nove de junho - movimento um

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CEP : 66623-120

Alemeda Santa Helena, 08 Marambaia, Belém, Pará

Belém, 09 de Junho de 2015

Adan Costa

9 de junho - movimento um



“Quanto mais o adulto está empenhado na vida prática, tanto mais aguda é a distinção que faz entre fantasia e realidade, e tanto mais esta é valorizada em detrimento daquela.”

Ecléa Bosi, 1994, p 58.


9 de junho - movimento um


9 de junho sempre foi uma data celebrada em casa, juntavam-se as festas dos santos juninos, o aniversário de minha avó materna e de meu irmão mais novo, 9 de junho representava reunir a família em torno de uma mesa, repleta de coisas gostosas, de reencontrar os primos, de correr pela casa lotada, de rir das histórias contadas pelos tios e tias, e é claro, por esperar Dona Júlia, repartir com uma paciência quase budista, a sua famosa torta salgada de frango.

Esses últimos anos, tem sido povoados por uma mistura de saudade e de esperança, saudade porque ela nos deixou depois de longos sete anos lutando com todas as forças que tinha contra um câncer, que destruiu nossa família inteira, porque acompanhávamos o seu sofrimento em não podíamos fazer nada, a não ser esperar, esperança, por crer que ela hoje esteja em um lugar melhor, sem sofrimentos nem dores. Minha avó sempre teve no decorrer de seus 77 anos de vida, pessoas que a acompanharam, seja para ajudá-la e se locomover pela cidade, ou mesmo para ajudar a carregar as inúmeras sacolas da feira, ela pouco letrada, nordestina, mãe de 14 filhos, nunca se deixou trapacear, com uma habilidade matemática de meter medo em qualquer economista, ela geria a casa com mão de ferro, sem luxos, tudo era muito simples, tudo era na medida certa.

Em abril de 2015, fez três anos de sua partida, quando moleque, eu à acompanhei por longos anos, em suas andanças, viagens, negociações, aprendi a ter paciência, a esperar a hora certa das coisas, a compartilhar minhas coisas com as pessoas que tem menos, a fazer economias, e sobretudo valorizar as coisas que tenho. Me despedi dela, beijando sua testa fria, seu corpo coberto de flores, queria ter feito tanto, queria ter ficado mais tempo ao seu lado, quando a doença se asseverou, eu me recusava a vê-la definhando, me recusa a ver aquela mulher tão forte, tão ativa, com quem convivi por anos, a um ser imóvel, mudo, repousado sobre uma cama a meia luz, coberta por um mosquiteiro cor de rosa, ela até seus últimos segundos esteve na casa que ajudou a construir, e onde educou filhos, netos e bisnetos, a casa era como coração de mãe.

Dedico à sua memória.






Cartas sĂŁo poemas que encalham nos escombros da saudade






adancosta@gmil.com


Dona Júlia

Passagem Alegre, 33 Pedreira, Belém, Pará CEP : 66087-760


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