30 minute read
Gestores afinam estratégias para retoma da atividade
grande tema gran tema
Gestores afinam estratégias para retoma da atividade
Advertisement
Face à desafiante e grave situação que vivem as empresas e a economia perante a atual crise de saúde pública mundial, a Câmara de Comércio e Indústria Luso-Espanhola (CCILE) promoveu junto de gestores e economistas um ciclo de webinars dedicados à temática “Impacto do covid-19 nas relações comerciais e empresariais luso-espanholas e perspetivas pós-crise sanitária”. Foram vários os especialistas que nas últimas semanas transmitiram neste formato de comunicação os seus exemplos e testemunhos pessoais sobre a forma como nas suas organizações se está a tentar ultrapassar esta fase tão negativa para a grande maioria das empresas e da sociedade em geral. Por sua vez, a Direção da CCILE participou também numa iniciativa idêntica promovida pelo ISCTE, com uma apresentação que se encontra resumida mais à frente. Os cenários traçados pelos gestores são negros, mas não totalmente pessimistas. Há perspetivas e visões, nas páginas seguintes, que podem ajudar nomeadamente as PME a reposicionar-se e a fortalecer-se para se relançarem depois desta travagem abrupta da atividade económica, sentida a nível mundial.
Elena Aldana, diretora-geral Internacional de Relações Externas da Mercadona, deixou bem claro na intervenção durante o webinar realizado no passado dia 4 de maio que “partilharariqueza geradaé amelhor forma de ter um projeto empresarial que as pessoas desejam que exista”. Da evolução do maior grupo de supermercados de Espanha, de destacar o lançamento, em 2018, do projeto da Mercadona Online em Portugal, sendo só depois no ano seguinte que começaram a abrir as primeiras lojas físicas. As 10 lojas abertas em Portugal faturaram em 2019 (e apenas em seis meses) cerca de 32 milhões de euros, operando com 300 fornecedores nacionais, Elena Aldana confirmou que a cadeia irá continuar a abrir, ainda no norte em Portugal, mais uma dezena de lojas este ano. Frisando que a empresa “aposta num modelo de qualidade total”, baseado em cinco pilares–o cliente, os colaboradores, os fornecedores, a sociedade e os acionistas–, a responsável sublinhou que a cadeia procura sempre garantir a satisfação do cliente e dos seus colaboradores e que essas são etapas fundamentais para alcançaro sucesso que tem tido. Os fornecedores são muito importantes: “queremos trabalhar com os nossos fornecedores para a vida toda”, comentou. Quanto ao pessoal, o grupo conta com 900 colaboradores em Portugal e no total do grupo 90 mil”, enquadrou a gestora. Quanto à inserção na comunidade, o objetivo principal é “criar riqueza e colaborar com a sociedade”. Com a situação atual do covid-19, estacomponente da cadeia ganhou importância”, admitiu a responsável, que elogiou todo o empenho demonstrado não só pelos colaboradores, como pela resposta colaborativa da comunidade local. Elena Aldana abordou ainda o modelo comercial da Mercadona, assente numa forma mais moderna de relacionamento e comunicação com o cliente, garante. “Passamos, assim de um modelo tradicional, onde o fornecedor disponibiliza os produtos e o distribuidor os coloca ”à venda, para outro “modelo mais moderno, o modelo da Mercadona, onde é o cliente, juntamente connosco e o nosso Centro de Co-Inovação, quem define o sortido, e isso é comunicado assim aos fornecedores”, garantindo maior procura por parte dos clientes, refere a gestora espanhola. “Isto também leva a que apostemos em produtos novos, que não existiam no mercado”, adianta. Com 1.400 fornecedores, a empresa realizou compras no montante de 20.187 milhões de euros em 2019, adiantou a gestora. A nível global, o grupo tem mais de 1.600 lojas e aumentou o seu volume de negócios, para os 25.500 milhões de euros. Os lucros ascenderam, em 2019, a 623 milhões de euros. O plano de investimentos do grupo entre 2019 e 2023 ascende a cerca de dez mil milhões de euros, onde se prevê maior aposta na “digitalização da empresa”. A empresa tem sempre presente a partilha dos seus lucros, distribuindo cerca de 25% em prémios de desempenho pelos colaboradores. 40% dos lucros são para reinvestimento e 10% para distribuição de dividendos. “Partilhar a riqueza gerada é a melhor forma de ter um projeto empresarial que as pessoas desejam que exista”, resume a responsável. Gestão da crise: Em março, com a crise sanitária, a Mercadona procurou atuar rapidamente, adotando diversas medidas de proteção dos colaboradores e clientes das suas lojas. A comunicação das medidas implementadas –através de canais internos e das redes sociais –foi essencial, para tranquilizar ambos e permitir o funcionamento normal das lojas, em Portugal, explicou Elena Aldana, Por outro lado, a cadeia tem reforçado a sua política de responsabilidade social e feito doações, de mais de 200 toneladas de produtos, a diversas instituições sociais. Embora as vendas tenham aumentado, os lucros da atividade em Portugal irão cair cerca de 95%, admitiu a mesma responsável. AMercadonaanunciou entretanto ter atribuído cerca de 44 milhões de euros em prémios aos seus 90 mil colaboradores, como "reconhecimento pelo esforço e o compromisso" mantidos durante a pandemia. Este valor acumula com os 340 milhões de euros de prémio anual, concedido em fevereiro a todos os colaboradores da companhia. Texto María de Maintenant
