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Centenário do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária 9 de Julho de 2013 Reportagem fotográfica Palestra “LNIV - Os Caminhos do Presente” Dr. Álvaro Mendonça






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dora: Clara Cruz, Madalena Monteiro, Carla Machado, Sรก, Alice Santos (da esquerda para a direita)


Início


Discurso do Orador Convidado Professor Doutor Álvaro Pegado Mendonça LNIV - Os Caminhos do Presente Exmo. Senhor Secretário de Estado da Alimentação e Investigação Agroalimentar Exmo. Senhor Presidente em exercício do INIAV Exmo. Senhor Professor Miguel Fevereiro Exmos Senhores membros da Comissão de Comemoração do Centenário do LNIV, Demais autoridades presentes, Exmos Convidados Exmos Senhores funcionários do LNIV, caros colegas, Minhas Senhoras e meus Senhores Na qualidade de antigo e atual colaborador do LNIV, pois que a colaboração tem muitas formas, foi-me pedido que fizesse as honras da casa neste dia de festa. Agradeço publicamente esta incumbência de apresentar, por breves instantes, uma história de cem anos. Cem anos! É um grande gosto para mim. Permito-me saudar ainda em particular duas Instituições irmãs, a Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa e a Estação Zootécnica Nacional. Irmã na idade e irmãs também

porque foi nestas três instituições que se alicerçou a história centenária da Medicina Veterinária em Portugal. Muitas das palavras que vos dirijo são-lhes também merecidas, dada a contínua colaboração ao longo destes anos. Dirijo ainda uma palavra de apreço à Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa pela partida recente da sua dirigente Cristina Lobo Vilela, minha particular amiga. Portugal tem 870 anos e destes, 100 são também do LNIV. Melhor do que eu, um matemático diria que, numa perspectiva estatística, no contexto da história nacional, o LNIV tem um valor de p estatisticamente significativo. Pese embora o título desta intervenção, virada para o presente, seria uma falha grosseira não fazer uma ida ao passado, recordando as principais marcas históricas, e são muitas. Propositadamente, para além dos antigos Diretores, não referirei ninguém mais e desde logo por três razões. A primeira porque, se bem que há muitas personalidades a distinguir, é o conjunto que faz a mudança. A segunda porque, sendo eu um pouco tardio na Instituição, confesso que receei cometer a injustiça de


esquecer alguém. A terceira porque tantos se evidenciaram que o tempo iria escassear. De qualquer forma, a Comissão da Comemoração tem publicado cadernos comemorativos na página oficial, e uma publicação com a história detalhada do LNIV, onde, aí sim, se faz justiça pessoal a todos e em particular aos seus membros mais destacados.

o seu pessoal.

Não possuindo os dotes de comunicação de Hermano Saraiva ou o espantoso magnetismo comunicativo de Vitorino Nemésio, atrevo-me mesmo assim a recordar um pouco da sua história. Resumirei primeiro a Instituição e de seguida os seus órgãos.

Em 1936 são criados os laboratórios do Porto e Évora, sob a orientação técnica e científica do LCPV.

O Laboratório de Patologia Veterinária e Bacteriologia nasceu em 1913 fruto da necessidade de dotar o País de uma organização especificamente direcionada para os aspetos laboratoriais da Medicina Veterinária. Até aí, estas necessidades eram supridas parcialmente pelo Instituto Bacteriológico Câmara Pestana e pelo Laboratório de Bacteriologia da Escola de Medicina Veterinária. As suas funções iniciais seriam a clarificação de problemas epizoóticos e de higiene pública, a montagem e concepção de métodos de diagnóstico, o estudo de doenças animais enzoóticas e epizoóticas assim como a preparação de diversos soros anti-bacterianos, vacinas e reagentes para diagnóstico. Competia ao seu diretor António Águeda Ferreira (1913-1946) dirigir os trabalhos científicos do Laboratório e

Em 1918, muda a sede para a estrada de Benfica, as atuais instalações, e começa uma longa evolução, mesmo em termos de designação, tomando o nome de Laboratório Central de Patologia Veterinária (L.C.P.V). O seu pessoal e competências são alargados.

Nos anos seguintes passarão pelas funções dirigentes sucessivamente, Arnaldo Mendonça Machado, Inácio Ribeiro Baptista e Moreira Jacob (1946-1950). Em 1957, sendo Diretor João Manso Ribeiro (1950-1975), muda de novo de designação para Laboratório Nacional de Investigação Veterinária (LNIV), que passará a ser o nome mais conhecido, ultrapassando diversas fases. As suas funções incluem já o estudo de doenças animais, zoonoses, investigação aplicada em animais de produção e em animais de companhia, animais de zoo e espécies silváticas. Em 1975, sendo Diretor José Cristina Afonso (1975-1978), o laboratório continua uma prestação de serviços e publicações intensas, estando sob a dependência direta da Direção Geral de Pecuária. Em 1979, sendo Diretor Manuel Braço Forte Jr. (1979-1982), foi criado o Instituto Nacional de Veterinária,


com autonomia científica e financeira, gerindo os laboratórios de Lisboa, Porto, Évora, Mirandela, Viseu, Faro e dos portos de pesca. Em 1983, sob a direção de Joaquim Patrício de Matos Águas (1982-1993) é extinto o INV e recriado o LNIV, de novo sob a dependência da DGP. Sucessivamente são entregues às Direções Regionais de Agricultura os laboratórios de Faro e Mirandela e extinto o laboratório dos Portos de Pesca, cujas atribuições passam para o LNIV central. Em 1993, também os laboratórios de Évora e Viseu são transferidos para as respetivas Direções Regionais de Agricultura. O LNIV é integrado em nova estrutura o Instituto de Proteção à Produção Agro-Alimentar (IPPAA), com a categoria de Direção de Serviços, passando a designar-se Laboratório Nacional de Veterinária, LNV. Entre 1997 e 2006, sendo Diretor Alexandre Galo (1996 - 2004) é de novo extinto o LNV e recriado o LNIV, sendo entretanto construído o novo Laboratório do Porto, em Vairão, Vila do Conde. O LNIV recupera a autonomia científica, técnica e financeira. As competências são-lhe reforçadas, com a criação dos Departamentos Científicos de Patologia, Bacteriologia, Virologia, Parasitologia, Biologia Celular, Produtos Biológicos e Quimioterapêuticos, de Higiene Pública e as Unidades de BSE, de Preparação

