Maceió, 200 Anos.

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Presidente Carlos Alberto Mendonça

Presidente do Conselho Estratégico

Carlos Alberto Mendonça Diretor Executivo

Luis Amorim Instituto Arnon de Mello (82) 3326-1604

Coordenação Geral

Leonardo Simões História

Douglas Apratto Tenório Economia

Cícero Péricles de Carvalho Geografia

Rochana Campos de A. Lima Cultura

Cármen Lúcia Dantas Revisão

Ivone dos Santos Fotografia

José Ronaldo Hamilton Cruz Direção de Arte e Diagramação

Wellington Charles Cavalcanti Tratamento de Fotos

Victor Paiva Impressão - Gráfica Moura Ramos Tiragem - 15.000 Exemplares Foto capa: Ricardo Lêdo

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“MACEIÓ, 200 ANOS”

É

magnífico, e feito com muito zelo e especial cuidado, este Trabalho sobre os 200 anos de Maceió, realizado pelo Instituto e a Organização ARNON DE MELLO, através dos competentes Mestres, Especialistas Pesquisadores e doutos Historiadores, a exemplo dos Professores Douglas Apratto Tenório, Cármen Lúcia Dantas, Cícero Péricles de Carvalho e Rochana Campos de A. Lima, auxiliados por um bom grupo de Fotógrafos, Redatores e Colaboradores, sob os cuidados do diretor Leonardo Simões. É um prazer entregá-lo à sociedade, registrando, com maestria exemplar, o valor da Efeméride de grande significado para todos nós que temos a felicidade de presenciar, esse marco histórico, desta acolhedora Maceió, completando seu segundo século como Capital. É uma obra notável, ímpar, sobre o “Torrão dos Marechais”. Um trabalho cuidadoso, restaurador incondicional da História da Maceió, a qual todos nós amamos e onde temos nossas raízes, os nossos ancestrais. Homens e Mulheres que, efetivamente, construíram esta querida cidade. Maceió, hoje verdadeira metrópole, dona das

mais belas praias e dos mais agradáveis recantos deste sofrido Nordeste, foi berço de grandes homens que continuam ajudando a construir e solidificar a nossa República. Os que tiveram a felicidade alcançar uma cidade onde o transporte principal era o bonde, indo para todos os bairros, após, inteligentemente, circular o Centro, e daí seguindo para os seus destinos, são orgulhosos de terem vivido num dos recantos mais agradáveis deste Brasil. Pelas suas belezas naturais, lagoas, praias, cidade alta, cidade baixa e muitas outras maravilhas, Maceió recebeu o merecido título de “Cidade Sorriso”, onde, dizem os mais antigos, “não havia dificuldade para a vida das famílias”. Ao fazer esta saudação à querida cidade de Maceió, a qual aprendi, logo cedo, a querer bem, amando-a com o coração, e que me deu família e bons amigos, orgulho-me de integrar o Instituto e a Organização ARNON DE MELLO, poder testemunhar a realização de um Trabalho magnificamente elaborado por uma Equipe de Estudiosos Profissionais que engrandecem a todos nós, como este MACEIÓ, 200 ANOS.

Maceió, dezembro de 2015.

Carlos Alberto Mendonça Presidente do Instituto ARNON DE MELLO

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Índice A História Os Símbolos de Maceió

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Capítulo I Dos primórdios ao Período Colonial As raízes indígenas, a origem e as dúvidas Porto e porta abertos ao comércio com os franceses O registro no diário holandês Dirimindo dúvidas sobre a origem O povoado inicial A padroeira e a transferência de São Gonçalo As entrelinhas da escritura Entre jacutingas e araçás, uma restinga estratégica O povoado se expande Os sambaquis - Maceió antes dos índios A toponímia tupi de Maceió A rede e a jangada, vestígios de um legado esquecido

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Capítulo II Elevação à vila - Uma cidade em gestação num país nascente O Alvará Régio e a primeira Câmara Póvoas queria Maceió como capital Uma vila com vocação mercantil A reação dos comerciantes A planta de Mornay e um destino manifesto Sociedade urbana com essência patriarcal A luta pela independência e a lusofobia Transferência da capital e mudança do cofre

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Capítulo IV

A História

Os turbulentos anos republicanos – De 1889 ao fim da República Velha A vida intelectual nascente e o Instituto Histórico Um período de turbulência na consolidação da República A queda dos Malta, Maceió incendiária A Quebra dos Terreiros. Ato de perseguição religiosa A Belle Époque sururu e a miséria dos pobres Maceió das imagens e a expansão das associações Do outro lado da ribalta, os excluídos As novas invenções, Maceió se civiliza Os gansos do Salgadinho salvam o governador Os banquetes e as lutas políticas O irrompimento da questão obreira A época de ouro da cultura

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Capítulo V

Capítulo III Maceió torna-se a capital - O Período Imperial O fascínio dos estrangeiros A escravidão e a presença negra em Maceió O trem e a modernização conservadora do século XIX As linhas arquitetônicas, serviços básicos e posturas A visita do imperador, a matriz e a Santa Casa “Voluntários” forçados a ir à Guerra do Paraguai Acirramento político Lisos x Cabeludos As tensões e os movimentos sociais e políticos As campanhas abolicionista e republicana Educação e cultura

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Maceió, da Revolução de 30 aos dias atuais - Os desafios do século XXI Os revolucionários entram na cidade-restinga O grand finale de uma era Bebedouro é destaque na era de ouro da cultura O Estado Novo e a II Grande Guerra O Anjo Americano, Angústia e Ninho de Cobras O petróleo é de Alagoas, é do Brasil, é nosso Maceió em tempos de cólera O fim da guerra e a redemocratização de 45 O Gogó da Ema O primeiro prefeito eleito, em 1953 As surpreendentes mudanças dos anos 50 A novidade do banho de mar e a praia das acanhadas O episódio do impeachment abala a política As vilas operárias, o voto urbano e as universidades Nova perda de autonomia A resistência de uma época de medo A televisão insere Maceió na aldeia global Presença das mulheres na ribalta política A Praça do Centenário Bibliografia / Intendentes municipais de Maceió Prefeitos de Maceió

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A Economia Capítulo VI Os desafios de Maceió no século XXI - A busca da qualidade de vida A cidade do comércio e dos serviços A economia informal 57% da economia alagoana estão na região metropolitana A cidade polarizada O Estado onipresente A questão habitacional O consumo popular O mercado de trabalho Oportunidade de desenvolvimento A capital dos serviços - Uma urbe dinâmica Maceió, moderno centro comercial Um dinâmico polo de saúde Uma rede educacional qualificada Moderna estrutura de turismo A indústria da construção civil TI e Business Services A economia criativa Porto e aeroporto, as portas de Maceió Um porto para o mundo Na era da aviação

A Comunicação

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Capítulo VII IAM, uma década de obras sobre Alagoas e sua gente O papel da OAM na modernização de Alagoas O Século XX - Esse extraordinário mundo novo As empresas que formam a OAM Arnon de Mello, um homem apaixonado pela informação

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O papel da OAM na modernização de Alagoas

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A Geografia Capítulo VIII e IX Maceió, 200 anos - 1815 a 2015 - Uma visão temporal da cidade Maceió, de 1815 a 2000 O ambiente natural – A geologia A geomorfologia A cobertura vegetal A Hidrografia As águas superficiais –As águas subterrâneas – As unidades de conservação Evolução dos limites municipais As primeiras ocupações Evolução urbana Vias de comunicação Evolução populacional Maceió no século XXI – O desafio de se reinventar – Região metropolitana Divisão dos bairros Os bairros – Os bairros da planície lagunar Os bairros da planície marinha Os bairros do planalto Maceió e sua população atual Mobilidade e acessibilidade – Os desafios para que a cidade se mova Glossário

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A Cultura Capítulos X e XI A construção da identidade – Literatura Artes plásticas Teatro Cinema Fotografia Música Bibliografia

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Maceió, jovem e bela senhora M

aceió é uma adolescente de 200 anos, se comparada com milenares cidades europeias e asiáticas, ou mesmo com capitais brasileiras que têm mais do dobro da sua idade. Mas nossa cidade já atrai visitantes como gente grande. Porque é bela e porque tem um povo que sente gosto de mel quando dizem que sua cidade é bonita. Somos vaidosos dos encantos da nossa capital. Vaidosos como mãe de menino traquinas. Reclamamos dos problemas dela entre nós, que somos de casa. Mas vá alguém “de fora” falar mal de Maceió na nossa frente. Viramos bicho, defendemos a cria. Nosso amor pela cidade não é apenas atávico. É herança e tradição, sim, mas Maceió nos dá motivos muito reais para admirar seu passado e gostar de viver aqui no presente. As ruas do Centro histórico, por exemplo. Os nomes originais dessas ruas dão uma ideia de como Maceió exala inspiração e lirismo desde que nasceu. Rua do Sol, Avenida da Paz, Rua da Alegria, Rua Boa Vista, Beco do Moeda, Rua do Imperador, Ladeira da Catedral, Rua do Livramento, Beco de São José, Rua Augusta, também conhecida como Rua das Árvores... Que povo mais poético é esse, para inventar endereços tão bonitos? Houve um tempo em que essas denominações foram trocadas – é a velha mania brasileira de rebatizar locais públicos. Nos regimes autoritários (o Estado Novo e a ditadura de 1964), a Avenida da Paz virou “Avenida Duque de Caxias”. Triste ironia: a paz foi trocada por um símbolo da guerra, Caxias, que aliás nunca pôs as bravas e honradas

botinas por aqui. Nasceu e morreu no Rio de Janeiro. A Rua da Alegria virou “Rua Joaquim Távora” – outro militar, cearense e nem um pouco ligado a Alagoas. Na época da mudança, uma anedota local dizia que, lá longe em seu túmulo, o próprio Joaquim Távora lamentava ver seu nome sendo usado para acabar com a Alegria. A Rua do Sol virou “Rua João Pessoa”, paraibano e também sem vínculos com Maceió. E assim por diante: todas as outras principais vias públicas foram rebatizadas com nomes que nada diziam à alma da cidade. O Centro perdeu a identidade, pelo menos nas placas das ruas. Mas o maceioense, mesmo nas décadas seguintes, continuava a chamá-las pelos nomes antigos – é uma qualidade que o povo tem, a teimosia. Felizmente, em 1990, a Câmara Municipal de Maceió aprovou um projeto do então vereador Ênio Lins e devolveu oficialmente os nomes com que Mestre Povo batizou as ruas do Centro histórico de Maceió. Hoje as placas voltam a ostentar os nomes originais, os nomes verdadeiros e belos das nossas ruas, becos, praças e avenidas, que nasceram e cresceram junto com Maceió. E os personagens? Toda cidade que se preza tem seus personagens. São eles que dão vida, humanizam e contam a história de um lugar. Falar de Maceió é falar do Moleque Namorador, do Major Bonifácio dos carnavais e festas de fim de ano; de Rás Gonguila e de Benedito Mossoró. Da Nega Odete e da Miss Paripueira. Do homem do veneno no Mercado, dos anônimos cantadores das feiras e dos poetas

bêbados nas madrugadas enluaradas. Ou de um rapaz do Farol que cantava e tocava violão e jogava bola muito bem, chamado Djavan Caetano Viana, filho de um ambulante e de uma lavadeira. Um dia o rapaz saiu daqui e foi mostrar sua arte para o Brasil e o mundo. Mas sempre volta para beber a água da sua fonte, e se inspirar na cidade que o viu nascer para criar sua música. Parabéns à jovem senhora bicentenária, Maceió. A brisa que vem do mar, desde o litoral norte em Ipioca, passando pelas três enseadas de beleza sem igual – a da Jatiúca, a da Pajuçara-Ponta Verde e a da Praia da Avenida, de onde se vê o mais belo pôr do sol –; a brisa que chega ao Pontal das rendeiras e entra pela Lagoa Mundaú, passa pelo Porto do Sururu no Dique-Estrada, vai adiante e refresca velhos casarões e pequenas habitações de pescadores e catadoras em suas margens na Cambona, no Bom Parto, no Mutange e em Bebedouro, até as antigas fábricas nas ladeiras de Fernão Velho, já no extremo sul – essa brisa generosa, que balança os coqueiros e mangueiras de Maceió, sopra as 200 velinhas de seu aniversário. E nós todos cantamos, batemos palmas, fechamos os olhos e abraçamos a nossa cidade querida, desejando-lhe muitos anos de vida e de felicidade para seu povo. Finalmente, nossos merecidos e sinceros cumprimentos à Organização Arnon de Mello, que mais uma vez mostra zelo com a História, preservando a memória e a cultura da cidade com o suplemento comemorativo dos 200 anos de Maceió. A cidade agradece pelo presente. Ela merece.

Renan Filho Governador

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200 anos de Maceió, Momento de Celebração O

aniversário de uma cidade é um marco na história e nas conquistas de seu povo. O bicentenário de Maceió é também uma página que revela a chegada de um novo tempo, em que buscamos mais qualidade de vida, melhor infraestrutura e melhores condições de educação, saúde e bem-estar. Maceió completa 200 anos como uma cidade dinâmica, em plena construção de um futuro ainda melhor, que aspira por mais justiça social. Berço ou morada de grandes nomes de relevância nacional e de um povo trabalhador, ordeiro, especial, nossa cidade enfrenta com altivez e coragem o desafio de reduzir as desigualdades e promover a cidadania de nossa gente. Estamos em uma luta incansável pela qualificação dos espaços públicos e áreas de lazer, ampliação do acesso à educação, à saúde e ao esporte, promoção de empregos e da economia solidária e oferta de condições para a expansão da atividade turística, vocação natural inspirada pela beleza de nossas praias e potencializada pela capacidade acolhedora de nossa população. A comemoração dos 200 Anos de Maceió é um momento de grande significado para a cidade. De celebrar o crescimento, de celebrar conquistas, de refletir sobre os

desafios e reforçar o compromisso para com nossa população. É o momento de fortalecer a identidade do maceioense e sua relação de pertencimento com a bicentenária Maceió. À frente da Prefeitura de nossa capital, esta tem sido uma de nossas metas, da qual procuramos não nos distanciar: fazer, por meio de uma gestão devotada à causa de nossa cidade, elevar o orgulho que todos nós sentimos em ser maceioenses, alagoanos. O aniversário é de nossa cidade, mas somos todos parte dessa festa. O bicentenário de Maceió é o momento de declarar o nosso amor pela capital onde vivemos e criamos nossos filhos. Onde o legado de nossos antepassados nos inspira e onde a esperança de um amanhã de bem-aventurança só faz aumentar. A publicação Maceió 200 Anos endossa esse compromisso. É o legado da Gazeta de Alagoas à história e à construção do bicentenário. A obra reúne grandes especialistas, que apresentam com muita competência a história, a geografia, a economia, a cultura e a realidade da capital alagoana. É um presente para o maceioense, a preservação da memória e a afirmação do envolvimento com a cidade. Parabéns, Maceió!

Rui Soares Palmeira Prefeito

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Lembranças do Bicentenário A

história de Maceió está em suas ruas, em suas vilas, em seus vultos, canções, tragédias e glórias. Como toda história, invulgar e única. Por isso, bela e incandescente. E quem ousa nos contá-la? Todos aqueles que possuem, cada um a seu modo, a tarefa de evitar que nos esqueçamos. Mesmo que fragmentadamente. E estes compõem um mosaico de seres, objetos, narrativas. Todos indispensáveis. É a raposa de Lêdo Ivo. O itinerário de Luis da Silva, de Angústia de Graciliano Ramos. É Manoel Antonio Duro, habitante primeiro no começo dos 1600, como indica Craveiro Costa. É a Praça do Montepio, em sua honra, em sua degradação. É o Jacintinho e o Benedito Bentes, em biografia, e em sua geografia. O Café Central. O Quebra de 1912. Os faróis. Riachos, mar, lagoa. E os livros. Como este que você tem agora em suas mãos. Obra produzida com esmero e que busca dar, de sua maneira, contribuição a esta tarefa de nos apresentar o ontem e a evolução de nossa Maceió, nossa cidade, nosso chão. Livro que ganha um significado ainda

mais especial, diante do marco de ser lançado em sincronia com o bicentenário de nossa cidade. São 200 anos, infinitas histórias, que aqui busca, em parte, condensar e registrar com qualidade editorial, pesquisa acurada, redação primorosa e projeto gráfico editorial que dá gosto de ver, de folhear e de ler. Maceió alcança seus 200 anos vivendo um momento crucial em sua existência. A capital de Alagoas começa a se desfazer da feição que a rotulava como pequena para assumir, gradativamente, sua condição de grande cidade, sede de região metropolitana, polo convergente. E junto às delícias vêm as dores de ser o que é. Desafios que todos nós, na Prefeitura de Maceió, estamos buscando diariamente superar. Mais que isso, para além de bandeira de gestão, desafios que todos nós, filhos desta cidade, temos a missão de enfrentar. E nesta tarefa, estamos todos unidos. Unidos pelo amor a Maceió, vivenciando nosso papel, sendo raposa, Luis, Manoel, Praça da Faculdade, Ipioca ou Moleque Namorador. Construindo com nossas vidas estes retalhos de histórias, necessários ao lembrar de um povo.

Clayton Santos Secretário Municipal de Comunicação

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Minha Pátria Lêdo Ivo

Minha pátria não é a língua portuguesa. Nenhuma língua é a pátria. Minha pátria é a terra mole e peganhenta onde nasci e o vento que sopra em Maceió. São os caranguejos que correm na lama dos mangues e o oceano cujas ondas continuam molhando os meus pés quando [sonho. Minha pátria são os morcegos suspensos no forro das igrejas [carcomidas, os loucos que dançam ao entardecer no hospício junto ao mar, e o céu encurvado pelas constelações. Minha pátria são os apitos dos navios e o farol no alto da colina. Minha pátria é a mão do mendigo na manhã radiosa. São os estaleiros apodrecidos e os cemitérios marinhos onde os meus ancestrais tuberculosos [e impaludados não param de [tossir e tremer nas noites frias e o cheiro de açúcar nos armazéns portuários e as tainhas que se debatem nas redes dos pescadores e as résteas de cebola enrodilhadas na treva e a chuva que cai sobre os currais de peixe. A língua de que me utilizo não é e nunca foi a minha pátria. Nenhuma língua enganosa é a pátria. Ela serve apenas para que eu celebre a minha grande e pobre pátria [muda, minha pátria disentérica e desdentada, sem gramática e sem dicionário, minha pátria sem língua e sem palavras.

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Maceió, urbe e polis C

idades são monumentos à civilização. Em graus variados contam a história da evolução, desde o primitivismo às formas mais elaboradas de organização social. Apresentam marcas da engenhosidade humana na longa caminhada que nos retirou das cavernas para o convívio em sociedade. Na escala do tempo, elas são degraus expressivos do processo civilizador. No curso da história atestaram a importância de cada cultura, que nelas deixaram suas digitais, mais ou menos indeléveis, conforme a complexidade que atingiu cada um desses centros econômicos, administrativos e populacionais. O marco dessa evolução foi dado pelos gregos, que, numa síntese das conquistas ocorridas no Mar Mediterrâneo, adicionaram o conceito de polis ao de urbe, a expressão máxima do desenvolvimento social na gestão do poder – aí incluso o conhecimento em várias vertentes –, fazendo com que as suas cidades-estado estabelecessem paradigmas de tudo aquilo que hoje entendemos por civilização. Maceió permite essa leitura. Desde seus primórdios de feitoria dedicada à extração do pau-brasil por tribos primitivas voltadas ao comércio colonial; do engenho de açúcar sob o causticante sol tropical em meio ao mangue úmido, num crescimento social lento e sofrido até os dias de hoje. Da cidade cheia de dualidades, mas já inserida no contexto

da modernidade brasileira. Da construção de uma cultura e da identidade, do conhecimento que avança lenta e de forma permanente sobre o analfabetismo, difundindo técnicas, criando atividades econômicas, enfim, saindo do primitivismo tacanho em direção à modernidade. A urbe evoluiu, trocando traçados urbanos toscos e casarios antiquados por linhas urbanisticamente elaboradas e construções não somente mais belas, mas também capazes de oferecer maior conforto aos seus ocupantes. Um esforço desenvolvimentista protagonizado por empresários, engenheiros, arquitetos, profissionais de saúde e artífices de habilidades diversas, que fizeram sua parte na melhoria das condições de vida, criando, em ciclos virtuosos, aperfeiçoamentos a cada geração - aquilo a que chamamos progresso, o que faz o hoje melhor do que o ontem. A cidadania em lenta evolução também é uma conquista desse processo evolutivo. A polis construída nos trópicos iguala direitos e valoriza o primado da lei. Maceió é a cidade cuja maior expressão é Ledo Ivo, de talento poético único, que elevou o caranguejo a figura lírica e o mangue a símbolo de nossa universalidade. Maceió, duas vezes centenária, é ainda imperfeita, mas cheia de qualidades e promessas!

Stefani Brito Lins

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Casa de Fazenda Frans Post - 1651

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A HISTÓRIA

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Douglas Apratto Tenório Doutor em História pela Universidade Federal de Pernambuco, membro da Academia Brasileira de História, da Associação Brasileira de Imprensa e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

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O Brasão de Armas

Os Símbolos de Maceió

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LEITURA: Escudo: português antigo, em posição natural, terçado em faixa. Em 1, ou no Chefe, ou primeiro quartel, de verde (sinopla), com uma jangada alagoana velejante de prata; em 2, no segundo quartel deste último, carregado de uma divisa de vermelho (goles), ondada; em 3, no contrachefe, ou terceiro quartel, de azul (blau), com uma canoa velejante de prata. Apoios: duas palmas de coqueiro (coco nucifera), de sua cor, entrelaçadas embaixo sob um listel de azul (blau), filatado de prata, com a palavra MACEIÓ, em letras do mesmo. Coroa Ural de ouro, de cinco torres, aberta de vermelho (goles), com um escudete de prata carregado de um barrete frígido de vermelho (goles) na muralha central. Simbologia: A forma do escudo, retângulo de 8 x 7, com ângulos arredondados de 1/4 de círculo, é a forma usada na Península Ibérica e adotada pelas municipalidades portuguesas. Indica, assim, nossa origem racial, cultural e política, e faz a devida ligação do nosso passado com a história lusitana. A faixa central, de prata, representa a restinga onde se encontra Maceió. De prata, para retratar sua constituição arenosa e a alvura puríssima de suas praias, bem como para simbolizar a alegria característica de sua paisagem, que lhe valeu o nome, hoje clássico, de Cidade Sorriso. A faixa diminuída, ou divisa, ondada, representa o Riacho Maceió, Salgadinho ou Reginaldo, que recebeu o nome do lagoeiro, ou pântano Maçayó, e depois o transmitiu ao primitivo engenho, mais tarde à vila e à cidade; de vermelho, pois que nasce sob o nome de Rego, ou Riacho da Pitanga (vermelho, em tupi), e corre na maioria de seu curso, principalmente no inverno, com águas

barrentas, carregadas de argila vermelha das próprias ravinas que atravessa antes de chegar à restinga. O chefe, o primeiro quartel, carregado com uma jangada velejante de cor prata, representa o mar que banha de um lado a restinga, e do qual a jangada é a embarcação típica e indispensável; o verde é para recordar os mares bravios de Alagoas, particularmente o de Maceió, e simbolicamente para indicar a abundância de peixes. O contrachefe, campanha ou terceiro quartel, recorda, por sua vez, a lagoa que limita, no outro lado, a restinga; o azul indica que não se trata de água salgada, e simbolicamente expressa sua formosura e serenidade, com uma canoa velejante de cor prata, que é semelhante à sua embarcação característica. A coroa mural é símbolo dos municípios brasileiros, e vem sendo usada em todos os brasões municipais, a exemplo do que acontece em Portugal. É figurada com cinco torres para indicar que se trata de cidade, e de ouro, porque a cidade é capital do estado. O escudete, com o barrete frígio, símbolo da República, pretende recordar que no município, nasceu o marechal Floriano Peixoto, o Consolidador da República. Os apoios: folhas de coqueiro, de sua cor, indicam que Maceió está situada dentro de um vasto coqueiral, mostrando, além disso, que a palmácea é a sua maior riqueza agrícola, mas também ornamental, emoldurando com sua beleza as praias do mar e da lagoa, as ruas, os quintais e as praças da cidade. A palavra MACEIÓ, no listel, indicando o nome do município, acompanha a tradição heráldica que nos veio através de Portugal, e que já se encontrava nos brasões nassovianos de Alagoas e de Porto Calvo.

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A Bandeira Leitura: Bandeira terçada em faixaS de verde, branco e azul. Na faixa branca, uma divisa ondada de vermelho. No centro, um círculo branco, contendo o brasão de armas oficial do município de Maceió, sem o listel de azul. A Bandeira procura representar as cores do brasão - verde, branco, azul e vermelho - na mesma disposição em que nele se encontram. O brasão, reproduzido num círculo ao centro, reforça a simbologia das cores e partições. Como se trata de bandeira, o brasão de armas não leva o listel com o nome MACEIÓ. Os projetos do brasão e da bandeira de Maceió são de autoria do professor Theo Brandão e foram apresentados à Comissão designada pelo prefeito Vinicius Cansanção, em 1960. A Câmara de Vereadores, através da Lei nº. 868, aprovou o resultado da seleção, sendo a lei sancionada em 29 de maio de 1962.

Hino de Maceió Letra de Carlos Moliterno e música de Edilberto Trigueiros

És, Maceió, altiva e majestosa, Feliz nasceste entre a lagoa e o mar, Ao lado da capela milagrosa De um velho engenho pobre e secular. Pelo trabalho e pelo esforço ingente, Como a bravura de teus filhos nobres E debaixo de um sol glorioso e quente Veio a riqueza dessas terras pobres A tua glória promana Desses teus filhos audazes Cujo alto valor se irmana Ao dos heróis mais capazes Maceió, terra adorada! Ó terra bela e altaneira! Tua história é proclamada Pela nação brasileira Tu tens paisagens, Maceió, famosas Teu sol é quente e o teu luar é claro São tuas praias belas e formosas De um tom de prata, deslumbrante e raro E desde o alvorecer das madrugadas De Ponta Verde às curvas do Pontal Os coqueiros e as velas das jangadas Dão-lhe um vigor de tela natural.

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A tua glória promana Desses teus filhos audazes Cujo alto valor se irmana Aos teus heróis mais capazes Maceió, terra adorada! Ó terra bela e altaneira! Tua história é proclamada Pela nação brasileira.

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Dos Primórdios ao Período Colonial Capítulo I

As raízes indígenas, a origem e as dúvidas

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aceió é a capital do “país dos alagoanos”, como dizia o inesquecível Lêdo Ivo, o grande bardo da nossa cidade. Após alcançar sua autonomia em 1815, disputou com cerca de oito vilas a primazia de ser a sede do novo governo provincial, criado por dom João VI em decreto real de em 16 de setembro de 1817. A competição foi renhida: quatro eram marítimas - Maceió, Porto Calvo, Poxim e Porto de Pedras. Uma era lacustre e levou por mais de vinte anos a contenda - Alagoas do Sul; outra era fluvial - Penedo, a mais séria concorrente, e duas mediterrâneas - Anadia e Atalaia. Maceió não desistiu, como fizeram as outras, e finalmente alcançou a vitória em 1839, consolidando sua posição e afastando definitivamente a concorrência. Ganhou tal condição no episódio épico regional que se chamou A Mudança do Cofre, com direito a lutas, mobilizações sociais e militares, prisão do governador e desterro dos principais líderes da sublevação contra a mudança da capital. Seu magnífico porto natural, na bela enseada da Pajuçara, foi o leit-motiv da escolha régia. Não só a história nem a política, mas também a sociologia e a psicologia dos povos são profundamente afetadas pelo fato memorável da autonomia, da emancipação. A capital dos alagoanos tem sua data maior celebrada no mês de dezembro. E em todos os anos há uma pergunta repetida por muita gente. Qual a data efetiva do aniversário de Maceió? Por que esta confusão entre os dias 5 e 9 de dezembro?

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Albert Eckhout, óleo sobre tela, 1641, Museu Nacional da Dinamarca, Copenhague

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equívoco é porque em 5 de dezembro de 1815 dom João VI, entre os muitos papéis que despachava com seus ministros no Rio de Janeiro, assinou o Alvará Régio que elevou Maceió à categoria de Vila. Anos mais tarde, quando o governador Agostinho da Silva Neves foi libertado e venceu a facção que apoiava a transferência da capital, Maceió foi finalmente oficializada como a nova capital da Província das Alagoas, na data de 9 de dezembro de 1839. Para dirimir qualquer dúvida, o correto é celebrar o 5 de dezembro, data de sua autonomia, perfazendo agora em 2015, portanto, 200 anos de emancipação política. A data da mudança, a sua investidura como capital é significativa, mas não sobrepuja a da promoção à classe independente de Vila, dia de sua maioridade política.

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Porto e porta abertos ao comércio com os franceses R

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egistros históricos apontam que em 1672 o rei de Portugal, dom Pedro II - que não é o monarca brasileiro tradicionalmente conhecido por suas longas barbas brancas - já manifestava aos dignitários da corte de Lisboa sua preocupação sobre aquele ponto longínquo de além-mar que abrigava um porto e uma porta abertos aos negócios feitos à revelia da Coroa. O que seria aquele lugar com um nome estranho, eminentemente gentio, Maçayo-k, ao sul da próspera capitania de Pernambuco? Ordens expressas foram dadas para que um policiamento mais rígido da área impedisse o florescente comércio dos franceses com os índios, os verdadeiros donos da terra que habitavam aquele lugar dotado de uma excelente baía natural. O navegador Américo Vespúcio primeiro, e outros marinheiros mais adiante, das expedições exploradoras, certamente já haviam passado ao largo de suas praias, avistando-as de longe e alguns depois ensinaram aos neófitos e sucessores o caminho pelo mar até a paradisíaca angra de Jaraguá. “Quem vier buscar esta enseada, supondo vir da parte do norte, pode buscar a terra antes de chegar a ela, e avistando o cabo de Santo Agostinho ou o Porto Calvo ou o Camaragibe ou outra que lhe fique antes da enseada pode vir sempre a vista da terra, sendo que do mês de abril até março correm na costa as águas para o sul, e os ventos.” Apesar das duras disposições de dom Pedro II, de Portugal, a exportação do pau-brasil continuou e população maceioense crescia livre do controle oficial. Os projetos de fortificações em Jaraguá, feitos conforme

D. Pedro II, rei de Portugal

mandara o rei, ficaram no papel. Nenhum registro a seguir foi digno de importância, exagerando alguns que se dedicaram ao período da ocupação holandesa, como o grande Luís Câmara Cascudo, ao dizer que na documentação que pesquisou “nem sinal tinha de onde surgiria a linda Maceió”. Era uma publicação holandesa que descrevia o território conquistado - Itinerário desde a cidade Maurícia até o Forte Maurício, junto ao rio São Francisco - com excelente apresentação de toda essa faixa geográfica que ia de Recife a Penedo.

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O registro no diário holandês E

m contrapartida, trabalho de pesquisa do historiador José Fernando de Maya Pedrosa sinaliza o reconhecimento do território maceioense naquela época. Em meio a movimentação militar entre as forças flamengas e seus inimigos portugueses e espanhóis, havia um ponto entre Porto Calvo, a praça fortificada do norte, e o Forte Maurício, em Penedo, a praça forte meridional que não era Santa Maria Madalena da Lagoa do Sul. No longínquo ano de 1640, uma tropa holandesa de reconhecimento percorreu a costa alagoana desde Porto de Pedras, fazendo anotações que servissem para operações de guerra. Atravessaram de canoa os rios Santo Antonio Meirim e Pratagy e seguiram a marcha pelo caminho do Poço e Mangabeira até o Carrapato, hoje Jatiúca. De acordo com Maya Pedrosa, “Descobriram com os batedores uma linda enseada de águas turquesa. ‘Aqui é a Ioçara. Ali é Jaraguá, onde tem um paço’, diz um batedor índio no diário flamengo. Com a maré cheia, fizeram uma hora de marcha de Ponta Verde a Jaraguá, do contrário, o fariam em meia hora pela areia dura da praia.”. O paço seria um armazém, onde antes havia o embarque do pau-brasil. Ou seria a casa de Manuel Duro, de telha e tijolo. E o oficial batavo ditou ao seu imediato para fazer o registro oficial aos superiores: Praia de Ioçara, uma grande enseada junto ao paço de Jaraguá. Local de dunas areentas e alvas, coberta de mato rasteiro e ralo que se adiantava até o mar, demarcando a impressionante baía até a frente, a ponta de Jaraguá. Segundo ainda Maya Pedrosa, o capitão procurou examinar o terreno para mapear suas potencialidades para planejamento da guerra que estava em curso e mandou seu escriba anotar também “Aqui não há água,

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mas pode-se abrir cacimbas. A água é mais salobra, o pasto sofrível mais um pouco para o interior atrás da mata”. E prosseguiram caminhando de Jaraguá até a Barra das Lagoas, levando uma hora de marcha pela areia da praia, chegando a um lugar onde havia botes para transposição da Lagoa Manguaba e uma pequena instalação militar, um quartel, numa ilhota em frente.

Dali seguiram rumo a Santa Maria Madalena da Lagoa do Sul, lugar estratégico para uma guerra que se afigurava longa e sangrenta. Mas o oficial holandês não acertou quanto à questão da falta de água de boa qualidade no lugar e a aridez da terra. Nos idos de 1819, o almirante francês Roussain sinalizou uma ótima fonte na Praia de Pajuçara que servia para atender aos navios no porto. Ela estava a pouca distância da Ponta de Jaraguá e datava de muito tempo. Certamente serviu aos índios, aos contrabandistas de pau-brasil estrangeiros e certamente à família de Manoel Antonio Duro e seus escravos. Os holandeses não a viram naquele dia, provavelmente porque a preamar impediu que fosse percebida escoando pela praia, e o filete, antes de chegar lá, corria para o interior ao encontro dos alagadiços.

Vila de Madalena, Alagoas (1637-1645) autor: não identificado. fonte: Gravura que ilustra o livro de Barlaeus (BARLAEUS - 1647), estampa nº 14. Exemplar pertencente à Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro. A povoação de Santa Maria Madalena da Alagoa do Sul, atualmente cidade de Marechal Deodoro, foi fundada por Diogo Soares da Cunha, em uma sesmaria que lhe foi concedida em 1591 (CASCUDO - 1956, pág. 155). Junto à Alagoa do Norte ficava a povoação de Santa Luzia. A aparência da vila de Madalena foi registrada em uma estampa, que ilustra o livro de Caspar Barlaeus, sob número 14, com o título de ‘Pagus Alagoae Australis’, que faz referência ao nome da vila, então recém-criada. Trata-se de uma planta com sentido cartográfico, semelhante a ‘Portus Calvus’, tendo sido provavelmente elaborada pelo mesmo cartógrafo, que seria Marcgrave ou Golijath. Como Porto Calvo, a Vila de Madalena era composta de uma simples rua, com casas dos dois lados, margeando o Caminho do Conde, tendo em sua extremidade sul a igreja matriz e, do mesmo lado, mais adiante, um reduto defensivo. A vila e o caminho estavam assentados em um terreno estreito e elevado, ladeado por duas áreas mais baixas, tendo ao leste a Lagoa do Sul. Seria na época uma povoação ainda menor do que Porto Calvo, a julgar pelo número de habitações

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dirimindo dúvidas sobre a origem M

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assayó era o nome do engenho de açúcar do qual se originou a cidade. Antes disso, havia nas imediações do porto natural de Pajuçara um razoável movimento dos nativos caetés com os piratas franceses, que faziam a exploração do pau-brasil e escoavam o produto por ali. É possível que antes da descoberta do Brasil pelos portugueses o litoral alagoano já fosse conhecido por eles. No período anterior à invasão holandesa, lá pelos idos de 1609, havia perto da enseada das canoas indígenas uma casa de telha pertencente a Manoel Antonio Duro, a quem Diogo Soares, alcaide-mor de Santa Maria Madalena, doara uma sesmaria. Escritura pública de 1611 comprova a existência dessa casa dois anos antes, falando o documento em outro homem que lá se estabelecera antes legalmente, a quem o sesmeiro teria que respeitar caso a demarcação que seria feita alcançasse os limites do sítio. A sesmaria de Manuel Antonio Duro foi transferida em seguida para o capitão Apolinário Fernandes Padilha, antigo proprietário de terras em Maceió, que substituiu o sesmeiro na posse da terra. Após a expulsão dos holandeses, e da sangrenta guerra que assolou o território alagoano, pois éramos parte da capitania de Pernambuco, a Nova Lusitânia, a Coroa lusa decidiu prevenir-se de novas investidas estrangeiras, providenciando fortes militares em alguns pontos da colônia e assentando no hoje território maceioense as bases de seu povoamento. Como ordens reais expressas sem recursos não são cumpridas, o Forte do Porto de Jaraguá não saiu

D. João VI, soberano do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, de 1816 a 1822. Desde 1825 foi rei de Portugal, até sua morte, em 1826

do papel e o povoamento continuou sendo feito no interior, nas regiões da Mata Atlântica e do Rio São Francisco, onde os recursos naturais eram melhores e a vida menos perigosa, sem piratas a ameaçar. Entendemos a desolação de um antigo historiador ao dizer “nasceu espúria a cidade num páteo de um engenho colonial”, pois ao terminar o século XVIII a metrópole de hoje era apenas a casa-grande e a senzala de um engenho banguê, no local onde mais adiante foi construído o prédio do Tesouro Provincial, atual Praça Pedro II. E no lugar onde se encontra a catedral havia a capelinha do mesmo engenho, dedicada a São Gonçalo. Atrás dela descortinava-se a terra vermelha do antigo morro da Pólvora, onde se guardavam as munições, e igualmente foi construído o primeiro farol de Maceió, em 1851.

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O povoado inicial F

oi exatamente após o fim da guerra do açúcar, com a expulsão dos holandeses, que teve início o primeiro povoado de Maceió, através da construção do engenho que tomou emprestado o nome indígena dado ao território da restinga, plena de alagadiços. Certamente algum sesmeiro de Santa Luzia do Norte resolveu procurar novas terras e ampliar seus domínios, fundando um engenho de açúcar, a grande vedete da economia naquele momento. Ali, com o pequeno conjunto agroindustrial de nome silvícola, nasceria uma

poluído e quase inexistente regato de agora um paciente que está na Unidade de Terapia Intensiva sem oxigênio. Fornecia água potável para homens e animais, pesca para alimentação e mantinha em funcionamento os rudimentares aparelhos agrícolas e industriais. Os capitães Apolinário Fernandes Padilha e Gonçalo de Cerqueira, que não tomaram posse da sesmaria que lhes foi dada pela Corte, localizada entre as vilas de Madalena e Porto Calvo, preferiram instalar-se na área que foi doada a Manoel Antonio Duro, aquele da Porto da Levada, Maceió primitiva

modesta povoação em seu redor, célula-mãe da nossa capital. O nome do pequeno, mas robusto, riacho que banhava o sítio maceieoense, chamado pelos índios de Massayó, ou Maçai-ó-k - ou seja, “o que tapa o alagadiço”, explicação para a restinga onde os nossos avós caetés habitavam - hoje conhecido por Salgadinho, foi escolhido para denominar o engenho. Ele foi fundamental para a escolha do local, pois suas águas eram límpidas, nada semelhantes às do

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famosa casa de telhas de Jaraguá. O capitão Padilha pagou 64:00 réis por conta dos foros ao almoxarife Manoel Lopes de Santiago, conforme se lê na carta de doação, documento oficial comprobatório: “Apolinário Fernandes Padilha pagou por conta dos foros da sesmaria confronte 64: 00 ao Almoxarife Manoel Lopes Santiago, a quem se carregarão em dissipar dúvida é que puz esta verba em 4 de junho de 1716 – fl. da receita”.

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A padroeira e a transferência de São Gonçalo O

proprietário e sua mulher estabeleceram o patrimônio de Nossa Senhora dos Prazeres, nova invocação que substituiu a da antiga capelinha de São Gonçalo, santo de devoção do primeiro morador, que iria ser homenageado em outra igrejinha mais acima, onde ficava a antiga Casa da Pólvora. São Gonçalo do Amarante era um santo de grande devoção popular na época; foi arcebispo de Braga, em Portugal, e ficou famoso por sua pregação e vida de orações. O culto a Nossa Senhora dos Prazeres foi muito intenso durante as agruras da Guerra do Açúcar, na dominação holandesa, em toda a capitania, sendo a ela atribuída a vitória contra os invasores. É uma devoção muito antiga e foi trazida de Portugal, sendo forte no período colonial. Muito maceioense pergunta o porquê da denominação de sua padroeira. É que a mãe de Cristo foi assim intitulada para recordar as sete alegrias que teve em vida. Essa revelação teria sido passada a um frade franciscano muito devoto, que diariamente lhe presenteava com flores ao fazer sua reza matinal. São elas: a anunciação do anjo; a visita de sua prima Isabel; o nascimento de Jesus; o encontro do menino com os doutores no templo; a ressurreição de Jesus; a vinda do Espírito Santo; sua assunção e coroação como rainha do céu.

Nossa Senhora dos Prazeres (Catedral de Maceió)

São Gonçalo de Amarante

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As entrelinhas da escritura A

pós a morte do capitão Padilha, o tenente Antonio Fernandes Teixeira e sua mulher, Maria de Aguiar, promoveram um processo na Justiça contra a viúva de Padilha exigindo o sítio do Poço. Como não existe nenhum documento que ateste a posse, por qualquer motivo, desse “sítio do Poço”, como era conhecida toda a região do engenho, pelos demandantes Antonio Fernandes e sua esposa, e como eles foram vitoriosos na questão judicial, podemos concluir que o território em questão na verdade é a parte da sesmaria que pertencia ao capitão Gonçalo de Serqueira, que estava desaparecido nos autos, e que eles seriam seus descendentes e herdeiros legais. Outra escritura, desta feita em 25 de abril de 1787, dos bens do padre Antonio Ferreira da Costa em favor dos seus três afilhados Bento Ferreira, João Ferreira e Rita Maria da Boa Hora, consta “um creoulinho de nome Benedito, uma creoulinha de nome Nicácia, um creoulinho de nome Antonio, casas de telhas, uma capelinha e o sítio Massayó com todos os seus acessórios”. Craveiro Costa, em seu importante trabalho Maceió, nos informa que desse engenho original foram encontrados vestígios em 1850. O tempo apaga as lembranças e o primeiro morador permanece desconhecido, mas é possível que tenha sido alguém do burgo de Santa Luzia que veio buscar novas oportunidades em lugar tão promissor. E trouxe escravos, gado e haveres para seu empreendimento.

Marechal Deodoro - 1637-1645 (1647) ‘ALAGOA AD AUSTRVM’. autor: Frans Post. fonte: Gravura que ilustra o livro de Barlaeus (BARLAEUS - 1647), estampa nº 15. Exemplar pertencente à Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro. Trata-se de uma gravura, com base em um desenho de Frans Post, assinada por aquele artista, sobre um tronco de coqueiro, caído no lado esquerdo da parte inferior da imagem. A estampa traz uma legenda, que permite identificar na parte central a igreja na área fortificada (A), protegida com uma cerca de madeira e, nas proximidades, algumas casas. Sob a cerca de madeira é possível constatar a existência de um muro, uma espécie de cerca de faxina, isto é, construída com feixes de paus amarrados e terra socada. Na direção da igreja podemos observar a existência do que poderia ser uma porta de entrada para a área fortificada. O desenho deve ter sido tomado pelo lado sul, de sorte que não se pode ver a parte urbanizada. Comparando com a estampa denominada ‘Pagus Alagoae Australis’, pode-se perceber exatamente o ponto de vista do artista, que deixava à sua direita a lagoa, situando-se à margem do Caminho do Conde, em direção à vila. O artista assinala ainda, junto à lagoa, algumas casas de pescador e, à sua esquerda, alguns coqueiros. Em toda a sua modéstia, essa era por volta de 1640 a Vila de Santa Maria Madalena da Alagoa do Sul, atual cidade de Marechal Deodoro

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Entre jacutingas e araçás, uma restinga estratégica O

modesto povoado evoluiu para uma pequena vila, constituída em seguida por um conjunto de ruelas e habitações rústicas, com luxuriante cobertura vegetal e mata exuberante, cheia de pequenas cascatas como as que desciam da vizinhança do casarão onde funciona atualmente a Unidade IV do Centro Universitário Cesmac. O engenho e a ermida foram o núcleo do povoado que não pararia de crescer, alcançando outros planos, áreas e os locais mais distantes, tanto na orla lagunar como no tabuleiro onde abundavam os araçás e os jacutingas. Foi bastante difícil domar os terrenos extremamente pantanosos da restinga e os mangues da lagoa. O movimento comercial ia aumentando, servindo de confluência para a produção agrícola dos vales do Mundaú e do Paraíba, de São Miguel dos Campos e dos demais rios de açúcar cortados por dois grandes caminhos abertos ao acesso de penetração pelo sertão, com diversos e ricos centros açucareiros marginais a lhes procurar para escoar os produtos. Daí o mérito do Porto de Jaraguá, que definiria a sua importância como polo hegemônico da economia e da administração. Sendo necessário passar pelo povoado para ir ao porto, Maceió foi progredindo, ameaçando ultrapassar a tradicional Vila de Alagoas. A evolução foi penosa, mas persistente. Não se comparava aos burgos tradicionais como Pe-

nedo, Madalena, Porto Calvo, Santa Luzia, Anadia, Poxim e Passo de Camaragibe, mas não era difícil perceber que seu futuro seria promissor. Ano a ano as expectativas auspiciosas iam aumentando. Era por aqui que vinham morrer os árduos caminhos da parte sul da capitania pernambucana. Um lugar de passagem da Alagoas boreal para a Alagoas austral, que se tornava quase obrigatório. Como se fosse um novo caminho para as Índias, se assim se pudesse comparar. Uma rota imprescindível ditada não apenas por seu porto marítimo, mas pelas lagoas e estradas estratégicas. Estradas, não! Na verdade, trilhas, veredas indígenas e passagens naturais ou feitas com sacrifícios enormes pelos desbravadores a duras penas. Tantos as que serviam ao antigo engenho, depois desaparecido, como as que buscavam a Lagoa do Norte e o Vale do Mundaú, aquelas que margeavam o litoral, conduzindo a Madalena do Sul e as que vinham de Porto Calvo e povoações próximas, que delas iam se desgarrando ao alcançar autonomia. De um movimentado ponto de encontro entre caetés e franceses no início, e, antes ainda, de um Pindorama exclusivamente indígena para um reduzido burgo iniciado por um pequeno engenho e um povoado, uma história cheia de capítulos inusitados e fascinantes, que continua a ser escrita.

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O povoado se expande A

Antiga foto do Alto da Forca, 1920 (Porto Calvo)

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ligação mais forte era com Porto Calvo e Alagoas, nome que substituía a antiga Madalena. O credo reformado trazido para cá pelos calvinistas franceses e pelos holandeses no período de ocupação não acabou com a expulsão dos dois invasores. E no final do século XVIII, lá pelos idos de 1794, um pregador que veio de Pernambuco fez um registro sobre o pequeno burgo em expansão: “Habitada por vendilhões e pescadores, a pequena povoação de Maceió tinha no comércio sua maior atividade. Muita gente conduzindo madeiras para as praças, no que se ocupavam as embarcações que ali vinham, e também, com sacas e caixas de algum engenhos próximos”. Um lugar, portanto, onde o comércio era maior que a agricultura, dominante no resto do território. Mas Ipioca, que tinha vida independente e que hoje faz parte da cidade, fazia o contraponto da lavoura. Era a área eminentemente rural que não tinha nada a ver com a ambição cosmopolita do núcleo portuário mais ao sul.

Alguém já disse que as obras do acaso não existem. A sina de Maceió era desgarrar-se do arcabouço rural alagoano, ser urbana, dedicar--se ao comércio, às atividades de serviços e às mercantis. Cidade das águas e não da terra, onde o mar e a lagoa bosquejavam seus limites. Ledo Ivo, que não esquecia suas raízes, dizia que seu chão maternal era porto e porta. “Portas! Portas abertas, paraísos incertos”. Os navios da sua infância, que ele avistara na enseada de Pajuçara, continuaram seguindo o poeta por toda a vida. “Quando deixei Maceió, fechei a porta do mar e enxotei os navios que insistiam em me seguir. Tive de aninhar o vento nos corredores das casa brancas que guardam lacraias. Mas o mar me acompanhou até nos sonhos, igual ao dia azul que sustenta o mormaço.” É inquestionável que o pequeno Porto de Jaraguá foi peça de resistência do avanço da povoação, já que era ponto de passagem obrigatória. Era onde o som dos carros de bois rangendo, transportando açúcar, algodão, peles e madeiras procedentes do interior, competia com o silvo das embarcações que chegavam e saíam do ancoradouro de águas turmalinas. Os gêneros de exportação eram adquiridos por pessoas mais endinheiradas e revendidos aos veleiros, barcaças e navios que os levavam para Salvador e Recife. Algumas estradas que cortavam a localidade ajudavam no seu progresso. Não existiam ainda ruas propriamente ditas, mas vários sítios, que hoje são bairros importantes. Já eram conhecidos Poço, Bebedouro, Trapiche da Barra, Flexal e, claro, Jaraguá.

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Os sambaquis, Maceió antes dos índios M

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aceió, Alagoas e o Brasil são invenções recentes e, por isso, saber a história de nossos ancestrais indígenas, antes da chegada aqui dos colonizadores europeus, não é uma tarefa fácil. Eles não conheciam a escrita, mas deixaram vestígios em todos os recantos em que viveram. Os navegantes e suas famílias portuguesas não chegaram, portanto, a um território vazio. A terra alagoana atual, assim como o solo maceioense, era ocupada por uma população nativa que se dedicava à caça e principalmente à pesca, pois a região oferecia muitas opções para alimentação em suas águas marinhas, lacustres e fluviais. As pessoas também praticavam uma agricultura rudimentar e faziam seus próprios instrumentos de trabalho e de adorno. Os franceses, antes mesmo dos portugueses, trocavam presentes com os nativos que lhe retribuíam com o pau-brasil, com aves e animais e também com o seu artesanato. Muito antes dos caetés e seus colegas tupis, os nossos antepassados viviam e desfrutavam a grande variedade de alimentos que a natureza proporcionava. Nossos bisavós indígenas deixaram marcas que vão se apagando com a expansão imobiliária chegando a todos os pontos do litoral e da área rural. A pré-história é estudada através de todo vestígio arqueológico pertencente ao estágio precedente à sua consciência histórica: fósseis, sambaquis, inscrições rupestres,

Sambaquis - cascas de crustáceos característicos do sistema lagunar que une Maceió a Marechal Deodoro

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instrumentos de pedra etc. Há registro de vários sambaquis em Maceió, quase todos desaparecidos com a ocupação dos nossos sítios pelo crescimento da população. Mas ainda é possível encontrar alguns, como o da margem esquerda do Canal Grande de Dentro, Sítio Areias, no local denominado Caboclo, na área das nossas lagoas. Um sambaqui grande, um enorme amontoado de cascas de ostras, unha-de-velho, taioba e restos de cerâmica, colares e resíduos de carvão de fogueiras. Bem como um cemitério em Massagueira. No centro da capital já foram encontrados ossos de animais pré-históricos, quando das escavações no prédio de nº 55, numeração antiga, na Rua do Comércio, conforme atesta o Relatório dos Trabalhos de 1882, apresentado ao então Instituto Arqueológico e Geográfico Alagoano, hoje Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, pelo seu secretário perpétuo, o famoso estudioso João Francisco Dias Cabral. Ainda no ano de 1882 foi encontrada uma machadinha de diorito quando era aberto um poço na antiga Rua da Boa Vista, conforme informação da Revista nº 2 do citado Instituto, v. VI, 1915. É importante salientar as características do nosso complexo lagunar comunicado com o mar, que representa um ecossistema rico em recursos naturais de flora e fauna e que

foi, desde a pré-história e até os dias atuais, uma região de atrativos para as populações. Antes mesmo dos nossos avós caetés chegarem, nossos bisavós pré-históricos já tinham percebido isto há mais de um século. O que enfatizamos é que havia presença humana antes dos índios caetés, que aqui já estavam antes da chegada dos europeus e dos negros que vieram da África. Não há documentação escrita nem rastros salientes, mas os desconhecidos senhores do atual território maceioense começaram a construir os montes nos quais deixaram registrada sua passagem por aqui há muito tempo e são conhecidos pelos arqueólogos como sambaquieiros, ou construtores de sambaquis, que vem de samba=mariscos e ki= amontoado, em linguagem tupi. Na verdade, eles já eram um mistério para os índios que os sucederam. Quando os primeiros portugueses aqui chegaram, eles já tinham desaparecido havia mais de mil anos. Sabe-se, portanto, quase nada daqueles que um dia ergueram os montes feitos de conchas e restos de animais, utensílios e mesmo de sepultamentos. Viviam à beiramar, não tinham estresse nem impostos a pagar e se instalavam nas margens das lagoas e nas matas da encosta, o que lhes garantia comida o ano inteiro.

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A toponímia tupi de Maceió P

ajuçara, Pratagy, Jacarecica, Ypioca, Jacutinga, Mundaú, Manguaba, Guaxuma, Gulandim, Jatiúca, Sauaçuí. É tão forte a presença indígena na toponímia e na etimologia maceioense e, no entanto, nós nem associamos esses nomes às nossas raízes indígenas nem à herança que nossos ancestrais deixaram em vários campos de atividade. O português que o maceioense fala hoje adquiriu um toque especial por conta da linguagem tupi. E as palavras se tornaram mais simples, mais eufônicas, mais suaves... Proibida pelos jesuítas, pela administração portuguesa e pelas escolas, tachada de bárbara e menosprezada, a língua caeté, o tupi, continua sendo usada a larga até hoje. É uma relação imensa: mandacaru, abacaxi, sapé, mandioca, peroba, imbuia, imbu, maracujá, caju, jararaca, capivara, quati, sagui, caninana, sucuri, piranha, urubu, curió, sanhaço, sabiá, pitanga, pitu, pitomba, sapé, perereca, picuá, potó, tatu, taboca, preá, piracuera, sapucaia, seriema, saúva, sarará, tucano, teiú, tapioca, uçá, xexéu etc. Belos nomes a descrever não só geografia, flora e fauna, mas vocábulos usados em inúmeras situações. O estudo de Paulino Santiago Presença de Vovô Índio, o Tupi na Corografia Alagoana é uma preciosidade para o conhecimento da nossa linguagem.

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A rede e a jangada, vestígios de um legado esquecido O

nde estão os pedaços do nosso legado indígena? Quando passamos pela bela orla da nossa capital, vemos à venda nas lojas de artesanato a tradicional rede de dormir, que é uma herança dos nossos antepassados. Assim como os currais de peixes esquecidos e desativados da Jatiúca e as jangadas que levam às piscinas naturais. No Mercado Público ainda temos colheres de pau, esteiras de piripiri e palha de bananeira, samburás, caçuás, vassouras de piaçava, adereços, tabocas, balaios, covos. O sururu, recentemente elevado à categoria de patrimônio imaterial, é uma das heranças da arte culinária de nosso avós, embora sem o leite de coco, que é uma contribuição africana. Os produtos à margem da estrada em Riacho Doce são beijus, tapiocas e outros quitutes de nossa culinária mestiça. Os pontos das ervas no comércio e nas feiras populares mostram uma rica variedade da medicina indígena. O passado deixa vestígios próprios, mesmo que não sejam entendidos nem usados como material para a história. A cidade moderna, uma das capitais mais visitadas pelos turistas no Brasil, é um lugar onde tem tudo que a sociedade de consumo oferece. Mas embaixo dessa Maceió industrial e urbana, construída sobre o asfalto e o plástico, existe outra cidade, que mistura contribuições remotas, numa urdidura de atores que desapareceram, mas que estão bem vivos através de sua herança em vários espaços do cotidiano.

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Curral de peixe, parte da cultura de pesca dos índios que habitavam nosso litoral

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Elevação à Vila Capítulo II

Uma cidade em gestação num país nascente

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o ocaso do período colonial, a antiga restinga habitada pelos índios caetés ampliava os limites do alagadiço, conservava seus sítios rurais, mas despontava forte seu núcleo urbano centrado nas proximidades do porto. A povoação já era um pequeno centro comercial, servindo a uma larga área de lavoura estendida pelos vales do Paraíba e do Mundaú. Instalada no Rio de Janeiro, a corte lusa acumulava poder e problemas. O estandarte do outrora rico império dos grandes navegantes, após sua transferência para o Brasil é o do Reino Unido: Portugal e sua colônia americana e Algarves. O ano de 1815 é de grandes decisões. A Europa se reorganiza após a derrota de Napoleão e os portugueses e as outras nações europeias cobram o retorno da corte para Lisboa. Ainda há os problemas de dom João VI não ser rei de direito, pois sua mãe, dona Maria, a Louca, continua viva, e dona Carlota Joaquina, sua esposa, não desiste de conspirar em favor de seu país de origem, a Espanha. O Brasil é enorme como as suas dificuldades, e subversivas ideias separatistas, mesmo iniciantes não param de ser comentadas.

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Cofre da Tesouraria Geral da Fazenda da antiga cidade de Alagoas (atual Marechal Deodoro) capital da antiga Província, transferida pela Lei nº 11, de 9 de dezembro de 1839, sancionada pelo presidente da província, Agostinho da Silva Neves, para a Vila de Maceió

Entre as muitas questões decisórias de âmbitos internacional e nacional que importunavam o monarca, existiam inúmeras demandas locais e provincianas. Uma delas marcaria para sempre a vida de Maceió. Naquele agitado fim de ano de 1815, dom João VI assinou grande quantidade de papéis oficiais e, dentre esses, juntou num mesmo alvará régio a elevação à categoria de vila de duas povoações alagoanas: Maceió e Porto de Pedras. Quem diria! O pequeno burgo dos alagadiços tinha a deusa fortuna a protegê-lo desde o início. Seu destino era ser grande.