Ruth Breitenfeld, vice-presidente da Cepsa Portuguesa, foi uma das oradoras do ciclo de webinars lançado pela CCILE sobre o “Impacto do covid-19 nas relações económicas luso-espanholas e perspetivas pós-crise sanitária”. Na sua apresentação, a gestora começou por elogiar os colaboradores da Cepsa Portuguesa, para “agradecer por continuarem a dar o seu melhor contributo, sempre, diariamente, para que possamos continuar a garantir a nossa atividade e a poder disponibilizar, a cada momento–em circunstâncias extremas, como as que estamos a viver–a energia de que necessitamos para as nossas vidas”. Entre estes, alguns dos profissionais que se mantêm a trabalhar nos seus locais habituais de operação, como é o caso das estações de serviço, estando ainda uma parte dos funcionários em teletrabalho. Salientando que a sua apresentação tinha uma tónica mais pessoal do que institucional, Ruth Breitenfeld enquadrou também desde logo a questão da “interconexão económica, social e cultural incontornáveis” entre os dois países ibéricos. Para Portugal, Espanha é o seu maior cliente, absorvendo mais de 20% das exportações de bens portugueses, o que torna esta ligação essencial para as empresas nacionais. E, naturalmente, considera que o impacto da pandemia vai ser “grande”, “Nesta situação sem precedentes que é esta pandemia, é difícil saber quais os efeitos que o covid-19 vai ter nas relações económicas a nível bilateral” ou nas relações com o resto do mundo. Apenas se sabe que “nada vai voltar a ser o que era”, comentou. Mas a Cepsa, através do seu ADN, “vai continuar a abastecer com energia toda a cadeia de valor desta indústria". O grupo opera, com mais de 10 mil profissionais em todo o mundo, em áreas tão diversas, como a exploração e produção petrolífera, a petroquímica, o fornecimento de gás, eletricidade, trading de combustíveis, até às energias renováveis. E salientou a liderança mundial do grupo na petroquímica, com aplicações desde o têxtil à construção, farmacêutica, dispositivos médicos ou de proteção individual, a produtos de higiene e detergente, duas áreas que estão em foco atualmente nesta crise sanitária. O grupo, que mantém uma forte aposta na tecnologia e na inovação. conta em Espanha com cerca de 1.500 postos de combustível para veículos terrestres, para a navegação marítima e tem área de distribuição e rede comercial. São líderes no fornecimento aos aviões, que é atualmente um dos setores mais afetados pela crise. Em Espanha, têm a área de operação no mercado de eletricidade, gás natural e estão também, mais recentemente, nas energias renováveis (com um novo parque eólico em Jerez de la Frontera). Em Portugal, a companhia tem mais de 260 postos de abastecimento e cerca de 600 profissionais ao serviço. Tem ainda uma unidade industrial de produtos betuminosos. Por outro lado, estabeleceu acordos de colaboração com a Ionity e a Masdar para a instalação de pontos de carregamento elétricos nos seus postos de abastecimento na Península Ibérica. Através de uma nova joint-venture, poderão ainda desenvolver projetos eólicos e de solar fotovoltaico em ambos os países. A Cepsa Portuguesa está já presente também na comercialização de eletricidade para clientes industriais, revelou Ruth Breitenfeld. Constrangimentos: “A origem deste confinamento mundial é comum: é o covid-19”. No entanto, “as circunstâncias de cada país são distintas”, como enquadrou. "A procura [de combustíveis e outros produtos petrolíferos] sofreu uma queda a nível mundial sem precedentes”, com um excesso da oferta, por causa das restrições à mobilidade de pelo menos um terço da população mundial, destacou a gestora. “Em Portugal, a queda foi na ordem de mais de 50%”, em termos médios, mas muito superior no tráfego aéreo e de cruzeiros, por exemplo. Gestão da crise: Desde o início da crise, a companhia assegu-
rou sempre a “garantia de fornecimento energético”. “As indústrias energética e química desempenham um papel fundamental na luta contra o covid-19", frisou, mais uma vez, a responsável. “Somos considerados serviços essenciais”, tendo-se os postos de abastecimento mantido abertos, fornecendo combustíveis e gás engarrafado, “apesar da queda drástica na procura”. De destacar que a empresa, que mantém uma atividade integrada a nível ibérico (centralizada em Espanha), criou ainda um Comité de Resposta, para a monitorização das suas atividades e abastecimento de produtos. Além do Plano de Contingência para garantir a atividade e segurança de colaboradores–fomentando o teletrabalho e implementando normas de segurança–, assim como a segurança dos distribuidores e dos clientes. Ruth Breitenfeld salientou ainda que a sua companhia se colocou à disposição das entidades públicas portuguesas para garantir o fornecimento energético e o cumprimento de medidas para a saúde pública. A área social também