Caderno do Festival de Cinema de Vitória - Homenageado Nacional / Matheus Nachtergaele

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Matheus Nachtergaele

HOMENAGEADO

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Minist茅rio da Cultura, BNDES e Petrobras Apresentam

Matheus Nachtergaele

Homenageado Nacional Vit贸ria - ES, setembro de 2015



É impossível estar perto de Matheus Nachtergaele e não sentir sua paixão pelo ofício de ator. Seu processo criativo é abissal, mergulha profundamente na composição de seus personagens, tanto que, mesmo em papéis coadjuvantes, sua presença cresce e nunca passa despercebida. Como ele próprio admite, sua rede de amigos conta muitas pessoas de idade superior a sua, isso talvez explique sua capacidade de estabelecer diálogo entre as gerações passadas com o que há de mais contemporâneo. Pelas propostas estéticas contidas nos trabalhos protagonizados por Matheus, também é possível percebermos o seu modo crítico de compreender a nossa cultura. Intenso, perfeccionista e auto-crítico, tal empenho já lhe rendeu prêmios e o reconhecimento do público. Mas os louros não satisfazem o gênio criativo de Matheus, que busca sempre ir além, decantar processos, esmerar a interpretação. Tal dedicação está explicitada em sua trajetória artística, em especial no cinema, onde atuou com alguns dos mais significativos cineastas brasileiros das duas últimas décadas. Não contente em apenas atuar, Matheus foi para detrás das câmeras para roteirizar e dirigir o longa-metragem A Festa da Menina Morta. Com esse filme, amplamente premiado e elogiado pela crítica, além de conhecermos um pouco de suas percepções políticas e existenciais, pudemos assistir a uma obra resultante de uma pronfunda consciência e maturidade artística. Seja no teatro, na televisão ou no cinema, Matheus Nachtergaele é responsável incluir personagens densos e, ao mesmo tempo, populares no nosso imaginário e na história da dramaturgia nacional. Em nossa 22º edição, nos é motivo de honra poder prestar esta homenagem a um artista que sintetiza, como poucos, a diversidade, o vigor e a inventividade da arte brasileira. Lucia Caus Diretora do 22º Festival de Cinema de Vitória



Sumário Apresentação · 9 Uma infância entre o campo e a cidade · 15 Um ator nasce · 25 Um bicho de cinema · 33 Uma flor na TV · 45 Trabalhos e prêmios · 51 Depoimentos · 67 Legendas e créditos das imagens · 77



Apresentação

Aos 47 anos e com metade de sua vida dedicada ao ofício de ator, o paulistano Matheus Nachtergaele é reconhecido pelo público, pela crítica e pela classe artística como um dos mais representativos de sua geração. A intensidade também define seu ritmo de trabalho: atuando no teatro, no cinema e na televisão, em seu currículo constam mais de 60 produções. Sua trajetória conta muitos personagens intensos cujas vidas ficcionais explicitam, quase sempre, um mundo tragicômico. Por sua contribuição à arte e à cultura do Brasil, foi condecorado com a Ordem do Mérito Cultural do Ministério da Cultura em 2014. Matheus começou a vivenciar o ofício de ator no Centro de Pesquisas Teatrais de Antunes Filho. Em seguida, ingressou na Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo. Em 1991, participou da montagem do texto alemão Woyzeck, de Georg Büchner. Resultado de uma oficina para atores iniciantes, a montagem contou com a direção de Cibele Forjaz. Em 1992, passa a fazer parte do Teatro da Vertigem, companhia inovadora dirigida por Antônio Araújo. Nesse grupo, foi premiado como Melhor Ator pelo Troféu Mambembe, pelo Prêmio Shell e pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), por sua atuação como protagonista em O Livro de Jó. Encenado de forma itinerante em diversos hospitais a partir de 1995, o espetáculo teve grande repercussão de público e foi um marco em sua carreira. Em 1998, participou da montagem Da Gaivota, peça em que dividiu o palco com Fernanda Montenegro, Fernanda Torres, com direção de Daniela Thomas. Dois anos depois, foi dirigido por Paulo José em A Controvérsia. Em 2002, interpreta o protagonista de Woyzeck, O Brasileiro em uma nova montagem do texto, mais uma vez sob a direção de Cibele Forjaz. O reconhecimento nos palcos lhe rendeu o convite para atuar em O Que é Isso, Companheiro?, de Bruno Barreto, em 1997. Em 1998, participou de dois filmes de Walter Salles: Central do Brasil e Primeiro Dia, codirigido por Daniela Thomas, com o qual Matheus foi premiado como Melhor Ator pelo Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Dois anos depois, recebeu novamente contemplado essa

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premiação por O Auto da Compadecida, de Guel Arraes, onde interpretou um dos personagens mais importantes da sua carreira: o esperto João Grilo. No cinema, fez parte do elenco de cerca de 30 produções, entre elas Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles; Bufo & Spallazani (2001), adaptação do texto de Rubem Fonseca dirigida por Flávio R. Tambellini; A Concepção (2005), de José Eduardo Belmonte; Tapete Vermelho (2006), comédia de Luiz Alberto Pereira. O pernambucano Cláudio Assis foi um dos diretores com quem Matheus mais trabalhou até o momento. Participou de todos os longas-metragens do diretor: Amarelo Manga (2003), Baixio das Bestas (2007), Febre do Rato (2012) e Big Jato (2015). Em 2014, foi protagonista de Trinta, de Paulo Machline, cinebiografia sobre o carnavalesco Joãozinho Trinta. Um de seus últimos trabalhos para o cinema foi Quando Parei de me Preocupar com Canalhas, curta-metragem de Tiago Vieira, que lhe rendeu neste ano o prêmio de Melhor Ator no 43o Festival de Cinema de Gramado.

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Matheus Nachtergaele também assina a direção e o roteiro do longa-metragem A Festa da Menina Morta. Com exibição de estreia na seleção oficial do Festival de Cannes, na mostra Un Certain Regard, de 2008, o filme ganhou diversos prêmios em festivais nacionais e internacionais. Seu argumento foi inspirado em uma cerimônia religiosa presenciada por Nachtergaele, por meio da qual uma família celebrava o milagre do aparecimento do vestido de sua filha desaparecida. A sua ida para a televisão aconteceu de maneira paralela aos trabalhos no cinema. Em 1997, interpretou seu primeiro personagem na Rede Globo na série A Comédia da Vida Privada. No ano seguinte, interpreta o emblemático personagem Cintura Fina, na minissérie Hilda Furacão. A partir daí participou de mais de 20 produções para TV, atuando em séries, em programas especiais e em novelas como A Muralha (2000), Os Maias (2001), A Cor do Pecado (2004), América (2005), Amazônia, de Galvez a Chico Mendes (2007), Queridos Amigos (2008), Decamerão, a Comédia do Sexo (2009), Ó Pai, Ó (2009 a 2011), Saramandaia (2013) e Doce Mãe (2012 e 2014).


“Tenho uma tendência à boemia, mas a cidade grande me contraria, é um espaço massacrante e mais selvagem que a vida na mata”


a m u o h n eT “ , ai m eo b à ai cn ê d n et e d n ar g e d a d i c a s a m m u é , a i r ar t n o c e m et n ar c a s s a m o ç a p s e e u q m eg av l e s s i a m e ”atam an a di v a




Uma infância entre o campo e a cidade Nascido em 3 de janeiro de 1968, Matheus Nachtergaele é o filho único do casamento do engenheiro Jean Pierre Henri Leon Nachtergaele com a poetisa Maria Cecília Nachtergaele, falecida três meses após seu nascimento. Ainda na infância, o pai de Matheus casou-se com Carmem Júlia Nachtergaele, com quem teve mais três filhos: Beatriz, André e Marcos. Por conta da morte prematura de sua mãe, Matheus passou boa parte da infância em um sítio em Atibaia, município do interior paulista, sob os cuidados de seus avós paternos, André e Denise, belgas que migraram para o Brasil devido às consequências da Segunda Guerra Mundial. Foi no ambiente familiar e ainda na infância que Matheus estabeleceu seus primeiros contatos as artes. Seu pai também era músico, tocava banjo e, quando estudante, foi um dos fundadores da Traditional Jazz Band. Seu avô havia sido cantor de ópera na Bélgica e atuava como alfaiate, tapeceiro e macineiro. “Ele não foi cantor no Brasil, mas tinha essa coisa de ser um homem que foi do palco, chegou a me ensinar trechos de árias, como de Carmem, por exemplo. Dessa forma, meus avós foram transmissores de uma cultura europeia”. Durante a infância e parte da adolescência, Matheus teve a sua vida divida entre o cotidiano em uma família classe média paulistana e a vida bucólica e criativa no campo. “Tive essa coisa de ser uma cara criado em São Paulo, mas com um vínculo grande com o sítio dos meus avós. Isso deixou marcas fortes em mim, pois, se de uma certa maneira São Paulo me preparou para o mundo cosmopolita e abriu a minha cabeça para culturas diversas, por outro lado, eu tive essa honra de andar de pés descalços, de subir em árvore, de catar pitanga, de ter contato com bichos... Isso ficou marcado em mim e desemboca no meu trabalho. Fiquei muito vinculado a esse ambiente, após passar as férias com os meus avós e voltar para casa dos meus pais eu ficava sempre com uma certa nostalgia do sítio, achava uma pena ter morar na cidade grande”. A vida familiar, especialmente com seus avós, permitiu que Matheus estivesse em contato mais direto com o ambiente natural e, ao mesmo tempo, experimentasse uma vivência lúdica e afetuosa

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com a arte. No terreno de seu avô havia praticamente uma pequena comunidade formada por famílias paulistanas que alugavam casas por longos períodos para passarem finais de semana, férias ou feriados. Foram nas festas dessa pequena vila em Atibaia que Matheus brincou pela primeira vez de fazer teatro: “o meu avô criava um palco, minha vó era costureira fazia o figurino e a cenografia. Eu mobilizava os primos e as crianças das outras casas para participarem das apresentações. Mas nunca me ocorreu ser ator, aquilo estava ligado ao convívio e às celebrações do sitio. Contam histórias que, desde pequeno, me colocavam em cima de mesa para falar coisas, recitar textos que eu tinha aprendido na escola. Dizem que eu falava um Castro Alves bem bonitinho quando era criança”.

