Caderno do VCV - Homenageado Nacional / Paulo José

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Paulo José

HOMENAGEADO

2014



Governo do Espírito Santo, BNDES e Petrobras apresentam

Paulo José

Homenageado Nacional Vitória-ES, setembro de 2014



Falar em Paulo José é falar de poesia e de dedicação à arte. Ele, como poucos, transborda talento em tudo que faz. Um exímio ator que, com seus personagens, presenteou a nós espectadores com momentos intensos. Um homem forte e corajoso que sempre guiou a vida com muita paixão. Paulo José foi o homenageado pelo nosso Festival em 1998 e, agora, retorna para receber, além do Troféu Marlin Azul, esta publicação que traz o registro de sua trajetória profissional. Um homem sofisticado, feliz e sincero. Pesquisador e aprendiz de tudo o que possa melhorar sua arte. Já percorreu todas as etapas de uma produção para teatro, cinema ou televisão, sempre com muito zelo. Quando estive na presença de Paulo José, me chamou a atenção o seu olhar intenso e atento, gestos e fala de um homem atualizado. É essa mesma intensidade que ele emprega no teatro, no circo, no cinema e na televisão. Nascido com o dom da arte, ainda constituiu uma linda família que também se encontrou com o mundo artístico. Em nossa 21º edição, temos a honrada de poder reafirmar e render homenagem a Paulo José, cujo brilhantismo ilumina o nosso Festival.

Lucia Caus Diretora Festival de Vitória – 21º Vitória Cine Vídeo



Sumário

Apresentação - 9 Uma breve biografia - 15 Um faz tudo no teatro - 23 Um mergulho no ofício de ator - 33 Um inventivo diretor de TV - 43 Currículo Teatro - 50 Cinema - 60 Televisão - 65 Prêmios - 73 Depoimentos - 79 Referências - 90



Apresentação Gaúcho de Lavras do Sul, Paulo José é personagem importante da dramaturgia nacional brasileira e traz no currículo diversas realizações e prêmios no teatro, cinema e televisão. Com 77 anos de vida completos no dia 20 de março, ele nos recebeu em sua casa na Gávea, no Rio de Janeiro, em julho deste ano para realizarmos a entrevista que subsidiou esta publicação. Nessa conversa, sempre com um tom bem humorado e acolhedor, Paulo nos contou um pouco de suas memórias, falou dos personagens e trabalhos que marcaram sua carreira e dos esboços dos projetos futuros e em andamento. Profissional e artista múltiplo, Paulo José imprime sempre uma grande dedicação a tudo aquilo que faz. Em parte, essa paixão pelo labor foi um dos fatores responsáveis pelo desenvolvimento do Mal de Parkinson, enfermidade diagnosticada em 1992 após exaustivo trabalho na televisão. Entretanto, se por um lado a doença lhe trouxe limitações, principalmente na coordenação motora; por outro, a sua mente está sempre inquieta e ativa. Por trás da aparente fragilidade, há uma cabeça que não para de maquinar novas ideias e que nunca cessou de criar. Ator e diretor em dezenas de peças e espetáculos, ele já realizou trabalhos de cenografia, figurino, maquiagem, iluminação, produção executiva e até de administração de teatro. Suas primeiras experimentações na área foram ainda aos dez anos, quando era aluno do Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, em Bagé, município vizinho à sua cidade natal. Aos 15 anos, morando em Porto Alegre, ingressa no teatro amador e participa do Teatro Equipe. Nos anos de 1960, fez parte do Teatro de Arena de São Paulo e do Rio de Janeiro, um dos mais atuantes e significativos grupos da história do teatro brasileiro e por meio do qual passaram importantes diretores e dramaturgos brasileiros como Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri. Mais recentemente, Paulo também desenvolveu trabalhos de pesquisa e de direção com o Grupo Galpão, que é, atualmente, uma das companhias brasileiras contemporâneas mais inovadoras. Consagrado ator de cinema, estreou na telona em 1965 como o personagem principal do longa-metragem O Padre e a Moça, de

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Joaquim Pedro de Andrade. De lá pra cá, atuou em dezenas de filmes sob a direção de cineastas como Domingos de Oliveira, Hector Babenco, Joel Pizzini, Walter Salles Jr., Cacá Diegues, Júlio Bressane e Jorge Furtado. Um marco de sua carreira no cinema é o longa-metragem Macunaíma (1969), de Joaquim Pedro de Andrade, filme em que interpreta a Mãe do Macunaíma e o Macunaíma Branco. Outro destaque mais recente foi sua participação em O Palhaço, filme de 2011, dirigido e estrelado por Selton Mello. Nessa produção, Paulo interpretou o personagem Valdemar, o Palhaço Puro Sangue. Essa foi sua última atuação no cinema e pela qual recebeu quatro prêmios, entre eles o de Melhor Ator Coadjuvante pelo Grande Prêmio de Cinema de 2012, reconhecimento dado pela Academia Brasileira de Cinema. Na televisão, ele foi ator em 46 obras entre novelas, minisséries e outros programas na TV Globo. Entre suas atuações mais conhecidas está Shazam da novela Primeiro Amor, ficção de 1972 escrita por Walter Negrão e dirigida por Régis Cardoso, que, juntamente com outro personagem, o Xerife, vivido por Flávio Migliaccio, caiu no gosto do público. O sucesso da dupla rendeu um seriado infantil após o fim da novela: Shazam, Xerife & Cia que foi exibido de 1972 a 1974. Além da atuação, Paulo José dirigiu outros 34 trabalhos para a telinha e também foi responsável por introduzir novos formatos com propostas narrativas mais ousadas para o meio televisivo. Sob sua direção, foram marcantes as minisséries O Tempo e O Vento, de 1985; e Agosto, de 1993. Neste ano, em seu último trabalho na TV, interpretou um personagem vivendo com Mal de Parkinson, doença com a qual vem convivendo já há mais de vinte anos. Sempre jovial e perfeccionista, Paulo lida com o seu processo de criação de uma forma quase artesanal. É um otimista irreparável, como ele mesmo se considera, e com sua vivência artística se aproximou de importantes nomes da cena cultural brasileira. Parte da grandeza deste artista brasileiro pode ser mensurada pelos 39 prêmios que ele recebeu ao longo de sua trajetória profissional, mas o currículo vasto e o reconhecimento público só explicitam uma pequena parte de sua índole inquieta, criativa e generosa.

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“Ao me deitar, não penso se o dia foi mesmo melhor ou não. Olho para a frente e penso ‘amanhã será um outro dia’. Assim, sigo trabalhando, vivendo dia por dia”





Uma breve biografia Paulo José Gómez de Souza nasceu em Lavras do Sul, único município gaúcho surgido a partir da extração de ouro e que, atualmente, conta com uma população pequena, de quase oito mil habitantes vivendo principalmente da agropecuária. Ele é o segundo filho de uma família de cinco filhos homens. Pela vontade da mãe, Paulo José deveria ser uma menina e se chamaria Raquel. Sua mãe, Maria Del Carmem, ou Carmencita, tem origem espanhola, nascida nos pirineus espanhóis e vinda para o Brasil aos oito anos de idade. Estudou em um colégio interno em Porto Alegre, de onde saiu, praticamente, para o casamento. Pianista e declamadora, ela sempre incentivou os filhos a experimentarem e conhecerem o mundo das artes. Seu pai, Arlindo Ferreira de Souza, era um gaúcho severo, vindo de uma família de catorze filhos, mas fora criado pelos avós maternos quase sem relação com os irmãos. Foi para o Rio de Janeiro estudar Engenharia Civil, chegando a atuar como engenheiro, mas tornouse fazendeiro em Lavras do Sul, município que fica ao lado de Bagé. Desde cedo, os irmãos Gómez de Souza estabeleceram uma relação de intimidade com a literatura, a música, as artes plásticas e o teatro. Além do português, aprenderam o espanhol devido à proximidade com a família da mãe. Eram, praticamente, os únicos meninos a frequentarem o Instituto Municipal de Belas Artes de Bagé e, por isso, eram alvo de chacota dos outros garotos. No Instituto, Paulo estudou piano, harmonia e solfejo. Aos dez anos, Paulo ingressa no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora onde começa a experimentar o teatro. Ele fazia todos os espetáculos da escola; uns cinco por ano. Eram peças religiosas escritas por Giovane Bosco, fundador da ordem católica que mantinha o

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Colégio. O cumprimento das tarefas escolares contava com o acompanhamento próximo de sua mãe, que havia sido professora, mas não lecionava a pedido do esposo. Nessa época, além de atuar, Paulo já se percebia atraído pela função de diretor. Nas férias escolares, os irmãos Gómez de Sousa não tinham moleza e, durante quatro meses por ano, iam para a fazenda e assumiam a rotina de atividades dos peões. “Era uma personalidade dupla, quase dividida! Na fazenda, tínhamos um trabalho muito concreto e pesado. Nosso pai nos colocava pra assumir a lida bem cedo, acordávamos por volta das quatro da manhã”. Também foi em Bagé onde ele conheceu o cinema. Esta arte era algo literalmente bem próximo de seu cotidiano familiar e chegava a transmitir-lhe uma “fragrância”: “a gente morava na mesma quadra do Cinema Avenida, que era o único cinema de Bagé. Os fundos de nossa casa faziam limites com a sala de cinema. Os filmes chegavam muito danificados, pois as cópias circulavam por outras cidades antes de chegarem a Bagé. Vinham aos pedaços, quase todos eles sofriam emendas e cortes depois de serem exibidos. Pela manhã, eu e meus irmãos ficávamos esperando, em cima do muro dos fundos de nossa casa, o funcionário do cinema jogar os pedaços dos filmes no lixo. Nós pulávamos e catávamos aquilo que a gente chamava de ‘ceninhas’. Naquela época, o cinema tinha cheiro: o cheiro do acetato”. E Paulo se recorda do primeiro filme que assistiu: a animação Bambi, dos estúdios Disney, de David Hand. Em 1954, a família Gómez de Souza se muda para Porto Alegre onde Paulo ingressa no curso Científico – que corresponde ao Ensino Médio atual. Contraditoriamente, com um histórico de bom aluno, ele repete o terceiro ano para não ter que fazer o vestibular para Medicina, que era a vontade de sua família. “Essa sabotagem era uma coisa dolorosa, mas era a maneira de comprovar e de dar atestado que eu não conseguiria fazer aquilo. Em casa havia uma relação de conflito, pois, se por um lado havia uma aceitação e um estímulo ao teatro, pra que a gente estudasse música e piano; ao mesmo tempo havia uma severidade, uma restrição a essa coisa mais ‘vagabunda’ e atirada. Por isso, tínhamos que ser muito conse-

