Catálogo Cine Expurga

Page 1


2


3


SESC APRESENTA Cine Expurga Mostra Coletivo Expurgação vitória, 2011

FOTO: tiago rossmann

4


Esta não é uma mostra coletiva, mas sim a mostra de um Coletivo: Expurgação. O mapeamento da produção audiovisual local está dentro do projeto de implantação do programa de Cultura do Centro Cultural SESC Glória. Esta Mostra trás ao público das ações de cultura do Serviço Social do Comércio - SESC/ES, a possibilidade de entrar em contato com a produção recente de um grupo de jovens. É papel do SESC reconhecer a produção audiovisual, viabilizar diálogos e exibir obras à seu público. Obras que falem do local ao universal. Quando se pensa em mapeamento cultural, primeiramente depara-se com uma das suas características mais básicas: A Cultura é viva! Existe em pleno processo de mutação e esta é sua natureza. Aí surge a Mostra Cine Expurga. Considerar como Arnheim, o processo cinematográfico como uma janela onde somos capazes de ver o mundo. Talvez não tanto uma janela, mas um prisma. Audiovisual como linguagem, como manifestação que circunda o cinema, criando zonas de interseção e diálogos com outras linguagens. Aspectos contemporâneos de leitura de uma obra. Questionamentos pós-modernistas. Experimentações conclusivas. Estes e outros vários pontos de debate acerca do hibridismo nas Artes. Aonde termina o cinema e começa o vídeo? Onde passa a faixa que separa o Vídeo das Artes Plásticas? Como ignorar a impossibilidade de se restringir o olhar do espectador a um único prisma? Segundo Munsterberg, o cinema é a arte que se utiliza de nossa mente. Assim como a música é a arte que se utiliza dos nossos ouvidos e a pintura de nossos olhos. A experiência cinematográfica eleva o espectador até um patamar próprio. O uso de instrumentos de comunicação recentes que mudam os sentidos e velocidades de antigos fluxos, se valendo de novos veículos que trazem em si novas possibilidades, o foco não está mais somente no objeto. Cortes transversais e novas percepções atravessam a experiência do artista e do espectador. A máquina além da lente, gerando novos focos. Expurgação produz obras Realistas, na medida em que realidade é caracterizada pelas ordens primárias de tempo, espaço e causalidade. Observar o mundo ao seu redor é fazer recortes desta realidade. Prismas individuais coletivos. A tecnologia se apresenta neste cenário onde o baixo custo e acessibilidade impulsionam a produção audiovisual. A profusão de imagens. A internet como personagem protagonizante deste processo, coloca tudo em um tabuleiro cultural, onde não existem, portanto fronteiras entre suportes, autores, linguagens e nomenclaturas fixas. O hibridismo, coletivo.

Gabriel Albuquerque Sesc/ES


6

a internet, que se expande na direção da inclusão digital de todas as camadas sociais, através da profusão de dispositivos eletrônicos e do desenvolvimento das telecomunicações. O vídeo é um importante aliado dessa inclusão, já que apresenta características híbridas compatíveis com os formatos utilizados nos aparelhos digitais, nas mídias físicas e virtuais. Em primeira análise o vídeo tem funções (prática, estética e simbólica) regidas pelo caráter documental e narrativo. Mas na prática a idéia do emprego da primeira análise se desdobra em muitos outros devires e classificações. Por exemplo, vídeo como arte, como entretenimento, como notícia, como gênero, como exercício... como linguagem. Trabalhando a linguagem do vídeo o homem diversifica, compreende e aprimora as formas de comunicação e consequentemente de aprendizado. O Coletivo Expurgação acredita que a videografia, por mais simples que seja sua concepção, representa um exercício de multilinguagem e expressão com princípio auto-narrativo. A Mostra Coletivo Expurgação - Cine Expurga exibe uma diversidade de fins para o vídeo, desde vinhetas que marcam a transição entre narrativas, videoclipes, vídeos experimentais, até documentários com relevância sócio-cultural. Destaque para os lançamentos “Uma”, vídeo experimental e humanista que trata da ontologia do ser, e “Itaúnas”, documentário que aborda questões culturais de preservação do meio ambiente.