de Meios de Cultura e de Reagentes Analíticos e de Criação e Seleção e Bem-Estar dos Animais. Foram ainda criados os Serviços de Administração e os Gabinetes de Planeamento e de Garantia da Qualidade. Entre 2004 e 2007, sendo Diretora Maria Inácia Correa de Sá (2004 – 2007), enfrentou-se a gripe aviária e nova reorganização, perdendo o LNIV a autonomia. Foi integrado no INRB, com o INIA, o IPIMAR, e alguns departamentos da DGPC e LNETI. Esta última transformação foi já concluída em 2008 sendo Vogal do INRB José Manuel Costa (2007-2008). Em 2009, sendo Vogal do INRB Nuno Boavida Canada (2009-2012), continuou a reorganização, sendo extintos alguns órgãos, reintegrados na nova estrutura. A partir de 2012, após mais uma reorganização do Ministério da tutela, é criado o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), já sem o IPIMAR. No conjunto, o INIA e o LNIV são extintos e, juntamente com serviços de outros laboratórios, dão lugar à Unidade de Saúde e Produção Animal e à Unidade de Tecnologia e Segurança Alimentar. Fora o LNIV uma criança, depois adolescente, mais tarde adulto e de seguida um ancião centenário, com tanta mudança e contradança, poderia desenvolver um grave distúrbio


de personalidade. No entanto, muito mais que os modelos de gestão, ou a acrescentar a eles, é o conjunto das pessoas da instituição quem faz valer as suas atribuições: as competências adquiridas na vida académica, estágios diversos, formações frequentadas, exigências profissionais e virtudes humanas (inteligência prática, memória, capacidade de trabalho, dedicação, interpretação e compreensão das funções, motivação e moral coletiva) são o alicerce da instituição, que consegue compensar um ou outro momento menos bom das decisões tutelares, ao longo do tempo. Acresce que alguns laboratórios descentralizados foram, no passado, tratados como se de órfãos mal comportados se tratassem, transitando entre uma e outra hospedaria. Peço a vossa atenção para fazer justiça à Instituição, e àqueles que a construíram, recordando a sua evolução interna e os seus pontos altos e baixos. Há pouco mais de um século atrás, bem perto da fundação do LNIV, Victor Hugo, na sua obra mais conhecida, Os Miseráveis, surpreende-nos com a descrição sublimada que faz dos esgotos napoleónicos de Paris. De acordo com a sua visão poética, seriam um imenso rio contendo os restos de toda uma população: vestígios de felicidade e tristeza, exaltação e depressão, uma súmula da vida conjunta da grand ville, onde ricos e pobres se encontravam, onde a ostentação se misturava com a

mais vil condição, onde enfim, se poderia encontrar o resumo possível de uma tão grande reunião de pessoas. Não se referia evidentemente aos meros e sórdidos dejetos sanitários mas sobretudo àquilo que sobra de uma casa do séc. XIX, em que não havia reciclagem, desde os restos de cozinha aos objetos já inúteis, das roupas velhas aos bibelots indesejados, tudo o que já não cabia na vida das pessoas, um pouco como as nossas ribeiras de província, tal como as recordo da minha meninice, há 30 ou 40 anos atrás. Com recurso a uma lupa especial, mágica, poderíamos imaginar a vida das pessoas e toda a sua envolvência. Esta passagem, cuja leitura coincidiu com as aulas de Anatomia Patológica, na verdura do início dos meus vinte e poucos anos, associou para sempre a aversão inicial do organismo animal morto e degradado aos esgotos de Paris. Por um lado, uma sublimação que só um grande escritor poderia despertar. Do outro lado, um organismo morto, no princípio repulsivo, com lesões e mau aspeto, por vezes em início de putrefação, e logo com evidência de uma vida sofrida, resistindo à doença e sucumbindo à mesma, inspirando inicialmente repulsa e mais tarde intrigando-nos com a sua organização, capacidades, sinais escondidos, provas e mistérios, evidenciando causas e consequências, a olho nu ou sob o escrutínio do microscópio, após longas e laboriosas operações de corte e coloração, observação e tantas vezes desespero…. Creio que um patologista se reconhecerá aqui.


A minha homenagem aos patologistas. No LNIV, a anátomo-histopatologia começa de forma incipiente dada a deficiência de pessoal e a necessidade de formação de quadros novos. Só a partir de 1930 começam a ser descritas algumas patologias mais específicas. A peste suína é desde há muito, a maior preocupação.

que entretanto surgiram, como a Linfadenite Tuberculosa dos Suínos e a Gripe Aviária. Em 1990 surge a BSE, sendo diagnosticada em animais nacionais a partir de 1994. Em 1998 é criado em Lisboa um novo laboratório devidamente apetrechado para lidar com este agente zoonótico e não convencional.

O reforço do laboratório com patologistas fez-se a partir de 1941, com trabalhos em patologia aviária a partir de 1951. Vários patologistas de renome fizeram a sua entrada nestes anos, descrevendo-se várias doenças como a doença de Aujeszky, a Peripneumonia Contagiosa dos Bovinos (PPCB), a doença de Newcastle, a Varíola e o Ectima Contagioso dos ovinos. Foi diagnosticada a Peste Suína Africana (PSA) em 1957.

Lisboa e Vairão, têm assegurado o diagnóstico laboratorial das TSEs assim como a pesquisa de farinhas de carne e osso em alimentos compostos para animais.

Surge a pecuária intensiva nas décadas de 60 e 70.

Em 1979 surge o Serviço de Patologia Apícola e o Serviço de Patologia dos Peixes em 1980 para apoio à aquacultura.

