Voz da Leste, edição 005
São Paulo, SP/ Zona Leste, Janeiro de 2015.
MANIFESTOS As periferias unidas
Foto: Antonio Miotto.
AMéRICA LATINA
México, Argentina e Brasil, agente somos nós
DIREITOS HUMANOS
Chega de genocídio da população negra, desmilitarização da PM já!
EDITORIAL
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Edição Especial 2015
Estupradores não passaram!
Foto: Fernanda Simionato
Ao nos reunirmos para pensar nesse editorial que encerra o ano de 2014 e inicia de 2015 fizemos um balanço do ano que se encerra e percebemos que seria impossível não falar de alguns assuntos que foram politicamente importantes. Iniciamos o ano com a volta dos blocos de rua em São Paulo. Foi incrível ver as pessoas ocupando as ruas durante o carnaval. Foi um dos belos sinais de que ocuparíamos as ruas com lutas
coloridas. E as festas, os protestos, as ciclovias, as ocupações foram o espetáculo de uma cidade viva e que recusa a privatização do nosso existir. Apesar de termos aproximadamente 150 rios espalhados pela cidade, vivemos durante esse ano período de crise de água. O complexo Cantareira de abastecimento chegou a em média seus 15% de capacidade. O descaso com as nascentes
dos rios, com o tratamento da água, como o consumo desenfreado pelas indústrias, grupos empresariais e bairros elitistas são apenas alguns dos motivos que levaram a essa situação. A água virou negócio há muito tempo e nele também se busca lucro. Os lucros da Sabesp são divididos pelos acionistas na bolsa de valores, mas Alckmin quer que Dilma empreste 4 bilhões de reais, é pro cu cair da bunda mesmo! E vemos que se a Copa trouxe o tão prometido aumento de consumo financeiro no país, a periferia não teve uma fatia larga do bolo, apenas o aumento da especulação imobiliária, afastando as pessoas para bairros cada vez mais longes do centro da cidade. Alguém já viu quanta custa um apê ou casa em Itaquera agora? Quem sempre morou lá não consegue mais comprar sua terra e continuar na comunidade que nasceu e se criou. E quando a gente achava que já poderíamos começar o ano, lembramos que ainda teríamos as eleições presidenciais, governamentais e dos legislativos em outubro. Até o che-
gado dia da votação, vivemos momentos de declarada divisão entre a classe dos privilegiados, e daqueles que nunca tiveram tais privilégios. A rearticulação da direita foi imensa e elegemos o congresso e senado mais conservador desde a ditadura Civil-Militar de 1964. Ou seja, vamos apanhar muito mais da polícia em 2015 contra as atrocidades que podem ser aprovadas na calada da noite. Por falar em Policia Militar, os dados comprovam: a criminalidade caiu e a PM matou mais pessoas em 2014? A PM, que faz o genocídio negro, periférico e LGBT vai ganhar tanques blindados de Israel, esses são os direitos humanos praticados pelo PSDB paulista há 22 anos no poder. Pelo fim da Militarização da PM já. E por falar em Militares, a Comissão Nacional da Verdade entregou o relatório final sobre aqueles anos sombrios. A lista de pessoas perseguidas, torturadas, abusadas e mortas pelos militares aumentou, assim como as atrocidades e meios de tortura utilizados pelos mes-
mos. Ainda temos muito para lutar até que nossas vozes possam ser realmente ouvidas. A memória é ato político, como já disse Walter Benjamin “quem mando no passado controla o futuro”, ou algo assim. Precisamos resolver as cicatrizes da Ditadura e da Escravidão que ainda sangram e fazem milhões sangrar: milhões com classe, gênero, sexo e cor! Com a vitória, Dilma prometeu realizar um plano de democratização dos meios de comunicação. Essa deve ser, ao nosso ver, aquilo que une todas, todos e todxs, que querem mudar este país e o mundo: FIM DO MONOPÓLIO MIDIÁTICO! PT pare de ser burro, não da mais pra te defender amiga! As periferias e todas as pessoas que lutam por um mundo justo e livre terão q eu se reinventar frentes aos antigos e novos desafios. Agora os conservadores agora também saem às ruas! Esta edição deseja a todxs um ótimo 2015, com muita luta e com a certeza de que esLuciara Ribeiro e Marcel C. Couto - Editores São Paulo, Janeiro de 2015.
EXPEDIENTE • Editores: Marcel Cabral Couto e Luciara Ribeiro • Arte e Diagramação: Paloma Valéria dos Santos • Ilustrações: Ebbios Lima, Mônica Marques e Ruana Negri • Repórteres: Antonio Miotto, Escobar Franelas, Luciara Ribeiro, Marcel Couto, Roberto Maty e Victor Leme Balan, • Revisão: Marcel Cabral • Fotógrafos: Antonio Miotto, Escobar Franelas, Luciara Ribeiro e Marcel Cabral Couto • Colaboradores: Antonio Miotto, Escobar Franelas, Everton Santana. Marcel Copola e Queila Rodrigues • Parceiros: ANEL-SP, Casa de Cultura do Itaim Paulista, Caritas – ACNUR, Centro de Formação Cultural Cidade Tiradentes, Coletivo DAR, GRCS Escola de Samba Unidos de Santa Bárbara, Jornal Brasil de Fato, Portal Geledés, Portal Viomundo, Rede Brasil Atual, Rede Latina América, Revista Fórum, Sarau do Fórum, Sarau na Quebrada, Sarau Mauá Literal, Sarau o Que Dizem os Umbigos e S.R.B. Escola de Samba Lavapés • Administração: Marcel Cabral Couto • Contatos: e-mail: vozdaleste@gmail.com; facebook: https://www.facebook.com/VozDaLeste; Blog: vozdaleste.blogspot.com; • Anúncios: anunciosvozdaleste@gmail.com; Cel: 963811073 (Marcel) / 984649060 (Luciara) • Gráfica: Taiga Gráfica e Editora Ltda. Tiragem: 3.000 exemplares.
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Realização:
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AÇÃO SOCIAL
Depois da Copa do Mundo, é a vez da Copa dos Refugiados! Refugiados que vivem em São Paulo uniram-se neste ano de copa no Brasil para fazerem sua própria competição.
Por Luciara Ribeiro
A Copa dos refugiados ocorreu entre os dias 2 e 3 de agosto de 2014, na Comunidade Novo Glicério, na região central da cidade. Foram dois dias de jogos envolvendo jogadores de cerca de 16 países, sendo alguns deles: Angola, Nigéria, Paquistão, República Democrática do Congo, Costa do Marfim, Guiné, Serra Leoa, Burkina, Mali, Colômbia,Togo, Afeganistão, Bangladesh, Síria, Iraque e Camarões. A Copa foi organizada de refugiados para refugiados. Segundo o malinês Adama Konate, um dos organizadores, “a copa foi realizada com o intuito de dar a oportunidade ao povo brasileiro de conhecer os refugiados que vivem em São Paulo. Aqui, há muitas pessoas estrangeiras, alguns refugiados e outros não. Pois, o povo está se misturando”. A copa dos refugiados não foi apenas um evento de competição, algumas organizações sociais contribuíram para que o evento fosse também um espaço de lazer e formação socialpolítica. Entre as parcerias estabelecidas destacamos a Agência de Refugiados da Organização das Nações Unidas (ACNUR), a Caritas Arquidiocesana São Paulo, a Organização Mulheres, o Programa das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS), a Organização Internacional IKMR e a equipe do Pé do Mundo no Brasil.
De acordo com Konate, “a copa também é uma maneira de esquecermos as dificuldades que estamos passando. Pois, aqui muitas pessoas estão preocupadas. Mas, quando estamos juntos nós brincamos, cantamos, dançamos, jogamos”. O jogo final da Copa dos Refugiados ficou entre duas equipes africanas, a Nigéria e o Camarões. E, a Nigéria foi a grande vencedora da competição. Victor Silva (nome fictício), jogador da equipe da Nigéria, não conhecia seus colegas de time antes da organização da copa: “Eu fiquei sabendo que ia ter um jogo entre países, eu não conhecia as pessoas que estavam organizando, mas, logo que encontrei com eles começamos a treinar um pouco. E foi bom para a gente se conhecer”. Já George Nouga, jogador da equipe do Camarões, teve um encontro diferente com a equipe formada: “Eu já conhecia o pessoal, pois já estou aqui no Brasil a um tempo”. A Copa foi um momento de compartilhamento cultural e organização política entre os refugiados, além de demonstrar a necessidade de mais ações culturais e de lazer dedicadas a acolhida e integração desses novos moradores na cidade.
Alguns dos organizadores Nome: Uchen K. País de origem: Nigéria Profissão: professor de inglês e cantor; é um dos compositores do Hino da Copa (https://www.youtube.com/watc h?v=0Nf5CQRUF4). Como está participando: atua na equipe de coordenação e cantar á o Hino da Copa na abertura do evento. Nome: Romeo G. País de origem: Camarões. Profissão: cantor; é um dos compositores do Hino da Copa (https://www.youtube.com/watc h?v=0Nf5CQ-RUF4). Como está participando: além de fazer parte da organização, será locutor dos jogos e cantar á o Hino da Copa na abertura.
Nome: Salma K. País de origem: Iraque. Profissão: engenheira de informática. Há quanto tempo está no Brasil: 5 anos. Como está participando: desde as primeiras reuniões, está no grupo de coordenação; também foi articuladora do time do Iraque. Nome: Jose Pele País de origem: Angola. Há quanto tempo está no Brasil: aproximadamente 1 ano. Profissão: vendedor Nome: Jean K. País de origem: República Democrática do Congo. Profissão: empresário (ele é dono da sua própria lan house, que o permitiu reunir recursos para trazer sua família para o Brasil). Como está participando: trabalha na administração de recursos e no planejamento da programação do evento.