não foi esquecida, tendo a Fundação Cepsa apoiado nesta fase as instituições Comunidade Vida e Paz e a Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Leixões, com uma doação de combustível no valor de 10 mil euros. Perspetivas: Sobre o futuro, Ruth Breitenfeld sublinhou que “continuamos a manter- -nos preparados para os diversos cenários de retoma da atividade”, seja gradual ou de outra forma, estando atenta ao evoluir da abertura gradual da atividade no país. Questionada sobre a transição energética, disse apenas que a estratégia se mantinha e que “a Cepsa é uma parte ativa integrante dessa transição energética. A solução do futuro está num mix de produtos oriundos de diversas fontes de energia”, apostando na sustentabilidade. Quanto ao facto do preço do crude estar em forte queda nos mercados mundiais, a gestora sublinha que além das cotações internacionais, os preços dos combustíveis incorporam outros custos e impostos.
"Não cortámos nenhum investimento" previsto para os próximos três anos
António Portela, CEO da Bial, salienta que apesar deste grupo ter já 96 anos de existência, foi só em 2009 quando começou a comercializar os seus medicamentos de investigação própria, que catapultou a atividade. Assim, em 2019, faturou mais de 300 milhões de euros, dos quais 55% provêm precisamente dos dois medicamentos patenteados pela Bial (para a epilepsia e para a doença de Parkinson). Desde 1997 que estão em Espanha, sendo mesmo a filial mais relevante, com um volume de negócios de 90 milhões de euros. A Bial em Espanha conta com 170 colaboradores. O grupo investe mais de 20% do volume de negócios em I&D. "a inovação é absolutamente fundamental para nós", para "termos um crescimento importante e para chegarmos a novos mercados", onde comercializam os seus medicamentos ou através das suas filiais próprias ou, fora da Europa, através de parceiros em cada país. Gestão da crise: O grupo conta com mil colaboradores, repartidos por Portugal, Espanha
e outras filiais europeias. "A covid-19 apanhou-nos a todos, de alguma forma, de surpresa". Todavia, desde muito cedo, a empresa adaptou o seu plano de "Business Continuity" ao novo cenário do covid-19 e conseguiu manter as suas operações a funcionar quase a 100%, adianta António Portela. A preocupação foi assegurar a segurança dos colaboradores, que na sua maioria foram enviados para casa, sendo nomeadamente suspensas as visitas dos seus profissionais de saúde a unidades de saúde. Nem todos os colaboradores ficaram em teletrabalho, pois a parte ligada à produção, qualidade, logística e a mais algumas áreas de suporte tiveram de garantir o aumento da procura de medicamentos que se registou nesse período. Só no primeiro trimes-
tre deste ano, a empresa produziu mais 50% face ao trimestre homólogo de 2019, conseguindo assim responder quer às necessidades de stock quer ao aumento da procura de medicamentos em toda a Europa. O processo de comunicação interno foi muito importante para transmitir confiança aos colaboradores para continuarem o seu trabalho e responder ao aumento da procura do mercado, adiantou António Portela. Uma das áreas que não conseguiram continuar a desenvolver foi a dos ensaios clíinicos dos medicamentos, de resto, os projetos mantiveram-se em ação. A interação parte digital com os clientes foi acelerada e tem corrido bem, adianta. De salientar ainda que a Bial criou um fundo de 500 mil euros para apoiar centros de investigação e profissionais de saúde no combate ao covid-19. Perspetivas: Deste modo, a Bial espera terminar o ano dentro dos objetivos previstos. "Nós não cortámos nenhum investimento, quer seja ao nível da I&D, quer sejam investimentos industriais" que tinhamos planeado para os próximos três anos. "Estamos a continuar a trabalhar para que os mesmos possam continuar, e sentimos que este problema terminará em qualquer momento e nós temos de continuar a investir e continuar a crescer". Com o arranque do desconfinamento em Portugal, a Bial está a preparar a retoma da atividade normal dos colaboradores, com algumas medidas extra de segurança. Ao nível global, considera que as anteriores perspetivas de normalização a partir de junho/ julho poderão realmente acontecer, mas ainda com muitas restrições e cuidados para evitar novos surtos da doença. É possível haver novos cenários de confinamento para o final do ano e para 2021, relembra, e a empresa vai acautelar todas as possibilidades, para garantir stocks dos medicamentos. Quanto ao relacionamento com outros mercados e à recuperação europeia, defende "um plano de competitividade, de reindustralização muito forte nos diversos países", através de um forte apoio público às empresas e à sua recapitalização, mais até do que o próprio investimento público. Só assim se poderão recuperar o emprego e o consumo privado, frisa. Quanto à descoberta e colocação no mercado de uma vacina ou de um tratamento para o covid-19, apesar de todos os esforços sem precedentes e com investimentos "colossais" que têm sido feitos pelos investigadores, não serão processos fáceis ou tão céleres como o desejado, alerta o gestor.