Raphael gaspar tebaldi coletivo expurgação

FOTO: huemerson leal

A

s descobertas que transformam a sociedade têm origem na pesquisa científica, no avanço tecnológico e na própria ação prática que trama o tecido social. A diversidade de processos que o meio dispõe às pessoas provém dinamismo comunicativo, além de aprofundamento das questões disciplinares e culturais. No entanto, a informação difundida na operação do tear não é transmitida de forma direta ao tecido cosido, senão pela perfeição do resultado ou pelo desastre de uma manipulação incoerente. Examinando os agentes orgânicos desse tear mecânico, visualizamos que a informação necessária para operar os fios do conhecimento não se converte em conclusões unânimes, algumas vezes em nenhum entendimento - é preciso buscar sentido! Os aspectos criativos do modo operante não seguem padrões ou orientações exatas, de modo que movimentos voluntários e involuntários ditam o ritmo e a harmonia do tecer social. O Coletivo Expurgação busca compor e entender esse movimento aparentemente automático depurando seus elementos performáticos para romper com a normalidade do processo de aprendizado. Identifica a diferença e a exibe de várias formas, envolvendo diversos agentes, até que surja o sentimento de pertencimento. Para tanto, O Coletivo Expurgação possui características: interdisciplinar, colaborativa e experimental, que visam enriquecer a cultura no fluxo da rede distribuída no espaço físico e digital. Ambos são territórios livres para disposição de conteúdos textuais, pictográficos e sonoros, que orientam o sentido da comunicação do coletivo de acordo com os princípios da interatividade da projeção artística e intelectual. Principalmente


FOTO: francisco neto

Timeleske I (Vitória, 2009, Experimental, 2’) Vídeo que explora o deslocamento dos astros e o suave movimento de rotação da Terra. Viagens e vivências através da técnica timelapse.  câmera e edição:

Francisco Neto. Trilha original: Expurgação.

Bicicletada (Vitória, 2010, Documentário, 6’13”) Cobertura da Bicicletada de Março/2010 quando foi inaugurada a irônica “praça do ciclista”. O vídeo cobre a intervenção urbana, todo percurso e o protesto improvisado feito pelos ciclistas no lançamento do projeto Cais das Artes.  CÂMERA:  Edição:

Francisco Neto, Huemerson Leal e Marcelo Mendes “Geléia”. Francisco Neto. trilha original: Expurgação.

Superficie Ntrl (Amsterdã, 2008, Experimental, 30”) Conexões neurais em alta velocidade nervosa e psicodélica.  edição, Direção e trilha original:

Gustavo Senna.

7

Herméticos (Sítio Javali, 2008, Experimental, 6’29”) Seres de outros planetas experimentam artefatos terrestres.  Câmera e edição: Alexandre

Barcelos. Trilha original: Huemerson Leal.

Ventos Solares (Vitória, 2009, Experimental, 1’07”) Desenrolar de uma intervenção em um dos diversos tapumes de construção na cidade.  Câmera: Alexandre

Barcelos.  Edição: Reinaldo Guedes e Huemerson Leal.

Zetsterdam (Vitória, 2008, Experimental, 6’34”) Uma homenagem ao broder Azeite. O registro foi todo feito durante a guerra de bexigas proposta por ele para um trabalho de experimentação fotográfica. Alexandre Barcelos. Arthur Navarro e Alexandre Barcelos.

 Câmera E edição: Trilha original:


Suprasubstancial (Vitória, 2009, Documentário, 60’) Foi parte de uma pesquisa transformar o corpo do homem em ferramenta de condução do objeto câmera. O desenvolvimento da técnica durante encontros casuais e sessões de skate pelo Brasil criou um rico acervo visual e sequências substanciais.  Direção e Edição:

Dalmo Rogério e Gustavo Senna.

