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Desafios culturais
DESAFIOS
CULTURAIS 3
Uma vez que estamos vivendo no “tempo do fim”, quando as profecias de Daniel poderiam ser plenamente compreendidas, nos compete dedicar tempo e energia ao estudo desse maravilhoso livro da Bíblia. Daniel contém 12 capítulos. O capítulo 1 funciona como uma introdução apropriada ao livro como um todo. Fala da primeira invasão de Babilônia a Jerusalém, do aprisionamento e cativeiro de Daniel e seus amigos e do teste que enfrentaram para ocupar uma posição junto à corte real. Também é fundamental para a compreensão dos eventos do capítulo 2, quando Nabucodonosor, rei de Babilônia, tem um sonho misterioso com uma assombrosa estátua. Explica também a procedência dos vasos de ouro e prata que estavam em Jerusalém e foram levados para o templo de Marduque, principal deus em Babilônia, os quais são profanados momentos antes de sua queda, segundo o relato do capítulo 5. Assim, o primeiro capítulo fornece detalhes para a compreensão dos eventos registrados em todo o livro.
A lição ensinada no capítulo 1 é o interesse de Deus pelas nações e pelos indivíduos. Segundo C. A. Auberlen e S. P. Tregelles, a própria divisão do livro em duas línguas atesta esse fato. Segundo sabemos, o livro de Daniel foi escrito originalmente em dois idiomas:
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a) 1:1 a 2:4a: Hebraico b) 2:4b a 7:28: Aramaico c) 8:1 a 12:13: hebraico
Esses autores sustentam que essa mudança de línguas é a chave para se compreender os propósitos de Deus no livro. Na medida em que existe uma estrutura, observa-se que o livro de Daniel transmite uma mensagem de julgamento e derrota para o mundo gentio, do qual os principais representantes no tempo do profeta eram Nabucodonosor, Belsazar, Dario e Ciro. A linguagem apropriada nessa parte que se refere aos gentios é o aramaico, língua diplomática e comercial da época. O livro transmite ainda outra mensagem, uma mensagem de esperança e livramento para o povo de Deus, os hebreus. Para a parte que trata dos hebreus, a língua é, naturalmente, o hebraico.1
O GRAnDE cOnflITO cOMO PAnO DE fUnDO
Desde o início do livro vemos em marcha o grande conflito entre o bem e o mal, entre o culto pagão e a adoração ao verdadeiro Deus. Logo no primeiro verso, duas cidades se destacam. Jerusalém, capital do povo de Deus, e Babilônia, capital idólatra, representando a sede do poder que se opõe a Deus. De fato, essas duas cidades são citadas em toda a Bíblia, do Gênesis ao Apocalipse, e podemos ver a intensa luta entre a luz e as trevas, a verdade e o erro, em cada momento da história.
Logo no primeiro livro da Bíblia, Gênesis, no verso 18 do capítulo 4, lemos: “Ora, Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; pois era sacerdote do Deus Altíssimo”. A expressão “Salém” deu origem ao nome “Jerusalém”, cidade da paz (Salmo 122; 135:21).
Onde está Babilônia no Gênesis? O capítulo 10 fala sobre um famoso caçador chamado Ninrode e que o princípio de seu reino foi Babel (Gênesis 10:10). No verso 9 do capítulo 11, falando sobre uma torre que os homens estavam construindo, lemos: “Por isso se chamou o seu nome Babel, porquanto ali confundiu o Senhor a linguagem de toda
1 CULVER, Robert D. Daniel: comentário bíblico Moody: Isaías a Malaquias. São Paulo: Imprensa Batista Regular, 1990, p. 210.
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a terra, e dali o Senhor os espalhou sobre a face de toda a terra”. De “Babel” vem a palavra “Babilônia”, confusão.
Já o livro de Apocalipse apresenta a Nova Jerusalém como sendo a morada do Altíssimo com os salvos por toda a eternidade (Apocalipse 21:2, 3), evento este que ocorrerá somente após a queda de Babilônia, descrita nos capítulos 14 e 18. Vemos assim essas duas cidades existindo durante todo o decorrer da história. No livro de Daniel, elas se encontram e a primeira impressão que temos é que Babilônia sai vitoriosa sobre a cidade de Deus, Jerusalém. Entretanto, somente a conclusão da história pelas lentes da profecia nos permitirá avaliar a questão de forma correta.