A partir de 1965-1967 inicia-se a campanha de profilaxia da Leucose Bovina. Em 1980 regressa a Febre Aftosa e em 1982 a PPCB. Publicam-se sucessivamente trabalhos diversos e diagnosticam-se novas doenças. Surgem as primeiras suspeitas de Peste Equina em 1989. Por razões diversas verifica-se a saída de vários patologistas, com a admissão de novos elementos, que vieram a verificar-se um sólido apoio nas novas crises, algumas graves,

Como não podia deixar de ser a BSE apanhou toda a gente desprevenida. Não fora um departamento de patologia preparado, sobretudo com meios humanos, e a resposta nacional poderia não ser suficiente.

Se a lupa do Victor Hugo veterinário continua a resistir às nossas investidas, então será necessário utilizar outro crivo pois o alvo das nossas buscas poderá ser uma das muitas bactérias do nosso cardápio: mal dispostas, lentas de ação ou fulminantes, tratáveis ou intratáveis, multiplicando-se em tubinhos de cores mil e placas com aspeto semelhante a famosas pinturas contemporâneas. Algumas tão atrevidas e insuportáveis que colocam em risco a vida de quem as manuseia. Falo evidentemente dos sofridos do-


mesticadores de bactérias.

os estudos sobre a Varíola Ovina.

Logo em 1913, para além das culturas efetuadas e das vacinas produzidas, nos primeiros 25 anos foi o Carbúnculo Hemático, a Brucelose e a Tuberculose os alvos das principais preocupações.

Inicia-se a campanha antirrábica a partir de 1924. Febre Aftosa em 1937. Doença de Newcastle em 1947. Doença de Aujeszky em 1953. Em 1956 surge a Língua Azul e, em 1957, a Peste Suina Africana (PSA).

Nos anos 40 as mastites bovinas foram também alvo das atenções.

Febre Aftosa (1980), Peste Equina Africana (1989-1990) e novamente, a Língua Azul (2004 -2009).

Seguem-se estudos sobre Bactérias Anaeróbias, as Salmoneloses e a Leptospirose, as Micoplasmoses, e de novo a PPCB, a Tuberculose Bovina e a Brucelose. A Paratuberculose faz o seu aparecimento em 1987, existindo hoje em cerca de 60% dos rebanhos em algumas zonas do país. Iniciam-se aqui as técnicas de biologia molecular e mais tarde o incremento do estudo das Zoonoses e das Resistências Antimicrobianas. Mau grado a grande capacidade do Victor Hugo bacteriologista o alvo das nossas preocupações poderá ser ainda mais pequeno e insidioso, passando sem ser detetado mesmo no nosso nariz ou pelo bico das aves, nossas parceiras no infortúnio da influenza. Os insignes caçadores de vírus, arrojados pesquisadores do mal, tal a agressividade de algumas das suas maldições, já só utilizam equipamentos inacessíveis à compreensão de um não crente. Também para eles vai a minha simpatia. O soro contra a Peste Suína e a vacinação anti-rábica seriam os primeiros trabalhos de relevo, seguindo-se

PSA, PSC e doença de Aujeszky - milhões de soros processados ao longo da década. O diagnóstico virológico molecular foi iniciado em 1991 e em 2004 publicada a sequência genómica completa de um lentivírus dos pequenos ruminantes, totalmente sequenciada no LNIV. Vírus da Gripe Aviária, Língua Azul, Nilo Ocidental e Schmallenberg Mais de 80 vírus diferentes E se mesmo assim não chegamos a bom porto é necessário evoluir noutra vertente, a mais parecida com especialidade literária do nosso bom Hugo (como diria Eça), a necrópsia parasitológica, que tantas angústias me causou no tempo de estudante! Toca de abrir a tripa e meter mãos à obra. As minhas sinceras homenagens aos doutos e corajosos colegas da parasitologia. Há para todos os gostos: endo ou ectoparasitas, helmintas ou protozoários, insectos ou não….alguns reclassificados como zoonóticos após o meu tempo de estudante, an-


darão pelo menos pela centena aqueles com mais interesse veterinário. Sem esquecer os seus famosos ciclos biológicos, que tanta memória nos consomem.

cologia confundem-se nos primeiros anos de vida do Laboratório com as atividades dos Laboratórios de Parasitologia – Tinhas e Aspergiloses – e de Bacteriologia – Candidíases.

Desde 1918, é contemplada a parasitologia, como especialidade destacada na patologia.

O Laboratório de Micologia só se tornou autónomo em 1974, tendo como vocação prioritária o apoio ao diagnóstico de doenças animais causadas por fungos, algumas de declaração obrigatória ou com impacto económico.

Mais tarde em 1939 foi elevada à qualidade de Serviço com valências nas áreas de Aracnoentomologia, Protozoologia e Helmintologia. Nos anos seguintes destaca-se a Protozoologia nas aves, cavalos, coelhos e a Leishmaniose no cão. Ixodídeos e identificação de larvas de estrongilídeos gastrintestinais foram outras áreas de trabalho. Com a entrada na CEE colaborou nas medidas de controlo e vigilância, planos oficiais da Autoridade Veterinária Nacional e na formação de Inspetores Sanitários - Trichinella, Theileria, Babesia, e Leishmania. Estudaram-se ainda diversos artrópodes, vetores de agentes microbianos e muito em especial a Helmintologia. As campanhas de reconhecimento parasitário, a partir de 1954, foram precursoras dos futuros planos de vigilância, sendo acometidas ao Serviço de Parasitologia o seu desenvolvimento no campo. Destacam-se as campanhas da Hipodermose e da Fasciola hepatica. As atividades relacionadas com a mi-

