tem 50 8 anos, é formado em Teologia e Filosofia com Mestrado em Missiologia Urbana pelo Calvin Theologic Seminary (Michigan, EUA). Atualmente, é um dos pastores Comunidade Presbiteriana Ch Primavera e coordenador do programa de pós-graduação em Plantação e Revitalização de Igrejas no Seminário Presbiter do Sul (Campinas, SP). É um fundadores do Projeto Timóte mio e do CentroP derêTreinamento p Plantadores de Igrejas (CTPI 1 0 0 Casado com 2Sôniao há 27 anos, t men Casadeíliquatro a Ricardo é pai lindos Fam filhos: Luiza (casada com Pau Levi e Ligia, e avô do Gabriel
autor
Ricardo Agreste da Silva
editor responsável
Alberto José Bellan
revisão
Juana del Carmen C. Campos
capa, produção e diagramação
foto capa
iStockphoto
impressão e acabamento
Gráfica Mundo
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Silva, Ricardo Agreste da Feito para durar / Ricardo Agreste da Silva – Santa Bárbara d’Oeste, SP : Z3 Editora, 2009. ISBN: 978-85-98486-52-9 1. Aconselhamento conjugal 2. Amor 3. Casais - Relações interpessoais 4. Casamento - Aspectos religiosos - Cristianismo 5. Comunicação no casamento 6. Divórcio - Aspectos religiosos 7. Homem-mulher - Relacionamento 8. Reconciliação - Aspectos religiosos - Cristianismo I. Título. 09-06020
CDD-248.844 Índice para catálogo sistemático: 1. Casais : Comunicação : Aconselhamento conjugal : Vida Cristã : Cristianismo 248.844 2. Comunicação do casal : Aconselhamento conjugal : Vida Cristã : Cristianismo 248.844
1ª Edição Junho de 2009
5ª Edição
Novembro de 2019
© 2009 por Z3 Editora
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Dedicatória
À minha querida Sonia, que conheci quando ainda adolescente, reencontrei quando jovem e que tenho hoje ao meu lado, como companheira e amante, na construção do projeto mais precioso de nossas vidas, nossa família. Aos meus amados filhos, Luiza, Levi e Ligia, presentes de Deus que constantemente me convidam a conhecer mais profundamente o significado do amor e a crescer na direção da maturidade.
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Sumário Introdução Um Problema Emergente...............................................................09 Capítulo 01 Em Busca de Uma Visão Realista..................................................21 Capítulo 02 De Homem para Homem...............................................................37 Capítulo 03 A Hora e a Vez da Mulher...............................................................55 Capítulo 04 Família, Família; Negócios à Parte...............................................77 Capítulo 05 Sexo é bom e Deus quis assim.......................................................97 Capítulo 06 Filhos? Qual é o lugar deles nisso?.............................................119 Capítulo 07 O Tempo: Um Inimigo ou Um Aliado......................................141 7
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Introdução
Um Problema Emergente Lembro-me de meus tempos de criança e adolescente. A separação e o divórcio pareciam muito distantes de minha vida e realidade social. Entre meus amigos, todos moravam com seus pais biológicos. Bem ou mal, viam seus pais acordando juntos, lutando pelo sustento do lar, administrando as crises e indo dormir no mesmo quarto. Relação conjugal e família eram coisas feitas para durar. Por isso mesmo, quando ouvíamos de um caso de separação ou divórcio, aquilo soava a todos como algo absurdo e inconcebível. É claro que existia o preconceito para com o separado ou divorciado, mas este estava associado ao fato de que sua decisão era vista como uma anomalia no contexto dos valores da sociedade da época. Dificuldades e adversidades eram vistas como obstáculos a serem superados e não como impedimentos que justificassem o abandono da relação. Mas eu cresci, me tornei adulto e me casei. Convidei vários amigos para estarem em meu casamento, alguns deles foram meus padrinhos, outros tocaram como músicos, outros 9
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cantaram belas músicas de sua autoria. No entanto, quando olho as fotos daquele tempo, sou tomado por uma constatação: boa parte dos meus amigos de outrora estão separados ou divorciados. Seus casamentos não resistiram por muito tempo e a pressão pela busca da felicidade individual destruiu o projeto a dois. Hoje, entre meus amigos mais chegados e meus parentes mais próximos, convivo com várias pessoas separadas e divorciadas. O que era uma anomalia se tornou padrão, e eu, ainda casado com a mesma mulher por mais de 20 anos, já fui tomado por umas crises repentinas me sentindo a nova anomalia. Sinto o desconforto de alguns parentes e amigos pelo fato do meu casamento estar durando tanto. Mas, afinal, não era para durar? Somado a isso, a cada encontro com um velho amigo, um dos temas sempre presentes é aquele: “Você se lembra do João? Sim, aquele que era doido pela Ritinha? Pois é, ele se casou com ela, mas encontrei-o recentemente e descobri que estão separados”. Mas surpresa mesmo teria este velho amigo se ouvisse de mim: “Pois é, ele se casou com ela, teve filhos e, depois de mais de 20 anos, vivem muito felizes”.