Uma (Vitória, 2011, Experimental, 14’05”) Visão do planeta Terra como um macroorganismo vivo. Assim como as células, o homem participa desta rede energética para o equilíbrio de um imenso sistema. Alexandre Barcelos.  Edição: Alexandre Barcelos, Felipe Mattar e Reinaldo Guedes.  Fotografia: Alexandre Barcelos, Francisco Neto, Reinaldo Guedes e Tiago Rossmann.  Produção: Leonardo Prata e Lorena Louzada.  Roteiro: Felipe Mattar, Huemerson Leal, Ivan Cosenza, Raphael Gaspar e Wérllen Castro.  Sound Design: Arthur Navarro e Felipe Mattar.  Direção:

Salãozinho (Vitória, 2010, Suspense, 1’26”) Tarde de salãozinho no Cemuni II, promovido por Thai Angelo. O vídeo é um experimento audiovisual com ênfase no sound design.  câmera e Fotografia:

Francisco Neto.  Produção: Thai Angelo. Thai Angelo e Francisco Neto.

 Edição e Sound Design:

fepascláudio (Afonso Cláudio, 2011, Videoclipe, 5’20”) Projeto Circulação de Shows, pela Secult. Trecho expurgado do show em Afonso Cláudio - ES. Fepaschoal e Marcelo Voodoo no beatbox.  Câmera:

Reinaldo Guedes.  Edição: Alexandre Barcelos.

Paiol (Sítio Javali, 2008, experimental, 2’06”) Ritual expurgativo para eleição de resultado. Alexandre Barcelos. Elenco: Raphael Gaspar e Felipe Mattar. Lorena Louzada, Gustavo Senna, Reinaldo Guedes, Wérllen Castro e Alexandre Barcelos.

 Direção:

 AnimaçÃo:

Mundos

 Câmera:

Alexandre Barcelos e Reinaldo Guedes. Expurgação.

Trilha original:

 Edição:

Felipe Mattar.

FOTO: narjara pianis

(Vitória, 2011, Videoclipe, 4’08”) Videoclipe da música Mundos que faz parte do álbum Noaretério do Coletivo Expurgação. Uma viagem audiovisual pelo Brasil.


Pedalada Dia Mundial Sem Carro (Vitória, 2009, Experimental, 4’57”) Cobertura completa em timelapse da Pedalada do Dia mundial Sem carro, que ocorreu em Vitória no dia 22 de setembro de 2009.  CÂMERA E Edição: Francisco  Colaboração:

Neto. trilha original: Expurgação. FelipeMattar.

Quero filmar o Céu (Amsterdã, 2008, Experimental, 2’ 54”) Desconstrução visual em uma viagem de trem.  Direção:

Gustavo Senna. Trilha original: Gustavo Senna.

Boial expurgative percurssion (Sítio Javali, 2009, Experimental, 3’56”) Tu-tu pá tu pá tu pá tu-tu pá pém-pém tu-tu pá tu pá pá pém tu pá tu pém-pém.  Câmera:

Alexandre Barcelos.

9

Anoya (Sítio Javali, 2008, Experimental, 1’) Performance freestyle com música ao vivo.  Performance:

Gustavo Senna.

 Câmera, edição:

Felipe Mattar.

Trilha original: Expurgação.

Timeleske II (Vitória, 2010, Experimental, 3’ 44”) Assim como no TimeLeske I, essa coletânea de vídeos feitos em time-lapse, teve como principal objetivo o experimento da técnica. Nesse vídeo foram explorados a cidade de Vitória e alguns experimentos caseiros.  Edição e Produção:

Francisco Neto. Trilha original: Expurgação.

Itaúnas (Itaúnas, 2011, Documentário, 26’) Primeiro documentário da série Últimos Refúgios que mostra como grupos humanos se apropriam intelectualmente e materialmente dos recursos naturais. Neste episódio o foco é a preservação ambiental no Parque Estadual de Itaúnas, considerando as comunidades remanescentes. Yuri Salvador.  Coordenação geral: Leonardo Merçon. Lorena Louzada.  câmera: Alexandre Barcelos, Ilka Westermeyer, Leonardo Merçon, Felipe Merçon, Francisco Neto, Reinaldo Guedes e Yuri Savaldor.  Roteiro: Gustavo Senna, Reinaldo Guedes e Yuri Salvador. Trilha sonora: Arthur Navarro.  Direção e edição:  Produção:


