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LOUQUINHO pOR JESUS CORTINA ABERTA Em cena um rapaz de vinte anos de idade, sentado desajeitado no tapete da sala, brincando com bolinhas de gude. – Este é Marquinho, o filho mais velho do Sr. Ariovaldo e de Dona Rosália, crentes fiéis a Deus... – diz o narrador – Ele tem vinte anos de idade, mas sua mentalidade é de uma criança de seis anos. Entram, conversando, dois rapazes gêmeos de aproximadamente quatorze anos. Estão com roupas idênticas e materiais escolares. Marquinho continua brincando. – Eu te disse, Régis! – exclama um deles – Você e eu somos uma dupla imbatível! Ninguém na escola tem a capacidade intelectual que nós temos! Acredito que não há ninguém na cidade mais inteligentes que nós! – Você viu a cara daquelas gatinhas, quando nós respondemos com exatidão todas as questões sobre a vida de Albert Einstein?? – pergunta o outro, batendo nas costas do irmão – É, Regino, nós somos os caras!!
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Após o pequeno diálogo, os dois colocam os materiais em cima da mesa e, sentando-se, folheiam seus cadernos e começam a fazer a lição de casa, sempre com jeito esnobe. – Estes são Régis e Regino... – continua o narrador – Eles são considerados geniais. Sabem um pouco sobre tudo. São grandes admiradores de homens ilustres como Albert Einstein, Leonardo Da Vinci, Santos Dumont, entre outros... São, também, os irmãos mais novos de Marquinho. Marquinho, vendo que seus irmãos sequer o cumprimentam, levanta e se aproxima deles. Olha para Régis e para Regino (sempre de frente para o espectador). Continua olhando para um e para outro, virando a cabeça rapidamente, sem dizer uma palavra. Percebendo sua insistência, Régis pergunta: – O que você quer, Marquinho? Está nos atrapalhando. – É, seu retardado... – diz Regino – ...Não está vendo que estamos fazendo nossas tarefas? Com seu jeito carinhoso e divertido, sem se incomodar com a arrogância dos irmãos, com uma voz muito engraçada, Marquinho diz: – Focês dão falaram oi pra bim... Eu âbo buito focês... Peus irbãos queritos... Régis e Regino se entreolham, e, juntos dizem: – Ooooooiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii, Marquinho! Marquinho fica feliz e beija os rostos dos irmãos, irritados. Régis, limpando o beijo que o irmão lhe dera, diz: – Cai fora, agora! Temos mais o que fazer! Saindo aos pulinhos, Marquinho exulta de alegria e fica cantarolando:
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– Beus irbãos falaram oi pra bim! Lá, lá, lá... Beus irbãos falaram oi pra bim! Lá, lá, lá... Marquinho sai de cena. Seus irmãos continuam suas lições. Regino diz: – Fala sério, Régis... Como é que nós, seres tão inteligentes, fomos capazes de virmos ao mundo através da mesma barriga que esse maluco? Confesso que eu tenho uma vergonha de saber que ele é nosso irmão... – Eu estou querendo começar uma pesquisa sobre isso... – diz Régis – Na verdade, eu acho que esse idiota foi trocado no hospital... Veja você... Papai e mamãe também são bastante sabidos... Claro, eles não chegam aos nossos pés, mas têm uma boa dose de inteligência... Neste instante, surge Dona Rosália, acompanhada de seu esposo, Sr. Ariovaldo. – Filhos, nós vamos até a clínica para sabermos o resultado dos exames do Marquinho. Querem ir conosco? – diz Sr. Ariovaldo. – Desculpe, pai... Temos muito o que fazer... – responde Regino. – Bem, então até daqui há pouco. – termina ele. CORTINA FECHADA Os atores preparam o palco para que se torne uma clínica. CORTINA ABERTA Um médico alemão está olhando algumas chapas. Ao fundo um grande letreiro: “CLÍNICA MÉDICA DR. STAKOPÉ NAKOVA”. Batem à porta.