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O ambiente escolar também foi um lugar que estimulou o espírito livre e inventivo do pequeno Matheus. Até os dez anos, juntamente com a irmã Beatriz, foi aluno da Escola Waldorf Rudolf Steiner, em São Paulo. “É uma instituição que tem uma metodologia diferente das escolas tradicionais, onde se respeita bastante o desenvolvimento individual de cada criança. Até um certo momento da formação, não há obrigações curriculares e busca-se sempre estimular a autonomia e a criatividade da criança. Há aulas de português, matemática, inglês, mas também de mitologia, de tricô, de como fazer pão. Somente a partir de um certo momento é que se entra no currículo normal pra que se preparar para o vestibular. É uma proposta de edução que tem a antroposofia como base filosófica e acredita que cada criança tem um tipo de desenvolvimento, como, por exemplo, de que há um tempo de alfabetização diferente para cada um. Eu fui bem precoce na alfabetização, mas tive amigos aprenderam a escrever aos dez anos e estava tudo certo, pois era o tempo daquela criança”. A vida no sítio com os avós também despertou em Matheus o interesse pelos animais. Tanto que ele chegava, às vezes, a dedicar mais tempo para os animais do que para a companhia dos irmãos. Hoje ele possui 12 cachorros, divididos entre suas residências na cidade do Rio de Janeiro e na cidade histórica de Tiradentes, no interior de Minas Gerais. Tal inclinação foi tanta que ele tentou seu primeiro vestibular para o curso de biologia, mas acaba não passando. Nessa época, ele ainda era menor de idade, mas já havia


sido emancipado pelos pais. “Como não acredito em destino, pelo menos não em termos místicos, hoje acho bom não ter passado naquele vestibular, mas era um caminho que pensava em trilhar. Seria feliz estudando biologia. Também pensei em fazer zootecnia, e esse é um assunto que continua me interessando, estou sempre lendo livros de etologia, que é a ciência do comportamento animal. Entender os animais é uma pista para o ser humano também se entender. De uma certa maneira, sou bem atento a isso e consigo perceber aquilo que é estritamente humano e do que vem de uma linhagem muito maior que a dos primatas, mas da bicharada toda! Essa percepção me interessa e aparece no meu trabalho, como certos traços de selvageria que todos nós temos, que o ser humano tem, e que, na verdade são impulsos naturais herdados dessa ancestralidade animal nossa”. Atualmente, Matheus divide seu tempo entre os trabalhos para cinema, TV e Teatro, e sua vida e uma vida reservada, seja em sua casa no bairro Botafogo, em uma área verde do Rio de Janeiro, ou na chacária que possui desde 2004 em Tiradentes. Ele assume que possui uma relação não muito harmônica com o espaço urbano e, por isso, tem vivido uma rotina mais caseira. “Em um certo momento, desbundei para a cidade e vivi intensamente a boemia. Usei a cidade e a cidade me usou, principalmente em São Paulo, mas também no Rio de Janeiro, assim que mudei pra cá. Mas há uma certa “caipirice” que me puxa de volta pra a vida mais doméstica e minha casa é feita pra isso. Na minha casa é onde estão, com diz a música, ‘os livros, os bichos, os discos e alguns amigos’. Tenho uma tendência à boemia, mas a cidade grande me contraria, é um espaço massacrante e mais selvagem que a vida na mata. Toda essa quantidade de humanos em um mesmo lugar é desumana, o tamanho das cidades não é possível para o humanismo que eu pretendo e almejo. Na cidade grande as relações ficam desalmadas, as pessoas passam a ser boiada, e , naturalmente, acontecem problemas. Nenhuma animal tem a capacidade de viver tão aglomerado assim, por melhor índole que tenha. Não é possível viver assim sem se agredir, sem se ferir, sem criar desigualdades muito brutais entre as pessoas. Não sinto que moro na cidade do Rio de Janeiro. Moro nesta casa, neste cantinho ao pé da montanha. A cidade não

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é um lugar no qual me aventure demais, pois, geralmente, me sinto inseguro. Gosto de samba de roda, esse ritual boêmio musical brasileiro, isso é algo que me chama, essa maneira samba de ser, essa virtude que sobra do morro e se espalha pela cidade. Há algo de indomável nos cariocas que eu admiro muito, que os baianos também têm, são um povo que se nega a obedecer certas normas, acho isso bom! Mas a cidade em si já não me seduz. Não me imagino voltar a viver em São Paulo, por exemplo, acho ecológico não morar lá, mas há quem ame essa concentração”.

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Desde muito cedo, Matheus gostava de desenhar. Aos oito anos já queria trabalhar como desenhista e chegou a ir até o cartunista Mauricio de Sousa para apresentar suas criações. Na ocasião, o pai da Turma da Mônica elogiou a desenvoltura do pequeno desenhista, mas alegou que só poderia contratá-lo quando adquirisse mais idade. Diante da negativa, Matheus voltou para casa chorando, mas, pela adolescência e até a juventude, continuou a buscar nas artes visuais e plásticas o caminho para sua realização pessoal. Aos 15 anos, seus pais lhe presentearam com um curso de animação no Museu da Imagem e do Som de São Paulo que foi conduzido pelo dramaturgo e animador Ségio Tastaldi. “Para a minha família, o curso era um pouco caro, por isso foi um presentão. De alguma forma, eu começava a me envolver com a imagem quadro a quadro, que é o cinema. Eu fiz o meu curtinha com o Tastaldi e lembro de ter ficado todo pimpão na escola por isso!”. Dos 17 para os 18 anos, Matheus faz o seu segundo vestibular e ingressa no curso de Artes Plásticas da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), graduação que abandona no terceiro ano para atuar no Centro de Pesquisas Teatrais de Antunes Filho. “Comecei a estudar arte e conviver no meio das artes plásticas e, logo ali me interessei pela performance e pelo cinema. Acho muito bom ter feito artes plásticas, foi um prólogo bonito pra mim, tive a chance de estudar sobre história e teoria da arte, além de conhecer mais sobre o desenho, a escultura e a fotografia, que me fez ter ainda mais interesse pelo cinema. Naquela época, também comecei a ir bastante ao teatro e assistir à performances”.


A decisão de abandonar a graduação em artes plásticas para tornar-se ator não agrado muito a sua família que lhe cortou a mesada. Para se sustentar, dava aulas de desenho em escolas e fazia trabalhos como animador de festas infantis. Mas sua primeira tentativa de ingressar no teatro acaba não sendo muito bem sucedida. Conhecido pelo rigorosa condução de seus atores e por ser um dramaturgo exigente, Antunes Filho retira Matheus do elenco da peça “Paraíso Zona Norte”, para o qual estava ensaiando por quase dez meses. “O Antunes falou que eu não estava pronto para estrear. Aquilo me bateu fundo e pensei que talvez nunca fosse estar pronto. Fiquei deprimido, resolvi ir passar um tempo na Europa, me ocorreu que talvez pudesse fazer o preparatório para o Conservatório de Arte Dramática de Paris. Eu tinha 21 anos, tinha boa fluência em francês, devido ao convívio com meus avós belgas, e queria ter poderia ter uma formação bonita Europa. Fui pra lá, comecei a fazer um preparatório para prova do Conservatório. Em Bruxelas, um músico que tocava música brasileira em bares me convidou para acompanhá-lo. Quando dei por mim, estava cantando na noite, em Bruxelas e em Paris, fiz isso por cerca de seis meses. Era uma situação engraçada, cantar em restaurante, enquanto as pessoas conversam e comem, e tudo era Brasil outra vez, pois eu estava ali cantando músicas de meu pais numa nostalgia danada (risos)! Foi dando uma vontade de voltar! A data de fazer o teste para Conservatório foi se aproximando, aí desisti de fazer a seleção, pois não queria permanecer na Europa por mais quatro anos”.

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“O que sobrou para o teatro é pouco perto do cinema e das elaborações eletrônicas, mas o que sobrou é muito lindo!”


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Um ator nasce De volta ao Brasil, Matheus Nachtergaele fez o seu terceiro vestibular, dessa vez para a Escola de Arte Dramática da Universidade (EAD) de São Paulo. Em 1990, antes mesmo de iniciar o curso, já havia atuado na peça amadoras O Jardim dos Cogumelos e Delírio, com direção de Antônio Ravan, estreou como o personagem Andres na montagem de Woyzeck, texto do dramaturgo alemão Georg Büchner, em uma oficina para atores iniciantes dirigida por Cibele Forjaz. Esse espetáculo ficou em cartaz no estacionamento do Elétrico Cineclube, na Rua Augusta, no Centro de São Paulo. A proposta de fazer teatro em um espaço não convencional e bem como alguns integrantes da peça iriam, mais tarde, estar presentes também no Teatro da Vertigem: conduzido por Antônio Araújo e considerado um dos mais importantes grupos de teatro brasileiro dos anos de 1990. Matheus ingressou na EAD e, paralelamente, também se envolveu intensamente com o processo de criação do Teatro da Vertigem. Em 1993, sob a direção de Antônio Araújo, interpretou Satanás em O Paraíso Perdido, obra de Sérgio de Carvalho baseada no poema de John Milton, e aconteceu na Igreja de Santa Ifigênia, em São Paulo. A realização da peça não foi fácil, pois setores mais conservadores da igreja não exergavam com bons olhos a utilização do templo religioso para o teatro. A apresentação foi comovente e inaugurou a triologia bíblica do Teatro da Vertigem, resultado da pesquisa de Antônio Araújo sobre a mitologia bíblica católica, que também contou com O Livro de Jó (1995), de Luís Alberto de Abreu, e Apocalipse 1,11 (2000), de Fernando Bonassi. O Paraíso Perdido buscava entender o que é um anjo caído e a ideia de um homem que é homem a partir do rompimento com Deus”, explica Matheus. Em 1995, interpretando o herói sábio e protagonista de O Livro de Jó, Matheus se consagra como ator de teatro e é premiado como Melhor Ator pelo Troféu Mambembe, pelo Prêmio Shell e pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). Novamente sob a direção de Antônio Araújo, o espetáculo percorreu o Brasil e outros países, como Rússia, Colômbia e Dinamarca, foi apresentado por

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cerca de cinco anos sempre em hospitais ou enfermarias. “Foi uma loucura, porque não tinha a dimensão, e acho que não tenho até hoje, do tamanho e da força do mito tá contido no Jó. Considerado muito desafiador, esse texto poético ficou fora do compêndio bíblico por muito tempo, pois, pela primeira vez, o Deus judaico mostra sua face negra negativa. Deus passa a ser o bem e o mal, um Deus amoral - o que é é bem interessante para o mundo moderno. É Jó que reconhece essa face em Deus: um deus que é tudo, é o absoluto; que é o bem, mas também é violência; que é alegria e criatividade, mas também é destruição”.

