A Canção Sertanejo-universitária do Poeta Maldito

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A canção sertanejo-universitária do poeta maldito



A canção sertanejo-universitária do poeta maldito



Índice 07... 09... 17... 33... 41...

Prefácio 1° Movimento 2° Movimento 3° Movimento 4° Movimento

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Andante Allegro ma non troppo Adagio Molto vivace



Prefácio

Idiografia orto-horizontal do belo enquanto diástole Alguém, rápido, esvazie a mente deste jovem adulto. Ele está prestes a se perder. Ele está prestes a se encontrar. Palavras claras desabam de sua boca, num acidente iconoclástico que trará a meia-noite aos nossos corações. Estamos salvos, estamos solúveis, estamos à venda nas prateleiras. Rápido! Fechem as portas, fechem as janelas, vedem as fechaduras, e gozem o mais alto que puderem. A felicidade violenta dos dedos amanhecidos já acaricia a magreza torpe da luz. E, destes que esperam, poucos restarão. É preciso ter pressa. É preciso ter presas. É preciso, mais uma vez, alimentar o rotor da alegria adrenérgica que dança aos olhos das plateias epidurais. Eles preferem o desvio ao fastio. Eles estão pagando. Entre cães binários uivantes de segredos, entre pernas prolongadas de meras misses, está subindo a rua o deambulante enlutado em verbetes assimétricos. Armado de

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alguma verdade hipodérmica, está subindo a rua aquele que não é coberto por contrato. Um poeta, sempre maldito, a cantar sua canção sertanejo-universitária.

Agravo Razur Organor Lux do 3°Templo

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1ยบMovimento Andante



Tal como um grego acompanhado de venĂŠrea musa, o poeta maldito, trajando negro, toca sua viola imunda, a mandar, para todos, beijos de lĂ­ngua na bunda.

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Vai lá, e apunhala o coração daquele jovem rapaz, pois só assim uma inspirada canção, ou um poema, ele faz. É preciso que você seja esta musa cruel, a negar-lhe o precioso mel que ele tanto deseja. Vai lá, dizer-lhe que não, que é impossível te amar. Vai lá e lhe tire o chão. Musa mais cruel não há. Do amor, da desventura, não só a dor viceja, floresce lauta a literatura ou outra arte que se deseja. O jovem poeta não sabe, mas ele já te aguarda, a desejar esta musa árdua que, em seus braços, cabe.

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Musa obtusa, com quem se deitas? Se a cama ĂŠ fria como frases feitas, por que a alegria com que se deitas?

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Minha musa dá para todo mundo. Mas, não dá para mim. Já ofereci dinheiro. Já dei uns tapas. Já propus casamento. Já ameacei me matar. E, outros truques da arte encantatória do amor. Mas, ela não me dá! Então, acabei chorando baixinho em seu colo, dizendo: dá pra mim, dá pra mim, dá pra mim... Enquanto ela alisava o meu cabelo e me dizia que eu era uma alma perdida e que precisava me cuidar. Oh, musa! Não quero a sua pena. Não quero o seu cuidado. Quero no recôndito e estreito do seu corpo adentrar. Quero calar a sua fala com minha potência criadora, enquanto, ajoelhada, está. E em todos os seus meios encontrar minha pequena morte. Mas, por que, por que você não me dá???

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Bastaria um cansaço na alma e o olhar vagabundo para o poeta ganhar a rua e a menina. Assim tão fácil seria. Mas, ele tem que penar, aprender latim, burilar dodecassílabos, sofrer por amor, para, no fim, perceber que, de fato, bastaria um cansaço na alma e o olhar vagabundo. O que é tão fácil dá muito trabalho, enfim.

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2ยบMovimento

Allegro ma non troppo



A namorada imaginรกria engatou um romance com o amante autoral. Ficcionalizavam um futuro juntos.

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Penso na antiga amada que, à uma hora destas, está deitada na cama, abraçada à memória. E, dentro da noite silenciosa, ela me espera. Sem saber que perdi cabelo e ganhei barriga.

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Debruçada na janela, o olhar perdido, acho que espera a saudade chegar. Do lençol, na máquina de lavar, já se apagou qualquer menção ao amor. Na pia, o par de xícaras sujas ainda resta.

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Cheguei em casa, fui para o quarto, e encontrei vocĂŞ pronta para o ato. (Esta foda foi patrocinada por aquela marca de cerveja que me faz te ver cada vez mais linda, minha potranca sertaneja.)

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Posso estar enganado, mas, acho que te amo. Nós dois aqui, nesta cama, eu por trás, você de quatro, seus seios balançando. Nós dois aqui, na cama, eu no leva e traz, num ritmo exato, você gemendo e xingando. Posso estar muito enganado, mas, acho que te amo.

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O amor que nós faz não tem concordância. Até parece briga.