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– Pode entrrarr... – diz ele, com sotaque – A porrta está aberrta!! – Bom dia, Dr. Nakova... – diz Dona Rosália, entrando com seu marido – Viemos saber sobre o exame de nosso filho... – Ah, sim!! Yáh! Yáh! Vocês são os pais de Marrquinha, nom?? O garrota que é maluca da cachola? – pergunta o doutor. – Ei, dr... O senhor não pode falar assim de nosso filho! – diz Sr. Ariovaldo. – Ops, me desculpa... É um jeito carrinhosa de falar... O Marrquinha é um menina muito diverrtida... – diz ele – Agorra, sentem–se, porr favorr... Os dois sentam–se. O Dr. anda de um lado para outro, fitando-os. De repente, sentando-se também em sua cadeira, começa: – Bem, meus amigas... – Fala logo, doutor!!! Algum problema com nosso filho?? – grita Dona Rosália. – É que... Eu sou médica e prreciso dizerr a verrdade... – diz ele. – Por favor, doutor... – diz Sr. Ariovaldo. – É que... – continua o doutor – ...Eu estava agorra mesma analisando os exames de Marrquinha... O prroblema dele é sérria... Muito sérria... Tenho duas notícias parra darr a vocês... Uma é boa e a outrra é ruim prra carramba... Qual vocês querrem que eu darr prrimeirra?? Os pais de Marquinho se olham. Tentando se controlar, perguntam: – Diga-nos a notícia ruim...
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O doutor, levantando-se novamente e colocando suas mãos nos ombros do casal, diz: – A notícia ruim é que o Marrquinha não vai conseguirr viver porr muita tempo... Acho que ele vai baterr os botas em mais ou menas um mês, talvez um mês e meia... O casal se levanta e se abraça, chorando. – Calma! Calma!! Não prrecisa chorrar tanto assim, nom... – diz o doutor, sorridente – Agorra eu querria dar a boa notícia!! Ainda abraçado com a esposa, Sr. Ariovaldo pergunta: – Boa notícia, doutor?? Será que existe alguma possibilidade de cura para nosso filho??? Daríamos nossa vida por ele!! – Curra?? Oh, nom... Nom ter curra para seu filha Marrquinha, nom... – continua o doutor – O boa notícia é que eu tenho um amiga que é dona de uma funerrárria! Se vocês quiserrem eu consigo 50% de desconta no caixom parra meus pacientes... Assustados e desconsolados, pai e mãe de Marquinho se abraçam e saem chorando muito alto, sem sequer se despedir do doutor, não acreditando que aquele médico poderia ser tão insensível. Olhando para o público, o doutor exclama: – Ista que dá ser um bom médica e querrer ajudarr as pacientes... Bando de ingrratos!! CORTINA FECHADA Novamente o palco se transforma na casa de Marquinho. CORTINA ABERTA Sr. Ariovaldo e Dona Rosália entram, ainda abraçados e chorando muito. Não há ninguém na casa.
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Os dois entram e sentam–se num sofá. – Calma meu amor... – diz Sr. Ariovaldo – Nosso Deus é maior! Eu sei que Ele tem um propósito para todas as coisas neste mundo! Com nosso filho não será diferente! – Mas, Ariovaldo... Como vamos conviver com isso?? Quando damos conselhos para outras pessoas que vêm nos procurar, dizemos para que elas tenham fé em Jesus, mas quando uma coisa dessas acontece conosco, é tão difícil... Eu quero crer que nosso Deus é o Deus do impossível!! Ele já fez tanto por nós, não é mesmo?? Mas, mas, eu não estou conseguindo!!! Ajuda-me Senhor!!! Acrescenta-me a fé!!! – diz ela, chorando e contorcendo-se de dor por causa de tanto sofrimento. Sr. Ariovaldo não sabe o que dizer. Simplesmente abraça mais forte ainda a esposa. Nisso, alguém toca a campainha. – Você atende, querido? – pergunta Dona Rosália, soluçando. – Claro amor... – responde ele, enxugando as lágrimas. Ao atender a porta, Sr. Ariovaldo fica surpreso ao ver um policial carrancudo e com aparência de sargento “mandão” segurando Marquinho pela gola. – Guarda Eustáquio?? Mas o que foi que houve???? – pergunta ele. O policial, entrando com Marquinho (que está com as mãos cheias de folhetos evangelísticos), responde, com uma voz grossa: – Vim lhe devolver esse moleque, Sr. Ariovaldo!! Eu o peguei outra vez azucrinando as pessoas ali na esquina!! Esse louquinho deveria ficar preso em casa!!