Empresas devem aproveitar
Luís Castro e Almeida revela que o BBVA em Portugal espera não ser tão afetado pela crise sanitária como outros concorrentes, devido ao plano de restruturação que implementou há cinco anos. Um plano que pretendia consolidar a instituição, para fazer face à anterior crise financeira e antecipar novas recessões, e que consistiu num extenso plano de encerramento de balcões, na concentração nos segmentos de clientes com rendimentos mais elevados e no abandono do crédito à habitação, demarcando-se mesmo de potenciais negócios de promoção imobiliária, atividade que tem estado em alta, sobretudo em Lisboa e no Porto. “Foram decisões difíceis que tomámos, foi um risco, mas que se vieram a mostrar essenciais nesta altura que estamos a atravessar", comentou o gestor num webinar recentemente promovido pela CCILE. Paralelamente, foi feita uma aposta na digitalização da atividade bancária, como o serviço BBVA Consigo, que chega a 80% dos clientes e que "é uma referência em Por tugal". Deste modo, com estas restruturações, o volume de moratórias concedidas a particulares e empresas
novas oportunidades com as quebras de fornecimentos
acabou por atingir um valor da ordem dos 420 milhões de euros, um valor que "é baixo", e que tem a ver com as decisões estratégicas tomadas anteriormente, como sublinhou.
Gestão da crise: Perante a crise inesperada, o BBVA em Portugal teve como grandes preocupações a segurança quer dos seus 400 colaboradores (tendo 90% entrado em regime de teletrabalho, enquanto os restantes 10% se repartiram entre a sede e os balcões), como o apoio aos clientes e à sociedade, revelou Luís Castro e Almeida. Para apoiar os seus clientes, o banco "avançou rapidamente com linhas de linhas de apoio e moratórias, quer para os particulares, quer para as empresas". Para as empresas, concederam já empréstimos no valor de 500 milhões de euros e aumentaram as linhas de liquidez em 200 mllhões de euros. Do total de 1.700 milhões de euros em linhas de liquidez, o banco ainda tem disponíveis para conceder mais de 500 milhões, enquadrou o country manager do BBVA em Portugal, na apresentação feita no passado dia 7 de maio. "Não temos nenhum cliente a dizer que o dinheiro ainda não chegou à sua empresa", destacou. Frisando que a instituição não recorreu a apoios do Estado na anterior crise de 2008 e que também agora não irá aderir a linhas com garantia do Estado, Luís Castro e Al
meida destacou, assim, que as eventuais perdas decorrentes dos novos financiamentos não recairão sobre os contribuintes portugueses. Uma responsabilidade que revela a sua preocupação em relação à sociedade onde se insere, como sublinhou Luís Castro e Almeida. Ainda dentro das responsabilidades sociais assumidas pelo banco, destaque para a campanha de solidariedade interna envolvendo os colaboradores para apoiar o Banco Alimentar contra a Fome. O valor das doações feitas pelos colaboradores foi duplicado pelo BBVA Portugal.
