Abismo Humano nº4

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Editorial

4 A Associação de Artes 'Abismo Humano’ dedica-se ao aproveitamento da tendência artística presente nas novas camadas jovens e a integrar, junto da arte, os valores locais, bem como ao entretenimento, educação e cultura de forma a ocupar os espaços livres na disposição dos seus associados. Para tal a associação compromete-se a contactar vários artistas, tanto na área da pintura, da literatura, escultura, fotografia, cinematográfica, ilustração, música e artesanato, de forma a expor as suas obras tanto num jornal de lançamento trimestral, consagrado aos sócios, como na organização de eventos, como tertúlias, exposições, festas temáticas, concertos e teatros. A associação das artes compromete-se igualmente a apoiar o artista seu colaborador, com a montagem de, por exemplo, bancas comerciais e com a divulgação do trabalho a ser falado, inclusive lançamentos, visando assim proteger a arte do antro de pobreza ingrata e esquecimento que tantas vezes espera as mentes criativas após o seu labor. Os eventos, que são abertos ao público, servem inclusive o propósito de angariar novos sócios, sendo que é privilégio do sócio, mediante o pagamento da sua quota, receber o jornal da associação, intitulado de “Abismo Humano”. Este jornal possui o objectivo de divulgar as noticias do meio artístico bem como promover os muitos tipos de arte, dando atenção à qualidade, mais do que à fama, de forma a casar a qualidade com a fama, ao contrario do que, muitas vezes, se pode encontrar na literatura de supermercado. Afiliada às várias zonas comerciais de cariz artístico, será autora de promoção às mesmas, deixando um espaço também para a história, segundo as suas nuances artísticas, unindo a vaga jovem ao conhecimento e à experiência passada.

Abismo Humano

Equipa Editorial André Consciência - Albano Ruela

Assinaturas Assinaturas: abismohumano@gmail.com Para assinar a Revista Abismo Humano contactar por email


Sumário Editorial Assinaturas Sumário Manifesto Ruínas Circulares Hieróglifos Existenciais Noites Passadas na Literatura Flauta de Pã Labirintos Prosaicos Ensaios Filosóficos Obra em Destaque Captações Imaginárias Pintura Arte Digital Fotografia Cartoon - Cartazes Trabalhos Plásticos Escultura

3 3 4 5 6

Apogeus Espirituais Coliseu dos Assinantes Trans Missões Arautos Sonoros Inventos Publicidade

31 33 38 41 43 43

8 11 16 19 23

Noites Passadas na Literatura Entrevista com Carla Ribeiro Página 8

Hieróglifos Existenciais Flauta de Pã

Drunkyard Poems Página 11

24 26 27 28 29 30

Hieróglifos Existenciais Labirintos Prosáicos

Da Sabedoria Página 18

Hieróglifos Existenciais Obra em Destaque

Alice do Outro Lado do Espelho Página 23

Captações Imaginárias

Coliseu dos Assinantes Madrigal das Torres Altas Página 37

Pintura

Maa Kali Página 24

Trans Missões A Dança do Divino Página 39

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Arautos Sonoros And Also the Trees ao Vivo em Leiria Página 42

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Manifesto Abismo Humano O Abismo Humano compromete-se a apresentar a sapiência, o senso artístico, e o cariz cultural e civilizacional presente no gótico contemporâneo tanto como nas suas raízes passadas. O Abismo Humano toma o compromisso de mostrar o que têm tendência a permanecer oculto por via da exclusão social, e a elevar o abominável ao estado de beleza, sempre na condição solene e contemplativa que caracteriza o trabalho da inteligência límpida e descomprometida. O Abismo Humano dedica-se a explorar as entranhas da humanidade, e é essencialmente humanista, ainda que esgravatando o divino, e divino é o nome do abismo no humano. O Abismo Humano é um espaço para os artistas dos vários campos se darem a conhecer, e entre estes, preferimos as almas incompreendidas nos meios sociais de maior celebridade. O Abismo Humano é um empreendimento e uma actividade da Associação de Artes, e por isso tomou o compromisso matrimonial para com as gémeas Ars e Sophia, duas amantes igualmente sôfregas (impávidas), insaciáveis (de tudo saciadas) e incondicionais (solo fértil à condição). O Abismo Humano compromete-se a estudar o intercâmbio da vida e da morte, da alegria e da tristeza, do amor partilhado e da desolação impossível, do qual o Abismo Humano é rebento. Como membro contra-cultura, o Abismo Humano dedica-se à destruição da ignorância que cresce escondida, no seio das subculturas, cobrindo-as à sombra do conformismo e da futilidade. Retratamos a tremura na mão do amor, a noite ardente, e a dança dos que já foram ao piano do foi para sempre.

André Consciência Imagem - Tatiana Pereira

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Ruínas Circulares

Gótico Somente tomando como contexto de reflexão a «música popular» e os «movimentos juvenis» concernentes – é coerente perguntar: Afinal de onde veio o Gótico? A década de 70 assiste ao declínio do «movimento hippie», degradado por comunidades de fome e promiscuidade, na perda de todo e qualquer horizonte político e isoladas nos seus katmandus artificiais. Deste apocalipse emergem a vadiagem pretensamente operária e orgânica e pretensamente anarquista do punk, bem como a mitologia «hell’s angels» na sua apologia de um individualismo extremo, a pretensa liberdade on the road and keep riding de tribos motorizadas, a violência gratuita, o white power, o heavy metal. Os The Doors continuam a ser a banda de referência para perceber o evoluir e declínio do «movimento hippie» e os fenómenos de subcultura que dele, dialecticamente, emergem. Como uma terceira via entre o punk e o heavy metal surge o death punk/death rock de bandas como Alien Sex Fiend, Christian Death, Fields Of The Nephilim, The Damned, Bauhaus, Siouxsie And The Banshees, Joy Division etc, etc… (mas mesmo estes são precursores, as primeiras bandas a autodenominarem-se góticas foram bandas como The Shroud, Rosetta Stone, London After Midnight, Nosferatu, etc). Mantendo alguma da crueza do punk curto e duro à Ramones e Sex Pistols, o death punk evolui dentro do movimento genérico da new wave, como os The Stranglers, The Cure, Blondie ou Nina Hagen Band, mas adopta muito da temática e orquestração do dark metal, bastante mais esotérico, tétrico e sinfónico do que o heavy metal/hard rock reinante – o primeiro álbum de Black Sabbath («Black Sabbath», 1970) permanecerá como a referência mais remota e inspiradora numa franja extensa que vai do death rock «clássico» ao «híbrido» contemporâneo gothic metal. Mas não se deve procurar apenas os contextos de época, mas sim procurar as raízes mais fundas que alimentaram a originalidade do death punk… e essas raízes as encontramos no lado mais sombrio do rock progressivo, no psicadelismo negro de Hawkwind, Van Der Graaf Generator, King Crimson, os verdadeiros pais do Gótico, a que eu chamo prégóticos, por analogia literária com os pré-românticos (quem é mais romântico? o pré-romântico William Blake? ou o romântico Byron?).

(...) Os góticos vão se organizae na fantasia de uma sociedade alternativa, paradoxal, fazendo parte do sistema produtivo capitalista e aceitando-o mas refugiando-se na utópica construção de um escol de eleitos, de almas esclarecidas, de uma subcultura feita de protocolos e secretismo (...) Este evoluir a partir do punk, por contradição, é o impulso do Gótico, e é neste sentido que o podemos considerar um retorno a um certo espiritualismo que tutelava o «movimento hippie»… se este propunha um modelo de sociedade que fosse a negação do capitalismo, se o punk propõe a saída do sistema produtivo, recusando o trabalho e até propondo a destruição sistemática, se os neohippies se isolam no retorno atávico a uma economia medieval de artesãos, os góticos vão-se organizar na fantasia de uma sociedade alternativa, paradoxal, fazendo parte do sistema produtivo capitalista e aceitando-o mas refugiando-se na utópica construção de um escol de eleitos, de almas esclarecidas, de uma subcultura feita de protocolos e secretismo, esquartejada entre o diurno afã e um qualquer éden nocturno… Recuperação do Romantismo, é certo – das épicas luzes do século XIX

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contra o néon frio e sem alma do século XX –, mas rapidamente o «movimento» se fecha sobre si cancerigenamente numa autofagia ultra-romântica de tiques mórbidos e pseudo-abismos da alma. O facto de o Gótico nunca ter ascendido a contra-cultura prende-se com o facto de ter sido desde o início sempre mais emblemático do que problemático, como se o texto estivesse certo mas os seus divulgadores apenas permanecessem na contemplação estética da sua luz negra. A ausência de lideranças outras, que não o fluxo e refluxo das bandas na moda e à la carte, têm roubado ao Gótico a manifestação política, social e cultural da sua tremenda energia em potência.

