A liberdade perdeu dois combatentes: Paulo Autran e Zé Aparecido Autran marcou forte presença nas lutas libertárias com seu desempenho em Liberdade, Liberdade, em 1965. Aparecido, um cassado, resistiu à ditadura. Páginas 39 e 40
Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa
Jornal da ABI
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Em cena, Gláuber Rocha, o jornalista
A CAUSA DA ABI É NOBRE, DIZ SARNEY
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Ele apela à Senadora Ideli Salvatti para apressar o parecer ao projeto que retira do sufoco a ABI, a ABL e o Instituto Histórico. Página 11
MINISTRO MARINHO OUVE AS NOSSAS RAZÕES PÁGINAS 11 E 12
A MULHER ENTRA EM CAMPO MARLUCI MARTINS OUVE ROMÁRIO: HÁ MAIS MULHERES COBRINDO FUTEBOL . PÁGINAS 3, 4, 5 E 6
AS ESTRADAS INSEGURAS,
PAULO HENRIQUE AMORIM E REALI JR.
NOVA FORMA DE GENOCÍDIO
“Nossa imprensa é ruim”, mas mesmo assim o grande capital está de olho nela
ACIDENTES COMO OS DA BR-282, QUE MATARAM 27 PESSOAS, TORNAM ROTINA AS MATANÇAS. PÁGINA 30 E EDITORIAL NA PÁGINA 2
Páginas 13 e 14, 24, 25, 26 e 27
A RECORD LANÇA DESAFIO À HEGEMONIA DA GLOBO EM COMUNICADO A ASSOCIAÇÕES DE IMPRENSA, A EMISSORA DECLARA QUE JÁ SENTE NO AR O CHEIRO DA LIDERANÇA. PÁGINA 32
ATO NA ABI REVIGORA O CLAMOR PELA ANISTIA MAIS DE 800 REQUERENTES DO DIREITO ATÉ AGORA SONEGADO OCUPAM NOSSO PRINCIPAL AUDITÓRIO CLAMANDO POR JUSTIÇA. PÁGINA 17
JC 180 ANOS
Lula: Sou resultado da liberdade de imprensa
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Editorial
BR, TEU NOME É GENOCÍDIO A OPINIÃO PÚBLICA FICOU TRAUMATIZADA com o duplo acidente de veículos ocorrido no princípio de outubro numa das principais rodovias do Sul do País, a BR-282, a qual foi cenário de uma tragédia rodoviária que provocou a morte de 27 pessoas, além de ferimentos graves em dezenas de outras. Entre os mortos, como relatamos nesta edição, através da montagem de textos publicados em jornais, incluem-se três jornalistas, que cobriam os acidentes com a dedicação e o destemor presentes e necessários nesta profissão que tem por destinação informar o conjunto da sociedade, ainda que à custa de pesados riscos, como estes materializados no Município de Descanso, na extremidade oeste de Santa Catarina. Sem que isto represente qualquer manifestação de corporativismo, a ABI não pode deixar de deplorar tão grave episódio, que reflete o continuado abandono das rodovias do País, especialmente as administradas pela União, que se revela insensível e até mesmo indiferente, e não de agora, ao genocídio em curso entre nós há vários anos. A cada ano são dezenas de milhares de mortos em acidentes rodoviários, sem que os relatos e as denúncias dos órgãos de comunicação, principalmente os jornais e a televisão, esta com o seu poder de impressionar com a força das imagens, provoquem qualquer comoção nos altos escalões da República e gerem ações para a reversão desse
Associação Brasileira de Imprensa
quadro dramático. Ao triste total de mortes que enlutam e desestruturam dezenas de milhares de famílias junta-se uma terrível legião de mutilados, grande parte privada da possibilidade de manter digno padrão de vida pela redução brutal de sua capacidade de trabalho e pela lentidão no reconhecimento do direito a indenização a que fazem jus. Como acontece em momentos semelhantes, também no caso da tragédia do Município de Descanso os meios de comunicação empenharam-se em levantar dados e informações cuja revelação deveria cobrir de vergonha os detentores de poder no País. Pelos números do site Contas Abertas citados pela Folha de S. Paulo (caderno Cotidiano, 11deoutubrode2007,páginaC3),oGovernoFederal dispunha este ano de R$ 8,1 bilhões autorizados no Orçamento para aplicação no setor rodoviário, mas gastou apenas R$ 4,4 bilhões – pouco mais da metade (54,4%). De seu lado, o Ministério dos Transportes informou que especificamente na BR-282 foi aplicado entre 2002 e 2006 – cinco exercícios orçamentários, portanto – o montante de R$ 27,8 milhões, o que significa a cada ano a inversão de apenas R$ 8.514,00 em cada um dos 653 quilômetros da BR-282. Oito reais e 51 centavos por metro de estrada! Além do genocídio, estamos diante de um escárnio, uma afronta à Nação.
Nesta Edição Tem mulher no pedaço Genocídio / Enterrem meu coração nas cinzas do Brasil
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A história da construção da sede da ABI por quem a facilitou: Barbosa Lima Depois do Presidente, a ida ao Ministro
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Depoimento / Paulo Henrique Amorim Gente / Ana Cláudia: adrenalina pura, logo cedo
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Prestígio / A ABI homenageada em três Estados Depoimento: Reali Jr.
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A morte não estava na pauta, mas se fez presente Jornalistas do Sul-RJ tomam posição
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A Record joga pesado contra a Rede Globo “Eu sou o resultado da liberdade de imprensa”, diz Lula em ato no Rio
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Livros / Petrônio adormece os girassóis / Sylvio Pinto, um Pancetti mais humano Livros / O drama de Rodolfo Konder, um perseguido / A infância de Ziraldo, por Audálio
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Em cartaz, Gláuber jornalista O Instituto Histórico evoca com emoção a atuação de Mário Barata
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Saudades do Diário de Notícias
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SEÇÕES Aconteceu na ABI
Casa cheia por uma causa que se arrasta: a anistia Sesi abre seus serviços para nossos sócios e funcionários
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Bittar acredita numa tv digital sem discriminação O caos de Sganzerla-Welles / Zelito: A elite não olha para o povo
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Um romance proibido, por Adhemar Gonzaga / Expedito, luta e morte Liberdade de imprensa A censura chegou primeiro
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Direitos Humanos
TV Brasil já é lei, por MP Conselho reprova política de segurança
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Vidas
Câmara do Rio celebra os 41 anos do Teatro Casagrande Aparecido, o Zé dos amigos
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Paulo Autran, um combatente da liberdade
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OBSERVAÇÃO - Esta edição foi finalizada e impressa na segunda quinzena de dezembro de 2007, quando começou a circular nacionalmente.
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DIRETORIA – MANDATO 2007/2010 Presidente: Maurício Azêdo Vice-Presidente: Audálio Dantas Diretor Administrativo: Estanislau Alves de Oliveira Diretor Econômico-Financeiro: Domingos Meirelles Diretor de Cultura e Lazer: Jesus Chediak Diretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Sousa (Pajê) Diretor de Jornalismo: Benício Medeiros CONSELHO CONSULTIVO Chico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira (in memorian), Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura. CONSELHO FISCAL Luiz Carlos de Oliveira Chesther, Presidente; Argemiro Lopes do Nascimento, Secretário; Arthur Auto Nery Cabral, Geraldo Pereira dos Santos, Jorge Saldanha e Manolo Epelbaum. CONSELHO DELIBERATIVO (2007-2008) Presidente: Fernando Barbosa Lima 1º Secretário: Lênin Novaes 2º Secretário: Zilmar Borges Basílio Conselheiros efetivos (2005-2008) Alberto Dines, Amicucci Gallo, Ana Maria Costábile, Araquém Moura Rouliex, Arthur José Poerner, Audálio Dantas, Carlos Arthur Pitombeira, Conrado Pereira (in memoriam), Ely Moreira, Fernando Barbosa Lima, Joseti Marques, Mário Barata (in memorian), Maurício Azêdo, Milton Coelho da Graça e Ricardo Kotscho. Conselheiros efetivos (2006-2009) Antônio Roberto Salgado da Cunha, Arnaldo César Ricci Jacob, Arthur Cantalice, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos Augusto Xisto da Cunha, Domingos Meirelles, Fernando Segismundo, Glória Suely Alvarez Campos, Heloneida Studart, Jorge Miranda Jordão, Lênin Novaes de Araújo, Márcia Guimarães, Nacif Elias Hidd Sobrinho e Pery de Araújo Cotta. Conselheiros efetivos (2007-2010) Artur da Távola, Carlos Rodrigues, Estanislau Alves de Oliveira, Fernando Foch, Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Jesus Chediak, José Gomes Talarico, José Rezende Neto, Marcelo Tognozzi, Mário Augusto Jakobskind, Orpheu Salles, Paulo Jerônimo de Sousa, Sérgio Cabral e Terezinha Santos. Conselheiros suplentes (2005-2008) Anísio Félix dos Santos (in memoriam), Edgard Catoira, Francisco Paula Freitas, Geraldo Lopes (in memoriam), Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz, José Amaral Argolo, José Pereira da Silva, Lêda Acquarone, Manolo Epelbaum, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Pedro do Coutto, Sidney Rezende, Sílvio Paixão e Wilson S. J. Magalhães. Conselheiros suplentes (2006-2009) Antônio Avellar, Antônio Calegari, Antônio Carlos Austregésilo de Athayde, Antônio Henrique Lago, Carlos Eduard Rzezak Ulup, Estanislau Alves de Oliveira, Hildeberto Lopes Aleluia, Jorge Freitas, Luiz Carlos Bittencourt, Marco Aurélio Barrandon Guimarães, Marcus Miranda, Mauro dos Santos Viana, Oséas de Carvalho, Rogério Marques Gomes e Yeda Octaviano de Souza. Conselheiros suplentes (2007-2010) Adalberto Diniz, André Moreau Louzeiro, Arcírio Gouvêa Neto, Benício Medeiros, Germando de Oliveira Gonçalves, Ilma Martins da Silva, José Silvestre Gorgulho, Luarlindo Ernesto, Luiz Sérgio Caldieri, Marceu Vieira, Maurício Cândido Ferreira, Yacy Nunes e Zilmar Borges Basílio. COMISSÃO DE SINDICÂNCIA Ely Moreira, Presidente; Carlos di Paola, Jarbas Domingos Vaz, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio Cândido Ferreira. COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO Alberto Dines, Artur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan Alves Filho e Paulo Totti. COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOS Audálio Dantas, Presidente; Arthur Cantalice, Secretário; Arcírio Gouvêa Neto, Daniel de Castro, Germando Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy Mary Carneiro, Maria Cecília Ribas Carneiro, Mário Augusto Jakobskind, Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles, Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yaci Nunes.
Jornal da ABI Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andar Telefone: (21) 2220-3222/2282-1292 Cep: 20.030-012 Rio de Janeiro - RJ (jornal@abi.org.br) Editores: Francisco Ucha, Maurício Azêdo e Benício Medeiros Projeto gráfico, diagramação e editoração eletrônica: Francisco Ucha Apoio à produção editorial: Ana Paula Aguiar, Fernando Luiz Baptista Martins, Guilherme Povill Vianna, José Ubiratan Solino, Maria Ilka Azêdo e Solange Noronha. Diretor responsável: Maurício Azêdo Impressão: Taiga Gráfica Editora Ltda Avenida Dr. Alberto Jackson Byington, 1808 Osasco, SP (11) 3693-8027 As reportagens e artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do Jornal da ABI.
ESPECIALIZAÇÃO
UCHA
Jornais e emissoras de rádio e televisão contam com um time respeitável de mulheres, que venceram preconceitos e se revelam tão competentes quantos os seus colegas homens.
TEM MULHER NO PEDAÇO POR RODRIGO CAIXETA
É
crescente a presença cada vez maior da mulher no esporte. E elas não estão só praticando: vêm demonstrando talento e segurança nas coberturas jornalísticas em todas as mídias. Entendem de basquete, rali, Fórmula-1, futebol, e, em geral, torcem também. Mariana Becker, repórter e apresentadora da TV Globo, começou carreira na Geral, mas, no dia-a-dia, “achava muito mais graça na leveza, na luta, na emoção do esporte”. Diz que enveredou na editoria por prazer e cobriu todas as modalidades que lhe foram pautadas, além de ter feito “muitas viagens longas e contemplativas, que pediam papel e caneta”: — Daí veio o hábito de escrever sobre o que vejo e gente que conheço. Mas, para ser uma candidata à edito-
ria, é preciso ler muito, ser curiosa, ter desenvoltura, interesse e predisposição para trabalhar pra valer e se deixar absorver pelo jornalismo. Nas horas vagas, Mariana surfa — “praticar esporte mantém a sanidade mental”, diz. No trabalho, gosta de cobrir esportes radicais, “porque têm muito mais imprevistos e costumam ser praticados em ambientes naturais”. Quando a pauta envolve viagens, aproveita a oportunidade para estudar a cultura e a geografia, desenhar o roteiro da história, escolher a trilha sonora e “tudo mais que a produção de um quase minidocumentário envolve”: — Por outro lado, a adrenalina diária de se fazer uma matéria com pouco tempo para apurar e concluí-la tem um gosto especial. Provar a própria agilida-
de com o tempo limitado é um exercício gostoso. Glenda Kozlowski, apresentadora do Esporte espetacular — Edição São Paulo, entrou por acaso no jornalismo esportivo. Queria fazer teatro, mas a mãe não gostava da idéia. Em 1992, foi convidada pela SporTV para apresentar o programa 360º e acabou se apaixonando pela profissão. Atleta profissional de body-boarding — conquistou quatro títulos mundiais, cinco brasileiros, dois norte-americanos e três australianos —, Glenda pratica vários esportes, como natação, tênis e vôlei, e anda de skate com o filho: — Adoro me exercitar. Esporte é minha vida e meu trabalho. Consegui me realizar. Sobre a formação dos futuros profissionais, analisa: — Ainda que estejam
mais bem preparadas atualmente, as faculdades nos apresentam apenas à parte teórica. Os alunos se formam com uma noção do que é edição, produção, reportagem, apresentação. Mas o dia-adia é o grande professor, a prática é o grande livro. A busca do diferente Quando era estagiária, Marluci Martins, repórter de O Dia, passou por todas as editorias do jornal, mas o interesse pelos eventos esportivos e o domínio do assunto fizeram que seu desempenho fosse melhor “onde sempre quis estar”. Para ela, o jornalista de Esportes difere dos demais pela criatividade: — Um setorista do Flamengo vai diariamente ao treino do time e, dependendo do jornal para o qual trabalha, tem que Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
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ESPECIALIZAÇÃO TEM MULHER NO PEDAÇO
voltar com uma, duas, três, quatro, cinco matérias. É diferente do repórter que vai cobrir um tiroteio num dia e um atropelamento no outro. Ele tem que achar alguma coisa diferente naquela rotina, num treinamento que acontece todos os dias quase que da mesma forma. Haja imaginação! Marluci lembra ainda que a proximidade com a fonte não pode interferir no resultado do trabalho: — A credibilidade é tudo na vida de um jornalista. Por exemplo: o jogador fulano de tal se tornou meu amigo e me deu um furo jornalístico, mas ele tem que entender que se jogar mal vai levar nota zero. É preciso separar as coisas. Recentemente, liguei pra um dirigente de clube que conheço há séculos, pois queria fazer uma entrevista com um jogador acusado de tentativa de estupro, entre outros rolos. O dirigente disse que conseguiria a entrevista para mim, com exclusividade, se eu prometesse aliviar o jogador. Agradeci e disse que não queria mais fazer a entrevista. Denise Mirás, subeditora de Esportes do Jornal da Tarde, está há 26 anos na editoria em que pensou que ficaria ape-
vende jornal, para mim, não é verdade. A boa história, bem contada, é lida, sim. E em qualquer editoria. Respeito é bom Heleni Felippe, repórter do Estadão, ingressou no jornalismo esportivo quando foi trabalhar na assessoria de imprensa do Pão de Açúcar Esporte Clube — que tinha equipes de tênis, atletismo e vôlei e um piloto de Fórmula Ford, Pedro Paulo Diniz. Ela diz que gostar de esporte é fundamental para trabalhar na editoria: — Cubro todos os esportes olímpicos: atletismo, basquete, natação, vôlei, vela, judô, hipismo... Já fiz quatro edições dos Jogos Pan-americanos e três Olimpíadas. Adoro. O problema, diz Heleni, é que, como o esporte faz parte do cotidiano, “todo mundo comenta e acha que entende do assunto”. — Qualquer jornalista, de qualquer editoria, deve ter curiosidade intelectual, ler muito, falar línguas e gostar de um trabalho sem horários ou dias fixos. Mas cobrir esportes também pressupõe que o repórter seja capaz de identificar um Ministro de Estado ou um astro de rock numa arquibancada, por exemplo. Há um ano repórter de Esportes do Estadão, Amanda Romanelli diz que trabalhar nessa área era um sonho de infância. Às novatas ela adverte que na Redação de um diário não há tempo para aprender o ofício. Portanto, quem costuma acompanhar competições leva vantagem, pois já conhece, entre outras coisas, o jargão, as regras e formas de disputa de campeonatos: — Da faculdade, é necessária a bagagem básica para qualquer editoria: bom texto e disposição de sempre propor boas pautas. Deborah Lannes, editora-geral do Jornal dos Sports, foi triatleta e chegou a cursar até o 5º período de Educação Física: — Foi quando descobri que gostaria de me relacionar de outra forma com o esporte. Como também sempre gostei de escrever, fiz Jornalismo. Mas interesse, bom senso, capacidade de discernimento, conhecimento da língua portuguesa e bom texto não se aprendem na faculdade. Embora não se considere especialista num esporte específico, nem tenha predileção por qualquer esporte, Deborah diz que há um envolvimento mais forte com o futebol, que ocupa a maior parte do noticiário. Sobre a relação amistosa com os atletas, destaca que confiança e respeito são indispensáveis para criar fontes e, conseqüentemente, conseguir furos: — Mas a amizade, em alguns casos, pode até atrapalhar, porque você pode se envolver emocionalmente com o assunto, o que não é apropriado.
“A prática da profissão é o grande livro”
Radialista em Teresópolis, Andréa Maciel apresentava lá um programa esportivo. No Rio, mergulhou fundo no mundo do futebol.
nas 15 dias. Para ela, qualquer área da imprensa é igual: — Jornalista é jornalista, tem que perguntar, se informar, entender e transmitir. Não é uma brincadeira, como alguns entendem, de ficar fazendo notinhas de atletas. Não estamos aqui para deseducar ou desinformar, mas para dar chance aos leitores de crescer. A forma como é feita a cobertura do futebol atualmente, em sua opinião, é muito chata: — Nem adianta imaginar que se possa discutir isso. O argumento de que, com mais esportes, mais gente leria a editoria e de que futebol é que 4
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Aprendendo na marra Glenda Carqueijo, repórter do Jornal da Tarde, credita aos pais, professores de
Educação Física, o interesse pelo esporte. Sempre soube que queria trabalhar na área, mas diz que o caminho foi longo: — Só há dois anos comecei na editoria, cobrindo “outros esportes”, ou seja, tudo que não é futebol. Não somos obrigados a entender todas as regras, mas quem souber mais terá mais facilidade para escrever e trabalhar. Os repórteres muitas vezes se identificam com um ou mais esportes, mas há aqueles em que você tem que dar a cara para bater e aprender na marra, como beisebol. Sanny Bertoldo, única mulher da editoria de O Globo, faz Se ainda existe preconceito contra a presença da mulher na cobertura o que sempre quis, esportiva é no futebol, diz Sanny Bertoldo, que cobre outras áreas. mas acredita que, mais do que a paixão pela atividade, é preciso ter disponibiTambém da Rádio Globo, mas no lidade: — Os plantões são pesados e a Rio, Andréa Maciel começou carreira carga horária varia de acordo com o hoem Teresópolis, onde apresentava um rário das competições. Também não programa no domingo pela manhã, com faz sentido dizer que os repórteres de comentários, resultados da rodada de sáesporte são menos preparados que os de bado e os jogos do dia: — Na mesma outras editorias, para as quais muitas época, o time da cidade, Barra Futebol vezes fazemos matérias. Para ser jornaClube, disputava a seletiva no Campelista, é necessário ter bom texto e boa onato Carioca e eu gravava matérias, faapuração e, principalmente, saber diszia especiais e fui me apaixonando cada cernir o que é notícia. vez mais por aquele mundo. A rádio do Carla Matera, repórter da Rádio Glointerior é escola para muita gente e na bo de São Paulo, diz que foi o jornaliscapital, quando me tornei setorista do mo esportivo que entrou em sua vida. Botafogo, entrei fundo no universo do Era locutora-noticiarista e repórter de futebol, em que me sinto à vontade. outra emissora quando o patrão, no Dia Internacional da Mulher de 1999, a convocou para participar da jornada esportiva no Maracanã, que incluía um torneio de futebol feminino: — Na hora, relutei e argumentei que não sabia nada de futebol. Meu chefe, no entanto, não se comoveu, respondendo que eu também não precisava ser médica para entrevistar um cirurgião. Fui, cheia de receio, mas ele gostou do meu “clima” na transmissão. Então, passei a cobrir o campeonato estadual de futebol feminino e, depois, fui incorporada à equipe de Esporte. Embora afirme estar bem longe de ser atleta, Carla orgulha-se de ter feito um gol no Maracanã, numa promoção de intervalo de jogo. No trabalho, porém, é preciso disposição para suportar a maratona: — A carga horária é pesada. Viaja-se muito e as folgas, normalmente, são de apenas um dia e durante a semana.
Iniciada na profissão como assessora de imprensa do Pão de Açúcar Esporte Clube, Heleni Felipe cobre todos os esportes olímpicos. Trabalhou em quatro edições do Pan e três Olimpíadas. “Adoro”, diz.
Quando Andréa começou, não era exigida formação acadêmica em Jornalismo: — Na minha opinião, o fundamental é entender, é gostar do assunto, ter conhecimento de causa e, claro, talento. A faculdade pode ensinar muitas técnicas, mas o talento é seu. O José Carlos Araújo era professor de Geografia e vai dizer que algum jornalista aprendeu a ser bom como ele na faculdade? Os pré-requisitos são conhecimento, rapidez de raciocínio, boa voz, boa dicção, humildade e sabedoria.
ta funciona bem como comentarista, colunista, e muitos são brilhantes, como o Sócrates. Glenda Kozlowski, no entanto, acredita que alguns atletas podem desempenhar um bom papel como jornalistas: — Até porque os atletas entendem mesmo do esporte, sabem traduzir o que o técnico pediu, o que acontece em determinado momento. Para ela, difícil na profissão é a estabilidade, a longevidade: — Isso a gente só consegue com anos e anos de trabalho e dedicação. São muitas horas numa ilha de edição, muitos feriados longe da família, muitos aniversários na Redação, muita chuva na rua, muito calor na arena e por aí vai. Marluci Martins, de O Dia, é defensora do diploma de Jornalismo e afirma que é preciso se preparar: — Gosto de ver ex-jogadores ou ex-árbitros comentando jogos, mas o candidato ao posto de jornalista deve ter alguns conhecimentos básicos. O Robson Caetano, por exemplo, fez faculdade de Jornalismo, assim como a Glenda Kozlowski. Citoos porque os entrevistei inúmeras vezes quando eram atletas de alto nível.
“Alguém aprendeu na faculdade a ser tão bom quanto o José Carlos Araújo?”
Quem pode opinar? Outro ponto polêmico no jornalismo esportivo é a participação de atletas nas coberturas. Mariana Becker analisa o surgimento de atletas como comentaristas ou ainda como “repórteres especiais”, especialmente em eventos internacionais: — O atleta tem informações valiosas de quem foi criado no meio, mas é preciso mais do que isso. É preciso treinar a escrita, a maneira de se expressar, o olhar. O jornalista sabe que tem certas obrigações morais e técnicas na feitura de uma reportagem. Já o atle-
senvoltura etc. Para escrever também é preciso habilidades específicas, que um atleta pode ou não ter. Carla Matera, que faz rádio, também é incisiva: — Em determinados eventos, vale um atleta participar de uma transmissão, até mesmo para falar de suas experiências, mas não como profissional de comunicação. Amanda Romanelli, do Estadão, considera importante a participação de atletas como comentaristas nas Olimpíadas, para deixar o público mais perto das regras de certos esportes: — Também é interessante porque às vezes Amanda Romanelli considera importantes os comentários de permite um resgate atletas nas coberturas, mas adverte: Jornalismo é mais do que isso. histórico de campanhas brasileiras em Heleni Felippe, do Estadão, é firme em competições, por meio de depoimentos sua opinião: — O conhecimento em si no testemunhais. O trabalho jornalístico, esporte não significa que o atleta tenha no entanto, vai além disso. outras habilidades, como ser sucinto, saDeborah Lannes, do JS, concorda: — ber falar ao vivo, ter bom português, deAtleta pode ter grande conhecimento,
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vivência, o que contribui, mas não tem necessariamente visão jornalística. Nada impede, porém, que um atleta faça curso de Jornalismo e participe de coberturas em competições, o que muitos já fazem, e muito bem. Glenda Carqueijo, do JT, vê mais aspectos positivos que negativos na participação de atletas em coberturas esportivas: — Quando se domina um assunto, fica mais fácil falar dele, especialmente em esportes mais complexos, como a ginástica artística, que requer um olhar mais técnico para entender cada pontinho perdido em uma acrobacia ou simplesmente para dizer se a atleta está indo bem ou não na apresentação. Preconceito: em queda A participação das mulheres nas coberturas esportivas enfrenta ainda dois preconceitos: em relação ao sexo e em relação à própria editoria, que teria repórteres menos preparados ou cultos. Mariana Becker, da TV Globo, diz que na Reportagem da emissora há dez homens e uma mulher, mas há cerca de cem profissionais envolvidos na edição e produção e mulheres em todas as áreas. Sobre a crença de que mulher não entende de esporte, comenta: — Já passei por algumas situações de preconceito, geralmente veladas. Às vezes surge na expressão de surpresa quando você demonstra conhecimento, cultura, em determinados assuntos. E eu acho que o trabalho responde melhor do que qualquer discussão. Glenda Kozlowski, também da TV Globo, diz que jamais sofreu algum tipo de preconceito: — Fazemos de tudo e quem forja a editoria é o profissional. Por exemplo, o Marcos Uchoa hoje é chefe no escritório de Londres, o Renato Ribeiro está na Alemanha e o João Pedro Paes Leme está em Paris
Triatleta, Deborah Lannes chegou a cursar o 5° ano de Educação Física, mas descobriu que tinha de se relacionar com o esporte como jornalista. Decidiu então fazer e fez o curso de Jornalismo.
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Marluci Martins diante de Ronaldo Fenômeno: Ela acha que as jornalistas preferem cobrir mais os esportes olímpicos do que o futebol e tenta convencê-las a ampliar seu leque de interesse.
como correspondente. São três profissionais que começaram no Esporte e ganharam o mundo. Precisa dizer mais alguma coisa? Marluci Martins conta que no Dia o quadro de repórteres tem quatro mulheres e cinco homens e observa uma tendência de as mulheres preferirem cobrir esportes olímpicos: — Não entendo isso e venho tentando convencê-las a ampliar o leque de preferências, pois vão lucrar com isso na profissão. Ainda há muito espaço a ser conquistado pela mulher e admito que elas estão se interessando mais por esportes. Hoje esbarro com muito mais mulheres nas coberturas esportivas do
que na Copa de 94, quando havia menos de meia dúzia. Denise Mirás, do Jornal da Tarde, enfrenta o preconceito da seguinte forma: deixa entrar por um ouvido e sair pelo outro. — Nenhum homem que conheça uma jornalista que cubra bem Esporte se mete a dizer que ela não entende do assunto, porque na primeira pergunta que ela lhe fizer o fulano não vai saber responder. Já Heleni Felippe, do Estadão, diz que o preconceito diminuiu, embora ainda exista no futebol: — Mas isso é coisa do homem brasileiro, não do jornalista em particular. Se aparece alguma menina bonita, eles sempre comentam que ela “bate um bolão” — pelas costas e entre eles, é claro! —, antes de reconhecer que é uma boa repórter. Acredito que conquista de espaço está proporcionalmente ligada à competência. E a escolhas. Ainda não são muitas as mulheres que escolhem Esportes, mas o espaço aumentou, e muito, nas duas últimas décadas. Também do Estadão Amanda Romanelli reforça que é totalmente preconceituosa a alegação de que o repórter de Esporte é menos preparado do que o de outras editorias: — Alguns dizem que para escrever algo popular é necessário empobrecer a linguagem. Não me consta que Nelson Rodrigues, grande cronista de futebol, fosse um despreparado. Para Deborah Lannes, do Jornal dos Sports, jornalista bom trabalha em qualquer setor: — Esporte tem concorrência e busca por furos e exige muita dedicação como qualquer outra editoria. O preconceito existe, mas é menos evidente hoje. Sinceramente, não me preocupo com isso. Acho tão ultrapassado
ter este tipo de pensamento que prefiro me concentrar em outras coisas. Glenda Carqueijo, do JT, acredita que as mulheres só precisam de oportunidade: — É preciso parar com essa história de que mulher não entende de esportes. Se você escolheu esta área é porque se interessa, porque gosta. Sanny Bertoldo, de O Globo, diz que os homens hoje estão mais acostumados com a presença das mulheres em um ambiente que já foi exclusivamente deles. — Se ainda existe preconceito é no futebol, que não faz parte da minha pauta. Cubro especialmente atletismo, vela, ginástica, hipismo e esportes radicais, que adoro. Carla Matera, da Rádio Globo-SP, conta: — Certa vez, durante uma coletiva, um treinador se chateou com uma pergunta que fiz e discutiu comigo no ar. Depois, orientado por sua assessoria, ligou para a rádio e pediu para entrar no ar, sob a alegação de que achava ter sido grosseiro comigo. Jogou confete em mim, disse que sou dedicada etc, mas, no fim, soltou a pérola: “Queria mesmo me desculpar e dizer que a Carla, apesar de mulher, é uma excelente repórter!” Andréa Maciel, da Rádio Globo-RJ, diz que a mulher tem que provar sempre que sabe do assunto e, quando faz um comentário, é muito mais exigida: — O torcedor de futebol não tolera erros dos repórteres masculinos, imaginem de uma mulher. Mas de forma geral sempre tive apoio dos meus colegas e nunca fiquei de saia justa.
