REINVENÇÃO A TARDE completa hoje 97 anos de uma história de ideais marcada por mudanças na forma, conteúdo e tecnologia
UM JORNAL EM PERMANENTE MOVIMENTO Poucos jornais na história da imprensa brasileira chegaram aos 97 anos de circulação ininterrupta, marco que A TARDE, orgulhosamente, atinge hoje, sem, no entanto, perder de vista os desafios do futuro e o comprometimento do fundador Ernesto Simões Filho para com os interesses da Bahia. Ao longo deste quase século de existência, o jornal não poupou esforços em modernizar-se, tornar-se mais atrativo às novas gerações, sem perder, contudo, o seu espírito essencialmente baiano. Nesta edição comemorativa, o leitor conhecerá como A TARDE vem se reinventando para acompanhar o espírito do tempo, acompanhando os últimos avanços técnicos, atualizando as formas de produção de conteúdo e proporcionando qualificação ao seu corpo funcional. Apesar das novas tecnologias adotadas, o compromisso de A TARDE continuará sendo com a informação cidadã e com a credibilidade que conquistou junto ao seu público – essências de sua história quase centenária.
Simanca
CADERNO ESPECIAL 97 ANOS DO JORNAL A TARDE EXPEDIENTE EDITORA-COORDENADORA SIMONE RIBEIRO EDITOR CLÁUDIO BANDEIRA EDITORA DE ARTE IANSÃ NEGRÃO EDITOR DE FOTOGRAFIA CARLOS CASAES PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO AXEL AUGUSTO HEGOUET PESQUISA HISTÓRICA MAURÍCIO VILLELA
SALVADOR, QUINTA-FEIRA, 15 DE OUTUBRO DE 2009 ESTE CADERNO É PARTE INTEGRANTE DO JORNAL A TARDE. NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE.
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ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
REGINA SIMÕES A presidente de A TARDE enfrenta há cinco décadas o desafio de conduzir o jornal fundado por seu pai, Simões Filho
Uma mulher à frente de seu tempo CLÁUDIO BANDEIRA
“É uma mulher com rumo, que sabe o que quer fazer, uma mulher firme e afirmativa. Uma mulher contemporânea”. A definição do ex-governador Waldir Pires sintetiza a personalidade de Regina Simões de Mello Leitão, que enfrentou com têmpera o desafio de conduzir o destino de A TARDE, tarefa que cumpre com êxito ao longo de cinco décadas, desde a morte de seu pai, Ernesto Simões Filho, que fundou o jornal em 1912. Muitos a consideram a primeira-dama do jornalismo baiano, mas, acima de tudo, ela é uma mulher à frente de seu tempo, destacando-se no mundo empresarial em uma época em que era pouco habitual mulheres ocuparem cargos executivos. A força de sua influência jamais sobressaiu-se à discrição com que atuou na defesa dos interesses da empresa. Nascida em Salvador no dia 28 de agosto de 1912, pouco menos de dois meses antes da fundação de A TARDE, dona Regina, como é carinhosamente chamada, desde cedo se fez presente ao lado do pai em suas lutas políticas. E não foram poucas. Ela conjugava com ele todo o sentimento da vida política baiana. E não fez diferente a partir de 1957. Com o falecimento de Simões Filho, conduz o jornal em um período no qual o Brasil passou por profundas transformações políticas e sociais, muitas delas turbulentas, como o golpe militar de 1964, a redemocratização a partir do final dos anos 70 e os novos tempos da economia estabilizada e do real. “Sem nenhuma dúvida, ela é a grande figura do jornal. Tem o dom de manter o jornal que o pai instituiu. Ela é a grande figura aglutinadora do jornal. Exemplo de equilíbrio, firmeza e sabedoria de conduzir, de vencer obstáculos”, define Waldir Pires. Dotada de muitas das qualidades que caracterizam a individualidade de seu pai, de quem foi confidente, e a personificação do carinho e da solidariedade, ao longo dos anos, transmitiu à orientação do jornal a lucidez, a firmeza e o espírito público que soubera imprimir-lhe nos 50 anos em que o dirigiu o jornalista Simões Filho. O espírito indômito do fundador de A TARDE serviu de inspiração e força para que Regina Simões mantivesse vivo o trabalho construído por seu pai. Esta ligação afetiva foi manifestada pela presidente de A TARDE em homenagem post-mortem que Simões Filho recebeu em outubro de 1992 da Associação Bahiana de Imprensa. “Procuramos ser dignos do ideal de independência que nosso pai nos deixou”, disse então.
segundo ela, “foi brilhante na sua vida pública. Ninguém amou mais a sua terra – a Bahia – do que ele”, definiu. “Dona Regina possui valores incomuns”, diz o jornalista e colunista político de A TARDE Samuel Celestino, “um refinamento e uma capacidade de liderança extraordinária; sabe discutir o jornal porque ela conhece o seu funcionamento. A linha editorial do jornal era traçada por ela e doutor Jorge [Calmon], ao lon-
go do tempo, adaptada ao processo histórico. Ela costuma recomendar: “Meu filho, veja a linha política do jornal”. Casou-se com o engenheiro civil Sylvio Calheiros da Graça de Mello Leitão, com quem teve dois filhos: Sylvio e Sérgio. Ficou prematuramente viúva em 1958. Dona Regina recebeu sua educação no Colégio Alemão, em Salvador, e no Colégio Sagrado Coração de Jesus, no Rio de Janeiro, onde também fez o
curso de enfermagem na Cruz Vermelha Brasileira. Em Paris, estudou Literatura e Línguas. Além de presidente da Empresa Editora A TARDE S.A., já foi membro da Sociedade Interamericana de Imprensa, sendo eleita, em 1971, no México, vice-presidente regional do Comitê de Liberdade de Imprensa e várias vezes condecorada. Na área de promoção social, assumiu a diretoria da Associação Brasileira Beneficente de
Reabilitação, foi fundadora da Obra Assistencial do Chame-Chame e sócia benemérita da Obra de Assistência aos Pobres e Menores Vendilhões da Paróquia de Nazaré.
Trabalho infantil Sua preocupação com a exploração do trabalho infantil fez com que apoiasse e presidisse a Fundação Franco Gilberti, de amparo às crianças de rua. “Medidas efetivas devem ser buscadas pa-
ra acabar com tal exploração da infância”, afirmou quando foi homenageada pela Legião da Boa Vontade (LBV). Preocupada com a consolidação e modernização do jornal, tem se empenhado incessantemente com os irmãos, Renato Simões e Vera Simões Bainville, para atingir aquele objetivo. “Acreditamos no Brasil, e uma prova disso é que estamos investindo e modernizando nosso parque gráfico”, disse.
Gildo Lima / Ag. A TARDE / 14.10.2002
CONDECORAÇÕES Medalha do Mérito Jornalístico (ABI), Dama da Ordem Militar e Religiosa de Malta, Medalha Machado de Assis, Comenda da Ordem do Mérito Judiciário do Trabalho (TST) e Comenda da Ordem do Mérito da Bahia
LIBERDADE DE IMPRENSA Dona Regina Simões sempre defendeu a liberdade de imprensa e manteve o jornal ligado a entidades orientadas no sentido de defender os direitos civis e democráticos, como a Associação Nacional de Jornais
Dona Regina mantém vivos a lucidez, a firmeza e o espírito público de Simões Filho
ADMIRAÇÃO E RESPONSABILIDADE Simões Filho sempre teve uma admiração profunda pela filha, e ela se sentiu na responsabilidade e obrigação de que essa chama continuasse viva até os 97 anos do jornal A TARDE
TRABALHO INFANTIL A preocupação de Dona Regina com a exploração do trabalho infantil fez com que apoiasse e presidisse a Fundação Franco Gilberti, de amparo às crianças de rua, e defendesse medidas para ajudar crianças em risco social
“Ela é uma mulher afirmativa, uma mulher contemporânea”
Admiração
WALDIR PIRES Ex-governador da Bahia
“Simões Filho sempre teve uma admiração profunda pela filha, e ela se sentiu na responsabilidade e obrigação de que essa chama continuasse viva até os 97 anos do jornal A TARDE, explica o filho e diretor executivo de A TARDE, Sylvio Simões. Como Simões Filho, costuma corrigir com delicadeza seus colaboradores e não transgride de suas obrigações empresariais – sempre tendo à frente a continuidade do trabalho do pai, que,
“Dona Regina sempre defendeu o valor da liberdade de imprensa” ROBERTO SANTOS Ex-governador da Bahia
Compromisso com os interesses da Bahia e defesa da liberdade de imprensa O trabalho desenvolvido por Regina Simões para o estabelecimento de uma imprensa independente no País foi reconhecido em vário momentos. Em 13 de maio de 1967, por exemplo, ela recebia a Medalha do Mérito Jornalístico, ao lado de outras ilustres figuras, tendo sido congratulada pelo então governador da Bahia, Luiz Viana Filho: “Congratulo-me pelo honroso recebimento do Mérito Jornalístico com que a distingue o Governo da República pelos serviços prestados na imprensa brasileira em continuação à obra do inesquecível fundador de A TARDE, o grande baiano Simões Filho, cuja memória tem a reverência de nossas homenagens”.