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quentes. Eu frequentemente desandava e deixava de cumprir tarefas mais nobres. Eu saí da posição de melhor aluno da escola para ser um reprovado. Isso me fez sofrer muito. Eu estava entrando por um caminho que não podia controlar direito”. Paulo chega a ingressar no curso de Arquitetura, mas não o conclui. Tal decisão, evidentemente, não foi bem recebida pelos pais. Para sua família, a vida no teatro era algo bem distante de uma carreira profissional mais tradicional, como haviam planejado para os filhos. “Quando eu estava no colégio e participava das peças enquanto atividade estudantil, para os meus pais era uma ‘gracinha’ ter o filho fazendo teatro. Depois dessa época, quando essa coisa ficou séria e decidi largar a arquitetura para fazer teatro, o clima ficou pesado e foi uma situação terrível para a convivência em casa. Eu era o vagabundo, pois o importante era ter um diploma, um canudo. Virei a ovelha negra da família”. Tempos depois, seu pai o procura para uma “reconciliação”. Propôs-se, inclusive, a financiar a ida do filho para o Rio de Janeiro ou a São Paulo a fim de que viesse a aprofundar-se na arte teatral. Os três anos de estudante de Arquitetura também serviram para aproximá-lo do Teatro Universitário da União dos Estudantes e, mais tarde, os conhecimentos aprendidos contribuíram para a criação de seus trabalhos de cenografia. Em Porto Alegre, ainda enquanto estudante de Arquitetura, Paulo teve seus primeiros contatos com grupos de teatro, atuou em peças amadoras e chegou a assumir a direção de um espetáculo no Teatro Equipe. No início dos anos de 1960, ele deixou Porto Alegre e foi para São Paulo fazer parte do Teatro de Arena, onde também atuou, dirigiu, fez figurino e cenografia, entre outras atividades. É no Arena que Paulo conhece a atriz Dina Sfat, sua primeira esposa, com quem se casa em 1968. Após o Golpe Militar de 1964, crescem os movimentos pela retomada democrática. A tensão política também aumenta com o decreto do Ato Inconstitucional nº 5, em dezembro de 1968, dispositivo que suspendeu os direitos constitucionais e que concedia poderes extraordinários à Presidência da República, então ocupada pelo

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General Artur Costa e Silva. No início de 1969, Paulo e Dina, juntamente com o Arena, viajam para um festival de teatro na Europa. Ao retornarem para o Brasil, no final daquele ano, Paulo é contratado pela TV Globo e vai morar, definitivamente, no Rio de Janeiro. Paulo José é pai de quatro filhos, três dos quais enveredaram pela vida artística. Entre as suas companheiras, contou sempre com mulheres fortes e também envolvidas com o meio artístico. Durante catorze anos, foi casado com a atriz Dina Sfat, com quem teve as filhas Ana, Clara e Bel Kutner. Em 1979, nasceu Paulo Henrique Caruso de Souza, filho de Paulo com a atriz Beth Caruso. No início dos anos de 1980, casou com a atriz e diretora Carla Camurati. Em 1989, durante a peça Delicadas Torturas se envolve com a atriz Zezé Polessa com quem, entre idas e vindas, viveu por sete anos. Por fim, conheceu a figurinista, cenógrafa e diretora Kika Lopes, com quem está casado desde 1999. Em 1992, após uma estafa causada por 36 horas ininterruptas de trabalho em uma ilha de edição, Paulo foi diagnosticado com Mal de Parkinson. Essa doença neurológica crônica e irreversível é causada pela falta de um neurotransmissor, causando enrijecimento muscular, tremores, perda da capacidade da coordenação motora e da potência vocal. Desde então, com o diagnóstico, Paulo modificou sua rotina para enfrentar a doença e se tornou uma espécie de referência pública sobre o Parkinson. “Tive muitos momentos de depressão. Houve um tempo que tinha medo de dormir e não acordar mais. Às vezes, tenho medo de morrer. Não estou num daqueles momentos de depressão profunda. Mas, tampouco este é um período fácil. Quando acordo, tenho de fazer uma escolha. Decido sair da cama. Hoje será um dia melhor. Ao deitar-me, não penso se o dia foi mesmo melhor ou não. Olho para a frente e penso ‘amanhã será um outro dia’. Assim, sigo trabalhando, vivendo dia por dia”.

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“Eu tinha que dar conta de tudo e nĂŁo mergulhava no personagem, pois o que me interessava era o conjunto mais amplo do fazer teatralâ€?





Um faz tudo no teatro Das peças do teatro salesiano em Bagé, passando pelo teatro estudantil e pelo amador em Porto Alegre, até integrar grupos de vanguarda como o Teatro de Arena e, mais recentemente, o Grupo Galpão, Paulo José já fez de tudo no palco e nas coxias. Foi cenógrafo, maquiador, iluminador, produtor executivo, contrarregra, administrador de teatro, figurinista, animador e escritor de teatro de fantoches, tradutor teatral, maquinista e assistente de direção. Em seu currículo constam cerca de 30 peças como ator e outras 25 como diretor. Paulo começa a envolver-se mais intensamente com a arte teatral quando ingressa no curso de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Naquela época, a cena cultural era protagonizada por companhias e grupos de teatro, em sua maioria, amadores ou estudantis. Havia festivais que movimentavam essa cena e reuniam atores amadores de todo o Brasil. Foi a partir dessa primeira vivência em grupos de teatro que Paulo José experimenta o fazer teatral de uma forma holística e integral, pois o amadorismo dos grupos exigia que quem nele estivesse teria de assumir as mais diversas funções de um espetáculo, desde a venda dos bilhetes até a direção. Sua primeira participação no teatro estudantil foi em 1954 na peça Entre o Vermute e a Sopa, de Artur Azevedo, que estava sendo montada pelo Grupo Teatro Universitário do Rio Grande do Sul. Paulo José acabou fazendo papel de um personagem que não tinha fala: um criado clownesco que espanava os móveis e servia sua patroa. Paulo chegou a ser dirigido por e a dividir palco com o então estudante Antônio Abujamra na peça À Margem da Vida, de Tennessee Williams. Conhecido seu desde a época do colégio, Abujamra também iniciava ali sua carreira de ator e diretor, tornando-se um

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dos fundadores do Grupo Teatro Universitário e também diretor do Departamento de Teatro da União Estadual dos Estudantes. Nessa época, Paulo recebeu, pela primeira vez, por um trabalho no teatro, não como ator, mas como maquiador de um presépio vivo armado em uma praça de Porto Alegre. São José, Nossa Senhora e o Menino Jesus foram personagens maquiados. O serviço foi contratado pela Prefeitura e os conhecimentos de maquiagem vinham da vivência no teatro ainda no colégio em Bagé onde aprendeu técnicas de teatro clássicas, do circo e da pantomima. Em 1958, integrou o elenco de Poetas e Poemas, dirigido por Mário de Almeida, que estava como diretor do Grupo Teatro Universitário, em cujo espetáculo eram dramatizadas poesias de importantes poetas brasileiros. A peça fez sucesso e rendeu uma apresentação no Uruguai que acabou sendo assistida por Vinícius de Moraes, que na época atuava como diplomata pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil naquele país. O Poetinha chegou a fazer uma crítica de “pé de orelha” para o próprio Paulo José dizendo que a interpretação do poema “A Mensagem a Rubem Braga”, de autoria do próprio Vinícius, fora feita de forma equivocada pelo jovem e iniciante ator. Ao voltar do Uruguai, juntamente com Mário de Almeida, Paulo César Peréio e Milton Mattos, que também faziam parte do espetáculo; Paulo José participou da criação do Teatro Equipe, grupo do qual fez parte atores como Lilian Lemmertz, Ítala Nandi, Nilda Maria e Fernando Peixoto. Um dos objetivos da nova companhia era o de buscar a profissionalização e apresentar um teatro autêntico voltado à realidade brasileira. Ainda em 1958, o grupo faz sua estreia com os espetáculos Esperando Godot, de Samuel Beckett, sob a direção de Luiz Carlos Maciel; e Rondó 58, com dramatizações de textos de poetas brasileiros – primeiro trabalho assinado por Paulo José co-dirigido com Mário de Almeida. Com um espaço fixo para ensaios, o Teatro Equipe se manteve ativo quatro anos e realizava suas apresentações no Teatro Belas Artes ou no Teatro São Paulo. Entretanto, o teatro amador gaúcho começou a ficar limitado para Paulo José. Se, por um lado, aquela experiência já lhe havia possibilitado conhecer as mais diversas atividades do fazer teatral; por

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outro, ele sentia necessidade de buscar aprimorar-se mais ainda na área. Para isso, Paulo almejava bolsa de estudos no Teatro Nacional Popular (TNP), na França. Ele se espelhava no ator francês Gérard Philippe e queria estudar com Jean Villar, um dos mais importantes diretores franceses daquele período. Em 1960, o Teatro de Arena esteve em Porto Alegre para compor o elenco do espetáculo Revolução na América do Sul, de Augusto Boal. Paulo José se identificou instantaneamente com a proposta do grupo paulista e, juntamente com o ator Fernando Peixoto, foi convidado a ir para São Paulo e atuar na peça. No ano seguinte, ele já estava morando em São Paulo e ainda desejava conseguir uma bolsa para estudar teatro na Europa. Criado em 1953, o Teatro de Arena surge como uma resposta estético-política ao Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), que possuía um repertório sofisticado de peças muito vinculado à dramaturgia internacional. O Arena fora criado com as perspectivas de montar espetáculos de baixo custo, de afirmar-se como alternativa no circuito teatral paulistano e de apresentar textos que refletissem a realidade. No Arena, Paulo José estreou como ator em O Testamento do Cangaceiro, de Chico de Assis, sob a direção de Augusto Boal. Seu papel era de um violonista e, para isso, foram muito úteis os conhecimentos em música que aprendera em Bagé. A direção musical do espetáculo era de Carlos Lyra. Em 1962, ele também assumia, pela primeira vez, a direção de peças do grupo com Eles Não Usam Black Tie, de Gianfrancesco Guarnieri, no Teatro de Arena do Rio de Janeiro. Logo nos primeiros anos de companhia, Paulo começa a percorrer o interior do Brasil com os espetáculos do Teatro de Arena em apresentações feitas ao ar livre ou em espaços não convencionais. Era uma época de grande ebulição político-cultural, o que possibilitou um grande aprendizado sobre brasilidade e cultura popular para o recém-chegado gaúcho na Pauliceia. Vindo de uma vivência dramatúrgica mais vinculada à tradição europeia, Paulo se percebe em meio ao nascimento de um teatro brasileiro inovador e, por fim,

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sua ideia de estudar na Europa deu lugar à paixão pela fervilhante dramaturgia que estava sendo inventada ali bem diante dos seus olhos pelo Teatro de Arena. Era o povo brasileiro que passava a ser o personagem central da criação dramatúrgica. Esse posicionamento ideológico do Teatro de Arena também implicava em construir outra forma de interpretação e de construção de personagens, sem impostação, sem a qualidade gestual do teatro convencional, com muito mais espontaneidade e assumindo a precariedade como elemento estético. No Arena, Paulo José também pôde vivenciar o fazer teatral de forma ampla. Além de ator e diretor, ele foi figurinista, cenógrafo, iluminador, tradutor, produtor executivo e ainda chegou a assumir a administração dos espaços do grupo em São Paulo e no Rio de Janeiro. Os três anos do curso de Arquitetura também contribuíram para a confecção de cenários para espetáculos e, nessa empreitada, foi seu parceiro de criação o cenógrafo e artista plástico Flávio Império que colaborou em alguns trabalhos. Em 1962, Paulo fez a cenografia e o figurino para a peça Mandrágora, de Maquiavel, dirigida por Augusto Boal. Faziam parte do elenco do espetáculo Fauzi Arap, Gianfrancesco Guarnieri, Isabel Ribeiro, Juca de Oliveira, Maria Alice Vergueiro, Milton Gonçalves, Paulo José e Riva Nimitz. No ano seguinte, por esse trabalho de figurino, ele recebeu o Premio Molière e o Prêmio Padre Ventura, concedido pela Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Em 1964, ano do Golpe Militar, Paulo José estava atuando e dirigindo a peça O Filho do Cão, de Giafrancesco. O espetáculo contava um elenco formado Abrahão Farc, Ana Maria Cerqueira Leite, Antero de Oliveira, Dina Sfatt, Gianfrancesco Guarnieri, Isabel Ribeiro, Joana Fomm, João José Pompeo, Juca de Oliveira e Rubens Campos. O Teatro de Arena, assim como outros espaços culturais, foram fechados pela Ditadura. Enquanto Juca Ferreira Gianfrancesco Guarnieri foram para a Bolívia, e Augusto Boal foi para uma fazenda no interior de São Paulo, Paulo José e Flávio Império ficaram escondidos na cobertura de Cacilda Becker e Walmor Chagas situada na esquina da Avenida Paulista com o Trianon