O ouvidor Batalha, que liderou o movimento a favor de sua elevação, tinha vencido. Seus partidários festejaram. Maceió adquiriu autonomia, era agora independente. O próprio Batalha, homem de posses e funcionário real, doou um sobrado para ser a sede da Câmara da nova vila. O gesto era indispensável, pois a instalação oficial e o gozo efetivo do novo status administrativo só se daria quando estivessem prontos o pelourinho, a cadeia, as oficinas necessárias e, principalmente, a casa da Legislativo. E a corte deixava essas providências para a população reivindicante. 33

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O Alvará Régio e a primeira Câmara N

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ão houve dificuldades para atender a exigência. Os habitantes, felizes com o sucesso do seu pleito, não se omitiram e disputaram o que consideraram um privilégio. A casa para servir da cadeia foi doada por José Elias Pereira, uma das lideranças do movimento, que também cedeu o seu sobrado do pátio da capela para o funcionamento do Parlamento, sobrado que só foi demolido em 1938. Já Antonio Firmiano Braga encarregou-se da construção do pelourinho, que era uma coluna de pedra, ou madeira, colocada em lugar público central, onde eram feitas as comunicações oficiais ou afixados atos do governo, e servia também para castigar os criminosos. Um verdadeiro símbolo de autoridade e da autonomia local, livre das amarras que durante séculos a unira à vila de Alagoas, a antiga Madalena do Sul. Com todas as pompas e devidamente organizada, a vila foi instalada no dia 29 de dezembro de 1816, um ano, portanto, após sua elevação oficial pelo rei de Portugal, Brasil e Algarve. A solenidade foi presidida pelo ouvidor Batalha, que fez no dia seguinte a composição da primeira câmara legislativa da nova vila, tomando posse os eleitos no dia 1º de janeiro de 1817. Assim, naquele ano igualmente de tanta turbulência, com a Revolução Pernambucana sendo deflagrada visando a separação do Brasil de Portugal, Alagoas alcançava sua autonomia, separando-se de Pernambuco e tendo o mesmo Batalha como liderança principal do movimento. Ele discursou ao pé do pelourinho, realçando a benevolência do soberano para com Maceió e fazendo a habitual ovação a el-rei, no que foi acompanhado pelos presentes. O povo seguia as aclamações, os

discursos pomposos, sem entender totalmente o que significavam, mas aderia à vibração, aos tiros de salva, ao toque dos tambores, ao repique dos sinos e às congratulações dos dirigentes. Ninguém escapava do clima de alegria pela auspiciosa elevação da sua urbe. Entre outras coisas, o Alvará Régio registrado na Secretaria do Desembargo do Paço do Reino do Brasil dizia: “Eu, o Príncipe Regente, faço saber aos que este alvará, com Força de Lei, virem: que subindo à minha Real Presença em consulta da mesa do Desembargo do Paço com audiência do Procurador de minha real coroa decido crear na Villa de Penedo, Comarca das Alagoas, hum lugar de Juiz de Fora de Civel, Crime e Orphãos com o mesmo Ordenado, Aposentadoria e Propina, que vence o Juiz de Fora de Recife, Pernambuco. E he outrossim servido erigir em Villas as povoações de Maceió e Porto de Pedras, nomeando para cada huma dellas os Officios respectivos, e Deferindo os Termos que lhes hão de pertencer, tudo na forma nesta declarada”. Em 17 de janeiro de 1816 outro Alvará Régio estabelecia os limites das duas vilas recém-criadas e autorizava para cada uma delas dois juízes Ordinários, um de órfãos, três vereadores, um procurador da Câmara, um tesoureiro, dois almotacés, um alcaide como escrivão do seu arrogo e dois tabeliães, do Público e de Notas. A vila de Porto das Pedras teria por termo todo território que existe aquém do Rio Manguaba e até o Rio Santo Antonio Grande. Já Maceió teria como limite a Barra das Alagoas e daí até os rios Santo Antonio Grande e Mundaú, ou Paripueira exclusivamente, que ficava desmembrada da vila de Porto das Pedras.

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Póvoas queria Maceió como capital Bandeira do Reino Unido do Brasil, Portugal e Algarve

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ovo fato marcante acontece em 16 de setembro de 1817: Alagoas torna-se independente da capitania de Pernambuco. É agora senhora de seu próprio destino. Os integrantes da Câmara de Maceió apoiaram o movimento de emancipação, solicitando a dom João VI a separação e defendendo-a sem hesitações. A nova vila começava a participar ativamente da vida política da recente província brasileira. E para dirigi-la, o soberano nomeou o seu primeiro mandatário, um homem bem ilustrado e fidalgo da Casa Real, Sebastião Francisco de Melo e Póvoas, neto do famoso marquês de Pombal, cavaleiro da Torre e comendador da Ordem de Cristo que tinha dirigido com sucesso a capitania do Rio Grande do Norte. Ao di-

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rigir-se para tomar posse de seu posto na capital da nova província, Alagoas do Sul, deu-se o inesperado. Saindo do Rio de Janeiro, e antes de chegar ao seu destino na antiga Madalena, ele decidiu primeiro conhecer Maceió, o que aconteceu no dia 27 de dezembro de 1818. Sua chegada foi cercada de grande alvoroço, pois, ao primeiro sinal de aproximação do seu veleiro, o mundo oficial e a população acorreram ao porto para esperar a autoridade maior da capitania. Um acontecimento sem precedentes, do desembarque ao paço da Câmara, onde ficou hospedado. Não veio de carruagem, pois não havia nenhuma disponível na pequena povoação, até então longe das primícias oficiais e das benesses

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protocolares, mas de carro de boi, que era o meio de transporte usado na vila. Pudera! Uma visita ilustre, feita de forma tão inesperada, tinha que se adequar às reais condições da vila, sem camuflar a realidade! É fato que Melo e Póvoas, que relutara em aceitar o cargo, pois preferia permanecer no Rio de Janeiro, na intimidade da Corte, tomou-se de grande simpatia pela vila nascente. Após passar por Jaraguá, ainda não delineada pelos seus armazéns, chegou à Boca de Maceió, lugar de morada e negócios no varejo, e vislumbrou, no que seria mais tarde o centro do comércio, uma espécie de marco zero da povoação e lamentou que a elevação à categoria de vila tivesse sido apenas três anos antes, pois ela era o lugar ideal para sediar a capital da nova província. Até parece que Póvoas, homem erudito e experiente, não desceu por acaso em Maceió, antes de tomar posse em Alagoas do Sul. Deveria possuir informações da localização estratégica da vila e do seu porto. As habitações rústicas e o conjunto de ruelas tortuosas, com a mata bordejando o casario colonial, não deixaram o primeiro mandatário decepcionado. Ele conhecia bem o mundo português no Brasil. Dirigira outra província, a norte-riograndense, e visitara outras unidades provinciais. O povoado que o Engenho Maçayó formara

à beira-mar, segundo Craveiro Costa, “já tinha bem fundado o seu desenvolvimento social, a sua prosperidade econômica e a sua organização política. Contrariamente ao que sucedera a outros burgos, o engenho que o fizera nascer, não chegara a imprimir-lhe os traços do feudalismo, isolando-o no latifúndio, e repousando exclusivamente no trabalho escravo os encargos da vida industrial e da vida econômica. Aqui o povoado vencera o engenho, expulsando-o para construir o comércio, varrendo do litoral os magnatas da terra e da escravidão”. Doce ilusão do autor do formidável Maceió! A conta a ser paga pela vila comercial viria de forma inexorável nos anos que sucederam o período imperial e chegaria até os anos republicanos. Se na economia avultaram os empreendedores que laboravam em variados setores da economia; por outro lado, o predomínio da vida política da província e do futuro estado seria preponderantemente da era colonial, até os dias atuais, açambarcado pela elite do açúcar, atingindo todos os poderes. E a promissora vila que se tornaria uma metrópole receberia todo o legado da decadência do engenho e da sua sucessora, a usina, um escoadouro de sua população desassistida que iria formar um enorme cinturão de favelas em seu redor, com todas as demandas sociais, de cidadania, não atendidas.

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Uma vila com vocação mercantil O

gesto de Póvoas, descendo primeiro em Maceió e aqui permanecendo por vários dias, não escapou do olhar sagaz dos políticos e outras lideranças locais. A Câmara reunida em 9 de janeiro de 1819 fez um apelo veemente para que ele permanecesse e fixasse residência e a sede do governo. Um arrazoado justificava o pleito, evidenciando principalmente o movimento comercial, as vantagens do porto, de melhor calado que o de Alagoas e muito mais defensável. O dirigente, experiente no trato da administração e da política, percebeu que uma atitude brusca naquele momento poderia gerar férrea resistência dos alagoenses, provavelmente lutas, e comprometeria definitivamente sua autoridade já no início da gestão. Uma ruptura traumática que se confirmaria em 1839. Ele optou por uma decisão salomônica. Comunicou que a sede do governo ficaria oficialmente na vila de Alagoas e que sua residência seria onde se fizesse necessária a operacionalidade administrativa e a defesa da capitania. Tomou posse na igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição, escolheu o quadro de seus auxiliares com o ouvidor Batalha à frente. Organizou a estrutura governamental, Junta de Arrecadação, Comando das Armas, Justiça etc. Pediu sugestões para seu plano de trabalhos e pareceres sobre as vantagens e desvantagens das duas vilas para sediar a sede do governo, eximindo-se de responsabilidades futuras na escolha de sua predileção. Vieira Perdigão, alto funcionário da Fazenda, deu parecer favorável a Maceió por várias razões, inclusive pela sua privilegiada localização em relação a outras regiões e vilas da capitania.

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Outro auxiliar opinava pela permanência na vila lacustre, sugerindo a abertura de um canal que a ligasse ao Porto do Francês. Mas o parecer mais forte foi mesmo o do ouvidor Batalha, optando por Maceió “que domina o melhor porto da Capitania e que oferece comodidades para o commércio que lhe dera ser”. A disputa, na verdade, interessava não só às duas vilas; Penedo e Anadia e outras não escondiam o próprio interesse. Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho e Melo, primeiro conde de Oeiras (Lisboa, 13 de maio de 1699 – Pombal, 8 de maio de 1782) foi um diplomata e estadista português, secretário de Estado durante o reinado de D. José I (1750-1777)

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Entendemos que a consulta dos pareceres solicitados faziam parte da habilidade de Póvoas para não ofender os alagoenses, mas sua intenção já era a de instalar na vila de Maceió “o lugar mais adequado que poderia ser a capita”. Mudou-se para cá e tratou de criar as repartições necessárias. De 1819 a 1822 fez um verdadeiro rush de realizações para consolidar a recém-criada capitania. Criou a Casa de Arrecadação e a Inspeção de Açúcar e Algodão em São Miguel dos Campos; Alfândega em Jaraguá e Penedo; estabeleceu Mesas de Consulados nessas cidades; criou duas companhias de soldados, uma de infantaria e uma de artilharia, e iniciou um quartel no atual QG da Polícia Militar com a construção de dois pequenos fortes, o de São Pedro, em Jaraguá, onde era a antiga Escola de Marinheiros, e o Forte São João, inaugurado em 1820 nos areais em frente à barra do riacho Maçayó. Póvoas iniciou um estaleiro na enseada de Pajuçara e a construção de uma embarcação que recebeu o nome de Corveta Maceió. Como se observa, a antiga vila foi a grande beneficiada com a gestão do primeiro governador. Melo e Póvoas propôs ainda a divisão da capitania em duas comarcas - a do Sul, com

sede em Alagoas, compreendendo Penedo e outras povoações, e a segunda em Maceió, englobando Atalaia, Porto Calvo, Porto de Pedras e mais alguns povoados. A população de Alagoas, no entanto, não viu com bons olhos os atos do mandatário e a Câmara da vila negou o pedido e pleiteou que a Alfândega e a Casa da Arrecadação fossem transferidas do Porto de Jaraguá para o do Francês. Este foi fechado à navegação irregular pelo governador, que, em seguida, abriu estradas e contornou uma crise que poderia ter resultados negativos para el-rei, que já era assolado com ameaças de insurreições libertárias em vários pontos do país. Aqui era o início de longo processo de disputa entre as duas vilas, que redundaria na crise de 1839. Não foram poucos os protestos da vila de Alagoas exigindo a presença de Melo e Póvoas, e acusando-o de favorecer Maceió. A reclamação chegou a ser enviada ao rei, mas Póvoas, com habilidade, contornou a crise. Os altos funcionários que deram o parecer favorável aos atos do governador passaram a ser mal vistos e hostilizados em Alagoas do Sul por atentarem contra a hegemonia da vila como cabeça de comarca.

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A reação dos comerciantes A

lagoas do Sul não se conformara totalmente com a situação criada. Embora amainada com a ação diplomática de Melo e Póvoas, o fogo do desgosto continuaria vivo por muitos anos. Como aceitar a recusa de suas condições topográficas para sede das repartições fiscais e aceitá-las em uma vila sem história nem tradição, constituída de mercadores gananciosos como Maceió? Era um esbulho do seu direito. Famílias ilustres, proprietários de terra, senhores de engenho e políticos alimentavam a insatisfação. A mudança da Alfândega para o porto do Francês ganhou a adesão até de outras Câmaras, como a de Poxim. O governo imperial não atendeu às solicitações. Melo e Póvoas terminou seu ciclo com brilho. Por decreto das Cortes, em 21 de setembro de 1821 retirou-se para a terra natal, Portugal, concluindo sua missão com sucesso para a província das Alagoas, e sobretudo para Maceió, para cujo progresso social e material deu extraordinária contribuição. Segundo Craveiro Costa, “Foi um administrador esclarecido e realizador. Lançou os fundamentos da administração pública na província, atendeu as suas necessidades, sugeriu medidas de maior utilidade, e quando as lutas pela Independência começaram a inflamar a população, houve-se com habilidade e com raríssimo tino, mantendo a ordem pública, sem compressão do espírito de liberdade. Retirou-se em paz, benquisto e de mãos limpas o parente de Pombal”. Teve a apoiá-lo fortemente no episódio que causou tantas amarguras aos alagoenses os cada vez mais influentes integrantes

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da classe comercial. Os interesses destes com os da classe agrária, da lavoura, não eram mais harmônicos. Havia divergências. A abertura dos portos às nações por dom João VI e a onda dominante da Revolução Comercial e da industrialização acentuaram a divisão de interesses. As questões do Porto de Jaraguá versus o do Francês; da autonomia das relações comerciais com relação a Bahia e Pernambuco, intermediários da colocação dos nossos produtos no estrangeiro; os abastecedores de gêneros necessários ao trabalho, à vida, ao conforto nas Alagoas, por intermédio de suas praças; a transferência das repartições fiscais para Maceió e o direito de nela se pagar os tributos exigidos, cavaram um fosso entre os dois setores. A burguesia nascente e o interesse maior da classe mercantil a faziam reagir às pressões.

Porto de Maceió, com passadilho de acesso, diferencial que contribuiu para a destinação da antiga vila a capital

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Os principais comerciantes maceioenses eram portugueses. Suas relações vinham desde o início, seja por meio de navegação direta ou por intermédio dos portos de Recife e Salvador. A Grã-Bretanha, cuja preeminência comercial no mundo era cada vez mais forte, chegava aqui após o ato de abertura dos portos. Assim como os negociantes portugueses, uma representação de grande atuação se fazia sentir. Uma colônia inglesa passara a ser notada por sua rique-

za e poder. O Cemitério dos Ingleses ficava entre Jaraguá e o centro, além de uma igreja anglicana para o culto. As legações portuguesa e britânica já ocupavam a zona do porto. Era um contraponto à pressão dos proprietários rurais do burgo lacustre. Uma vida agitada, de compra e venda intensa, de horários e regras, um mundo diferente da vida patriarcal pachorrenta das casas-grandes e dos casarões senhoriais da nobreza rural.

Penedo - District maps from the Atlas do Império do Brasil by Candido Mendes de Almeida in 1868

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A planta de Mornay e um destino manifesto U

ma planta baixa de Jaraguá desenhada pelo engenheiro Carlos Mornay para o governo, em 1841, mostra um bairro com 160 construções e um progresso acentuado desde a elevação. Nela está a bateria de São Pedro, lugar da antiga fortaleza, duas pontes de trapiches, a igreja N.Sra. da Conceição, na Pajuçara, a igreja N. Sra. Mãe do Povo, a antiga, a atual Avenida da Paz, o Cemitério dos Ingleses e as primeira e segunda pontes ligando Jaraguá ao centro. Veem-se ainda armazéns, trapiches, casa comerciais e outros prédios “sem nenhuma ligação com os fundos através de becos e ruas, até a Rua da Alfândega”, atual Sá e Albuquerque. O documento mostra como Jaraguá e Maceió, em pouco menos de duas décadas, desde a autonomia e a independência, se desenvolveram. Póvoas acertou em apostar na vila. Sua chegada, mais as consequências econômicas da independência em 1822, do aumento da exportação de açúcar, algodão e fumo para os portos da Europa, melhoraram significativamente o burgo comercial que não se detinha em seu destino manifesto de liderar a província. É um mapa urbano em expansão que não se deteve no sopé do monte onde ficava a igreja de Nossa Senhora dos Prazeres. O Largo do Pelourinho, as tortuosidades do Brejo do Olho d’Água, também conhecido como Lagoa Manuel Fernandes ou Lagoa da Água Negra, o riacho Maçayó, a Boca de

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Maçayó, mangue, brejo, pântano conquistado, saneado, estendendo-se da Praça Sinimbu à Rua Pontes de Miranda, indo até a Enfermaria Militar. Onde Melo e Póvoas tinha erguido o Forte São João, em 1820. Por uma ponte passava ali o trem de ferro que fazia o transporte de cargas e passageiros no trecho Jaraguá-Centro-Trapiche da Barra e também os bondes de tração animal. Craveiro Costa descreve com minúcias a Maceió os primeiros tempos imperiais. “Atravessava a estiva, entrava-se na rua da estrada do Poço (Pontes de Miranda), com poucas casas, predominando as cobertas de palha. Quatro ladeiras ligavam a estrada do Poço ao centro, a da Rua nova, do Comércio, à do Calabouço e da Catedral.”

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A principal via, a do Comércio, sinuosa e longa, possuía curvas para deixar livre o intenso trânsito dos carros de bois que vinham do interior. A planta da cidade daqueles tempos menciona nomes conhecidos e poéticos: Rua da Ladeira, Cambona do Machado, Boa Vista, Rua do Rosário, em homenagem à capela levantada e mantida pelos escravos; que se transformou na bela igreja de nossos dias; Rua da Rosa (Livramento), Rua da Boa Vista (paralela à Rua do Comércio, prolongando-se até a Rua da Lama); Rua do Alecrim, entre a Melo Morais e Praça Deodoro, hoje Barão de Alagoas; Rua do Ferreiro, Melo Morais de hoje; Beco do Padre Francisco, mais conhecido por Beco das Pedras; Praça da Contiguiba, Praça Deodoro atual; Rua da Contiguiba, que levava à Lagoa do Reguinho. Não há dúvidas de que Melo e Póvoas foi um grande planejador urbano. Uma pena que seus sucessores, alcaides, intendentes e prefeitos, não tivessem seguido o seu exemplo. Com os povoados ribeirinhos e sua arqui-rival, a vila das Alagoas, Maceió tinha comunicação lacustre através de canoas, sendo o Trapiche da Barra o entreposto de toda movimentação. Nos idos de 1840 abriu-se o Canal da Levada para melhorar o trânsito e as ligações comerciais com a Lagoa do Norte. Escunas, barcaças, brigues e sumacas transitavam entre Maceió e as capitanias da Bahia e Pernambuco, principais praças abastecedoras, e deixavam mais fácil a ligação com outros centros e a capital do Império. Estradas terrestres eram difíceis e morosas. Duas principais, a do Norte, que levava a Porto Calvo, e a do Sul, que seguia o curso do Mundaú, ramificavam-se em várias outras à medida que novos centros de produção iam surgindo.

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Sociedade urbana com essência patriarcal A

os domingos e dias santos, nas novenas e tríduos, nas festas, como na aclamação de dom Pedro, multidões acorriam dos vilarejos, sítios e engenhos para as igrejas. Senhoras ricas vestidas de tecidos caros, saias de panos enormes, cobertas de toda espécie de joias de ouro, chegavam com imenso e folclórico séquito - agregados, mucamas, escravos-, com o pater família à frente, simbolizando o poder e a autoridade. Grande parte da população - formada da nascente burguesia, classe média, funcionários, militares, pequenos comerciantes, posseiros, lavradores independentes, meeiros e artesãos -, comprimida, acotovelada, procurava alcançar no santuário um espaço mínimo para, na ponta dos pés, acompanhar a solenidade religiosa. Era momento raro de igualdade que a fé proporcionava, ma non troppo, já que a distinção de classe exigia lugares de conforto nas igrejas e as cadeiras eram destinados a poucos. E na imperdível leitura de Maceió, Craveiro Costa continua a descrição: “Vinham cavaleiros dos arredores, montados com aparato, arreios de prata, seguido de pajens, apeando-se a distância, fazendo tinir as rosetas das esporas, enquanto os almofadinhas da época demoravam pelo pátio, mais a espera das namoradas que da missa”. Espetáculos especiais eram comemorados pelo poder público quando necessários, festões não eram muitos. Só em datas especiais, sujeitos a Te Deum e ação de graças, discursos e procissões, mostrando a união entre a Igreja e o poder político. Praças ainda não existiam, só depois elas apareceram.

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Não se pode esquecer que a classe mais abastada era minoria. As ruas e vielas que iam surgindo não eram só de sobrados, sobradões ou casas bem construídas. Reproduzindo a imensa desigualdade, uma sociedade marcada por uma hierarquia social rígida, havia a Maceió das choupanas, cobertas de palha de ouricuri ou palha de coqueiro, onde as pessoas faziam biscates e procuravam sobreviver da pesca, do sururu, da coleta de frutos, da caça de animais que ainda se encontravam com facilidade nas matas que circundavam a vila, e a da grande população de escravos, indispensáveis ao funcionamento da economia, sem os quais a vida da província seria impensável. Na vila florescente, vocacionada para o comércio, que deu o prumo para a urbanização alagoana, os encargos da vida doméstica e do ganho nas ruas com a venda de refrescos, doces e frutas melhoravam a renda dos senhores nos casarões de Maceió.

Armazém de açúcar em Jaraguá

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A luta pela independência e a lusofobia Q

uando da emancipação política de Alagoas, em 1817, Maceió não tinha a importância de Alagoas do Sul e de outras cidades como Penedo e Porto Calvo, mas já se faziam notar o seu florescimento e o destino manifesto. Nos embates que se seguiram à independência do Brasil, em 1822, o ousado burgo já mostrava a sua vocação inovadora e irredenta. Sua manifestação em favor da autonomia nacional a diferenciava da maioria das vilas acomodadas e refratárias a mudanças. Foi contundente. A situação não amainou com o governo do filho de dom João VI. Os portugueses e seus aliados foram objetos de hostilidades, não tiveram tréguas. A tensão continuou mesmo depois da separação e da autonomia. Acompanhava-se o clima de instabilidade do país. Em 1831, após a abdicação do imperador Pedro I, preocupados os maceioenses com a possibilidade do Brasil retornar à condição de colônia, não pouparam acusações aos luso, influentes no comércio, na agricultura e em outros setores. Discutem-se inflamadamente nas esquinas, nas casas. O rastilho se propaga. O nacionalismo é um sentimento bom, mas exacerbado é perigoso. Uma multidão revoltada ataca um quartel de artilharia, apoderando-se de todo as armas e munições.

Aspecto, em 1869, do local onde está hoje a Praça dos Palmares, tendo ao lado sobrado do barão de Jaraguá, que foi palácio do governo durante muitos anos

Liderando a população, o padre Francisco Badaia Rego, conhecido por sua rebeldia política, incendiário diretor e redator do jornal O Federalista Alagoense. A sublevação conseguiu contagiar outras vilas. Maceió inicia a sua sina de condutora do processo político alagoano. As manifestações foram intensas em Maceió. Verdadeira lusofobia. Episódios tristes de perseguição, ferimentos e mortes. Exigia-se a demissão e a retirada de todos os portugueses das terras alagoanas. Estes procuravam abrigos em suas casas, trancavam-se, buscavam refúgio nas igrejas e nas matas. Um templo de Jaraguá foi palco de lamentáveis acontecimentos, como no trágico episódio que ficou conhecido como “mata-marinheiro”. Marinheiro era o apelido dos portugueses.

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Transferência da capital e mudança do cofre O

episódio central, o mais importante da história de Maceió, é inquestionavelmente o da transferência da capital, ou da mudança do cofre. Tem tudo para um enredo de novela ou romance histórico: rivalidade entre cidades, disputas entre personalidades políticas, intriga, lances passionais, traições, manobras, estratégias etc. Em 1839 Maceió já concentrava os negócios de uma autêntica capital. Centralizava a economia e abrigava os bastidores da política. A ideia de ser oficializada como capital de direito não era novidade, e a cada dia um novo passo era dado nessa direção, agravando uma situação insustentável. Desde a separação da capitania de Pernambuco, em 1817, o natural seria a consolida-

ção de Alagoas do Sul, hoje Marechal Deodoro, como sede administrativa, política, militar, judiciária e religiosa. Desde o incremento das atividades comerciais da província, do aumento do interesse pelo intercâmbio por parte de países europeus industrializados com a Inglaterra capitaneando esse movimento, as condições mudaram. O ano de 1818 marcou esse momento. E a gestão de Melo e Póvoas foi emblemática. Havia agora um olhar enamorado por uma vila noviça, que dispunha de um excelente porto natural e que daria um impulso maior à importação/exportação de produtos. Houve até um movimento da Câmara de Alagoas e pressão junto à Corte do Rio de Janeiro tentando impedir a Casario do final do século XIX

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mudança de alguns órgãos, como a Tesouraria da Fazenda, para o burgo mercantil. Póvoas, homem erudito e de visão estratégica, enxergou logo as vantagens que o pequeno povoado portuário oferecia em relação à tradicional vila lacustre. Vantagens em termos de topografia e arrecadação. As instalações fiscais foram transferidas, mas todas as outras e a capital continuaram lá. Sem querer uma ruptura naquele instante, habilmente ele preparou os primeiros passos para uma mudança no futuro e ficou administrando daqui até as proclamações das Cortes portuguesas, em 1821. A interdição do Porto do Francês tornou a vila velha dependente economicamente da nova. Dificuldades topográficas e controle fiscal agravaram a situação. A ampliação do comércio internacional e o forte prestígio dos setores ligados à exportação, de ingleses e portugueses, exigiam uma mudança de rumo para fazer face ao incremento da economia. A guerra pela mudança da capital é o grande assunto nos salões da elite em 1839. Nas ruas das duas vilas o tema das conversas também é um só. E as futricas corriam soltas. Em 1839, quando exercia a presidência da província Agostinho da Silva Neves, houve o impasse e a eclosão da crise anunciada que vinha se arrastando havia anos. O presidente decidiu oficializar a mudança e deixar de vez a situação ambígua. Maceió seria a capital de fato e de direito. Nos bastidores a teia política ia sendo fechada. Agostinho foi aprisionado no Palácio Provincial após uma rebelião encabeçada pelo pai de Deodoro, então comandante

das armas, e Tavares Bastos, pai do famoso filósofo e político. O presidente, forçado a renunciar, foi embarcado no Porto do Francês para o Rio de Janeiro sob escolta. Um verdadeiro conflito foi instalado, com a participação de várias vilas e freguesias de Alagoas. Os contingentes se dividiram. Mas a rebelião, condenada pela Corte, não queria incentivar movimentos semelhantes em outros pontos do reino. Sinimbu, vice-presidente, foi convocado pelos rebeldes para assumir o cargo vago com a saída forçada do titular. Os Tavares Bastos e os Fonseca eram famílias provinciais influentes. Os revoltosos sentiram o seu isolamento com a decisão firme da Corte real em apoiar os legalistas. Sinimbu, apesar de moço, deu mostras de ser um estrategista político. Reuniu as lideranças pró-mudança. Tomou posse do cargo em Maceió, mandou interceptar o patacho Dois Amigos que conduzia preso Agostinho da Silva Neves e o trouxe para o Porto de Jaraguá, reempossando-o no cargo. As tropas que marcharam sobre a velha Alagoas assumiram o controle, prendendo os revoltosos. Em 9 de dezembro, a Resolução Provincial nº 11, encerrava de vez a interminável controvérsia: Maceió era de fato e de direito a capital da província. O bilhete de Sinimbu, na condição de presidente em exercício, ao comandante do navio, advertindo sobre a afronta feita ao imperador, ordenando prestar as honras devidas ao dirigente preso e desembarcá-lo imediatamente em Maceió, é o final de um enredo digno de romance ou filme de aventuras.

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A família de Tavares Bastos continuou na política em eterna rivalidade com o clã Sinimbu. Um de seus filhos foi ministro do Tribunal Superior, no Sul, e o outro Aureliano Cândido, foi um dos maiores pensadores do país. Já o clã dos Fonseca amargou dias piores, dada a condição de Manoel como militar. Ele foi preso por muito tempo, respondeu a processo, mandou buscar

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sua numerosa prole para ficar junto dele no cárcere. Sete dos seus filhos foram matriculados na Escola Militar, seguiram carreira, viraram heróis na Guerra do Paraguai e um deles, pela ironia do destino também Manoel, foi o proclamador da República em 1889, acabando com o regime monárquico que causou o exílio de sua família do espaço da terra natal.

Maceió na primeira metade do século XX

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Maceió torna-se a Capital Capítulo III

M O PERÍODO IMPERIAL

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aceió finalmente tornara-se capital, em 1839. Mas as sequelas da transferência permaneceram por muitos anos. Na metade daquela centúria Alagoas já se encontrava com seu espaço territorial definido e acompanhava a consolidação do governo do imperador dom Pedro II e a internacionalização do país, sob a preponderância inglesa. Abrandou o ímpeto das ideias secessionistas como as de Pernambuco, Pará e Rio Grande do Sul, mas o fermento das insatisfações e de fantasmas políticos e sociais como república e abolição não iria baixar totalmente. Diferenciando-se da maior parte das vilas e cidades do interior, só rivalizando com Penedo, portadora também de um porto agitado e de uma vida urbana iniciante, a jovem capital alagoana, mais do que qualquer outro burgo, participa dos acontecimentos vinculados ao aparecimento de companhias estrangeiras e das modificações da economia e dos hábitos. O contexto urbano de Maceió se desenha a partir da segunda metade do século XIX, quando recebe em vários setores os beneficiamentos dessa modernização. É o tempo do trem urbano, da ligação com as outras províncias através da navegação a vapor, da iluminação a gás, da construção de palacetes no meio dos sítios e arrabaldes, das primeiras indústrias têxteis, do telefone, do jornal diário, da cerveja, do chá das cinco, do guarda-chuva e do guarda-sol, das meias finas, do impulso do cristianismo reformado, das escolas públicas, do paletó, do chapéu panamá, da organização do comércio e tantas outras coisas.

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Paisagem urbana de Maceió em seus primórdios

Caio Prado Júnior diz que foi nessa época que tomamos conhecimento do que era o progresso moderno, riqueza e bem-estar material. Rigidamente subordinados ao sistema imperial que nos mandava seus representantes para presidir a província, numa rotatividade que ensejava descontinuidade administrativa e insatisfação na população, pois os recursos arrecadados não atendiam as necessidades fundamentais, era em Maceió que o desagrado era mais notado. Reclamava-se da utilização de verbas para sustentar a corte do Rio de Janeiro e sua feérica iluminação; para prover as guerras contra o Paraguai, o Uruguai e a Argentina e os custosos presentes para as le-

gações diplomáticas e as famílias reais. É certo também que o desenvolvimento material que a cidade experimentou ficou restrito às camadas mais influentes. Embora com melhorias, a educação da capital continuou inexpressiva e destinada a poucos; as epidemias que assolavam a província desaguavam os doentes aqui; as condições de higiene precárias e o trabalho escravo continuavam, assim como no interior. A imigração e a ocupação dos estrangeiros em certos setores, como o ferroviário e o comércio especializado, davam mostras de um avanço que iria contribuir para as sociedades abolicionistas que surgiriam.

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O Fascínio dos Estrangeiros A

s transformações da economia fizeram aumentar em muito a presença de forasteiros na cidade. Havia os que chegavam e iam embora, mas muitos aqui se fixavam para fazer negócios lucrativos. Os ingleses, que detinham a preeminência no mercado internacional, participaram ativamente da vida local com seus investimentos. Trouxeram práticas inovadoras que se incorporaram à nossa herança, como o futebol, a religião reformada, a reorganização das práticas comerciais, e chegaram a ter um cemitério perto do atual canal Salgadinho, onde se enterravam os súditos de sua Majestade Britânica. Outros europeus emigraram para cá, como espanhóis, italianos e franceses, radicando-se aqui, constituindo família e deixando descendentes e alguns costumes de seu país. Vários consulados e legações diplomáticas se instalaram em Jaraguá. Alguns viajantes se foram após curta passagem, mas deixaram registrados em depoimentos e diários de viagem suas impressões, entre eles, Mary Graham, Daniel Kidder e Robert Avé Lalement. Este último descreveu a cidade que conheceu em lindo e significativo testemunho: “Mesmo a mais bela ilha dos Mares do Sul dificilmente apresentaria aspecto mais pitoresco que o porto de Maceió. A praia se alarga terra adentro, em semicírculo. A areia tem a alvura da neve e parece ter sido branqueada pelas espumas que as ondas atiram incessan-

temente sobre ela. Um pouco atrás, plantada sobre o flanco de uma colina, eleva-se a cidade, habitada por quase três mil almas...” De todas as influências, a britânica foi a mais poderosa. A sede da Estação Ferroviária, antiga Alagoas Railway, é uma reminiscência significativa desse período áureo. A presença inglesa estava em praticamente todos os empreendimentos modernizadores que a vida urbana começava a desfrutar. Eles incentivavam e de certa forma tutelavam o comércio. Praticavam uma política de dominação mansa e sutil, como ocorria em todos os pontos do mundo. A preferência pelos produtos de exportação, em detrimento dos gêneros alimentícios básicos, cujo cultivo era posto de lado, provocava o aumento dos víveres básicos, causava dificuldades nas classes desfavorecidas; não vinculadas, portanto, aos lucros das atividades de exportação; por isso havia reclamações e chistes com aqueles “galegos”, como eram denominados os estrangeiros, e ironias engraçadas eram espalhadas:

num se pesca mai de rede num se pode mai pescá qui já sube da nutiça qui os ingrêis comprou o má

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A Escravidão e a Presença Negra em Maceió É

absolutamente imperdoável falar da composição racial e da cultura maceioense e deixar de lado a presença negra. Apesar da vocação portuária, comercial, industrial, Maceió não foi uma ilha, diferente do contexto provincial e nacional. Teve, é verdade, um papel de vanguarda como agente da urbanização tardia de Alagoas, um lugar onde foram implantadas as sementes das ideias renovadoras, da contestação às estruturas mais conservadoras; não obstante, a elas não esteve imune. Foi inserida plenamente na sociedade senhorial, patriarcal, escravocrata, na chamada “civilização do açúcar” que caracterizava a metade sul da outrora capitania de Pernambuco. Não só no cinturão de engenhos, fazendas e sítios que permeavam as zonas mais distantes, mas em Ipioca, no norte, e na região lagunar, sua presença era essencial para manter a estrutura econômica agrária. Os negros estavam também nas ruas, becos e travessas do Centro e em Jaraguá, nas atividades portuárias. Antes e depois da Abolição, em 1888, era comum ver os “negros de ganho” circulando com cestos na cabeça, vendendo frutas, doces e licores para a própria sobrevivência e a de seus senhores. Lugares como Cambona, Parque Gonçalves Ledo e Rua Ângelo Neto, cujas denominações vieram muito depois, abrigavam populações negras, algumas talvez até quilombolas. O número de escravos excedia, no Censo de 1870, em mais de 12% o da população

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livre. Ora, se naquele ano, já consolidada sua função de centro administrativo ligado ao setor exportador, e com as leis imperiais restritivas ao tráfico, ainda havia esse percentual oficial, é de se imaginar que, na realidade, havia alta taxa de escravos na capital, sem contar os alforriados. Muitas das palavras alagoanas são de matriz africana: quiabo, mulungu, quitoco, fulo, nanico, samba, entre outras. Quem já não ouviu a expressão “fulano está capiongo hoje”, querendo dizer que está triste, melancólico por algum motivo? O grande número de terreiros existentes nos bairros de Maceió mostra hoje uma cultura forte que conseguiu sobreviver às perseguições e à marginalização, mantendo vivos seus conhecimentos, sua religião. Os nossos ri-

Nobreza da Terra (1637) - Frans Post

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Em Alagoas, como no resto do mundo, a ferrovia era um sinal de progresso no transporte de pessoas e mercadorias, elevando a capacidade produtiva de regiões e países

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cos folguedos e artesanato não seriam os mesmos sem a participação dos afro-descendentes. Os negros não tinham acesso fácil às igrejas e confrarias frequentadas pelos brancos, mas lentamente, e com muita luta, venceram a segregação e a discriminação, que ainda hoje existem, e deixaram as igrejas do Rosário e a de São Benedito como prova de sua obstinação. As irmandades de ambas são também marcos desse combate incessante, para ser reconhecido e valorizado, pois eles também não podiam entrar nos templos católicos. Mesmo quando houve a Lei Áurea os negros preferiam, diante do grande volume de obras na capital, prestar seus serviços ao governo ao invés de a particulares, que não obedeciam aos acertos e se recusavam a pagar o prometido. A despeito da condição de escravo, que

o limitava em tudo, da marginalização que lhe era imposta e dificultava a transmissão em toda a plenitude dos seus valores, a cultura negra sobreviveu e se faz presente no vocabulário, na religião, na culinária, na dança, no folclore, no esporte. Foi além do processo de miscigenação, tão visível nos rostos dos nossos conterrâneos. Quem não aprecia os carinhosos diminutivos painho, mainha, netinho, filhinho? A pimenta malagueta, o acarajé, as lendas, a música, rodas impregnadas de nossa negritude? Há uma rica herança presente no cotidiano do maceioense. Hoje, nos bairros periféricos, do Tabuleiro ao Vergel, de Bebedouro à Pescaria, há atuantes redutos da cultura negra, quilombola, exibindo com robustez a graça, a criatividade e a variedade de uma cultura que sobreviveu a séculos de intempéries e discriminação.

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O Trem e a Modernização Conservadora do Século XIX T

rapiche da Barra, Poço, Bebedouro e Mangabeiras se consolidavam como áreas urbanas no período de grandes transformações que foi a segunda metade do século XIX, e que tinha como epicentro Jaraguá. A era dos melhoramentos materiais que se abria para o Brasil e alterou o cenário urbano nas províncias foi vivida com intensidade na capital alagoana. A implantação do primeiro ramal ferroviário de 6 quilômetros, ligando a ponte de desembarque de Jaraguá ao Trapiche da Barra, em 25 de março de 1868, e depois outro, que ia da Rua do Livramento até Bebedouro, foi a arrancada da chamada modernização da capital alagoana. Nenhuma inovação supera o trem de ferro como símbolo das grandes alterações que surgiram com o advento da Idade Moderna. Se formos atentar para o exemplo local, comparemos o que foi mudado na província a partir do surgimento da Alagoas Railway em Maceió. O transporte do açúcar, do algodão e de muitos outros gêneros era feito no lombo dos burros; nos carros de bois, nas barcaças, canoas e sumacas que singravam nossas águas. Passou a haver uma condução mais rápida e com muito mais volume. Cambona, Bebedouro e Fernão Velho passaram a competir com o Trapiche e o Pontal da Barra, que eram tradicionais entrepostos de desembarque dos produtos que vinham pelas lagoas. A linha pioneira foi a Trapiche-Jaraguá-Centro, e com o trem movido a tração animal. Da mesma forma podemos falar da navegação a vapor que deu impulso idêntico nas comunicações com as outras vilas pro-

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víncias e com outros lugares do Império e do estrangeiro. Tudo o que a nova era mundial apresentou de mais significativo podemos encontrar em Maceió dessa época, tendo como vitrine privilegiada o seu bairro portuário, convertido em city financeira, e o centro comercial: ruas iluminadas por lampiões a gás, calçamento das ruas principais, ponte de ferro de desembarque do porto, rede telegráfica, jardins nas praças, casas bancárias e seguradoras, navegação a vapor, ramal ferroviário e as principais repartições públicas instaladas não mais em prédios acanhados e improvisados, mas em construções sólidas e vistosas, à altura de nações desenvolvidas e da corte do Rio de Janeiro, como o Consulado Provincial, Alfândega, Repartição do Selo, Capitania do Porto, Assembleia Provincial, Palacete do Barão de Jaraguá, onde hoje funciona Biblioteca Pública Estadual, Assembleia Legislativa, Delegacia Fiscal etc. Navios de várias bandeiras zarpavam com regularidade do nosso porto principal levando açúcar, algodão, madeira, carne, couro, coco, azeite de mamona e gêneros incomuns como sebo em rama, vinhático, óleo de copaíba, paina de barriguda. Em compensação, o comércio foi inundado de produtos externos como artigos de lã e seda, tecidos de algodão, azeite de oliva, vinhos, ferragens, drogas medicinais, bacalhau, cigarros, brim de linho, chapéus franceses, chitas percalinas, chapéus de sol e paletós de casimira. Novidades como o cartão-postal e a fotografia surgem também, exprimindo que Alagoas, pelo menos em sua capital, saía do casulo colonial, da sociedade agrária e senhorial, e passava a ter aspirações cosmopolitas.

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As Linhas Arquitetônicas, Serviços Básicos e Posturas A

vida urbana de Maceió começa no Império. É certo que a capital concorre com Penedo e só disparará na liderança durante o período republicano, mas sua arrancada é feita na segunda metade do século XIX. Edifícios majestosos, casas de alvenaria ao invés de taipa ou palha, nenhuma delas da era colonial, como era antes da Mudança do Cofre em 1839. Diegues Júnior tem opinião drástica ao afirmar que a cidade não chegou a conhecer de verdade a vida colonial e que sua trajetória civilizada começa somente nos anos do Segundo Reinado, que definiu as linhas arquitetôni-

cas principais. “O gosto pelo azulejo nas fachadas, nos enfeites no alto das casas – as pinhas, as figuras mitológicas, os abacaxis, nas casas imprensadas umas nas outras quase sem ar, sem ventilação, contrastando com aquelas casas largas e cheias de janelas dos tempos da colônia.” É natural que nesta escalada de urbanização surgissem obras viárias, de iluminação, e provimento de água, e que os pântanos que proliferavam em todos os pontos fossem aterrados para torná-la habitável. E que surgissem as normas de edificação com as primeiras leis de posturas, como Construção primitiva da Santa Casa de Misericórdia de Maceió

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a de 1866, que aperfeiçoava seu primeiro Código de 1845. “Toda casa que de ora em diante se edificar terá pelo menos dezoito palmos de altura. As janelas de peitoril terão oito palmos e meio de vivo em altura e cinco e meio de vivo em largura”. Ou essa outra, que determinava que a limpeza estava a cargo dos maceioenses. “Os moradores desta cidade e seu têrmo serão obrigados a ter limpos as testadas de suas casas, sítios e fazendas até o meio da rua. Os infratores serão multados em dois mil réis.” É irônico que em pleno século XXI, pagando impostos tão altos à municipalidade, tenhamos uma cidade onde as metralhas, o lixo e os dejetos caninos dominam as vias públicas! Outro regulamento surpreendente é o que trata de incêndios, aprovado pela Câmara Municipal. “Quando haja incêndio, será obrigado cada vizinho do quarteirão em que for, e dos quatro lados, a mandar imediatamente, os que tiverem, um escravo com barril de água e apagar o incêndio, os quais se apresentarão a qualquer dos inspetores de quarteirão, que tomarão o nome do escravo e do senhor. Logo que for público o incêndio, estando as ruas às escuras, deverão todas as janelas iluminarem-se, sob pena de dois mil réis de multa.” Bons tempos em que não havia insegurança, nem polícia, e os inspetores de quarteirão resolviam tudo! A mais bizarra das posturas era sobre os dejetos huma-

nos, que deviam ser carregados em barricas pelos escravos e enterrados nos fundos dos quintais, ou atirados ao mar além do Hospital Militar, na água negra em direção a Ponta Grossa, depois da linha da Levada, ou colocados, com a profundidade de um palmo e cobertos de terra, à margem do Riacho Maceió. “Os lixos poderão ser conduzidos a qualquer hora do dia. As imundícies e matérias fecais só à noite, dentro de vasos bem cobertos para não incomodar o público. Os infratores que forem forros serão multados na quantia de cinco mil réis, e na falta de pagamento em quarenta e oito horas, em dois dias de prisão, e sendo escravos sofrerão palmatoadas e o duplo na reincidência.” A cidade entrava de vez no ritmo da modernidade! O Palácio do Governo funcionando num casarão, demolido em 1940 para dar lugar ao Iapetec; o Palacete do Barão de Jaraguá, o Mercado Público, o Quartel da Tropa de Linha, o edifício onde funciona hoje o Quartel Geral da Polícia Militar, o prédio da Assembleia Provincial, o mesmo da Assembleia Legislativa atual, a Inspeção de Algodão, a Capitania dos Portos, a Alfândega, a matriz de Nossa Senhora dos Prazeres, as igrejas de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, a de Nossa Senhora do Livramento e, finalmente, a do Bom Senhor Jesus dos Martírios.

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A Visita do Imperador, a Matriz e a Santa Casa O

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acontecimento que marcou época e se eternizou com história e estórias foi a visita do imperador dom Pedro II, quando, acompanhado da imperatriz Teresa Cristina, em 31 de dezembro de 1859, presidiu a solenidade de inauguração da atual matriz, a Catedral de Nossa Senhora dos Prazeres, e se hospedou no palacete do barão de Jaraguá, sendo sua estada muito disputada pelos homens de bens da época. Sua passagem está marcada em monumento em frente à Assembleia, na praça que leva o seu nome. Ficaram célebres seus passeios matinais a cavalo pelos arrabaldes, a cômica disputa por medalhas e condecorações reais e suas visitas com críticas à precária rede de ensino da capital. A bela matriz, inaugurada pela augusta autoridade da corte do Rio de Janeiro, era bem o emblema dos novos tempos vividos ao lado do Jardim Público do Largo da Matriz, aberto depois pelo presidente José Martins de Alencastre em 1867, “o único ponto de reunião e recreio que se proporciona à população desta capital”, segundo o jornal O Progressista, em edição de 21 de novembro daquele ano. Uma das mais notáveis instituições criadas foi a Santa Casa de Misericórdia, em 7 de setembro de 1851, que permanece atuante e modernizada. É a mais antiga entidade maceioense fundada pela Igreja Católica e a ela ligada, um órgão não governamental que teve como inspiração irmandades semelhantes. A primeira

Catedral Metropolitana de Maceió

foi criada por dom Manuel, de Portugal, em 1498, para tratar enfermos, inválidos e acolher órfãos. Numa época de condições difíceis da medicina, uma casa para acolher doentes foi um avanço extraordinário. A febre amarela, por exemplo, trazida pelos navios, fazia da cidade a porta de entrada da moléstia, que pagava com vidas e aflições sua taxa ao progresso.

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“Voluntários” Forçados a ir à Guerra do Paraguai O

s conflitos com os países do Prata, principalmente, a grande guerra com o Paraguai, deixava a população aflita em busca de notícias. A instalação do telégrafo, uma das inovações da modernidade, fazia a descrição dos últimos combates e informava como estavam as coisas no Rio de Janeiro, em Buenos Aires e Assunção, além da posição dos países europeus. Nos cinco anos de guerra, a província foi uma das que mais forneceram soldados, cerca de 5.578 homens, e parte deles de Maceió. Quase todos apanhados manu-militari, que nada tinha de adesão voluntária.

Os homens temiam encontrar de forma inesperada com o capitão Almeida ou com os majores Paca e Pinto, terríveis recrutadores que os fariam aderir, de forma coercitiva, aos “Voluntários da Pátria” para lutar nos charcos guaranis. Muita gente deixou de sair à noite! A iluminação da cidade era através dos lampiões alimentados por gás líquido, substituindo os velhos que funcionavam com azeite de peixe e muitas vezes eram criticados por mergulhar na escuridão ruas inteiras, devido aos encarregados não reabastecerem a tempo o fluido nos postes. Oficiais brasileiros nos momentos finais da Guerra do Paraguai. Entre eles está o conde d’Eu (com a mão na cintura) 1870. Acervo da Biblioteca Nacional

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Acirramento Político Lisos x Cabeludos A

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história alagoana, como um todo, demonstra que seu povo nunca ficou a salvo dos abusos e paixões dos donos do poder, das brigas intermináveis entre as facções que representavam interesses de grupos oligárquicos e que a política foi sempre impregnada de um alto grau de acirramento e violência entre os adversários e partidos. A capital também participava desse clima de radicalização que sempre a caracterizou, principalmente porque Maceió era o centro do poder e aqui desaguavam todas as desavenças originárias do interior. Era na capital que os fatos repercutiam e se tornavam emblemáticos. Era aqui que se debatiam e se decidiam as grandes questões. Vitorioso o projeto da mudança da capital, quando ocupou por curto tempo a presidência da província, o visconde de Sinimbu liderou o seu grupo denominado Cabeludos (os progressistas) e mudou-se para a corte, onde ocupou vários cargos de destaque. A exemplo do general Góis Monteiro, no entanto, não perderia o vínculo com a sua terra natal. Do outro lado, em oposição implacável, sem qualquer contemporização, estavam os Lisos (os históricos) chefiados pelo extraordinário orador Tavares Bastos, também oriundo de uma importante família alagoense e que jamais esqueceria a derrota no episódio da Mudança do Cofre, em 1839. Como a política imperial era uma gangorra, um dia estavam dirigindo os Conservadores, no outro os Liberais. O ro-

Visconde de Sinimbu

dízio também se aplicava na província e as consequências eram sempre de acusações e relatórios funestos sobre o outro grupo.

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Bernardes de Souza Campos, amigo pessoal de Sinimbu, foi seu aliado no Rio de Janeiro. Quando o novo presidente começou a mudar os ocupantes dos cargos--chaves, exonerando os partidários Lisos, o clima ferveu. Em 4 de outubro de 1844, um batalhão de revoltosos ocupou Bebedouro e foi engrossado por outra coluna sob o comando do coronel José Vieira Peixoto. Houve combates na capital e Souza Franco foi obrigado a refugiar-se no navio Caçador, atracado no porto porque Maceió foi ocupada pelos sediciosos. Houve então um acordo com os rebeldes para que ele voltasse ao posto, desfazendo algumas exonerações e garantindo a eleição do juiz Tavares Bastos e de Francisco Barros Leite para deputados gerais. A trégua foi quebrada, a tensão continuou e tropas pernambucanas vieram apoiar o dirigente da província. Um novo ataque à capital foi desbaratado e a sedição terminou com a derrota dos Lisos em Murici e Atalaia. Mas o imperador, em seguida, nomeou um novo presidente - Caetano Lopes Gama, visconde de Maranguape, contrário à política de Sinimbu, e elegeu Tavares Bastos à Câmara dos Deputados.

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As Tensões e os Movimentos Sociais e Políticos A

s tensões políticas que convergiam para a capital da província nem sempre ficavam isoladas das agitações sociais que surgiram no período imperial. Muitas vezes eram utilizadas pelas lideranças e grupos em favor dos seus propósitos. Por isso, quando os ânimos esquentaram entre Lisos e Cabeludos, ou melhor, entre os partidários de Sinimbu e os de Tavares Bastos, Vicente de Paula, o famoso imperador das Matas e comandante dos Cabanos, movimento social do Norte, apareceu em Maceió para ajudar os Lisos, acampando na Mata do Rolo, nas cercanias do campus da atual Universidade Federal de Alagoas. Moveu um ataque à cidade, espalhando o terror, numa investida que deixou muitos

mortos e feridos. Desta feita, a vitória militar foi dos Cabeludos. Sob a presidência do brigadeiro Henrique Marques, em 1845, os irmãos Morais organizaram um bando de cangaceiros que aterrorizavam a população no interior após terem membros de sua família executados. O périplo da violência chegou até as fronteiras de Pernambuco, onde enfrentaram as tropas do famoso Pedro Ivo. Fuzilado em Sergipe, o chefe deles, Manoel, teve a cabeça cortada, salgada e exibida como um troféu, em Maceió. Nos anos 1851/1852 a Sublevação dos Maribondos - Ronco das Abelhas, como ficou mais conhecido - atraiu a atenção dos maceioenses, embora não chegasse a sacudir diretamente a capital. Era uma reação Companhia União Mercantil. Vista geral da fábrica, em Fernão Velho, Maceió

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mais centrada nas vilas e cidades do interior contra a realização do Censo Geral do Império e o Registro dos Nascimentos e Óbitos. O boato era que esses decretos visavam escravizar os recém-nascidos e todas as pessoas livres. Por ser uma cidade onde a população era mais concentrada, foi mais fácil fazer uma campanha de esclarecimento para desfazer a intriga. Os soldados de Maceió, no entanto, foram enviados aos focos de rebeldia: Porto Calvo, Barra Grande, São Brás, Jacuípe e outras. Da mesma forma que no Quebra-Quilos, outro movimento que agitou a província de 1874 a 1875, a capital não deixou de expressar seu descontentamento nas feiras, com atos hostis aos portugueses, que, segundo o povo, eram os responsáveis pela alteração que visava aumentar os preços dos gêneros. Contingentes de praças da Guarda Nacional destacados em Maceió foram convocados para reprimir as manifestações e evitar depredações. O clima de agitação geral estimulara desocupados e marginais a promover desordem nas noites de Natal e Ano-Novo. Maceió também padecia o seu quinhão amargo da crise brasileira!

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As Campanhas Abolicionista e Republicana U

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ma cidade que se pretendia cosmopolita, acompanhou a intensa campanha abolicionista que redundou na libertação dos escravos em 13 de maio de 1888. Os principais líderes do movimento promoviam sessões culturais e comícios para popularizar o tema - Dias Cabral, Diegues Júnior, o pai, Fernandes Lima, Ricardo Brenand, entre outros. Promoviam-se sessões de alforria de escravos com contribuições e rifas. Em 1881 fundou-se a Sociedade Libertadora Alagoana, a mais importante das entidades emancipacionistas. A Associação Comercial de Maceió, ligada ao pessoal do algodão, no seu primeiro ano de criação libertou a escrava Benvinda, mostrando sua simpatia e filosofia liberal. Não houve, todavia, uma adesão sólida do povo em todo o território. A porção agro-rural era mais conservadora, por isso a capital era a sua caixa de ressonância progressista. Junto com Penedo, que também tinha uma vida mais urbana, mais desenhada, discutiam-se as grandes questões sociais da época. Ideias libertárias eram defendidas na imprensa, que teve ativo papel de esclarecimento, em jornais como O Lincoln, A Gazeta de Notícias, O Gutemberg e O Correio de Maceió. O movimento contrapunha-se à resistência dos proprietários, que não queriam perder o seu investimento na compra de negros, o que sustentava o nefando instituto da escravidão e, por consequência, a economia local. Igualmente a campanha republicana também defendida por líderes como Ricardo Brennand e João Gomes Ribeiro, que estavam associados aos abolicionistas Dias Cabral, Fernandes Lima e Francisco

Domingues. Completando a jornada do pioneiro O Apóstolo, em 1851, surgiram mais adiante os periódicos A República, A Província e O Século, como principais arautos do novo credo antimonárquico. A intelectualidade estava mobilizada, embora fosse contestada também por colegas defensores do status quo. Em 13 de maio de 1888, a então regente princesa Isabel assinava a lei que acabava com a escravidão negra no Brasil

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Educação e Cultura E

mbora passasse por um período de modernização e melhoramentos materiais, não houve aprimoramento nem expansão da educação à altura das transformações. A elite alagoana enviava seus filhos para estudar em Recife, Olinda, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Europa e não se preocupava em universalizar o ensino, tornando-o meta prioritária da sociedade e do governo. Os grandes vultos que tivemos, tanto na cultura como na política, estudaram fora. A imprensa foi a universidade alagoana com a produção de sua intelectualidade esparsa nos jornais. Colégios particulares começaram a receber alunos para prepará-los para os exames gerais. Além do Liceu Provincial de Artes e Ofícios e de uma pequena expansão de escolas, nada significativo. Dom Pedro II, quando em sua viagem a Maceió, já havia feito em seu diário anotações sobre a precariedade da nossa educação. Sá e Albuquerque em sua gestão fechou o Colégio de Educandos Artífices, segundo ele por ser muito dispendioso. Propôs, então, o Colégio de Educandos Agrícolas, dizendo em sua mensagem: “Eu não quero sábios agrícolas, quero moços educados no campo, sabendo apenas ligeiras noções teóricas e o manejo de algum instrumento agrícola”.

Dom Pedro II, Palácio Grão Pará Petrópolis, RJ

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OS TURBULENTOS ANOS REPUBLICANOS Capítulo IV

De 1889 ao fim da República Velha

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P

odemos dizer que o advento da República foi uma surpresa para as elites políticas e econômicas de Alagoas, já que o Partido Republicano tinha pouca expressão frente à corrente dos monarquistas liberais na Província. As primeiras décadas foram marcadas por intensas turbulências e instabilidade política que tiveram a comandá-las dois alagoanos: Deodoro da Fonseca, filho do líder da sedição alagoense em 1839, o proclamador da República, e Floriano Peixoto, o consolidador. Os dois com laços familiares fortes em seu território natal. Nas comemorações da Lei Áurea, por exemplo, entre os festejantes na Praça dos Martírios estava o coronel Floriano Peixoto, maceioense e herói da guerra dos Paraguai. O primeiro governador nomeado, depois de vinte dias da Junta Provisória encabeçada por Tibúrcio Valeriano, foi o irmão do marechal Deodoro, Pedro Paulino, que com ele e toda a família dos Fonseca se auto-exilou no Rio de Janeiro, em 1839. Ironicamente, o navio que levou o velho imperador banido para a Europa foi o Alagoas. Parecia que a velha capital agora dava o troco para o monarca e o regime que apoiara Maceió na disputa pela sede da província. Os embates pró e contra o novo regime, antes do 15 de novembro de 1889, entre as duas correntes, ficou circunscrito praticamente a Maceió, a páginas dos jornais e sessões de alguns grêmios literários, principalmente o Instituto Histórico e Geográfico, na época Instituto Arqueológico e Geográfico. O choque entre os dois lados foi feito nos salões, sem confronto nas ruas da capital, mas

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Estampa da capa da biografia resumida do primeiro presidente que o Brasil teve, o Marechal Deodoro da Fonseca (reprodução)

a calmaria terminaria e Maceió viveria, durante o novo regime, intensa agitação política, diferente da estabilidade da era imperial, na sua fase outonal. Essa turbulência duraria até o final da República Velha, com a deposição de Álvaro Paes, em 1930. Os litígios discursivos e escritos nos salões, no entanto, não teriam vida longa. A monarquia que engendrou representações culturais e simbólicas que calaram tão fundo na alma popular foi perdendo rapidamente

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seus últimos defensores. Se o credo republicano era defendido antes por meia dúzia de intelectuais, as elites de dirigentes e dos grêmios culturais passam, sem sobressalto e com entusiasmo, para o novo regime - “a República da Espada”, como passou a ser chamada naquele instante, é louvada e adulada. “É preciso mudar para que tudo continue como está”, e manter os postos de comando com ligeiras adaptações é o que importa. Às favas a coerência política e o partidarismo!

