Fichamento - Para entender o mundo financeiro - SINGER, 2000

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1. Indicação bibliográfica SINGER, P. – Para entender o mundo financeiro. São Paulo: Contexto, 2000.

2. Resumo O universo das finanças Todos nós participamos do mundo financeiro sempre que oferecemos e recebemos crédito. A rotina das finanças está incorporada no cotidiano do nosso comportamento econômico – quando movimentamos contas bancárias, compramos e vendemos bens e serviços, entre outros. O modo de organização do mundo financeiro em nossa sociedade permite apenas que grandes intermediários capitalistas monopolizem o acesso ao capital via crédito. O autor objetiva oferecer noções básicas dos fundamentos das finanças ao cidadão comum, de nível médio. Com base em teorias marxistas e keynesianas, Singer apresenta o caráter subjetivo e aleatório do universo financeiro, e traça um histórico da evolução das instituições financeiras, assim como das políticas monetárias e cambiais. Em seguida, o autor fala, mais profundamente, sobre a questão da crise financeira, apontando soluções e medidas preventivas. Por fim, há um capítulo dedicado aos serviços financeiros disponibilizados aos mais pobres. Fundamentos das finanças

1) A natureza das transações financeiras É uma operação de empréstimo, e caracteriza-se por não envolver diretamente transferência definitiva de valor. Os títulos se assemelham a mercadorias, embora não o sejam, e podem ser comprados, vendidos, revendidos ou recomprados. São contratos de empréstimo. Contratos de aluguel são também chamados de arrendamento ou “leasing”; os pagamentos são feitos em troca do uso do bem. O seguro de vida é um contrato condicional. O segurado paga um prêmio mensal em dinheiro, e, caso venha a falecer, a companhia de seguros devolve o dinheiro à família do segurado. O contrato de seguro possui prazo incerto, pois pode ser rescindido independente de sinistro. A compra de ações também é uma transação financeira condicional, já que o prazo, o valor do principal e os juros são oscilantes, dependendo do desempenho da empresa. Ações são títulos de propriedade de capital, leiloadas diariamente na bolsa de valores. Em geral, as transações financeiras são condicionais, pois todas envolvem riscos. A riqueza compõe-se de ativos, que podem ser bens reais ou contratos financeiros.

2) O papel das finanças na economia capitalista No capitalismo, as finanças antecipam as transações a fim de reduzir o tempo em que os produtos permanecem sem serem utilizados. Se não existissem as finanças, a economia teria grande parte de seus ativos estocados à espera do início das etapas de produção ou consumo. Graças às finanças, os períodos de produção e distribuição dos bens estão dissociados da movimentação de valores, permitindo que o dinheiro acumulado nos fundos de depreciação possa ser emprestado a outros agentes, que, em troca de juros, podem utilizá-lo para consumir ou produzir. 3) O risco financeiro No mundo das finanças, o passar do tempo produz valor, que se dá por meio do trabalho na produção e distribuição. A causa do risco financeiro é a imprevisibilidade, regida pela competição e inovação. Os neoclássicos sustentam a ideia de que o risco pode ser previsto e medido.


Sempre houve altos e baixos no mercado financeiro – o que prova a pouca capacidade de previsão e medida dos riscos envolvidos. O risco financeiro é geralmente alimentado pelas expectativas dos agentes. 4) A especulação financeira A percepção que os agentes têm do risco financeiro é mascarada pelo otimismo ou pessimismo com o qual eles mesmos encaram o futuro da economia. Os especuladores atuam conforme suas expectativas, e querem chegar primeiro ao ponto para onde a maioria caminha. Quando estão otimistas, os agentes efetuam mais empréstimos, fazendo com que suba a cotação dos títulos. Quando pessimistas, vendem mais títulos, resultando na queda da cotação desses títulos. Nas bolsas de valores há os pessimistas (ursos), vendedores de ações, e os otimistas (touros), compradores. O maior desafio do agente do mercado financeiro é adivinhar o que a maioria fará, e fazer antes.