Escrever ou não escrever? Eis a questão. Neste contexto surgiu o desejo de escrever sobre este tema. Mas, minha consciência de que teria que andar sobre areia movediça quase me fez desistir. Algumas coisas que 10
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apresentaria no texto fariam com que pessoas de minha própria convivência me julgassem como ultrapassado ou quadrado. Resolvi, então, refletir e elaborar algumas razões que me levariam a tratar deste tema para avaliar, de forma mais objetiva, se valeria a pena arriscar-me. Sentei em meu escritório numa manhã de sábado e alistei algumas razões: O crescente aumento do número de divórcios
Em minha experiência de vida pessoal e pastoral, nunca testemunhei tantos casos de divórcio na família, na roda de amigos ou no contexto de uma comunidade cristã. O que 30 anos atrás se tratava de casos isolados e esporádicos, hoje está se tornando regra no relacionamento conjugal. No Brasil, segundo o censo de 2002, a duração média do casamento era de 10,5 anos. Quando por ocasião do divórcio, a média de idade dos homens era de 40,7 anos e das mulheres de 38 anos. Em 80% das dissoluções de casamento há filhos menores de 18 anos de idade. As mulheres são normalmente as requerentes da ação: 70% das separações e 55% dos divórcios não consensuais. Por fim, segundo o IBGE, nos últimos 10 anos, o número de divórcios no Brasil aumentou 52%. A drástica mudança no cenário das separações
No início de meu ministério pastoral, cerca de 20 anos atrás, de cada 10 pessoas que me procuravam em busca de ajuda na tentativa de salvar seu casamento, de 7 a 8 eram mulheres. No entanto, na atualidade, de cada 10 pessoas, 7 a 11
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8 são homens. Pelos mais variados fatores, as mulheres estão mais propensas ao aborto da relação conjugal. Sobre este cenário, a professora catedrática da Universidade do Minho, Maria Engrácia Leandro, especialista em sociologia da família afirma que “a escolarização da mulher fez com que ela não aceitasse tão facilmente a “submissão” em relação ao homem e a independência financeira da esposa pôs fim aos casamentos por uma questão de sobrevivência”. A banalização do fato
Na sabedoria bíblica, encontramos duas razões para que o divórcio seja uma opção numa relação conjugal. A primeira delas é quando a fidelidade conjugal é quebrada. A segunda é quando um dos cônjuges toma a decisão de tornar-se discípulo de Jesus e, por isso, o outro decide abandonar a relação. Mesmo assim, sobre os dois casos, prevalece a razão maior na perspectiva de Deus: “o endurecimento do coração humano”. No entanto, na atualidade, as razões que levam casais a se separarem são bem menores e, por vezes, subjetivas. Nas palavras que justificam o ato existe sempre uma grande dose de individualismo e hedonismo. Na maioria das vezes escuto a frase: “Eu tenho o direito de ser feliz”. Revela-se uma incapacidade para administrar frustrações e uma urgência em “ser feliz”. O crescente número de vítimas
O divórcio faz, a cada dia, um número maior de vítimas. O primeiro tipo de vítima é aquele que vive a experiência de ser 12