Autor de cinco livros centrados em buscar provas sobre a existência de Deus, o empresário Nelito Carvalho conta que dona Regina leu todos os seus livros: “Ela é muito católica”. O empresário a conheceu em 1948, porque namorava a prima dela e frequentava a casa da família. “Eu lembro muito de Ernesto Simões. Era uma pessoa muito inteligente e também muito aguerrida. Mas não acho que dona Regina tenha herdado esse traço dele. Ela era muito serena, muito sábia”. “Dona Regina sempre foi defensora do valor da liberdade de imprensa. O jornal sempre foi ligado a entidades orientadas no sentido de defender as liberda-
des democráticas. Ela teve um papel muito importante nessa direção”, afirma o ex-governador da Bahia Roberto Santos. Dona Regina costumava acompanhar o pai nas idas e vindas à Bahia. Em 1951, Simões Filho foi nomeado ministro da Educação e Saúde do governo Getúlio Vargas. Com ele, absorveu as inquietações que faziam parte do cotidiano dele, principalmente sendo Simões Filho um líder político e um homem que buscou a construção de uma sociedade mais justa. “Ao longo dos anos, transferiu o sentimento de filha em relação ao pai para o jornal A TARDE e procurou aplicar as concepções de Simões Filho para que A TAR-
DE se mantivesse na linha democrática, plural e cidadã. É uma busca inquietante até hoje”, lembra o diretor de A TARDE, Sylvio Simões. Ele ressalta não ser verdade que o ex-redator-chefe de A TARDE Jorge Calmon tenha conduzido a política editorial do jornal. ”Foi Regina Simões. O Jorge era uma pessoa ligada a Antonio Carlos Magalhães, a Lomanto Júnior. No entanto, houve uma mudança nas candidaturas de Roberto Santos e Waldir Pires, da qual ela se posicionou amplamente favorável. Ela imprimiu a linha política do jornal, a qual o Jorge Calmon seguiu“. COLABOROU BEATRIZ GARCIA
Marco Aurélio Martins / Ag. A TARDE
Empresário recorda histórias vividas
Ações sociais e a estima de auxiliares
Pai e filha discutem sobre a amizade
Waldir lembra apoio ao retorno libertário
Talento para driblar crises e mirar futuro
O empresário Nelito Carvalho conta que, certa feita, convidou dona Regina para almoçar com ele no restaurante do Yatch, que é o favorito dela, e ela disse que já tinha um compromisso. Contudo, desmarcou para aceitar o convite do empresário. “Ela costumava frequentar muito o Yatch. É muito viajada. Uma vez por ano, ia para Nova Iorque, e uma vez, a Paris. Tem um hotel famoso em Paris, que não recordo o nome, onde ela já foi mais de 40 vezes! Uma vez, perguntei: ‘A senhora é de direita ou de esquerda?’. Ela respondeu: ‘Eu sou entre os dois, não sou nem esquerda nem direita”
“Temos lutado, meus irmãos e eu, com o auxílio e a dedicação de Jorge Calmon, para manter A TARDE como o maior jornal do Norte e Nordeste”, disse em discurso feito há 17 anos na ABI. De seus amigos, fica o relato de sua imensurável bondade com a qual soube fazer-se estimar tanto por antigos auxiliares de seu pai como pelos que depois dele em A TARDE ingressaram. Muitas ações de caráter social tomadas pela empresa em favor dos funcionários, e suas famílias, foram iniciativas de sua presidente, de quem também instituições baianas de assistência social recebem ajuda.
“Um episódio a mencionar-se foi quando ele [Simões Filho] se aborreceu com um grande amigo dele, de muitos anos [o então governador Octávio Mangabeira ], e ela [dona Regina] estranhou o fato de voltarem a ter relações. À sua inconformidade, ele respondeu: “Não tenho mais idade para criar uma outra amizade de 30 anos!”. Octávio Mangabeira, Luiz Viana Filho, Washington Luiz, Landulpho Alves, entre outras personalidades, conviveram também com Regina, que participava dos entendimentos políticos no Rio de Janeiro, então capital do País“, lembra o irmão Renato Simões.
“Dona Regina teve muita simpatia quando eu voltei e recompus as forças democráticas da Bahia e pude unir todos os libertários inconformados”, lembra o ex-governador Waldir Pires. “Mais de uma vez já propus sessões especiais na Câmara dos Deputados para fazer homenagens ao A TARDE e a Regina estava lá. Uma homenagem à existência do jornal e sua fidelidade à liberdade de imprensa e à liberdade de opinião. Deputados de todos os estados reconheceram, aliás todos reconhecem, que o maior jornal do Nordeste é o A TARDE. Nesta ocasião, ela ficou muito emocionada”.
“Eu sei que driblar crises tem sido uma constante na vida dela. Isso tem sido demonstrado em toda a sua formação, em todo o seu caráter”, pondera o ex-governador Roberto Santos. “Não é fácil destacar uma situação específica porque estamos falando de uma vida inteira. Eu diria que dona Regina é sim uma mulher à frente do seu tempo. Num mundo em que os homens tinham uma predominância muito grande, tanto na vida política e cultural, ela sempre se destacou. E, a despeito disso, sempre teve uma presença de vanguarda, e todos tiveram grande respeito pelas suas opiniões”.
Waldir Pires: “Fidelidade à liberdade de imprensa”
ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
CARINE APRILE IERVESE
Da clicheria (técnica de transferir imagens para uma chapa metálica de impressão) às fotos digitais, A TARDE acompanhou todas as mudanças de linguagens gráficas ocorridas ao longo dos seus 97 anos de existência, principalmente através das capas do jornal, seu melhor cartão de visitas. Especialistas em design gráfico e artes plásticas atestam que o periódico conseguiu passar por todas essas mudanças sem perder sua identidade. “Se pegarmos os jornais da época do surgimento de A TARDE, vamos perceber que ele estava inserido no contexto mundial, pois sempre acompanhou o aspecto visual do seu tempo”, diz Enéas Guerra. Designer gráfico há 37 anos e leitor de A TARDE desde 1973, Guerra é coautor de dois livros em parceria com o fotógrafo Pierre Verger. Para o artista plástico Juarez Paraíso, ex-diretor da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia e um dos criadores do curso de design gráfico da instituição, A TARDE sempre apresentou capas capazes de impactar seus leitores. “O jornal marcha paralelo a todas as evoluções tecnológicas. Ao longo dos anos, vem abrindo mais espaço para a imagem, sejam fotografias, ilustrações ou infografias. A participação da imagem dá o peso de contemporaneidade e oferece esse nível de leveza e dinamismo ao jornal”.
DESIGN Artistas plásticos e designers atestam que o periódico baiano evoluiu ao longo de quase um século de história, acompanhando as transformações visuais de seu tempo
Capas de A TARDE revelam as mudanças nas artes gráficas 1
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1 Em 7 de setembro de 1922, A TARDE publica, pela primeira vez, uma capa totalmente ilustrada, em papel especial e impressão em quatro cores, em comemoração ao Centenário da Independência do Brasil
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No dia 14 de agosto de 1945, outro momento raro para a época foi registrado na primeira página do jornal. Uma infografia explicando o funcionamento da bomba atômica
3 Com a ofensiva americana, o Japão anunciou rendição incondicional, findando a II Grande Guerra. No dia seguinte, o jornal dava a manchete que todos esperavam ler: “Reina, afinal, a paz no mundo!”
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Até a década de 50, as capas de A TARDE davam destaque a fotos de personalidades, como presidentes, militares e lordes. A partir de 1960, acontecimentos como a chegada do homem à Lua registram as primeiras fotos com mais movimento
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5e6 A partir dos anos 2000, as capas ganham mais plasticidade e leveza. Fotos maiores dão lugar ao que antes era texto e a informação através das imagens é priorizada
7e8 A paz desejada no início de cada ano é contrastada, aqui, com a violência urbana. A foto enviada por um leitor, de um ônibus pegando fogo em Salvador, ganha destaque na primeira página do jornal Reprodução / Ag. A TARDE
“A TARDE marcha em paralelo a todas as evoluções tecnológicas e vem abrindo espaço para a imagem”
registradas por A TARDE. Cinquenta e seis anos depois das bombas atômicas, foram os Estados Unidos que viraram os alvos, desta vez de Osama Bin Laden, em 11 de setembro de 2001. “Terror abala o mundo”, manchetava o jornal, com uma foto desoladora das torres gêmeas em chamas.
Fotografia JUAREZ PARAÍSO, artista plástico e ex-diretor da Escola de Belas Artes da Ufba
Reprodução / Arquivo A TARDE
Instituições nacionais e internacionais destacam design De 2003 para cá, A TARDE passou por três grandes mudanças em seu projeto gráfico (2003, 2006 e 2009), absorvendo as novas tendências e demandas da sociedade. O editor-coordenador de arte do jornal A TARDE, Pierre Themotheo, define a atual linguagem visual com uma só palavra: simplicidade. “Eliminamos os enfeites e demos toda a importância à informação. Absolutamente nenhum recurso gráfico se sobrepõe a uma informação. As capas de A TARDE são muito importantes e refletem o design editorial da Bahia”, afirma Themotheo. A capa publicada em 27 de novembro de 2007 (“Tragédia em sete atos”), um dia depois do acidente que matou sete pessoas na Fonte Nova, foi reconhecida nacionalmente. A edição ficou entre as três finalistas do Prêmio Esso de Jornalismo 2008, desbancando mais de 100 capas dos principais jornais do País. Outra capa de A TARDE reconhecida, desta vez internacionalmente, foi a publicada no dia 21 de janeiro de 2009 (“Obama propõe nova era“), um dia após o discurso de posse do primeiro presidente negro da história dos EUA, Barack Obama. A edição foi escolhida pelo The Poynter Institute para fazer parte de um livro que reuniu as 30 melhores capas do mundo sobre o tema. Com as novas tecnologias, o leitor de A TARDE também vem
PRIMEIRAS PÁGINAS
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Destaques Capas marcantes pontuam a história de A TARDE, como a publicada no dia 7 de setembro de 1922, em comemoração ao Centenário da Independência do Brasil. O jornal arriscou e, pela primeira vez, publicou, em edição extraordinária, uma capa completamente ilustrada, com papel especial e impressão em cores. “É uma belíssima capa. Perfeita, do ponto de vista plástico”, avalia Juarez Paraíso. Outra raridade para a época foi publicada na capa da edição de 14 de agosto de 1945: uma infografia explicando o funcionamento da bomba atômica. No dia anterior, o Japão anunciou a rendição incondicional, findando a II Grande Guerra, depois de ter duas cidades (Hiroshima e Nagasaki) atingidas por bombas atômicas, lançadas pelos Estados Unidos. “O Japão Capitulou!”, dizia a manchete daquele dia. No dia seguinte: “Reina, afinal, a paz no mundo!” A paz pode ter reinado naquele momento, mas outros conflitos entre nações continuaram a amedrontar o planeta e foram
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Capa indicada como uma das 30 melhores do mundo
“Eliminamos os enfeites e demos toda importância à informação” PIERRE THEMOTHEO, editor-coordenador de arte do jornal A TARDE
sendo estimulado a atuar como produtor de conteúdo, auxiliando, inclusive, na produção das primeiras páginas do jornal. Prova disso é a capa publicada no dia 8 de setembro de 2009 (“Criminosos atacam módulos da polícia e queimam quatro ônibus“), que trouxe, com destaque, uma foto enviada por um leitor de A TARDE.