5) A poupança como fonte dos ativos financeiros As famílias, analisadas em seu conjunto, possuem a tendência em gastar menos do que ganham, ao contrário de governos e empresas, que sempre gastam além da receita. Governos e empresas disputam a poupança líquida das famílias. Se o governo expande a dívida pública, pode provocar a elevação da taxa de juros e escassear os empréstimos às empresas. Com o crescimento da economia, a poupança também aumenta e acaba por satisfazer a demanda por empréstimos, tanto no setor estatal como privado. Segundo Keynes, um aumento da renda nacional gera crescimento proporcional da poupança, já que o consumo das famílias é pouco variável. O crescimento contínuo da economia resulta em vários pontos de estrangulamento, anulando essa progressão. Se a política econômica persistir nesse crescimento, irá causar forte aumento de preços. A visão neoliberal enxerga qualquer inflação como resultado da oferta de empréstimos ou de moeda em excesso e dos altos gastos do governo. Eles também acreditam que a economia se encontra em equilíbrio na situação de pleno emprego. A doutrina neoliberal julga a inflação como o pior dos males. A riqueza acumulada é desvalorizada e o consumidor é obrigado a pagar o imposto inflacionário. Os neoliberais também creem que o desemprego é voluntário, pois os trabalhadores se negam a aceitar remuneração abaixo do que consideram necessário. Em uma situação de alto desemprego esta regra não se aplica, já que a maioria das pessoas é obrigada a trabalhar pelos salários vigentes ou inferiores. 6) A intermediação financeira e a alavancagem Intermediários financeiros são aqueles que captam a poupança e a reemprestam, tais como: bancos, seguradoras etc. Os empréstimos se constituem em diferentes ativos financeiros. Ao passar duas vezes pelo intermediário, a mesma soma dobra o valor. Essa expansão é causada pela alavancagem. Um dos serviços da intermediação financeira é transformação de prazos, onde um depósito à vista se converte em um empréstimo em longo prazo. O intermediário financeiro também possui a proteção do Banco Central e alto valor de capital, oferecendo pouco riso a quem nele deposita. Porém, ao reemprestar, se expõe a um risco maior. O sistema financeiro é composto de diversos intermediários. Os prazos são alongados e os riscos, diluídos. Marx chamou de ‘capital fictício’ a multiplicação dos ativos financeiros.


7) As reservas que deveriam ancorar o mundo financeiro ao real Os bancos devem conservar uma parte do valor total de depósitos em caixa, assegurando aos depositantes a retirada dos valores a qualquer tempo. Se houver uma retirada maciça de depósitos, as reservas serão insuficientes, promovendo a quebra dos intermediários financeiros. É imposta aos bancos uma reserva financeira sempre maior do que a necessária em tempos de calmaria, a fim de proteger o sistema financeiro. Quanto maior o capital ocioso entesourado, maior é o multiplicador de valor posto em circulação. Decisões erradas provocam falências e, consequentemente, dívidas não pagas. Há uma desvalorização dos ativos financeiros, o que ocasiona a cobrança dos empréstimos e a recusa dos bancos em oferecer novos créditos. O relacionamento nada tranquilo entre finanças e Estado 1) Origem e evolução da intermediação financeira A “alta finança” deram origem aos bancos. As sociedades por ações surgiram no século XIX, se multiplicando no comércio, na indústria e no sistema financeiro. Mercados financeiros tornam-se oligopólicos, dominados por grandes bancos varejistas. Bancos de investimentos europeus e asiáticos se associam às multiempresas formadas por eles, que se tornam independentes dos bancos de investimentos. Bancos estatais investiram na tecnologia industrial em países do Terceiro Mundo. Sistemas nacionais de previdência social foram impostos aos países industrializados na segunda metade dos anos 40. Era uma espécie de poupança forçada feita em nome dos assalariados. O custo mais importante dos intermediários financeiros é todo o processo de gerenciamento das informações, pois paga altos salários a executivos e analistas para a realização desse trabalho. 2) A formação da unidade monetária No século XVIII, a Grã-Bretanha detinha a mais avançada economia, assim como o sistema bancário mais adiantado. Cada banco emitia sua própria moeda-papel, considerada como dinheiro na região em que operava. As notas do Banco da Inglaterra possuíam validade nacional. Com o tempo, o Banco da Inglaterra passou a apoiar os demais bancos, deixando de lado os negócios comerciais e de investimentos. Tornou-se o banco central, emissor da moeda legal. Este sistema bancário foi imitado pelos demais países. 3) A política monetária No passado, podia-se efetuar um depósito em ouro ou prata para garantir o papel moeda. O preço era fixado em lei. Hoje a movimentação é fiduciária, sendo a moeda aceita pelo público. O valor da moeda depende de seu poder de compra. A autoridade monetária tem como principais tarefas controlar a oferta de moedas e a taxa cambial, o sistema de intermediação financeira e administrar a dívida pública. Os liberais veem o sistema financeiro como um mercado comum, semelhante aos outros. O banco central deveria ser independente do governo e impedir que este gaste mais do que arrecada. Para o governo, é importante manter o banco central subordinado aos seus objetivos, que vão muito além da defesa do valor monetário. 4) Relações entre as finanças e a política monetária A moeda corrente é um ativo financeiro, posta em circulação pelo governo, por meio do banco central. A política monetária tem três objetivos: manter a economia em pleno emprego, estabilizar preços e equilibrar o balanço de pagamentos.