Desde 1976, foram desenvolvidas metodologias de avaliação de rações para animais. Nas décadas de 60 a 80 foram sendo descobertas as principais micotoxinas – cerca de 200 – e avaliado o seu impacto na saúde animal e humana. Tenho mesmo de referir, por justiça e peso próprio, o apoio ao diagnóstico prestado pelos colegas que operam o microscópio electrónico, que nos enchia de respeito reverente nos anos leves da Faculdade…. AHHH o Microscópio Eletrónico; sonhávamos com a visita ao ME, falávamos dele aos amigos, nos intervalos do cinema. É electrónico e até dá para ver os vírus… Muito mais perspicaz ainda do que a visão poética de Victor Hugo. O Laboratório de Biologia Celular (LBC) foi a sua última designação, pois está atualmente extinto. Criado no início da década de 70, teve em 1974 a instalação do primeiro ME. Apoiou diversos trabalhos nas áreas


da virologia e da bacteriologia. Implementou diversas técnicas de microscopia eletrónica. Colaborou no diagnóstico da PPCB e no apoio a projetos de brucelose Novo ME em 1987. Nesta data teve início a técnica de imunohistoquímica em microscopia de campo claro, estudo das lesões por ME, técnica do imuno-ouro aplicada à ME, técnicas de bioquímica, citometria de fluxo, microscopia de fluorescência e microscopia eletrónica Estudam-se lesões em diversas espécies animais, a deteção de vírus em lesões e tumores, a observação de parasitas, a identificação de antigénios em bactérias, o isolamento e a identificação de fibrilhas de proteína priónica-BSE (Bovine Spongiform Encephalopathy). Recordando as quimeras da mitologia grega (minotauro, medusas, cérberos, centauros - qual será mesmo a sua fórmula leucocitária??) os bioquímicos foram sempre um mistério para mim. O Laboratório de Bioquímica, criado em 1957 é atualmente o Laboratório de Análises de Resíduos. Participa ativamente no Plano Nacional de Pesquisa de Resíduos (PNCR) – Animais vivos e outras amostras. De 1978 a 1982 o serviço trabalha em especial a imunoquímica e as análises bioquímicas e dá apoio a diversos trabalhos de investigação

Brucella melitensis, PPCB, ictiopatologia, doseamentos moleculares, leishmaniose canina, pesquisa de enterotoxinas, micoplasmose, antibióticos, hormonas, tireostáticos e clembuterol. A Quimica, herdeiros dos pesquisadores da pedra filosofal. Um outro mistério denso para mim... A sua designação atual é Laboratório de Controlo da Alimentação Animal. Tem sido responsável pela análise físico-química dos géneros alimentícios de origem animal e dos alimentos para animais. Tem competência também na medicina veterinária forense. Executa análises de natureza químico-bromatológica e químico-toxicológicas de avaliação da presença de rodenticidas, pesticidas e venenos em amostras biológicas. Após investimentos avultados em equipamento iniciou-se a fase post -EU com técnicas sofisticadas. Participa desde 1989 na pesquisa de farinha de carne e ossos na alimentação dos ruminantes, na sequência da (BSE) e desde 1992, no Plano Nacional de Controlo da Alimentação Animal, na pesquisa de metais pesados e aditivos destinados à alimentação animal. A microbiologia alimentar inicia-se logo em 1913, com uma função importante no Laboratório realizando


milhares de análises higiénicas a água, azeite, banha, carne, leite, manteiga, margarina, mel, nata, queijo, vinagre e vinho. Compreende-se a natural relevância para o leite e derivados. Cria-se o Serviço de Lactologia mais tarde Serviço de controlo laboratorial de leite. Estende-se também a atividade a outros muitos outros alimentos. Nos anos seguintes o laboratório prosseguiu com o apoio ao controlo de qualidade microbiológica de numerosos alimentos e diversos agentes microbianos. Foi-se apetrechando e modernizando segundo as exigências da sociedade civil, das exigências europeias e das necessidades da tutela. Em 1913 também se iniciou a atividade do laboratório com a produção de produtos biológicos, serviço atualmente extinto. Produziram-se sucessivamente soros e ou vacinas para o Carbúnculo Hemático, Varíola Ovina, Gurma, diarreia dos vitelos; sobressai, a produção da vacina antirrábica, das tuberculinas, do soro antitetânico e das vacinas de rebanho. Produziram-se os reagentes a utilizar nas campanhas e soros de referência para diversas doenças. Sendo o LNIV o Laboratório Oficial de Controlo dos MVI (Medicamentos Veterinários Imunológicos) – no Serviço de Contraste procedia-se á autorização de funcionamento a estabelecimentos de distribuição por grosso de MVI.

Participou na elaboração do Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho, em que foi estabelecido um código comunitário relativo aos medicamentos veterinários. O Laboratório do Porto, criado em 1936 acompanhou crises e glórias da sede, servindo toda a região norte, por vezes com o apoio dos serviços da sede. A partir do início de 2001, dá-se a sua transferência para as novas instalações no campus do Vairão prosseguindo os diversos serviços, as suas tarefas em melhores condições. Um sector quase sempre esquecido no passado, os Serviços Administrativos, não há grande história escrita. Não quereria deixar de prestar a minha homenagem aos seus atores dos tempos mais recentes, em que as exigências legais rotineiras e lentas, colidindo com as vontades urgentes dos serviços de produção, causam embaraços e pequenos atritos diários. A imensa teia de legislação é um autêntico quebra cabeças só acessível àqueles mais dedicados. Mais recente na cadeia evolutiva, o Gabinete de Garantia da Qualidade transformou-se numa estrutura incontornável, dada a necessidade de demonstrar perante as autoridades e a comunidade científica a qualidade e o rigor do trabalho desenvolvido. São exemplos disso a acreditação das técnicas laboratoriais (muitas centenas), para fazer fé junto de instâncias nacionais