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O Livro de Jó foi apresentado em momento onde a epidemia de Aids causava, além das mortes, a estigmatização e culpabilização das pessoas soropositivas justificadas por um discurso moralizador. “Estávamos perdendo amigos, não havia o alívio que os remédios possibilitam hoje. A Aids era uma peste assim como a de Jó. Falavam que as pessoas tinham feito por merecer a Aids. A peça questionava essa ideia de justiça, pois o Jó era legal, era o melhor de acordo com as normas de uma humanidade, era generoso e culto, e, por isso, ele recebia só bens. Até que um dia Deus e o Diabo fazem uma aposta perversa para provar a fé desse herói que, em seguida, perde a família, perde todos os bens todos e adquire uma peste sem cura que vai levá-lo à morte. Apesar de tudo, Jó continua fiela e quer apenas falar com Deus, mas Deus só pergunta e nunca responde”. O Livro de Jó foi uma peça marcante na história da dramaturgia brasileira e responsável por lançar Matheus Nachtergale como ator para o mundo: “foi quando me tornei um ator, de uma certa forma. Foi ali que saí um pouco da minha fase de formação, que tem a ver com o Antunes Filho e com a EAD e uns poucos trabalhos antes disso, para fazer parte de espetáculo de muita potência artística e de grande importância cultural para o Brasil e para o teatro do mundo. O Livro de Jó foi uma peça muito respeitada, então amadureci muito rápido ali. Talvez tenha sido um pouco precoce, eu tinha 27 anos e achei um pouco cedo fazer um personagem tão grande assim. É óbvio que sofri as consequências disso depois. Esse período de formação poderia ter sido um pouco mais leve”. O sucesso de O Livro de Jó rende lhe rende o convite para atuar


no cinema. Sua estreia foi em O Que É Isso, Companheiro? (1997), de Bruno Barreto, emendando outros quatro longas-metragens até o ano seguinte. A aproximação com Fernando Torres no set de O Que É Isso, Companheiro? se desdobra em Da Gaivota, livre adaptação da obra do dramaturgo russo Anton Pavlovitch, com direção de Daniela Thomas e realizada em 1998. Além de Fernanda Torres, também fizeram parte do elenco dessa montagem Fernanda Montenegro, Antônio Abujamra, Celso Frateschi e Nelson Dantas. Em 2000, volta novamente aos palcos sob a direção de Paulo José no espetáculo A Controvérsia. Nessa peça, uma adaptação do texto dramaturgo francês Jean-Claude Carrière, Matheus interpreta o missionário Bartolomeu de Las Casas. A partir daí, Matheus irá se dedicar mais intensamente ao cinema e a às séries televisivas na TV Globo. Em 2002, retorna aos palcos, mais uma vez sob a direção de Cibele Forjaz, para viver o protagonista do espetáculo Woyzeck, O Brasileiro, uma nova adaptação dessa importante obra da dramaturgia mundial feita por Fernando Bonassi. Além de atuar, Matheus assinou a produção da peça junto com Miriam Juvino, sua atual produtora. Também fizeram parte do elenco Marcélia Cartaxo, Leandro Firmino da Hora, Michel Melamed, Rui Polanah, Fabiano Costa e os atores do Grupo Piolim, da Paraíba - Soia Lira, Nanego Lira, Servílio de Holanda e Everaldo Pontes. A trilha sonora do espetáculo foi feita pelo cantor e compositor pernambucano Otto. Para Matheus, o texto do dramaturgo alemão expressa algumas de suas inquietações político-existenciais. “Woyzeck tem essa coisa bonita de não precisar ter uma idade para poder interpretá-lo. A peça é um prenuncio do que aconteceria no mundo industrial. É uma tragédia moderna, pela primeira vez o destino de um personagem no teatro não é ditado pelo deuses, mas pela classe social e econômica a qual ele pertence. O protagonista não consegue escapar dessa sina. Woyzeck é o meu Hamlet, foi onde fiz a pergunta ‘o que é ser?’. É uma peça que precisa ser refeita sempre”. Mais recentemente, Matheus voltou ao teatro, dessa vez como diretor do Grupo Teatro Entre & Vista, companhia amadora sediada em Tiradentes com a qual realizou a montagem O País do Dese-

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jo e do Coração, de William Butler Yeats. “Não é uma coisa que acontece no grandes centros, mas em festivais menores e também Tiradentes. A direção do grupo é um presente para mim e, para eles, a experiência é um super exercício de formação”. O seu mais recente projeto para o teatro é Conscerto do Desejo, cujo texto é uma adaptação de poesias de sua mãe, Maria Cecília Nachtergaele. Nesse trabalho, Matheus interpreta os textos apenas com o acompanhamento de um violonista e propõe uma experiência teatral mais intimista. “Isso faz parte de um outro movimento com o teatro orientado por uma crença de se retomar a uma certa simplicidade: apenas o ator e o texto expostos no palco. O que sobrou para o teatro é pouco perto do cinema e das elaborações eletrônicas, mas o que sobrou é muito lindo! Gosta dessa coisa mais artesanal do teatro. Por isso, a minha proposta de teatro acontece em um ambiente com pouco interferência tecnológica e muita interferência da poesia humana. Uma coisa simples é para onde estou andando. Não me interesso mais pelo teatro oficial, tenho achado o bom teatro oficial sempre quase bom, tudo muito bem feito, muito bem acabado, mas lhe falta algo. Busco fazer aquilo que sinto falta no teatro: uma certa crueza de estar puramente junto com o público. Por agora, não quero fazer o teatro convencional e comercial, pois custa caro, e eu quero fazer pequeno, pequenininho mesmo. Um teatro que também admiro é esse dos grupos, os muito sinceros ou os rituais grandes, como os do Zé Celso, o teatro de gabinete desprezo um pouco, infelizmente. O teatro devia voltar a ser o lugar para se pensar muito livremente o ser humano”.


“Mesmo sem saber, eu estava formado e preparado para atuar para uma câmera. Me tornei um bicho de cinema que veio do teatro experimentalâ€?


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Um bicho de cinema Em 1997, a atriz Fernanda Torres foi a uma das apresentações do espetáculo O Livro de Jó. A interpretação de Matheus Nachtergaele lhe chamou a atenção e ela o indica para o diretor Bruno Barreto que, na época, estava montando o elenco para o filme O Que É Isso, Companheiro?. “O Bruno me chamou pra uma conversa e, de imediato, foi decidido que eu interpretaria o Jonas, depois ele foi ver Jó. Foi um susto! Eu pensei ‘nossa, vou fazer um filme e não tinha me programado’!”. Matheus não teve muita dificuldade em atuar para as câmeras. Sua experiência com o Teatro da Vertigem já o havia, de alguma forma, preparado para o set de filmagem. “A gente não trabalhava em palco italiano. Minha interpretação possuía uma dilatação épica, no caso de O Livro de Jó, mas também exigia uma proximidade com o público; havia pessoas a um ou a dois metros e outras mais distantes. Para a lente do cinema, um ator com essa noção de espacialidade era interessante e possível. Por isso, mesmo em saber, eu estava formado e preparado para atuar para uma câmera. Rapidamente entendi que o tamanho da lente diz um pouco sobre a distância do espectador e que essa medida interfere em sua atuação, em sua dilatação ou contenção; essas são características do cinema que não são fáceis de entender de imediato para quem vem do teatro. Talvez, se tivesse trilhado uma formação mais clássica no teatro, minha ida para o cinema tivesse demorado um pouco mais”. A acolhida por um elenco já consagrado em O Que é Isso, Companheiro? lhe foi bem positiva. “Havia ali muita alegria de se fazer cinema, uma troca intensa entre o elenco e a equipe de produção e o tema do filme era considerado importante por todos nós. Pra mim, tinha esse extra de estar estreando ao lado de pessoas experientes e de estar sendo apresentado a um novo meio artístico, o que me dava, ao mesmo tempo, um misto de honra e paúra. Foi muito agradável fazer o filme. Fiquei amigo de muitos deles, como a Nanda (Fernanda Torres) e a Fernandona (Fernanda Montenegro), com a quais fiz outros trabalhos no teatro, no cinema e na televisão; e o Alan Arkin, que me deu muitos toques durante as filmagens”.

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O Que é Isso, Companheiro? foi indicado ao Óscar como Melhor Filme Estrangeiro em 1998, mas antes mesmo de sua estreia nos cinemas, Matheus já estava interpretando seu segundo personagem em outro longa-metragem: o revoltoso gaúcho Manoel em Anahy de Las Misiones, de Sérgio Silva. A partir daí, ele não parou mais de fazer filmes: em quase 20 anos de carreira na telona, ele atuou em cerca de 30 filmes – uma média de quase dois filmes por ano. “Me tornei um bicho de cinema que veio do teatro experimental. Entrei pra essa retomada do cinema, termo que renego, pois sempre fizemos um bom cinema, bom mesmo, até nas épocas mais difíceis. Artisticamente, estamos vivendo em um deserto, apesar do sucesso que a produção brasileira vem ganhando. Há um medo não só no cinema, mas no teatro brasileiro. Há um retrocesso, uma coisa esquisita, uma perdição, mas acho que isso é um fenômeno mundial, tá difícil achar a veia agora”.