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Immanuel Wallerstein: as consequências mundiais da vitória de Dilma Rousseff Intelectual ressalta o papel do Brasil na construção de instituições latino e sul-americanas, o que manteve os EUA e seu poder mais distantes da região Originalmente publicado no site revista Forum de Novembro Por Immanuel Wallerstein Tradução: Vinicius Gomes
América Invertida - 1943 - Joaquín Torres García (1878-1949) - Uruguay
4 Em 26 de outubro, a presidenta do Brasil Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT), foi reeleita no segundo turno por uma estreita margem contra Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Apesar do nome do PSDB, esse foi um claro embate entre esquerda-direita, onde os eleitores votaram – de maneira genérica – de acordo com sua classe social, apesar de os programas de governo dos dois partidos serem, em muitas frentes, mais centristas do que de esquerda ou direita. Para compreender o que isso significa, nós precisamos analisar as particularidades políticas do Brasil, que em muitos aspectos estão muito mais próximas da Europa Ocidental e da América do Norte do que qualquer outro país do Sul Global. Como os países do Norte, os confrontos eleitorais acabam, no fim, se tornando uma batalha entre um partido de centro-esquerda e um partido de centro-direita. As eleições são regulares e os eleitores tendem a votar de acordo com os interesses de sua classe, apesar das políticas de centro dos dois principais partidos que geralmente se alternam no poder. O resultado é a constante insatisfação dos eleitores com o “seus” partidos e constantes tentativas das verdadeiras esquerda ou direita para forçarem políticas em suas direções. Como esses grupos de esquerda e direita perseguem seus objetivos dependem um pouco da estrutura formal das eleições. Muitos países têm um sistema de fato de dois turnos. Isso permite que a esquerda e a direita escolham seus próprios candidatos no primeiro turno e então votem no candidato dos principais partidos no segundo. A maior exceção a esse sistema de dois turnos são os EUA, que forçam a esquerda e a direita a entrarem nos principais partidos e depois passem a lutar de dentro (com as primárias). O Brasil possui um traço excepcional: enquanto em todos esses países os políticos mudam de partido de tempos em tempos, na maioria dos países estes formam um pequeno grupo. No Brasil, tal mudança de partido é virtualmente uma ocorrência cotidiana na legislatura nacional, isso força os principais partidos a gastar enormes quantidades de energia em reestruturar alianças constantemente e corresponde a uma maior visibilidade em corrupção. Nessa eleição, o PT estava sofrendo de grande desilusão de seus eleitores. A candidata Marina Silva tentou oferecer uma terceira via. Ela era conhecida por três características: ambientalista, evangélica e uma “não-branca” de origem muito pobre. No começo, ela pareceu decolar. Mas enquanto
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começava a propor um programa muito neoliberal, sua popularidade entrou em colapso e os eleitores se voltaram para Aécio Neves, um direitista mais tradicional. As desilusões com o PT eram principalmente sobre sua falha em cortar relações estruturais com a ortodoxia econômica, além do fracasso em cumprir suas promessas sobre reforma agrária, preocupações ambientais e a defesa dos direitos dos povos indígenas. Ele também reprimiu demonstrações populares de movimentos de esquerda, notoriamente os de junho de 2013. Apesar disso, os movimentos sociais da esquerda uniram forças de maneira muito forte com o partido no segundo turno. Por que? Por conta das mudanças positivas de 12 anos de governos do PT. Primeiramente, havia a grande expansão do programa Bolsa Família, que paga subsídios mensais ao mais pobres da população brasileira – que tiveram melhoras significativas em suas vidas. Em seguida, e pouco mencionado na imprensa ocidental, havia o enorme sucesso do Brasil em sua política externa – seu enorme papel na construção de instituições latino e sulamericanas que manteve longe o poder dos EUA na região. A esquerda tinha certeza que Neves iria reduzir as políticas de bem estar social do PT e se aliar novamente aos EUA no cenário internacional. A esquerda do Brasil votou por esses dois pontos positivos, apesar de todos os pontos negativos. No mesmo final de semana, ocorreram três grandes eleições no mundo: Uruguai, Ucrânia e Tunísia. A eleição no Uruguai foi bem similar à brasileira. Era o primeiro turno e o partido de situação no poder desde 2004, a Frente Ampla, tem como candidato Tabaré Vázquez. Esse partido é bem amplo – indo de centro-esquerdistas para comunistas a ex-guerrilheiros. Vásquez encarou um clássico candidato de direita, Luis Lacalle Pou do Partido Nacional, mas também Pedro Bordaberry do Partido Colorado, um dos dois partidos que governaram o país de maneira repressiva por mais de meio século. No primeiro turno, Vázquez conseguiu 46,5%, enquanto Lacalle contou com 31%, ou seja, não o suficiente para não haver o segundo turno. Bordaberry, que teve cerca de 13%, anunciou seu apoio a Lacalle, mas é provável que Vázquez vença por conta, mais ou menos, das mesmas razões que levaram Dilma Rousseff à vitória. Além disso, ao contrário do Brasil, seu partido possui o controle do Legislativo uruguaio, assim sendo, o Uruguai também reafirmará o esforço para construir uma estrutura geopolítica autônoma
na América Latina. O caso da Ucrânia é totalmente diferente. Longe de estar estruturada em um embate de esquerda-direita com dois partidos centrais tentando vencer as eleições, a política na Ucrânia tem agora como base uma divisão regional etnico-linguística. Nessas eleições, o governo pró-Ocidente realizou eleições excluindo qualquer participação dos supostos movimentos separatistas do leste da Ucrânia. Estes, então, boicotaram as eleições e anunciaram que manteriam suas administrações regionais autônomas. Na capital Kiev, parece que aqueles que agora governam: o presidente Petro Poroshenko aliado a seu rival, o primeiro-ministro Arseniy Yatsenyuk, irão se manter no poder, excluindo o verdadeiro ultranacionalista Setor Direito de qualquer papel. Finalmente, na Tunísia o que ocorreu foi bem diferente. A Tunísia foi vista como a propulsora da chamada Primavera Árabe e hoje, parece ser sua única remanescente. Ennahda, o partido islâmico que venceu as primeiras eleições, perdeu consideravelmente sua força ao correr atrás de um programa de islamização da política tunisiana. Acabaram forçados, alguns meses atrás, a dar lugar a um governo interino tecnocrata e perdeu muitos eleitores (até mesmo de islamitas) na segunda eleição. O partido vencedor foi Nadaa Tunis (O Chamado da Tunísia). Suas políticas são de certa maneira claras: é um partido secular. Seu líder é venerado político de 88 anos chamado Beji Caid Essebsi, que serviu nos governos Destourian que governou o país após a independência até que por fim se tornou um grande dissidente. Seu problema é manter unido a coalizão que conta com enormes variedades de forças secularistas – principalmente os jovens que lideraram o levante contra o presidente Zine el Abidine Bem Ali, em 2011, e diversos membros daquele governo que agora retornaram à arena política. De qualquer maneira, Nadaa Tunis conta com 85 assentos parlamentares dos 217, enquanto o Ennahda foi reduzido a 69, sendo que os outros estão espalhados entre partidos menores. Será necessário um governo de coalizão, envolvendo praticamente todos os partidos. Então, enquanto os jovens revolucionários da Tunísia estão celebrando a vitória contra o Ennahda, ninguém sabe ao certo aonde isso terminará. Eu digo “urra!” para o Brasil, onde aconteceu a mais importante dessas quatro eleições. Mas lá, assim em como em outros lugares, o jogo ainda não terminou. Não mesmo!
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Após anúncio do massacre, manifestantes tentam invadir sede presidencial no México Protesto ocorreu após a declaração de três membros do cartel de drogas Guerreros Unidos que confessaram o assassinato dos 43 jovens Texto: Brasil de Fato Publicado em 10/11/2014
Mais de 300 manifestantes tentaram derrubar a porta principal do palácio nacional da Cidade do México na madrugada deste domingo (9) para protestar contra o anúncio feito de que os 43 estudantes desaparecidos foram chacinados. Eles chegaram a atear fogo, mas não conseguiram entrar no palácio, que o presidente Enrique Peña Nieto usa apenas para cerimônias oficiais. Os manifestantes também picharam mensagens como “Nós os queremos vivos”, em referência aos estudantes desaparecidos. O protesto ocorreu após a Procuradoria Geral mexicana divulgar a chocante declaração de três membros do cartel de drogas Guerreros Unidos, que confessaram o assassinato dos jovens. Segundo o relato, os corpos queimaram por 14 horas até serem jogados em um rio. Com base nas confissões, o procurador-geral do México, Jesús Murillo Karam, contou que os estudantes foram levados para um lixão da localidade vizinha de Cocula, na noite de setembro. Alguns já chegaram ao local mortos por asfixia, e os demais foram assassinados lá mesmo. Ainda de acordo com as confissões, os corpos calcinados foram fraturados, colocados em sacos de lixo e jogados em um rio próximo de Cocula. No lixão, peritos encontraram cinzas e alguns vestígios de ossos humanos. Protestos em massa varrem o país, e a expectativa é que aumentem após as últimas notícias sobre os estudantes. Entenda o caso No dia 26 de setembro passado, um grupo de estudantes da escola do Magistério de Ayotzinapa, cidade rural de Guerrero, se apoderaram de vários ônibus para viajar à vizinha Iguala, onde arrecadariam fundos para seus estudos. A polícia de Iguala, com o apoio de pistoleiros de um cartel local, agiu contra o grupo, deixando seis mortos, 25 feridos e 43 estudantes de magistério desaparecidos. As autoridades prenderam 34 pessoas relacionadas com a matança dos alunos: 26 são policiais municipais e quatro estão vinculadas ao cartel Guerreros Unidos.
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Villa 1.11.14: un espacio de construcción colectiva by Rede Latina on *Por Larissa Valença
La semana pasada los invité a entrar en la Villa 1.11.14, una de las más conocidas villas miserias de Buenos Aires. Donde viven aproximadamente 40 mil personas, según datos del diagnostico institucional. Vamos a seguir recorriendo la villa, para conocer otros contextos. Por más que la violencia policial sea una constante, la población local lucha para combatir los estereotipos y las arbitrariedades. Además, en esa villa hay un escenario amplio, cada uno actúa con autonomía. Como una locomotora, así, las partes se juntan y la intervención social nasce. Para enfrentar los problemas socioeconómicos los miembros de la comunidad y de organizaciones de apoyo trabajan de manera articulada. Hay instituciones educacionales, religiosas, las cuales no son originadas por la población de la villa y sí por quien comparte de los mismos valores: ayudar quien está en situación de exclusión. La única escuela de enseñanza de nivel medio del bajo flores, ENEM nº3 empezó a funcionar en 1996, cuando algunos profesores/ militantes tomaron la edificación abandonada, mismo que no tenían muchos recursos,
empezaron a hacerla. Antes, el barrio supervivía sin un local de enseñanza abierto para la población. Juan Manuel Mauro, coordinador y militante de ENEM nº 3, tenía el papá y el tío presentes en la toma, incluso el colegio público lleva el nombre del tío Carlos Geniso, que fuera decisivo para la construcción de ese ambiente democrático y colorido. El colegio fue resistiendo. En 2001, cuando Argentina pasaba por una fuerte crises económica, en la cual el desempleo llegara hasta más de 20% y más de 55% de la populación se sumergió en la miseria La realidad alarmante era la falta de comida en las mesas, primer gran problema que afectó la escuela. Por eso, la construcción de un refectorio fue la primera prioridad. Las necesidades hablaban por si solas. Ese sería no solamente para los alumnos. Una gran mesa fue hecha para que se pudiera compartir, siendo toda la comunidad contemplada. Los estudiantes traían las familias. El refectorio fue hecho para 1.500 niños. Pero compartiendo en vueltas distintas, mucho más gente podría comer. El refectorio se llenaba de voces y caras distintas. La comunidad
Ilustração: Mônica Marques
El recorrido no se restringió a tan solamente conocer los trabajos sociales hechos en la escuela. Fui yendo. Pasé por una comisaría de la policía y fui llegando en calles de barrio, con viviendas más sencillas. Uno habitante chiquito, con manera tímida, nos acompañaba en ese recorrido. En medio a una partida de fútbol y casas coloridas que se acercaban de la cancha, surgió una conversación acerca de un estupefaciente que masacra las villas: pasta base “el paco”. Hecho con residuos de cocaína y mesclado con otros productos químicos, como bicarbonato de sodio, querosene. Considerado el peor, pues puede matar en poco tiempo de uso. Con eso, más un proyecto social es desarrollado, ahora, por la iglesia católica. Los ‘curas villeros’ como son conocidos, integrantes de la corriente MSTMU (Movimiento de Sacerdotes para el Tercer Mundo), empezaron la trayectoria en las décadas de 60 y 70, salieron de la iglesia formal. Viniendo a los barrios marginales ayudar las familias en la construcción de hogares. Cerca de la iglesia “Madre del pueblo”, hay un local donde los curas que pertenecen a ese movimiento dan vivienda, comida, y trabajan junto con los chicos usuarios de “el paco”. El uso ha aumentado mucho desde meados de los años 90. Padre Mugica, uno de los que empezó con esa corriente de resistencia, no llegó a ver la dictadura militar y todos los crímenes contra la humanidad, pues fuera asesinado en 1974, por la llamada Alianza Anticomunista Argentina, grupo paramilitar de ultraderecha. Ya Padre Richardelli fue defensor de la dignidad de esa populación de vulnerabilidad social y protector de los perseguidos en la dictadura, por eso sofrió atentados y llevó tiros. Él también era contra quien lucra con la pobreza. El cura llegó a esa villa en 1964 y fue quien hizo la iglesia “Madre del Pueblo”, en 1975, donde estuvo por más de 30 años. Al convertirse en amigo de Mugica, Richardelli, atribuyo fuerza a la lucha por la justicia y igualdad en local de opresión. Él traduce el alma de la Villa 1.11.14. Ambos los curas fueran combatidos por la elite. Sin embargo, esas ideias no fueran enterradas, y sí prosiguieron. Para ler o texto na integra acesse o site da Rede América Latina http://redelatinamerica. cartacapital.com.br/espanol/1075/