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No mesmo ano, Augusto Boal retorna para São Paulo, reabre o Arena e dirige a peça Tartufo, de Moliére, com figurino e cenografia de Paulo José. Nos anos seguintes, o grupo passa a apresentar espetáculos musicais como o Opinião, Arena Canta Zumbi, Arena Canta Bahia e Tempo de Guerra. Em 1966, o Arena estreia O Inspetor Geral, de Nikolai Gogol, com a direção de Boal e a cenografia de Paulo José. Em 1968, o Ato Constitucional nº 5 de 13 de dezembro deu à Ditadura Militar todos os poderes, como o fim das liberdades individuais, o direito de reunião, o fechamento do Congresso e outras medidas que puseram um ponto final nas atividades do Arena e do Cinema Novo. No início de 1969, Paulo José e Dina Sfat, recém-casados, viajam com o Arena para um festival em Nancy, na França. Ao embarcar, o grupo tinha a clareza de que aquela seria sua última apresentação e que, por isso, optam por dissolver-se durante a viagem. Devido à censura e à repressão da Ditadura, eles sabiam que, ao retornarem para o Brasil, aquele tipo de trabalho teatral seria considerado uma prática subversiva e perseguida pelo Regime Militar. Paulo e Dina decidem ficar na Europa, onde permaneceram até o final daquele ano. Após seu retorno, Paulo José se afastou, por uns anos, do teatro e passou a trabalhar mais intensamente no cinema e na televisão. Em 1975, ele voltou aos palcos atuando e dirigindo Mandrágora, de Maquiavel, peça montada no Teatro Casa Grande, no Rio de Janeiro. Nesse mesmo ano, dirigiu a atriz Regina Duarte na peça Reveillon, de Flávio Márcio, trabalho pelo qual, dois anos depois, recebeu o Prêmio Governador do Estado de São Paulo. Desde então, passou a fazer menos trabalhos de ator e mais de direção. Doze anos depois, recebeu outro importante prêmio do teatro: o Prêmio Molière por seu trabalho como ator em Delicadas Torturas, de Harry Kondoleon, peça dirigida por Ticiana Studart e que também contou com as atrizes Zezé Polessa e Lília Cabral no elenco. Em 2000, a convite do jornalista e cineasta Pedro Bial, fez a direção de Controvérsia, de Jean Claude Carrière. O texto, em sintonia com a comemoração dos 500 anos do Descobrimento do Brasil, ence-

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nava o debate que ocorrera na Europa em 1951 para definir se os índios possuíam ou não uma alma. Consagrada pela crítica, a peça foi montada no Teatro Glória, no Rio de Janeiro, e tinha no elenco Matheus Nachtergaele, Otávio Augusto, Ivan de Albuquerque, Ruy Polanah, além do próprio Paulo José. Em uma nova experiência de grupo, Paulo atuou, em 2002, como diretor convidado de uma das mais atuantes e inventivas companhias de teatro brasileiras: o Grupo Galpão, de Belo Horizonte. Essa vivência, além de ter se desdobrado na realização de espetáculos, possibilitou uma retomada dos estudos e pesquisas teatrais que ele até empreendera junto ao Arena e ao Teatro Universitário de São Paulo – grupo do qual também foi coordenador e diretor até o final dos anos de 1960. Em 2009, Paulo dirigiu Um Navio no Espaço ou Ana Cristina César, montagem feita a partir de textos da poetisa Ana Cristina César e roteirizada por Maria Helena Kühner. Dividindo o palco com sua filha Ana Kutner, esse foi seu último trabalho como ator. Desse ano para cá, ainda consta em seu currículo a direção de outros três espetáculos teatrais.

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“Minha experiência com cinema foi meio dolorosa, pois eu era muito solidário com o diretor do filme”





Um mergulho no ofício de ator Enquanto nos palcos Paulo José construiu uma carreira marcada pela polivalência, no Cinema ele se aprofundou no ofício de ator: “Eu tinha que dar conta de tudo e não mergulhava no personagem, pois o que me interessava era o conjunto mais amplo do fazer teatral. Enquanto os atores estavam trabalhando seus personagens, eu estava ocupado com a cenografia, com o figurino, com a luz ou com a produção. Achava isso mais nobre, considerava os atores egoístas e pequenos por baterem no peito e dizerem ‘meu personagem’. Eu trabalhava como ator, mas sempre no lugar de alguém, pois em teatro de grupo todo mundo tinha que fazer alguma coisa, inclusive no palco. Eu não tinha muita convicção; era mais uma coisa externa. Quando fui fazer cinema, aí sim entendi o sentido do trabalho do ator. Quando fui atuar em um filme pela primeira vez, já estava tudo pronto: o cenógrafo pra fazer o cenário, o diretor de fotografia pra fazer a luz, o elenco todo já preparado e assim por diante. Só me restava atuar”. Desde Bagé, Paulo tem uma relação de proximidade com o Cinema. Em sua infância e adolescência, foi assíduo frequentador das sessões com filmes de faroeste e seriados com super-heróis. Anos depois, em Porto Alegre, passou a visitar o Clube do Cinema, uma associação cineclubista criada pelo jornalista Paulo Gastal sempre que realizava exibições e debates. Contudo, até 1965, a sétima arte continuava como apenas o lugar do encantamento e da fruição do cinéfilo e não como um espaço de atuação. É nesse ano que inicia sua carreira de ator no Cinema. “Meu primeiro trabalho no cinema foi no filme O Padre e A Moça, de Joaquim Pedro de Andrade. Eu acabei fazendo o papel do padre, personagem-protagonista, que ia ser interpretado pelo artista plástico Luiz Jasmin. Joaquim, também tinha convidado a Helena Ignez (mulher do Glauber Rocha) para fazer a moça, além do Fauzi Arap

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e o Mário Lago. Dois dias antes do início das filmagens, com tudo preparado, Luiz Jasmin é diagnosticado com hepatite e teve que ficar, pelo menos, dois meses de repouso. A produção do filme parou e o desespero foi batendo na equipe. A mulher do Joaquim, a Sarah de Castro, lembrou que tinha me assistido na peça Mandrágora. Aí me convidaram de última hora pra fazer o filme. Eu tinha inveja do Fauzi Arap, que também era do Arena e já tinha feito cinema. Era uma inveja saudável!”. As filmagens de O Padre e A Moça foram em São Gonçalo do Rio das Pedras, um distrito localizado na região do alto Jequitinhonha, em Minas Gerais. No primeiro dia no set, Paulo experimenta o figurino do personagem: uma batina. Devido à mudança repetina, a produção não obtivera tempo hábil para adaptar a roupa às medidas do novo integrante do elenco. “A batina era muito grande. Aí ficou aquele impasse, uma coisa desagradável, uma saia justa. Aí o Eduardo Escorel, que era assistente de direção de Joaquim, com muito bom senso, disse o seguinte: ‘Corta a manga, encolhe a roupa’. Aí eu falei: ‘É isso aí! Se não pode esticar o ator, encolhese a roupa’. Então acharam a solução e deram uma apertadinha na batina. Como eu não tinha nada pra fazer a não ser o papel, eu o fazia com afinco ao ponto de as mulheres da cidade começarem a ver-me como padre. Algumas delas vinham pedir-me a confissão e eu dizia que não podia, pois era apenas um seminarista que ainda não tinha diploma de padre. Era um lugar morto apesar de no passado ter sido próspero devido à extração de diamantes. Tinha duas matrizes; uma em cada lado das margens do Rio Jequitinhonha. Quando chegamos lá pra fazer o filme, a produção construiu a ponte, pois a antiga havia sido levada por uma enchente. Foi uma alegria pra cidade. Foram maravilhosos três meses e meio!”. A condução das filmagens de O Padre e A Moça foi feita de forma severa e rigorosa por Joaquim Pedro de Andrade que estava realizando o segundo longa-metragem. Para um ator que vinha de uma experiência teatral transgressiva e esfuziante, a atuação para o cinema exigia outra forma de interpretar, menos melodramática, com uma expressividade mais comedida. Em sua primeira prova no cinema, essa foi a lição que Paulo aprendeu com Joaquim.

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O clima político da época estava tenso e desencadeava certo patrulhamento ideológico, especialmente no meio artístico-cultural. Por isso, a participação de Paulo José no filme de Andrade acabou recebendo críticas. Para algumas pessoas e organizações políticas, a temática do filme – o romance entre um padre e uma moça em um lugarejo no interior do Brasil – era equivocada para aquele contexto de Ditadura. A União Nacional dos Estudantes – UNE, por exemplo, ameaçou fazer confusão na estreia do longa, mas a exibição transcorreu sem qualquer incidente. Em 1967, Paulo recebe o Prêmio Saci do jornal O Estado de São Paulo pela sua atuação nesse filme. No ano seguinte, as críticas foram ainda mais intensas devido à sua atuação na comédia carioca Todas as Mulheres do Mundo, primeiro longa-metragem de Domingos de Oliveira. Agindo de maneira contrária à vontade de pessoas próximas, Paulo pediu licença do Arena de São Paulo e foi para o Rio de Janeiro trabalhar no filme. O roteiro de Todas as Mulheres do Mundo havia sido escrito por Domingos de Oliveira como forma a tentar ter de volta o amor da atriz Leila Diniz, com quem o diretor fora casado por três anos e da qual havia se separado no ano anterior às filmagens. Modelo de beleza e de transgressão, Leila protagonizou esse longa-metragem que a imortalizou como ícone feminista daquela época. Também fizeram parte do elenco Flávio Migliaccio, Joana Fomm e Ivan de Albuquerque. Inicialmente, Oliveira o escrevera para ser um média-metragem cuja sequência da história seria Edu Coração de Ouro (1967), que se tornou o terceiro longa na carreira de Paulo José. A participação em Todas as Mulheres do Mundo rende o seu segundo prêmio na carreira de ator de Cinema: o Troféu Candango de Melhor Ator pelo II Festival de Cinema de Brasília em 1966. Entre 1965 e 1968, ele atua em outros seis filmes: Bebel, Garota Propaganda, de Maurice Capovilla; As Amorosas, de Walter Hugo Khoury; O Homem Nu, de Roberto Santos; Os Marginais, de Carlos Alberto Correa; Vida Provisória, de Mauricio Gomes Leite; e Como vai, vai bem?, de Alberto Salvá, Carlos Alberto Abreu, Carlos Alberto Camuyrano, Daniel Chutorlanscy, Valquíria Salvá e Paulo Veríssimo. Com apenas dois anos de presença na telona,