Perspetivas: Ainda sem saber como evoluirá a economia portuguesa perante este “nevoeiro cerrado”, o gestor procura dar uma visão pessoal positiva sobre o futuro a curto e médio prazo, nomeadamente para as empresas a operar em Portugal e Espanha, já que considera que nem todos os setores de atividade serão afetados da mesma forma. Mas além do papel dos empresários, serão também fundamentais para a saída da crise as decisões governamentais e europeias que venham a ser adotadas para travar o impacto de uma recessão sem precedentes no espaço europeu. E lança um repto às empresas portuguesas e espanholas para que aproveitem para preencher nichos de mercado onde se verifiquem disrupções nas cadeias de fornecimento quando a ativi
dade retomar. "Muitos países europeus não vão querer estar dependentes de fornecedores de outros lugares do mundo" e há que começar a produzir a nível europeu esses componentes ou produtos finais, incentiva. "As empresas deviam já estar a pensar nisso e a contactar potenciais clientes" a nivel nacional ou europeu para propor novos produtos. Fundamental ainda é que as empresas apostem na “digitalização do seu negócio” e no e-commerce, mesmo pós- -pandemia, devendo recorrer sempre que possível ao teletrabalho, alerta o responsável. As previsões do BBVA para a economia portuguesa seguem as de outras instituições internacionais. Assim, o BBVA estima para este ano uma queda do PIB nacional até aos 6,5% e uma taxa de desemprego de 10%. Quanto ao impacto de uma recessão desta dimensão sobre a atividade dos bancos, Luís Castro e Almeida reconhece que ela afetará os resultados da banca, mas, mesmo assim, considera, há que ver como reagirão alguns setores, menos prejudicados pela crise sanitária. Neste sentido, e tendo em conta que as empresas poderão aproveitar esta altura para apostar na diversificação dos seus portefólios de produtos e mercados, o PIB nacional deverá voltar a recuperar, podendo registar um crescimento de 4,9% em 2021, antecipa ainda.
Assegurar apoios até ao fim da pandemia será fundamental para relançar as economias
Nuno Alves, diretor do Departamento de Estudos Económicos do Banco de Portugal, apresentou, num webinar realizado no passado dia 11 de maio, uma visão sobre o impacto macroeconómico global da crise pandémica, apontando igualmente algumas perspetivas sobre o caso concreto da economia portuguesa. "A pandemia tem um impacto em termos de saúde pública de primeira ordem", embora "também tenha um impacto económico muito forte", pois corresponde a "um choque simultâneo do lado da oferta e do lado da procura". Com as medidas de confinamento adotadas em vários países e a interrupção de produções industriais e de serviços, a oferta acabou por "ter um choque negativo muito acentuado", que coexiste com o choque do lado da procura –quer por parte das famílias, que devido à incerteza optaram por poupar os seus rendimentos ou tiveram mesmo uma quebra acentuada de rendimentos (por desemprego, lay-off, etc.), quer por parte das empresas, que adiam o investimento. Por outro lado, "este choque coloca-nos num contexto de incerteza, que alguns autores classificam de incerteza radical". "São mesmo tempos sem precedente histórico recente". Deste modo, é muito difícil para os economistas calcularem a profundidade e extensão da crise económica, pois dependem muito da duração da própria pandemia e das medidas de contenção. "Sabemos que esta crise vai ser muito profunda" e que vai afetar significativamente os sistemas fi
nanceiros mundiais. "Portugal e Espanha não serão exceção". A globalização da crise e o arrastar de uma crise económica em simultâneo com uma crise financeira, também pode afetar ainda mais o nível da recessão. As medidas de política económica a seguir pelos vários países, e que subsistirão nos próximos trimestres, também condicionarão a crise. E dá como exemplo as medidas de apoio ao mercado de trabalho, que são fundamentais para a solvência das famílias. As políticas orçamentais seguidas têm uma abrangência mais nacional e de efeitos menos duradouros, defendendo antes alguns uma "resposta monetária para este choque, que é assimétrico, em toda a Europa, e mesmo a nível global". Esta pode passar por instrumentos pouco convencionais, como a provisão de uma grade liquidez a baixo custo, a compra de ativos de diversos tipos, em diversos mercados. "Assegurar esta ponte", entre o momento atual e o fim da pandemia será fundamental para re
lançar as economias, defendeu ainda o mesmo especialista. Mas "fazer esta ponte tem um custo orçamental enorme e é muito complicado garantir para todos os segmentos da população, para todos os segmentos de empresa, que todas continuarão a ter um viabilidade após a crise. Certamente, muitas empresas entrarão em insolvência durante a crise". Um inquérito do Banco de Portugal e do INE às empresas conclui que a continuação do atual cenário de paragem da atividade além de 40 dias úteis afetaria 17% das empresas, em termos de défice de liquidez. Embora as medidas de lay-off tenham mitigado estes efeitos. Contudo, a situação das microempresas é ainda mais precária. Perspetivas: O impacto do confinamento neste segundo trimestre "será muito severo", com o BCE a antecipar uma forte queda para vários países, seguindo-se alguma recuperação. Mas, mesmo assim, "não vamos recuperar o nível do PIB de 2019 mesmo no final de 2022". "É uma crise profunda" e que tem problemas graves como a travagem do investimento, do desemprego permanecer elevado por muito tempo e da inovação e I&D ficarem adiadas. Quanto à inflação, a tendência será para os preços diminuirem nos próximos anos. A política de contenção da escalada do vírus é preferível à abertura total da economia, garantem os economistas, defendendo que a criação de bases de confiança para os consumidores, através, por exemplo, da