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Edição Especial 2015 Ilustração: Monica Marques
Jandira quer ampliar proteção da Lei Maria da Penha a transexuais Publicado em Viomundo em 3 de novembro de 2014 - Da assessoria de imprensa da deputada federal Jandira Feghali, via e-mail
Trabalhadores levam sugestões à Comissão Nacional da Verdade Representantes esperam que punição de empresas que colaboraram com a ditadura, sigam adiante Por Vitor Nuzzi Da Rede Brasil Atual
A Comissão Nacional da Verdade está a um mês de entregar o seu relatório final, depois de dois anos e meio de trabalhos, em meio a pressões tanto de ativistas dos direitos humanos como de setores favoráveis ao golpe de 1964. Em meados de outubro, um dos grupos que compõem a CNV, o dos trabalhadores, entregou recomendações para o relatório, incluindo desmilitarização das polícias militares, revisão da Lei da Anistia e punição para empresários e empresas, públicas e privadas, que colaboraram com a ditadura. Além disso, o grupo – formado por centrais sindicais e outras entidades – quer que sejam apuradas responsabilidades em episódios que resultaram em mortes de trabalhadores. Citam, entre outros, casos ocorridos em Serra Pelada (PA), Volta Redonda (RJ), Ipatinga (MG), Morro Velho (MG) e Sampaio (TO). Outra recomendação é pela revogação de artigos do Código Penal que interferem no direito de greve. No total, são 43 recomendações, divididas em cinco temas: crimes contra a humanidade, legislação, segurança pública, memória e direitos. O secretário de Políticas Sociais da CUT, Expedito So-
laney, representante da central no grupo de trabalho, avalia que a apresentação do relatório da CNV à presidenta Dilma Rousseff, em dezembro, está longe de significar o encerramento das atividades. “Não é para ficar na gaveta do Arquivo Nacional. A nossa disputa começa agora”, afirma. Os representantes dos trabalhadores propõem a criação de um organismo, após a extinção da CNV, para monitorar e pressionar para que as propostas sejam atendidas. “Agora é que vem a parte mais difícil. O relatório tem de refletir as recomendações.” A punição a empresas é parte importante do documento, considerando que várias delas colaboraram permitindo a entrada de agentes infiltrados nos locais de trabalho e entregaram listas de funcionários ao Dops. O documento fala em “investigar, denunciar e punir empresários, bem como empresas privadas e estatais, que participaram material, financeira e ideologicamente para a estruturação e consolidação do golpe e do regime militar”. Essas empresas deveriam ser punidas financeiramente, inclusive. No primeiro dos 43 itens, o grupo dos trabalhadores defende que o Estado brasileiro acate as normas do direito in-
ternacional sobre crimes contra a humanidade e ratifique convenção das Nações Unidas sobre a imprescritibilidade de tais crimes. Também propõe suprimir artigo da Lei da Anistia de forma a permitir punição de agentes públicos, além da revogação da Lei de Segurança Nacional. Ainda no campo legal, o grupo pede revisão da lei que criou a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos (9.140, de 1995) e duas relacionadas, “com reabertura de prazo indeterminado para a entrada de requerimentos com pedidos de reconhecimento e reparação”. Os trabalhadores querem ainda a formação de um grupo de trabalho interministerial para identificar e suprimir leis incompatíveis com o estado democrático de direito. Uma reivindicação constante das centrais, a ratificação da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), foi incluída no texto. A norma trata de proteção contra demissões imotivadas – Solaney lembra que o golpe de 1964 acabou com a estabilidade no emprego prevista em lei. Além disso, os trabalhadores querem que enfim se regulamente a Convenção 151, sobre organização sindical e negociação coletiva no setor público. Solaney tam-
bém enfatiza a necessidade de acabar com o “manual“ da Escola Superior de Guerra e introduzir elementos de direitos humanos na formação militar. A proposta tem alcance além do trabalhista, observa o sindicalista, e busca “quebrar a doutrina de que todo civil é um suspeito”. Universidades Em outubro, a Rede Nacional de Comissões da Verdade Universitárias (RNCVU), que reúne 13 colegiados, também entregou um conjunto de sugestões à Comissão Nacional da Verdade. Segundo seus representantes, o documento contém 12 recomendações específicas sobre universidades e educação e 16 propostas gerais. Uma trata de tipificar crimes contra a humanidade e outra, a exemplo dos trabalhadores, é relativa à criação de um organismo permanente que dê continuidade ao trabalho da CNV. Leia mais em: bit.ly/sugestoes_cnv
A deputada federal reeleita Jandira Feghali mais uma vez se apresenta como uma parlamentar progressista e visionária. Relatora na Câmara da Lei Maria da Penha, em 2006, que combate a violência doméstica, Jandira agora quer incluir no rol de proteção da legislação transexuais e transgêneros. Ela apresentou na terça-feira o Projeto de Lei 8032/2014 que prevê esses mecanismos. Segundo Jandira, os avanços contra a violência doméstica ocorreram, como a criação de instrumentos de combate e punição (delegacias, fóruns e juizados especiais) por estados e municípios, mas haviam demandas sociais, como a de transexuais: “Ampliar a cobertura de proteção é também fazer com que o Estado reconheça a identidade de milhares de cidadãos brasileiros”, adianta. A parlamentar ainda aponta que a visão machista de parte da sociedade pesa sobre mulheres e transexuais da mesma forma: “É preciso que o Estado garanta equidade e igualdade no combate à violência, sem discriminar”, diz, acrescentando que deseja urgência no trâmite do PL para este ano: “A próxima legislatura será muito conservadora e reacionária, o que dificulta avanços progressistas”, avalia. Para Keila Simpson, vice-presidenta da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), travestis e transexuais são discriminadas em razão de um estereótipo de inferioridade e são alvo de agressões, preconceito e constantemente relegadas à inviabilidade estatal. “Hoje são mais de 1 milhão e 500 mil que estão vulneráveis e sofrem violência”.
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DIREITOS HUMANOS
À Queima Roupa:
A prova irrefutável de que o Brasil tolera o assassinato de pobres e negros.Veja e assuma Por BRUNO PAES MANSO - Formado em economia (USP) e jornalismo (PUC-SP) Originalmente públicado no site Geledes em 10 de novembro de 2014 Ilustração por Ebbios Lima
Seu pai, sua mãe, cinco irmãos e a cunhada haviam acabado de chegar em casa depois do culto. Foram executados a sangue frio pelos policiais. Apenas três crianças de menos de cinco anos foram poupadas. Com seus pijaminhas de ursinhos e palhacinhos, eles vão pedir socorro na casa vizinha da tia. No filme, Vera conta como encontrou os corpos de seus parentes depois da chacina. A mãe estava com a bíblia na mão. O irmão morreu de joelhos, segurando os documentos que tentou mostrar para a polícia. Uma das irmãs iria se casar em dias. Outra, lançaria um CD evangélico. Teve os dedos quebrados pelos policiais a irmã que tentou defender os pais.
Ainda não consegui me esquecer do depoimento de Vera Lucia dos Santos no documentário À Queima Roupa, de Thereza Jessouron, que estreia na quinta-feira, dia 13, nos cinemas de São Paulo. Para falar a verdade, não vou me esquecer nunca mais. Vera está toda vestida de preto e sua figura tem a sobriedade das matriarcas evangélicas dos bairros pobres brasileiros. Ela tem uma mistura de negra e índia. Morava em Vigário Geral quando, em agosto de 1993, 21 moradores foram assassinados por policiais. Oito vítimas eram de sua família.
Vigário Peço ao leitor, com todo o respeito, um esforço de abstração. Imagine uma vingança com tal crueldade praticada pela polícia contra moradores de Pinheiros, em São Paulo, do Leblon, no Rio, ou Stella Maris, em Salvador. Pais formados em universidades públicas, com seus filhos em colégios privados, todos brancos, sete corpos estendidos na sala de jantar para saciar a vingança e o ódio dos policiais marginais. Não sejamos hipócritas. Isso seria inconcebível. É inimaginável. O Estado não toleraria as consequências. Só toleramos as cenas do documentário À Queima Roupa, que se repetem com absurda frequência no Brasil, porque as vítimas são negras e pobres das periferias brasileiras. Assista o documentário e assuma para si mesmo. É a prova irrefutável. Apenas um cínico ou mentiroso seria capaz de negar. Ainda na cena de Vigário Geral, conforme Vera descreve detalhadamente a posição dos corpos de seus familiares, o documentário mostra as fotografias feitas na época pela perícia policial. A sobreposição de imagens e narrativa é um soco no estômago: por onde escorria o sangue da irmã, qual parte do irmão estava ferida, etc, as cenas ficaram intactas na memória de Vera. Também a maneira como estava o céu, o período da lua, as últimas palavras ditas ao pai. Vera foi condenada pelo sistema a carregar nos ombros por toda a
vida uma cruz maciça que pesa toneladas. Só conseguiu aliviar o peso graças à grandeza de seu espírito, que perdoou os assassinos. As 21 pessoas foram assassinadas em Vigário Geral em vingança pela morte de quatro soldados que tinham sido executados por traficantes na noite anterior. Homens, mulheres e crianças foram mortos em Vigário Geral apenas por viverem no mesmo bairro onde o policial foi atacado. Na época, houve indignação. O Rio era governado por Leonel Brizola e Nilo Batista era o Secretário de Segurança. Ambos reagiram com firmeza. Só que os anos se passaram. E as vinganças e assassinatos aleatórios de pobres voltaram a ocorrer. Em janeiro de 2005, 30 pessoas foram assassinadas por policiais na Baixada Fluminense. No ano anterior, cinco adolescentes tinham sido mortos no Caju. Em 2007, subi o morro no Complexo do Alemão e testemunhei o dia seguinte da execução de 19 moradores locais. Casas de mulheres e idosos invadidas pela polícia para servir de trincheira. Rádios de carros roubados, comerciantes extorquidos, crimes rasteiros praticados contra os pobres do Alemão por policiais com carta branca da sociedade para matar. Em São Paulo, houve o Carandiru, em 1992, com 111 mortos. Mais recentemente, depois dos ataques do PCC em 2006, 493 pessoas morreram por disparos de arma de fogo no começo de maio. Trabalhadores, pegos no meio das ruas de bairros pobres. Policiais jogando roleta russa com o destino para assassinar aqueles que por infelicidade estavam nas ruas das periferias. As Mães de Maio são o resultado da mobilização contra essa covardia, que continua se repetindo. Assistir ao filme foi especialmente cruel porque no dia anterior nove pessoas haviam sido assassinadas em bairros pobres do Belém do Pará. À Queima Roupa deveria ser debatido em todas as faculdades de direito e academias de polícia do Brasil. Nossos promotores, policiais e juízes estão sendo formados em uma bolha de plástico. Precisamos conversar com eles sobre a realidade das chagas brasileiras.
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Um campinho de futebol e outras ideias Terreno abandonado em bairro na zona leste de São Paulo se torna espaço de lazer, cultura e tema de filme a partir da iniciativa de moradores da região Por Roberto Maty
“Doc. Cine Campinho” é o nome da primeira produção cinematográfica do Lentes Periféricas - um coletivo cultural composto por moradores do distrito de Lajeado e de outras quebradas. Durante este ano, o grupo reuniu depoimentos e resgatou imagens de uma das ações culturais mais importantes que aconteceu no bairro Jardim Bandeirantes: o “Cine Campinho”. Em meados de 2007, alguns moradores insatisfeitos com a realidade violenta da região usaram a sétima arte como ferramenta de transformação social e política, os encontros eram feitos em diferentes casas do bairro no formato de cine-debate, onde abordavam questões como violência, políticas públicas, convívio comunitário, entre outros assuntos do dia a dia da comunidade. Após faltar espaço para abrigar todos os interessados, que aumentavam a cada sessão, o grupo se articulou em uma grande ação que revitalizou um terreno abandonado que era utilizado como depósito de lixo e ponto de venda de drogas. A iniciativa tinha a
intenção de suprir a ausência de praças, quadras esportivas, parques e alternativas socioculturais que trabalhassem a perspectiva de futuro de crianças e jovens. Por isso, a intervenção dos moradores transformou o lugar em um campo de futebol, de convivência e, com o tempo, cinema a céu aberto. As sessões começaram a ser programadas nos moldes dos cines-debate que aconteciam nas casas, e como a sala de cinema mais próxima estava a 18 km e alguns reais de distância o público invadiu o campo para aproveitar a novidade. Não demorou muito para que o lugar ficasse conhecido como “Cine Campinho” e virasse ponto de referência cultural no bairro. Anos depois, alguns frequentadores dessas sessões resolveram produzir seus próprios filmes e formaram o coletivo Lentes Periféricas, que em 2014 apresenta sua primeira produção - um documentário sobre o acesso à cultura e ao lazer na periferia da cidade sob o olhar do que foi e significou a ação do Cine Campinho para a realidade do bairro.