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Em 1998, fez parte do elenco de dois filmes lançados pelo diretor Walter Salles: Central do Brasil, produção amplamente premiada, protagonizada pela atriz Fernanda Montenegro e indicada ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro no ano seguinte; e Primeiro Dia, codirigido por Daniela Thomas, com o qual Matheus foi aclamado como Melhor Ator pelo Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. “Mesmo sendo um bastardinho da produção do Waltinho (Walter Salles), comparado com o Central do Brasil que era muito poderoso, O Primeiro Dia é um filme lindo e precede algumas temáticas do chamado cinema de retomada, inclusive do Cidade de Deus”. Nesse mesmo ano, interpreta o personagem Pedro na ficção Kenoma, primeiro longa-metragem de Eliane Caffé. Segundo o próprio ator, os personagens desses primeiros trabalhos do cinema serviram como uma preparação para interpretações futuras: tenho um carinho especial pelo Chiquinho de O Primeiro Dia por ele ter sido o meu primeiro personagem do morro, um malandro ingênuo. Às vezes, olho para ele e percebo que forcei um sotaque aqui e ali, mas era um trabalho bonito. Foi graças a ele que, quatro anos depois, consegui fazer o Cenoura, personagem do Cidade de Deus. Da mesma forma, o Pedro do Kenoma foi um ensaio para o João Grilo de O Auto da Compadecida. É algo semelhante ao que acontece com as artes plásticas: alguns personagens acabam sendo, sem ter-


mos consciência disso, ensaios para outros personagens. São como temáticas que comparecem nas pinturas de um artista plástico”. Em 2000, Matheus arrebata público, crítica e prêmios como o esperto João Grilo de O Auto da Compadecida, obra roteirizada por Adriana Falcão a partir da peça de teatro Auto da Compadecida, do dramaturgo e escritor pernambucano Ariano Suassuna. Com a direção de Guel Arraes, essa produção foi criada e exibida originalmente como minissérie pela Rede Globo cerca de um ano antes de ser adaptada para o cinema. Dez anos depois, Matheus foi dirigido por Guel Arraes novamente no cinema em O Bem Amado, filme feito a partir da adaptação da telenovela homônima escrita por Dias Gomes em 1973. “O Auto... nos jogou, eu e o Selton, para sempre para dentro do coração do público do Brasil. As pessoas amam o Grilo e o Chicó. Tudo mudou depois do sucesso do filme”. Por sua interpretação nesse longa-metragem, Matheus recebe sua segunda premiação em cinema como Melhor Ator pelo Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. No entanto, ele confessa preferir a versão televisiva: “Guel reuniu um elenco tão bonito e dirigiu tão bem. A adaptação dele é tão respeitosa, tudo o que não é originalmente do Auto... é de outra peça do Suassuna. Gosto mais da série, acho-a mais bonita e até mais completa. Cada capítulo é uma joia, mas a verdade é que o filme fez sucesso, as pessoas continuam assistindo e as crianças que nem eram nascidas assistem”. Cerca de cinco anos depois, ele interpretou o Quinzinho, protagonista de Tapete Vermelho, de Luiz Alberto Pereira. Questionado sobre a semelhança entre esses personagens bem populares da comédia, Matheus responde: “Apesar do parentesco, são coisas diferentes. O Quinzinho é uma atualização do Jeca Tatu e tem a ver com essa indolência macunaímica. Tem algo de indígena nisso, um se negar ao trabalho forçado de um jeito muito gracioso que resulta em preguiça, mas que é inteligência. Já o João Grilo possui uma ascendência, enquanto tipo de personagem, altamente europeia que faz uso da esperteza para sobreviver ao poder. O Quinzinho é um pouco esse permanecer na ignorância”. Por sua atuação em Tapete Vermelho, Matheus é indicado como Melhor Ator pelo 3º Prêmio Fiesp/Sesi-SP do Cinema Paulista em 2007, premiação que ele acaba ganhando, porém por um outro trabalho

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seu: como o personagem X do longa-metragem A Concepção, de José Eduardo Belmonte. Sob a direção do pernambucano Lírio Ferreira foi o personagem Salustiano em Árido Movie, filme lançado em 2006 e, mais recentemente, interpretou Gaetan em Sangue Azul. Com o diretor Heitor Dhalia, outro pernambucano, atuou em Nina (2004) e como o Coronel Carvalho em Serra Pelada, produção lançada nos cinema em 2013, que no ano seguinteé exibida no formato de série pela Rede Globo. Em 2012, Matheus vive o sertanejo Olegário, o único personagem de Na Quebrada das Águas Perdidas, dos diretores Wagner Miranda e Marcos Carvalho, ficção que foi inspirada em música homônima de Elomar Figueira Mello, compositor que assina a trilha sonora do filme junto com Geraldo Azevedo e o grupo Matingueiros.

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Matheus também fez trabalhos com diretores estrangeiros. Em 2005, viveu o personagem Nazda em 12 Horas até o Amanhecer, longa-metragem do diretor americano Eric Eason filmado no Brasil e que também contou com os atores brasileiros Milhem Cortaz e Alice Braga em seu elenco. Em 2008, sob a direção do venezuelano Ignácio Castillo Cottin interpretou o Professor João na fantasiosa comédia La Virgen Negra. Recentemente, atuou para o filme Zama, da diretora Argentina Lucrecia Martel. Em 2015, Nachtergaele recebeu sua última premiação com um trabalho no cinema: ele levou o prêmio de Melhor Ator do 43ºFestival Nacional de Gramado por sua atuação no curta-metragem Quando Parei de Me Preocupar com Canalhas, de Tiago Vieira. Matheus atuou em todos os longas-metragens de ficção do pernambucano Cláudio Assis, sendo ele o diretor com quem mais fez trabalhos para o cinema. “A gente interfere muito na obra um do outro, ele é meu amigo e, pra mim, ele é o cineasta mais consequente que o Brasil tem hoje em atividade. Ele consegue levar para o cinema a sua percepção de mundo, além de ser um aquecedor de artistas: aquece o Hilton (Lacerda), o fotógrafo, a arte e os atores. Não é um diretor nos moldes mais comuns. Ele joga uma querosene, faz o fogo propagar e, dependendo da maneira que isso queimar, um filme acontece. Ele se arrisca, além de ser um homem muito simples e bom. Acho ele do caralho, além de ser um gato!”.


O início dessa parceria foi em Amarelo Manga, produção de 2003 onde Matheus fez o personagem Dunga, atuação que lhe rendeu a indicação para Melhor Ator pelo Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e a premiação, nessa mesma categoria, pelo 13º Cine Ceará – Festival Nacional de Cinema e Vídeo. “O Amarelo Manga recoloca a mitologia de nosso teatro e cinema, retoma as personagens da tradição teatral e cinematográfica brasileira com uma nova roupagem: a putas pudicas, o veadinho veludo, estão todos ali. Foi a estreia do Cláudio Assis em longas de ficção e o filme mostrou o quanto o Walter Carvalho era realmente um poeta da fotografia, contou com um elenco ótimo e toda aquela galera de Pernambuco. Foi um negócio potente, um naturalismo brasileiro com novas cores. É um dos filmes de que mais gosto”. Com Cláudio Assis, Matheus construiu uma relação muito cúmplice e singular para sua interpretação: “Ele é o único diretor para quem, por motivos que não sei explicar, parei de interpretar. Com o Cláudio me dou esse direito de enlouquecer totalmente e ele sabe que pode contar com isso. Em um certo momento, eu passei a não ter personagem. Isso começou no Baixio das Bestas, mas ali era um lado muito sombrio meu e o Cláudio queria isso. Eu quase não fiz esse filme, tive medo porque o personagem era muito violento, mas acho lindo o resultado. O Everardo é desgraçado, é o pior personagem que já fiz, o que tem mais defeitos, um cara sem virtude alguma, ele é a misoginia, o agroboy que usa sua cultura para o mal, para perverter os meninos e machucar mulheres”. Depois de Baixio das Bestas, filmado em 2006, Matheus interpretou o personagem Pazinho em A Febre do Rato, produção lançada em 2012. “Neste filme, não tenho mais personagem. Ali sou eu, doa a quem doer, ninguém observou isso com atenção, porque obviamente ficaram impressionados com o poeta interpretado pelo Irandhir Santos e com outras coisas. Considero como o meu melhor trabalho para o cinema, de uma verdade total! Foi muito difícil fazer aquilo. Afora um leve sotaque, ali sou eu na situação que for, casado com uma travesti, sou eu com minha idade, pensando como se fosse o Pazinho e olhando aquele poeta dizendo ‘eu não entendo’, mas, na verdade, tá entendendo tudo. É lindo aquilo”. No filme mais recente de Cláudio Assis, Big Jato, produção que faz sua

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estreia no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro deste ano, Matheus interpreta dois personagens gêmeos: Chico Pai e Nelson. “O filme é uma fábula com muitas crianças e adolescentes e tem um tom um pouco diferente das outras produções do Cláudio. É uma nova fase dele. Até por ser baseado no livro do Chico Sá, apresenta um humor distinto do do Cláudio e do Hilton Lacerda”.

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Em 2012, o diretor Paulo Machline lançou a cinebriografia Trinta, ficção protagonizada por Nachtergaele no papel de Joãzinho Trinta. Para compor o personagem, o ator chegou a fazer aulas de balé a fim de adquirir a postura altiva do carnavalesco. Questionado sobre a diferença entre interpretar personagens puramente ficcionais e personagens que existiram na vida, Matheus diz que são processos parecidos de criação: “No final das contas, o que tenho é um roteiro e uma dramaturgia sobre a qual me debruço, não importa para que tipo de personagem. A diferença é quase que ética: como vou me aproximar desse cara? Vou copiar os trejeitos dele ou não? Essas são escolhas que fazemos em grupo de acordo com cada trabalho. No Trinta, não queríamos essa imitação do personagem real. O filme é uma homenagem lírica que ressalta as virtudes, a obstinação, a capacidade intelectual que talvez fossem surpreendentes para uma pessoa tão simples. Apesar de todos os contras, o Joãozinho é o nordestino que vence pelo seu talento. Por isso, o filme é uma grande homenagem ao brasileiro batalhador”. Em 2008, Matheus sai da frente das lentes e vai para detrás das câmeras dirigir seu primeiro longa-metragem: A Festa da Menina Morta, cuja exibição de estreia foi na seleção oficial do Festival de Cannes, na mostra Un Certain Regard. Tendo o ator Daniel de Oliveira como protagonista, o filme recebeu diversos prêmios em festivais nacionais e internacionais, entre eles o de Melhor Diretor pelo Festival do Rio daquele ano. Com a parceria do cineasta pernambucano Hilton Lacerda no roteiro, o filme foi gravado em Barcelos, no Amazonas. Seu argumento foi inspirado em uma cerimônia religiosa presenciada por Nachtergaele, por meio da qual uma família celebrava o milagre do aparecimento do vestido de sua filha desaparecida. “É um filme sobre os lutos de um Brasil abandonado que está na Amazônia, sobre meus lutos familiares, sobre o luto de Deus e a persistência das religiões mesmo diante


da morte de Deus anunciada por Nietzsche. Isso tudo com um colorido tropical”, explica Matheus. Matheus conta que, em um primeiro momento, a experiência na direção acabou afetando sua entrega aos trabalhos de ator: “A princípio teve um impacto negativo. Fiquei muito crítico com muitos diretores que amo. Acho isso natural, pois havia passado por aquele lugar, mas depois isso normalizou e voltei à função de ator. O ator é um pouco a Blanche Duboi, depende da bondade alheia: ‘me esforço, faço, mas dependo de seu bom olhar’. O ator precisa confiar no diretor, pois é ele que diz para onde seguir. Tive uma experiência bonita com os meus atores, foi muito respeitosa a relação entre equipe e elenco. Foi um set, ao mesmo tempo, sério, muito artístico e leve. Agora estou em bom momento como ator, tenho visto meus trabalhos e tenho percebido essa entrega. Voltou a ser prazeroso e desafiador interpretar”.