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Paulo José já recebia o Prêmio de Melhor Ator pelo conjunto de seus trabalhos no cinema, reconhecimento concedido pelo Instituto Nacional de Cinema. Em 1969, atua em Macunaíma, aclamada comédia de Joaquim Pedro de Andrade, baseada no romance homônimo de Mário de Andrade, que se torna marco do Cinema Novo. Amigo e frequentador da casa do diretor desde O Padre e A Moça (1965), Paulo, até então escalado para fazer o papel da Mãe do Macunaíma, viu de perto a escolha do elenco que contava com Grande Otelo, Dina Sfat, Jardel Filho, Milton Gonçalves, Joana Fomm, Rodolfo Arena, entre outros. Após a distribuição dos papéis, Joaquim chega a um impasse para definir quem interpretaria Macunaíma quando branco. Paulo possuía o desejo de fazer o personagem, mas era o confidente das angústias do diretor diante o impasse na escolha do ator para o papel. Por isso, não externava as suas pretensões. “Eu estava ao lado dele todos os dias e pensava ‘por que ele não me chama?’, como custou! Ele me perguntava ‘o que você acha de tal ator?’ e eu respondia ‘é perfeito, é o próprio Macunaíma’ e elogiava todas as indicações. Até que um dia ele perguntou: ‘topa operar seu nariz? Se você operar o nariz, o papel do Macunaíma Branco é seu. Você tem um nariz difícil de fotografar, porque de perfil é fininho, mas é batatudo de frente’. Eu disse que não iria operar. No dia seguinte, o Joaquim chegou pra mim e disse ‘pensando bem, você até tem o nariz do personagem: é europeu de perfil, negro de frente, e mameluco e cafuzo nos três quartos’. Ou seja, era um pouco de tudo, a própria síntese do homem brasileiro”. Macunaíma é um marco do cinema brasileiro. Uma obra autêntica que imprime uma estética inovadora ao misturar o Cinema Novo com as chanchadas sob uma narrativa épica com elementos tropicalistas e da cultura popular. Por outro lado, foi essa originalidade do filme que dificultou a sua posterior distribuição no mercado após a finalização. “Fomos de Seca a Meca, rodamos por todos os distribuidores para negociar o filme. Nós assistíamos ao filme com o exibidor na cabine da Líder, que era o laboratório da época, e ficava aquele silêncio quando acabava o filme. Daí o exibidor falava

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‘acho que o povo não vai entender, não tenho interesse no filme’”. Para um circuito mais convencional de cinema e até para a crítica especializada da época, faltavam parâmetros para classificar e entender Macunaíma, ao contrário do público que o recebia como se fosse uma comédia popular. Com uma carreira de importantes festivais internacionais, Macunaíma chegou a ser exibido na França em sessões distintas, com as presenças do antropólogo Claude Lévi-Strauss e do sociólogo Roger Bastide. Pela sua atuação, Grande Otelo recebeu prêmios em diversos festivais. No mesmo ano do filme, Paulo foi premiado como Melhor Ator pelo 1º Festival de Cinema do Norte, em Manaus. Paulo José traz no currículo cerca de 40 filmes nos quais foi ator. Ao longo de sua carreira, sempre esteve preocupado em interpretar roteiros com os quais se identificava. Na década de 1970, também se aventurou na produção executiva dos longas-metragens: Deuses e os Mortos, de Ruy Guerra; e A Culpa, de Domingos de Oliveira. Crente em um cinema autenticamente brasileiro, procurou envolver-se com filmes autorais e de menor custo, em detrimento de grandes projetos orientados pelo sucesso de bilheteria. “Minha experiência com cinema foi meio dolorosa, pois eu era muito solidário com o diretor do filme. Eu sempre privilegiava o cinema autoral, onde o diretor também era o produtor, geralmente com um investimento pessoal no projeto e feito com muita dificuldade, pois o plano não era comercializar o filme”. Sua última participação no cinema foi em 2010 no filme O Palhaço, segundo longa-metragem dirigido por Selton Mello. “O fato de eu ter Parkinson me fez ter uma certa resistência a fazer cinema. Em 2002, havia feito Benjamim por insistência da diretora Monique Gardenberg. Me sentia velho, doente e cansado, mas ela insistia muito. Foi tão incondicional o voto de confiança dela que eu acabei aceitando. Já em Saneamento Básico, o Jorge Furtado me ofereceu um personagem que eu conhecia muito bem, aquele típico gaúcho colono e seu jeito de falar. Eu sabia como fazer aquilo, por isso não me preocupei – diferente do personagem de Benjamim, que era de uma outra classe social, um carioca; isso ficava mais difícil pra

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mim. N’O Palhaço, eu também resisti bastante e aconteceu algo parecido com a escolha do elenco para Macunaíma. O Selton, que na época era meu vizinho, ficava dando voltas e não achava o ator para fazer o palhaço pai. É aquela dificuldade do autor que tem para entregar um personagem que lhe é muito querido; há uma certa avareza e ciúme. A Kika, minha esposa, foi a figurinista do filme. A produção já caminhava e foi ela que sugeriu ao Selton que eu fizesse o personagem. Eu me sentia bem, seguro pra fazer o papel. E decidi topar. No primeiro encontro que tive com o Selton para falar sobre o filme, já fui com nariz e sapatos de palhaço!”. Lançado em 2011, O Palhaço circulou diversos festivais, foi amplamente premiado e chegou a fazer parte da lista dos possíveis filmes estrangeiros para concorrer ao Prêmio de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar de 2013. Pela sua atuação nesse longa, Paulo José recebeu alguns prêmios. Entre eles, o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro de 2012 na categoria Melhor Ator Coadjuvante.

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“Nunca tive preconceito com a televisĂŁo por ser um produto da cultura de massaâ€?





Um inventivo diretor de TV No teatro, Paulo José traçou uma trajetória de atividades múltiplas e, sempre preocupado em viver a arte teatral na sua totalidade, buscou desenvolver um processo de criação quase artesanal. No cinema, dedicou-se de maneira quase exclusiva ao ofício de ator. Já na televisão, apesar de em termos absolutos ter no currículo mais trabalhos como ator, sua maior dedicação foi à direção. Ele foi contratado pela TV Globo do Rio de Janeiro no final de 1969 e chegou a receber, na época, uma proposta para ir trabalhar na TV Tupi, a convite da autora de novela Glória Magadan. A disputa entre os dois canais lhe possibilitou um bom salário; isso era resultado, em parte, do sucesso do filme Macunaíma que fora lançado naquele mesmo ano. Praticamente toda a sua carreira na TV foi na Globo; com exceção, justamente, de seu primeiro trabalho para esse meio. No início daquela década, junto com o Arena, Paulo trabalhou sob a direção ´ de Zbigniew Marian Ziembinski em Os caminhos da medicina, uma série escrita por Walter George Durst e veiculada pela TV Excelsior, em São Paulo. Seu início como ator na emissora carioca foi em 1972 no papel do fotógrafo Zé Mário, personagem da novela Véu de Noiva, de Janete Clair. Em um dos ensaios da novela, Daniel Filho, que era o diretor, surpreende a todos e pede que Paulo dirija uma das cenas do texto. Paulo aceita o desafio e faz a direção. Antes disso, em 10 de dezembro de 1971, a Globo exibiu A Pérola, o quarto episódio do programa Casos Especiais e a estreia de Paulo José como diretor na televisão. O roteiro era uma adaptação do romance homônimo do escritor americano John Steinbeck feita por Dias Gomes e tinha os atores Tarcísio Meira e Dina Sfat no elenco. Uma atualização do teleteatro, o Casos Especiais apresentava histórias feitas a partir de textos inéditos ou de adaptações de filmes, de peças de teatro e de obras literárias. Menos comprometido com

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a audiência do que com as obras seriadas, o formato do programa possibilitava uma considerável experimentação. Os modos de produção e de direção dos episódios também estavam mais próximos do cinema do que da telenovela. Paulo dirigiu mais de vinte episódios do Casos Especiais. Ainda em 1972, Paulo José, junto com Flávio Migliaccio, seu amigo e companheiro do Arena, entra para o elenco da novela O Primeiro Amor, de Walter Negrão, sob a direção de Régis Cardoso. No folhetim, eles interpretavam os atrapalhados mecânicos Shazan e Xerife que, na condução da “camicleta” – uma mistura de cama e bicicleta, ofereciam seus serviços de consertos e faziam a alegria da cidade de Nova Esperança. O sucesso da dupla cômica se desdobrou no seriado infanto-juvenil Shazan, Xerife & Cia que estreou no final daquele ano e foi veiculada até março de 1974. “Foi um personagem que gostei muito de fazer. Havia uma identificação carinhosa e intensa do público. Nós íamos para os subúrbios do Rio de Janeiro fazer as gravações, pois as cenas eram praticamente todas externas. Aí tinha esse contato mesmo direto com as pessoas, era realista e gerava uma identificação com o povo. A gente viajava como o caminhãozinho pra fazer apresentações em circos. Chegamos a nos apresentar nos estádios do Mineirão, Beira Rio e Maracanã”. Na televisão, Paulo trabalhou como ator em 46 produções. Em muitas delas, sua participação foi pontual e breve, mas na maior parte de seu tempo de trabalho ele esteve ocupado com a direção de especiais e de minisséries ou atuando na criação de novos formatos de programa. Em 1978, dirigiu Ciranda, Cirandinha, um episódio do Casos Especiais que, devido ao sucesso de público, se desdobrou em uma série homônima que foi dirigida por Daniel Filho. Neste mesmo ano, ainda dirigiu Jorge, um brasileiro; outro episódio do programa e que tinha Antônio Fagundes como ator -protagonista. Esta obra também deu origem a uma outra série da TV: Carga Pesada – programa de Daniel Filho, com a direção de Gonzaga Blota e de Milton Gonçalves, que foi exibida de 1979 a 1981. Ainda na linha do teleteatro, em 1979, Paulo criou e dirigiu Aplauso, série ficcional que apresentava adaptações de peças de teatro para a televisão. O programa de estreia foi com a obra Ves-

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tido de Noiva, de Nelson Rodrigues, e tinha no elenco as atrizes Tônia Carrero e Suzana Vieira. “Nunca tive preconceito com a televisão por ser um produto da cultura de massa. Tive a sorte de entrar na TV nos anos de 1970, que foi um período de invenção da TV brasileira enquanto linguagem. A gente fazia uso da literatura brasileira, a chamada cultura superior, principalmente no Casos Especiais e nas minisséries. Estava ali todo o vocabulário brasileiro mais autêntico, eram histórias nascidas de escritores que criaram personagens densos, como São Bernardo, de Graciliano Ramos. Sempre achei que, do ponto de vista cultural, estávamos prestando um serviço ao trazer as pessoas para conhecerem autores como Érico Veríssimo, Jorge Amado, José Lins do Rego, entre outros. A nossa TV tinha a literatura como base e a literatura é uma coisa extremamente elaborada, com personagens bem elaborados e indestrutíveis mesmo quando maltratados pelo diretor ou pelo roteirista”. Em 1982, Paulo foi o responsável pela implantação do Caso Verdade. Uma resposta da TV Globo à audiência da programação popular da concorrente TV Tupi. Esse programa narrava, ao longo de uma semana, uma história cujo roteiro era baseado em fatos retirados de cartas enviadas pelos telespectadores. No último bloco da exibição de sexta-feira, o personagem real aparecia e atestava a autenticidade da história. Paulo José trabalhou por um ano no Caso Verdade dirigindo mais de trinta edições. Um aspecto menos conhecido em sua trajetória professional foi a sua inserção no mercado publicitário. Nas décadas de 1970 e 1980, ele dirigiu mais de duzentos comerciais para a televisão. “Inicialmente, fui chamado para dirigir comerciais na Globotec. Eram testemunhais com atores sobre produtos. Aí, fui me inteirando do mercado publicitário, que é um pouco restrito e fechado, mas, quando você consegue entrar nele, aparece um comercial por semana para fazer. Eu viajava para Porto Alegre, São Paulo ou Belo Horizonte para realizar esses trabalhos e ganhava muito mais dinheiro dirigindo pra publicidade do que com o Cinema. Era uma vingança minha contra a miséria do Cinema, pois era possível gastar uma