(...) esquartejada entre o diurno afã e um qualquer éden nocturno (...) Episódicas tentativas de organização têm surgido de tempos a tempos, de variados, e até antagónicos, quadrantes: neo-românticos, pós-modernistas, neo-pagãos, nietzshianos e esotéricos, mas apenas parecem concordar na mitologia, numa certa reacção à civilização cristã capitalista e nas «torres de marfim». Na década de 90, com a vulgarização contínua e progressiva da Internet, alguns góticos da primeira vaga começaram a comunicar e a discutir o declínio anunciado do «movimento» e decidiram agir; movia-os uma responsabilidade para com as novíssimas gerações e a tentativa de devolver o Gótico à sua pureza inicial, avassalado que estava por satanismos psicóticos, bruxarias de alcova e sado-masoquismos hospitalares… Formou-se um directório, ao modo das sociedades secretas, com um ideário, programa político e objectivos precisos, mas os combates internos por jurisdição e hierarquia acabaram por fragmentar esta tentativa de estabelecer uma liderança e o directório transformou-se numa hidra abjecta de cabeças em luta, que acabou por degenerar nos satanismos, bruxarias e sado-masoquismos que criticava e pretendia combater. Alguns poucos góticos antigos decidiram continuar o projecto… isolados e malditos, assumiram o estatuto de vampiros. O resto é, ainda, história contemporânea…

Lord of Erewhon

(...) a tentativa de devolver o gótico à sua pureza inicial (...)

Looking Wesr from Across the Gotham River Anton Furst

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Hieróglifos Existênciais Noites Passadas na Literatura (...) Gosto de escrever à mão mesmo nos projectos mais extensos e ainda que dê mais trabalho. É uma forma de me ligar mais pessoalmente ao meu mundo. E escrevo a preto, sempre. (...)

ENTREVISTA com Carla Ribeiro, autora de Senhores da Noite (Fronteira do Caos Editores) e Pela Sombra Morrerão (Antagonista Editora).

1 - Como é que começaste a mostrar interesse pela literatura? Desde muito cedo me descobri como leitora compulsiva. Adorava perder-me em bibliotecas, fosse na municipal, fosse na da escola. Levava sempre o máximo de livros que pudesse para casa e perdia-me por completo nas histórias que me passavam pela frente. Este factor, aliado a um interesse bastante forte por várias das obras que se estudavam na escola ajudaram-me a encontrar com mais certeza a natureza do meu fascínio pela literatura. A partir daí foi uma caminhada constante, sempre a conhecer novos livros e novos autores, e depois a descobrir a minha própria vontade de escrever. 2 - Tens alguém relacionado com a literatura na tua família? Tenho uma prima que também escreve - e muito bem, mas que ainda não publicou. 3 - De que forma a literatura está presente no teu dia a dia? Está sempre lá, de forma mais ou menos discreta. As ideias não escolhem hora para aparecer e, mesmo quando não tenho tempo para escrever, ou quando estou numa fase de planeamento, mais que de escrita, a história que tenho em mente vai crescendo nos meus pensamentos. Por vezes, uma ideia nova surge de forma inesperada, no contacto com algum elemento ou experiência de vida, às vezes até de um sonho mais invulgar. E, do outro lado da escrita, há a leitura. Adoro entrar nos imaginários de outros autores e, por isso, não consigo passar um dia sem ler, nem que sejam só algumas páginas. Dedico bastante tempo à leitura, seja poesia, ficção ou qualquer outro género e confesso que é algo que me dá imenso prazer. 4 - Costumas brincar com palavras? Que estados de espirito associas a isso? Por vezes, sim. Uma boa parte da minha escrita nasce de forma bastante espontânea, ao ritmo da inspiração e das palavras que me nascem no pensamento. Mas quando tenho uma ideia em particular ou, mais que uma ideia, um estado mental, acabo por jogar com as palavras para tentar descobrir que expressões funcionam melhor. Isto acontece-me principalmente na poesia, que associo, muitas vezes, a estados de espírito mais sombrios ou melancólicos. 5 - Achas que tens hoje em dia especial atenção às palavras? Os outros sentidos despertam-te descrições? Sim. Sou bastante detalhada na adjectivação do que pretendo descrever e, por isso, há sempre algumas palavras "preferidas", que me soam melhor. E se, em termos de ficção, não sou particularmente descritiva, é possível que várias dessas imagens tenham nascido de cenários inspirados em imagens de lugares que vi ou em sons e melodias que ouvi.

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6 - Como é que te costumas lembrar das coisas? Imagens, palavras, sons, odores? Um pouco de todos, se bem que mais em termos de imagens e palavras. Geralmente associo a imagem ao cenário e as palavras às pessoas/personagens. Em menor grau, há o elemento melodia associado a algumas situações específicas e, em certas circunstâncias, o odor. Mas este já é relativamente raro enquanto recordação. 7 - Em relação à tua infância, quando tinhas medo ou te assustavas, era com o quê? Não sei se seria já um "sintoma" da minha imaginação compulsiva, mas sempre tive sonhos um pouco invulgares. Fugas em cenários desconhecidos, pesadas portas fechadas e criaturas impossíveis sempre estiveram, de certa forma, presentes no meu imaginário e, por vezes, acabavam por se revelar assustadores. Outras ideias que me assustavam eram as de um veículo descontrolado em andamento comigo no interior e as clássicas quedas intermináveis. Tenho - e julgo que sempre tive bastante medo de alturas. 8 - Tens alguma história clínica relacionada com problemas na fala ou na escrita? Nenhuma de que tenha conhecimento. 9 - Lembras-te da tua mãe te ler histórias? Não. A minha avó sabia imensas histórias populares e acabava por ser ela quem me contava muitas dessas histórias e lendas. 10 - De que forma se expressavam melhor os teus pais? Achas que te podem directa ou indirectamente ter levado à escrita? Não creio. Sou uma espécie de raridade no meio em que vivo, relativamente à paixão pela leitura e pela escrita. Durante o meu período de crescimento, os "adultos" centravam-se essencialmente no trabalho e também há que admitir que a minha terra natal, enquanto meio pequeno, nunca foi particularmente abundante em termos de opções culturais. 11 - E tu, de que forma te expressas mais à vontade? Sou uma pessoa silenciosa por natureza, daí que me sinta muito mais livre na escrita que na expressão oral. Apesar de adorar a música e de ter algum conhecimento da área, é sem dúvida a escrita a expressão que melhor me reflecte. 12 - Lembras-te da primeira vez que tentaste escrever? O que se passava na altura? Não exactamente a primeira vez, mas a primeira vez "a sério", quando descobri que a escrita podia ser o refúgio e o impulso de que precisava. Por circunstâncias menos boas da vida, estava a passar por uma fase bastante negra e um pouco depressiva. Foi nessa altura que escrevi o primeiro poema que guardei na memória, como reflexo e expressão do que sentia mas não sabia como explicar. 13 - Porque sentes necessidade de escrever? É em parte compulsão e em parte abrigo. Tenho um elo emocional muito forte com as minhas criações e gosto de pensar que ponho nelas a melhor parte de mim. Por um lado, permiteme fugir para os meus mundos imagnários e viver aquela vida, ainda que apenas por momentos. Por outro, mesmo que quisesse parar, sei que não conseguiria, porque as ideias continuariam a amontoar-se nos meus pensamentos. 14 - Em que momentos escreves? Tento, em cada dia, dedicar um pouco de tempo ao processo criativo. Por vezes, escrevo compulsivamente durante dias seguido. Noutras alturas, passo dias ou semanas sem escrever, enquanto a ideia amadurece. E depois há os momentos em que a escrita ganha vontade própria: um poema inesperado, um fragmento que, por si só, não se enquadra em nada, mas que faz sentido de acordo com o estado de espírito que, nestas circunstâncias, tende a ser um pouco mais negro.