e internacionais. Pressupõe uma metodologia de trabalho minuciosa, complexa e sequencial e sobretudo o envolvimento de todos. Tal como os serviços administrativos as Unidades de Criação e Experimentação Animal tendem a ser injustamente tratados. Do seu esforço e dedicação dependeram o bem estar animal, as explorações demonstrativas, os animais de laboratório e aqueles destinados à produção de produtos biológicos da mais variada natureza. Destacaria as crises da PSA, PPCB, nitrofuranos, febre aftosa, BSE e gripe aviária. Penso que a história nos mostra que é muito mais barato e eficiente estarmos preparados para as crises, do que correr para responder a elas. Desde há muito que é voz corrente no LNIV que o progresso vem amarrado às crises. Fazemos votos para que o futuro nos traga a profilaxia. Para dar sustentabilidade a tudo isto e manter memória futura, e deixando sossegado Victor Hugo, a minha homenagem às centenas de autores e milhares de artigos científicos coligidos em centenas de revistas nacionais e internacionais, espólio que merecia recolha e tratamento próprios por se confundir com a origem da Medicina Veterinária em Portugal, sem omitir as instituições irmãs da época, ESMV e EZN e outras mais recentes. Neste espaço acumulam-se centenas de volumes desde contabilísticos a técnicos e

científicos, relatórios de campanhas e seus resultados, que a partir de hoje contam a história resumida de cem anos de atividade. Tratando-se de uma biblioteca do Jacinto, Eça de Queirós diria que são cinquenta metros de lombadas de história do diagnóstico veterinário em Portugal, e até um eventual tratado em oito volumes sobre a expressão fisionómica do lagarto (a Cidade e as Serras). Uma sugestão que aqui deixo, é que a compilação e tratamento de todos estes dados, para memória futura suscetível de ser rapidamente consultada, possa ser confiada à execução de teses de mestrado. E aqui termino este périplo pelas valências mais diferenciadas (que me perdoem os colegas se algumas omiti, por fazerem parte de interfaces laboratoriais e não por serem menores que as restantes). Estes factos do passado são hoje como que um rio do tempo, não poluído e limpo dos vestígios menos positivos da história, que transporta tudo o que sobrevive ao esquecimento e chega até nós sob a forma de memórias, já não como uma ribeira mas um rio com a dimensão de um século. Alguns dos seus aspetos mais recentes são ainda recordados por muitos presentes. E chega o presente, sendo esta a razão por que estou aqui. Deste passado recente, confesso, tenho as naturais saudades do tempo passado, algumas poucas mágoas e muita certeza de ter respeitado a Institui-


ção e as pessoas. Esta minha missão tem um lado fácil pois é o tempo de falar. Mais difícil é o tempo de agir. Como diria um contemporâneo do LNIV, Almada Negreiros, “quando eu nasci, todas as afirmações susceptíveis de salvar a humanidade haviam já sido proferidas. Só já faltava salvar a humanidade”. Permitam-me uma máxima socrática (sem qualquer intenção política) muito ao gosto de Platão. Tudo tem o seu contrário. Este é um dos pilares essenciais do seus ensinamentos. E se aplicarmos este conceito ao tempo? Certamente concordarão que o passado não existe, existiu. Por essa mesma razão não pode ser corrigido. Quantos de nós gostariam de viajar ao seu passado e alterar o que se fez menos bem? Podemos aprender com ele, filosofar sobre ele, mas já não existe. Existe sim a sua memória, conceptualmente. Parece certo que o futuro também não existe, é uma mera probabilidade, desde logo como seres humanos viventes, cujo prazo de validade pode terminar abruptamente, mas sobretudo porque o futuro depende das opções que hoje fazemos. Estas sim, são reais, concretas e possíveis, ao nosso alcance individual e coletivo. No futuro ainda nada fizemos, só podemos ter intenções de agir. É certo que o planeamento estratégico utiliza o amanhã para fasear as opções de hoje, mas essas

opções são falíveis e pode vir a ser necessário corrigir a trajetória. Por outras palavras o futuro, pese embora a sua importância, só existe conceptualmente, tal como o passado. Em conclusão, penso que concordarão comigo quando digo que, dentro destas premissas, o passado e o futuro não existem. Resta-nos honrar um e sonhar o outro. Retomando a nossa premissa socrática, temos os contrários passado e futuro e falta-nos o presente, de que se diz ser o resto do passado e a antecâmara do futuro. Está na charneira do que já vivemos e do que queremos viver. É uma multiplicidade de realizações de hoje, devidamente concretizadas hoje, que dá lugar ao amanhã, pelo que os amanhãs são meras probabilidades estatísticas. Complicado? O meu psicanalista faz o que pode. Há uma frase de marketing particularmente feliz, utilizada por um canal de cabo que diz “História, faz-se todos os dias”. Espero não ser processado se a utilizar para dizer que também o “Futuro se faz todos os dias”. Foquemos então no presente e nas ações que podemos executar para continuar a construir a história. Não tenho a pretensão de desbravar os mares ou prever o caminho das estrelas, muito longe disso. Essas tarefas deixo-as para homens e mulheres muito raros, que surgem sem se fazer anunciar. Prefiro, ainda ao


estilo socrático (e sempre sem objetivos políticos) fazer perguntas a mim mesmo, ao meu alcance e a tentar responder-lhes. Só sei que nada sei, diria ele. Temos necessariamente de avaliar as condições institucionais da instituição e a sua missão. Em relação às primeiras continuo a pensar que a fusão com as demais instituições foi um erro, já parcialmente corrigido com a desanexação do IPIMAR; considero que as poupanças são exíguas quando comparadas com a perda de operacionalidade e de especificidade. Esta fusão corresponde grosso modo à fusão do Instituto Ricardo Jorge com os Laboratórios dos Centros de Saúde ou entre todas as Faculdades de Medicina Veterinária do País. Não tendo inclinação ou tradição revolucionária sempre me abstive de contrariar decisões tomadas há muito. Por outro lado, penso que as Instituições valem pelas pessoas e têm uma inércia própria, termo aqui utilizado no sentido positivo, de continuarem a mover-se desafiando o atrito. O enquadramento institucional pode é facilitar mais ou menos o caminho. A transformação iniciada em 2007 e prosseguida permanentemente durante cerca de cinco anos, é demasiado demorada. Se é para ficar há que fazer as pessoas acreditar, se não é para ficar, termine-se de uma vez. Sem críticas pessoais sinto, aqui e ali, algum cansaço e desalento pelo perpetuar da precaridade a nível de instalações e órgãos funcio-