FOTO: francisco neto

30/06 QUINTA UMA, 14’05”

29/06 QUARTA

FOTO: tiago rossmann

10

Vitória, 2011, experimental

Salãozinho, 1’26” Vitória, 2010, suspense

Timeleske I, 2’

fepascláudio, 5’20”

Vitória, 2009, experimental

Afonso Cláudio, 2011, videoclipe

Bicicletada, 6’13”

Paiol, 2’06”

Vitória, 2010, documentário

Sítio Javali, 2008, experimental

Superficie NTRL, 30”

Mundos, 4’08”

Amsterdã, 2008, experimental

Vitória, 2011, experimental

Hermeticos, 6’29”

Pedalada Dia Mundial Sem Carro, 4’57”

Sítio Javali, 2008, experimental

Vitória, 2009, experimental

Ventos Solares, 1’07”

Quero FIlmar o Céu, 2’54”

Vitória, 2009, experimental

Amsterdã, 2008, experimental

Zetsterdam, 6’34”

Boial Expurgative Percussion, 3’56”

Vitória, 2008, experimental

Sítio Javali, 2009, experimental

Suprasubstancial, 60’

Anoya, 1’

Vitória, 2009, documentário

Sítio Javali, 2008, experimental

Timeleske II, 3’44” Vitória, 2010, experimental

Últimos Refúgios: Itaúnas, 26’ Itaúnas, 2011, documentário


EMPREENDEDORISMO CRIATIVO EM REDE LEONARDO BRANT Pesquisador cultural e consultor

Acompanho o Expurgação há alguns anos e venho estabelecendo um contato que inclui troca de experiências e reflexões sobre as novas potencialidades de criação artística no Brasil do século XXI. O sentido comunitário do coletivo, seu caráter transmídia e sua capacidade de mobilização, articulação e generosidade com outros artistas e movimentos, esboçam algo de maior abrangência, a partir do compromisso com o desenvolvimento local. Conectado com as redes nacionais e o pensamento global a respeito da função política da cultura, Expurgação traduz a urgência da arte como espaço de garantia das utopias e como elemento central da sustentabilidade humana. Esses ingredientes os colocam na vanguarda de um tempo que já é de vanguarda, de experimentações e descobertas, de novas mídias, tecnologias e linguagens. E sobretudo de um novo lugar para o artista na sociedade. É tempo de fazer junto, dialogando, reunindo esforços, trocando expertises, dividindo tarefas, complementando. O espaço é compartilhado, de divisão de tarefas, de amparo afetivo, emocional, misturando estilos e autorias, agregando sentido, diluindo o peso da economia sobre suas vidas. Uma espécie de empreendedorismo criativo em rede. Expurgação é práxis, acima de qualquer coisa: a ponte possível entre os aprendizados e a vida cotidiana. Só é possível essa práxis porque é solidária, não solitária. São inúmeros coletivos, grupos e movimentos artísticos organizados no Brasil trabalhando sob a mesma ótica. É preciso um olhar de toda a sociedade para esse fenômeno. O reconhecimento e a parceria do SESC-ES a esse movimento vem inocular uma vacina para todos os males existentes, e os que ainda virão. Viva a cultura do Espírito Santo!

