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A pandemia e a economia
Os infetados, os afetados, os números estimados, os apoios anunciados, as variáveis desconhecidas, as oportunidades à espreita, a aprendizagem e a responsabilidade social em curso, as mudanças, os novos modelos de trabalho, de consumo e de lazer. O que esperar? Como nos iremos reinventar? O impacto do coronavírus na economia estará em constante atualização… Indústria e turismo são alguns dos setores mais vulneráveis aos efeitos da pandemia Covid-19, em Portugal, em Espanha e no mundo. Alguns dos “sintomas” já se manifestam, outros adivinham-se… Governos e Comissão Europeia vão disponibilizando “remédios” para atenuar efeitos diretos e colaterais. A cura da pandemia e da economia está em fase de testes. As pessoas e as empresas são, por estes dias, tubos de ensaio…
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Nem os seres humanos, nem a economia estavam vacinados contra o coronavírus. Por enquanto, a única certeza quantitativa é a de que o número de afetados pela pandemia será muito superior ao número de infetados com Covid-19. Como disse o presidente francês, Emmanuel Macron, estamos “em guerra contra um inimigo invisível”. O presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa, no dia em que decretou o estado de emergência (18 de março), insistiu que “é de uma guerra que se trata”, para justificar “uma decisão excecional num tempo excecional”. Desconhecemos quando poderemos encerrar as contas das baixas resultantes desta “guerra”, cujos números se alteram diariamente, porque como sublinhou o Presidente da República de Portugal, a pandemia Covid-19 é diferente de tudo o que já vivemos: “Está a ser e vai ser mais intensa. Vai durar mais tempo até desaparecerem os seus últimos efeitos. Está a ser e vai ser um teste nunca vivido ao nosso Serviço Nacional de Saúde e à sociedade portuguesa, chamada a uma contenção e a um tratamento em família sem precedente. Está a ser e vai ser um desafio enorme para a nossa maneira de viver e para a nossa economia. Basta pensar na saúde, na educação, no comportamento nas famílias, no trabalho, nos efeitos no turismo, nas exportações, no investimento, na fragilização de famílias e empresas, nomeadamente de pequena e média dimensão.” Um dia antes, o presidente de Governo de Espanha, Pedro Sánchez, anunciava um “plano de choque económico” no valor de 200 mil milhões de euros e chamou-lhe “o maior de sempre em Espanha”. Isto, numa altura em que Espanha já era o quarto país em número de infetados com Covid-19, atrás do Irão, da China e da Itália. Pedro Sánchez apelava ao contributo de todos: “O Estado assume a sua posição, mas também os empresários, os trabalhadores, os arrendatários, os senhorios, todos podemos pôr-nos na pele dos outros para travarmos o impacto e abrir uma cadeia de solidariedade que nos fará recuperar o mais cedo possível e com o maior brio possível o vigor económico que tínhamos até ter aparecido este coronavírus”.
A Portugal, o coronavírus chegou mais tarde (o primeiro teste positivo foi conhecido a 2 de março) “e, também por isso, pode demorar mais tempo a atingir os picos da sua expressão”, observou Marcelo Rebelo de Sousa.
À doença e, no pior dos cenários, à morte, juntam-se outras consequências provocadas pela paralisação parcial da economia, sobretudo nos setores da indústria e do turismo.