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rejeitado. Na comunidade cristã que pastoreio, não são poucos aqueles que foram vítimas do divórcio nos últimos anos. Não é fácil restaurar a autoestima daquele que se expôs numa relação de intimidade, revelou seus pensamentos, sentimentos e atitudes mais profundas e, em determinado momento, foi rejeitado. Instala-se uma sensação de ausência de valor e medo de qualquer novo relacionamento. Deixar-se conhecer passa a ser sinônimo de correr o risco de ser novamente rejeitado. Mas, não apenas o que é rejeitado se torna vítima do divórcio. Aquele que rejeita também se torna refém de alguns sentimentos que passam a acompanhar sua vida. Normalmente, aquele que aborta uma relação o faz, às vezes, por sua incapacidade de administrar algumas frustrações, negociar alguns desejos e comprometer-se com a construção de uma felicidade madura e de médio-longo prazo. No entanto, estes sentimentos são, por vezes, levados para o segundo, terceiro e outros relacionamentos, fazendo daquele que rejeita mais uma das vítimas do divórcio. E a situação dos amigos e familiares que aprendem a conviver com o casal, inserindo o cônjuge na rede de relacionamentos construída ao longo de anos e compartilhando as histórias de suas vidas com o mesmo? De repente, a ruptura conjugal gera uma desestabilização na família e nos amigos. A partir de agora, existem nomes que não devem ser mais mencionados, histórias que não devem ser contadas e fotografias que não podem mais ser mostradas. Mas, com toda a certeza, a maior vítima do divórcio são as crianças. Por mais que existam livros e terapias com 13
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o propósito de amenizar a dor e a confusão emocional das crianças, este não é, e jamais será, um processo natural para filhos e filhas. A dificuldade de compreender e administrar as crises decorrentes da insegurança gerada por ter sido testemunha de um casamento destruído é tão grande que especialistas apontam para o fato de que crianças de pais divorciados são de 4 a 5 vezes mais propensas ao divórcio quando adultas. Diante disso tudo, decidi que seria importante tratar do tema, mesmo correndo o risco de ser mal compreendido ou tido por retrógrado ou ultrapassado. Decidi que iria remar contra a maré, por amor de todos estes que, ao longo de mais de 20 anos de atividade pastoral, tenho visto sofrerem as dores da rejeição, da culpa, da perda e da desestabilização emocional geradas por uma ruptura conjugal.
Objetivos deste texto Mas, meu objetivo com este texto jamais será o de gerar culpa sobre aqueles que um dia fizeram esta opção, ou intensificar a dor daqueles que um dia foram vítimas deste fato. Meu objetivo pode ser descrito através de três verbos: alertar, apoiar e encorajar: • Alertar casais sobre o perigo que ronda seus relacionamentos e a necessidade de uma tomada de decisão: “investir intencionalmente na relação”. Muitos de nós, casados, temos dedicado tempo e investido dinheiro na formação profissional, na construção de um futuro estável, na educação dos filhos, mas temos nos esquecido da necessidade de nos 14
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dedicarmos, de forma tão intensa quanto, à construção de um relacionamento conjugal estável. Vejo muitos noivos dedicando-se intensamente aos preparativos da cerimônia religiosa, visitando inúmeros buffets, organizando cada detalhe da cerimônia e festa, mas dedicando pouquíssimo tempo na construção efetiva da relação a dois. Vejo jovens casais preocupados com suas carreiras e dedicados a juntar quantias significativas de dinheiro para um carro novo, uma casa nova ou uma nova viagem para a Europa, mas pouco fazem, intencionalmente, para o aprofundamento da relação a dois. Por isso, um dos objetivos deste texto é alertar para aquilo que Moraes Moreira já cantava há muitos anos atrás: Sim, é como a flor, de água e ar, luz e calor, O amor precisa para viver, De emoção e de alegria, e tem que regar todo dia.