O cATIVEIRO DO POVO DE DEUS
Vimos no capítulo 1 que o povo de Deus enfrentou três cativeiros ao longo de sua história. O livro de Daniel inicia com a descrição do terceiro – o cativeiro babilônico. “No ano terceiro do reinado de Jeoaquim, rei de Judá, veio Nabucodonosor, rei da Babilônia, a Jerusalém e a sitiou” (Daniel 1:1). Nesse período da história quatro principais nações dominavam o Oriente Médio: Egito, Lídia, Média e Babilônia.
O Império Assírio, terrivelmente cruel, havia dominado o crescente fértil2 por cerca de 300 anos. Esse mesmo império havia destruído as 10 tribos de Israel em 722 a.C., mas agora estava chegando ao seu ocaso e despontava um novo poder: Babilônia.
Por volta de 612 a.C., Nabopolassar conseguiu vencer a Assíria e tornou-se o fundador do Império Neobabilônico. Seu filho, Nabucodonosor II (o mesmo do livro de Daniel), conseguiu elevar Babilônia à sua época de ouro. Seu nome NABU-KUDURRI-USUR significava em caldeu “prece dirigida ao deus Nabu por proteção”.3
2 “Crescente fértil” é a região do planeta onde surgiram as primeiras civilizações. Região que englobava a Mesopotâmia, uma faixa de terra junto ao Mar Mediterrâneo e o nordeste da África. Ficou conhecida por esse nome porque seu traçado forma um semicírculo que lembra a Lua no quarto crescente e também pela presença de grandes rios (Tigre e Eufrates), cujos vales apresentavam solos férteis propícios para a prática da agricultura. Fonte: <http://www.historiamais.com/crescente_fertil.htm>. Acessado em 30 junho 2013. 3 NICHOL, Francis D. Comentário bíblico adventista. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2013. V. 4, p. 831.
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Por vezes, os judeus buscaram o apoio do Egito para não caírem nas mãos de Babilônia, mas por meio do profeta Jeremias e Isaías, Deus orientou que não buscassem essa aliança, mas cedessem ao domínio de Babilônia. Finalmente, no dia 1º de junho de 605 a.C., Nabucodonosor derrotou o posto militar avançado do Egito, localizado em Carquêmis. Com a morte de seu pai, Nabopolassar, no dia 15 de agosto do mesmo ano, Nabucodonosor viaja às pressas para Babilônia, antes que um impostor usurpe o trono. No dia 7 de setembro de 605 a.C. ele chega a Babilônia e é coroado rei.4
Judeia, cidade de Daniel e seus amigos, estava localizada ao longo da costa oriental do mar Mediterrâneo, território hoje ocupado por Israel. Babilônia se localizava junto ao rio Eufrates, próximo à atual localização de Bagdá, capital do Iraque. Os rios Tigre e Eufrates irrigavam um vale bastante plano, limitado a Leste por uma cadeia de montanhas e a Oeste pelo deserto. O vale era chamado de “Mesopotâmia”, ou “terra que fica entre rios”. A rota regular de Jerusalém para Babilônia extendia-se por mais de 1.500 km. Caminhando cerca de 25 km por dia, seria uma viagem de aproximadamente dois meses.5 Foi esse longo percurso que Daniel, seus amigos e outros príncipes judeus fizeram como escravos.
Mas por que Deus “entregou” (Daniel 1:2) Jeoaquim, rei de Judá, e os utensílios do templo nas mãos do rei de Babilônia? Por que Deus permitiu o cativeiro de Seu povo?