nais. Fruto também da crise financeira, sinto em outros a vontade de sair, da reforma. A nível científico noto o receio de ficar para trás, dada a dificuldade de investimento em meios humanos e também materiais. São estas as minhas perguntas socráticas: 1 – A reforma é definitiva ou volta atrás dentro de 3 anos? Já há 100 anos de lastro, atrás de nós.... 2 – A reforma é benéfica ou só fruto da vontade, legítima, de poupança de meios financeiros? 3 – Há de facto poupança de meios financeiros, se contabilizarmos a perda de especificidade? e qual o valor dessa poupança em percentagem da sua faturação? 4 – O facto de haver atividades inadiáveis, independentemente da crise financeira, estão de facto contempladas no conjunto da instituição? 5 – As novas estruturas estão de facto preparadas para o presente e para o que se pensa que pode ser o futuro? Quanto à segunda penso que a carta de missão elaborada pela tutela é bem clara e situa as funções do LNIV na área do diagnóstico laboratorial das doenças animais e de apoio às políticas sectoriais do Ministério. A nossa integração no espaço político alargado, com acordos rigorosos na área dos planos nacionais e europeus de saúde animal e segurança


alimentar, garantem um LNIV atarefado por mais cem anos, saiba ele manter a qualidade do serviço e a excelência dos resultados no cumprimento dos seus objetivos. A trajetória da saúde animal e da segurança alimentar, num mundo cada vez mais poluído e cada vez com mais concentração animal deixam perspetivar, as chamadas doenças emergentes, para as quais é necessário estarmos preparados. E estar preparado significa estar mesmo preparado, e não reagir depois da casa roubada. Ficam mais algumas perguntas no âmbito da Missão: 1 – Está facilitado o contacto com outras instituições? 2 – Está facilitado o contacto com clientes? Mesmo numa perspectiva de empresa privada? 3 –Está garantida a transmissão de conhecimentos aos futuros investigadores? Há futuros investigadores? 4 – É encorajada a preparação de pessoal em novas áreas potencialmente ameaçadoras? 5 – É encorajada a rapidez de resposta? 6 – São encorajados os projetos de investigação e facilitada a contratação de bolseiros nesse âmbito? 7 – Os preços praticados das análises é real e competitivo? Muitas outras perguntas poderia

fazer, mas não é esta a ocasião Permito-me aqui fazer um parêntesis para recordar um pouco dos clientes finais do LNIV, na área da saúde animal, que são os criadores de gado e as suas associações, diretamente ou através de outros organismos da tutela. De acordo com um inquérito aos alunos do ensino secundário nos países do centro da Europa, os agricultores, e logo os criadores, são velhotes simpáticos, sujos e pobres que tratam de animais nas quintas. Em Portugal poderíamos dizer que são velhotes que conduzem carrinhas de caixa aberta, com um novelo de corda penduradas no taipal e um pulverizador de dorso dentro da caixa, conduzindo a 40 Km/hora nas estradas da província. Ocasionalmente transportam também um motocultivador mas nunca animais, pois isso é proibido por lei, a menos que possuam um carro especificamente licenciado para o efeito. O criador é também alguém que tem trinta dias para registar o nascimento de um filho ou um neto, mas somente 10 dias para registar um bovino nascido na exploração. Esta seria a definição anedótica, e dolorosa, mas nem por isso menos verdadeira, pois o rol de absurdos nos regulamentos comunitários ultrapassa largamente o rol de prémios nobel igualmente absurdos. Mas na realidade os criadores são muito mais do que isso. São antes


de mais os herdeiros de um modo de estar na vida, como eram os criadores do passado, viver ao ritmo da natureza, com um tempo para cada cultura, ter o prazer de ver os animais nascer e crescer, as plantas desenvolver-se e as estações seguirem-se regularmente uma a seguir à outra. A testemunhar a influencia extraordinária das estações nas diferentes produções. A ensaiar soluções e a aprender com os erros. A vender na feira os seus produtos e a receber o justo valor deles. Pouco importava o preço da lã na Austrália, o preço da carne na Argentina, a influência do biodiesel no preço dos alimentos. Certo era que na feira o negócio nem sempre era certo, mas acertavam-se os preços cara a cara com quem queria comprar. E se corria mal, no ano seguinte produzia-se outra coisa. Trabalhava-se, como hoje, de sol a sol, porque a campanha não podia esperar. O feno estraga-se com a chuva e em Maio e Junho há trovoadas. Se o inverno vier nevado, há que ter feno no palheiro. Não se trabalha das 9 às cinco. Não há fins-de-semana nem feriados. Os animais adoecem em qualquer dia e a qualquer hora. Os estábulos hoje são afastados dos centros urbanos…. Muito desta descrição não romanceada continua a ser verdade. O que se perdeu foi o ritmo lento do tempo, que deu lugar a uma velocidade desajustada do ritmo das pastagens e dos animais. Deu lugar à documentação incompreensível para uma grande parte deles e a prazos de

toda a ordem que é indispensável cumprir. Quando há ainda muitos que mal sabem ler e escrever. Quando a maioria tem mais de 65 anos. Quando a maioria não consegue adaptar-se. É certo que estamos a falar de três realidades: 1 - do criador/agricultor que é o criador tradicional que em algumas regiões é seguramente a maioria; 2 - do empresário agrícola em que aquele se tem vindo a tornar; 3 - também do criador intensivo. Os dois últimos utilizam de forma geral capital intensivo, têm explorações de maiores dimensões ou, pelo menos, funcionam com uma economia de escala. Têm formação técnica ou acesso a ela e os apoios típicos de uma empresa: contabilidade de custos, acesso ao crédito e, o que é mais importante, acesso à informação e tempo disponível para a adquirir. Já os primeiros não têm nada disto. De forma geral guardam os rebanhos 365 dias por ano, recorrendo a membros da família para guardar o gado, quando têm de se ausentar. Estamos a falar só na região que melhor conheço, de 15.000 agregados familiares e de 420.000 cabeças de gado. É uma produção não desprezável, tanto mais que se trata de raças autóctones, vitais na biodiversidade e na economia regional, pelos produtos certificados a que dão origem. No conjunto do pais serão seguramente metade. O que têm em comum são as questões sanitárias. Uns e outros estão