monitorização da doença e da realização de testes de despiste em larga escala para evitar novo surto. No caso de Portugal, a recessão foi transversal a todos os setores. "Entre março e maio, temos uma queda quase generalizada e transversal a quase toda a economia. São poucas as exceções". Nos serviços, a queda foi ainda mais acentuada, devido ao bom momento que atravessavam e que sofreu uma travagem demasiado abrupta. Mas a indústria também caíu de forma generalizada. Para o futuro a médio prazo, Nuno Alves alerta que "a economia portuguesa tem fragilidades que irão condicionar" a recuperação. A questão do elevado endividamento do setor público, que deverá ainda agravar-se com esta pandemia, o facto de haver muitas pessoas no limiar da pobreza, o que condicionará a procura, e ainda a própria fragilidade financeira das empresas, bem como a elevada exposição ao setor do turismo, que pode sofrer quedas da ordem de 80% no atual trimestre (o setor representa cerca de 6% do PIB). Mas, conclui, "a capacidade de resposta das empresas e a coesão social são cruciais para minimizar os efeitos desta crise". O FMI aponta para uma queda do PIB nacional de 8%, enquanto a Comissão Europeia estima uma descida de 7%. Quanto ao desemprego, deverá manter-se elevado durante muitos anos. Já relativamente à relação económica com Espanha, Nuno Alves considera que esta "continuará a ser imparável" após o retomar das atividades normais.
Espanha vai ter uma abertura gradual e progressiva, por região
Luís Moura, delegado da AICEP em Espanha, enquadrou a situação económica e regulamentar em Espanha desde o início da crise sanitária e até à data (13 de maio), enquanto vigora o estado de alerta decretado pelo Governo espanhol há 10 semanas e que duraria pelo menos até 23 de maio [o qual, entretanto, foi prolongado por mais 14 dias]. "É uma situação nova, que está a causar grande impacto económico e social sobre esta sociedade. A crise que se avizinha é uma crise sem precedentes" para o país, com estimativas de queda da economia recordes em termos das últimas décadas –o Governo espanhol prevê uma queda do PIB de 9,2% em 2020. A travagem da economia espanhola foi total, "um choque semelhante ao de um desastre natural", "a atividade parou em seco", pararam as exportações, tendo o confinamento sido muito mais restritivo do que em Portugal. Do lado da procura, houve igualmente um choque, derivado de situações de
lay-off, desemprego, perda de remunerações, aumento de incerteza e diminuição do consumo, com exceção dos bens alimentares e produtos farmacêuticos. Gestão da crise: Terá de haver recursos públicos para ajudar a retomar o consumo e ajudar as empresas a voltarem a operar e a exportar. No início da crise, o Govenon espanhol implementou medidas como o lay-off simplificado, avais do Estado (três tranches de avais de 20 mil milhões de euros
cada, de um total de cem mil milhões), além da garantia pública de 80% dos empréstimos, através do Instituto de Crédito Oficial (ICO), essencialmente destinada a PME e trabalhadores independentes. Foi ainda decretada a flexibilização do pagamento das contribuições para a segurança social por parte de trabalhadores independentes e empresas, bem como a flexibilização do pagamento de impostos. A proibição temporária de despedimentos por causa da pandemia foi outra das medidas adotadas em Espanha, que está em vias de lançar também o rendimento mínimo garantido para famílias vulneráveis. Quantos aos setores mais afetados, Luís Moura salienta em primeiro lugar o turismo, que valia cerca de 12% do PIB, e que poderá ter perdas da ordem dos 124 mil milhões de euros. Também o setor automóvel e aeronáutico, com 17 fábricas em Espanha e um peso de 12% do PIB do país, é outro dos mais prejudicados com a suspen-
são da atividade. A hotelaria, restauração, calçado e moda estão também entre os que mais sofreram. Do lado contrário, os produtos alimentares, a tecnologia, a saúde e o setor da construção estão entre os que reagiram melhor e não foram tão prejudicados. Para já, uma boa notícia: "embora seja uma crise severa, não se transmitiu ao setor financeiro como em 2008 ou como a recessão de 1929", frisa Luís Moura. A estratégia do "desconfinamento em Espanha será gradual, progressiva e assimétrica por regiões e setores". Esta decorrerá em quatro fases, divididas em oito semanas, a implementar consoante as províncias, começou no passado dia 4 de maio, mas Madrid é, por exemplo, uma das regiões que ainda está na fase zero, de preparação para a retoma da atividade, comentou o responsável, durante o webinar que se realizou no passado dia 13 de maio. Madrid e a Catalunha estão entre as regiões mais afetadas por casos de contaminação, num país que está no topo da tabela de casos na Europa. Só na fase 3 (última fase) é que está prevista a mobilidade entre províncias, pelo que a abertura das fronteiras com Portugal não deverá acontecer muito antes disso, esclarece o mesmo responsável.