Ellen G. White, falando dos propósitos divinos ao permitir o cativeiro do povo de Israel, escreveu: “A religião deles centralizava-se nas cerimônias do sistema sacrifical. Haviam feito da forma exterior algo da máxima importância enquanto tinham perdido o espírito do verdadeiro culto [...] O Senhor agiu ao permitir que o povo fosse levado ao cativeiro e ao interromper os serviços do templo, a fim de que as cerimônias exteriores não se tornassem a essência da sua religião [...] A glória exterior foi removida, para que o espiritual pudesse ser revelado”.6
A primeira invasão da Judeia é o evento que assinala a data do início do cativeiro babilônico que, segundo o profeta Jeremias, seria de 70 anos
4 MAXWELL, C. Mervyn. Uma nova era segundo as profecias de Daniel. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1996. p. 32. 5 Ibidem. p. 18. 6 WHITE, Ellen G. Meditação Matinal: Olhando para o alto. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1983. p. 155.
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(Jeremias 25:11, 12). Ao todo, foram três as invasões babilônicas a Jerusalém. A primeira ocorreu no ano 605 a.C. Nabucodonosor fez Joaquim se ajoelhar diante dele e levou reféns, entre eles, Daniel e seus companheiros (Daniel 1:1-6). Mais tarde, em 597 a.C., em outra expedição à Palestina, depois de certas atitudes rebeldes da parte dos reis judeus, Joaquim e Jeoaquim, Nabucodonosor viu a necessidade de punir essa rebeldia, e tornou a subjugar Jerusalém. Desta vez, ele levou cativo 10.000 prisioneiros, entre os quais estava o rei Jeoaquim e o jovem profeta Ezequiel (Ezequiel 1:1-3; 2 Crônicas 36:10; 2 Reis 24:8-20). Finalmente, em 597 a.C., depois de um longo cerco, Nabucodonosor destruiu a cidade e o templo, bem como toda a comunidade judaica (2 Reis 25:1-7; Jeremias 34:1-7; 39:1-7; 52:2-11).
A Bíblia relata que Nabucodonosor profanou o santuário do Altíssimo, tomando parte dos utensílios sagrados do Templo, que somavam mais de 5.000 objetos,7 e os levou para Babilônia colocando-os na casa do seu deus, Marduque. Esses saques dos tesouros sagrados pelos babilônios cumpriram as profecias de Isaías e Jeremias. Os profetas haviam declarado:
“Eis que virão dias em que tudo quanto houver em tua casa, juntamente com o que entesouraram teus pais até o dia de hoje, será levado para Babilônia; não ficará coisa alguma, disse o Senhor” (Isaías 39:6). “E voltarão os caldeus, e pelejarão contra esta cidade, e a tomarão, e a queimarão a fogo” (Jeremias 37: 8). O livro de lamentações de Jeremias (1:1-5; 2:1-4, 13) fala da tristeza que se abateu sobre o profeta ao testemunhar seu povo levado cativo.
Marduque era o principal deus de Babilônia que, no tempo da primeira dinastia, mais de mil anos antes, tinha sido chamado usualmente Bel, “senhor”. Seu templo principal chamado Esagila, em cujo pátio estava a grande torre chamada Etemenanki, ficava no coração de Babilônia.8 O fato dos utensílios sagrados usados no serviço do santuário estarem agora no templo de Marduque era um símbolo da vitória desse deus sobre o Deus dos judeus. Parecia que a situação havia fugido ao controle. Entretanto, como veremos mais à frente, Deus estava
7 MAXWELL, 1996, p. 25. 8 SDABC, V. 4, p. 759.
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conduzindo todas as coisas para beneficiar Seu povo, e dar ao mundo da época uma mensagem que jamais poderia ser esquecida, sendo pertinente ainda para nossos dias.