11


expurgando o contexto FOTO: francisco neto

12


A

capacidade inteligível humana se fundamenta na desenvoltura do organismo e na posse do conhecimento. Memorizando experiências e materializando descobertas o homem cria versões históricas que explicam o seu surgimento “especial”. Um milésimo do pixel da tela universal é espaço demasiado para comparar com o tamanho da nossa importância elementar dentro das infinidades do mundo. Por isso abandonamos a naturalidade para jogar com o encantamento civilizatório orientado pelo status social. Neutralizados pelo acaso da pré-existência do sistema, os sentidos perturbam mais os desejos efêmeros e menos a busca transformadora. Ilusionismos hipercapitalistas, instantâneos, que escondem os fertilizantes da imaginação. Sobra autonomia, mas falta habilitação para “ser e estar humano”. Faltam elos interativos que reconheçam as relevâncias individuais. Nesse momento, qualquer manifestação gestora de recurso humano que equilibra sonho e realização é bem vinda para perturbar o consagrado sistema comercial. Não ultrapassamos o capítulo moderno, não alcançamos o “PÓS”, não viramos a página para o futuro livre do estigma da degradação social, esse fenômeno que nos ameaça está presente em todas as nações do planeta, pobres ou ricas. A escalada do individualismo na relação capitalista cria graves crises mundiais, mas também gera reações naturais. A formação de grupos organizados que sonham comprovar a inviabilidade econômica desse sistema, que fundam espaços neutros regidos pelo respeito mútuo e por leis distintas a cada conjunto, onde o que vale é a política da cooperação e a cultura coletiva. Organizando a unidade para união forçamos o campo magnético dos poderes - a iniciativa mais coerente para se trabalhar a co-responsabilidade dentro dos limites da tolerância e do incentivo moral. A tecnologia favorece a interação das unidades simpáticas que formam grupos com interesse comum, que podem aprimorar o conhecimento interno através do compartilhamento das informações condicionadas na rede mundial. A organização está facilitada, pode ser estruturada em muitas interfaces. Queira acoplar-se para pertencer e modificar uma realidade.

Reação contra as dificuldades individuais Jovens universitários da UFES perceberam que faziam parte de um grupo distinto de amigos que compartilhavam diversos interesses, principalmente artísticos e profissionais. Por meio da convivência acadêmica esses jovens, maioria do curso de Desenho Industrial, se reuniram com freqüência para estudar e pesquisar sobre design, cinema, música, ciência e curiosidades. Através das experimentações corriqueiras, apresentações musicais, viagens em grupo e pesquisas que integraram símbolos de outras culturas, por exemplo, a cultura indiana e das antigas civilizações, o grupo se fortaleceu como equipe criando uma linguagem repleta de simbolismos, gírias e neologismos. A interação contínua fez o grupo perceber que o desenvolvimento profissional é proporcional ao envolvimento dos parceiros na metodologia de produção. “Nos instantes da modelagem dos projetos propostos, todos estavam envolvidos. Aprendemos a expurgar!”

13


Surge a Expurgação

Tempo de cultura O progresso a qualquer custo carrega o peso da mídia. O homem moderno tende a se isolar do amor ao saber dos princípios e das causas. Mídia = meio? A reação contra o isolamento solstício é o surgimento de diversos grupos sólidos em todo mundo, contrários a idéia tradicionalista de formação de mercados e de subordinação à cultura espetacular. A evidência dos Coletivos no cenário econômico (economia criativa) mostra que as dificuldades de estruturação dos empreendimentos artísticos e culturais serão amenizadas pela necessidade mercadológica de reinventar a alma e o visual dos produtos e dos serviços oferecidos. Nessa oportunidade, a vocação brasileira no plano cultural evidencia a mesma tendência facilitada pelo assistencialismo, que deve fomentar a cultura na nova classe média brasileira. Contudo, esse processo ainda se ajusta no terreno prático revelando inspirações que

FOTO: francisco neto

14

O termo expurgação ficou conhecido após atuações “freestyle” do artista/mendigo “Away”, que dizia diretamente para a câmera: seu ouvido está expurgando! Deliberadamente, o termo marcou um estado de espírito positivo, sentido e compartilhado durante as experimentações musicais. Ele pode ser explicado por muitas combinações curiosas: concentração perceptiva, descarrego mental, desprendimento criativo, deslocamento de córtex, derretimento de ego. O Coletivo Expurgação se consolidou em 2007, quando a primeira e única mulher do grupo (Srta. Loris) incentivou 17 homens a fundarem uma sede. Uma casa no Bairro República serviu para abrigar os integrantes que não tinham moradia fixa em Vitória e também viabilizou a elaboração de novas experimentações, trilhas sonoras, vídeos e visuais. Surgiu o “Comando”, assim era chamada a primeira sede. O Coletivo permaneceu nesse Comando por dois anos, suficientes para ampliar o conhecimento e conduzir as técnicas de produção ao desenvolvimento. Surgiu uma nova forma de estruturação na metodologia de produção em função da especialização profissional. Por exemplo, a produção audiovisual que estava a cargo de uma só pessoa (da captura até a finalização), passou a ser dividida em várias tarefas específicas que os interessados podiam realizar: áudio, edição, roteiro, etc. Isso não quer dizer que os expurgadores deixaram de praticar outras funções, apenas reforçaram o foco profissional na área de maior interesse, dedicando-se à disposição das informações relevantes para o desenvolvimento de uma função.