“Apesar de mulher, é uma excelente repórter”
Esta reportagem foi produzida em fevereiro de 2005. Ressalvada a rotatividade de empregos, os depoimentos e opiniões nela contidos mantêm atualidade.
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GENOCÍDIO
Enterrem meu coração nas cinzas do Brasil Quando o primeiro homem branco pôs os pés no litoral brasileiro – há quase quinhentos anos – recebeu dos indiozinhos que se aproximaram sorrindo curioso presente: um cocar de penas brancas. Meio envergonhado, ele retribuiu a oferta – e lhes deu um pesado sombreiro negro. Tinham início as dolorosas relações entre selvagens e civilizados. Começavam alegremente: terminariam mal. Pois dos cinco milhões de índios que naquela época viviam do Oiapoque à barra do Chuí – entre o Rio Javari e o Cabo do Santo Agostinho – hoje restam cerca de cem mil, na sua maioria desorientados, alquebrados, insanos, desdentados, entorpecidos, abobados. Foi na Amazônia que se desenrolou a etapa mais dramática desta destruição. Ali, em pleno século das luzes, um bando de molambeiros se atirou sobre os indígenas com o objetivo de se apossar de mão-de-obra barata para alimentar o monstro industrial da borracha. A nação Waiká foi a primeira a receber o impacto. Sobre os Xirians caíram os abutres do ramo mercantil: mascates, comerciantes de armas e de cachaça. Os Guaharibos tiveram destruídas as habitações que constituíam a base de sua vida comunal primitiva – e se desintegraram. O massacre mais brutal foi nos vales do Juruá e do Purus, onde outrora se encontravam as maiores reservas seringueiras do mundo. As nações Pano e Aruak foram rapidamente dizimadas. Índios altivos arrojavam a fonte ao pó diante da imensa superioridade do branco, de sua inteligência diabólica. Entrava em cena um especialista em matar índios: o bugreiro, capanga de tocaias e traições; aborto tardio do bandeirante predador – deus do jaguncedo. Nos extensos vales do Tapajós e do Madeira, os Tora e os Mundukuru tentaram se constituir numa barreira ao avanço branco. Também o povo Piritin cobrou um alto preço (em sangue) pela borracha que um dia foi extraída da floresta para fabricar os pneus das limusines das grã-finas da Cote d´Azur – ou dos carros de combate que iriam rolar nas areias do Ryff africano. Carijós, Xucurus, Portiguaras: deles só resta a memória. Contra os Timbiras travou-se uma luta prolongada porque os índios se refugiavam na Serra Geral, de onde raramente saíam. Mas quando se tornava difícil destruí-los pela guerra, eram atraídos para a periferia de povoados sórdidos, onde as doenças e o álcool se encarregavam do resto. Algumas nações foram jogadas con8
Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
MARCELLO CASAL JR./ABR
POR P AULO RAMOS D ERENGOSKI
“Apesar de todos os discursos (e artigos bonitos), estamos na antevéspera da descida do pano sobre a tragédia de nossas populações autóctones.”
tra outras, como os Krahós, que se especializam em escravizar seus irmãos, para vendê-los aos brancos em troca de cachaça e sal. Somente os mais ariscos e alçados conseguiram sobreviver, como os Gaviões, que até hoje se escondem pelas margens do Tocantins. No coração do Planalto Central, a nação Karajá foi das mais judiadas: os poucos que restaram são atração turística na Ilha do Bananal, onde sacodem a bunda para fotografias coloridas. Os ingênuos Xerentes – que chegaram a transformar D. Pedro II em seu “deus” – também desapareceram do mapa. No coração do País ainda restam alguns Kayapós e Xavantes que só sobreviveram por serem ferozes e arredios. E os Bororós, outrora notáveis por sua robustez física, entraram em decadência. No vasto pantanal de Mato Grosso viviam os Mbayás-Guanicurus, os primeiros índios do continente a utilizar o cavalo como montaria. Aliados do Paraguai, chegaram a construir batalhões que lutaram ao lado dos brasileiros para impedir a penetração guarani ao norte do Rio Apa. Pois desses altivos ca-
valeiros restam hoje pouco mais do que dez indivíduos arrasados. Tristes trópicos: Kadivéus, Guanás, Otis, Terenas, todos se acabaram. Alguns tomados de impulsos místicos alucinatórios se suicidaram – ou fugiram em direção ao Mar, numa ânsia louca de Liberdade. Outros terminaram mendigando à beira das estradas asfaltadas do progresso, como os Botucudos, os Maxacalís e os Pataxós. No Sul, os descendentes dos Kainguangues e dos Xoklengs se subdividiram em pequenas tribos, para fugir à penetração dos colonos. Erro fatal: bugreiros profissionais foram contratados para exterminá-los até à morte. Dentre os poucos índios que restam, espalhados pela vastidão do território brasileiro, muitos perderam até mesmo a noção da realidade. E ainda acham que suas nações um dia voltarão em toda a glória e esplendor, renascendo das cinzas de Kanê: revivendo entre a vasta cabeleira de Karô que voam – altaneiros e invisíveis – além das nuvens do céu, de onde tudo observam através de seus olhos de carancho-de-penacho-branco. Lá, nas alturas, eles sentem desprezo por
aqueles homens pálidos e enfermiços que um dia massacraram seus povos. E esperam o momento de desabar sobre a Terra – com fúria – como nas assombrações do Boitatá e do Quer-Quer-É. Mas não tenhamos ilusões... Apesar de todos os discursos (e artigos bonitos) estamos na antevéspera da descida do pano sobre a tragédia de nossas populações autóctones. Os índios estão no fim. Em breve, deles só restará a memória: foram apagados como os desenhos que o santo padre Anchieta – José do Brasil – um dia fez nas areias das praias de São Vicente; varridos pelas ondas sempre fortes e renovadas do ódio; afogados pelo profundo mar da ignorância. E quando raiar o Milênio, quando alvorecer o ano 2001 entre as neblinas das florestas brasileiras, os índios já não poderão contemplar o brilho das espadas e a beleza dos estandartes. Nem ouvir o tropel empoeirado e colorido da Morte... Paulo Ramos Derengoski, jornalista e escritor, é sócio da ABI. Este artigo foi escrito antes do começo de 2001 e relata uma situação que desde então só se agravou.
Caymmi feliz por estar na Comissão de Honra
Ao discursar na cerimônia dos 90 anos da Casa, Barbosa Lima Sobrinho contou como se tornou realidade o sonho da sede própria, graças à fusão das três entidades de jornalistas existentes até o fim dos anos 20. No discurso que proferiu no ato comemorativo dos 90 anos da ABI, em 7 de abril de 1998, Barbosa Lima Sobrinho fez um relato sobre a unificação das três entidades de jornalistas existentes nos anos 20, medida que possibilitou a doação pela Prefeitura do Distrito Federal do terreno onde seria construída a sede própria da Casa, o atual Edifício Herbert Moses. Com a fusão, Moses assumiu a Presidência da Casa e liderou o esforço de construção da sede, inaugurada em 10 de setembro de 1938 e que se constituiu em um dos marcos da arquitetura moderna brasileira. Audacioso, Moses promoveu um concurso nacional de projetos arquitetônicos, vencido por dois arquitetos recém-formados: Milton e Marcelo Roberto, que tinham pouco mais de vinte anos. “Neste aniversário de 90 anos da Associação Brasileira de Imprensa, não posso deixar de recordar o momento em que ingressei na ABI, convidado por um grande caricaturista que era o Raul Pederneiras, presidente da entidade. Foi no início do ano de 1921, quando eu cheguei ao Rio de Janeiro, e pouco tempo depois Pederneiras me convidava para ser presidente da Associação Brasileira de Imprensa¹, talvez pela minha atividade no Jornal do Brasil como representante na Câmara dos Deputados e, depois, pelos editoriais de que eu fui incumbido. Nessa ocasião eu tinha a idéia de que a Associação Brasileira de Imprensa fosse uma grande instituição. Mas a minha decepção foi maior pelos aspectos materiais, quando Raul Pederneiras me levou à sede da Associação Brasileira de Imprensa, que funcionava naquela ocasião no 2° andar da Rua Primeiro de Março. Foi uma batalha que eu tive depois que travar para conseguir efetivar a doação do terreno que, quando da de-
REPRODUÇÃO
O mais antigo e um dos maiores compositores brasileiros, Dorival Caymmi aceitou o convite para integrar a Comissão de Honra do Centenário da ABI e se declarou muito feliz com a lembrança da Casa, que ele conheceu desde os tempos de Herbert Moses, no final dos anos 30, quando chegou ao Rio de Janeiro. “Além de feliz, estou muito honrado com o convite da ABI”, disse Caymmi, que ressaltou o apoio que recebeu dos jornalistas desde o começo de sua carreira como compositor e cantor. “A imprensa sempre me tratou com muita atenção e muito carinho”, disse. O contato de Caymmi com a ABI foi feito no dia 29 de outubro, por telefone, por seu filho Dori Caymmi, também compositor e cantor, que disse que o pai, atualmente com 93 anos, não pode participar de eventos com a freqüência que desejaria, mas está à disposição da ABI para se fazer presente nas celebrações do centenário da Casa. Dori fez questão de passar o telefone para o pai, que expôs seu contentamento com a ABI. “Vocês estão me dando muita alegria com este convite. Estou muito feliz”, declarou Caymmi com a voz dominada pela emoção. A Comissão de Honra do Centenário é presidida por Oscar Niemeyer e com a sua constituição a ABI presta homenagem às personalidades convidadas a integrá-la e aos segmentos da vida nacional que contribuíram ao longo do século decorrido para que a imprensa do País alcançasse os padrões que hoje ostenta. Como sua designação indica, a participação na Comissão de Honra não impõe qualquer encargo financeiro ou administrativo a seus integrantes: é uma forma de a ABI homenagear, sem nada pedir, os que colaboram para a grandeza da imprensa. A ABI já recebeu dezenas de mensagens de personalidades aceitando o convite para integrar a Comissão de Honra do Centenário e começou a divulgá-las em seu Site (www.abi.org.br). Todas as mensagens serão publicadas posteriormente no Jornal da ABI.
A história da construção da sede da ABI por quem a facilitou: Barbosa Lima
Três vezes Presidente da ABI, Barbosa Lima Sobrinho renunciou no primeiro mandato para permitir que o Prefeito Pedro Ernesto doasse à Casa o terreno de sua atual e definitiva sede.
A COMISSÃO EXECUTIVA Formada por associados e diretores, a Comissão Executiva do Centenário tem a seguinte composição: Alberto Dines, Ancelmo Góis, Artur da Távola, Audálio Dantas, Aziz Ahmed, Benício Medeiros, Cecília Costa, Domingos Meirelles, Estanislau Oliveira, Fernando Barbosa Lima, Francisco Paula Freitas, Jesus Chediak, José Gomes Talarico, Marcelo Tognozzi, Maria Inês Duque Estrada Bastos, Mário Barata (in memoriam), Marlene da Silva, Milton Coelho, Miro Teixeira, Paulo Jerônimo de Souza, Pery Cotta, Ricardo Kotscho, Rodolfo Konder, Sérgio Cabral, Silvestre Gorgulho, Tarcísio Holanda e Terezinha Santos, sob a presidência de Maurício Azêdo. Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
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ARQUIVO ABI
Imprensa, que tinha direito a isso, por ser de todas as entidades a mais antiga. Desse modo, com a renúncia dos três presidentes, foi possível à Associação Brasileira de Imprensa dispor desse terreno na área do Morro do Castelo. E, graças a isso, com a renúncia do presidente da Associação Brasileira de Imprensa, foi possível depois a construção desse prédio e a posse dele para que servisse à Associação Brasileira de Imprensa, como entidade mais antiga da reunião dos jornalistas brasileiros. Quero dar essa explicação para que se veja como de fato a reunião das três entidades propiciou que elegêssemos o meu candidato à presidência da Associação Brasileira de Imprensa, que foi Herbert Moses², a quem coube realmente tomar todas as providências depois para a construção do prédio. Contamos com a boa vontade da Prefeitura do Distrito Federal, que forneceu, no período de Getúlio Vargas, todos os recursos necessários à construção deste prédio, que na verdade não custou nada à comunhão dos jornalistas brasileiros. Foi construído todo ele com reservas autorizadas pelo Presidente Getúlio Vargas. Este ligeiro histórico que estou fazendo é para mostrar como realmente a Associação Brasileira de Imprensa representa uma série de lutas, de trabalhos, de esforços até chegarmos ao momento atual. Defender as instituições brasileiras no momento em que elas não estão sendo levadas a sério pelo Governo: é nesse trabalho que estamos empenhados aqui na Associação Brasileira de Imprensa, para, de certa maneira, se fazer justiça aos jornalistas brasileiros, se fazer justiça à história tradicional da nação brasileira, desse esforço imenso para construir alguma coisa neste país à custa do auxílio, da cooperação e, muitas vezes, do sacrifício de todos os cidadãos brasileiros. Não tenho outras palavras, neste momento, do que agradecer a presença de todos os que aqui se acham, porque acho que todos têm compreendido que a Associação Brasileira de Imprensa, no momento atual, é um baluarte realmente em defesa das instituições brasileiras, para que elas representem de fato a tradição do Brasil, o respeito do Brasil às grandes normas de sua orientação e de sua atuação. Eu agradeço a todos a presença e quero dizer que estou aqui, neste momento, já numa idade mais do que avançada³, para cumprir o dever de Presidente desta Casa no momento em que ela comemora 90 anos de luta, de serviço e, sobretudo, de esforço em benefício da prosperidade do Brasil”.
Projetado pelos jovens arquitetos Milton e Marcelo Roberto em 1936 e inaugurado em 1938, o edifício-sede da ABI é um dos marcos da moderna arquitetura brasileira, graças a soluções pioneiras como o brise-soleil em toda a sua fachada.
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1.A convite de Pederneiras, Barbosa Lima Sobrinho assumiu a Presidência da ABI em 1926 e a dirigiu no biênio 1926-27. Reeleito depois para o biênio 1930-31, renunciou antes do fim do mandato, para ensejar a fusão das entidades de imprensa então existentes. 2.Moses assumiu a Presidência em 1931 e dirigiu a Casa até 1964, quando um derrame o impediu de continuar a presidi-la. Foi eleito então Presidente de Honra, cargo que exerceu até seu falecimento, em 1972, aos 88 anos. 3.Barbosa Lima Sobrinho, nascido em Pernambuco em 22 de janeiro de 1987, contava então com 101 anos. Faleceu em 16 de julho de 2000, com 103 anos.
DIVULGAÇÃO
molição da área do Morro do Castelo, tinha se reservado para a Associação Brasileira de Imprensa. Quando eu fui me dirigir a uma autoridade para que, de certa maneira, fosse autorizado à Associação Brasileira de Imprensa usar e construir um prédio naquele terreno, a resposta foi a de que não era possível deferir o meu requerimento, uma vez que havia três associações de imprensa no Rio de Janeiro: a Associação Brasileira de Imprensa, a Associação da Imprensa Brasileira, que nós chamávamos de Invertida, e o Clube de Imprensa, que era uma instituição de grande significação naquele momento pelos elementos com que se compunha. Mas quando me disseram que realmente havia uma possibilidade de uma competição, ou pelo menos de uma contestação do direito da Associação Brasileira de Imprensa, eu achei que a primeira providência a tomar seria a de procurar os representantes das outras entidades para que eles concordassem em que o terreno fosse doado à Associação Brasileira de Imprensa. Só que isso não era possível sem que eu próprio renunciasse à presidência da Associação Brasileira de Imprensa, o que eu não tive dúvida em fazer, desde que eles também renunciassem à presidência do Clube de Imprensa e à presidência da Associação da Imprensa Brasileira, para que todos nos congregássemos aqui, na construção de uma grande sede para a Associação Brasileira de
Nizan Guanaes, ás da publicidade, decidiu fazer a campanha de promoção do centenário sem ônus para a ABI.
Nizan Guanaes na promoção do Centenário Líder do Grupo Ypy, o publicitário Nizan Guanaes aceitou o convite para fazer a campanha publicitária de promoção do centenário da ABI e dos eventos que irão integrá-la, a partir de 7 de abril de 2008, quando a entidade completa cem anos. A decisão foi anunciada, em nome de Nizan Guanaes, pelo Diretor de Responsabilidade Social do Ypy, Luiz Roberto Pires Ferreira, e pelo publicitário Luiz Gonzaga Saraiva, do setor de Criação do grupo, em encontro realizado na ABI em 1º de outubro. Em reunião com o Presidente da ABI, Maurício Azêdo, Luiz Roberto Ferreira e Luiz Gonzaga solicitaram informações sobre a trajetória da Casa ao longo do século decorrido, bem como material audiovisual, sobretudo fotografias e imagens em movimento, para ilustrar a campanha. A ABI entregou a ambos um conjunto de documentos sobre as iniciativas já em curso para a comemoração dos seus cem anos, como os atos de constituição da Comissão Executiva do Centenário, a formação da Comissão de Honra, presidida por Oscar Niemeyer, e os expedientes formulados pela ABI na busca de apoio institucional para a realização dos eventos. A colaboração de Nizan Guanaes foi sugerida pelo jornalista Ricardo Kotscho, membro do Conselho Deliberativo da ABI e integrante da Comissão Executiva do Centenário, que o convidou a apoiar a programação em elaboração pela Casa. Nizan Guanaes aceitou o convite prontamente e designou o Diretor de Responsabilidade Social do grupo Ypy, Luiz Roberto Pires Ferreira, para manter contato com a ABI, visando a tornar efetiva sua contribuição aos festejos do centenário da Casa.
MARATONA
Depois do Presidente, a ida ao Ministro A ABI prossegue a sua peregrinação para tentar anular uma cobrança injusta com que o INSS a persegue. Após falar com Lula, ela expôs suas razões ao Ministro da Previdência, Luiz Marinho.
Sarney: “A causa da ABI é nobre” Após a reunião com o Ministro Luiz Marinho, os representantes da ABI foram recebidos em seu Gabinete pelo Senador José Sarney, ao qual pediram o acolhimento das emendas de aperfeiçoamento do projeto antes da votação na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado do parecer elaborado pela relatora, Senadora Ideli Salvatti (PT-SC). Sarney considerou adequadas as emendas propostas pela ABI e ponderou que o ideal é que estas sejam incorporadas ao parecer da relatora Ideli Salvatti, a fim de evitar que o processo retorne à Comissão de Assuntos Econômicos se as emendas tiverem outro signatário. Diante disso, ele redigiu no alto do expediente apresentado pela ABI um pedido à Senadora: “Ideli, Peço-lhe receber o Maurício Azêdo, Presidente da ABI. A causa é nobre. Do (a) Sarney – l7.10.07”.
O Ministro Marinho discutiu com diretores da ABI alternativas de solução para o problema que tem imposto um calvário à Casa.
Durante o encontro, o Senador José Sarney justificou a apresentação do PLS 191/206 e a necessidade de sua aprovação, pois as três instituições por ele beneficiadas estão a carecer do apoio do Poder Público. Ele expôs com preocupação alguns aspectos da situação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, que é a mais antiga instituição cultural do País, criado que foi em 1838, dois anos antes da decretação da maioridade do jovem herdeiro do trono do Brasil, Pedro II. “O Instituto Histórico passa por tremendas dificuldades”, disse o Senador. “Se não fosse a colaboração do Senado, que edita a publicação, ele não poderia manter a continuidade da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, que constitui o maior repertório de estudos e documentação sobre a História do Brasil. Essa é uma publicação valiosíssima, mais importante do que a Brasiliana, e que não pode ter a sua circulação interrompida.” Disse o Senador que o Instituto Histórico tem um prédio próprio na Lapa, construído pela União durante o Governo Médici, mas ele não se constitui em uma fonte da receita, em razão da localização. “O Instituto tem andares inteiros com salas desocupadas, Quem vai alugá-las num prédio situado naquele ponto da cidade?” Com Ideli Pela bancada de imprensa do Senado, que estava no começo de uma sessão noturna de delibera-
ção, a ABI teve acesso à Senadora Ideli Salvatti, à qual foi entregue o expediente da Casa com a mensagem que lhe dirigiu o Senador José Sarney. Empenhada, como Líder do PT, no encaminhamento da votação de projetos de interesse do Governo, a Senadora pôde apenas informar que analisaria com a maior atenção o pleito da ABI, a quem já atendera com a apresentação do parecer, ainda que sem as emendas agora solicitadas. A ABI expôs também seu interesse pelo PLS nº 191/96 aos Senadores José Agripino Maia (DEM-RN) e Demóstenes Torres (DEM-GO), que revelaram a disposição de examinar a reivindicação da Casa. ROOSEWELT PINHEIRO/AGÊNCIA SENADO
FABIO RODRIGUES POZZEBOM/ABR
consideradas para a solução do problema, de que teve notícia pelo noticiário da imprensa. Marinho admitiu submeter o assunto à apreciação do Presidente Lula, tendo em conta o interesse que ele demonstrou ao ouvir o relato da ABI.
ELZA FIÚZA/ABR.
A ABI encaminhou ao Ministro da Previdência Social, Luiz Marinho, em audiência realizada em 17 de outubro, fundamentada petição em que a Casa questiona a cobrança que lhe faz o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS para pagamento de uma dívida de contribuição previdenciária que a ABI considera indevida, pois gozou do status de entidade pública desde julho de 1917, por um decreto-lei do Congresso Nacional sancionado pelo então Presidente Venceslau Brás e, embora ainda em vigor, descumprido no Governo Fernando Henrique Cardoso, com desrespeito aos seus direitos adquiridos. A audiência foi agendada depois que o Presidente da ABI, Maurício Azêdo, relatou ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, assim que se encerrou a sessão solene comemorativa dos 110 anos da Academia Brasileira de Letras, em 28 de setembro passado, a ameaça que pesa sobre o patrimônio da ABI, colocada sob o risco de penhora e subtração de sua sede, o Edifício Herbert Moses, um dos marcos da arquitetura moderna brasileira, por uma ação de execução fiscal ajuizada pelo INSS na Justiça Federal do Rio. Alertado para a hipótese temida pela ABI de o INSS lhe tomar a sede, o Presidente respondeu: “Ninguém vai tomar a sede da ABI. Não tomaram em outros momentos, em outras épocas, e não será agora que irão tomar”. No encontro, em que foi representada por seu Presidente e pelo jornalista Tarcísio Holanda, membro de seu Conselho Deliberativo, a ABI solicitou ao Ministro o apoio à aprovação, com emendas, do Projeto de Lei do Senado nº 191/2006, de autoria do Senador José Sarney (PMDB-AP), que concede isenção fiscal e tributária à Academia Brasileira de Letras, à ABI e ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e cancela débitos dessa natureza atribuídos às três instituições. Na extensa e minuciosa petição entregue ao Ministro, a ABI pediu o exame da possibilidade de edição pelo Presidente Lula de uma medida provisória que transforme em lei a proposta do Senador José Sarney. Acompanhado por uma integrante de sua assessoria jurídica, Ana Paula Cerca, o Ministro Luiz Marinho expôs as alternativas que poderão ser
A Senadora Ideli Salvatti (PT-SC) revelou que há áreas do Governo contrárias ao projeto apresentado há mais de um ano por Sarney.
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MARATONA DEPOIS DO PRESIDENTE, A IDA AO MINISTRO
As razões que a ABI expôs a Marinho
EMENDA MODIFICATIVA Nº ...: A ementa do Projeto terá esta redação: “Concede isenção tributária e do pagamento da contribuição previdenciária patronal à Academia Brasileira de Letras, à Associação Brasileira de Imprensa e ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e cancela os débitos fiscais e previdenciários dessas instituições.”
O Estado tem desapreço pelo papel da Casa na vida nacional.
EMENDA MODIFICATIVA Nº ... t. 6º do Projeto terá esta redação: art. O ar “Art. 6º - Ficam cancelados os débitos fiscais da Academia Brasileira de Letras, da Associação Brasileira de Imprensa e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro relativos a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, bem como os relativos à contribuição previdenciária patronal administrada pelo Instituto Nacional do Seguro Social, cujos fatos geradores tenham ocorrido até à data de publicação desta Lei, inscritos ou não em dívida ativa, cobrados judicialmente ou não, com exigibilidade suspensa ou não.” EMENDA ADITIVA Nº ... Acrescente-se onde couber: Art. ... – Fica acrescentado à Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, o seguinte artigo: “Art. 55-A – São isentas das contribuições de que tratam os incisos I, III e IV do art. 22 desta Lei a Academia Brasileira de Letras, a Associação Brasileira de Imprensa e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.” LEGISLAÇÃO CITADA Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991 Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. “Art 22 – A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: (Vide Lei n° 9.817, de 1996) I – vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais, sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou contrato ou, ainda, de convenção coletiva de trabalho ou sentença normativa; (Redação dada pela Lei n° 9.876, de 26 de novembro de 1999 (Vide LCp n° 84, de 1996) III – vinte por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços; (Incluído pela Lei n° 9.876, de 26.11.99) IV – quinze por cento sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, relativamente a serviços que lhe são prestados por cooperados por intermédio de cooperativas de trabalho. (Incluído pela Lei n° 9.876, de 26.11.99) EMENDA SUPRESSIVA Nº ... Suprima-se o parágrafo único do art. 8º do Projeto.
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A petição encaminhada pela ABI ao Ministro Luiz Marinho, que incluía dois anexos, um com propostas de emendas, outro com o anteprojeto de uma medida provisória, tem o seguinte teor: “Ilustre Ministro Luiz Marinho, A Associação Brasileira de Imprensa agradece a presteza com que Vossa Excelência marcou a presente audiência, a fim de que lhe pudéssemos expor de viva voz a preocupação da ABI em relação à ameaça de subtração de seu patrimônio configurada pela ação executiva de cobrança judicial que lhe move o Instituto Nacional do Seguro Social-INSS. 2. Como tivemos oportunidade de expor diretamente ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Academia Brasileira de Letras, após a solenidade comemorativa dos 110 anos da Casa de Machado de Assis, em 28 de setembro passado, a ABI encontra-se sob o cerco do Estado nacional, representado por essa ação do INSS, e teme que sua sede, o Edifício Herbert Moses, marco da arquitetura moderna brasileira e fruto do sonho e da luta de quatro gerações de jornalistas, seja alcançada por atos de penhora promovidos no interesse do INSS. 3. Considera a ABI, ilustre Ministro Luiz Marinho, que esta situação reflete o desapreço do Estado pelo papel que esta Casa do Jornalista desempenha há um século, a ser completado em 7 de abril próximo, na defesa das liberdades públicas, dos direitos civis e do melhor interesse nacional. Foi a ABI o principal cenário, em seu Auditório Oscar Guanabarino, dos atos em recinto fechado da campanha O petróleo é nosso, nos anos 40 e 50. Foi ela também que abrigou e em inúmeros casos liderou jornadas cívicas memoráveis, como a defesa dos recursos minerais do País; a luta pela anistia; o movimento Diretas Já; a defesa da liberdade de imprensa, de expressão e de criação artística; a luta em defesa dos direitos humanos e pela instituição do Estado Democrático de Direito. A Pátria é injusta e ingrata com a ABI, Ministro. 4. Confortou-nos a reação do Senhor Presidente da República, no ato da Academia, diante do reclamo e do pedido de apoio que a ABI lhe formulou. “Ninguém vai tomar a sede da ABI. Não conseguiram tomar em outros momentos, em outras épocas, e não será agora que vão privar a ABI de sua sede”, disse então o Presidente Lula, recomendando que a ABI expusesse sua preocupação a Vossa Excelência, como deu notícia a ABI em seu site. 5. Cabe relatar-lhe, Senhor Ministro, que a ABI gozou de isenção do pagamento da contribuição previdenciária patronal até que o Governo Fernando Henrique Cardoso, na demagógica campanha contra as chamadas entidades pilantrópicas, resolveu cassar o registro de enti-
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Nossas propostas de emendas
Em vez de cobranças extorsivas, a ABI deveria receber do Estado nacional a gratidão por suas lutas, como as de defesa do monopólio estatal do petróleo.
dade beneficente de assistência social de uma série de instituições e nessa onda levou de roldão a ABI, que gozou de benefícios isencionais durante mais de 80 anos, desde que um decreto-lei aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado em 1917 pelo então Presidente Venceslau Brás lhe concedeu o reconhecimento de entidade de utilidade pública para todos os efeitos (grifo nosso). Essa lei jamais foi revogada, continua em vigor, mas o Governo Fernando Henrique abalroou o texto legal e privou a ABI de um status de que gozava desde antes do fim da Primeira Guerra Mundial. 6. Com base na sonegação à ABI do registro de entidade beneficente de assistência social pelo Conselho Nacional de Assistência Social, o INSS lançou a débito da ABI a cobrança retroativa de cinco anos de contribuição previdenciária patronal, agravando o passivo injusto, e a nosso ver sem fundamento legal, com juros, multa e correção monetária. Em 30 de junho passado esse débito ultrapassava a casa dos R$ 3 milhões e 358 mil. Fez mais o INSS, que está promovendo a execução fiscal dessa dívida e ameaça apossar-se da sede da ABI. 7. A solução eficaz para a superação do cerco a que a ABI está submetida pelo Estado nacional foi proposta pelo Senador José Sarney, que apresentou no Senado Federal o Projeto de Lei do Senado nº 191 de 2006, o qual concede isenção fiscal e tributária à Academia Brasileira de Letras, à Associação Brasileira de Imprensa e ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e institui e cancela débitos dessa natureza atribuídos às três instituições. O PLS 191/2006 acaba de merecer parecer favorável da eminente relatora na Comissão de Assuntos Econômicos, Senadora Ideli Salvatti, e está pendente de votação na referida Comissão, o que poderá ocorrer nos próximos dias. 8. A ABI considera que o PLS 191 deve ser aperfeiçoado pela apresentação de emendas, sob pena de, em relação à ABI, se tornar inócuo, porque a Casa tem
encargos fiscais federais de pequena monta. O ônus avassalador que enfrenta, como relatado, é o da contribuição previdenciária patronal, constituído dessa forma carente de base legal. Na busca da desejável eficácia do futuro texto legal, como já expôs ao Senador José Sarney e à sua Assessoria, a ABI sugere as seguintes emendas: (ver destaque adiante). 9. Vossa Excelência, ilustre Ministro Luiz Marinho, poderá desenvolver uma ação decisiva para solução desse grave problema através da intervenção junto às bancadas da base de apoio do Governo no Senado Federal, primeiro, e na Câmara dos Deputados, posteriormente, para que viabilizem a rápida tramitação do PLS 191/2006, apresentado há mais de um ano, e sua aprovação. Com isso, Ministro, será possível a transformação desse projeto em lei ainda na Sessão Legislativa de 2007. 10. Mais eficaz, Senhor Ministro, será a edição de uma medida provisória pelo Senhor Presidente da República, de modo que as medidas redentoras previstas no PLS 191/2006 se tornem logo realidade. Para assinatura de tão importante ato o Governo poderá convidar o digno autor do Projeto, Senador José Sarney, e representantes e membros da Academia Brasileira de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e da Associação Brasileira de Imprensa, que prestariam ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva as homenagens de gala pela sensibilidade de acolher tão justo pleito. Para a consideração desta hipótese, tomamos a liberdade de oferecer a minuta da medida provisória de que se cogita. (Documento 2) 11. São essas, Senhor Ministro, as postulações que submetemos ao seu alto discernimento, com a esperança de recolhermos a justiça que há anos nos vem sendo sonegada. No ensejo, pedimos-lhe que aceite as expressões de nosso elevado apreço. Cordialmente(a), Maurício Azêdo, Presidente.”