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A Vida Intelectual Nascente e o Instituto Histórico N

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ão é mera casualidade que o advento de entidades culturais da vida intelectual maceioense e alagoana, eminentemente nativas - e não da ilustração de seus pares anteriormente formados em outros pontos do país e do exterior -, reflitam as matrizes necessárias de identificação, da expressão da relação entre elas e a política, do casamento, ou incesto, entre a classe dirigente e seus acadêmicos. A alagoanidade ambígua que é exercitada na capital do agora estado federativo serve de substrato para a coesão local. Não é um artefato comum, é uma confrontação sutil entre cultura de classes distintas e opostas, erudito versus popular. Um elogio e busca das raízes originárias, muitas vezes de usurpação dos elementos marginalizados dos grupos subalternos, ou um instrumento de dominação antes de se chegar a um processo de convivência histórica da sociedade maceioense, alagoana, exercitada no teatro cultural. Ao longo do período da República Velha, e mesmo depois dele, surge uma série de grêmios, entidades, associações culturais, mas o mais destacado de todos e paladino da formação mental é, sem dúvida, o Instituto Histórico e Arqueológico Alagoano, o mais antigo e importante centro cultural. Nada há comparável a ele, nessa quadra, para fazer o papel de formador de uma construção coletiva da sociedade caeté. Suas sessões eram concorridas. O ingresso na instituição valia o mesmo que um título de nobreza no período passado. Os grandes vultos parlamentares, do Judiciário, do Executivo ou grandes lideranças na medicina, no comércio ou na indústria sonhavam em ocupar uma das cadeiras, com direito a ostentar o título de sócio, frequentar suas reuniões, ou não, mas principalmente

pela festa de posse, uma iniciação digna da coroação de um rei. Sua revista, que era então editada regularmente, é um precioso mostruário da produção científica, quando não havia ainda nenhuma unidade universitária. Suas peças e coleções constituem o único museu do novo estado, formando precioso acervo da história local. A Casa das Alagoas, como passou a ser chamado, foi fundada pelo presidente José Bento da Cunha Figueiredo, que também havia instituído em Maceió a Escola Normal no velho Lyceu. O dirigente, considerado um dos mais operosos da era monárquica, seguia o exemplo do imperador no Rio e do presidente de sua terra, Pernambuco. Numa época de lutas políticas e posições irreconciliáveis, queria reunir em torno de um órgão cultural as mentes mais lúcidas da província e estabelecer confronto só no campo das ideias e da arte. Ele pessoalmente, como dom Pedro II na corte do Rio de Janeiro, participava das sessões para valorizar a Casa. Seu papel só diminuiria com o surgimento das universidades, no século XX.

Prédio do Instituto Histórico

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Um Período de Turbulência na Consolidação da República P

edro Paulino, a exemplo de seu irmão Deodoro, teve um mandato agitado. Estudioso da geografia e da história, um intelectual, perdeu o rumo e o prumo nas intermináveis brigas locais. Agora todo mundo era republicano desde o ventre da mãe. O poder era a ambição geral. As turbulências que o país atravessava refletiam aqui. O governador exasperou-se com as críticas e traições, fechou jornais e, a exemplo do irmão generalíssimo, também renunciou. Mas a radicalização não cessou. Assumiu outro militar, com prestígio na caserna e entre os líderes republicanos, mas foi destituído, e seu sucessor, o barão de Traipu, enfrentou sérias dificuldades. A população de Maceió vivia sobressaltada com os tiroteios e enfrentamento entre as facções nas ruas. Batalhões militares, ao sabor das conveniências do Rio de Janeiro, tomavam partido e acirravam as tensões. Juntas governativas se sucediam. O barão, um condestável do regime caído, era agora um republicano forte. Gabino Besouro era um republicano histórico e tinha partidários inconformados com sua deposição. Traipu, acossado no palácio invadido, fugiu e entrincheirou-se no Hotel Nova Cintra. Renhido combate deixou dezenas de mortos e feridos. Prudente de Morais, presidente da República, enviou soldados de Sergipe e os besouristas perderam a luta. Militares partidários de Gabino foram transferidos ou reformados. Logo depois Manoel José Duarte assume, em plena tensão, e passa o governo para Euclides Malta, que inaugurou uma fase tranquilidade e revezou-se com seu irmão, num período que ficou timbrado como “Oligarquia dos Malta”.

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Pedro Paulino da Fonseca

Gabino Besouro, governador, foi deposto no período conturbado que se seguiu à Proclamação da República

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Euclides Malta, no centro da foto de chapéu branco e guarda-chuva

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Matagrandense com atuação em Penedo, ele é genro do barão de Traipu e entende o espírito do seu tempo, da política dos governadores. É um bacharel que costura um pacto com os detentores do poder econômico e a classe agrária do interior e tem como seu vice um representante do influente setor açucareiro. É a aliança da burguesia republicana nascente com a sólida representação interiorana, que sempre comandou a política nos períodos anteriores. Doze anos de poder dos Malta deixaram inúmeras realizações urbanas em Maceió - Te-

atro Deodoro, Palácio de Justiça, Palácio Floriano Peixoto (ou dos Martírios), Repartição de Higiene, Junta Comercial, Ponte dos Fonseca, Praça Euclides Malta, hoje Sinimbu, e a Garagem Alagoana são as mais visíveis. A máquina eleitoral, azeitada para a vitória contínua dos políticos governistas, foi estimulando o ressentimento dos oposicionistas, o que redundou na eleição do presidente Hermes da Fonseca, neto do marechal Deodoro, em movimento nacional contra a política dos governadores, visando a derrubar as oligarquias estaduais que se espalhavam por todos os estados.

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A Queda dos Malta, Maceió Incendiária A

pós disputadíssimo pleito eleitoral com Rui Barbosa, o civilista, Hermes da Fonseca, novo candidato militar, assume a presidência da República e entra em conflito com as antigas lideranças estaduais que faziam a chamada “política dos governadores”. Ele implementa a política das “salvações” para destituir as oligarquias, e no Nordeste ela é aplicada com sucesso. Alagoas, terra de seus avós, assim como Bahia, Pernambuco, Ceará e Paraíba são objetos da estratégia hermista para mudar o quadro político nacional e restaurar os ideais de 1889. Havia guerra intensa entre os periódicos diários Correio de Maceió, Jornal de Alagoas, Jornal de Debates, e muitos outros semanários que radicalizavam suas posições. Comícios inflamados agitam a capital, que encabeça a resistência contra a férrea estrutura governamental maltina que havia muitos anos era blindada contra oponentes e ganhava todos os embates eleitorais e fora deles. A organização política de Euclides era imbatível no interior junto aos coronéis e chefes municipais. Maceió, no entanto, era refratária à couraça situacionista. Com o impulso dado pela nova política do governo federal, a oposição cresceu. Panfletos, discursos, artigos e manchetes de jornais incendeiam Maceió. O governador começa a ser hostilizado nas ruas - fato inédito! Uma estratégia da oposição em convidar o coronel Clodoaldo da Fonseca, filho de Pedro Paulino e chefe da Casa Militar do presidente Hermes, foi uma manobra de mestre. Clodoaldo relutou em deixar uma bem-sucedida carreira

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na capital federal e vir para um estado onde seu pai e seu avô tiveram desilusões. Os líderes oposicionistas, no entanto, conseguiram convencê-lo. Uma tragédia, mais uma, detonou o grupo oligárquico. Inauguração da Praça do Montepio

Na atual Praça do Montepio, onde funcionava a antiga sede da Organização dos Advogados do Brasil-OAB, há um encarniçado confronto em meio a um comício da oposição que tinha sido proibido pelas autoridades. Há feridos e vítimas fatais. A polícia, provocada, atirou nos manifestantes. Os adversários revidaram. Morrem o advogado Bráulio Cavalcanti, ao discursar pedindo a saída de Euclides, e, do outro lado, o chefe de Polícia, o tenente Brayner, do Exército. A multidão enfurecida invade o palácio e o governador foge para escapar à sanha da massa que queria vingança. Foi o término de um ciclo e o começo de outro, que, no entanto, não operou grandes mudanças no sistema. Ocorre uma metamorfose oligárquica, chegam novos atores, mas os métodos, a estrutura e a maioria da representação política continuam como antes.

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A Quebra dos Terreiros. Ato de Perseguição Religiosa O

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ano de 1912 foi marcante. Alguns dizem que o século começa nele. Além da queda dos Malta e da ascensão da política das “salvações”, temos um fato que não pode ser esquecido - a derrubada dos terreiros de culto afro em Maceió. Em meio à briga entre governo e oposição, em que Euclides Malta se mantinha firme, apesar das investidas contínuas, um fato desestabilizou sua posição. Foi planejada uma Operação Xangô, uma intriga disseminada entre a população, dizendo que o governador só se mantinha no cargo porque frequentava os terreiros e tinha a proteção de divindades do mal. Fernandes Lima e o estado-maior oposicionista divulgaram a notícia em toda a capital. Um fanático que lutou na Campanha de Canudos e ansiava por uma nova guerra, o sargento Manoel da Paz, chefiava um grupo paramilitar, a Liga dos Republicanos Combatentes, e recebeu instruções dos antimaltinos para atacar seus oponentes e destroçar a base dos oligarcas. Pagãos, adoradores do demônio e outras acusações foram feitas, doutrinando suas fileiras e convertendo-as numa autêntica guarda pretoriana. Eles fizeram a guerra suja, enquanto os bacharéis e políticos lutavam na ribalta legal. Barbarizaram os opositores, invadiram e quebraram os terreiros existentes. Em toda a capital, de Bebedouro a Ponta Grossa, de Jaraguá ao Trapiche, quebra--quebra, prisões, torturas e desfiles humilhantes aconteciam, como num verdadeiro auto de fé da Inquisição Medieval. Os adeptos da religião foram alvo de perseguição durante muito tempo e, para evitá-la, faziam suas rezas e invocações com os tambores tocando baixo. Registros apontam que pais de santo como Manoel Martins tiveram seus cavanhaques arrancados à força. Tia Marcelina, conhecida mãe ialorixá, foi torturada e sofreu uma pancada profunda na

Culto praticado por descendentes afro de Maceió

cabeça, mas não desprezou sua fé. Muitos objetos religiosos são quebrados, mas boa parte é arrestada como troféu de guerra. São inicialmente deixados no Jornal de Alagoas e depois entregues, por tirocínio de Luiz Silveira, na Sociedade Perseverança e Auxílio, um templo republicano que a repassou ao Instituto Histórico, guardião de uma das mais belas e valiosas coleções afro do país. Lançando mão de inúmeros estratagemas, a Perseverança foi recolhendo aqui e ali o que restou dos objetos religiosos negros. Quando a violência amainou, os batuques, em seus toques, continuaram com o cuidado de não ser ouvidos por estranhos, na clandestinidade, portanto. Fernandes Lima, governador duas vezes, a primeira sucedendo Clodoaldo da Fonseca e depois a Batista Acioli, foi senador e figura política importante até o fim da Velha República, mas não teve final feliz. Sua família amargou tragédias, reforçando com sua dor a fama das entidades negras e as lendas urbanas da capital alagoana.

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A Belle Époque Sururu e a Miséria dos Pobres A

capital da chamada “terra dos marechais”, que no final do século XIX ainda media forças com algumas cidades interioranas como a aristocrática Penedo e a lacustre Pilar, consolidou-se no começo do século XX como urbe moderna e incontestável polo econômico, político e administrativo. O surgimento das praças onde se reuniam os munícipes, deixando a reclusão de suas casas para interagir nos locais públicos e saber das últimas novidades, a construção de prédios grandiosos como o Palácio Floriano Peixoto, o Tribunal de Justiça e o Teatro Deodoro marcam de vez o ingresso de Maceió na chamada belle époque. São tempos urbanos por excelência. Em que a euforia toma conta da antiga e limitada povoação do engenho Maçayó. Em que a esperança aquece os corações maltratados pelas transformações trazidos com o novo regime proclamado pelo nosso generalíssimo no distante Campo de Santana. Em que o espírito sorridente da bela capital emana uma fé inabalável no progresso. Obras são feitas nas antigas e acanhadas vias, que são alargadas. A Rua do Comércio e Jaraguá desafiam as doenças e se adaptam aos novos tempos. A cada dia uma novidade! Mesmo com todas as dificuldades financeiras, limitações governamentais e complicações políticas, que não eram poucas, o novo século tem um viés mais citadino. E o influente mundo agrário, que tem sua fortaleza no interior, se adequa mas não se deixa vencer. É só ver que por trás dos bem arrumados e corteses políticos bate um coração rural sem vergonha de esconder suas

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Teatro Deodoro

origens. Os últimos senhores de engenho são agora governantes, parlamentares e administradores e mantêm sob seu controle os cordéis do poder. Não é à toa que o governador Fernandes Lima, agora um urbano morador da capital, adota como slogan de sua gestão “rumo ao campo”. A febre das novidades toma conta da cidade. Endireitavam-se as velhas vias rasgadas nos alagadiços que antes tomavam conta da grande restinga cercada de águas, doce e marinha. As ruas exalam cheiro de peixe frito, tapioca e arroz doce vendidos nas esquinas enfeitadas por negras trajando vistosos xales e turbantes. Os negros, agora libertos, lutam pela difícil sobrevivência, pois não tiveram nada de ganho material

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de seus proprietários com a abolição que já dista duas décadas. Engraxam sapatos e oferecem seus préstimos em todos os lugares para assegurar o ganha-pão de suas famílias. Ofertam seus serviços a cavalheiros de chapéu coco e bengala postados solenemente nas calçadas, às portas da Maison Elegante, da Casa Zanotti, da High Life, da Casa Eugene Goestchel ou do Café Colombo. As damas não dispensam coletes, mantilhas nem os pequenos e graciosos leques. Maceió ganhou até um hipódromo, o Prado Alagoano, que mais tarde se chamaria Jockey Clube e que deu origem ao bairro do Prado. Dançavam-se, nos intervalos das corridas de cavalos, ao som de conjuntos e orquestras. Apareciam os primeiros clubes de futebol, Clube de Regatas Brasil-CRB e Centro Sportivo Alagoano-CSA, outra novidade trazida no período de Euclides Malta por seu filho e que ganhou a simpatia geral, apesar de alguns críticos, como Graciliano Ramos, jurarem que aquele esquisito esporte inglês de vários homens idiotizados correndo atrás de uma bola não teria futuro nenhum, pois o povo não o adotaria. Só a elite ávida por banalidades que a distinguissem do povão e que depois o trocaria por outra coisa qualquer vinda de além-mar. Como errou feio o querido autor de Vidas Secas!

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Maceió das Imagens e a Expansão das Associações A

fotografia passava a ter muitos admiradores. E mesmo depois de ter vindo do século passado, os artistas estrangeiros continuavam predominando na praça seguindo a trilha inaugurada por Augusto Morean, Albino Pereira, E. Monier, Jean Gaston e Julien Boquel no século passado. Continuavam o trabalho dos pioneiros, agora com maior intensidade, oferecendo em caráter sazonal, em turnês nos estados, seus serviços ao público na Rua do Comércio. Alguns maceioenses começam a aprender o ofício, mas os de fora eram os preferidos, voltados para o cenário e a estética regional, “tirando retratos” das pessoas de posses, em cujas casas o álbum de família era símbolo de status. A novidade que surgiu com os daguerreótipos veio para ficar e a sociedade moderna, industrial, urbana, seria doravante a da imagem. Outra invenção que atrai a curiosidade geral é o cinema. Um aperfeiçoamento da arte e da tecnologia fotográfica atraía multidões embasbacadas com aquelas figuras que se movimentavam na tela, algo inacreditável. Era mudo, é verdade, mas músicos entretinham os frequentadores, antes de começar a sessão e nos intervalos. Multiplicavam-se as sociedades recreativas: Clube Fênix, Terpsychore Jaraguaense, Montepio dos Artistas. Maceió, mais suscetível às inovações, ia abrindo brechas na sociedade agrária, adotando costumes das metrópoles do país e do exterior e se inserindo nas mudanças que o século industrial, a era da tecnologia, ia oferecendo à humanidade.

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Lyceu Alagoano, Rua Senador Mendonça

O teatro resiste, mesmo abalado com a concorrência da engenhoca mágica que encanta com suas luzes e movimento. E encontra um modus vivendi com o concorrente. Muitos deles se transformam em cine-teatro, como o Moderno e o Floriano. O Deodoro, mais solene, é para espetáculos e grandes solenidades oficiais. Não adere à mistura. Outros se rendem incondicionalmente, como o velho Teatro Maceioense. O Politeama, celebrizado pela visita do imperador em 1860, procurou a fórmula para sobreviver mais um tempo. Minerva, Montepio dos Artistas e 16 de Setembro enfrentam a concorrência de um adversário que veio com proposta aliciante.

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Do Outro Lado da Ribalta, os Excluídos A

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s regalias dos tempos dourados das novas tecnologias urbanas não chegavam com facilidade para todos. Uns usufruíam, outros viam e não podiam. Nem tudo era, portanto, festa na belle époque sururu. As senzalas tinham sido oficialmente extintas, mas permaneceram bem vivos a segregação social e o poder da casa-grande. A influência desta na cosmopolita e avançada capital não era tão reduzida quanto se possa pensar. O imaginário do mundo patriarcal, escravocrata, rural, que permeia a sociedade alagoana no interior do estado não é descartado em Maceió. Continuará presente no seu cotidiano, nas relações sociais, no tratamento desrespeitoso das classes mais abastadas - burguesia e média para com os subalternos, às vezes até mesmo dentro do seu próprio estrato. Era só observar nas convenções aplicadas aos empregados domésticos pelos patrões, nas repartições públicas pelos chefes emproados e designados sem nenhum mérito, por mera indicação política dos mais graúdos. O nepotismo era deslavado nas repartições governamentais inchadas e ineficientes; nas nomeações de cabos eleitorais sem concurso para nada fazer ou para fazer mal feito; na solene reverência aos portadores de paletó e gravata, vestidos e roupas caras e da moda. Antes, os títulos de major e coronel só eram concedidos aos mais poderosos: agora é o de doutor, mesmo ao portador de uma desqualificação cultural elementar. É o que se vê nas expressões “sabe com quem está falando?” e “sim, sinhô doutô”. No

Ouricuri, aglomerado de moradias da população pobre

servilismo presente até nas instituições culturais nascentes. No desrespeito às normas mais elementares de convivência urbana, nos entulhos nas portas das casas, na apropriação de espaços públicos sem nenhuma restrição. Na despudorada utilização do serviço público para interesses particulares. O romantismo de uma era igualitária, em que todos usufruíssem igualmente das benesses obtidas pelo avanço da ciência e da tecnologia ainda era uma aspiração, um sonho de uma noite de verão. Um projeto de construção que se tardava a fazer. A cidadania ainda estava por vir e a república industrial vestia-se de linho, de casemira inglesa, mas na essência continuava com a alma colonial e agrária.

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A capital atrai, com suas luzes e oportunidades, levas de pessoas da hinterlândia que sonham com uma vida melhor. Não ainda com a intensidade que terá a partir da década de 1930, mas com frequência cada vez maior para uma população que vai se instalando em áreas marginalizadas, em encostas, em pequenos morros como Mutange e Farol, ou à beira da lagoa ou do mar. Grupos de famílias do interior iniciavam o processo de criação de conjuntos de habitações populares que iam ano a ano formando, até o final do século das luzes, um verdadeiro cinturão de favelas em torno dela da cidade-restinga. Os resquícios quilombolas vão engrossando como um regato até transformarem-se em rio caudaloso! O mundo dos despossuídos não estava nos belos sobrados, entre os elegantes senhores de fraque, nos costumes refinados importados. Para a maioria da população, a casa de tijolo, alvenaria, era artigo inacessível. Ela constrói seus abrigos como mocambo de pescadores, em Pajuçara, Ponta da Terra, Bebedouro ou à margem das lagoas. Próximo às áreas de movimento, como o embarcadouro da Levada, Jaraguá e mesmo no Centro, em cortiços, galpões de madeira subdivididos internamente entre famílias numerosas que superlotam os cubículos. Na falta de área de privacidade, brigam por qualquer coisa. Gente sofrida, precocemente envelhecida, que lava enorme quantidade de roupas e faz biscates para sobreviver. Eles são clientes habituais do Asilo de Mendicância, as vítimas preferenciais das altas taxas de mortalidade e doenças mentais. Pagavam pesado tributo a enfermidades como tuberculose, varíola, cólera e gripes. Um delas, a espanhola, trazida dos campos de batalha da Europa, na I Grande Guerra, dizimou milhares de maceioenses. A capital da agora conhecida “terra dos marechais” mudava com o novo século, inseria-se na belle époque com sua beleza e miséria, na versão sururu, ora em ritmo lento, ora mais veloz, mas sempre com o pensamento voltado para as inovações viscerais surgidas no mundo e com o espírito republicano.

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As Novas Invenções, Maceió se civiliza A

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cidade-restinga sempre foi bela por natureza. Os próprios viajantes estrangeiros que por aqui passaram não escondiam seu encanto. Mas naqueles anos da República Velha a cidade, como diziam os jornais, “se civiliza”. A finesse importada dos novos hábitos e as invenções da revolução industrial fazem a elite envaidecer de orgulho com os avanços obtidos pelo antigo alagadiço malsão. Como no dia 30 de janeiro de 1923, quando o hidroavião Sampaio Corrêa amerrissou nas águas da Lagoa Mundaú, sob os sinos das igrejas e dos apitos das embarcações do porto. Brasileiros e norte-america- nos cobriam o histórico raide Nova Iorque-Rio de Janeiro. Maceió era uma das etapas. Que glória!, suspirava o público. Um jantar no Clube Fênix Alagoana homenageava pilotos e tripulação, filmado pela Pathé News para o mundo. Nada mal para quem já tinha visto o primeiro voo de avião, o Bleriot, dez anos antes nos céus locais, pilotado pelo francês Lucien Deneau na Praia de Jaraguá. “Semelhante monstruosa libélula” naquela ocasião foi vista pela multidão transportada pelos bondinhos da Companhia Alagoana de Trens Urbanos-Catu, puxados por burros. Os pobres animais ficavam em estado lamentável para conduzir o grande número de pessoas que se acotovelavam para ver o “voo imponente do besouro maravilhoso”. O trajeto de Jaraguá ao Centro em mais de uma hora deixou os participantes totalmente enlameados, pois o leito da linha esburacado difi-

Delmiro Gouveia, empresário fundador da Fábrica da Pedra

cultava a marcha dos animais. Ambiguidades do progresso alucinante! No ano de 1923 inaugurava-se o Hotel Bela Vista, prédio de três andares, projetado pelo arquiteto alemão Guilherme Jagerfeld, com energia elétrica própria movida a gás. Seria não só uma joia da hotelaria local, mas um centro de reunião da política estadual. A capital não podia ficar atrás da povoação da Pedra, que havia dez anos, por ação de Delmiro Gouveia, já possuía água encanada e iluminação elétrica, a primeira cidade brasileira a

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receber essa conquista. A fábrica têxtil de lá e sua cidade operária tinham que disputar com Fernão Velho e Alexandria, que produziam linhas de coser, as excelências da industrialização. E ademais, a União Mercantil tinha desde 1893 uma filarmônica constituída por operários da pioneira na fabricação de tecidos. Não tentassem rivalizar com a capital! E haja motivo de orgulho! Foi a segunda cidade brasileira a contar com um moderno sistema de comunicação, o serviço telefônico automático. A primeira foi Belo Horizonte. A inauguração foi presidida pelo governador Costa Rego, tendo ao lado o prefeito da capital, Anfilófio de Melo, mais conhecido como Jayme de Altavila, e o arcebispo dom Santino Coutinho, em 31 de março de 1927. O Relógio Oficial, inaugurado em trecho da Rua do Comércio, esquina com a Senador Mendonça, no dia 11 de março de 1922, em local estratégico apontado por Melo e Póvoas em anos distantes, parecia mostrar que finalmente chegara o tempo do futuro. Outra novidade festejada foi a inauguração da Companhia de Telégrafo, a Western Limitada, ligando Maceió à capital do país. Os primeiros telegramas foram enviados em 21 de abril de 1922 pelo governador Fernandes Lima, um deles ao deputado federal Costa Rego, que seria também seu candidato à sucessão. Outro marco do período foi a inauguração do imponente prédio da Associação Comercial de Maceió em 16 de julho de 1928, em Jaraguá, cuja obra havia sido iniciada cinco anos

antes. Uma vitória do setor têxtil, que agora rivalizava com o açucareiro na economia e era um símbolo da industrialização. Novamente Fernandes Lima se fez presente e, embora pertencesse ao setor canavieiro, apoiou a iniciativa do segmento que emergia com força na economia estadual. Igualmente marcantes foram o surgimento da linha de bondes elétricos na gestão de Clodoaldo Fonseca, sendo o material adquirido nos Estados Unidos; as inaugurações do Cine-Teatro Floriano e do Helvética, do mesmo ramo, e o funcionamento da sede social da Sociedade Perseverança e Auxílio dos Empregados do Comércio de Maceió.

Prédio da Associação Comercial

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Os Gansos do Salgadinho Salvam o Governador A

ssim como a poderosa Roma dos Césares teve em sua história os gansos do Capitólio, a cidade-sorriso teve os gansos do Salgadinho. Um governador durão, o pilarense Costa Rego, jornalista bem-sucedido no Sul, com seus costumes modernizantes e ferrenho inimigo do jogo do bicho e do crime, brigou com o seu antecessor Fernandes Lima, com muita gente importante e até com os colegas de imprensa. Certa noite, estava descansando na casa de uma amiga francesa nas imediações do riacho Salgadinho quando foi surpreendido pelo alarido dos gansos da casa vizinha, salvando-se milagrosamente dos tiros deflagrados por um pistoleiro escondido nos matagais da área, que não era povoada como hoje. O caso repercutiu durante anos, o pistoleiro foi preso e acusou o intendente municipal e seu grupo como os mandantes. Este era filho do ex-governador e deixou a edilidade, fugindo para o Sul. O governo capitalizou o episódio, fortaleceu-se e recebeu solidariedade expressa em gigantesca passeata que percorreu as ruas centrais e Te Deum na catedral.

Costa Rêgo

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Os Banquetes e as Lutas Políticas A

s disputas políticas continuaram fortes no período. Se o sistema baseado no coronelismo garantia eleições a bico de pena no interior, sendo cada chefe político municipal a base do viciado processo eleitoral, era na capital que ele discutia com o chefe estadual, o governador, as questões da sua região e este presta contas ao presidente da República. O dirigente estadual obedece fielmente às diretrizes traçadas no Rio de Janeiro, a famosa “política dos governadores”, do coronelismo, criada por Campos Sales. A oratória era uma instituição indestrutível, principalmente nos banquetes em que os governantes recebiam seus correligionários locais, ou de fora, como os realizados nos salões da majestosa Associação Comercial de Jaraguá, do Palácio dos Martírios, ou do Teatro Deodoro. Ministros e presidentes por lá passaram. Um deles ficou famoso quando da dura reclamação do governador Costa Rego contra a discriminação feita pelos órgãos federais a Alagoas e ao Nordeste e os privilégios financeiros e orçamentários ao Sul e Sudeste. Bizarros jantares eram oferecidos no Teatro Deodoro, a joia dos edifícios culturais maceioenses, quando os convidados, encasacados e graves, fingindo prestar atenção ao orador, estavam mais interessados em traçar o peru ou tomar sua taça de champanhe. O povo se amontoava nos camarotes superiores daquela casa de espetáculo, assistindo de lá os inúmeros oradores que se revezavam no esplêndido rega-bofe.

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Governador Fernandes Lima

A turbulência que marcou o período e se refletia essencialmente na capital do estado atravessou todas as gestões. Desde Pedro Paulino, que renunciou em 1891, a Gabino Besouro, que foi defenestrado; ao barão de Traipu, que também viu o sangue correr nas ruas da cidade, e a Manoel José Duarte, que procurou as bênçãos da Igreja para preservá-lo das tensões. Em sua gestão foi criada a Diocese em Maceió. Já Euclides Malta conheceu as agruras da radicalização, sendo alijado em meio a um movimento popular. João Batista Acioli Júnior, que sucederia Clodoaldo, entrou em rota de colisão com Fernandes Lima e novamente o clima esquentou em Maceió até chegar a novo capítulo com o rompimento entre Fernandes Lima e Costa Rego e o grand finale, a deposição de Álvaro Paes, o último governante do ciclo, com a eclosão da Revolução de 30.

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O Irrompimento da Questão Obreira A

pesar do grande número de jornais conservadores comprometidos com os grupos políticos e econômicos mais fortes, emerge uma imprensa operária para divulgação da questão obreira, lutando pela melhoria das condições de vida e por ideias que causam enorme reação policial e política. Publicações como Gazeta Operária, O Povo, O Proletário, Os Mártires de Chicago e O Trabalho Livre circulavam em território até então desconhecido pela antiga sociedade rural. Entidades como a União Operária, fundada em 1903, e a Federação Operária, criada em maio de 1913, se juntam a outras que desmontam a velha tese de que a questão social é apenas um caso de polícia. Categorias mais organizadas conseguem os primeiros movimentos paredistas. Associações como as dos

Caixeiros, Carroceiros e Gráficos, e o Montepio dos Artistas surgem como espaço para discussão de ideias consideradas audaciosas para aquele tempo. Em 1909 é deflagrada a greve dos ferroviários da companhia Great Western. Era um movimento feito em vários estados da região, mas causou comoção em Maceió. No governo Fernandes Lima, outra, desta feita dos Ferroviários alagoanos, que acarretou dura repressão da polícia. O surgimento de espaços industriais e aglomerações operárias com as fábricas têxteis favoreciam a disseminação de ideias questionadoras. Os adversários políticos, porém, deixavam as rivalidades de lado e se uniam para combater as iniciativas grevistas. O Estado Novo cortaria pela raiz a contestação, preferindo uma política de cooptação. Os vencedores da Revolução de 30 assumem o poder em Alagoas

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A Época de Ouro da Cultura D

urante os anos 20 e 30, Maceió abrigou grandes nomes do mundo cultural brasileiro, como a cearense Rachel de Queiroz, os paraibanos José Lins do Rego e Santa Rosa e os alagoanos Graciliano Ramos, Jorge de Lima, Aurélio Buarque de Holanda, Nise da Silveira e Lily Lages, entre outras estrelas locais. A Academia Alagoana de Letras, fundada no final da I Grande Guerra, já competia com o Instituto Histórico em prestígio e o Café Ponto Central era um dos endereços preferidos dessas estrelas. Gente como Jorge Amado e Osvald de Andrade e outras figuras vinham a Maceió para confraternizar com seus colegas e conhecer melhor a cidade que abrigava tantos nomes importantes da intelectualidade brasileira. Grêmios como o Guimarães Passos, academias como a dos Dez Unidos, e o Cenáculo Alagoano de Letras atraíam os jovens que discutiam os rumos da modernidade literária, o futurismo. Maceió seguia os passos revolucionários da Semana de Arte Moderna de São Paulo de 1922!

Aurélio Buarque de Holanda

Graciliano Ramos

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Ponto Central

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MACEIÓ, DA REVOLUÇÃO DE 30 AOS DIAS ATUAIS Capítulo V

Os Desafios do Século XXI

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Revolução de 30 ocorreu após uma fase de grande inquietação política, social, econômica e cultural que atingiu o Brasil nas últimas décadas e quebrou aquela aparente estabilidade herdada da chamada “República Velha”. Os anos vinte, e mesmo antes deles, em Maceió, foram como reflexo dos acontecimentos no Rio de Janeiro e em São Paulo, em 5 de julho de 1922 e 5 de julho de 1924, respectivamente. A capital alagoana não esteve imune às turbulências do país e pode-se dizer que até se antecipou com os episódios de 1912, a Quebra dos Terreiros e o fim da oligarquia dos Malta. A questão social emergia com as associações operárias e as greves; a política continuava dando sua contribuição ao panorama instável em situações como o ferrenho entrevero entre Fernandes Lima e Batista Acioli, e aquele ainda mais quente entre o “caboclo indômito” de Camaragibe e o destemido Costa Rego. As ruas da capital eram palco de muitas mortes ligadas à política interiorana, algumas misteriosas, como a do chefe político de Piranhas acusado de ser o mandante do assassinato do famoso Delmiro Gouveia.

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os Revolucionários Entram na Cidade-Restinga N

um radiante dia de outubro, sofrendo com o sol quente do quase verão, abrem caminho nas ruas da cidade-restinga os soldados revolucionários que apeariam do poder o presidente Washington Luiz. Era a Coluna do Norte, comandada pelo tenente Juarez Távora. O cheiro do suor se mistura ao da pólvora dos foguetes soltados por alguns entusiastas dos novos heróis e candidatos a salvadores da pátria, enquanto ressoa o estrépito das botas dos soldados marchando e dos cascos de cavalos que conduzem os líderes da coluna vitoriosa. O destino das tropas é a praça onde está o símbolo do poder, o quase recente prédio inaugurado pouco mais de quinze anos antes, obra dos Malta, o Palácio Floriano Peixoto, que paradoxalmente é mais conhecido como Palácio dos Martírios. A posse de Hermilo de Freitas Melro no dia 14 de outubro inaugura a era dos interventores. A escolha do líder político penedense é anunciada pelo próprio Juarez, “o vice-rei do Norte”, na sacada do palácio. Penedo ainda não perdeu de todo o seu prestígio ante a sua triunfante rival marinha. Maceió antecipara-se, como as demais capitais nordestinas à renúncia do presidente no Palácio do Catete. A Junta Governativa Provisória que entregaria o bastão de comando a Getúlio Vargas, o chefe da revolução vitoriosa, só o faria em 3 de novembro. Aqui, no dia 9 de outubro, um avião sobrevoa a cidade soltando boletins que chamavam a população à sublevação e a aderir ao movimento insurgente. Apesar dos insistentes desmentidos do Palácio dos Martírios, de que tudo estava bem, que a situação estava inteiramente sob controle, a população desconfia de que havia no ar algo mais que aviões de carreira. Nas casas, nas ruas e nas esquinas o comentário é um só: os dias insólitos que estão por chegar.

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Presidente Washington Luiz

Getúlio Vargas

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O grand finale de uma era C

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lio é uma deusa caprichosa. Deusa e mulher. Por isso a história aponta tanta surpresa. São exatamente os dois últimos governadores alagoanos da República Velha, os mais urbanos entre todos que por aqui passaram, que sofreram as vicissitudes dos movimentos insurgentes, de cunho modernizante. Álvaro Paes já havia sofrido as perturbações de ordem pública com os conflitos entre soldados da guarnição federal, o 20º BC, e guardas civis e soldados da Política Militar. O temperamento conciliador do governador junto ao coronel Floriano Gomes pôs fim às desinteligências. O pano de fundo era a fidelidade de Paes ao Governo Federal enquanto grassava forte a rebelião em Princesa, na Paraíba. O recrudescimento da crise nacional após o assassinato de João Pessoa, em Recife, chegou ao ápice. Os guardas civis saíam à cata, nas ruas de Maceió, de boletins subversivos, proibindo a sua leitura. Um trabalho de Sísifo! Apoiadores cuidavam de renovar o estoque e os teco-tecos, em voos rasantes, soltavam novas mensagens. Uma a uma as províncias do Norte aderiam à causa revolucionária. Não havia mais sustentação para o governo alagoano. Maceió fervilhava. O arcebispo dom Santino Coutinho tenta mediar e solicita a Álvaro Paes que renuncie para evitar violência e derramamento de sangue. O governador não aceita a ideia, diz que está tudo sob controle e que reforços do Sul chegarão em breve para ajudá-lo a manter a ordem. Reúne seu secretariado para trabalhar as lideranças indecisas. Planos são traçados no papel. Final da tarde, saem para passear, como sempre faziam, ele, o escritor José Lins do Rego, o secretário Quintela Cavalcanti e o poeta Jorge de Lima. A pé andam todo o centro da capital e seguem até Jaraguá pela Avenida da

Paz. Cooper não foi pioneiro nas caminhadas... O quarteto chamava atenção pela presença do chefe de Estado. Onde passava, contínuas saudações, mesuras, chapéus sacados da cabeça e, retribuindo, a resposta risonha do ainda líder máximo da política estadual. Carlos de Gusmão, no livro Boca da Grota, narra: “Nós do grupo governamental, íamos conversando, pilheriando, como se estivéssemos a fazer o footing de um governo novo. No entanto, chegávamos ao fim. Poucas horas depois, pelas 21,30 horas, ao passarmos, eu, Quintela e Castelo Branco, pela Rua do Macena, vimos nos fundos do palácio dois carros e um caminhão com malas. Era a fuga. Em verdade uma coisa triste, que eu nunca esqueci”. Grand finale de uma atribulada década, de uma estrutura política vinda dos primórdios da República que o Movimento Tenentista finalmente conseguira dobrar.

Presidente Washington Luiz sendo recebido na ponte de desembarque do Porto de Jaraguá

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Bebedouro é Destaque na era de Ouro da Cultura A

chama da cultura popular não arrefece com o sucesso da cultura erudita, iniciada na década de 20. Bebedouro, bairro tradicional, famoso por seu embarcadouro e pelos belos casarões das famílias importantes que lá moravam, destaca-se pelas grandes festas populares que promove. O major Bonifácio é figura inesquecível para os que amam o folclore alagoano. Pastoril, Chegança, Taieira, Baiana, Reisado, Guerreiro, Coco de Roda, Bandas de Pífano e as Cavalhadas encontravam lá o seu grande palco e atraíam gente dos arrabaldes e das cidades vizinhas de Maceió . O ciclo natalino, o Carnaval e as festas juninas eram celebrados com muita alegria, sobrepujando outros bairros que também faziam comemorações. A cultura erudita continuava a crescer. A Academia Alagoana de Letras inspira novas entidades. Vive-se uma era de forte ebulição nas letras e nas artes e os intelectuais participam ativamente da vida política e administrativa - Jorge de Lima, Demócrito Gracindo, Costa Rego, Guedes de Miranda, Lima Júnior, Povina Cavalcanti e Jayme de Altavila, entre outros. Figuras que adquiririam depois renome nacional, como Raquel de Queiroz e José Lins do Rego moravam em Maceió. Na Rua do Comércio, nas imediações do Ponto Central ou nas livrarias, era fácil encontrar Graciliano Ramos tomando café e conversando com Raquel, Carlos Paurílio, José Lins, Santa Rosa e Jorge Amado, ou com o visitante Mário de Andrade. Os mais jovens, como Diégues Júnior, Arnon de Mello, Aurélio Buarque de Holanda, Raul Lima, Mendonça Júnior, Valdemar Cavalcanti, Aloísio Branco e Emílio de Maia,

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Major Bonifácio da Silveira (Carnaval de 1934)

fundavam associações literárias - o Grêmio Guimarães Passos e a Academia dos Dez Unidos. Revistas de vanguarda eram publicadas desafiando cânones tradicionais. Lourenço Peixoto lançava o Paralelismo, inovação alagoana no campo das artes plásticas. O Instituto Histórico mantinha animadas reuniões com grande participação dos sócios. Temas novos são abordados, como o petróleo no romance Riacho Doce.

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O Estado Novo e a II Grande Guerra N

a era varguista que trouxe os interventores, governos fortes e mudanças pregadas pela Revolução dos Tenentes, mudaram os gestores, mas não mudou um nome que influenciava mais que qualquer outro a política do estado, o general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, um alagoano que estava entre os líderes gaúchos que marcharam triunfalmente pelo Rio de Janeiro em 1930. Com o fim dos anos 30, estão terminando os tempos de glória e de utilidade da ponte de embarque de passageiros e dos trapiches de carga. Jaraguá volta a ter grande movimentação por conta de obras no porto. O fluxo de passageiros e produtos precisa se modernizar. A produção de açúcar precisa ser escoada com maior rapidez para melhorar a concorrência com outros portos do Sul e do Nordeste. Moacir Pereira, um intelectual que trabalha no serviço público federal, é enviado para adquirir as estacas principais do porto na Alemanha. O regime estadonovista naquela oportunidade flerta com o governo nazista

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que emerge com grande prestígio. O Brasil pratica uma diplomacia pendular para tirar melhor proveito da situação. Com a eclosão do conflito que arrasta quase todos os países para a Grande Guerra, as obras do porto demoram, são adiadas. O povo, desconfiado, transforma o nome da construtora, Geobra, em adjetivo pejorativo. O maceioense é implacável, mas tem senso de humor. Finalmente o sonhado porto é inaugurado, calando pessimistas e descontentes.

Revolução de 1930, em Maceió: multidões nas ruas

A política fervilha. Integralistas e comunistas se digladiam. A Liga Católica prega os valores conservadores e simpatiza mais com os primeiros. Os socialistas são mais próximos dos segundos. Não há espaço para neutralidade. Grandes amizades no ambiente cultural são rompidas. Excessos são cometidos e beira o paroxismo a perseguição ideológica. Depois de 1935 os comunistas amargam a prisão, e entre eles estão Graciliano Ramos e Sebastião da Hora. Graciliano é colocado em um navio e enviado para a prisão

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no Rio de Janeiro, de onde não retorna mais. Depois de 1937, os integralistas também são postos na ilegalidade. A partir de 1942 a guerra atinge mais forte o Brasil. Navios cheios de passageiros são torpedeados próximos de Maceió. O país entra na guerra. Da capital partem os pracinhas alagoanos para o front na Europa. Lágrimas e desespero dos familiares no Porto de Jaraguá. Para Maceió vêm os norte-americanos aliados e muitas novidades. A Lagoa Mundaú vira campo de pouso para os hidroaviões, enquanto balões cruzam os céus. Na parte alta do Tabuleiro do Martins, até então área quase desabitada da cidade, os mesmos norte-americanos iniciam a construção do aeroporto que conduzirá seus aviões para a África e a Europa, com tropas e armamentos para combater o inimigo nazi-fascista. A cidade é sacudida pelo clima de guerra. Não é nada parecido com o conflito de 1914-1918, quando só se sabia da conflagração através das notícias de rádio e de jornais e soava distante. Agora não, agora é real, sente-se sua presença nas ruas, no dia a dia. Maceió nunca conhecera algo assim antes.

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O Anjo Americano, Angústia e Ninho de Cobras A

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cidade não é apenas um conceito geográfico, mas, sim, um símbolo complexo e inesgotável da aventura humana, nos ensina Italo Calvino em sua obra As Cidades Invisíveis. Sua natureza, referências físicas e racionalidade geométrica nada seriam sem a trajetória histórica, o emaranhado das pessoas que a construíram e deram significado à sua existência. Para os maceioenses que viveram aqueles momentos decisivos para a humanidade, o drama da guerra não era apenas o que liam nos livros, nos jornais ou viam nas telas do cinema. Era realidade, e não mera narrativa ou ficção. Como saber o que aquelas pessoas sentiram no cotidiano das décadas de 30 e 40 do século passado? Alguns livros podem nos trazer aqueles anos de volta. Há um que mistura memória e ficção - Na Estrada dos Passos Perdidos, de Cyro Rocha. Uma narrativa excelente sob o prisma de uma biografia fantasiada. E três outros que são verdadeiras obras-primas, os romances por excelência de Maceió. Neles se encontram a geografia da cidade, seu jeito de ser, os tipos inesquecíveis, a arquitetura, a alma e a psicologia da urbe sorriso. São eles O Anjo Americano, Angústia e Ninho de Cobras, dos geniais Luiz Gutemberg, Graciliano Ramos e Ledo Ivo, escritos em momentos diferentes e por gerações diferentes, mas com inequívoco selo de qualidade literária sobre a cidade restinga, os homens e a sociedade onde estão inseridos. Quem se dispuser a conhecer Maceió não pode prescindir da leitura desses livros. Neles vamos saber da política e dos fatos pitorescos. Do treinamento de soldados; das agruras das famílias para não ter seus filhos

Bebedouro, 1948. Bonde elétrico circula em frente à matriz de Santo Antônio

indo para a morte; sobre os famosos apagões noturnos que mergulhava a cidade nas trevas, esperando bombardeiros a qualquer momento; dos balões imensos vigiando a costa e dos soldados guarnecendo as praias esperando desembarques letais; do cultivo intensivo de hortas nas casas para evitar a fome porque muitas mercadorias poderiam não vir ou desaparecer ao serem torpedeados os navios que as traziam; do tremendo horror causado pelo afundamento constante de embarcações no litoral nordestino; da indignação da população nas ruas, em gigantescos comícios lideradas por intelectuais e estudantes pedindo o rompimento com o Eixo e a declaração de guerra, que finalmente viria para atender o reclamo geral.

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O Petróleo é de Alagoas, é do Brasil, é Nosso Avenida da Paz, Maceió

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Vergel do Lago e o Tabuleiro foram fronteiras da cidade desbravadas pela guerra. Tomaram impulso com a construção de campos de pouso. A campanha pela exploração do petróleo em Riacho Doce ganhou as manchetes no estado e no país. Galvanizou as atenções, pois geólogos norte--americanos diziam que aqui não havia reservas do precioso óleo.Um intelectual negro, Rodriguez de Melo, participava dessa campanha que tinha como slogan “o petróleo é nosso” e contou com o apoio de gente de expressão nacional,

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como Monteiro Lobato. Comícios em toda Maceió arrastavam multidões. Estávamos em plena ditadura com o Estado Novo. A crítica ao governo ou opiniões independentes, ou simples denúncias por intriga de desafetos, eram punidas com rigor e as pessoas sofriam constrangimentos. O clima era de insegurança total. Graciliano Ramos, então Diretor de Instrução Pública, e Alberto Passos Guimarães foram alguns dos presos sem motivo, sem julgamento e sem direito de defesa.

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Maceió em Tempos de Cólera A

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Revolução de 30, que veio para transformar a política antiga, não modificou na essência os costumes. A violência continuou na disputa pelo poder. Os grupos mais interessados em preservar seus privilégios faziam uso dela como dantes. A cisão da família Góis Monteiro foi muito danosa à paz, prolongando-se até a década de 50. Dos tumultos vividos nas ruas de Maceió o mais triste é o de 14 de março de 1935, quando as ruas da capital foram juncadas de mortos e feridos, entre os quais Rodolfo Lins e outros líderes políticos. Jornais empastelados, a prisão na guarnição federal de Silvestre Péricles, irmão do general Góis Monteiro, e de seus correligionários, na briga com familiares. Violência policial de toda sorte marcou essa data que ficou conhecida como a tragédia do Hotel Bela Vista, local onde se hospedavam Silvestre e outros políticos, que lá ficaram sitiados pelos adversários. Na gestão de Osman Loureiro foi encerrado o “ciclo do cangaço”, quando Lampião foi abatido em Angicos, em Sergipe, por volante alagoana e as cabeças dos integrantes do bando, inclusive as de Virgulino e Maria Bonita, foram exibidas na capital. O irmão mais novo dos Góis Monteiro, Ismar, foi nomeado interventor em 1941, por estar longe dos acontecimentos, não envolvido na divisão familiar. Trouxe com ele alguns auxiliares para aplicar a legislação trabalhista e reduzir a violência, que atingia níveis alarmantes. O secretário do Interior e Segurança Pública, Ari Pitombo, era delegado de polícia no Rio de Janeiro e fez dura repressão aos infratores. Constantes blitzen tomavam centenas de facas peixeiras, revólveres, rifles e pu-

O dirigível Zeppelin sobrevoa Maceió

nhais, desestimulando a agressividade. Para combater os boatos que provocavam brigas e até crimes pela gravidade das desinteligências, alguns deles feitos inclusive contestando a autoridade do interventor, foi criada a Galeria dos Boateiros, em plena Rua do Comércio, onde se dizia que ficava a central das fofocas, próxima ao Bar Colombo. O mentiroso apanhado com a mão na massa tinha a cabeça raspada e sua foto colocada na Galeria, para conhecimento e execração da população. Mas houve fatos que ficaram gravados na memória da população, como os filmes mudos e os primeiros falados, que emocionavam e divertiam.

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O Fim da Guerra e a Redemocratização de 45 A

guerra chegou ao fim com a rendição da Alemanha. Igualmente aconteceu o fim da ditadura Vargas. Mas na eleição para governador, os Góis Monteiro ainda mandam. Silvestre Péricles é eleito. A Rádio Difusora é uma conquista do mandatário na sua gestão tumultuada. A capital é saneada no Centro, o sistema de água encanada é instalado e novidades políticas surgem com a derrubada do presidente Getúlio Vargas. Juntam-se os antagonistas udenistas e comunistas, de formação ideológica opostas, numa frente ampla para derrubar o inimigo comum: a família Góis Monteiro, que vinha dirigindo o estado desde a Revolução dos Tenentes, em 1930. Um comício histórico junta PCB e UDN; Rui Palmeira, liberal, candidato a governador, e Luís Carlos Prestes, aspirante a senador pelos marxistas. Foi uma época de muita inquietação e sobressaltos na capital, de ataques aos estudantes, intimidação policial e comícios gigantescos no Parque Gonçalves Ledo, na Praça do Pirulito e na Rua do Comércio. Boletins e jornais provocadores faziam a catarse da democracia após anos de regime ditatorial. Depois de tanto tempo rigidamente controlada, a política voltava a entusiasmar como uma febre a população maceioenses, desejosa de participar do processo eleitoral. Uma grande tragédia marcou também a vida local quando uma tromba d’água caiu sobre a cidade, soterrando casas e matando muitas famílias nas imediações da Escola Técnica, atual Ifal, próximo ao Centro. Os primeiros assentamentos urbanos começam a ter densidade. O primeiro deles, que rece-

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General Mascarenhas de Moraes com oficiais americanos

beu a denominação de favela, situou-se nas dunas do Sobral, absolutamente despovoado - o Ouricuri. Os despossuídos espalham-se nas beiras das lagoas e descem as grotas. Prenúncio de um imenso cinturão delas que vai envolver a antiga vila de Sebastião de Melo e Póvoas. A população se diverte nos logradouros públicos nas rodas gigantes, nos cavalinhos, nos animados pastoris e outros folguedos natalinos. O jogo do bicho financiava não só obras públicas, como a Rádio Difusora, mas também as campanhas, inclusive os agitados comícios da época.

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O Gogó da Ema U

m coqueiro esquisito tornou-se alvo das atenções gerais e atraía turistas para ver, na praia, sua estranha forma emoldurando a bela orla de Maceió. A princípio ninguém lhe dera atenção. Ficava escondido no lugar. Mas alguns curiosos pulavam a cerca do sítio de Francisco Venâncio, o Chico Zu, arriscando-se, para vê-lo de perto, a ser mordidos pelos cães ou a levar chifrada de algum boi mal-humorado. A notícia se espalhou e o lugar passou a ser frequentado. Foi tema não só da admiração dos visitantes e dos locais, mas tema constante de canções e poesias. Ficava na Praia de Ponta Verde, um local afastado do Centro. Sua foto era divulgada por todo o Brasil. Com o progressivo avanço do mar, o amado Gogó da Ema, o famoso coqueiro torto maceioense, foi caindo aos poucos até tombar de vez, apesar de todas as tentativas de agrônomos e especialistas para reerguê-lo. Mauro Mota, importante poeta pernambucano, escreveu rendendo-lhe homenagem: “Paramos agora diante do Gogó da Ema. Está de pé, mas está seco e morto. Toda a proteção de cordas, cimento e barreiras foi póstuma. Não ressuscitou o coqueiro, que era um monumento vegetal. Compôs-lhe o mausoléu”. O coqueiro-símbolo caiu em 1955, mas foi socorrido e replantado com o apoio de um guindaste. Foi substituído como cartão-postal pelos Sete Coqueiros, na Pajuçara.

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Gogó da Ema, coqueiro que se tornou símbolo da capital alagoana

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O Primeiro Prefeito Eleito, em 1953 U

m fato a ser destacado nessa nova fase política foi a eleição do primeiro prefeito constituinte de Maceió, em 06 de outubro de 1953, uma vez que os intendentes antes, e os prefeitos depois, eram nomeados pelo governador. Nesse memorável pleito para a história política da capital, sagrou-se vencedor o coronel da Polícia Militar José Lucena Maranhão, que tinha sido antes prefeito de Santana do Ipanema e ficou famoso por ter comandado as volantes que combateram e liquidaram Virgulino Ferreira, o famoso Lampião, e seu bando de cangaceiros. Prédio da Intendência Municipal

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As Surpreendentes Mudanças dos Anos 50 Bela Vista Palace Hotel

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década de 50, que começou com a surpreendente vitória do liberalismo udenista sobre o populismo silvestrista, registrou importantes mudanças em outros campos. Na questão populacional, por exemplo, Maceió vai ser o emblema dessas modificações com o vertiginoso crescimento urbano e a migração de numeroso contingente de pessoas do interior, pulando para 121.000 habitantes. O cosmopolitismo e os ventos da transformação nacional chegam até aqui. A capital vai dei-

xando de ser rural e conservadora, bucólica e tranquila, e torna-se mais trepidante e aberta aos novos costumes que vão aparecendo. A influência francesa que afetava as pessoas mais cultas cede lugar ao prestígio da cultura norte-americana, conectada com as invenções surgidas, mais descontraída e menos sofisticada que a anterior. O ensino da língua inglesa aumenta, enquanto as referências culturais francesas vão cedendo à nova liderança mundial surgida no após guerra.

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A Novidade do Banho de Mar e a Praia das Acanhadas Banhistas em praia de Maceió na primeira metade do século XX

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o mesmo local onde existia o coqueiro festejado começa uma novidade que vai se tornar uma coqueluche municipal. Desde a era colonial, passando pela imperial e a republicana, ninguém dava atenção aos banhos de mar. A novidade tida como esquisitice portuguesa veio com a transferência da corte de dom João VI para o Rio de Janeiro, mas não foi adiante. Era prescrita pelos médicos como remédio, e só. O hábito começa a aparecer em meados do século XX. Inicialmente mais concentrada na Praia da Avenida da Paz, de areias alvas e com um Salgadinho límpido, sem nenhuma poluição. Mas na mesma beira-mar do coqueiro pop as pessoas se juntavam para fazer piqueniques - também conhecidos como convescotes - com as suas famílias, tomar banho e apreciar o admirável visual marinho. A preferência era das moças que não queriam, por recato, ser vistas tomando banho com seus camisolões, mesmo com nada descoberto. A atual Ponta Verde passou a ser conhecida como a Praia das Acanhadas, como descreveu o cro-

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nista Humberto Gomes de Barros. A escritora Simone Cavalcante descreve a transformação do antigo areal e sítio do Chico Zu em bairro moderno e cheio de edifícios. A Ipanema da capital, a sua zona mais requintada, com IDH dinamarquês e suíço em contraposição ao do Haiti e do Gabão registrado nos bairros mais pobres, nas favelas. “Passaram os anos, ao sabor das marés, do vento nordeste e da ação humana, a paisagem foi se modificando, os imensos coqueirais cederam lugar à urbanização acelerada.” Tornou-se o metro quadrado mais caro da Maceió. As palhoças de pescadores, os areais e os infindáveis coqueirais foram substituídos por incontáveis construções; as jangadas e os currais escassearam. Surgiram bancos, estabelecimentos comerciais e o que há de mais avançado na civilização urbana do século XX. A cidade que nasceu do porto e caminhou para o Comércio e Bebedouro, retornou inicialmente para as proximidades de Jaraguá e depois foi avançando em direção a Cruz das Almas e ao norte.

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O Episódio do Impeachment Abala a Política C

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omo na canção de Mercedes Sosa, tudo cambia e as mudanças vão se sucedendo. No patrimônio, prédios antigos como o Palácio Velho e o formoso Hotel Bela Vista são derrubados para dar lugar a empreendimentos imobiliários; surgem novas referências como o Edifício Breda, o primeiro a ser erguido na capital, e o Edifício São Carlos, o primeiro arranha-céu residencial de uma série que será infindável. Casas modernistas ganham páginas em revistas nacionais, bangalôs começam a povoar o Farol. A Praça Moleque Namorador é construída como homenagem a um passista que encantava as plateias com sua arte. Finalmente, na política e na administração vive-se uma dramática experiência com a ascensão do populismo representado pelo governador Muniz Falcão. Pela primeira vez um governo saído das entranhas da massa ousa confrontar-se com as elites, a aristocracia estadual, que secularmente controlam as rédeas do poder local. Na sexta-feira 13 de setembro de 1957, Maceió foi notícia internacional em função de um conflito entre poderes que ficou conhecido como a tragédia do impeachment alagoano. Os holofotes das atenções nacionais voltaram-se para a Assembleia Legislativa local, com a presença de altas personalidades da política brasileira. Estava em votação o impedimento do governador Muniz Falcão no parlamento estadual quando foi deflagrado violento tiroteio entre deputados situacionistas e da oposição, trans formando o prédio da Praça Pedro II em verdadeiro campo de guerra, deixando

a cidade conflagrada e atônita com a tensa crise política, que terminou com uma intervenção assinada pelo presidente Juscelino Kubistchek. Depois de uma batalha judicial, houve o retorno triunfal do governador. O episódio nunca foi esquecido, pois rendeu prêmios de jornalismo e sequelas além da política local, sendo referência constante na política nacional. Em 1960 é eleito o major Luiz Cavalcante, oponente de Arnon de Mello, que foi opositor de Silvestre Péricles. Este último venceu

Deputados e militares momentos antes do tiroteio no interioir da Assembleia Legislativa

em Maceió pelos votos da chamada “poeira de ouro”, assim chamados por ele os seus eleitores dos bairros periféricos de Maceió. Um radialista paraibano de nome Sandoval Caju é eleito prefeito de Maceió e atrai o eleitorado populista com seus chistes engraçados e seu amor pelas praças que constrói sempre com um S a emoldurá-las.