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“É por isso que faço menos televisão, me entrego de verdade em cada cena e é quase impossível fazer assim no esquema industrial”


oç af e u q o s s i r o p É “ ,o ã s i v e l et s o n e m e d o g er t n e e m a d a c m e e d a dr ev es au q é e an ec r e z af l ev í s s o p m i ameuqse on mi s s a ”lai r ts u dni




Uma flor na TV Antes de ir para um set de um filme, Matheus Nachtergaele já havia interpretado para as câmeras de televisão. Entre 1992 e 1995, fez seus primeiros trabalhos para a telinha atuando em vinhetas roteirizadas por Caco Galhardo, veiculadas pela MTV. A quase totalidade de seus trabalhos para o meio televisivo foram na Rede Globo, com exceção desses primeiros e de uma recente série para o canal Space, produção ainda inédita em que interpreta o Zé do Caixão. Em 1997, ano em que estreia no cinema em O Que é Isso, Companheiro?, ele integrou o elenco de A Comédia da Vida Privada: como o personagem Andrew no episódio “Anchietanos”, sob a direção de Jorge Furtado; e como o motorista no episódio “A Voz do Coração”, sob a direção de João Falcão. De lá pá cá, participou de cerca de 20 produções. , Entre elas há quatro telenovelas e a maioria foram séries, minisséries ou programas dramatúrgicos especiais. Ator que mergulha profundamente em seus personagens, Matheus conta que tem dificuldade de conciliar trabalhos simultâneos na TV, no cinema e no teatro. “Fui fazendo menos teatro depois de começar a trabalhar no cinema e na televisão. Seja na TV, teatro ou cinema, gosto de estar muito inteiro em qualquer um deles. É por isso que faço menos televisão, me entrego de verdade em cada cena e é quase impossível fazer assim no esquema industrial. Fico muito exausto com trabalhos mais extensos, como as novelas. Depois, ainda assisto às cenas que gravo para estudar minha interpretação. Não consigo ser menos intenso”. Em 1998, fez parte do elenco da minissérie Hilda Furacão, escrita por Glória Perez e dirigida por Wolf Maia. A atriz Ana Paula Arósio protagonizou essa obra televisiva, cuja personagem é uma prostituta que vive um romance impossível com um frei católico, interpretado por Rodrigo Santoro. Apesar de secundários, os personagens de Nachtergaele – a travesti Cintura Fina, e Maria Tomba-Homem, interpretada pela atriz Rosi Campos, ganham destaque na trama. No ano seguinte, fazendo dupla com o ator Selton Melo, que interpretou o personagem Chicó, Matheus passa, definitivamente, a fazer parte do imaginário nacional ao dar vida ao esperto João Gri-

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lo na minissérie O Auto da Compadecida, sob a direção de Guel Arraes. “Foi uma ideia genial fazer comédia pra TV com um texto altamente político e, ao mesmo tempo, filmar em película para transformar esse material em algo mais eterno. O sucesso desse trabalho tem a ver com o eterno da alta comédia na qual o Ariano Suassuna se baseou, são mitologias muito antigas. A ascendência de Grilo e do Chicó está em Molière, no Lazarillo de Tormes e nos palhaços antigos. , faz parte de uma linhagem antiga de servos espertos da dramaturgia e da literatura mundial”. Por essa atuação, ganhou o Troféu APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte como Melhor Ator, sendo esse seu primeiro prêmio por um trabalho na televisão. No ano seguinte, o sucesso da obra seriada ganhou ainda mais força ao ser adaptada para o cinema.

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Em 2000, voltou à telinha na pele do Padre Miguel na minissérie A Muralha, escrita por Maria Adelaide Amaral, João Emanuel Carneiro e Vincent Villari. Escrita pelo mesmo trio de autores, a minissérie Os Maias foi exibida em 2001, sob a direção de Luiz Fernando Carvallho. Nesta ficção interpretou o personagem Teodorico Raposo. Em 2004, fez sua primeira telenovela como o Pai Helinho de A Cor do Pecado, obra de estreia de João Emanuel Carneiro como autor de folhetim. Matheus conta que tinha receio de atuar em novelas devido à duração desse tipo de ficção “Sou muito amigo do João Emanuel, por isso topei fazer. Tinha muito medo, não apenas pelo tamanho do trabalho, mas também porque tenho um lado preguiçoso. Apesar de trabalhar muito, sou um pouco vagabundinho (risos)! A novela é um trabalho exaustivo, é um trabalho ordinário. Como boêmio e artista, não gosto disso. É muita norma ficar cerca de dez meses passando na catraca. Há dias em que a gente não tem disposição para gravar e que é melhor não fazer nada mesmo, pois no outro a concentração vai estar melhor. Fazendo novela não há essa canja; tem que fazer. É um exercício de doma capitalista!”. Um ano depois, foi o peão Carreirinha em América, telenovela de Glória Perez dirigida por Marcos Schechtman. Mais uma vez ele estava interpretando um personagem popular e, inicialmente secundário, que ganhou destaque no desenrolar da trama, o que lhe rendeu o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante do Melhores do Ano do Domingão. “Amei fazer o Carreirinha, nunca trabalhei tanto e


fiquei esgotado! As pessoas o amavam loucamente. Ele era uma graça, uma criança. Ele foi pensado para ser um personagem que morreria de alcoolismo tragicamente, mas durante a novela ele começou a ganhar um público infantil. As crianças ficavam acordadas para verem o Carreirinha. Um dia, a Glória Perez me ligou para dizer que ia dar um outro fim para o personagem, que ele ia se alfabetizar e ter um amor, pois não podia fazer aquilo com as crianças. Eu concordei! No capítulo em que o Careirinha aprendeu a ler e escrever, eu fiquei muito emocionado e chorei. Ele começou a frequentar a escola escondido para surpreender sua noiva no dia do casamento e assinar o nome dele. E assinou! Ele portava uma certa ingenuidade e, ao mesmo tempo, era valente”. No currículo de Matheus há mais duas atuações em novelas: como o profeta Miguézim de Cordel Encantado, de Duca Rachid, Thelma Guedes e Thereza Falcão e com direção de Amora Mautner, exibida em 2011; e como Seu Encolheu em Saramandaia, de Ricardo Linhares, Nelson Nadotti, Ana Maria Moretzsohn e João Brandão e com direção de Denise Sarraceni, que foi ao ar em 2013. Para Matheus, a telenovela é um produto cultural importante por se tratar de uma obra dramatúrgica democrática e acessível: “A novela ocupa esse espaço de uma comunicação muito rápida quase ao vivo com as pessoas e com os temas cotidianos. As séries podem se aprofundar mais em alguns temas e, artística e esteticamente, por serem mais corajosas, podem esgarçar e forçar o público. Os folhetins raramente fazem isso. Apesar de o cinema e o teatro serem terrenos mais propícios, é possível nascerem flores na novela. Penso isso sempre que vejo, por exemplo, um Raul Cortez, uma Laura Cardoso ou uma Cássia Kiss na televisão. A novela fica nesse lugar do quase ao vivo, do teatro mediano, da comedia de costumes, da discussão cotidiana social e política, com alguma restrição temática e de liberdade. Ela cumpre isso com toda a majestade possível, com grandes atores e ótimos dramaturgos. Eu gosto de fazer, gosto mesmo!”. Jorge Furtado foi um dos diretores com quem Nachtergaele mais trabalhou na televisão. Foi sob a condução do diretor gaúcho que atuou no episódio de A Comédia da Vida Privada em 1997, sua primeira atuação na Rede Globo. Em 2010, fez Decamerão – A Comédia do Sexo. Por fim, interpreta o personagem Fernando de Souza

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para Doce de Mãe em sua versão telefilme, veiculada em 2012, e na versão seriada, exibida dois anos depois; e ambas as produções contam com direção e roteiro de Jorge Furtado e Ana Luísa Azevedo. “O Jorge é um diretor com quem gosto muito de trabalhar. Ele é dono de uma inteligência generosa e brilhante, sem histrionismo. Tenho admiração por ele e estou sempre disponível quando ele me solicita. Atualmente, ele é um dos poucos que consegue falar de política de uma maneira delicada. Ele entende o que está acontecendo e consegue, sem muita raiva, expor suas opiniões”. Quem também lhe dirigiu diversas vezes para a televisão foi Denise Saraceni que, além de duas novelas, conduziu as minisséries A Muralha (2000) e Queridos Amigos (2008). Guel Arraes foi outro diretor bem presente em sua trajetória. A última atuação de Matheus para a televisão é uma séria ainda inédita na qual interpreta o Zé do Caixão, de José Mojica Marins. A produção conta com a direção de Vitor Mafra e será veiculada pelo canal pago Space. “É um trabalho de reprodução muito fiel das características do Mojica, pois ele expunha muito isso. Eu fiquei fisicamente muito parecido. A caracterização é muito impressionante: tem a voz, o sotaque e o jeito de falar, pois o Mojica erra o português de propósito para compor o Zé do Caixão. Foi muito saboroso fazer esse trabalho!”. 48