Até a década de 1950, as capas de A TARDE traziam fotos que
ilustravam principalmente as personalidades da época. Eram militares, presidentes, médicos, sacerdotes, embaixadores e lordes. Mas foi a partir da década de 1960, com fatos históricos como a chegada do homem à Lua, que as fotografias passaram a retratar mais movimento. “O pulo da clicheria para o fotolito foi um passo enorme. E agora à imagem digital. Essas foram as três fases nítidas de mudança tecnológica. A clicheria
tem o seu encanto. É uma coisa semiartesanal, sente-se um certo primitivismo. É uma imagem quase ingênua. Depois, o avanço do offset deu uma qualidade gráfica significativa e por último a evolução digital, que é realmente fantástica”, diz Paraíso. A união das novas tecnologias com uma equipe de arte afiada dá o tom dinâmico das capas mais atuais de A TARDE. “Essa turma de designers, ilustradores e infografistas de A TARDE é mui-
to boa. São pessoas plugadas com a linguagem global”, afirma Enéas Guerra. Para o designer, o projeto gráfico do jornal valoriza a legibilidade. “Hoje, as pessoas têm pouco tempo para se informar e A TARDE está atenta a esta tendência, trazendo informações de leitura rápida”, avalia Guerra. “As capas de A TARDE são sinopses. É ali que os leitores encontram o índice do que tem de melhor no dia”, destaca Paraíso.
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ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
IMPRENSA CONHEÇA A HISTÓRIA DE A TARDE, O MAIOR E MAIS ANTIGO JORNAL EM CIRCULAÇÃO NA BAHIA, ATRAVÉS DA GALERIA DE FOTOS PUBLICADA EM www.atarde.com.br
NOVAS TECNOLOGIAS
Luciano da Matta / Ag. A TARDE / 20.11.2007
Arquivo A TARDE
excepcional. A tiragem aumentou muito. Posteriormente, A TARDE teve tal desenvolvimento que sepultou os que existiam na época. Desapareceram O Imparcial, O Estado da Bahia e o Jornal da Bahia, que havia sido inaugurado no final da década de 50 com recursos modernos tanto de maquinário quanto de apresentação gráfica.
ENTREVISTA Renato Simões, superintendente de A TARDE
O JORNAL A TARDE SEMPRE TEVE UM ESPÍRITO DE PIONEIRISMO CLÁUDIO BANDEIRA
O superintendente de A TARDE, Renato Simões, lembra nesta entrevista a corajosa decisão que tomou, há quase quatro décadas, de transferir a sede do jornal da Praça Castro Alves para a então desabitada área onde hoje fica o Caminho das Árvores e a Avenida Tancredo Neves. Ele conta que A TARDE sempre teve um espírito pioneiro e inovador e ressalta que muito do sucesso obtido “devemos a uma equipe de abnegados auxiliares” que constituem em seu conjunto o que Simões Filho chamava de “família d’A TARDE”. Segundo ele, “A TARDE é um jornal identificado com a mentalidade baiana desde o tempo de meu pai”.
INVESTIMENTOS Ao longo de 97 anos, o Grupo não parou de investir na modernização de seu parque gráfico
Sede de A TARDE ocupou o descampado que no futuro seria o novo centro financeiro de Salvador
Evolução permanente marca a história tecnológica de A TARDE CLÁUDIO BANDEIRA
O ano era 1996 e A TARDE preparava-se para dar mais um grande passo em direção ao futuro: aposentar definitivamente as máquinas de escrever, após nove décadas de bons serviços. Tinha início a era da redação informatizada e, quase, silenciosa. Para tanto, o espaço fora inteiramente remodelado, com a instalação de modernos computadores Compac e móveis ergométricos, para maior conforto dos usuários. Vivo então fosse, Simões Filho exultaria em ver que, como gostava, seu jornal permanecia em contínua evolução. Fora assim em 1913, um ano depois de a fundação de A TARDE, quando substituíra a velha impressora Marinoni, alugada de uma tipografia de Salvador, por um mo-
derna Koening-Bauer , importada da Alemanha. Pela primeira vez, A TARDE circulava com seis páginas, tornando-se o jornal mais bem impresso da Bahia. O espírito empreendedor de Simões Filho transcendeu à sua morte em 1957 e manteve-se vivo em seus filhos Regina Simões e Renato Simões, que passaram a conduzir a empresa, como presidente e superintendente, respectivamente. Ambos não deixaram espraiar qualquer desânimo quanto ao futuro. A prova disso é que mantiveram os investimentos necessários para assegurar a evolução tecnológica e gráfica do jornal (ver entrevista ao lado). Adquiriram mais cinco linotipos do jornal “Diário da Bahia”, em 1959, inauguraram o sistema de radiofotos, modernizaram o telex e o projeto gráfico do jornal. Em 1972, adquiriram
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o terreno onde hoje está a sede, inaugurada em 1º de março de 1975, já com uma nova impressora rotativa “Goss”, o que veio proporcionar a mudança de seu sistema de impressão leterpress para offset.
Linha produtiva Em 1978, o Sistema de Composição VIP-Mergenthaler, de última geração, substituía as velhas máquinas de linotipos. Estava assim completa a moderna linha produtiva industrial. No final dos anos 80, têm início as obras de ampliação da sede, já pequena para abrigar os inúmeros departamentos que compõem o jornal. Um anexo de sete andares é construído ao lado do prédio já existente. Paralelamente às obras de ampliação, no início da década de 90, faz-se novos investimen-
Poucos jornais brasileiros alcançaram a marca dos 97 anos de circulação ininterrupta
O espírito empreendedor de Simões Filho manteve-se vivo nos seus descendentes
tos para a aquisição de uma moderna rotativa “Goss”, com uma configuração bastante ampliada, capaz de rodar 40 mil exemplares/hora. Já nos anos 2000, em função da crescente demanda do mercado por páginas coloridas, um novo deck foi acrescido à impressora, possibilitando ampliar o número de páginas em cor. Também a rotativa Goss mais antiga foi acrescida de novo deck, o que também multiplicou a sua capacidade produtiva. Na redação, por sua vez, é introduzido, em 2006, o revolucionário sistema editorial GoodNews (GN3). O GN3, que requereu pesados investimentos, é um avançado aplicativo editorial que permite executar as etapas de produção de uma publicação no computador, agilizando todo o processo. “A TARDE chega aos 97 anos
se renovando permanentemente, não apenas no aspecto tecnológico, mas também na sua base de leitores. O projeto A TARDE Educação, hoje, atinge mais de duas mil escolas das redes municipal e estadual e vai ao encontro do incentivo à leitura e à busca de conhecimento por parte dos jovens baianos”, afirma o diretorexecutivo de A TARDE, Renato Simões Filho. A empresa consolida-se no Grupo A TARDE, que passou a funcionar de forma integrada e convergente, hoje formado por A TARDE On Line, A TARDE FM, Agência A TARDE, Mobi A TARDE, Web TV, A TARDE Serviços Gráficos e Avance Telecom. A TARDE On Line, criada em 1996, tornou-se um sucesso e é, hoje, a de maior audiência do Estado. O Mobi A TARDE provê conteúdo para aparelhos celulares.
O serviço introduziu pioneiramente na Bahia o QR Code usado para ajudar os usuários na tarefa de adicionar dados a telefones celulares. “O mundo cibernético será o futuro dos grupos de comunicação por meios que vão da internet ao celular”, define o diretor-executivo de A TARDE, Sylvio Simões. Ele diz que essas alternativas eletrônicas e digitais reproduzem imagens, sons e a escrita instantaneamente, além de se tornarem arquivos vivos nos portais de busca e a custo operacional reduzido e da possibilidade de levar a informação a um grande número de usuários. “O Grupo A TARDE caminha nessa direção, construindo não só conteúdos a partir de sua própria atividade, como parcerias com outros grupos, inclusive na área de telefonia”, antecipa.
CONTEÚDO Linguagem A TARDE vem se utilizando de novas narrativas, como os quadrinhos e o cordel, para contar notícias Infografia O jornal foi também pioneiro na Bahia ao usar os infográficos como recurso de leitura Participação Internautas sugerem pautas e complementam com textos, vídeos e áudios a cobertura diária do jornal Convergência O processo começou há cinco anos e envolveu os meios impresso, portal e rádio
Qual o motivo da transferência do jornal da Praça Castro Alves para o local que viria a ser o novo centro de Salvador, na Av. Tancredo Neves? Com o aparecimento de jornais com o sistema offset, e não querendo ficar à margem, já que A TARDE sempre teve um espírito pioneiro, viajei para os EUA a fim de substituir o equipamento do jornal, uma máquina Mann,de fabricação alemã, ultrapassada, tanto na largura das bobinas, que criava problemas para o fornecimento de papel, como também pela lentidão com que operava. Fui para Chicago e procurei os representantes do equipamento Goss, o mais moderno da época. Quando voltei para Salvador, constatamos com nossos companheiros da época, principalmente o velho Artur Couto (gerente administrativo e financeiro de A TARDE), que acompanhou a empresa durante muitos anos e fiel amigo, que o equipamento encomendado não daria na área da antiga máquina – nem se fosse alterada a estrutura do prédio, no primeiro andar (da antiga sede na Castro Alves). Resolvi, então, transferir-me para um outro local. Foram-me oferecidas duas áreas noCaminho daÁrvores, tendo eu optado pela área triangular que é onde estamos atualmente. Nada existia, então, no entorno... Era praticamente uma ação arriscada porque nada havia na área, inclusive a comunicação rodoviária era precária na época. Construímos o prédio em um ano e pouco, com projeto do arquiteto Epaminon-
Renato Simões: iniciativa pioneira e inovadora
“A TARDE é um jornal identificado com a mentalidade baiana e sempre esteve a favor das causas populares”
“Foram-me oferecidas duas áreas, tendo optado pelo local onde estamos atualmente”
“Acredito que a vinda da empresa para cá deslocou grande parcela da cidade e incentivou empreendimentos”
das Berbert, do escritório Valente. Muita gente viu com temor a decisão. Rodamos o primeiro número no dia 1º de março de 1975. Nesse período, há um detalhe também curioso: o projeto de Berbert incluía a construção de dois blocos, como o é atualmente, mas fiquei com receio do investimento devido ao compromisso financeiro que isso representaria. A máquina foi comprada, financiada, e as prestações venciam de seis em seis meses em dólar corrigido em uma época em que a moeda brasileira estava debilitada. Portanto, um compromisso pesado, pois os juros estrangeiros eram elevados. Nesse período, o jornal experimenta um crescimento? O jornal teve um crescimento
O que fez o sucesso de A TARDE, como o jornal mais lido no Estado da Bahia? A TARDE é um jornal muito identificado com a mentalidade baiana, desde o tempo de meu pai [Simões Filho], época da qual não participei, como posteriormente, já com a nossa participação, A TARDE sempre esteve a favor de causas que visem de perto à solicitação popular. A campanha do petróleo e a luta contra o desmembramento do Estado para a criação de um outro ao sul, entre outras campanhas. A mudança de A TARDE foi responsável pela alteração do vetor de crescimento de Salvador? Não posso afirmar com certeza, mas acredito que a vinda da empresa para cá deslocou uma grande parcela da cidade, incentivando novos empreendimentos, a começar pelo Shopping Iguatemi, a Estação Rodoviária e, talvez, tenha dado consequência às novas instalações do governo estadual no Centro Administrativo. Que fatos o Sr. se recorda desses tempos pioneiros? É curioso observar que, a despeito do isolamento representado pela distância do centro urbano, só tivemos, ao que me lembre, um funcionário que, desgostoso com a mudança, demitiu-se da empresa. A transferência motivou um rápido desenvolvimento da região. Que outras modernizações foram feitas na nova sede? Posteriormente, com o inesperado sucessorepresentado pela nova máquina (rotativa), construiu-se o complemento (o prédio anexo) que havia sido adiado e, imediatamente, adquiriu-se novo conjunto gráfico de porte muito superior ao anterior. O surgimento de novas tecnologias terá que impacto no futuro de A TARDE? As inovações técnicas são uma consequência lógica do comportamento daempresa, que sempre procurou estar a par da modernidade. Não deixando espaço para outras empresas competirem com fórmulas mais modernizantes. Por último, ressalve-se, é um ramo muito espinhoso para administrar com duas partes praticamente estanques, a industrial e a intelectual, pelo que poucas empresas sobrevivem durante tanto tempo, principalmente sob orientação de um mesmo grupo familiar. São 97 anos de vida numa mesma família.