Ela também influi sobre o nível de atividade e emprego, por meio da expansão da oferta de moeda e da redução das taxas de juros. Isso eleva o consumo, contribuindo para produção e emprego. O banco central promove a desvalorização externa da moeda nacional, com o objetivo de conter importações e favorecer a exportação. Quando pretende que industriais e agricultores barateiem seus produtos, a operação é contrária: o BC valoriza a moeda no exterior. Em caso de inflação alta, a autoridade monetária interrompe a oferta de moeda. Essa oferta é ampliada se os preços baixarem. Por meio da venda de títulos públicos, o banco central retira dinheiro de circulação, e o coloca no mercado com a compra desses títulos. Para combater o perigo de inflação alta, é necessária a negociação para conter preços e salários em diversos setores da economia.

5) Sistemas internacionais de pagamentos Os sistemas internacionais de pagamentos surgiram a partir do estreitamento das relações comerciais e financeiras entre nações capitalistas. O padrão ouro foi o primeiro sistema. Em 1931, abandonou-se o padrão ouro, diante da maior crise financeira capitalista internacional. Foi inaugurado pela Bretton Woods um novo sistema internacional de pagamentos, em 1944, e a moeda era o dólar. O FMI – Fundo Monetário Internacional – implantou e supervisionava esse sistema. Os países deveriam manter paridade constante de suas moedas com o dólar. 6) A prevenção da crise financeira pelo FMI Criou-se o FMI para ajudar os países-membros com problemas, a fim de que estes não fossem obrigados a adotar políticas recessivas. O padrão de ajuste desenvolvido pelo FMI para o Terceiro Mundo foi a contenção do crédito, dos gastos públicos e dos salários. Com a crise das dívidas externas em países latino-americanos nos anos 80, o FMI passou a liderar operações de resgate dos países que não honraram seus compromissos financeiros externos. Os bancos foram salvos da bancarrota, mas os países devedores tiveram empobrecimento e marginalização de parte de sua população. Em 1976, artigos de Acordo do FMI permitiram aos países adotarem qualquer regime cambial, exceto o padrão ouro. Isso provocou aumento da instabilidade monetária internacional e a especulação cambial. Administradores do capital globalizado, por receio da crise cambial, acabam deixando os países e isso provoca elevada desvalorização das moedas nacionais e surtos inflacionários.

7) A globalização financeira A experiência keynesiana de regulação dos mercados financeiros chegou ao fim na década de 80. Surge ideia liberal de priorizar o combate à inflação mediante ajuste fiscal e contenção de crédito. A riqueza financeira globalizada se tornou maior do que ativos financeiros nacionais aplicados. Política fiscal e monetária de expansão pode provocar fuga de capitais para países de políticas opostas. Países que reduzem juros a fim de estimular crescimento econômico arriscam-se a sucumbir a uma crise cambial. George Soros: percepção de risco dos aplicadores influi no destino das aplicações. Governos que optam pela dependência de capitais externos priorizam ajuste fiscal. No entanto, a prática de políticas macroeconômicas torna o desenvolvimento débil ou impossível, impedindo o crescimento da economia.

A crise financeira e suas formas mutantes 1) O que é crise financeira Existe crise quando a oferta de ativos ultrapassa em muito sua demanda.