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fortuna na gravação de um plano de cinco segundos e ser criativo à vontade e se podia ter tudo numa produção: os melhores equipamentos ou os melhores efeitos de edição da época. No começo, fazia comerciais sobre qualquer coisa; era deslumbrado com a publicidade. Lembro-me de um comercial que gravamos na Avenida Rio Branco, aqui no Rio, ali na altura da Cinelândia. Era uma manhã de sábado ou domingo; eu no alto de uma grua fechando a avenida inteira, das seis até às oito da manhã. Depois de gravarmos o plano, a polícia liberava o trânsito e aquilo vinha fervendo. Aquele monte de veículos buzinando – putos – e eu lá em cima da grua! Eu achava magnífico, fantástico! Mas, de fato, não tem nenhum trabalho na publicidade de que gostei realmente de fazer”. Em 1983, Paulo ganhou o prêmio de Melhor Diretor de Comerciais, reconhecimento concedido pela Associação Brasileira de Propaganda. Na noite de 8 de abril de 1992, foi ao ar a primeira transmissão do Você Decide, programa que foi um marco enquanto proposta de interatividade para a narrativa televisiva, sendo exibido até agosto de 2000. Cada episódio apresentava uma história cujo desfecho era definido pelos telespectadores por meio de uma votação via telefone. Além de ter atuado na sua concepção e implantação, Paulo foi também o diretor geral ainda por dois anos e atuou na implantação desse formato de programa em diversos países como Espanha, Itália, Portugal, Suécia entre outros. Nas décadas de 1980 e 1990, Paulo também assinou a direção de minisséries que se tornaram marcos da dramaturgia televisiva. Em 1985, ele dirigiu O Tempo e o Vento, uma adaptação da obra de Érico Veríssimo feita pelo escritor Doc Comparato sob a colaboração de Regina Braga. Mesmo com apenas dois meses de pré-produção, um tempo curto para a dimensão do projeto, e sem o elenco definido, as gravações foram iniciadas e a equipe teve que desdobrarse até o ritmo de trabalho harmonizar-se. Dadas as condições de realização, para Paulo, O Tempo e o Vento foi um grande desafio professional, superado em parte pela possibilidade de tornar visíveis na televisão todas aquelas histórias e personagens que fizeram parte do imaginário de sua infância no interior do Rio Grande do Sul. No ano seguinte, essa obra foi premiada como a Melhor Série

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para TV pelo 8º Festival Internacional de Cinema Latino Americano de Cuba. Outros trabalhos de direção desse período foran as minisséries. Em 1993, dirigiu Agosto, uma adaptação feita por Jorge Furtado e Giba Assis Brasil do romance homônimo de Rubem Fonseca e que foi exibida entre agosto e setembro. No ano seguinte, fez a produção A Madona de Cedro, exibida em oito capítulos, com o roteiro baseado na obra de Antonio Callado e a direção e supervisão geral de Tizuka Yamasaki; e Incidente em Antares, uma adaptação de Nelson Nadotti e Charles Peixoto da obra de Érico Veríssimo. Ainda na década de 1990, o artista arrancou lágrimas do país inteiro interpretando o texto de Manoel Carlos na novela Por Amor, exibida entre 1997 e 1998. Seu papel foi o do anti-herói carismático e alcoólatra Orestes que, junto com a atriz mirim Cecília Dassi, intérprete da personagem Sandrinha – a filha de Orestes, protagonizou cenas emocionantes. Sua última participação na televisão foi também em uma obra escrita por Manoel Carlos, Em Família, exibida de fevereiro a março deste ano, em que interpretou o personagem Benjamim, um idoso com Mal de Parkinson – doença com a qual convive desde 1992. Desse encontro entre a vida real e a ficção folhetinesca, Paulo José nos presenteia com uma lição profundamente sartriana que foi a de transformar os limites da própria existência na matéria-prima de sua arte dramática.

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Teatro 1947 a 1953

Participação em todos os espetáculos teatrais do Colégio Nossa Senhora Auxiliadora e eventos do Centro Cultural Dom Aquino Correa. Estudos de piano, harmonia e solfejo no Instituto Municipal de Belas Artes. Bagé – Rio Grande do Sul

Ator Amador e Semiamador 1954 - O Muro, de Jean Paul Sartre. Tradução de Lineu Dias

Entre o Vermute e a Sopa, de Arthur Azevedo 1956 - À Margem da Vida, de Tenesse Williams 1957 - A Descoberta do Novo Mundo, de

Morvan Lebesque/Lope de Vega No Tempo do Amadorismo, de Silveira Sampaio 1958 - Romeu e Julieta, de William Shakespeare

Amor Por Anexins, de Arthur Azevedo A Almanjarra, de Arthur Azevedo Um Demorado Adeus, de Tenesse Williams A Farsa da Esposa Perfeita, de Edy Lima Esperando Godot, de Samuel Beckett Poetas e Poemas, poemas dramatizados de diversos autores Rondó 58, poemas dramatizados e recitais de crônicas

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Ator profissional 1961 - O Testamento do Cangaceiro, de Chico de Assis

Direção: Augusto Boal Teatro de Arena - São Paulo Revolução na América do Sul, de Augusto Boal Direção: José Renato Teatro de Arena – São Paulo 1962 - Eles Não Usam Black Tie, de Gianfrancesco Guarnieri

Direção: José Renato Teatro de Arena – São Paulo Os Fuzis da Senhora Carrar, de Bertolt Brecht Direção: José Renato Teatro de Arena – São Paulo 1963 - A Mandrágora, de Nicolau Maquiavel

Direção de Augusto Boal Teatro de Arena – São Paulo 1964 - O Filho do Cão, de Gianfrancesco Guarnieri

Direção de Paulo José Teatro de Arena – São Paulo 1965 - O Tartufo, de Molière

Direção de Augusto Boal Teatro de Arena – São Paulo Arena contra Zumbi, de Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri

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Teatro de Arena – Rio de Janeiro 1968 - Os Inconfidentes, baseado na obra de Cecília Meirelles

Direção: Flávio Rangel Teatro Municipal do Rio de Janeiro 1975 - A Mandrágora, de Nicolau Maquiavel

Direção de Paulo José Teatro Casa Grande – Rio de Janeiro 1977 - Eu me lembro (leitura), de Geraldo

Mayrink e Fernando Moreira Salles Direção de Paulo José 1985 - A Fonte da Eterna Juventude, de Tiago Santiago

Direção de Domingos de Oliveira Teatro Gláucio Gil – Rio de Janeiro 1987 e 1988 - Eu te Amo, de Arnaldo Jabor

Direção: Arnaldo Jabor Teatro de Arena - Rio de Janeiro 1988 e 1989 - Delicadas Torturas, de Harry Kondoleon

Direção de Ticiana Studart Teatro de Arena – Rio de Janeiro 1990 - Bukowski - Bicho Solto no Mundo, de Ticiana Studart

Direção: Ticiana Studart Teatro Nelson Rodrigues – Rio de Janeiro

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1991 - O Tiro que Mudou a História, de Aderbal

Freire Filho e Carlos Eduardo Novaes Direção: Aderbal Freire Filho Museu da República – Rio de Janeiro 2000 - A Controvérsia, de Jean Claude Carrière

Direção de Paulo José Teatro Glória – Rio de Janeiro 2009 - Um Navio no Espaço ou Ana Cristina César

Direção: Paulo José Teatro Oi Futuro Ipanema – Rio de Janeiro

Diretor 1958 - Rondó 58, com Mario de Almeida 1963 - Eles não Usam Black Tie, de Gianfrancesco Guarnieri

Teatro de Arena – Rio de Janeiro 1964 - O Filho do Cão, de Gianfrancesco Guarnieri

Teatro de Arena – São Paulo 1965 - Arena contra Zumbi, de Augusto

Boal e Gianfrancesco Guarnieri Teatro de Arena – Rio de Janeiro 1966 - Carnaval para principiantes, de Domingos

de Oliveira, Eduardo Prado e Flávio Migliaccio 1967 - A Mandrágora, de Nicolau Maquiavel

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1972 - Dorotéia vai a Guerra, de Carlos Alberto Ratton 1975 - Reveillon, de Flávio Márcio 1976 - Gata em Teto de Zinco Quente, de Tennesse Williams 1977 - Seis Personagens à Procura de Autor, de Luigi Pirandello 1977 - É..., de Millor Fernandes 1978 - Murro em Ponta de Faca, de Augusto Boal 1998 - Dercy Gonçalves - 90 Anos - Uma Lição de Vida 1980 - Em Família, de Domingos de Oliveira

Transaminases, de Carlos Vereza 1989 - Ponto Limite, de Ana Kfoury, Paulo José e Lu Grimaldi 2000 - A Controvérsia, de Jean-Claude Carrière

Teatro Glória - Rio de Janeiro 2001 - Na Solidão dos Campos de Algodão, de Bernard-Marie Koltès 2003 - O Inspetor Geral, de Nikolai Gogol. Direção e adaptação 2005 - Um Homem é um Homem, de Bertolt

Brecht. Direção e adaptação 2006 - Antonio e Cleópatra, de William

Shakespeare. Direção e adaptação 2009 - Um Navio no Espaço ou Ana Cristina César,

adaptação de Maria Helena Kuhner e Walter Daguerre 2011 - Histórias de Amor Líquido, de Walter Daguerre

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Murro em Ponta de Faca, de Augusto Boal 2012 - JT LeRoy – Um conto de Fadas Punk, de Luciana Pessanha

Cenógrafo 1957 - Romeu e Julieta, de William Shakespeare

A Farsa da Esposa Perfeita, de Edy Lima 1958 - Esperando Godot, de Samuel Beckett 1962 - A Mandrágora, de Nicolau Maquiavel 1963 - O Noviço, de Martins Penna 1964 - O Inspetor Geral, de Nikolai Gogol 1965 - O Tartufo, de Molière 1977 - Seis Personagens à Procura de Autor, de Luigi Pirandello 2003 - O Inspetor Geral, de Nikolai Gogol 2005 - Um Homem é um Homem, de Bertolt Brecht

Figurinista 1962 - A Mandrágora, de Nicolau Maquiavel 1963 - O Noviço, de Martins Penna 1964 - O Inspetor Geral, de Nikolai Gogol 1965 - O Tartufo, de Moliére

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Iluminador Hamlet, de William Shakespeare Nossa Cidade, de Thorton Wilder O Diabo Cospe Vermelho, de Maria Inês Barros de Almeida Seis Personagens à Procura de Autor, de Luigi Pirandello Marido Magro e Mulher Chata, de Augusto Boal Eles Não Usam Black Tie, de Gianfrancesco Guarnieri

Tradutor 1963 - O melhor juiz, O Rei, com Augusto Boal e

Gianfrancesco Guarnieri adaptação livre de Lope de Vega. Editora Brasiliense, Coleção Teatro Universal 1977 - Seis Personagens à procura de um autor, de Luigi Pirandello 1979 - O Beijo da Mulher Aranha, de Manuel Puig 2003 - O Inspetor Geral, com Cacá e o Grupo Galpão 2005 - Um Homem é um Homem, com o Grupo Galpão

Produtor Executivo 1963 - A Mandrágora, de Nicolau Maquiavel

Teatro de Arena - São Paulo e Rio de Janeiro 1963 - Eles Não Usam Black Tie, de Gianfrancesco Guarnieri

Teatro de Arena - São Paulo e Rio de Janeiro 1964 - O Tartufo, de Molière

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Teatro de Arena - São Paulo e Rio de Janeiro 1965 - A Arena Contra Zumbi, de Augusto

Boal e Gianfrancesco Guarnieri Teatro de Arena - Rio de Janeiro 1965 - O Inspetor Geral, de Nikolai Gogol

Teatro de Arena – São Paulo 1966 - Carnaval para Participantes, de Domingos

de Oliveira, Eduardo Prado e Flavio Migliacio Teatro de Arena – Rio de Janeiro 1974 - O Colecionador, de John Fowles 1989 - Ponto Limite, de Ana Kfoury, Lu Grimaldi e Paulo José