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As Vilas Operárias, o Voto Urbano e as Universidades U

ma das transformações ocorridas a partir da década de 50 foi a igualdade de votos entre as populações rural e urbana, com a última cada vez mais ganhando da primeira. Um eleitorado que se firma com independência, com a rebeldia do chamado voto de cabresto, encontrado principalmente nas vilas operárias da capital e do interior. Alexandria, Fernão Velho e Saúde fazem parte desse eleitorado, passando a ser um peso importante nas eleições estaduais. São os votos da famosa Terceira Zona eleitoral. Foram elas que sustentaram o movimento populista e deram a vitória a Muniz Falcão em 1957, por margem mínima de votos, é verdade, mas constituíram uma revolução eleitoral. Deve-se registrar, também, que o movimento sindical que ressurgiu no fim da década de 40 tem uma história de lutas bem mais antiga, já que as primeiras greves surgiram no começo do século passado, uma delas portuária, que paralisou Jaraguá. Por outro lado, a existência de uma classe média mais fortalecida, a concentração de professores, estudantes e intelectuais e a criação da Universidade Federal de Alagoas em 1961, com um contingente de massa crítica mais atuante, ajudaram a formar na capital aquilo que se denomina opinião pública. Gente menos comprometida com os coronéis donos da vida e da morte das pessoas. A consolidação desse universo acadêmico se amplia com a criação mais adiante de uma rede de ensino médio com a Campanha de Educandários Gratuitos, nome depois mudado para Comunidade. O mesmo sacerdote, padre Teófanes Augusto de Barros, que já havia ajudado na criação da instituição federal de ensino,

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São Miguel dos Campos, antiga Fábrica de Tecidos Vera Cruz

funda o Centro de Estudos Superiores de Maceió-Cesmac, em 1971, que proporcionou condições para que os trabalhadores sem acesso ao ensino universitário ministrado durante o dia, pudessem estudar no período noturno, após a jornada de trabalho. Alguns anos antes, outra unidade de ensino público, desta feita no âmbito estadual, é criada em 1967, numa memorável luta empreendida pelos familiares e seus filhos, os estudantes chamados excedentes, que foram aprovados no vestibular federal mas não obtiveram vagas, que eram limitadas. Era a Escola de Ciências Médicas que hoje é a Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas-Uncisal.

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Nova Perda de Autonomia C

om o advento do regime militar de 1964, a população maceioense deixou de escolher de novo seu dirigente pelo voto. O último prefeito eleito foi Divaldo Suruagy, em 1966, que governou até fevereiro de 1970. Antes, os militares conseguiram a cassação, pela Câmara Municipal, de Sandoval Caju, em maio de 1964, e deram posse do vice, Vinicius Cansanção. Sandoval era um prefeito que sabia exercer bem a arte de comunicação com o povo e deixou muitas praças construídas. Suruagy, por sua vez, começou a edificação dos primeiros conjuntos habitacionais populares, como o de Cruz das Almas e o do Jacintinho; reorganizou a educação com a Fundação Educacional do Município de Maceió-Femac e alçou voos mais altos, chegando ao governo do estado por três vezes e exercendo um domínio de mais de três décadas na política alagoana, superando Euclides Malta, Fernandes Lima e os Góis Monteiro. A experiência da capital com prefeitos eleitos diretamente pelo voto popular é cur-

ta em relação aos alcaides nomeados desde a proclamação da República, em 1889. O primeiro foi Ricardo Brennand Monteiro, em 1890, republicano histórico, membro da Junta Governativa que substituiu o último presidente de província do Império, e os últimos foram Ernadi Teixeira Bastos e o coronel Crisanto de Carvalho, em 1925. Foram ao todo 24 intendentes municipais, como eram chamados. O primeiro prefeito, igualmente nomeado pelo governador, só mudando, portanto, a denominação, foi Moreira e Silva, em 1925. Mais duas dezenas de gestores municipais até a eleição de José Lucena de Albuquerque Maranhão, o famoso Coronel Lucena, com mais cinco prefeitos eleitos e nova interrupção após o mandato de Divaldo Suruagy, em 1970, readquirindo Maceió a sua autonomia eleitoral em 1986 com a eleição de Djalma Falcão, em acirradíssimo pleito disputado voto a voto com João Rodrigues Sampaio Filho, no período da chamada abertura democrática.

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A Resistência de uma Época de Medo O

longo período que vai de 1964 até o início da década de 80 foi uma época de medo e de incertezas. A radicalização política e ideológica, produto da guerra fria que vivia o mundo desde 1945, chegara ao Brasil e Maceió não escapou do clima incandescente. A deposição do presidente João Goulart e a tomada do poder pelos militares contou com parcela expressiva da opinião pública - Igreja, imprensa, empresários e classe média - e a capital assistiu nas ruas centrais a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, apoiando o golpe contra o fantasma do comunismo. Do outro lado, as associações sindicais, o Comando Geral dos Trabalhadores-CGT, intelectuais, entidades estudantis e a esquerda representada por intelectuais contestadores. As classes rurais armaram-se na Praça Sinimbu, com políticos do governo estadual visando impedir a vinda de Miguel Arraes para realizar um comício a favor das reformas e do presidente João Goulart. Os militares venceram em 31 de março e as tensões permaneceram por anos a fio. O regime ditatorial enfraquecia a oposição, que persistia. Muros da cidade são

pichados com palavras de ordem; grêmios e diretórios estudantis são vigiados. Maceió resistia com a juventude, os jornais alternativos e as lideranças sindicais. A Igreja Católica, agora com nova postura, a Ordem dos Advogados do Brasil-OAB, os órgãos estudantis, os partidos proscritos, a Sociedade dos Direitos Humanos, as Associações dos Moradores que são criadas, assim como os núcleos femininos, passam a oferecer um contraponto à violência, à falsa unanimidade oficial e à falta de democracia. Os movimentos sociais surgem como esperança de novos dias. Nas eleições municipais de 1982, o Movimento Democrático Brasileiro-MDB, partido que contesta a situacionista Aliança Renovadora Nacional-Arena, elege uma forte representação para a Câmara de Vereadores, ajudando ainda na eleição para a Assembleia Legislativa de vários nomes comprometidos com a democracia. Logo em seguida, no retorno da autonomia municipal, com a consolidação da abertura política no país, elege o prefeito de oposição, o irmão do governador Muniz Falcão, historicamente comprometido com a vertente populista, o deputado Djalma Falcão.

Revolução de 1964, movimentos maciços nas ruas

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A Televisão Insere Maceió na Aldeia Global A

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televisão espalhou-se pelo país após o movimento militar de 1964. No começo ela perdia para o cinema e o rádio devido à dificuldade da população em adquirir as telinhas. Mas a partir da década de 70 ela ocupou lugar de preeminência no universo comunicacional, passou a impor hábitos, a influir na política, na economia, na educação. Maceió foi inserida no fascinante mundo da televisão. A mídia passou a fazer parte das duas dimensões culturais da vida cotidiana - o real e o imaginário -, integrando-as em produtos sincréticos e ao mesmo tempo tornando-os acessíveis aos bolsões populacionais desprovidos de escolaridade maior, que passam a pautar suas escolhas pelo que veem e ouvem na telinha. Ela não expulsa o rádio, integra-se com ele e oferece uma janela para o mundo. Doravante o maceioense fará suas escolhas eleitorais influenciado pelo que assiste nos horários eleitorais, e não mais nos gigantescos comícios a que comparece nas praças e largos da capital. A eleição do pleito municipal que Djalma Falcão disputou com João Sampaio, em 1985, por exemplo, foi decidida pela televisão nos últimos dias da campanha. Muita gente prefere assistir o jogo de futebol em casa ao invés de ir ao Trapichão. Da mesma forma, as novelas inviabilizam muitos programas oficiais, sociais e culturais fora do horário de seus capítulos. Ao ser inaugurada a TV Gazeta, Canal 7, em 27 de setembro de 1975, os maceioenses viram a abertura de um novo ciclo de comunicações no estado. A mesma organização que trouxera o novo veículo apresentava o pioneirismo e o arrojo como marca de sua atuação na

O senador Arnon de Mello, à esquerda na foto, no momento da inauguração da TV Gazeta, que inseriu Alagoas no circuito televisivo nacional

imprensa local, desde a impressão colorida no jornal do grupo empresarial, e depois o aceso à internet e a interação da plataforma multimídia em plena era digital. Em seguida vieram a TV Alagoas, a TV Pajuçara, e as TVs a cabo, complementando o importante ciclo aberto em 1975. Ficavam no passado as dificuldades e a instabilidade que marcaram a captação de uma imagem de TV em Alagoas, vinte e cinco anos depois que Assis Chateaubriand trouxera o instrumento para o Sul do país. O senador Teotônio Vilela, saudando o senador Arnon de Mello responsável pela grande realização, afirmou que “A terra tem agora a sua voz e a sua imagem. Pode se ver no mesmo espelho em que se vêm as terras importante. Isso é progresso, é desenvolvimento, é cultura”.

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Presença das Mulheres na Ribalta Política O

final do século XX foi agitado no burgo das águas. A população manteve-se fiel à tradição irredenta, de vanguarda, das mudanças sociais do estado, iniciadas com a mudança da capital em 1839. Destaque-se a visibilidade adquirida pelos movimentos negro, indígena, gay, dos deficientes físicos, que ganham força e defendem seus direitos, obrigando autoridades e sociedade a ouvir seus justos reclamos. Dê-se realce ainda para o protagonismo da Ordem dos Advogados do Brasil, entidades feministas, comissões de Direitos Humanos e de Combate à Corrupção e, sobretudo, para o Movimento sem Terra- MST, que, pregando a reforma agrária e assentamentos, faz regulares passeatas pelas rua da cidade, trazendo muito incômodo e reação dos que se julgam prejudicados. Há a destacar também a eleição para a Prefeitura de Maceió, de Ronaldo Lessa e Heloísa Helena, políticos militante em partidos de esquerda, PSB e PT, e o movimento popular de 17 de julho de 1997, que tirou do cargo o governador Divaldo Suruagy, que estava à frente do seu terceiro mandato no Palácio dos Martírios. Isto motivou, mais adiante, a eleição de Ronaldo Lessa para o governo do estado, em uma frente de esquerda contra o candidato situacionista Manoel Gomes de Barros, que pleiteava a reeleição. Outro ponto político importante foi Fernando Collor de Mello, ex-prefeito que depois alcançou o governo do estado e daí, num lance ousado, foi eleito o primeiro presidente civil após o período militar, num pleito que enfrentou líderes como Ulisses Guimarães, Aureliano Chaves, Leonel Brizola e Luís Inácio Lula da Silva.

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O fato mais destacado do século passado, porém, foi a vitória do movimento feminista. Iniciado na década de 30 com a Federação para o Progresso Feminino, as mulheres maceioenses decidiram quebrar as cidadelas de privilégio masculino: organizaram-se em Conselhos e Associações e conseguiram importantes vitórias. Elas estão hoje em todos os setores, no Tribunal de Justiça, nas promotorias, nas prefeituras, nas câmaras, na Polícia Militar, em todas as profissões enfim. Foi eleita uma prefeita, a odontóloga Kátia Born, que conseguiu se reeleger, uma senadora, Heloísa Helena, sindicalista. Na sucessão, venceu o radialista Cícero Almeida, que igualmente foi reeleito. Atualmente o prefeito é Rui Palmeira, filho de ex-governador e neto de seu homônimo, que foi senador mas começou sua vida pública como secretário da municipalidade de Maceió na década de 30.

Rádio Difusora: o rádio exerce enorme influência sobre as pessoas, gera prestígio para os seus profissionais, entre os quais mulheres, que rompem as barreiras do preconceito

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A Praça do Centenário A

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lagoas já foi comparada a uma esfinge, dado aos seus enigmas e acontecimentos inusitados em seu território. E Maceió, como já disse o querido poeta Lêdo Ivo, “é a capital do país das Alagoas”. Pois só isso explica um fato surreal como a comemoração de um centenário muitos anos depois, exatamente dezenove anos. Estamos falando da conhecida Praça Centenário, situada no bairro do Farol, que foi inaugurada em 9 de dezembro de 1939. Entendemos que a ideia dos seus autores era festejar a transferência da capital, ocorrida naquele dia, em 1839, mas a verdadeira data da autonomia da Maceió não é a da transferência da capital, e sim a de sua elevação à condição de vila independente, de sua maioridade política e administrativa, ato que foi assinado por dom João VI, no dia 5 de dezembro de 1815. Na contramão dessa ideia, o interventor Osman Loureiro e o alcaide por ele nomeado gestor da cidade, Eustáquio Gomes de Melo, decidiram comemorar os cem anos dando o nome à praça que naquele momento era o portão de entrada da cidade. Diversas autoridades foram chamadas, entre elas o prefeito de Aracaju, Godofredo Diniz, convidado de honra para selar uma aliança entre os dois pequenos estados e suas respectivas capitais, imprensados entre dois gigantes - Bahia e Pernambuco. O dia anterior, sexta, foi feriado dedicado à Imaculada Conceição. Como foi anunciado pelo governo que sábado também seria feriado para dar maior dimensão ao acontecimento, os líderes do comércio reclamaram, pois com a prorrogação do horário de trabalho na segunda-feira, seriam pagas horas extras aos comerciários, condição exigida pelo Ministério do Trabalho para dar o aval a mudança pleiteada. A situação foi contornada.

Monumento à liberdade “emprestado” por Jaraguá – bairro onde ainda hoje está assentado – para enriquecer a festa de inauguração da Praça do Centenário

O evento ultrapassou fronteiras O mais antigo jornal da América Latina, o Diário de Pernambuco, certamente alimentado pelo noticiário do Palácio dos Martírios, publicou simpática nota em homenagem a Maceió. Entre outros elogios: “O Centenário de Maceió: os nossos vizinhos do sul comemoram no dia de hoje o centenário de sua capital. É uma data que não só os alagoanos, mas to-

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dos os povos nordestinos celebram com igual alegria, de tal modo nos sentimos com eles identificados e unidos. A cidade alagoana está destinada a ser um dos maiores aglomerados urbanos do Brasil se o Rio de Janeiro tem o cenário empolgante da Baía da Guanabara, se a Bahia tem as suas colinas e as suas igrejas, se o Recife tem os rios que o cortam em várias direções, Maceió, situada na restinga ao norte da Lagoa Mundaú, a que os indígenas no seu linguajar simbólico chamavam Paranam-guera (o que foi o mar), oferece uma das mais sedutoras paisagens que se pode contemplar neste meridiano. Só para ver a beleza de suas lagoas, sentir a graça de sua paisagem, com os seus infinitos coqueirais, valeria a pena se deter nessa cidade, envolta numa atmosfera de tanta poesia e de tanto encantamento”. E continua nesse tom laudatório, aliás muito justo, seguindo a trilha de tantos e tantos depoimentos, inclusive de famosos visitante e cronistas coloniais europeus. Uma constante dos visitantes europeus extasiados com a beleza paradisíaca da antiga Maçayok, a famosa restinga dos índios tupis. “Nenhuma urbe brasileira nos dá uma sensação tão viva de trópico, como Maceió. E nesse pedaço de trópico brasileiro vem se erguendo uma civilização que merece nossa mais viva simpatia. O seu movimento associativo, a sua imprensa, o desenvolvimento de seu aparelho educativo, as suas obras de assistência, o seu comércio, a sua indústria demonstram a capacidade criadora do alagoano, que com pequenos e limitados recursos, lutando com circunstâncias desfavoráveis, tendo de enfrentar grandes obras de saneamento e urbanismo, ainda assim pode oferecer em um século, uma demonstração positiva de seu esforço. Maceió merece todos os estímulos no dia em que se registra o seu primeiro centenário, queremos significar-lhe o quanto nos interessa o seu destino.” O texto não esconde a intenção governamental alagoana, que provocou o tradicional

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órgão de imprensa pernambucano a elogiar o pseudo centenário da cidade, em mostrar que a interventoria local e sua prefeitura estavam unidas no objetivo de mostrar serviço e inserir-se no espírito do regime ditatorial varguista, de um Brasil grande, que celebrava festas cívicas e deixava a população com uma sensação de pertencimento e de orgulho por sua cidade, seu estado e seu país. Era o espírito da época, uma era tumultuada, de regimes fortes, autoritários, e de grandes embates ideológicos, nazismo, fascismo, comunismo e do outro lado o liberalismo, que redundaram na II Grande Guerra. Festejar as datas marcantes, os vultos ilustres, os heróis e a história oficial são exemplos para a sociedade, especialmente para a juventude. Em 1932 o mesmo interventor Osman Loureiro, homem culto e ligado à família Góis Monteiro, que detinha a hegemonia política em Alagoas, já havia inaugurado no local o que seria o início da praça - uma escola homenageando o extraordinário pensador Aureliano Cândido Tavares Bastos. Começava a ocupação do bairro alto com a construção de habitações modernas, os bangalôs da classe mais abastada e a praça seria uma contribuição a essa nova trajetória da vida urbana e o prestígio social do novo bairro que a cidade agora via surgir com força. Até a Estátua da Liberdade, outrora tão celebrada pelos maceioenses, no Cais do Porto, na Praça da Recebedoria, foi retirada do bairro de Jaraguá e levada para brilhar no espelho d água do novo largo da urbe como grande atração do novo logradouro. A programação foi variada e cheia de atrações. Todos os órgãos de imprensa circularam no sábado com reportagens e notas, com fotografias e depoimentos alusivos à grande data. Iniciada com uma missa campal logo cedo pelo arcebispo católico dom Ranulfo Farias, realizada na Praça dom Antônio Brandão, em frente ao Seminário. Houve inauguração da pavimentação da Avenida Moreira e Silva e

da Praça Sergipe. Desfile das Forças Armadas com a tradicional presença de estudantes das escolas públicas e particulares. À tarde, o prefeito Eustáquio Gomes de Melo ofereceu em sua residência um coquetel à imprensa e convidados concedeu entrevistas aos jornalistas presentes. Em seguida, todos foram para o Teatro Deodoro, a joia mais reluzente da cultura alagoana, onde inauguraram uma exposição de fotos e livros de autores locais. Ato contínuo, assistiram palestra do professor e advogado dr. Guedes de Miranda, conhecido, por seus dotes oratórios, como o Demóstenes alagoano. O programa da noite foi o banquete oficial oferecido às autoridades, com saudação especial ao Prefeito de Aracaju e ao interventor Osman Loureiro. A parte final foi um animado baile no Clube Fênix Alagoana, onde os concluintes da Faculdade de Direito faziam sua festa. Ainda no domingo a programação continuou com um disputado torneio de futebol entre Alagoas e Sergipe, vencido pelos visitantes, e no Instituto Histórico e Geográfico houve apresentação de um conjunto musical feminino, regido pelo intelectual Luiz Lavenére. E assim a Praça do Centenário, como passou a ser chamada, foi inaugurada e os maceioenses viram passar fora de época os seus 100 anos de história.

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BIBLIOGRAFIA AZEVEDO, João (org.) Documentário das Comemorações do Cinquentenário do Grêmio Guimarães Passos. Maceió: Ufal, 1979 BARROS, Theodyr Augusto. O Processo de Mudança da Capital. Maceió: Ufal, Departamento de História, 1990 CALVINO, Italo. As Cidades Invisíveis. SP: Companhia das Letras, 1990 CRAVEIRO COSTA. História das Alagoas, reed. Maceió: Secretaria de Educação, 1983 ---------------. Maceió, reed. Maceió: Ed. Catavento-Femac, 2001 JAMBO, Arnoldo. Um Tempo de Maceió. Maceió: Ed. Catavento, 1998 LEITE JÚNIOR, Bráulio. Histórias de Maceió. Maceió: Ed. Catavento, 2000 LIMA JÚNIOR, Félix. Igrejas e Capelas de Maceió. Chesf,1965 MUNFORD, Lewis. A Cidade na História. BH: Ed. Itatiaia, 2002 OLIVEIRA, José Alberto Saldanha. A Mitologia Estudantil. Maceió: Sergasa, 1994 QUEIROZ, Álvaro. Episódios da História das Alagoas, 2ª. ed. Maceió: Ed. Catavento, 1999 ROCHA, Cyro. Na Estrada dos Passos Perdidos. Curitiba: HD Livros, Curitiba, 1997 SANT’ANA, Moacir Medeiros de. História do Modernismo em Alagoas. Maceió: Edufal, 2003 TENÓRIO, Douglas Apratto. A Tragédia do Populismo, 2ª. ed. Maceió: Edufal, 2007 ------------. A Casa das Alagoas. Maceió: Edufal, 2007 WANDERLEY, Olavo Augusto C. (org.) Maceió, 180 Anos de História. Maceió: Prefeitura de Maceió/Instituto Théo Brandão, 1998

Intendentes Municipais de Maceió

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1 Bel. Ricardo Brenand Monteiro - 1890 2 Napoleão Goulart - 1890 3 Dr. Manuel Eugênio do Prado - 1891 4 Ten. Cel. Antonio Pereira Caldas - 1891 5 Ten. Cel. Joaquim José de Araujo Lima Rocha - 1892 6 Bonifácio Magalhães da Silveira - 1892 7 Bel. Antonio Francisco Leite Pindaliba - 1893 8 Ten. Cel. Joaquim José de Araújo Lima Rocha - 1894 9 Clarêncio da Silva Jucá - 1897 10 Farmacêutico Antonio José Duarte - 1899 11 Engenheiro José de Barros Wanderley de Mendonça - 1901 12 Joaquim José de Araújo - 1903 13 Cel. José Rody Braga - 1904 14 Dr. Manoel Sampaio Marques - 1905 15 Engenheiro Antonio Guedes Nogueira - 1907 16 Bel. Demócrito Gracindo - 1909 17 Bel. Luís de Mascarenhas - 1911 18 Farmacêutico Firmino de Aquino Vasconcelos - 1913 19 Bel. Ignácio Uchôa de Albuquerque Sarmento - 1915 20 Farmacêutico Firmino de Aquino Vasconcelos - 1917 21 Bel. Leonino Correia de Oliveira -1919 22 Farmacêutico Firmino de Aquino Vasconcelos -1921 23 Dr. Ernandi Teixeira Basto -1923. Passou o governo do município ao cel. Crisanto de Carvalho a 8 de novembro de 1924, encerrando a Era dos Intendentes, denominação que vinha desde o Império.

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Prefeitos de Maceió 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41

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José Moreira da Silva Lima – Moreira Lima - 1925/1927 Anfilófio Jayme de Altavila Melo - 1927/1928 Ernandi Teixeira Bastos - 1928 José Carneiro de Albuquerque - 1928/1930 Antonio Baltazar de Mendonça - 1930/1933 Orlando Valeriano de Araújo - 1933 Alfredo Elias da Rocha Oiticica – 1933/1934 Edgar de Góis Monteiro -1934/1935 Álvaro Guedes Nogueira - 1935/1936 Cipriano Jucá -1936 Eustáquio Gomes de Melo - 1937/1941 Francisco Abdon Arroxelas - 1941/1945 Antonio Mário Mafra - 1945 Reinaldo Carlos de Carvalho Gama - 1945/1948 JoãoTeixeira de Vasconcelos - 1948/1950 Luiz Campos Teixeira - 1950/1951 Joaquim de Barros Leão - 1951/1952 José Lucena de Albuquerque Maranhão - 1953/1955 Cleto Marques Luz - 1955 Abelardo Pontes Lima - 1955/1960 Manoel Valente de Lima - 1960/1961 Sandoval Ferreira Caju - 1961/1964 Vinicius Cansanção Filho - 1964/1966 Divaldo Suruagy -1966/1970 Henrique Equelman – 1970/1971 Juvêncio Calheiros Lessa - 1971 João Rodrigues Sampaio Filho – 1971/1975 Dilton Falcão Simões - 1975/1979 Fernando Afonso Collor de Mello - 1979/1982 Corinto Onélio Campelo da Paz - 1982/1983 José Bandeira de Medeiros - 1983/1986 Djalma Marinho Muniz Falcão - 1986/1989 Guilherme Gracindo Soares Palmeira - 1989/1991 João Rodrigues Sampaio Filho - 1991/1992 Pedro Vieira da Silva - 1992 Ronaldo Augusto Lessa Santos - 1993/1996 Katia Ribeiro Born - 1997/2000 Katia Ribeiro Born - 2001/2004 (reeleita) José Cícero Soares de Almeida - 2005/2008 José Cícero Soares de Almeida - 2009/2012 Rui Soares Palmeira - 2013

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Maceiรณ, a cidade e o porto

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A ECONOMIA

Cícero Péricles de Carvalho Doutor em Economia pela Universidade de Córdoba, Espanha. Professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (Feac) da Universidade Federal de Alagoas-Ufal, autor de vários livros sobre a economia alagoana.

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Os desafios de Maceió no século XXI Capítulo VI

A busca da qualidade de vida

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M

aceió é uma das mais belas capitais brasileiras, conhecida como o “paraíso das águas”, um dos destinos mais procurados pelo turismo nacional. É, também, o 41º município mais rico entre os 5.570 existentes no Brasil, porque concentra em seu território metade da produção econômica de Alagoas. Em 2014, antes mesmo de completar o seu segundo centenário como cidade, ultrapassou o simbólico número de um milhão de habitantes, centralizando metade da população urbana do estado, ocupando o 17º lugar na lista das cidades mais populosas do país. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Maceió possui o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,721, o mais baixo entre todas as capitais, ocupando o 1.266º lugar entre os municípios brasileiros; ainda assim, por ficar acima do valor 0,700, é considerado de “alto desenvolvimento” pelos padrões da ONU. Mesmo com seus aspectos favoráveis nos planos comparativos – com seu patrimônio natural, histórico e cultural – e competitivos, a exemplo da especialização setorial no turismo, que transformou a cidade num dos mais demandados destinos no Nordeste, Maceió é uma das mais desiguais e violentas cidades do Brasil. Com a riqueza mal distribuída, possui um dos maiores deficits habitacionais entre as cidades brasileiras, e nos seus bairros pobres encontramos 575 “áreas de risco” e 92 “aglomerados subnormais”, onde habita parte considerável de sua gente. A população considerada “socialmente vulnerável” representa metade do total dos moradores da cidade, que tem meio milhão de seus habitantes inscritos nos vários programas sociais federais.

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Essa desigual distribuição de renda explica o fato de Maceió ter o 5º pior Índice de Gini (0,638) entre as capitais brasileiras, índice que mede a diferença entre os estratos mais ricos e mais pobres da população. A polarização também é vista no recente estudo sobre as regiões metropolitanas realizado pelo Pnud, em 2015, no qual a capital alagoana apresenta unidades de desenvolvimento humano que refletem as gritantes diferenças de qualidade de vida. Algumas apresentam (como a Ponta Verde e o Aldebaran) o IDH de “alto desenvolvimento humano” (0,898) equivalente ao da Suécia; outras, como o Vale do Benedito Bentes, têm IDH de “muito baixo desenvolvimento humano” (0,522), menor que o de Bangladesh (0,558). A cidade atravessou uma longa e demorada construção como centro econômico. Entre os séculos XVI e XVIIII viveu seu período de formação, sendo ocupada pelas sesmarias e pelos poucos engenhos. Nesse esse espaço de tempo foram implantados em seu território, principalmente no século XVIII, os vários caminhos das exportações alagoanas. No século

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XIX, na era imperial, tornou-se vila e cidade, ganhando a disputa com a antiga sede administrativa (a cidade de Alagoas, hoje Marechal Deodoro), no privilégio de ser a capital, primeiro da província, e, depois do estado de Alagoas. Esse foi o período de sua afirmação política e administrativa. No século XX a capital se expandiu e de 36.427 mil habitantes, em 1900, apenas 5% da população do estado, chegou a 932.733 mil pessoas, um terço dessa população, em 2000. Ou seja, multiplicou seu tamanho por 26 vezes. A era republicana representou a afirmação da cidade como polo regional, por seu peso administrativo, econômico e cultural, com a ampliação de seus laços comerciais e políticos com o interior de Alagoas. E o século XXI? Este poderá ser o século da superação de sua desigualdade social e de suas áreas de pobreza extrema. A penúria de sua população, os correspondentes deficits sociais e ambientais e as arcaicas desigualdades sociais travam o desenvolvimento da cidade. Superá-los é o principal desafio para Maceió no século XXI.

O centro da cidade, com sua aglomeração humana, é o palco da economia informal

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a cidade do comércio e dos serviços F

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undada no começo do século XIX como um espaço que fazia a ligação entre a produção agroindustrial – baseada na cana-de-açúcar e no algodão, localizada no interior do estado – e seu porto exportador, Jaraguá, a capital alagoana se constituiu como uma economia de comércio e de serviços desde suas origens. As iniciativas industriais, sempre pontuais e localizadas, não geraram uma dinâmica fabril, não obstante ter-se situado em Maceió a primeira experiência estritamente industrial-urbana de Alagoas, a Fábrica Carmen, fundada em 1857 e instalada no distrito de Fernão Velho. Os antigos engenhos, presentes no território alagoano desde o século XVI, eram, até a chegada da primeira usina de açúcar, a Brasileiro, em 1892, unidades fabris estabelecidas no campo, subordinadas à atividade rural. Sem um forte setor industrial, foram a rede comercial, a burocracia estatal e o setor de serviços que moldaram o perfil urbano de Maceió. Mesmo contando, em décadas passadas, com algumas fábricas têxteis importantes (Alexandria, em Bom Parto, Santa Margarida, em Jaraguá, e o Cotonifício Nogueira, em Ipioca) e unidades de outros segmentos industriais, Maceió não assistiu à formação de um parque fabril significativo. Nas décadas finais do século XX, a presença de grandes empresas com suas instalações emblemáticas pelo porte e tecnologia, de setores distintos, como a química e a de alimentos, não gerou mais fábricas ou empresas nesses setores. Nem mesmo a tentativa de se criar um distrito fabril no Tabuleiro do Martins, a partir de 1960, realizou o sonho de uma industrialização tardia. Por décadas, a ausência de infraestrutura, os limites do setor público, a falta de capital interno

e de um amplo mercado regional, mais a forte competição industrial de outras regiões e dos estados vizinhos, impediram o intento. O resultado desse esforço cinquentenário para a industrialização local é um arranjo fabril com uma centena de pequenas e médias empresas com seis mil trabalhadores que geram um impacto relativamente pequeno na dinâmica estadual. Os grandes elementos da economia de Maceió continuam sendo o setor comercial e o de prestação de serviços, espalhados por todos os bairros, somados à burocracia estatal. O modelo de sociedade que se implantou em Alagoas é o mesmo que o Brasil conhece desde o tempo colonial, caracterizado pela concentração das terras e dos espaços urbanos, distribuição desigual da renda e indica-

Os shoppings criaram novos conceitos de consumo

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dores sociais negativos, traços estes que são mais fortes no Nordeste. Com um terço da população total do estado, Maceió tem o privilégio, desde o século XIX, de centralizar quase toda a administração federal e a estadual, além de sua própria prefeitura. São mais de noventa mil funcionários públicos vivendo na cidade. Uma em cada quatro famílias na capital tem um servidor público entre seus integrantes. Ao longo de décadas implantou-se em Maceió uma rede comercial e um setor de serviços desenhados para servirem à população da própria capital e das cidades do interior que se constituíram, desde o século XIX, num mercado permanente para a sede estadual. No século XVIII esse comércio chegava às pequenas cidades pelos caminhos de terra

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batida, as veredas pelas quais circulavam as tropas de burros, carroças e carros de boi. No século seguinte esse movimento foi ampliado por via lacustre ligando a capital e seu importante porto marítimo às cidades banhadas pelas lagunas Manguaba e Mundaú: Pilar, Marechal Deodoro, Coqueiro Seco, Santa Luzia, Satuba e Rio Largo. No final desse mesmo século a rede ferroviária, inaugurada em 1884, conectava Maceió às cidades dos vales dos rios Paraíba e Mundaú. No século XX esse vínculo se estreitava por estradas de terra batida que, depois, foram asfaltadas, chegando a todos os municípios do Estado. Essa articulação comercial entre a capital e o conjunto dos municípios formatou a rede de transportes e comunicação – estradas, ferrovia, telefonia – e ajudou a firmar o papel

Um novo modelo de consumo integrado às marcas globais

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de Maceió como centro econômico regional, que, por sua posição central, tornou-se mais atrativa para os investimentos fabris. As poucas fábricas alagoanas fora da agroindústria sucroalcooleira estão quase todas em Maceió ou na sua região metropolitana. Dois grandes símbolos da industrialização setorial, como a Braskem, na área química, e a Sococo, no setor alimentar, estão na capital. A maior concentração de fábricas – pequenas e médias empresas – está na parte alta da cidade, dentro e no entorno do distrito industrial do Tabuleiro do Martins, e no distrito de Marechal Deodoro, município que pertence à sua região metropolitana. A economia da capital, no entanto, não é composta apenas pelos modernos setores de comércio e serviços, administração pública ou mesmo de seu parque industrial. Na cidade de formação antiga, alguns setores tradicionais sobrevivem de forma ainda significativa, como a pesca e o artesanato. Herdeira de uma antiquíssima tradição de pesca artesanal, Maceió é o segundo município mais expressivo neste setor em Alagoas,

vindo depois de Piaçabuçu. É uma atividade empregadora de muita mão de obra, tanto nos bairros lagunares (Bebedouro, Bom Parto, Pontal da Barra, Vergel do Lago e o distrito de Fernão Velho) como nos litorâneos (Ipioca, Pescaria, Pajuçara e Riacho Doce). Às margens da Lagoa Mundaú ou da orla atlântica, milhares de homens extraem, anualmente, a segunda maior quantidade e a mais diversificada produção de pescado estuarino e marítimo do estado: arabaiana, atum, bagre, camarão, carapeba, cavala, dourado, maçunim, ostra, pescada, sardinha, serra, siri, sirigado, sururu, tainha, vermelho e xaréu. A comercialização é realizada quase toda na própria capital. O artesanato alagoano é, dentre os estados brasileiros, um dos mais ricos nas suas diversas manifestações culturais. O mais recente balanço do cadastro dos artesãos inscritos no Programa do Artesanato Brasileiro revela um número surpreendente: mais de 12 mil profissionais alagoanos atuam nesse mercado, realizando uma ampla produção, resultado da fusão de várias culturas presen-

Unidade da Braskem no Pontal da Barra

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tes na nossa formação. Vinculados ao comércio popular e ao turismo, milhares de trabalhadores, espalhados por todos os bairros de Maceió, produzem seus objetos de cerâmica, madeira, couro, cestaria, trançados e tecelagem manual, e movimentam unidades produtoras, fornecedores de matérias-primas, prestadores de serviços e instituições que, no seu conjunto, representam um importante segmento da economia. No município, para um total de 64,4 mil empresas formalizadas (excluindo as MEI’s), 28,4 mil são empreendimentos comerciais e 29,2 mil atuam no setor de serviços. A cidade também acolhe 6,6 mil indústrias e, na sua área rural, atuam 115 empresas do agronegócio. Praticamente, metade das empresas alagoanas – micro, pequenas, médias e grandes – está na capital. Em Maceió também está situado o principal polo turístico

do estado (hotéis, pousadas, restaurantes e agências de viagens) e o setor comercial mais importante, tanto o varejo (25,6 mil empresas) como o de distribuição atacadista (2.900 empresas). O sistema financeiro do estado está concentrado na capital – metade das agências bancárias e 40% dos correspondentes bancários. Na capital estão instaladas mais de quarenta mil micro e pequenas empresas, quase metade do total de MPE’s de Alagoas, além do segmento, cada vez mais desenvolvido, do business services (advocacia, contabilidade, marketing, propaganda, informática e consultoria financeira de médio e alto padrão), presente com suas modernas torres de escritórios e condomínios empresariais. Com o somatório de todas as condições citadas, em 2012 a capital produzia 46,4% da riqueza estadual, o que trouxe um problema crônico: Planta industrial da Unidade da Braskem no Pontal

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por ter mais vantagens competitivas, como a melhor infraestrutura, localização, uma presença mais definida do setor público e um mercado consumidor mais amplo, a cidade continua atraindo mais empreendimentos e ampliando a centralização da riqueza regional em seu território. A falta de alternativas no interior do estado e a dinâmica econômica municipal, um pouco superior à média estadual, vêm penalizando Maceió com uma forte migração rural (direta do campo) e deslocamentos populacionais das pequenas cidades alagoanas em sua direção. O município conhece esse processo de urbanização desde 1839, quando da transferência da capital da província de Alagoas e de sua transformação em sede política e administrativa, e sofreu uma ampliação acelerada nas quatro últimas décadas do século XX, quase quadruplicando sua população. A cidade que em 1900 contava tão somente com 5% dos alagoanos, cresceu rapidamente, alcançando

atualmente quase um terço dos habitantes do estado. Nesse mesmo processo, Maceió foi também “ruralizada” pela presença massiva de uma população originária do campo alagoano, que trouxe suas práticas e valores, influenciando o cotidiano em bairros inteiros. Desde a que se tornou capital, a cidade se transformou num município – polo com influência regional. Dada a importância adquirida ao longo desse período, pelo seu peso populacional e econômico, pode-se afirmar que o desenvolvimento de Alagoas passa, obrigatoriamente, por Maceió. O Mapa de Influência das Cidades (2012), elaborado pelo IBGE, no qual se destaca a presença da rede comercial e de serviços, aliada à centralidade da sede político-administrativa, revela uma relação estreita entre a capital e o universo das localidades interioranas, demonstrando, com clareza, o alcance dessa presença econômica e política de Maceió no território de Alagoas (ver mapa).

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A economia informal A

capital alagoana, entre as décadas de 1960 e 1980, com o apoio de muitos investimentos federais, conheceu um ritmo de crescimento econômico significativo. Registram-se nesses anos a instalação, em seu território, de uma unidade química da Braskem; a inauguração ou ampliação de algumas fábricas, tanto no Distrito Industrial do Tabuleiro como fora dele; a modernização do Porto de Maceió, com a instalação do terminal açucareiro; a construção de vários conjuntos habitacionais populares com recursos do então Banco Nacional da Habitação (BNH), secundados pela

Cohab e Ipaseal, que duplicaram o espaço urbanizado da cidade; o começo das obras da rede de saneamento básico (que atende atualmente a 32% da população da capital); a ampliação da sistema de abastecimento d´água; a abertura de vias de transportes como a Leste-Oeste, o Dique Estrada e a Via Expressa, conectando partes da cidade; a ponte sobre a Laguna Mundaú, permitindo a ligação direta da capital com o Litoral Sul; a urbanização e a iluminação da parte da orla marítima que vai do Centro a Cruz das Almas; a construção de equipamentos modernos (para a época) como o Aeroporto dos O artesanato tem forte apelo turístico

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Palmares, o mercado da Ceasa, a rodoviária intermunicipal e a ampliação da rede hoteleira, que se deslocou do Centro de Maceió para os bairros litorâneos, padrão que se mantém até hoje. Nesse mesmo período, outro aspecto chama a atenção: o ritmo da migração que chega do interior do estado. Uma cidade que tinha 170 mil habitantes em 1960 passou para mais de um milhão de pessoas em 2014. Foi um acelerado crescimento populacional para um município que tinha frágil infraestrutura urbana, poucas alternativas econômicas de ocupação dessa mão de obra, além das limitadas condições financeiras da prefeitura da capital e da máquina estadual. A população não parou de crescer. Maceió, que em 1960

abrigava menos de um quinto da população do estado, passou a representar, no século XXI, o local de moradia de um em cada três alagoanos. Ao longo dos anos 1990, o ritmo de crescimento econômico das décadas anteriores, centrado em muitas obras de engenharia, foi quebrado, no plano nacional, pelos efeitos da recessão econômica, denominada “década perdida”, e, no âmbito estadual, por uma crise fiscal que se prolonga até hoje. Nesse período, os outros estados nordestinos não vivenciaram uma crise fiscal como a que passou a máquina pública de Alagoas, nem suas capitais conheceram taxas tão altas de crescimento populacional como as de Maceió. Como resultado, a ci-

Sol e mar, a receita que sustenta o setor de turismo

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dade registrou, em 2010, pela terceira década seguida, o mais baixo IDH de todas as capitais, ficando numa desconfortável colocação (1.266º) entre os 5.570 municípios do país, mesmo sendo o 41º com a maior economia (PIB de 2012). Maceió reproduz a dinâmica característica de uma região subdesenvolvida e, por isso, possui uma economia tomada de paradoxos. No mesmo espaço econômico, comandado por um moderno setor comercial e de serviços, algumas plantas industriais modernas (a maior indústria de cloro e soda cáustica da América Latina, um distrito industrial dominado por pequenas e médias unidades fabris e a maior beneficiadora de produtos de coco do mundo), registra-se a presença da economia informal, com seu universo de pequenas empresas, de caráter familiar, de baixa produtividade, com a in-

corporação de pouca tecnologia e limitado raio de ação. Por sua vez, a parte urbanizada do município, que possui um altíssima densidade demográfica (1.900 habitantes/ km², quando a de Alagoas é de 120 habitantes/km²), assiste um rápido processo de verticalização, convivendo com uma expressiva área rural, espalhada em mais da metade de seu território (285 km² dos 503 km² da área municipal), ocupada por canaviais destinados à produção de açúcar e álcool nas fábricas localizadas em Maceió (Cachoeira do Meirim) e municípios vizinhos (Leão e Santa Clotilde); e com pastos para a criação de um rebanho leiteiro cuja produção é voltada para duas unidades industriais do setor de laticínios. Maceió possui uma economia baseada na imensa rede de serviços e comércio que são os grandes empregadores da mão de obra local, tanto no setor formal, com trabalhadores de carteira assinada ou contrato jurídico, como os ocupados na economia informal. No setor informal (cujas empresas ou trabalhadores não possuem vínculos nem registros formais com a previdência, prefeitura, estado ou União), está um grande conjunto empresarial organizado em torno das unidades de porte pequeno ou micro, empresas com pouca tecnologia, de caráter familiar, apresentando, por sua vez, baixa produtividade. Ruas inteiras e parte dos bairros periféricos têm nessas atividades a sua razão de sobrevivência econômica. A imensa economia informal convive, em todos os bairros, com parte da economia formal, esta última em tamanho menor e mais rica, possuindo setores modernos e competitivos no plano regional nordestino. 117

Uma cidade de eventos esportivos

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57% da economia alagoana estão na região metropolitana E

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m Alagoas, a concentração populacional e da economia na capital são muito maiores que a média nacional e até mesmo do que a nordestina. Ocupando apenas 7% do território, os doze municípios da Região Metropolitana de Maceió (RMM) centralizam 42% da população alagoana e 57% da riqueza do estado (2012). Do total de 29,5 bilhões de reais do Produto Interno Bruto (toda a riqueza criada em um ano), de Alagoas, R$17 bilhões foram gerados na cidade de Maceió e municípios vizinhos. A explicação é relativamente simples: nas doze localidades da área centralizada pela capital estão concentradas as poucas indústrias do estado, o setor de serviços mais dinâmico, o maior polo turístico, os ativos setores da construção civil e do comércio e parte da agroindústria voltada para a exportação. Nos anos 1990-2000, o fenômeno da criação ou do deslocamento da riqueza para outros municípios, principalmente por meio da “interiorização” de indústrias, comum em outros estados, não ocorreu em Alagoas, pelo contrário, o município de Maceió, com 46,4% do PIB estadual, ampliou seu índice de concentração, que é atípico mesmo para o Nordeste. A cidade ficou distante das capitais menos centralizadoras das riquezas estaduais, a exemplo de São Luís, com 41% do PIB do Maranhão; Aracaju, que representa 35% do PIB de Sergipe; de Natal, 33% do PIB Rio Grande do Norte; de Recife, 31% do PIB de Pernambuco; de João Pessoa, 29% do PIB da Paraíba; e de Nas últimas quatro décadas, Maceió cres-

A verticalização e o automóvel marcam a fase atual da cidade

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ceu e passou a apresentar uma série de aspectos favoráveis, em âmbitos comparativo e competitivo: uma vasta rede comercial e um conjunto hoteleiro/gastronômico relativamente desenvolvido; aeroporto internacional e porto marítimo moderno; uma infraestrutura viária razoável, que reforça sua posição geográfica privilegiada no Nordeste do Brasil; um destacado complexo de saúde e uma rede de ensino superior que já incorpora mais de setenta mil alunos etc. Com essas vantagens, Maceió reforçou seu papel de maior núcleo de desenvolvimento regional de Alagoas.

Mesmo com sua urbanização contraditória, a cidade cresceu e se transformou num centro estadual prestador de serviços de reconhecida qualidade nas áreas do comércio, saúde, educação de nível técnico e superior, turismo e gastronomia, tecnologia da informação, business services e da produção cultural e artística, o que lhe confere relativa competitividade no plano regional nordestino. Essa presença econômica está ancorada em alguns setores urbanos fortemente competitivos, o que permite a Maceió, localizada na faixa litorânea da Zona da Mata, estender sua influência ao Agreste e Sertão, até

A construção civil é um dos motores da economia da capital

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suas fronteiras com Pernambuco, Sergipe e Bahia. Maceió chega ao século XXI como o 41º mais rico do país, com um dos maiores índices de Produto Interno Bruto/PIB entre os municípios brasileiros e sua renda per capita (R$ 14.364) é 53% maior que a média alagoana (R$ 9.333) e maior 30% que a do Nordeste (R$ 11.045). No entanto, a cidade vem sofrendo com o crescimento populacional acelerado, que aumenta a pobreza urbana e responde pela constante ampliação da economia informal. A pobreza da maioria da população e a exclusão social quase absoluta estão presentes nos bairros periféricos com as suas 92 aglomerações subnormais (favelas, palafitas, grotas, encostas, cortiços, loteamentos clandestinos etc.) e as 575 áreas de risco. Os aglomerados subnormais e as áreas de risco, impróprios para a habitação por estarem sujeitos a desastres naturais – a exemplo de inundações, ou com declividade acentuada, com risco de des-

moronamento ou deslizamento de terras, são elementos que se contrapõem à riqueza da capital, uma contradição para uma localidade que está entre os cinquenta mais importantes municípios do país, no âmbito econômico. Muitas vezes, em função do esforço positivo de divulgar a cidade turística, Maceió é vista e vendida apenas como a orla marítima. É, contudo, mais que isso. É impossível homogeneizar a cidade, colocando num mesmo nível socioeconômico as diferentes situações e perfis que refletem os bairros mais ricos e valorizados, em pequeno número, mas dotados de infraestrutura e peso econômico; os bairros de renda média, antigos e estagnados, e um amplo cinturão, formado pelos bairros mais pobres, que crescem mais rapidamente que a cidade. Cada bairro ou, pelo menos, cada bloco de bairros, revela a extrema diferença social, econômica e espacial dentro da cidade. No último meio século, a acelerada urA ocupação dos vales, que deveriam abrigar novos corredores de transporte da cidade, reflete a falta de planejamento urbano de longo prazo e a busca de moradias por trabalhadores informais

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O Riacho Salgadinho é o maior exemplo da poluição dos cursos d’água da cidade devido à falta de saneamento

banização da capital, com o crescimento dos bairros antigos e a criação de novos núcleos habitacionais, trouxe problemas evidentes. Mesmo sendo a cidade mais rica do estado, o orçamento municipal, as verbas estaduais e os programas federais não conseguiram, e nem conseguem, atender a todas as demandas por habitação popular, educação, saúde pública, transporte, saneamento, coleta de lixo, tratamento d´água, pavimentação, iluminação, segurança e outros itens da infraestrutura e serviços urbanos, acumuladas ao longo do tempo. O aspecto mais importante desse crescimento urbano acelerado vem a ser sua de-

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sigual ocorrência, com o ritmo mais forte nos bairros mais pobres e periféricos, onde estão as áreas dos aglomerados subnormais e “áreas de risco” do que na parte rica da cidade (os bairros de classe média, com mais infraestrutura, serviços próximos e presença crescente da verticalização da moradia e dos condomínios fechados). A polarização, centrada no cenário econômico, exclui a parte majoritária da população dos benefícios de viver na capital e tem desdobramentos sociais (incluindo a violência urbana), problemas de mobilidade urbana e ambientais gravíssimos – a degradação das áreas verdes, das encostas, do espaço lagunar e dos

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riachos localizados no município. Essa polarização social crescente é o principal problema social e econômico enfrentado pela cidade. Não há planejamento formal, nem operação urbanística que resistam a uma realidade tão desigual. Em 1982, um documento da Prefeitura Municipal da cidade, “Assentamentos Urbanos de Baixa Renda em Maceió: caracterização e dimensionamento”, já registrava a existência de 42 aglomerações de baixa renda na cidade. Naquela época, outro estudo constatava que 34% da população da capital viviam em habitações consideradas “subnormais”. Seis anos depois, um documento do então prefeito Djalma Falcão ao presidente José Sarney solicitando ajuda para Maceió, detectava 60 dessas aglomerações, afirmando que a informação “evidencia um crescimento galopante dessas áreas-problemas”. O Censo Demográfico de 1991 registrou 47 aglomerações. Número menor que o da prefeitura, porque o IBGE tem como exigência mínima para caracterizar uma aglomeração subnormal a quantidade de 51 unidades domiciliares. No entanto, a maior parte das vilas, favelas, encostas, cortiços e assemelhados, loteamentos informais, grotas e palafitas não atinge esse número mínimo. Anos depois, em 1996, a Secretaria das Regiões Administrativas da Prefeitura Municipal de Maceió, num estudo mais amplo sobre a exclusão social na capital, chegava ao número de 121 dessas aglomerações, ou seja, uma quantidade três vezes maior que a encontrada pela primeira pesquisa, em 1982. Numa atualização realizada em 2002, o número subiu para 186. E, anos depois, em maio de 2006, a Secretaria Municipal de Habitação, com base em levantamento feito

pelo Instituto Brasileiro de Administração Municipal, anunciava que mais de 150 mil pessoas moravam em assentamentos precários, em Maceió. O crescimento rápido, registrado no documento de 1982, foi confirmado nos dados de 2006 e, reafirmado, em 2010, pelo IBGE, no Censo Populacional, que detectou, com a mesma metodologia anterior, a existência de 95 aglomerados subnormais em Maceió (dos 112 existentes em Alagoas) com 32 mil domicílios e 115 mil moradores. A permanente e expressiva polarização social e espacial é uma das consequências do modelo de desenvolvimento excludente.

A ocupação das encostas resultou na redução das áreas verdes

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A cidade polarizada Q

uando se verifica a renda média dos habitantes distribuída nos bairros da capital, descobre-se que a cidade fica dividida em blocos. Para efeito de ilustração, dividiremos Maceió em três conjuntos de bairros diferenciados pela renda familiar média. O mais rico – a parte reconhecida pelo mercado imobiliário por sua infraestrutura, equipamentos públicos, rede de serviços e comércio mais sofisticado e que, por isso, concentra o processo de verticalização da moradia – está estruturado em torno da orla marítima (do Centro a Cruz das Almas, passando pelo Poço, Pajuçara, Ponta Verde, Jatiúca e Mangabeiras), ou da avenida Fernandes Lima, na parte alta (do Farol ao Jardim Petrópolis, passando pelo Pinheiro, Gruta e Serraria). Essa parte de bairros de renda familiar média mais alta (acima de R$ 2.800,00, segundo o Censo de 2010) contempla apenas 17% da população maceioense e ocupa 15% da parte urbanizada do município (a cidade de Maceió ocupa uma área urbanizada de 194 km² dos 503 km² do total municipal). O segundo bloco é formado pelos bairros de renda média ou baixa, vizinhos aos mais ricos. Alguns mais antigos, de população estável ou decrescente (Jaraguá, Pitanguinha, Ponta da Terra, Ponta Grossa, Prado e Pontal da Barra), outros nas áreas de expansão recente (Antares, Barro Duro, Feitosa, Ouro Preto, Petrópolis, Santa Amélia e São Jorge) e parte do Litoral Norte, com bairros que estão sendo alvo da ocupação de novos projetos imobiliários (Garça Torta, Guaxuma e Jacarecica). O segundo bloco, com renda média familiar entre R$ 1.500,00 e R$ 2.800,00, em 2010, abriga 23% da população da capital, ocupando 20% da área urbanizada.

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O terceiro bloco é constituído pelo conjunto de bairros pobres, com renda familiar média abaixo de R$1.500,00 (em 2010), formado pelo cordão das localidades que margeiam a Lagoa Mundaú, com população estável ou decrescente (Trapiche, Vergel do Lago, Levada, Bom Parto, Mutange, Chã da Jaqueira, Chã de Bebedouro, Bebedouro, Fernão Velho e Rio Novo), pelos bairros de expansão recente, marcados pela presença de conjuntos habitacionais populares (Benedito Bentes, Canaã, Cidade Universitária, Clima Bom, Jacintinho, Santa Lúcia, Santo Amaro, Santos Dumont e Tabuleiro do Martins) e por uma parte menor do Litoral Norte, ainda habitada por uma população de pescadores e outros trabalhadores pobres,

A Avenida Fernandes Lima é o principal corredor de transporte urbano da capital

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Duas cidades, uma horizontal e outra vertical, convivem no dia a dia

mas que vem sendo ocupada pelas novas construções imobiliárias (Riacho Doce, Pescaria e Ipioca). Neste bloco, com 60% da população de Maceió, ocupando 65% da área urbanizada, está localizada a maioria absoluta das áreas de risco, dos aglomerados subnormais e das habitações inadequadas que colaboram para o déficit habitacional da capital. No primeiro bloco – o mais rico – estão apenas 4% das “áreas de risco” da cidade; no segundo bloco localizam-se 23% dessas

“áreas” e no terceiro, o mais pobre, estão 400 das 575 “áreas de risco”, equivalente a 73% do total existente no município. A presença, nos bairros mais pobres, dessas áreas consideradas perigosas para quem nelas habita, aliada à vizinhança com os chamados aglomerados subnormais, confere à questão da moradia, e o seu crônico déficit habitacional, uma importância central na construção da desigualdade atestada nos vários indicadores nacionais.

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O Estado onipresente M

aceió, no final do século XIX, era uma pequena cidade de 36 mil habitantes. O Censo de 1920 registra 74 mil pessoas vivendo na capital. Três décadas depois, em 1950, a população alcançava 120 mil pessoas. Esse crescimento dispara a partir de então: 170 mil pessoas em 1960, quatrocentas mil em 1980 e mais de um milhão em 2014. Neste último período, a cidade que tinha ocupada a parte central da baixada litorânea e a margem da Laguna Mundaú, cresceu em direção ao Litoral Norte e à parte alta. Entre 1970 e 1996, alguns bairros da capital obtiveram altas taxas de crescimento, de mais de 1.000% (Barro Duro, Tabuleiro do Martins e Mangabeiras) ou mais de 500% (Ponta Verde e Cruz das Almas). Por outro lado, outras localidades tiveram taxas negativas de crescimento (Centro, Levada, Mutange e Poço), desenhando assim

a fisionomia da cidade socialmente dividida existente hoje. De um lado, a pequena cidade rica e “formal”, com suas “ilhas valorizadas” e registradas no espaço do mercado imobiliário, cercada pelos bairros estagnados e de renda menor. No outro polo, a parte pobre, formada por bairros com frágil infraestrutura urbana, insuficientes serviços e equipamentos públicos, com áreas dominadas pela ocupação ilegal e irregular do solo, desconhecida até mesmo pelos órgãos responsáveis pelo controle urbanístico. A prefeitura da capital e o estado de Alagoas, pressionados nas definições de seus gastos públicos, muitas vezes realizam investimentos que valorizam as zonas já bem servidas de infraestrutura, sem contemplar da mesma maneira as áreas-problema, ou seja, a maior parte da cidade, aprofundando ainda mais a A região central da cidade abriga os vários níveis da administração pública. Em primeiro plano, o Museu Floriano Peixoto

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distância entre as áreas rica e pobre. Por isso, é grande a diferença de equipamentos públicos (escolas, praças, parques, passeios, ciclovias) e infraestrutura urbana e serviços públicos (saneamento, água, gás, pavimentação, iluminação, sinalização) entre as duas partes da cidade. A municipalidade possui quinze mil funcionários e tem a maior arrecadação entre todas as prefeituras do estado. No entanto, com esse corpo administrativo e esse orçamento, o poder público municipal não consegue dar conta de todas as demandas da população. O somatório anual dos principais tributos arrecadados pelo município (Imposto Predial Sobre Patrimônio Urbano, Imposto Sobre Serviços, Imposto de Transferência de Bens Imobiliários, Taxa de Localização e de Funcionamento, Taxa do Lixo e Dívida Ativa) é sempre menor que a cota-parte do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) a que Maceió tem direito.

Em 2013, o total de recursos transferidos pela União para Maceió, em todas as suas rubricas (saúde, educação, infraestrutura, assistência social etc), inclusive o FPM, totalizou R$ 866 milhões de reais, ou seja, o equivalente a três vezes a arrecadação própria do município. No ano passado (2014), as transferências cresceram para R$ 970 milhões. Esse fenômeno da dependência dos recursos federais normalmente ocorre nos pequenos e pobres municípios do interior. Maceió, no entanto, arrecada parcela pequena do que teoricamente deveria receber, segundo a legislação tributária vigente, por conta das limitações das grandes empresas exportadoras, que gozam de isenções; da fragilidade do conjunto de empreendimentos de pequeno porte; e, principalmente, da pobreza social e econômica, o que explica a isenção ou inadimplência de 60% de seus 312 mil domicílios particulares, que não pagam o IPTU, diminuindo o volume do que seria seu principal imposto, que perNa região central de Maceió o comércio tradicional e as atividades de serviços atendem aos moradores dos bairros mais antigos da cidade

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de para a arrecadação do ISS (Imposto Sobre Serviços). No ano de 2013, dos 67,4 milhões arrecadados na cobrança do IPTU, 70% (R$ 46,8 milhões) vieram dos 12 bairros de renda média mais alta, que abrigam tão somente 17% da população; 13% (R$ 9,3 milhões) foram pagos por moradores dos 16 bairros de renda média e apenas 17% desses recursos públicos (R$ 11,3milhões) vieram dos 22 bairros mais pobres, que concentram 60% da população de Maceió. Enquanto 80% dos moradores dos bairros de renda média mais alta são contribuintes do IPTU, apenas 19% dos domicílios da área mais pobre contribuem para os cofres do município. Nesta cidade, colocada entre as mais ricas (pelo Produto Interno Bruto) do país, 40% de suas famílias estão cadastradas no Ministério de Desenvolvimento Social, recebendo algum tipo de apoio federal, por meio dos programas de assistência social. Deste contingente cadastrado, 95% são consideradas pobres (com renda per capita abaixo de meio salário mínimo) e, particularmente, as que têm renda familiar per capita abaixo de R$ 140 reais são consideradas extremamente pobres e, por isso, são o público-alvo do Programa Bolsa-Família. Os 80 mil beneficiários deste programa, moradores da capital, recebem por mês, R$ 11,4 milhões, totalizando R$ 138 milhões ao ano (2015). Já os 145 mil aposentados e pensionistas do INSS residentes em Maceió receberam, em 2014, o equivalente a R$ 1,7 bilhão de reais. Como cada beneficiário do Programa Bolsa-Família ou cada previdenciário do INSS tem família com uma média de 3,4 pessoas (Censo de 2010), esse dinheiro público atende, direta ou indiretamente, a mais de dois terços da população. Desta forma, a presença federal, por meio das políticas sociais e dos programas assistenciais de distribuição de renda, transformou-se em parte constitutiva e fundamental do sistema produtivo local.