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Soltando Marquinho, este responde, procurando abraçar o guarda: – Sou louquinho por Xesus, viu? Be dá um abraço!! Eu âbo buito o senhor, viu seu polícia?? – Ora, sai pra lá, seu maluco! – exclama o guarda. Irritado com a atitude do policial, Sr. Ariovaldo, empurrando-o para fora, diz: – Bom, obrigado por trazer nosso filho... Acho que o senhor já está de saída, não é mesmo?? – Sim, vou me retirar... – diz ele – Mas, se eu o encontrar atrapalhando a ordem de nossos cidadãos, levarei o senhor para prestar contas com o delegado! Sr. Ariovaldo não responde nada e, fechando a porta, pergunta para o filho, que nessas alturas já estava nos braços da mãe: – O que você fez de errado, Marquinho? – Nata, pai... Eu estafa entrecando papelzinho te Xesus... Taí um homem falou que Xesus dão existe e eu fiquei brafo... – responde ele. – Você ficou chateado com o homem, meu filho? – pergunta Dona Rosália – O que você disse pra ele? – Dão tisse nada... Só empurrei ele... Daí ele caiu num monte te lixo... E tudo munto teu risata dele... – diz Marquinho – Mas foi sem querer e tepois eu peti pertão... só que ele ficou be xincanto... Eu dão costo que falam que Xesus dão existe... Ele existe sim e eu âbo buito Xesus, mãe... – Ora, filho... – diz Sr. Ariovaldo – Eu já te esninei que não podemos forçar as pessoas a gostarem de nosso Senhor Jesus Cristo... Se você quer entregar folhetinhos que falam de Deus,
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então você não deve se importar com aqueles que não acreditam... Cada um vai ter que dar conta de sua vida a Deus, um dia... – Bas eu pedi pertão pro homem, pai... – diz ele, chorando. – Ok, filho... Vamos esquecer tudo isso, está bem? Por acaso, você sabe onde estão seus irmãos? Eu já falei para que eles não deixem você sozinho em casa... – pergunta Sr. Ariovaldo. – Acho que eles estão estutanto na piplioteca... – responde ele. Logo, entram Régis e Regino. Marquinho, ao vê–los, corre abraçá-los novamente. – Peus irbãos queritos!!!... Eu âbo buito focês!!!... Os dois, empurrando-o, dizem: – Já falamos oi pra você, hoje, Marquinho!!! – Eu sei!! Eu Sei!!! – responde ele, balançando os braços de um lado para outro – Focês são peus irbãos queritos!!!... Tchau!! Acora eu fou brincar lá fora!! Fou catar tatuzinho!! Tchau minha fabília querita!! Quando Marquinho sai, Dona Rosália começa a chorar novamente. Sr. Ariovaldo senta-se ao seu lado. Régis, vendo aquilo, pergunta: – O que houve, mãe? Por quê a senhora está chorando?? Dona Rosália não responde e se levanta, dirigindo-se para o quarto, transtornada. Sr. Ariovaldo, então, diz: – É por causa do irmão de vocês, meninos... Foi constatado nos exames que ele está morrendo... O doutor disse que ele só tem algumas semanas de vida... – Sério, pai?? – pergunta Regino, assustado.
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– É... – diz Sr. Ariovaldo, procurando não demonstrar sua terrível dor, conduzindo a esposa desconsolada – Vamos, querida, vamos orar e entregar toda nossa família nas mãos de Deus... É Ele o dono da vida... Sr. Ariovaldo e Dona Rosália saem de cena. Regino, olhando para Régis, com um sorriso de quem teve uma boa idéia, exclama: – Está na hora de usarmos nossa maravilhosa inteligência para algo realmente grande!! Algo capaz de mudar o rumo da medicina!! – Do que você está falando, Regino? – pergunta Régis. – Estou falando que nós, humanos altamente capacitados, temos condições de salvar o biruta do Marquinho... O que você acha de nós voltarmos à biblioteca e estudarmos tudo sobre doentes mentais?? Reviraremos aqueles corredores e prateleiras de cabeça pra baixo, se for necessário!! Nem que tenhamos de aprender sobre como preparar alguma fórmula mágica contra retardamento!! Nem que tenhamos que inventar, misturando algumas químicas!! Régis fica observando-o com ar de zombaria por alguns segundos. – E então, maninho?? O que você acha?? Dando as costas para o irmão, Régis diz: – Essa foi a idéia mais... mais... mais... (virando-se rapidamente para Regino e dando-lhe um beijo na testa) ... mais sensacional que essa sua boca de gênio já revelou!!! Vamos agora mesmo para a biblioteca!! CORTINA FECHADA O palco se transforma num laboratório.