O presidente do Eurogrupo Mário Centeno deixou claro que o surto de Covid-19 está a ter um impacto na economia semelhante ao que teríamos em “tempos de guerra”. A chamada gripe espanhola, a pandemia causada pelo vírus influenza que se espalhou por quase todo o mundo, entre 1918 e 1920, contaminado mais de 500 milhões de pessoas (ou quase 27% da população
As previsões e a análise da Cosec
Líder em Portugal nos ramos do seguro de créditos e caução, a seguradora Cosec calcula que “a Covid-19 pode custar 280 mil milhões de euros por trimestre ao comércio internacional”, ou seja “em oportunidades de exportação, sendo a maior barreira às trocas de bens e serviços entre países durante 2020”. Os estudos da Companhia de Seguro de Créditos portuguesa e da sua acionista Euler Hermes, efetuados até 9 de março, traduzem “um abrandamento significativo da procura por parte da China e da Europa” e apontam para um regresso à normalidade até o final de maio. De acordo com a última análise da Euler Hermes, líder mundial em seguro de créditos, “em apenas um trimestre, o Covid-19 já teve tanto impacto no comércio internacional como um ano inteiro de guerra comercial entre os Estados Unidos e a China”. Até à referida data, “as medidas de contenção tomadas pelos países para impedir a disseminação do vírus tiveram um impacto equivalente a um aumento de 0,7 pontos percentuais nas tarifas, que, no final do primeiro trimestre de 2020, deverão situar-se, em termos médios, nos 6,5%”. Em comunicado, a Cosec especifica que “os números apontam também para uma recessão comercial em termos de volume, tanto no primeiro trimestre (-2,5% face ao trimestre anterior), como no segundo (-1%)”. Em termos globais, no setor dos serviços, “a Euler Hermes prevê uma redução significativa de turistas da China, Itália e, de um modo geral, do continente europeu, a que vai somar-se um abrandamento significativo nos serviços de transporte. Nestes setores, as perdas em termos de oportunidades de exportação serão, respetivamente,
e por trimestre, de 110 mil milhões de euros e 29 mil milhões de euros.” A China começou por ser o país mais afetado, “com perdas, para este período, de 168 mil milhões de euros, seguido da Itália, com 19 mil milhões de euros”. Para os restantes países da Europa, a previsão é de que o impacto nas oportunidades de exportação seja na ordem dos 95 mil milhões de euros.
Na China A Euler Hermes estima que a Covid-19 terá um impacto de um ponto percentual (1 p.p.) no crescimento do Produto Interno Bruto da China, sobretudo no primeiro trimestre do ano, porém é possível que este valor suba, ressalvam os analistas. De acordo com o estudo “Coronavirus outbreak in China: Risks of supply chain disruption increase with time” (Surto do coronavírus na China: Riscos de interrupção na cadeia de fornecimento aumentam com o tempo), “o mais provável é que o país consiga recuperar, e no espaço de um a dois trimestres, mas ajudado por políticas de apoio à produção”. Sabe-se já que “um mês após a implementação das medidas de contenção do vírus Covid-19, a economia da China está
a operar a 75% da sua capacidade, evidenciando um ponto de viragem que deverá traduzir-se num retorno gradual aos valores normais de produção até ao final de abril, estima a Euler Hermes. Os analistas da líder mundial em seguro de créditos sublinham que “o balanço final do surto vai depender da sua gravidade e duração”. Certo é que “a procura e a oferta estão sob pressão”. O estudo frisa ainda que “a epidemia e o 'fator medo' associado ao Covid-19 vão pesar nos gastos dos consumidores”, sustentando que “um abrandamento do consumo interno é hoje muito mais relevante do que na anterior grande epidemia deste tipo, o SARS (Síndrome Respiratório Agudo Severo): a economia chinesa é agora mais dependente do seu mercado interno (50% do crescimento do PIB em 2019 versus 28% em 2003). O surto de 2003 teve um impacto de -2 p.p. entre o primeiro e o segundo trimestre desse ano no PIB do país (+9.1% no segundo trimestre, face a +11.1% no primeiro trimestre).” A seguradora alerta para “uma pausa prolongada na atividade industrial chinesa pode afetar muito significativamente algumas cadeias de
fornecimento, como as de produtos químicos, equipamentos de transporte, têxteis e equipamentos eletrónicos”. De assinalar que “a província de Hubei (o epicentro deste surto) representa 9% da produção total de veículos automóveis na China”, pelo que “o elevado grau de ligação entre esta indústria e os restantes setores da economia leva a que o impacto da epidemia se estenda à maioria das atividades industriais”. Acresce também o elevado peso de setores como o têxtil e o de computadores e eletrónica na economia mundial, “dado que o valor gerado pela China para esses setores representa 19% e 17% da produção global, respetivamente”. A seguradora nota que “considerando o nível relativamente baixo de stocks no setor eletrónico, é possível que se verifique uma situação de escassez”.
Na Europa Na semana em que foram anunciadas a maioria das medidas de contenção, na Europa, perspetivava-se que essas políticas poderão custar entre 0,7 pp a -3,0 pp ao crescimento do PIB, dependendo do país e da severidade dos bloqueios. “Ao lado das medidas destinadas a conter o contágio e a aumentar a resiliência dos sistemas nacionais de saúde, medidas de política fiscal e monetária, da Itália ao Reino Unido e Alemanha e ao BCE, foram ou serão anunciadas num esforço para amortecer a forte contração económica que está prevista para o primeiro semestre de 2020”, analisa a Euler Hermes. Apesar disso, “é importante enfatizar que essas medidas fornecerão apenas um fundo de maneio para apoiar e mitigar os efeitos negativos, tentando impedir uma completa crise financeira e / ou um forte aumento de insolvências e desemprego”.