tangem a gestão horizontal do trabalho. Se o mercado explora o direito autoral sob argumento de economia criativa, grupos como o Coletivo Expurgação elevam esse estado conceitual para uma economia solidária e paralela, atrelada com a produção cultural de diversos coletivos que compartilham a mesma visão: o posicionamento da economia a serviço da cultura.

Tempo de expurgação Fim do primeiro Comando; e o início de outro...

O fim é o início dessa história de amizade que compartilha o processo de produção para potencializar resultados. Orientando-se em função dos projetos que proporcionam satisfação e experiência profissional, a Expurgação se transferiu para um novo espaço, voltado exclusivamente para o trabalho coletivo. O “Comando kalakuta”, que está localizado no Centro de Vitória, é o marco do desenvolvimento coletivo e também um sinal


de sustentabilidade do empreendimento horizontal. A produção aumenta, a interação se afina, o resultado transmite confiança, por fim, a opinião crítica se fortalece sincronizando e aproximando os saberes individuais em valimento de novas descobertas artísticas. "Agora todo mundo vive no Comando, mas ninguém mora lá!"

A Expurgação refaz o percurso da sua concepção, mas dessa vez em um plano de ação. A arte da cultura dá lugar à cultura da arte, que os expurgadores fazem questão de compartilhar com o público. Esse contato inspira novas mudanças no plano da produção do Coletivo, principalmente com o acesso à sala de cinema que fortalece a relação do espectador com o vídeo apresentado. “A priori nos divertimos brincando com os fenômenos mais perturbadores, a podridão humana. No entanto, projetamo-nos para o futuro buscando sobrepor as camadas inflamadas do efêmero com sobrevida criativa, evitando a reprodução e o desperdício de material humano.”

TeleVídeotagem Para aqueles que não enxergam o tempo passar... a imagem é o rastro do tempo que pode ser revisto e lembrado dentro e fora do pensamento. Porque nosso pensamento é imagem após imagem. Nossa visão é um efeito da casualidade evolutiva que criou um órgão de projeção cerebral complexo, capaz de transduzir uma realidade visual caótica em condensações estáticas. Fisiologicamente, outros instrumentos sensíveis realizaram o mesmo movimento de projeção cerebral criando células interligadas em sinapse: papilas gustativas, células sensoriais olfativas, auditivas e táteis, compõem um sistema autopoiético, que se auto-regula constantemente. A luz é o sentido de projeção da visão. A vibração é o sentido de projeção da audição, que também é responsável pelo equilíbrio e pela postura corporal. A tridimensionalidade é o sentido de projeção do tato, logo ela pode ser representada visualmente e sonoramente. O paladar é uma complementação do olfato, ambos se projetam no sentido químico. O sentido de projeção opera na direção do vetor pessoal, conduzido pela apreensão perceptiva que se depara com significantes e significados.

Exemplos de estágios intermediários na natureza. Cada gradação serve ao seu possuidor: Olho em taça (platelmintos), identificam a luz; abertura ocular (nautilus) identificam a direção da luz; lente convexa (ser humano), identifica o objeto revelado pela luz.