Administrador Teatral 1963 a 1964 - Diretor administrativo do Teatro de Arena – São Paulo e Rio de Janeiro 1966 - Diretor Administrativo do Teatro de Arena do Rio de Janeiro

Outras atividades 1954 a 1960 - Contrarregra, assistente de direção, maquiador,

maquinista etc. em diversos espetáculos do Teatro Universitário e Teatro de Equipe de Porto Alegre Animador, diretor e escritor de Teatro de Fantoches de Porto Alegre 2002 - Oficina com o Grupo Galpão

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Cinema Ator 1965 - O Padre e a Moça, de Joaquim Pedro de Andrade 1966 - Todas as Mulheres do Mundo, de Domingos de Oliveira 1967 - Edu, Coração de Ouro, de Domingos de Oliveira

As Amorosas, de Walter Hugo Khoury 1968 - Bebel, Garota Propaganda, de Maurice Capovilla

O Homem Nu, de Roberto Santos Os Marginais, de Carlos Alberto Correa Vida Provisória, de Maurício Gomes Leite Como vai, vai bem?, de Alberto Salvá, Carlos Alberto Abreu, Carlos Alberto Camuyrano, Daniel Chutorlanscy, Valquíria Salvá e Paulo Veríssimo 1969 - Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade 1971 - A Culpa, de Domingos de Oliveira

Gaudêncio, o Centauro dos Pampas, de Fernando Amaral 1972 - Cassy Jones, O Magnífico Sedutor, de Luiz Sergio Person 1975 - O Rei da Noite, de Hector Babenco 1982 - O Homem do Pau Brasil, de Joaquim Pedro de Andrade

A Difícil Viagem, de Geraldo Moraes 1988 - O Mentiroso, de Werner Schnemman 1989 - Faca de Dois Gumes, de Murilo Salles

Dias Melhores Virão, de Cacá Diegues 1991 - A Grande Arte, de Walter Salles Jr.

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1994 - Os Moradores da Rua Humboldt, de Luciano Moura 1996 - Cheque Mate, Ricardo Bravo 1997 - Anahy de Las Misiones, de Sérgio Silva 1998 - Policarpo Quaresma, Herói do Brasil, de Paulo Thiago 1999 - Outras Estórias, de Pedro Bial 2001 - O Poeta das Sete Faces, de Paulo Thiago 2002 - O Casal dos Olhos Doces, de Felipe Rodrigues

Dias de Nietzsche em Turim, de Júlio Bressane Morte, de José Roberto Torero 2003 - O Homem que copiava, de Jorge Furtado 2004 - O Vestido, de Paulo Thiago

Benjamim, de Monique Gardenberg Como Fazer Um Filme de Amor, de Jose Roberto Torero 2005 - 500 Almas, de Joel Pizzini 2006 - Saneamento Básico – O Filme, de Jorge Furtado 2007 - Juventude, de Domingos Oliveira

Pequenas Histórias, de Helvécio Ratton 2008 - O Teu Sorriso, de Pedro Freire

Insolação, de Felipe Hirsch A Festa da Menina Morta, de Matheus Nachtergaele 2009 - Meu País, de André Ristum

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A Morte de Quincas Berro D’água, de Sérgio Machado 2010 - O Palhaço, de Selton Mello

Produtor Executivo 1971 - Os Deuses e os Mortos, de Ruy Guerra

A Culpa, de Domingos de Oliveira

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Televisão Outras atividades 1998 a 1999 - Oficina de direção – TV Globo 2002 a 2003 - Oficina de direção – TV Globo 2008 - Assessoria – Controle de originalidade e qualidade de

sinopses e argumentos para Central Globo de Produção

Ator 1969 - Véu de Noiva, novela de Janete Clair 1970 - Assim na Terra Como no Céu, novela de Dias Gomes 1971 - O Homem que Deve Morrer, novela de Janete Clair 1972 - O Primeiro Amor, novela de Walter Negrão 1973 a 1974 - Shazan, Xerife & Cia, seriado 1974 - Super Manuela, novela de Walter Negrão

Somos Todos do Jardim de Infância, caso especial de Domingos de Oliveira 1976 - O Casarão, novela de Lauro César Muniz

Meu Primeiro Baile, caso especial de Janete Clair 1979 - O ovo, tele-peça de Eugène Ionesco

A consulta, tele-peça de Ligia Fagundes Telles Albertine Disparue, tele-peça de Fernando Sabino Riso na Cara, tele-peça 1982 a 1983 - Caso Verdade, participação em diversos episódios

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1983 - Feliz Ano Novo, Quarta Nobre de Euclides Marinho

O Santo Milagroso, Quarta Nobre de Lauro César Muniz 1984 a 1985 - O Tempo e o Vento, minissérie de Érico Veríssimo 1986 a 1987 - Armação Ilimitada, participação em vários episódios 1987 - Roda de Fogo, novela de Lauro César Muniz 1988 - Vida Nova, novela de Benedito Rui Barbosa

Sampa, minissérie de Gianfrancesco Guarnieri 1989 - Tieta, novela de Aguinaldo Silva 1991 - Araponga, novela de dias Gomes,

Ferreira Gullar e Lauro C. Muniz As Pessoas da Sala de Jantar, caso especial de Gianfrancesco Guarnieri 1991 - Vamp, novela de Antônio Calmon, direção de Jorge Fernando 1992 - O Desaparecido e Mal Secreto, episódios de Você Decide

Somos Todos do Jardim de Infância, caso especial de Domingos de Oliveira 1993 - O Mapa da Mina, novela de Cassiano Gabus Mendes

Isca de Policia, episódio da série Você Decide Olho no Olho, novela de Antônio Calmon 1994 - Madona de Cedro, minissérie de Antônio Calmon

A Dívida, episódio de Você Decide de Ana Maria Nunes 1995 a 1996 - Explode Coração, novela de Glória Perez 1997 - Por Amor, novela de Manoel Carlos

Luna Caliente, minissérie de Carlos Gerbase, Giba Assis Brasil e Jorge Furtado

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O Rio de Machado de Assis, documentário para TV dirigido por Kika Lopes 1998 - Labirinto, minissérie de Gilberto Braga 1999 a 2000 - A Muralha, minissérie de Denise Sarraceni 2001 - Um Anjo que Caiu do Céu, novela de Antônio Calmon 2003 - Agora é que São Elas, novela de Ricardo Linhares 2008 - Casos e Acasos, série de Carlo Milani

Capitu, minissérie de Luiz Fernando Carvalho Ciranda de Pedra, novela de Denise Sarraceni 2009 - Caminho das Índias, novela de Glória Peres 2011 - Morde e Assopra, novela de Walcir Carrasco 2014 - Em Família, novela de Manuel Carlos

Diretor 1972 - O Primeiro Amor, novela de Walter Negrão

Direção dos 10 últimos capítulos 1972 - A Pérola, caso especial de Dias Gomes/John Steinbeck, 1977 a 1978 - Quem Era Shirley Temple, caso especial de Osman Lins

Solidão, caso especial de Gianfrancesco Guarnieri Jorge, Um Brasileiro, caso especial de Oswaldo França 1978 - Jardim Selvagem, tele-peça de Ligia Fagundes Telles

O Caminho das Pedras Verdes, tele-peça de Paulo Mendes Campos Feliz Aniversário, de Clarisse Lispector e Antonio Carlos Fontoura 1978 a 1979 - Ciranda, Cirandinha, série de Paulo Mendes Campos

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1979 - Aplauso, 26 programas de teatro

para TV, criação e direção: - Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues - A Ilha das Cabras, de Ugo Betti - Um Grito Parado no Ar, de Gianfrancesco Guarnieri - O Ovo, de Eugène Lonesco - A Rainha do Agreste, de Ferreira Gullar - Duas ou Três Coisas sobre João Guimarães, O Rosa, colagem de textos de Guimarães Rosa - O Preço, de Artur Miller - As Pequenas Raposas, de Lílian Hellmann - Riso Na Cara, diversos textos de humor 1980 - Carga Pesada, de Gianfrancesco

Guarnieri, Ferreira Gullar e outros O Dia que Waldik Soriano foi a Sucupira, de Dias Gomes, Episódio da série O Bem Amado 1982 - Caso Verdade, criação e direção. Programa diário

Direção dos episódios: O Menino do Olho Azul, O Caso Cândida, O Caso Márcia e Gorda Sim, Por que Não 1983 - São Bernardo, de Graciliano Ramos

Adaptação de Lauro César Muniz. Quarta Nobre Casal Vintém, de Euclides da Cunha. Quarta nobre 1984 a 1985 - O Tempo e o Vento, de Erico Veríssimo

Adaptação de Doc Comparato. Minissérie 1987 - Expresso Brasil, de Dias Gomes

Mini novela em 40 capítulos de Dias Gomes 1991 - O Caso do Martelo, de José Clemente Pozzenato

Episódio do Terça Nobre 1992 a 1993 - Você Decide, Direção Geral da série

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1993 - Agosto, de Rubem Fonseca

Adaptação de Jorge Furtado e Giba Assis Brasil 1994 - Madona de Cedro, de Antonio Callado

Supervisão geral e direção de Tizuka Yamasaki Incidente em Antares, de Érico Veríssimo Adaptação de Nelson Nadotti e Charles Peixoto 1995 - Família Brasil, 30 quadros de humor para

a serie jornalística Contagem Recressiva 2007 - Palavras, Programa sobre poesia apresentado

em quatro episódios no Fantástico

Produtor Executivo 2000 - João do Rio e a Alma Encantadora das Ruas

Documentário dirigido por Kika Lopes para o canal GNT 2005 - Grupo Galpão – 20 Anos de Estrada

Documentário dirigido por Kika Lopes e André Amparo

Narração O Índio de Casaca Bocaina, Caminhos do Alto Chico Buarque, Francisco Ilha das Flores, de Jorge Furtado Guerra dos Meninos O Sorriso do Lagarto Os Carvoeiros João do Rio e a Alma Encantadora das Ruas, de Kika Lopes Tom Jobim, Show nº 1 Krajcberg – O Poeta dos Vestigios Animal Planet – Canal Discovery Net Works O Mundo cabe numa cadeira de barbeiro, de Roberto Torero Como fazer um Filme de Amor, de Roberto Torero

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Locução Comerciais e institucionais para empresas, cinema, rádios e TV 2002 - Fundação Oswaldo Cruz 2003 - Poesias em Gotas - Interprogramas com 18 poesias para TVE 2003 - Petrobras – 50 anos 2003 - Som e Luz (projeto para Fundação Roberto Marinho)

Comerciais Direção de mais de 200 comerciais

Clientes: Presidência da República, Ministério da Saúde, Ministério da Educação, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Grupo Vicunha, Gerdau, Bradesco Saúde, Banerj, Cieps, Tv Globo, Abecip, Produtos Império, Casas Pernambucanas, Mesbla, Rio Design Center, O Globo, Gillete do Brasil, Café Moinho de Ouro, Prosdócimo, General Eletric, Produtos Trevo, Lillo, Rio Sul, Casa Shopping, Disco, Sendas, Teacher´s do Brasil, Cyanamid, Faet, Fundação Roberto Marinho, Editora Globo, Esso, Atlantic e outros.