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não pensaria em continuar. Mas as emoções concretas dependem do tema e da situação que estou a escrever. Um dos motivos que fazem com que goste muito de escrever situações dramáticas (julgamentos e execuções, despedidas, mortes inesperadas, etc.) é porque parte dessa emoção reflecte-se em mim, como se eu própria vivesse aquelas circunstâncias. Como se fosse de facto possível viver outra vida. 16 - Escreves quando algo muda na tua vida? Muitas vezes, sim. Acaba por ser uma forma de marcar as minhas reacções, positivas ou negativas, à mudança, de uma forma quase secreta. 17 - O ambiente é importante? E tens rituais? Mais uma vez, depende. Quando a ideia surge de forma inesperada e especialmente se é um projecto curto, como um poema ou um mini-conto, é provável que, desde que o tempo o permita, escreva logo na hora. Nos projectos mais longos e mais elaborados, o ambiente é importante: um lugar calmo, com a música que me inspira como companhia, é o meu cenário de eleição. Rituais... Eu diria manias. Gosto de escrever à mão, mesmo nos projectos mais extensos e ainda que dê mais trabalho. É uma forma de me ligar mais pessoalmente ao meu mundo. E escrevo a preto, sempre. 18 - De onde vem a tua inspiração? De toda a parte, desde a minha experiência de vida ao cenário que uma melodia possa evocar nos meus pensamentos. Tudo o que sou e o que faço se reflecte naquilo que escrevo, incluindo leituras mais marcantes, memórias inesquecíveis e objectivos cumpridos ou fracassados. 19 - Que prazer tiras de escrever? É como se fosse um refúgio distante, uma oportunidade de viver outras vidas que não a minha, mas, ainda assim, de me reflectir nessas mesmas vidas. Todo o processo de criação, desde a primeira à última palavra, é algo que me deixa muito realizada e é, na verdade, a parte mais maravilhosa do percurso. 20 - E como te sentes quando começas uma nova obra? Como se estivesse parada no início de um labirinto, onde cada passo vai dar lugar a novos sonhos e novas descobertas, mas ainda não sei o que vou encontrar. Em parte curiosa e em parte insegura sobre se devo ou não avançar e, se sim, em que sentido. 21 - Como sabes quando está concluido um livro? Tenho um caminho de escrita bastante linear, isto é, começo no prólogo e sigo a ordem do enredo até ao epílogo, sem ter cenas posteriores escritas à partida. Daí que, posto o ponto final no epílogo tenho a história encerrada. Seguem-se as revisões, no sentido de melhorar algumas situações pouco desenvolvidas ou corrigir algumas coisas. Terminada a quinta revisão, a não ser que seja um projecto particularmente difícil, considero-o completo. 22 - Como vês a obra depois de publicada? E como encaras as criticas do público? Como uma muito querida parte de mim que ganhou vida própria e partiu. Acho que é isso que cada trabalho representa para mim e fica sempre uma sensação de algo definitivo quando o livro passa da gaveta para a forma publicada. Quanto às críticas... Evidentemente, nem tudo é positivo, mas a partir do momento em que o livro está por aí, temos de aceitar as boas e as más, as construtivas e as destrutivas, as fundamentadas e as que se baseiam em não se sabe bem o quê. Neste aspecto, independentemente do facto de doerem ou não, tento tirar de cada crítica os aspectos com que posso aprender e melhorar. O restante é algo com que se vive.

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Hieróglifos Existênciais Flauta de Pan Drunkyard Poems I.

Noites de Lúcifer e a cidade satânica. Ainda e sempre, A chuva elogio. Enamorei-me da solidão. É demasiado Precária a promessa de companheirismo. Preferível será Caminhar isolado em direcção ao desconhecido. Túnel. Rodeiam-me cadáveres, pútridos. Pulcros são, lacustrais Ardem. Sorumbáticos, ardem. Assim fenecer, apartado Da Lei, sobre a ponte, um comboio, a extrema liberdade. Talvez atravessar a estrada que liga a lado nenhum, lado A lado, talvez seguir enfim em direcção ao desconhecido. Ou mergulhar naquele abismo, abismos mil, abismo outro. Ágil o medo consagrar ao torpor da História, perseverar E ascender, ler os imensos livros que o tempo me permite Reescrever, escrever, escrever. Depois beber, embriagar O espírito de motivações e projectos. Ir ao teu encontro. II. A febre agudiza-se nos meses de Inverno. Tudo escritos Que lembram o quão lamentável é não saber viver em paz. Então aproximo-me daquela que a minha neurose atenua, Aproximo-me e grito baixinho, é o medo, hoje visto medos. Sei o caminho de volta a casa, sei-o. Ponto final. A janela De Deus abrir-se-á, nervosa, periclitante, como se dilúvio. Chove muito na minha alma azul, é o tempo. São espíritos. Tropeço em alguém, há sorrisos estranhos. Positivamente, Abeiro-me do balcão e gemo penetrante, os meus poemas, Toma-os à cabeceira da noite e protege-te. São espíritos Impiedosos e sagazes. Sim, eu conheço-os. Onde o Amor Que eu tanto sonhei? Onde o Amor que eu tanto sonhei? Não, ninguém parece preocupar-se com a sanita carregada De vómito, sim, a merda alimenta. Não, tal não me perturba.

O Justo Ricardo dos Reis

(...) Chove muito na minha alma azul. É o tempo. (...)

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Hieróglifos Existênciais Flauta de Pan Drunkyard Poems III. Eu sou o cadáver que menos brilha neste bar. As emoções Troquei-as por uma bebida. Sofro orfandade. O projecto Prossegue e bebidas mais virão. Eu sou um cadáver ocioso. Então quando os sinos dobram, quando a eternidade se dá Em meus dedos, deixo-vos atravessar, meus poemas. Sabei Que tudo em mim é uma gargalhada demoníaca a luzir, o riso De quem soube enlouquecer a medida exacta, nada de breu E conselhos de alcova. Foda-se o Hipócrates. Ousei viver. Assim, minha amiga, cautela com as palavras que me sugeres. Sim, sim, conheço-as sobejamente. Uma bebida? Mas claro. Agrada-te o Inverno, dizes, as cores acidentadas do poente. Ouvi dizer que, outrora, quando os cadáveres se transferiam, As noites eram quentes e admiráveis, plácidas até. Um shot? Peço-te que me perdoes o entusiasmo, qual é o teu projecto?

Sleeping Soul Ricardo dos Reis

IV. Sonho um Outono em que as janelas dêem para a liberdade. Total e absoluta. Poder quedar-me e ter-te, meu amor, a sós. Caminharíamos por entre a neve como dois puros querubins. Tu lerias pelo serão fora, palavras que seriam violinos a voar, Rasgados e serenos, violinos a voar, tu lerias pelo serão fora. Junto à chaminé, ouviríamos o cântico dos outros anjos, tudo Uma correspondência singular e funda, delicada, harmoniosa. Escreveria rosas a tornear nossos dedos, a tua mão na minha, A despedida sem constrangimentos, a neve, chama inexorável. Depois, depois o dia nasceria envolto em fantasias e enigmas, As manhãs ciganas e os corações alegres, as brincadeiras vãs. E caminharíamos por entre a neve como dois puros querubins. Remendados e serenos, violinos a voar, tu lerias toda a manhã. E caminharíamos por entre a neve como dois puros querubins.

(...) Ouvi dizer que outrora, quando os cadáveres se transferiam, as noites eram quentes e admiráveis, plácidas até (...)

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Hieróglifos Existênciais Flauta de Pan Drunkyard Poems V. Bebo demasiado. Faz silêncio. Outono e tremeluzente treme A minha alma. Chove muito, extenuante o teu nome e o vento, Ide escritos por que não temo. Tive um sonho, evidentemente, A terra rasgava-se e era um túmulo e nós cadáveres doentios, Regressávamos. Abandonei o projecto, era bem uma fantasia. Nomadizo-me. Talvez as palavras me digam e o fumo do verbo Se espraie até de manhã, e a eternidade chame, com suprema Ironia, por aqueles que não dormem. O cristal das estrelas era Um frio glacial, estarei sobre as pedras, minha irmã, não temas, Dar-te-ei de beber. Os homens falam muito, olvidam a solidão. Mas as fábricas que a lúgubre princesa de neve laboram, essas Jamais se esquecem. Não. Ah, meu sonho! Ah, mundo frígido! A palidez da música que a miséria sentimentalizou. A demanda De ti, um mundo novíssimo, a felicidade nomeada. Chove fogo.

Sete Pecados Mortais Ricardo dos Reis

VI. O bar foi. Estou perdido. Sinto-me cruel, frenético e exigente. Lembro que desenvolvo um cancro bem parecido. Ela muito ria. Eu não sabia. Então no Inverno sentia flautas que dilaceravam A minha espinha. Havia uma música. Comecei a ver anjos. Sim. Levaram-me ao hospital: mundo, enlouqueci. Eu que alimentara Estátuas femininas, que a minha dor doara à fome das mulheres, Eu enlouquecera. Na sala chovem noitinhas de sonhos. Deixei De cortejar o cadáver. Então, no espelho, ouso assaz enfermo Cantar a indignação dos povos, roubados, explorados, também Eles cruéis, frenéticos e exigentes, indagarem, que é feito amor, A beleza, a vida, se ouvimos o espaço e o infinito a denunciarem A nossa embriaguez. O bar fechou, irmãos. Estamos perdidos. Levaram-me ao hospital: mundo, enlouqueci. Eu que alimentara Estátuas femininas, que a minha dor doara à fome das mulheres.

(...) Eu que alimentara estátuas femininas, que a minha dor doara à fome das mulheres (...)