Foto Sandra Marina Guerreiro
Presidente da República: "Está a ser e vai ser um desafio enorme para a nossa maneira de viver e para a nossa economia. Basta pensar na saúde, na educação, no comportamento nas famílias, no trabalho, nos efeitos no turismo, nas exportações, no investimento, na fragilização de famílias e empresas, nomeadamente de pequena e média dimensão.”
mundial na época) terá causado cerca de 50 milhões de vítimas mortais. A partir de modelos epidemiológicos, os cientistas estimam que esta pandemia teria efeitos semelhantes, se não estivéssemos a adotar as medidas sanitárias drásticas que estão em curso. Estes modelos, citados pela chanceler Angela Merkel, indicam que a adoção destas medidas permitem reduzir as taxas de infeção para níveis inferiores a 0,1-0,15% ao longo de um ano, em vez dos 70% previstos, na falta delas. Wuhan, uma das cidades mais povoadas da China, com cerca de dez milhões de habitantes, prova isso mesmo. “Está demonstrado que o vírus pode ser contido. Ele tem de ser contido”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres (foto na pág. 37), numa conferência de imprensa (19 de março), em que apelou à coordenação global de todos governos para responder à emergência sanitária e à iminente crise económica mundial. O atual líder da ONU frisou a necessidade de os países mais ricos ajudarem os mais pobres. Travar a progressão da pandemia também trava a economia, porém, não o fazer seria ainda mais catastrófico, como se conclui pela evidência de que as pessoas são o principal ativo económico, sem o qual a engrenagem bloqueia. Porém ninguém conhece o limite a que a paralisação poderá chegar, sem se tornar fatal…
A atual paralisação parcial da economia poderá conduzir a perdas semelhantes ou superiores às da crise de 2008/2009. No caso da China, que no momento em que escrevemos
Turismo: travar a fundo, em alta velocidade
O turismo, que conhecia em quase todo o mundo um crescimento assinalável, é um dos setores mais afetados pela epidemia causada pelo coronavírus, vulnerabilizando sobretudo as economias que nos últimos anos fizeram desta atividade um dos seus principais trampolins económicos, como é o caso de Portugal. Também em Espanha, o setor de turismo tem um peso fulcral na economia, contribuindo para cerca de 12% do PIB do país. Para Portugal, o turismo valeu 8,2% do PIB português em 2018 e respondeu por 51,5% das exportações de serviços e por 18,6% das exportações totais. As receitas do setor cresceram 9,6% em 2018, atingindo os 16,6 mil milhões de euros, no entanto sabemos já que o valor acumulado das receitas até novembro de 2019 já superava os valores do ano anterior, chegando aos 17,1 mil milhões de euros. O ano de 2020 contará uma história diferente, em todo o mundo. De acordo com os dados da Organização Mundial de Turismo, o número de turistas no setor deverá diminuir entre 1% e 3%, mas poderá ser mais. O Conselho Mundial de Viagens e Turismo lembra que, em 2018,
o turismo representou cerca de 319 milhões de empregos, pelo que é previsível ser este um dos setores que mais reduzirá a sua oferta de trabalho. Os cancelamentos de voos e hotéis já causaram instabilidade no emprego para milhares de trabalhadores. Os efeitos da Covid-19 também são esperados para o verão, já que se estima que o número de reservas diminua, mesmo que se resolva a situação pandémica. As primeiras projeções apontam perdas diárias na ordem dos cinco milhões de euros para a hotelaria, em Lisboa e no Algarve, até ao fim deste ano, de acordo com um estudo da Neoturis, consultora especializada em turismo. Várias companhias aéreas viram-se forçadas a cancelar uma parte significativa das suas rotas
e até reduziram o preço dos bilhetes, nalguns casos em 50%. Espanha e Portugal suspenderam mesmo o tráfego aéreo entre os dois países durante o estado de emergência. As conexões fluviais e o tráfego ferroviário, com exceção do transporte de mercadorias, também foram cancelados e foram impostas limitações às comunicações rodoviárias. Com o abrandamento do turismo, reduz-se também a atividade dos negócios de restauração e de serviços de lazer, onde houve um crescimento e um investimento muito relevante nos últimos anos. É a esses pequenos negócios que se destinam uma boa parte das linhas de crédito anunciadas pelo Governo (texto principal).