DEPOIMENTO
PAULO HENRIQUE AMORIM
ta, de quem, depois, me tornei profundo admirador e amigo. Jornal da ABI — Como foi sua ida para o escritório da TV Globo em Nova Y ork? York? Paulo Henrique — O escritório da emissora foi aberto pelo Hélio Costa — hoje Ministro das Comunicações —, a pedido do Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho), para fazer matérias para o Fantástico. Sempre disse a ele e ao Armando Nogueira que gostaria de ir trabalhar em Nova York, onde praticamente comecei a minha vida profissional e também me casei. Com a saída do Lucas Mendes, minha ida se precipitou.
A imprensa brasileira é conservadora e ruim
estava no Palácio Piratini na hora em que Leonel Brizola instalou a Rede da Legalidade e resolveu lutar pela posse do VicePresidente eleito, João Goulart. Minha função era falar com esse contato por telefone — as ligações com Marte eram melhores... —, anotar o que ele dizia e passar aos redatores. Mas eu, é claro,me considerava em plena guerra...
Jornal da ABI — No site do programa Domingo Espetacular Espetacular,, quando o senhor é apresentado, há a seguinte frase: “E foi na América que (P aulo Henri(Paulo que Amorim) construiu toda a noção de jornalismo em que acredita”. Que noção é essa? Paulo Henrique — Quando fui ser correspondente, a Veja tinha um acordo operacional com a Newsweek e eu podia freqüentar reuniões de pauta e conversar com editores. Eu tinha 25 anos. Claro que isso me influenciou bastante. Depois, fiz um curso de Magazine making and editing, como ouvinte, na Universidade de Nova York. E peguei um professor muito legal. Quando fui trabalhar na Globo de Nova York, já era burro velho — isso foi em 1990 —, mas tinha uma experiência muito limitada em televisão (tinha sido editor, colunista e apresentador a maior parte do tempo). Lá, sim, fui para a rua como repórter e via os repórteres norte-americanos trabalhando, ali, lado a lado, nas coberturas de grandes eventos. E acho que aprendi alguma coisa.
Jornal da ABI — Quando surgiu a oportunidade de se tornar correspondente internacional? Sua estréia foi na Veja ork. eja,, em Nova Y York. Como foi essa experiência? Paulo Henrique — Eu trabalhava na revista Realidade, quando Murilo Felisberto, diretor do Jornal da Tarde, me convidou para ser editor do caderno de Variedades. Procurei o dono da Abril, Roberto Civita, e disse que estava disposto a ir para o Jornal da Tarde, a menos que pudesse ser o primeiro correspondente em Nova York da revista semanal (Veja ainda não tinha nome) que ele ia lançar. Como eu sabia falar inglês, ele topou na hora. Eu praticamente não conhecia o Diretor de Redação, Mino Car-
Jornal da ABI — Olhando pelo retrovisor e recordando os tempos como correspondente, como o senhor observava a cobertura dos assuntos do Brasil na mídia estrangeira? Houve alguma mudança em comparação aos dias de hoje? Paulo Henrique — Não mudou nada. A mídia norte-americana só se interessa pelo bizarro, pelo grotesco. Há alguma cobertura da parte musical (li há algum tempo no New York Times a crítica de um show do Gilberto Gil, em que o autor o chama de “genial”). Agora, progressivamente, deve haver uma cobertura maior da produção brasileira de biocombustível, em que o Brasil dá de dez a zero nos Estados Unidos.
Depois de militar em variados meios de comunicação, do jornal e da revista impressos aos sites e blogs do jornalismo eletrônico, o apresentador e repórter de Domingo Espetacular tem uma visão ácida da atual qualidade da mídia. ENTREVISTA A RODRIGO CAIXETA Paulo Henrique Amorim é um jornalista multimídia. Migrou da mídia impressa para a eletrônica sem grandes dificuldades, mas sempre com o foco num jornalismo objetivo e isento. Hoje, assina o Conversa afiada, um dos blogs mais acessados do País, e foi um dos primeiros profissionais a estrear projetos jornalísticos na internet, ainda nos primórdios da chegada da rede ao Brasil. Carioca da Glória, casado, pai de uma filha, formado em Sociologia e Política e torcedor do Fluminense e da Acadêmicos do Salgueiro, vive atualmente em São Paulo, onde se dedica ao Domingo espetacular, programa da Rede Record. Aos 64 anos, Paulo Henrique diz que o jornalista perdeu o sentimento de prestador de serviço e afirma que os jornais e revistas brasileiros têm qualidade inferior aos de outros países. Além de remontar sua trajetória profissional, ele comenta que um correspondente tem que ser um bom repórter, classifica a mídia como conservadora, faz críticas à Rede Globo e revela ter medo da tv do Governo. Jornal da ABI — Sua formação acaolítica. Política. dêmica é em Sociologia e P Como o jornalismo apareceu em sua vida? Paulo Henrique Amorim — O jornalismo apareceu cedo, porque meu pai era jornalista e eu praticamente me alfabetizei desenhando primeiras páginas de jornal. Meu pai era um barnabé, mas foi também repórter e editorialista em jornais como O Radical e A Noite. Tinha um texto maravilhoso, seco, sem adjetivos, não havia uma única palavra em
excesso. Um Graciliano Ramos... Jornal da ABI — Onde o senhor começou carreira e quantos anos tinha? Paulo Henrique — A primeira vez em que levei dinheiro para casa como jornalista foi como foca do jornal A Noite, em 1961. Eu tinha 18 anos. Jornal da ABI — P Para ara quais outros veículos trabalhou? Paulo Henrique — Para as revistas Chuvisco, Jóia, Fatos & Fotos, Manchete, Realidade, Veja e Exame, para o Jornal do Brasil, as TVs Manchete, Globo, Bandeirantes, Cultura e Record e os portais Zaz, Terra, UOL e iG. Jornal da ABI — Uma de suas grandes coberturas no início da carreira foi quando o Presidente Jânio Quadros renunciou, em 1961, e o então Governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, mobilizou soldados e jornalistas para garantir a posse do V ice-P reVice-P ice-Presidente João Goulart. Como foi participar deste importante acontecimento nacional? Paulo Henrique — Não diria que foi uma “grande cobertura”. Eu era foca de A Noite e, por acaso, um contato de publicidade do jornal tinha ido a Porto Alegre tentar vender um caderno de turismo sobre o Rio Grande do Sul. Só que ele
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DEPOIMENTO PAULO HENRIQUE AMORIM
Jornal da ABI — Com sua larga experiência, o que o senhor acredita que um correspondente deve ter e saber para ser um bom profissional? E o que deve trazer na bagagem? Paulo Henrique — Um correspondente tem que ser um bom repórter. Não adianta fazer stand up para amarrar imagens captadas de agências internacionais e pretender que o espectador acredite que você apurou aquilo tudo. Correspondente tem que ralar. Trazer na bagagem? Tudo o que puder. Absorver tudo o que for bom.
construção daquele então novo formato de se fazer jornalismo? Paulo Henrique — Sempre tive a percepção de que a internet ia ser uma mídia importante. Tomei a iniciativa de procurar o Marcelo Lacerda e bolar um produto de jornalismo econômico para o ZAZ. Não foi exatamente um sucesso, mas eu o Marcelo nos demos conta de que “tinha jogo” — dali ia sair alguma coisa. Depois, o Caio Túlio Costa me chamou para fazer uma estação de tv na internet, e nós fizemos o UolNews. A bolha da internet furou, o projeto teve que se reduzir, mas a semente estava lançada. Está lá. É provável que o caminho seja o YouTube, mas que vai ter televisão na internet, isso é óbvio. Os novos jornalistas já devem saber disso: a internet é um mercado de trabalho em expansão.
“Os novos jornalistas já devem saber disso: a internet é um mercado de trabalho em expansão.”
Jornal da ABI — Falando do jornalista de forma geral, como o senhor avalia o trabalho dos focas que chegam hoje ao mercado? Paulo Henrique — Uma praga. As escolas de Jornalismo prestaram um gigantesco desserviço à imprensa brasileira. Com a obrigatoriedade do diploma, como diz o grande jornalista Mauro Santayana, não tem mais jornalista pobre nas Redações. É tudo mauricinho, com vontade de ficar amigo de banqueiro. O jornalista perdeu um ingrediente central da profissão, que é o sentimento de prestar serviço, de se colocar na pele de alguém que está ali para servir à comunidade, e oferecer um bem inestimável: informação, informação objetiva, a base para se tomar decisões sensatas. Isso é indispensável à democracia. Escolher com conhecimento dos fatos. Lamentavelmente, temos jornalistas malformados, com mania de ter opinião — e com uma certa dificuldade de dar informação precisa, respeitando a “verdade factual”, como diz o Mino Carta. Platão já explicou que a opinião é o lado escuro, podre do conhecimento. Agora, qualquer “reporteco” de quinta tem opinião. E em 99,9% dos casos opinião que coincide com a opinião do patrão. Os norte-americanos têm uma frase que é o que o leitor deveria dizer, sempre, ao repórter: “Você, por favor, me forneça os fatos que eu entro com a opinião”. Acho que o mal que a lei da obrigatoriedade do diploma fez ao jornalismo brasileiro é irreparável: como os jornais impressos vivem uma crise terminal, não vai dar tempo para que novos profissionais, muitos de origem pobre, de classe média baixa, como o Maurício Azêdo e eu, possam fazer um jornalismo objetivo, isento, que ajude a democracia. Jornal da ABI — Hoje o mercado de trabalho exige um jornalista multimídia. O senhor teve experiência em diferentes veículos e não demonstrou ter tido grandes barreiras para se adaptar às novas mídias, como a internet. Como foi a experiência de iniciar as coberturas em tempo real para a inter net no Brasil — na W ebTV ternet WebTV ebTV,, do extinto ZAZ — e o processo de 14 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
Jornal da ABI — Quando surgiu a idéia de criar o blog Conversa afiada ? afiada? Paulo Henrique — O Conversa afiada surgiu quando fui fazer uma produção independente na TV Cultura de São Paulo. Era, basicamente, um talk show sobre assuntos de economia. Gostei muito de fazer aquele programa — era uma produção independente diária, no horário nobre, em que a minha empresa e a Cultura dividiam os custos e os lucros. Um formato que, sei, a Cultura reproduziu com outros profissionais. E que poderia se alastrar País afora, se a Globo não tivesse a hegemonia que teve e tem (por enquanto...), na tv aberta e na paga. Depois levei esse título para a Record e, agora, para o iG. Jornal da ABI — P Por or que o senhor classifica a mídia como conservadora? Paulo Henrique — Porque é. É a mesma imprensa que derrubou Vargas, tentou derrubar JK, derrubou Jango e tentou impedir a eleição de Brizola para Governador do Rio. Os jornais e revistas brasileiros são conservadores e, freqüentemente, como aquele personagem do Kubrick em Dr. Strangelove (“Dr. Fantástico”), não resistem e fazem a saudação nazista. A imprensa brasileira, virae-mexe, levanta o braço e diz “Heil Hitler!”, com saudades de 1964. Além do mais, a imprensa brasileira é de qualidade inferior. Não comparo com os jornais ingleses, norte-americanos, franceses... europeus em geral. Falo dos argentinos, para começar. La Nación e Clarín são muito melhores do que qualquer jornal impresso brasileiro. Na nossa imprensa, temos um texto de ler em prantos. Não falo das ofensas à língua portuguesa, isso já nem conta mais, re-
leva-se. O problema é a falta de precisão, concisão, clareza. E humor, elegância. No mundo inteiro, o melhor texto da imprensa é o da seção de esportes. E a do Brasil? Onde anda o Nelson Rodrigues, santo Cristo? Jornal da ABI — Que caminho a imprensa deve seguir? Paulo Henrique — Com a decadência da mídia impressa, o jornalismo vai continuar na televisão e se expandir para a internet e todos os caminhos que os novos meios abrirão. Não quero ser saudosista, até porque adoro trabalhar em televisão e na internet, mas a decadência da imprensa contaminou, de certa forma, todo o jornalismo brasileiro, porque, em qualquer lugar do mundo, a mídia impressa é o data bank da imprensa — em informação, talento, consistência... Jornal da ABI — Em 2005, o senhor publicou Plim-plim: a peleja de Brizola contra a fraude eleitoral toral,, em que denuncia a trama que manipulou o resultado das eleições para o Governo do Rio de Janeiro em 1982 com o apoio da Rede Globo, segundo informações do livro. A que se deve hoje seu posicionamento crítico em relação à emissora? Paulo Henrique — Minha posição contra a Globo se explica pela própria Globo. A emissora é protagonista de três episódios antológicos de manipulação da vontade popular. Em 1982, quando participou do complô para impedir a eleição de Brizola no Rio — o que procuro demonstrar no Plim-plim. Em 89, quando o Jornal Nacional — toda a edição, em seu conjunto, e não só a “edição do debate” — ajudou a eleger Fernando Collor, contra Lula, na véspera da eleição, no segundo turno. E agora, como Raymundo Rodrigues Pereira demonstrou de forma irrefutável na CartaCapital, o mesmo telejornal levou a eleição para o segundo turno: como em 89 ignorou o desastre da Gol para não desarrumar a edição do “JN” que prejudicaria Lula. As Organizações Globo são contra os líderes trabalhistas desde Getúlio Vargas, está no seu DNA. E, agora, com o rebaixamento do Ministro das Comunicações, o fortalecimento de Dilma Roussef e a escolha de Franklin Martins, a Globo voltou a ser especialmente feroz contra o Governo Lula. É a primeira vez, desde os anos militares, que o Ministro das Comunicações não manda... Sobre as minhas criticas à Globo e ao fato de
“Minha relação com a ABI vem da infância. Meu pai era um sócio sempre presente, participava das atividades da Casa.”
eu ter trabalhado lá, gostaria de esclarecer que trabalhei na emissora e em muitas outras instituições — como já enumerei antes — com o mesmo entusiasmo, dedicação e profissionalismo. Mas há uma diferença interessante entre o regime da escravidão e o regime capitalista. Na escravidão, o dono da fazenda manda no escravo. No capitalismo, há uma troca: o trabalhador vende a sua força de trabalho e é remunerado por isso. O empregador compra a força de trabalho e paga. Roberto Marinho era meu empregador, não era meu dono... Jornal da ABI — O senhor comentou certa vez em seu blog sobre as duas ““frias” frias” que o F ranklin Franklin Martins encontraria na Secretaria de Comunicação: acumular a distribuição de verbas do Governo com a política de informação do Planalto e a montagem de uma rede pública de televisão. Qual a sua sugestão para ele ser bemsu cedido nessas sucedido em preitadas? empreitadas? Paulo Henrique — O Franklin Martins é um excelente jornalista e um homem honrado. Ele tem tudo para se sair bem nas duas tarefas. Porém, permito-me reafirmar que acho uma fria reunir num mesmo saco informação e publicidade; e morro de medo dessa televisão do Governo. Pode ser um sorvedouro de dinheiro; um cabide de emprego para jornalista de segunda categoria, mas amigo do amigo dos poderosos; fazer propaganda do Governo; e, o mais importante, não ter audiência nenhuma e não servir para nada. Entre outros erros estratégicos irreparáveis — como a derrubada de Goulart, a transferência da capital para Brasília... —, acho que não ter uma emissora como a BBC no Brasil foi uma tragédia. Só que agora não dá mais tempo.
“A imprensa derrubou Vargas, tentou derrubar JK, derrubou Jango e tentou impedir a eleição de Brizola para Governador do Rio.”
Jornal da ABI — Como é o seu trabalho à frente do Domingo Espetacular tacular,, na Rede Record? O senhor também participa da produção? Paulo Henrique — Sou apresentador e repórter do programa. Participo da produção e redação das minhas matérias. E já é muito serviço... Jornal da ABI — Qual a sua relação com a ABI? Paulo Henrique — Vem da minha infância. Meu pai trabalhava no Ministério da Fazenda, perto da sede da Associação, e toda quarta-feira eu ia buscálo na repartição. Tomávamos um lanche e íamos à sessão de cinema, no fim da tarde, no salão nobre do Edifício Herbert Moses. Meu pai era um sócio sempre presente, participava das atividades da Casa. Mais tarde, quando fui foca de A Noite, participei das coletivas de Yúri Gagarin e Francisco Julião na ABI.
GENTE FOTOS: ARQUIVO PESSOAL
Ana Cláudia: adrenalina pura, logo cedo “Algo para correr agora?”, é o que ela pergunta logo que chega à Redação. POR MÁRCIA MARTINS
Ela começa o dia bem cedo na editoria Rio de O Globo. Quando não está na escuta, pode contar que está cobrindo reportagens policiais. Quem vê Ana Cláudia Costa atuando no front (como gosta de dizer) não imagina que com apenas 1,55 m de altura ela guarda disposição e determinação ímpares para subir morros e entrar em favelas durante operações policiais. Ana gosta da agitação do dia-a-dia; estar dentro da Redação lhe causa impaciência. Quer logo pegar uma boa pauta de polícia e partir para uma cobertura na rua. Prova disso é que antes mesmo de dar “bom-dia” aos colegas de outras redações, por e-mail, faz a mesma pergunta todas as manhãs: “Algo para correr agora?” Formada há 17 anos, mas trabalhando há 19 na área, Ana Cláudia Costa já passou pela Rádio Jornal do Brasil AM, a revista Manchete, o Jornal do Commercio, a Gazeta de Notícias (já extinta) e o Jornal do Brasil. Também fez frilas para o Estadão e a Folha de S.Paulo e passou por assessorias de imprensa, antes de chegar ao Globo, há sete anos. A meta de Ana Cláudia é sempre estar na frente da notícia. Conhece vários po-
liciais pelo nome e tem o privilégio de ter telefones pessoais de muitos deles: — Tenho muitas fontes na Polícia, que foram conquistadas com muito respeito e honestidade, sabendo diferenciar o que é on e o que é off. Para cobrir polícia, isso é primordial. Mas explico que, mesmo tendo-os como fontes, sou acima de tudo jornalista, e que o meu papel é informar, investigar e denunciar. Especializar-se em polícia aconteceu naturalmente, com o passar do tempo. A primeira matéria ocorreu quando ainda era estagiária, mas nem por isso teve menos importância. Foi convocada para fazer uma entrevista com o triunvirato do pó da Rocinha, formado por Naldo, Buzunga e Cassiano. Também entrevistou Flávio Augusto da Conceição no final da década de 80. Brasileirinho, como Flávio era conhecido, tinha apenas 13 anos quando ganhou notoriedade por sua atuação na quadrilha de traficantes da favela da Zona Sul do Rio: — Depois dessas matérias, já era, né? Fiz muita coisa desta época para cá, mas a cobertura de polícia acabou marcando e, para falar a verdade, gosto muito. Não tem rotina e é excitante. Ana Cláudia deu furo de reportagem quando denunciou o uso de rádio ama-
Ana Cáudia (à direita) entre companheiras que não enjeitam parada na cobertura policial, apesar de seus riscos: ela considera excitantes essas reportagens, porque não têm o sabor desagradável de rotina.
Ao lado do corpulento colega Domingos Peixoto, Ana Cláudia parece uma pessoa frágil. Tal como ele, Ana Cláudia enfrenta as situações de risco numa boa, sem medo nem imprudência.
dor pelos detentos dos presídios cariocas. Na ocasião, foi elogiada pelo então Secretário de Administração Penitenciária, Astério Pereira dos Santos. Também já passou por muitas situações de risco; a mais comum, ficar no meio da favela sob tiroteio intenso. Uma das mais marcantes foi quando a Polícia Militar ocupou durante mais de dois meses o conjunto de favelas do Complexo do Alemão, no subúrbio, deixando dezenas de mortos: — Depois de tanto tempo indo para o Alemão, passei a brincar com os colegas de profissão, dizendo que iria morar logo por lá. Passei a conhecer os donos de bares, o comerciante da malharia, o dono da barraca de frutas... Ana Cláudia enfrentou ainda momentos de tensão na ocupação do Morro da Mineira, no Centro, em que 13 bandidos foram mortos: — Todo conflito dá medo, mas tem uma adrenalina que nos move e pede para irmos adiante com a matéria. Medo, adrenalina e tesão pelo trabalho são ingredientes necessários para fazer uma cobertura de conflito com responsabilidade, sem pôr a vida em risco e, claro, sem esquecer também da segurança, como colete à prova de balas, carro blindado etc. Se antes era mais fácil fazer matérias
nas favelas e havia até coletivas com os bandidos, após a morte do jornalista Tim Lopes a realidade mudou: — Hoje, nós somos os inimigos, os “X9”, os “ratos”, como eles mesmo dizem, até porque na maioria das vezes entramos nas comunidades com a polícia. Mas a gente precisa continuar o trabalho do Tim. Temos que mostrar para a sociedade esse mundo paralelo e denunciar. Somos a ponta social que liga ou, pelo menos, tenta ligar essa cidade partida. As matérias de polícia do currículo de Ana Cláudia não se restringem a tiroteios. Há poucos meses, fez uma reportagem no Morro Tavares Bastos, na Zona Sul do Rio, onde o Batalhão de Operações Especiais-Bope está instalado: — Lá não há milícia, nem tráfico de drogas. Gostaria de fazer muitas matérias iguais a esta. Apesar de gostar muito da reportagem policial, quando perguntada se gostaria de cobrir outra área Ana Cláudia diz que queria experimentar a editoria de Política. E acha que o tipo de matérias que faria não seria muito diferente do que já faz hoje: — Gostaria muito de investigar a podridão da política, a corrupção. Sempre denunciando. Adoro isso. Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
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PRESTÍGIO
A ABI homenageada em três Estados Pernambuco, Minas Gerais e São Paulo distinguem a Casa com diploma, placa e prêmio. Diferentes instituições de três Estados honraram a ABI, em outubro, com homenagens que refletem o seu prestígio nacional: Pernambuco conferiu à Casa o Diploma de Amigo da Imprensa; Minas Gerais, através do seu Instituto dos Advogados, entregou à ABI uma placa comemorativa
do centenário, celebrando nossos 100 anos de luta pela liberdade de imprensa; a Comissão Organizadora do 11° Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa, sediado em São Paulo, concedeu à Casa o Prêmio Personalidade da Comunicação 2008.
O diploma dos pernambucanos Na solenidade de celebração dos 76 anos de fundação da Associação da Imprensa de Pernambuco (AIP), realizada no dia 6 de outubro, a ABI foi agraciada com o Diploma de Amigo da Imprensa. O ato exaltou a atuação da entidade nos seus primeiros anos de fundação, em benefício dos jornalistas pernambucanos. No artigo AIP: 76 de história, Múcio Aguiar Neto — associado da ABI e Primeiro Secretário da AIP — diz que “o surgimento da Associação Brasileira de Imprensa, em 1908, afirmou a existência de uma ‘classe dos jornalistas’, acontecendo a partir daí o nascimento de outras associações de imprensa”. Múcio Aguiar lembrou ainda que, em 1912, a decisão da ABI de eliminar do seu quadro de associados o General Dantas Barreto, então Governador de Pernambuco, foi um atitude que mar-
cou época na história da imprensa daquele Estado. Segundo Múcio, o General foi o “responsável pelo empastelamento sofrido, em sua administração, pelo jornal Diário de Pernambuco e pelos atentados a diversos jornalistas pernambucanos, deles dizendo Mário Melo que ‘amanhecer vivo era incompreensível’, tantos foram os periódicos ameaçados, as surras em jornalistas, com assassinatos até por engano, como o de Trajano Chacon”. Em mensagem de agradecimento à AIP, a ABI cita a Casa do Jornalista de Pernambuco como um exemplo de luta, que enaltece não apenas os jornalistas, mas também o bravo povo pernambucano. Nesse sentido, diz a nota, “a ABI se sente no dever de registrar os 76 anos dessa instituição e render as suas homenagens a quantos a trouxeram lúcida e combativa desde 1931 aos nossos dias”.
A placa dos mineiros O Instituto dos Advogados de Minas Gerais e o Centro Universitário-UNA ofereceram à ABI uma placa em que se incorporam às comemorações do centenário da Casa e prestam homenagem à “instituição-símbolo da defesa do Estado Democrático de Direito no Brasil”. A entrega da placa foi feita no Centro Universitário-UNA, em Belo Horizonte, na noite do dia 16 de outubro, antes da palestra que o Presidente da ABI, Maurício Azêdo, proferiu sobre o tema O papel da imprensa no Estado Democrático de Direito, a convite das duas instituições. Numa demonstração de seu alto apreço pela ABI, o Instituto dos Advogados, representado por seu Presidente, José Anchieta da Silva, e seu Secretário-Geral, José Brígido P. Pedras Júnior, e o Centro Universitário-UNA convidaram para compor a mesa, sob a presidência do Vice-Reitor da UNA, Professor Ricardo Cançado, o Presidente da Academia Mineira de Letras, ex-Senador Murilo Badaró, o Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Fernando Xavier Brandão, o Diretor da Escola de Comunicação da UNA, Professor Glauco Gross, e o Presidente da Associação Mineira de Imprensa, Wilson Miranda. O Presidente da ABI foi apresentado à assistência, composta por advogados, jornalistas e estudantes de Comunicação e de Direito, pelo Diretor de Relações com a Imprensa do Instituto, Rogério Faria 16 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
Tavares, que é sócio da ABI. Na platéia encontravam-se, entre outros, os jornalistas Oséas Carvalho, membro do Conselho Deliberativo da Casa e atualmente radicado em Belo Horizonte, e Petrônio Gonçalves, também sócio da Casa e morador na capital mineira. O jornalista Guy de Almeida, um dos decanos da imprensa de Minas e que viveu anos exilado durante a ditadura militar, mandou uma mensagem de saudação à ABI. A sessão foi encerrada com um pronunciamento do Presidente do Instituto dos Advogados, José Anchieta da Silva, que exaltou a presença da ABI nas lutas em defesa das liberdades. A placa oferecida à ABI tem os seguintes dizeres: “Homenagem à ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA Na abertura das comemorações dos 100 anos da Associação Brasileira de Imprensa em Minas Gerais, o Centro Universitário-UNA e o Instituto dos Advogados de Minas Gerais homenageiam a instituição-símbolo da defesa do Estado democrático de Direito no Brasil. Ao longo de sua história, a ABI pautou sua conduta pelo primado da ética, da promoção do interesse público e da liberdade de expressão. O seu centenário é oportunidade para celebrar sua memória e renovar a crença em seu papel de destaque no futuro do país. (a) UNA – Instituto dos Advogados de Minas Gerais.”
O prêmio dos paulistas A Comissão de Organização da 11º Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa decidiu homenagear a ABI pelo seu centenário, que será celebrado no próximo dia 7 de abril, outorgando à entidade o Prêmio Personalidade da Comunicação 2008. A cerimônia de entrega está marcada para 14 de maio do ano que vem, às 20h, no Centro de Convenções Rebouças, em São Paulo. Receberão a premiação, em nome da ABI, o Presidente da Casa, Maurício Azêdo, e o Vice-Presidente, Audálio Dantas. Em resposta à Organização do Congresso, Maurício falou da gratificação pela indicação da entidade: — A ABI recebeu com grande honra a decisão de homenageá-la em seu centenário com o Prêmio Personalidade da Comunicação, através da atribuição dessa notável distinção a mim e ao nosso VicePresidente, Audálio Dantas. Como instituição e como pessoas, ficamos muito sensibilizados e agradecidos pela generosidade. O Prêmio Personalidade da Comunicação foi instituído em 1999 e, na ocasião, presidido por Audálio Dantas. A primeira personalidade a recebê-lo foi o jornalista José Hamilton Ribeiro, editor especial do programa Globo rural. Depois vieram Vera Giangrande (2000), Miguel Jorge (2001), Alberto Dines e Paulo Nassar (2002), Gaudêncio Torquato e Mino Carta (2003), Ruy Mesquita (2004), Roberto Civita (2005), Octavio Frias de Oliveira (2006) e Johnny Saad (2007). Para a solenidade em 2008, devem ser convidadas cerca de 600 pessoas, incluindo jornalistas, empresários e autoridades. De acordo com a Comissão Organizadora do Congresso, os agraciados farão depoimentos sobre o tema O futuro do Brasil e os caminhos da imprensa brasileira. No caso da ABI, segundo o jornalista Eduardo Ribeiro — do Jornal da Comunicação Corporativa e um dos organizadores do evento —, o prêmio é um ato de reconhecimento a uma entidade muito importante para a imprensa nacional: — Estamos muito honrados em poder homenagear, nas figuras do Audálio e do Maurício, esta instituição tão importante para o jornalismo brasileiro e para o próprio Brasil.