PORTA-VOzES DE DEUS nO cATIVEIRO
Ellen G. White afirma que “Daniel tinha apenas dezoito anos quando foi levado a uma corte pagã a serviço do rei de Babilônia”.9 Junto com seus amigos, Hananias, Misael e Azarias, seria testado em todos os aspectos. As provas os preparariam para posições mais elevadas, onde teriam a oportunidade de testemunhar a respeito do Deus verdadeiro. Esses jovens se tornaram um exemplo para os jovens modernos, e em Babilônia passaram por quatro testes difíceis que foram verdadeiras provas de fé. Vamos analisá-las:
PRIMEIRA PROVA DE fé: DE nObRE A EScRAVO
O primeiro teste aos exilados hebreus foi a mudança de seu status social – de príncipes do reino de Judá a escravos em terra estrangeira. Os conquistadores da antiguidade tinham o costume de levar os nobres como reféns para assegurar a lealdade dos inimigos vencidos. Assim, seguindo o costume da época, Nabucodonosor ordenou que jovens sem nenhum defeito e de boa aparência, instruídos em toda sabedoria, doutos em ciência e versados em conhecimento, deveriam ser preparados para ajudarem no palácio do rei. Esse período preparatório duraria três anos (Daniel 1:3-5), e, ao final, um teste seria feito para saber quem estaria apto para ajudar no palácio real.
Diante de circunstâncias tão terríveis, a fé desses jovens poderia ter vacilado. As circunstâncias não eram nada boas. Escravizados em terra estranha, com sua cidade querida em ruínas, o glorioso templo que Salomão erguera e onde se ofereciam os sacrifícios estava agora destruído, seu rei feito escravo, o que poderia ser pior? Nessas condições, eles poderiam ter abandonado suas crenças e reconhecido que Marduque era o deus mais poderoso. No entanto, não fizeram isso. Em momento algum sua fé vacilou. Apegaram-se às promessas divinas e
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creram que Deus agiria para libertar Seu povo como os profetas haviam anunciado (Isaías 44:27, 28; 45:1; Jeremias 25:11,12).
SEGUnDA PROVA DE fé: MUDAnçA DOS nOMES
Um segundo teste enfrentado pelos jovens hebreus foi sua mudança de nomes. Mudar nomes era uma prática comum na história bíblica. José recebeu um nome egípcio ao ingressar na vida cortesã egípcia (Gênesis 41:45), e o nome de Hadassa foi trocado por (Ester 2:7). A mudança de seus nomes significava que esses jovens hebreus estavam sendo adotados pela corte babilônica. Seus novos nomes representavam divindades caldeias.
Daniel agora é beltessazar: levando em conta o comentário de Nabucodonosor (Daniel 4:8), que o nome babilônico de Daniel se relacionava com o deus dele, “Bel”, fica evidente que a primeira sílaba, “Bel”, refere-se a Marduk, o principal deus babilônico. Assim, a melhor tradução seria “Bel proteja sua vida [a do rei]”.10
Hananias agora é Sadraque: Hananias significa “o Senhor é bondoso comigo”. Sadraque: “Inspiração ao deus sol”. Seria o deus sol que passaria a brilhar bondosamente sobre ele e não o senhor Deus de Israel.
Misael agora é Mesaque: Misael significa “semelhante a Deus”. Mesaque: “servo da deusa Sheba”.
Azarias agora é Abede-nego: Azarias: “o Senhor é meu ajudador”. Abede-Nego: “o servo de Nebo”. Geralmente se aceita que esse nome corresponde ao Abede-Nebo, “servo de [o deus] Nabu”, nome que se encontra em um papiro aramaico achado no Egito.11
Nabucodonosor não obrigou os jovens hebreus a renunciarem sua fé e adorarem os deuses de Babilônia, mas com essas mudanças de nomes esperava alcançar isso gradualmente. Também mediante as práticas e costumes idólatras da nação esperava induzi-los a renunciar à religião hebraica e unir-se aos deuses de Babilônia. Mas isso não funcionou com Daniel e seus amigos. Mesmo alterando seus nomes, sua reverência e lealdade para
10 O Dr. S. J. Schwantes alega que a origem mais provável do nome dado a Daniel, Beltessazar, é do babilônico Belet-sar-usur, “Que a madona (Ishtar) proteja o rei”. Belet é feminino de bel, “Senhor”, título dado ao deus Marduque, chefe do panteão babilônico. (Ver SCHWANTES, S. J. Daniel, o profeta do juízo. Engenheiro Coelho, SP: Gráfica Alfa, 2003, p. 25). 11 FINLEY, Mark. Revelando os mistérios de Daniel. São Paulo: Editora Tempos Ltda., 1999, p. 14.