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(pode-se fazer efeito de fumaça em alguns vidros, utilizando gelo seco) CORTINA ABERTA Os irmãos gêmeos estão trabalhando. Passaram–se algumas semanas – diz o narrador – e os irmãos Régis e Regino estudaram tudo o que podiam para mostrar o quanto eram sabidos... Porém, o coração de ambos não estavam exatamente querendo ajudar Marquinho, mas sim, provar ao mundo que eram pessoas especiais, donas de uma inteligência fora do comum... Não percebiam como estavam cada dia mais arrogantes e mais distantes das coisas de Deus... Deus esse que eles já nem criam tanto, pois a cada dia admiravam mais e mais essa ciência que nega a existência de um Ser Supremo, Criador de todas as coisas... – Hum... Vejamos aqui... – diz Régis olhando um livro, segurando um frasco com um líquido preto numa das mãos e na outra, um frasco com um líquido amarelo – Primeiro misturamos um pouco de Glicosonorbato Cerebracol com Mentalizonador Nucal... Assim que Régis mistura os dois líquidos, Regino (que está segurando um frasco com um líquido vermelho) pega a fórmula e continua: – Agora colocamos um pouco de Neuronicranicapacitatol Inteligenianozor... E... záz!! Está quase pronto, meu irmão!!! Régis pega novamente a fórmula, com cuidado para não derramar. Enquanto Regino falava, Régis já estava segurando mais um outro pequeno frasco com um líquido roxo. – Agora sim!!! – diz Régis – Ah! Ah! Ah!!! Só falta colocarmos agora o ingrediente final!!! Apenas uma gota de Pensarrapidol e
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está feito!! Ah! Ah! Ah!! Vamos chamar esta fórmula inovadora de Regiserreginador!!! Vamos ganhar uma nota preta!! – Bem, ainda temos de fazer alguns testes... – diz Regino – E outra coisa: assim que tivermos a certeza de que ela funciona, devemos mostrar a fórmula para algum doutor... Alguém formado, pois nunca o Ministério da Saúde vai nos permitir usar esse negócio... Nesse instante, Régis começa a sentir uma coceira nas costas. Deixando a fórmula na mesa e se coçando devagar, diz: – Caramba, Regino... Estou sentindo uma coisa esquisita... Regino também começa a se coçar, porém na barriga. – Ai, que coceira me deu de repente... A coceira começa a se manifestar nas outras partes do corpo dos dois. – Ai, Régis!!! – diz Regino, coçando-se freneticamente – O que será que é isso?? Sarna???? – Sei lá!! – diz Régis, deitando-se e rolando no chão, desesperado – Aiii!!!!! Droga!!!! Que coceira infernal!!!!!!! Os dois continuam coçando-se terrivelmente, derrubando tudo no laboratório, contorcendo-se e gritando, enquanto a cortina vai se fechando. CORTINA FECHADA O palco novamente se transforma na casa de Marquinho. CORTINA ABERTA Sr. Ariovaldo está na sala, lendo um jornal, tendo Marquinho encostado em seu ombro. Todos ouvem sirene de polícia. Alguém toca a campainha. Sr. Ariovaldo vai atender. Ao abrir a