• Apoiar aqueles que experimentaram o divórcio a reconstruírem suas histórias libertando-se do passado e vivendo o futuro de Deus em suas vidas. Com certeza, erros foram cometidos de ambos os lados numa relação que culminou no divórcio. Por isso, é de fundamental importância analisar com muita tranquilidade e clareza onde estes erros aconteceram e reposicionar-se diante dos mesmos. O caminho não passa pelo remorso ou pela culpa que consome a alma e aprisiona uma pessoa ao passado. Mas 15
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sim, por uma perspectiva madura da vida, a qual identifica os erros, aceita a graça de Deus que nos perdoa e nos renova, e passa a reconstruir a vida na direção do futuro. Como dizia Frederich Nietzche “não importa o que fizeram de você, o que importa é o que você vai fazer do que fizeram de você”. • Encorajar os jovens ao desenvolvimento de relacionamentos saudáveis e consistentes, a partir de uma visão crítica da cultura que nos cerca. Quase tudo o que é oferecido aos nossos jovens pela mídia os convida ao estabelecimento de relacionamentos sem compromissos e grandemente atrelados aos benefícios individuais que esses relacionamentos geram. É uma relação de consumo. Enquanto o outro é capaz de me fazer feliz, estou com ele. Quando não se mostra mais capaz disso, troco de fornecedor. Gostaria que, ao final da leitura deste texto, jovens se sentissem grandemente estimulados ao estabelecimento de relacionamentos estáveis e duradouros. A construção de uma caminhada conjugal madura e sadia é altamente gratificante. Jamais estará isenta de dificuldades e desencontros. No entanto, quando vemos estes desencontros como parte do processo de maturação e construção, tornam-se aliados e não inimigos.
Antes de começar Este texto é escrito na perspectiva dos valores e princípios da espiritualidade cristã. Você encontrará inúmeras citações de textos bíblicos escritos por homens e mulheres há 16
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mais de três mil anos. No entanto, você perceberá que, apesar deles não terem todas as informações científicas que nos são oferecidas nos dias de hoje, a sabedoria contida em suas palavras revela uma fonte de inspiração e orientação altamente valiosa para nossas vidas. Não se deixe levar pelo preconceito semeado em sua mente e coração em relação à sabedoria bíblica. Esteja aberto para ler, meditar e acolhê-la em seu coração. Você certamente se surpreenderá com o poder que ela possui na restauração de suas emoções, na renovação de suas forças e na orientação sábia diante das decisões que deve tomar em relação à sua vida, cônjuge e filhos. Creio ser importante pontuar que tudo quanto iremos tratar pressupõe a existência de duas visões de mundo bem distintas. Estas duas visões de mundo coexistem em uma constante tensão, chamando seu conjunto de princípios e valores de “sabedoria”. Reconhecer quais são os óculos através dos quais estamos enxergando a vida é fundamental para compreender por que nos sentimos mais confortáveis com alguns valores e princípios do que com outros. Por um lado, temos os valores e princípios desenvolvidos a partir de uma visão de mundo que considera loucura o que chamamos de sabedoria bíblica. Este conjunto de valores e princípios, grandemente caracterizados pelo individualismo, narcisismo, hedonismo e consumismo, é resultado dos caminhos tomados pela cultura ocidental nos últimos dois séculos. Chamaremos este conjunto de valores e princípios de “sabedoria secular”. 17
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Por outro lado, temos os valores e princípios desenvolvidos a partir da sabedoria bíblica, a qual considera loucura o estilo de vida proposto por esta “sabedoria secular” alheia a Deus e sua vontade. Para a sabedoria bíblica, o Deus criador nos deixou princípios e valores não para que não desfrutássemos da vida. Muito pelo contrário! Os princípios e valores de Deus nos foram dados para que em tudo nos fosse bem, em todas as dimensões da vida privada e pública. Como consequência da tensão entre estas duas “sabedorias”, parte do conteúdo que vou tratar a seguir poderá não soar politicamente correto, mas meu propósito será ser biblicamente coerente. Por isso, em momento algum confunda meu discurso com movimentos feministas