Recomeçam os Cursos Livres de Jornalismo Entre os seis módulos, um de Ilustração Gráfica, novidade na programação deste semestre. A ABI iniciou no dia 22 de outubro o novo ciclo dos Cursos Livres de Jornalismo da ABI, que oferecem neste semestre aulas de Jornalismo Internacional, Texto Jornalístico para Diversas Mídias, Redação Jornalística, Marketing para Jornalistas, Assessoria de Imprensa e Ilustração Editorial. O curso de Jornalismo Internacional é ministrado por Trajano de Moraes, de O Globo. Com 35 anos de carreira, Trajano atuou como repórter, redator e assessor de imprensa, além de ter passado pelas editorias de Economia e Internacional do Jornal do Brasil. O de Assessoria de Imprensa está a cargo de Ilza Araújo, que é graduada e pós-graduada em Jornalismo e Relações Públicas e já atuou como assessora de imprensa da Golden Cross, da Sociedade Brasileira de Cartografia e da Fundação de Apoio à Escola Técnica-Faetec, entre outras grandes empresas e instituições. A Fernando Flessati cabe o módulo Marketing para Jornalistas. Flessati é pós-graduado em Administração de Empresas pela Puc-Rio e especialista em gestão de negócios, marketing e planejamento. Já trabalhou como diretor de Marketing e consultor em diversas organizações — como Golden Cross Seguradora, Sul América Seguros e Lojas Americanas — e atualmente é professor da UniverCidade. Redação Jornalística tem como professor Admar Branco, que foi repórter de O Globo e Jornal do Brasil e editor do site de noticias Último Segundo, além de atuar como assessor de comunicação de ongs desde 2002. O jornalista Pery Cotta está à frente do curso Texto Jornalístico para Diversas Mídias. Pery tem larga experiência no jornalismo, com passagem por diversos veículos e editorias. Já o curso de Ilustração Gráfica, inovação da programação, fica a cargo do artista argentino radicado no Brasil Luis Trimano, que tem na bagagem mais de 40 anos de experiência em grandes publicações, como Jornal da Tarde, Jornal do Brasil, revistas Veja e Argumento, além dos alternativos Opinião, Movimento, O Bondinho e Leia Livros. Os Cursos Livres contam com o apoio da Rede Globo, da Maxpress e do Comunique-se e têm carga horária de 12, 24, 30 e 48 horas. Eles são destinados especialmente a estudantes de Comunicação e têm por objetivo familiarizá-los com as técnicas da profissão dominadas por companheiros experientes.
Aconteceu na ABI ATO PÚBLICO
Casa cheia por uma causa que se arrasta: a anistia Centenas de vítimas da ditadura reúnem-se na ABI para ouvir o Presidente da Comissão de Anistia, que pretende decidir os processos pendentes até o final do Governo Lula, em 2010. POR IGOR WALTZ
Diante de uma platéia que superlotava o Auditório Oscar Guanabarino – 920 pessoas assinaram as listas de presença –, o Presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão Pires Júnior, expôs em 26 de outubro na ABI, em encontro com membros de entidades representativas de perseguidos políticos e anistiados, as mudanças que promoveu na atuação do órgão, a fim de assegurar mais rapidez na apreciação de milhares de processos pendentes de decisão. O evento, que durou cerca de quatro horas, foi uma iniciativa da Associação Democrática e Nacionalista de Militares–Adnam, entidade que congrega militares que foram vítimas da ditadura, e teve por objetivo de discutir com membros de entidades a nova gestão da Comissão. O Auditório Oscar Guanabarino, no 9º andar do Edifício Herbert Moses, foi tomado por centenas de perseguidos políticos, bem como esposas, viúvas e filhos de pessoas punidas pela ditadura militar. O Presidente da Adnam, Brigadeiro Rui Moreira Lima, presidiu a mesa e foi recebido sob fortes aplausos. Ele lembrou os esforços da entidade em reparar os danos sofridos por muitos durante a ditadura e a luta de mais de 43 anos pela anistia: — A Adnam sucede à Associação de Militares Cassados para reforçar o nosso compromisso com a democracia. Nós ainda temos que enfrentar muita dificuldade, principalmente porque ainda há setores militares que dificultam a nossa luta. A mesa contou com a participação do Vice-Presidente da Comissão, Sérgio Muylaert, e parlamentares, como a exDeputada Laura Carneiro e o Vereador Pedro Porfírio. Ezequiel Oliveira representou o Senador Marcelo Crivella. O debate teve ainda a presença do Presidente da ABI, Mauricio Azêdo, que elogiou o Presidente da Adnam. — Rui Moreira Lima foi um herói do nosso País, defendendo nos céus da Itália as idéias de liberdade, à frente de muitos companheiros da Força Expedicionária e da Força Aérea Brasileira. Ele é um herói da História das lutas de liberdade no Brasil. Maurício ressaltou a importância do evento, que reuniu tantos brasileiros que
O Presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão ( quarto a partir da esquerda), expôs seu propósito de decidir todos os processos de anistia antes do término do mandato do Presidente Lula.
lutaram pela liberdade no País: — Este plenário está repleto de compatriotas que deram suas vidas por um Estado Democrático de Direito. São lutadores que antes mesmo de 1964 sustentaram os ideais de liberdade e democracia que possibilitaram mais tarde a eleição do Presidente Lula, um ex-torneiro mecânico que se tornou Presidente. Contudo, mesmo assim temos que lutar contra setores militares que querem impedir a aplicação da Lei da Anistia, dificultando o nosso trabalho. Esta lei só possui a falha de permitir a estes militares torturadores a isenção de sua culpa. Paulo Abrão expôs os avanços e dificuldades de seu trabalho na presidência da Comissão. Com apenas 32 anos de idade, ele recebeu a incumbência do Ministro Tarso Genro por não estar vin-
Brigadeiro Rui Moreira Lima: Há setores militares que dificultam a efetivação da anistia.
culado diretamente à luta dos anistiados. — A minha geração está envolvida com outras lutas, como a luta pela igualdade e pelas questões ambientais. O Ministro não deu este cargo a alguém que participou da luta pela anistia desde o início, pois acredita que esta gente já lutou demais. Confesso que esta questão ainda está sendo revelada a mim. Eu ainda estou percebendo a dimensão do drama, da dor, do sofrimento, das histórias de cada um. Agora a luta pela anistia é a minha luta também. Abrão falou também do funcionamento do órgão e dos entraves administrativos que precisa superar constantemente: — A Comissão de Anistia é formada por 22 conselheiros que se reúnem semanalmente em Brasília, sem nenhuma compensação financeira, para julgar os processos de indenização. A meu pedido, eles não se negaram a dobrar a carga de trabalho, pois minha meta é terminar de avaliar em 2010 todos os processos de anistia antes do final do Governo Lula. Acima de tudo, queremos resolver esta questão, seja para deferir a anistia do requerente ou não, para que assim se possa acabar com a angústia dessas pessoas. Para isso, foi preciso contratar mais funcionários em regime de urgência. Antes havia 58 servidores na Comissão, hoje eles ultrapassam os cem. Eu trabalhava com sete advogados analistas, agora conto com 30. Estamos passando
por um processo de reestruturação administrativa. Aumentar a transparência da Comissão e transformá-la num órgão de defesa da anistia também está nos planos de Paulo Abrão: — Estamos trabalhando para levar uma imagem aos meios de comunicação de que é essencial para a democracia que a questão da anistia seja resolvida. É preciso defendê-la daqueles que se opõem a ela. Estamos criando também as sessões temáticas, em que os conselheiros se encontram diretamente os requerentes, para que eles conheçam a situação além do que está escrito nos papéis. Acima de tudo, nós queremos resolver. A ex-Deputada Laura Carneiro, contudo, exigiu mais agilidade: — Pior do que os problemas vindos da idade avançada dos anistiandos é a cassação de anistias. É como se essas pessoas estivessem sendo cassadas duplamente. E a falta de estrutura é o que a gente escuta já há algum tempo. Sugiro que o Presidente (da Comissão) encontre um caminho que possa levar a resolução dos processos de anistia mais para perto dessas pessoas. Mais do que fazer para eles, faça com eles. Laura Carneiro referia-se à situação de cabos da Aeronáutica anistiados alcançados por uma portaria que cassa a anistia já concedida a centenas deles e nega o benefício a outras centenas de cabos que também o requereram. A duplicidade na regulação legal gerou um processo em tramitação no Tribunal de Contas da União, que foi transformado assim naquilo que a lei não previa: é o arbitro da anistia requerida por essas vítimas da ditadura. Igor Waltz, estudante de Comunicação Social, é estagiário da Diretoria de Jornalismo da ABI.
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Aconteceu na ABI ANTONIO BATALHA
Projeto da ABI e da Médicos Solidários em área popular
O tango para quem não sabe
Vila Parque da Cidade, nas proximidades da Rocinha, é a primeira beneficiada.
Coreógrafo com formação na Argentina nos anos 70 dá aulas sobre o mais famoso ritmo portenho.
“É muito bom ter um médico toda semana para cuidar da gente. Espero que isso dure pra sempre.” As frases são de Luiz Carlos Mendes da Silva, Vice-Presidente da Associação de Moradores Pró-Melhoramento da Vila Parque da Cidade, localizada na Gávea, nas proximidades da Rocinha, na Zona Sul do Rio. A novidade só foi possível graças a um programa da ABI, implantado há seis meses, que tem como parceiro a organização não-governamental Médicos Solidários. A ABI escolhe a comunidade carente a ser ajudada e os 200 médicos de várias especialidades da Médicos Solidários fazem o atendimento. Há dois meses, esta é a realidade dos cerca de 5 mil moradores que vivem na Vila Parque. O Diretor de Assistência Social da ABI, Paulo Jerônimo de Souza (Pagê), informa que um médico dá plantão uma vez por semana na sede da Associação dos Moradores da Vila Parque da Cidade. O Secretário da Médicos Solidários, Henrique Peixoto, é o responsável pela consulta no local. Se o caso necessitar de um especialista, ele encaminha para outro membro da entidade. O projeto agradou tanto, que dezenas de pessoas da comunidade já foram atendidas. O Vice-Presidente da Associação de Moradores Pró-Melhoramento da Vila Parque da Cidade diz que toda a comunidade foi informada do projeto da ABI e que está satisfeita com a iniciativa. Diz Luiz Carlos que um profissional de saúde, mesmo atendendo apenas uma vez por semana, deixa a população mais segura. E ele espera que o projeto dure muito tempo: – Tínhamos um médico por semana, mas ele foi embora. Ficamos dois anos dependendo somente de hospitais públicos. É muito bom ter um médico de novo. Agora, checo minha pressão toda semana. A Conselheira da ABI Ilma Martins da Silva também acompanha de perto como está o atendimento aos moradores das comunidades carentes — a outra é a Comunidade Ocidental Fallet, localizada em Santa Teresa, no Centro do Rio, mas a violência na região ainda não permitiu que um médico fique instalado no local. O projeto de levar atendimento médico deve se estender a outras comunidades carentes do Rio: — A gente espera, em breve, dar assistência a mais seis grupos — diz Pagê. Fundada em 2001 a organização nãogovernamental Médicos Solidários tem como objetivo dar assistência médica gratuita a pessoas com dificuldade de acesso aos serviços públicos. Uma das características do projeto é aproximar dois pólos: os que recebem o beneficiário e os voluntários da área da saúde. A organização inspirou-se em um projeto de outra ong, a Médicos Sem Fronteiras, que atua em nível mundial. O grande diferencial do projeto é o fato de o atendimento acontecer principalmente nos consultórios dos próprios voluntários, trazendo praticidade para médicos e usuários. A ong Médicos Solidários funciona em espaço da ABI, no 6º andar do Edifício Herbert Moses, no Centro do Rio. (Márcia Martins)
Um curso diferente foi iniciado na Casa neste mês de outubro: a Oficina de Tango ABI, com aulas a cargo do professor e coreógrafo Don Jorge Paulo. O curso —iniciativa da Diretoria de Cultura e Lazer — tem o objetivo de demonstrar aos alunos as noções mais básicas do mais famoso ritmo portenho. As inscrições podem ser realizadas na sede da ABI (Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andar, Centro do Rio). A taxa de inscrição é de R$ 20, mais duas mensalidades de R$ 60. Serão duas horas de aula, sempre às sextas-feiras, mas o aluno pode optar pelo horário que achar melhor no período de 16h às 19h. Don Jorge teve sua formação em tango na década de 1970, quando viveu em Buenos Aires. Casado com uma argentina, trabalhou como coreógrafo no filme A ópera do malandro, de Rui Guerra e Chico Buarque de Holanda, e na peça Dona Ninguém, de Jesus Chediak, e interpretou um professor de tango na novela Carmem, de Glória Perez, exibida em 1987 na TV Manchete. Ele considera o tango uma das danças de salão mais difíceis de ser praticada, mas o curso na ABI não se destina apenas a quem já tem alguma experiência: — O tango é sempre um desafio. Quando o aluno começa a fazer dança de salão, geralmente esse ritmo é a ultima etapa do ciclo. Porém, muitos aprendem a dançar o tango sem precisar passar antes pela salsa ou o bolero, e acabam se adaptando muito bem. Jorge Paulo pretende se concentrar também em “outras modalidades de ritmo que compõem o baile de tango, como o clássico, a milonga e a valsa”. No encerramento, diz ele, será abordada também a chacareira, uma dança folclórica do interior da Argentina. Apesar de detectar “um certo preconceito dos mais jovens em relação à dança”, Don Jorge afirma que suas aulas são voltadas para pessoas de todas as idades: — Em geral, a procura por cursos de dança é de pessoas na faixa dos 30 anos em diante, mas o número de jovens interessados em aprender está aumentando. E como tem havido uma profunda modernização do tango, ele atrai cada vez mais a atenção, tanto no Brasil quanto na Argentina. Durante muitos anos, a juventude de Buenos Aires torceu um pouco o nariz para o tango, preferindo ritmos como o rock, mas está acontecendo uma grande reviravolta, com a ascensão de novas modalidades além do tradicional, como o tango eletrônico, com uma batida mais metálica, mais histriônica, e o som grupo Gotan, um pouco mais tranqüilo, mas que também tem feito muito sucesso com os mais novos. (Igor Waltz)
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O convênio ABI/Sesi oferece assistência aos sócios e funcionários e seus dependentes.
Sesi abre seus serviços para nossos sócios e funcionários Diretoria de Assistência Social firma convênio que amplia benefícios em várias áreas. Associados e funcionários da ABI contam agora com os serviços de medicina, odontologia, educação, esporte e lazer que são oferecidos pelas unidades do Serviço Social da Indústria no Estado do Rio de Janeiro. Os benefícios são extensivos aos dependentes legais e foram assegurados por meio do convênio firmado entre a ABI e o Sesi-RJ, por iniciativa da Diretoria de Assistência Social. Para usufruir do atendimento, os sócios da ABI devem procurar os Centros de Atividades do Sesi-RJ, munidos de carteira de identificação emitida pela Casa. No caso dos funcionários, é preciso apresentar o contracheque. A exigência de documentação vale também para os dependentes. Outras informações, incluindo horários de atendimento, preços, cursos e atividades disponíveis, podem ser obtidas na Central de Tele-atendimento do Sesi-RJ, pelo telefone 0800-231-231.O convênio com o Sesi era uma das metas da Diretoria de Assistência Social, segundo Paulo Jerônimo de Souza–Pagê, responsável pela iniciativa: — Atingir essa meta era uma das minhas principais responsabilidades quando fui convidado pelo Presidente Maurício Azêdo para fazer parte da Diretoria da ABI. Ele enfatizou a necessidade de ampliar os serviços de atendimento de saúde e educação oferecidos aos nossos associados e funcionários. Essa foi uma das prioridades da Diretoria de Assistência Social ainda no primeiro mandato. Pagê conta que a DAS continua empenhada em conseguir outros benefícios: — O Sesi foi uma grande conquista, pois conta com excelentes serviços médicos e odontológicos em instalações que me deixaram impressionado. Há também os cursos e a oferta da prática de esportes, tudo a preços compatíveis com os níveis de renda dos sócios e funcionários. Acho que estamos dando uma boa abertura para os nossos quadros social e funcional, mas não vamos parar por aí. Os integrantes da Diretoria continuam trabalhando para aumentar a rede de benefícios, incluindo seguro-saúde e um plano de previdência privada, pois sabemos o quanto essas iniciativas vão representar para todos. A Gerente-Executiva Operacional do Sesi Unidade Santa Luzia, Lucrécia Calixto Bezerra Guimarães, revela que foi feito
com a ABI um acordo especial, capaz de fornecer descontos na prestação de serviços para empresas não regimentais, ou seja, que não fazem parte do setor industrial: — No caso da Associação Brasileira de Imprensa, o convênio nos permite fornecer nossos serviços com um valor de tabela inferior ao que normalmente é cobrado das empresas que não são conveniadas. Informou Lucrécia que a finalidade do Sesi é atender à indústria, mas a entidade criou um mecanismo para ampliar seu leque de beneficiados: — É nesse contexto que se enquadram os sócios e funcionários da ABI, que vão ter direito a consultas médicas e odontológicas, aos nossos cursos do ensino fundamental e médio e às atividades de esporte, cultura e lazer. Uma das grandes vantagens do convênio ABI/Sesi é que, na utilização dos serviços médicos e odontológicos, os conveniados terão direito a um desconto de 10% do valor normal da consulta, que é de R$ 30,00 (pagarão R$ 27,00 pelo atendimento). Quem desejar se associar ao Sesi Clube e freqüentar as unidades operacionais, com acesso a todas as atividades, terá desconto de 30%, tanto no plano familiar (R$ 40,00) quanto no individual (R$ 20,00). As especialidades oferecidas na área médica são angiologia, cardiologia, dermatologia, endocrinologia, ginecologia, clínica médica e oftalmologia, além de serviços de nutrição, enfermagem, laboratório e shiatsu. Na área odontológica, há ortodontia, periodontia, clareamento, cirurgia bucomaxilo-facial, endodontia e prótese. O Sesi-RJ tem também um projeto de educação básica e oferece, em todas as suas unidades, cursos do ensino fundamental e médio para jovens e adultos — algumas têm também matrícula para a pré-escola. No Estado do Rio, há 23 Centros de Atendimento do Sesi (no Município do Rio, estão em Jacarepaguá, Centro, Tijuca, Benfica, Vicente de Carvalho, Honório Gurgel, Laranjeiras e Paciência; na Baixada, há unidades em Nova Iguaçu e Duque de Caxias). — No quesito lazer, por exemplo, quem pensa em aproveitar férias com a família na Região Serrana conta com a unidade Sesi de Nova Friburgo, em que a hospedagem em cabanas tem diárias bem abaixo da taxa normal de hotelaria — ressalta Lucrécia.
TECNOLOGIA
Bittar acredita numa tv digital sem discriminação Relator dos projetos sobre convergência tecnológica em tramitação na Câmara dos Deputados, ele acha que a tv digital vai refletir os interesses de todas as classes. POR JOSÉ REINALDO MARQUES
A tv digital brasileira é um projeto que vai refletir os interesses de todas as camadas sociais do País. Essa é a crença do Deputado Jorge Bittar (PT-RJ), exposta no dia 5 de outubro na ABI no encontro intitulado TV digital e convergência tecnológica: você está preparado para esse novo mundo?, coordenado pelo Diretor de Cultura e Lazer da Casa, Jesus Chediak, em mesa formada ainda por Fernando Barbosa Lima, Presidente do Conselho Deliberativo, e Terezinha Santos, Presidente do Clube de Comunicação, entidade promotora do evento, e membro da Comissão Executiva do Centenário da ABI. Bittar foi designado pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados para relatar os projetos sobre convergência tecnológica, que tramitam atualmente na Câmara e servirão de base para a criação de um novo marco regulador para o setor de telecomunicações. Diante de uma platéia de estudantes, jornalistas, produtores de audiovisual e profissionais de outras áreas da comunicação social, ele agradeceu o convite para participar dessa “reflexão coletiva numa Casa de tantas tradições”: — É bom estar na ABI, falando para pessoas de setores muito importantes sobre um tema que nos é tão relevante, pois envolve a democratização das comunicações, acesso à educação e à cultura na sociedade brasileira, que é o que está por trás na verdade de todas essas questões que dizem respeito à convergência tecnológica. O Deputado considera que o tema entrou na pauta geral, já que o País vive hoje o processo mundial das transformações rápidas: — É por isso que precisamos debatê-lo, torná-lo consenso e ajudarmos a população como um todo
a ter compreensão do seu verdadeiro significado. Disse Bittar que a principal meta dos trabalhos da Comissão é garantir que as inovações tecnológicas tragam benefícios reais aos brasileiros, mas para isso é preciso que haja consenso e equilíbrio na distribuição desses benefícios: — Estamos trabalhando na construção de um projeto que reflita os interesses de todas as camadas sociais brasileiras. Ele tem que representar a vontade dos vários setores; alguns já têm vozes e até muito fortes. Guerra no mercado Na ausência de uma definição mais substantiva e consagrada, usa-se a terminologia convergência tecnológica para definir todo o desenvolvimento técnico-científico em plataformas de comunicação no Brasil (tv aberta, sistema de redes de telefonia móvel e convencional, fibra ótica e de satélite). O investimento em novas tecnologias, admite Bittar, trouxe uma espécie de inquietação no mercado de audiovisual, uma vez que as empresas de telecomunicações desejam mudar seu perfil de negócios: — As teles querem transmitir conteúdos audiovisuais, mas estão esbarrando nas empresas que já dominam esse mercado, como as redes de tv aberta, que se sentem ameaçadas pelo grande poder econômico das possíveis concorrentes. Para as teles, vender apenas conversação pelo sistema de voz, através de um sistema de comunicação, estaria se tornando um processo anacrônico: — Como é possível fazer o mesmo via internet, ou por celular, a receita dessas empresas está entrando em queda, pois elas têm redes que custaram fortunas. Essa plataforma começou a ficar subutilizada, na medida em que os serviços de voz podem ser distribuídos por meio de
Bittar quer que as inovações tecnológicas proporcionem benefícios reais ao conjunto da população.
quaisquer outras plataformas disponíveis – disse Bittar, que informou à platéia que a Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática está trabalhando com o Governo para o lançamento da tv pública, que será feito juntamente com o da tv digital: — Será mais uma oportunidade de veiculação de produtos nacionais de qualidade. Estamos trabalhando no plano da chamada inclusão digital. A idéia é que possamos levar o direito de acesso à internet, a preços acessíveis, às nossas escolas e comunidades de baixa renda. Para isso estão sendo analisadas diversas ações legislativas, que serão aplicadas no plano nacional por meio dos recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações, o Fust, instituído com esse objetivo. O parlamentar advertiu que o Brasil deve se preparar, porque as transformações tecnológicas vão se realizar também no mercado dos canais abertos a partir da adoção da tv digital pelo Governo: — Isso revoluciona não só a qualidade da comunicação, como também a recepção, que vai ter mais qualidade nos nossos aparelhos de tv, num processo de alta definição. Este, porém, é o aspecto apenas subjacente da implementação do padrão digital, que permitirá o uso mais eficiente do espectro de freqüência pelo qual são transmitidos os sinais da TV aberta: — Vai ser possível pôr mais canais nessa freqüência, além de permitir que
se opere a multiprogramação. Ou seja, a transmissão de vários canais, simultaneamente, dentro de um mesmo canal. Outro elemento importante é a interatividade do telespectador com o programa, como já faz hoje o internauta com o computador, em chats. Área difícil A nova legislação deverá se preocupar também com a verticalização histórica da comunicação no Brasil, iniciada com as concessões de tv durante o regime militar, que favoreceram o surgimento de controladores de grandes redes nacionais, em detrimento da produção regional. O atual sistema também impede o aumento de veiculação de produtos independentes, ao contrário do que acontece, por exemplo, nos Estados Unidos: — Lá, só os programas jornalísticos das grandes redes têm produção própria. O resto é comprado de produtoras independentes, o que dinamiza a geração de empregos. Mas há que se ter um olhar sobre a dinâmica desse processo. Não adianta estarmos bem intencionados no aumento da produção se não tivermos condições de controlar como esses produtos são distribuídos e comercializados. A questão, diz ele, é muito delicada e vem sendo tratada com especial atenção: — A Comissão está pensando na revogação da Lei do Cabo. Pretendemos também criar uma legislação uniforme para tratar do problema de tv por assinatura no País.
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Aconteceu na ABI
O caos de Sganzerla-Welles Diretor de O Bandido da Luz Vermelha monta obra de ficção sobre o filme maldito do criador de Cidadão Kane. O signo do caos, de Rogério Sganzerla, abriu no dia 1° de outubro a programação do Cine ABI, iniciativa do Diretoria de Cultura e Lazer da Casa. O longa-metragem é uma obra de ficção e gira em torno do filme It´s all true, de Orson Welles, que foi rodado no Brasil. O longa foi apresentado pelo curador da mostra, Sérgio Santeiro. Na platéia estavam a mulher do cineasta, Helena Ignez, e Otávio Terceiro, ator do filme. Durante a explanação, Santeiro ressaltou a importância de um filme ser visto mais de uma vez para que seja feita uma análise crítica consistente daquilo que quer ser passado pelo autor. O curador também traçou um perfil de Sganzerla, ressaltando a importância do diretor: — Ele foi, com certeza, o mais modernista dos cineastas do País.
CinBeI A
Depois, Helena Ignez falou um pouco sobre o filme que seria apresentado, o último realizado pelo marido. Disse ela que as películas de Sganzerla sobre o trabalho de Orson Welles no Brasil tornaram-se obrigatórias onde há debates sobre o diretor norte-americano. Helena Ignez ficou satisfeita pelo fato de o Cine ABI ter escolhido um filme do marido para exibir: — Estou muito agradecida, feliz e adorando estar aqui rodeada de amigos — ressaltou. O signo do caos tem como pano de fundo um fato histórico: a vinda de Orson Welles ao Brasil, em 1942, quando filmou It´s all true (É tudo vertade). Welles começou a registrar cenas de Carnaval, favelados e outros personagens que não agradaram aos estúdios norte-americanos. O longa-metragem relembra essa história de maneira descontínua, fragmentada. Há uma carga
que chega ao porto e é examinada por um personagem chamado Dr. Amnésio (Otávio Terceiro). Nas caixas estão os restos desse filme interrompido de Welles. O signo do caos traz ainda a atriz Camila Pitanga, num dos seus primeiros papéis no cinema. O filme de Sganzerla foi rodado em super-16 mm e 35 mm, misturando imagens em preto e branco e coloridas, e ganhou o Prêmio Especial Festival de Brasília 2003 de melhor diretor e melhor montagem. Rogério Sganzerla nasceu em Joaçaba, Santa Catarina. Estreou na direção de longas em 1968, com O bandido da luz vermelha, depois de passar quatro anos como crítico de cinema no Estado de S.Paulo. Em 1969, dirigiu A mulher de todos, estrelado por sua mulher. Fundou a produtora BelAir, com a qual fez, entre outros, O abismo, Nem tudo é verdade e Tudo é Brasil.
Mesmo com problemas decorrentes de um câncer no cérebro, Sganzerla continuou produzindo seus filmes. No último, O signo do caos, usou pela primeira vez o formato de película super-16 mm, o que lhe permitiu uma fotografia bem contrastada. Quando compareceu ao Odeon em uma cadeira de rodas para apresentar a obra em sessão especial, foi aplaudido de pé pela platéia. Sganzerla também enveredou pelo teatro. Dirigiu as peças Savannah Bay, de Marguerite Duras, com sua filha, Djin, e sua mulher no elenco; O belo indiferente, de Jean Cocteau; e A maja desnuda, sobre a vida e a obra de Goya. Sganzerla morreu — em 9 de janeiro de 2004, aos 57 anos — com o sonho de refilmar o clássico O bandido da luz vermelha, tendo Alexandre Borges no elenco. (Márcia Martins)
Zelito: A elite não olha para o povo E não percebe que o problema do Brasil não é econômico, e sim a cultura que ela abandona. O Cine ABI recebeu no dia 8 de outubro o diretor e produtor de cinema Zelito Viana, um dos grandes nomes do Cinema Novo brasileiro e co-fundador da Mapa Filmes do Brasil Ltda. Durante o evento, ele falou um pouco acerca da situação da cultura e do cinema no Brasil da atualidade. Zelito entende que o maior de todos os problemas do Brasil não seria de ordem econômica, e sim de natureza cultural. Ele considera que os governantes estão relegando a cultura brasileira ao segundo plano: — O problema do Brasil não é econômico, e mesmo assim só se fala de economia, pensa-se apenas na estrutura. O País é rico, mas nossa população ainda está perecendo na pobreza, sem acesso à educação e à cultura. A elite política não olha para o povo brasileiro como ele merece ser observado. Ao expor as dificuldades do cinema no Brasil, que vive de uma “migalha” do mercado, que é dominado pela produção norte-americana, uma realidade, disse, encontrada em toda parte, ele denunciou: — Em todos os países do mundo o mercado de cinema é dividido entre o nacional e o norte-americano. Aqui, os filmes do último grupo representam por volta de 95% do nosso mercado — afinal, nós somos colonizados. Os EUA entenderam que ganhar a mente e os corações das pessoas era muito melhor e eficaz do que se impor por meio de armas. Este domínio do mercado é uma conseqüência política pensada pelos 22 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
norte-americanos e realizada de maneira brilhante. Mas nós temos condições de reverter isso, pois somos um país enorme, com uma cultura vastíssima. Falta-nos apenas vontade. Zelito falou também de seu curtametragem A necessidade da arte, documentário estrelado por Ferreira Gullar e que procura mostrar a importância da obra de arte na vida do ser humano, filme, disse, que pertence mais ao poeta maranhense do que a ele próprio. — Pelo menos 90% do filme se devem a Ferreira Gullar. Eu selecionei de um livro de arte uns dez quadros, dos mais diversos gêneros e artistas, e minha intenção era filmar a impressão que ele teria sobre as pinturas. Mas Gullar foi muito além e falou da necessidade humana de buscar uma transcendência através da arte. A idéia de fazer o filme veio após Zelito ler o livro Relâmpago, em que Ferreira Gullar retrata a emoção que sentiu diante de obras de artistas brasileiros e estrangeiros. O cineasta não sabe como o livro parou em suas mãos, mas em 2006 resolveu entrevistar o autor para realizar o documentário, que acredita ser um guia de reflexão sobre a arte: — A necessidade da arte é um ótimo exercício para discutir a arte. Ele é polêmico e levanta questões sobre a vida que o ser humano leva hoje. Produtor e diretor de filmes, Zelito Viana fundou em 1965, com Gláuber Rocha, a Mapa Filmes, empresa que realizou os filmes Terra em transe (1966),
Tendo como protagonista Chico Anysio, seu irmão, Zelito dirigiu o primeiro episódio da comédia O doce esporte do sexo (1971). Foi também responsável pela produção de 51 programas do humorista para a TV Globo e dirigiu documentário histórico com a cantora Sueli Costa. Zelito conquistou vários prêmios no exterior: o Air France de melhor produtor por Terra em transe; o Pavão de Prata de melhor diretor, na Índia; a Coruja de Ouro, no Brasil, e a Salva de Prata, em Portugal, por Os condenados; a Margarida de Prata, do CNBB, com MorZelito condena a dominação colonial do mercado de cinema: os te e vida severina; o filmes note-americanos ocupam 95% das salas de exibição. Candango de Ouro, com Choque cultural; O dragão da maldade contra o santo guero Tucano de Ouro, com Cabra marcado reiro (1968) e Cabeças cortadas (1970). para morrer. O filme Avaeté, a semente da Em 1999, dirigiu seu mais ambicioso vingança foi um de seus trabalhos mais projeto: Villa Lobos, uma vida de paixão, premiados, tendo conquistado medalha com seu filho, Marcos Palmeira, revede prata no Festival de Moscou, o Sol de zando-se com Antônio Fagundes no Ouro no Rio Cine Festival, o Prêmio Air papel-título, em diferentes fases da vida France e o Festival de Tróia, em Portudo personagem. gal. (Igor Waltz e Márcia Martins)
Após a demora de cinco anos em sua realização, Romance proibido teve um lançamento, em 1944, excepcional para um filme brasileiro: estreou em nada menos que cinco salas.