Em meio a uma grande emoção, o filme foi lançado em 29 de novembro no mesmo local onde são exibidos mensalmente as obras que os frequentadores do Cine Campinho assistem às exibições. A pré-estreia do documentário no lugar que é palco de toda essa história, no campo localizado na rua Alessio Prati, próximo a escola municipal Dias Gomes, Jardim Bandeirantes, Lajeado, foi um ato carregado de simbolismos, resistência e afirmação. Ver filmes no “terrão” do campinho já tinha lá seu ineditismo, o público reconhecendo-se entre as imagens que rolavam na tela ampliaram a idéia e o sentido de protagonismo e de pertencimento. Nessa perspectiva, todos lucram: a comunidade eternizada na tela, o coletivo que dá nome ao filme, que perpetuou seu histórico peculiar e o Lentes, que nasceu para formatar este roteiro mas dá mostras de que pode arriscar-se em voos ainda mais altos.
Sarau sobrenome liberdade comemora seus 2 anos O Sarau Sobrenome Liberdade, comemorou[12/09/14] seu 2º Aniversário no Relicário Rock Bar [ zona zul]; Com a Intervenção sonora do DJ Roger; Varal e projeção de fotografias de diversos artistas; Show das bandas: Além da Ponte e Apologia Groove; Distribuição gratuita de cartões postais do Projeto Praga. O grande lema da comemoração foi “Nosso tempo é agora. Vamos juntos! Além de toda POESIA, viveremos” 2º Aniversário Sobrenome Liberdade. SÃO PAULO/SP, Brasil – 24/09/2014 (Foto: Antonio Miotto)
No ABC tambémtem Saraus! Conheça alguns deles. Foto: Amanda Lopes / Divulgação Sarau do Fórum
O movimento de saraus nas periferias brasileiras tem tido significativo crescimento nos últimos anos, fato que possibilitou que no mês de abril deste ano alguns coletivos e saraus de São Paulo integrassem a comitiva brasileira de saraus de poesia da 40ª Feira Internacional do Livro de Buenos Aires. Os saraus se multiplicam e a poesia ganha espaço num cotidiano antes marcado pelo
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distanciamento educacional, falta de acesso e exclusão social. Em busca de transformação, os saraus são promovidos em diferentes espaços, como bares, praças, faculdades e pontos de cultura; e, na maioria das vezes unindo dança, poesia, leitura de livros, música, pintura e teatro. Na periferia de São Paulo movimentos culturais tem sido destaque, assim como na região do ABC Paulista. Co-
nhecida pelos movimentos operários e sindicalistas que ocorreu no final do período de ditadura militar, o ABC é hoje uma das regiões culturais que apresentam um forte cenário na construção dos saraus nas periferias da região metropolitana. Para conhecer mais esses movimentos, a equipe do Voz da Leste visitou três saraus das cidades do ABC Paulista: Sarau do Fórum, em São Bernardo
do Campo; Sarau na quebrada, em Santo André e Sarau Mauá Literal, em Mauá. O projeto Sarau do Fórum do Hip Hop é uma atividade desenvolvida pelo coletivo Fórum de Hip Hop de São Bernardo do Campo. O evento acontece toda última quinta-feira do mês com o intuito de promover o encontro de poetas, poetizas e público. Tais ações contribuem para o aperfeiçoamento das relações humanas e da emancipação dos indivíduos da região. Felipe Choco, um dos organizadores do Sarau do Fórum, afirma que “o objetivo do sarau é divulgar a cena cultural da região. Começamos com o interesse de reunir e conhecer o trabalho cultural realizado em São Bernardo e região. Agora, já alcançamos outras cidades, até mesmo São Paulo”. O Sarau do Fórum apresenta uma junção de linguagens artísticas, que de acordo com Choco, ocorre “sem separação, apenas somando”. Pensamento semelhante pode ser encontrado também no Sarau na quebrada, em Santo André. O Sarau que já ocorre a três anos, tem como organizadores um coletivo de moradores da região, entre eles, Neri Silvestre, Gláucia Adriane, Mc Márcia e Nego Dabes. Glaucia Adriane, conta que: “o Sarau na Quebrada é um coletivo de pessoas que buscam transformação cultural. Em constante evolução, a produção cultural na periferia colhe novos frutos a cada dia; e por isso, seguimos com nossas atividades.” Mc Márcia é cantora no coletivo musical RimAção e uma das organizadoras do Sarau na Quebrada, para ela: “o Sarau é um espaço de luta periférica. A juventude da periferia não tem equipamento cultural, de forma que o espaço do sarau se torna um espaço cultural de envolvimento e apropriação. Esse envolvimento me fez voltar a acreditar o potencial da minha voz como mulher Mc.” O projeto também explora outras linguagens além da poesia, como debates, música, apresentação de dança, exibição de documentários, sorteios de livros, protestos, microfone aberto e outras formas de manifestação. Os organizadores do sarau buscam espaços da cidade que possam acolher o sarau, variando estes desde salas de aula em universidade, bares, praças, casa de moradores, etc. Os espaços de bares na periferia foram escolhidos para sediar muitas das sessões do sarau na quebrada, pois, em geral, esses lugares conseguem reunir jovens, artistas e moradores locais em uma celebração à poesia. Gláucia Adriane, diz que: “utilizamos os espaços dos
bares para transformar eles em centro culturais, já que, o que mais tem na periferia são bares.” Além disso, o Sarau na Quebrada incentiva e apoia a criação de novos saraus na região, como o Sarau Mauá Literal, lançado em julho, na cidade de Mauá. Esse é o primeiro sarau periférico da cidade e busca ampliar os espaços de encontro e debates da cena cultural da cidade. De acordo com os organizadores Paulo Uzander, Danilo Ramos, Márcio Oliveira e Kitty Meira: “a proposta consiste em possibilitar encontros entre a velha e a nova geração de poetas, escritores e artistas em geral, culminando com a difusão da produção literária atual. Outro objetivo do Sarau é contribuir com a construção de novos públicos dos arredores do Centro Cultural Dona Leonor, bem como dar visibilidade a assuntos de acontecimentos atuais e propondo debates”. Apesar de recente, já foram realizadas duas edições do Sarau Mauá Literal durante esse ano e pretendem para o próximo ano criar um circuito cultural entre os saraus na região do ABC, de forma a fortalecer os laços culturais entre as cidades da região.
Sarau do Fórum
Quando: Toda última quinta-feira do mês. Horário: 19:00 hs Entrada Gratuita Onde: Projeto Meninos e Meninas de Rua – Rua Jurubatuba, 1610 Centro / São Bernardo do Campo Sarau na Quebrada
Quando: Toda última sexta do mês. Horário: 19:00 hs Entrada Gratuita Onde: Jamaica’s Bar – Estrada do Pedroso, 541 Jardim Santo André / Santo André Sarau Mauá Literal
Quando: Bimestralmente no penúltimo sábado do mês. Horário: 19:00 hs Entrada Gratuita. Onde: Centro Cultural Dona Leonor - Rua San Juan, 121 Parque das Américas / Mauá
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DENÚNCIA SOBRE AS CASAS DE CULTURA DO MUNICÍPIO DE SP
Ilustração: Mônica Marques
Assinam este documento: cidadãos, artistas e diversas coletividades da cidade, dentre elas:
Ao longo de 10 anos as Casas de Cultura passaram por um processo de sucateamento e abandono generalizado. Com a mudança de gestão na Prefeitura, alimentamos a esperança de que este processo fosse revertido. É unanimidade nos quatro cantos da cidade, entre todas as coletividades, grupos, agentes culturais e comunidades que as Casas devem retornar para a gestão da Secretaria Municipal de Cultura (SMC). As Casas de Cultura até o momento estão vinculadas às subprefeituras, que por sua vez, estão loteadas para os vereadores, os quais distribuem os cargos de coordenação das Casas ao seu bel prazer, sem qualquer compromisso com a qualificação profissional das pessoas indicadas para exercer a função. O orçamento para cultura nas subprefeituras é escasso, quase inexistente. Falta vontade política para melhorar a situação e, a comunidade que deveria ser beneficiada com este equipamento cultural público, acaba pagando o preço. É VERGONHOSO ver as Casas de Cultura no balcão de negócios de distribuição de cargos, enquanto as comunidades agonizam com pouquíssimas opções de lazer e cultura, principalmente nas periferias do município de SP. O Secretário de Cultura, Juca Ferreira, assumiu publicamente o compromisso, desde o primeiro encontro #EXISTEDIÁLOGOEMSP
(em 05/02/2013) e em diversas reuniões, encontros e seminários posteriores, de que as Casas de Cultura retornariam à SMC, faltando para isso apenas “resolver alguns trâmites burocráticos” para que fosse publicado o decreto. Porém, até o momento (com mais de 1 ano e 5 meses), o que vemos é uma inércia e nenhum empenho em resolver logo este problema que tanto aflige as periferias da Cidade. É triste ter que defender o óbvio, mas é necessário dizer: as Casas de Cultura são o berço de diversas coletividades e grupos, e em muitos casos são o primeiro contato de muitas crianças, adolescentes e jovens com a arte e a cultura. Não podemos deixar que em nome da “governabilidade” as casas permaneçam sucateadas e ainda com a velha política. Portanto, EXIGIMOS: • RETORNO IMEDIATO DAS CASAS E SUPERVISÕES DE CULTURA PARA A GESTÃO DA SMC! • 2% PRA CULTURA JÁ (de forma descentralizada de acordo com a densidade demográfica)! • REGULARIZAÇÃO DOS ESPAÇOS CULTURAIS QUE OCUPAM ESPAÇOS PÚBLICOS! • T R A N S P A R Ê N CIA NO ORÇAMENTO DA CULTURA! CHEGA DE SERMÃO! QUEREMOS VER AÇÃO! CHEGA DE FROUXURA! QUEREMOS MAIS CULTURA!