anuncia zero casos de contágio comunitário em Wuhan (o que permite avançar projeções mais próximas da realidade), a pandemia e a paralisação económica deverão traduzir-se num recuo do crescimento do PIB (ver caixa sobre previsões da Cosec). A nível global, há vários cenários possíveis, dependendo da duração da pandemia e do estrangulamento da economia. As bolsas de todo o mundo acusaram imediatamente a instabilidade e as previsões de uma futura crise económica. Outro indicador em queda é o do preço do petróleo: no passado dia 20 de março, o preço do petróleo nos Estados Unidos atingiu a sua maior queda semanal desde a Guerra do Golfo de 1991, recuando 10,7%. O abrandamento da procura provocado pela pandemia fez o valor desta matéria-prima descer durante quatro semanas consecutivas. O valor de referência nos EUA, do petróleo WTI , teve perdas de 29% na semana que terminou a 20 de março, e o Brent recuou 20%. Desemprego
A Organização Mundial do Trabalho (OIT ) prevê que a pandemia leve ao desemprego 25 milhões de trabalhadores, em todo o mundo (números de 18 de março de 2020). A OIT calcula ainda que os impactos da pandemia Covid-19 poderão causar perdas de rendimento de até 3,4 triliões de dólares
até ao final do ano. A estimativa avança com um intervalo de desemprego mundial entre os 5,3 milhões e os 24,7 milhões de pessoas. Números a que teremos que somar os 188 milhões que a OIT tinha estimado no final de 2019, na sua previsão anual. A OIT sustenta a que é necessária "uma resposta política coordenada internacionalmente" com estímulos fiscais e apoio a empregos e salários, de modo a proteger os trabalhadores. A organização teme perdas de rendimento e de postos de trabalho semelhantes às que aconteceram durante a última crise financeira global. Prevê-se igualmente o crescimento do subemprego e do autoemprego, ainda a OIT que reconheça que estes dois indicadores estarão condicionados pelas restrições à circulação de pessoas e bens.
A pandemia terá, inevitavelmente, um efeito a curto prazo na oferta de trabalho, mas teve um efeito imediato na forma de trabalhar, com milhões de empresas a optarem pelo teletrabalho e pelas videoconferências. Até que ponto iremos mudar ou flexibilizar a forma como trabalharemos, é mais uma das incógnitas, mas talvez esta seja uma oportunidade para muitas empresas testarem novos modelos de trabalho.
A coordenação local e global também poderá sair reforçada. Exemplo disso é o facto de empresas e particulares se mobilizarem para o fabrico de máscaras e viseiras de proteção, bem como de ventiladores. Desde a empresa portuguesa FAN3D que começou a produzir viseiras para o Hospital de Setúbal e depois alargou a outros hospitais, à Catalunha que está agora a fabricar respiradores com impressoras 3D, na sequência da descoberta de um protótipo, já validado por médicos, ou ao cientista português, João Nascimento, que iniciou o projeto Open Air para encontrar alternativas de ventiladores através de um desafio que iniciou no Twitter. A comunidade científica apontou baterias para o desenvolvimento de uma vacina e de um anti-vírus para prevenir e combater a doença, respetivamente. “A Comissão disponibilizou hoje um apoio financeiro de até 80 milhões de euros à CureVac, uma empresa inovadora de Tübingen, na Alemanha, para amplificar o desenvolvimento e produção de uma vacina contra o novo coronavírus na Europa”, revelou o executivo comunitário em comunicado. A presidente da instituição, Ursula von der Leyen, comentou que “nesta crise de saúde pública, é de extrema importância apoiarmos os nossos principais investigadores e empresas de tecnologia”, pelo que “estamos determinados a fornecer à CureVac o financiamento necessário para aumentar rapidamente o desenvol“Está demonstrado que o vírus pode ser contido. Ele tem de ser contido”, disse o secretário-geral das ONU, António Guterres, apelando à coordenação global de todos governos para responder à emergência sanitária e à iminente crise económica mundial.
vimento e a produção de uma vacina contra o novo coronavírus”. A China também diz estar já na fase adiantada da criação de um vacina contra o coronavírus, que poderá chegar dentro de um ano. Identificada pela primeira vez em Wuhan, capital da província de Hubei, na China, a 1 de dezembro de 2019, a Covid-19, uma doença respiratória aguda causada pelo coronavírus da síndrome respiratória aguda grave 2 (SARS-CoV-2), foi declarada pandemia pela Organização Mundial da Saúde no passado dia 11 de março. Nessa data, já a China tinha atingido o pico do surto e a Europa estava a transformar-se no principal epicentro de casos. A partir daí, Governos de todos os países com casos de infetados (acima de 170 países) anunciavam medidas de ajuda aos diversos setores da economia afetados. Medidas que estão em constante atualização, no entanto, as contas já feitas apontam para apoios acima dos cinco biliões de euros, concedidos por governos e diversas instituições como a União Europeia ou os bancos centrais.