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A existência e o funcionamento da economia dos bairros periféricos e das áreas ainda mais pobres não podem ser compreendidos sem dois elementos fundamentais: as políticas sociais públicas e as transferências federais. Maceió tem uma economia influenciada fortemente por essa renda sem produção. São os elementos desta renda – bolsas, aposentadorias, pagamentos de benefícios etc. – que movimentam o comércio popular e a rede de serviços, permitindo a sobrevivência das pequenas empresas formais e informais que ocupam um enorme contingente de trabalhadores com pouca qualificação profissional, gerando a renda que dinamiza a vida local.

A cidade é uma colmeia em permanente crescimento

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A questão habitacional U

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m exemplo claro da presença do Estado na vida da cidade é a habitação popular. Maceió é a capital nordestina com a terceira maior carência habitacional (2012), segundo o Ministério das Cidades. Esse déficit é o somatório das moradias em estado precário, que precisam ser repostas, mais as unidades a serem construídas para atender às famílias que moram em coabitação, em locais inadequados, como os chamados “aglomerados subnormais”, ou que pagam aluguel excessivo, acima de 30% da renda familiar. Por sua vez, inadequação significa a necessidade de melhorias ou reformas na infraestrutura interna ou externa para que essas habitações sejam consideradas dignas para receber uma família. A falta de condições de moradia é distribuída desigualmente e atinge 92% da população com faixa salarial de até três salários mínimos, 5% da faixa que recebe de 3 a 5 salários e 3% acima de cinco mínimos. Ou seja, é um problema social em todo o país. O déficit para a capital alagoana baixou de 19.177, em 2011, para 18.955, em 2012; em 2023, deverá ser de 16 mil unidades. Levando em conta o movimento demográfico crescente, os números do déficit e das moradias inadequadas estarão em queda relativa, porque o município deverá aumentar seu estoque de domicílios necessários, dos 312 mil atuais (2015) para 425 mil em 2023, ou seja, a cidade necessita construir mais 110 mil novas habitações. O déficit vem diminuindo, principalmente pela atuação dos programas públicos, tanto nos lugares de renda mais baixa, como o conjunto Cidade Sorriso, constru-

ído no Complexo Benedito Bentes, numa parceria entre prefeitura e Ministério das Cidades, que beneficiou 2.200 famílias fixadas anteriormente em áreas de risco ou assentamentos precários; até nos conjuntos

do programa Minha Casa, Minha Vida, que, entre 2009 e 2014, construiu 102 mil unidades habitacionais para famílias com renda de até dez salários mínimos em Alagoas; passando pela experiência também pública, do Programa de Arrendamento Residencial, o PAR, que entregou, até 2009, mais de 45 mil unidades habitacionais. Graças a esses programas, o déficit habitacional alagoano, entre 2001 e 2010, caiu 30%, segundo os dados do Ministério das Cidades e da Caixa Econômica Federal.

A busca por novas moradias é crescente em todas as faixas de renda

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O consumo popular M

aceió concentra metade da população urbana de Alagoas, o mais importante mercado consumidor. Em 2013, 53% dos domicílios na capital pertenciam ao segmento de consumo C; 21% aos segmentos D e E juntos, e uma mesma proporção, 21%, pertencia ao público B. A estratificação social é muito clara: apenas 5% das famílias pertenciam ao público A. A renda média domiciliar do segmento de consumo A era mais alta que 20 salários mínimos, ou seja, acima de 16 mil reais. A parte B recebe de 10 até 20 salários mínimos, ou seja, de 8 a 16 mil reais. A classe C recebe de 2 a 10, que varia de 1.600 a 8 mil reais e a classe D desce um pouco: entre um e dois salários, ou seja, entre 800 e menos de 1.600 reais. A classe E conta com um salário mínimo ou menos. Um fato novo no mercado consumidor de Maceió foi o aumento constante e expressivo dos segmentos mais pobres, nesta última década e meia, um fenômeno detectado pelas associações de supermercados, instituições que fazem pesquisas de consumo, agências de propaganda e meios de comunicação de massa. Nos segmentos mais pobres, os programas sociais de transferência de renda têm exercido um papel fundamental no processo de consumo. As políticas permanentes de educação e saúde também são responsáveis pela transferência de renda e, claro, a Previdência Social. Mas, no tocante às faixas C e D, outros elementos também têm trabalhado a favor: a estabilidade financeira alcançada desde a segunda metade dos anos 1990, com o Plano Real, que permite realizar compras a longo prazo; o crescimento da economia

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brasileira por mais de uma década seguida; a melhoria do padrão financeiro dos setores assalariados, com contrato formal de trabalho, e vinculados ao salário mínimo; a bancarização do público de baixa renda e a ampliação do crédito consignado. A Ceasa responde pelo fornecimento diário de frutas e legumes

As classes de renda menor são as responsáveis pelo crescimento dos setores comerciais e de serviços. As tradicionais lojas de departamento, as redes de supermercados e as empresas de bens de consumo duráveis, assim como os novos empreendimentos comerciais, passaram a direcionar seus esforços para atender a esse novo tipo de consumidor. Houve uma compreensão de que 74% dos consumidores alagoanos fazem parte das classes mais pobres. Em Maceió, o poder de compra dos segmentos C e D têm níveis de consumo muito próximos, alcançando R$ 4,4 bilhões (2013). O IBGE e as instituições setoriais (em Maceió, a Federação do Comércio, que realiza pesquisas regulares) buscam compre-

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ender esse fenômeno recente das altas taxas de crescimento do comércio de varejo. Em regiões pobres como Alagoas, as faixas mais ricas, com suas necessidades mais ou menos satisfeitas, poupam parte do que ganham e investem parte da renda obtida; nos setores mais pobres, o dinheiro vai todo para o consumo de bens que estão há tempo na lista de compras futuras. Uma elevação de renda nos segmentos C e D implica um aumento no consumo de alimentos, roupas, remédios e material de construção. Assim, essa mesma elevação no segmento A quase não altera o próprio consumo. Em Maceió, os setores industriais e comerciais mais dinâmicos são justamente aqueles que atendem às demandas do público mais pobre, produzindo os chamados “bens populares”. A multiplicação de pontos de vendas – mercadinhos, mercearias, lojas de material de construção, lanchonetes, padarias, sacolões e feiras livres – é o melhor indicador. As feiras de bairros – Tabuleiro do Martins, Jacintinho, Levada, Benedito Bentes, Graciliano Ramos, Bebedouro e Jatiúca – assistiram a um crescimento acelerado, de tal forma, que vêm criando problemas de gestão para a Prefeitura de Maceió. Nos bairros da capital, fábricas de produtos populares seguem a mesma tendência de crescimento. As “sulancas”, produtoras de confecções sem marca e com preços acessíveis, estão ampliando as vendas. As tubaínas (refrigerantes populares) ocupam lugares nos mercadinhos e mercearias. Os produtos de limpeza e de higiene pessoal são itens comuns nas compras dos segmentos de menor renda. Na parte comercial, as lojas de materiais de construção a varejo aumentaram sua capilaridade em função desse aumento da renda, popularizando a autoconstrução, com seus “puxadinhos” e reformas de imóveis. As vendas diretas, de porta a porta, tiveram um crescimento exponencial nesta última década e meia. Da mesma forma, ocorreu com a rede de serviços – salões de beleza, consultórios, academias, locadoras, bares e restaurantes – desenhada para atender a esses segmentos. Um destaque é o crescimento da frota automotiva na

O comércio popular atrai diariamente os consumidores

última década. Diante da insuficiência do sistema de transporte coletivo, que possui apenas dois mil ônibus para atender uma população de um milhão de habitantes, a venda de meios de transportes individuais, como bicicleta e motocicleta expandiu-se fortemente. A frota total ampliou em 130%, com seu contingente de automóveis quase duplicando de tamanho (97%), mas fenômeno mesmo foi o salto do conjunto das motos e motonetas, que subiu 337%, mais que triplicando sua presença nas ruas de Maceió (ver o quadro).

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Mercado da Produção, tradicional reduto do comércio popular

Esse movimento está na base da ampliação da quantidade de micro e pequenas empresas legalizadas no Sistema Simples Nacional, em Alagoas. O número delas, em 2007, era de 25 mil; em outubro de 2015, era de 106 mil e deve continuar crescendo, pela grande quantidade de pequenos empreendimentos e empresários da economia informal que transitarão para o Sistema Simples. É a forma que a economia estadual está encontrando para desenvolver seu tecido econômico. O mais importante é que a taxa de sobrevivência dessas empresas, que era de menos da metade em 2005, chega, dez anos depois, a 75%, ou seja, de cada quatro abertas, três conseguem atravessar os dois primeiros anos de existência. Atualmente, 40% dos empregos com carteira assinada acontecem nas micro e pequenas empresas. São

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107 mil empreendimentos basicamente na área do comércio e serviços, representando quase 90% desse conjunto, e pequenas indústrias “de fundo de quintal” ou vinculadas à construção civil, com cerca de oito mil unidades. Essas empresas estão voltadas exclusivamente para o mercado interno, local. No tocante aos impostos, há uma relativa surpresa. Com a ampliação do Sistema Simples, as empresas passaram a pagar valores menores nos tributos, mas como são mais numerosas arrecadam um volume maior. Entre 2008 e 2014, mais que dobraram o pagamento de ICMS ao Estado, passando de 19 para 42 milhões de reais; e mais que triplicaram o pagamento de ISS à prefeitura de Maceió, passando de 4,5 milhões para 17,1 milhões de reais no mesmo período de tempo.

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O mercado de trabalho P

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ara um universo de 469 mil pessoas com capacidade para trabalhar, a população economicamente ativa (PEA), em Maceió, apenas 261.525 têm contrato de trabalho, carteira assinada ou regime jurídico público. Ou seja, no presente, a desocupação, ou vínculo precário, é um problema para quase metade da força de trabalho. Esse índice é explicado pela presença da economia informal, sendo ainda um reflexo de um sistema produtivo que no seu ambiente estadual depende de setores com alta e baixa estação, ou safra e entressafra, como o turismo e a cana de açúcar. A época das chuvas (março a agosto) coincide com o fim da alta estação do turismo e o término da safra da cana. Nesta fase, a construção civil diminui seu ritmo e o comércio dispensa parte da mão de obra contratada para as vendas de final de ano. A partir de setembro, recomeçam a alta estação do turismo, a safra canavieira, o período das vendas de fim de ano e a corrida da construção civil para a entrega das obras do ano corrente. No primeiro tempo, temos mais desemprego formal; no segundo, mais contratações. Tal como no século XX, a economia de Maceió e seu mercado de trabalho são ainda influenciados pela economia informal e por esses setores econômicos de atividades sazonais. Maceió também carece de um forte setor industrial que gere empregos com relativa estabilidade (como é o caso dos seis mil trabalhadores do Distrito Industrial) e mesmo de um estável setor agrícola. Nas décadas passadas, nos municípios da Região Metropolitana de Maceió, ocorreu a ampliação dos canaviais e pastos, assim como das áreas urbanizadas, significando um avanço

sobre a área rural tradicional dessas localidades, extinguindo sítios e pequenas propriedades responsáveis por uma agricultura familiar produtora de alimentos, policultora e pluriativa, que empregava o ano inteiro e ajudava a abastecer a cidade. A dinâmica do setor comercial se ressente dessas ausências e, por isso, é também um empregador sazonal.

A atividade industrial é responsável pelo emprego qualificado

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Em meio a essas dificuldades, Maceió vem encontrando um destino econômico – o de permanecer como uma cidade de comércio e serviços. É o setor terciário que mais movimenta a economia, emprega e gera renda no município. O problema central desse setor para seu crescimento é o mercado estreito e muito disputado, além da pouca incorporação de tecnologia, resultado da baixa qualificação profissional de sua mão de obra. Nos últimos anos,

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esse mercado foi se ampliando, influenciado pela conjuntura nacional. Com essa ampliação, ocorreu o crescimento de mais unidades, resultando na formalização de empresas e da força de trabalho. A área de comércio e serviços instalada em Maceió tem alguns polos modernos e permanece como o eixo dinâmico da economia local, sendo responsável – juntamente com o setor público – pela melhoria das condições de vida.

As pequenas e médias empresas respondem pela maior parte dos empregos formais

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Oportunidade de desenvolvimento O

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s grandes problemas da cidade, a pobreza em larga escala e todos os seus deficits sociais – educação, saúde, habitação, saneamento, mobilidade, segurança etc. – são, ao mesmo tempo, uma grande oportunidade para seu desenvolvimento. Para atender às demandas listadas, são necessários fortes investimentos que, aplicados de forma a combinar infraestrutura e geração de emprego e renda podem apontar para um novo ciclo de crescimento com a diminuição dessas deficiências. Os investimentos em infraestrutura, principalmente na área da moradia, acesso à energia elétrica e ao saneamento, por meio dos programas federais, a exemplo do “Minha Casa Minha Vida” e “Luz para Todos”, demonstraram o acerto nesse caminho. As políticas de formação profissional, de assistência e de crédito empresarial, que são concretizadas nos programas populares para atender a essa maioria pobre da cidade, têm impacto positivo, a exemplo das experiências realizadas por meio do microcrédito produtivo, desde o amplo e capilarizado do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), um banco estatal, ao circuito mais simples do Banco Cidadão, uma pequena organização da sociedade civil que trabalha com recursos públicos, passando pela Desenvolve (Afal), uma moderna agência de fomento apoiada pelo Estado e instituições nacionais, com seus projetos de apoio às MPE’s, como o Sebrae. O microcrédito é uma operação de empréstimo de valor reduzido realizada aos empre-

endedores de pequeno porte, que apresentam uma taxa de inadimplência considerada exemplar. Outras instituições cumprem um papel importante na construção desse novo ambiente, como o Senai, na formação da mão de obra da área industrial, o Senac, nos segmentos comercial e serviços, e o Sebrae no apoio aos negócios de pequeno porte e fortalecimento das empresas vinculadas aos arranjos produtivos locais. Para o seu futuro, Maceió poderá ampliar o vetor social como eixo central de seu modelo de desenvolvimento, aumentando a presença das políticas públicas permanentes de saúde, educação, segurança, habitação e mobilidade, atendendo às demandas da

O Aeroporto Zumbi dos Palmares é a porta de entrada do turismo qualificado

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maioria absoluta de sua população. Os deficits sociais da cidade e as possibilidades de melhoria da qualidade de vida de seus cidadãos são uma oportunidade econômica para o crescimento. Em paralelo, o município deverá investir nos programas de desenvolvimento local, criando as condições para a geração de mais renda, emprego e tributos, por meio dos investimentos mais pesados em infraestrutura urbana (vias de acesso, saneamento, solução dos problemas ambientais etc.); dos programas de microcrédito e de formação de mão de obra, para setores dinâmicos e empregadores de mão de obra local, como a construção civil, turismo etc. A capital alagoana, no entanto, não está só na disputa regional e, por isso, necessita de políticas de longo prazo nas quais desenvolva seus setores competitivos nas áreas de comércio, para atender a região; e serviços, para sua inserção no âmbito da economia nacional, como o turismo; ou no âmbito regional, a exemplo dos setores especiais, como os de saúde de média e alta complexidade; educação de nível superior e técnica, tecnologia da informação e os chamados business services. São políticas de longo prazo que fortalecem tanto os setores tradicionais, a exemplo do turismo (hotelaria e gastronomia), educação ou saúde, como os segmentos emergentes e modernos que formam a crescente “economia criativa”. Maceió, no século XXI, comemorando o seu segundo centenário de fundação, poderá realizar, nas próximas décadas, a sua difícil tarefa de modernizar a cidade, sincronizando sua riqueza econômica com as demandas de uma população expressiva, superando as crônicas deficiências, erradicando a pobreza extrema, diminuindo suas fortes desigualdades, convergindo seus indicadores sociais para níveis nacionais, criando um forte tecido econômico, com um avançado setor de serviços e de comércio, revertendo as dificuldades ambientais, projetando o destino de uma localidade com uma realidade sustentável para seus mais de um milhão de habitantes e atrativa para os visitantes.

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A CAPITAL DOS SERVIÇOS

UMA URBE dinâmica

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N

uma sociedade de mercado, as cidades se inserem na economia regional de acordo com o peso de sua produção, baseada nos segmentos competitivos, e pela importância dos seus índices de desenvolvimento (social, cultural, tecnológico etc.). No Brasil, refletindo essas diferenças, as cidades mais importantes e industrializadas estão localizadas nos estados do Sul e Sudeste. Por sua vez, no Nordeste, as mais ricas correspondem às capitais de seus nove estados, que revelam graus diferenciados de porte e de progresso. Maceió, a capital de Alagoas, está inserida nesse contexto econômico, no qual disputa o mercado com as demais sedes das unidades federativas nordestinas. Neste momento de integração dos estados e das regiões, em processo cada vez mais acelerado, o crescimento econômico e a inserção regional da capital alagoana dependem das respostas que permitam criar diferenciais competitivos. A economia de Maceió, impulsionada pelo setor comercial e de serviços, tanto para atender a sua população crescente como as cidades do interior do estado, assim como pela centralização da burocracia federal e estadual, foi paulatinamente se transformando numa cidade com as características modernas, alavancadas por atividades de setores tipicamente urbanos, mas sem ter conhecido o ciclo industrial tradicional das cidades no capitalismo. Centralizando o sistema de saúde e educação estadual, parte considerável da rede financeira, os segmentos conectados com a economia nacional como o turismo e a tecnologia da informação, a parte mais dinâmica da construção civil, a capital alagoana se transformou numa cidade de importância regional nordestina

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Uma cidade vocacionada para eventos esportivos, Maceiรณ tem um intenso calendรกrio anual em vรกrias modalidades

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Maceió, moderno centro comercial M

aceió é o 25º maior município consumidor do país. É, também, o maior centro comercial varejista e atacadista alagoano. Para isso, sedia grandes empresas comerciais responsáveis por uma forte competição local na área de supermercados, tanto dos grupos nacionais e multinacionais (Bompreço –Walmart, Ceconsud – Gbarbosa, Assaí e Extra – Pão de Açúcar, Atacadão – Carrefour e Makro) como das redes estaduais (Unicompra, Palato), e de um varejo espalhado pelos cinquenta bairros da cidade, com mais de 28 mil pontos de vendas. O setor de serviços é ainda maior que o varejo em número de empresas formalizadas: mais de 30 mil. Todas as grandes empresas nacionais, sejam os grupos industriais, comerciais ou as firmas de serviços, têm representação na capital.

Nas últimas décadas, dois fenômenos de modernização marcaram o comércio de Maceió: a) o crescimento e a diversificação dos pontos de vendas e a ampliação para os bairros da cidade e; e) a chegada das grandes redes nacionais e dos shoppings centers. Enquanto cada bairro segue moldando sua rede comercial, cada vez mais ampliada e diversificada, o antigo Centro de Maceió está passando, desde a década passada, por um processo de modernização infraestrutural que beneficia dezenas de tradicionais ruas comerciais. Paralelamente, as grandes redes do varejo e os shoppings centers ampliaram suas presenças na capital. A novidade maior desse segmento foi a chegada quase simultânea, entre 2010 e 2013, de dois novos shoppings centers, um na Via

Moderno centro de compras da cidade

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Expressa e outro em Jacarecica, e o anúncio de um terceiro, a ser construído na avenida Durval de Góes Monteiro, no Tabuleiro do Martins. Na parte alta da cidade, o Grupo Invest Mall construiu, em 2010, na Via Expressa, o Shopping Pátio Maceió, um investimento de R$ 200 milhões, que abriga 182 novas lojas (10 âncoras, 12 megalojas e 160 lojas satélites), com cinco salas de cinema, um centro médico e uma universidade particular. Outro grande investimento, o Parque Shopping Maceió, inaugurado em 2013, foi construído num terreno de 200 mil metros quadrados entre os bairros da Cruz das Almas e Jacarecica e representa um investimento de R$ 200 milhões compartilhados pelos grupos

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Aliansce e Multiplan. O mais novo shopping de Maceió tem 200 lojas (mais 12 âncoras e megalojas) e 34 mil metros quadrados construídos. Reagindo a esses novos investimentos, o maior e mais antigo shopping da cidade, o Maceió (Antigo Iguatemi), localizado em Mangabeiras e inaugurado em 1989, terminou seu processo de ampliação, no ano passado, com mais 32 lojas e seis salas de cinema que se somaram as 200 lojas já existentes. Esse é o shopping de maior movimento, com mais de um milhão de pessoas por mês, à frente do Pátio Maceió, com 700 mil pessoas mensalmente, e do Parque Maceió, com 600 mil pessoas ao mês.

A expansão residencial e novos serviços ditam a dinâmica dos bairros da parte alta

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UM dinâmico polo DE SAÚDE M

aceió disputa com outras capitais nordestinas o privilégio de ser um núcleo competitivo de prestação de serviços na área de saúde. O setor é alvo de fortes investimentos, tanto na ampliação das unidades existentes, como em novos empreendimentos. Com uma grande variedade de especialidades e de serviços, Maceió concentra um importante centro de tratamento de saúde do Nordeste, com crescimento regular e constante, um polo de serviços com quase mil empresas a ele vinculadas, com destaque para as grandes unidades hospitalares, como o Hospital do Açúcar, a Santa Casa de Misericórdia, o Arthur Ramos Hospital do Coração, o HU/Universitário/Ufal, a Unimed e o Sanatório, casas de saúde, clínicas especiali-

zadas, medicina laboratorial (Unilab, Sabin, Dilab, Medicor e IPC), centros de diagnósticos (Mediradius e Diagnose), todos dotados das tecnologias em exames e cirurgias mais modernos. Neste conjunto de unidades, com mais de quatro mil leitos distribuídos pela rede pública, privada ou filantrópica, atuam milhares de trabalhadores especializados (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas, dentistas etc.). Importante para esse segmento é a existência, em Maceió, de um amplo sistema de formação universitária e técnica. Esse conjunto de cursos de graduação na área da saúde encontra-se na: Universidade Federal de Alagoas (Ufal) – enfermagem, medicina, farmácia, odontologia e Os serviços médicos representam um setor importante da economia

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nutrição; Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) – medicina, fisioterapia, fonoaudiologia, enfermagem e cursos técnicos em radiologia e sistemas biomédicos; Centro Universitário (Cesmac) – medicina, biomedicina, fisioterapia, enfermagem, nutrição, farmácia, odontologia, psicologia; Faculdade Tiradentes (FITS) – medicina, biomedicina, enfermagem, fisioterapia, farmácia e psicologia; e Faculdade Maurício de Nassau – biomedicina, enfermagem, farmácia, fisioterapia, nutrição. No campo da formação técnica, o destaque são as escolas de enfermagem – Santa Bárbara e Santa Juliana. Polo de saúde é a região que agrega serviço de alta e média complexidade e atrai usuários de outras áreas em busca de tratamento especializado. Nele, também há concentração de empresas (públicas e privadas) que desenvolvem atividades similares, fortemente inter-relacionadas ou interdependentes, permitindo o aproveitamento da infraestrutura criada ao longo de décadas, além de integração e articulação com as instituições de apoio. O caso alagoano é evidente: 80% das empresas na área de saúde, do pessoal ocupado e dos salários e remunerações estão concentrados na cidade de Maceió.

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Essa rede ultra-especializada emprega diversos profissionais de nível superior, como médicos, nutricionistas, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e fisioterapeutas em interação interdisciplinar e interprofissional, além das pessoas ocupadas nos serviços de complementação diagnóstica e terapêutica dos laboratórios. E utiliza mão de obra cada vez mais qualificada com remuneração superior às médias de outras atividades, em função do contingente cada vez maior de trabalhadores egressos de cursos superiores e técnico-profissionalizantes. A importância do setor de saúde para a cidade de Maceió pode ser mensurada pela comparação com o de “alojamento e alimentação”, em que está incluída toda a rede de hotéis e restaurantes voltada para o turismo. A saúde emprega mais trabalhadores formais, assalariados de carteira assinada, que a rede ligada ao turismo. O setor, com número menor de empresas – um terço – emprega mais e remunera melhor os participantes em comparação à rede hoteleiro-gastronômica.

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Uma rede educacional qualificada M

aceió, ao longo de décadas, foi construindo uma rede educacional, com escolas e qualidade reconhecida, desde o nível pré-escolar até a pós-graduação, passando pelos ensinos básico, médio, técnico-profissionalizante, com suas unidades especiais, centros artísticos, faculdades tecnológicas, colégios preparatórios, centros de ensino superior e universidades que ofertam desde a creche à primeira infância, aos cursos de mestrado e doutorado. Com mais de trezentos mil alunos matriculados regularmente e milhares de profissionais envolvidos, essa complexa rede, por seu tamanho e atributos, afirmou-se como um polo educacional regional de qualidade. As décadas recentes (1991-2010) foram de mudanças significativas – e positivas – na área educacional e os resultados estão à vista. Importante destacar que o ambiente geral da educação, em Alagoas, sempre foi sempre foi marcado pelo seus aspectos negativos. A mais recente avaliação do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com a construção do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M), que resulta numa combinação de saúde, educação e renda da população, no entanto, registrou que o IDH geral de Alagoas e o de Maceió evoluíram rá-

pida e positivamente, sendo a razão para esse destaque, nos dois casos, o acesso ao ensino regular. O IDH-M/Educação de Maceió, graças aos investimentos no ensino fundamental, foi o que mais avançou entre todos os municípios do estado, com uma variação de 87%, e Alagoas foi o estado que mais evoluiu, com uma taxa de 199% de melhoria nesse índice. Graças, em parte, a esse avanço na área educacional, o município de Maceió alcançou o status de “alto desenvolvimento humano”, assim definido pelo Pnud. A última década do século XX e a primeira do século XXI trouxeram mudanças significativas na área educacional. Uma comparação entre os anos finais do século XX e os anos atuais ilustram bem esse avanço. Segundo o estudo da Secretaria de Planejamento do Estado “Perfil Socioeconômico do Estado de Alagoas”, em 1984, 62% dos alagoanos não tinham instrução alguma e o analfabetismo atingia 49% da população acima de quinze anos; 40% das crianças em idade escolar estavam sem estudar e apenas 12 mil alunos frequentavam o ensino superior. Desde a segunda metade dos anos 90, a expansão dessa rede de ensino foi transfor-

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mando o perfil escolar da população, considerado baixo para os padrões nacionais e internacionais. O percentual de pessoas que hoje cumprem a exigência mínima escolar para o moderno mercado de trabalho – segundo grau completo ou universitário – é crescente, mas ainda insuficiente para as demandas de uma economia baseada, principalmente, no setor de serviços. Alagoas, segundo a mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE (2014), possui uma população economicamente ativa com número ainda muito alto de analfabetos (24%) ou com o primeiro grau incompleto. São mais de 300 mil estudantes regulares na rede de ensino da capital, com mais de 900 escolas de todos os níveis. Na capital alagoana, aproximadamente 190 mil crianças, jovens e adultos estudam regularmente na rede pública: 7 mil crianças nas creches e pré-escola, 100 mil alunos no ensino fundamental e técnico, 25 mil estudantes no nível médio, 16 mil no ensino de jovens e adultos (EJA). Somados aos da rede privada de ensino básico, técnico e universitário, ultrapassa aos 300 mil estudantes regulare. E essa estrutura foi modificando o padrão formal da educação, refletindo-se na mudança do perfil da escolaridade da cidadania e de seus eleitores. Essa mudança no perfil educacional do eleitorado da capital é confirmada pelos dados do Tribunal Superior Eleitoral, quando apresenta os números sobre o nível de escolaridade do eleitorado de Maceió. Representativo pelo seu número – 560 mil votantes -, que contempla quase 60% da população do município (aqueles com mais de 16 anos), esse conjunto tem uma forte presença de eleitores com nível superior (mais de 20%), uma maioria de votantes com nível fundamental ou médio (69%) e apenas um reduzido número de eleitores que “sabem ler e escrever” ou de analfabetos (11%), ou seja, cidadãos que não

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frequentaram escolas. Ou seja, entre os anos 2000 e 2015, o percentual de votantes que não frequentaram escola foi reduzido pela metade, enquanto duplicou o índice de eleitores com nível superior. Na rede educacional em Maceió o destaque é o ensino superior, nas vertentes politécnica e universitária, revelando-se um componente estratégico imprescindível ao desenvolvimento da cidade, evidenciado pela perspectiva de crescimento no curto prazo, com a instalação de novas faculdades isoladas e universidades particulares. São mais de 70 mil alunos cursando o nível superior (graduação e pós-graduação) na capital alagoana. Esse contingente encontra, no ensino universitário, o seu núcleo mais dinâmico e atraente (Ufal, Cesmac, Fal, Ifal, FAT, FAA, Fits, Seune, Uncisal, Mauricio de Nassau, Unifal, Facima, Fama, Uneal, FRM etc), oferecendo praticamente todos os cursos de graduação (presencial e a distância) e um crescente leque de alternativas na pós-graduação.

A formação profissional de nível superior atrai novos estudantes

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moderna estrutura de turismo REDE HOTELEIRA Hotel Jatiúca Conde Hotel Hotel Praia Bonita Hotel Colônia Hotel Matsubara Coqueiro Express Hotel Reymar Casa Caiada Pousada Hotel Atlantic Holliday Inns Express Hotel Porto da Praia Pousada EcoMaceió Hotel Ponta Verde Brisa Tower Hotel Trópico Hotel Mercure Hotel Ritz Hotel Verde Mar Hotel Pousada do Conde Pousada Aquarela do Brasil Maceió Mar Hotel Hotel Ciribai Ritz Praia Hotel Hotel Radysson Hotel Praia Enseada Hotel Paraíso das Águas Hotel Buongiorno Pratagy Beach Resorts Hotel San Marino Hotel Pousada des Basques Hotel Porto Grande Tropicalis Pousada Hotel Pajuçara Estalagem Praia Hotel Hotel Costamar Quaraçá Pousada Tambaqui Hotel Canto do Mar Hotel d’Natureza Saint Patrick Hotel Hotel Ouro Branco Hotel Dover Ritz Plazamar Salinas de Maceió Resort

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esde 1980 o Nordeste do Brasil tornou-se um destino turístico em permanente crescimento, atraindo as mais importantes redes de hotéis nacionais e internacionais e resorts, graças à beleza dos seus três mil e trezentos quilômetros de praias. Nestas duas últimas décadas, empresas brasileiras e estrangeiras realizaram grandes investimentos no litoral nordestino, transformando-o num dos principais produtos ofertados no Brasil. Maceió, porto de entrada do estado, soube aproveitar seu potencial – clima, belezas naturais, preços relativos – e tornou-se um dos destinos mais visitados do Nordeste. Lentamente, a rede hotéis e restaurantes foi se implantando, crescendo e firmando-se como uma das áreas mais significativas do setor de serviços da capital. A cidade é o centro de um movimento que se espalha para o Litoral Nordeste, pela Costa dos Corais, até a fronteira com Pernambuco; e, para o Litoral Sul até a foz do São Francisco. Nos anos 1980 Maceió esteve à frente de muitas capitais nordestinas e implantou, nas praias centrais, que foram urbanizadas na mesma época, um conjunto de hotéis que, rapidamente, suplantou a acanhada rede hoteleira existente (Palmares, Califórnia, Palace, Atlântico e Beiriz), toda concentrada no centro da cidade. O ponto de partida foi a inauguração, em 1976-1977, dos modernos hotéis Luxor e Beira Mar, localizados na Praia da Avenida, que, por razões de localização e gestão, foram desativados anos depois. Inaugurado em 1980, o Hotel Jatiúca é símbolo maior desse período de modernização hoteleira e um dos responsáveis pela entrada de Maceió no circuito nacional. Considerado o

primeiro resort urbano do Brasil, o hotel é um complexo de duas unidades: o Jatiúca Resort Hotel e o Jatiúca Resort Flat, com 200 unidades entre apartamentos e suítes, ocupando um espaço de 62 mil metros quadrados na área nobre da capital. O sucesso desses investimentos atraiu novos hotéis, como o Matsubara (1987), o primeiro hotel cinco estrelas; e unidades pertencentes a famosas cadeias internacionais, como Meliá (1990) e o Ibis–Accor (1991). Dessa maneira, Maceió implantou uma rede de grandes e médios hotéis, além de pousadas, com características diferenciadas. Maceió conta hoje com mais de seis mil leitos em dezenas de unidades para hospedagem com qualidade equivalente a duas ou mais estrelas, presentes na rede de unidades hoteleiras existentes no município, como as que, hoje, estão associadas à Associação Brasileira de Indústria Hoteleira (ABIH).

A cidade tem vocação natural para o lazer

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Nos últimos anos, Maceió assiste a chegada de novos investimentos, ainda de pequeno porte para as demandas de uma capital no Nordeste, hoje o principal destino turístico nacional. Ainda assim, a cidade possui um dos maiores conjuntos hoteleiros e pode ser considerada também um grande polo gastronômico regional, com

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mais de uma centena de restaurantes especializados, desde a cozinha baseada nos pratos regionais aos mais finos cardápios internacionais, capazes de produzir um roteiro competitivo no âmbito nordestino. Essa infraestrutura hoteleiro-gastronômica ajuda a manter Maceió como um dos polos turísticos mais demandados do país.

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A INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO CIVIL

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economia de Maceió não conheceu um ciclo de industrialização, com a criação e atração de um grande conjunto de fábricas que aumentasse a produção de mercadorias, gerador da riqueza da população local, permitindo o surgimento de um empresariado moderno, uma classe trabalhadora numerosa e setores de classe média vinculados a essa produção. Em vez disso, Maceió ocupou sempre o lugar da cidade dos serviços e do comércio. A carência de infraestrutura, a pouca força do capital local, a inexistência de um mercado mais amplo que consumisse parte dessa produção e a concorrência de cidades próximas e maiores, como Recife e Salvador, dificultaram, ao longo de décadas, a geração e a atração desses investimentos fabris. Os símbolos da industrialização. Neste século e meio de história da indústria em Maceió, no entanto, instalaram-se na capital algumas grandes empresas, a exemplo da Fábrica Carmen (fechada em 2010), a Petrobras, Sococo, Braskem e a Usina Cachoeira do Meirim. Esses cinco símbolos da economia maceioense demonstram a possibilidade dessa industrialização e, ao mesmo tempo, revelam as dificuldades e os limites de se criar um parque fabril maior, voltado para as demandas regionais e gerador de riqueza econômica e mais dinâmica social. A Fábrica de Fernão Velho. A Fábrica Carmen, inaugurada em março de 1857, fechou suas portas ao completar 153 anos de existência, permanecendo, por muitos anos, como a indústria têxtil mais antiga em atividade no Qualificação técnica e uma arquitetura arrojada caracterizam a dinâmica da verticalização

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Brasil – Fundada com o nome de Companhia União Mercantil, foi adquirida, em 1943, pelo grupo empresarial pernambucano Othon Bezerra de Mello, passando a se chamar Fábrica Carmen. Até 1960, funcionando com mais de 800 operários, foi a indústria de manufatura de maior importância de Alagoas. Em 1997 mudou outra vez de dono, permanecendo até seu fechamento com o nome Fábrica Carmen Fiação e Tecelagem S/A. Fez parte da história das comunidades de Fernão Velho, Goiabeiras, ABC e Rio Novo. Petrobras – Presente em Maceió desde 1955, a Petrobras é parte da história econômica da capital. Desde o século XIX, há informações sobre a existência de petróleo em Maceió. Inicialmente, foram as áreas de Riacho Doce e Garça Torta as mais pesquisadas. O farol da Ponta Verde está assentado sobre uma base de cimento que cobre um dos muitos poços perfurados pelo Conselho Nacional do Petróleo, entre 1920 e 1943. O petróleo foi descoberto efetivamente em Maceió em outubro de 1957, no Tabuleiro do Martins, fazendo de Alagoas o segundo produtor, logo depois da Bahia. Desde então, a empresa tem realizado pesquisas e perfurações em solo alagoano e na plataforma marítima, constando Alagoas como um dos dez estados brasileiros produtores de petróleo. Usina Cachoeira do Meirim – Fundada em 1959, é a única empresa do setor sucroalcooleiro localizada no município de Maceió. Foi comprada pelo Grupo Carlos Lyra em 1986 e, desde então, tem modernizado suas instalações e ampliado sua produção, transformando-se numa das maiores unidades do setor em Alagoas. Na safra 2014-2015 esmagou 1,8 milhão de toneladas de cana-de-açúcar e produziu 2,2 milhões de sacas de açúcar e 35 milhões de litros de álcool.

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Sococo – Fundada em 1966, a Sococo foi adquirida, em 1982, pelos grupos proprietários das usinas Seresta e Triunfo. É hoje a maior e mais moderna indústria de derivados de coco do mundo, com capacidade de processamento de 280 mil cocos por dia (envasa 50 milhões de garrafinhas de leite de coco por ano), comercializados em todo o Brasil e no exterior. Possui uma fábrica em Alagoas e duas no Pará e detém mais de 40% do mercado nacional de produtos derivados da fruta. A da capital alagoana utiliza as matérias-primas já processadas no Pará, onde possui a maior plantação do Brasil, com 1 milhão de coqueiros. No ano passado, faturou R$373 milhões. O Grupo também possui a Amacoco/ Água de Coco da Amazônia, criada em 1995 como joint-venture entre a Sococo e o grupo mineiro Regon. A empresa é responsável por 70% do mercado nacional de água de coco envasada, com uma produção de 2,5 milhões de litros/mês, em suas unidades do Pará e de Petrolina (PE). Braskem – Instalada em Maceió desde 1976, a Braskem é a maior empresa de Alagoas. Em 2004 já possuía duas unidades industriais: a planta produtora de cloro e soda cáustica, que é a maior do continente americano, e a unidade de produção de polipropileno (PVC), produto do qual a Braskem é líder na América Latina. Em 2008 investiu R$ 90 milhões, passando de 200 para 250 mil toneladas/ano na unidade de produção de PVC. Produz também 520 mil ton./ano de DCE (dicloretano), 460 mil ton./ano de soda cáustica e 400 mil ton./ano de cloro. Oferece 400 empregos diretos. Em 2012 inaugurou uma nova planta de PVC, localizada em Marechal Deodoro, representando um investimento de R$ 1 bilhão. Setor construção civil e mercado imobiliária. Maceió é uma cidade em plena cons-

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O adensamento urbano coloca novos desafios para os gestores da cidade

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trução. Hoje ela comporta 330 mil imóveis. Alguns bairros da capital – principalmente na orla marítima e nas margens da Avenida Fernandes Lima – têm recebido grandes investimentos imobiliários, com destaque para os edifícios e condomínios de classes média e média alta. São muitas as construtoras e incorporadoras que, lideradas por um grupo mais dinâmico – Cipesa, Meta, V2, Falcão, Placic, Delmann, Record, Contrato, Lima Araújo, Lares, ReyCon, Teto, Humberto Lobo, Telesil, Consenco, Enengi e Norcon –, vão transformando a fisionomia da cidade. A construção civil gera empregos urbanos e alimenta uma forte rede de compras por meio de sua cadeia produtiva. Essa vasta rede está centrada nos fornecedores de material de construção, nos escritórios de engenharia e de arquitetura, nas lojas de decoração e de mobiliário. A construção civil tem o apoio e trabalha articulada, principalmente, com as empresas imobiliárias que comercializam imóveis usados e de produção de incorporadoras: Zampieri Imóveis, Marcio Raposo Imóveis, Soares Nobre, MP2, Conlar e Imobili. Importantes também são as empresas que administram aluguéis, como a Zampieri, líder de mercado,

e a Mário Dias. E, na área de condomínios, existem aproximadamente 50 empresas administrando 2.500 condomínios em Alagoas. Estas empresas, juntas, fazem com que o setor seja considerado um dos mais dinâmicos do Nordeste Nos bairros periféricos a construção popular dinamiza outro tipo de mercado: o varejo da construção civil e os empreendimentos informais, presentes em quase todas as partes da cidade. A construção civil local é conhecida pela capacidade técnica, originária das faculdades de engenharia civil, elétrica, ambiental e sanitária e de arquitetura e urbanismo ofertadas, no âmbito universitário (Ufal, Cesmac, Maurício de Nassau e Fits) e dos cursos técnicos oferecidos pelo Instituto Federal de Alagoas (Ifal), a exemplo de estradas e edificações, que funcionam há décadas na capital. Empresas alagoanas já constroem em outros estados brasileiros, comprovando a capacidade empresarial do setor. Muito influenciado pelo turismo, o produto imobiliário de Alagoas atende, hoje, a um mercado com um percentual crescente de compradores oriundos de outras unidades da federação e do estrangeiro.

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TI E BUSINESS SERVICES

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m centro regional com mais de um milhão de habitantes tende a oferecer serviços complexos à economia na qual está inserido. É o caso de Maceió, e o seu aspecto externo mais visível são os edifícios corporativos. O surgimento dos prédios empresariais se deve à urbanização, à melhoria da renda e às demandas de um setor cada vez mais complexo – o de serviços empresariais, como advocacia, contabilidade, consultoria financeira, marketing etc. Com a perda de importância do Centro de Maceió, que concentrava o setor de serviços com esses escritórios especializados, o setor imobiliário começou a oferecer, com mais infraestrutura e conforto, edifícios empresariais localizados próximos dos bairros mais dinâmicos da cidade. Neste setor de serviços empresariais destaca-se a tecnologia da informação. Maceió vem sobressaindo regionalmente, já há algum tempo, pela presença de um conjunto criativo e dinâmico, que agrupa um significativo universo de aproximadamente 200 empreendimentos de base tecnológica: empresas integradoras e produtoras de hardware, de software e web; de prestadoras de serviços; da cadeia produtiva de tecnologia da informação; de serviços de apoio e empresas de setores correlatos, além de incubadoras e condomínios empresariais. Esse grupo de empreendimentos localizado em Maceió apresenta uma rede de alta tecnologia – eletrônica, informática e biotecnologia. O relativo adensamento urbano, a mão de obra qualificada e os investimentos em infraestrutura garantem o sucesso desses empreendimentos. O Sebrae e o governo de Alagoas vêm, desde 2004, articulando o Arranjo Produtivo Local (APL) da Tecnologia da Informação com empresas dedicadas a venda

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de hardware, desenvolvimento de software, assistência técnica na área de serviços, provedores de internet, escolas de informática e outras empresas com atividades ligadas à tecnologia da informação. O projeto do APL identificou algumas áreas com potencialidade de aglomeração de empresas e produtores, mapeando 27 atividades potenciais que são trabalhadas pelo setor. O objetivo é incrementar a economia digital de Maceió, por meio de ações de qualificação, aumento de faturamento, competitividade e integração das empresas e organizações. Grande parte dessas companhias trabalha na construção do Cais Tecnológico, uma articulação de vários parceiros institucionais do Polo de Tecnologia da Informação e Comunicação. Além do sistema de ensino superior liderado pela Universidade Federal de Alagoas, o estado abriga uma avançada estrutura de instituições voltadas à formação de mão de obra de níveis básico e médio, destacando-se o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Instituto Federal de Alagoas (Ifal).

A informatização é uma das características de empresas com perfil tecnológico moderno como a Braskem

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A ECONOMIA CRIATIVA

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economia criativa. A economia criativa engloba um espaço amplo do setor de serviços. Maceió desenvolve esse segmento em quase todas as suas expressões. Existe a economia da cultura, muito determinada pela indústria cultural, tanto a audiovisual – rádio, TV, cinema e vídeo –, como a impressa – livro, revistas e jornais; e a produção de conteúdo, para redes sociais, games e softwares. Mas não é só, esse segmento econômico engloba também as expressões culturais como as artes visuais, a exemplo da pintura, escultura e fotografia, e as artes

performáticas - música, teatro, dança e circo. Maceió já vem desenvolvendo os chamados serviços criativos, ou criações funcionais, como publicidade, arquitetura e o design de joias, móveis, roupas, brinquedos e interiores. Não menos importantes para Maceió são as manifestações populares: celebrações, festejos e artesanato. Apostar na economia criativa. Em todos esses setores há produção em Maceió, com desiguais níveis de desenvolvimento. Aqui já se produz em quase todas as expressões da economia criativa, da música à computação;

Orquestra Sinfônica Universitária (Ufal)

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do artesanato ao software; do livro à gastronomia. Esse conjunto envolve milhares de pessoas. No entanto, há uma clara ausência de vínculos entre a produção criativa, a universidade e as empresas. A característica hoje ainda é um componente de improvisação, a falta de planejamento para a produção, difusão e consumo. E, por isso, Maceió vai aprendendo com as outras experiências, como as de Salvador, Recife e Fortaleza que, quando deram seus primeiros passos na direção da organização do setor, também eram cidades do porte da capital alagoana. Maceió é capital de um estado urbanizado que possui 1,1 milhão de estudantes matriculados regulamente, dos quais 100 mil são universitários. Temos escolas de arquitetura e design, de música, computação, equipamentos culturais, uma mídia impressa e eletrônica ampla e diversificada, ou seja, as pré-condições para produzir na área criativa.

Potencial criativo. Alagoas, com uma história antiga, de mais de cinco séculos, apresenta uma enorme diversidade artística e cultural distribuída por todo o território. Maceió vem, por isso, investindo na possibilidade de se transformar num grande pólo produtor na área da economia criativa, seguindo o que ocorreu com Salvador, na Bahia, nos anos 1960-1970; com Recife, em Pernambuco, nos anos 1980; e com Fortaleza, no Ceará, que vem se desenvolvendo desde os anos 1990. A capital alagoana é conhecida como uma cidade de muitos artistas e intelectuais. Também costuma ser lembrada pelas múltiplas expressões culturais populares. Um rico acervo dessas tradições consta em livros, vídeos e outros suportes. A tradição e o patrimônio acumulados fizeram-na a capital cultural de Alagoas, formada por um grande número de artistas plásticos, ateliês e galerias; cantores, compositores e um razoável número de locais O complexo cultural do Teatro Deodoro enriqueceu o centro de Maceió como opção de entretenimento

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Poetas e cantores traduzem a criatividade de uma cultura com forte componente oral

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destinados para apresentação pública (casas de espetáculos); editoras locais, alguns teatros – Deodoro, Gustavo Leite, Sesc, Arena – e grupos teatrais regionais; escolas de música, de dança e de artes plásticas; gravadoras, livrarias (Resma, Laselva, Nossa Livraria, Paulinas) e alfarrábios (no centro da cidade e em Jaraguá); museus – Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas – IHGAL, Pierre Chalita, Associação Comercial, Museu da Imagem e do Som (Misa), Museu Théo Brandão; e cinemas (Shopping Maceió, Centro Cultural Arte Pajuçara e Shopping Pátio Maceió) que fazem da cidade o maior centro artístico--cultural de Alagoas. O laboratório da Bienal. Há uma mudança em curso na sociedade alagoana. Este ano teremos a VII Bienal do Livro, que deverá movimentar mais de 250 mil pessoas numa fei-

ra literária. Um fenômeno expressivo numa cidade de um milhão de habitantes. Mas, significativo mesmo, foi que a Bienal passou a ter um público duas vezes maior que a tradicional Feira Agropecuária, que conta com 64 edições, realizada quase na mesma data. Recentemente, duas novas e boas livrarias foram inauguradas em Maceió – a Leitura e a Viva Editora e Livraria – atendendo uma demanda antiga na área cultural-educativa. Muitos CD´s estão sendo gravados a cada ano, assim como estão ocorrendo exposições de arte plásticas, montagens de peças de teatro; várias escolas de balé funcionando a pleno vapor, assim como orquestras de música clássica, revelando o potencial de um setor – a chamada “economia criativa”, que engloba não somente a parte cultural, mas todas as expressões ligadas ao conhecimento.

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Pela regularidade, alto nível de organização e capacidade de mobilização, a Bienal do livro é um excelente laboratório para provar a possibilidade de Maceió crescer na área da economia criativa. É uma experiência que vem sendo estudada. E isso serve para o teatro alagoano, para a produção audiovisual, música etc. Artistas e criadores nacionais. Outro sintoma da evolução local é a integração de alguns artistas e profissionais no circuito nacional, mesmo residindo em Maceió. Os exemplos são muitos e poderíamos citar alguns: Carlos Bala, Eliezer Setton, Wado e Júnior Almeida, na música; Delson Uchôa, Marta Araújo e Rogério Gomes na pintura; Douglas Apratto e Dirceu Lindoso na produção intelectual; Martha Medeiros na moda; vários arquitetos e designers, produtores audiovisuais que são premiados e têm obras em circulação em outros estados, demonstrando, assim, que essa tendência deverá ser ampliada adiante. Esse aspecto não deve ser subestimado, porque prova a existência das condições, embora limitadas, para se produzir neste segmento, vivendo em Maceió.

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PORTO E AEROPORTO, AS PORTAS DE MACEIÓ Cícero Péricles de Carvalho

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aceió tem diversas estradas que ligam o município ao resto de Alagoas e ao Brasil: a AL-101 Norte que atravessa alguns bairros do litoral e vai em direção a Pernambuco; a BR-101 que liga a parte alta da cidade aos municípios do Norte de Alagoas, realizando a comunicação com as outras regiões; e a AL-101 sul, que atravessa o complexo estuarino Mundaú-Manguaba e vai em direção ao rio São Francisco. Estes são os caminhos terrestres que conectam a capital aos demais municípios e estados vizinhos. Mas, outras duas portas, uma aérea, o Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares, e outra marítima, o Porto de Maceió fazem a ligação da capital alagoana com o Brasil e o mundo. Localizado no bairro de Jaraguá, entre as baías da Pajuçara e Avenida, o porto é herdeiro do ancoradouro que, por mais de dois séculos, serviu à economia. O Zumbi dos Palmares é o herdeiro de outros aeroportos: o da Levada, que recebia hidroaviões, e a antiga pista de pouso, que se transformou num dos maiores aeroportos do país, como veremos nos textos seguintes, baseados nas informações da Infraero e da Administração do Porto.

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Um porto para o mundo

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o século XIX, com a passagem de Maceió a capital, o Porto de Jaraguá se afirma como o canal principal das exportações e importações de Alagoas. Suas limitadas condições de funcionamento sempre foram objetos de preocupações e projetos. Em 1896 a empresa The National Harbour Company Ltd. obteve a concessão do porto, mas não conseguiu realizar as obras determinadas, sendo o contrato rescindido, em 1905, pelo Governo Federal. A partir de 1910 novos estudos foram elaborados, mas, por razões de ordem financeira, não foi possível dar continuidade ao desenvolvimento das instalações do Porto de Maceió. Somente em novembro de 1933 a União autorizava o governo do Estado de Alagoas a construir e explorar comercialmente o porto. Em 1935, tinha início a execução do atual projeto, a cargo da Companhia Geral de Obras e Construções S.A. – Geobra, ocorrendo a inauguração do Porto de Maceió, em 20 de outubro de 1940, cujas operações vieram a começar oficialmente em janeiro de 1942, quando houve o primeiro embarque de açúcar. Ao longo de sua existência, o porto teve sua estrutura aprimorada a partir da realização de diversas obras de expansão. Em 1974, o aterro hidráulico que propiciou a implantação do Terminal Açucareiro e do novo Cais Comercial, totalizando 750 metros de linha de cais. Em 1978, o novo acesso rodoviário, enrocamento externo e uma rede de energia elétrica. Em 1989, iniciava-se a construção do píer petroleiro, cuja conclusão se deu em 1995. No ano de 1996, o Porto foi beneficiado com obras de dragagem no canal de acesso e na bacia de evolução do Cais Comercial. De dezembro de 2001 até fins de 2011, houve a construção do Cais de Contêineres, prolongando-se o Cais Comercial em 80 metros, conectado à extremidade norte do Terminal Açucareiro e formando uma dársena com 350 metros de extensão.

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Porto de Maceió

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NA ERA DA AVIAÇÃO Aeroporto Zumbi dos Palmares

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aceió recebe aviões de carreira desde 1927. Mas o primeiro aeroporto era marítimo e ficava na Lagoa Mundaú. Ali pousaram os hidroaviões da Pan American Airways, da Panair do Brasil S.A. e do Sindicato Condor Ltda. Este era um dos melhores planos d’água do litoral de Alagoas, por sua extensão, condições naturais e meteorológicas. Para atender às necessidades do avião DC3, então empregado pelas empresas nacionais, foi construído o primeiro campo de pouso de Maceió. O governo estadual, em 1927, concedeu uma área de 100 hectares de terras devolutas, no Tabuleiro do Pinto, à Societé Fran-

co Sud Americaine de Travang Publics para a construção de um campo de pouso para aeronaves, com a inauguração prevista para janeiro de 1929. Antes mesmo da conclusão de seu campo de pouso, a Compagnie Générale Aeropostale, sucessora da Latéssère, começou o serviço de aeropostal nacional e internacional, este último com o Uruguai e a Argentina. A inauguração da Aeropostale ocorreu em 14 de outubro de 1928, com capacidade para seis aeronaves. Contava com estação de rádio, oficina mecânica, além de outras dependências com o nome de Costa Rêgo, em homenagem ao governador alagoano. O aeroporto de Ma-

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Aeroporto Zumbi dos Palmares tem instalações modernas e funcionais

ceió já foi chamado Campo dos Palmares, em homenagem ao Quilombo de Palmares. A denominação atual vem de dezembro de 1999, referência ao herói, Zumbi dos Palmares. O Aeroporto Internacional está localizado na região metropolitana de Maceió. É o quarto maior em tamanho do terminal de passageiros do Nordeste, atrás dos de Salvador, Recife e Fortaleza,. É considerado um dos mais belos terminais aeroportuários do Brasil. Sua pista foi reformada e ampliada para 2.601m, ganhando também um novo terminal de passageiros. Este, com 22.000

m², segue a tendência contemporânea de assemelhar os terminais aeroportuários a shopping centers. O aeroporto de Maceió possui quatro pontes de embarque com acesso direto às aeronaves (fingers), sendo duas com capacidade para aclopagem de grandes aeronaves (inclusive as de categoria NLA - New Large Aircraft) e o novo sistema de pátio pode receber, simultaneamente, até 19 aviões de grande porte. É o primeiro aeroporto do Brasil projetado com a tecnologia de eficiência energética de gás natural.

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IAM, UMA DÉCADA DE OBRAS SOBRE ALAGOAS E SUA GENTE

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Conjunto de publicações culturais do Instituto Arnon de Mello: Enciclopédia Municípios de Alagoas (1ª, 2ª e 3ª Edições); Maceió Século XXI; Alagoas Memorável - Patrimônio Arquitetônico; Fazer Popular - Mestres Artesãos das Alagoas (1ª e 2ª Edições) e Alagoas Popular - Folguedos e Danças de Nossa Gente. Livrao_maceio_duzentos_anos.indd 161

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O papel da OAM na modernização de Alagoas

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O Século XX Capítulo VII

F

esse extraordinário Mundo Novo Stefani Brito Lins*

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*Com Curso de Doutorado em Ciências da Informação pela Universidade Autônoma de Barcelona, Espanha

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oi na segunda metade do século passado que a comunicação se tornou um elemento de grande influência na sociedade. Se o século XIX assistiu ao primado dos jornais, que atraíram a atenção coletiva, no começo do século seguinte o rádio – uma tecnologia multitudinária e de longo alcance – teve seu próprio reinado, dominando o espaço cultural e político, principalmente. Logo em seguida à II Guerra Mundial, foi a televisão que emergiu como a grande novidade no campo das comunicações, estabelecendo padrões e novos referenciais comportamentais. A tríade jornais (e revistas) rádios (AM e FM) e televisão aberta formou um polo de grande influência nas sociedades do pós-guerra, dando origem, ao atingir o auge de sua expansão, ao termo “quarto poder”, expressão com que pretendia traduzir sua influência entre as instituições-pilares do Estado moderno. É indeclinável o fato da crescente influência dos meios de comunicação sobre a sociedade, ela própria denominada “sociedade de massas”, numa alusão ao gigantismo alcançado pelas metrópoles ocidentais, em permanente ebulição de comportamento sob a interferência desses recursos. A enorme influência de jornais e revistas sobre um público mais requintado intelectualmente, e do rádio e da TV em relação ao coletivo de composição massiva e heterogênea, foi considerada um dos fenômenos relevantes dos derradeiros 50 anos do século que passou.

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Os veículos impressos, radiofônicos e televisivos culminaram sua influência nos anos 70, quando se tornaram decisivos nos processos eleitorais dos países democráticos e juízes dos governos que reuniam bons níveis de urbanização, de renda, de liberdades civis e educacionais. A partir dessas considerações, é inevitável reconhecer o papel das atividades de comunicação não somente na política, mas também, e de forma decisiva, na promoção de novos padrões de comportamento e na mudança de costumes, quebrando barreiras culturais tradicionais, principalmente a TV, com forte impacto nas transformações sociais e na economia. Desde que o homem começou o processo civilizatório o progresso tem sido a tônica. Sabe-se que há uma relação direta entre os diferentes meios de comunicação e o progresso alcançado num certo período; ou seja, onde só havia caminhos tortuosos a evolução econômica, social e cultural era mais lenta. A existência de estradas e depois de meios de transporte marítimos etc., não somente faziam o progresso acontecer, mas o faziam numa velocidade maior. O que o século passado assistiu foi a um momento em que a tecnologia criou novos e avançados meios de transporte (aviação, navegação, rodoviário) e avanços tecnológicos na comunicação (jornais e revistas de melhor qualidade gráfica), rádios de maior alcance e a televisão (em preto e branco e a cores, por micro-ondas e por satélite etc.), conjugação que elevou o impacto sobre o ambiente em que atuaram, produzindo mudanças cada vez maiores e mais velozes. AS TRÊS FUNÇÕES A informação cria enlaces entre os entes sociais. Faz com que pessoas, instituições, empresas e demais agentes sociais falem entre si. Sabemos da importância da comuni-

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cação interpessoal e entre os demais entes de uma sociedade, sejam pessoas físicas ou aqueles que compõem as instâncias responsáveis pelo funcionamento desses agrupamentos. Ao vincular pessoas dos diversos estamento sociais entre si, os meios de comunicação fortalecem o conceito de sociedade como uma colmeia em permanente atividade. Foi graças a eles que ideias simples passaram a circular de cima para baixo, e horizontalmente, aumentando a sensação de participação e mudança. Nunca antes na história da humanidade houve um período em que os acontecimentos da ciência, da técnica e das artes che-

gassem a tantas pessoas nos mais diferentes lugares da Terra, criando a sensação de aproximação e participação. Isso elevou o sentimento de pertencer a um patamar mais elevado, ativando novas opiniões, criando modas e modismos, tendências, correntes de conduta e de pensamento com efeitos intensivos e expansivos.