ou machistas, nem com posicionamentos de conservadores ou liberais. Eu não tenho qualquer compromisso e simpatia por estes grupos. Meu desejo é que você compreenda o que a sabedoria bíblica diz sobre o papel do homem e da mulher na construção de relacionamentos saudáveis e duradouros. Parte do que vou tratar vai soar a seu favor, parte confrontará algumas de suas ideias e posturas, bem como alguns dos valores da cultura vigente em nossa sociedade. Apesar da vasta quantidade de literatura produzida para ajudar casais na comunicação, nas finanças e na sexualidade, os casamentos vão de mal a pior. Nunca o divórcio chegou tão cedo e com tanta frequência à relação. Nunca a instituição “casamento” esteve em descrédito tão grande entre jovens. Por isso, se toda literatura produzida pelo conhecimento científico e cultural não tem nos ajudado efetivamente, precisamos 18
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ser humildes e dar espaço para, ao menos, ouvirmos o que a sabedoria bíblica tem para nos dizer. Tenho plena consciência de que os valores e princípios da sabedoria bíblica nem sempre correspondem ao que é tido como sábio pela cultura vigente. No entanto, peço a você que procure escutar o que a Bíblia tem a dizer, dando espaço em sua mente para a reflexão sobre os temas que serão abordados. Por fim, você certamente se deparará com alguns exemplos de minha própria experiência. Mas, por favor, não se atenha aos exemplos. Dando aulas há mais de 20 anos observo que, muitas vezes, meus alunos agarram-se aos exemplos e deixam passar, por entre os dedos, os princípios. Por isso, tenha seus olhos nos princípios. A maneira como você irá construir sua vida pessoal e seu casamento certamente será um caminho diferente do meu em alguns aspectos. Mas quero incentivá-lo a perceber a importância dos princípios e valores que nos são lançados pelo próprio Criador no seu “manual do construtor”, através do qual somos convidados ao desenvolvimento de uma espiritualidade relevante para todas as áreas de nossas vidas, inclusive para relacionamentos feitos para durar. Boa leitura.
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Capítulo 1
Em Busca de Uma Visão Realista Mad About You: Uma versão americana do “infinito enquanto dure” Por anos me diverti com os altos e baixos do casal Paul e Jamie Buchman, no seriado norte-americano Mad About You. Jovens urbanos, envolvidos pelas tensões entre a construção de um casamento e o desenvolvimento profissional, constantemente invadidos na privacidade por familiares e amigos, tudo fazia com que eu os visse como um casal bem próximo de minha realidade e bastante inspirativo para minha caminhada. Até que lá pelo sétimo ano de casamento a crise emerge. A relação se desgasta, o nível de comunicação cai, o sucesso profissional passa a ocupar lugar de destaque na agenda. Num certo dia, Jamie se deixa beijar por um outro homem e o fantasma do divórcio surge na história do casal. Em um dos episódios, Paul e Jamie têm um diálogo no qual inúmeros temas, constantemente presentes na vida 21
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de casais que caminham para o divórcio, são mencionados. Desgaste na relação, perda do romantismo, excesso de trabalho, infidelidade conjugal, desconfiança acerca dos sentimentos do outro, incapacidade de corresponder às expectativas, dificuldade para se ter filhos, entre outras coisas, são temas abordados de forma dramática e intensa numa discussão de aproximadamente 10 minutos. Deste diálogo poderíamos tirar uma excelente agenda para discutirmos sobre a arte de casar e permanecer casado. No entanto, a surpresa maior no final deste diálogo é quando Jamie diz a Paul: “Eu avisei você. Duas pessoas juntas para o resto da vida é muito difícil.” Paul então se levanta, se despede friamente de Jamie, vira as costas e sai caminhando pela rua. É o fim de uma relação. É a concretização de uma profecia: Duas pessoas juntas para o resto da vida é muito difícil. Ambos se separam como se de fato pudessem seguir suas vidas sendo os mesmos que há sete anos atrás. As experiências boas e difíceis vividas juntos fazem parte de uma agenda e de uma memória em comum. Se duas pessoas viverem juntas para sempre é difícil, não menos difícil é quando duas pessoas decidem por se separar.