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Hieróglifos Existênciais Flauta de Pan Drunkyard Poems VII. Então elas incharam, as veias da cidade suja, ruas cadáveres, A Peste vingara. Uma estrela que puna estóica a atrocidade, Areia e pó, que as morgues se abram para as noivas de negro Desfilarem, sanguinárias, qualquer coisa nefasta na ancestral Utopia dos olhos vazios de vitalidade. Amor meu, se colapso. Sonhamos de águas voltadas, companheira, o horror azulado, Bebemos escondidas as figuras que só a morte sabe esculpir. Nas ruas os cadáveres exultam e dançam, como se as palavras Fossem o projecto de um suicídio burguês, corrompido, o vício Venal que o néon magnifica, tudo o semblante de algo sinistro, E a neve cai, serena, como um punhal sobre o rosto da poesia. A impunidade de tal sofrimento, meu Amor. Penetrar-te, deus, É como esfregar a lama no rosto da minha vizinha, assassinada E de seguida violada pelo mais singular sonho então realizado. VIII.

Beauty Ricardo dos Reis

Ela veio com o último suspiro de um piano e o silêncio era neve. Algo disse, talvez o delírio se dê, um cataclismo gelado, branco, Tempestade e manhã inauguradora, a humanidade aprisionada. Súbito o piano tremeu e o mundo era um monstro feliz, cunhava A música que o fazer dos solitários erguera dos escombros, era Um monstro feliz, o mundo, e servia. Dera a embriaguez o Anjo Os sábados e a morte das crianças, os cadáveres sorriam ágeis. Deus cuspia, por Arturo Benedetti Michelangeli interpretado. De tempos a tempos, serenatas os bandalhos urdiam. Primitivos Eram e bem pagos, erguiam-se do lodo com a graça dos plágios. As madames, histéricas, arregaçavam as conas, o doente dava-o Perfumado, estéril, ainda os homens espantalhos, sempre corvos. A morte de um artista na cena em que o céu ardia. Sangria lenta. Ela veio com o último suspiro de um piano. Silêncio. Neve e dor.

(...) Nas ruas os cadáveres exultam e dançam, como se as palavras fossem o projecto de um suicídio burguês (...)

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Hieróglifos Existênciais Flauta de Pan Drunkyard Poems IX. Eco de noites infindáveis, o sofrimento da humanidade. Sara-me Esta ferida que é tempestade e archote no lodaçal dos corações Mal equilibrados. Tremo tanto, meu amor. Padeço e minhas mãos. Os bares ruíram, são os cadáveres uma reminiscência e destroços De todos os poemas que ascendem para nunca mais, a penumbra E a cidade deserta. Uma morte sóbria não compensa este cantar Eterno, lembram os fantasmas se a verdade é um oásis a sepultar. As flores dilaceram as máscaras e toda uma natureza fúnebre vive Isolada dos pianos, o violino das coisas não compreende sentidos E os amantes soçobram com a celeridade de velas sempre acesas. É preciso sangrar as imagens da manhã de encontro ao vomitório, Lamber baixinho a poeira das estrelas que os solitários crucificam. Que eu não quero desaparecer sem o teu beijo, alvíssima princesa Das mágicas sarjetas do céu. Eu não quero desaparecer. Tremo. Por ti, meu amor, eu componho a morte e a vida. Assim sei a ferida.

Nocturne Ricardo dos Reis

X. O projecto prossegue e os amantes da poesia são a flor dos céus. Damos as mãos e a febre adquire uma outra consistência, escritos, Sonhos, medos, convalescemos num genocídio colectivo e soamos. Os teus olhos, companheira, o teu sorriso, tudo páginas da poesia Que ora termina. Doença. Morte. A nossa embriaguez subjugada E decorada. Chove. Eu pesquiso, na sombra, o elixir da felicidade Última, rasgão de luz, nas noites frias consolo, alma azul, refulgente. Lacemos as mãos, fiel companheira, redijamos o futuro, a vastíssima Fraternidade, que os nossos dedos serão rosas e tu, palavra minha. Inauguremos um outro bar, longe do vício e da miséria humanas, uma Nova linguagem, um mundo belíssimo. Deus é morto. Adoremo-nos. Inauguremos um outro bar, longe do vício e da miséria humanas, uma Nova linguagem, um mundo belíssimo. Deus é morto. Adoremo-nos. O projecto prossegue e os amantes da poesia são o futuro da raça.

The Poisonous (http://avozdaserpente.blogspot.com/)

(...) As flores dilaceram as máscaras e toda uma natureza fúnebre vive isolada dos pianos (...)

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Hieróglifos Existênciais Labirintos Prosaicos

Abismo Humano Os seus olhos eram azuis e redondos como uvas, a anelante cadeia duma queda, um mergulho. Eu olhara, e nada me interessava ou importava, se pensasse. Apenas as mãos, quando se erguem em acção e comunicação, desvario. – Isto é uma chaladice, não percebes… Como um choro, nada me interessava, como um sorriso de aceitação. - Ouve, beijei-te o sono… - Tu és chalado, completamente chalado, e começara a despir-se, ali de joelhos na cama à minha frente, completamente chalado, sentia-me triste como se algo em mim se tivesse perdido, os seios despontaram-se-me e levei a mão, pequenos, em forma de pêra, os bicos arrebitados para cima, e sempre esta sensação de medo e insegurança quando me aproximo de uma mulher, este medo que atrai com violência, esta ansiedade que se enerva e excita pelo corpo todo, um pequeno espanto já desgastado como a angustiosa espera de uma revelação intuída que nunca aconteça. - É por isso que me deixo ir, e beijara-me com língua decidida, Isto vai ser um desastre, disse ela, É bom que sacudas o cabelo e não penses nisso, disse eu… Peguei no candeeiro e pusme em pé na cama, movendo-me em redor dela na medida em que o fio eléctrico me permitia, apetecia-me a luz dançando em cima dela que de joelhos se quedara, um braço esticado ao longo do corpo e outro de mão pousada no ombro, e não ria não, mantinha-se séria como se analisasse ou meditasse. – Estás decidida a mandar às urtigas as preocupações e começar a tratar dos problemas a sério, disse eu, Ou não?... Apetecia-me rir e fazê-la rir, poisei o candeeiro na mesa e ajoelhei-me frente a ela. Porquê sempre esta tristeza na alegria do amor? Os meus dedos tocavam a sua face, o calor da pele, suave e nova, o arco das sobrancelhas, as pálpebras nos frágeis olhos, Alguém foge por dentro, os lábios secos que se querem húmidos, os dedos nos dentes, suavemente forçando a entrada para o calor da boca, o sopro da respiração. – Tu só vives o momento presente? – Não vivo nada, absolutamente nada. Sou um corpo gordo boiando em água morna. Ela empurrou-me, novamente como outras e eu próprio fizera algures e sorriso, acabou o

(...) Como um choro, nada me interessava, como um sorriso de aceitação (...)

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gesto que lhe descera o vestido até à cintura, tirou as cuecas como se as arrancasse, e então foi como se levasse um soco no epicentro da minha concepção das coisas e do mundo, ali mesmo, completamente chalado, olhando o pénis que me olhava, pequeno, muito pequeno e fino numa densa pintelheira mas contudo um caralho, uma picha. Para êxtase do meu espanto o candeeiro pôs-se a piscar, talvez um mau contacto que eu provocara com os meus movimentos, piscava tremendo o olhar, tornando aquele sexo estonteantemente irreal como uma alucinação ou um sonho, aparecendo e desaparecendo como se falasse entre as pernas dela. Olhei para o abajur rendado do candeeiro com a luz periclitante que assim súbito se apagava e acendia, gaguejando e enjoando, e respirei fundo, poisando o meu olhar no dela. - Confuso? E parecia chorar, É ele ou ela?...