Fotos Arquivo A TARDE
Iracema Chequer / Ag. A TARDE
SALTO DE QUALIDADE COM A NOVA ROTATIVA
SEMPRE NA DIANTEIRA DAS NOVAS TECNOLOGIAS
TELEX ANTECEDEU A ERA DO E-MAIL
LINOTIPO REVOLUCIONOU TÉCNICA DA COMPOSIÇÃO
RADIOFOTO AMPLIOU USO DA IMAGEM NAS EDIÇÕES
INVESTIMENTOS MODERNIZAM O JORNAL
TELECÓPIA INOVOU A REMESSA DE TEXTOS
A TARDE ON LINE: MAIS UM PASSO INOVADOR
O investimento feito por A TARDE na compra de uma impressora offset, em 1974, permitiu ao jornal um salto de qualidade e ampliar sua tiragem. O offset é baseado na repulsão tinta-água
Operário trabalha na oficina gráfica de A TARDE (1962). Apaixonado por inovações, a cada viagem, Simões Filho trazia volumes com novos equipamentos para renovar o parque gráfico
Antes das comunicações digitais e do e-mail, o teletipo ou telex, equipamento eletromecânico de transmissão de dados, foi amplamente utilizado para enviar e receber mensagens
Sala de linotipo na sede da Castro Alves. A máquina – então uma revolução – fundia o chumbo para formar linhas de caracteres tipográficos. Tinha um teclado como o da máquina de escrever
A radiofoto era produzida por um equipamento de transmissão de fotos, lento, mas importante para consolidar a imagem no contexto da produção jornalística
Regina Simões, o secretário Cruz Rios (D) e o editor-chefe Jorge Calmon (E) observam a impressão da edição de 15/10/1974, quando A TARDE comemorava 62 anos: investimentos modernizantes
A TARDE inaugurou pioneiramente o sistema de telecópia (envio de documentos, depois rebatizado de fax), em 1975, ligando a sede e a sucursal de Feira de Santana
Embrião do A TARDE On Line, em 1998. A iniciativa do grupo A TARDE marca mais um passo inovador no sentido de incorporar novas tecnologias. Hoje, o portal é o de maior audiência na Bahia
Cenário muda ao longo de 35 anos
O vazio demográfico que caracterizava o local para onde A TARDE transferiu sua sede em 1974, atual Avenida Tancredo Neves, deu lugar a uma sucessão de modernos prédios comerciais
Jornal, jornalistas, textos e leitores: reinvenção constante EDSON FERNANDO DALMONTE Jornalista, doutor em comunicação e professor
Na evolução da indústria cultural, temos visto surgir muitos questionamentos quanto ao posicionamento tradicional dos produtos midiáticos. A partir da proliferação das redes interativas, como a Internet, vários alardes anunciaram a morte do jornal impresso, sobretudo porque os anúncios publicitários estariam migrando para a rede. Os visionários cinzentas também apresentaram maus presságios quanto a uma diminuição drástica do número de leitores. Porém, na contramão disso tudo, temos visto a expansão do mercado editorial. Ao invés do enfraquecimento do hábito de ler, prefiro pensar que novas modalidades de leitura estão surgindo. Da mesma forma, novas formas textuais estão em desenvolvimento. O impacto da rede mundial de computadores não está no fim da tradição impressa, mas no desenvolvimento de novas textualidades e novas modalidades de leitura. Ao leitor sempre foi facultada a possibilidade de ler de forma linear ou de forma “salteada”, pulando de um texto a outro, conforme seu interesse. Na web, ao invés de textos longos, a narrativa é apresentada em blocos menores; links conduzem a outras partes da história, que podem ser complementadas por fotos, vídeos etc. O jornalismo está se adaptando com perfeição ao ambiente web. Aliás, o jornalismo parece que foi criado para ser praticado em ambientes digitais. E quanto ao jornal impresso, ele tem futuro ou já é coisa do passado? Da mesma forma que os outros textos, o jornal impresso também está se adaptando à nova realidade; basta olhar para a influência que o webjornalismo tem exercido sobre o jornal diário. Nos séculos XVII e XVIII, o jornal e o livro mantinham uma mesma estrutura. É só quando o jornal adquire um formato maior e uma ampla circulação que o seu suporte material terá um tratamento mais livre, passando a ser carregado, dobrado e consumido por muitos. Se a internet é um mix de linguagens e formas de organização textual, ela também passa a influir na organização discursiva de outros suportes, como é o caso do jornal impresso, que adota tanto uma linguagem mais objetiva, com blocos de texto menores, como passa a trabalhar em multiplas plataformas. A proposta de se pensar as possibilidades de organização textual encontra-se ampliada, pois os vários canais que viabilizam a circulação de mensagens encontram-se disponíveis ao leitor num único suporte. A TARDE é um exemplo de tentativa de renovação. Ao completar 97 anos, o jornal se desdobra em várias frentes, do site ao mobi, que interage com leitores por meio de aparatos móveis, como celulares. No site, o leitor do impresso pode encontrar informações atualizadas na editoria “Últimas”; o leitor-navegador do site, pode, a partir de uma breve notícia de “Últimas”, ir ao impresso do dia seguinte para ver o desenvolvimento do conteúdo apresentado no plantão. A palavra de ordem é convergência, que se processa entre linguagens, formatos e distintas plataformas. Não dá pra dizer que uma modalidade textual seja melhor que a outra. O desafio fica a cargo do jornalismo e dos jornalistas, que devem continuar atentos às mudanças e repensar continuamente o seu fazer. Seguramente, o modo de fazer jornalismo não está concluído. Provavelmente ele estará sempre em construção.
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ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
IMPRENSA CONHEÇA A HISTÓRIA DE A TARDE, O MAIOR E MAIS ANTIGO JORNAL EM CIRCULAÇÃO NA BAHIA, ATRAVÉS DA GALERIA DE FOTOS PUBLICADA EM www.atarde.com.br
NOVAS TECNOLOGIAS
Luciano da Matta / Ag. A TARDE / 20.11.2007
Arquivo A TARDE
excepcional. A tiragem aumentou muito. Posteriormente, A TARDE teve tal desenvolvimento que sepultou os que existiam na época. Desapareceram O Imparcial, O Estado da Bahia e o Jornal da Bahia, que havia sido inaugurado no final da década de 50 com recursos modernos tanto de maquinário quanto de apresentação gráfica.
ENTREVISTA Renato Simões, superintendente de A TARDE
O JORNAL A TARDE SEMPRE TEVE UM ESPÍRITO DE PIONEIRISMO CLÁUDIO BANDEIRA
O superintendente de A TARDE, Renato Simões, lembra nesta entrevista a corajosa decisão que tomou, há quase quatro décadas, de transferir a sede do jornal da Praça Castro Alves para a então desabitada área onde hoje fica o Caminho das Árvores e a Avenida Tancredo Neves. Ele conta que A TARDE sempre teve um espírito pioneiro e inovador e ressalta que muito do sucesso obtido “devemos a uma equipe de abnegados auxiliares” que constituem em seu conjunto o que Simões Filho chamava de “família d’A TARDE”. Segundo ele, “A TARDE é um jornal identificado com a mentalidade baiana desde o tempo de meu pai”.
INVESTIMENTOS Ao longo de 97 anos, o Grupo não parou de investir na modernização de seu parque gráfico
Sede de A TARDE ocupou o descampado que no futuro seria o novo centro financeiro de Salvador
Evolução permanente marca a história tecnológica de A TARDE CLÁUDIO BANDEIRA
O ano era 1996 e A TARDE preparava-se para dar mais um grande passo em direção ao futuro: aposentar definitivamente as máquinas de escrever, após nove décadas de bons serviços. Tinha início a era da redação informatizada e, quase, silenciosa. Para tanto, o espaço fora inteiramente remodelado, com a instalação de modernos computadores Compac e móveis ergométricos, para maior conforto dos usuários. Vivo então fosse, Simões Filho exultaria em ver que, como gostava, seu jornal permanecia em contínua evolução. Fora assim em 1913, um ano depois de a fundação de A TARDE, quando substituíra a velha impressora Marinoni, alugada de uma tipografia de Salvador, por um mo-
derna Koening-Bauer , importada da Alemanha. Pela primeira vez, A TARDE circulava com seis páginas, tornando-se o jornal mais bem impresso da Bahia. O espírito empreendedor de Simões Filho transcendeu à sua morte em 1957 e manteve-se vivo em seus filhos Regina Simões e Renato Simões, que passaram a conduzir a empresa, como presidente e superintendente, respectivamente. Ambos não deixaram espraiar qualquer desânimo quanto ao futuro. A prova disso é que mantiveram os investimentos necessários para assegurar a evolução tecnológica e gráfica do jornal (ver entrevista ao lado). Adquiriram mais cinco linotipos do jornal “Diário da Bahia”, em 1959, inauguraram o sistema de radiofotos, modernizaram o telex e o projeto gráfico do jornal. Em 1972, adquiriram
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o terreno onde hoje está a sede, inaugurada em 1º de março de 1975, já com uma nova impressora rotativa “Goss”, o que veio proporcionar a mudança de seu sistema de impressão leterpress para offset.