Teatro

Atuação 1988 - O Jardim dos Cogumelos, de Antônio Ravan Personagem: vários / Direção: Antônio Ravan Delírio, de Ravan Personagem: vários Direção: Antônio Ravan São Paulo - SP 1991 - Woyzeck, de Georg Büchner Personagem: Andres / Direção: Cibele Forjaz - São Paulo-SP 1992 - Essa propriedade esta condenada, de Tennessee Williams Personagem: Ton / Direção: Johana Albuquerque São Paulo-SP e Curitiba - PR 1993 - O Paraíso Perdido, de John Milton Personagem: Satanás / Direção: Antônio Araújo São Paulo-SP e Curitiba - PR 1994 - Seria Cômico... Se Não Fosse Trágico (Play Strindberg), de Friedrich Dürrenmatt Personagem: Capitão / Direção: Augusto Francisco - São Paulo-SP 1995 - O Livro de Jó, adaptação de Luís Alberto de Abreu Personagem: Jó / Direção: Antônio Araújo São Paulo-SP , Rio de Janeiro-RJ , Curitiba-PR, Porto Alegre-RS / Colômbia , Dinamarca e Rússia 1998 - Da Gaivota, de Anton Tchekhov Personagem: Treplev / Direção de Daniela Thomas - Rio de Janeiro-RJ, Curitiba-PR, Salvador-BA, Santo André-SP e São Paulo-SP 2000 - A Controvérsia, de Jean-Claude Carrière Personagem: Bartolomeu de Las Casas Direção: Paulo José Rio de Janeiro-RJ, Porto Alegre-RS e São José do Rio Preto-SP

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2002 - Woyzeck, O Brasileiro, de Georg Büchner Personagem: Woyzeck / Direção: Cibele Forjaz Rio de Janeiro-RJ / São Paulo-SP / Porto Alegre-RS/ Curitiba-PR, Brasilia-DF, Goânia-GO, Palmas-TO, Campo Grande-MS e Cuaiabá-MT

Direção 2003 - Gema I - Espetáculo solo com o bailarino André Vidal - Evento de dança produzido para o Sesc-RJ com direção e coreografia de Matheus Nachtergaele, execução do bailarino André Vidal, Espaço Sesc - Rio de Janeiro-RJ 2004 - Gema II - Espetáculo solo com o bailarino André Vidal - Evento de dança produzido para o Instituto Itaú Cultural com direção e coreografia de Matheus Nachtergaele, execução do bailarino André Vidal, na Galeria Vermelho - São Paulo-SP 2014 - O Pais do Desejo do Coração, de William Butler Yeats - Adaptação e direção para o Grupo Teatro Entre & Vista Tiradentes, São João Del Rei e Ouro Preto, em Minas Gerais

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2015 - Conscerto do Desejo, de Maria Cecília Nachtergaele Adaptação, atuação e direção ao conjunto de poesias inéditas da poetisa Maria Cecília Nachtergaele, sua mãe - Ouro Preto - MG




Cinema

Atuação 1997 - O Que É Isso, Companheiro? Personagem: Jonas (Virgílio Gomes da Silva) / Direção: Bruno Barreto Anahy de las Misiones Personagem: Manoel / Direção: Sérgio Silva 1998 - O Primeiro Dia Personagem: Francisco / Direção: Walter Salles e Daniela Thomas Kenoma Personagem: Pedro / Direção: Eliane Caffé Central do Brasil Personagem: Isaías / Direção: Walter Salles 1999 - Castelo Rá-Tim-Bum, o filme Personagem: Rato/ Direção: Cao Hamburguer 2000 - O Auto da Compadecida Personagem: João Grilo / Direção: Guel Arraes Gêmeas Personagem: Primeiro Namorado / Direção de Andrucha Waddington 2001 - Bufo & Spallanzani Personagem: Agenor / Direção: Flávio Ramos Tambellini 2002 - Cidade de Deus Personagem: Sandro “Cenoura” / Direção: Fernando Meirelles Eclipse Personagem: Gil / Direção: Herbert Brödl 2003 - Narradores de Javé Personagem: Souza / Direção: Eliane Caffé Amarelo Manga Personagem: Dunga / Dreção: Cláudio Assis

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2004 - Nina Personagem: pintor / Direção: Heitor Dhalia 2004 - A Concepção Personagem: X / Direção: José Eduardo Belmonte Árido Movie Personagem: Salustiano / Direção: Lírio Ferreira 2005 - Crime Delicado / Direção: Beto Brant Atuando como o protagonista da peça “Woyzeck, O Brasileiro” sob a direção de Cibele Forjaz 12 Horas até o Amanhecer Personagem: Nazda / Direção: Eric Eason Tapete Vermelho Personagem: Quinzinho / Direção: Luiz Alberto Pereira 2006 - Baixio das Bestas Personagem: Everardo / Direção: Cláudio Assis 2008 - Terra Vermelha 56

Personagem: Dimas / Direção: Marcos Bechis La Virgen Negra Personagem: Professor João / Dieção: Ignácio Castillo Cottin 2010 - O Bem Amado Personagem: Dirceu Borboleta / Direção: Guel Arraes 2011 - A Febre do Rato Personagem: Paizinho / Direção: Cláudio Assis 2012 - Na Quebrada das Águas Perdidas Personagem: Olegário / Direção: Wagner Miranda e Marcos Carvalho 2013 - Serra Pelada Personagem: Coronel Carvalho / Direção: Heitor Dhalia


Sangue Azul Personagem: Gaetán / Direção: Lírio Ferreira Trinta Personagem: Joãozinho Trinta / Direção: Paulo Machline 2014 - Quando Parei de Me Preocupar com Canalhas Peronsagem: João Carlos / Direção: Tiago Vieira Mãe Só Há Uma Personagem: Matheus / Direção: Anna Muylaert Big Jato Personagens: Chico Pai e Nelson / Direção: Cláudio Assis 2015 - Zama Personagem: Vicuña Porto / Direção: Lucrecia Martel

Narração 2000 - O Povo Brasileiro, de Darcy Ribeiro, Documentário Direção: Iza Ferraz 2002 - Onde a Terra Acaba, Documentário Direção: Sérgio Machado 2007 - Encontro com Milton Santos ou O Mundo Global Visto do Lado de Cá, Documentário / Direção: Silvio Tendler

Roteiro e Direção 2008 - A Festa da Menina Morta Filme rodado em Barcelos, Amazônia.

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Atuação Mtv 1992 a 1995 - Diversas Vinhetas Roteiro de Caco Galhardo / Vários diretores

Rede Globo 1997 - Comédia da Vida Privada Episódio Anchietamos Personagem: Andrew / Direção: Jorge Furtado Episódio A voz do coração Personagem: motorista pagodeiro / Direção: João Falcão 1998 - Hilda Furacão, de Glória Perez. Minissérie - Personagem: Cintura Fina / Direção: Wolf Maia 1999 - O Auto da Compadecida, de Adriana Falcão, Guel Arraes e João Falcão. Minissérie - Personagem: João Grilo / Direção: Guel Arraes 60

2000 - A Muralha, de Maria Adelaide Amaral, João Emanuel Carneiro e Vincent Villari. Minissérie Personagem: Padre Miguel/ Direção: Denise Sarraceni Você Decide Episódio: Um Casamento Aberto / Personagem: Arinelson Direção: Ignácio Coqueiro 2001 - Os Maias, de Maria Adelaide Amaral, João Emanuel Carneiro e Vincent Villari Minissérie - Personagem: Teodorico Raposo Direção: Luiz Fernando Carvalho 2002 - Pastores da Noite, de Jorge Amado Minissérie - Personagem: Curió / Direção: Maurício Farias e Sérgio Machado

Televisão


2003 - Brava Gente Episódio: A Moda do Chifre / Personagem: Nezinho / Direção: Carlos Araújo Episódio: Francisco de Assis / Personagem: Narrador / Direção: Roberto Farias 2004 - Da Cor do Pecado, de João Emanuel Carneiro Telenovela - Personagem: Pai Helinho Direção: Denise Saraceni 2005 - América, de Glória Perez. Telenovela - Personagem: Carreirinha / Direção: Marcos Schechtman 2005, 2006 e 2007 - Os Amadores, de Mauro Wilson. Especial de fim de ano. Personagem: Jaime / Direção: José Alvarenga Júnior 2007 - Amazônia, de Galvez a Chico Mendes, de Glória Perez. Minissérie - Personagem: Poeta / Direção: Marcos Schechtman 2008 - Queridos Amigos, de Maria Adelaide Amaral. Minissérie - Personagem: Tito / Direção: Denise Saraceni 2008 - Ó Paí, Ó, de Guel Arraes e Jorge Furtado. Série - Personagem: Queixão / Direção: Monique Gardenberg 2009 - Ó Paí, Ó, de Guel Arraes e Jorge Furtado. Série - Personagens: Queixão / Direção: Monique Gardenberg 2010 - S.O.S. Emergência, de Daniel Adjafre e Marcius Melhem Série - Personagem: Sete Quedas (Jezuino da Silva) /Direção: Mauro Mendonça Filho Decamerão - A Comédia do Sexo, de Guel Arraes e Jorge Furtado. Série - Personagem: Tofano / Direção: Jorge Furtado 2011 - Cordel Encantado, de Duca Rachid, Thelma Guedes e Thereza Falcão. Telenovela - Personagem: Miguezim / Direção: Amora Mautner

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2012 - Doce de Mãe, de Jorge Furtado e Ana Luiza Azevedo Telefilme - Personagem: Fernando de Souza Direção: Jorge Furtado e Ana Luiza Azevedo 2013 - Saramandaia, de Ricardo Linhares, Nelson Nadotti, Ana Maria Moretzsohn e João Brandão. Telenovela - Personagem: Seu Encolheu Direção: Denise Saraceni e Fabrício Mamberti 2014 - Serra Peladade, Heitor Dhalia e Vera Egito. Série - Personagem: Coronel Carvalho / Direção: Heitor Dhalia 2014 - Doce de Mãe, de Jorge Furtado e Ana Luiza Azevedo. Série - Personagem: Fernando de Souza / Direção: Jorge Furtado

Canal Space 2015 - Zé do Caixão, Série inédita Personagem: Zé do Caixão /Direção: Vitor Mafra