Flora of Nightfall—Babalith

Eu atirara-me à bacia que estava junto à janela, e vomitara-lhe como se para dentro dela me estatelasse, é o que dá encharcar-se em destilados como se preparasse o confronto com o outro, é o que dá aaaaaaah suspirei num grito, Onde há água, o cântaro, morna, a água, ela chorava, eu ouviaa soluçar, encharquei-me por inteiro como se me sacudisse todo e pousei o cântaro no chão. Levantei-me para a janela que abri numa imperiosa necessidade de ar e sentei-me no beiral, virado para ela. - Nós, respondi seguramente e avancei para sentar-me na cama um pouco abalado assim fraco, pousando as mãos entre as suas pernas. Fantástico, não tinha testículos, apenas aquele pénis pequeno e frágil, como um feto. – Que queres fazer? Como se suspirasse como todas e todos, Naturalmente, intumescê-lo… Puxei-a para mim todo e em queda, É quente, quente, Nunca… soprou ela, Nunca… e chorava num som uno como um lamento, como um único soluço de dor e alegria suspenso no limite, olhando o abismo, planando. Nós seguramente, sim, o pénis entesava sem crescer nem engrossar, sim, pequeno como um feto e enrijando, feminino e masculino. Encostei-me a ela e mergulhei de vez no seu corpo. Vítor Mácula http://vitormacula.blogspot.com/

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Hieróglifos Existênciais Labirintos Prosaicos

Da Sabedoria Olhas-me sobranceiro, numa altivez feita de orgulho e presunção, instalado na tua sabedoria como um trono e dizes conhecer tudo, até os mais obscuros segredos do mundo. Gabas-te de conhecer o pensamento de todos os filósofos, de ter penetrado nos meandros mais intrincados da psicologia e abarcar como ninguém a grandiosidade do cérebro humano; congratulas-te por compreender as mais elaboradas leis da física e descrever os mais complexos mecanismos biológicos que regulam os organismos; regozijas-te, por fim, com a certeza de que ninguém como tu é capaz de citar com tamanha precisão autores famosos ou identificar, num único relance o pai de qualquer uma das obras de arte que povoam os nossos museus. Eu, porém, digo-te que nada te valem esses saberes que tanto te esforçaste por acumular e que antes te queria Boy Lightening a Candle—El Greco ver sábio como aquele menino pobre e sujo que saltita descalço nas poças de água lamacentas que os rigores do inverno fizeram nascer nas vielas onde ainda não chegou o alcatrão. Pudesses tu, como ele, ter prestado atenção às canções que o vento nos traz e que povoam o silêncio, ou mergulhado as mãos nas águas límpidas e frescas de uma ribeira, seguindo o seu rasto atribulado ate ao berço de rocha nua onde nasceu; tivesses tu, como ele, a capacidade de conhecer um coração bondoso ou descobrir uma alma pura no brilho de um sorriso... Frankie http://os-meus-pequenos-nadas.blogspot.com/

(...) Pudesses tu, como ele, ter prestado atenção às canções que o vento nos traz e que povoam o silêncio, ou mergulhado as mãos nas águas límpidas e frescas de uma ribeira (...)

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Hieróglifos Existênciais Ensaios Filosóficos

U m

N o v o

C o n c e i t o

d e

V e r d a d e

Cremos que a questão da verdade é oportuna hodiernamente e que deve ser repensada, pois com os grandes sistemas ideológicos formulados pela modernidade e que originaram as catástrofes históricas que tão bem conhecemos (duas guerras mundiais, as ditaduras comunistas, etc.) começou-se a desconfiar de qualquer anúncio de um modelo completo. Qualquer sistema que tenha a pretensão de abarcar todo o real acaba por deixar escapar as várias subtilezas que subjazem a esse real, por isso uma filosofia ou mundividência deve começar por humildemente reconhecer que há zonas do ser que escapam à razão. Ora, foi esta humildade que faltou aos grandes sistemas da modernidade. O exacerbado racionalismo acreditava que a razão era capaz de abranger todo o tecido do real e assim construir por si só e a partir de si a verdade. Como sabemos, isto veio a verificar-se ser um fiasco e descambou nas maiores atrocidades da história da humanidade. Não é, pois, de estranhar que posteriormente se tenha começado a viver uma fase de desconfiança relativamente a qualquer doutrina que se apresentasse como a verdade, mais, a própria verdade começa a ser encarada com desconfiança culminando nas filosofias do absurdo da pósmodernidade. Do extremo da confiança cega na razão e nos sistemas por ela elaborados passa-se para o extremo da negação da verdade, passando a existência a ser considerada sem sentido. Pensamos que este temor de afirmar que existe uma verdade é fruto de uma concepção errada do que é a verdade, que tem a sua origem, na expressão de Merleau-Ponty, na “visão estrábica” da tradição filosófica ocidental. De uma maneira ou de outra, sobretudo em Platão, a verdade é transcendente ao “mero” mundo humano, pertence a um outro nível de realidade, ao mundo das ideias eternas e imutáveis. É, portanto, uma verdade de “sobrevoo”, que não toca a vida do mundo da opinião onde vivem os comuns mortais. A filosofia clássica criou um mundo das essências, mundo independente do sensível. Ora, consideramos que tudo o que seja desligado da experiência é fruto da “visão estrábica” da tradição filosófica ocidental. A verdade não é diferente. Para realmente ser verdade e convocar o ser humano não pode ser completamente alheia à sua vida quotidiana, tem de ser acessível a todos e não fruto de complicados processos ascético-iniciáticos. Torna-se, portanto, necessário depurar a equivoca noção de verdade da tradição filosófica ocidental.

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Eu sou a Verdade

Não poderíamos deixar de abordar a verdade no contexto do cristianismo. Cremos que tem aqui cabimento fazer uma breve exposição acerca da verdade no cristianismo, até porque uma das suas afirmações centrais é a declaração de Jesus Cristo: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” 1 Que verdade é, então, esta que Jesus diz que é? Podemos dizer com Michel Henry que “não é nossa intenção perguntar se o cristianismo é «verdadeiro» ou «falso» para provar a primeira destas duas hipóteses. Pretendemos, sobretudo, descobrir o que é que o cristianismo considera como verdade ou que género de verdade propõe e se esforça por comunicar aos homens; não como uma verdade teórica indiferente às suas vidas, mas como uma verdade essencial que com os homens mantém uma afinidade misteriosa, dado que é apresentada como a única capaz de lhes assegurar a salvação.”2 Que verdade é esta que é especificidade do Cristianismo? Em primeiro lugar, a verdade não é o produto de uma operação mental, não é separada da experiência, a verdade não é separada da vida quotidiana, ela é, antes, vivencial e por isso, é Caminho, que conduz a ela mesma e que gera Vida. Quanto mais se experimenta, quanto mais se vive a Verdade, mais resplandecente ela se torna. A sensação visceral da Verdade não é algo estático, adormecido numa dimensão transcendente ao quotidiano. Essa seria uma noção platonizante do problema da verdade. Ora, pelo contrário, a verdade está embrenhada na experiência, na vivência do quotidiano e constrói-se em inter-relação com estas duas dimensões. A verdade é um processo, como muito bem viu Hegel num outro contexto. Não podemos esperar que a verdade advenha de forma imediata, antes ela vai-se construindo a partir de uma adesão originária, numa pericorese entre o princípio a que numa adesão autodoadora nos fundamos e a vida quotidiana. Quanto mais experimentarmos aquilo a que aderimos, mais refulgente será a verdade. Primeiro há a manifestação da Verdade. “Esta verdade que tem o poder de se revelar a si mesma é a verdade de Deus. É Deus que a si mesmo se revela, ou Cristo enquanto Deus”3. Depois adere-se a essa verdade com as potências emotivas e no fluir da vida a inteligência vai acompanhando também a adesão emotiva. No embrenhamento no mundo emerge a inteligibilidade do que ao que antes se tinha aderido numa dádiva confiante de si mesmo. Depois da entrega a esta verdade ela vaise revelando, a verdade dá-nos acesso a si mesma. É ela mesma que se nos revela e é ela mesma o meio para que a conheçamos cada vez melhor. O sentido daquilo em que previamente se aderiu numa dádiva confiante, à medida que se vive a verdade, é cada vez mais resplandecente, até que tudo se ilumina e se chega à afirmação: “Sim, isto é mesmo a Verdade!”. Mas tal não é possível a priori. É requisito essencial experienciar e viver a verdade para que ela mesma seja luz para o ser. Esta Verdade, como já foi referido, para o cristianismo é o próprio Cristo. Poder-se-ia alegar que essa verdade é subjectiva, que se refere somente aos que acreditam nela pela fé e que cada um deve encontrar a sua verdade e não a verdade de outros, como o é a verdade de Cristo, pois ela é somente a verdade de uma pessoa que existiu há pouco mais de dois mil anos. O que acontece é que esta verdade de que falamos não é a verdade de Jesus Cristo, esta verdade é Jesus Cristo. Ao mesmo tempo, esta verdade que é Cristo é a minha verdade, é a verdade universal singularizada em cada indivíduo. Como é isto possível? Ora, Cristo é a actualização plena do que é ser humano. Assim, o objec-