Linha produtiva Em 1978, o Sistema de Composição VIP-Mergenthaler, de última geração, substituía as velhas máquinas de linotipos. Estava assim completa a moderna linha produtiva industrial. No final dos anos 80, têm início as obras de ampliação da sede, já pequena para abrigar os inúmeros departamentos que compõem o jornal. Um anexo de sete andares é construído ao lado do prédio já existente. Paralelamente às obras de ampliação, no início da década de 90, faz-se novos investimen-
Poucos jornais brasileiros alcançaram a marca dos 97 anos de circulação ininterrupta
O espírito empreendedor de Simões Filho manteve-se vivo nos seus descendentes
tos para a aquisição de uma moderna rotativa “Goss”, com uma configuração bastante ampliada, capaz de rodar 40 mil exemplares/hora. Já nos anos 2000, em função da crescente demanda do mercado por páginas coloridas, um novo deck foi acrescido à impressora, possibilitando ampliar o número de páginas em cor. Também a rotativa Goss mais antiga foi acrescida de novo deck, o que também multiplicou a sua capacidade produtiva. Na redação, por sua vez, é introduzido, em 2006, o revolucionário sistema editorial GoodNews (GN3). O GN3, que requereu pesados investimentos, é um avançado aplicativo editorial que permite executar as etapas de produção de uma publicação no computador, agilizando todo o processo. “A TARDE chega aos 97 anos
se renovando permanentemente, não apenas no aspecto tecnológico, mas também na sua base de leitores. O projeto A TARDE Educação, hoje, atinge mais de duas mil escolas das redes municipal e estadual e vai ao encontro do incentivo à leitura e à busca de conhecimento por parte dos jovens baianos”, afirma o diretorexecutivo de A TARDE, Renato Simões Filho. A empresa consolida-se no Grupo A TARDE, que passou a funcionar de forma integrada e convergente, hoje formado por A TARDE On Line, A TARDE FM, Agência A TARDE, Mobi A TARDE, Web TV, A TARDE Serviços Gráficos e Avance Telecom. A TARDE On Line, criada em 1996, tornou-se um sucesso e é, hoje, a de maior audiência do Estado. O Mobi A TARDE provê conteúdo para aparelhos celulares.
O serviço introduziu pioneiramente na Bahia o QR Code usado para ajudar os usuários na tarefa de adicionar dados a telefones celulares. “O mundo cibernético será o futuro dos grupos de comunicação por meios que vão da internet ao celular”, define o diretor-executivo de A TARDE, Sylvio Simões. Ele diz que essas alternativas eletrônicas e digitais reproduzem imagens, sons e a escrita instantaneamente, além de se tornarem arquivos vivos nos portais de busca e a custo operacional reduzido e da possibilidade de levar a informação a um grande número de usuários. “O Grupo A TARDE caminha nessa direção, construindo não só conteúdos a partir de sua própria atividade, como parcerias com outros grupos, inclusive na área de telefonia”, antecipa.
CONTEÚDO Linguagem A TARDE vem se utilizando de novas narrativas, como os quadrinhos e o cordel, para contar notícias Infografia O jornal foi também pioneiro na Bahia ao usar os infográficos como recurso de leitura Participação Internautas sugerem pautas e complementam com textos, vídeos e áudios a cobertura diária do jornal Convergência O processo começou há cinco anos e envolveu os meios impresso, portal e rádio
Qual o motivo da transferência do jornal da Praça Castro Alves para o local que viria a ser o novo centro de Salvador, na Av. Tancredo Neves? Com o aparecimento de jornais com o sistema offset, e não querendo ficar à margem, já que A TARDE sempre teve um espírito pioneiro, viajei para os EUA a fim de substituir o equipamento do jornal, uma máquina Mann,de fabricação alemã, ultrapassada, tanto na largura das bobinas, que criava problemas para o fornecimento de papel, como também pela lentidão com que operava. Fui para Chicago e procurei os representantes do equipamento Goss, o mais moderno da época. Quando voltei para Salvador, constatamos com nossos companheiros da época, principalmente o velho Artur Couto (gerente administrativo e financeiro de A TARDE), que acompanhou a empresa durante muitos anos e fiel amigo, que o equipamento encomendado não daria na área da antiga máquina – nem se fosse alterada a estrutura do prédio, no primeiro andar (da antiga sede na Castro Alves). Resolvi, então, transferir-me para um outro local. Foram-me oferecidas duas áreas noCaminho daÁrvores, tendo eu optado pela área triangular que é onde estamos atualmente. Nada existia, então, no entorno... Era praticamente uma ação arriscada porque nada havia na área, inclusive a comunicação rodoviária era precária na época. Construímos o prédio em um ano e pouco, com projeto do arquiteto Epaminon-
Renato Simões: iniciativa pioneira e inovadora
“A TARDE é um jornal identificado com a mentalidade baiana e sempre esteve a favor das causas populares”
“Foram-me oferecidas duas áreas, tendo optado pelo local onde estamos atualmente”
“Acredito que a vinda da empresa para cá deslocou grande parcela da cidade e incentivou empreendimentos”
das Berbert, do escritório Valente. Muita gente viu com temor a decisão. Rodamos o primeiro número no dia 1º de março de 1975. Nesse período, há um detalhe também curioso: o projeto de Berbert incluía a construção de dois blocos, como o é atualmente, mas fiquei com receio do investimento devido ao compromisso financeiro que isso representaria. A máquina foi comprada, financiada, e as prestações venciam de seis em seis meses em dólar corrigido em uma época em que a moeda brasileira estava debilitada. Portanto, um compromisso pesado, pois os juros estrangeiros eram elevados. Nesse período, o jornal experimenta um crescimento? O jornal teve um crescimento
O que fez o sucesso de A TARDE, como o jornal mais lido no Estado da Bahia? A TARDE é um jornal muito identificado com a mentalidade baiana, desde o tempo de meu pai [Simões Filho], época da qual não participei, como posteriormente, já com a nossa participação, A TARDE sempre esteve a favor de causas que visem de perto à solicitação popular. A campanha do petróleo e a luta contra o desmembramento do Estado para a criação de um outro ao sul, entre outras campanhas. A mudança de A TARDE foi responsável pela alteração do vetor de crescimento de Salvador? Não posso afirmar com certeza, mas acredito que a vinda da empresa para cá deslocou uma grande parcela da cidade, incentivando novos empreendimentos, a começar pelo Shopping Iguatemi, a Estação Rodoviária e, talvez, tenha dado consequência às novas instalações do governo estadual no Centro Administrativo. Que fatos o Sr. se recorda desses tempos pioneiros? É curioso observar que, a despeito do isolamento representado pela distância do centro urbano, só tivemos, ao que me lembre, um funcionário que, desgostoso com a mudança, demitiu-se da empresa. A transferência motivou um rápido desenvolvimento da região. Que outras modernizações foram feitas na nova sede? Posteriormente, com o inesperado sucessorepresentado pela nova máquina (rotativa), construiu-se o complemento (o prédio anexo) que havia sido adiado e, imediatamente, adquiriu-se novo conjunto gráfico de porte muito superior ao anterior. O surgimento de novas tecnologias terá que impacto no futuro de A TARDE? As inovações técnicas são uma consequência lógica do comportamento daempresa, que sempre procurou estar a par da modernidade. Não deixando espaço para outras empresas competirem com fórmulas mais modernizantes. Por último, ressalve-se, é um ramo muito espinhoso para administrar com duas partes praticamente estanques, a industrial e a intelectual, pelo que poucas empresas sobrevivem durante tanto tempo, principalmente sob orientação de um mesmo grupo familiar. São 97 anos de vida numa mesma família.
Fotos Arquivo A TARDE
Iracema Chequer / Ag. A TARDE
SALTO DE QUALIDADE COM A NOVA ROTATIVA
SEMPRE NA DIANTEIRA DAS NOVAS TECNOLOGIAS
TELEX ANTECEDEU A ERA DO E-MAIL
LINOTIPO REVOLUCIONOU TÉCNICA DA COMPOSIÇÃO
RADIOFOTO AMPLIOU USO DA IMAGEM NAS EDIÇÕES
INVESTIMENTOS MODERNIZAM O JORNAL
TELECÓPIA INOVOU A REMESSA DE TEXTOS
A TARDE ON LINE: MAIS UM PASSO INOVADOR
O investimento feito por A TARDE na compra de uma impressora offset, em 1974, permitiu ao jornal um salto de qualidade e ampliar sua tiragem. O offset é baseado na repulsão tinta-água
Operário trabalha na oficina gráfica de A TARDE (1962). Apaixonado por inovações, a cada viagem, Simões Filho trazia volumes com novos equipamentos para renovar o parque gráfico
Antes das comunicações digitais e do e-mail, o teletipo ou telex, equipamento eletromecânico de transmissão de dados, foi amplamente utilizado para enviar e receber mensagens
Sala de linotipo na sede da Castro Alves. A máquina – então uma revolução – fundia o chumbo para formar linhas de caracteres tipográficos. Tinha um teclado como o da máquina de escrever
A radiofoto era produzida por um equipamento de transmissão de fotos, lento, mas importante para consolidar a imagem no contexto da produção jornalística
Regina Simões, o secretário Cruz Rios (D) e o editor-chefe Jorge Calmon (E) observam a impressão da edição de 15/10/1974, quando A TARDE comemorava 62 anos: investimentos modernizantes
A TARDE inaugurou pioneiramente o sistema de telecópia (envio de documentos, depois rebatizado de fax), em 1975, ligando a sede e a sucursal de Feira de Santana
Embrião do A TARDE On Line, em 1998. A iniciativa do grupo A TARDE marca mais um passo inovador no sentido de incorporar novas tecnologias. Hoje, o portal é o de maior audiência na Bahia
Cenário muda ao longo de 35 anos
O vazio demográfico que caracterizava o local para onde A TARDE transferiu sua sede em 1974, atual Avenida Tancredo Neves, deu lugar a uma sucessão de modernos prédios comerciais
Jornal, jornalistas, textos e leitores: reinvenção constante EDSON FERNANDO DALMONTE Jornalista, doutor em comunicação e professor
Na evolução da indústria cultural, temos visto surgir muitos questionamentos quanto ao posicionamento tradicional dos produtos midiáticos. A partir da proliferação das redes interativas, como a Internet, vários alardes anunciaram a morte do jornal impresso, sobretudo porque os anúncios publicitários estariam migrando para a rede. Os visionários cinzentas também apresentaram maus presságios quanto a uma diminuição drástica do número de leitores. Porém, na contramão disso tudo, temos visto a expansão do mercado editorial. Ao invés do enfraquecimento do hábito de ler, prefiro pensar que novas modalidades de leitura estão surgindo. Da mesma forma, novas formas textuais estão em desenvolvimento. O impacto da rede mundial de computadores não está no fim da tradição impressa, mas no desenvolvimento de novas textualidades e novas modalidades de leitura. Ao leitor sempre foi facultada a possibilidade de ler de forma linear ou de forma “salteada”, pulando de um texto a outro, conforme seu interesse. Na web, ao invés de textos longos, a narrativa é apresentada em blocos menores; links conduzem a outras partes da história, que podem ser complementadas por fotos, vídeos etc. O jornalismo está se adaptando com perfeição ao ambiente web. Aliás, o jornalismo parece que foi criado para ser praticado em ambientes digitais. E quanto ao jornal impresso, ele tem futuro ou já é coisa do passado? Da mesma forma que os outros textos, o jornal impresso também está se adaptando à nova realidade; basta olhar para a influência que o webjornalismo tem exercido sobre o jornal diário. Nos séculos XVII e XVIII, o jornal e o livro mantinham uma mesma estrutura. É só quando o jornal adquire um formato maior e uma ampla circulação que o seu suporte material terá um tratamento mais livre, passando a ser carregado, dobrado e consumido por muitos. Se a internet é um mix de linguagens e formas de organização textual, ela também passa a influir na organização discursiva de outros suportes, como é o caso do jornal impresso, que adota tanto uma linguagem mais objetiva, com blocos de texto menores, como passa a trabalhar em multiplas plataformas. A proposta de se pensar as possibilidades de organização textual encontra-se ampliada, pois os vários canais que viabilizam a circulação de mensagens encontram-se disponíveis ao leitor num único suporte. A TARDE é um exemplo de tentativa de renovação. Ao completar 97 anos, o jornal se desdobra em várias frentes, do site ao mobi, que interage com leitores por meio de aparatos móveis, como celulares. No site, o leitor do impresso pode encontrar informações atualizadas na editoria “Últimas”; o leitor-navegador do site, pode, a partir de uma breve notícia de “Últimas”, ir ao impresso do dia seguinte para ver o desenvolvimento do conteúdo apresentado no plantão. A palavra de ordem é convergência, que se processa entre linguagens, formatos e distintas plataformas. Não dá pra dizer que uma modalidade textual seja melhor que a outra. O desafio fica a cargo do jornalismo e dos jornalistas, que devem continuar atentos às mudanças e repensar continuamente o seu fazer. Seguramente, o modo de fazer jornalismo não está concluído. Provavelmente ele estará sempre em construção.