habituados a ver morrer animais e a desesperar por soluções! A ver surgir novas ou velhas doenças e a ser penalizados por isso. A cumprir imposições sanitárias nem sempre compreendidas. Eventualmente a aguardar resultados do laboratório ou das autoridades para poder dispor dos seus animais. Para lhes ser permitida a venda e obter seu o produto, satisfazendo as suas necessidades financeiras familiares. Ainda comum a todos eles são os preços dos seus produtos, mais ou menos penosos para todos. Em 1957 foi assinado o tratado de Roma. Nele se estabelecia, entre muitas outras coisas que o objectivo da PAC era aumentar a produtividade, tornar possível um nível de vida equitativo à população rural, estabilizar os mercados, garantir os abastecimentos e assegurar preços razoáveis para os consumidores. Não se previa que o preço da água engarrafada viria a ser muito semelhante ao do vinho e do leite, mau grado as imensas diferenças de tecnologia de produção, conservação, transporte e embalagem, como do tempo despendido de mão de obra ao longo do ano. Muito embora o núcleo de preocupações do LNIV seja o diagnóstico laboratorial, segurança alimentar e doenças zoonóticas, é necessária e urgente uma aproximação ao campo e seus problemas. Há criadores de gado a desistir das suas explorações pelos custos envolvidos no controlo de qualidade do leite. Destes, alguns são pecuária sem terra, pelo que a

sua desistência implica o desaparecimento definitivo do efectivo. Considerem este desabafo como uma aguarela apressada e mal pintada, destinada a esbater um pouco a imensa distância actual entre a cidade e o campo, entre o laboratório e a exploração pecuária. De regresso à alegoria do presente e do futuro, e sem pretender ser exaustivo permitam-me apontar alguns caminhos possíveis para o presente. Teremos antes de mais de contabilizar e avaliar o que temos, o que parece estar feito. Todos os relatórios e planos de actividades dos últimos anos contabilizam pessoas, edifícios, equipamentos, reagentes e demais activos e passivos. Parecem não contar tanto com a identidade fracturada, com a inexperiência que vem da mudança de actividade, com o moral colectivo, com a engrenagem, para além da planta desenhada. Sou tentado a fazer uma comparação com um artigo do IKEA, em que há uma diferença abismal entre o que adquirimos em fotografia e a complicadíssima montagem das peças. É de facto relativamente simples responder às perguntas: temos gente suficiente? Temos equipamento adequado? Reagentes? Instalações condignas? Estarão no bom estado exigível? Temos folga para imprevistos? Será seguramente mais difícil responder às questões humanas. Será seguramente mais


difícil responder às questões financeiras. Será seguramente mais difícil compreender o futuro. Na ausência de previsões detalhadas de Nostradamus, que teria provavelmente a tutela de outro ministério, talvez os nossos colegas patologistas aqui presentes, nos possam brindar com as últimas leituras nas entranhas dos animais, daquilo que está para vir, arte que já vem da antiguidade clássica…. Abriria aqui um outro parêntesis para não ser acusado de insensibilidade social. Desde criança, por formação, que me vem de meu pai e minha mãe, considero que a sociedade é responsável por si própria e pelos mais fracos, onde se incluem desde logo as franjas marginalizadas e na actualidade os desempregados, muito mais que as franjas do passado. Não me parece difícil que hoje qualquer um de nós tenha bem perto de si alguém nestas circunstâncias e dispenso-me de recordar os dramas humanos que ocorrem diariamente, se calhar paredes meias connosco, sem que sequer o saibamos. Não, não há insensibilidade social! O que há é necessidades antagónicas. E uma imensa dificuldade em decidir. Onde fica a fronteira entre este gasto necessário ao nosso serviço, que pode parar um matadouro ou atrasa uma semana o resultado dos soros, e a criança que não almoça? Ou o idoso que não tem medicamentos? Ou um serviço que fica estacionado no tempo e perde os seus jovens investigadores para o estrangeiro, ou simplesmente não tem dinheiro para

lhes pagar? Onde fica o equilíbrio? Por outro lado, um país não pode parar e um país é o conjunto dos seus cidadãos e instituições. Toda uma ética e uma moral colectiva dos serviços públicos travam uma guerra sem quartel com a mesma ética e moral colectiva de índole social e humana. No dia-a-dia tendemos a esquecer um pouco estas questões, como esquecemos os nossos problemas pessoais, quando estamos empenhados nas tarefas da profissão. É então necessário um esforço acrescido de contenção e de avaliação das reais necessidades. 1 - Começaria por uma preocupação de longa data, com mais de 20 anos. Na altura, já docente, os alunos tinham um estágio curricular, vulgarmente conhecido como “Trabalho de Fim de Curso. Confesso que os alunos eram tantos e as solicitações tantas, que por vezes me era difícil arranjar temas para todos. Assim, estando em plena campanha da Brucelose, época em que o tratamento da informação era ainda incipiente (hoje pode, ou deveria poder, saberse em tempo real os dados epidemiológicos mais importantes) pensei em destacar vários alunos com o mesmo programa de trabalho para concelhos diferentes, plano em que incluiria o levantamento dos casos humanos. Mal eu sabia no que os estava a meter. As dificuldades com o levantamento dos casos humanos foram inultrapassáveis pois esta informação estava como que blinda-