A descoberta de Lençóis, em Brilhante Cidadezinha baiana ganhou projeção com a realização de um filme,conta Conceição Senna num documentário. A história da transformação dos moradores de uma cidade após as filmagens de Diamante bruto, na década de 70, foi contada no dia 22 de outubro no Cine ABI. Estiveram presentes à exibição de Brilhante Conceição Senna, diretora e roteirista do documentário, e seu marido, o cineasta Orlando Senna. A idéia de fazer o filme surgiu durante oficinas de roteiro feitas por Orlando Senna em Lençóis, no interior da Bahia, que foi pano de fundo de Diamante bruto. Conceição percebeu que os moradores da cidade, ao verem o resultado na tela, relembraram fatos que aconteceram durante as filmagens: — Percebi que tinha que recuperar essa memória — diz ela. Lençóis vivia unicamente da extração de brilhantes até começar a enfrentar dificuldades devido à escassez da pedra preciosa. Após as filmagens de Diamante bruto, que ressalta a beleza da Chapada da Diamantina, houve aquecimento no turismo e o Município acabou sendo tombado pelo Iphan como Patrimônio Histórico Nacional. O ator José Wilker e Gilda Ferreira, que foi escolhida entre os moradores de Lençóis para trabalhar no filme, falam, em Brilhante, da experiência que tiveram em Diamante bruto. Também participaram do documentário Renée de Vielmond e o próprio Orlando Senna. Vários habitantes da cidade baiana contam histórias ocorridas durante as filmagens e as modificações pelas quais a cidade passou: — É lógico que ainda existe muita dificuldade, mas o turismo
fez muita gente melhorar de vida — ressalta Conceição. A cineasta, que se considera muito mais uma atriz, disse ter adorado a oportunidade de exibir Brilhante no Auditório Oscar Guanabarino. Vários diretores procuram espaços semelhantes para exibir seus filmes e o projeto tem tudo para dar certo, já que a ABI “está muito bem localizada, no Centro da cidade”: o horário escolhido também é um fator positivo, em sua avaliação, que terminou em trocadilho bem-humorado: — As pessoas podem esperar o trânsito melhorar assistindo a um bom filme: Esse espaço e o projeto são simplesmente brilhantes. Conceição Senna é atriz e atuou em filmes como Iracema — Uma transa amazônica (1976) e A ópera do malandro (1986). Estreou como diretora no documentário Memória de sangue (1987), realizado com os herdeiros dos sobreviventes do massacre de Canudos e premiado na Jornada de Cinema da Bahia e no Rio Cine Festival. A idéia de produzir Brilhante veio após a exibição de Diamante bruto em uma oficina de roteiros ministrada por Orlando Senna, em Lençóis. As pessoas da localidade falavam emocionadas sobre o ocorrido durante o tempo das filmagens, o que despertou na diretora a idéia de retratar essas histórias. Conceição diz que o documentário seria um complemento ao filme de Orlando, além de uma declaração de amor a ele. (Márcia Martins).
Expedito, luta e morte Longa de Aída Marques e Beto Novaes mostra a luta e o assassinato de líder camponês no Pará. O documentário Expedito — Em busca de outros nortes, de Aída Marques e Beto Novaes, foi exibido no dia 29 de outubro no Cine ABI. Primeiro longa-metragem de Aída Marques e Beto Novaes, o filme narra a trajetória de um líder camponês, Expedito Ribeiro de Souza, Presidente do Sindicato Rural de Rio Maior, no Pará, que foi assassinado por latifundiários da região. Mais que uma denúncia do fato em si, o filme busca recompor a figura do sindicalista como um poeta popular e homem de família exemplar, que pautou sua vida em favor dos outros sem esquecer o afeto e o amor aos mais próximos. Atualmente a família do líder sindical está espalhada por vários Estados. O filme acabou sendo o lugar do reencontro desse núcleo. Durante o documentário, Chico Buarque recita poemas de Expedito. Aída Marques estudou cinema e literatura em Paris. Regressou em 1979 e trabalhou para a Embrafilme até 1987. Premiada 11 vezes em diferentes festivais brasileiros, já editou mais de 40 filmes, entre eles Tensão no Rio (1982), de Gustavo Dahl; A igreja da libertação (1985), de Silvio Da-Rin; Geléia geral (1986) e Dama da noite (1987), de Sandra Werneck; e Memória de sangue (1987), de Conceição Senna. Ela é professora de cinema e vídeo da Universidade Federal Fluminense (Uff), em Niterói. José Roberto Novaes, ou simplesmente Beto Novaes, é pesquisador e professor de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e faz documentários em vídeo com temas relacionados ao mundo do trabalho e ao resgate da memória das lutas dos trabalhadores do campo. (Márcia Martins)
Um romance proibido, por Adhemar Gonzaga Criador da Cinédia levou cindo anos, por falta de filme virgem, fazendo um filme que causou sensação. Romance e traição estiveram presentes na tela do Cine ABI no dia 15 de outubro. Terceiro filme do criador da Cinédia, Adhemar Gonzaga, Romance proibido tem detalhes de produção requintada, qualidade que foi ressaltada pela filha do cineasta, Alice Gonzaga, antes da exibição. Mas nem tudo deu certo durante as filmagens, contou Alice. O filme, que começou a ser feito em 1939, teve sua realização adiada pela guerra e por um pedido do então Presidente Getúlio Vargas, que queria que a Cinédia terminasse primeiro um outro filme: — Durante a guerra faltavam filmes virgens e o pedido de Getúlio para terminar outro longa e dar um cunho mais nacionalista a Romance proibido fez com que a estréia acontecesse cinco anos depois — relembrou Alice. O longa, em preto e branco, conta a história de duas ex-colegas de colégio que gostam do mesmo rapaz. Uma, sentindose abandonada, vai lecionar no interior e revoluciona o ensino local. Por coincidência, porém, a professora volta a encontrar o rapaz e, não querendo atrapalhar seu casamento com a amiga, finge não gostar mais dele e vai dar aulas em outro lugar. Alice Gonzaga criticou o fato de a televisão não exibir mais filmes preto e branco, ficando esta categoria restrita a salas de exibição. Romance proibido foi recuperado pela própria Alice, que hoje tem um projeto de montar o Museu do Cinema. Um local já foi comprado para abrigar o que pode ser um novo centro de cultura e pesquisa para curiosos e especialistas no assunto: — Hoje, no Brasil, para montar um documentário, por exemplo, a gente precisa viver pedindo as coisas. Não tem que ser assim. Eu agora não empresto e não dôo mais nada. Tenho que guardar tudo para o museu. Animada com a nova empreitada, Alice, que tem 73 anos, brincou com uma fala do filme que foi exibido, dizendo que
agora não pode morrer porque está muito ocupada. Romance proibido não é só uma história de amor: faz também uma campanha contra o analfabetismo. Um momento importante, na concepção do diretor, é a cena em que a professora acaba de projetar um filme educativo para os alunos. Adhemar Gonzaga exalta o valor dos seres humanos que abdicam de suas aspirações pessoais em benefício do progresso da coletividade, através do nobre exercício de uma profissão. O longa-metragem estreou no Rio de Janeiro nos cinemas Plaza, Astória, Olinda, Ritz e República, em 18 de dezembro de 1944. Foi então o maior lançamento de um filme nacional. Terceira obra dirigida por Adhemar Gonzaga, teve sua realização adiada por vários motivos, entre eles não só a dificuldade de obtenção de filme virgem, mas também a recessão econômica do País em virtude da Segunda Guerra Mundial e os rigores da censura da época. Ator, jornalista, crítico, diretor, produtor e cineasta, o carioca Adhemar Gonzaga foi um pioneiro do cinema brasileiro e fundou o primeiro cineclube do Brasil, em 1912. Criou também o mais completo estúdio de sua época, a Cinédia, que está até hoje em funcionamento. Foi crítico das revistas Palcos & Telas e Paratodos e fundador da revista Cinearte. Tornou-se sócio efetivo da ABI em 16 de maio de 1924. Gonzaga esteve três vezes em Hollywood para aprender a técnica e adquirir equipamentos para suas produções. Foi parceiro de Paulo Emílio Salles Gomes no livro 70 anos de cinema brasileiro. Escreveu, produziu e dirigiu quase 40 filmes. Como produtor, assinou clássicos como Ganga bruta (1933), de Humberto Mauro, Bonequinha de seda (1936), de Oduvaldo Vianna, e O samba da vida (1937) e O cortiço (1945), ambos de Luís de Barros. (Márcia Martins). Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
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DEPOIMENTO
DIVULGAÇÃO
REALI JR. As grandes corporações estão invadindo a mídia na Europa de forma desastrosa
Enviado em 1972 para Paris pela Rádio Jovem Pan e correspondente do Estadão na França durante 33 anos, Realinho, como é chamado pelos companheiros mais antigos, teme que, a médio prazo, o Brasil tenha o mesmo destino.
ENTREVISTA A MÁRCIA MARTINS
Muitos começam na profissão devido à paixão pela escrita, pela leitura, ou pelo jornalismo propriamente dito. Pois a primeira paixão de Reali Jr. foi outra, bem diferente, e mesmo assim o levou a ser hoje um dos mais respeitados correspondentes no exterior. Autodidata, Elpídio Reali Jr. — mais conhecido apenas por Reali Jr., ou Realinho, em algumas Redações — aprendeu o ofício se espelhando em profissionais experientes. Na década de 70, mudou-se com a mulher e as quatro filhas para Paris, enfrentou dificuldades, mas adaptou-se à nova realidade. Passados 33 anos desde que se mudou para a capital francesa, lança o livro Às margens do Sena e acredita que ainda tem muito para aprender. Mesmo assim, dá alguns conselhos preciosos para os que pretendem seguir a carreira de jornalista, especialmente como correspondente estrangeiro. Jornal da ABI — V ocê começou Você no jornalismo com apenas 16 anos. Como foi o ingresso na profissão? Reali Jr. — Muito mais simples do que se pode imaginar. Não entrei por vocação ou a inspiração de uma criança voltada para a escrita. Não tinha nenhuma vocação de Rui Barbosa. Eu era apenas um jovem, recém-saído da adoles-
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Jovem Pan pretendia expandir seus serviços para os Estados Unidos e a Europa. Como eu já era o homem que a Direção sempre designava como enviado especial ao exterior em ocasiões como a eleição de Georges Pompidou, em 1969, me candidatei ao cargo, pois as coisas estavam ficando pretas no Brasil. Repórter político sob censura não dava. As restrições eram cada vez maiores e a minha credencial para cobrir o Presidente da República já havia sido cassada. Aproveitei e vim para Paris. Para minha surpresa, o General Lira Tavares, membro da junta militar que havia assinado o Ato Institucional nº 5, tinha sido nomeado Embaixador na França. Bela recepção. Mas tudo deu certo e pude realizar um trabalho interessante, pois a capital francesa era também a capital dos exilados brasileiros no exterior. Os governos franceses mostraram-se abertos para recepcioná-los, mas alguns ministros do Interior agiam ao contrário, colaborando com a polícia brasileira.
Jornal da ABI — Foi difícil se manter no jornalismo sendo tão novo? Reali Jr. — Na época, o mercado era bem mais aberto, as dificuldades eram menores. Optei por construir uma carreira aos poucos, sendo bem orientado por homens como Fernando Vieira de Mello e Mauro Guimarães, no rádio, e Cláudio Abramo e Mino Carta, na imprensa. As oportunidades foram surgindo e passei a trabalhar também para a tv como repórter esportivo, depois de Política e Geral. Fiz um pouco de tudo. Fui conhecendo gente, aprimorando minha agenda de endereços, tecendo cumplicidades com fontes importantes. Hoje as coisas são bem mais difíceis, em razão da crise econômica que cortou uma grande parte dos correspondentes dos jornais brasileiros. Ironia da História: na era da globalização, quando os jornais mais importantes espalham seus correspondentes por esse mundo afora, os brasileiros reduzem sua representação no exterior.
Jornal da ABI — Como era a busca da notícia assim que você chegou? Como eram produzidas as pautas? Reali Jr. — No começo o trabalho foi quase artesanal, pela falta de recursos materiais de um correspondente brasileiro. As primeiras emissões foram feitas de uma agência dos Correios. Meu escritório era na minha própria casa. Primeiro fiquei não muito longe da Torre Eiffel. Depois optei por uma residência junto à Maison de la Radio, onde se encontram instaladas numerosas rádios francesas, às margens do Rio Sena. Desde 1976 estou nesse mesmo apartamento, ao lado desse edifício que pode ser visto pelos turistas que passeiam de barco pelo Sena. Mas além das dificuldades técnicas havia as políticas também. Um corres-
Jornal da ABI — Fale um pouco sobre a sua trajetória profissional. Reali Jr. — O primeiro veículo impresso em que trabalhei foi o Correio da Manhã, um grande jornal nos anos 60, dirigido por Osvaldo Peralva, outro mestre do jornalismo brasileiro. Depois, em São Paulo, passei pelos Diários Associados e a sucursal de O Globo, onde fui repórter político e chefe de Reportagem levado pelo Mauro Guimarães. Isto sem abandonar o rádio e a televisão. Passei pela TV Record, TV Tupi, Rádio Jornal do Brasil e Rádio Jovem Pan, onde me encontro desde aquela época até hoje. Foi a Jovem Pan que me enviou a Paris como correspondente. Depois ingressei no Estadão, do qual fui representante na capital francesa por 33 anos. Jornal da ABI — Como acontearis? Paris? ceu sua ida para P Reali Jr. — Em 1972, vivíamos os pesados “anos de chumbo” da ditadura e a
pondente brasileiro, por mais importante que venha a ser o órgão, não tem a mesma importância de um correspondente norte-americano, de um Washington Post, ou europeu, do The Guardian da Inglaterra, por exemplo. A luta é desigual. Os interesses, também. É preciso saber aproveitar as chances. Para conseguir uma entrevista, era preciso ficar atento a uma viagem do Presidente da República à França ou do Presidente francês ao Brasil. Na França, ao contrário de outros países, é preciso trabalhar muito para obter uma boa agenda de contatos. Em países como a Itália e a Alemanha, os centros de imprensa herdados do nazismo e do fascismo permaneceram, e hoje facilitam contatos democráticos. Naquela época, os jornalistas-correspondentes eram reunidos num mesmo local, com facilidades de transmissão, mas eram também mais bem controlados do que se estivessem espalhados. É preciso muita determinação para se impor na França, onde as coisas melhoraram, mas ainda não são perfeitas. Para se conseguir uma credencial, demorava muito, às vezes seis meses, e o candidato a correspondente passava por interrogatórios no Ministério do Exterior e na policia. Depois as coisas se tranqüilizavam e você passava a ser chamado para entrevistas nos ministérios e podia participar do briefing do Quai D‘Orsay — designação que muitos franceses associam ao Ministério das Relações Exteriores. Hoje, a burocracia melhorou, mas as dificuldades são mais ou menos as mesmas. Jornal da ABI — A figura do pauteiro não fez falta? Reali Jr. — Não. Para mim, o pauteiro é uma atividade nula, reivindicada pelos que nunca foram à luta, que nunca tiraram o traseiro da cadeira. Pautei-
ro não é jornalista , mas sim o homem que solicita o impossível para não obter nada. Não admito pauteiro que não tenha sido repórter, pois só esses sabem como as coisas são complexas e não comportam as facilidades da imaginação fértil, mas pouco realista, desse tipo de atividade. Como dizia o Claudio Abramo, pauteiro só deveria dar o nome do entrevistado interessado e se possível, o telefone. O restante o repórter faz. Jornal da ABI — Como foi a adaptação da família? Foi fácil passar a trabalhar em casa? Reali Jr. — Para alguém que no Brasil chegou a ter quatro, cinco empregos, correndo de um para outro, não foi nada fácil. Afinal, saía de casa às 7h e voltava às 23h, quando não chegava de madrugada. No começo foi difícil, mas a vida mudou no exterior. As crianças, graças ao ensino francês, passavam o dia na escola. Por isso, quando chegavam da escola, era uma alegria; dava para interromper um pouco um texto para saudá-las — às vezes para dar bronca numa delas, devido a uma nota baixa. Trabalhando em casa, mesmo mergulhado no seu texto, há uma tendência em você se meter com problemas da casa com os quais não teria nada a ver. Quantas vezes ouvi Amelinha passar e dizer que ia preparar um espaguete al sugo para a noite e eu respondia de pronto: “Faz um picadinho que eu prefiro.” Já abria espaço para tomar uma bronca, pois não tinha que dar palpite nessas coisas. Nunca houve nada grave, mas depois de 35 anos acho que o melhor é sair, trabalhar fora, e voltar para casa. Você aumenta o grau de liberdade de sua mulher, não interferindo naquilo que não é de sua conta. No caso da Amelinha, ela não podia trabalhar, pois tinha que cuidar das meninas num país que FOTOS: ARQUIVO PESSOAL
cência, com apenas 16 anos e apaixonado pela namorada. Como queria casar, necessitava arrumar um trabalho. Fui procurar então um velho amigo da minha terra, Bauru, no interior de São Paulo, o Cesemiro Pinto Neto, que, na época, era o Diretor da Rádio Pan-americana. Eu me candidatei a uma vaga de repórter esportivo, pois não tinha idade suficiente para a Política, apesar de já ter forte inclinação pelas coisas que envolviam o noticiário político. Aprendi jornalismo praticando-o no cotidiano, buscando exemplos nos mais velhos, lendo seus artigos, procurando, na medida do possível, contato com eles. Hoje os veteranos são pouco considerados por uma geração, apesar de terem deixado ou estarem deixando uma ampla bagagem de exemplos que merecem ser examinados. Cinco anos após conseguir o emprego, estava casado e com filha. Hoje são quatro filhas e continuo amando a mesma mulher. Costumo nos definir como um casal revolucionário nos tempos atuais.
Reali Jr. mora no mesmo apartamento desde que chegou à França, em 1976. Lá ele criou as quatro filhas, uma delas, Cristiana, festejada pelos franceses como grande atriz. Entre os amigos que o visitam em Paris está o jornalista e escritor Luiz Fernando Veríssimo.
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DEPOIMENTO REALI JR.
“A reportagem mais marcante da minha vida foi uma entrevista com o médium Chico Xavier na TV Tupi. Ele recebeu no próprio estúdio o espírito do escritor Camilo Castelo Branco.” não era o dela. Acabou sacrificando sua vida profissional para permitir a realização profissional do marido e das filhas. Jornal da ABI — Qual reportagem você destacaria como a mais importante da sua carreira? Reali Jr. — A mais marcante da minha vida, pelo menos a de maior repercussão junto ao público, foi uma entrevista com Chico Xavier num programa da TV Tupi, Pinga fogo, apresentado pelo jornalista Almir Guimarães. Na época não existia ainda a transmissão nacional: o programa foi ao ar em São Paulo e passou a rodar o Brasil em videoteipe. Durante dois anos, a entrevista correu o País. O líder espírita recebeu no próprio estúdio o espírito do escritor Camilo Castelo Branco. Chico Xavier era honesto, simples e muito franco e impressionou os telespectadores. Hoje, esse vídeo foi recuperado e encontrase à venda. No mesmo programa, Jarbas Passarinho, na época Ministro da Educação, reconheceu que havia tortura no Brasil e que não se podia esconder o sol com a peneira. Isso ocorreu na véspera de minha partida para a França e a notícia foi publicada com grande destaque pelo Le Monde. Era a primeira vez que um Ministro reconhecia a tortura na ditadura. Jornal da ABI —V —Você correu ocê já cor reu risco em alguma reportagem? Reali Jr. — Situação de perigo todos nós passamos, no Brasil, na Europa ou em coberturas mais sensíveis em qualquer parte do mundo. Todo correspondente tem histórias dessa natureza, mas isso é normal e inerente à profissão. Na guerra Irã-Iraque, na fronteira marcada pelo Rio Chat el Arab, houve uma troca de tiros em Korranchar, cidade iraniana cujo controle havia sido anunciado pelos iraquianos. Noutra ocasião, houve um incêndio no hotel onde dormia em Oviedo, cidade da Galícia onde fui cobrir a entrega do Prêmio Astúrias ao Presidente Lula. Acabei sendo retirado pela escada magirus, mas antes abracei o computador que os bombeiros espanhóis não queriam transportar na operação. Mas vamos fa26 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
Repórter da Rádio Pan, Reali se debruça sobre o Governador Jânio Quadros para entrevistá-lo. Ao lado, no palanque de uma inauguração, ele fica à direita do Governador Ademar de Barros para ouvi-lo. Reali conhece histórias incríveis de Ademar, boa parte delas impublicáveis.
lar de outras coisas, pois passar por momentos perigosos faz parte do jornalismo e de outras profissões de risco.
Tempos de luta: numa greve de jornalistas, Reali grita palavras de resistência à represssão num piquete à porta de um jornal. De pé, o jornalista e hoje escritor Ignácio de Loyola Brandão. Nem jatos dágua dissolveram o piquete.
Jornal da ABI — Então vamos falar do seu livro. Como surgiu a idéia de fazer Às margens do Sena ? Sena? Reali Jr. — A idéia nasceu do Gianni Carta. Afinal, trabalhando 11 horas por dia, para o Estado de S.Paulo e a Jovem Pan, ficava difícil pensar em escrever mais alguma coisa. O pouco tempo em que tinha antes de dormir aproveitava para trocar conversa fiada com colegas e amigos, sempre acompanhada de um prato de macarrão e um bom Bordeaux ou Bourgogne — ou de um Montalcino, um Brunello ou um Montepulciano. O Gianni, que é um excelente correspondente, propôs que escrevêssemos a quatro mãos, nas horas de folga e sem pressa para a publicação. Assim foi feito. Foram mais de cem horas de depoimentos, porém muitas histórias e seus bastidores ficaram de fora. Gianni resolveu ouvir algumas pessoas citadas sobre os fatos que revelei. Mania de repórter de ouvir o outro lado, sempre necessário para uma boa apuração. De todos, só o Delfim Netto se recusou a prestar depoimento. Também, quem foi ouvi-lo logo de cara perguntou sobre o Relatório Saraiva. Nosso ex-Ministro, mago das finanças, refugou diante do obstáculo. A seleção foi feita de comum acordo, mas não havia espaço suficiente para tudo — afinal, o livro já tem 320 páginas. Sobraram algumas apetitosas histórias desses 35 anos de Paris e mesmo passagens brasileiras interessantes, talvez suficientes para escrever um outro, Rive Droite et Gauche de la Seine. Jornal da ABI — Qual a sensação de ver pronto o livro com os
Na turma do Colégio Estadual Caetano de Campos, Reali é o quinto a partir da esquerda. A foto é do acervo de Itobi Alves Correia, o nono a partir da esquerda, na última fileira, em pé. Os pais de Reali, Giuseppina e Ettore, chegaram ao Brasil no fim dos anos 1900 e não deixaram de fazer a foto então obrigatória e tradicional.
bastidores das suas reportagens? Reali Jr. — A sensação para um novato foi muito boa. Talvez pelo não esperado êxito editorial do livro. Achamos que ia agradar a jornalistas, estudantes de Jornalismo e ouvintes que me acompanham pela Jovem Pan. Graças a amigos da mídia, o livro já explodiu na noite de autógrafos, com 730 exemplares vendidos. Outros 500 exemplares haviam sido reservados pela Ediouro e enviados à nova Livraria Cultura de São Paulo. E 230 foram vendidos em consignação, mas com direito a autógrafos. Isso nos obrigou, eu e Gianni, a passar o dia seguinte assinando os livros. Outros 50 foram enviados a Paris, para depois voltar ao Brasil devidamente autografados. Jornal da ABI — O outro livro que daria para fazer já é um projeto certo? Reali Jr. — Por enquanto, estou enfrentando um outro desafio: minha própria saúde. Mas, vencido esse episódio, espero poder pensar em alguma coisa, ainda não decidida. Talvez aprofundar um pouco mais minha experiência na Europa, o trabalho feito, as mudanças que ocorrem no jornalismo e os novos desafios de um correspondente, que já
não são os mesmos anteriores. Antes, um bom correspondente necessitava de algumas qualidades, falar línguas, ter bom conhecimento geral, muita disposição e determinação para vencer os obstáculos. Hoje, na era da internet, as exigências são maiores — a começar por uma boa formação de informática — e a concorrência, também. Jornal da ABI — Seu livro não trata apenas de reportagens e seus bastidores: traz um verdadeiro guia gastronômico. Como surgiu a idéia de abordar esse tema? Reali Jr. — Às margens do Sena é a história de uma trajetória ou de uma vida. As viagens e companhias mais interessantes, e certas passagens entre gastrônomos, no caso, eu, o Luis Fernando Verissimo, Lúcia e Amelinha. Precisava tratar das férias, dos dias de folga de um correspondente, ou o livro estaria incompleto Ora, quando falo dos lugares por onde passamos, dos lugares em que comemos, tinha obrigação de citar seus nomes, pois seria frustrante para o leitor não obter a informação sobre um restaurante ou um hotel onde poderia comer ou se hospedar numa eventual passagem pelo local. Por que esconder do
Já vinculado ao jornalismo impresso, Reali (primeiro à esquerda) participa de uma entrevista coletiva com Prestes Maia.
“Le Figaro agora é controlado pelo grupo Dassault. Libération, fundado por Jean-Paul Sartre, hoje está nas mãos da família Rothschild. A médio prazo o Brasil não vai escapar disso.”
Reali Jr. — Aqui na França, acompanho as mudanças da imprensa, a profissionalização de certos jornais e a invasão dos grandes grupos industriais e financeiros na mídia, o que acontece de forma desastrosa aqui na Europa e tende a se repetir no Brasil. Jornais como Le Figaro, Le Monde, Libération estão passando das mãos de famílias ou de grupos de jornalistas para grandes corporações, muitas vezes ligadas à venda de armas ou à fabricação de aviões de combate. É o caso, por exemplo, do Figaro, controlado pelo grupo Dassault, e do Libération , fundado por Jean-Paul Sartre e hoje nas mãos da família Rothschild. O Brasil, a médio prazo, não vai escapar disso.
leitor um lugar onde eu e o Luis Fernando comemos bem? Não se trata de uma guia, mas de algumas dicas que valem o “détour ”, como dizem os franceses. Este foi o nosso objetivo: passar a boa informação de forma completa.
Jornal da ABI — Jornalismo é uma das carreiras mais concorridas nos vestibulares, e muitos universitários sonham ser correspondentes. Que dica você daria a eles? Reali Jr. — Aos novos jornalistas digo que tudo é possível. Muita coisa mudou, mas ainda é preciso ter muita determinação. Uma vez, o ex-correspondente da Folha de S. Paulo Caio Túlio Costa me confessou que, como Secretário de Redação, criticou muito o trabalho dos correspondentes e só quando ocupou esse lugar pôde constatar que a tarefa não era fácil. Aí no Brasil, nas grandes Redações, toda uma estrutura funciona a favor do redator, do enviado especial ou do repórter. No exterior, essa estrutura é de responsabilidade do jornalista — no caso de uma cobertura externa, por exemplo, da reserva da passagem e do hotel ao passaporte e o visto. Essa parte administrativa o repórter desconhece no Brasil — e ela dá trabalho e toma tempo. Muitas vezes, por problemas de fuso horário e outros, há pouco tempo para apurar e escrever. No país onde você vive, é preciso criar sua rede de informantes. Na França, muita coisa funciona numa mesa de restaurante — e isso significa despesa. Enfim, são tantas as coisas, simples e complexas, que devem ser supervisionadas ao mesmo tempo que tem gente que desiste na metade do caminho. Uma coisa posso dizer: aprendi muito durante todo este tempo na Europa.