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ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
CIÊNCIA Da chegada do rádio a pesquisas para desenvolver a televisão e a penicilina, nada ficou de fora das páginas do jornal
A TARDE noticiou as inovações tecnológicas e científicas que modificaram a vida no século 20
Arte sobre fotos / Editoria de Arte A TARDE
BEATRIZ GARCIA
Numa época em que o único meio de comunicação de massa noticioso era o jornal impresso, foi através de suas páginas que as descobertas e inventos marcantes chegavam ao conhecimento do público. Não seria exagero afirmar, portanto, que A TARDE alterou a forma como os baianos viram as transformações tecnológicas do século 20. Mergulhar nas páginas antigas do jornal é como vivenciar as incertezas e polêmicas que rondavam cada descoberta, cada acontecimento. Em 1922, por exemplo, o jornal já discutia o mistério da vida em Marte, sob o título “São passados 20 dias depois do dia em que o famoso Marte se aproximou o máximo possível da Terra, e a Terra não recebeu comunicação alguma”, levantando especulações sobre um tema que incita dúvidas até hoje. Na edição de 1º de fevereiro de 1926, o jornal cita pela primeira vez as experiências em torno da televisão, descrita como “transmissão da imagem movimentada a distância”. A primeira transmissão de alguns contornos de imagens em movimento só viria a ocorrer seis meses depois. O engenheiro responsável, John Logie Baird, assinou em seguida um contrato com a BBC para transmissões experimentais. Chamada de rádio-televisão pelo jornal, a relação entre os dois veículos de comunicação era constante nas matérias que se seguiram. Em 1936, sob o título “A televisão e o rádio”, uma matéria descrevia a expectativa pela chegada da televisão aos lares americanos: “Os ouvintes de rádio aguardam impacientemente o advento da televisão, a fim de ficarem sabendo que cara têm seus cantores prediletos”. Em 1947, na ocasião de uma das primeiras exibições de um programa televisionado em Salvador, no Clube Bahiano de Tênis, o jornal descreveu o evento como um “espetáculo”. A televisão, contudo, só chegaria aos lares brasileiros mais abastados em 18 de setembro de 1950, com a criação da TV Tupi por Assis Chateaubriand, descrita pelo jornal como “uma nova etapa do progresso do rádio brasileiro”.
Uma das maiores descobertas da história da medicina, a penicilina, não gerou alarde quando anunciada em 1929. O primeiro antibiótico a ser utilizado com sucesso, descoberto pelo escocês Alexander Fleming, só foi citado 11 anos depois pelo jornal New York Times, numa nota sobre ciências. O antibiótico só ganhou notoriedade em
“A bomba-atómica revoluciona a ciência da guerra: [...] destruição” A TARDE, 7/8/1945, Sobre a explosão da bomba H no Japão
“A TV Tupi é uma nova etapa do progresso do rádio brasileiro” A TARDE - 18/09/1950 Sobre a chegada da televisão ao Brasil
1943 por ter sido anunciado como a droga que salvou a vida de Winston Churchill, primeiro-ministro inglês durante a Segunda Guerra Mundial.
Bomba H O antibiótico foi trazido do Rio de Janeiro especialmente para ser aplicado na cantora de rádio Conceição Andrade, que estava internada no Hospital Português com septicemia. Depois deste fato, a penicilina não parou de ocupar as páginas do jornal. Em 22 de março do mesmo ano, A TARDE conta, na linguagem literária tão cara às notícias da época, a descoberta da substância: “Detinha-se aquele sábio no exame de uma lâmina de cultura […] quando com sua visão acurada observou que um bôlor aparecera à superfície da mesma e se espalhara ao redor de sí uma mancha amarelada onde as bactérias não se desenvolviam”. Alguns anos antes, em 7 de agosto de 1945, o baiano contemplava perplexo as páginas de A TARDE. Nos últimos dias da Segunda Guerra, o jornal publicava a investida americana da bomba H sobre a cidade japonesa de Hiroshima. Sob o título “A bomba-atómica revoluciona a ciência da guerra: poder incrível de destruição”.
Muitos anos depois, numa página interna da edição de 26 de julho de 1978, A TARDE noticiou: “Primeiro bebê de proveta (do sexo feminino) nasce em boas condições”. Apesar da curiosa ênfase ao sexo do bebê, o nome da criança não é sequer citado. Em 26 de julho de 1997, A TARDE noticia a clonagem da ovelha Dolly. A divulgação do nascimento do primeiro animal clonado do mundo foi manchete estampada na capa: “Fabricação de ovelha preocupa o mundo”. O termo clonagem era explicado aos leitores como “reprodução em série” e marcava a última grande inovação do século 20.
Guerra fria Para quem esperava o fim dos conflitos mundiais, o encerramento da Segunda Guerra foi apenas início de um conflito invisível entre as duas maiores potências mundiais da época. Estados Unidos e União Soviética davam início à corrida espacial, em busca da superioridade do sistema econômico adotado por cada país. Em 9 de outubro de 1957, “movimentam-se os que dispõem de recursos na compra de binóculos para observar melhor o engenho soviético, que está prendendo todas as atenções do mundo científico”, publicava o
jornal, referindo-se ao Sputinik, primeiro satélite artificial do mundo, lançado cinco dias antes pela União Soviética. A TARDE acompanhou também o lançamento do Sputinik II, que levou a bordo a cadelinha Laika. A opinião pública mundial mobilizou-se contra o sofrimento que a cadela estaria vivenciando em nome da ciência, e a repercussão no jornal não poderia ser diferente. Contrariando os boatos de que o animal havia morrido durante o voo, o jornal tranquilizou o leitor que já havia desenvolvido simpatia pela cadela, informando que “técnicos de uma estação de rádio americana acreditamter captadoasbatidas docoração de Laika, com frequência de 115 batimentos por minuto”. Apenas em 11 de novembro, o jornal admitiu que todos os indícios apontavam para o falecimento de Laika. Descrito por A TARDE em 16 de julho de 1969 como o “mais sensacional acontecimento da Humanidade”, a histórica viagem da nave Apollo 11 leva o homem à Lua pela primeira vez. A TARDE acompanhou os oito dias que os astronautas Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin Aldrin passaram no espaço numa narrativa que marcou o imaginário de milhares de baianos.
Projeto de digitalização preserva memória impressa Reprodução / Fernando Amorim / Ag. A TARDE
A primeira estação de rádio “telephonica” chega à Bahia
Em 2009, o Grupo deu um novo passo na preservação da memória impressa do jornal A TARDE, que registrou importantes fatos históricos em 97 anos de circulação ininterrupta. Todo o acervo de edições do jornal está sendo digitalizado, desde o primeiro número, lançado em 15 de outubro de 1912, até 1999. A partir de 2000, as edições são geradas pelo sistema editorial GN3 e as cópias digitais salvas em páginas PDF. Serão digitalizados 467 rolos de 35 milímetros que guardam a história de A TARDE no século 20. Cada um desses rolos guarda cerca de 3 mil documentos. “Graças a uma parceria vitoriosa com a Fundação Pedro Cal-
mon e a Humanidades Editora e Projetos , que contou ainda com importantes patrocinadores, A TARDE encerrará este ano com seu acervo de 1912 a 1999 digitalizado e disponível ao público nos terminais instalados na Biblioteca Pública e Arquivo Público”, diz o diretor executivo, Ranulfo Bocayuva. Segundo ele, “como as edições posteriores a esta data já estavam em versão digital, A TARDE entra na categoria dos grandes grupos de comunicação que digitalizaram suas edições, permitindo assim a preservação histórica do seu conteúdo. Este projeto permitirá melhor conhecimento da história da Bahia e dos baianos”.