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Rotativa de Marinoni no “Le Petit Journal”, na França, 1890

O mundo passou a mudar, a rever atitudes e maneiras de pensar e comportamentos de maneira muito rápida. Um “mundo novo” para muitos que nunca haviam vivenciado uma período tão intenso de trocas sociais. Os eixos centrais do sistema se transformaram em centros emissores de novidades, de média e curta duração, em forma de ondas sucessivas, muitas vezes criadas ou repercutidas pelos meios de comunicação. Esse foi o papel central da mídia no século XX. Os acontecimentos, por mais distantes que ocorressem, eram entregues na sala de jantar, seja pelos jornais e revistas, pelo rádio ou pela televisão. Nem os grandes conflitos da segunda metade do século XX ficaram de fora, pois os meios os converteram em espetáculos para as grandes plateias universalizadas, a exemplo da Guerra do Vietnã.

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FUNÇÕES DOS MEIOS POLÍTICA – O jornal impresso nasceu como panfleto político nas agitadas contendas do século XVIII na Europa. Daí saltou para as gráficas e ganhou status empresarial. Passou a informante privilegiado do que acontecia nos recônditos do poder, fazendo o enlace entre este e o homem da rua. Erigiu-se em vigilante do bem público, olho da sociedade. Ganhou reconhecimento e lutou, tenazmente, para que fossem reconhecidas sua isenção e qualidade de defensor dos interesses coletivos face ao poder político. ECONÔMICA – Com o pragmatismo que a caracteriza, a economia logo descobriu nos veículos de comunicação um aliado decisivo em sua busca por resultados. Assim, jornais, rádios e decisivamente a TV, passaram a ser a grande vitrine da economia, divulgando tendências e modismos, criando, junto com a publicidade, necessidades. De mãos dadas, elevaram a alturas siderais essa maneira de ser, inaugurando a Sociedade de Consumo. COMPORTAMENTAL - A cultura, que comporta inúmeras definições, pode ser resumida como algo que, à semelhança da argamassa, une os tijolos de uma parede. Ela é

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o que de mais forte temos. Do berço ao túmulo, nos marca de forma indelével. Ela influencia comportamentos, modas e costumes, e pode ser positiva quando desempenha o papel que identifica um ou milhares de indivíduos com um conjunto de valores e crenças. É, portanto, de importância vital para os grupos sociais, a exemplo da cultura nordestina para os nordestinos. Dá a cada um identidade e sentido de pertencer, contribuindo para a sanidade individual. Mas pode, também, ser um fator de paralisia que dificulta as mudanças sociais, impede a sociedade de progredir. Sociedades agrárias, onde há pouca comunicação interpessoal, sofrem de elevado grau de conservadorismo, estando mais impermeáveis às transformações. Às vezes, as mudanças são decisivas para o progresso geral de uma comunidade - na forma de pensar, de ver o mundo, de aceitar as coisas. Os jornais, o rádio, e principalmente a TV, tiveram um papel crucial nas modificações de comportamento e na quebra de barreiras, mormente na segunda metade do século XX. A divulgação da ciência, das conquistas da técnica, das obras de arte, do vestuário e de formas de conduta originários dos centros mais adiantados, fez proliferar pelo resto do mundo um incontido desejo de ser igual, de ser moderno, de progresso. Desejo de estar nessa corrente de atualidade, de modernidade, de costas para o passado. A Organização Arnon de Mello e Alagoas No momento em que o jornalista Arnon de Mello adquiriu de Luís Silveira a Gazeta de Alagoas, ele estava inaugurando um novo capítulo na história das comunicações em seu estado natal. Experiente e consagrado como profissional do jornalismo brasileiro, num momento da história em que os holofotes levavam seus profissionais ao centro do poder como irmãos siameses dos que detinham as rédeas das decisões nacionais, Arnon de Mello se revelaria um empreendedor de visão atilada.

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Alagoas era então uma província distante da capital da República e um estado pequeno, mesmo dentro da constelação nordestina. Com a tenacidade dos realizadores, Arnon de Mello deu início à construção do que no futuro seria um dos mais sólidos e modernos grupos de comunicação do país, partindo de uma base pequena que era o jornal recém-adquirido. Todas as empresas de jornais, revistas, rádios e emissoras de televisão sabem que a sobrevivência depende de uma equação que se chama eficiência. Jornais são produtos híbridos, porque devem, diariamente, apresentar aos seus leitores um menu variado, que vai da política à moda, do crime à cultura, da economia aos noticiários nacional e internacional. Foi em meio aos embates políticos das oligarquias locais, movidos a interesses paroquiais, que o jornalista Arnon de Mello aceitou o desafio de fazer um periódico que fosse a um só tempo um espelho de sua terra e um arauto da modernidade que soprava do Sudeste e, eventualmente, das terras de além-mar, quando as comunicações incipientes dos telégrafos permitiam, e sob risco de apagão devido à precariedade do fornecimento de energia. Nos anos seguintes, entre os fatos locais e os acontecimentos externos que, devido ao progresso dos meios de transmissão, aproximavam o jornal dos padrões de modernidade vigentes na imprensa do Centro-Sul e até do exterior, a Gazeta de Alagoas cresceu e se afirmou, funcionando como embrião do que seria o futuro grupo de comunicação. Tornou-se, logo, um referencial para a sociedade alagoana. Numa época em que os jornais tinham sua posição de hegemonia socialmente reconhecida, a Gazeta era quem chegava primeiro às casas, não somente em Maceió, mas em todo estado, levando as notícias recentes. Aos poucos, se convertia no verdadeiro mediador entre o poder político e o cidadão. Uma força incontestável! Em seguida veio a Rádio Gazeta AM, propagando a linha editorial do que já era o embrião ampliado do futuro grupo para mi-

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lhares e milhares de conterrâneos, e até para fora de Alagoas. As empresas da OAM nasceram com a vocação da comunicação, mas com o espírito empresarial. Essa concepção as levou a se destacar e se impor à concorrência, firmando-se no curso do tempo. Logo a Gazeta de Alagoas se tornaria um forte dinamizador das atividades econômicas do estado devido à sua audiência de leitores. Suas páginas se tornaram um espelho dos vários setores da economia, cujos anúncios buscavam potenciais clientes. Identificando carências na infraestrutura de transporte, energia e outros setores, a Gazeta transformou tais demandas em sua própria agenda e fez contraponto ao poder local. Com as rádios vieram as ligações horizontais e verticais que estimularam a coesão social e a valorização dos costumes alagoanos, contribuindo para preservar e ampliar a autoestima de sua gente. Elas representam importante fator em sociedades que experimentam rápido desenvolvimento, com elevado risco de perda de identidade pelos grupos que chegam à vida urbana vindos do campo.

Quando a TV Gazeta chegou a Alagoas, ainda na década de 70, a televisão no Brasil, cujo ciclo de modernidade havia sido inaugurado pela Rede Globo, na década de 60, ainda não ganhara a maioridade. Num país de dimensões continentais, a lentidão das comunicações impusera certo isolamento regional em relação aos centros mais dinâmicos, que orbitavam em torno da antiga capital da República e de São Paulo. Era essa impermeabilização que fazia brasileiros do Sudeste se sentirem estrangeiros quando encontravam um nordestino ou estes, igualmente, estranhos diante de sulistas. Sociedades de certa forma herméticas lutavam contra o isolamento, que só era quebrado pelos poucos voos interestaduais, pela navegação de cabotagem e pelos que se

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aventuravam pelas toscas e esburacadas estradas nacionais - as BRs. A chegada da TV Gazeta a Alagoas representou um momento singular para a vida do estado. Alagoas ingressava naquele instante no clube do amanhã, que com ele trazia promessas infinitas de informação e lazer, tudo através da telinha que, de imediato, converteu-se no objeto de desejo de dez entre dez alagoanos. A TV Gazeta multiplicou várias vezes o poder de inclusão na modernidade que detinha o jornal Gazeta de Alagoas. Tudo tinha que ser bonito na telinha, a fala, a roupa, a iluminação, o som etc. Havia a preocupação com a aparência, própria dos centros mais modernos, com a plasticidade, fazendo a velha propaganda virar publicidade. Cada vez comerciais melhores, com maior poder de sedução sobre o telespectador. Uma revolução nos costumes, nos hábitos, no comportamento. Afinal, Alagoas ia, aos poucos, via TV Gazeta, ocupando seu lugar na Aldeia Global, não somente aquela que a Rede Globo estenderia pelo Brasil afora, mas também a outra, de conceito mais amplo, criada por Herbert Marshall McLuhan, o destacado educador, intelectual, filósofo e teórico canadense da comunicação. Se já era forte o papel da Gazeta de Alagoas e rádios Gazeta (a essa época já fora inaugurada a Rádio Gazeta FM) como ativadores da economia e do desenvolvimento de Alagoas, esse papel foi elevado pela TV recém-inaugurada que, juntando voz e imagem, tornou-se um dinâmico canal das relações comerciais.

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A velha província foi sacudida, como de resto o Brasil, pela versão, de origem americana, que viria a ser o padrão Globo de comunicação. Dessa forma, hábitos arraigados foram sendo socavados lenta e inexoravelmente por novos padrões vindos via televisão. Um embate entre o ontem, o hoje e o amanhã. Com defensores e detratores, mas que de forma inelutável, como acontece com os movimentos apoiados em tecnologias inovadoras, se impôs.

Atuando em conjunto, jornal, rádios e TV, aos qual se juntaram depois a Gazeta Web - a versão para a era digital -, o Instituto Arnon de Mello e a TV Mar, formariam um conjunto de alto poder comunicacional, reunidos na Organização Arnon de Mello, elevando a novos patamares a capacidade desse conglomerado de influir, de maneira decisiva, na economia, na formulação de políticas, nos hábitos e nos costumes de Alagoas e de sua gente.

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as empresas que formam a oam

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Arnon de Mello, um homem apaixonado pela informação Patrícia Barros

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Arnon Affonso de Farias Mello nasceu em 19 de setembro de 1911, no Engenho Cachoeirinha, de seus pais Manuel Affonso Calheiros de Mello e Lúcia de Farias Mello. Sua relação com o jornalismo surgiu ainda na adolescência, quando o jornalista Luiz Magalhães da Silveira, fundador e diretor do Jornal de Alagoas, conseguiu-lhe uma colocação como agenciador de assinaturas e, em seguida, o emprego de revisor. Com apenas 15 anos já revisava as produções jornalísticas e literárias de nomes como Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz , entre outros, que se projetavam nas letras. Arnon de Mello tornou-se repórter no Jornal de Alagoas, do qual terminou sendo primeiro diretor-geral em 1936, assim que este órgão de imprensa passou a pertencer à cadeia dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Ficou neste cargo até 1942, embora radicado, desde fevereiro de 1930, no Rio de Janeiro, onde se projetou nacionalmente com as grandes reportagens produzidas e divulgadas através desta maior rede da área de comunicação de massa do País. Jornalista por formação, Arnon decidira investir no Estado-natal os bens adquiridos como profissional da imprensa, da advocacia e empresário ao longo de décadas no Sul do País. Logo que assumiu o controle do que seria o primeiro órgão jornalístico da OAM, a Gazeta de Alagoas, modificou-lhe a feição gráfica, imprimindo-lhe uma moderna e revolucionária administração.

Arnon costumava repetir: “Não importa que alguém considere loucura o arrojo das iniciativas, desde que sejam profundas as raízes dela”. O jornalista, político e empresário vinha seguindo essa orientação desde a infância. E a seguiria até o fim da vida.

Senador Arnon de Mello

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Gazeta de Alagoas – 82 anos de história A Gazeta de Alagoas foi inaugurada por Luiz Silveira na tarde de 24 de fevereiro de 1934. No dia seguinte, saía às ruas como o mais moderno diário da época. Em 1948, a Gazeta deixou de ser propriedade de Luiz Silveira, seu fundador, passando a pertencer a uma cooperativa, que seria a primeira no campo das comunicações. Os primeiros exemplares tinham a colaboração de nomes como Guedes de Miranda, Diegues Júnior, Mário Marroquim, Luiz Lavenére e Afrânio Lages. Para completar o time, o primeiro correspondente em Brasília foi o jornalista Arnon de Mello, já consagrado nacionalmente pelos seus artigos e reportagens. Arnon de Mello começou a atuar como repórter político na então capital do país, tendo trabalhado como revisor, depois repórter e redator no Jornal de Alagoas, além de ser o primeiro correspondente da Gazeta no Distrito Federal. Evitou o desaparecimento dessa empresas, adquirindo-a na década de 50. Surgia a Organização Arnon de Mello, que logo iria se transformar em um dos maiores complexos de comunicação do país. Era também o início de uma sucessão de iniciativas pioneiras no universo das comunicações de massa no território alagoano. A Gazeta não apenas seria o primeiro jornal no Estado a ser impresso com a impressora de última geração, a introduzir o telex e os sistemas de radiofoto e telefoto. Foi também a primeira, entre as folhas diárias da iniciativa privada em Alagoas, a ser impressa a cores e em off-set, a ser acessada pela Internet e ter todos os departamentos informatizados. Em 1973, com 39 anos de circulação, a Gazeta estava situada na Rua do Comércio e já vendia 9 mil exemplares. A direção da empresa anunciava para breve a utilização dos equipamentos off-set (foi a primeira do Estado). Era a Gazeta se modernizando dia a dia. Enquanto uma rede de repórteres espalhados por todo o Estado fazia a cobertura local, este jornal cuidava em captar as informações com fotos mais atuais, mantendo

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Redação da Gazeta de Alagoas: vários prêmios obtidos em diversas categorias de reportagem

seus leitores informados, por meio do telex e teletipo e telefoto, os únicos equipamentos até então existentes numa empresa jornalística e ligados às principais agências de notícias do mundo. Antes da década de 80 terminar, a Gazeta ultrapassava a marca dos 10 mil assinantes, começava a espalhar sucursais pelo interior do Estado e já contava com matérias produzidas por um maior número de agências e logo foi o primeiro jornal alagoano lido no mundo inteiro pela Internet. Primeiro jornal a ser impresso em off-set e em cores em suas próprias oficinas e também primeiro órgão alagoano de imprensa a ser acessado na Internet, a Gazeta de Alagoas conta hoje com uma das redações mais modernas do País e um projeto gráfico-editorial inovador. Empresa jornalística com maior número de sucursais no interior de Alagoas é também a única a contar com um instituto próprio de pesquisa de opinião – o GAPE.

Em 2004 a empresa mudou a sua sede, transferindo-se do prédio na Av. Durval de Góes Monteiro, no Tabuleiro do Martins, para a área anexa ao prédio da TV Gazeta e Rádios Gazeta, unindo-se, assim, às demais empresas da Organização Arnon de Mello em um mesmo complexo empresarial. Hoje a GAZETA conta com uma das mais modernas redações do país, o que garante mais qualidade de impressão e transmissão das notícias aos leitores.

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Parque gráfico

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Em dezembro de 2008 foi inaugurado o novo parque industrial da Gazeta, com 1.100 m² de área construída num terreno de 10 mil m². Um momento que marcou a história da empresa. As novas instalações possibilitaram uma série de adaptações, comportando o dobro da capacidade utilizada atualmente e até permitindo o trânsito de caminhões na parte interna. Uma nova máquina rotativa (foto) com 19 unidades compostas por duas dobradeiras, foi adquirida, transformando o parque gráfico no mais moderno do Nordeste. Considerada a escola do jornalismo alagoano, por onde passaram grandes nomes da imprensa no estado, a redação da Gazeta, composta por repórteres, editores, revisores, diagramadores e fotógrafos, é conhecida por inúmeros prêmios conquistados. Um componente forte para o direcionamento da empresa é a liberdade de trabalhar exclusivamente em função da notícia. Com 82 anos de existência, a Gazeta de Alagoas não é apenas o mais tradicional veículo de comunicação impressa do Estado. É também o de maior credibilidade e líder absoluto na preferência dos leitores. Isso foi comprovado na última pesquisa IBOPE. Para o mercado publicitário, anunciar na Gazeta de Alagoas é atingir pessoas com alto poder de consumo, sendo que 90% destes leitores habituais são das classes A e B com mais de 25 anos. Independência, autonomia editorial, investimentos constantes em tecnologia e o empenho dos profissionais são características fundamentais que garantem o sucesso da Gazeta de Alagoas.

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Gazetaweb, pioneirismo que surpreendeu Alagoas Em novembro de 1995 a Organização Arnon de Mello (OAM) inovou no meio de comunicação com o site Gazeta OnLine. A ideia partiu do senador Fernando Collor, que acompanhava os avanços tecnológicos nos Estados Unidos e apostou no projeto quando as pessoas sequer tinham noção do valor da Web. Nascida de forma acanhada, ela deu pulos grandiosos. A princípio, um espaço para transcrever matérias da Gazeta de Alagoas. Se na década de 90 a Gazetaweb era um site estático, de linguagem limitada, mudou rapidamente quando a OAM decidiu transformá-lo em algo mais dinâmico. Após lançar o site da Gazeta de Alagoas, percebeu-se a necessidade de lançar um site para representar a própria Organização como um todo, chamado Gazetaweb. O portal Gazetaweb.com foi ao ar em março de 2008, inovando ao disponibilizar em um só endereço na web, em tempo real, o conteúdo de jornalismo da TV Gazeta, Gazeta de Alagoas e Rádio Gazeta e da própria Gazetaweb, além de reportagens em formato de texto, áudio, e vídeo. O objetivo era reforçar a cobertura jornalística na Internet, oferecendo ao usuário o máximo de conteúdo das diversas empresas da Organização Arnon de Mello em um só local, garantindo credibilidade, visibilidade e velocidade na apuração da informação. Quinto portal do país e o primeiro a entrar no ar em Alagoas, a Gazetaweb diferencia por levar até o internauta a informação mais completa, no menor tempo possível. Além disso, a Gazetaweb funciona, de fato, como portal. O internauta encontra notícias atualizadas produzidas pela redação, mas pode acessar e assistir o que é veiculado nas rádios, ler a Gazeta de Alagoas ou acompanhar, ao vivo, o contedo da TV Mar, o canal fechado da OAM. Em 2011 a Gazetaweb iniciou a parceria com a rádio Gazeta, com a fusão das duas redações. Isso deu um ganho de qualidade para as coberturas jornalísticas e aumentou o número de acessos do portal e na audiência da rádio. Com a inserção dos

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podcasts nas notícias, quem não ouviu a rádio pode fazê-lo no site e isso tornou-se um diferencial. Com muitos prêmios conquistados e uma história construída com a contribuição de profissionais gabaritados, a Gazetaweb tem como pauta diária o compromisso com o leitor. O trabalho começa, todos os dias, às 6h, e prossegue até meia-noite. Uma busca incessante por informações para deixar o internauta por dentro de tudo o que acontece em Alagoas, no Brasil e no mundo. Com uma redação jovem, o Gazetaweb é hoje o portal mais acessado de Alagoas em números absolutos. Com um trabalho pautado na ética e no respeito ao leitor, o site conquistou, entre 2011 e 2015, mais de dez prêmios de jornalismo, um reconhecimento às matérias de qualidade veiculadas no portal.

Redação da Rádio Gazetaweb, em Maceió

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Novidades em 2015 Responsável por levar aos computadores, smartphones e tablets alagoanos um conteúdo rico em informações atualizadas diariamente, o portal de Gazetaweb passou por uma nova transformação no final de 2015, quando lançou um novo layout. O novo modelo comemorou os 20 anos do primeiro site de notícias de Alagoas, nascido como Gazeta Online, e trouxe para o leitor, além de uma nova programação, páginas reestruturadas e um banco de dados atualizado. Foram necessários 16 meses para o desenvolvimento do novo projeto. Através de muitas pesquisas e reuniões, cada detalhe foi pensado para proporcionar uma experiência de uso aprimorada através do portal, garantindo uma maior interação e aperfeiçoamento do acesso à informação. O resultado foi uma página moderna e de fácil navegação. Outro diferencial importante do novo projeto gráfico foi conseguir agregar no site todo o conteúdo produzido pela Organização Arnon de Mello, seja ele radiofônico, impresso ou televisivo. Dessa forma, os internautas conseguem, com facilidade, navegar pelas rádios Gazeta AM e FM, Tv Mar e Gazeta de Alagoas por meio do portal.

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Rádio Gazeta - inaugurada na década de 60 Importante veículo de comunicação por todo o mundo, o rádio sempre abrangeu um grande público, em várias faixas sociais. Em Alagoas, o senador Arnon de Mello imprimiu uma nova marca nos meios de comunicação quando decidiu inaugurar, em 2 de outubro de 1960, a Rádio Gazeta, doze anos após o surgimento do rádio em Alagoas. Já nessa época, consolidava sua liderança em audiência junto ao mercado publicitário e de ouvintes graças a uma programação diversificada, onde a boa informação estava em primeiro lugar. Grandes fatos foram transmitidos pela Rádio Gazeta ao longo desses 55 anos de história, como a chegada do homem à lua, as guerras do Vietnã, do Golfo, Malvinas, Iugoslávia; e os mais recentes, como os atentados de 11 de setembro em Nova Iorque, a invasão ao Afeganistão, ao Iraque, entre outros acontecimentos. Marcada por atravessar com eficiência a era em que a rádio AM era exclusivamente musical, a Rádio Gazeta se consagrou como uma emissora jornalística. Foi preciso abreviar a programação musical, abrindo espaço à informação e ao esporte. Tantos investimentos permitiram à empresa ser classificada entre as dez maiores emissoras do Brasil na cobertura de eventos esportivos internacionais, como a Copa do Mundo, Olimpíadas, Copa América e torneios esportivos das mais diversas modalidades. O transmissor potente garante o alcance da Rádio Gazeta nos 102 municípios de Alagoas e também em algumas cidades de estados vizinhos. São 19 horas diárias com programação ao vivo, informação e prestação de serviços. O programa Ministério do Povo, com 31 anos no ar, é um dos mais antigos do rádio alagoano e líder em audiência. Mas não é só a boa informação e a programação diversificada que fazem a Rádio Gazeta a preferida dos ouvintes alagoanos. A promo-

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Estúdio Rádio Gazeta

ção Caravana da Felicidade, realizada desde o início da década de 70 no mês de maio, reúne mais de 140 mil cartas de muitos filhos querendo presentear suas mães. Em 2011 A Organização Arnon de Mello lançou a Rádio Gazeta Web. O portal marcou a integração entre a Rádio Gazeta e o portal Gazetaweb.com. O modelo multimidiático é pioneiro em Alagoas, uma marca da OAM. A integração de mídias representou um ganho de qualidade para os dois veículos. Celeiro de grandes radialistas do estado, profissionais que ajudaram a fazer a história do rádio em Alagoas, a Rádio Gazeta sempre foi uma grande escola de informação e cultura, responsável por imprimir um hábito que até hoje existe entre os alagoanos: manter-se informado ouvindo a Rádio Gazeta. “Informação com credibilidade e independência”. O slogan que reflete a atuação da Rádio Gazeta desde a sua inauguração.

Em 15 de novembro de 1983 a OAM inaugura a Rádio Gazeta FM Arapiraca, com uma programação local voltada para a música e informação. Já em 17 de setembro de 1997 é inaugurada a Rádio Gazeta Pão de Açúcar, sendo responsável por transmitir a programação da Rádio Gazeta no sertão, mas também conta com horas diárias de programação local. Com as duas rádios no interior do estado, a OAM amplia definitivamente a marca da Rádio Gazeta no Estado e consolida a liderança do maior grupo de comunicação de Alagoas.

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Gazeta FM, um novo momento

Rádio Gazeta Arapiraca: conexão com a comunidade

Fachada da Rádio Gazeta Pão de Açúcar

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Com uma linguagem moderna, eclética e dinâmica, a Rádio Gazeta FM entrou para a preferência dos ouvintes, que passaram a se referir como a 94,1. Inaugurada dia 1º de julho de 1978, a emissora tornou-se líder desde o seu surgimento e sinônimo de inovação e sucesso musical. No início participou da transmissão de outras rádios, mas já no começo da década de 80 passou a ter a programação totalmente local. A rádio é a mais potente na faixa de frequência modulada com 30 kilowatts, cobrindo todo o estado de Alagoas e parte da região. Com o slogan “Na Gazeta, o sucesso é você!”, conquistou a preferência dos ouvintes e isso foi comprovado nas últimas pesquisas do IBOPE, que apontaram a Rádio Gazeta líder em audiência em Alagoas. São 24 horas de música, de domingo a domingo. Para contar com a total automação de música, comerciais, vinhetas e qualidade de som foram feitos pesados investimentos, inclusive levando a sua programação para a Internet e mantendo os ouvintes sempre bem informados em qualquer lugar que ele esteja. Trabalhando com os mais altos padrões de qualidade e uma moderna equipe de locutores e operadores, a Rádio Gazeta FM 94,1 reúne ousadia, irreverência e a melhor programação musical, voltada para os ouvintes de todas as faixas. Um diferencial da Rádio Gazeta é a estratégia comercial avançada, com produtos como o Pit Stop e a Blitz Gazeta, levando a força de comunicação da rádio até os clientes.

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Complexo de comunicação (Jornal, Rádios AM e FM, TV e Web) da OAM, no bairro do Farol, em primeiro plano

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TV Gazeta de Alagoas Em 27 de setembro de 1975 a TV Gazeta foi inaugurada com o compromisso de levar a melhor programação e um jornalismo sério a todos os alagoanos. Ao longo desses 40 anos, a emissora filiada da Rede Globo evoluiu em tecnologia e contribuição social, transformando-se em um dos mais importantes veículos de comunicação de Alagoas. Seu jornalismo atuante leva a informação aos lugares mais distantes de Alagoas. Mais do que uma emissora de televisão, a TV Gazeta é hoje o principal canal da informação, do entretenimento e do social de todos os alagoanos. A programação diversificada, a qualidade da produção e do jornalismo, a cobertura geográfica e a consistência dos índices de audiência permitem que a TV Gazeta adicione valor e visibilidade para a comunicação das marcas e dos clientes. Em 2005 a TV Gazeta teve um grande avanço com a aquisição do satélite, o que permitiu à emissora chegar a quase todos os municípios de Alagoas, trazendo um marco para o cenário da comunicação no estado. Em maio de 2007 a TV Globo deu um grande passo em direção ao inícios das transmissões digitais, iniciando na cidade de São Paulo. A estação transmitiu em caráter experimental até dezembro daquele ano, quando foi iniciada oficialmente a transmissão do sinal digital, e serviu para análise da cobertura em aparelhos fixos, móveis e portáteis e testes com os primeiros protótipos de receptores disponibilizados pela indústria nacional.

“Com a TV Gazeta

Bom Dia AL, jornalismo da TV Gazeta

rompemos um laço que amarrava Alagoas à triste condição de único estado que ainda não dispunha de uma TV” Senador Arnon de Mello

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Três anos depois, em 2010, chegou a vez da TV Gazeta entrar nessa nova era, sendo a primeira emissora a transmitir o sinal digital em Alagoas, beneficiando a região metropolitana de Maceió. A afiliada de Alagoas foi a 39ª a entrar na era digital, entre as 120 exibidoras em todo o país. O novo momento marcou a história da TV Gazeta e inseriu definitivamente Alagoas em um novo patamar de tecnologia e inovação. A televisão digital não era apenas uma nova forma de se fazer e assitir televisão. A tecnologia de transmissão de sinais passou a proporcionar aos telespectadores uma série de novos benefícios. Aliado à altíssima resolução de som e imagem, que ganhou uma qualidade impensável sobre o sistema analógico, a TV digital possibilitou recursos de mobilidade e portabilidade.

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A expansão do sinal digital para as demais cidades do estado de Alagoas está prevista para os próximos anos, mas ainda não há datas definidas. Em março de 2012 o jornalismo local passou a ser todo captado e transmitido em HDTV, além de um novo estúdio para os seus telejornais e para o Globo Esporte. Anteriormente, os programas locais já eram todos captados em alta definição. Nesse mesmo ano foram lançadas as versões alagoanas do G1 e do GloboEsporte.com. Em 2015, ano em que comemorou 40 anos de história, a TV Gazeta passou a transmitir o Campeonato Alagoano de Futebol, obtendo o direito exclusivo de transmissão do campeonato pela televisão e pela Internet a partir deste ano.

Ilha de edição TV Gazeta

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TV Mar, a nova empresa da OAM

Estúdio TV Mar

A inauguração da nova TV Mar em 2013 marcou um novo momento não apenas no jornalismo alagoano. A mais moderna das emissoras do Estado surgiu com uma proposta ainda mais desafiadora de ser também a TV mais próxima da população. A mais jovem empresa da Organização Arnon de Mello chegou ao cenário das comunicações com equipamentos de última geração, pronta para se transformar no canal com o maior conteúdo local. Ao longo de pouco mais de dois anos a grade da programação se fortaleceu, ganhou índices supreendentes de audiência e o Canal 25 da NET é hoje um dos espaços de maior credibilidade da televisão alagoana. Fundada há 12 anos, a TV Mar foi incorporada à OAM e passou por um processo de modernização, ganhando novas instalações. É o único canal a cabo local que transmite tanto no sistema analógico quanto no digital. Isso significa que 100% dos assinantes da NET em Maceió podem sintonizar a TV Mar. A programação também foi reforçada com a entrada de novos profissionais, que se somaram a alguns apresentadores que já estavam na grade. O objetivo é oferecer aos alagoanos uma programação diferenciada, eclética, voltada para a comunidade e o interesse pblico.

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Responsável em Alagoa por iniciar uma convergência entre as mídias, a TV Mar foi pioneira em permitir que fosse possível acompanhar em tempo real toda a programação pelos smartphones, uma tendência que já é realidade nas grandes emissoras do mundo. É uma forma de atender aos novos telespectadores, que estão sempre conectados em celulares e tablets. Outro diferencial importante é que a programação da TV Mar também é transmitida em um link no portal Gazetaweb.com, conquistando um alcance supreendente em Alagoas. No Canal 25 da NET a interação pelas redes sociais e todo o conteúdo disponível na web dos smartphones é hoje o maior avanço na área da comunicação no Estado. Com cer-

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ca de 120 mil assinantes da Net em Alagoas, com o aplicativo para iOS e Android, a emissora chega diariamente a um número ainda maior de telespectadores. Uma das maiores novidades da TV Mar é sem dúvida a utilização de uma câmera drone, sendo pioneira na utilização do equipamento por uma emissora em Alagoas. Funciona como um mini-helicóptero com uma câmera acomplada, movido por controle remoto, capaz de captar imagens aéreas de alta qualidade em alturas de até 150 mil metros. Equipamentos de última geração e iluminação de alta tecnologia Led no seu estúdio panorâmico fazem da TV Mar uma televisão de vanguarda em Alagoas.

Sala de edição TV Mar

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Instituto Arnon de Mello (IAM) o braço social e cultural da OAM Ao longo da sua trajetória, a Organização Arnon de Mello (OAM) vem mostrando que cultura, educação e assistência social também fazem parte da sua história, assim como a comunicação transmitida com seriedade em suas empresas. Para o Senador Arnon de Mello, a boa informação não deveria ser a principal missão de seus veículos de comunicação. Era necessário também promover o desenvolvimento cultural e social de Alagoas. Foi a partir desta visão do senador que surgiu a necessidade de servir ainda mais à comunidade alagoana. Em 1996 o Instituto Arnon de Mello (IAM) era inaugurado, imprimindo um novo conceito em desenvolver projetos e programas que resgatam e valorizam a história de Alagoas, seja em melhoria de conhecimentos culturais e educacionais, ou em ações de solidariedade com a comunidade. Reconhecido como utilidade pública pelo Município de Maceió, o IAM tornou-se uma referência em todo o Estado. A cada ano, cresce a participação do Instituto em ações cujo objetivo principal é apenas servir à sociedade alagoana.

178 Dr. Carlos Mendonça, presidente do Instituto Arnon de Mello, na sede da instituição

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O IAM nas comemorações do II Centenário de Maceió (*) Professor Carlos Mendonça – presidente do IAM

O valor do Instituto Arnon de Mello nas comemorações do Segundo Centenário de Maceió, deve ter destaque especial, quando, durante longos meses do ano de 2015, foram promovidos encontros com alunos de Escolas Públicas, com rápidas palestras na Praça do Centenário, no Farol, para destacar que se aproximava os 200 anos da capital alagoana, fazendo jus a um período de comemorações de toda a sociedade e, em especial, a necessidade de mostrar, especialmente ao mais jovens, o valor da grande data da cidade. O Instituto Arnon de Mello de Liberdade Econômica e Promoção Social, instituído como uma homenagem ao Segundo Século da cidade de Maceió, é uma entidade civil, sem fins lucrativos, pertencente à Organização Arnon de Mello, com capacidade cultural de preservar a história de Alagoas e, em especial, da sua Capital. Sua instituição foi decidida pelos acionistas da Organização Arnon de Mello, a qual ficou diretamente vinculado, no dia 11 de setembro de 1989, data de aniversário de

nascimento do seu ilustre patrono, o Senador Arnon de Mello. Com o objetivo primordial de ser um organismo apto a trabalhar como um instrumento de grande eficácia na preservação da história de Alagoas, o IAM logo se tornou um aliado da sociedade alagoana, a partir do momento em que passou a ser o responsável direto pela preservação rigorosa do acervo às entidades públicas e privadas, e toda a sociedade alagoana nos trabalhos que necessitam as informações sobre fatos passados e, em especial, no desenvolvimento de estudos de questões sérias do maior interesse do Estado, especialmente nas áreas de Educação, Ciências, Tecnologia, Ecologia, Desenvolvimento, como trabalhos que contribuam com o bem-estar social. O IAM homenageia, em especial, o fundador da Organização Arnon de Mello, jornalista de visão clara e incomparável na defesa de Alagoas, cuja vontade incansável com grandes lutas políticas e administrativas, sempre foi a de ver o Brasil na plenitude do seu

desenvolvimento e, em consequência, o seu povo feliz, atendido nas suas necessidades primordiais. Assim, o Instituto Arnon de Mello, desde a sua fundação tem sido, silenciosamente, um organismo executor e, em especial, apoiador de ações da iniciativa da sociedade alagoana que visam o desenvolvimento do Estado, o bem-estar do seu povo e a garantia dos direitos sociais de todos. Em todos os campos, onde há o interesse da sociedade, o Instituto Arnon de Mello tem estado presente, direta ou indiretamente, procurando ajudar a fazer o bem, sem nenhuma maior divulgação das suas ações, mas cumprindo com os objetivos para os quais foi instituído pelos acionistas da Organização Arnon de Mello, em homenagem aos seu grande fundador. Vale destacar as ações que têm integrado as programações anuais nos campos Social, Educacional, Cultural, Ecológica, Preservação Patrimonial e Trabalhos Científicos.

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CULTURA Igualmente, com a mesma efetividade, o Instituto Arnon de Mello tem voltado as suas vistas para o campo cultural, especialmente no apoio à publicação de obras literárias consideradas de valor real para a sociedade alagoana, particularmente aquelas que oferecem auxílio na orientação e integração da família no mundo cultural. Diretamente, o Instituto Arnon de Mello, anualmente, por ocasião das comemorações da semana do seu Patrono, Senador Arnon

de Mello, tem realizado, com grande êxito, um concurso literário destinado à participação de estudantes de segundo grau, a fim de incentivar o gosto pela literatura e, em especial, descobrir novos valores culturais para o futuro. Shows culturais que têm valor para o desenvolvimento cultural da juventude, especialmente com artistas religiosos, têm sido uma constante com o apoio do IAM, atendendo às solicitações da comunidade da capital.

ECOLOGIA

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O Instituto Arnon de Mello, preocupado com os problemas ambientais, tem sido parceiro constante nas ações que são desenvolvidas na capital e em alguns municípios do estado no tocante à proteção do meio ambiente. O IAM, visando a proteção das lagoas Manguaba e Mundaú, já prestou inestimáveis apoios a alguns municípios situados nos estuários das mesmas, inclusive com a divulgação de programas e eventos que se destinam ao esclarecimento das comunidades, em defesa dessas lagoas. Em outra oportunidade, objetivando colaborar com os serviços de fiscalização e proteção das lagoas Mundaú e Manguaba, o IAM fez convênio com o Instituto do Meio Ambiente, cedendo ao mesmo um barco motorizado para os seus trabalhos naqueles mananciais. O Instituto Arnon de Mello já vem há vários anos oferecendo integral apoio às campanhas que pedem a revitalização do Rio São Francisco, inclusive selecionando e conseguindo junto à Gazeta de Alagoas que sejam publicadas, com prioridade, todas as matérias que defendem a preservação daquele Patrimônio Nacional.

Há cerca de quatro anos, o IAM, através da Rádio Gazeta, promoveu uma programação especial em todos os municípios alagoanos da margem do Rio São Francisco, recebendo nos seus microfones grande nmero de personalidades, inclusive de outros Estados. Da mesma sorte que outros programas do interesse da sociedade, o Instituto Arnon de Mello não tem se descuidado de emprestar o seu apoio à preservação do Patrimônio Histórico do Estado, especialmente em obras que não têm a proteção do Poder Público. Naturalmente que, nesses casos, o IAM funciona como coordenador das atividades, encontrando especialistas, estudiosos, construtores, restauradores, todos conhecedores do assunto, e, em especial, parceiros que possam verdadeira e desinteressadamente apoiar os projetos. Não é fácil, num estado onde o Patrimônio Histórico tem sido objeto de atenção apenas dos tratores e das picaretas destruidores, alcançar uma vitória restaurando uma edificação histórica.

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SANTUÁRIO DE NOSSA SENHORA DOS REMÉDIOS O exemplo maior da contribuição cultural do Instituto Arnon de Mello para Alagoas foi a restauração integral da Igreja de Nossa Senhora dos Remédios (foto) uma relíquia dos idos dos anos 1850, construída em plena mata atlântica, próximo às margens da Lagoa Mundaú, no município de Coqueiro Seco distante da capital do Estado pouco mais de 20 quilômetros, que se encontrava praticamente destruída pela ação da intempérie, dos cupins e dos morcegos. Trata-se de uma relíquia sacra, uma obra ímpar que, pelo seu valor histórico, religioso, arquitetônico e, especialmente, pela grandiosidade da massa humana que cultua a fé há mais de 150 anos, não podia desaparecer.

depois da restauração Toda a estrutura estava danificada, sem que houvesse a menor manifestação dos Poderes Públicos para evitar a extinção total daquela igreja consagrada como milagrosa. Foi um trabalho hercúleo. Durante quatro meses de trabalhos intensos, marcando os dias com 12 (doze) horas úteis, engenheiros, arquitetos e dezenas de operários trabalharam cuidadosamente, especialmente no aproveitamento de toda a estrutura original. Dezenas de metros cúbicos de pedras decorativas. Centenas de sacos de cimentos. Monumental muro de arrimo para proteger uma grande barreira lateral. Construção de balaustrada decorativa com mais de 300 metros de extensão. Escadaria de concreto com mais de 120 metros. Os dois altares que ainda existiam se encontravam totalmente apodrecidos (um terceiro havia sido incendiado) foram desmontados, peça por peça, e levados para São Paulo para serem restaurados.

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181 Altar Mor

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Todas as peças do acervo da igreja foram recuperadas Os trabalhos que haviam iniciado no final do mês de março de 2005 foram totalmente concluídos no mês de julho, daquele ano, quando novamente foi inaugurada aquela igreja, agora, um verdadeiro santuário, objeto de admiração de todos que ali vão visitar. Somente conhecendo, in loco, aquela obra magnífica poder-se-á avaliar o valor dos trabalhos coordenados pelo Instituto Arnon de Mello.

Relativamente a esta obra, o Instituto Arnon de Mello fez publicar um livro mostrando todo o trabalho realizado, a partir de como se encontrava o templo anteriormente. É um verdadeiro documentário fotográfico que se encontra arquivado em todos os órgãos e entidades que registram a história de Alagoas.

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Dom José Carlos Melo, Arcebispo Metropolitano de Maceió (2006)

Dom José Carlos Melo inaugura obras do santuário

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Emoção e fé marcaram a inauguração das obras de reforma do santuário de Nossa Senhora dos Remédios, na zona rural de Coqueiro Seco, prestigiada pela comunidade. Familiares de João Duda Calado, proprietário das terras onde fica a igrejinha, também estiveram presentes. “Nunca tinha visto essa igreja tão linda. Nunca pensei na vida em viver um momento desses!, dizia emo-

cionada, a dona de casa Augusta dos Santos. Ela mora no lugar há mais de 60 anos e é uma espécie de zeladora voluntária do santuário. “É um momento importante, porque a igreja é um ambiente sagrado, que favorece o espírito de oração. É um verdadeiro milagre de Nossa Senhora dos Remédios”, destacou o Cônego Celso Alípio.

O próprio Arcebispo ressaltou a importância do momento, pelo louvor à Nossa Senhora. “É um local de dedicação à Maria Santíssima, que com o título de Nossa Senhora dos Remédios, oferece a todos nós uma motivação a mais para a devoção”, disse ele. Se-

gundo o pároco da comunidade, padre João Carnaúba, a igreja estava em situação de decadência, mas nunca foi abandonada pela paróquia nem pelos fiéis, que sonhavam com a restauração. “É um presente de Deus o que estamos vivendo hoje”, observou ele.

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CENTRO SOCIAL DOM ADELMO MACHADO Ainda sobre restauração do patrimônio, já no ano de 2006 o Instituto Arnon de Mello, atendeu à solicitação formulada por Dom José Carlos Melo, Arcebispo Metropolitano de Maceió, que fez veemente apelo no sentido de que o IAM procedesse à restauração do Centro Social Dom Adelmo Machado, que se encontrava com as suas atividades paralisadas face o estado de deterioração de sua estrutura. É de ser lembrado, ainda que o Instituto, com um ônibus devidamente adaptado e designado de “Expresso do Saber”, o Instituto

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Arnon de Mello tem levado às escolas rurais do Estado um grande volume de conhecimentos, especialmente, procurando incentivar as crianças para a leitura e o interesse pelos estudos. Por outro lado, cuidadosamente, o IAM tem produzido obras magníficas, de grande valor social e cultural. Obras que hoje já se encontram em várias bibliotecas do Brasil e do Exterior, especialmente universitárias, recebendo, por isso, grande elogios e permanente agradecimentos.

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ARQUIVO DO INSTITUTO ARNON DE MELLO O Instituto guarda um dos mais completos acervos de livros que pertenceram ao Senador Arnon de Mello, além do arquivo com todos os exemplares da Gazeta, inclusive o seu primeiro número, publicado em 25 de fevereiro de 1934. Um serviço gratuito de apoio à pesquisa educacional, oferece ao mundo estudantil e à sociedade em geral as páginas da Gazeta para consultas orientadas. Muitas dessas pesquisas serviram para dissertações de Mestrado e teses de Doutorado.

LANÇAMENTO DE IMPORTANTES OBRAS CULTURAIS Desde a sua fundação, o IAM tem sido um executor e, em especial, apoiador de ações da iniciativa da sociedade alagoana que visam o desenvolvimento do Estado. É o braço social e cultural da Organização Arnon de Mello e atualmente a entidade sem fins lucrativos que mais produz conteúdo de valorização da cultura e história de Alagoas. Os projetos Mulheres Alagoanas, Memória Cultural e Memória Legislativa de Alagoas deram início à produção de conteúdo mais completa sobre Alagoas.

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As enciclopédias lançadas pelo Instituto Arnon de Mello entraram para a história por reunir informações sobre a economia, a geografia, a história e a arte sacra dentro de uma abordagem inovadora. Elas foram disponibilizadas em fascículos encartados na Gazeta de Alagoase agora estão disponíveis em versão digital. Atlas Geográfico Mundial, Memórias Legislativas de Alagoas, Mulheres Alagoanas e Memória Cultural de Alagoas foram as primeiras obras lançadas pelo Instituto Arnon de Mello ainda na década de 90. Em 2006, já sob o comando do professor Carlos Mendonça, em uma iniciativa pioneira, o IAM lançou o projeto Enciclopédia dos Municípios Alagoanos, transformado em verdadeira obra histórica das 102 cidades de Alagoas e relançado em 2008 e 2012 em edições amplia-

das e atualizadas. A Enciclopédia dos Municípios de Alagoas foi responsável por uma mudança importante na forma de estudar e analisar o estado. Com o objetivo de atualizar informações das cidades alagoanas, a obra entrou para a história por reunir, em uma só publicação, dados sobre a economia, a geografia, a história e a arte sacra, dentro de uma abordagem inovadora. Em 2007 foi lançado o projeto Maceió Século XXI, uma série de sete fascículos com os principais polos econômicos do Estado: saúde, cultura, comércio e serviços, imobiliário, educação, automotivo, turítico-hoteleiro-gastronômico e cloro-alcooquímico e energético. Em 2009 foi a vez do artesanato alagoano ganhar destaque nas páginas da obra Mestres Artesãos das Alagoas. Uma edição que ganhou o mundo e inspirou marcas conceituadas do

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cenário da moda. O artesanato é a expressão mais autêncica da criatividade popular, em que o criador se serve de habilidades manuais para dar forma à leitura do mundo que o cerca. A essas habilidades se agrega a sensibilidade de cada um desses artistas, que materializam os valores de seu meio. Um artesão, portanto, é a mediação mais autêntica entre seu entorno e o objeto por ele criado. Em 2011 o Instituto Arnon de Mello mais uma vez entregou à população alagoana um legado da história de seu povo com o Projeto Alagoas Memorável - Patrimônio Arquitetônico, resgatando referenciais arquitetônicos de cada região, com certeza uma contribuição de grande valia para manter viva a sua história de geração em geração.

Em 2013 foi lançado o Alagoas Popular – Folguedos e Danças da Nossa Gente, emergindo das sombras à luz, para serem reconhecidos como protagonistas dessa tessitura feita de elementos prosaicos, quase despretensiosos, para animar os dias. Uma obra inédita que apresentou os movimentos e cantos, singelos, ingênuos, mas que são o mais forte componente dessa rede a que chamamos cultura, mas precisamente cultura popular. Em 2014 o Instituto Arnon de Mello lançou um caderno de anotações sobre a obra de restauração do Santuário de Nossa Senhora dos Remédios, um trabalho primoroso realizado pelo IAM. Todas as anotações da obra de restauração foram feitas durante os meses de trabalho e traz registro fotográfico de cada

ambiente, o antes e depois de um dos mais belos templos religiosos de Alagoas. O IAM tem conseguido ao longo desses anos ser coordenador das principais atividades literárias e de pesquisa sobre a história, cultura, geografia e economia de Alagoas. Isso tem sido possível porque o Instituto encontrou especialistas, estudiosos, construtores, restauradores, todos conhecedores do assunto, e, em especial, parceiros que apoiam os projetos.

IAM: publicações culturais diversificadas voltadas para o público alagoano

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Boca de Maceió

Boca do Maçayó Maurício de Macedo

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Boca do Maçayó, água parada e lama... E o engenho moendo a cana que cresce no massapê. Boca do Maçayó, as terras deste engenho é São Gonçalo quem vai benzer. Boca do Maçayó, casas e ruas emergindo da lama... Nossa Senhora dos Prazeres

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é quem abençoa o lugar. Boca do Maçayó, empório do açúcar no porto de Jaraguá. Boca do Maçayó, Santa Maria Madalena pode menos do que Nossa Senhora. Boca do Maçayó, despeito da Alagoa do Sul - o pântano é vila agora.

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A GEOGRAFIA

Rochana Campos de Andrade Lima Graduada em Geologia pela Universidade Federal de Pernambuco; especialista em Aproveitamento em Recursos Hídricos pela Universidade Federal de Alagoas; mestra e doutora em Geociências, Geologia Sedimentar e Ambiental pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE; professora do Centro de Tecnologia – CTEC/ Universidade Federal de Alagoas-Ufal; pesquisadora do Labmar/Ufal; coordenadora do setor de Oceanografia Geológica.

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MACEIÓ, 200 ANOS 1815 – 2015 Capítulos VIII e IX

Uma visão temporal da cidade

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este fascículo em comemoração aos 200 anos da capital do Estado das Alagoas – Maceió apresentamos um amplo panorama do município subdividindo sua evolução geo--ambiental em dois períodos: Maceió Ontem, de 1815 a 2000, onde são evidenciadas as características físico-geográficas e ambientais, enfatizando como era o ambiente natural do município, seus primeiros limites e bairros e a evolução urbano-arquitetônica e populacional. O segundo focaliza Maceió no século XXI, com seus limites já definidos, suas distâncias para as demais capitais nordestinas, a organização atual dos bairros, o crescimento populacional nos últimos 15 anos, suas Unidades de Conservação e, como em qualquer cidade de grande e médio porte, os problemas de mobilidade urbana. O traçado urbano de Maceió, ou seja, a organização das ruas e a localização das edificações, se dá numa negação constante de seus aspectos naturais. Os elementos que privilegiaram sua localização foram o mar e a Laguna Mundaú, que emolduram a cidade, justificando, assim, o processo de ocupação nas direções norte e sul do município e, posteriormente, seguindo em direção à parte mais alta da cidade.

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Um passeio por Maceió nos instiga a prosseguir na recuperação da geografia do sítio urbano da cidade e da compreensão dos elementos físico-naturais de suas paisagens. As análises comparativas dos fatos, com fotos e mapas, representaram excelentes recursos de reconstituição, principalmente

quando apoiadas na geo-história do lugar e no modelo arquitetônico atual. A paisagem e o lugar, afinal, são instâncias ressaltadas nas relações sociedade/natureza, que ajudam na compreensão do espaço urbano em diversas abordagens, especialmente na descrição da cidade de Maceió.

Paisagem urbana antiga de Maceió

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MACEIÓ, de 1815 a 2000 O

meio físico-natural da cidade é a base na qual se dá o uso e a ocupação do seu espaço, mesmo com prejuízos ambientais quando se aterram alagados, ilhas, mangues, canais, vales fluviais e lagoas, numa tentativa desordenada

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de ampliar a área urbana para moradias. A geografia e as paisagens de Maceió foram determinantes na localização da cidade, entre o mar e a laguna, com seus canais circundados pelas encostas do planalto, para onde se expandiu.

Em segundo plano, a estação ferroviária de Bebedouro à margem da Laguna Mundaú

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O AMBIENTE NATURAL

A Geologia

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eologicamente, Maceió está situada quase que totalmente sobre a Bacia Sedimentar de Alagoas, nos domínios dos sedimentos Terciários da Formação Barreiras e dos sedimentos Quaternários que formam as planícies costeira, marinha e lagunar, ocorrendo, porém, no extremo norte do município, afloramentos de rochas cristalinas determinados pela Falha da Usina Cachoeira do Meirim. Em sua evolução geológica, no final do Terciário e início do Quaternário, foram depositados os clásticos da Formação Barreiras.

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Seguindo-se a formação da planície costeira e da restinga durante o Quaternário, associadas a flutuações do nível do mar - Transgressões (avanço do mar no continente) e Regressões (recuo do mar do continente) que foram determinantes na modelagem do sítio urbano do município. Os processos de deposição, as variações do nível do mar e os agentes de erosão propiciam até hoje o acúmulo dos sedimentos marinhos, fluviais, eólicos e flúvio-lagunares que compõem as planícies costeira e lagunar atual.

Paisagem da Pajuçara, que antes das várias urbanizações era um grande areal

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A Geomorfologia

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m relação à morfologia, o relevo é ondulado no extremo norte, onde se encontram as rochas cristalinas, na serra da Saudinha, e suavemente ondulado sobre a bacia sedimentar, que apresenta três compartimentos bem caracterizados, cada um deles distribuído em níveis topográficos distintos. O primeiro corresponde à parte mais baixa da cidade e se estende por toda a planície costeira e a margem lagunar, com altitude de 0 a 5 metros. Nele estão localizados os bairros antigos da Levada, Ponta Grossa, Prado, Trapiche

teiro. Esse terraço constitui parte da barreira arenosa que fechou o sistema Estuarino Lagunar Mundaú-Manguaba (CELMM). Nesse nível localiza-se o Centro Comercial e de Negócios, com vários equipamentos urbanos importantes - Quartel da Polícia Militar, Tribunal de Justiça, Teatro Deodoro, Academia Alagoana de Letras, Câmara Municipal de Maceió e Assembleia Legislativa, além de bancos e repartições públicas. Finalmente, o terceiro nível, com altitude acima de 40 metros, tem início na borda da enPraia da Sereia, com linha de arenito de praia

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da Barra e Pontal da Barra, na parte sul. Centro, Jaraguá, Pajuçara, Ponta da Terra, PontaVerde, Jatiúca, Cruz das Almas, Jacarecica, Riacho Doce, Pescaria e Ipioca se sucedem na área litorânea de expansão urbana, na Zona Norte da cidade. Neste compartimento era comum a ocorrência de dunas, como no Pontal da Barra; alagados, manguezais, pântanos e turfeiras no entorno do atual Mercado da Produção. O segundo, com altitude de 8 a 10 metros, corresponde a um terraço marinho que tem início no cruzamento das ruas do Imperador com a Barão de Atalaia e estende-se até a Santa Casa de Misericórdia, limitado pela Rua Pedro Mon-

costa e chega a mais de 80 metros na Cidade Universitária. Corresponde a uma das atuais áreas de expansão urbana. Trata-se de um Baixo Planalto Sedimentar, também chamado Planalto do Jacutinga. As encostas deste nível, quando voltadas para o mar, recebem a denominação de paleofalésias, como pode ser verificado ao longo da Rua Barão de Atalaia e Avenida Gustavo Paiva, nos bairros do Poço, Mangabeiras e Ipioca. A evolução das formas de relevo em Maceió deve ser entendida como um processo natural durante os últimos 200 anos, modificada pela ação dos processos antrópicos.

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A Cobertura vegetal

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vegetação que está diretamente relacionada ao clima, tropical quente e úmido, em poucos locais se apresenta preservada em relação à original. O processo de transformação da paisagem vegetal é intenso e contínuo. São encontradas no município formações típicas do litoral, do cerrado e raras formações florestais, todas intensamente degradadas pelo homem. Nos terrenos costeiros, arenosos e salgados, são encontradas plantas rasteiras (salsa de praia) e pequenos arbustos; na área de dunas, pequenas árvores tortuosas de fo-

lhas grossas que sevem para estabilizá-las. Os manguezais aparecem avançando pelos baixos cursos dos rios, margeando a Laguna Mundaú e suas ilhas. Nas praias podem-se incluir os coqueirais, que não são nativos, testemunhas da ação do homem que aparecem de forma predominante no litoral. No tabuleiro e nas encostas a vegetação original era de floresta, que se estendia pelo vale dos rios em forma de mata galeria. Nesse compartimento ocorriam, de forma isolada, manchas de cerrado semelhantes a verdadeiras clareiras dentro da floresta. Parque Municipal, parte da Reserva de Mata Atlântica da capital

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A Hidrografia

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s recursos hídricos vêm alcançando grande importância, determinada em parte pela demanda progressiva do consumo, e também pelo mau uso que deles tem sido feito. Em Maceió, uma série de fatores ambientais, como efluentes sanitários, vazamentos industriais, salinização de aquíferos e presença de chorume, dentre outros, tem levado à degradação desse bem natural de superfície e subsuperfície. Com relação aos recursos hídricos de su-

perfície, as ocupações em áreas de risco são de tal magnitude que explicam o quadro de complexidade da infraestrutura urbana com relação aos deslizamentos nas encostas e alagamentos, tão característicos nas paisagens da cidade. As inundações na parte baixa ocorrem em áreas que foram invadidas gradativamente e incorporadas ao traçado urbano através de aterros sucessivos, ampliando a conquista de espaços antes tomados pelas águas, tornando-se assim ambientes de risco.

Município de Maceió com a delimitação das Regiões Hidrográficas e Bacias Hidrográficas

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As Águas Superficiais

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aceió está inserida em duas regiões hidrográficas: a do Complexo Estuarino Lagunar Mundaú-Manguaba-CELMM e a do Pratagy, compostas pelas bacias dos rios Mundaú, Sauaçuy, Meirim, Pratagy, Ja-

carecica e Reginaldo, os riachos Estivas, do Senhor, Doce, Garça Torta, Guaxuma, das Águas Férreas, do Sapo, Gulandim, do Silva e Catolé e ainda os canais da Levada e do Trapiche.

As Águas Subterrâneas

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a planície costeira do município os sedimentos de praia e aluviões constituem o aquífero Quaternário, que representa fontes pontuais de abastecimento através de poços rasos e tubulares. A qualidade da água é influenciada pelos níveis semi-superficiais, sujeitos a infiltrações de vários tipos de efluentes, como também pela cunha salina. Devido à pequena profundidade do nível freático, torna-se suscetível à contaminação.

A Formação Barreiras, que forma os tabuleiros costeiros, constitui um dos mais importantes sistemas aquíferos explotados no município. Os constituídos pelas formações Barreiras e Marituba são responsáveis por boa parte do abastecimento da cidade de Maceió, como, por exemplo, as baterias de poços da Companhia de Água e Saneamento de Alagoas-Casal no Reginaldo, Bebedouro e Benedito Bentes.

As Unidades de Conservação

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pesar da forte expansão urbana, ainda se encontram em Maceió alguns ecossistemas preservados - Cerrado, Mata Atlântica e Zona Litorânea -, verificando-se a existência de 8 Unidades de Conservação de esfera federal, estadual e municipal que protegem a rica biodiversidade do município. Compõem estas Unidades a Área de Prote-

ção Ambiental (APA) Costa dos Corais, a Área de Proteção Permanente (APP) do Ibama (federal); Área de Proteção Ambiental (APA) de Santa Rita, Área de Proteção Ambiental (APA) do Catolé/ Fernão Velho, Área de Proteção Ambiental (APA) do Pratagy (estadual); Parque Municipal de Maceió, Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), Aldeia Verde e Tobogã (municipal).

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Evolução dos limites municipais O

s limites do município passaram por mofificações ao longo do tempo. Em 1815 a Vila de Maceió tinha o limite costeiro que ia da Barra da Lagoa do Norte (Laguna Mundaú) até o Rio Santo Antônio Grande, e para o interior o Rio Mundaú e o município de Atalaia. Em 1823 passaram a ser, ao norte o Rio Sauaçuy; a oeste o Riacho FernãoVelho e a Lagoa do Norte; a sudeste o canal e a Barra da Lagoa e a leste o Oceano Atlântico. Em 1922, quase um século depois, ocorreu uma nova demarcação, passando a ser ao norte São Luiz do Quitunde, ao sul e a leste o Oceano Atlântico, a oeste Santa Luzia do Norte e a sudeste Alagoas (atual Marechal Deodoro).

Em 1950 os limites, com nova alteração, passaram a ser: ao norte, São Luiz do Quitunde; ao sul, Marechal Deodoro; a oeste, Murici e Rio Largo e a leste o Oceano Atlântico. Atualmente o município de Maceió, com uma linha de costa de aproximadamente 52 quilômetros de comprimento, tem uma área total de 509,876 km2 (IBGE, 2015), subdividindo--se em área urbana de 194,345 km2; área lagunar de 23,266 km2 e área rural de 292,265 km2. Limita-se com os seguintes municípios: ao norte com Flexeiras, São Luiz do Quitunde, Barra de Santo Antônio e Paripueira; ao sul com Coqueiro Seco, Marechal Deodoro e o Oceano Atlântico; a leste com o Oceano Atlântico e a oeste com Messias, Rio Largo, Satuba e Santa Luzia do Norte.