Em Portugal…
O Governo português, que antecipa um impacto de dois mil milhões de euros por mês em medidas de apoio à família e ao trabalho, começou por encerrar escolas e responder por 66% do salário dos pais que não possam trabalhar por terem que ficar com
Consumo em tempo de quarentena
O estado de emergência declarado pelo Presidente da República e executado pelo Governo, manteve abertos supermercados, farmácias, óticas, postos de abastecimento de combustível. Se no início, o pânico levou ao esgotamento de produtos como papel higiénico, massas ou laticínios na maioria dos supermercados, o Governo deixou claro, por diversas vezes, que a cadeia de abastecimento não está em risco e que não faltarão produtos alimentares e de primeira necessidade. A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) refere que houve um ligeiro aumento na procura por produtos em supermercados e hipermercados associados à Covid-19. O estudo “Brands + Consumers”, realizado pela Kantar Media para a Centromarca, afirma que os portugueses mudaram o seu comportamento de consumo com a chegada da Covid-19. Numa primeira fase, quando os primeiros casos do vírus começaram a aparecer em todo o mundo, o consumo em Portugal aumentou 8%. Posteriormente, na segunda fase, quando os casos começaram a aumentar e houve um alerta, o consumo cresceu 13%. Nessa situação, o número de vezes que se vai ao supermercado diminui, mas, no entanto, a quantidade de dinheiro gasta em compras é maior. Entre os produtos de maior destaque estão alimentos e bebidas (10%), papel higiénico (8%), produtos domésticos e produtos de limpeza (7%) e, finalmente, produtos de higiene e perfumaria (3%). Não há números exatos, mas estima-se que o comércio online também cresça enquanto durar a quarentena. A plataforma de vendas online Amazon, por exemplo, con
firmou que a procura aumentou consideravelmente e anunciou a contratação de 100 mil funcionários para armazéns e entrega de produtos nos Estados Unidos. "Constatamos um aumento significativo na procura, o que significa que as nossas necessidades de trabalho são sem precedentes para esta época do ano", publicou a Amazon no blogue oficial da empresa. O grupo revelou que vai investir 350 milhões de dólares para aumentar os pagamentos a estes funcionários nos EUA, Canadá, Reino Unido e União Europeia. Por outro lado, a Amazon retirou mais de um milhão de produtos da plataforma, devido a manipulação de preços ou publicidade enganosa sobre o coronavírus. Os centros comerciais e os grandes armazéns estão parcialmente encerrados, mantendo apenas em funcionamento as lojas relativas aos segmentos já referidos. António Sampaio de Mattos, presidente da APCC- Associação Portuguesa de Centros Comerciais, frisa que a prioridade da associação e dos seus associados tem sido garantir a segurança de visitantes, lojistas, colaboradores e fornecedores, a par da dos ativos: “Estabelecemos, desde a primeira hora, um canal de comunicação direto e permanente com a Direção-Geral da Saúde, e os nossos associados implementaram todas as medidas decretadas pelas autoridades de saúde e governamentais. Os nossos associados têm estado a garantir as condições necessárias ao funcionamento dos serviços considerados essenciais pelo Governo
– nomeadamente hipermercados, farmácias, restauração de take- -away, papelarias, jornais e tabaco, eletrónica e produtos alimentares, entre outros – ao passo que asseguramos o cumprimento de todas as medidas de higiene e segurança recomendadas pelas autoridades. O El Corte Inglés, por exemplo “continua a trabalhar para manter o fornecimento sem interrupções nos seus supermercados”, e mantém “em funcionamento as áreas de informática, telecomunicações e alimentação para animais, além dos supermercados e dos espaços saúde”. Em todas as outras áreas, “os clientes podem continuar a efetuar compras, a qualquer hora e sem contacto físico, através da loja online ou fazer os seus pedidos através do telefone. O El Corte Inglés indica ainda que “continua a reforçar os seus serviços de entregas ao domicílio e de recolhas no parque como é o caso do Click & Car”. Neste contexto, as cadeias de supermercado estão, para já, entre as vencedoras neste período, sendo ainda impossível quantificar o impacto que poderá ter uma possível crise económica nesta fileira. O mesmo é válido para as empresas de energia e de e internet, já que também é previsível que o consumo de Internet e eletricidade