Jornal da ABI — Após 25 anos vivendo uma realidade diferente, você acha que daria para voltar a fazer jornalismo no Brasil hoje? Reali Jr. — Acho que dá, pois não sou um homem desligado do País. Nunca deixei de acompanhar de perto todos os acontecimentos políticos e de outra natureza que possam ter ocorrido no Brasil. Como digo no começo do livro, sempre estive ligado. Na votação das diretas, tomei um avião e fui para Brasília só para assistir às negociações e à votação naquele momento delicado de nossa vida político-institucional. Agora, com a internet , isso não é mais necessário, mas passo uma boa parte do tempo seguindo os escândalos, as disputas no Congresso, no Supremo, e participo da luta contra o amianto no Brasil — uma vergonha. Apesar de estar fora durante todo esse tempo, conheço São Paulo como a palma de minha mão. Aprendi a conhecer essa cidade feia, mas cuja feiúra eu adoro. Jornal da ABI — V Você ocê acompanha a imprensa em dois países bem distintos. Como analisa o jornalismo no Brasil e na França?
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Liberdade de imprensa DEBATE
A CENSURA CHEGOU PRIMEIRO Antes mesmo da criação dos primeiros jornais no Brasil, era a realeza que decidia o que se podia publicar, diz em seminário na ABI a jornalista e escritora Ana Arruda Callado. REPRODUÇÃO
POR R ODOLPHO T ERRA
A censura instalou-se no Brasil antes mesmo do aparecimento da imprensa entre nós, na primeira década do século XIX, disse a jornalista e escritora Ana Arruda Callado, Presidente do Conselho Estadual de Cultura do Estado do Rio, ao intervir no dia 10 de outubro na sessão de abertura do seminário A liberdade de expressão em debate, promovido na Sala Belisário de Souza da ABI pelo PEN Clube do Brasil, com apoio da Casa. O seminário foi aberto pelo Diretor de Cultura e Lazer da ABI, Jesus Chediak, que recepcionou o Presidente do PEN Clube, Cláudio Murilo Leal, e a Vice-Presidente, Ana Arruda Callado, também Presidente do Conselho Estadual de Cultura, e o Secretário-Geral da Academia Brasileira de Letras, Cícero Sandroni. Chediak iniciou o seminário com um relato sobre a situação da censura no Brasil em tempos de ditadura e nos dias de hoje. Ele falou dos direitos sociais, do direito à saúde e à educação e do forte poder do Estado. E citou a comercialização sobre o capital intelectual: — Hoje a pessoa não é mais considerada pelo mérito ou pela atividade profissional, e sim pelo seu poder de compra. Cláudio Murilo Leal abriu sua intervenção sobre a liberdade de expressão na imprensa com uma citação de origem inglesa: — A verdadeira liberdade ocorre quando os homens, nascidos livres, precisando dirigir-se ao túmulo, podem falar livremente. Aquele que puder e quiser falar merecerá elogios. Aquele que não puder ou não quiser poderá ficar em paz. O que poderá ser mais justo em um governo do que isso? Ele justificou a razão do tema escolhido para o seminário, mencionando a presença da liberdade de expressão na História, na literatura e na imprensa. Antes de passar a palavra à Vice-Presidente Ana Arruda, aproveitou para citar o trecho de uma notícia publicada em O Globo, dois dias antes, sobre a liberdade de imprensa que estaria sendo ameaçada na Venezuela. A Presidente do Conselho Estadual de Cultura explicou que a censura no Brasil tem origem antes mesmo da imprensa, um século depois de existirem jornais publicados na Europa, em países onde a monarquia já havia sido extinta. Aqui, a imprensa também foi prejudicada pela realeza, que muitas vezes vetou as gazetas. A censura fez que publicações fossem perseguidas e 28 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
Desembarque de Sua Alteza Real, gravura de Charles Simon Pradier, segundo óleo de Jean Baptiste Debret, que mostra D. Carolina Leopoldina em primeiro plano e D. João VI entrando na carruagem que os levaria ao Palácio de São Cristóvão. Ao fundo, o Mosteiro de São Bento.
Ana Arruda, entre Cecília Costa e Jesus Chediak, mostrou a precedência da censura, que Cláudio Murilo Leal e Cícero Sndroni também condenaram.
publicadas clandestinamente. Ela descreveu também a evolução das publicações brasileiras, partindo de um dos primeiros veículos impressos, o Jornal do Commercio do Rio, que data do século XIX, e a Gazeta do Rio de Janeiro. Com relação à situação atual da imprensa, falou das constantes agressões contra jornalistas e escritores, em todo o País. Falando da ABI, Ana Arruda relembrou
os tempos em que a entidade era questionada sobre a própria existência e disse que hoje ela é um órgão útil e que, como no início, luta por ideais como o da liberdade de imprensa. O Secretário-Geral da Academia Brasileira de Letras, Cícero Sandroni, lembrou a época da ditadura, em que todos os presentes, jornalistas ou não, vivenciaram momentos difíceis na História do Brasil.
Sandroni comparou também as primeiras publicações brasileiras, incluindo na lista o Diário de Pernambuco, “o jornal mais antigo em circulação na América Latina”. No final, comentou a entrevista que fez com o Presidente da ABI Barbosa Lima Sobrinho para a revista Status. Rodolpho Terra, estudante de Comunicação Social, é estagiário da Diretoria de Jornalismo da ABI
JOSÉ CRUZ/ABR
A religião, fonte de perseguições A liberdade de expressão em debate teve seqüência em 17 de outubro com um painel dedicado à História. O Presidente do PEN Clube, Cláudio Murilo Leal, recebeu os palestrantes Luiz Paulo Horta, escritor, historiador, crítico de música clássica de O Globo e membro da Academia Brasileira de Música e da Academia Brasileira de Arte, e Paulo Roberto Pereira, professor da Universidade Federal Fluminense e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, ensaísta e crítico literário. O Presidente do PEN Clube do Brasil abriu a sessão com um breve sumário sobre o primeiro painel, que teve como tema a imprensa. Em seguida, Luiz Paulo Horta discorreu sobre a religião relacionada à liberdade de expressão, dando exemplos históricos em que as igrejas influíram diretamente na comunicação e na imprensa: — Por muitos anos, pessoas foram punidas por não seguir alguma doutrina ou tal profeta. Um exemplo básico da questão religiosa como obstáculo à liberdade de expressão é a Inquisição. Muitas vezes, como no ressurgimento do fundamentalismo, a intolerância mata também o espírito religioso. Outro aspecto destacado por ele foi a questão do poder da Igreja sobre o Estado: — Mas o universo dessa questão da religião x liberdade de imprensa é um assunto de grande amplitude. Acho que entramos num território imenso, inesgotável, que eu definiria como o diálogo entre o poder temporal e poder espiritual. Luiz Paulo mencionou a Bíblia, um livro mais próximo à civilização ocidental, e citou um trecho do Livro dos Reis, que acredita ser “fascinante e um dos mais bem escritos, em particular quando conta a história de Davi”: — O diálogo entre o profeta e o Rei se dá como entre duas pessoas iguais — destacou o jornalista, que procurou mostrar também um panorama geral sobre a liberdade de expressão e a doutrina nos países do Oriente Médio e na China de Mao Tsé-Tung. O professor Paulo Roberto Pereira, que atualmente coordena a coleção bicentenária Dom João VI no Brasil e está lançando o livro A comédia de Antônio José da Silva, O Judeu — falou sobre a liberdade de expressão no mundo luso-brasileiro do século XVIII e dos períodos de Inquisição que Portugal vivenciou: — Os Lusíadas (acima) é uma obra que ilustra bem o poder da fé e das cren-
REPRODUÇÃO
A Inquisição, a grande matriz da intolerância, analisada por Luiz Paulo Horta. Nas fogueiras da Inquisição arderam infiéis por não seguirem determinada doutrina ou tal profeta, disse Luiz Paulo Horta, assinalando que, como ocorre nos fundamentalismos, a intolerância mata o espírito religioso. Experimentada repórter política, Tereza Cruvinel deixou O Globo e a TV Globo em Brasília para dirigir a nascente TV Brasil.
ças cultivadas durante a constituição do império português. Sem levar em conta esse catolicismo muito peculiar, esse catolicismo armado, não conseguiríamos entender o Estado lusitano. Como Luiz Paulo Horta, Roberto Pereira discorreu sobre a questão Estado x religião, mas focou o assunto especialmente no período que precedeu ao descobrimento do Brasil e, depois, na catequização dos nativos sul-americanos. Antes de finalizar, ele comentou “como é relativo o fenômeno da liberdade de expressão e como é importante
acompanhar os passos que ela deu através dos tempos”. O Presidente do PEN Clube, Cláudio Murilo, despediu-se dos palestrantes e da platéia reforçando a idéia da contínua luta pela liberdade de expressão em todos os meios de comunicação. Ele se referiu à pesquisa da organização Repórteres Sem Fronteiras, publicada na quarta-feira precedente em O Globo, que mostra que o Brasil teve uma queda de nove posições no ranking anual das condições de trabalho na imprensa. (Rodolfo Terra).
Os planos do PEN Clube Seu Presidente desde julho, Cláudio Murilo Leal quer dar relevo à defesa da liberdade de expressão. O PEN Clube é uma associação internacional que defende a liberdade de expressão e os direitos dos escritores. Por isso, diz Cláudio Murilo Leal, seu Presidente, a promoção do seminário se torna muito apropriada: — Quando assumi a direção do PEN Clube, em julho deste ano, minha primeira preocupação era poder realizar um evento que estivesse de acordo com a nossa missão institucional. Pensei na promoção do debate sobre liberdade de expressão, sabendo que ele deveria acontecer com a parceria de uma organização que tivesse as mesmas preocupações que nós. Foi por isso que procurei a ABI, que, na figura do Presidente Maurício Azêdo, nos apoiou de imediato. Cláudio Murilo Leal diz que um dos principais objetivos do encontro na ABI era mostrar que defender a liberdade de expressão é estar contra qualquer tipo de censura, seja ela política ou religiosa. O painel sobre literatura visava a mostrar uma distorção que vem ocorrendo no mercado editorial: — Atualmente, por imposição do mercado, só publica um livro o autor cuja obra é considerada best-seller. Quem não é enquadrado nessa categoria tem que arcar com os custos de edição do próprio bolso. O Presidente do PEN Clube pretende realizar outros encontros, nos quais deverão ser debatidos temas relativos à educação e à filosofia, que “na época do enciclopedismo do século das luzes, com Voltaire e muitos outros, batalhou pelos direitos dos homens”. Diz Cláudio Murilo Leal que trabalhar em parceria com a ABI, “com a adesão de debatedores com representatividade social e nível intelectual elevado”, dá mais visibilidade aos projetos que o PEN Clube pretende realizar, principalmente em assuntos como a liberdade de expressão, “que é a bandeira das duas instituições”(José Reinaldo Marques).
TV PÚBLICA
TV Brasil já é lei, por MP Uma medida provisória que tomou o número 398, publicada no Diário Oficial da União do dia 11 de outubro o Governo autorizou a criar a Empresa Brasil de Comunicação– EBC, que se chamará TV Brasil, cuja programação deverá ter como destaque informação sobre educação, cultura, ciência e lazer. A nova empresa está vinculada à Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, cujo titular é o Ministro Franklin Martins. Entretanto, conforme divulgou a Agência Brasil, a medida provisória garante sua autonomia em relação ao Governo federal na produção, programação e definição de conteúdos no sistema público de radiodifusão. A Diretoria-Executiva da Empresa Brasil de Comunicação será exercida pela jornalista Tereza Cruvinel, ex-colunista política do Globo, em Brasília. A empresa é constituída por um Conselho de Administração e um Conselho Fiscal, com, respectivamente, cinco e três membros nomeados pelo Presidente da República, e um Conselho Curador formado por quatro ministros de Estado, um representante dos funcionários e 15 representantes da sociedade civil. A Empresa Brasil de Comunicação, cuja sede será no Rio de Janeiro, foi criada a partir da união patrimonial da Radiobrás com a Associação de Comunicação Educativa Roquette-Pinto–Acerp, responsável pela TV Educativa fluminense. O orçamento previsto para o funcionamento da EBC em 2008 é de R$ 350 milhões. Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
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FOTO: RAQUEL HEIDRICH / ZERO HORA / AGENCIA O GLOBO
TRAGÉDIA
A MORTE NÃO ESTAVA NA PAUTA, MAS SE FEZ PRESENTE Três jornalistas cobriam uma colisão de veículos no interior de Santa Catarina quando foram mortos por uma carreta, que, apesar da sinalização do acidente, entrou na contramão a 130 quilômetros por hora e atropelou repórteres, bombeiros, passageiros, curiosos e quantas pessoas encontrou pela frente. A morte não estava na pauta dos jornalistas Evandro Luiz Troian, de 33 anos, Elisandra Lucotti, de 27, e Valdik Lucas Rupolo, de 35, quando cobriam na noite de 9 de outubro uma colisão de veículos no Quilômetro 630 da Rodovia BR-282, no Município de Descanso, no extremo oeste de Santa Catarina, a 680 quilômetros de Florianópolis, capital do Estado. O acidente envolveu um ônibus e um caminhão, que se chocaram de frente, causando a morte de sete pessoas e ferimentos em dezenas. Quando as vítimas eram socorridas por bombeiros profissionais e bombeiros voluntários, o motorista de uma carreta carregada de soja ignorou a sinalização do acidente, iniciada a oito quilômetros do local da colisão, percorreu dois quilômetros na contramão a 130 quilômetros por hora e atropelou as equipes de socorro, jornalistas que cobriam o primeiro acidente, sobreviventes da colisão anterior e curiosos que acompanhavam os
trabalhos de assistência e remoção das vítimas. Morreram mais 20 pessoas. Ao todo, 27 mortos e dezenas de feridos. – A cena lembrou um furacão. Eram pedaços de pau, lata, carga voando. Um poeirão subindo – disse o Major Luiz Carlos Balsan, do Corpo de Bombeiros de Chapecó, Município vizinho de Descanso, mobilizado para auxiliar nas operações de socorro. como registrou a repórter Simone Iglesias, da Agência Folha em Chapecó. Esse furacão foi fatal para o cinegrafista Evandro Luiz Troian, da Rede Brasil Sul de Televisão-RBS, que cobria o acidente junto com o repórter Francesco Silva, que percebeu a aproximação do caminhão-bólido e conseguiu saltar e se abaixar, escapando da morte, como contou a repórter Adriana Baldissarelli, de O Globo: com o fio do equipamento na mão, Troian não teve a mesma sorte. Adriana revelou que Troian era paranaense e passou o ano trabalhando
Com os faróis acesos, vistos no fundo, a carreta investiu na contramão e matou 20 pessoas.
para a RBS em Chapecó. Ele deixou a companheira e um filho de três anos do primeiro casamento e estava no último ano da Faculdade de Educação Física da Universidade do Oeste de Santa Catarina-Unoesc. Valdik Lucas Rupolo era jornalista da Rádio Peperi.FM de São Miguel do Oeste, sua terra, e tinha dois horários na emissora: Desperta, Peperi, diário, das 5 às 6h30min, e Viva a Banda, ao meiodia dos domingos. Ele estava no local do acidente vendo o trabalho de socorro às vítimas e foi atingido pelo caminhão do motorista tresloucado. Darci Debona, repórter da Agência RBS, ouviu um amigo de Rupolo, o motorista de ambulância Diego Trentin, que morou com ele em Florianópolis, antes de regressarem a São Miguel do Oeste, e contou que o amigo estava muito bem: começara a namorar no vizinho Município de Bandeirante e recentemente havia comprado “o carro dos sonhos” – um Golf. Trentin trabalhou no resgate dos cor-
FÓRUM
Jornalistas do Sul-RJ tomam posição Carta aprovada em Barra Mansa defende um jornalismo ético e dedicado ao interesse público. Representada pelo Conselheiro Mário Augusto Jakobskind, a ABI participou do I Fórum de Jornalistas do Sul Fluminense, que reuniu centenas de jornalistas e estudantes de Comunicação, nos dias 5 e 6 de outubro, em Barra Mansa-RJ. Foram discutidas várias questões de interesse da categoria, com ênfase para a atividade jornalística no interior. O Fórum foi aberto com uma palestra sobre democratização das comunicações e da tv digital, proferida pelo jornalista e professor Gustavo Gindre, integrante do Coletivo Intervozes. Os Presidentes do Sindicato dos Jornalistas do Estado do Rio, José Ernesto Vianna, e do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, Susana Blass, participaram de painel sobre momento atual do sindicalismo. A Fenaj foi representada pelo Diretor Alcimir Carmo e o movimento Luta Fenaj, pela jornalista Bia Costa. Ao final do encontro, foi divulgada 30 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
a Carta de Barra Mansa, cujo teor é o seguinte: “Os jornalistas do Sul do Estado do Rio de Janeiro, reunidos em Barra Mansa, dias 5 e 6 de outubro de 2007, no I Fórum de Jornalistas do Sul-RJ, reafirmam sua função social de oferecer à sociedade um jornalismo de qualidade, plural, responsável, ético e voltado ao interesse público. Reunidos apenas dois meses após a aprovação do novo Código de Ética do Jornalista, ratificam como primeiro e essencial o compromisso com a informação como direito fundamental do cidadão que em hipótese alguma pode ser ameaçado. A divulgação da informação correta e precisa é direito e dever dos meios de comunicação e dos jornalistas. A manipulação, a distorção e a deturpação devem ser denunciadas como atentados à cidadania. Ao mesmo tempo, o I Fórum de Jornalistas do Sul-RJ condena o abuso do poder econômico, a imensa concentração da mídia, a censura por pres-
sões política e econômica e a violência — ameaças ao interesse público, à liberdade de imprensa e à democracia. Sendo este I Fórum realizado no mesmo momento em que termina o prazo das concessões de algumas das principais redes de tv do País, nós, jornalistas do Sul-RJ, somamo-nos à luta pela transparência e controle público dos processos de concessão e renovação de outorgas de radiodifusão, o que inclui a revisão criteriosa das atuais concessões, a regulamentação dos artigos constitucionais referentes ao tema e também a observância de critérios democratizantes na transição do modelo analógico para o modelo digital de transmissão de rádio e tv. Os jornalistas do Sul-RJ reafirmam também como fundamental a exigência do diploma superior de Jornalismo para o exercício profissional, defendendo a qualidade dos cursos de Comunicação Social e denunciando a prática
pos e no socorro aos feridos, como relatou Debona em reportagem publicada em O Globo, Ele se horrorizou com as cenas que viu: – Era gente sem perna, sem cabeça, parecia filme. Elisandra Lucotti, repórter do jornal Folha do Oeste, de São Miguel do Oeste, formara-se em 2005 na Universidade Comunitária Regional de Chapecó. Acidentes como os desse fatídico 9 de outubro são comuns em Santa Catarina, que, informou a Folha de S. Paulo, detém o segundo lugar no ranking de acidentes em estradas federais neste ano de 2007. Até o dia 10 de outubro, registraram-se nas rodovias da União no Estado 10.615 acidentes, ou 11,5% do total nacional. O primeiro lugar é de Minas Gerais, que já teve 14.687 acidentes este ano, ou 16% do total. Proporcionalmente, Santa Catarina oferece mais perigos em suas estradas federais: a malha rodoviária da União em seu território é de 2.241 quilômetros, enquanto em Minas chega a 11.426 quilômetros. (Maurício Azêdo)
irregular da profissão na região. Em nome da valorização profissional, a categoria deve se manter vigilante contra as iniciativas de precarização das relações de trabalho, defendendo as conquistas dos trabalhadores brasileiros e a manutenção do veto do Presidente da República à Emenda n° 3. O I Fórum de Jornalistas do Sul-RJ manifesta ainda, de forma inequívoca, o reconhecimento do Sindicato dos Jornalistas do Estado do Rio de Janeiro como o único, legal e legítimo representante da categoria na região. Repudia e não reconhece quaisquer projetos divisionistas que se autoproclamam representantes dos jornalistas mas que na verdade servem aos interesses da exploração patronal, defendendo a realização de um Congresso Estadual dos Jornalistas que busque unificar as lutas da categoria. Os jornalistas do Sul-RJ assumem o compromisso com a luta coletiva pelo respeito e a dignidade profissional. E o sucesso deste I Fórum demonstrou que o caminho correto é o da participação, do debate democrático, da mobilização, da formação, da atualização e da união com as legítimas entidades e movimentos representativos dos jornalistas brasileiros. E que a garantia das conquistas é a organização. Vamos à luta, jornalistas do Sul-RJ!”
Direitos humanos HISTÓRIA
MOÇÃO
Câmara do Rio celebra os 41 anos do Teatro Casagrande
Conselho reprova política de segurança
Em sessão especial convocada por iniciativa do Vereador Eliomar Coelho (Psol), a Câmara Municipal do Rio de Janeiro comemorou no dia 23 de outubro os 41 anos de arte e luta do Teatro Casagrande, num encontro que reuniu membros das classes artística e jornalística e os sócios fundadores da casa, Max Haus, Moysés Ajchenblatt, Sérgio Cabral, Conselheiro da ABI, e Moysés Fuks, e convidados especiais, como Mary e Zuenir Ventura, Guguta Brandão e Nelma Salles, que participaram de importantes debates realizados no Casagrande durante a ditadura militar e ajudaram na organização da sessão. Desde a sua inauguração, nos anos 60, o Casagrande foi palco de importantes montagens teatrais, em que se apresentaram grandes artistas, entre eles Marco Nanini, Ney Latorraca, Miguel Falabella, Raul Cortez, Jô Soares e Regina Casé. O teatro abrigou também os Ciclos de Debates da Cultura Contemporânea, que trouxeram ao Rio pela primeira vez o metalúrgico Luiz Inácio da Silva, então Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Foi ainda no Casagrande, em 29 de julho de 1985, que Fernando Lyra, então Ministro da Justiça do Governo José Sarney, anunciou para uma platéia de 700 artistas e intelectuais o fim da censura no Brasil. Nas palavras do Ministro, o “entulho autoritário” que acabava de ser revogado somava 39 leis, decretos e portarias editados no regime militar, cerceando todo tipo de diversão. No dia 25 de abril de 2005, para celebrar os 30 anos dos históricos encontros culturais, foi lançado na sede do Clube de Engenharia o Instituto Casagrande, criado para desenvolver eventos, novos ciclos de debates, projetos e pesquisas. Oficialmente, o Teatro Casagrande será reaberto em março de 2008, restaurado do incêndio que sofreu em 5 de abril de 1997, durante a temporada da peça O burguês ridículo, de Molière, com direção e adaptação de Guel Arraes. A sala voltará a funcionar, totalmente modernizada e com cem lugares, no andar térreo do Shopping Leblon, com entrada pela Avenida Afrânio de Melo Franco.
Em sua sessão de outubro, realizada no dia 30, o Conselho Deliberativo da ABI aprovou Moção de Repúdio à política de segurança do Governo do Estado do Rio de Janeiro e um pedido de punição rigorosa para os assassinos do agricultor Valmir Mota Vieira, ocorrido em Santa Teresa do Oeste, no Paraná, no dia 21 precedente. A Moção foi apresentada pela Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos por iniciativa dos associados Mário Augusto Jakobskind, Daniel de Castro e Wilson de Carvalho, que a subscreveram. O Conselho aprovou também apelo ao Governador Sérgio Cabral para que determine a retomada do pagamento das indenizações de reparação moral, instituída pela Lei nº 3.744, de 2001, suspenso em junho de 2005. A Comissão Especial de Reparação, criada para aplicação dessa lei, deferiu cerca de 900 processos — de um total de 1.100 requerimentos apresentados — de pessoas que sofreram privação de liberdade ou sevícias em dependências do Governo do Estado do Rio, durante a ditadura militar. Até junho de 2005, o Governo do Rio havia pagado a indenização de R$ 20 mil a apenas 144 requerentes. O caso da reparação moral foi levantado na reunião do Conselho pelo advogado André de Paula, uma das vítimas da ditadura, que fez candentes críticas à suspensão dos pagamentos. A Moção aprovada tem o seguinte teor: “A Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos condena a política de segurança adotada pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, que, na prática, criminaliza as áreas pobres da Cidade, além de ser totalmente inócua no combate à violência. Os números falam por si só. Neste ano de 2007, segundo levantamento do Instituto de Segurança do Estado do Rio, já morreram
DOMINGOS PEIXOTO / AGÊNCIA O GLOBO
Foi lá que em 29 de julho de 1985 Fernando Lyra, Ministro de Sarney, anunciou o fim da censura.
Moção condena violência das ações policiais, apontando-as como inócuas e responsáveis pelo aumento do número de mortes em confrontos em relação a 2006.
As violentas ações do Batalhão de Operações Especiais-Bope foram apontadas pelo Conselho Deliberativo como uma forma, na prática, de criminalizar as áreas pobres do Rio.
em confrontos 961 pessoas, o que corresponde a mais 154 do que os mortos registrados entre janeiro e setembro de 2006. Deste total, muitos inocentes foram executados, conforme denúncia da Moção da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil. A Comissão de Direitos Humanos da ABI manifesta ainda seu repúdio às declarações de autoridades do Estado, que justificam estratégias de confronto das Polícias Civil e Militar, o que, na prática, vale sempre repetir, criminalizam as áreas pobres do Rio de Janeiro. Declarações de defesa da prática do aborto como método de redução da violência ou de que a favela da Rocinha é uma fábrica de produzir marginais só contribuem para a ampliação do precon-
ceito contra os que habitam as áreas pobres da cidade. Adotar dois pesos e duas medidas em ações policiais em áreas pobres e de classe média é acirrar a divisão social do Rio de Janeiro. A Comissão de Direitos Humanos exorta a Diretoria da ABI a tornar pública esta manifestação e se somar aos esforços da OAB-RJ no sentido de investigar com rigor as recentes ocorrências na favela da Coréia, onde foram mostradas por canais de televisão as imagens de duas pessoas, narcotraficantes ou não, executadas por tiros partidos de um helicóptero da Secretaria de Segurança. A sociedade não pode aceitar como fato normal, sob qualquer pretexto, execuções sumárias como as ocorridas na favela da Coréia.”
Também Andradina apóia a luta do pessoal do Itesp Tal como a de Guaratinguetá, Câmara Municipal condena demissões em massa no Instituto de Terras. A Câmara Municipal de Andradina, SP, comunicou à ABI a iniciativa do Vereador Marco Pilla de propor moção de apoio aos servidores da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo–Itesp contra a ação civil pública e a decisão do Poder Judiciário que resultaram na anulação do concurso público realizado pelo órgão em 2001, para preenchimento de vagas em seu quadro funcional.
Os vereadores de Andradina vão solicitar apoio a parlamentares de outros Municípios do interior paulista em favor dos servidores do Itesp, pedindo que sejam enviados, no trâmite dos seus regimentos internos, ofícios às autoridades e aos órgãos e poderes públicos. Esta é a segunda vez que a ABI é solicitada a divulgar o caso dos servidores do Itesp. Na primeira, a Casa foi acionada pelo Vereador Otávio Falcão, de Guara-
tinguetá, para citar o abaixo-assinado da Associação dos Funcionários do Itesp pedindo a aplicação do princípio constitucional de ampla defesa contra ação do Ministério Público estadual que questiona a validade do concurso citado acima. Se mantida a decisão judicial, o Itesp terá de demitir cerca de 700 servidores, que são responsáveis pela assistência a cerca de 12 mil famílias que dependem da atuação do Instituto de Terras. Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
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FIFA
As editorias internacionais não sabem onde fica o Oriente Médio Professor de Geografia diz que a imprensa erra ao tratar o Oriente Próximo com essa denominação.
Como parte da estratégia para desbancar a rival, a Record ofereceu R$ 800 milhões pelas Copas do Mundo de Futebol de 2010 e 2014
COMPETIÇÃO
A Record joga pesado contra a Rede Globo A emissora anuncia que sua vice-liderança de audiência “já começa a ter um ar de primeiro lugar”. Em declaração encaminhada a entidades da área de comunicação, entre as quais a ABI, a Rede Record investiu abertamente contra a Rede Globo de televisão, anunciando que dobrou seu faturamento nos últimos três anos e assumiu a posição de vice-líder de audiência de televisão no País. Na declaração, firmada por seu Presidente no Rio de Janeiro, Marcelo Silva, diz a TV Record que, hoje, “até a maior revista nacional também comprova essa cumplicidade e mostra como essa vice-liderança já começa a ter um ar de primeiro lugar”. “Os números não mentem. Nos últimos três anos, a Rede Record dobrou seu faturamento e assumiu a posição de vice-líder da TV aberta brasileira. Mais do que um posicionamento no ranking, esses dados refletem o comprometimento da Record em oferecer uma programação de altíssima qualidade no formato que o público deseja assistir”, diz o comunicado, que acrescenta: “Não existe a imposição de um padrão ou um estilo, mas sim a total compreensão do gosto, da exigência e das necessidades do espectador. Uma definição precisa: cumplicidade. Os números e rankings da TV aberta hoje apenas comprovam essa cumplicidade e o reconhecimento do público e dos parceiros.” Junto com a declaração a Rede Record encaminhou aos destinatários de seu comunicado um exemplar da edição de número 2029 da revista Veja, com data de capa 10 de outubro de 2007, a qual é dedicada àquilo que os editores intitula32 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
ram A guerra entre Globo e Record — Na tela e nos bastidores, tendo como complemento, sob a rubrica Exclusivo,, uma matéria com o título Trechos da biografia inédita do bispo Edir Macedo, apontado como o dono da emissora. Nas matérias, assinadas pelo repórter Marcelo Marthe, abertas com a reportagem No ar, mais um vice-campeão de audiência e que ocupam as páginas 84 a 92, Veja reproduz dados comparativos dos investimentos e gastos das duas redes de tv, indicando como Os fronts da guerra o ataque da Record e o impacto sobre a Globo. A revista alinha os seguintes dados e fatos: • a Rede Record investiu R$ 50 milhões em 2006 e passou a ter como carro-chefe o Jornal da Record, cópia (clone, diz a revista) do Jornal nacional: ela contratou nesse ano 250 profissionais e investiu R$ 15 milhões em equipamentos para criar o primeiro canal só de notícias da tv aberta, o Record News; • a Record investiu R$ 300 milhões na teledramaturgia; 40% de seus técnicos vieram da Globo; o novelista Tiago Santiago passou de assistente na Globo a titular na Record e viu seu salário saltar de R$ 25 mil para R$ 170 mil por mês; • na área de Esportes, a Record fez uma razzia: contratou por R$ 120 milhões a transmissão dos Jogos Olímpicos de 20l2, em Londres; ofereceu R$ 800 milhões pelas Copas do Mundo de Futebol de 2010 e 2014; R$ 500 milhões pela transmissão do Campeonato Brasileiro; R$ 70 milhões pelo Campeonato Paulista;
• na guerra dos domingos, a Record tem como armas, entre outras, o humor de Tom Cavalcante, que ganhava R$ 80 mil na Globo e passou a R$ 300 mil na Record. Diz a Veja que, para enfrentar a concorrente atrevida, que desde 2004 atraiu 60 dos seus jornalistas, a TV Globo debateu a possibilidade de passar o canal pago de notícias Globo News para a tv aberta. Além de fazer contatos mais longos para atores de segundo escalão das novelas, a fim de resguardar seu elenco, a Globo teve de subir o desembolso pelas transmissões de futebol: R$ 700 milhões pelas Copas, R$ 350 milhões pelo Brasileirão 2007, que lhe custara R$ 290 milhões em 2006, e R$ 70 milhões pelo Paulistão 2007, no qual gastara R$ 25 milhões no ano anterior. Veja faz comparações também de audiência, informando que além de Gugu Liberato, do SBT, seu adversário histórico, Faustão tem de enfrentar novo concorrente, Tom Cavalcante, que lhe roubou a liderança por alguns minutos em recente domingo. O repórter Marcelo Marthe entrevistou o responsável pela parte artística da Record, seu Vice-Presidente Honorílton Gonçalves, que foi audacioso na resposta à primeira pergunta, acerca da possibilidade de a emissora emparelhar com a Globo no Ibope. Disse Honorílton: “Não vamos só emparelhar. Vamos passar a Globo. Esse dia não está longe. A Globo tem medo.”