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tivo de cada ser humano é transformar-se num outro Cristo, que em vez de suprimir a sua individualidade a aprofunda e a faz plena. O ser encontra a sua veracidade quando se identifica consigo mesmo. Ser verdadeiro em termos de essência do ente humano é ser aquilo que se é realmente. Isto não é dado à partida, é, antes, algo que se vai conquistando. Por isso, tornar-se humano é ao mesmo tempo tornar-se cada vez mais parecido com Cristo. Quanto mais parecidos formos com Cristo, mais verdadeiros seremos, pois nos vamos aproximando do que é o nosso verdadeiro ser.4 Á luz de Cristo, não há qualquer cisão entre as várias dimensões e expressões da vida humana. Queremos com isto dizer que, se tomarmos como princípio interpretativo da realidade Cristo, todas as leituras possíveis convergem para este mesmo cume de sentido que é Cristo. Assim, não haverá qualquer divisão entre a teologia e a filosofia, nem entre as várias expressões religiosas, nem em qualquer forma de vida. Antes, a multiplicidade e fecundidade da Vida, unem-se harmoniosamente orientando-se para o princípio cósmico que é Cristo. Este é assim tomado também como princípio ordenador do cosmos, pois hermenêutica não se pode distinguir de ordem. Ler a realidade é ordená-la, é dar-lhe um sentido. A multiplicidade e fecundidade próprias da Vida encontram o seu princípio ordenador em Cristo. Só Ele poderá ser o fundamento da unidade da realidade. É Cristo que impede a dispersão na relatividade. Desta forma, em vez de divergência e dualismo passa-se a perceber a subtil empatia entre a tese e a antítese, entre o corpo e o espírito, entre a dimensão humana e a dimensão divina, entre a vida contemplativa e a vida activa, entre a fé e a razão… Tudo passa a ser encontro com Deus. E Deus presente em tudo sem excepção. A dimensão divina não desce até à dimensão humana. A dimensão divina e a dimensão humana embrenham-se mutuamente, inextricáveis, em Jesus Cristo. A criação e o criador dançam num bailado harmonioso ao som da Encarnação do Logos. Platão coloca o Bem como principio unificador da realidade, ao mesmo tempo principio hermenêutico, epistemológico e soteriológico/ético, mas como poderá ser este o princípio se é tão alheio à dimensão humana? O Bem pertence à esfera do mundo inteligível, é descarnado e o ser humano só o é enquanto corpo e espírito. O Bem é um princípio impessoal e a forma mais profunda de relação é a que acontece entre duas pessoas. Deste modo, o princípio unificador além de transcendente, pois só deste modo pode ser meta, telos, é também imanente; para unir terá de ser munido das duas naturezas que pretende unir. Cristo, verdadeiro homem e verdadeiro Deus é este princípio, ao mesmo tempo, soteriológico/metodológico (caminho), hermenêutico/epistemológico (Verdade) e ético (Vida): “Eu sou o caminho, a verdade e a vida.” (Jo 14, 6-11). Cristo prefigura a humanidade com todas as suas capacidades plenamente actualizadas. O que em nós é potência em Cristo está em acto. Só se pode afirmar que algo tem determinada característica em potência quando sabemos o que é (a sua definição), ou seja, quando conhecemos a sua forma final. É isto que Jesus mostra. Agora sabemos que a humanidade possui características de Cristo em potência.

(...) A criação e o criador dançam num bailado harmonioso ao som da Encarnação do Logos. (...)

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(...) A dimensão divina não desce até à dimensão humana. A dimensão divina e a dimensão humana embrenham-se mutuamente (...) O seguimento de Cristo é condição sina qua non para a actualização das capacidades latentes no ser humano. Só por Cristo e com Cristo elas são despoletadas. Jesus é, deste modo, causa eficiente e causa final da verdadeira humanidade, pois é Ele que move a pessoa humana no aprofundamento e desenvolvimento das suas potências: "Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o atrair…". (Jo 6,44). E é Cristo a finalidade da pessoa; nele se transformar e configurar, o mesmo é dizer, quanto maior a semelhança a Cristo, mais actualizadas estarão as capacidades próprias do ser humano. Jesus, como princípio hermenêutico, identifica-se com a luz. Tal como a luz faz com que vejamos a realidade, assim Cristo ilumina o intelecto. Tudo deve ser interpretado à luz de Cristo, tendo como foco que espalha os seus raios pela realidade, Jesus Cristo. Quando acendemos uma luz, o que era informe e obscuro passa a ser percebido de forma clara e ordenada, os objectos percebem-se como ocupando determinado lugar, determinado espaço. Ora, quando pegamos no esplendor luminoso que é Jesus Cristo, e com ele iluminamos os recantos da realidade, esta passa de opaca e obscura a uma luminosidade resplandecente, tudo passa a fazer sentido. 7) Conclusão Cremos, ao contrário do que disse alguém, que existe a verdade, que é possível conhecê-la e comunicá-la, pelo menos, apontá-la, já que a verdade é uma revelação, seja interior, à maneira de Agostinho de Hipona, seja “vinda do alto exterior”. A verdade brota na vida quotidiana e brota vida da verdade, pois é ela que faz do ser humano mais humano e faz com que cumpra plenamente a sua vocação. Nos dias de hoje, geralmente, pensa-se que existe uma relação inversa entre verdade e liberdade. A opinião que vigora é de que cada um é mais livre na medida em que pode pensar e fazer o que quiser, uma vez que não se encontra preso a nenhuma convicção. Por conseguinte, respira-se na sociedade hodierna um cepticismo extremo. O filósofo genuíno vê as coisas de outra forma: está persuadido de que pode alcançar a verdade e de que, ao consegui-lo, se torna mais livre. Afirma que a liberdade adquire-se na medida em que sabemos mais sobre a realidade, na medida em que se conhece com maior profundidade qual é o papel do homem e, em concreto, desse homem que sou eu, no universo. A verdade é também digna de confiança, ou seja, nela podemos fiar-nos, pois põe fim à incerteza e à infinidade da investigação, às hesitações e conjecturas, à instabilidade. Mas a verdade não é estagnar, pois ao mesmo tempo que é ponto de chegada é também ponto de partida. A verdade possui inúmeras consequências e é possibilidade de inúmeros conhecimentos novos. A solidez e firmeza da primeira evidência potencia imediatamente a promessa de outras verdades, ela é uma chave que abre a via do espírito. Se não vejamos Descartes e procura do seu fundamento indubitável, assim que o descobre logo avança com a construção do seu edifício intelectual. A verdade abre e liberta para outras verdades. Ela descobre o ser e as relações entre as partes do ser, ela possibilita a introdução em novos domínios de verdade.

Patrícia Calvário

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Hieróglifos Existênciais Obra em Destaque

Um fascinante regresso ao mundo dado a conhecer em Alice no País das Maravilhas. É isso que promete este segundo livro, dedicado às aventuras da pequena Alice nos segredos de um mundo onde tudo é possível. E, com encontros inesperados, situações inacreditáveis e um jogo de xadrez muito especial, este é um livro que não desilude. Com uma escrita acessível e um imaginário incomparável, capaz de agradar a crianças e adultos, Alice do Outro Lado do Espelho é toda uma obra de impossíveis, onde a menos plausível das situações ganha um interesse verdadeiramente fantástico. Aqui, não é a história em si o que importa - até porque definir uma linha de enredo num livro como este não é trabalho nada fácil. São os momentos inverosímeis, mas cativantes, a magia sem preâmbulos nem consequências. A ideia do maravilhoso, de um lugar onde tudo pode acontecer. E, entre tudo isto, a ingenuidade de Alice, ao mesmo tempo inocente interveniente dos acontecimentos e fonte de todos eles. Uma referência também às ilustrações que, ao longo do texto, nos permitem uma imagem concreta e bastante interessante de vários dos momentos deste livro, conjugando palavra e desenho numa bela harmonia. Um livro feito de sonhos, portanto, e que, na sua improbabilidade, faz o leitor sonhar e imaginar. Simples na sua essência, pequeno nas suas dimensões, mas muitíssimo interessante no seu resultado final, esta foi uma obra que gostei muito de ler. Muito bom. Carla Ribeiro http://asleiturasdocorvo.blogspot.com/

(...) A magia sem preâmbulos nem consequências. A ideia do maravilhoso, de um lugar onde tudo pode acontecer (...)

(...) Ao mesmo tempo inocente interveniente dos acontecimentos e fonte de todos eles (...)

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Captações Imaginárias Pintura

Maa Kali Nuno Miguel

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Captações Imaginárias Pintura

“Virtus Pretiosuni Est Quam Aurum” Emanuel R. Marques www.myspace.com/emanuelrm

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Captações Imaginárias Fotografia

“T. Owen Knight With Cauldron (Standing)” Foto, Samekh Modelo, Owen Knight

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Captações Imaginárias Cartoon - Cartazes

Vânia Trindade

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Captações Imaginárias Trabalhos Plásticos

Plaster Mother - Mortisa http://kindaprincess.deviantart.com/

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Captações Imaginárias Escultura

The Being - Albano Ruela http://neoartes.blogspot.com/

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Apogeus Espirituais Dissipar a Névoa

(...) A loucura, o medo da morte, obsessões sexuais, religiosas, de identidade, são todas postas em causa ao longo desta viagem, que é na realidade a libertação do nosso corpo dos grilhões da ignorância. (...)