Fórum de Cultura da Zona Leste Bloco de Ocupação Cultural de Espaços Públicos IMCITA Coletivos Culturais de Cidade Ademar e Pedreira Sarau O que dizem os umbigos Brava Companhia Reação Arte e Cultura Coletivo Perifatividade Sucatas Ambulantes Trupe Kuaracï-abá (cabelos do sol). Grupo musical Forró di Muié Sede móvel Pq. Belém Cineclube Kinopheria Movimento Cultural de Itaquera Sarau da Quebrada Sarau dos Loucos Graffiz Festa Banda Gricerina Parábola IPJ - Instituto Paulista de Juventude Jornal José Bonifácio Fórum Permanente de Cultura de Taboão da Serra Muros que gritam Manulo Silva Sauro grafite Sarau Candeeiro Marcelo Ribeiro - prod. cultural/ M’boi Mirim Sociedade Samba Dá Cultura Mestre Arakunrin (capoeira) Espaço Cultural CITA Grupo Teatral Cavalo de Pau Hugo Paz Coletivo da Albertina Cia Porto de Luanda Itaquera na Cena Pastoral da Juventude São Mateus Associação de Moradores Jardim Helian Itaquera Jongo dos Guainás Edvaldo Santana Cia Oslo Casa das Crioulas Comunidade Cultural Quilombaque Rua de Lazer Fórum Popular de Saúde Itaquera CEDECA Sapopemba Juntas na Luta M.A.P. Movimento Aliança pela Praça Tenda Literária
Rede Popular de C ultura M’Boi Campo Limpo Fórum de Cultura de São Mateus Cultura ZL Movimento Cultural da Penha Coletivo ALMA Grupo doBalaio Jornal Voz da Leste Grupo Transformar Cia. Mapinguary Coletivo Fora de Frequência Bloco do Beco Cenário Periférico Trupé na Rua Sacolão das Artes Coletivo Fora de Frequencia Jaçarau Prá,çarau Cia de Artes Decalogo JALC Kiwi Companhia de Teatro Sarau A Voz do Povo Banda Nego Veio Bloco das Cores Velha Guarda do Helga TV Doc Fundão Tv Doc Capão Agencia Solano Trindade Casa de Cultura de M’Boi Grupo Espírito de Zumbi Bloco Afro É di Santo Grupo da Melhor Idade Flor de Lis Conselho Gestor da CECCO Pq. Raul Seixas No Batente Nhocuné Soul PelaArtePelaZuera Engrenagem Urbana Observatório da Juventude Dolores Boca Aberta Mecatrônica de Artes Cordão Carnavalesco Boca de Serebesque Cine Campinho Pula o Muro - Blog AGENDES Viela Cultural Cultura Leste - Blog Centro de Direitos Humanos de Sapopemba Pombas Urbanas Banda Zabah Bush
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E a história se repete... Mais uma vez UMBIGOS no olho da rua!!! Feira miolos
Arte: Ivan Leandro Ferreira
“Nin Jitsu, Oxalá, capoeira, jiu jitsu Shiva, Ganesh, Zé Pilin dai equilíbrio Ao trabalhador que corre atras do pão É humilhação demais que não cabe nesse refrão E se não resistir e desocupar Entregar tudo pra ele então, o que será?” (Criolo)
Neste sábado, 29 de Novembro, deveria acontecer mais uma edição da “Ocupação Cultural O que dizem os Umbigos?! , ação que faz parte do Projeto Sarau e Ocupação O que dizem os Umbigos?!, contemplada pelo VAI II. A ação AGENDADA NA CASA DE CULTURA DESDE O INÍCIO DO ANO teve que acontecer e receber o grupo convidado “Porto de Luanda” no “Bar do Michel “e na Praça, espaços ao lado e em frente a Casa de Cultura que mais uma vez fechou as portas para um Coletivo Cultural do Itaim Paulista. Curiosamente na semana passada em reunião com o Secretário de Cultura, Juca Ferreira, ouvimos do mesmo que nossas pautas foram 90% plenamente atendidas e que temos desrespeitado as ações e “boas intenções” da SMC. Pois bem, aqui está mais uma prova de que a retórica não condiz com a prática, pois se quer temos o básico e que falta de respeito quem sofre somos nós, coletivos e comunidade que mais uma vez levaram a
porta na cara. Semana passada foi o BatucAfro, nessa semana os Umbigos, coletivos com histórico de atuação nesta comunidade e que novamente são impedidos de utlizar a Casa de Cultura - ESPAÇO PÚBLICO-para realizar ações, contraditóriamente, contempladas pela mesma SMC via VAIs. Enquanto existe uma preocupação em que conheçamos a história do novo coordenador, não há a mesma preocupação que o mesmo conheça as nossas histórias e ações no bairro e neste espaço dito público. Após a mudança de gestão da Casa em nenhum momento os coletivos foram convidados para uma reunião que tivesse o interesse em saber em que pé estão os projetos lá dentro ou como poderíamos juntos somar forças pela Casa. O que houve até agora foram apenas cobranças de ofícios’relâmpago para realização de ações que já tinha sido préviamente agendadas e autorizadas, falta de respeito pelo nosso trabalho, pelos coletivos e comunidade convidada.
Não somos nós os responsáveis pela falta de estrutura da Casa e nem pela falta de segurança local! Aliás, essa casa só está de pé, assim como em outras quebradas, graças aos coletivos da região e isso precisa ser considerado. Estamos fazendo o nosso trabalho, façam o de vocês e não nos responsabilizem pela incompetência que não é nossa!!! E que fique desenhado, não estamos aqui para defender ou acusar este ou aquele coordenador, mas há tempos seguimos na luta por políticas públicas estruturais de alcance coletivo e exigimos respeito pela nossa luta e militância somada à de outros artistas/ coletivos da região. Finalizamos agradecendo ao Bar do Michel mais uma vez pela acolhida, ao Grupo Porto de Luanda por somar conoso independente do ocorrido, à todxs xs parças que resistem junto com a gente e ao povo da rua, que faça chuva ou faça sol, nunca nos deixa na mão. LAROIÊ!!! COLETIVO O QUE DIZEM OS UMBIGOS?!
A feira literária Miolo(s) marcou a chegada das publicações independentes à Biblioteca Mário de Andrade. O evento aconteceu dia 1º de novembro, das 10h às 18h, e contou com mais de cinquenta editoras, coletivos e artistas. As obras serão doadas para biblioteca e poderão ser consultadas pelo público posteriormente. Uma característica dos trabalhos independentes é a vontade dos realizadores de estudar diferentes formatos e acabamentos. Isso resulta em uma imensa variedade nas abordagens do livro como objeto. Diferente das bienais e feiras tradicionais, neste tipo de evento, existe a possibilidade de conhecer e conversar diretamente com editores e autores para compreender os processos criativos, a dinâmica da edição e a formas de produção gráfica. Durante a Miolo(s), os visitantes encontraram livros de diferentes gêneros, feitos em pequenas tiragens. Também puderam conhecer uma grande seleção de fanzines, quadrinhos, trabalhos com fotografia, cadernos de artista e obras com produção artesanal.
Feira Miolo/Fotos por George Leoni/ www.flickr.com/georgeleoni
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A importância de Abdias do Nascimento para a história do Brasil Abdias incluiu questões de interesse para a população negra nas grandes discussões nacionais. Seu legado permanece vivo alimentando nossa luta. Por Gabriel Rocha Originalmente publicado em Jornal Brasil de Fato em 10/11/2014
Abdias do Nascimento certamente figura entre as personagens de grande importância na luta histórica dos negros no Brasil, tal qual Luiz Gama, José do Patrocínio, Manuel Querino, José Correia Leite, Carolina de Jesus, Clóvis Moura, Wilson Nascimento Barbosa, Cuti, Beatriz Nascimento, Milton Barbosa, Ney Lopes, Sueli Carneiro, Kabengele Munanga, citando apenas alguns nomes. No ano de seu centenário podemos fazer um balanço de sua atuação militante e de seu legado em nossa história. Sua trajetória acompanha os diferentes períodos da luta dos negros no Brasil, tendo ele marcado presença em momentos decisivos, atuando em entidades que se destacaram na história do movimento negro nacional como a Frente Negra Brasileira (FNB) na década de 1930 – onde teve seus primeiros anos de militância, ainda na retaguarda – e o Teatro Experimental do Negro (TEN) entre 1944 e 1968, o qual fundou e esteve sempre a frente de suas atividades projetandose como artista, intelectual e liderança política. Desde o final dos anos 1940 manteve contato com militantes negros, ou simpatizantes da luta antirracista dos EUA, França, países caribenhos e africanos, contato que se estreitou e se intensificou a partir de 1968 quando iniciou seu (auto)exílio nos EUA e sua militância pan-africanista. Em 1978, numa de suas visitas ao Brasil participou do ato de fundação do Movimento Negro Unificado (MNU)[1]. Nos anos 1980 quando retornou definitivamente ao país participou da fundação do PDT junto com Leonel Brizola, partido pelo qual foi Deputado Federal nos anos 1980 e Senador da República nos anos 1990. Em sua longa trajetória de militância dedicou-se profundamente no combate ao preconceito e a discriminação racial, e na luta por igualdade social entre negros e brancos. A atuação política de Abdias do Nascimento nos diferentes períodos históricos em que viveu pode ser entendida como um percurso não linear
de um sujeito se relacionando com seu espaço e seu tempo, fazendo leituras do mundo em que viveu (deixando também suas impressões neste mundo), buscando respostas para questões pertinentes a sua realidade que também foi – e de certo modo continua sendo – a realidade de muitos brasileiros descendentes da gente que aqui fora escravizada e fora mantida marginalizada no período que sucedeu a abolição. Neste percurso apreciamos sua adesão e ruptura com idéias e movimentos políticos, marcando posições que aos olhos do observador do presente podem emergir como contradições. Considerando que trata-se de um ser humano – demasiadamente humano – e não um mito, as contradições surgem, o que de maneira alguma reduz sua importância para nossa história. O envolvimento na década de 1930 com a Ação Integralista Brasileira, quando também freqüentava a FNB não apenas alimentou posteriormente, nos anos 1950, situações de indisposição entre Abdias e setores da esquerda como a UNE, como ainda hoje pode ser apontado por algumas pessoas enquanto um desvio em sua trajetória evidentemente progressista. É impossível olharmos para o Integralismo e não sentirmos os tons fascistas que dele saltam. Mas para entendermos a adesão a tal movimento ultraconservador por personalidades incontestavelmente progressistas como D. Helder Câmara, José Celso Martinez, o próprio Abdias e outros intelectuais negros e brancos que futuramente vieram a cooperar com o TEN e com a esquerda política, seria necessário outro artigo dedicado à este tema. O TEN além de atividades dramatúrgicas, exercia o papel de instituição de ensino oferecendo alfabetização para pessoas que aspiravam entrar para o teatro mas não eram alfabetizadas. Promoveu concursos de beleza e de arte negra, publicou livros e o jornal Quilombo, promoveu Fóruns de discussão e reflexão sobre a situação do negro brasileiro.
Boa parte de seus atores eram de origem pobre, empregadas domésticas e trabalhadores braçais. Foi o marco inicial para a carreira das atrizes Ruth de Souza, Léa Garcia e do ator e dramaturgo Haroldo Costa, e teve importante papel pedagógico ao usar a imagem cênica para combater a ideologia do racismo, colocando os negros como protagonistas nos palcos, retirando as representações de inferiorização do negro que era comum no teatro brasileiro. Nos anos 1950 a produção de Abdias se afasta gradativamente até romper definitivamente com ideias que remetiam à democracia racial como uma realidade entre os brasileiros. Nos anos 1960 denuncia radicalmente a democracia racial enquanto mito mascarador da realidade e instrumento de dominação das elites brancas. Quando esteve exilado Abdias atuou como professor na Universidade de Buffalo em NY, viajou por África e Caribe, sendo ele o primeiro negro brasileiro a participar de congressos pan-africanistas, continuando sua luta antirracismo em âmbito internacional. De volta ao Brasil nos anos 1980, eleito deputado federal, foi o primeiro parlamentar negro a dedicar seu mandato à luta contra o racismo, propondo projetos de lei que o enquadram como crime de lesa-humanidade, e propondo mecanismos de ação compensatória para negros no Brasil. Atuou na desapropriação da Serra da Barriga e na transformação desta em patrimônio histórico nacional, na questão das comunidades quilombolas, no questionamento do 13 de maio e na definição do 20 de novembro como dia da Consciência Negra. Abdias incluiu questões de interesse para a população negra nas grandes discussões nacionais. Seguiu sua atuação política como senador da república entre 1991 e 1994, assumindo posteriormente a mesma função entre 1996 e 1999, com a morte de Darcy Ribeiro, de quem era suplente. Seu legado permanece vivo alimentando nossa luta.
[1]Abdias participou do ato de fundação do MNU e cooperou com esta organização sem ser filiado a ela. Gabriel Rocha é bacharel e licenciado em história pela USP, atualmente é bolsista na FAPESP, onde cursa o mestrado em História Social, desenvolvendo uma pesquisa sobre a produção intelectual de Abdias do Nascimento no período do Teatro Experimental do Negro (1944-1968).
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II MARCHA INTERNACIONAL CONTRA O GENOCÍDIO DO POVO NEGRO
CONSCIÊNCIA NEGRA
1º Mostra de Cidadania Cultural aconteceu no Ibirapuera
A II Marcha Internacional contra o genocídio do povo negro ocorreu em 22 de agosto de 2014. Segue abaixo o Manifesto escrito pelas organizadoras e organizadores. “Esta Marcha é sobre a dor da mãe que perdeu o filho, que segura a barra na família, que enfrenta o trânsito para pegar o trampo pesado, educar e alimentar suas crias, com a tristeza da pouca comida na mesa, devido ao salário minguado, trabalhando muito para o sustento e luxo do patrão. Esta Marcha é para o irmão cansado de ser enquadrado voltando da escola, do rolê ou do trabalho, devido ao fato de ser sempre visto como suspeito, precisando provar que é trabalhador, muitas vezes para não ser morto. É também para a irmã, que tentando se profissionalizar, enfrenta a falta de grana pra comprar livros ou até mesmo se alimentar; é para os irmãos e irmãs presos na cela fria, sem advogado, humilhados pela justiça e torturados pelos agentes penitenciários; é para todas as crianças que são discriminadas na escola, pela cor de sua pele, seu nariz e cabelo...é para tod@s guerreir@s: indígenas, do Hip-hop, da capoeira, das escolas de samba, dos times de várzea, das organizações políticas e culturais, de todos os terreiros (umbanda e candomblé), mesquitas e igrejas. Essa Marcha é por nós e para nós mesmos! Por todas essas pessoas, que enfrentam a violência do racismo em seu dia a dia. Sabendo que esse movimento não acabou na noite do dia 22 de agosto, mas deve continuar até o dia em que o “negro” alcance sua condição humana, que historicamente nos foi roubada!”