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Prêmiações

1996 - Melhor Ator / Prêmio Shell pela peça O Livro de Jó 1996 - Melhor Ator / Prêmio Mambembe do Ministério da Cultura, pela peça O Livro de Jó 1998 - Ator Revelação / Troféu APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte, pela minissérie Hilda Furacão 1999 - Melhor Ator / Troféu APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte, pela minissérie O Auto da Compadecida 2000 - Melhor Ator, voto da crítica e do público / Prêmio Sesc de Melhores Filmes, pelo filme O Auto da Compadecida 2001 - Melhor Ator / Prêmio Sesc de Melhores Filmes, pelo filme O Primeiro Dia 2001 - Melhor Ator / Grande Prêmio de Cinema Brasileiro, pelo filme O Primeiro Dia 2002 - Melhor Ator / Grande Prêmio de Cinema Brasileiro, pelo filme O Auto da Compadecida 2003 - Melhor Ator / 13º Cine Ceará - Festival Nacional de Cinema e Vídeo, pelo filme Amarelo Manga 2003 - Melhor Ator / Prêmio Qualidade Brasil, pela peça Woyzec, o Brasileiro 2003 - Melhor Ator Coadjuvante / Prêmio Qualidade brasil, pelo filme Cidade de deus 2005 - Melhor Ator Coadjuvante / Melhores do Ano Troféu Domingão, pela novela América 2006 - Melhor Ator / Troféu APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte, pelo filme Tapete Vermelho 2006 - Melhor Ator / 10º Festival de Cinema Brasileiro de Miami (Brazilian Film Festival of Miami), pelo filme Tapete Vermelho 2006 - Melhor Ator, voto da crítica e do público / Prêmio Sesc de Melhores Filmes, pelo filme Tapete Vermelho

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2006 - Melhor Ator / 10º Cine PE, pelo filme Tapete vermelho 2007 - Melhor Ator / 3º Prêmio Fiesp/Sesi-SP do Cinema Paulista, pelo filme A Concepção 2008 - Prêmio Especial do Júri / 36º Festival de Cinema de Gramado, pela sua direção no fillme A Festa da Menina Morta 2008 - Música / 36º Festival de Cinema de Gramado, pelo filme A Festa da Menina Morta 2008 - Melhor Diretor / Festival do Rio, pelo filme A Festa da Menina Morta 2008 - Diretor Revelação / 12º Festival de Cinema Luso Brasileiro, pelo filme a A Festa da Menina Morta 2008 - Melhor Novo Diretor / Festival Intenacional de Chicago, pelo filme A Festa da Menina Morta 2009 - Melhor Filme de Ficção / Troféu APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte, pelo filme A Festa da Menina Morta 2011 - Melhor Ator Coadjuvante / 6º Prêmio Contigo de Cinema, pelo filme O Bem Amado 66

2012 - Melhor Ator Coadjuvante / 7º Encontro Nacional de Cinema e Vídeos dos Sertões, pelo filme Na Quadrada das Águas Perdidas 2014 - Ordem do Mérito Cultural / Ministério da Cultura 2015 - Melhor Ator / 43º Festival Nacional de Gramado, pelo filme Quando Parei de Me Preocupar com Canalhas 2015 - Melhor Ator / 11º Prêmio Fiesp/Sesi-SP do Cinema Paulista, pelo filme Trinta


Depoimentos

Da geração do Matheus Nachtergaele, não vejo ninguém com mais talento, mais entrega, mais vocação, mais disponibilidade e despudor cênico do que ele. Esse milagre não acontece todos os dias. Parabéns, Matheus! Fernanda Montenegro, atriz Matheus Nachtergaele foi meu João Grilo, não leram no jornal não? Pra dizer a verdade acho que eu que era dele. Soube disso no dia que meu pirarucu morreu. Matheus Nachtergaele é grande no espírito, grande em sua sensibilidade e portanto grande em tudo que faz. Que alegria o destino ter nos aprontado a fortuna de ser a dupla de Suassuna e Guel Arraes. Matheus Nachtergaele não tem equivalente, ele é ele. Pessoal e intransferível. E assim, com sua fúria cheia de delicadeza, chegou no coração de quem se deparou com sua arte, nos palcos e nas telas. Matheus Nachtergaele é nome bom de falar, por isso escrevi quatro vezes até agora. Brasileiro, brasileiríssimo, com esse nome de gentes de fora. Mas ele é de dentro. De dentro do coração selvagem. Que siga iluminando por onde passa por muito tempo. Com carinho, De seu admirador-comparsa-Chicó, Selton Mello, diretor e ator Muito antes de se lançar na carreira de ator, Matheus transbordava sensibilidade e talento. Quando pequenos, estudávamos na escola Waldorf Rudolf Steiner e o Matheus encantava a todos declamando lindamente

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“O baile na flor” de Castro Alves. Ele adorava euritmia, uma arte que traduz música e poesia em movimento. Estudava flauta e Kântele na escola e em casa cresceu acompanhando meu pai que nos criou ao som de seu violão com as notas de Villa Lobos, Beatles, sambas e muita bossa nova. E em nossos saraus, Matheus sempre foi o principal intérprete, com sua voz limpa e emoção. Na escola, ele se destacava nos concursos de redação e amostras de artes. Matheus sempre adorou literatura pelo prazer e para mergulhar e investigar as coisas que lhe interessavam. Sempre passou horas e horas lendo... Por muito tempo pensaram que o Matheus seria um desenhista, ou artista plástico. Sempre houve um momento nas reuniões de família e amigos em que as crianças e adultos se reuniam em sua volta para que ele lhes fizesse suas caricaturas. Nas festas maiores, como Natal, o Matheus nos reunia e montava uma peça onde nossos avós, Dedé e Manina, preparavam os cenários e figurinos, e então apresentávamos para os adultos. Éramos muito pequenos, mas ele distribuía os papéis conforme a maturidade e talento de cada um. Interpretávamos árvores, animais, coadjuvantes e o papel principal cabia a ele... Justo! 68

Outra paixão dele são os animais, pensou até em ser veterinário e até hoje vive rodeado de cachorros! Os primeiros tempos de teatro não foram fáceis, o Matheus abandonou a escola de artes plásticas e os caminhos óbvios para perseguir a carreira de ator. Neste começo, não teve o incentivo da família, mas perseverou... para sorte de todos! Vivemos hoje em cidades diferentes, mas continuamos muito próximos. Aproveitamos todas as oportunidades para nos encontrar. O Matheus cria laços muito fortes com quem convive. Desperta a sensibilidade e inspira. Surpreende a cada encontro com planos, idéias e histórias lindas. E hoje, através do teatro, cinema e televisão este talento pode ser desfrutado não só por nossa família. Merde Matheus! Beatriz Nachtergaele, arquiteta e irmã de Matheus


Trabalhei apenas uma vez com Matheus Natchergaele no filme Mãe só há Uma, ainda inédito. Acho que ele é um tipo de ator-água: Entra nas brechas, se enfia nos buracos, reage naturalmente e suavamente a tudo, de modo que molha o que está em volta com sua presença calorosa. Matheus não é pouca coisa não. Poderia ter virado nada mais que uma estrela. Poderia ter sido consumido pela fama e pelas aparências. Mas claro que , como a água, não o fez. Preferiu ficar com o pé na vida. Inteligente, atento, verdadeiro. Trabalhar com Matheus é como beber água. Necessário, prazeiroso, transparente, verdadeiro, vital. Nada menos que um mestre. Anna Muylaert, roteirista e diretora Matheus pessoa, antes de ator e diretor, tem no olhar a força da alma grande e melancólica (porque vai até os limites) que inspira o artista nele. Por isso tem “giro”; é um ator de giro, ou seja, recebe os personagens e os recria nas inúmeras improvisações que jorram quando ele está vestido deles... E o diretor no set que corra atrás!!! Matheus é minucioso; é muito mais serio, comprometido e pensador do que se supõe. Pode habitar o profundo e o raso; o drama, a comédia e o épico... a bebedeira coletiva com os amigos e a solidão sóbria de quem tem os poros abertos demais. A dor e o riso quase na mesma intensidade. Tenho em minha casa um banco que sento todas as noites para fumar o cigarro ritualístico do fim do dia...presente antigo do Matheus; nem sei se ele se lembra...nem deve imaginar que essa pequena mobília ficou enlaçada na memória diária das artes que ele- ator e personagem- aprontaram no Jequitinhonha... e o mundo fez que fez dele e de mim... e desde então, ele não pode adivinhar o quanto tenho de admiração e respeito por sua arte/pessoa ... alguns atores são para certos diretores, algo de filho que se perdeu no mundo, mas que sempre terão uma linha de tecido umbilical...É assim que vejo Matheus...É assim que sinto ele....e sei que ele é o infinito mais que isso. Eliane Caffé, diretora de cinema

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Para um Amor no Jardim Botânico... Morávamos bem pertinho naquele extenuante verão do Rio de Janeiro e era inevitável que nos esbarraríamos em alguma esquina do bairro. Estava escrito em todos os terreiros de macumba do mundo que seríamos amigos. Identificações detectadas numa simples troca de olhares, compartilhávamos inúmeros sentimentos e vontades comuns, assim como, algumas diferenças fundamentais. E isso é o que nos movia e nos move até hoje. Certa noite no balneário, presenciei junto a outro amigo em comum, o enfant terrible hipnotizando o seu cão preferido que insistia em subtrair um dos filhotes do seu passarinho de estimação que distraidamente caíra da gaiola bem em frente a Baco que, de súbito, abocanhou-o e suplicou para o seu dono tal qual um gladiador romano pedindo o veredicto ao seu imperador.

BACO (melidroso): E aí? Posso? MATHEUS (com autoridade): Baco, não engula! Larga o filho do Zé! 70

BACO (com jeito de malandro carioca): Eu estava aqui de bobeira. Ele que caiu bem na minha frente.

Incrédulos, Eu e Joãozinho cada um com um copo de cerveja na mão, presenciávamos ao diálogo surrealista.

MATHEUS (didático): Baco, você come ração de cachorro. Não vá comer os meus passarinhos. BACO (com o passarinho ainda alojado na bocarra aberta e com cara de pidão): Deixa, vai! MATHEUS (paterno): Solta, Baco! BACO (resignado): Tristeza...