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Prêmios 1963 - Prêmio Molière: Melhor figurinista por A Mandrágora Prêmio Padre Ventura – Associação Brasileira de Críticos Teatrais: Melhor figurinista por A Mandrágora 1966 - Troféu Candango – 2º Festival de Cinema de Brasília: Melhor ator pelo filme Todas as Mulheres do Mundo 1997 - Troféu O Saci – Jornal O Estado de São Paulo: Melhor ator pelo filme O Padre e a Moça Troféu Candango – 3º Festival de Cinema de Brasília: Melhor ator pelo filme Edu Coração de Ouro Prêmio Instituto Nacional de Cinema: Melhor ator pelo conjunto de trabalhos em cinema 1969 - Iº Festival de Cinema do Norte – Manaus: Melhor ator pelo filme Macunaíma 1971 - Medalha Roquete Pinto: Condecoração de Mérito Artístico Premio Air France: Produção de melhor filme do ano pelo filme Os Deuses e os Mortos 1972 - Troféu Helena Silveira: Personalidade do Ano na TV 1976 - Troféu Candango – 9º Festival de Cinema de Brasília: Melhor ator pelo filme O Rei da Noite 1977 - Prêmio Governador do Estado de São Paulo: Melhor Diretor pela peça Reveillon 1983 - Iº Festival de Cinema do Rio de Janeiro: Melhor Ator pelo filme A Difícil Viagem Associação Brasileira de Propaganda: Melhor Diretor de Comerciais - Conjunto de trabalhos 1986 - Prêmio Profissionais do ano de 1985: Direção de Comerciais

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8º Festival Internacional do Novo Cinema Latino Americano de Cuba: Melhor Série para TV O Tempo e o Vento 1989 - Prêmio Molière: Melhor Ator pela peça Delicadas Torturas 1990 - Prêmio Air France: Melhor Ator pelo filme Faca de Dois Gumes 1998 - Festival de Cuiabá: Melhor ator pelo filme Policarpo Quaresma Festival de Vitória – 5º Vitória Cine e Vídeo: Homenageado do Festival 1999 - 2º Prêmio Estação Botafogo do Cinema Brasileiro: Melhor Ator pelo filme Policarpo Quaresma Título de Cidadão Honorífico de Porto Alegre Titulo de Cidadão Catarinense 2000 - 28º Festival de Gramado: Troféu Oscarito Movstar 2002 - Festival da Bahia: Melhor Ator pelo filme A Morte 2004 - Festival de Miami: Melhor Ator pelo filme Benjamim Prêmio TAM, Homenagem pelos trabalhos feitos no cinema Comenda de Honra ao Mérito, Prêmio do Ministério da Cultura Homenagem da RBS pelos trabalhos feitos na televisão 2005 - 7º Festival de Cinema Brasileiro de Paris: Homenageado do Festival 2008 - Prêmio da Associação dos Correspondentes de Imprensa Estrangeira no Brasil pelo conjunto de trabalhos no cinema 1º Festival de Paulínia: Prêmio de Melhor Ator pelo filme Pequenas Histórias 36º Festival de Gramado: Prêmio Especial de Qualidade Artística pelo filme Juventude 2012 - Homenagem do 6º Prêmio da Associação de Produtores de Teatro do Rio de Janeiro (APTR) Festival SESC SP Melhores Filmes de 2012:

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Melhor Ator pelo filme O Palhaço Prêmio Contigo de Cinema 2012: Melhor Ator Coadjuvante pelo filme O Palhaço Grande Prêmio do Cinema Brasileiro 2012: Melhor Ator Coadjuvante pelo filme O Palhaço 1º Cine Festival de Araxá 2012: Melhor ator pelo filme O Palhaço

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Depoimentos Domingos de Oliveira - dramaturgo, cineasta e ator Conheci Paulo José em um verão carioca escaldante. Anos 60. Paulo tinha chegado há pouco e era o galã revolucionário do Teatro de Arena de São Paulo. Um príncipe, simplesmente um príncipe. Bonito, educado, inteligente - com uma mulher fantástica ao lado. Chamada Dina Sfat, a mulher mais linda que já vi. Todos sem dinheiro no bolso, envolvemo-nos numa peça em cooperativa que ele dirigiu. Era fevereiro, não havia ainda cadeiras no Teatro de Arena da Siqueira Campos. Era arquibancada de dura madeira que foram testemunhas de muitas e tensas reuniões políticas até o 68 do Ato Institucional. “Carnaval para principiantes” era um show de “esquerda” visando os turistas do fevereiro. Escrita por Eduardo Prado, que viria a ser o autor do meu segundo filme “Edu, coração de ouro”. No palco conosco a atriz Joana Fomm. Cantavam no espetáculo, entre outros, Nelson Sargento, Jairzinho, Mauro Duarte e Elton Medeiros. O diretor musical era um rapaz longilíneo e talentoso chamado Paulinho da Viola. Com essa ficha técnica desconhecida foi um fracasso absoluto. Fazia na pequena arena da Siqueira Campos um calor do Senegal. Porém, nos divertimos muito. Direção de Paulo José. Pouco depois ele filmava com Joaquim Pedro de Andrade, figura de proa do Cinema Novo, apenas encimado por Glauber Rocha. Depois disso, todo mundo queria trabalhar com Paulo. Inteligente e bonito só tinha o Paulo. Quando veio o filme “Todas as Mulheres do Mundo”, que era um filme de paixão, tive que escolher meu alter ego. Quem iria tomar nos braços e beijar a boca da minha amada Leila Diniz? Paulo José. Os galãs do Cinema Novo tinham de ser personagens inteligentes. A filmagem começou. A locação principal era, como não podia deixar de ser, o meu próprio apartamento. O ator era Paulo, cujos irmãos insistiam em dizer que era irmão também. Para a primeira tomada, a câmera foi posta na varanda, sob o olhar fiel e atento de Mário Carneiro.

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O sucesso estrondoso e inédito do filme somente podia nos unir. Dizem, mas não provam, que muita gente do Cinema Novo foi contra Paulo fazer o Edu, trabalhar de novo com Domingos Oliveira, aquele alienado, que não fazia da política seu único tema. “Edu, coração de ouro” não fez sucesso, pagou as despesas, talvez porque era um filme demasiadamente semelhante, embora apenas no estilo, ao “Todas as Mulheres”. Eram motivos suficientes para que os martelos levantados pelo sucesso anterior descessem sobre minha existencial cabeça, mas Paulo, como sempre, estava excepcional e outro dia, décadas depois, Paulo me disse: “quando eu fiz ‘Edu, coração de ouro’, achei que estava fazendo uma comédia. Revi o filme recentemente. É a história de um homem prestes ao suicídio!”. Anos mais tarde fizemos “A Culpa”. Fizemos é modo de dizer. Paulo mobilizou recursos que tinha e não tinha para que eu realizasse aquele meu sonho cinematográfico. E perdeu muito dinheiro. uma estranhíssima estória de dois irmãos (ele e Dina) que assassinavam, junto com o noivo dela (Nelson Xavier) o pai primevuo todo poderoso. Ganhamos o prêmio de melhor direção do ano. Nelson Pereira gostou muito. Hoje é meu filme mais revisto. Continuou a vida e fizemos muita coisa na televisão, eu e o Paulo. Nosso patrão na TV era o grande Ziembinski. Tempos de glória, embora ainda não devidamente reconhecida. Caso Especial em preto e branco, depois cores e o memorável Aplauso. Paulo tem direções notáveis neste período, no nível do nosso melhor cinema. Pressinto que teria que me estender demais para tornar aceitável o depoimento sobre minha vida com Paulo José. É daquelas gerações pelas quais é pequena até a palavra amizade. Ele está presente e me apoiando em todos os momentos importantes da minha vida, vida minha. Minha peça biográfica “Do fundo do lago escuro” foi dirigida pela primeira vez no teatro por ele. “Juventude” todo mundo ama... E agora no final da vida, garotos de setenta e seis, setenta e sete ou oito anos, dividimos as dificuldades da velhice. Trocando conselhos como se fôssemos (acho que somos) crianças brincando de invadir castelo e matar o dragão. Não quero dizer que Paulo foi uma benção

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ou irmão que a vida me deu: foi um prazer enorme e diante dele me torno religioso só para poder dizer ‘Deus te proteja, Paulo. A ti e a todos os teus!’.

Fernanda Montenegro - atriz “E, na secura nossa, amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.” Carlos Drummond de Andrade Esta é a imagem que o homem Paulo José imprime em tudo que ele realiza no seu viver. É paradoxalmente um crente na sua descrença que crê. Tem uma vida presente em muitas áreas da nossa cultura. É uma pessoa sempre altamente qualificada, jamais previsível ou esgotada. Há sempre nele propostas de muitos caminhos a seguir e, ao optar, a escolha nasce com luz, nasce fremente, generosa, aglutinadora. Põem-se à prova a cada desafio quer ao criar, quer em sua vida mesma. E nos apaixonamos por ele. Paulo José, nos seus tantos anos atuando em tantas frentes, sempre nos seduz, nos conquista com sua visão vertical sobre o material a trabalhar. Quem passou por ele, quem se aproximou dele o que mais deseja, o que mais espera é voltar a tê-lo junto, quer atuando, quer como amigo, companheiro. Paulo José é inspirador. Inesgotável. Jamais nos chega com uma só visão, com um só esquema, fechado em propósitos ditatoriais. Sua diversificação de possibilidades criadoras quer no teatro, no cinema, na TV e (por que não?) na vida, nos tira sempre do conformismo, da acomodação, o que nos livra, como companheiros de trabalho ou como plateia, do previsível, da saturação. Tê-lo é um privilégio. Agradeço ao Festival de Vitória, ao homenagea-lo, esta oportunidade de dizer o quanto eu o amo, o quanto nós o amamos.

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Não há dois Paulo José. É peça única. Paulo querido, na nossa cultura você faz parte do melhor que o nosso país tem para nos dignificar, criar, acrescentar, irmanar. Grande abraço, Rio de Janeiro, 06 de agosto de 2014

Laura Cardoso - atriz Paulo José, grande nome do teatro, do cinema e da televisão. Sua atuação é sempre brilhante e reconhecida nos três veículos.

Luiz Carlos Lacerda - cineasta A primeira vez que assisti Paulo José foi numa montagem do Arena, “A Mandrágora”, de Maquiavel, com Dina Sfat, Fauzi Arap e Milton Gonçalves, na minha adolescência – ávido por consumir aquele teatro montado de uma forma inusitada pelo já famoso e incensado Arena de São Paulo. Naquela época, os novos ares do palco sopravam da Paulicéia Desvairada desde o Oficina e da bela e corajosa Maria Della Costa – a primeira a montar Brecht e Plínio Marcos no Brasil e que merece um reconhecimento até hoje não registrado. No palco, aquele jovem cheio de talento e juventude dava ao seu personagem tons nunca dantes navegados – mas fundamentados na sua visível formação teatral e acadêmica (também seria oriundo da EAD, de onde saíram muitos importantes atores ?). Através de minha amiga Leila Diniz, com quem assisti “A Mandrágora”, conheci mais de perto o ator de “Todas as mulheres do mundo” e de “Edu,coração de ouro” – estrelados pela dupla anos mais tarde. Cooptado pelos cineastas do Cinema Novo, estreou em “O Padre e a Moça”, de Joaquim Pedro de Andrade, uma das mais comoventes interpretações da história do cinema brasileiro, dando vida ao obstinado religioso do poema de Drummond em sua paixão proibida - nada mais emblemático na cultura de Minas - pela vertiginosa presença de

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Helena Ignez, também uma fonte transbordante de talento e beleza. Foram nas assembleias da classe de cinema que estivemos mais perto, nas madrugadas varadas nos teatros Santa Rosa, da Praça, Teatro Jovem, organizando a nossa participação nas passeatas contra a ditadura convocadas pelos estudantes e intelectuais. Ele e Dina, mãe de seus filhos e uma de nossas mais lindas e boas atrizes. Conspirávamos noite adentro ! Tudo já se falou de Paulo José e de sua magnânima interpretação em “Macunaíma”. Não poderia deixar de lembrar de “O Homem Nu”, de Roberto Santos, “Policarpo Quaresma”, de Paulo Thiago, e tanto que contribuiu para tornar mais qualitativa a dramaturgia da TV. De Paulo José diretor, o que mais me emocionou e o define como o grande artista que é, foi a versão para a telinha do clássico “Vestido de Noiva”– do nosso maior dramaturgo, Nelson Rodrigues. Por seu olhar moderno sobre um quase clássico e a coragem de transgredir os limites de linguagem da TV. Ser seu contemporâneo e acompanhar seu trabalho durante meio século de multiplicidade é um dos troféus de quem contempla seu tempo com a alegria de um privilegiado. Viva Paulo José!