Nos locais de acesso, os usuários poderão pesquisar todo o material produzido ao longo de 88 anos e imprimir as páginas de seu interesse. “Este trabalho envolve a digitalização dos microfilmes, a indexação de seu conteúdo e o processamento das imagens com o motor de reconhecimento OCR (Optical Character Recognition), o que permitirá, além da pesquisa por datas, a busca por assuntos e nomes”, explica o coordenador geral do projeto, Maurício Villela. “Até o momento, já digitalizamos 44 anos e estamos finalizando o terceiro lote, correspondente a mais 22 anos de edições”, acrescenta Villela.
SAIU EM A TARDE 1922 Durante as comemorações do centenário da Independência, o Rio de Janeiro ouviu a primeira transmissão via rádio do País 1927 Estreia O Cantor de Jazz, primeiro filme falado da história do cinema 1927 A teoria de que o Universo se originou a partir de uma grande explosão, o Big Bang, é formulada pelo belga Georges Lemaître 1928 Alexander Fleming descobre a função antibiótica da penicilina 1946 É construído nos Estados Unidos o Eniac, considerado o primeiro computador da história 1953 O americano James Watson e o inglês Francis Crick descobrem a estrutura do DNA 1957 A União Soviética dá início à Corrida Espacial lançando o Sputinik I 1956 A empresa sueca Ericsson desenvolve primeiro aparelho celular, pesando 40 quilos 1967 Acontece o primeiro transplante de coração da história da medicina, na África do Sul 1969 O homem conquista a Lua e deixa uma pegada americana no satélite da Terra 1969 Militares americanos criam um sistema de comunicação por computador, a Arpanet, embrião da internet atual 1978 Nasce Louise Brown, a primeira bebê de proveta 1996 O embriologista escocês Ian Wilmut, através da célula de uma ovelha, constrói um animal idêntico ao original
ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
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FOCO O mundo das plasticidades merece a atenção de A TARDE desde 1913, quando surgiram as primeiras colunas sobre o tema
Jornal com os olhos nas artes e os pés no futuro CÁSSIA CANDRA
Depois de adquirir uma Koenig-Bauer, rotativa moderna que permitia maiores recursos de impressão e utilização de imagens, A TARDE inaugurou uma página dedicada às notícias de artes. A primeira saiu em 23 de agosto de 1913, reunindo notas de literatura, “modas” e “sports”, muitas delas relatando acontecimentos no exterior, como as últimas tendências em tecidos, modelos e chapéus de Paris, na coluna Elegancias, e os resultados do quinto grand-prix do Automóvel Clube de França, mostrando que, na época, os franceses eram “os reis do volante”. Neste espaço era comum a publicação de uma miscelânea de assuntos e diversos conteúdos jornalísticos, como uma coluna social em formato de foto-legenda para registrar a passagem da família imperial pelo Brasil e o
sucesso do maxixe em Paris, além de colunas de reflexão filosófica, e de poemas e “anedoctas”. A primeira notícia específica de artes plásticas foi publicada em 6 de setembro, com o título “um pintor bahiano”. A nota se referia à aquisição da obra Cabeça de Velha, de Presciliano Silva, pelo “capitalista”, José de Sá. O “laureado pintor patrício” a quem A TARDE se referia, era um dos grandes mestres da escola paisagista da Bahia, de volta a Salvador depois de participar do Salão Oficial dos Artistas Franceses com a obra Retrato de Madame le Clinche.
Interesse pela cultura A iniciativa, que marcou os primórdios da relação entre A TARDE e as artes, vem amadurecendo nos últimos 90 anos. “Embora conservador, o jornal sempre demonstrou seu interesse pela cultura”, sublinha Florisvaldo Mattos, editor-chefe de A TARDE
e um dos criadores do suplemento Cultural, que circulou nos últimos 20 anos, tornando-se referência no jornalismo baiano. Ele lembra iniciativas memoráveis como o fato de ter noticiado, em maio de 1932, a exposição de José Tertuliano Guimarães, artista que inaugurou a arte moderna na Bahia. A mostra do ex-aluno do mestre Presciliano Silva foi montada no lendário Edifício A Tarde, na Praça Castro Alves e mereceu especial atenção do jornal. Foi noticiada pela primeira vez na edição do dia 14 de maio de 1932, quando saiu com uma foto no formato 3x4, informando sobre o vernissage naquela noite. Datam do período as primeiras colunas de arte assinadas. Eugênio Gomes, um estudioso de artes, era colunista e costumava escrever sobre artistas e temas específicos; e Carlos Chiacchio, que no mesmo ano de 1932 assinava a coluna Homens
A TARDE noticiou, em maio de 1932, a exposição de José Tertuliano Guimarães, artista que inaugurou a arte moderna na Bahia
O jornal A TARDE atravessou o século 20 contemplando as artes plásticas da maneira mais abrangente possível
& Obras, também costumava refletir sobre obras poéticas e noticiar eventos do mundo da arte. A exposição de José Guimarães foi abordada por ambos. O artista plástico Sante Scaldaferri, observa que desde colunistas como Chiacchio e Eugênio Gomes até recentemente com os artigos de Almandrade, para o já extinto Caderno Cultural, e a atual colunista Yolanda Simões Atherino, que escreve a coluna Plasticidades, publicada às quartas-feiras no Caderno 2 +, “A TARDE sempre teve interesse e abriu espaço para publicar sobre artes plásticas”.
Fonte de pesquisa Sante Scaldaferri se tornou leitor atento e observador a partir da década de 1940. Depois, quando começou a pesquisar sobre arte para escrever a obra Os primórdios da arte moderna na Bahia - Depoimentos, texto e considerações em torno de José Tetu-
liano Guimarães e outros artistas (Museu de Arte Moderna da Bahia, 1998), visitou muitas vezes os arquivos do jornal. “A TARDE foi uma fonte constante para a minha pesquisa”, afirma o artista, que se deteve em informações entre o fim o século 19 a 1960 para escrever seu livro. “Seria uma tese se eu quisesse ser doutor, mas preferi ser só artista”, resume bem-humorado, lembrando que muitas informações só foram encontradas em edições antigas. Para Sylvia Athayde, diretora do Museu de Arte da Bahia, “A TARDE é o grande veículo de divulgação de artes no Estado”. Em sua opinião, o valor do acervo extrapola o campo das artes. “Qualquer pesquisa histórica você tem que recorrer ao jornal A TARDE. Está tudo lá. Será uma fonte também no futuro sobre muitos acontecimentos, inclusive os eventos culturais”, comenta a museóloga.
Reprodução / Arquivo A TARDE
Eventos artísticos na Bahia e no mundo ao longo de nove décadas
As artes plásticas sob a ótica dos colunistas e do jornalismo factual
O jornal A TARDE atravessou o século 20 contemplando as artes plásticas da maneira mais abrangente possível (incluindo as mais controvertidas, como pintura mediúnica, por exemplo). Ao longo dos anos vêm sendo noticiados desde eventos locais importantes, como a inauguração da Galeria Oxumaré – legenda da plástica baiana –, em 1952, a fatos de vulto mundial, como a Bienal de Veneza, em 1980, ou o centenário de morte de Van Gogh, em 1990. O leitor pode se informar tanto sobre os principais eventos artísticos do País, a exemplo da XXIV Bienal de São Paulo, última do milênio, realizada em novembro de 1998, como tomar conhecimento de acontecimentos importantes na cena baiana, como a abertura do I Salão Regional de Artes Plásticas, em Alagoinhas, em julho de 1992.
As páginas de A TARDE também se detiveram no factual para informar fatos como a superação da crise nervosa do pintor surrealista Salvador Dali, em 1980, e a instalação da sede da Associação dos Artistas Plásticos Modernos da Bahia, no antigo prédio da Academia de Letras, no Terreiro de Jesus, em fevereiro de 1986, e, no início desta década, a demolição de murais do artista plástico Juarez Paraíso, nos prédios dos extintos Cine Art 1 e Cine Art 2. “Muitas dessas notícias vêm sendo veiculadas também na coluna de July”, observa Sante Scaldaferri. A autora da coluna social de mais prestígio da imprensa baiana diz que faz questão de observar este universo: “É uma coisa que aprecio. Sempre tive esse olhar mais atencioso para quem faz arte”, comenta a colunista July. Há 26 anos no mercado, o galerista Paulo Darzé afirma que o jornal sempre esteve atento aos principais eventos de artes plásticas da Bahia, do Brasil e do mundo. “Acompanho há muitos anos e acho que isso é fato. A coluna atual de artes plásticas, Plasticidades, por exemplo, é muito informativa. Leio sempre que quero saber sobre os eventos que acontecem no Rio de Janeiro”, pontua Darzé. O artista plástico Juarez Paraíso, ex-diretor da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia e articulador de eventos de vulto, como as duas edições de bienais nacionais na Bahia, nos anos 1960, diz que, ao longo das décadas, A TARDE vem mantendo espaços com colunistas importantes. Ele cita Riolan Coutinho e Lídia Borja, nos anos 1960, e Clarival do Prado Valladares e Hélio Simões, na década de 70, além da crítica de arte Matilde Mattos, de Reynivaldo Britto, até os 90, e, nos 80, Antônio Celestino, com a coluna Pátio das Artes. Almandrade acrescenta ainda a coluna literária de Fred Souza Castro, onde publicou suas poesias semióticas (poemas visuais).
Página de Letras, Artes, Sports e Modas: 16.8.1913
Página dedicada às artes era semanal: 23.8.1913
Exposição do modernista Guimarães: 14.5.1932
Montagem de fotos era o destaque em 30.8.1913
Prata da casa Através de matérias, artigos e textos publicados em colunas, A TARDE muitas vezes valorizou a “prata da casa”, e não só os consagrados Mário Cravo Jr., Carybé e Jenner Augusto, como criadores mais jovens, e entre eles membros da famosa Geração 70, que reúne artistas como Bel Borba, Justino Marinho, Fred Schaeppi, César Romero e Murilo (atual diretor do Palacete das Artes Museu Rodin). O jornal vem acompanhando de perto o movimento das artes em sua troca dinâmica de espaços e públicos, como quando o Barroco da Bahia foi a Buenos Aires, em mostra montada no Museo Nacional de Arte Decorativo, em outubro de 1988; ou quando o artista Mário Cravo Neto ganhou destaque no The New York Times, que elogiou sua exposição de fotos na Witkin Gallery, em dezembro de 1997. A arte foi notícia até quando virou caso de polícia, o que aconteceu com o roubo de telas do Masp e de uma coleção particular, ambos os casos ocorridos em São Paulo. Parao leitor,certamentedeve ter sido interessante observar, por exemplo, o movimento de troca que dinamizou o campo das artes. Temos dois bons exemplos com Bahia à Paris – Arts Plastiques d'aujourd'hui, que em outubro de 1998 levou trabalhos de 29 artistas às galerias parisienses; e comHélio Oiticica, Lygia Clark e o Desenho Moderno no Brasil, que deu oportunidade ao espectador baiano de ver de perto o desenho brasileiro desde o Modernismo de 1922 à expressão de artistas neoconcretistas, destaque no Museu de Arte Moderna da Bahia – MAM, em maio de 1995. Para o crítico de arte Almandrade, a abordagem do conteúdo de arte por A TARDE se dá “não só no nível de informação como de formação cultural do espectador, colocando-o diante do trabalho de arte”, enfatiza.