Por fim, Baco acabou largando o filho do Zé no encerado chão da cozinha e, talvez, o sem pena nem tenha se dado conta de que sua existência terrena havia sido colocada em pauta e quase que totalmente abreviada. Olhei para Joãozinho que atônito também me fitava e depois olhei para a cerveja. Será? Juro, eu nunca tinha antes visto um cão falar com seu dono. E um dono assim: tão mandão e tão conciliador, tão enfático e tão dócil. Tática Nachtergaleana.

Sermos amigos e trabalharmos juntos é um grande passo para a minha humanidade e, passo a passo, ainda está sendo. Foi assim no Árido Movie quando o danado saia do Maranhão onde gravava uma novela e viajava até as brenhas do interior de Pernambuco para compor um aleijado sarará enjeitado pela mãe autoritária ou quando partia das brenhas do interior do Pará onde fazia um outro filme e pousava numa ilha a meio do caminho entre o Brasil e a África para compor um atormentado atirador de facas franco-belga em Sangue Azul. Talentoso, bonito, generoso, companheiro, inteligente, amoroso e amigo. Sou abençoado por tê-lo ao meu lado no road movie da vida e na última noite de nitrato e sei que não sou o único... Um beijo pra tu, Matheus. Lirio Ferreira, cineasta Sobre meu amigo Matheus Nachtergaele Fico imaginando a reação de um nativo das selvas brasileiras que, seguindo um som estrondoso que lhe atiçava o espírito, deparou-se com as Cataratas do Iguaçu. Imagino o espanto, a reverência, talvez um tanto de medo, certamente uma profunda admiração por perceber que estava diante de uma força da natureza, algo que se entende mas não se explica,

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que se reconhece mas não se reproduz nem se inventa. Os japoneses tem uma palavra para isso: yugen. Significa “a consciência que desperta sentimentos profundos e misteriosos demais pasra serem expressos em palavras”. A primeira vez que eu vi o Matheus foi assim: yugen. Foi no teatro, em O Livro de Jó, 1995. A peça era ótima mas o que eu guardei daquela noite foi a certeza de ter conhecido um grande ator. Sei que os atores crescem, se aperfeiçoam, melhoram com o tempo e o estudo, sei que eles podem sempre aprimorar sua arte mas tenho a convicção de que o talento de um grande ator é inato.

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Na primeira chance que tive, chamei o Matheus para um trabalho, Os Anchietanos, um programa de televisão da série Comédias da Vida Privada, em 1997. Foi o primeiro trabalho dele na televisão e, desde então, ele não cansou de surpreender o país com seu extraordinário talento em muitas peças, filmes, séries, novelas. Trabalhamos juntos muitas vezes e temos planos de trabalhos futuros. Ficamos amigos e os amigos são raros. Matheus não cansa de me surpreender com a sua inteligência e sensibilidade, entrega-se ao personagem com uma coragem exemplar, uma determinação que chega a assustar mas, ao mesmo tempo, é generoso com os colegas, conhece como poucos o jogo que é o teatro, sempre uma brincadeira de turma. Compartilho com Matheus o amor pela poesia, que ele declama como poucos, e sempre que penso nele lembro em Fernando Pessoa, um ser múltiplo, complexo, sensível e único. Matheus me lembra sempre que o ofício de interpretar é o oposto de fingir, e ninguém definiu melhor esta diferença que Pessoa: Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração. Tudo o que sonho ou passo, O que me falha ou finda,


É como que um terraço Sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda. Por isso escrevo em meio Do que não está ao pé, Livre do meu enleio, Sério do que não é. Sentir? Sinta quem lê! Matheus é assim, ele sente com a imaginação. Sorte nossa. Porto Alegre, 30 de agosto de 2015 Jorge Furtado, cineasta Falar de Matheus Nachtergaele para mim é, ao mesmo tempo, difícil e prazeroso. Difícil porque posso me pegar afogado em adjetivos bastante complexos e grandiosos; porque a minha ligação com ele vai muito além da simples amizade. Resvala em um amor sincero e colide com uma admiração profunda. Amizade cheia de laços e de nós. Falar desse amigo é difícil, pois talvez eu tenha que inventar uma palavra muito específica para defini-lo, e provavelmente vou cansar minha cabeça sem chegar a um denominador cabível. Difícil porque é difícil dar concretude a algo muito próximo da cumplicidade, esse crime que nasce na essência. Por outro lado, é bastante prazeroso, pois com palavras simples como gratidão e amor eu sou muito facilmente compreendido – tanto por ele como por vocês. Ou de coisas mais simples ainda que palavras, como nada dizer e ficar olhando os dias passarem sabendo que ele está ali por perto, em alguma estrada. E desconfio que isso vai muito longe. Muito longe mesmo. Hilton Lacerda, diretor e roteirista

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Legendas e créditos das imagens Capa - Minissérie e filme O Auto da Compadecida, com direção de Guel Arraes (1999/2000). Fotografia de Nelson Di Rago (Cedoc / TV Globo). Pág. 4 - Peça Da Gaivota, de Anton Tchekhov, com as atrizes Fernanda Montenegro e Fernanda Torres (1998). Fotografia Lenise Pinheiro. Pág. 6 - Minissérie Hilda Furacão, de Glória Perez (1998). Fotografia de Jorge Baumann (Cedoc / TV Globo). Pág. 8 - À esquerda, Matheus Nachtergaele aos 12 anos no grupo de escoteiros. Imagem do acervo pessoal de Matheus Nachtergaele. Pág. 13 - Os irmãos Nachtergale: acima e à esquerda, Matheus aos oito anos, ao seu lado, Beatriz. Abaixo, André e Marcos. Imagem do acervo pessoal de Matheus Nachtergaele. Pág. 14 - Cidade de Bruxelas, capital da Bélgica (2001). Fotografia de Rodrigo Lopes. Pág. 23 - Peça O Livro de Jó, adaptação de Luís Alberto de Abreu. Fotografia de Richelle Costi com direção de Antônio Araújo (1995). Pág. 24 - Peça Woyzeck, de Georg Büchner dirigida por Cibele Forjaz, com o ator Roberto Audio (1991). Imagem do acervo pessoal de Matheus Nachtergaele. Pág. 31 - Filme Sangue Azul, de Lírio Ferreira (2015). Imagem divulgação Imovision. Pág. 32 - Filme Baixio das Bestas, de Cláudio Assis, com a atriz Dira Paes (2006). Imagem divulgação Imovision. Pág. 43 - Série Comédia da Vida Privada, direção de Roberto Farias (1997). Fotografia de Jorge Baumann (Cedoc / TV Globo). Pág. 44 - Série Decamerão - A Comédia do Sexo, de Guel Arraes e Jorge Furtado, com a atriz Deborah Secco (2010). Fotografia de Fábio Rebelo (Cedoc / TV Globo). Pág. 49 - Telenovela América, de Glória Perez e com direção de Marcos Schechtman (2005). Imagem do acervo pessoal de Matheus Nachtergaele. Pág. 50 - Peça Seria Cômico... Se Não Fosse Trágico, de Friedrich Dürrenmatt, com direção de Augusto Francisco (1994). Imagem do acervo pessoal de Matheus Nachtergaele.

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Pág. 53 - Novela Cordel Encantado, de Duca Rachid, Thelma Guedes e Thereza Falcão e com direção de Amora Mautner (2011). Fotografia de Renato Rocha Miranda (Cedoc / TV Globo). Pág. 54 - Série Ó Paí, Ó, de Guel Arraes e Jorge Furtado, com direção de Monique Gardenberg (2008). Fotografia de Zé Paulo Cardeal (Cedoc / TV Globo). Pág. 57 e 58 - Minissérie e filme O Auto da Compadecida, com o ator Selton Mello (1999/2000). Fotografia de Nelson Di Rago (Cedoc / TV Globo). Pág. 63 - Peça Woyzeck, O Brasileiro, de Georg Büchner com Cibele Forjaz (2002). Imagem do acervo pessoal de Matheus Nachtergaele. Pág. 64 - Minissérie Queridos Amigos, de Maria Adelaide Amaral com direção de Denise Saraceni (2008). Fotografia de Márcio de Souza (Cedoc / TV Globo). Pág. 74 e 75 - Filme Big Jato, de Cláudio Assis, com Francisco de Moraes Assis (2015). Imagem divulgação República Pureza Filmes. Pág. 76 - Série Zé do Caixão, de Vitor Mafra (2015). Fotografia de Kauê Zilli.

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Para a produção da reportagem desta publicação, o ator e diretor Matheus Nachetergaele concedeu entrevista a André De Biase, Lucia Caus e Paulo Gois Bastos que foi realizada no dia 3 de agosto de 2015, na cidade do Rio de Janeiro-RJ.


CADERNO DO FESTIVAL DE CINEMA DE VITÓRIA HOMENAGEADO NACIONAL / 15ª Edição Projeto Editorial – Lucia Caus Delbone e Paulo Gois Bastos Reportagem e edição – Paulo Gois Bastos (MTB/ES 2530) Projeto Gráfico e Diagramação – Paulo Prot Revisão de Texto – Luiz Cláudio Kleaim Especificações Gráfica Tipografia – Chaparral Pro para títulos e Gandhi Serif para texto Papéis – Couchê Fosco 115g/m 2 , Clear Plus 180g/m 2 e Cartão Supremo 250g/m 2 Impresso em Vitória, ES O Caderno do Festival de Cinema de Vitória - Homenageado Nacional é uma publicação do 22º Festival de Cinema Vitória, evento realizado de 11 a 16 de setembro de 2015 em Vitória-ES. O Festival é uma realização da Galpão Produções e do Instituto Brasil de Cultura e Arte. Nosso endereço e contatos: Rua Professora Maria Cândida da Silva, nº 115-A – Bairro República – Vitória/ES. CEP 29.070-210. Tel.: +55 27 3327 2751 / producao@ibcavix.org.br

FICHA CATALOGRÁFICA

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) C122 CADERNO DO FESTIVAL DE CINEMA DE VITÓRIA HOMENAGEADO CAPIXABA. Paulo Gois Bastos (Editor). Vitória: 22° Festival de Cinema Vitória, Set 2015. Anual. 80p.: il. (22º Festival de Cinema de Vitória, 15ª Edição). 1. Matheus Nachtergaele. 2. Teatro. 3. Cinema. 4. Televisão. 5. Filmografia. 6.Arte. 7.Cultura 8. 22º Festival de Cinema de Vitória. I. Bastos, Paulo Gois. (Editor).



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