Por Marcel Cabral Couto
Ilustração: Mônica Marques
Contato: Site: 2marchacontragenocidio.batemacumba.net Facebook: Marcha Nacional Contra o Genocídio do Povo Negro SP Contra o genocídio do povo negro, nenhum passo atrás!!
Dia 6 e 7 de dezembro o 1º Festival de Cidadania Cultural, que levou ao Parque do Ibirapuera o melhor da produção artística das periferias da cidade. Foram dois dias cheios de atrações, que se dividiram em cinco espaços, a tenda Estrela, o Palco, a tenda de Artes Cênicas, a tenda do Audiovisual e o espaço Aberto. Fui cobrir uma parte do evento e entrevistou alguns grupos. No início da tarde o grupo de Taiko, tambor tradicional japonês, de São Miguel Paulista se apresentou perto do Portão 3 encantando quem passava pelo local, entre eles muitos/as ciclitas que paravam para apreciar a milenar arte oriental. Uma das integrantes explicou os significados maiores da dança e como ela, no Brasil, servia como estímulo à cultura, educação e sociabilidade para jovens. Da SP japonesa para a São Paulo africana foi a vez do Batucafro, grupo do Itaim Paulista, apresentar um cortejo tecendo um caminhar ritmado até o portão 10. Com roupas exuberantes, turbantes bem montados e ao som dos percussionistas essa grande família foi colorindo o caminho até o portão 10 onde ocorreram rodas de danças tradicionais como Coco e Cacuriá (dança típica do Maranhão).
Neste local ocorreram ainda rodas de capoeira, shows, teatros e apresentação de vídeos. Na tenda do Audiovisual acompanhei a apresentação e debate de alguns documentários financiados pelo VAI e Agente Comunitário que estão em construção. Quem tem medo de Cris Negão do coletivo Preta Porter Filmes falava sobre Crist Negão, famosa travesti-empresaria-cafetina figura carimbada da cena lgbt em São Paulo. Figuras da noite paulistana como a Drag Thalia Bombinha e a atriz cubana relatam casos de amor e ódio que rondam esse mito pouco conhecido da noite paulistana. O coletivo Na Rego falou ainda um pouco sobre o processo e sobre a performance que fizeram na Rego Freitas famosa rua do cenário travesti da capital paulista. Majé Bassan – terreiro das vilas, documentário que está sendo produzido por Fernando de Bellis, agente comunitário, onde denuncia o processo de higienização religioso que o bairro de Pirituba vem sofrendo nas últimas décadas desde que o governo Erundina (PT) legalizou os terrenos. O documentário mostra o processo de perseguição e fechamento que vieram passando os terreiros de candomblé ao longo de duas décadas e se propõe a fazer um resgate dessa cultu-
ra como forma de resistência cultural com a comunidade. A mostra ainda teve apresentações de dança, circo, performances, shows, bate-papos num misto de sons, cores e gestos que deram o tom de parte das produções culturais de SP. Este Jornal também faz parte deste rolê e agradecemos ao VAI e sua equipe que nos auxiliar com pepinos e alegrias como esta de cobrir este evento importante e ajudar a dar visibilidade aos projetos que ocorrem na cidade, notadamente nas bordas de SP. Para saber mais esses projetos culturais da Secretaria de Cultura acesse o site programavai.blogspot.com.
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Coletivos Culturais Periféricos lançam Manifesto contra a direita autoritária O Manifesto já conta com mais de 150 assinaturas Manifesto dos coletivos culturais de sp em apoio a reeleição de Dilma Nós, movimentos e coletivos artísticos, culturais, sociais, políticos e religiosos, organizados que subscrevem este texto, atuantes nas periferias de São Paulo, vimos por meio deste declarar nosso voto contra a direita autoritária, preconceituosa e excludente representada na candidatura de Aécio Neves do PSDB. Diante do atual cenário político, acreditamos que a oposição a esta ideia se representa na candidatura de Dilma Rousself. Como trabalhadores e trabalhadoras, moradores de favelas e periferias da cidade de São Paulo, temos presente na memória a barbárie que se instalou nestas regiões quando o PSDB governou o país entre os anos de 1995 e 2002. Também sentimos na pele a política deste partido à frente do governo do estado de São Paulo. Os governos do PSDB têm representado a criminalização dos movimentos sociais; a repressão contra a população pobre, preta e periférica e o preconceito contra os diferentes setores marginalizados da sociedade como os negros, índios, diferentes orientações sexuais e religiosas, nordestinos e pobres em geral. Preocupados com o retrocesso político e social proposto pela classe social que o PSDB representa, afirmamos nossa opção pela vida e contra a barbárie, ao apoiarmos a candidatura de Dilma Roussef para a presidência do Brasil. No entanto, gostaríamos de pontuar algumas pautas muito importantes para a população moradora da periferia de São Paulo e da periferia dos grandes centros urbanos do país. Estas pautas incidem diretamente em nossas vidas, e devem ter uma atenção maior por parte daqueles que ocupam os principais cargos públicos. Reivindicamos que o Governo Federal assuma o compromisso de priorizar Políticas Públicas de Estado para a população pobre, preta e periférica, assim como o fortalecimento dos movimentos sociais e dos setores historicamente marginalizados como os índios, negros e o combate a homofobia.
Destacamos e exigimos prioridade nos pontos elencados a seguir: •Demarcação de todas as terras indígenas e quilombolas (observa-se que as da cidade de São Paulo estão na mesa do Ministro José Eduardo Cardozo – Assina Cardozo); • Reforma urbana; •De maneira imediata, exigimos multas e desapropriações de terrenos e imóveis que não cumprem sua função social; •Pelo fim dos despejos; •Reforma agrária; •De maneira imediata, exigimos a desapropriação das fazendas que se utilizam de trabalho escravo, com punição aos responsáveis; •Combate ao uso de agrotóxicos na produção alimentar; •Investimento na produção agrícola realizada pelo pequeno agricultor; •10% PIB pra Educação Pública, Gratuita e de Qualidade; •Saúde 100% Pública, Gratuita e de Qualidade; •Pela legalização do aborto; •Ampliação de ações de combate a violência doméstica e da mulher; •Pela criminalização da homofobia; •Democratizar os meios de comunicação e suas concessões (abertura das rádios e TVs comunitárias); •Pela instituição de uma constituinte exclusiva e soberana para a reforma do sistema político; •Redução da jornada de trabalho de todas e todos trabalhadores para 40 horas semanais. Mais tempo livre para familia, estudos, lutas e ócio já! •Criação de uma agenda permanente de encontros regulares com os movimentos sociais; •Criação e aprofundamento de mecanismos de participação popular; •Pela taxação das grandes fortunas; •Fim imediato da violência policial; e desmilitarização das polícias; •Por uma política nacional de desencarceramento;
•Punição imediata dos responsáveis pelo genocídio da população preta, pobre e periférica; •Consolidação da Defensoria Pública e de sua interlocução popular; •Punição imediata dos responsáveis pelos crimes cometidos na Ditadura Militar (1964-1985); •Criar Comissão da Verdade para punir os crimes na Democracia; •Pela abertura de uma CPI para investigar e punir os responsáveis pelos mais de 500 incêndios em favelas ocorridos entre 2008 e 2012 no município de São Paulo; •Construção do Memorial da Memória e da Verdade nas Periferias no período Ditatorial e no pós-ditatorial; •Transporte 100% público, gratuito e de qualidade; •Aumento dos investimentos em infraestrutura nas periferias urbanas, com melhora da qualidade dos transportes e construção de mais linhas de metrô nessas regiões, com recursos federais; •Pelo aprofundamento dos processos de integração com países latinoamericanos; •Garantia de internet gratuita de qualidade para todo território brasileiro; No âmbito cultural, reconhecemos avanços em programas como o Cultura Viva e os Pontos de Cultura, dentre outros. No entanto, seguem abaixo pautas importantes que julgamos serem necessárias para produzirmos mais arte e cultura e de melhor qualidade, fundamentalmente aquela produzida pela população moradora da periferia: •1% do PIB para a cultura pública (ou seja, financiamento direto); •Fim das Leis de renúncia fiscal; •Criação de Políticas Culturais Públicas de Estado estruturadas em Lei priorizando as áreas com alto índice de vulnerabilidade social; •Defesa e Promoção das culturas tradicionais (indígenas, terreiros, ciganos, imigrantes) para o combate a intolerância cultural e religiosa;
Assinam este documento: cidadãos e coletividades artístico-culturais periféricas de São Paulo e Brasil
•Ampliação dos equipamentos para produção e promoção de cultura nas periferias urbanas e rurais (casas de cultura, bibliotecas, teatros, cinemas, etc.); •Atendimento e fortalecimento das propostas levantadas nas conferências de cultura municipais, estaduais e federal; •Ampliação do Plano Juventude Viva no combate ao racismo institucional que promove o genocídio da juventude pobre, preta e periférica; •Avançar na promoção da cultura voltada para a primeira infância, terceira idade e pessoas com deficiência; •Criação conferencia de cultura para infância; •Aprovação imediata da PEC 150 (garantia de recursos para a cultura); •Votação Imediata da Lei PNLL e a implementação dos PMLLs (Plano Nacional do Livro e Leitura); •Garantir que pelo menos 10% dos recursos do Fundo Social do Pré-Sal sejam destinados à Cultura; •Aprovação da lei Griôt; •Ampliar os programas VAI e Agentes Comunitários de Cultura para todo Território; •Criação de lei de apoio a ocupação de espaços públicos ociosos e/ou abandonados, por coletivos culturais locais; •Ampliar a ações intersetoriais entre Cultura, Educação, Esporte e Economia Solidária e Direitos Humanos; • Incluir o Futebol de Várzea dentro das políticas de cultura do MINC; Cremos que somente amplas mobilizações populares podem de fato fazer avançar estas pautas. Nos comprometemos a construí-las. Contamos com o apoio do governo Dilma Rousseff. Cabe ressaltar que temos plena consciência dos limites da via eleitoral. No entanto, segue sendo uma trincheira de luta, dentre outras. Abandonar esta trincheira por completo, neste momento, pode decorrer em graves consequências para o país, principalmente para as classes populares. Um pé no voto, uma vida na luta!
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MANIFESTO
Segue um trecho do Diario de Carolina de Jesus, escritora negra, catadora, que nos anos 50 escreveu o celebre Quarto de despejo. O ano de 2014 é o do centenário de seu nascimento.