Caderno 2+: artes visuais são presença constante em A TARDE
A coluna “Plasticidades” é publicada semanalmente no jornal
Os pioneiros
O centenário do cubismo foi abordado em edição do Cultural
Os 20 anos da morte de Salvador Dalí foi tema do suplemento
“José Guimarães voltou da Europa todo Cézane. Todo arte moderna”. Assim o colunista Carlos Chiacchio comentava o acontecimento artístico mais importante do ano de 1932, a primeira exposição de um artista moderno da Bahia, em sua coluna Homens & Obras, publicada na edição de 17 de maio. No dia 30 do mesmo mês, a exposição do primeiro artista moderno da Bahia foi tema também da coluna de Eugênio Gomes, pioneiro, juntamente com Chiacchio, na análise das artes plásticas em A TARDE. Na década seguinte, seriam publicadas coberturas de eventos, como a primeira Exposição de Arte Moderna na Bahia em 1944, com obras de Manuel Martins, ilustrador de obras de Jorge Amado.
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ESPECIAL
SALVADOR QUINTA-FEIRA 15/10/2009
EVOLUÇÃO Jornalistas contam como a chegada de novas tecnologias alterou o processo produtivo no cotidiano de A TARDE
Do linotipo à convergência digital, profissionais dizem como foram as transformações no jornal Arquivo A Tarde / 29.7.1986
Thiago Teixeira / Ag. A TARDE
À esquerda, redação de A TARDE no ano de 1986: máquinas de datilografar e papéis pelo chão. À direita, a redação atual: computadores e programas que deram agilidade ao processo produtivo
João Alvarez / Ag. A TARDE
CARINE APRILE IERVESE
“Eu peço demissão! Não vou me adaptar às novas tecnologias”, disse um repórter de A TARDE, em 1996, quando os novíssimos computadores entraram na redação. Quem lembra deste fato curioso, que marcou a resistência de alguns jornalistas aos avanços tecnológicos, é o coordenador da Agência A TARDE, Paixão Barbosa, que chegou ao jornal aos 22 anos, em 22 de novembro de 1977, como revisor. Nas décadas de 1970 e 1980, o processo produtivo era muito mais trabalhoso. Os repórteres apuravam as informações, depois voltavam para a redação e tinham que disputar uma das máquinas de datilografar disponíveis, das marcas Olivetti e Remington. Na hora de escrever a matéria, se o repórter errasse o lead – primeiro parágrafo da notícia –, jogava-se o papel fora e começava-se tudo de novo, ou, então, cobria-se o trecho errado com uma fileira de “x“. “A redação não era tão limpa quanto é hoje, porque a gente amassava o papel para jogar fora, mas nem sempre caía na lata do lixo, aí ficava aquela sujeira espalhada pelo chão, sem contar as bitucas de cigarro”, lembra Ari Donato, ex-funcionário de A TARDE e primeiro a ocupar o cargo de coordenador das sucursais no jornal. Depois de pronto, o texto seguia para as mãos do editor, que o repassava para um reescrevedor. “Se o texto estivesse muito ruim, estas pessoas tinham autonomia de mudar completamente a matéria”, afirma Paixão Barbosa. Reescrito, o texto era encaminhado para o setor de linotipos, máquina de composição a chumbo usada até meados dos
“O processo de pré-impressão durava cerca de duas horas na década de 1970” GUERRINO TREVISAN, chefe de manutenção industrial de A TARDE
“Tínhamos códigos para tudo, como bater a caneta na mesa” SARA BARNUEVO Editora de A TARDE
anos 70. Posteriormente, com a chegada da fotocomposição, a matéria era digitada e salva em computadores. “A digitação era muito rápida. A gente nem olhava para o teclado. Tínhamos uma prancheta na vertical onde fixávamos o papel. Era olhando o texto e digitando. Tudo de forma automática. A gente parecia um monte de robôs”, lembra, saudosa, Iloma Sales, que ingressou como digitadora, em 1992, e hoje ocupa o cargo de editora-coordenadora do Mobi A TARDE. As matérias digitadas eram impressas e os textos encaminhados para os revisores. “Nós ficávamos em duplas: uma com o texto original do repórter e outra com o texto digitado. Tínhamos códigos para tudo, como bater a caneta, uma ou duas vezes na mesa, para indicar que na-
quele trecho havia uma letra maiúscula ou uma aspa”, lembra Sara Barnuevo, editora do caderno Empregos&Negócios, que iniciou sua carreira em A TARDE como revisora, em 1993.
A tecnologia é só um auxiliar no processo de fazer o bom jornalismo
Fotocomposição Depois de passar por tantas mãos, a matéria seguia para o auxiliar de fotocomposição, que revelava o texto em papel-filme e montava os fotolitos, que iam para a rotativae eram impressos em formato de jornal. Só que a pré-impressão nos anos 70 durava cerca de duas horas. “As páginas chegavam a ser engomadas. O processo envolvia a produção de filme, gravação e secagem. Atualmente, para preparar uma página, não levamos nem cinco minutos. Hoje parece até brincadeira fazer jornal“, afirma Guerrino Trevisan, chefe de manutenção industrial de A TARDE há 36 anos, que acompanhou todas as mudanças tecnológicas do parque de impressão do jornal. A chegada dos PCs, em 1996, e a mudança do sistema DOS para o Windows, com a implantação do GN3 (programa de edição de texto), em 2006, representaram grande avanço e muito mais agilidade no processo produtivo. ”Antigamente, quando a gente começava a imprimir o jornal às duas horas da manhã era uma vitória. Hoje, neste mesmo horário já está tudo pronto“, conta José Grimaldi Mariano, gerente de planejamento e controladoria, no jornal há 34 anos. Hoje, o processo funciona assim: o repórter escreve a matéria no computador em rede, direto na página. Depois, o texto é lido pelo editor e, em seguida, pelo revisor. Aprovada, a página desce para a gráfica bastando dar alguns cliques.
PAIXÃO BARBOSA Coordenador da Agência A TARDE
Paixão Barbosa entrou em A TARDE aos 22 anos, como revisor Marco Aurélio Martins / Ag. A TARDE / 2.12.2008
Iloma Sales: de digitadora a editora-coordenadora do Mobi Fernando Vivas/Ag. A TARDE / 28.8.2003
Telex antecedeu o e-mail no envio de textos a distância Quando o repórter viajava para cobrir pautas em outros municípios, a transmissão das matérias e fotos para a redação do jornal era outra novela. Enquanto que hoje o material é enviado via e-mail, pela internet, e em apenas alguns segundos, na década de 1970, o Telex e o Telefoto eram as máquinas responsáveis pela transmissão (ver página 4). Algumas sucursais tinham as máquinas, outras não. Nestes casos, o repórter precisava procurar algum telex disponível, geralmente encontrado em bancos ou nos Correios. Quando não havia telex, os repórteres liam a matéria completa, por telefone, para o editor copiar. Com as fotos, o processo era
As fotos eram retocadas com o uso de tinta guache ainda mais complicado. O fotógrafo tinha que procurar na cidade alguém que tivesse um estúdio para revelar as imagens. Fotos reveladas, era hora de buscar uma linha telefônica para fazer a transmissão via telefoto. “Colocava-se a foto numa espécie de cilindro e uma leitora ótica ia lendo a imagem e passando para a redação. Isso leva-
va cerca de dez minutos para cada fotografia. Em algumas cidades do interior só existia uma linha disponível no posto telefônico”, conta Paixão Barbosa, coordenador da Agência A TARDE.
Ari Donato atuou durante 31 anos no jornal em várias funções Margarida neide / Ag. A TARDE
Tinta guache O negativo da fotografia chegava à redação via telefoto, depois era revelado. “Só que a revelação saía cheia de chuviscos. Na época, retocávamos a imagem com pincel e tinta guache. Como a revelação ficava um pouco oleosa, misturávamos um pouco de sabão na tinta guache para ela aderir melhor”, lembra Reinaldo Gonzaga, infografista que se aposentou em A TARDE após 35 anos de trabalho.
Sara Barnuevo chegou revisora e hoje é editora de caderno
Confesso que não foi nada boa a primeira impressão que tive do meu local de trabalho, quando fui contratado para ser revisor de A TARDE, lá pelos idos de 1977. A razão é que, para entrar no “aquário” da Sala de Revisão, tínhamos de passar pela “oficina”, onde ficavam as linotipos, e, além de ser barulhento, o local era muito quente, devido à matéria-prima usada ser o chumbo derretido. Grande revolução tecnológica no final do século XIX, a linotipo já estava com os seus dias contados, quando entrei no jornal, e foi substituída por um método de digitalização eletrônica. Saí da revisão para a Redação, onde continuamos a trabalhar por muito tempo com a velha máquina de escrever. Curioso porque a Redação não aderia à modernidade dos computadores, quando o jornal sempre teve uma história marcada pelo pioneirismo, perguntei isto a Jorge Calmon, o redator-chefe que tanto marcou o jornal e o jornalismo baiano. E, na sua resposta, dá para se entender um pouco da maneira como dirigia aquele grupo. Com uma certa condescendência ante a ansiedade do jovem editor, ele disse que não achava prudente fazer aquilo logo, porque temia que alguns companheiros na Redação não se adaptassem à nova tecnologia. A mudança só veio em 1996, após o afastamento voluntário de Dr. Jorge. E depois de passar mais de 80 anos com as máquinas de escrever, a Redação ficou menos de 10 anos com a modernidade do programa C-Text, que rodava no ambiente DOS. Desde 2006, já se trabalha com o Goodnews, no seu modelo GN3, e, com três anos apenas de operação, já está em andamento o processo para substituição pelo modelo GN4. Enfim, como um veterano que passou por todas estas mudanças, costumo dizer aos mais jovens que o fundamental, nesta história toda, é que duas coisas permaneçam inalteradas: o bom e velho jornalismo, porque a tecnologia é somente um auxiliar neste processo, e a capacidade de fazer do local de trabalho um ambiente com muitos amigos. Porque todo o resto passa.