dispare devido à quarentena forçada, como já acontece em Espanha. A quarentena também causou um aumento no consumo de televisão. Além disso, aumentou o público em plataformas de streaming como a Netflix e a HBO. No que se refere a cultura e entretenimento, importa referir a rápida resposta que vários agentes culturais deram, revelando flexibilidade e capacidade de adaptação. A Internet revela-se o principal aliado, neste contexto, já que proporciona outras formas de consumir cultura: concertos e festivais de música através das redes sociais; visitas a coleções ou a exposições de museus também online; leitura de livros; teatro humorístico, etc. O desporto tal como trabalho também se mudou para o ambiente doméstico, crescendo a procura por aulas de várias modalidades em plataformas como o YouTube. Outro setor que alinha pelos vencedores é a imprensa, quer online, quer televisiva, já que o consumo de informações e notícias aumentou, sobretudo nos órgãos mais tradicionais, considerados de referência. De acordo com um estudo da Ymedia, nos últimos dias houve um aumento de 30% no número de utilizadores que acedem ao conteúdo da web de jornais. As versões digitais do El Mundo ou do La Vanguardia, por exemplo, aumentaram o número de utilizadores em 10%. Embora os jornais digitais tenham aumentado sua audiência, a televisão tem sido o meio mais utilizado para assistir às notícias, com o número de minutos dedicados a ver noticiários aumentou 58%.
os seus filhos. O executivo anunciou também cem milhões de euros para ajudar as pequenas e médias empresas (PME), valor que, pouco depois, duplicou. No dia 18 de março, os Ministros da Economia e das Finanças, Pedro Siza Vieira e Mário Centeno, respetivamente, avançaram com um pacote de medidas para fazer face à pandemia e ao seu impacto na economia que custará 9200 milhões de euros. Só 3.000 milhões de euros se destinam a quatro linhas de crédito para reforçar sobretudo (80%) a tesouraria da indústria e do turismo. O Governo avança também que este valor é para somar aos 200 milhões antes anunciados relativos à “linha de âmbito geral, que abrange todos os setores económicos, do comércio, da indústria e dos serviços”. De acordo com o Ministro da Economia, 1300 milhões vão para setores industriais (têxtil e vestuário, madeiras, calçado e indústria extrativa), dos quais 400 milhões serão para micro e pequenas empresas. As microempresas industriais poderão pedir empréstimos até 50 mil euros. Para as pequenas empresas têm um limite de 500 mil e as médias de 1,5 milhões. O turismo terá a sua disposição linhas de crédito no valor de 1100 milhões para o turismo, sendo desse valor 300 milhões de euros para micro empresas e PME. No segmento de agências de viagem, animação e eventos, as micro e pequenas empresas dispõem de 75 milhões e o limite de crédito é de 50 mil para cada uma, as médias- -pequenas têm 120,5 milhões, com um teto de meio milhão e as médias-grandes contam com 4,5 milhões, podendo pedir até 1,5 milhões por empresa. Nos restantes segmentos de turismo, as microempresas podem pedir até 50 mil euros, para as pequenas o valor máximo é de 500 mil e para as médias o teto é de 1,5 milhões. Limites iguais aos das empresas da restauração e similares, que terão uma linha de financiamento no valor de 600 milhões de euros.