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com o Deus verdadeiro não foram afetadas. Seus princípios religiosos, aprendidos desde a infância, se mostraram uma fortaleza nos momentos de prova e produziram um caráter nobre e forte. Ellen G. White escreveu:
“Entre os filhos de Israel que foram levados cativos para Babilônia no início dos setenta anos do cativeiro havia cristãos patriotas, homens que eram tão fiéis ao princípio como o aço, e que se não deixariam corromper pelo egoísmo, mas honrariam a Deus com prejuízo de tudo para si [...] Jamais deviam comprometer-se com idólatras; sua fé e seu nome como adoradores do Deus vivo deveriam ser levados como alta honra. E isso eles fizeram. Na prosperidade e na adversidade honraram a Deus; e Deus os honrou a eles”.12
TERcEIRA PROVA DE fé: REGIME AlIMEnTAR O terceiro teste enfrentado pelos jovens em Babilônia estava relacionado ao seu regime alimentar. Nessa mesma área, Adão e Cristo haviam sido tentados. O primeiro falhou, mas Cristo saiu vencedor sobre a terrível prova e sua declaração ecoa como símbolo de vitória sobre o inimigo: “Nem só de pão viverá o homem” (Mateus 4:4).
A clara ordem do rei havia sido para que todos participassem dos manjares e vinho da mesa real. Nabucodonosor pensava estar fazendo um grande favor e concedendo um grande privilégio aos jovens cativos. Daniel precisava tomar uma decisão agora: Deveria ele apegar-se aos ensinamentos de seus pais sobre comidas e bebidas, e desagradar o rei, com a provável perda não apenas de sua posição, mas da própria vida; ou desconsiderar os mandamentos do Senhor e conservar o favor do rei, garantindo dessa forma vantagens intelectuais e temporais? Não houve um momento de hesitação. Daniel e seus amigos eram regidos pelos princípios da Palavra de Deus. A Bíblia declara: “Resolveu Daniel firmemente não contaminar-se” (Daniel 1:8). Havia várias razões pelas quais um judeu piedoso evitaria comer da comida real:
1. Os babilônios, como outras nações pagãs, comiam carnes imundas (Levítico 11).
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43 2. Os animais não tinham sido mortos de acordo com a lei levítica (Levítico 17:14-15). 3. Uma parte dos animais destinados ao alimento era oferecida, primeiro como sacrifício aos deuses pagãos (Atos 15:29). 4. O consumo de mantimentos e bebidas alcoólicas era contra os princípios de estrita temperança como apresentado no Antigo
Testamento, a Bíblia desses jovens (Provérbios 20:1; 23:20; 31:4).
Daniel e seus amigos “estavam familiarizados com a história de Nadabe e Abiú, de cuja intemperança e seus resultados foi conservado o registro nos pergaminhos do Pentateuco; e sabiam que suas próprias faculdades físicas e mentais seriam danosamente afetadas pelo uso do vinho” (Levítico 10:1-3).13
Esse teste ao qual Daniel foi submetido ilustra a verdadeira temperança e as bênçãos que se seguem aos que a praticam. Se desejarmos manter nossas faculdades puras para o serviço de Deus, precisamos observar estrita temperança no uso dos alimentos. Devemos praticar a regra básica: usar com moderação as coisas que nos são benéficas e nos abster completamente das que nos são prejudiciais.
Como Daniel e seus amigos, devemos buscar desenvolver hábitos corretos que promovem a saúde plena. Faculdade intelectual, força física e longevidade dependem de leis imutáveis criadas por Deus. Nessa questão o acaso não existe. Iremos colher aquilo que semearmos. “O Deus da natureza não interferirá para preservar os homens das consequências da violação das leis da natureza”.14
Pense, por exemplo, em uma pessoa que não bebe a quantidade de água suficiente ao longo do dia. Ela pode ser diagnosticada com pedras nos rins e sofrer muitas dores. Males que poderiam ter sido evitados, se ela houvesse ingerido água na quantidade ideal. Mas muitos não dão a devida importância a essa questão do comer e beber. Ellen G. White pondera: “Hoje há entre os professos cristãos muitos que haveriam de julgar que Daniel era demasiado escrupuloso, e o sentenciariam como
13 WHITE, 1995, p. 482. 14 WHITE, Ellen G. Conselhos sobre regime alimentar. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1993, p. 29.