1 – NÃO ACREDITO NUM SISTEMA INICIÁTICO POR GRAUS. Em primeiro lugar, como regra, penso que qualquer sistema que retire ao indivíduo a sua capacidade de se guiar pela sua própria luz interior é inválido, pois isso bloqueia o seu discernimento e torna-o dependente de uma fonte exterior/particular, domesticando-o e agindo contra o princípio elementar da Magia que é o desenvolvimento da Vontade e a extensão ilimitada do Eu. Em segundo lugar, um sistema iniciático por graus enviesa a compreensão do Universo, criando a tendência na mente do aspirante de considerar o Universo segundo compartimentos, segmentados e operando segundo lógicas específicas, procedendo de uns para os outros segundo uma sequência linear e gradual, o que de facto é falso. Todo o Universo é contínuo e intemporal, a sua contemplação como uma actualidade - e não como uma dualidade irreconciliável de categorias racionais e percepções sensoriais - é o propósito que a magia encarna, e o sistema de aprendizagem deve reflecti-lo. Defendo uma organização desorganizada, uma liberdade de experiência de sistemas exteriores, cuja utilidade é enriquecerem o sistema interior, esse sim seguido com toda a devoção, excelência e auto-sacrificio. 2 – DISCORDO NA REJEIÇÃO DAS QLIPHOT NA ECÓNOMIA DO UNIVERSO. Quantos artistas não irromperam nos nossos tempos representando exemplarmente esta fórmula? É o meu conselho que o Adepto nunca se deixe atemorizar por ameaças ou fábulas de terror ficando calado quando as ouve, mas que ponha contra estas a sua espada e confie na sua luz interior defendendo a Coragem, a Audácia, o Silencio e a Sabedoria. Qliphot são as cascas que limitam a nossa percepção. Elas são as portas que o Mago irá abrir quando aceita definitivamente o desafio da iniciação. 3 – DISCORDO DA IDEIA DE QUE CRUZAR O ABISMO É A TAREFA DE UM GRAU. Na minha opinião começamos a cruzar o abismo desde que no momento da nossa primeira iniciação somos arrancados do casulo sensorial dos nossos sentidos básicos e temos percepção de que Consciência e Matéria são energia. A solução de um paradoxo fundamental inicia-se desde esse momento que se pode manifestar das mais diferentes maneiras, e coloca a nossa estrutura psicológica num desequilíbrio que só recu-

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Apogeus Espirituais (...) a consciência do homem permanece presa aos mapas de realidade estéreis do senso comum, que vampirizam todo o potencial energético e ocultam a sua divindade (…)

perará equilíbrio na fusão, no desimpedimento dos canais que bloqueiam a absorção de energia por parte de Nuit, o vazio/nada no coração do nosso Eu. Aqui estamos perante mais uma ameaça para afastar profanos que envolve um segredo universal de falsidade. Eu não compactuo com esta postura, desprezo-a, acho-a ignorante e mesquinha. Ross Hodinott

Mais uma vez expulso os demónios dos degraus, e das metas lineares, limitadas e convido o Oceano da continuidade cíclica e o todo-englobante, tocando as Estrelas no Céu em Cima e em Baixo, de forma que para quem navega nele não existe cima nem baixo, o abismo é simplesmente pensar que a mente é como uma terra plana com o Céu em cima, e terra em baixo. Não o céu envolve tudo e é tudo, o centro está em todo o lado, somos nós que estamos fechados a ele, que não acreditamos nele. “Não há que ter medo, o mundo é nosso, vamos com ele brincar” – Adolfo Luxúria Canibal. “Juro interpretar todo o fenómeno como uma comunicação de Deus comigo” – Ordálio do Mestre do Templo.

José Silva

(...) Ao contrário da morte que os escravos experimentam ao se deixarem arrastar pela melancolia e pelo pessimismo apocalíptico, o mago experimenta a dissolução como uma experiência purificadora e vitalizante para continuar o seu caminho eterno. A fusão não é um fim, mas um princípio. (…)

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Coliseu dos Assinantes Madrigal das Torres Altas

(...) Terra, ar, lume e nascente,(...)

http://0lvxk.deviantart.com

(...) Vinda dos olhos negros do espaço chuva de prata caiu todos estes longos meses (...)

Ombres Esparses, Iana Reis o clamor preso na garganta terra ar lume e nascente do amor que não pode ser dito terra ar lume e nascente a ti eu canto príncipe da Torre da Aquitânia terra ar lume e nascente do cimo da minha Torre de Babilónia que construí de minhas mãos que os assassinos do mestre querem destruir livre, conduzo teus passos até ao sonho do cimo da torre olho mas não vens nada em meu redor anuncia a tua presença as nuvens de pó no caminho que desprenderiam os teus passos não se erguem no horizonte; e o panorama é triste e solitário de contemplar de mãos frias recolho a corda de cobre do cimo da torre do rio de águas ardentes terra ar lume e nascente lanço a corda que não tem fim a corda é longa e chega até à terra e cai pesadamente luz brilhando sol queima no cobre e de minhas mãos pequenas solta-se a corda para que subas sem ter de subir todos os degraus de espiral da torre a corda desliza entre minhas mãos o metal é frio mas aquece ao toque este cobre transcalente que entrelacei vezes sem conta tecido com ouro entrelaçado noites a fio para que subisses debaixo dos salgueiros perto do rio

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Coliseu dos Assinantes Madrigal das Torres Altas

longamente esperei a tua vinda mas, agora que sei que existes sinto-me viver na tua voz ergo a cabeça para olhar o horizonte sinto-te mas não vens; em vão escuto passos ao longe os teus passos firmes no chão de terra batida mas vens, sei que vens através dos campos desolados através dos rios e dos montes lá aonde estás acordado ou dormindo sei que caminhas até mim e no cimo da torre estou, lançando a corda para que subas pois as tuas mãos libertam meus pés das correntes, e dão-lhes asas para que corra e corte através dos altos céus; e na Torre de Babilónia vivo, torre que construí para que ao longe me visses, que para mim corras pois a tua vinda estilhaça a dor de meu coração. todo o dia já passou, e anoitece agora no firmamento o sol desceu, e não é mais que uma orbe rubra descendo lentamente no crepúsculo de nuvens róseas a ocidente. à minha frente: Norte, as paragens remotas e frias, os gelos eternos à rectaguarda: Sul, os desertos, os mares quentes, os recifes de coral à minha mão direita: Oriente, o Pacífico, o vasto oceano sem fim à minha mão direita: Ocidente, e os traidores. lentamente cai a noite, e os céus constelam-se de estrelas que me tombam em miríades de luz na testa coroa-me Antares de seu relampejo rubro flamígero em meu coração Al-Kaid e em meu ventre os Gémeos e pergunto-me amor longínquo se estás em terra ou no mar em terra percorrendo as estepes sem fim numa montada de cascos que despedem chamas a cada passo e a terra treme conforme galopas no mar Argonauta no mar convivendo com a Grande Mãe Leviathan reflectindo teu rosto nos espelhos das suas mil e uma escamas ou virás pelo ar? que anjo te emprestou as asas? Seraphim ou Lucifer? a corda de cobre com o cair da noite tornou-se fria ao toque

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Coliseu dos Assinantes Madrigal das Torres Altas

e lentamente a desenrolo esta corda que não tem fim como que sentada à beira de um abismo insondável lançando sem esperança uma corda infindável terra que arde vermelha para depois queimada negra a neve cair branca ar parado para que o vento o mova e leve até ti a minha voz lume que se ergue queimando os templos ímpios na noite ó templos em chamas ardam e guiem meu amor até mim nascente guardada nascente secreta que até ela só eu sei o caminho nascente das águas puras que lavam todo o mal nascente de meu segredo que morrerei sem contar a ninguém onde fica a não ser que venhas nascente da Babilónia da qual ninguém ousa sequer falar e sobre mim no firmamento compasso contra meu peito se disser o que brilha sobre mim e sobre mim nos altos céus nocturnos o pulsar infinito do universo mas, martelo em minha testa se disser o que brilha sobre mim oh, meu coração sem dono, voa e alcança as alturas do céu empyreo e, régua na minha garganta se disser o que brilha sobre mim terra ar lume e nascente terra ar lume e nascente terra ar lume e nascente terra ar lume e nascente terra ar lume e nascente a noite é escura e densa e tem mil olhos de aves de rapina mas pareceu não esfriar; ao longe a Oriente vejo as trevas a dissipar e o sol a raiar mas não nasceu ainda; Aurora, dos dedos róseos lentamente ergue-se no horizonte a estrela do dia, a portadora da primeira luz antes do sol ainda consigo perscrutar algo à distância... vejo as luzes rubras da aurora vejo Vénus o sol ainda está para nascer... o sol que se esconde atrás destas nuvens pesadas de chumbo que largam o longo choro do céu sobre a terra inundando os campos, terra abaixo