O professor de Geografia do Rio Mauro Walter Guedes considera que a imprensa brasileira comete erros de conceito geográfico quando se utiliza da expressão Oriente Médio ao se referir à região mais próxima da Europa. Diz o professor que essa região deveria ser chamada de Oriente Próximo (l’Orient Proxain) “como muito acertadamente é denominada pela imprensa francesa”. Mauro Guedes chama a atenção para o fato de que, historicamente, as civilizações mais antigas, conhecidas como Oriente Próximo, foram os sumérios, egípcios, hebreus, fenícios, caldeus, assírios, medos, persas, árabes etc.: — São as civilizações que conhecemos como as mais próximas da Europa (antiga Ásia Menor), como é ensinado nas escolas, acertadamente. Ora, é exatamente nessa região que estão Síria, Líbano, Turquia, Israel, Palestina, Irã, Iraque, Arábia Saudita, Emirados Árabes, Faixa de Gaza etc. Por que Oriente Médio?, –– indaga o professor, que foi Conselheiro do Colégio Pedro II e também lecionou no Colégio Angloamericano e no Centro de Instrução Almirante Wandenkolk, da Marinha. Mauro Guedes lembra que após a Primeira Grande Guerra ficou estabelecido pela Convenção de Genebra o meridiano de Greenwich para a demarcação dos fusos horários nas longitudes ocidentais e orientais, isto é, 180° para Leste e 180° para Oeste: — Ora, o verdadeiro Oriente Médio está situado nas longitudes médias de 90°, onde se encontram Índia, Paquistão, Bangladesh, Sri Lanka, Mianmar, Tailândia, Nepal, Butão etc. Por que a imprensa da França denomina esta região de l´Orient Moyen? Ora, acertadamente, pois aí estão em derredor de 90° as nações citadas, como demonstrei anteriormente. Na defesa da sua tese, o professor Mauro Guedes explica ainda que as longitudes orientais se prolongam para o chamado Extremo Oriente, abrangendo China, Japão, Sibéria Oriental, Coréia do Norte, Coréia do Sul etc., que se localizam próximas para mais ou para menos dos 150° orientais nas diferentes regiões do Oceano Pacífico, até atingir os grupamentos insulares da Polinésia e Micronésia, isto é, na chamada Oceania.
PRONUNCIAMENTO FOTOS: JORNAL DO COMMERCIO
“Eu sou o resultado da liberdade de imprensa”, diz Lula em ato no Rio Ao discursar nas comemorações dos 180 anos do Jornal do Commercio do Rio, o Presidente admitiu que só chegou ao cargo porque havia imprensa livre no País. A importância da liberdade de imprensa para a tomada de decisões pelo conjunto da cidadania foi realçada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao discursar, na noite de 1 de outubro, no Copacabana Pálace Hotel, no Rio, no jantar comemorativo dos 180 anos do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro. “Eu sou o resultado da liberdade de imprensa. Eu não seria o Presidente da República se não houvesse liberdade de imprensa”, disse o Presidente, que salientou a necessidade de os governantes fazerem avaliação adequada da informação dos meios de comunicação. “Pobre do governante que se preocupa com a notícia negativa demais. E pobre do governante que acha que o que falam bem dele é a pura verdade”, disse ele, acrescentando que “os dois extremos permitem ao governante governar com a sobriedade necessária”. Na cerimônia, o Jornal do Commercio conferiu o Troféu 180 Anos ao Presidente, à Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministra Ellen Gracie, ao Governador Sérgio Cabral e a mais 11 personalidades de diferentes setores da vida nacional. Além do Presidente discursaram no ato o Governador, o Presidente da Academia Brasileira de Letras, Marcos Vinícios Vilaça, e o Presidente do JC, Maurício Dinepi. Cabral, que é formado em Jornalismo e sócio efetivo da ABI,
Dinepi, Presidente do JC, entregou a Lula a densa obra de Sandroni sobre o jornal.
Os agraciados pelo JC em seus 180 anos
Edição n° 1 do JC: um veículo destinado a estimular os negócios no Império.
exaltou a qualidade do JC e evocou os ensinamentos daquele que considera seu maior mestre, o também jornalista e escritor Sérgio Cabral, membro do Conselho Deliberativo da ABI. Após observar que alguns jornais preferem a publicidade à qualidade da notícia, Lula fez o elogio do JC, apontando-o como “modelo de imprensa séria”. “Não se completa 180 anos, em um país
Ao lado do Desembargador Murta Ribeiro, Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio, o Governador Sérgio Cabral e a Ministra Ellen Gracie exibem o Troféu 180 Anos.
Foram também agraciados com o Troféu 180 Anos do Jornal do Commercio as seguintes personalidades: • Aroldo Araújo, publicitário, criador e coordenador da campanha pela eleição do Cristo Redentor para uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno. • Carlos Artur Nuzman, Presidente do Comitê Olímpico Brasileiro. • Fernanda Montenegro, atriz de teatro, cinema e televisão. • Lázaro de Melo Brandão, Presidente do Conselho de Administração do Bradesco. • Luiz Carlos Trabuco Cappi, Presidente da Bradesco Seguros e Previdência. • Marcos Vinícios Vilaça, Presidente da Academia Brasileira de Letras. • Maurílio Biagi Filho, Presidente do Conselho de Administração da Usina Moema Açúcar e Álcool. • Olavo Monteiro de Carvalho, Presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro. • Paulo Niemeyer Filho, neurocirurgião. • Roger Agnelli, Presidente da Companhia Vale do Rio Doce. • Rosa Célia Pimentel Barbosa, fundadora e diretora do Pró-Criança Cardíaca.
de política tão complicada como o Brasil – disse —, sem ter uma razão muito especial para a sobrevivência.” Lula afirmou também que não se importa se a imprensa fala bem ou mal do Governo, mas sim em que “a imprensa seja imprensa”. “Isso garantido – acrescentou —, podemos ter a certeza de que as instituições democráticas, que já estão consolidadas, garantirão a este País nunca mais ter experiência de rompantes autoritários, de gente que acha que há saída para o Brasil fora da democracia.” Antes da cerimônia, a direção do JC entregou a Lula e Cabral os primeiros exemplares do livro 180 anos do Jornal do Commercio – 1827-2007 – De D. Pedro I a Luiz Inácio Lula da Silva, de autoria do jornalista e acadêmico Cícero Sandroni, também sócio efetivo da ABI Depois do ato mais exemplares foram entregues a cerca dos 900 convidados presentes.
Testemunha e registro da nossa História A ABI saudou o 180º aniversário do Jornal do Commercio com esta mensagem dirigida ao seu Presidente, Maurício Dinepi: “É com especial satisfação que a Associação Brasileira de Imprensa se dirige a Vossa Senhoria para saudar o 180º aniversário da fundação do Jornal do Commercio, que hoje se comemora, e para fazer chegar aos diretores e funcionários dessa empresa meus cumprimentos pela colaboração que essa instituição nacional – como Rui Barbosa definiu o JC há mais de um século – tem prestado ao progresso material e espiritual do País. Como o mais antigo diário em circulação contínua no Brasil, o Jornal do Commercio constitui uma indispensável fonte de informações sobre a evolução nacional em todos os campos desde os nossos primeiros anos como nação independente, criado que foi pouco mais de cinco anos após o rompimento da submissão política a Portugal. Testemunhou e registrou o JC, a partir de 1 de outubro de 1827, o que desde então ocorreu de significativo no País, desde o surgimento e evolução do regime monárquico ao seu colapso, a modernização da vida econômica no século XIX, o advento da república e suas crises, os progressos materiais registrados a partir dos anos 30 do século XX, as crises políticas e as restrições das liberdades individuais e civis nas ditaduras do Estado Novo e do regime militar, o ingresso do País no rol das nações em desenvolvimento. A ABI considera alvissareiro verificar que este 180° aniversário encontra o Jornal do Commercio em mais um momento de grande vitalidade, como demonstra esta magnífica edição especial comemorativa de suas 18 décadas de existência. É com justificado júbilo, pois, que a ABI festeja esta data da mais alta expressão na vida da imprensa brasileira. Rio de Janeiro, 1 de outubro de 2007 (a) Maurício Azêdo, Presidente da ABI.” Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
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LIVROS
Petrônio adormece os girassóis
Froim: Ninguém pode ser um bom escritor se sua obra não incluir uma barata.
Kafka inspirou a barata de Froim Baumwol O jornalista e escritor Froim Icek Baumwol lançou na ABI em 29 de agosto o livro Uma barata na Vieira Souto, em que o inseto é o personagem principal da obra. O lançamento aconteceu na Sala Belisário de Souza, no 7º andar do Edifício Herbert Moses. Froim revelou que a inspiração para escrever o livro surgiu após ler, na adolescência, Metamorfose, de Franz Kafka, que transforma seu personagem principal em uma barata. Froim gostou tanto do livro do tcheco que resolveu lançar um desafio: — Ninguém pode ser um bom escritor se sua primeira obra não incluir uma barata — brinca o jornalista, que também conta, orgulhoso, que em fevereiro deste ano conseguiu que sua categoria de sócio da ABI mudasse de colaborador para efetivo. Além da história central, Uma barata na Vieira Souto traz duas crônicas de Froim. No prefácio da obra, o autor diz que “são histórias necessárias para estimular a leitura e o interesse pela cultura, principalmente de jovens estudantes”. De acordo com o jornalista — que começou a carreira como repórter no extinto Diário Carioca, nos anos 60 — outro objetivo do livro é divertir diferentes gerações. Informações sobre como obter o livro podem ser conseguidas pelo telefone (21) 2236-0844 ou pelo e-mail atendimento@ctrlccopias.com.br. 34 Jornal da ABI 322 Outubro de 2007
O escritor e jornalista mineiro Petrônio Souza Gonçalves, sócio da ABI, lançou no dia 22 de outubro seu novo livro de poesias, Adormecendo os girassóis (Editora Europa, RJ). Foi no Restaurante Cozinha de Minas, em Belo Horizonte, onde mora. Este é o segundo livro de poesias de Petrônio — o primeiro foi Quando a curva faz a vida (2006) — e nele o escritor passeia pelo universo de sua própria história, “povoada pelas coisas do porão e pelas incertezas de quem vive preso entre montanhas”. O livro reúne 80 poemas e uma seção especial dedicada ao poeta Mário Quintana — uma de suas influências — com a série de poesias Quintanear I, Quintanear II e Quintanear III. Essencialmente mineiro, o autor homenageia também algumas cidades e lugarejos de seu Estado, como Ouro Preto, Conceição do Mato Dentro, Cocais, São Bartholomeu, Serra do Cipó, Serro Diamantina e Poços de Caldas, entre outros, além das represas de Furnas e Três Marias. Em 2005, Petrônio ganhou o segundo lugar do Concurso Nacional de Literatura da Academia Mineira de Letras. No ano passado, o artista Saulo Laranjeira selecionou alguns dos textos do livro, que ainda estavam inéditos, e os gravou, com o título Colhendo estrelas, em seu cd Assunta Brasil, em que registra textos dos
grandes poetas brasileiros. O prefácio do livro é assinado pelo também jornalista, escritor e poeta José Maria Rabêlo, que declara que “a poesia de Petrônio Souza Gonçalves não tem o ranço das coisas guardadas no baú, que ficam mofando pelos cantos da casa, longe do sol e da vida. Ao contrário, ela brota sobre o papel com a força e a energia que marcam a verdadeira obra literária.” O jornalista Sebastião Nery é quem faz a apresentação, na qual diz que os poemas de Petrônio Souza Gonçalves são como as gaivotas: “Eles levitam e mergulham. Afloram e submergem. É uma poesia feita de luz e sombra, flor e cacto, carne e sangue”. O livro traz ainda o depoimento do escritor e Presidente da Academia Mineira de Letras, Murilo Badaró, que afirma ser Petrônio “um caso extraordinário de vocação intelectual”. Como jornalista, Petrônio mantém uma coluna semanal sobre política e cultura publicada em mais de 40 jornais brasileiros, entre eles O Rio Branco (AC), Correio Popular (RO), Tribuna Catarinense (SC) e O Rio Grande (RS), e o blog www.petroniosouzagoncalves.blogspot. com. Após o lançamento de Adormecendo os girassóis, ele já começa a trabalhar em um novo livro, Braço de rio, pedaço de mar, em que pretende fazer uma “poesia mais existencialista”.
Os 33 anos da Engenharia da Petrobrás A Petrobras doou à Biblioteca Bastos Tigre um exemplar de Engenharia da Petrobras 1972—2005: ontem, hoje e amanhã construindo uma história, publicação que relata 33 anos de desenvolvimento e progresso da empresa, graças à contribuição da Unidade de Engenharia, criada na década de 70. O livro destaca as ações da Petrobras desenvolvidas com os compromissos de prazo, custo, qualidade, saúde, meio ambiente e responsabilidade social. Momentos difíceis e grandiosos também são contados na obra, que dispensa a característica de um relatório técnico, para fazer uma visita ao passado, um relato do presente e uma projeção do futuro, reconstruindo a trajetória da Engenharia da Petrobras. Coordenado pela Documentação Técnica e Legal dos Serviços e Logística da Engenharia (DTL), o Projeto História da Engenharia — responsável pela
publicação — procurou recuperar, preservar e divulgar a história do órgão, inicialmente chamado Serviço de Engenharia (Segen). Amplamente ilustrado, o livro apresenta, em capítulos, as obras de engenharia no setor petrolífero brasileiro, a atuação do Segen na exploração offshore e os caminhos da Engenharia da Petrobras na atualidade, entre outros assuntos. A ficha catalográfica da obra: Engenharia da Petrobras 1972 — 2005: ontem, hoje e amanhã construindo uma história = Petrobras Engineering Services 1972 — 2005: yesterday, today and tomorrow building a history / Texto: Carlos Eduardo Barbosa Sarmento, Sérgio Tadeu de Niemeyer Lamarão; apresentação: Renato de Souza Duque, Pedro José Barusco Filho; versão para o inglês: Carla Meneghini, Carlos André Oighenstein. Rio de Janeiro: Petrobras, 2006.
Sylvio Pinto, um Pancetti mais humano ,Sylvio Pinto, meu pai, meu amigo (2005, L & M Martins Editores) é o título do livro de Ubirajara Pinto (filho do artista plástico) e Paulo Alonso doado em 16 de julho à Biblioteca Bastos Tigre, da ABI. Para o PhD em Filosofia da Educação Cláudio Fico Fonseca, trata-se de uma obra referencial do legado artístico de um gênio da pintura do século XX, “impressionista de excepcional agrado” que freqüentou o Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro, onde iniciou o aprendizado de Desenho. Filho dos portugueses Bernardo Pinto e Silvana Carvalho, que desembarcaram no Brasil no início do século XIX, Sylvio nasceu em 17 de março de 1918 no Brasil, onde construiu sua brilhante carreira artística. Amante do Carnaval, era também freqüentador da Mangueira, fez amizade com Cartola e Nélson Sargento, também pintor, e chegou a criar carros alegóricos para as antigas grandes-sociedades carnavalescas. Em 1943, no Salão Nacional de Belas Artes, ganhou a Medalha de Bronze. Cinco anos depois, conquistou a Medalha de Prata, que o habilitou a uma viagem à Europa — prêmio então considerado o mais valioso das artes brasileira. O mar é um tema tão forte na pintura de Sylvio Pinto que mereceu comentários elogiosos dos acadêmicos Carlos Heitor Cony e Antônio Olinto. Em um artigo — reproduzido no livro — publicado na revista Manchete em 1996, Cony diz: “Tema recorrente da pintura universal, o mar tem dois representantes ilustres na arte brasileira: José Pancetti e Sylvio Pinto. O primeiro, mais divulgado e enaltecido (...). O segundo, mais abrangente e humano (...).” Já o mineiro Olinto conta na introdução do livro que sua memória de Sylvio Pinto está ligada à primeira vez em que viu o mar. E continua: “Quando entrei em contato com a pintura de meu País, lá estavam Sylvio Pinto e Pancetti, pintando o mar, pegando-o e interpretando-o para nós.” Sylvio Pinto, meu pai, meu amigo traz reproduções de quadros do pintor — muitos hoje pertencentes a coleções particulares — que têm não só o mar como tema, mas também outras paisagens e personagens rurais e urbanos do Brasil e de Portugal. O livro pode ser adquirido na L & M Martins Editores. Mais informações pelo telefone (21) 2267-8992 ou pelo e-mail lmartins@ superig.com.br
O drama de Rodolfo Konder, um perseguido Em 1975, o jornalista e escritor Rodolfo Konder foi preso pelo Doi-Codi, no quartel do II Exército em São Paulo. Quando deixou a prisão, resolveu denunciar as torturas de que foi vítima e a violência dos agentes da ditadura que levaram à morte o jornalista Vladimir Herzog, na mesma unidade militar. As experiências estão no livro Cassados e caçados (RG Editores, 2007), o 16º da sua carreira. Ameaçado de morte, Konder, juntamente com outros perseguidos, teve que deixar o País, num roteiro que incluiu Peru, Argentina, Canadá e Estados Unidos. Sobre o exílio, ele comentou recentemente numa rádio paulista: “A experiência no Canadá e em Nova York foi muito enriquecedora. Até pensei em enviar uma carta aos militares, agradecendo”. No livro, porém, Konder fala de aventuras às vezes dramáticas. “A história se desenvolve num clima sombrio, porque aconteceu durante os quase 20 anos de ditadura militar que tivemos no Brasil”, diz ele no capítulo de abertura. O livro começa quando Konder foi trabalhar na Petrobras, aprovado em concurso, em 1961. Procurado pelo companheiro de trabalho Josias Muniz, logo se tornou membro do Partido Comunista Brasileiro–PCB, juntamente com Paulo Saboya, Amauri Sabino e Luiz Peregrino, e conheceu João Goulart, como representante do movimento sindical da Petrobras, em Brasília. Quando ocorreu o golpe militar, em 64,
o jornalista era líder sindical na estatal do petróleo e, portanto, cassado e caçado. Para fugir da repressão procurou abrigo na casa de amigos e parentes. O primeiro refúgio foi a casa do tio Evandro Lins e Silva, em Copacabana. Resolvido a não comprometer os que lhe davam guarida, Konder foi à Embaixada do México: “Um funcionário (...) me atendeu. Eu disse: preciso da proteção do governo mexicano, porque estou sendo perseguido por razões políticas. O funcionário chamou o embaixador (...) O embaixador chegou, perguntou se eu estava armado. Respondi: ‘Só das minhas idéias políticas’. Eles me acolheram.” Espécie de roteiro não-linear autobiográfico, o livro de Konder leva o leitor a conhecer as dificuldades do exílio, a prisão, a violência e a tortura sofrida nos porões da ditadura. No capítulo A inquisição, o autor compara o Doi-Codi ao período medieval: “Os vultos atravessam os corredores sombrios levados pelo braço. Nas salas contíguas há gente encapuzada que está sendo punida por heresias imperdoáveis.” Konder trabalhou nas revistas Realidade, Singular e Plural, Visão, IstoÉ, Afinal e Nova. Foi colaborador do Estadão e editor-chefe e apresentador do Jornal da Cultura. Atualmente, é Diretor Cultural das Faculdades Metropolitanas Unidas (uniFMU) e do Masp e membro do Conselho Municipal de Educação. Em 2001, recebeu o prêmio Jabuti pelo livro Hóspede da solidão.
Audálio (à esquerda) e Ziraldo receberam um leitor ilustre: o bibiofilo e acadêmico José Mindlin
A infância de Ziraldo, por Audálio Amigos desde o tempo em que trabalhavam juntos na revista O Cruzeiro, o Vice-Presidente da ABI, Audálio Dantas, e o cartunista Ziraldo voltaram a se encontrar no dia 6 de outubro para o lançamento do livro A infância de Ziraldo (Editora Callis), na Saraiva Mega Store do Morumbi Shopping, em São Paulo. O livro infanto-juvenil faz parte da coleção A infância de ..., que já focalizou Ruth Rocha, Graciliano Ramos e Maurício de Sousa. Audálio conta: — No começo de O Cruzeiro, Ziraldo era do Departamento de Arte e eu, da Reportagem. O que nos aproximou foi o fato de que na sucursal paulista da revista era comum as matérias serem diagramadas com a presença do autor. Então, discutíamos todos os detalhes. Ele foi quem mais diagramou matérias minhas.
Uma delas foi O circo do desespero, que se referia a uma maratona de dança programada para acontecer no Ginásio do Ibirapuera, num carnaval: — Lembro que o Ziraldo se impressionou com a matéria e acompanhou o sofrimento daquela gente pobre, que se dispôs a participar do concurso em troca de um dinheirinho. A partir de então, houve entre nós uma identificação muito grande e ele virou meu diagramador preferido. Audálio conta que quando começou a escrever para a coleção o nome de Ziraldo foi primeiro a ser citado: — O prazer desse livro foi o reencontro sensível que tivemos, pois a partir das perguntas sobre o passado dele reconstruímos nossa atividade profissional. Ele se emocionou muito. Afinal, quem é que não gosta de ter a história da sua infância contada em livro?
Maria Lúcia Amaral lança sua 36ª obra A professora, acadêmica, escritora e conferencista Maria Lúcia Amaral, presenteou a Biblioteca ABI com um exemplar de O chalé vermelho (Edições Jogo de Amarelinha, 2007), seu 36º livro. Maria Lúcia é autora de 35 obras infantis, do ensaio Criança é criança (Vozes, Petrópolis), sobre a literatura infantil e seus problemas, e de seis peças teatrais, entre elas Iracema, a tabajara, adaptação para o palco do romance de José de Alencar. No prefácio do livro, o escritor Hernani Donato faz menção à página infantil Drops criançada!, que a autora lançou em um jornal do Rio, e destaca que Maria Lúcia sempre foi “muito festejada e requerida por escolas e tribunas”. Com referências à infância da escritora no primeiro capítulo, O chalé vermelho é, segundo o editor Leonardo Chianca — sobrinho de Maria Lúcia —, leitura recomendada para todas as idades, “porque os fatos rememorados vão muito além da viagem interior da autora”. A obra é uma coletânea de “fotografias verbais” de episódios acontecidos em diferentes épocas, sobre gerações e modos de vida situados entre o século XX e o início do XXI.
Crianças e adolescentes fizeram fila para obter os autógrafos de Audálio e Ziraldo.
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PRECIOSIDADE
EM CARTAZ, GLÁUBER JORNALISTA
P
olêmico, irreverente, um gênio! Assim era Gláuber Rocha, um dos mais importantes cineastas brasileiros, que morreu de septicemia, no Rio de Janeiro, em 1981, aos 42 anos, e virou mito. Para alegria dos fãs e pesquisadores de sua obra, tudo o que ele escreveu em jornais sobre cinema e teatro agora faz parte do acervo do Projeto Tempo Gláuber – Revitalizando a Cultura, idealizado pela mãe do diretor, Dona Lúcia Rocha. Com cerca de cem mil documentos, entre filmes, recortes, livros e roteiros, o Projeto conta com a parceria do Arquivo Nacional e o patrocínio da Petrobras. Apesar do pouco tempo que viveu, o cineasta baiano de Vitória da Conquista conseguiu fazer muitos filmes que tratam de política, regionalismo, terceiro-mundismo e brasilidade. E a linguagem vanguardista de obras antológicas como Terra em transe (1967) e A idade da Terra (1980) continua encantando críticos e platéias do mundo inteiro. Primeiro filho de Adamastor Bráulio Silva Rocha e Lúcia Mendes de Andrade Rocha, Gláuber nasceu em 14 de março de 1939 e, no início dos anos 60, foi crítico de cinema do programa de rádio Cinema em close-up. Na década seguinte, exerceu a mesma função na imprensa, embora tenha estreado nas páginas com uma reportagem policial, no Jornal da Bahia – depois passou por O Conquistense, Sete Dias, Diário de Notícias, Jornal Unitário (de Fortaleza) e JB (do Rio), entre outros.
Projeto idealizado pela mãe dele, Dona Lúcia Rocha, inclui a produção do cineasta como crítico de cinema e teatro. P OR J OSÉ R EINALDO M ARQUES
tida e difundida no País inteiro, está longe de ser a única entrevista polêmica que ele deu. Aí não se trata de um trabalho jornalístico, mas da utilização da imprensa para divulgar suas idéias. Essa apropriação também é observada pela professora da Escola de Comunicação da UFRJ Ivana Bentes, autora da pesquisa ainda inédita XYZ, Glauber Rocha jornalista. Ao se debruçar sobre o acervo, ela diz ter percebido a amplitude da criação, com mais de 500 artigos e entrevistas: – No Jornal da Bahia, nos anos 50, ele se apresenta como o primeiro crítico a falar sobre a necessidade de organização do cinema nacional. Desde o primeiro texto a gente percebe como o jornalismo foi importante para a organização do seu pensamento e da sua postura de agitador cultural na Bahia. A professora da Eco conta que ficou impressionada quando leu os artigos que Gláuber escreveu para o Suplemento Literário e o Caderno B, do Jornal do Brasil, e O Pasquim, em que o que mais chama a atenção é “a capacidade do cineasta de usar a imprensa de forma orgânica”: – No Suplemento surge seu primeiro texto polêmico, Metafísica na favela, em que ele critica o filme Orfeu, de Camus, e reclama da postura paternalista quando se fala das mazelas da população mais pobre. O período é interessante, porque coincide com momento da reforma gráfica do JB, em que o jornalismo não está separado da produção cultural, como acontece hoje. “Isso acabou”
Precocidade
Dona Lúcia conta que o filho escreveu seu primeiro artigo aos 12 anos: – Era sobre a peça A hora da criança. O dono do jornal que ele procurou me chamou e disse: “O Gláuber está aqui com um artigo querendo que eu publique, mas é impossível, porque ele está criticando o diretor do teatro. Só aceito se a senhora assinar e assumir a responsabilidade de autoria do texto”. Assinei sem receio. O Gláuber nasceu e viveu carregando nos ombros aquela responsabilidade de querer salvar o Brasil e o mundo. O texto, Carta ao homem da hora da criança, foi publicado na seção dos leitores do jornal A Tarde, em 1951, e, diz Ruy Gardnier, jornalista e pesquisador
de história do cinema, “é uma ode solene ao espetáculo”. Gláuber faz muitos elogios, mas em um pequeno trecho critica o fato de a peça ter sido exibida “(...) no palco deficiente que o mistério de tamanha fantasia não merece (...)”. Gardnier integra a equipe que organiza a documentação do Projeto Tempo Gláuber. Ele diz que o acervo grandioso só existe graças à garimpagem de Dona Lúcia ao longo dos anos. – São artigos, poemas e até desenhos que o Gláuber jogava na lixeira do quarto – diz ela. – Eu os pegava, via que eram importantes e guardava. Juntei muitas caixas de papelão. Nem sei como nada se perdeu, pois papel precisa de uma
O Tempo Gláuber é fruto da persistência de Dona Lúcia Rocha, sua mãe, que cultua com o jovem Eric, filho dele, a memória e a documentação do cineasta.