Estes empréstimos, disponibilizados através dos bancos e a contrair por estes dias terão um período de carência de até 12 meses e deverão ser amortizados nos próximos quatro anos. Dos fundos da União Europeia, chegarão a Portugal para já 1,8 mil milhões de euros para fazer face às despesas imediatas de resposta à crise desencadeada pelo coronavírus no setor da saúde, bem como para apoiar o mercado laboral e as PME. A verba faz parte de um pacote de 37 mil milhões de euros provenientes de fundos estruturais e de investimento do orçamento comunitário, anunciado pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, a 17 de março, para ajudar os Estados membros. Esta “iniciativa para o investimento em resposta ao coronavírus” beneficia de “dinheiro que estava adormecido nos envelopes nacionais dos fundos estruturais e que pode agora ser imediatamente ativado para estes três setores que antes estavam vedados aos investimentos da política de coesão”, como explicou Ursula von der Leyen. A presidente da Comissão Europeia assinalou que “esta crise representa um desafio sem precedentes para os sistemas de saúde da UE e um choque brutal para a economia europeia”. Teme-se a hipótese de a União Europeia entrar em recessão técnica, com o crescimento de 2020 a bater no zero. “Podemos dizer que é muito provável que o crescimento na zona euro e na União Europeia Governo português anunciou pacote de medidas de 9200 milhões de euros para fazer face à pandemia e ao seu impacto na economia. 3000 milhões de euros destinam-se a quatro linhas de crédito para a indústria e turismo
como um todo caia para baixo de zero este ano, e potencialmente consideravelmente abaixo de zero”, vaticinou o responsável máximo da Direção-Geral de Assuntos Económicos e Financeiros da Comissão Europeia (DG ECFIN). Maarten Verwey lembrou que caem por terra as previsões anteriores à pandemia: “Aquilo a que estamos a assistir é a uma previsão de crescimento que está a deteriorar-se muito rapidamente. Em fevereiro, publicámos as nossas previsões de inverno, e nessa altura ainda pensávamos que a economia da UE cresceria 1,4% e a da zona euro 1,2%, mas o que é claro face a tudo o que está a acontecer é que será necessário adaptar essas previsões e provavelmente de forma muito
Marketing social em alta
O coronavírus é o tal “inimigo invisível” que colocou o mundo inteiro na mesma trincheira. As marcas têm assim uma oportunidade de se colocarem ao lado dos consumidores, de sublinharem o seu posicionamento e mostrarem como podem ser úteis neste enquadramento. Como sempre, a responsabilidade social deve começar dentro da organização, pelo que as empresas devem adotar e comunicar políticas responsáveis internamente, para com os seus funcionários. As marcas também devem comunicar informações úteis e contextualizadas com o momento em que vivemos, contribuindo para o bem comum, com o que têm ao seu dispor. Isto é válido mesmo quando pretendem comunicar os seus próprios produtos ou serviços. Há várias formas de o fazer e várias marcas o têm demonstrado, atendendo às principais necessidades do momento: máscaras, desinfetantes e ventiladores, entre outras ações. Grupos como o gigante de marcas de luxo LVMH (donos da Louis Vuitton, Dior, Givenchy, Celine, Guerlain, etc) ou a cervejeira portuguesa Super Bock Group (dona da Super Bock) estão a produzir gel desinfetante. Bernard Arnault, presidente do grupo francês, colocou a divisão de perfumes e cosmética da LVMH ao serviço da produção de “quantidades substanciais de álcool gel” para distribuir gratuitamente pelas autoridades de saúde francesas. Na mesma linha, “para apoiar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) no abastecimento de produtos essenciais, o Super Bock Group e a Destilaria Levira estabeleceram uma parceria, em que o álcool retirado na produção de Super Bock Free Sem Álcool será utilizado para a produção de gel desinfetante para mãos, que vai ser oferecido a várias unidades hospitalares”. Em comunicado, o Super Bock Group, sedeado em Matosinhos, informa que “para começo, são cerca de 56.000 litros de álcool da produção de cerveja sem álcool que vão ser transformados, pela Destilaria Levira, em aproximadamente 14.000 litros de álcool gel para as mãos, num processo de fabrico que segue as diretrizes da Organização Mundial de Saúde”. Esse álcool destina-se “a várias unidades hospitalares do norte de Portugal, para que disponham de uma maior quantidade destes produtos indispensáveis para a prevenção e tratamento da infeção com a Covid-19”. Outro exemplo vem da indústria têxtil, sendo várias as marcas que puse
ram as suas unidades de produção a fabricar máscaras de proteção. O grupo galego Inditex (dono de marcas como a Zara, entre outras), por exemplo, fabricou 300.000 máscaras para uso em Espanha. “A empresa colocou à disposição do Governo toda a sua capacidade logística, de aprovisionamento e de gestão comercial, sobretudo a partir das unidades industriais do grupo na China, para atender às necessidades de urgência, tanto de material sanitário como têxtil, que for necessário nesta altura”, lê-se num comunicado da empresa liderada por Amancio Ortega. Têm sido também várias as entidades e personalidades, de empresas, a clubes de futebol e a empresários, a comprarem ventiladores para reforçar a capacidade dos hospitais portugueses. A EDP - Energias de Portugal e a sua principal acionista, a China Three Gorges (CTG), “em coordenação com o Ministério da Saúde e com o apoio da Embaixada de Portugal em Pequim, adquiriram 50 ventiladores e 200 monitores médicos, bem como respetivos consumíveis e equipamentos de suporte associados, num total de cerca de quatro milhões de euros”, informou a energética de origem portuguesa. Estes equipamentos médicos terão chegado a Portugal no final do mês de março, altura em que foram entregues ao Ministério da Saúde. Com esta iniciativa, “a EDP e a CTG juntam-se ao esforço coletivo das equipas médicas no terreno na luta contra esta epidemia. Uma ação a que se juntam cerca de duas mil pessoas
significativa.”