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Coliseu dos Assinantes Madrigal das Torres Altas

dolorosa como lágrimas de morte vinda dos olhos negros do espaço chuva de prata caiu todos estes longos meses sempre forte

e de repente de súbito o violento o palpitante tropel da tua vinda ao longe uma pequena nuvem de pó no fundo do horizonte mais distante mas reconheço-te enfim te ouço! enfim te vejo! e as chamas que os cascos de tua montada lançam ao pisar a terra de tão veloz e agora sei que subirás pela corda até mim, Torre de Babilónia acima e nesse saber resplandeço em milagre já falta pouco - aguardo em silêncio que te aproximes para te receber em meus braços abertos adentro da voragem do labirinto do amor flamejante onde me quero perder para sempre. ao longe, sobre ti, natureza viva, pulsante tapeçaria sempre inacabada onde, incessantemente se desenham e apagam todas as formas lentamente, nasce o sol. tudo se passa na escuridão e será que houve, para além de ti e de mim,

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Coliseu dos Assinantes Madrigal das Torres Altas

alguma vez, alguma coisa, nalgum lugar, nalgum tempo?...

hyaena fierling reich / ana cordeiro reis

http://soundcloud.com/hxfxr http://vimeo.com/user1054334/videos http://lvcenti14bis.wordpress.com/ http://www.myspace.com/hyaenaxreich http://acr1977.carbonmade.com/

http://0lvxk.deviantart.com Motion Study, Iana Reis

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Coliseu dos Assinantes Encontrei Um Espaço Encontrei um espaço, e esse espaço é do tamanho das árvores, é do tamanho das folhas, de papel, das formas do teu corpo e do canto de um pássaro. Encontrei um espaço, que é espuma na minha boca, que são nozes sobre os meus dedos, e frutos entre os cabelos. Encontrei um espaço, que ocupa o meu rosto, que faz desenhos nas nuvens e que desce a pico sobre as ondas da terra molhada. Encontrei um espaço... que escorre por entre as mãos, num silencio demasiado branco, que me diz em meias palavras que esse espaço sou eu. Ana Patrícia Dias

Trans Missões Língua e Ave Com uma precisão cirúrgica ela decepa a sua língua e prega-a à mesa de cozinha onde a deixa passar a noite. Na manhã que se segue arrasta-se ao pequeno-almoço para descobrir que a sua língua houvera sido substituída por uma ave enfurecida. Um Corvo. Ela removeu o prego da cauda do animal que perante o acto escapou voando, deixando-a sem palavras. Tradução de André Consciência

Tongue and Bird With surgical precision she cut out her tongue and nailed it to the kitchen table where she left it overnight. The following morning she came to break fast only to find her tongue had been replaced by an angry bird. A Raven. She removed the nail from the birds tail and there upon it flew away leaving her speechless. All words © C.J. Duffy

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Trans Missões A Dança do Divino Dançámos como se em rodas transparentes Segurei-a perto de mim, Senti as suas mãos na minha coluna E os seus dedos vagueavam livremente. Nós sorrimos e rimos e mais rimos E derramado como a ponta da espiral O luar lançou-nos a prata suave E a luz das estrelas gotejou. Aí, prometemos um amor duradouro Pata sempre durando, A nossa paixão erguida a cruéis sombras, Vultos dançantes no chão. Dei-lhe a mão e dobrei o meu joelho E pedi-a em casamento Que comigo corresse em palavras sussurradas Para sempre a meu lado. Sorriu um sorriso de estonteante brancura Que envergonhou as estrelas Mas afirmou que apesar de só a mim me amar Não suportava o meu nome. E enquanto a luz estelar se vinha vindo a apagar E o Sol branqueava o céu Vi o meu amor em mortal carne Revelado ao meu olho da manhã. Dez anos passados comigo ido Agora de ossos secos, todos, Que aquele solene inverno me foi roubar Todo o sopro e assim morri. Gritei e escapei àquele rosto fantasmagórico Quão rápido pude E não mais retornarei para ver O sombreado que do Sol foi esconder. Tradução de André Consciência

Do You Remember? Albano Ruela The Dance of the Divine we danced as though on gossamer heels i held her close to me, i felt her hands upon my spine her fingers wandered free. we smiled and laughed and laughed some more and spun like whirling tops, the moonlight cast us silver soft and the starlight fell in drops. we promised then a love to last to last forever more, our passion rose in stark shades, shadows danced on the floor. i took her hand and bent my knee and asked her as my bride to run with me with whispered words forever by my side. she smiled a smile of dazzling white that set the stars to shame but said although she loved but me she could not bear my name. and as the starlight faded fast and the sun bleached the sky i saw my love in mortal flesh revealed to my morning eye. 'ten years past have i been gone now with my bones all dried, that solemn winter stole from me all breath and so i died'. i screamed and ran from that ghostly face as fast as i could run and no more will i return to view the glade hidden from the sun. All words © C.J. Duffy

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Trans Missões Sem Titulo e eu pagaria por destruição como algumas crianças rezam pela morte dos seus pais, pelo silêncio e pela crosta do joelho de cair com um enorme estrondo que agitaria a pequena cidade livre da cevada para processar a gordura e agitar a fecundidade, para onde a gravidade esfolaria as pernas afastadas e os pássaros se ririam de contentamento. Tradução de Marta Amado and i would pay for destruction like some children pray for the death of their parents, for the silence and the scab of the knee to fall with a giant thud that would shake the little town free of the barley to render the fat and churn the fecundity, to where gravity would flay the limbs apart and birds would giggle in glee.

Original de Serena Smith

Imagem de Serena Smith

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Arautos Sonoros And Also the Trees ao vivo em Leiria, 05-03-2010 Nem o mau tempo esmoreceu a vontade de sair de Lisboa para passar o fim-de-semana numa cidade que há algum tempo queria conhecer e de ver ao vivo mais uma das minhas bandas fetiche. Não vos vou mentir, a experiência com os Fields fez-me perder alguma da fé e baixou-me um pouco as expectativas. No entanto, e apesar da entrada atribulada em Leiria, pouco tempo depois dei comigo preparado para assistir ao melhor concerto de sempre. Foi com esta expectativa que entrei no Teatro José Lúcio da Silva. Enquanto resmungava com o preço do vinil 10’, olhava as serigrafias no átrio e esperava pela abertura de portas, a expectativa ia crescendo. Grande parte do público que alí se reuniu já o conhecia de vista doutros concertos em Lisboa e no Porto, fiquei assim agradado com a adesão, afinal o Fade In já tem um peso considerável no panorama musical português apesar da falta de divulgação fora de Leiria - não vi um único cartaz em Lisboa e segundo me consta no Porto também não os havia - resta portanto agradecer às comunidades virtuais a compensação. Mas este texto é sobre o concerto, sobre a banda, sobre o modo como me deixaram rendido e me deram o 4º melhor concerto da minha vida de expectador. Só depois da entrada em palco de quatro elementos e dos primeiros acordes de Domed é que Simon entra com o seu ar de decadência vitoriana, no momento exacto de começar a cantar In Another Land, I tried to find somebody… e conquistar logo ali um publico que queria ser arrebatado. Os AATT apresentaram-nos alternadamente trabalhos de Vírus Meadows e o do mais recente The Rag and Bone Man, surpreendendo Portugal com um concerto eléctrico em vez de um expectável concerto acústico. É difícil destacar pontos altos porque todos o foram – desde o engano de Justin à presença e simplicidade com que o expressivo Simon se afastava em direcção ao fundo escuro do palco sempre que era altura dos outros membros brilharem – o que posso dizer é que ao vivo eles tocam o mesmo que se ouve nos discos, não há por ali artifícios e nestes casos será difícil destacar músicas pelo meio do set, mas a nível pessoal saliento Slow Pulse Boy, The Beautifull Silence, He walked through the dew, Maps in her Rists and Arms e um surpreendente segundo encore com a Vírus Meadow solitária, a dizer adeus. Espero sinceramente que a banda se tenha divertido tanto quanto o publico. A after party foi no Beat Club com a presença da banda (e estiveram por lá bem mais que cinco minutos), a musica esteve excelente e contou ainda com a projecção de um dos cremasters do artista plástico Matthew Barney e o Fausto de Murnau. Um ambiente bem simpático. Fica a lista de músicas e as fotos, desta vez são da Isabel: Setlist: Domed (The rag and bone man), The beautifull Silence (The rag and bone man), Gone… like Swallows (virus meadows), Maps in her Rists and arms (virus meadows), Under the Stars (The rag and bone man), A room lives in Lucy (retrospective??), He walked through the dew (Further from the Truth), Mucklow (The rag and bone man), Slow pulse boy (virus meadows), Belief in the rose (Farewell to the shade), Mermen of the lea (Green is the sea), Shaletown (Milpond years), Dialogue (Klaxon), Rive droite (The rag and bone man) 1º Encore Prince Rupert (Farewell to the shade) Vincent Craine (virus meadows) Feeling Fine (Further from the Truth) Untangled Man (Further from the Truth) 2º Encore Virus Meadow (virus meadows)

Reportagem por: http://portico2.blogspot.com/ Ebola Fotos: Film-m-k

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Arautos Sonoros And Also the Trees ao vivo em Leiria, 05-03-2010

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