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mesquinho e fanático. Eles consideram a questão do comer e beber como de muito pequena importância para exigir tão decidida resistência – tal que poderia envolver o sacrifício de todas as vantagens terrenas. Mas os que assim raciocinam, notarão no dia do juízo que se desviaram das expressas reivindicações de Deus e se apoiaram em sua própria opinião como norma para o que é certo e para o que é errado. Descobrirão que aquilo que lhes parecera sem importância não fora assim considerado por Deus. Suas reivindicações deveriam ter sido sagradamente obedecidas”.15
DAnIEl PROPõE UM TESTE
Para resolver o problema de participar da mesa real, Daniel propôs um teste de dez dias. Ao fim desses dias os resultados se provaram exatamente o oposto do que o cozinheiro-chefe esperava. Não somente na aparência pessoal, mas também no vigor mental, os que haviam sido temperantes em seus hábitos exibiam uma evidente superioridade sobre os seus companheiros, que haviam sido condescendentes com o apetite. Como resultado dessa prova, permitiu-se a Daniel e seus companheiros continuarem com o regime simples durante todo o curso de seu treinamento para os deveres do reino.
Terminado o prazo dado pelo rei, que foi de três anos, quando sua capacidade e erudição foram testadas, veio o resultado: “entre todos eles não foram achados outros como Daniel, Hananias, Misael e Azarias; por isso, passaram a servir perante o rei. Em toda matéria de sabedoria e de inteligência, sobre que o rei lhes fez perguntas, ele os achou dez vezes mais doutos do que todos os magos e encantadores que havia em todo o seu reino” (Daniel 1:19 e 20).
“Aqui está uma lição para todos, mas especialmente para os jovens [...] Na experiência de Daniel e seus companheiros, temos um exemplo da vitória do princípio sobre a tentação para condescender com o apetite, uma demonstração de que mediante o princípio religioso, podem os jovens triunfar sobre a concupiscência da carne, e permanecer fieis aos reclamos de Deus, mesmo que isso custe grande sacrifício”.16
15 WHITE, 1996, p. 78. 16 WHITE, 1993, p. 32.
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QUARTA PROVA DE fé: InSTRUçãO
Um último teste que podemos ver no capítulo 1 trata da educação que os jovens hebreus deveriam receber em Babilônia. Nabucodonosor havia determinado que lhes ensinasse a “língua e a cultura dos caldeus” (Daniel 1:4). Essa era uma estratégia usada por nações opressoras, mas que podem ainda ser vistas em nossos dias. Mark Finley escreveu: “Quando os russos invadiram o Afeganistão, jovens afegãos foram levados e colocados em escolas de ensino especial na Rússia, onde aprenderam a filosofia marxista-leninista. Em seguida, foram enviados pelo Kremlin como novos governantes do Afeganistão. Hitler fez também isso com muitas nações que invadiu durante a Segunda Guerra Mundial. Ele trazia os jovens desses países para a Alemanha e lhes ensinava a filosofia nazista. Depois de ‘formados’ voltavam como governantes de seu povo difundindo a filosofia nazista entre as massas”.17 Essa era a intenção de Nabucodonosor.