Ipioca, Litoral Norte

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As primeiras ocupações O

ambiente maceioense vem sendo ocupado desde a colonização para diversos fins. No princípio se processou de forma lenta, com uma série de fortificações. O primeiro núcleo urbano da cidade surgiu no início do século XIX, conforme registrado no mapa de José Fernando Portugal de 1803; portanto, quando da criação da Vila o núcleo era formado pela Igreja de Maceió (Centro), em Jaraguá pelo Armazém Real (em laranja) e a Fortaleza de Quatro Pontas. Maceió era, então, uma pequena comunidade, formada por dois povoados, um nas proximidades da Praça Dom Pedro II, em frente à atual catedral, e outro próximo ao Porto de Jaraguá. A Vila de Maceió era composta por um conjunto de ruelas tortuosas de habitações rústicas, com a mata à beira dos casarios, o pântano da Boca de Maceió (Riacho Reginaldo) e os mangues em torno da Laguna Mundaú. Em 1851 foi iniciado o povoamento do Jacutinga na parte alta do município. Em 1870 o povoamento já compreendia as freguesias de Maceió (atual Centro), Jaraguá e Pioca. No início, Jaraguá era um areal com brejo de vegetação rala e casebres entre coqueirais. Por sua morfologia natural, foi se tornando um ancoradouro seguro, oferecendo excelentes condições para abrigar barcos para cargas e descargas de mercadorias. A partir de 1890 ocorreu uma maior ocupação da Vila, que, além do núcleo chamado Maceió, apresentava alguns eixos suburbanos originados de agrupamentos lineares ao longo das estradas. Na divisão administrativa de 1911, o município era constituído por três distritos: Maceió (Centro), Jaraguá e Bebedouro e, ainda, as localidades conhecidas como Levada, Cruz das Almas, Jacarecica, Riacho Doce, Pioca, Pontal da Barra, Mangabeiras e outros menores, que formavam os subúrbios da cidade.

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Fonte: IHGAL, adaptado por Andrade Lima 2004.

Croqui esquemático mostrando plano das enseadas de Jaraguá e Pajuçara, por José Fernando Portugal, em 1803.

Croqui montado através de dados do IBGE - Formação Administrativa (1815-1900)

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m 1927 foi incorporado a Maceió o distrito de Fernão Velho. Já na década de 1930, o município contava com os distritos de Maceió (Centro), Bebedouro, Fernão Velho, Jaraguá, Meirim, Farol, Pajuçara e Poço. Em 1938 Bebedouro, Farol, Fernão Velho, Jaraguá, Meirim, Pajuçara e Poço perderam a categoria de distrito, sendo anexados a Maceió como simples Zonas Administrativas. Em 1949 foi criado o distrito de Floriano Peixoto (atual Ipioca), com terras do subdistrito de Meirim. Ressalte-se que entre 1920 e 1940 os ambientes costeiros como a laguna, rios, riachos, mangues e alagadiços passaram a ser aterrados para que se processasse a expansão urbana da parte baixa da cidade. No planalto, essa difusão foi iniciada por volta da primeira metade do século XX.

Croqui montado através de dados do IBGE - Formação Administrativa (1900- 1950)

Por volta de 1950 Maceió possuía os bairros suburbanos; Levada, Poço, Pajuçara, Mangabeiras e Bebedouro, e também algumas povoações: Cruz das Almas, Jacarecica, Riacho Doce, Meirim, Ipioca e Pontal da Barra. Em 1960 a área urbana era composta por 27 bairros, sendo 20 localizados nas planícies marinha e lagunar, 7 no planalto e mais três distritos: Maceió, Fernão Velho e Floriano Peixoto. Essa divisão permaneceu até 1995. Em 1998 foram extintos Fernão Velho e Floriano Peixoto, sendo seus territórios anexados ao distrito-sede do município de Maceió. 200 Mapa com delimitação da mancha urbana, adaptado por Oliveira (2015)

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Evolução Urbana A

partir deste momento faremos um passeio pela ocupação urbana de Maceió, com suas construções e vias, vielas, estradas e avenidas. Foi através dessas vielas, que se seguiram povoando, que se hierarquizou a Vila de Massayó. Inicialmente, abrigando choupanas cobertas de palha de coqueiro e sobrados de taipa de largas biqueiras. Dessas construções nada restou. Em 1609 tem-se como primeiro ponto de ocupação da futura Vila uma casa de telha construída na Pajuçara. Convém salientar que a atual Praça Dom Pedro II foi o ponto de irradiação urbana, destacando-se o Pelourinho, a Cadeia e um sobrado transformado em Paço, iniciando-se assim, o povoamento do atual bairro do Centro. É de Gaspar Barléus a elaboração do primeiro mapa da costa nordestina sob o domínio holandês, datado de 1647, que apresentava as duas lagoas, a Paranaguera, ou Alagoa do Sul (Manguaba), e a Mundaí, ou Alagoa do Norte (Mundaú) e a Ilha da Misericórdia (Ilha de Santa Rita), que emolduravam a cidade. Em 1818 a Vila de Maceió era um conjunto de ruelas tortuosas e habitações rústicas, com a mata, o pântano da Boca de Maceió (atual Riacho Salgadinho) e os mangues da lagoa. Jaraguá era um areal claro e escaldante e

desde o ponto de desembarque até o Centro era uma caminhada estafante. Antes da chegada de Melo e Póvoas, a Câmara da Vila tentou organizar as casas, numerando-as; as construções necessitavam de licença e alinhamento urbano. Em 1819, Póvoas lançou os fundamentos de um forte (São João) próximo à Barra Sete Coqueiros e outro em Jaraguá, denominado São Pedro. Ambos nunca foram concluídos. Em 1824 os atuais bairros Pontal da Barra, Trapiche da Barra, as praias da Avenida e do Sobral eram um grande brejo, com lagoas e canais que já estavam sendo aterrados. A região do Ouricuri era chamada “Mata dos Paus Secos”, mostrando um manguezal que havia sido soterrado pela migração de dunas existentes naquela região. Era nesse ponto que ficava a barra denominada Sete Coqueiros, lugar da desembocadura da Laguna Mundaú. Em 1866 o Trapiche da Barra era um pequeno povoado formado por um areal, onde se localizava um entreposto de madeiras e gêneros agrícolas vindos da Manguaba, do Rio Paraíba, do Pilar e de Alagoas (Marechal Deodoro). Assim, devido ao transporte lagunar feito por canoas e barcaças, foi construído o trapiche (ancoradouro) que deu o nome à comunidade.

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Mapa da evolução urbana de 1620 a 1820, baseado em Barleus (1647) e Octávio Brandão (1916), adaptado por Andrade Lima (1998)

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Mapa de evolução urbana 1820-1910, baseado em Barleus (1647) e Octavio Brandão (1916), adaptado por Andrade Lima 1998.

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registro mais antigo da organização e ordenamento da vila data de 1820, quando Melo e Póvoas solicitou a José da Silva Pinto que elaborasse um plano de urbanização, tentando assim corrigir o “aleijão” urbano. O plano, porém, não foi adiante e o burgo cresceu desordenadamente. Em 1841 Carlos Mornay elaborou um croqui que reproduzia parte dos atuais bairros do Centro e Jaraguá, com suas áreas alagadiças, o Riacho Maceió, ou Maceió Azul (hoje, Riacho Reginaldo) e a Lagoa do Olho d’Água, ou Negra. Nessa área, à margem dos alagadiços, pântanos e a restinga onde o riacho desaguava, conhecida como Boca de Maceió, continuou a expansão da cidade, passando por sucessivos aterros, originando as ruas do Imperador, da Praia e a Praça Sinimbu.

Fonte: IHGAL, adaptado por Andrade Lima 2004

Croqui esquemático mostrando o bairro do Centro, baseado em Carlos Mornay, 1841.

Jaraguá e Pajuçara - 1841

204 Fonte: IHGAL, adaptado por Andrade Lima 2004.

Nesse mesmo ano Mornay preparou um dos mapas mais completos para a área, mostrando o limite sul do bairro de Jaraguá na

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Ponte dos Fonseca e as principais edificações do bairro, como o Cemitério dos Ingleses, as casas, a fortaleza e os dois trapiches.

Croqui esquemático mostrando os bairros de Jaraguá e Pajuçara, baseado em Carlos Mornay, 1841.

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osteriormente, as construções começaram a apresentar um estilo mais elegante, com casas largas e cheias de janelas, já caracterizadas com azulejos nas fachadas, enfeites nos altos com figuras da mitologia e abacaxis. Mais tarde, a ideia era urbanizar o lugar para tirar os ares do passado. Assim, abriram--se e alargaram-se ruas, construíram-se praças e foi proposto um alinhamento como plano de desenvolvimento para a cidade, que nunca foi cumprido integralmente, mas algumas velhas ruas foram “endireitadas”. No início do século XX houve um incremento desenvolvimentista na cidade, surgindo alguns prédios públicos e particulares e as ruas receberam uma nova roupagem. Bebedouro era o distrito preferido da elite alagoana, que ali construiu seus casarões, próximo à Laguna Mundaú e a linha férrea. Em 1927 a Rua do Açougue, atual Avenida Moreira Lima, foi retificada provocando

um rebuliço na vida urbana da cidade. Derrubaram-se vários quarteirões de casas de taipa para que em seu lugar surgissem habitações modernas. O mesmo aconteceu com outras ruas nos bairros e arrabaldes, como Jaraguá, Poço, Farol, Trapiche da Barra, Levada e Bebedouro. A partir desse momento surgiram atividades constantes na cidade, como ruas novas, palacetes, praças com estátuas de animais e figuras do Olimpo. A partir da década de 1930 Maceió cresceu desordenadamente. Na Pajuçara, a vegetação típica da zona costeira cedeu lugar às residências. Bebedouro, que no princípio do século XX era a parte elegante de Maceió, começou a perder população para o Farol, que passou a se encher de edificações. Eram inúmeros os bangalôs, tão a gosto dos moradores do novo bairro que se apresentava com ruas largas, como a Avenida Fernandes Lima, e passou a ser o reduto moderno da cidade.

Prédio que deu lugar ao edifício que abrigou o Produban

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Planta da cidade de Maceió por Américo László (1932), adaptada por Andrade Lima, 2004

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o traçado elaborado por Américo László em 1932, verificava-se que o atual bairro do Prado já se encontrava totalmente modificado em relação à planta elaborada por Mornay em 1841, que apresentava lagoas e alagadiços totalmente aterrados. Os bairros do Poço e Mangabeiras eram ocupados por sítios e a Ponta da Terra, por pescadores que migravam da Pajuçara. Foi nesse período que surgiram várias praças, utilizadas para os festejos públicos. O Centro e o Farol foram os bairros onde houve maiores modificações físicas, com a abertura de vias, o que levou à destruição de árvores. Muitas famílias migraram do Farol para as áreas próximas da laguna (atual Levada) e do mar (Pajuçara). Os bairros que circundavam a Laguna Mundaú, Levada e Trapiche da Barra eram caracterizados por dois aspectos: casas de palha ou de taipa e a vida calma próxima à laguna. Por volta de 1950 tiveram início as transformações mais profundas da cidade, a partir da consolidação do Porto de Jaraguá, que definiu as estruturas para a capital e deu à cidade a configuração atual. No sentido Litoral Norte, o bairro de Cruz das Almas teve sua ocupação a partir da década de 1950 de forma bastante desor-

denada, com ruas estreitas e às vezes sem saída. Nele surgiu um dos primeiros conjuntos residenciais de Maceió, construído pela Companhia de Habitação Popular de Alagoas-Cohab/AL. A partir da década de 1960, na parte baixa da cidade, muitos sítios foram se transformando em loteamentos destinados a residências. Entre 1980 e 1990 Maceió acompanhou o processo de urbanização das demais cidades brasileiras. O resultado foi a maior demanda por espaços de habitação e alguns bairros da cidade, que eram majoritariamente térreos, passaram a ser verticalizados, concentrados, principalmente na região litorânea de Pajuçara e Ponta Verde. Mais tarde houve a urbanização da Jatiúca. Jaraguá passou a ser revitalizado, como aconteceu com o Pelourinho, na Bahia, e o Recife Antigo. No final desse período de maior expansão urbana, causada pelo boom imobiliário e uma rápida ocupação do sítio, houve uma explosão na expansão urbana, tanto na planície como no planalto. A partir daí surgem restaurantes e hotéis na parte baixa da cidade e também novos edifícios. O comércio se expandiu gradativamente e foi edificado o primeiro Shopping Center de Maceió, no bairro de Mangabeiras.

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Vias de comunicação E

m 1817 a vila tinha duas estradas importantes: a do Norte, que levava a Porto Calvo, aos povoados vizinhos e conduzia à capital da capitania de Pernambuco, e a outra, do Sul, que seguia o curso do Mundaú. Esses caminhos que serviam à vila não obedeciam a um traçado estruturado; as necessidades de locomoção é que ditaram suas aberturas. Outro elemento de desenvolvimento da vila em 1820 foi o primeiro plano de remodelação urbana, traçado por Melo e Póvoas, projetando avenidas que iam do mar à laguna. A planta menciona a ladeira lateral ao Hotel Bela Vista e as ruas do Comércio, Barão de Penedo, Boa Vista (Conselheiro Lourenço de Albuquerque), do Rosário (João Pessoa), da Rosa (Livramento-Senador Mendonça), da Igreja, em frente à catedral (Rua do Imperador), dos Ferreiros (Melo Morais) e Cotinguiba, atualmente Praça Deodoro.

Avenida Gustavo Paiva em 1920

Farol de navegação, inaugurado em 1857 e demolido em 1955

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Ladeira da Catedral

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Rua Augusta, atual Rua das Árvores

Bela Vista Palácio Hotel, onde hoje se localiza o Edifício dos Palmares, na Praça dos Palmares

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Cruzamento das ruas Livramento e do Comércio, no Centro

Praça Floriano Peixoto (atual Praça dos Martírios) em dois momentos: no primeiro, sem a caixa d’água e o mirante de Santa Terezinha; no segundo, com a caixa d’água do Clube de Engenharia e o bonde

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m 1823 foi pedida à Câmara Municipal a construção de uma ponte sobre o Riacho Maceió (atual Reginaldo), porém só foi construída na década de 1840. Nessa ponte, de madeira, passava o trem de ferro que fazia o serviço de cargas e passageiros de Jaraguá para Maceió (Centro) e de Maceió para o Trapiche da Barra. Em 1849 a Câmara de Maceió sugeriu a construção das pontes sobre os rios Sapucaí, Pratagy e Santo Antônio do Meirim e a contratação de um engenheiro para levantar a planta da cidade e projetar melhor os arruamentos. Em 1851 foi aberto na encosta do Jacutinga, ao lado da catedral, um acesso mais suave em direção ao planalto, onde se construiu a Casa da Pólvora (atual Igreja de São Gonçalo) e o Farol (atual mirante do Crea). Em 1857 o governador Sá e Albuquerque enumerou os serviços realizados: a ponte sobre o Riacho Maceió, o calçamento da rua principal de Jaraguá (atual Sá e Albuquerque) e a do Comércio, além da estrada Jaraguá-Mangabeiras, e alertava para a necessidade da construção de uma ponte de desembarque em Jaraguá e de um edifício para o palácio do governo. O engenheiro Carlos de Bolterstern foi encarregado, em 1866, de projetar as drenagens das ruas, fazer o nivelamento e tornar a cidade mais transitável. Ele também traçou um plano de remodelação das ruas principais, desde o Porto de Jaraguá até Bebedouro. Assim, na Rua Boca de Maceió (saída do Reginaldo), foi construída uma ponte mais alta que facilitaria a passagem das águas pluviais, que ficavam retidas e aumentavam o pântano próximo ao centro da cidade.

Alto do Jacutinga, atual bairro do Farol (Rua Aristeu de Andrade)

Praia da Avenida, com o prédio do Museu Théo Brandão e o bonde vindo de Jaraguá

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esse mesmo período, o problema de transporte teria solução com a tramway, que passou a fazer a ligação entre o Centro, Jaraguá e Trapiche da Barra, transportando mercadorias e desembarcando passageiros que vinham do Pilar e da Vila de Alagoas (Marechal Deodoro). Também nessa mesma época foi implantado o serviço de navegação, através de vapor e lanchas, da Lagoa do Norte (Mundaú) até Santa Luzia do Norte, Coqueiro Seco e Alagoas. Em 1868 a cidade tinha as estradas arruadas do Trapiche da Barra, Mutange, Flechal, Mangabeiras e Cruz das Almas, uma ponte em Bebedouro, uma de embarque em Jaraguá, outra no Riacho Maceió, a ladeira do Palácio e várias ruas calçadas.

Ponte de Embarque, em Jaraguá, inaugurada em 1870

No ano de 1887 foram projetados os seguintes serviços para a capital: nivelamento das praças dos Martírios, do Mercado (onde era o Instituto de Educação) e das Princesas (hoje Deodoro); empedramento da Praça D. Pedro II e das ruas Lourenço de Albuquerque e Senador Mendonça; um aterro em Jaraguá (Avenida da Paz); melhoramentos na ladeira de Bebedouro; construção das pontes dos rios Jacarecica e Meirim e a desapropriação de velhas casas para o alinhamento de algumas ruas do Centro.

Praça dom Pedro II, à esquerda a Assembleia Legislativa e, em frente, a Biblioteca Pública

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revolução industrial promoveu em Maceió, na segunda metade do século XIX, uma série de trapiches, ferrovias, navegação a vapor e bondes. A Companhia Alagoana de Trilhos Urbanos-Catu passou a fazer os serviços de transportes de passageiros e cargas em carro de tração animal. A sede era na Praça Sinimbu, com estações em Bebedouro, Trapiche da Barra, Jaraguá e Bom Parto. No início do século XX as linhas foram ampliadas para Mangabeiras, Levada, Pajuçara, Ponta da Terra e Farol. Em 1914 foi inaugurado o serviço de bonde elétrico, que circulava entre Maceió e Pajuçara.

Estação da Companhia Alagoana de Trilhos Urbanos, em Maceió

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Praça Deodoro. Ao fundo, o casarão da Academia Alagoana de Letras

Estação da Great Western e Arcebispado, na atual Rua Barão de Anadia

Croqui esquemático mostrando a Planta para o porto de Maceió, realizada por Consulting Engineer NY. USA 1917, adaptada por Andrade Lima, 2004

Em 1917, como pode ser visto no mapa que foi projetado para a implantação do novo porto de Maceió, existiam 12 trapiches em Jaraguá e um na Pajuçara, de propriedade de uma fábrica de sabão.

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expansão populacional para os bairros do Farol e Pajuçara, na década de 1930, nem sempre foi acompanhada pelos serviços de transportes urbanos. Nessa época os ônibus eram pouco utilizados pelos maceioenses, que os chamavam de sopas e/ou marinetes; faziam o trajeto Jaraguá-Centro e Farol-Levada. Logo, porém, foram desativados. Enquanto isso, era na Levada que os hidroaviões pousavam, sendo o primeiro bairro de interesse turístico de Maceió, pois assim os visitantes tinham uma visão geral da cidade. Em 1937 os bairros da Levada e do Trapiche da Barra utilizavam os canais da Laguna Mundaú como meio de transporte, através de lanchas que se dirigiam para outras localidades da cidade e municípios vizinhos. Em 1940 foi inaugurado o Porto de Maceió, modificando ainda mais a paisagem de Jaraguá. A partir das décadas de 1960 e 1970, com o objetivo de modernizar a cidade, foram introduzidos os planos remodeladores do porto e das principais vias de interligação. O conjunto de medidas implicou na descaracterização do Centro, Jaraguá e Jacutinga. As obras acarretaram abertura de largas avenidas, demolição de quarteirões, prédios históricos e retirou dos trilhos os velhos bondes elétricos que circulavam pelo Centro da cidade. Na parte alta foi aberta a Avenida Menino Marcelo (Via Expressa). Ainda em consequência das obras reformadoras, a restinga de Maceió foi ampliada e transformada em bairro industrial. A fisionomia da cidade começa a perder os últimos vestígios do seu passado. O bairro de Jacarecica ocupava a planície costeira de forma mais ordenada, devido aos conjuntos residenciais construídos na década de 1980. Sua área segue em direção ao Tabuleiro, limitando-se com o bairro do Benedito Bentes. Seu crescimento ocorreu com a construção da rodovia AL 101 Norte, rota do turismo de Alagoas. No período 1980/1990, foram realizadas

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várias obras para urbanização das praias e da parte alta da cidade. Os bairros da orla passaram por vários processos de urbanização com aberturas de ruas e avenidas como Sandoval Arroxelas, Engenheiro Mário de Gusmão, Avenida Jatiúca, Deputado José Lajes, Silvio Viana e Álvaro Calheiros, entre outras. Na parte alta, no bairro da Serraria, a Avenida Presidente Getúlio Vargas, e no Murilópolis a Avenida Nelson Marinho Araújo.

Praia de Pajuçara com o coqueiro Gogó da Ema, que tombou em 1956

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Evolução populacional N

o início de Maceió os serviços estatísticos eram precários e realizados de forma empírica, daí a falta de dados, uniformização e sistematização dos levantamentos populacionais. A catalogação dos habitantes foi iniciada com a área urbana ocupada por 13.994 pessoas em 1815; a partir daí, Maceió foi recebendo migrantes de outras regiões. Em 1872, no primeiro Censo Geral do país, a cidade contava com 27.703 habitantes, um incremento de 13.709 indivíduos em 57 anos. No segundo Censo, realizado em 1890, houve um crescimento de apenas 13,7%, ou seja, 3.795 habitantes em 18 anos; no de 1900, 15,8%, correspondendo a um incremento de 4.929 pessoas. A partir de então, esse número não parou de crescer. A cada contagem do Censo pelo IBGE, a mancha urbana

de Maceió se expandia e ocupava, também, a área rural do município. Em 1910 não houve recenseamento oficial, e em 1920 foram registrados 74.166 habitantes, com um aumento de 37.739 pessoas. Em 1930 não houve contagem da população e, até o Censo de 1940, esta cresceu 21,72%, chegando a 90.253 habitantes. O Censo de 1991 registrou 628.209 pessoas, um incremento de 537.956 indivíduos em 50 anos, e uma densidade demográfica de 1.232,082 habitantes por km2. Maceió chegou à última década do século XX com um grande crescimento populacional, pois de 1991 para 2000 registrou 169.550 pessoas, passando para um total de 797.759 habitantes, com uma densidade demográfica de 1.562,815 habitantes por km2.

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Pirâmide Etária com base no Censo (IBGE) de 1991

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Maceió no Século XXI, O desafio de se Reinventar O

passeio por Maceió, através de mapas e fotos, instigou a prosseguir na descrição da ocupação do sítio urbano da cidade e na compreensão dos elementos físico-naturais da paisagem. A análise comparativa dos fatos representa um excelente recurso de reconstituição, apoiada na geo-história e no

modelo modernizante atual. Maceió, por ser a maior cidade do estado e por acumular as funções administrativas, econômicas e culturais de Alagoas, tem sido alvo de forte afluxo populacional, agravando o problema da mobilidade e da acessibilidade urbana.

Região Metropolitana

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Região Metropolitana de Maceió envolve os municípios de Atalaia, Barra de Santo Antônio, Barra de São Miguel, Coqueiro Seco, Marechal Deodoro, Messias, Murici, Paripueira, Pilar, Rio Largo, Santa Luzia do Norte e Satuba. A região formada pelo processo de conur-

bação, principalmente entre os municípios de Maceió, Rio Largo, Satuba, Marechal Deodoro e Paripueira (conceituados como cidades dormitórios), é um fenômeno urbano que ocorre quando as cidades se expandem uma ao lado da outra, de tal forma que acabam se unindo. Maceió e municípios da Região Metropolitana

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Divisão dos Bairros

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uanto ao sítio urbano, encontra-se dividido em 50 bairros, dos quais 26 nas planícies costeira, marinha e lagunar e 24 no planalto (tabuleiro). Segundo o Plano Diretor de Maceió, o município foi dividido em 8 Regiões Administrativas, e estas, subdivididas em zonas de acordo com suas características dominantes, compõem sua área: Zonas Especiais de Preservação Histórica e mais seu entorno (ZEP), Zona de Expansão Intenssiva (ZEI), Zona de Interesse Ambiental e Paisagismo (ZIAP), Zona de Interesse Turístico (ZIT), Zona Residencial (ZR), Zona Residencial e Agrícola (ZRA), Zona Industrial (ZI) e Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS). Mapa dos 50 bairros de Maceió e 8 Regiões Administrativas

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Os bairros

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lguns bairros surgiram de povoamentos antigos e outros de loteamentos, conjuntos habitacionais e condomínios, nas áreas periféricas do Centro e também da descentralização do comércio, em face do boom imobiliário. Quanto aos bairros da planície costeira, já se encontravam em processo de verticalização na década de 1970 que, a partir de 2000 se expandiu em direção ao planalto. As planícies marinha e lagunar compreendem 26 bairros: Centro, Poço, Jaraguá, Pajuçara, Ponta da Terra, Ponta Verde, Jatiúca, Mangabeiras, Cruz das Almas, Jacarecica, Guaxuma, Garça Torta, Riacho Doce, Pescaria, Ipioca, Pontal da Barra, Trapiche da Barra, Prado, Ponta Grossa, Vergel do Lago, Levada, Bom Parto, Mutange, Bebedouro, Fernão Velho e Rio Novo.

Jaraguá

Os bairros da Planície Lagunar

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ebedouro apresenta-se ainda como uma área residencial, com organização social semelhante às comunidades interioranas. Nele se localizam o Parque Municipal de Maceió e alguns prédios tradicionais. Encontra-se ligado ao centro da cidade pelos bairros do Mutange e Bom Parto, de forma linear e com as mesmas características. Levada, Ponta Grossa e Vergel do Lago se caracterizam por abrigar residências de diversas classes sociais. Atualmente estão transformados em bairros comerciais, num processo de substituição de funções de uso do solo. Na Levada está o Mercado da Produção, que vende diversos produtos no varejo. Na porção norte da margem lagunar encontram-se Fernão Velho e Rio Novo. O primeiro tem sua origem vinculada à existência de duas povoações operárias - a Vila do ABC e a Vila Goiabeiras. No prolongamento, às margens da Laguna Mundaú, Rio Novo se mantém com as mesmas características desde a origem.

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Laguna Mundaú, que banha o Pontal da Barra

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Os bairros da Planície Marinha

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Pontal da Barra, banhado pela laguna e pelo mar, era formado por pescadores e seus familiares. Atualmente é visitado e admirado por turistas que chegam à capital, atraídos pela beleza natural do lugar, as lojas de artesanatos e os restaurantes típicos de frutos do mar. Faz parte da Zona Especial de Preservação Histórica, Turística, Residencial e Industrial. O Trapiche da Barra, que até o ano de 2000 era um bairro tipicamente residencial e horizontal, vem passando por um processo de transformação arquitetônica, tornando-se, também, verticalizado. É nele que se localizam o Estádio de Futebol Rei Pelé (também conhecido como Trapichão), o Ginásio Presidente Fernando Collor de Mello, o Pavilhão Multieventos do Sesi, o Hospital Geral do Estado, a Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas-Uncisal, o Hospital de Doenças Tropicais, o Quartel do Corpo de Bombeiros e o da Polícia Militar. O contíguo bairro do Prado é eminentemente residencial e lá estão dois mais antigos cemitérios da cidade. O Centro se caracteriza pelo comércio de varejo. É também o centro financeiro e de serviços administrativos, contando ainda com um pequeno número de residências e o privilégio de possuir uma praia, a da Avenida. Abriga alguns prédios históricos como a Assembleia Legislativa, a Biblioteca Pública, o Colégio de São José (atual Faculdade de Maceió-Fama). Jaraguá retrata a própria história de Maceió, encravado entre o mar, o bairro do Poço e o Centro. Deve sua expansão ao porto, que transformou o local. Nele se localiza o prédio da Delegacia da Receita Federal, que emoldura o conjunto arquitetônico da antiga Rua da Alfândega (atual Sá e Albuquerque). Perdeu seus casarões antiquíssimos para o modelo moderno de vida da cidade - bancos, associações, comércio e lazer. Nele está localizado um dos mais belos prédios da cidade, o da Associação

Comercial, que nos remete à época pujante do comércio de algodão. Também está ali uma parte da Faculdade de Alagoas – FAL. As antigas ruas residenciais estão sendo substituídas por casas comerciais, escritórios, consultórios, o Centro de Convenções e outras atividades produtivas. Ruas como as do Uruguai, Silvério Jorge, Minas Gerais e a Praça Rayol possuem poucos moradores, suas casas se transformaram em pontos comerciais com forte tendência de ampliação. O bairro do Poço constitui um prolongamento do núcleo comercial, através da Avenida Comendador Leão, e corredor de transportes para Jaraguá, Pajuçara, Ponta da Terra e Mangabeiras. Nele se localiza o Instituto Federal de Alagoas-Ifal.

Vista geral com o bairro de Pajuçara ao fundo

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A verticalização que já vinha ocorrendo nos bairros da planície marinha, a partir da Pajuçara, passando por Ponta da Terra, Ponta Verde e Jatiúca, atualmente se expande para Mangabeiras, Cruz das Almas, Jacarecica, Guaxuma, Garça Torta, Riacho Doce, Pescaria e Ipioca, que se destacam como nova área de expansão urbana do Litoral Norte, com intensa ampliação dos equipamentos urbanos para o turismo. O boom imobiliário prossegue modificando os espaços antes ocupados por chácaras e pequenas fazendas, incorporando-os ao espaço urbano através da expansão pelos loteamentos, conjuntos habitacionais e condomínios, além de uma grande variedade de estabelecimentos comerciais, shopping centers, restaurantes, hotéis e outros. Lá se encontram a Faculdade Integrada Tiradentes-Fits, a Faculdade Maurício de Nassau, a Faculdade de Administração de Alagoas-FAA e, ainda, os colégios COC, Contato e Santa Úrsula.

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Os bairros do Planalto

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parte alta de Maceió compreende 24 bairros: Farol, Pinheiro, Santo Amaro, Petrópolis, Chã da Jaqueira, Chã de Bebedouro, Santa Amélia, Clima Bom, Santos Dumont, Pitanguinha, Gruta de Lourdes, Canaã, Jardim Petrópolis, Ouro Preto, Jacintinho, Feitosa, São Jorge, Barro Duro, Serraria, Antares, Tabuleiro do Martins, Santa Lúcia, Cidade Universitária e Benedito Bentes. A ocupação do planalto teve início com o bairro do Farol, que deve seu nome ao facho outrora ali implantado. Hoje, seu principal

eixo de acesso, a Avenida Fernandes Lima, teve suas antigas residências substituídas por estabelecimentos comerciais, instituições públicas e privadas e por escritórios, constituindo-se num verdadeiro corredor de serviços onde se localizam o Hospital da Unimed, diversos campi do Centro de Estudos Superiores de Maceió –Cesmac e alguns colégios tradicionais. Atualmente, em processo de expansão para o interior do bairro, várias residências estão sendo substituídas por condomínios verticalizados.

Avenida Menino Marcelo, na parte alta

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Ao longo da Avenida Fernandes Lima localizam-se Pitanguinha e Pinheiro, também em processo de verticalização. O Pinheiro se caracteriza por ser residencial, porém abriga há muito tempo o Centro Educacional Antônio Gomes de Barros-Cepa, o Hospital Sanatório e parte da Faculdade Maurício de Nassau. A de Gruta de Lourdes, também seguindo o mesmo intenso processo, possui três importantes nosocômios – o Hospital do Açúcar, o Memorial Arthur Ramos e o Hospital do Coração, além de uma grande variedade de estabelecimentos comerciais. No Santo Amaro se localiza a Área de Proteção Permanente do Ibama. No Canaã está o principal cemitério particular de Maceió – Campo Santo Parque das Flores. Os bairros Jardim Petrópolis, Santa Lúcia e Tabuleiro do Martins encontram-se na continuação da Avenida Fernandes Lima, agora com o nome Durval de Góes Monteiro (BR 104). Ainda no planalto, próximo à laguna, tem-se a Chã de Bebedouro e Chã da Jaqueira (subdivididos de Bebedouro) e Santa Amélia. Ressalte-se que, após o redimensionamento do espaço urbano de Maceió, alguns conjuntos habitacionais já estabelecidos foram oficializados pela prefeitura, com o apoio do IBGE, como novos bairros: Clima Bom, Santos Dumont, Santa Lúcia, Cidade Universitária - que teve sua origem a partir da localização da Universidade Federal de Alagoas-Ufal e do Hospital Universitário - atualmente um dos mais populosos de Maceió, e o Benedito Bentes que surgiu de um conjunto habitacional. Feitosa, Barro Duro, Serraria, Ouro Preto, São Jorge e Antares tiveram seu crescimento impulsionado com a abertura da Avenida Menino Marcelo (BR 316/ Via Expressa) e o prolongamento das avenidas Rotary e Empresário Valentim dos Santos Diniz. A região, antes ocupada por loteamentos e conjuntos residenciais, vem passando por um processo de remodelação urbana, recebendo edifícios altos.

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Maceió e sua População Atual M

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aceió recebe o século XXI com uma população de 797.759 residentes (Censo 2000), com um crescimento de 169.550 pessoas, herança da última década do século XX, (1991 a 2000). De 2000 a 2010 houve um acréscimo de 134.989 habitantes, com taxa média de crescimento de 2,70% ao ano. Na Região Metropolitana, porém, esse aumento foi de apenas 2,38%, o que permite afirmar que Maceió cresce mais que os outros municípios da Região Metropolitana. A partir daí começa-se pensar num melhor ordenamento da cidade, enquanto o número de habitantes continua crescendo, alcançando em 2010 precisos 932.748 residentes. Houve um incremento populacional de 135.906 pessoas, proporcionando uma densidade demográfica de 1.829,362 habitantes por km2. Esse contingente já mora em uma cidade melhor estruturada. Benedito Bentes é o bairro mais populoso de Maceió (IBGE, 2015), com 88.084 residentes e uma densidade demográfica de 3.577,74 habitantes por quilômetro quadrado. Encontra-se também em processo de verticalização e ampliação do comércio ao longo de suas principais avenidas. Jacintinho é o segundo mais populoso, com 86.514 habitantes, e o de maior densidade demográfica do município, com 23.382,16 moradores por quilômetro quadrado. Suas principais avenidas são estreitas e fazem a interligação entre as partes baixa e alta da cidade. Já o de menor população absoluta é Garça Torta, na planície marinha, com 1.635 habitantes. O de menor densidade demográfica é Ipioca, com 378,50 pessoas por quilômetro quadrado.

Maceió apresentou o maior crescimento populacional entre as décadas de 2000/2010 nos seguintes bairros: Benedito Bentes (20.120 pessoas), Cidade Universitária (19.172), Tabuleiro do Martins (8.973), Jacintinho (8.665) e Clima Bom (8.094). Dentre os que tiveram menor aumento estão Ponta Grossa (2.390 pessoas), Jaraguá (1.008), Chã de Bebedouro (928), Centro (898) e Vergel do Lago (769). É importante registrar que os censos sempre confirmaram que, em Maceió, a população feminina cresce mais que a masculina e a urbana aumenta ocupando todos os espaços do sítio, invadindo o meio anteriormente rural, ratificando, assim, o fenômeno da conurbação, o que justifica o reconhecimento da Região Metropolitana de Maceió.

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No interstício de 2010 para 2015 o IBGE confirmou que a população de Maceió, já ultrapassava a casa de 1 milhão de pessoas residentes, alcançando 1.013.773, já com um incremento de 81.025 indivíduos e uma densidade demográfica de 1.988,273 habitantes por quilômetro quadrado, dado que coloca Maceió entre as capitais mais populosas do Nordeste e uma das que mais crescem no Brasil.

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Pirâmide Etária (IBGE)

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Mobilidade e acessibilidade Os desafios para que a cidade se mova Maceiรณ estรก localizada na metade da linha de costa da Regiรฃo Nordeste

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modelo de desenvolvimento adotado no Brasil, a partir da segunda metade do século XX, provocou uma forte concentração populacional nas cidades brasileiras. Em Maceió não foi diferente e ocasionou a saturação das vias urbanas, centradas no uso do automóvel, levando ao abandono os outros tipos de transportes. Assim, a capital se torna ponto de convergência das rodovias BRs 101, 104 e 316 e da AL 101 Norte e Sul. Atualmente, o núcleo urbano mantém continuidade espacial com os municípios de Satuba, Rio Largo e Marechal Deodoro, uma das causas do problema da mobilidade urbana, fenômeno complexo e difícil de ser solucionado pelo poder público. Como a capital é o ponto de convergência, a população já está sendo prejudicada pela dificuldade de chegar à cidade. Daí a necessidade de criar alternativas para o deslocamento no sítio urbano e suas adjacências. Desde a época dos bondes, e atualmente com o Veículo Leve Sobre Trilhos-VLT, partindo da principal estação, no Centro, este meio de transporte atende a alguns bairros da cidade - Levada, Bom Parto, Mutange, Bebedouro, Fernão Velho e Rio Novo, além de cidades da região metropolitana - Satuba e Rio Largo, finalizando em Lourenço de Albuquerque. Estão em projeto o VLT saindo do Aeroporto Internacional e percorrendo as avenidas Durval do Góis Monteiro e Fernandes Lima, e o BRT (Trânsito Rápido de Ônibus) na Avenida Menino Marcelo, na Serraria, e na Avenida Cachoeira do Meirim, no Benedito Bentes, que, segundo os responsáveis, em breve serão implantados.

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transporte coletivo (ônibus), no entanto, representa um papel fundamental no dia a dia da cidade, já que é baseado em sistema semi-integrado de transportes, constituído de Terminais de Integração. Os espaços públicos da cidade vêm sendo ampliados, qualificados e apropriados para o cidadão com a implantação das faixas azuis para ônibus, que restringem o acesso de automóveis nos corredores de transportes coletivos e estão localizados, na parte alta, nas avenidas Fernandes Lima e Durval de Góis Monteiro e em parte da Thomaz Espíndola; na parte baixa da cidade, nas avenidas Comendador Leão e Dona Constança. Outro programa implantado foi o de reestruturação das praças com a implantação dos binários - transformação de vias paralelas de mão dupla em vias com um único sentido - nos bairros de Santa Lúcia e Cruz das Almas. Das passagens de níveis, o Projeto Praia Acessível garante atividades de lazer e esporte a pessoas com dificuldade de mobilidade; fechamento de praças e ruas para lazer nos finais de semana e feriados; requalificação do Corredor Vera Aruda, na Jatiúca, e reforma da passarela sobre a Avenida Durval de Góis Monteiro, que liga o Canaã a Santo Amaro. O sistema viário da cidade tem como base três grandes estradas que exercem importante papel para o município: as avenidas Fernandes Lima, Durval de Góes Monteiro e Menino Marcelo. São consideradas as principais vias estruturais do município. Numa tentativa de solucionar e minimizar os problemas de mobilidade, corredores de transportes vêm sendo implantados na cidade: as avenidas Márcio Canuto e a Dona Josefa de Melo, que ligam o litoral à parte alta, com

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acesso para a Fernandes Lima e a Via Expressa. Elas mudaram a paisagem e o trânsito entre as avenidas Rotary e Juca Sampaio. Ainda na parte alta foram implantadas a Avenida Pierre Chalita, que liga o Conjunto José Tenório, na Serraria, a Jacarecica, na rodovia AL 101 Norte; a Empresário Valentim dos Santos Diniz, que liga a Fernandes Lima, passando pelo Ouro Preto, à Avenida Menino Marcelo. A José Afonso de Mello, que liga a Durval de Góes Monteiro, passando por Antares, ao Benedito Bentes e à Paulo Holanda, já é estuturada com ciclofaixa e beneficia a comunidade universitária da Ufal, o Hospital Universitário, os conjuntos Vilage Camprestre e Graciliano Ramos. Funcionará também como acesso ao Aeroporto Internacional. Uma nova estrada, a Via Litorânea, já organizada com ciclovia e calçadão, liga Cruz das Almas à Jacarecica. A a Ecovia Norte, com 6 quilômetros de extensão, ligará o Benedito Bentes à AL 101 Norte em Guaxuma. Com relação ao transporte não motorizado (bicicletas), foram implantadas ciclovias e está prevista a construção de várias delas entre as principais avenidas da cidade. Quanto ao transporte aéreo, o Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares, localizado na Região Metropolitana de Maceió, é o responsável pelos destinos diários para várias localidades, o que acontece com maior frequência na temporada de verão. Na Planície Flúvio-Lagunar, em projeto, um novo traçado viário que terá início na BR 316, no município de Satuba, atravessará a Laguna Mundaú, através de três pontes, até o dique-estrada, no bairro do Vergel do Lago, com acessos para a rodovia AL 101, Sul e Norte.

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Glossário

Abacaxis – enfeites de cimento colocados nas colunas dos muros ou no alto das casas. Afloramento – toda e qualquer exposição de rocha na superfície terrestre. Afluente – curso d’água responsável pelo crescimento de outro rio, no qual desemboca, ou onde lança suas águas. Afogamento – invasão na planície, ou topografias costeiras, pelas águas oceânicas, ocasionada pela subida do nível do mar ou por subsidência da área continental. Pode haver afogamento da planície fluvial durante as enchentes dos rios. Aglomerado urbano – qualquer agrupamento urbano, seja de vilas ou de cidades. Água subterrânea – parte da água do subsolo contida na zona de saturação. Altitude – elevação acima do nível do mar. Aquífero – camada subsuperficial capaz de armazenar e transmitir água em quantidade suficiente.

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Bangalô – estilo de casas de um andar só, em geral com varanda coberta. Boom Imobiliário – rápido crescimento imobiliário. Brejão – área alagada nas planícies marinha e lagunar. Caatinga – nome comum que recebe no Nordeste um tipo de mata baixa, pouco desenvolvida, formada por arbustos espinhosos e árvores de folhas frágeis. Também é encontrada no sul da África, na Austrália e na Índia. Censo - conjunto de dados estatísticos dos habitantes de uma cidade, província, estado, nação etc., com todas as suas características. Censo demográfico, recenseamento. Cerrado – tipo de vegetação que abrange em torno de 1/5 do território brasileiro. Ocorre em áreas planas do Planalto Central e em áreas isoladas da Amazônia e do Nordeste. Chorume – líquido de cor escura gerado a partir da decomposição da matéria orgânica existente no lixo.

Área de Preservação Permanente - APP – unidade de conservação estabelecida pelo poder público, em que não é permitida nenhuma utilização pelo homem e onde é vedada a alteração na cobertura vegetal.

Cidade dormitório – local próximo aos grandes centros urbanos, que as pessoas usam apenas para dormir.

Área de Proteção Ambiental - APA – unidade de conservação em que há relevante interesse público para a proteção ambiental, a fim de assegurar o bem-estar das populações, manter e melhorar as condições ecológicas locais.

Clima – conjunto de características meteorológicas que prevalecem numa determinada região e determinam o estado médio da atmosfera e sua evolução. Complexo migmatítico-cristalino – grupo de rochas metamórficas originadas por um complexo de diferentes fases de temperatura e pressão.

Arrabalde – localidade afastada do Centro. Bacia hidrográfica – área de um sistema de escoamento de águas superficiais, originadas de nascentes e/ou de chuva, ocupada por um rio e seus tributários.

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Bacia sedimentar – área geologicamente deprimida contendo sedimentos em seu interior, podendo chegar a vários metros ou quilômetros de espessura.

Contato geológico – Superfície ou zona de separação de unidades geológicas com distintas idades e/ou tipos e rochas.

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Conurbação - fenômeno urbano que ocorre quando as cidades se expandem uma ao lado da outra, de tal forma que acabam se unindo. Crescimento vegetativo – expressão usada para denominar o aumento natural da população, através da diferença entre nascimentos e óbitos. Densidade demográfica – é a medida expressa pela relação entre a população e a superfície do território. Desembocadura – saída ou ponto de descarga de um curso fluvial em outro rio, laguna, lago ou mar. Duna – acumulação sedimentar elevada de areia que se desenvolve pela ação do vento (eólica) em regiões costeiras e desertos. Ecossistema – sistema natural aberto, que inclui, em determinada área, todos os fatores físicos e biológicos (elementos bióticos e abióticos) daquele ambiente e suas interações. Encosta – declive dos flancos de um morro, de uma colina ou de uma serra. Pode, em algumas situações, ser interrompida, caracterizando dessa forma uma ruptura de declive, devido a uma causa estrutural ou erosão diferencial. Erosão fluvial – desgaste das margens e do leito por atividade do rio. Escoamento superficial – vazamento de água que ocorre na superfície quando o solo se torna saturado, for impermeável ou impermeabilizado pela ocupação urbana. Falésia – escarpa geralmente constituída de camadas sedimentares acompanhando a linha costeira. Falha Geológica – fratura ao longo da qual houve deslocamento relativo dos blocos contíguos.

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Fluvial – refere-se ao ambiente de sedimentação dos rios e aos depósitos formados nesse ambiente. Formação – conjunto de rochas que possuem características mais ou menos idênticas de origem, composição ou idade. Foz – local de desaguamento de um rio, também chamado embocadura e desembocadura, que pode ser mar, lago, lagoa ou rio. Freguesia – pequeno núcleo de ocupação. Geologia – ramo da Geociência que estuda as rochas que compõem a Terra e as transformações que sofreram através desde o tempo geológico até os dias atuais. Grau de urbanização (taxa/índice) – corresponde ao processo de ocupação das cidades em decorrência de vários fatores: industrialização, crescimento vegetativo, migração, incorporação de áreas anteriormente rurais, Estatuto do Trabalhador Rural, concentração da propriedade rural, difícil acesso à terra e a atração exercida pela cidade sobre a população etc. Habitat – lugar ou casa onde se habita. Hídrico – relativo à água. Ilha – porção de terra cercada de água por todos os lados. Incremento populacional – ato de aumentar. Quando de refere à população de um lugar, é a quantidade acrescida de pessoas, ou seja, ampliação – no caso, positivo - da população. Quando representa a redução, é negativo. Lagoa – depressão cheia de água doce, de forma variada, mas predominantemente circular, de pequena extensão e profundidade. Exemplo: Lagoa do Distrito Industrial.

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Laguna – depressão que contém água salgada ou salobra, situada na borda litorânea, que possui ligação com

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o mar através de um canal que é sempre invadido pela maré. Exemplo: Laguna Mundaú. Linha de costa – zona de contato entre as terras emersas e as águas do oceano. Litoral – região banhada pelo mar ou à beira-mar. Mangue – ecossistema situado em áreas costeiras tropicais, como estuários e lagunas, regularmente inundados pelas águas salobras. Protegido do impacto direto das ondas, oferece abrigo, alimento e local para reprodução de muitos animais. Mata Atlântica – ecossistema de floresta considerado o mais rico do mundo em biodiversidade. Mesorregião geográfica – divisão do território brasileiro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE para fins de planejamento. O estado de Alagoas é dividido em 3 mesorregiões. Microrregião geográfica – subdivisão realizada pelo IBGE para as mesorregiões. O estado de Alagoas éi dividido em 13 microrregiões. Nordeste – ponto colateral entre o Norte e o Este. Paleofalésia – forma de relevo litorâneo onde se tem a planície marinha à frente. Exemplo: falésias do Jacintinho, Riacho Doce e Ipioca. Pântano – terra alagadiça, em geral desprovida de árvores, em que o lençol freático se encontra no mesmo nível que o solo, ou imediatamente abaixo dele. Gramíneas e juncos são a vegetação dominante. 232

Planície costeira – região plana localizada à margem do oceano, também chamada planície marinha ou litorânea. Planalto – grande extensão de terreno plano ou pouco ondulado, elevado, cortado por vales nele encaixados.

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Planície – grande porção de terreno plano. Planície flúvio-lagunar – região plana margeando sistemas fluviais e lagunares. Planície de inundação – superfície pouco elevada acima do nível médio das águas, sendo inundada por ocasião das cheias. Planície lagunar – área plana à margem das lagunas. Poço tubular – perfuração que atinge um aquífero. Quaternário – termo que ainda tem amplo uso como o período mais recente da era Cenozoica, congregando as épocas Pleistocênica e Holocênica. Recurso hídrico – diz-se dos rios, lagos, lagunas e águas subterrâneas de uma área. Relevo – termo que caracteriza as diferentes formas da superfície terrestre. Restinga – faixa de areia depositada paralelamente ao litoral, graças ao dinamismo destrutivo e construtivo do mar. Regressão marinha – recuo do mar que expõe áreas anteriormente submersas. Rio – corrente líquida resultante da concentração de água em um vale. Rocha cristalina – conjunto de rochas, em geral ígneas e metamórficas. RPPN - Reserva Particular do Patrimônio Natura l– área de domínio privado a ser especialmente protegida por iniciativa de seu proprietário, mediante reconhecimento do Poder Público, por ser considerada de relevante importância pela biodiversidade ou pelo aspecto paisagístico,

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ou ainda por características ambientais que justifiquem ações de recuperação. Sedimento – material originado por intemperismo, erosão de rochas e solos transportados por agentes geológicos (rio, vento, gelo, correntes), acumulados em depressões. Sedimento de praia e aluvião – formação geológica de idade quaternária. Sedimento fluvial – formado por processos fluviais compreendendo depósitos de canal, de planície de inundação, de diques marginais etc.

depósitos que muitas vezes têm interesse econômico. Unidade de conservação - UC – conjunto de áreas legalmente estabelecidas pelo poder público, que objetivam a preservação do meio ambiente e das condições naturais de certos espaços territoriais do país. Vale – depressão de forma longitudinal na superfície da terra, constituída por duas vertentes e um talvegue, geralmente ocupada por um rio. Zona litorânea – região que se estende desde a praia até as terras emersas, em constante interação.

Sitio urbano – área geográfica onde a cidade se desenvolve, em contraposição a áreas naturais ou rurais.

Zona territorial – região geográfica com peculiaridades econômicas e sociais, de população, vegetação e conservação.

Tabuleiro costeiro – paisagem topográfica plana, sedimentar e de baixa altitude que aparece na zona costeira.

Equipe de Geografia

Terraço marinho – forma de relevo que ocorre na planície costeira, testemunha do recuo do mar sobre o continente.

Jovesi de Almeida Costa - graduada em Geografia pela Universidade Federal de Alagoas; especialização em Sensoriamento Remoto pela Unesp; mestre em Geociências, área de concentração Geomorfologia pela UFBA.

Território - base geográfica do Estado sobre a qual é exercida a sua soberania e que abrange solo, rios, lagos, mares interiores, águas adjacentes, golfos, baías e portos. Tramway – linha de bonde. Transgressão – fenômeno de avanço progressivo do mar sobre as terras continentais. Trapiche – ancoradouro. Turfeira – material orgânico natural, combustível, preto-amarronzado, composto por restos parcialmente decompostos, mas ainda estruturados, de vegetais que crescem continuamente em áreas paludosas, acumulando-se em

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Maria do Rosário de Oliveira - graduada em Geografia pela Universidade Federal de Alagoas; especialista em Geografia pela Ufal; mestre em Geografia, área de concentração Regionalização e Análise Regional pela UFPE; consultora do Ministério da Educação e Cultura (MEC) para autorização e credenciamento de cursos de graduação. Anderson dos Santos Ramos – estagiário, graduando em Geografia pela Universidade Federal de Alagoas, Curso em ArcGIS. Clyvia Roberta Gomes Souza – estagiária, graduanda em Engenharia Ambiental pela Universidade Federal de Alagoas. Thiago Luiz Thomaz Oliveira – estagiário, graduando em Engenharia Ambiental pela Faculdade Integrada Tiradentes-Fits.

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Ponta Verde - Paisagem (Ricardo LĂŞdo)

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A CULTURA

Cármen Lúcia Dantas Museóloga pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, especialista em História do Brasil e mestra em Literatura Brasileira pela Universidade Federal de Alagoas. Professora aposentada da Ufal. Atua nas áreas de museologia, consultoria cultural e pesquisa. Tem livros publicados sobre cultura popular, patrimônio histórico, artes plásticas e museologia.

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A construção da identidade Capítulos X e XI

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literatura

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aceió, desde sua origem, vislumbrou um crescente desenvolvimento, apoiado no movimento de idas e vindas de pessoas e de mercadorias no porto de Jaraguá. Essa efervescência, responsável pelo surgimento de uma atmosfera social pautada nos costumes europeus, não foi suficiente para garantir à cidade um avanço intelectual proporcional ao que incorporava de outras regiões, permanecendo, por longo tempo, dependente da cultura dos conventos e agremiações. Embora naquele momento a literatura fosse a atividade cultural preponderante, não havia uma relação direta com o avanço das letras europeias da primeira metade do século XIX. A produção local estava atrelada às tradições moralistas da época. Só a partir de meados do século, timidamente surgia uma literatura panfletária e profana que abriu espaço a uma pequena safra de literatos que, ainda muito jovens, produziam seus poemas e crônicas, em Maceió, antes de migrarem para Salvador e Rio de Janeiro. Entre eles, Ciridião Durval (1860-1895) e Guimarães Passos (1867-1909), este último membro fundador da Academia Brasileira de Letras. Em 1886 sai o primeiro romance de costumes alagoanos e traços românticos, A filha do Barão, editado na topografia Mercantil, de autoria de Pedro Nolasco Maciel (1861-1909), jornalista e abolicionista atuante. Foi o passo inicial para a libertação dos cânones religiosos. No final do século, nasce o poeta Jorge de Lima (1893-1953), tendo iniciado sua produ-

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Jorge de Lima

Aurélio Buarque de Holanda

ção literária desde a adolescência, já na capital, quando escreveu aos 17 anos o poema O Acendedor de Lampiões. Exerceu a profissão de médico, continuando um parnasiano até aderir ao Modernismo, em 1927, com a publicação do poema O Mundo do Menino Impossível, impactando o meio literário local.

Graciliano Ramos

O descontentamento entre os tradicionalistas foi compensado pela fileira de jovens poetas que promoveram a “Festa da Canjica” considerada um marco no rompimento definitivo com a rima e a métrica. Seu irmão, Hidelbrando de Lima, nascido em Maceió em 1904, carrega o louro de ter sido o primeiro autor

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alagoano a publicar um romance de temática policial, O Estranho Assassínio de Mr. Artwill, em 1937. A efervescência cultural começa a acontecer entre os estudantes da capital, que criam, em 1927, o Grêmio Literário Guimarães Passos. Manoel Diégues Júnior recebia em sua casa os colegas Aurélio Buarque de Holanda, Valdemar Cavalcanti, Raul Lima, Paulo Malta, Carlos Duarte, Francisco Marroquim, José Mota Maia, Arnon de Mello, Emílio de Maya e Carlos Paurílio. No ano seguinte, Jorge de Lima publica Essa Nega Fuló, em uma edição de 120 exemplares, atualmente disputada por bibliógrafos e amantes das letras. Com este poema, o poeta abriu as portas da literatura à crítica social envolvida nas relações de classes e no sistema econômico. Ainda em 1928, os jovens do Grêmio juntaram-se ao pintor Lourenço Peixoto e organizaram a “Festa da Arte Nova”, demarcando o ingresso do estado no movimento modernista que já ganhara vulto em São Paulo, com a Semana de 22. Os organizadores foram duramente criticados pelos literatos e acadêmicos resistentes às novidades, tratando-os com desdém. O Movimento Regionalista que surgiu no Nordeste, naquela mesma época, arrebatava os ânimos dos intelectuais, que enalteciam os valores locais, a paisagem, os tipos físicos, a vegetação inóspita do Sertão, seguindo a linha de Gilberto Freyre, figura de destaque na organização.

Para atiçar ainda mais os ânimos, chegava ao Rio de Janeiro, o futurista italiano F. T. Marinetti com o propósito de divulgar o novo estilo. Em Maceió os jornais não pouparam críticas, enchendo os periódicos de escárnio à proposta do italiano. Essa queda de braços resultou numa arena literária na vida cultural da província. De um lado os parnasianos e do outro os jovens adeptos da revolução proposta. A rica produção marcou o período de 1920, estendendo-se à década seguinte, época em que o escritor paraibano José Lins do Rego e a escritora cearense Raquel de Queiroz moraram em Maceió e se engajaram ao movimento local. Em 1930 Graciliano Ramos chega à cidade para ocupar um cargo público. Já conhecido pelos célebres Relatórios, o escritor, que fora prefeito de Palmeira dos Índios, fazia ponto no Café Central, na Rua do Comércio. O bar logo ganhou fama entre os intelectuais e os estudantes que passaram a frequentar a casa. A influência de Graciliano foi marcante para esses jovens que atuavam no jornalismo e nas letras, estimulados por conversas e declamações que se estendiam noite a dentro. Os jornais multiplicam suas páginas literárias, panfletos e revistas circulavam dando vazão à grande produção dos poetas e escritores, na maioria dos casos agrupados em grêmios e academias. Dessas publicações a de maior impacto foi a revista Novidade, de Valdemar Cavalcante e Alberto Passos Guimarães. Enfim, a vida cultural de Maceió ganhara impulso e engajamento. A participação da nova geração, ta-

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lentosa e antenada com a produção dos grandes centros do país, ampliava e qualificava o debate sobre temas atuais que repercutiam na imprensa nacional. Alguns deles deixaram a capital para seguir estudos no Rio de Janeiro, como Aurélio Buarque de Holanda, Manoel Diegues Júnior, Valdemar Cavalcanti, Arnon de Mello, Mendonça Junior, mas mantiveram laços intelectuais e afetivos com Alagoas. Nas férias, voltavam trazendo as novidades e se abasteciam de inspirações pelas noites boêmias de Jaraguá, com os amigos que aqui ficaram, como Carlos Moliterno, Arnoldo Jambo, Teotônio Vilela, Bráulio Leite Júnior, Carlos e Antônio Paurílio, Francisco Valoir e outros que a noite e a literatura se encarregavam de juntar. Chega a década de 1940, com Breno Accioly lançando no Rio de Janeiro, João Urso (1944) e em Maceió, a Gazeta de Alagoas circula com seu novo Suplemento Literário, coordenado por Sílvio de Macedo e Carlos Moliterno. A contribuição dos intelectuais se multiplicava. Abelardo Duarte, Félix Lima Júnior, Jorge Cooper, Théo Brandão, José Maria de Melo figuram entre os colaboradores. A presença de Moliterno estendeu-se de forma constante durante toda a metade do século passado. Autor da letra do hino de Maceió, o poeta dirigiu a Imprensa Oficial, participou da criação de revistas literárias, por muitos anos fez resenha de livros nas páginas dos jornais, presidiu a Academia Alagoana de Letras e deixou livros de sonetos e crítica, como Desencontros (1952), Notas Sobre Poesia Moderna em Alagoas (1965) e A Ilha (1969), levada com sucesso para o teatro pelo grupo da ATA (Associação Teatral de Alagoas).