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porta, depara–se novamente com o policial Eustáquio, que vai entrando sem pedir licença. – O que foi que houve desta vez, policial?? – pergunta Sr. Ariovaldo – O Marquinho ficou comigo o dia todo! O policial, com seu jeito de “autoridade máxima”, arrumando suas calças, diz: – Quem diria, Sr. Ariovaldo?!??... Bonito, não?? – diz ele. Marquinho segura-se fortemente em seu pai, observando atentamente os gestos do policial. O policial continua: – Agora até seus filhos gêmeos estão aprontando, hein?? – Do que é que o senhor está falando? – pergunta Dona Rosália, que aparece de bobs e máscara facial. – Estou falando de Régis e Regino... – continua ele – Civis até então considerados exemplos para todos nós por causa de suas genialidades e boa educação... Acabei de levá-los até o hospital... Eles entraram sem pemissão no laboratório de nossa universidade e acabaram mexendo em alguma química... Do jeito que eu os encontrei, parecia que estavam com alguma espécie de alergia por causa de uma fórmula estranha que estava em cima da mesa... Acho que só a exposição deles àquele líquido resultou nisso... Dona Rosália fica paralisada, em estado de choque. Sr. Ariovaldo, tentando novamente se controlar diante de uma notícia tão desagradável, corre auxiliar a esposa: – Querida!! Querida!! Fale comigo!! – dizia ele, sacudindo-a. Marquinho, levando as mãos à cabeça, começa a chorar muito:
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– Beus irbãos!!!! Beus irbãos!!!! Beus irbãos!!!! Dão pote ser!!!! Eu âbo buito beus irmãozinhos!!! De repente, Marquinho começa a sentir uma tontura e uma terrível dor na cabeça: – Ai... – diz ele – Estou esquisito... Tá ficando tudo preto... Ao dizer estas palavras, cai, nos braços do guarda Eustáquio. – Marquinho!!!! – grita Dona Rosália. – Filho meu!! – grita Sr. Ariovaldo, segurando-o em seus braços. O guarda exclama: – Vamos levá-lo até o hospital, também!!! Enquanto todos vão saindo, a cortina vai se fechando. CORTINA FECHADA O palco se transforma num hospital. Há três leitos, onde estão deitados: Régis, Regino e Marquinho. Todos estão tomando soro. CORTINA ABERTA Os três já estão nas camas. Entra Dr. Stakopé Nakova, acompanhado de Sr. Ariovaldo e Dona Rosália. O doutor examina lentamente os três. Depois diz: – Yáh, yáh... Pobrrezinhas... Tsc! Tsc!... – O que o senhor tem para nos dizer, doutor?? – pergunta Sr. Ariovaldo, apertando seu tórax.
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– Olha, meus querridas... – continua o doutor – Mais uma vez tenho duas notícias... Uma boa e outrra ruim prra carramba... – Olha, doutor... – diz Dona Rosália, irritada – Se o senhor vier com aquele negócio de funerária de novo eu vou denunciá-lo!!! – Denunciarr??? Bem... Querro dizer... Então vamos somente parra a notícia ruim, yáh?? – diz ele – É que... Segundo minhas exames... É... Bom... Segundo minhas exames... Os trrês meninas nom vom verr o luz do dia de amanhã... Dona Rosália desmaia nos braços do marido. Sr. Ariovaldo, chorando, tenta acordar a esposa, enquanto o doutor vai saindo. Ao chegar à porta, Dr. Nakova, entregando um cartão para Sr. Ariovaldo, pela última vez, diz: – Nom esqueça, se prrecisarrem de caixom... Dou uma jeitinha de conseguirr trrês pela preça de dois!! Sr. Ariovaldo, pegando o cartão, para que o doutor saísse logo dali, continua chamando a esposa: – Rosália!! Rosália!! Uma linda música toma conta do local. Ela, despertando-se e beijando as mãos dos filhos, inconscientes, chora e grita sem parar. – Marquinho!! Régis!! Regino!!! Óh, Deus!! Por quê o Senhor permitiu que eu fosse mãe, para agora tirá-los de mim dessa maneira???!! – Calma, querida!! – diz Sr. Ariovaldo – Não vamos brigar com nosso Deus! Estou muito entristecido, mas devemos ter fé! Eles estão vivos!! Eles não se foram!! Para tudo existe um propósito!!