Ilustrações: Ruana Negri
20 de julho de 1955 Deixei o leito as 4 horas para escrever. Abri a porta e contemplei o céu estrelado. Quando o astro-rei começou despontar eu fui buscar água. Tive sorte! As mulheres não estavam na torneira. Enchi minha lata e zarpei. (...) Fui no Arnaldo buscar o leite e o pão. Quando retornava encontrei o senhor Ismael com uma faca de 30 centimetros mais ou menos. Disse-me que estava a espera do Binidito e do Miguel para matá-los, que êles lhe expancaram quando êle estava embriagado. Lhe aconselhei a não brigar, que o crime não trás vantagens a ninguem, apenas deturpa a vida. Senti o cheiro do alcool, disisti. Sei que os ébrios não atende. O senhor Ismael quando não está alcoolizado demonstra sua sapiencia. Já foi telegrafista. E do Circulo Exoterico. Tem conhecimentos bíblicos, gosta de dar conselhos. Mas não tem valor. Deixou o alcool lhe do-
minar, embora seus conselho seja util para os que gostam de levar vida decente. Preparei a refeição matinal. Cada filho prefere uma coisa. A Vera, mingau de farinha de trigo torrada. O João José, café puro. O José Carlos, leite branco. E eu, mingau de aveia. Já que não posso dar aos meus filhos uma casa decente para residir, procuro lhe dar uma refeição condigna. Terminaram a refeição. Lavei os utensílios. Depois fui lavar roupas. Eu não tenho homem em casa. É só eu e meus filhos. Mas eu não pretendo relaxar. O meu sonho era andar bem limpinha, usar roupas de alto preço, residir numa casa confortável, mas não é possivel. Eu não estou descontente com a profissão que exerço. Já habituei-me andar suja. Já faz oito anos que cato papel. O desgosto que tenho é residir em favela. ... Durante o dia, os jovens de 15 e 18 anos sentam na grama e falam de roubo. E já tentaram assaltar o empório do senhor Raymundo Guello. E um ficou carimbado com uma bala. O assalto teve
inicio as 4 horas. Quando o dia clareou as crianças catava dinheiro na rua e no capinzal. Teve criança que catou vinte cruzeiros em moeda. E sorria exibindo o dinheiro. Mas o juiz foi severo. Castigou impiedosamente. Fui no rio lavar as roupas e encontrei D. Mariana. Uma mulher agradavel e decente. Tem 9 filhos e um lar modelo. Ela e o espôso tratam-se com iducação. Visam apenas viver em paz. E criar filhos. Ela tambem ia lavar roupas. Ela disse-me que o Binidito da D. Geralda todos os dias ia prêso. Que a Radio Patrulha cançou de vir buscá-lo. Arranjou serviço para êle na cadêia. Achei graça. Dei risada!... Estendi as roupas rapidamente e fui catar papel. Que suplicio catar papel atualmente! Tenho que levar a minha filha Vera Eunice. Ela está com dois anos, e não gosta de ficar em casa. Eu ponho o saco na cabeça e levo-a nos braços. Suporto o pêso do saco na cabeça e suporto o pêso da Vera Eunice nos braços. Tem hora que revolto-me. Depois domino-me. Ela não tem culpa de estar no mundo.
Refleti: preciso ser tolerante com os meus filhos. Êles não tem ninguem no mundo a não ser eu. Como é pungente a condição de mulher sozinha sem um homem no lar. Aqui, todas impricam comigo. Dizem que falo muito bem. Que sei atrair os homens. (...) Quando fico nervosa não gosto de discutir. Prefiro escrever. Todos os dias eu escrevo. Sento no quintal e escrevo.
POESIAS
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Ilustrações: Ruana Negri
O negro não tem fim Destino negado, Vida trocada, Religião amaldiçoada, Dança mal tratada. Convés lotados, Almas atormentadas, Pensamentos perdidos, Choro engolido, Dor aparente. Correntes ensurdecidas, Vidas malditas. Grita, agoniza Uma vida sem rima. Sem rima? Sinto a brisa.
CONSUMISMO
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A vida do negro sempre foi assim: - Agonizar, sobreviver. Agonizar, lutar, persistir e existir. Da dor, faz a dança. Dos maus tratos, sua segurança. Força que vem de Zumbi, De Dandara, De Ogum. Somos assim. Existimos, persistimos. Gritamos; - Nós negros não temos fim. Joice Azizi de Mendonça
Sobreviva, acredita. Sobreviva.
O mundo se consome de grão em pó de gota em bota de carro em luz é mais que sabido o preço; do petróleo, do feijão do bigmac, da água do sapato, da carne da coca e da soja em grão - ô campeão, quanto custa meia dúzia dessa virtude aqui!? o mundo se consome de lucro em latifúndio de ganância em desigualdade de burrice em capital de rancor em prazer banal de ilusão em falsos valores só não vê quem não quer o saldo negativo do progresso e a esperança? será o retrocesso ou o recomeço? Não sei. Mas não há ideologia que salve a pobreza de espírito... Eu acho que Deus já virou a ampulheta! .... E nós consumimos o mundo com a esperança de preencher o vazio que a alma deixou. ArthurVital
Se eu disser que não quero nada sério, um “compromisso” incerto Sem dia marcados, sem horas contadas, sem finais de semana prolongados Sem lençol desarrumado. Digas o que o pensa? Sem me namorar Sem me descompassar Chega de me beijar.... Joice Azizi de Mendonça
se é beatles que te fascina beatles-me, forte fortíssimo sem esse lenga lenga de cabelo comprido roupa arrumada sem beat sem Beatles Gerson Oliveira
I doze linhas arrebento de vagar & calça de moleton não interessa doze linhas de correr a mocidade cai na terceira estação sequente eu vi eu vi temores na palma da mão eu vi eu vi suor na palma das mães II linguagem é estar mudo perante a palavra e existir em palavra para lavrar-me e livrar-me da dobra da palavra III olhar olhar exer citar olho nu olhar olhar exer citar luzes ao alto olho olho estico reticências pois ex crê-ver não arrebenta linhas dos dedos Gerson Oliveira
Cor da pele
A Fala Falo, penso com a cabeça e Falo Todo falo que se preze falha Todo Feliz que não presta Fala Falo, mas não penso com a cabeça do meu falo Fato, todo ato não pensado é falho Feliz se ando pensando com o falo? Feliz o anus contemplado pelo falo. Falo mano e falho. Direito mano? Falso Direito humano? Falho É direito humano usar o falo Mesmo com a cabeça de outro falo. Não, não vou me calar, eu Falo Mesmo o Feliz não querendo eu Falo Mesmo o Feliz querendo falo, eu Falo. Falo dos deuses da fertilidade, Príapo, Exu, Frey, Osiris, Deuses que o (in)Feliz não crê. Deuses do gozo e do prazer Direito humano, fato. Mano a mano, Falo. Se Deus é humano é falho Ser feliz é humano, é fato. Todo prazer vem da cabeça Nem sempre vem do falo Homem pra ser homem não precisa do seu falo Nem mulher pra ser mulher usa o falo com regalo Abaixo o reinado do falo, Viva o reinado da Fala, De falar o que se pensa, Mesmo que seja sobre o falo, eu Falo. Feliz o anus contemplado pelo falo. Vandei Oliveira Zé
Afro bege Cor da pele, Cor da pele? Da pele de quem? Da minha não. Sou Preta, Sou Negra, Não sou mulata Sargentelle? Ele não sabe de nada. Morena? Me respeita SOU NEGRA Joice Azizi de Mendonça
Edição Especial 2015
Por Will Oliveira
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TIRINHAS
ENTREVISTA
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Edição Especial 2015 Foto: Divulgação S.R.B. Escola de Samba Lavapés
Tradição e resistência no samba Por Victor Leme Balan e Luciara Ribeiro
Foi na região central da cidade, entre os bairros da Liberdade, Cambuci, Aclimação e Glicério, que surgiu a mais antiga escola de samba em atividade da cidade de São Paulo, a S. R. B. E. Lavapés. Na década de 1930 a região do Glicério, ou Várzea do Glicério como era conhecida, caracterizava-se por ser uma área abandonada da cidade, reduto de boa parte da população pobre, formada por ex-escravos. Nesse lugar, a margem do que era considerado centro urbano de São Paulo, ocorriam manifestações do samba paulistano. Foi nesse ambiente que nasceu a Escola de Samba Lavapés, fundada em 1937 por Deolinda Madre (1909-1995), juntamente com seu marido Francisco Papa, o “Chico Pinga”, e seu irmão, José Madre, o “Zé da Caixa” (1918 - 2003). Deolinda mais conhecida por “Madrinha Eunice” foi a primeira diretora da Escola, cargo que ocupou até sua morte. Ela era filha de ex-escravos da região de Piracicaba, local onde vigorava o batuque de umbigada, o jongo e o samba rural. Até meados dos anos de 1950 o carnaval era diferente do que entendemos nos dias de hoje. Se hoje estamos acostumados a ver na televisão desfiles de escolas de samba formadas por alas e carros ale-
góricos, na época este ocorria de uma maneira mais simples, composto por foliões que cantavam as marchinhas nas ruas, com suas balizas e estandartes, era conhecido como cordão. Perpassando esses dois momentos, a Lavapés foi durante muito tempo uma das mais prestigiadas escolas do samba paulistano, tendo conquistado 19 títulos. Contudo na década de 1970, a escola teve seu primeiro rebaixamento e não conseguiu mais retornar ao grupo especial, estando hoje no grupo três de acesso. Contudo, se a escola atualmente não ocupa posição de destaque entre as escolas do grupo especial, ao menos o reconhecimento de sua importância ao samba paulistano está garantido. No mês de outubro do ano de 2013, o samba paulistano foi reconhecido como patrimônio imaterial pelos órgãos municipais. Na cerimônia de solenidade, realizada no dia 02 de dezembro (Dia Nacional do Samba), não faltaram menções à Lavapés pelo seu samba de resistência. No mês de novembro do mesmo ano a Escola foi vencedora do concurso do V repinique de ouro e da I bateria nota dez, ambos organizados da União das Escolas de Samba Paulistanas (UESP). Disto, nos resta uma pergunta: o que faz uma escola
de samba que está a margem do grupo especial permanecer por tanto tempo em atividade? A resposta o grande sambista Geraldo Filme nós dá: “É tradição e o samba continua...”, pois, mesmo longe dos holofotes e do glamour das grandes escolas, a Lavapés continua pela força, amor, dedicação e garra de seus diretores, associados e membros, que passam de geração a geração a tradição do samba. Assim, ao dizer: Lavapés, estamos falando de passado, presente e, sobretudo, do futuro, pois, como dizia Madrinha Eunice: “A Lavapés teve começo, mas nunca terá fim”. Confira abaixo a entrevista com Rosemeire Marcondes, atual diretora da Escola. Voz da Leste: O que é o carnaval pra você? Rose: (risos) ...Carnaval é minha vida, eu acho. Eu vivo cada momento. O samba é alegria, é emoção, é aquele momento, ali, naquela hora. Eu acho que vale muito a pena viver o carnaval. Apesar do carnaval não ser nosso, totalmente, e ser de outro país. Mas, a gente acabou adaptando ele no nosso país. E, eu acho que é melhor coisa que tem pra nós.
Voz da Leste: como você vê e caracteriza o carnaval de São Paulo? Rose: o carnaval de são Paulo hoje é um carnaval de indústrias e empresas. Não é mais um carnaval como era antigamente, como eu cresci no carnaval. Hoje é um carnaval de visual, de grandes artistas dentro da escola. Hoje é totalmente diferente do que eu vivi quando a minha avó era presidente. Hoje é bem empresa mesmo. Não tem nada de diferente no visual. Eu acho que é o maior evento que temos na cidade é o carnaval hoje. Ele tem uma visibilidade muito grande, tanto para trabalhador, ou para o grande empresário. O carnaval é muito bom. Voz da Leste: Como que a Lavapés se insere no carnaval de São Paulo? Rose: A Lavapés hoje está aprendendo tudo de novo. O carnaval, pra esse grandioso carnaval que está ai hoje. A gente já tem mudado algumas estratégias, tem acompanhado mais, os outros carnavais das entidades grandes que tão por ai. A gente já tem acompanhado o mesmo ritmo que tem as grandes escolas. Voz da Leste: E a sua direção na escola? Como está? Rose: eu trato a escola como se fosse parte da minha família, como se ele fosse mi-
nha avó ou meu avô mais velho, aquela pessoa mais velha. E, eu cuido dele com muito carinho, com muita atenção, e por sinal eu me dedico muito mais a escola de samba do que propriamente pra minha família. Quando chega o carnaval, eu abandono toda a minha família e só vivo para a Lavapés, entendeu? Eu acho que ela faz parte da minha família, um filho mais velho, coisa desse jeito. Voz da Leste: Quais as suas expectativas para o carnaval de 2015? Rose: 2015 eu preciso ganhar, ganhar e ganhar. Porque, senão vai ficar muito difícil a gente sair desse grupo. Até porque eu ando um pouco cansada, né? Hoje, se não melhorar, se as pessoas não ajudarem, não tem como. Nós precisamos de pessoas que agregam com a gente para que o samba viva. Agora, se não tiver essas pessoas, eu acho que fica muito difícil pra mim continuar só com a minha família. Então, eu preciso de muita gente, muitos parceiros para colocar o samba na rua. Voz da Leste: O que motivou escolher o enredo do ano que vem? Rose: o que motivou foi a grana. Não temos grana pra esse ano, vamos reaproveitar coisas. Eu não gosto de fazer, nunca gostei. Tem dois aqui que sabem que eu não gosto de reaproveitar nada do carnaval anterior, mas como eu não tenho grana, eu vou reaproveitar tudo pra por nesse enredo. Esse enredo a gente já fez e deu muito certo, foi muito bonito e legal falar de todas as feiras que tem por aqui. A Lavapés tem “Feiras” como tema do samba enredo do carnaval 2015, os ensaios ocorrem nos meses de Novembro/Dezembro e Janeiro, aos sábados das 17h às 21h em frente a lanchonete Flôr da Lavapés, localizada na rua Junqueira Freire 163 - Glicério - São Paulo. Mais informações em www.facebook.com/ lavapes.