Relações ibéricas:
No passado recente, as relações ibéricas cresceram de forma acentuada, representando em 2019 cerca de 46 mil milhões de euros de trocas comerciais, relembra Luís Moura. De destacar que mais de seis mil empresas portuguesas exportam para Espanha. Com a evolução da tendência, nos últimos anos, de aproximação às unidades produtivas mais próximas dos centros urbanos vs. as produções em países longínquos, os dois países alcançaram uma crescente complementaridade dos tecidos produtivos e um elevado grau de integração das cadeias de produção, enquadra Luís Moura.
"Que reabertura possível do comércio com Espanha, o nosso principal mercado?" foi o tema tratado por Eduardo Serra Jorge, tesoureiro da Junta Diretiva da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Espanhola, orador de um webinar realizado no passado dia 6 de maio, inserido num ciclo promovido pelo ISCTE.- -Executive Education, durante o mês passado e que contou com oradores de diversos setores. Para Eduardo Serra Jorge, o confinamento imposto em diversos países pretendeu não só prevenir a extensão do covid-19, como também travar um agravamento da própria atividade económica, neste período de incerteza. Abordando a situação concreta em Espanha, que é o principal mercado externo de Portugal, Eduardo Serra Jorge referiu a forma como este país está em vias de fazer o desconfinamento social, que continua a ser enquadrado pelo estado de emergência, mas com uma progressiva abertura de atividades e de mobilidade. Nesta "fase 1" do desconfinamento, será permitida a abertura de algum pequeno comércio, lugares de culto e atividades sociais, mas com diversas limitações. Só para meados de junho, se as condições sanitárias o permitirem, é que Espanha deverá entrar na fase 2, com maior normalização das atividades da população e de âmbito económico, adianta o mesmo responsável. Com uma abertura que se espera gradual também em Portugal, terá de haver uma concertação entre os dois países para o reabrir das fronteiras terrestres, o que permitirá maior mobilidade para os cidadãos, comenta o mesmo responsável. Perspetivas: Eduardo Serra Jorge resume que tudo dependerá do evoluir da crise sanitária. "A reaber
A pandemia irá colocar muitas dificuldades às empresas, com pressão sobre os preços e a logística, com muita concorrência dos canais online. As empresas portuguesas podem agora, perante a travagem em Espanha e noutros países europeus, ter espaço para aumentar a sua capacidade exportadora para o resto da Europa, Portugal e os produtos portugueses têm uma boa imagem exterior, que é necessário aproveitar, sublinha o responsável. Do lado do consumidor, é de esperar um consumidor emotivo e frágil, sensibilizado para contribuir para o bem estar e esforço coletivo, que adote um comportamento de consumo mais prático, que seja menos consumista, privilegiando a economia circular e os aspetos ambientais. Por outro lado, por razões económicas, estará mais sensibilizado ao preço e menos fiel a marcas. As lojas onlineou de proximidade serão privilegiadas por este consumidor.
Reabertura de fronteiras depende de evolução da crise sanitária
Perspetivas:
tura das relações bilaterais estará altamente condicionada à normalização da própria situação sanitária e à abertura das fronteiras". Recorde-se que ainda não há data para o reabrir das fronteiras terrestres entre os países ibéricos, que foram encerradas a 16 de março. Quanto à queda da economia espanhola, que se calcula que vá ser mais grave do que em Portugal, Eduardo Serra Jorge estima que no final deste ano poderá situar-se entre os oito a 12%, "uma quebra brutal, a que nunca se assistiu". Também o desemprego em Espanha, este ano, poderá atingir taxas de 20 a 30%, adianta. O consumo privado e as exportações também deverão sofrer fortes impactos, acredita o responsável. "Queremos acreditar que este desconfinamento gradual vá trazer boas novidades". Para o diretor da CCILE, que é advogado e ainda empresário do setor do turismo, este último será o que demorará mais tempo a recuperar. No seu entender, tudo aponta para que o ano atual, e provavelmente o próximo, "sejam anos perdidos", pelo que há que "preparar o ano 2022", adverte. Existem já estimativas de que os prejuízos em Espanha para o setor do turismo, caso o mesmo não reabra completamente até ao final deste ano, possam ascender a algo como "125 mil milhões de euros", lança o orador. "Isto são más notícias para Portu
gal", face à grande ligação comercial entre ambos os países, frisa. Embora as mudanças que esta pandemia veio impor nos hábitos dos consumidores, também, possam criar "boas oportunidades de negócio que as empresas não deixarão de aproveitar”, acredita o gestor. Ainda assim, enumera alguns setores em Espanha que têm conseguido manter ou mesmo melhorar a sua atividade, apesar da pandemia, como o setor tecnológico, o agroalimentar e distribuição, a indústria química, transportes e logística ou ainda a indústria farmacêutica e de produtos de higiene e limpeza. Sobre Portugal, e tendo em conta a sua experiência e conhecimento mais direto da realidade das empresas, lamenta a paragem da economia e o elevado número de empresas em lay-off e refere que os "empresários estão com muita expetativa sobre o que irá acontecer" nos próximos tempos.