Segundo Maxwell, a “língua caldaica”, a qual os jovens exilados deveriam aprender, incluía o acádio, idioma nacional de Babilônia, o sumeriano, que era o idioma da religião tradicional e o aramaico, idioma do comércio e da diplomacia internacionais.18 Já a “cultura” babilônica estava intimamente relacionada à idolatria e práticas pagãs; mesclava bruxaria com ciência e sabedoria com superstição. As práticas de magia, astrologia, adivinhação e exorcismo eram comuns entre os povos antigos, mas Deus havia alertado severamente Seu povo contra tais práticas (ver Deuteronômio 18:10-12). No entanto, os caldeus eram também eruditos no verdadeiro sentido da palavra. Possuíam um vasto conhecimento astronômico. Podiam até mesmo predizer eclipses lunares. Sua capacidade matemática também era bastante desenvolvida. Usavam fórmulas cujo descobrimento geral se atribui erradamente aos matemáticos gregos. Além disso, eram bons arquitetos, construtores e médicos que tinham encontrado, por meios empíricos, a maneira de curar muitas enfermidades.19
Supõe-se que estes são os aspectos da sabedoria em que Daniel e seus três amigos ultrapassaram os sábios de Babilônia. Aprenderam a
17 FINLEY, p. 12. 18 MAXWELL, 1996, p. 29. 19 Comentário bíblico adventista. v. 4, p. 789.
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perícia e as ciências dos caldeus, mas sem adotar os elementos pagãos mesclados em sua cultura. Isso fica evidente através de sua dependência do poder de Deus nas experiências que se seguiram, registradas nos capítulos seguintes do livro.
fIDElIDADE REcOMPEnSADA
Deus recompensou a firmeza e fidelidade dos jovens hebreus. A Bíblia declara: “No fim dos dez dias, a sua aparência era melhor; estavam eles mais robustos do que todos os jovens que comiam das finas iguarias do rei” (Daniel 1:15). Logicamente, apenas dez dias não seriam suficientes para uma grande diferença fisionômica, mas o resultado visto foi devido a um estilo de vida que não começou em Babilônia, mas já era seguido desde muito tempo.
Deus deu aos quatro jovens “conhecimento e a inteligência em toda cultura e sabedoria”, mas a Daniel concedeu ainda “inteligência de todas as visões e sonhos” (Daniel 1:17). Essa habilidade espiritual se mostraria oportuna no decorrer dos eventos do capítulo 2. Ao fim dos três anos, os jovens foram testados pelo próprio Nabucodonosor. E o testemunho do rei foi: “Em toda matéria de sabedoria e de inteligência [...] os achou dez vezes mais doutos do que todos os magos e encantadores que havia em todo o seu reino” (Daniel 1:20). Deus cumpriu Sua promessa: “Aos que Me honram, honrarei” (1 Samuel 2:30).
Nos dias desses jovens nem todos os livros do Antigo Testamento haviam sido escritos, muito menos qualquer um do Novo. Mas estes jovens dispunham de vários livros. Foi a partir desses estudos que aprenderam a distinguir entre o Deus verdadeiro e os falsos deuses de Babilônia. Fundamentados em Levítico 11 e Deuteronômio 14 foram capazes de fazer separação entre os animais limpos e imundos. Também perceberam o perigo de beber vinho (Levítico 10:1-11; Provérbios 20:1, 23:31-35), e conheciam a importância de serem fieis e honestos em todas as suas ações.
O capítulo 1 termina com a expressão: “Daniel continuou até ao primeiro ano” (Daniel 1:21). Depois de severamente provados, Deus os recompensou. Daniel, por mais de 70 anos, foi um instrumento de Deus para levar avante Seus desígnios junto à corte de Babilônia
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e da Média-Pérsia. Através de sua influência, veremos a conversão do grande rei Nabucodonosor e a assinatura de um decreto, por Ciro, o grande líder da Média-Pérsia, autorizando os judeus cativos a voltar para Jerusalém e a reconstruir a cidade e o templo. O quanto a humanidade deve a estes jovens, pelo seu exemplo de fé e perseverança, só a eternidade o revelará.
Do surgimento e queda das nações conforme expostos nos
livros de Daniel e Apocalipse, precisamos aprender quão sem
valor é a glória meramente terrena e externa. Babilônia,
com todo o seu poder e magnificência, como nosso mundo
jamais contemplou igual [...] completamente passou
[...] Assim pereceu o reino da Média-Pérsia, e os reinos da
Grécia e de Roma. E assim perece tudo o que não tem a
Deus por fundamento. Apenas o que está vinculado ao Seu
propósito, e expressa Seu caráter, pode perdurar
(Profetas e Reis, 548).