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Dona Rosália, tentando manter sua fé firme, limpando seu rosto e, segurando a mão de Marquinho, diz: – Uma coisa devo confessar, querido... Quando vejo nosso amado filho mais velho... Com seu jeito doce e carinhoso de ser... Mesmo com todos os problemas de desenvolvimento que ele tinha... Confesso que gostaria que Régis e Regino tivessem um pingo da humanidade que tem esse garoto... – É, Rosália... – diz Sr. Ariovaldo, segurando as mãos dos outros dois – A inteligência deles era tamanha que acabou os afastando de Deus... Eles se tornaram arrogantes e presunçosos... Como ficava triste ao ver o modo que eles tratavam o Marquinho, que, com sua pureza de coração nem percebia e continuava amando-os de verdade... Mas, vamos confiar em nosso Jesus, Rosália... Nada acontece, sem a permissão de Deus... Nisso entra uma enfermeira, dizendo: – Com licença, mas agora vocês devem sair... Com muita dor no coração, Sr. Ariovaldo consegue levar sua esposa para fora. A enfermeira também sai, auxiliando Dona Rosália. A música continua. Após alguns segundos Marquinho dá um pulo na cama e senta-se, um pouco assustado. Tirando o soro, olha para os lados e para cima. – Onte é que é esse lucar?? Eu dum tô da binha casa... Olhando Régis e Regino deitados nos leitos próximos a ele, desce da cama e diz, novamente: – Acora que eu be lemprei... O cuarda disse que beus irbãos estafam cum alerxia... Bas eu num sei o que é isso besbo... Mexendo nos irmãos, Marquinho diz:
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– Réxis!!! Rexino!!! Irbãos!!! Ei!! Acorta!! Tá na hora de focês estutar!! Irbãos!!! Ei!! Acorta!! Acorta aí!! Marquinho começa a chorar também, e curvando-se no chão, resolve orar: – Óh, papaizinho querito... Beu Senhor Xesus que eu âbo tanto!! Eu dum sei o que está acontecento com meus irbãos queritos... Axuda eles! Dum deixa eles borrer... (após orar, Marquinho fica na mesma posição de oração, chorando alto, até que seu choro se tranforma num gemido, que vai diminuindo, até acabar, juntamente com a música). Régis e Regino se levantam assim que tudo fica em silêncio. – Você está bem, mano?? – pergunta Régis para Regino. – Estou ótimo!! – diz ele, sorrindo e tirando seu soro, no que é repetido por Régis. – Você estava ouvindo?? – pergunta Régis, novamente. – Estava ouvindo tudo, desde a hora em que o médico disse que a gente estava para morrer! Só que parecia que alguma coisa não deixava eu me mexer, foi arrepiante!!! Ouvi tudo: a mãe, o pai, o Marquinho orando... – diz Regino. – Eu também!! Ei, veja!! O Marquinho ainda está ali no chão!! – grita Régis, levantando-se alegremente e dirigindo-se para perto do irmão mais velho – Ei! Ô “ Irmãozinho Doidinho”! (ele diz com carinho, pois sabia que Deus ouvira a oração do irmão, porém Marquinho não se mexe.) Regino também se aproxima. De repente, Régis se levanta assustado e, abraçando Regino, emudece. Uma canção que trata de salvação ao fundo (alguns segundos) e uma luz mais forte em Marquinho. Entram o doutor, Sr. Ariovaldo, Dona Rosália, o guarda e a enfermeira, olhando surpresos com os garotos em pé abraçados e Marquinho naquela posição de oração. Sr. Ariovaldo
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pega Marquinho no colo e todos ficam próximos a ele, sem palavras, enquanto a cortina se fecha lentamente. Mesmo com a cortina fechada, a melodia ainda toma conta por algum tempo. Narrador entra no palco (cortina fechada) e, com seriedade, diz: – Bem, meus amigos... Acabamos de assistir a história desse garoto, Marquinho... Uma pessoa simples, humilde, alegre e como ele mesmo dizia: louquinho por Jesus... Não pense que esta é uma história triste, não... Pelo contrário... Certa vez, há dois milênios aproximadamente, um homem cego com certa dificuldade perambulava pelas ruas e, de repente, passou próximo a ele, os discípulos de Jesus, que estavam acompanhados de seu Mestre... Um deles, vendo aquele cego, perguntou: “Senhor, por quê este cego nasceu assim? Quem pecou para que isto ocorresse? Ele mesmo, ou seus pais?” e Jesus, levantando e se aproximando do cego, disse: “Nem ele, nem seus pais pecaram... Isso aconteceu para que fosse manifestado a glória de Deus...” e realizando um milagre na vida do homem, este voltou a enxergar... Nosso querido Marquinho não foi curado... Porém se cumpriu mais uma vez aquela mesma palavra de Jesus... Através de Marquinho se manifestou a glória de Deus, pois não era ele quem precisava de cura, mas sim, seus dois irmãos, que, além da cura de seus corpos físicos, também conseguiram a cura espiritual, pois não percebiam que, por causa de tanta inteligência, a cada dia, estavam afastando-se do Senhor... Deus ouviu a oração de Marquinho e seu lar após sua morte, nunca mais fora o mesmo... Régis e Regino se tornaram grandes pesquisadores das Escrituras e, quanto mais se aprofundavam em conhecer a Palavra de Deus, mais preenchidos interiormente ficavam, resultando uma vida de paz, alegria e temor de Deus...
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CORTINA ABERTA Todos os participantes estão em cena, inclusive o narrador. Juntos dizem: – “Em verdade vos digo: Quem não receber o reino de Deus como uma criança de maneira alguma entrará nele”. Lucas 18:17