Pagou IVA em Espanha? Saiba como recuperá-lo connosco, contacte-nos já!
¿Pagó IVA en Portugal? ¡Descubra cómo recuperarlo con nosotros, contáctenos ahora!
Setor energético vai retomar a atividade normal e os seus investimentos
Nuno Ribeiro da Silva, diretor- -geral da Endesa Portugal, dedicou grande parte da sua intervenção à política energética europeia, salientando que quer o “Green Deal” aprovado pela Comissão Europeia, quer a Lei do Clima recentemente enviada pelo Conselho Europeu ao Parlamento Europeu para discussão, ou ainda os planos nacionais de energia dos Estados-membros devem avançar sem limitações, e sem alterações significativas que ponham em causa as “metas ambiciosas” definidas. O Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) de Portugal acabou de ser aprovado em Conselho de Ministros. Estes projetos implicam “centenas de biliões de euros só na Europa” –para a descarbonização até 2050, através da aposta em energias renováveis, redes inteligentes, eficiência energética –e são essenciais “para melhorar a nossa qualidade de vida, para tornar as nossas cidades –e em última análise, o planeta –sustentável”, defendeu. Mas ainda há “cuidados a ter”, quer em termos regulatórios, quer em termos de fiscalidade, alerta. Tem de haver flexibilidade administrativa e ainda incentivos financeiros e fiscais para que as empresas do setor invistam nestas vertentes. No webinar realizado no passado dia 22 de maio, o responsável falou ainda do impacto ambiental decorrente do menor consumo dos produtos energéticos neste tempo de confinamento, considerando que é temporário e que não se trata de uma tendência de longo prazo. “Vamos voltar a uma situação normal, em que os consumos de energia e os consequentes efeitos ambientais voltarão à tendência que tinhamos antes do confinamento. Mas também é verdade que apesar de muitas críticas”, tem- -se estado, nos últimos anos, a seguir “um caminho positivo no sentido de diminuir os impactos sobre o ambiente, com adoção de energias mais “limpas”, e de melhorar a eficiência energética, salientou. Sobre a situação inédita ocorrida em 16 de março, com uma queda abrupta e histórica do preço do crude, aquela decorreu de uma “tempestade perfeita” sobre a produção, mas os preços já recuperaram para cerca de 30 dólares por barril, comentou o mesmo gestor. Ainda assim, a tendência a médio prazo é para um “equilíbrio do mercado” e para “preços baixos” do petróleo e do gás, com as reservas atuais existentes e com a estabilização da procura devido à descarbonização. Mas o petróleo continuará com procura a nível mundial até cerca de 2040.
De salientar ainda a nova regulamentação em que os preços do gás natural e do gás de petróleo liquefeito deixarão de ser indexados ao preço do petróleo, nos mercados mundiais. Nuno Ribeiro da Silva salientou, por outro lado, que os preços da energia negociada no Mibel- -Mercado Ibérico de Eletricidade têm estado a baixar e que a Endesa tem feito repercutir essa diminuição junto dos seus clientes. “É uma boa conjuntura para os consumidores reverem os seus contratos”, mas os operadores têm feito um esforço para atualizar preços, considera o gestor. Nuno Ribeiro da Silva aponta ainda para a questão de Portugal e Espanha terem uma situação privilegiada em termos de variedade de fontes de produção energética –desde o solar fotovoltaico, à produção hidroelétrica através de barragens, à energia eólica e à biomassa –um mix de fontes renováveis pouco vulgar a nível mundial, considera. Assim, a produção do sistema elétrico tem apostado na descarbonização e geração por fontes renováveis e na eficiência energética. O objetivo até 2030 é de que 37% de todo o consumo energético nacional tenha origem em fontes renováveis. Relativamente à mobilidade elétrica, Nuno Ribeiro da Silva considera que esta tendência se irá manter nos próximos tempos. Mas as medidas legislativas e fiscais de governos e municípios nesta matéria serão fundamentais para intensificar este processo e contribuir para um ambiente nas cidades mais sustentável, adianta.