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Enquanto isso, no Rio de Janeiro, Aurélio Buarque de Holanda e Lêdo Ivo representavam o estado nas Letras, juntando-se à importância de Graciliano Ramos, já consagrado como escritor nacional, com seus romances de paisagem alagoana. No decorrer das décadas, novos nomes vão surgindo, tanto na poesia quanto na prosa e

Carlos Moliterno, escritor e poeta

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Lúcia Guiomar

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até no romance histórico, como Adalberon Cavalcante Lins, com Tigre dos Palmares, ou nas reminiscências de Carlos de Gusmão, em Boca da Grota. Na revista Caeté e nos suplementos literários eram publicados poemas, crônicas e contos de Luiz Gonzaga Leão, Cléa Marsíglia, Francisco Valoir, Anilda Leão, Heliônia Ceres, Solange Lages e Ilza Porto, que criara em 1974 o Grupo Literário Alagoano. José Geraldo Marques, presença marcante na Geração 70, trouxe um jeito novo de fazer poemas, inaugurado com o livro Os Luisíadas, de 1972. Lança, em 1999, Cactos Temporários & Itinerário Marítimo, uma das melhores publica-

ções da década. Outra revelação, a poeta Lúcia Guiomar, reforça a atmosfera de oxigenação da cena local com o lançamento de Poemeu, 1973, Araterra e Os Bons Demônios, em 1981, até sair Negro e Azul como Alma, em 2000, reunindo as obras completas. Arriete Vilela chega com Eu, em Verso e Prosa (1971), e segue com outras publicações como Recados (1978), Para Além do Avesso da Corda (1980), Fantasia e Avesso (1986), Farpa (1988), O Ócio dos Anjos Ignorados (1995), Maria Flor (2002), entre poemas e prosas intimistas. Marcus de Farias Costa lança O Amador de Sonhos, em 1982, e outros vieram, sendo o mais recente Jardim Selvagem, de 2013.

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Lêdo Ivo

Sidney Wanderley

Vindo de Viçosa, o poeta Sidney Wanderley, autor de vários livros entre poesia e prosa permeadas de humor inteligente, lança Na Pele do Lago (1999), Três Vozes (2001) Entropia (2004), Dias de Sim (2012), Cidade (2014) e Leituras.com (2015). Da mesma geração, Maurício de Macedo, dono de um texto apurado e preciso, começou na poesia com Cinzel da Língua (1996) e prosseguiu com Aventuras da Nega Fulô (1998), Onde a Vida Fere Mais Fundo (1999), A Palavra Feito Brasa (2000), Canção dos Orixás (2001), A Ostra

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e a Pérola (2003), A Água e a Pedra (2005). A criação de mestrado e doutorado em Letras da Universidade Federal de Alagoas, na década de 1990, foi responsável pela qualificação das discussões sobre o assunto, revelando um grupo de pesquisadoras que se dedicaram à análise crítica das obras, como Vera Romariz, Enaura Quixabeira, Isabel Brandão, Belmira Magalhães e Edilma Bonfim, entre outras. Os cursos abriram novos caminhos para os profissionais da área e para a organização de eventos importantes como a Bienal Internacional

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Fernando Fiúza

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do Livro promovida pela Ufal, e que em 2015 chega à sua 7ª edição. Outro marco relevante no campo editorial foi a circulação da revista Graciliano, pela editora da Imprensa Oficial, à época coordenada pela jornalista Milena Andrade, responsável também pela elaboração de editais de fomento à literatura local. Esse trabalho, posteriormente conduzido pela também jornalista Janayna Ávila, estimulou a entrada de novos nomes e a edição de publicações importantes . No retorno de Paris para Maceió, Fernando Fiúza traz na bagagem seu primeiro livro, O Vazio e a Rocha (1992), e reitera a possibilidade do exercício da literatura contemporânea. Outros títulos vieram, sem pressa, como ele mesmo diz: “sossega, deixa o verso aparecer”. E o verso apareceu sossegadamente com Tira-prosa (2004), Alagoado (2008), Outdó (2013) e Poemas Impuros (2015). Na dramaturgia, Fiuza viu seu monólogo Balanço Final ser interpretado, em 2013, com sucesso por José Márcio Passos, no Teatro Deodoro. Na música, estabeleceu parcerias com Cris Braun, Junior Almeida, Belô Ve-

loso e Leoni, resultando nas canções, Pequenas Misérias, Viga, Anjo Alucinado e Catarina. No contexto atual, surgem os mais novos, Nilton Resende e Tainan Costa Canário, ambos professores e envolvidos com outras vertentes artísticas. Nilton começou na poesia, mas flana pelo teatro, pela música, pela expressão corporal. Contista, poeta, ator, diretor de teatro, dramaturgo e professor, publicou O Orvalho e os Dias (1998). Da mesma geração, Tainan Costa Canário é professor, poeta, contista, ator e desde quase criança definiu-se pela literatura, fazendo em parceria com Beto Brito o seu livro de estreia, Duo. Depois veio Açougue (2007). Em 2014 lançou dois livros: Contos de Rubik e A Bulha Galinácea e os Escritos Galiformes. Tainan é um autêntico representante da nova literatura, integrado à linguagem do teatro e do cinema. Enquanto na década de 1990 a escritora Ruth Quintela deu o passo inicial no gênero infantil, com A Bela Bruxa Lilita, atualmente esse segmento entrou numa fase de efervescência com uma safra de jovens escritores e

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Foto: acervo partivular

Maurício de Macedo

Nilton Resende

ilustradores que se interessaram pelo público mirim e começaram se destacar nas bienais e feiras literárias. Tiago Amaral, Cláudia Lins, Luciana Fonseca, Leonardo Pimentel são alguns deles. Simone Cavalcante alia engajamento social à autoria de trabalhos como A Cultura Alagoana para Crianças, Literatura em Alagoas e Os Segredos da Mata. O trabalho de contadora de estórias que Simone desenvolve na ONG Fundo de Quintal, na Cambona, é um bom exemplo da responsabilidade social que aos poucos vem acontecendo por iniciativas desse tipo. Outro exemplo de disseminação da literatura é O Papel no Varal. Idealizado por Ricardo Cabus, leva poesia a todos os lugares, por mais inusitados que possam parecer, desde 2009.

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Artes plásticas A

Rosalvo Ribeiro

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pintura, até o século XIX, era atividade artística das sinhazinhas das casas-grandes e das moças casamenteiras de Maceió, que aprendiam a lidar com os pincéis da mesma forma que ensaiavam, desde cedo, o deslizar dos dedos no teclado dos pianos ou passavam o tempo distraídas com agulhas e dedais. A prática inseria-se em mais uma das prendas domésticas que toda moça deveria aprender para se habilitar ao casamento. Só com Rosalvo Ribeiro (1865-19015) a pintura começa a ganhar dimensão, quando o então professor de desenho do Liceu Alagoano retrata o presidente da província, Henrique Magalhães Sales, o mesmo que criara o Liceu, e lhe concede bolsa de estudo de três anos na Academia Imperial de Belas Artes, do Rio de Janeiro, em 1884. Do Rio, Rosalvo seguiu para Paris, voltando com uma sólida formação acadêmica. Embora na época o modernismo já estivesse fervilhando nos salões parisienses, ele não se afastou dos padrões convencionais da pintura oficial e foi com essa bagagem que retornou a Maceió, em 1901, aqui se estabelecendo como pintor e professor. Seus quadros variavam da paisagem à figura humana, especializando-se em retratar políticos, pessoas da sociedade e grupos familiares. Depois de Rosalvo, surgem Virgílio Maurício, Sá Brasil, Carlos Leão, Mirian Lima - filha do governador Fernandes Lima - e primeira mulher a ter projeção na pintura alagoana. Desse grupo, José Paulino é o caçula (18931971). Seus quadros de tons cálidos retratam paisagens alagoanas, com a particularidade de ele fazer as próprias molduras. Todos adotaram os padrões tradicionais, quer os que tiveram orientação artística, quer os autodidatas. Ninguém se atreveu a aderir às novas experiências.

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O primeiro lampejo de ruptura veio na Semana de 28, com Lourenço Peixoto (1897-1983) que criou o Instituto de Belas Artes Rosalvo Ribeiro e inovou com traços livres, partindo depois para o pontilhismo. À frente dos movimentos artísticos de sua geração, Lourenço Peixoto foi seguido a meia distância por Zaluar Sant`Ana, Eurico Maciel, Luiz Silva, Messias de Melo. Na década de 1940, morando no Rio de Janeiro, o poeta Jorge de Lima dividia o tempo entre literatura, pintura e a fotomontagem com abordagem estética vanguardista. Em Maceió, Miguel Torres (1904-1977) atendia as encomendas com suas composições de naturezas-mortas, envolvendo frutas, flores, crustáceos e aves. Como Lourenço Peixoto, também ensinou pintura e vivia da arte. No começo dos anos 1950, aparece José Zumba (1920-1996), autodidata que optou pelo paisagismo local e por uma temática figurativa que personaliza camadas sociais mais humildes, negros e velhos em sua maioria. Deixou uma vasta obra, cuja produção se estendeu por cinco décadas. Na mesma época, Fernando Lopes (19342011) ocupa espaço importante na pintura alagoana, sendo considerado um de seus mais importantes representantes. Egresso de São Miguel dos Campos, Fernando manteve um vínculo catártico com a sua cidade, que se estampa na temática evocativa da paisagem de memória. Falando sobre seus temas, disse: “Quando pinto o casario antigo, ele é um jogo de armar casinhas e há ali a tentativa de aprisionar o tempo entre a criança e o adulto”. Esta incursão sobre o tempo reveste-se da consciência mística que perpassa toda a sua obra. As madonas, os anjos, as figuras bíblicas, o próprio casario, tudo está envolto numa ritualidade que propõe transcender o próprio tempo. Pouco antes de morrer, participou da inauguração da Galeria de Artes Fernando Lopes, do Cesmac (Centro de Estudos Superiores de Maceió), homenagem que lhe foi prestada com exposição de seus trabalhos comemorando cinquenta anos de pintura.

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Contemporâneo de Fernando, Pierre Chalita (1930-2010) volta da Espanha, onde estudava pintura, e impacta a sociedade maceioense com a exposição, em 1965, no Teatro Deodoro, de uma grande tela de Cristo nu, na cruz. Suas pinceladas ágeis deram forma às composições como uma espécie de pele cromática, que é a um só tempo cor e luz. Sua obra está agrupada em duas séries: a do Baile e a do Paraíso. Na década de 1970, muita gente nova foi inserida no cenário das artes visuais produzidas em Maceió, com exposições em espaços públicos e privados. Além da Galeria Miguel Torres, no hall do Teatro Deodoro, a cidade contava agora com novos espaços públicos como a Galeria Rosalvo

Fernando Lopes e Denis Matos

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Ribeiro, a Galeria de Arte José Paulino, a Galeria Lourenço Peixoto e particulares, como a Sucata Decorações e a Galeria Mário Palmeira. Entre os artistas desse período Getúlio Mota dedicou-se ao ensino da pintura na educação pública com a Escolinha de Arte de Maceió e Hércules Mendes veio com o desenho. Na pintura Edgar Bastos, Roberto Lopes, Rosival Lemos, Vânia Lima, Fernando Bismarck, Gaspar Luiz, Vicente Ferreira, Rogério Gomes e Beto Leão foram alguns dos que fizeram parte da Geração 70.

Rogério Gomes permanece como um dos mais produtivos de seu tempo, com exposições contemporâneas e uma pesquisa constante de suportes e conceitos atuais. Reconhecido nacionalmente pelo apuro técnico e poder de síntese com que trabalha suas obras – pintura e escultura – é dono de uma obra única, marcada pelo refinamento na textura. Rogério produz com olhar focado no seu tempo, num diálogo constante com temas que inquietam os dias atuais. A década de 1980 pode ser identificada

Reinaldo Lessa e Rogério Gomes

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Pierre e Solange Chalita

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Lula Nogueira, óleo sobre tela. Procissão de São Pedro na Lagoa Manguaba

também como o período em que a capital conquista espaços importantes de exposições temporárias e permanentes. É o caso da Fundação Pierre Chalita, presidida por Solange Chalita, que passa a reunir em dois espaços diferentes – no Centro e em Jaraguá – o acervo particular do artista com obras de origem europeia e brasileira – pintura, mobiliário, esculturas sacras e peças decorativas em porcelana e cristal. A produção plástica ganha impulso com trabalhos de Paulo Caldas, Dyda Lyra, Lula Nogueira, Reinaldo Lessa, Aloísio Coimbra, Eduardo Xavier. Lula Nogueira abre com Petrúcio França a Galeria Grafitte, em 1981. Chega da Bahia Gláucia Lemos, professora e crítica de

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Rosivaldo Reis, óleo sobre tela

arte, oxigenando o meio artístico com seus comentários escritos. Antes dela, Rui Sampaio, radicado no Rio de Janeiro, colaborava com a crítica local e Romeu Loureiro inicia sua participação no cenário, com a instalação de uma galeria e textos críticos nos jornais. Em 1981 a capital passa a contar com a Pinacoteca Universitária, criada pelo então reitor da Universidade Federal de Alagoas João Azevedo. Dirigido pelo artista plástico e professor Rogério Gomes, o espaço – voltado para exposições e cursos ligados à cultura – mirava a produção contemporânea, perfil conceitual mantido até os dias atuais. A primeira iniciativa de repercussão capitaneada pela Pinacoteca foi o curso de

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Casa da Arte, Garça Torta

arte e criatividade conduzido pelo baiano Jadir Freyre, que chamou a atenção para a possibilidade de interação entre arte e comunidade. A proposta levantada por Jadir foi o estopim para a criação do Vivarte, em 1984. Movimento renovador da estética local, teve na figura de Ricardo Maia seu principal incentivador, um estudioso da percepção plástica do grupo, que congregou figuras como Maria Amélia Vieira, Dalton Costa, Fernando Bismark, Gerson Bezerra, Salles,

Foto: Jorge Barboza

Roberto Ataíde, Marcus Aurélio, Manoel Viana, Judivan, Irene Duarte, Lula Nogueira, Edgar Bastos e o próprio Ricardo Maia com os seus “abstratos-caetés”. Juntamente com o pintor Paulo Caldas, Maia organiza em 1987 a Cruzada Plástica, que reúne vivartistas e outros nomes que passam a aderir ao movimento: Rosivaldo Reis, Joaquim Alves, Valéria Sampaio, Lael Correia e a paulista Célia Campos, professora e crítica, que apoia o movimento. A Casa da Arte também chega com a década de 1980. Fruto da sensibilidade e engajamento social da professora Edna Constant, o espaço levou arte e cidadania para a Praia da Garça Torta. Exposições com nomes importantes, oficinas comunitárias voltadas principalmente para o público infanto-juvenil do entorno, transformaram a Casa numa referência para alagoanos e estrangeiros. Atualmente dirigida pelo artista Tito Mendes, mantém-se como espaço de convivência da arte contemporânea. Outra referência é a Galeria Karandash, idealizada pelos artistas Maria Amélia Vieira e Dalton Costa, cuja ramificação se estende atualmente à Ilha do Ferro, conhecido reduto de escultores e rendeiras. Em 2010 o casal criou o Museu Coleção Karandask, em Maceió, e o Barco-Museu “No Balanço da Águas”, núcleo de extensão das atividades nos municípios ribeirinhos do Rio São Francisco. O ano de 1985 marca a criação da Secretaria de Cultura, dirigida por Noaldo Dantas. Um dos trabalhos importantes da pasta foi o Iº Salão Nacional de Humor de Alagoas, pensado pela então diretora de difusão cultural, a arqui-

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teta Mirna Porto. A comissão julgadora reuniu os papas do humor no Brasil - Ziraldo, Chico e Paulo Caruso, Lapi, Lailson, Borjalo. Montado em um circo, na Ponta Verde, o evento uniu exposições, lançamentos de livros, apresentações artísticas em torno das homenagens ao Menestrel das Alagoas, Teotônio Vilela. Ênio Lins, Hércules e Manoel Viana participaram da exposição e juntamente com Nunes Lima se destacam entre os caricaturistas e chargistas com publicações nos principais jornais da capital. Hoje, Leo Vilanova é a revelação, no jornal Gazeta de Alagoas. Integrante do Grupo Geração 80, no Parque Lage (RJ), Delson Uchoa está entre os que alcançaram renome internacional no mercado de arte. O sentido de autofagia, a sobreposição de camadas, o colorido quente e a desconstrução da pintura estão entranhados no trabalho do artista que participa de mostras importantes - XXIV Bienal Internacional de São Paulo (2005), coletiva Modernos, Pós-Modernos etc, no Instituto Tomie Ohtake (2007), X Bienal de Havana (2009), 53ª Bienal de Veneza (2009), XII Bienal do Cairo (2010), XX Bienal de Curitiba ( 2013). Obras do artista podem ser vistas nas coleções da Pinacoteca do Estado de São Paulo, Inhotim (MG), Museu de Arte Contemporânea de Niterói, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, dentre outros museus e galerias de renome. As décadas de 1980 e 1990 podem ser compreendidas também como períodos de amadurecimento artístico de gerações empenhadas em assimilar conceitos contemporâneos e a fusão de linguagens e novas mídias. Artistas como Fernando Pontes, Marta Araújo e Francisco Oiticica são referências importantes na experimentação e pesquisa no sentido da desconstrução da arte formal, ampliando possibilidades conceituais de materialização e compreensão dos trabalhos – fotografia, pintura, instalação. O grupo de artistas que transitam pela ca-

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Foto: Celso Brandão

pital com ateliês e propostas de diferentes vertentes é ampliado com o passar dos anos. Nomes como Rosivaldo Reis, Denis Matos, Marta Arruda, Lael Correa, Francisco Melo, Eduardo Xavier, Aquiles Escobar, Dyda Lyra, Persivaldo Figueirôa e Lu Azul ganham destaque na cena local. Lula Nogueira, da mesma geração, é uma espécie de documentarista da Maceió de outrora, com composições da área urbana e ambientes domésticos. Agélio Novaes conso-

Delson Uchoa

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Foto: arquivo pessoal

Pedro Lucena

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lidou a colagem com trabalhos que retratam as cenas do cotidiano em verdadeiros quebra-cabeças bem engendrados. E a produção naif de Tânia Pedrosa resgata elementos da cultura popular local em telas de colorido vibrante. Entre os chamados “novíssimos” estão Suel Cordeiro, cujos trabalhos amanhecem no século XXI com um jeito novo de tratar o clássico, flexibilizando-o a conceitos e tendências atuais; Daniela Aguillar reaproveita materiais aparentemente imprestáveis em obras oníricas e lúdicas; Marta Emília constrói, desconstrói imagens e objetos tridimensionais. Funde pintura recortada e objetos cromáticos num jogo de resgate da memória coletiva. Uma das revelações deste início de século é o artista visual Pedro Lucena. Com um traço que mais parece com poesia esculpida num universo fantástico, Lucena é também ilustrador de livros infantis, possui trabalhos publicados em revistas nacionais e estrangeiras. Dono

de uma arte engajada, aplica oficinas de desenho e pintura para um público infanto-juvenil como o Atelier Aberto do Sesc. A possibilidade de inserir a arte visual em diferentes linhas de pesquisa que incluem moda, design, comportamento, música, sexualidade, fetiche, hábitos e cultura popular compõe parte do repertório criativo de Herbert Loureiro. Não há limites para a ousadia e a originalidade que se materializam contextualizadas às reverências cotidianas e globalizadas propostas pelo artista. Além do trabalho individual, Herbert Loureiro, o jornalista e fotógrafo Matheus Sandes e o performático Rodrigo Gonçalves formam uma tríade promissora que desponta no cenário das artes visuais em trabalhos altamente alinhados com a vanguarda (fotografia, performance, pintura...). O artista, a arte, o espaço e o público conectam-se por meio de linguagens e posicionamentos estético-sociais, definidos pelo comportamento que

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subverte os limites impostos pela heteronormatividade vigente. O design, como possibilidade de materialização do acontecimento plástico e de releitura de elementos da cultura de um povo, situa o trabalho do arquiteto Rodrigo Ambrósio. Destaque no cenário nacional com peças que resgatam a identidade e os saberes de Alagoas, o designer faz uma releitura contemporânea da tradição e do popular ao fundir arte e objeto, artesanal e industrial na pesquisa de técnicas – da cestaria, funilaria e cerâmica até a tornearia. Rodrigo Ambrósio em processo de fabricação

Cadeira Engenho - feita de rapadura, esteve em exposição durante a Semana do Design 2015, em São Paulo, e foi comida durante o evento

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Teatro O

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grande ato que abriu os caminhos da arte cênica em Maceió foi a construção do Teatro Deodoro e a sua inauguração, em 1910. Equipado com o que de melhor havia em termos de recursos técnicos, o Deodoro foi fundamental no estímulo ao surgimento de talentos locais e na vinda para a capital dos grandes espetáculos ligados à dramaturgia clássica, canto e dança. Artistas consagrados - Ítala Fausta, Bidú Saião, Procópio Ferreira, Eva Todor, Rodolfo Mayer, Paulo Autran e Paulo Gracindo, Bibi Ferreira, Carlos Magno e sua caravana cultural - subiram ao palco, esbanjando talento e experiência cênica. Ficaram para trás os teatros improvisados, mantidos por alguns abnegados. Entre eles, o Teatro Maceioense, depois Cine Teatro Delícia, que funcionava na Rua XV de Novembro, no Centro, o Minerva e o Teatro Santo Antônio, idealizado pelo Major Bonifácio Silveira para atender ao bairro de Bebedouro, nos primeiros anos do século XX. Na década de 1950 foi criada a Sociedade de Cultura Artística de Alagoas, por um grupo de intelectuais liderados por Leda Collor de Mello, que facilitou ainda mais a vinda de grandes espetáculos para Maceió, por preços simbólicos e campanhas de acesso gratuito dos estudantes, visando a formação de novo público. Entre os diretores do Deodoro, o ator e dramaturgo Braúlio Leite Júnior (1931-2013) teve gestão mais longa, estendendo-se por três décadas, desde 1957. Nesse período, criou o Teatro de Arena Sérgio Cardoso, o Teatro Lima Filho, a Fundação Teatro Deodoro, o Museu da Imagem e do Som, a Escola de Música, depois Centro de Belas Artes de Alagoas, a Orquestra de Câmara, a Orquestra Filarmônica e muitos eventos ligados às artes cênicas e plásticas. Como ator e dramaturgo Braúlio subiu ao palco do Deodoro em várias peças, como Antígo-

na, de Sófocles; Casa de Bonecas, de Ibsen; Os Inimigos Não Mandam Flores, de Pedro Bloch, e tantas outras, além de coordenar grupos teatrais e viver toda a sua vida dedicada ao teatro. Ao lado de Bráulio Leite, outro ícone da dramaturgia alagoana é a maceioense Linda Mascarenhas (1895-1991), atriz e diretora que marcou sua presença no teatro amador de maneira tão decisiva que recebeu o título

Teatro Deodoro em sua concepção arquitetônica original

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Linda Mascarenhas

de Dama do Teatro Alagoano e o 14 de maio, data de seu nascimento, passou a ser o Dia do Teatro Alagoano. Subiu aos palcos por mais de quatro décadas interpretando as mais variadas personagens, dirigiu peças e esteve à frente da produção de vários espetáculos. Sua casa, na Ladeira do Brito, era uma continuação da vida no teatro, reunindo atores, diretores, iluminadores e os jovens aspirantes, cheios de desejos de subir ao palco e aprender com ela as artimanhas da representação. Em 1955 Linda criou a ATA (Associação Teatral das Alagoas), responsável pela formação de vários atores, entre eles Ronaldo de Andrade, Homero Cavalcante, José Márcio Passos, seus discípulos diletos, que passaram a ser chamados carinhosamente de “meninos de Linda”. Otávio Cabral, Eduardo Xavier, Aline Marta, Fátima Medeiros, Correia da Graça são mais alguns dos que deram seus primeiros passos em direção ao palco levados pela ATA. Outros nomes contemporâneos de Linda e que contribuíram na formação e solidificação da arte cênica do estado podem ser listados a

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Bráulio Leite Júnior

partir de Pedro Onofre, Luiz Gutemberg, Aldemar Paiva, Wolney Leite, Lauro Gomes, Lima Filho, Eunice Pontes. Anilda Leão (1926-2012) foi outra Diva, representando e cantando com muita familiaridade cenográfica e participando, ao lado de Linda, dos movimentos feministas de avanços sociais. Com a morte de Linda, assumiu a presidência da ATA, ficando até 1994, quando entregou o comando a Ronaldo de Andrade, que permanece até hoje. Os 60 anos da ATA, comemorados em 2015, foi lembrado com a montagem de A Terra do Lêdo Ivo e com a publicação do segundo número da Revista Kaiti-tu. Na autoria de textos de abordagem social, outro viés importante na dramaturgia alagoana, aparecem nomes como os de Pedro Onofre, Sávio Almeida e o mais novo deles, Lael Correia, também ator, criador do Grupo Infinito Enquanto Truque, que instalou o Espaço Teatral Camaleão, na década de 1990, quando os teatros da cidade, a começar pelo Deodoro, permaneciam fechados. A sala alternativa tinha público garantido, formado por estudan-

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Anilda Leão

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tes, professores e artistas afeitos à linguagem contemporânea das peças de Lael. Outros grupos se formaram na medida em que as casas de espetáculos reabriram e outras foram surgindo, a exemplo do Teatro Jofre Soares do Sesc. O movimento ganhou mais força com a inauguração do Teatro Gustavo Leite, no Centro de Convenções. Artistas nacionais passaram a incluir Maceió no roteiro de suas apresentações Entre os grupos locais temos o Cena Livre, Companhia Teatral Comédia Alagoana, Companhia do Ponto, Companhia Teatral Nega Fulô, Falange Teatral, Companhia de Teatro da Meia-Noite, Companhia do Chapéu e Associação Teatral Joana Gajuru, que inovou levando o teatro para as ruas de Maceió. A caminho do profissionalismo, a Ufal abre o Curso de Artes Cênicas com Interpretação Teatral e em 1993 dá início ao Curso Profissionalizante de Formação do Ator e abre a Sala Preta como laboratório cênico para os estudantes. Na mesma época, Pedro Onofre organiza o Sated-AL. (Sindicato dos Artistas e Técnicos em Diversões do Estado de Alagoas). Novos horizontes são abertos e os olhares ficam mais exigentes com relação não só ao corpo cênico de atores, mas à preparação corporal, aos tratamentos cenográfico e coreográfico, à indumentária, à iluminação e a todo um elenco que trabalha nos bastidores para garantir a produção de bons espetáculos. Nestas áreas se tem o registro da competência de Gustavo Leite, Fernando Ribeiro, Eris Maximiano, Agélio Novaes, Rivaldo Lisboa, Fernando Arruda. Em 1994, a montagem da peça Mandrágora de Nicolau Maquiavel, com direção de Lauro Gomes, já teve a preparação corporal dos atores sob a orientação de Antônio Lopes, professor de expressão corporal da Ufal.

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O Deodoro, durante a gestão de Juarez Orestes, passou por um processo de restauração de sua condição cênica e recebeu como acréscimo um centro de artes. Inaugurado em 2014, o espaço amplo e moderno atende a atividades artísticas variadas. Juntos, os teatros Deodoro, Sérgio Cardoso e o Centro Cultural formam o Complexo Cultural Deodoro. A peça “A Devassa – o que as mulheres gostariam que fizessem com elas na cama” escrita e interpretada pela atriz Ivana Iza, marcou a segunda década deste século no palco do Deodoro. A peça teve direção de Flávio Rabelo e, depois de dois anos com sucesso pelo Nordeste, foi levada em São Paulo, no Teatro Juca Chaves. O público aprovou encenação e texto bem humorados, onde a atriz representa cinco personagens, todas com falas de conteúdo crítico relativo aos tabus que rondam a sexualidade feminina. Outros nomes brilham nos palcos da cidade, compondo o grande elenco da dramaturgia alagoana nos dias atuais. Entre eles, Chico de Assis, Aline Marta, Régis de Souza, Diva Gonçalves, David Farias, Naeliton Santos, Nilton Resende, Sílvio Leal e uma nova safra que sai do curso de teatro com uma visão profissional do ofício em cena. A multiplicação dos grupos é reforçada na medida em que os espaços alternativos se consolidam, a exemplo do Quintal Cultural, que em 2015 completou 8 anos. Instalado na rua Sol Nascente, no bairro do Bom Parto, ponto de cultura mantido pelo artista e educador Rogério Dyas é palco e cenário de integração social em área periférica. O Quintal materializa a possibilidade do acesso de crianças e adultos às artes cênicas. É literalmente uma ação de inserção da arte na comunidade por meio das oficinas de literatura, música e dança.

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Acervo partcular

Lael Correia Foto: João Erisson

David Farias, José Márcio Passos, Ivana Iza e Homero Cavalcante

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Cinema A

história do cinema em Alagoas é trilhada por caminhos difíceis, marcados por obstáculos e limitações, mas, ao mesmo tempo, fascinante na medida em que reitera a obstinação dos nomes que fazem parte dessa trajetória, desde a projeção do filme Casamento é Negócio?, em 1933, de Guilherme Rogato (1898-1966).

Filme de José Wanderley Lopes

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O cinema local alterna períodos produtivos e momentos de estiagem. Depois de Rogato, as passadas foram lentas até surgir, na década de 1960, a empresa cinematográfica Caeté Filmes do Brasil, de José Wanderley Lopes, que atendia a eventos políticos e festas familiares. Seu proprietário produziu, em 1971, o longa A Volta pela Estrada da Violência, com esperança de entrar no circuito comercial dos cinemas, mas a iniciativa naufragou. Voltou então à sua vocação comercial, mas sempre esteve próximo dos documentaristas. Em 1982, nova investida com Mulheres Liberadas, dirigido por Adnor Pitanga. O primeiro longa da Caeté Filmes do Brasil motivou, recentemente, o cineasta Pe-

dro da Rocha a produzir Memórias de uma Saga Caeté, recuperando as lembranças de época nas cidades de Santana do Ipanema e Maravilha, onde o longa foi rodado. A década de 1970 foi produtiva para a sétima arte. A realização do Iº Festival de Cinema Brasileiro, em Penedo (1975-1985), confirma os avanços. Embora o evento tenha acontecido na cidade ribeirinha, todo o projeto foi criado e pensado em Maceió. Solange Lages (hoje Chalita) à frente do Dac-Senec (Departamento de Assuntos Culturais da Secretaria de Negócios da Educação e da Cultura), vinda da bem sucedida experiência com o Festival de Verão de Marechal Deodoro, cria o evento, sempre em janeiro, que se prolonga até a década seguinte. O super-8 foi muito prestigiado e reunia um grupo de jovens talentosos e com disposição de seguir em frente. Celso Brandão, Mário Jorge Feijó, Benvau Fon, Joaquim Alves, José Márcio Passos, José Geraldo Marques, Ronaldo de Andrade, Beto Leão estão entre os que se destacaram, vindos do teatro, da literatura ou da fotografia. Premiado no I Festival com Reflexos, seu filme de estreia, Celso Brandão nunca mais largou a máquina. Filmando ou fotografando, manteve o olhar e a pesquisa voltados para a memória da cultura local. Seu rico acervo, em fase de catalogação, conta com imagens fundamentais para a compreensão da arte alagoana, com ênfase no segmento etnográfico. O empenho e a relevância do trabalho desenvolvido pelo fotógrafo é reconhecido pelas novas gerações. Em 2008, as cineastas Larissa Lisboa e Alice Jardim fizeram um documentário sobre o ex-professor, reunindo imagens e depoimentos. No IIIº Festival de Cinema Universitário da Ufal, em 2013, Celso foi homenageado, tendo suas obras fotográficas exibidas na Exposição Memento, e seus filmes projeta-

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dos em praça pública. Nome emblemático do audiovisual alagoano, a obra de Celso Brandão é referência no cenário nacional. Voltando à década de 1970, durante os festivais, Imanuel Caldas e Elinaldo Barros iniciam a produção de textos e resenhas críticas sobre cinema. Elinaldo, maceioense da Ponta Grossa, desde menino assíduo frequentador dos cinemas do bairro, entrelaçou o cinema local à própria história de vida. Foi jurado dos Festivais de Penedo e logo abriu novas frentes, indo das pesquisas às publicações – Panorama do Cinema Alagoano, Cine Lux, Recordação de um Cinema de Bairro e Rogato – A Aventura do Sonho das Imagens em Alagoas. Foi também crítico de cinema nos jornais impressos - O Jornal e Gazeta de Alagoas - e telejornais - TV Gazeta, TV Pajuçara. Outra iniciativa de Elinaldo foi a consolidação da seção de arte no antigo Shopping Iguatemi, em 1995. Durante a 2ª edição de seu primeiro livro, no espaço do Cine Sesi Pajuçara, em 2010, em emocionante homenagem, foi lançado o filme de Pedro da Rocha, Elinaldo Barros – o Catador de Fotogramas. Após os festivais, o tempo fechou para o cinema alagoano, devido à falta de incentivo público e privado. Em 1988 a retomada veio com a Mostra de Filmes Alagoanos. Destaca-se, nessa época, o papel dos professores da Ufal Pedro Nunes e Almir Guilhermino, que revelaram novos valores como o estudante Cláudio Manoel Duarte e outros do Curso de Comunicação que despertavam para o audiovisual. Cláudio Manoel, mesmo morando na Bahia, manteve o contato com o pessoal local. Entre seus últimos trabalhos está o curta Mais que Traços e Cores (2014), sobre o artista Roberto Ataíde, e um documentário com os escultores da Ilha do Ferro (2015).

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Foto: acervo pessoal

Elinaldo Barros

Penedo e a efervescência cultural dos anos 70

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Na década seguinte o cineasta Werner Salles Bagetti e o jornalista Emerson Maranhão organizaram a 1ª Mostra Competitiva de Vídeos Alagoanos, que aconteceu no Sesc-Centro. O estopim para nova retomada estava lançado. O aquecimento conta ainda com Hermano Figueiredo, paraibano que marcou presença em Maceió com produções em parceria com Regina Célia Barbosa. Além de escrever para um público infantil, participa das artes cênicas, sempre com foco no engajamento social. Hermano chegou com experiência em associações de classe e deu um impulso na organização de entidades que pudessem defender o interesse dos cineastas. Com Regina, criou a ONG Ideário Comunicação e Cultura voltado para a difusão do audiovisual pelos bairros da cidade, como o bem-sucedido projeto “Acenda uma Vela”, que percorreu o litoral, a área ribeirinha e as comunidades lagunares, usando como suporte as velas de jangadas e canoas. Outras iniciativas surgiram com os selos do Sesc e do Sesi, num momento em que o cinema digital e lançamentos de editais públicos oxigenaram a produção. Com as baterias recarregadas, o século XXI chega com a qualidade da imagem favorecida pela tecnologia e com uma nova safra de diretores, roteiristas, atores, produtores, fotógrafos e operadores de imagens antenados com os avanços que surgem.

Acervo pessoal

Hermano Figueiredo Foto: acervo particular

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Werner Salles Bagetti

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Acervo pessoal

Vera e Pedro da Rocha

Neste clima, começa a ser escrito um novo capítulo na história do audiovisual em Alagoas. Alguns personagens fazem o link entre o século passado e o atual, como o diretor Pedro da Rocha, que, em parceria com a esposa, Vera Rocha, montou a produtora Boca da Noite que assina Navegantes - sobre a procissão fluvial de Bom Jesus - e O Santo Guerreiro do Povo, homenageando o folclorista Ranilson França, ambos de 2007; A Estrela Radiosa, registro da Rádio Difusora de Alagoas, de 2008; Casa Almeida – Comércio e Filosofia, rodado em Junqueiro, de 2010; Sol Encarnado – ficção, com atuação de Sílvio Leal e Ivana Iza, em 2012; Yes, Mamãe!, sobre o tradicional bloco carnavalesco “Os Filhinhos da Mamãe”, de 2014.

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Foto: acervo particular

Silvio Leal

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Diretor premiado é Werner Bagetti, com uma escalada bem-sucedida de documentários, ficção e história, passando pela Imagem Peninsular de Lêdo Ivo, documentário sobre vida e obra do autor de Ninho de Cobras, de 2004; História Brasileira de Infância – Parte um, sobre o naufrágio, em Coruripe, da nau que conduzia o bispo Pero Fernandes Sardinha, de 2005, e Exu – Além do Bem e do Mal, de 2012. Muita gente nova entra na cena audiovisual - Larissa Lisboa, Alice Jardim, René Guerra, Rafhael Barbosa, Henrique de Oliveira, Pablo Casado, Anderson Barbosa, Amanda Duarte e atores do naipe de Nilton Resende, Taciane Simões, Igor de Araújo e Carol Moraes dentre outros. Entre os diretores laureados René Guerra

está entre os primeiros. Vindo do teatro, traz uma experiência com a luz, a preparação do elenco e a estrutura cenográfica. O resultado está ai, com seus curtas, como Os Sapatos de Aristeu, de 2008, e Quem tem medo de Cris Negrão?, focando a temática social de gênero. Dividindo sua produção entre São Paulo e Maceió, René tem planos para estar cada vez mais próximo do grupo alagoano com quem tem grande afinidade. Rafhael Barbosa vem do jornalismo, passando da coordenação do cineclube “Antes Arte do que Tarde”, à autoria dos filmes Chimarrão, Rapadura e Outras Histórias (2007), Km 58 (2011), melhor filme da II Mostra Sururu e finalmente, em 2013, O que Lembro, Tenho, detentor de 20 prêmios e selecionado para cerca

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Foto: Vanessa Mota

de 30 mostras nacionais e internacionais. O curta que aborda o Mal de Alzheimer revelou a atriz Anita das Neves. Aos setenta anos, ela deu um show de interpretação, ao lado da experiente Ivana Iza. A mais recente produção de Rafhael é Tempo de Cinema, lançado em 2014. Jogando em outras posições, atuou na produção de filmes de Werner Salles, de Alice Jardim, de Victor Guerra, Wladymir Lima e de Leandro Alves. Esta segunda década do século consolida na produção audiovisual novos eventos como a Mostra Sururu, criada durante a gestão de Pedro da Rocha à frente da Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-metragistas de Alagoas, e o Festival de Cinema Universitário de Alagoas, promovido pela Ufal, sob a organização do professor Sérgio Onofre. Ambos contribuem com a afirmação do cinema alagoano, enquanto a reabertura do Centro Cultural Arte Pajuçara, graças ao empenho de Marcos Sampaio – promove a formação de plateia e a inclusão de Maceió no circuito de exibição dos cult movies.

Rafhael Barbosa e Anita das Neves

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FOTOGRAFIA Foto: Juarez Cavalcante

H

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á pouco registro de fotógrafos em Maceió no século XIX. Em sua maioria as fotos não trazem a autoria. Entre os mais antigos que se tem notícia está Guilherme Rogato, o mesmo italiano que se fixou na cidade e que estendia sua paixão ao cinema. Só em meados do século passado a arte de fotografar veio a ganhar maior visibilidade e a atrair adeptos como Antenor Pitanga, Luiz Lavenère, Robert Stuckert. Nessa época profissionais estrangeiros, a exemplo de Pierre Verger e Marcel Gautherot passavam por Alagoas captando imagens que ilustraram reportagens de revista nacionais como O Cruzeiro, dos Diários Associados. Depois deles veio Japson Almeida (19221992) com um amplo registro da cidade e sua vida social nas décadas de 50 a 70. Parte de seu acervo está no livro recém-lançado Japson Almeida – Fragmentos de um olhar, com imagens que documentam a evolução urbana, as festas populares, os hábitos e costumes da sociedade maceioense em um período de grandes transformações. A partir dos anos 70, Celso Brandão entra na cena. Em sua passagem pelo Museu Théo Brandão, de 1977 a 1986, deixa uma grande coleção de fotos de temática etnográfica. A partir de 1992, rompe a barreira do estado com participações na mostra “Fotografia Brasileira Contemporânea”, em São Paulo, e a individual “Argueiro, um cisco no olhar”, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Dos trabalhos mais recentes, destacam-se as publicações Olhar Trincado, Memento e Mestres Artesãos das Alagoas. Juarez Cavalcante é outro destaque na fotografia, com algumas incursões no audiovisual. Das principais exposições destacam-se “Presença Negra no Cinema Brasileiro, de 1988 a 1989”, montada em 15 estados “Rastro de Luz”, de 1996, e “Luz Nossa de Cada Dia”, de 2001. O esmero técnico é a característica

Celso Brandão

principal de seu trabalho. Documentou a Mata Atlântica no município de Coruripe e participou do programa Cinema no Balanço das Águas, pelo Barco-Museu da Galeria Karandash, nas águas do São Francisco. Ricardo Ledo é outro nome importante. Vindo do fotojornalismo, ele pesquisa a luz. Ao longo de quase 20 anos, expôs a série “Ventos“ (2003) e “Relevo” (2011), em Maceió, e “Latinidades” (2005), no Rio de Janeiro. São de sua autoria as fotos que ilustram as publicações dos projetos especiais da Organização e do Instituto Arnon de Mello sobre a cultura alagoana. A relação entre fotografia, movimento e memória é a base do trabalho desenvolvido pela alagoana Renata Voss. Professora de fotografia da Escola de Belas Artes da UFBA, onde cursa doutorado, a artista visual pesquisa desde 2004 processos alternativos e novos suportes. Participou de mostras em vários estados. Em Maceió, a exposição mais recente foi Passagem, na Pinacoteca Universitária.

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Música M

aceió é musical por natureza, vocação que vem desde a sonoridade do próprio nome que em diferentes épocas inspira compositores e poetas. A força da musicalidade se confirma no hino da cidade, com letra de Carlos Moliterno e música de Edilberto Trigueiros. O elenco de composições passa pela inspiração de nomes como Aristóbulo Cardoso, Lourival Passos, Jackson do Pandeiro, Jararaca, Edécio Lopes, Roberto Becker, Jacinto Silva, Djavan, Carlos Moura, Martinho da Vila, Eliezer Setton. A lista se estende a outros autores, encantados com as belezas naturais e a alegria solar da capital. Dos bailes de salão às festas públicas, a música sempre esteve presente. Associações musicais surgiram no século passado, a partir da Tuna Alagoana, em 1904, vindo no ano seguinte o Clube Atheneida, o Círculo Musical,

em 1910, a Juventude Musical Brasileira, secção de Alagoas, e a Sociedade de Cultura Artística, ambas criadas por Leda Collor de Melo, em 1950. Seis anos depois, a pianista Venúzia de Barros Melo abre o Conservatório Brasileiro de Música, secção Alagoas, que permaneceu, graças a seu empenho pessoal, até 1973. Um marco fundamental para a difusão e ensino musical foi a criação do curso de música na Universidade Federal de Alagoas. Alguns bairros têm a história marcada pelos movimentos artísticos musicais que acalentavam suas noites, a exemplo de Bebedouro e Prado, com as apresentações dos festejos populares, seguidos pela Chã da Jaqueira, que continuou como ponto de organização de Guerreiros e Pastoris, abrilhantando as festas natalinas. Foto: divulgação

Djavan

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A animação na Ponta Grossa e no centro da cidade, durante as comemorações carnavalesca, marcaram uma época memorável com os blocos mais tradicionais como As Onze Mil Virgens, O Bota Fora, O Amigo da Onça, Cavaleiro dos Montes e Vulcão que sempre desfilavam arrastando multidões. À frente, Ras Gonguila levava o estandarte e o Moleque Namorador dava show de passista. Comandando a folia Setton Neto, o mais festejado rei momo de todas as épocas. Os clubes também se esmeravam para receber os foliões ao som das orquestras de instrumentos de sopro e percussão, com destaque para os maestros Passinha e Ivanildo Rafael. Entre as músicas mais tocadas, que sacudiam e sacodem multidões, está “Mamãe eu Quero”, de autoria do maceioense Jararaca (José Luiz Rodrigues Calazans) e de Ratinho (José Vicente Paiva), dupla que brilhou nos palcos do Brasil a partir da década de 1920, sendo a marchinha um clássico eternizado em todos os carnavais. Interpretada por Carmem Miranda, foi das primeiras músicas brasileiras a fazer sucesso dos Estados Unidos. Jaraguá, bairro portuário, tem suas noites ligadas à boemia dos marinheiros e poetas, das boates e bares animados que permaneceram até meados do século passado. No início dos anos 1970, as luzes da boate Tabariz, a mais famosa delas, se apagaram para dar lugar à recém-criada Areia Branca, local para onde se mudou seu proprietário Benedito Mossoró, levando com ele a alegria dos noctívagos para o novo bairro, na parte alta da cidade. Anos após a morte do empresário, a filha, Rosa Mossoró, reinventa a cena alternativa de Jaraguá com bares que entram para a história da boemia do bairro, atraindo intelectuais, boêmios e a comunidade LGBT. Atualmente, o bar La Rosa se transformou num espaço cultural voltado também para exposições de arte, debates e pockets shows de músicos alternativos que apostam nos ritmos de vanguarda.

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Emmanuel Fortes, Salete Toledo e Alfredo Gazzaneo

Design: Agélio Novaes

O Coletivo AfroCaeté, que começou em 2010, e o Afoxé Povo de Exu são bons exemplos do ressurgimento da cultura musical de raiz africana, entoada em Jaraguá e amplificada para toda Maceió. Seus componentes, na maioria jovens músicos, desenvolvem pesquisa de associação de ritmos negros e indígenas que expressem a tradição alagoana nessa área musical ainda pouco estudada. Além dos animados ensaios e apresentações, os grupos promovem oficinas de dança durante o correr do ano e no Carnaval sacodem o bairro com muito ritmo de calor histórico

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e identitário. A manutenção da musicalidade teve um reforço de peso com a instalação do Centro de Convenções, que abriu as portas aos grandes shows e bailes, a exemplo do da Seresta da Pitanguinha, que acontece todos os anos nas prévias carnavalescas. O Jaraguá Folia intensifica a vocação do bairro, levando para suas ruas Os Filhinhos da Mamãe, A Mulher da Capa Preta, Maracatu Baque Alagoano, Prazer de Viver, Urukubaka e tantos outros que desfilam tradicionalmente na semana que antecede o Carnaval.

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A orla, da Pajuçara à Ponta Verde, é a passarela do Pinto da Madrugada, bloco criado em 2000 que garante a apoteose solar de forma bem democrática, com o frevo arrastando uma multidão que aumenta a cada ano. As Pecinhas de Maceió é outro bloco tradicional com mais de três décadas de desfile, que leva para as ruas ou para os clubes seus foliões travestidos de mulheres, cumprindo os preceitos carnavalescos do deboche e do disfarce. A força das prévias já se tornou uma característica de Maceió, que tem nos dias de

Carnaval tímidas brincadeiras de rua, sendo o desfile das escolas de samba e a peleja dos bois as atrações principais. Alguns clubes levam a música para dentro dos salões, mas existe uma tradição entre muitos foliões de se deslocarem para Recife ou Salvador, onde o frevo de um lado e o axé do outro mantêm os maiores carnavais do Nordeste. Outra tradição musical presente na cidade é o canto coral, a princípio com grupos voltados apenas para o canto religioso, mas que aos poucos foram se libertando e aderindo ao repertório profano.

Bloco carnavalesco Pinto da Madrugada

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Coretfal canta Baião de Dois

Em 1975 a maestrina Maria Augusta Monteiro Menezes cria o Coretfal (Coral da Escola Técnica Federal de Alagoas), que permanece em plena atividade, com vários prêmios e montagens primorosas. Atualmente sob a regência de Maria de Fátima, filha da veterana Maria Augusta, o Coretfal se aperfeiçoa a cada espetáculo. Um bom exemplo da vivacidade e do profissionalismo do grupo são os espetáculos Retrato Cantado do São Francisco (2008) e Baião de Dois (2013), ambos sob a direção de René Guerra. O Embracanto, com Yvan e Vírginia Barsand, entra em cena com apresentações teatralizadas e a promoção de eventos, reunindo corais de várias nacionalidades. O grupo foi fundamental para a criação da Associação Artística e Cultural das Alagoas, cujo objetivo é congregar os diversos grupos de canto coral do estado.

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O maestro Benedito Fonseca é outra figura de destaque na regência do Coral da Ufal e de vários outros em Maceió e no interior. Ainda na década de 1970, Braúlio Leite cria a Orquestra Filarmônica do Teatro Deodoro seguida, dois anos depois, pela Orquestra de Câmara da Ufal. No início da década seguinte, outro grupo se organiza na Ufal sob a condução do músico Josélio Rocha. Trata-se da Orquestra Contemporânea de Alagoas, que nasce com a proposta de inclusão no repertório de compositores modernos, abrindo espaço para a música local. A Orquestra Sinfônica da Ufal, criada décadas atrás, retoma sua formação. Como a manutenção desses grupos demanda um custo considerado alto pela gestão pública, muitos deles sofrem processos de descontinuidade, comprometendo a formação de plateias e a manutenção da identidade musical e instrumental.

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Eliana Cavalcanti

Maria Emília Clark Foto: Jul Sousa

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A dança como representação do contexto social também pode ser observada por meio de diferentes deslocamentos que perpassam opostos como a figura do passista lendário Moleque Namorador, até o surgimento dos grupos clássicos e companhias de dança contemporânea. Figura emblemática durante os festejos carnavalescos dos anos 30 e 40 do século passado, o passista, de gingado inigualável e passos seguros, arregimentou fãs de diferentes classes sociais ao se deslocar entre fronteiras bem definidas que separavam a periferia dos bairros nobres da capital. Sambou da Levada ao Centro. No outro extremo, na década de 1970, é criado o Balé Eliana Cavalcanti, responsável pela formação de grande parte das bailarinas clássicas de Alagoas, dentre elas Maria Emília Clark, que em 2000 inaugura a própria escola com o objetivo de mostrar que o exercício do balé clássico não se restringe à aprendizagem da dança em si, mas principalmente na construção da cidadania. Ainda no mesmo ano é criada a Companhia dos Pés, dirigida por Telma César, que chega com uma proposta conceitual contemporânea focada no que ela descreve como “interesse no desenvolvimento de processos investigativos para a produção de conhecimento em dança, sobretudo, na forma de espetáculos”. Telma César trabalha com referências específicas e uma ampla pesquisa dos movimentos corporais, incluindo influências de Rudolf Laban e o estudo aprofundado nas danças tradicionais e populares brasileiras . Outros gêneros fizeram sucessos nos festivais de música das rádios Difusora e Gazeta de Alagoas, nas décadas de 1960 e 1970, vindo em seguida os festivais universitários de música, promovidos pelo DCE da Ufal, com apresentações memoráveis no Teatro Deodoro. Dessa época tem-se o registro da presença do Grupo Terra e de vários jovens que vieram a marcar o cenário musical dos anos seguintes, como Paulo Renault, Beto Batera, Marcos Vaga-

Companhia dos Pés

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Foto: arquivo pessoal

Leureny Barbosa

Foto: arquivo pessoal

reza, Eliezer Setton, Ricardo Mota, Marcondes Costa, Juvenal Lopes, Macleim, Chico Elpídio, Edson Bezerra, Wilma Miranda, Leureny Barbosa, César Rodrigues. O atual Festival de Música da Ufal faz renascer o encontro de estudantes em torno da pesquisa instrumental e dos ritmos de vanguarda que tomam conta dos atuais repertórios. No correr dos tempos, muitos valores individuais – com destaque para Djavan, que, entrou para a história da MPB – foram pautando a história da música na cidade, compondo, cantando, tocando e permanecendo como refe-

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Wilma Miranda

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rência para as novas gerações, como Antônio Paurílio, Aída Wucherer, Liège Tozzi, Marcus Vinícius e tantos outros que se perpetuaram na memória ou que ainda enchem as noites maceioenses de muita música boa, como Zailton Sarmento, Félix Baigon, Everaldo Borges, Almir Medeiros, Bruno Palagani, Joatan Nascimento, Wilson Miranda, Chau do Pífano. Com o microfone na mão, soltando a voz nos palcos, temos ícones da música local – Leureny Barbosa e Wilma Miranda, seguidas pelos mais jovens que começaram a aparecer a partir de 1980 e compõem o elenco profissional dessas últimas décadas. Entre outros, Júnior Almeida, Nara Cordeiro, Cris Braun, Wil-

ma Araújo, Fernanda Guimarães, Elaine Kundera, Irina Costa, Millane Hora, a dupla Divina Supernova, Igbonam Rocha, que veio da Bahia, e Wado, de Florianópolis, e se estabeleceram como nativos. Djavan, um dos maceioenses que alcançaram notoriedade nacional, está sempre voltando, levando Maceió para dentro de suas músicas e acontecendo com muito brilho entre os cantores e compositores brasileiros dos fins do século passado. Seu talento permanece em evidência. Grupos musicais adeptos de ritmos diversos, que vão do chorinho ao rock, do forró ao blues, têm lugar garantido na cultura musical Foto: Mônica Guimarães

Fernanda Guimarães, Igbonam Rocha, Nara Cordeiro, Cris Braun, Júnior Almeida, Wilma Araújo, Irina Costa e Elaine Kundera

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Divina Supernova: Ana Galganni e Júnior Bocão

da cidade. Conversa Fiada, Confraria do Choro, Cobra Criada e Barba de Gato apresentam-se nos botequins tradicionais e em arrojados festivais como o Maceió Music Show e o Festival Maionese, ambos em várias edições, que atraem um público jovem de gosto apurado. A partir dos anos 90 a música passou por um processo de efervescência com o surgimento de bandas importantes para a consolidação da cena indie em Maceió. Nessa leva de gru-

pos que se destacaram dentro e fora do estado transitam a Living in the Shit, Avoid, 70th Blight, Mopho, Ball, Sonic Júnior, Xique Baratinho, Coisa Linda Sound System, Vitor Pirralho e Unidade. A sonoridade da 70th Blight (1991), cujo álbum First Steps Over Water (1995), literalmente colou no ouvido de muita gente, surpreendeu pelas referências - de Zé Ramalho, Police e Lou Reed a B52s -, arranjos bem cuidados e composições em inglês. 271

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Num tempo em que Recife, capital do mangue beat, mostrava a força dos independentes, Maceió jogava no ventilador a Living In The Shit (1992) que “alternava e fundia” hardcore, punk e reggae, com um pé na terra e a ponta dos dedos no mundo, o que resultou no trabalho “Chá Magiológico” (1995). O rock retrô da Mopho surge em 1997 e com o lançamento do CD homônimo (2000) ultrapassa os limites de Alagoas e do Brasil, firmando-se como uma das principais representantes da cena indie nacional.

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Xique Baratinho

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Os anos 2000 consolidam também a experimentação e a energia da “Sonic Júnior” (2001) também conhecida como a “banda de um homem só”, o Juninho. Wado e o Manifesto da Arte Periférica (2001), Cinema Auditivo (2002) e A Farsa do Samba Nublado (2004) consolidam um ciclo e abrem caminho para os novíssimos independentes, como a Troco em Bala. A cantora e compositora Cris Braun, que durante um tempo transitou entre o Rio Grande do Sul, Alagoas e Rio de Janeiro, “fincou” pé na areia de Maceió num momento de maturidade sonora, confirmada pelo lançamento de seu terceiro CD solo, o impecável Fábula (2012). Antes dele vieram Cuidado com pessoas como eu (1997) e Atemporal (2004). Cris foi vocalista dos Sex Beatles, responsável pelo “barulhinho” muito bom dos CDs incendiários Automobília (1994) e Mondo passionale (1995). Na definição do crítico musical Arthur Dapieve (O Globo) “Não que Cris soe como uma versão feminina de Renato Russo, nada disso. Onde ele era hot, ela é cool. Há em comum, no entanto, uma certa angústia, um certo desejo de tornar esse tal de roquenrol uma coisa menos pueril, menos efêmera”.

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O final dos anos 90 marcou também a o surgimento do coletivo Pragatecno. A proposta era criar um ambiente de debate e pesquisa da e-music e da cibercultura no norte-nordeste. O grupo capitaneado pelo jornalista Cláudio Manoel Duarte se expandiu para outras regiões – Belém do Pará, São Luiz, Fortaleza, João Pessoa e Salvador. Na era das redes sociais um nome estoura nas paradas do brega e da lambada pelo diferencial de sua ginga, de seu estilo performático. Trata-se de Gyvle Simons, que disparou na rede com os hits Melô do Jonas, Lambada para Bangladesh e o álbum “Lambada Quente”, e a “Banda Figueiroas”. Quem pensa que Gyvle é um principiante, engana-se. Ainda com seu nome de registro, Gabriel Passos, aos 11 anos, já era um fino conhecedor da música popular brasileira e colecionador de LPs. Nasceu vocacionado para a música.

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Gyvle Simons É importante ressaltar que os exemplos descritos nesse trabalho, embora não deem conta de mostrar a totalidade das manifestações artísticas e dos artífices responsáveis pela construção da cultura nestes 200 anos de Maceió, representam um extrato significativo para a compreensão dos caminhos delineados pela arte na capital alagoana. A soma de esforços verificados em diferentes áreas reitera ainda a inegável relevância do empenho de artistas que, ao longo de dois séculos, mesmo em tempos de falta de incentivo, levaram adiante o fazer artístico que define a cidade e seus costumes.

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BIBLIOGRAFIA Arte em Alagoas. Algumas reflexões. Ana Flávia Ferraz, Otávio Cabral (org.) Maceió: Edufal, 2013. Barros, Elinaldo. Panorama do cinema alagoano. Maceió: Sergasa, 1983. Campos, Célia. Uma visualidade: trajetória e crítica da pintura alagoana: 1892-1992. São Paulo: Escrituras Editora, 2000. Cavalcanti, Eliana. 50 anos de plié – Memórias de uma alabucana. Maceió: Ed. Catavento, 2008. Costa, Craveiro – Maceió: Ed. Catavento, 2001. Enciclopédia Municípios de Alagoas. Instituto Arnon de Melo, 3ª ed. Maceió: 2012. Marroquim, AD. Terra das Alagoas. Roma: Editori Maglione & Strini, 1922. O teatro e Linda Mascarenhas: amadores em Maceió. Ronaldo de Andrade e Izabel Brandão (org.) Maceió: Edufal, 2011. Revista Graciliano Ramos – Imprensa Oficial. Maceió: ano V, nº 16, setembro/outubro, 2012. Rubens, Carlos. Um mestre da pintura brasileira: Rosalvo Ribeiro. Rio de Janeiro: Gráfica Laemmert Limitada, 1940.

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PATROCÍNIO:

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