da, inacessível, mesmo pedindo evidentemente sem nomes ou moradas dos pacientes. No presente, tanto quanto sei, esta dificuldade de comunicação mantem-se por razões que me são desconhecidas, mesmo sendo já evidente a necessidade de partilha de informação para a compreensão e controlo de doenças zoonóticas. De facto, há já uma década que se fala do conceito de uma só saúde (one health) que parece mais evidente sobretudo nos casos da gripe aviária e gripe A. Em plena crise da gripe aviária, em 2006, o LNIV recebeu visitas de diversas entidades, nomeadamente da Direção Geral de Saúde, genuinamente preocupada com o decorrer da situação internacional e procurando informar-se detalhadamente da atividade da componente veterinária do problema. Tive oportunidade de acompanhar essa visita que resultou numa troca franca de opiniões, nomeadamente a vantagem em as duas instituições trabalharem mais de perto, em conjunto. Se é verdade que isto já sucede, também é verdade que tem dependido mais da boa vontade dos investigadores do que da proximidade das instituições. Há pelo menos uma dezena de zoonoses “novas” ou menos novas que necessitam estudo e prevenção. A título de exemplo poderei avançar a ocorrência de cerca de 3000 casos de febre Q entre 2007 e 2010 na Holanda, necessitando tratamento

hospitalar, resultando em cerca de 30 mortes e centenas de casos crónicos. Calcula-se que o número total de casos tenha atingido os 40.000. Que sabemos nós veterinários de infeções/infestações diagnosticadas nos hospitais e Centros de Saúde com origem em alimentos de origem animal ou em animais, por transmissão directa? Incluiria os animais de companhia, tantas vezes a viver em andares, em convivência estreita com as pessoas. Recordo ainda a que lista de zoonoses, que o não eram há vinte anos, tem vindo a aumentar. O desafio seria estabelecer pontes de trabalho, com objectivos definidos e rotinas bem estabelecidas no campo institucional, com as autoridades de saúde, de forma permanente e não só em tempo de crise. 2 - Insisto no tema investigação que nem discutirei, como forma de garantir inovação e solidez de conhecimentos. Uma instituição como esta necessita de trabalho de vanguarda. 3 - Uma outra área em que é necessário investir, apesar do grande número de projectos que o LNIV tem submetidos e aprovados, é precisamente a procura de parcerias externas, nomeadamente com empresas e associações. A experiência recente com os projectos PRODER inovação, da responsabilidade das empresas, mas exigindo a participação de organismos vocacionados para a investigação aplicada, foi muito positiva e


há procura de parceiros, por parte das empresas. É necessário dirigir os projectos de investigação num sentido comercial. É também o caso dos projectos INTERREG, mais tarde POCTEP e também SUDOE, entre vários outros, cuja normativa permitia incluir investigação aplicada na área sanitária, desde que devidamente enquadrada nos objectivos gerais. É importante favorecer esta interface. O dia a dia atarefado dos investigadores e a natureza complexa da documentação necessária a novos projectos, sugere ainda a vantagem de um gabinete especializado trabalhando muito perto dos investigadores e demais técnicos, fornecendo apoio na elaboração e dando exemplos de projecto aprovados. 4 - Preconizo ainda uma colaboração mais estreita com as OPP, Organizações de Produtores Pecuários, cuja actividade normal é a recolha de amostras. Muitas vezes, o laboratório tem a dificuldade da aquisição de amostras por dificuldades financeiras, humanas ou distância aos seus alvos. Estas parcerias reúnem duas das quatro necessidades da investigação, como sejam a amostra, o laboratório e, a resolver caso a caso, o financiamento dos reagentes/pessoal. A quarta necessidade, o problema a resolver, é comum. A captação de verbas de investigação, em muitas instituições, está a suprir boa parte das deficiências actuais. Permite ainda, prevendo a contratação de bolseiros, dar uma

oportunidade aos mais novos de mostrar o que valem e, com o tempo, reter os melhores. 5 - Estes bolseiros podem revestir-se na forma de programas de doutoramento, mão de obra auto motivada e altamente diferenciada. A existência de laboratórios sofisticados e muitas vezes amostras em abundância sugere a criação de programas de doutoramento em parceria com universidades, para solução de questões práticas e não tanto investigação fundamental. É indispensável pensar também na empregabilidade futura dos mestrandos e doutorandos, para não cometer os erros do passado. 6 - Outra área passível de desenvolvimento é o apoio a clínicas de pequenos animais, dado o enorme incremento que têm vindo a verificar-se nos animais de companhia, e isto mesmo apesar da crise financeira. 7 - Deixem entrar a cultura dos ténis, dos brincos e dos cabelos compridos, da gente nova cheia de força e de ideias malucas (malucas para nós) pois a nossa idade serve para os temperar, para lhes dar uma base que, embora conquistada em 30 ou quarenta anos de estudo, não é mais nada do que o seu ponto de partida. Fim Não conheço ninguém que não tenha como hobbie alguma espécie de arte. Neste sentido, se me permitem uma alegoria musical, e terminaria aqui a minha intervenção que


já vai longa, o LNIV é como que uma orquestra com um trecho de um compositor centenário, um clássico. Usa instrumentos mais ou menos sofisticados, os seus laboratórios, e músicos virtuosos, os seus técnicos. A música soou melódica, logo triste, mais tarde gaiteira, allegro ma non troppo, tantas vezes triunfal. Após o presente, e de acordo com o maestro, pode vir a tocar fado, música erudita, jazz, rap ou até flamenco, assim as necessidades do país e da ciência o exijam, mas os músicos são a sua alma. O seu virtuosismo, dedicação, trabalho e vontade fazem a orquestra. E já termino com a sequência lógica desta minha alegoria musical, pedindo a vossa paciência por 30 a 40 segundos mais para ouvir um trecho de HOLST – Os Planetas, Jú-

piter - que, embora não me sendo possível dedicar ao LNIV, por não ser da minha autoria, posso pelo menos desejar. É uma obra composta em 1914, da exacta idade do LNIV e que como o LNIV sobreviveu até hoje. É um trecho vivo, de calma exaltação, que vos convido a ouvir e depois aplaudir, não tanto pelos meus dotes oratórios mas em especial pela beleza e segurança centenária que nos transmite. Música Estou seguro que dentro de 100 anos o LNIV, Eça de Queirós, Almada Negreiros e a música de Gustav Holst, todos contemporâneos, perdurarão como até aqui.

Muito obrigado


Ă?nicio


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