Neste contexto, o Banco Central Europeu vai injetar 750 mil milhões de euros (o equivalente a quase quatro vezes o PIB português) na economia, através da compra de ativos (títulos de
que a EDP também tem no terreno, em centros de despacho e centros produtores para garantir que a energia chega a casa de todos os portugueses”. As editoras foram as primeiras a reagir, assim que o Governo decretou o encerramento das escolas. A Porto Editora e a Leya disponibilizaram gratuitamente as suas plataformas de aprendizagem online, respetivamente, a Escola Virtual e a Aula Virtual. Estas páginas de e- -learning estarão temporariamente abertas de forma gratuita. Essas mesmas editoras, bem como outras, decidiram suspender a publicação de novos títulos até que o mercado livreiro e editorial retome o seu dinamismo. Os títulos já publicados destas editoras podem ser adquiridos online, em formato físico e e-book”. Com o impedimento de agendar eventos, a comunicação nas redes sociais tem sido a forma privilegiada pelas marcas, de todos os setores e segmentos, para comunicarem com os seus consumidores. As editoras também são exemplo disso, recorrendo a intervenções online dos seus autores, bem como apelando às sugestões dos leitores. As redes sociais constituem uma oportunidade de estreitar laços com os consumidores, criando conteúdos relevantes, gerando uma maior identificação e agradecendo aos que estão no terreno a contribuir para amortizar os efeitos negativos do surto Covid-19.
dívida pública), à semelhança do que anunciara a instituição congénere norte-americana (FED), que vai investir 700 mil milhões de dólares (642 mil milhões de euros) na compra de ativos. "Não há limites para o nosso compromisso com o euro", escreveu a presidente do BCE, Christine Lagarde, no Twitter. Num texto assinado por Lagarde e publicado em vários jornais europeus, a presidente do BCE prevê uma recessão "considerável" na zona euro e diz que o BCE "fará tudo o que for necessário no âmbito de seu mandato para ajudar a zona euro a superar essa crise", já que a instituição "está a serviço dos europeus.
Alguns bancos em Portugal também anunciaram a possibilidade de os seus clientes particulares beneficiarem de períodos de carência nos pagamentos dos seus empréstimos. Ente eles estão a Caixa Geral de Depósitos, que anunciou carência até seis meses de capital (não de juros) aos clientes individuais com crédito (habitação ou crédito pessoal). O BPI vai adiar o pagamento da prestação da casa, do crédito pessoal e do carro também por seis meses. Meio ano é também o período de carência de capital que o Santander Portugal permitirá para operações de crédito à habitação e ao consumo.
Aos números das vítimas, aos números dos apoios, aos números das perdas, há que subtrair oportunidades (farmacêuticas, fabricantes de equipamentos médicos, como ventiladores e máscaras de proteção, grupo de média, plataformas de streaming, empresas de tecnologia, energéticas, entre outras) e ganhos, talvez não imediatamente quantificáveis, mas potenciadores de benefícios futuros. A pandemia travou a economia, mas também travou a poluição, o que foi desde logo visível na China, cujas imagens da NASA, em tempo de quarentena, davam conta de um decréscimo significativo dos gases de efeito de estufa. O mesmo é, por agora, constatável em quase todo mundo, posto em pousio forçado: são milhões de carros nas garagens, centenas de aviões que não levantam voo, centenas de unidades industriais que já não libertam poluentes. O impacto do coronavírus na economia estará em constante atualização e, podemos intuí-lo, a médio prazo e a longo prazo, beneficiaremos da trégua que estamos a dar ao planeta. Ainda que seja agora pesada a fatura. O Banco Central Europeu vai injetar 750 mil milhões de euros na economia, através da compra de ativos (títulos de dívida pública)