Currey del Hall

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Remixorial Esta publicação é resultado da oficina “Tudo eh Remix”, um projeto dos coletivos 27 Frames e A Zica com a intenção de criar novos sentidos ao acervo audiovisual e imagético do Arquivo Público Mineiro e do Museu Mineiro. Currey del Hall é a síntese da experiência que nos deixou uma questão: 1) Será que os autores dos livros de História nos contaram tudo aquilo que gostaríamos de saber? A possibilidade das pessoas produzirem coletivamente via internet hoje é uma realidade e também um desafio. Ordenamos o acervo das duas instituições e disponibilizamos todos os vídeos e imagens on-line aos participantes. Assim foi possível articular de antemão o que foi feito durante o encontro do dia 18 de julho de 2015. Reapropriando um modo de produção que vai do dada ao meme, a intenção foi reutilizar qualquer conteúdo sem a culpa do plágio. Nossas referências teóricas foram o curta metragem “A Brief History Of John Baldessari” (2012), “Everything is a Remix “ (2010) , “RIP: A Remix Manifesto” (2009), os documentários “All Watched Over By Machines Of Loving Grace” (2011) e ”Toda a Memória do Mundo” (1956). O mini-curso resultou em três vídeos e a Currey del Hall que você tem em mãos. Os vídeos podem ser visualizados no canal da 27frames:vimeo.com/27frames . O que se esboça aqui é um tipo de criação totalmente livre que foge do que vemos no cotidiano. As multinacionais querem privatizar e capitalizar cada passo de nossa vida. A mídia quer adestrar nosso pensamento através de um mergulho em imagens repetidas pela nossa “História”. Logo, podemos criar nossas próprias realidades, tão absurdas quanto. “A herança literária e artística da humanidade deve ser utilizada para fins públicos. Todos os elementos, tomados em qualquer lugar, podem ser objeto de novas abordagens, tudo pode servir. É evidente que se pode não só corrigir uma obra ou integrar diversos fragmentos de obras antigas numa nova, como também mudar o sentido desses fragmentos e falsificar de todas as maneiras aquilo que os imbecis se obstinam em chamar de citações.” A resposta que damos para a pergunta que abre este texto é: 1) Nunca conheceremos toda a história do mundo. Que nossos livros de História possam ser reescritos a cada dia de um jeito diferente. Este experimento é um mero ruido do passado com sintomas da arte e da história em decomposição. Tudo que foi produzido é um mero exercício, já que existem infinitas possibilidades em recriar acervos. Cansamos de múmias empoeiradas. Que o bem público chegue ao povão.

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Centrão. Inaugurado em 1929, o Viaduto Santa Tereza foi concluído 13 anos antes do conjunto arquitetônico da Lagoa da Pampulha. Os dois locais foram frequentados pelas primeiras gerações modernistas da cidade. Outros locais importantes ao convívio boêmio dessa gente era o Grande Hotel (hoje Edifício Maletta) e os velhos bares da Rua da Bahia. Hoje esses bares foram substituídos por N espeluncas. Os cantões ali do Centrão presenciam gente nascer e morrer o tempo todo. Agora estão no meio da gentrificação galopante da área. Geram o enobrecimento de cantos outrora marginais e às vezes até ao desaparecimento de casas históricas. No meio fica a Avenida Afonso Pena, onde se vê o primeiro arranha-céu da cidade, abandonado por décadas. Nas vias de saída para outras regiões, as estações do Move, parecidas com as velhas estações de bonde que existiam na Avenida. Ah, ali perto é a Rua Sapucaí, onde teve a Favela da Estação. Agora é a primeira via com dois parklets na cidade. A Rua Caetés já tem um Subway e o Maletta um sushi. Depois que voltou do Festival de Woodstock, o poeta beatnik Paulo Leão frequentou a boêmia desse prédio até morrer. No final da vida, políticos tentaram lhe doar uma casa num bairro distante. Preferiu ficar ali, lendo poemas, que às vezes ninguém escutava, porque ele mostrava as feridas de seu olho arrancado.

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constantemente

deposite

O constante cahir de gotas d’ågua num vaso o farå transbordar


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caixa

na

economias

as suas


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Criacionices e arquivicionices Num processo de criação, a vertigem de se ter disponível um banco de imagens enorme pode ser a melhor das tentações. Tomar para si fotografias e jornais velhos feitos por alguém já esquecido ou que representam algum tempo ou lugar (des) conhecido parece ter um poder de invenção como se as figuras exigissem serem vistas de novo e mais uma vez. A colagem transfere formas e sentidos que sobrepostos deixam-se apreender em uma unidade entre a intenção e o resultado. E neste translado algo muda. É uma condição ambivalente que recria forças e vínculos entre o real e o imaginário. Daí pipocam as possibilidades de contar histórias, de modelar formas, de sobrepor ideias e encadear pensamentos. Além de fazer surgir o que está num papel ou numa tela em latência, é fazê-los existir em outro espaço e tempo para outro público. Tirar um arquivo imagético de seu buraco negro e trazê-lo a luz é um gesto importante em tempos de comunicação virtual em que imagens sucedem a outras em alta velocidade privilegiando a mais recente aparição, a mais recente exposição, a imediata superpresença, que muito rapidamente é lançada para trás numa linha do tempo volátil. Para os aproveitadores e oportunistas, Tudo eh remix. Para os profanadores da cronologia tudo é uma ambição, um remix para fazer de quase nada alguma coisa.