15


Hipercinema

16

Visão O mecanismo da visão consiste na transdução da luz em impulsos elétricos. Por que transdução e não transformação? A radiação eletromagnética que chega aos olhos é captada de forma bruta pelas células bastonete, que captam até um único fóton de luz. Simultaneamente três tipos de célula cone identificam três comprimentos de onda diferentes (verde, vermelho, azul). Essas quatro células especializadas contêm uma substância denominada rodopsina, que absorve a luz armazenando quimicamente sua energia. O impulso nervoso só é desencadeado se concentrar energia suficiente para gerar um fluxo elétrico. Se o sentido de projeção da visão é a luz convertida em química, o sentido da química é projetar-se na radiação da luz, comportando-se fisicamente.

Os avanços tecnológicos influenciaram o mundo do cinema com efeitos especiais e técnicas de gravação distintas. Processos como telecinagem e transfer permitem que os filmes tenham trânsito livre entre o registro digital e fílmico. Existem projetores de película 24mm e projetores digitais trabalhando com o mesma proporção cinematográfica. Afinal, o que é cinema hoje? Cinema é uma manifestação cultural com alto grau de influência política e social que prosperou desde a invenção do cinematógrafo. Portanto, é um entretenimento que teve origem no filme (por isso ligamos o conceito de cinema à utilização da película fotográfica). Os aspectos clássicos do cinema foram transformados pela cultura de massa e pela inclusão do computador na produção cinematográfica. Utilizando técnicas conversoras de dados para dispositivos gráficos, o cinema se reinventou no vídeo. É importante lembrar que os formatos analógicos que antecederam o vídeo digital (8mm, 16mm, Betha, VHS, mini-DV) abriram caminho para a popularização da linguagem audiovisual. A computação gráfica é um produto da Matemática desenvolvida durante centenas de anos (de Euclides à James Sylvester). A primeira finalidade da computação gráfica elaborada no final da década de 1950 era resolver questões militares norte-americanas (sistemas de defesa e simuladores de vôo). Em contrapartida, Alfred Hitchcock utilizou imagens feitas em computador na abertura do filme "Um corpo que cai", em 1958, exibindo formas gráficas centralizadas em rotação constante. Obra do músico e animador John Whitney, responsável pela primeira imagem criada por computador. Dessa forma, o cinema hibridizou suas potências com o vídeo, que é a saída mais coerente para a produção audiovisual descentralizada e independente, distante dos custos e da dominação do cinema em voga. Apesar das barreiras privadas que limitam a exibição das produções independentes nas salas de exibição, estão surgindo iniciativas que discutem o processo de transformação da linguagem cinematográfica. É de fundamental importância para Brasil reconhecer o vídeo como uma ferramenta de expressão, documentação e entretenimento, com influência direta na realidade do país.

Hoje o cinema é o que passa na tela do cinema.

ilustração: huemerson leal

Através da linguagem audiovisual estimulamos diretamente a visão e a audição, e indiretamente outros órgãos de projeção que contribuíram com as memórias do sabor, da textura e da intensidade do tato, do significado do gosto da matéria, dos sentimentos. Tudo que devemos fazer é tocar a unidade de um momento, grafando a animação do nosso tempo com imagem, escritura e ruído... O vídeo como exercício de reconhecimento, análise e reflexão, aproxima os seres associativos das fontes criativas que funcionam como um organismo: simbiótico e sinestésico microcultural com tendências hipermodernas. Temos potencial para criar camadas de significados que podem conotar diversos sentidos porque, como uma câmera, rastreamos o tempo que pode ser revisto e lembrado dentro e fora do pensamento.


17


REALIZAÇÃO

SESC/ES produção

Kalakuta CURADORIA

Expurgação PRODUÇÃO EXECUTIVA FOTO: francisco neto

Gabriel Albuquerque (SESC/ES) Lorena Louzada (Expurgação) ASSISTENTE DE PRODUÇÃO

Leonardo Prata produção gráfica

Wérllen Castro textos do catálogo

Raphael Gaspar 18 ilustRAÇÃO DO CATÁLOGO

Huemerson Leal assessoria de imprensa

Lorena Louzada vinheta

Felipe Mattar Impressão / apoio

Gráfica A1 agradecimentos

Cine Jardins Leonardo Brant

www.expurgacao.art.br APOIO

CURADORIA

PRODUÇÃO

REALIZAÇÃO


19


20


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.