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Cida Santos historiadora e assistente social
Texto e fotos Escobar Franelas
Em algum dia da década de 1990 recebi em minha casa a visita principesca do cantor e compositor Cacá Lopes. Ele, cortês, deu-me de presente um exemplar do livro Zona Leste Meu Amor, de Cida Santos. Eu não a conhecia, mas a partir da leitura dessa obra essencial, comecei a “acompanhá-la”, segui-la em suas andanças públicas. Mas ela não sabia de minha existência. O tempo passou e surgiram então essas novas tecnologias maravilhosas que permitem uma aproximação mais sutil entre as pessoas. Ficamos, estamos, somos, amigos desde então. Na sinceridade mais genuína que se possa construir - ou permitir. 1) Quem é Cida Santos? R: Assistente Social por opção, formada na Faculdade da Zona Leste (hoje, UNICID) e escritora por acaso. Descobri, desde criança, que queria ser Assistente Social, sem saber ao menos o verdadeiro significado da profissão. Quando iniciei meu estágio, no primeiro ano de faculdade, estava numa das muitas favelas que conheci e entrei num barraco pra conversar com a moradora e percebi que sua filha não parava de chorar. Aí perguntei pra aquela senhora, por que sua filha chorava tanto e ela, “ela está com fome e eu não tenho nada para dar a ela”. Saí correndo, fui num daqueles botecos de favela que costumam ter de tudo, pedi dois pacotes de macarrão, um litro de óleo e um quilo de sal; paguei, retornei e entreguei para aquela senhora. Saí de alma lavada, “achando” que salvei o mundo! Ledo engano, ao entrar no segundo, no terceiro, no quarto barraco, a situação era a mesma e eu só tinha dinheiro para chegar até a minha casa, pois havia necessidade de tomar dois ônibus. Sentei-me numa pedra que havia naquela comunidade e comecei a chorar e aí, a minha orientadora
sentou-se ao meu lado, perguntando o que havia acontecido? Relatei o ocorrido e então ela me disse, “se você acredita que ser Assistente Social é isso, então é melhor você parar por aqui e rever os seus conceitos”. Naquele momento, senti uma tristeza tão grande, mas ao mesmo tempo descobri que serviço social significava algo muito mais nobre que promover o ser humano, era muito mais importante do que “dar esmolas”. Cresci muito a partir daquele momento e optei por continuar meus estudos. Eu e outras colegas passamos a promover ações de geração de renda, criar vínculos com todas as famílias e a vida delas começou a mudar. A partir do momento em que você cria vínculos com uma comunidade, é incrível, as pessoas passam a ter consciência dos seus valores e automaticamente elas mudam de vida. Passei a entender a profissão que eu havia escolhido e me entreguei de corpo e alma. Ser Assistente Social, hoje é minha Missão. (Nasce a escritora) A escritora nasceu por acaso. Andando pelos caminhos tortuosos da minha querida Zona Leste, descobri “pequenos mundos” que me fascinaram! Conheci “líderes de comunidades”, como José MESSIAS da Silva, ELGITO Boaventura, Santo, Amaury Joaquim da Silva, Seu Luiz, Vera Lucia Alves da Silva, Luzia Monteiro, Padre Ticão, Dalva Paixão, Seu Espíndola, Luizão, Seu Elias, Chico Terra, João Lucas, Honório Arce, Socorro, Dona Lola, Jorge do Carmo, Tauá, Ana Maria Martins, etc... e tantos outros, líderes no sentido exato da palavra, que me davam lição de vida a cada momento. Um deles, o MESSIAS da Favela Jardim Robru, passou a ser o meu “herói”, tamanha era a admiração que eu tinha por ele! Em nome de fascínio pelas
lideranças, decidi escrever um livro e o título nasceu primeiro: ZONA LESTE MEU AMOR. Fui colhendo depoimentos de todos eles e o primeiro livro ficou pronto rapidinho. Lembrome do lançamento, na Casa de Cultura Chico Mendes, que o meu querido amigo Cacá de Oliveira era o Diretor. O evento teve início às 8 da manhã e só terminou às 18 horas. Foi um evento e tanto, porque tratava-se do primeiro livro sobre a Zona Leste e que contava a história de heróis anônimos que as pessoas “achavam” que conheciam mas, que na realidade, por trás deles havia uma riqueza cultural muito grande. Acredito que em toda a história da ZL, nunca alguém conseguiu reunir tanta gente importante num só lugar e num só dia! Tinha gente de todas as classes sociais e políticos de todos os partidos, todos ali, debaixo do mesmo teto! Foi realmente um dia inesquecível! Pra mim e para todos aqueles líderes, que se transformaram em “amigos” de verdade! 2) Baseada nessas experiências tão ricas, como você sente o mundo hoje? As coisas realmente melhoraram? Ou há uma ilusão de ótica na interpretação do social? R: O mundo hoje, meu caro Escobar, penso que está havendo uma grande inversão de valores... As pessoas perderam muito de sensibilidade, tornaram-se “práticas” demais; o essencial, o simples, perdeu o valor! O ser humano está valendo muito pouco. Não estou sendo pessimista não; sei que ainda existem pessoas “que pensam”, que “fazem” a diferença, graças a Deus! Quanto ao social, sim, há uma ilusão de ótica na interpretação de muitos, principalmente para grande parcela da população pobre e também dentro da classe política! O social tem sido interpretado como uma “muleta”... Poucos buscam a “promoção” do ser humano e muitos desejam que o ser humano não cresça, não desperte para a vida; para eles, é melhor que o ser humano continue sendo “coitadinho”, porque o “coitadinho” precisa de esmolas, o “coitadinho” será sempre “dependente” de tudo! Mas vejo uma luz no fim do túnel, pois percebo em alguns lugares, muitos jovens despertando para a verdadeira vida, pensando como “gente grande”, fazendo arte com consciência, preocupando-se com os graves problemas que o País enfrenta. Tudo isso traz a esperança e a gente passa a acreditar que ainda é possível vivermos num mundo melhor. 3) Você citou grandes nomes que contribuíram para o crescimento da zona leste. Eles deixaram “herdeiros” de suas militâncias? R: Sim, nomes importan-
ENTREVISTA tíssimos que misturam-se com a própria história da Zona Leste! Contribuíram muito para o crescimento dessa região, mas fico procurando outros líderes, iguais ou semelhantes e não consigo visualizar nenhum! Talvez, no momento atual, eu esteja um pouco distante da ZL, por estar morando aqui em Laranjal Paulista! Mas, nunca mais ouvi falar de líderes como o Messias, por exemplo! Ele era capaz de dar a vida pela sua comunidade! Será que hoje existe alguém na ZL, que seja capaz disso? Não sei, penso que é muito difícil! Mas a essência desses grandes líderes ficou em nós, para que possamos perpetuá-los pela eternidade! Hoje, dentro de comunidades, eu só vejo um líder, capaz de coisas excepcionais! Esse Homem chama-se Padre Ticão! 4) O que a faz acreditar que não há mais líderes como estes que você citou? Estamos realmente vivendo o fim das utopias? R: Você fala em utopia! Penso que eles viveram, realmente, a maior das utopias!!! Por outro lado, eles foram capazes de transformar a Comunidade em que viviam, mudaram planos de governo, foram presos muitas vezes, enfrentaram tempestades, mas mudaram muita coisa, então não foi um sonho? Foi tudo real... Penso que o mundo mudou e os líderes também mudaram! Talvez estejamos mesmo, vivendo o fim das utopias e isso me causa certa nostalgia... 5) Quais livros você publicou? R: Publiquei dois livros, Zona Leste Meu Amor – Personagens de uma história de lutas (1994) e Zona Leste Fazendo História (1997). 6) Tem intenção de publicar mais algum? R: Sim, eu gostaria de publicar mais um livro, creio que no início do próximo ano! Estou fazendo uma pesquisa sobre a história de minha família materna “os Ferrari”! São muitos e muitos anos, que meus “nonnos” maternos vieram de Verona/Itália. Desde 1892, já se passaram 120 anos, que essa família foi se formando aqui no Brasil! Essa pesquisa envolve muitas viagens e, neste momento, não estou conseguindo viajar devido à doença de meu pai. Mesmo assim, tenho obtido muitas informações através da internet. Já tenho pelo menos 200 páginas escritas e cerca de 2000 fotografias! Creio que até o início de 2013, vou conseguir. A história dos Ferrari é fascinante! 9) Quais obras (cinema, livro, teatro, música etc) que são referência para você? R: Minhas preferências? Cinema gosto, mas não sou fanática! Literatura, amo de paixão, todos os grandes escritores bra-
sileiros, apaixonada por Guimarães Rosa, Jorge Amado, Machado de Assis, Ferreira Gullar e muitos e muitos outros! Amo o Poeta Chileno Pablo Neruda, o seu livro “Confesso que Vivi” é o meu livro de cabeceira, junto com “Água Viva” de Clarice Lispector! Enfim, tudo o que é bom eu gosto de ler. Sou apaixonada pela poesia de Escobar Franelas, Francisco Xavier, Alvaro Posselt, Akira Yamasaki, Gilberto Braz, Paulo Alvarenga, José Vicente de Lima, Cecília Fidelli, Yohana Sanfer, esse povo mais novo que me encanta com seus poemas todos os dias! O teatro eu amo de paixão, lembro-me da Escola Dom Pedro em São Miguel, lá pelos idos de 67, 68 e 69, quando eu tive aulas de Artes Dramáticas com o Professor Luiz! Lembro-me de encenar o Auto da Compadecida de Gil Vicente. Morro de saudade de tudo isso! Penso que o Teatro tem um poder transformador na vida das pessoas! Quanto à Música, sou apaixonada por Música Popular Brasileira de qualidade, sou fã de Chico Buarque, Milton Nascimento e Caetano Veloso! Sou apaixonada pela música regional, que passa por Almir Sater, RenatoTeixeira,Vidal França, João Bá, Dércio Marques,Vital Faria, Geraldo Azevedo, Elomar Figueira, etc. Amo a música chilena, tenho três discos de Victor Jara que são os maiores tesouros que guardo comigo. Amo, ainda, a música cubana de Silvio Rodriguez e Pablo Milanés! Amo esses meninos todos que fazem arte na ZL, Edvaldo Santana, Cacá Lopes, Ronaldo Ferro, Sacha Arcanjo, Zulú de Arrebatá, Ceciro Cordeiro, enfim, todos esses que fazem parte desse rol de amigos... Outra coisa que eu também sou apaixonada, são algumas cantoras maravilhosas, como: Maria Martha (ela cantava no Boca da Noite do Bixiga e, hoje, canta e encanta Paraty), Mirian Mirah que fazia parte do Grupo Tarancón e também Mônica Albuquerque, que são pessoas que não estão na mídia televisiva, mas que lotam teatros e encantam plateias inteiras. Gosto também do cururu da minha região; conheci, desde criança todos os monstros sagrados do cururu, como: Parafuso, Pedro Chiquito, Zico Moreira, Nhô Serra, Horácio Neto e Luizinho Rosa.Amo o folclore, as festas religiosas, principalmente, as festas do Divino Espírito Santo e do Reizado, que acontecem aqui na minha região.
CULTURA
Fotografia de Divulgação
Dandara dos Palmares (1664 – 1694). Mulher, negra e guerreira