O Grande Dilema da Vida a Dois A frase de Jamie “Duas pessoas juntas para sempre é muito difícil” retrata o grande dilema da vida conjugal. Por um lado, existe dentro de cada um de nós o desejo por estabelecer uma relação de intimidade, continuidade e segurança com o 22
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outro. Mas, por outro lado, a concretização desta intimidade, ao longo dos anos, se revela uma tarefa muito mais difícil do que nossa jovem idealização poderia imaginar. Já nas primeiras páginas da Bíblia este dilema nos é apresentado. No texto escrito há mais de 3.500 anos, o desejo e necessidade por intimidade é contraposto ao desafio da construção de uma relação duradoura. Nos versos de Gênesis 2.18,23-25 encontramos o seguinte: Então o SENHOR Deus declarou: “Não é bom que o homem esteja só; farei para ele alguém que o auxilie e lhe corresponda”. Disse então o homem: “Esta, sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne! Ela será chamada mulher, porque do homem foi tirada”. Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e eles se tornarão uma só carne. O homem e sua mulher viviam nus, e não sentiam vergonha.
Aqui encontramos os dois movimentos que caracterizam o grande dilema da vida a dois. Por um lado, a constatação: “não é bom que o homem esteja só”. Ele precisa de uma companheira que corresponda aos seus sonhos, anseios e problemas. Esta companheira precisa ser da mesma essência. Nem inferior, nem superior, do mesmo nível. Alguém com quem ele possa conversar e trocar ideias, apoiando-o quando na direção certa e confrontando-o quando no caminho errado. 23
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No entanto, neste processo de tornar-se um, complementando um ao outro, se faz necessária também a disposição em abrir mão de algumas coisas. Por exemplo, “deixar pai e mãe” implica em abrir mão de uma cultura, com seus valores e hábitos, na qual fomos criados e treinados. Neste sentido, o casamento é o encontro de duas diferentes culturas e, se não houver disposição em abrir mão de determinados elementos e o acolhimento de outros, esta relação transformase num palco de um confronto entre duas vidas formadas com diferentes perspectivas e valores. Em meio a estes dois movimentos, existe o grande anseio do coração humano de estabelecer relacionamentos que durem, nos quais possam se apresentar realmente nus, física e emocionalmente, sem qualquer receio de não serem aceitos. Relacionamentos onde suas virtudes sejam celebradas e suas limitações sejam acolhidas, nos quais se tenha a convicção de que se é amado como fruto de uma aliança estabelecida e firmada, a qual foi feita para durar. Assim, desde o início de todas as coisas, encontramos este dilema entre a necessidade de construirmos relacionamentos íntimos, nos quais nossas virtudes sejam celebradas e nossas limitações acolhidas, e a dificuldade de perseverarmos, ao longo dos anos, na construção deste projeto. Quando estamos em solidão, nossos corações se movem na direção do outro. Mas quando estamos com outro, em meio aos encontros e desencontros de uma relação, nosso coração tende à solidão. Como lidar com este dilema? 24
Em Busca de Uma Visão Realista capítulo 01
Três Visões do Casamento: Na Revista Ultimato de maio-junho/2005, em uma matéria intitulada Casamento: Encantamento com Obrigações e Obrigações com Encantamento, três visões acerca do casamento nos são apresentadas: a visão otimista, a visão pessimista e a realista. Gostaria de tomar por empréstimo esta divisão didática para compartilhar algumas ideias sobre cada uma delas, fazendo algumas adaptações e colocações pessoais sobre cada visão. Visão demasiadamente otimista (ou ingênua).
Esta visão, grandemente influenciada pelos contos de fada, nos quais belos casais, normalmente príncipes e princesas, casam-se para viverem felizes para sempre em seus palácios, nos apresenta uma ideia tremendamente ingênua da complexidade da relação entre seres humanos. Estes relatos sempre terminam no ápice da paixão, sem que tenhamos notícias de como o casal viveu após a chegada dos filhos, diante das crises financeiras ou quando se depararam com a perda da força física ou da beleza própria da juventude. Esta ingenuidade, somada à crescente pressão da cultura individualista e hedonista que nos envolve, tem feito com que o número daqueles que optam pelo divórcio aumente drasticamente nos últimos anos. Numa reportagem da Revista Época de julho/2004 intitulada “Divórcio Sem Stress” nos é dito que “se antigamente a crise no casamento se instalava no sétimo ano, hoje ela dá sinais nos primeiros 36 meses de vida 25