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Publicações e imagens em movimento: hoje e ontem Foi trabalhoso organizar e escolher as imagens, que na sua maioria, nos foi passada em baixa resolução. Tudo que estava numa resolução razoável foi colocado on-line e os 5.0000 thumbs foram folheados para daí saírem outras 300 imagens. Este creme de la creme fotográfico, ainda recebeu o aporte de mais conteúdo vindo da imprensa. Algumas páginas da revista Bello Horizonte foram copiadas do Arquivo da Cidade de Belo Horizonte, de onde também vieram algumas charges. A Folhinha Mariana de 1868 teve suas ilustrações todas scaneadas pela equipe do Arquivo Público Mineiro. As colunas que o jornalista Moacir Andrade

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publicou no Diário da Tarde durantes os anos 1940 e 1950 foram lidas pela equipe d’A Zica e 27 Frames, que escolheu nelas as abordagens mais retrógradas. Quando os participantes da oficina começaram a criar, questionavam a equipe sobre sua produção. Foi tudo bem livre. Quando o Hugo Rezende nos contou que seu avô, Érico de Paula, era ilustrador da revista Bello Horizonte, a coisa deu ainda mais caldo. Junto com João Batista Monsã, o avô do Hugo foi um dos fundadores das artes gráficas na cidade. Faziam desde propaganda de comida a logotipos de instituições que perduram até hoje (vide o brasão do Minas Tênis Clube).


Sobre as imagens e vídeos - originais e remixes O material bruto imagético está disponibilizado no www.flickr.com/tudoehremix/ albums. Ali a própria organização de alguns álbuns foi remixada, criando conexões provocativas. Tanto nos vídeos quanto na publicação, mesmo com épocas diferentes abordadas, tudo tem uma relação com o que está acontecendo hoje. Não há futurologia, o que foi feito é para reforçar nossas perspectivas do agora. A produção dos vídeos da oficina se debruçou sobre um acervo essencialmente propagandista, produzido pelo governo militar das décadas de 1960 a 1980, além de uma animação e mais dois curtas.

Nos remixes, são vários matizes de ontem e agora se fundindo: - Durante a visita do presidente Médici a Minas Gerais, sons de metralhadoras, bombas, porcos e flatulências ressignificam o evento, assim como os creditos finais do filme listam o nome dos torturadores da era militar - um desfecho democrático ao acontecimento. Para Cid Moreira, é um grande trunfo o Córrego do Acaba Mundo desaparecer da paisagem e o Córrego do Leitão já não incomodamais ninguém. - Ao som de um pacadão o jornalista Amaral Neto deforma a Belo Horizonte de todos os tempos. Veja os vídeos em

http://vimeo.com/27frames

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Sobre experimentar arquivos Conheci o Arquivo Público Mineiro em 2006. Era um jornalista recémformado e sem experiência e estava começando a fazer uma pesquisa sobre Joaquim Rolla, cassinos etc. Naquela mesma época, tomei contato com o acervo da Biblioteca Nacional. Foi complicado encontrar qualquer coisa on-line e mesmo quando você achava, era ruim. A BN até disponibilizava muitos PDFs, mas a resolução era péssima e ainda tinha a marca d’água da instituição em cada página. Não havia como fazer a busca através de uma palavra, você tinha que folhear tudo pra achar algo. Nos últimos anos, a BN investiu e hoje compartilha seus arquivos de um jeito otimizado,

possibilitando o acesso. Alguns poucos grandes veículos da mídia também investiram em scanear e

disponibilizar seu próprio acervo, só que exclusivo a seus assinantes. Por quê ainda não existia um jeito para o pesquisador, não necessariamente historiador

profissional, querer procurar imagens específicas em sites institucionais? O Arquivo Público Mineiro, que começou a scanear seus arquivos em 2001, tem uma plataforma bem bacana para encontrar informações e imagens, porém elas não estão disponíveis para download. A mim, parece que elas estão organizadas de um jeito que privilegia apenas o acervo de onde vieram - a grande maioria, doações de políticos e figurões da sociedade. Além do quê, você só vê a imagem ocupando 25% da tela. Num mundo onde os bebês nascem manuseando tablets, enxergo uma necessidade maior desses arquivos circularem.

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CRÉDITOS: capa - 1 e 36: Paulo Marcelo Oz | logotipo Currey del Hall: 4e25 2: Hugo Rezende e Evandro Renan | 3 e 34: João Perdigão (e texto da página 25) 4 e 17: Warley Desali | 6 e 32: Hugo Resende | 7, 19 e 20: Aline Lemos 8, 10 e 11: Aruan Mattos

| 9: João Gabriel (texto de João Perdigão)

10 e 11: imagem do centro por Hortência Abreu e texto de Iago Passos | 12, 13 e 22: Evandro Renan 14: João Gabriel 15: Camila Félix (texto remixado a partir de uma ideia de Barbaba Mol) 16 e 23: Daniel Iglesias | 17: Manuel Carvalho | 24: Marina Alves | 25 e 29: Iago Passos 26: Camila Félix | 27: André Nicolau | 28: João Victor (De Merda) 30: João Valadão & Rafael da Mata | 31 Gabriel Caram | 35: Tenesmo

EDIÇÃO: João Perdigão (A Zica)com colaboração de Arthur Senra, Gabriel Caram e Tarley McCartney (27 Frames)

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REALIZAÇÃO:

http://vimeo.com/27frames

http://azica.tumblr.com

www.flickr.com/tudoehremix/albums

Coordenação: Arthur B. Senra, Gabriel Caram, João Perdigão e Tarley McCartney Apoio: campanha ateliê gráfico editorial (Clarice Lacerda, Bruno Rios e Ana Kossoski)

Agradecimentos: Ana Kossoski, André Nicolau, Bruno Rios, Clarice Lacerda, Leo Pyrata, Mariana Gonzaga, Arquivo Público Mineiro (Thiago Veloso e Marcia Alkmin ), Museu Mineiro (Angelina Camelo), Luiz Navarro e Marcelo Dolabela.

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