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Pare de gritar no meu ouvido, mulher, pois, eu sei do que você precisa. E, aquele seu doutor que, há anos, te analisa, não vai te dar. Desentorta, mulher, e deixa de drama! Vem logo pra cama. Hoje, aqui é seu divã! Essa tal de histeria é só frescura. Vem cá, mulher, que vou te dar a sua cura à tarde, à noite e de manhã. Desentorta, mulher, e vem pra cama! Desentorta, mulher, deixa de drama!

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O amor ideal é uma foda bem dada, com a mulher amada que acabou de se conhecer, para, depois, nunca mais ver e de quem não se dirá mais nada. O amor ideal é o que deixa saudade.

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Havia flores, havia sorrisos, o trinado das aves, aquele banco de ferro meio escondido no quintal. Havia felicidade, enfim. Mas, ent達o, as contas chegaram...

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Essa que passa. Essa que fica. Essa que nunca veio. Essa desconhecida. Essa familiar - qual o seu nome? Aquela outra. A outra. A prรณxima. A que virรก um dia sem avisar. A que espero. E, nรฃo vem mais.

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Tão cali, tão Kali! Entre os afeticídas, minha ex surgida, ostentando um colar magoado de corações alheios... Ó, o meu ali no meio!

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Encoxando donas de casa na fila do açougue, no hipermercado, aprendi que a vida não tem jeito. Que o melhor é ir vivendo, sem dar muito recado.

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Armado com palavras farpadas, sangrando corações, segue o poeta das melhores intenções.

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3ยบMovimento Adagio



Quando te conheci, eu era apenas uma criança chinesa, montando três mil celulares por dia...

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O sr. H. Vergueira Comatto é um homem antiquado. Ele acredita que um poema é para rimar, ter beleza e falar das coisas sutis da vida, e, não, para vender pacotes de dados em planos de telefonia móvel. O sr. H. Vergueira Comatto é um homem muito antiquado.

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O AMOR® veio como brinde nos pacotes tamanho família de COMPROMISSO®, em um pequeno sachê.

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No Estado Totalitário da Alegria, a única lei é ser feliz, a qualquer custo. Vai ser triste lá, para ver o que te acontece! Te enchem de remédios, te mandam para a terapia, te expulsam do bloco de rua e te bloqueiam no facebook...

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Somando os zeros nas casas certas, compraram o revolucionário para o sistema. Não há quem não se venda, quando dinheiro não é problema.

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4ยบMovimento Molto vivace



Do lupanar vem um brilho que atravessa o vivo carmim das sedas. Na porta, da moradora, o filho a atirar nos transeuntes podres frutas azedas.

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Vharás, o filisteu, não fode a puta. (Será que ele ainda não conhece o REMEDINHO®?)

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Na casa onde se tolera, o vov么 entrou animado, levando a dama do meio da galera para um lugar mais reservado. Mas, ela n茫o sabia: ele estava enviagrado.

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Sou um homem caridoso, cristão, até (embora me falte purgar mais as culpas). Perdoo seus filhos, por amor às putas.

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Deixei ela na cama, com um sorriso no rosto e uma nota de vinte sobre o criado mudo. Todos os dias, sempre na porta quando passo, ela me chama, “Vem-ni-mim!”, sem sutiã sob a blusa e o shortinho curto. Quem mandou eu ser tão romântico, assim!

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Caminha embriagado da consciência tomada na esquina e cambaleia junto à rima do seu canto embargado. Um poeta falido está caído no meio do caminho à espera de que lhe atirem a primeira perda.

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O poeta marginal está perambulando pelas ruas, para o terror dos leitores de bem. Mas, a polícia literária já foi acionada. Vai abordá-lo. “Larga a caneta e o caderninho. E, mão na cabeça, vagabundo!”. A polícia literária está revistando os bolsos do poeta marginal em busca de substantivos derivados e vocábulos de uso restrito. “Quais são as suas referências no cânone ocidental? Sabe metrificar? Que porra é essa que você escreveu aqui, isso é tema que se use em poesia? Como sua escrita se relaciona com a teoria literária? Pediu a benção aos clássicos?” Hesitante, o poeta marginal não sabe o que responder. “Você tem muito o que explicar, elemento.” O poeta marginal está sendo conduzido, sob aplausos dos zelosos leitores de bem. “Publicar seus versos? Nunca será!”, diz o editor da polícia literária, batendo a tampa do camburão na cabeça do poeta marginal. Uma douta senhora, que assistia horrorizada da janela, volta a ler seu best-seller. Ela está aliviada, agora.

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Finis

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acabou de se parir ‘sta mui prestimosa obra nos primórdios do mês d’agosto dest’ano de 2.013, entre chôros, berros e fontes tipográficas Mutlu e Margina, no respeitável recesso do lar, nesta cidade ajardinada de Bello Horizonte.



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