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condição especial para ser guardado. O tratamento que eu dava era pôr em cima de uma mesa e passar a ferro, para tirar o amassado – conta Dona Lúcia. Primazia
Ruy Gardnier lembra que Gláuber também escreveu para veículos estrangeiros, como a agência cubana Prensa Latina, e destaca o modo como ele intervinha na mídia nas entrevistas que concedia: – Teve uma para a revista Visão, em 74, que ficou especialmente famosa, não só na história do cinema brasileiro, como na da ditadura. Ele dizia que o Geisel ia iniciar a abertura e defendia o Golbery como “gênio da raça”. Apesar de ter sido deba-
São do mesmo período as críticas dos filmes Aruanda, de Linduarte Noronha e Rucker Vieira, e Arraial do Cabo, de Paulo César Saraceni, elogiosas, segundo Ruy Gardnier: – Ambas estão entre as coisas mais importantes publicadas na imprensa brasileira sobre o cinema nacional, são um marco definidor de um movimento cinematográfico que mudou uma série de concepções. A partir de então, nosso cinema passou a ser visto com novos olhos pela sociedade intelectualizada. Ivana e Gardnier destacam a capacidade de Gláuber de escrever textos que a princípio soavam como desarticulados, mas que no fundo eram uma experimentação de estilo de linguagem. Com eles, vieram também as grandes polêmicas, como a de decretar o fim do Cinema Novo. O jornalista diz que se trata de um momento de indefinição ideológica, em que há um artigo em que o cineasta diz sempre ter sido contra o cinema político e outro em que defende a literatura do realismo socialista, acima da questão dramática: – A pesquisa nesse terreno é muito fértil. Ele ia de um pólo a outro num período muito curto, sempre cheio de idéias e deslumbrado com a enorme aquisição de poder sobre as ideologias que iam surgindo. Ivana Bentes conclui: – A participação de Gláuber Rocha na imprensa é uma trajetória de intervenção nos jornais, de apropriação. É incrível! Hoje não há quem faça uma utilização tão orgânica e contínua, discutindo as questões de poder e do próprio jornalismo. Isso acabou.
MEMÓRIA
O Instituto Histórico evoca com emoção a atuação de Mário Barata Em intervenções numa mesa-redonda de saudade, historiadores expõem as muitas faces de sua atividade intelectual. O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro realizou em 17 de outubro uma comovente sessão para homenagear seu sócio benemérito Mário Barata, que exerceu o cargo de Segundo Vice-Presidente da instituição e morreu no dia 14 de setembro deste ano. Estiveram presentes sócios, amigos e membros da família do professor e jornalista, como a viúva, a pintora italiana Tiziana Bonazzola, o filho Flávio, o irmão Fernando e o sobrinho Carlos Eduardo. Mário Barata era membro do Conselho Deliberativo e da Comissão Executiva do Centenário da ABI. O Presidente do IHGB, Arno Wehling, e mais quatro sócios falaram sobre a trajetória de Mário Barata. Sem prévia combinação do assunto, cada um narrou aspectos da trajetória do professor, jornalista e museólogo. Histórias da vida acadêmica, da época em que serviu o Exército, do amor pelo Estado do Pará e da trajetória dentro do IGHB foram lembradas pelos palestrantes e amigos. O sócio Augusto Carlos da Silva Telles falou do amor que Mário Barata tinha pelas artes. Mencionando textos escritos pelo professor, Augusto relembrou algumas passagens da vida do amigo e ressaltou o quanto ele era digno: — Mário era uma pessoa íntegra e um trabalhador incansável. O amante das artes tinha também paixão pela docência. Este lado de Mário Barata foi contado pela sócia do IHGB Maria de Lourdes Viana Lyra, segundo a qual ele podia ser considerado como verdadeiro mestre, no sentido mais amplo da palavra: — Ele estava sempre pronto a orientar seus alunos. Além disso, era desprendido de vaidades e não tomava partido em confrontos políticos dentro da UFRJ. Maria de Lourdes lembrou ainda que Mário não desanimou nem mesmo quando o Ato Institucional nº 5, em 1969, o proibiu de atuar em qualquer estabelecimento de ensino ou cargo público. Foi nesta época, contou a professora, que ele mais se dedicou à atividade de jornalista. Voltou à universidade assim que saiu a Lei da Anistia, em 1979: — Ele voltou a lecionar com o mesmo entusiasmo, confirmando o quanto o seu exemplo dignifica a carreira de professor. Mário Barata era carioca, mas respirava o Estado do Pará, segundo o Vice-Presidente do IHGB, Victorino Chermont de Miranda. A identificação entre os dois aconteceu justamente por isso: — Quando comecei a ler o livro dele intitulado O poder e independência no Grão-Pará — 1820-1823, percebi que se tratava da história da minha família. Ele tinha os olhos voltados para o Pará. Chermont lembrou ainda que, como jornalista, Mário Barata escreveu para os jornais paraenses Província do Pará, Folha do Norte e O Liberal:
— E toda vez que retornava a estas Redações, para matar saudades, ele era muito festejado. Seu amor ao Pará não era só nostálgico à memória do sangue. Apesar de ter sofrido com a ditadura militar, que o impediu de lecionar, Mário Barata conviveu com militares durante alguns anos. As histórias de seu tempo como soldado do Exército brasileiro foram lembradas pelo Coronel Cláudio Moreira Bento: — Mário contribuiu muito com a Real Academia de Artilharia Militar —
disse ele. — E mesmo sem ter vivido a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, contava o episódio com riqueza de detalhes. O Presidente do IHGB, Arno Wehling, fechou a solenidade de homenagem a Mário Barata. Surpreso com o fato de cada pessoa ter tratado de um aspecto distinto do professor, ele falou da trajetória do homenageado na entidade: — Ele desenvolveu uma intensa atividade no Instituto, ao longo de 46 anos, tendo sido membro de Comissões
e atuando em eventos científicos. Fernando Barata agradeceu em nome da família a homenagem recebida. Contou que o irmão nasceu no mesmo ano da Semana de Arte Moderna, 1922, e descobriu cedo o interesse pela História e as artes. Disse ainda que os parentes cumpriram o último desejo do professor: jogou suas cinzas num cantinho especial na Floresta da Tijuca — Ele gostava de arte, do jornalismo, da natureza, dos seres humanos e dos seus alunos — concluiu.
Um marco na História do IHGB
curso para professor titular, esteve em minha banca. Na UniRio também convivemos longo tempo e tive a honra de fazer-lhe a saudação, em nome da Universidade, quando recebeu o título de Professor Emérito. À minha mulher sempre tratou com especial carinho e deferência, cuidado provavelmente acentuado pela comum origem paraense. Seu último gesto de delicadeza para conosco foi a presença na sessão dos conselhos superiores da UniRio, quando ela própria recebeu o título de Professora Emérita. Saíra recentemente do hospital e estava abatido, mas não deixou de levar seu abraço. Sobre a atuação universitária de Mario Barata já se falou muito bem nesta mesa em sua homenagem. Por isso, gostaria de registrar algumas observações sobre sua atuação no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Mario Barata aqui entrou em 1961, à época da presidência do Embaixador Macedo Soares. Pedro Calmon era orador, Wanderley Pinho atuava intensamente a partir da Segunda Vice-Presidência. O mundo era diferente: viviase a guerra fria, erguera-se naquele ano o muro de Berlim. O Brasil era diferente: a assembléia que o elegeu, em setembro, ocorria logo depois da renúncia de Jânio Quadros. O Rio de Janeiro era diferente: a Cidade-Estado da Guanabara trepidava na azáfama política da crise de posse do Presidente João Goulart e fervilhava de projetos e obras do Governo Carlos Lacerda. O Instituto era diferente: Mario Barata vinha da Universidade, como professor de História da Arte, mas os professores universitários eram poucos ou não se identificavam prioritariamente com esta atividade: ele próprio ingressava na Casa como historiador, crítico de arte e jornalista, mais do que como professor universitário. Desenvolveu uma intensa atividade no Instituto, ao longo desses 46 anos, tendo sido membro de Comissões e atuando em eventos científicos – cabe lembrar que foi sua a inspiração e a coordenação do Con-
gresso que, em 1989, patrocinamos a propósito do centenário da República. Exerceu, também, a partir de 1994 a Segunda Vice-Presidência da Casa, cargo que ocupava quando faleceu, e integrava o Conselho Consultivo do Instituto. Com abertura de espírito, Mario Barata abrangeu em seu campo de interesse a História da arte, a História da imprensa, a História do Rio de Janeiro e a História do Pará, embora tenha feito diversas incursões em outras áreas. De sua participação na vida intelectual do Instituto dão detalhado registro nossa Revista, os anais dos congressos em que atuou e as atas da Cephas – Comissão de Estudos e Pesquisas Históricas. Na Revista, sua contribuição mais antiga remonta a 1961, quando publicou o trabalho Afonso d’Escragnolle Taunay e a Missão Artística de 1816, fruto de conferência aqui realizada em agosto do ano anterior. Foram ao todo 39 estudos, entre artigos, resenhas, registros e discursos de recepção. Constam, também, colaborações suas nos anais do Congresso de História do Segundo Reinado, realizado em 1975, e nos do centenário da República, de 1989. Na Cephas, em cujas sessões era dos mais freqüentes, registramos 82 intervenções. Aí encontramos um longo painel de seus interesses e de suas motivações intelectuais, com a abordagem de temas como colofons de livros, notas biográficas (como, por exemplo, as que fez sobre Anísio Teixeira, Rodrigo Melo Franco de Andrade, Francisco Venancio, Magalhães Barata, D. Mateus Ramalho Rocha, Afonso Claudio, Barbosa Lima Sobrinho, Lafaiete Cortes, Egon Woff, Afonso Arinos de Melo Franco e muitos outros), instituições culturais do Rio de Janeiro, historiografia brasileira, museologia, além de registros bibliográficos e de eventos culturais. A presença constante, a capacidade de bem conviver e a identificação com o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro fizeram de Mario Barata um marco na história da Casa da Memória Nacional.
POR ARNO WEHLING*
Conheci Mario Barata no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1980. Logo passei a conviver com ele também na UniRio, onde lecionava no curso de Museologia. Em ambas as instituições estava de regresso, pois fora aposentado compulsoriamente com base no Ato Institucional nº 5, em 1969. Na UFRJ estreitamos nossas relações no colegiado do curso de Mestrado em História, coordenado à época por nossa confrade Eulália Lobo. Quando fiz con-
Arno Wehling é Presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Texto lido na sessão em homenagem a Mário Barata.
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Vidas
Aparecido, o Zé dos amigos A ABI recebeu com pesar o falecimento do jornalista e Embaixador José Aparecido de Oliveira, ocorrido em 19 de outubro, em Belo Horizonte. Aparecido, de 78 anos, era membro do Conselho Consultivo da ABI, para o qual foi eleito em abril de 2004 e reeleito em abril passado. Ele foi sepultado no dia seguinte em Conceição do Mato Dentro, Minas, sua cidade natal, após vigília mortuária no Palácio da Liberdade, sede do Governo de Minas. Em mensagem transmitida por email ao Deputado federal José Fernando Aparecido de Oliveira, filho de Aparecido, a ABI lembra que ele teve “corajosa atuação na resistência à ditadura, como incentivador de quantos, na imprensa e nos meios culturais, organizavam atos e iniciativas pela volta do País ao Estado de Direito”. Após assinalar que Aparecido foi “destacado homem público”, que “dignificou com sua competência e sua alta compreensão da ética nos negócios de Estado os relevantes cargos que exerceu”, entre os quais o de primeiro Ministro da Cultura, criado no Governo José Sarney, a declaração da ABI descreveu-o como “carinhoso e afável com as
Definido assim pelo ex-Presidente Itamar Franco, ele era carinhoso e afável com todas as pessoas. Foi corajosa a sua atuação na resistência à ditadura.
José Aparecido foi o primeiro Ministro da Cultura, cargo criado no Governo Sarney. O golpe militar incluiu-o na primeira lista de cassações, em 10 de abril de l964.
pessoas em geral, e não apenas com os amigos”, e merecedor da “definição do ex-Presidente Itamar Franco na declaração em que lamentou o seu passamento: ele era o ‘Zé dos amigos’.” É o seguinte o texto da mensagem enviada pela ABI ao Deputado José Fernando Aparecido de Oliveira, “A Associação Brasileira de Imprensa recebeu com profundo pesar a notícia do falecimento do jornalista e Embaixador José Aparecido de Oliveira, que honrou a ABI como membro do nosso Conselho Consultivo, para o qual fora eleito em abril de 2004 e reeleito agora em abril passado. Destacado homem público, José Aparecido dignificou com sua competência e sua alta compreensão da ética nos negócios de Estado os relevantes cargos que exerceu, entre os quais os de primeiro Ministro da Cultura (1988-1990), criado no Governo José Sarney (1985-1990), Governador do Distrito Federal (1985-
O embaixador dos sonhos mineiros
1988), Embaixador do Brasil em Portugal (1993), Secretário de Estado de Agricultura, de Governo e de Interior e Justiça de Minas Gerais e Secretário Particular do Presidente da República (1961). Foi também deputado federal por seu Estado, eleito como um dos mais votados na eleição de 1962 e cassado em 10 de abril de 1964 pela ditadura militar, e reeleito na eleição de 1982, em que obteve nada menos que 137 mil votos. José Aparecido teve corajosa atuação na resistência à ditadura, como incentivador de quantos, na imprensa e nos meios culturais, organizavam atos e manifestações pela volta do País ao Estado de Direito. Carinhoso e afável com as pessoas em geral, e não apenas com os amigos, merecia a definição do exPresidente Itamar Franco na declaração em que lamentou seu passamento: ele era o “Zé dos amigos”. Entristecida e enlutada , a ABI pedelhe que aceite e transmita à sua família, e especialmente à sua mãe, Senhora Maria Leonor, e à sua irmã, Senhora Maria Cecília de Oliveira, nossa palavra e nosso abraço de conforto em momento tão doloroso. Cordialmente (a) Maurício Azêdo, Presidente.”
Um homem público de correção absoluta POR JÂNIO DE FREITAS
POR PETRÔNIO GONÇALVES
Ele era meu amigo… eu o adorava. Embaixador da mineiridade, sempre foi o Zé de todos os amigos, como ficou conhecido; reconhecido. Possuía a grandiosidade dos gênios, a generosidade dos grandes, a nobreza dos que estão acima de nós. Deixou suas pegadas na memória e na história da alma brasileira, no coração dos mineiros, dentro e fora de nós. Governador de Brasília, primeiro Secretário de Cultura de Minas e primeiro Ministro da Cultura do Brasil, sempre vislumbrou um país melhor, voltado para suas coisas, renascido em suas raízes, embebido em sua luz. Ensinou aos mineiros um jeito de ver a vida; aos brasileiros, uma forma de fazer política; uma maneira de pensar e sonhar um país, um povo. Ao nosso primeiro encontro, convidou-me para almoçar com ele, em sua casa, servindo à mesa os valores que ele trazia incrustado em seu peito. Eu menino, acanhado e encabulado, e ele com seu garfo servindo as coisas em meu prato. Era o início de tudo. Ninguém nunca ficou sozinho ao seu lado, ninguém ficou desamparado. Na época da ditadura, diante da censura moral que abatia aos seus amigos de jornal e de ideal, ele sempre tinha uma verbinha amiga, uma palavra providencial, um atalho para encurtar o caminho de sofrimento de muitos. Oséas de Carvalho, amigo que Zé Aparecido me deu, em seu último encontro com o Zé Aparecido, enquanto enxugava as lágrimas, me confidenciou: — Ele sempre me ajudou em tudo, em tudo! Ele sempre nos ajudou, Oséas, em tudo, em tudo! Um dia, o inconfidente Celso Brant, quando me questionou sobre um novo amigo, lhe respondi: — Celso, eu sei que ele é amigo do Zé Aparecido.
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Depois de uma risada pachorrenta, Celso ponderou: — Petrônio, todo mundo é amigo do Zé Aparecido! Quando passou por uma cirurgia no Rio, o médico reclamou com a enfermeira diante da romaria dos que foram em busca do seu amigo: — Da próxima vez, nós vamos ter que operá-lo no Maracanã. Assim foi, assim viveu, assim escreveu a sua história. Quando ele chegou ao Palácio da Liberdade, em sua última visita, estava lá quando abriram a concha. Era como se abrissem em mim um baú repleto apenas de boas recordações. Que saudade, que saudade! Depois, seguiu para a sua Conceição que ele trazia bem dentro de si. Sempre fui para lá ao seu convite. E era sempre uma festa, uma confraternização, uma alegria incontida. Agora, parto para lá sem convite algum. Quando cheguei, vi a pequena cidade em luto. Na igreja, a comovente e comovida missa e a canção que não esqueço mais: “... quem tem as mãos limpas e o coração puro, quem não é vaidoso e sabe amar”. Os discursos foram poucos, as lágrimas foram muitas, verdadeiras. Agora, o Zé de todos os amigos, o querido embaixador dos sonhos mineiros, está no céu, brincando aos pés de dona Araci, que fica na varanda do tempo tricotando histórias para os anjinhos... é de novo o menino Zé, como gostava de ser, um ser de luz, que levou consigo a chama que acendia a fogueira que ao seu redor os homens sonhavam, festejavam e eram mais felizes... Com a bênção de Bom Jesus do Matosinhos! Petrônio Gonçalves, jornalista, poeta e escritor, é sócio da ABI. Ele escreveu este texto especialmente para o Site da ABI após voltar do sepultamento de José Aparecido em Conceição do Mato Dentro, a 185 quilômetros de Belo Horizonte. Originalmente o artigo tinha o título José Aparecido de Oliveira, o embaixador da mineiridade.
O ex-ministro da Cultura, ex-embaixador em Portugal e ex-deputado federal José Aparecido de Oliveira, morto anteontem, foi uma vocação extraordinária de articulador político, mas acima de tudo foi homem público de correção absoluta. Com o então deputado federal Paulo de Tarso Santos, o também deputado Zé Aparecido e eu, como jovem e insensato diretor do Correio da Manhã, estivemos juntos na aventura temerária de desvendar, com a posterior inviabilização, uma operação da CIA e da Embaixada dos Estados Unidos que, sob o codinome IBAD (supostamente Instituto Brasileiro de Ação Democrática), comprou grande número de congressistas brasileiros, com isso influindo na Câmara, no Senado, na administração do País e na agitação de direita e de esquerda. Consumado o golpe, eu estava fora do Correio, Paulo de Tarso foi cassado e exilou-se, e Zé Aparecido, também cassado, teve a casa invadida pelo general Carlos Guedes para usurpação de documentos sobre o IBAD, que sumiram como desejavam o General Vernon Walthers, especialista em golpes da CIA, e o embaixador do golpe Lincoln Gordon. Jânio de Freitas, jornalista, é sócio da ABI. Este texto foi publicado em sua coluna na Folha de S .Paulo, com o subtítulo Memória da crônica Herança das ditaduras, publicada na edição de 21 de outubro de 2007. É reproduzido com título da Redação do Jornal da ABI.
REPRODUÇÃO
Certa noite, no Opinião POR FERREIRA GULLAR
Paulo Autran pouco antes da saída da Passeata dos 100 mil. No alto, lindíssima, a atriz Odete Lara.
Paulo Autran, um combatente da liberdade Ele deu especial vigor aos textos de Liberdade, Liberdade, um dos pontos altos do teatro de resistência, em abril de 1965. A ABI manifestou em declaração divulgada em 12 de outubro seu pesar pelo falecimento do ator Paulo Autran, apontado pela entidade não apenas como o excepcional intérprete teatral que recebeu as devidas homenagens ainda em vida, mas também como um destacado combatente da causa da liberdade no País durante a prolongada ditadura militar. Lembrou a ABI que Autran foi o principal protagonista da peça Liberdade, Liberdade em abril de 1965, um dos momentos mais altos do chamado teatro de resistência inaugurado com a encenação do musical Opinião. “A Associação Brasileira de Imprensa” — diz a declaração — “manifesta seu forte sentimento de pesar pelo falecimento do ator Paulo Autran, que foi não apenas o excepcional intérprete teatral que recebeu as devidas homenagens ainda em vida, mas também um destacado combatente da causa da liberdade que teve a coragem cívica e política de assumir o papel de principal protagonista da peça Liberdade, Liberdade, encenada pelo Grupo Opinião em abril de 1965 e que constituiu um dos momentos mais altos do chamado teatro de resistência, inaugurado com o musical Opinião no ano anterior. Autran participou também das principais manifestações de resistência à censura e de defesa da liberdade de expressão durante a ditadura militar, ornando sua biografia com a negativa permanente de qualquer forma de alienação e de indiferença pelos destinos do País. Ao lado de Tereza Rachel e Oduvaldo Viana Filho, entre outros artistas,
Paulo Autran conduziu Liberdade, Liberdade com extrema competência, valorizando o texto montado por Millôr Fernandes e Flávio Rangel, que pesquisaram textos de exaltação da liberdade na literatura universal e ao longo da História, em diferentes países, e os apresentaram, intercalados com números musicais, com uma estrutura dramatúrgica de grande impacto sobre o público. Mereceu então Paulo Autran elogios entusiasmados de um dos principais críticos teatrais da época, Yan Michalski, do Jornal do Brasil. ‘A versatilidade demonstrada por Paulo Autran é impressionante: em duas horas de espetáculo ele esboça umas dez ou 15 composições diferentes, sempre adequadas e inteligentes, sempre livres de quaisquer recursos de gosto fácil’, disse Michalski em sua crítica, na qual apontava esse virtuosismo como resultado do ‘domínio dos problemas técnicos’ e ‘de todos os meios de expressão do ofício de ator’. A ABI considera necessário ressaltar esse aspecto da trajetória de Paulo Autran na vida cultural e política do País, para assim destacar igualmente o papel que, como ele, tiveram na organização da resistência à ditadura os integrantes do Grupo Opinião, responsável pela encenação de Liberdade, Liberdade, como Tereza Aragão, Armando Costa, Pichin Plá, Ferreira Gullar, Oduvaldo Viana Filho e João das Neves, alguns deles evocados com a mesma saudade com que prestamos reverência à fecunda existência de Autran.”
Paulo Autran desempenhou o papel principal da peça Liberdade Liberdade, que o Grupo Opinião montou, em 1965, em seguida ao show Opinião, que promovera uma renovação do musical brasileiro, mesclando textos e canções. Entusiasmados com o êxito do show, Flávio Rangel e Millôr Fernandes nos propuseram elaborar uma montagem de textos e músicas, cujo tema seria a liberdade. Vale lembrar que a ditadura militar mal completara um ano e ainda hesitava em mostrar a verdadeira cara, mas era preciso agir com cautela. Chamar Paulo Autran para protagonizar o espetáculo impunha respeito, mesmo porque ele não tinha atuação política. O espetáculo estreou com casa cheia, indicando que íamos repetir o êxito de público do anterior. Como os textos citados em cena, em defesa da liberdade, incluíam de Sócrates a Martin Luther King, passando por Voltaire e Lincoln, a censura não se atreveu a cortar nada, nem mesmo algumas piadas de Millôr, como uma que era dita com toda a seriedade por Autran: “Se a ditadura continuar permitindo que se montem peças como esta, o país vai terminar caindo numa democracia”. Mas enquanto não caía, nem tudo eram risos. Assim foi que, certa tarde, recebo um telefonema de nossa companheira Pichin Plat, a que, coube, naquele dia, de acordo com rodízio que estabelecemos, cuidar da bilheteria. Avisou-me que um sujeito mal-encarado comprara 40 ingressos e exigiu que fossem todos juntos. Naquela noite, o vice-governador ia ver a peça. Telefonei para o jornalista Hélio Fernandes, irmão de Millôr e diretor da Tribuna da Imprensa, que pediu a proteção da política. Antes do espetáculo reuni-me com o grupo e decidimos nada dizer aos atores pra não alarmá-los. Mal começado o espetáculo, chegaram os policiais –– que tanto temíamos –– para nos proteger. Uma rápida inspeção revelou a presença de uma pequena bomba artesanal, no banheiro do teatro, o que aumentou nossa preocupação. O que iria acontecer? O primeiro ato transcorreu sem nenhum atropelo, mas não tirávamos os olhos do trecho da platéia ocupado pelos 40 inimigos. (Quarenta parece um número amaldiçoado: além dos 40 ladrões, houve recentemente os 40 aloprados...). A platéia se divertia, era tocada pela fala irônica de Marco Antônio, em que denuncia a traição de Brutus, assassino de Júlio César, e que
Paulo Autran interpretava magnificamente ora rindo das surpresas do texto, quando Vianinha, bem sério, exige que cada espectador tome uma posição, seja de direita, de esquerda ou de centro, mas que, tomada, fique nela, “porque senão, companheiros, como as cadeiras do teatro rangem muito, ninguém vai ouvir nada”. No intervalo, mal conseguíamos esconder dos atores nossa preocupação. Nara Leão, depois de tomar um gole de refrigerante, fitou-me sorrindo. “Por que vocês hoje estão sérios e mudos?”, indagou. “Impressão sua”, respondi. Começado o segundo ato, a expectativa aumentou. A peça, a certa altura, aludia ao caso do poeta soviético Joseph Brodsky, que fora condenado a cinco anos de trabalhos forçados por desrespeitar as normas do regime. Logo em seguida, Paulo Autran falava do soldado norte-americano Eddie Slovik, que se negara a entrar em combate e estava sendo julgado como desertor. A cena é então interrompida por uma voz da platéia (um dos 40) que grita: “Cale a boca, comunista”. Paulo, surpreendido, hesita, olha na direção de onde veio o grito, e logo outros brados se ouvem: “Fora, comunista”. Ele faz que não escuta e continua a cena: “Conhece o princípio militar segundo o qual um cidadão fisicamente capaz que não luta por seu país não merece viver?”. –– Fora, comunista! Foi aí então que a maioria da platéia reagiu, começou a bater palmas e as palmas, num crescendo, fizeram calar a voz dos 40 provocadores. O espetáculo transcorreu tenso, mas sem interrupções até o fim. Quando o público começou a se retirar, os policiais cercaram os agitadores e passaram a revistá-los: alguns escondiam cassetetes sob o paletó, outros traziam revólveres e manoplas. Depois de desarmados, foram levados para fora do teatro e, na rua, defrontaram-se com um fotógrafo da “Tribuna da Imprensa”, que os flagrou. O retrato do chefe deles saiu no jornal, no dia seguinte: era um oficial da reserva da Aeronáutica. Para encerrar a noite, convidamos Paulo Autran a tomar um chope conosco na Fiorentina. Ele não pôde ir, mas, depois desse episódio, tornou-se um firme adversário da ditadura militar. Publicado na Folha de S. Paulo, caderno ilustrada, página E-14, edição de 21 de outubro de 2007. O título é do original. Ferreira Gullar, jornalista, poeta, escritor, teatrólogo, artista plástico, é membro do Conselho Consultivo da ABI.
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Saudades do Diário de Notícias POR RUBENS NOGUEIRA
Jornal é como vício – cada um tem o seu. Literalmente. E na memória dos que trabalharam em um matutino que desapareceu em 1974? Também. Cada um se lembra do seu tempo, dos colegas do seu turno, etc etc etc. Foi o que percebi ao ler: Diário de Notícias, A luta por um país soberano. Cadernos da Comunicação, série Memória número 15, ótima iniciativa da Prefeitura do Rio, Secretaria Especial de Comunicação, 2006, 106 páginas ilustradas, ave, ave, César Maia, morituri te salutant. Tudo na publicação faz lembrar José Simeão Leal e os Cadernos de Cultura do Mec na metade do século 20. Emoções, muitas emoções com os depoimentos de alguns do meu tempo e de outros, de outros tempos. Cada um analisando do seu ponto de vista a vida, a vibração, a influência daquele jornal criado por Orlando Dantas, em 12 de junho de 1930. Um desses colegas – Adail José de Paula –, grande caricaturista, certa noite de junho de 1960, da sua prancheta à entrada da Redação, fez o “boneco” de uns 30 profissionais, no tumulto que era, sempre foi, sempre será uma sala de Redação lá pelas nove da noite. Este obscuro suplente de conferente de revisão, tornado depois repórter auxiliar – entre 1948 e 1962 – mereceu aparecer na caricatura coletiva. Adail, como eu, um sobrevivente (como os dinossauros), está vivo e forte, trabalha ainda e em data oportuna vai expor o melhor de sua vasta obra. Ali, na Riachuelo 114, onde testemunhamos boa parte da História deste país. Meu Diário de Notícias! Li e reli o livrinho e notei que alguns não apareceram. Vivos ou mortos eles aqui são lembrados: Homero Homem, Geir Campos, Ribeiro Couto, Luiz de Barros, Victorino de Oliveira, Isaac Izeckson, Luciano Martins, Armando Santos,
José Mathias, Rubens Rezende, Darcy Evangelista, Milton Pedrosa, R. Magalhães Jr., Teixeira Heizer, José Garcia de Souza, Moniz Bandeira, Júlio Maria de Souza, Louis Wisnitzer. E ainda faltam alguns. Quando me vierem à memória citarei. Um jornal morre devagar. Leva, às vezes, muitos anos de agonia. Em nossa cidade tivemos exemplos no passado e temos no presente. Nos últimos 60 anos uma boa meia-dúzia de diários got back to oblivion e pelo menos dois impérios jornalísticos foram para o beleléu. História como a de O Globo é coisa rara. Rubens Nogueira, jornalista, é sócio da ABI
Uma grande redação do Rio de Janeiro, em 1961: a do Diário de Notícias, fechado em 1976. No traço de Adail, apenas o pessoal que ficava para o fechamento, sem incluir muitos repórteres e colunistas: 1 - Hélcio Martins; 2 - Nilson Viana; 3 - Hélio Fernandes; 4 - Júlio Maria; 5 - David Gonçalves; 6 - Agostinho Seixas; 7 - Daltro de Brito; 8 - Paulo de Castro; 9 - Campos Ribeiro; 10 - Maria de Lourdes; 11 - 0 próprio Adail; 12 - Rubem Pereira; 13 - Nilo Dante; 14 - Ezio Speranza; 15 - Vicente Cascado; 16 - Tobias Pinheiro; 17 - Vitorino de Oliveira; 18 - Jorge Gonçalves; 19 - Luiz Luna; 20 Edson Braga; 21 - Vanderlino Nunes; 22 - Rui Medeiros; 23 Aurélio Lacerda; 24 - Flávio Focão; 25 - Hugo Dupin; 26 - Barbosa Nascimento; 27 - Orlando Nóbrega; 28 - Rubens Nogueira; 29 Osório Borba; 30 - Prudente de Moraes, neto; 31 - Míster Samba; 32 - Sales Neto; 33 - Expedito Quintas; 34 - Luiz Macedo; 35 René Amaral; 36 - Mílton Pinheiro; 37 - Mário Vale; 38 - Osvaldo de Castro; 39 - Ítalo Vivone; 40 - Idalício Mendes.