Clara, Ana e Bel Kutner – filhas de Paulo José Pai, papai, Paulo José, P.J., comilão, Seu José, Macunaíma, Quincas, Orestes, Benjamin, Policarpo, Edu, Bukowski... Tudo isso é muito mais: o guri de Lavras do Sul, que quebra vidraça de casa, enfia a cabeça do irmão no forno, exímio orador do colégio marista, um charme com as meninas à cavalo ou na lambreta; Eletricista,cenógrafo,figurinista,artista de palco,tela,ecran e circo. Muita gente fala:o pai de vocês é tão fofinho! INHO?!

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Ele não tem nada de INHO! Papai é hipérbole, nunca eufemismo! Certa feita,chega em casa com os cabelos todos brancos!ana,apavorada,acha que ele envelheceu de repente, e corre para contar: “Nosso pai é mágico!”. O que acreditávamos, já que contando histórias para nos fazer dormir, criava cada personagem com voz própria, músicas inventadas, um sucesso de público e crítica! Generoso, engraçado,sem espertezas, mas esperto como água pronta para ferver. Sempre pronto para um pulo. Sempre pronto para surpreender! Com delicadeza, graça, tragicômico, trazendo nos olhos a dimensão do patético da vida. Um pateta. Um sábio. O bobo de clarice. Um cara fácil de amar. Mora muita gente dentro dele! Todo um incrível exército de Brancaleone, com trilha sonora e tudo: branca, branca, branca, leon, leon…; Mas, se fosse pra escolher uma música da nossa infância com ele, seria “Touradas em Madri”! Para ra tim bum bum bum… É muita coisa para falar no meio de tantas heranças antropofágicas: casa sempre aberta, comida certa, arte, cachorro, gato, papagaio e uma admiração infinita…

Marcos Flaksman – Cenógrafo e arquiteto cênico O quê dizer sobre Paulo José? Paulo é um homem generoso, talentoso, seletivo e atento. Isso não é pouco. Mas é mais que isso, Paulo é um artista. No teatro, no cinema e na televisão deixou sua marca e viveu uma parcela importante de sua vida. Arte verdadeira tem muito de doação e é isso que vemos na sua obra. Paulo é também um cara simples e, para minha sorte, posso dizer

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que é meu companheiro de trabalho e meu amigo. Essa homenagem é minha também e mais que justa! Viva Paulo José! Viva a arte brasileira! Viva o cinema! Muitos beijos!

Selton Mello – diretor e ator Paulo José merece todas as homenagens do mundo! Um ator extraordinário que é peça fundamental na história de nosso cinema. Também na tv e no teatro sempre fez a diferença por onde passou, com seu brilho diferenciado. Como ator ou diretor sempre alcançou momentos sublimes. E sempre será meu Pai Aço... O palhaço que Paulo José deu vida em meu filme extrapola a tela e atinge outras dimensões Ali, atrás de um nariz vermelho, está um dos maiores atores que esse país já conheceu. E sua maneira de ver a vida e a forma nobre como enxerga nossa profissão é muito comovente. Sou um privilegiado por compartilhar parte de minha vida com esse grande artista chamado Paulo José. E desejo sempre o melhor do mundo para meu Pai Aço!

Vania Catani – produtora de cinema Tô há dias tentando escrever este texto sobre Paulo José, para Festival de Vitória que, muito justamente, o homenageia este ano. Já comecei umas sete vezes, mas tudo fica aquém no meu imenso amor e admiração pelo Paulo.

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Tô aqui tentando de novo e de novo devo não chegar a dar conta de tudo que sinto, lembro e quero dizer sobre ele. Vamos lá. Paulo José sempre este na minha vida, desde menina. Primeiro, dentro da TV da sala encarnando o lendário Shazam da sensacional dupla Shazam e Xerife que marcou todas as crianças brasileiras da década de 70. Todos os dias eu estava com ele. E era bom demais. Daí, depois de uns encontros mais espaçado em filmes e novelas, encontramos novamente uns 20 anos depois. Sem saber muito como, estava ele ali na minha frente no primeiro dia de filmagem, do primeiro filme que produzi, para filmar o primeiro plano. Impressionante, não podia ser mais maravilhoso meu batismo no Cinema. Era uma manhã fria de junho ou julho e quase todos ali estávamos estreando na produção de um longa. Era o “Outras Estórias”, dirigido pelo Pedro Bial. Era também em Montes Claros, cidade que nasci, e este dado dava a tudo ainda mais encantamento para aquele instante. Ele, Paulo, todo pimpão esperando os preparativos normais de uma filmagem, passeava alegremente montado de costas no cavalo trajado com seu inesquecível Tio Man’Antonio. Eu, tomada de emoção por penetrar pela primeira vez no portal do Cinema, ciente que não voltaria dali muito fácil. Desde aí, vejo o Paulo quase todo mês, e alguns meses vejo toda semana. Em tempos de sorte o vejo todos os dias. Nos fizemos amigos, estimulamos nosso afeto e hoje o Paulo é da minha família. Fizemos também outras malinezas depois do Rosa. No nosso “A Festa da Menina Morta” ele surge endiabrado com o padre bêbado e louco.

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E no nosso “O Palhaço”, ele simplesmente nos concede a plenitude do seu mais alto talento com o maravilhoso Waldemar/ Puro Sangue. Neste aqui, me orgulho mais ainda porque fui eu que tive a felicidade de sugerir ao diretor Selton Mello para o papel. Agora tamos aí preparando mais uma estripulia cinematográfica que anunciaremos em breve. Enquanto isso rimos, falamos, bebemos, comemos e somos felizes em torno da mesa da sua cozinha sempre farta com os milagres gastronômicos da sua Kika, amada por ele e por mim.

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Legenda das fotos Capa - Filme Cassy Jones, O Magnífico Sedutor, de Luiz Sergio Person (1972). Pág. 04 - Filme Gaudêncio, o Centauro dos Pampas, de Fernando Amaral (1971) Pág. 06 - Filme Policarpo Quaresma, Herói do Brasil, de Paulo Thiago (1998). Pág. 08 - Filme Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade (1969) Pág. 13 - Com as filhas Bel, Ana e Clara Kutner (2012) Pág. 14 - Foto 1: Família Gómez e Souza, da direita para esquerda, os irmãos Antônio Cláudio, Paulo José (em destaque), Orlando Carlos, Luís Alberto e Arlindo Fábio. Ao centro, Arlindo Ferreira de Souza e Maria Del Carmem Gómez de Souza, pais de Paulo José (1948) Foto 2: Paulo José e os pais (1976) Pág. 21 - Peça A Controvérsia, de Jean Claude Carrière, direção de Paulo José que, na foto, divide o palco com o ator Matheus Nachtergaele Pág. 22 - Peça Delicadas Torturas com a atriz Zezé Polessa (1988) Pág. 31 - Filme O Padre e a Moça, de Joaquim Pedro de Andrade, com a atriz Helena Ignez (1965) Pág. 32 - Filme O Palhaço, de Selton Mello. Na foto, o próprio diretor do filme (2011) Pág. 41 - Seriado Shazan, Xerife & Cia com ator Flávio Migliacio (1973) Pág. 42 - Novela Super Manoela, de Walter Negrão, com o ator Antônio Pedro (1974) Pág. 48 - Peça Os Fuzis da Senhora Carrar, de Bertolt Brecht, com a atriz Dina Lisboa (1962) Pág. 58 - Filme Edu, Coração de Ouro, de Domingos de Oliveira, com a atriz Maria Gladys (1967) Pág. 63 - Episódio do programa Você Decide com a sua filha e atriz Bel Kutner (1999) Pág. 64 - Novela Explode Coração, de Glória Perez, com os atores Estênio Garcia e Laura Cardoso (1995) Pág. 71 - Filme O Homem Nu, de Roberto Santos (1968) Pág. 72 - Filme A Vida Provisória, de Mauricio Gomes Leite, com a atriz Dina Sfat (1968) Pág. 76 - Minissérie Madona de Cedro, minissérie de Antonio Calmon (1994) Pág. 77 - Filme Todas as Mulheres do Mundo (1966) Pág. 78 - Gravações da minissérie Agosto (1993) Pág. 88 - Peça Transaminases, de Carlos Vereza (1980)


Referências Pesquisadas CARVALHO, Tânia. Paulo José: memórias substantivas. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo: Cultura - Fundação Padre Anchieta. São Paulo, 2004. PORTO, Joyce Teixeira, NUNES, Marisa. Coleção Cadernos de Pesquisa: Teatro de Arena. São Paulo. Centro Cultural São Paulo. São Paulo, 2007. RAMOS, José Mário Ortiz. Cinema, televisão e publicidade: cultura popular de massa no Brasil nos anos 1970-1980. 2ª edição. Annablume. São Paulo: 2004. Enciclopédia Itaú Cultural do Teatro. Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_teatro/ . Acesso em: 9 de setembro de 2014. Memória Globo. Disponível em: http://memoriaglobo.globo.com/ . Acesso em: 9 de setembro de 2014. SOUZA, Paulo José Goméz. Cidade do Rio de Janeiro-RJ, 22 de julho de 2014. Entrevista concedida a André De Biase, Bel Kutner, Lucia Caus e Paulo Gois Bastos.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) C122

CADERNO DO VCV - HOMENAGEADO NACIONAL. Paulo Gois Bastos (Editor). Vitória: 21° Vitória Cine Vídeo, Set 2014. Anual.

92p.: il. (Festiva de Vitória – 21° Vitória Cine Vídeo, 14º Edição). 1. Paulo José 2. Teatro. 3. Cinema. 4. Filmografia 5. Televisão 6. Festiva de Vitória – 21° Vitória Cine Vídeo. I. Bastos, Paulo Gois. (Editor).


Festival de Vitória - 21º Vitória Cine Vídeo

FICHA TÉCNICA Caderno do VCV - Homenageado Nacional Projeto Editorial - Lucia Caus Delbone e Paulo Gois Bastos Reportagem e edição - Paulo Gois Bastos (MTB/ES 2530) Projeto Gráfico e Diagramação - Paulo Prot Fotografia - acervo pessoal de Paulo José e Daryan Dornelles (página 13) Revisão de Texto - Luiz Cláudio Kleiam Ficha Catalográfica - Jaqueline Dash

Especificações Gráficas Tipografia - Gandhi Serif (textos) e Chaparral Pro (títulos) Papéis - Cartão Supremo 250 g/m² na capa e Couche Matte Fosco no miolo

O Caderno do VCV - Homenageado Nacional é uma publicação do Festival de Vitória - 21º Vitória Cine Vídeo (VCV), evento realizado entre 12 e 17 de setembro em Vitória-ES. O VCV é uma realização da Galpão Produções e do Instituto Brasil de Cultura e Arte. Nosso endereço e contatos: Rua Professora Maria Cândida da Silva, nº 115-A - Bairro República - Vitória/ ES. CEP 29.070-210. Tel.: 27-3327-2751 / producao@ibcavix.org.br



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