Os ativos transacionados não possuem valor de mercadoria, apenas de troca, e seu valor depende da credibilidade do emissor. A riqueza financeira de um país é a soma da cotação dos ativos no mercado financeiro. O otimismo ou pessimismo em relação aos ativos financeiros se apoiam no sucesso ou no fracasso das operações econômicas reais. As notícias políticas são as que mais afetam os agentes financeiros. Na visão neoclássica, os operadores são racionais, com expectativas em dados confiáveis, aproximando otimistas e pessimistas. A autovalorização dos ativos financeiros acaba por formar uma bolha, e até que esta não estoure os operadores ganham muito dinheiro. A crise atinge especialmente os bancos e intermediários financeiros. O sistema bancário deve ser salvo pela intervenção da autoridade monetária, caso contrário advém uma crise econômica. 2) O controle da crise financeira pela autoridade monetária A crise econômica é resultante da desvalorização da riqueza financeira, expandindo-se naturalmente. Espera-se uma prevenção da crise por parte da autoridade monetária. O sistema bancário foi dividido em compartimentos, separando os financiamentos de atividades e de operações financeiras. A política keynesiana manteve juros baixos e restringiu o envolvimento dos bancos na especulação financeira, impedindo a contaminação da economia real. Bancos em dificuldades eram socorridos pelo banco central. Devido à desregulação, tornou-se impossível a autoridade monetária refrear a especulação financeira sem atingir a economia real. A intervenção do FMI, do Banco Mundial etc., tem evitado que crises financeiras nacionais e regionais atinjam países mais ricos. A continuidade de crescimento do Primeiro Mundo abreviou recessões em nações emergentes. 3) Reforma financeira ou como construir um sistema financeiro seguro O risco financeiro não pode ser descartado devido à imprevisibilidade da economia capitalista, descentralizada e competitiva. Economia real e mercado financeiro são compostos pelos mesmos agentes. Na era keynesiana, os altos e baixos eram contidos pela autoridade monetária sobre a especulação financeira. No período neoliberal, os mercados são livres, porém, sujeitos ao ciclo de conjuntura do capital globalizado. A construção de sistemas financeiros mais seguros tende a iniciar-se em plano nacional. O mercado cambial seria controlado pelo banco central, com entrada e saída de capitais sob sua autorização. Os depósitos de quem não visa rendimento financeiro ficariam a salvo dos riscos. O sistema ofereceria ao público de rendas alta e média opções de aplicações de risco, atenderia à demanda das empresas por financiamento e daria oportunidades de especulação a quem desejasse. 4) Um sistema financeiro para os pobres Os bancos não atendem os pobres. Apenas os agiotas, instituições religiosas ou especializadas prestam serviços financeiros às pessoas de baixa renda. A cooperativa de crédito surgiu na Alemanha, no século XIX. O empréstimo da cooperativa é destinado aos próprios sócios, gerando crédito rotativo. A garantia é a confiança mútua. Os fundos das cooperativas servem para financiar as atividades econômicas de seus sócios. As cooperativas de segundo grau formam o banco cooperativo, e podem assumir âmbito nacional ou multinacional, financiando grandes empreendimentos.


O Grameen Bank teve origem em Bangladesh, no ano de 1977, e atende especialmente mulheres, entre viúvas, divorciadas ou abandonadas, sem condições de criarem os filhos. Seus agentes de crédito vivem nas aldeias e organizam grupos solidários. No Brasil, os bancos do povo não podem receber depósitos. Há restrições legais a todas as instituições financeiras criadas pelos trabalhadores, e as cooperativas não têm onde se financiar.

3. Citações Na sociedade capitalista, os futuros individuais dependem de projetos sociais, a grande maioria sonha com futuros que só podem se realizar se houver apoio, favorecimento, ajuda, compartilhamento, participação de outros. (pág.7) (...) todos nós participamos do mundo financeiro à medida que estamos dando e recebendo crédito quase todo dia. (pág.8) No capitalismo, só os sonhos dos ricos têm vez no mundo financeiro. Os não ricos com sua poupança viabilizam (sem o saber) os sonhos de alguns ricos. (pág.9) O mundo financeiro é regido pela lei do acaso. (...) Os sonhos tornados projetos viram novas empresas, novos produtos, novas técnicas ou novas candidaturas, (...) Na medida em que se agregam ao mundo econômico geram ou político real, geram empregos, mercadorias, rendas, impostos. (pág.10) Do jeito como o mundo financeiro está organizado, o acesso ao capital via crédito é monopolizado por grandes intermediários capitalistas, que o vedam à massa de produtores desprovidos de propriedade. (...) (pág.13)

4. Comentários A proposta de Singer não é ensinar, e sim discutir sobre as finanças e suas crises. Ele aponta os pontos de vista liberais, dos quais discorda, porém ressalta que os mesmos não podem ser ignorados, assim como as visões marxistas e keynesianas, as quais o autor denomina como intervencionistas. Singer também tem o propósito de nos fazer entender os problemas e soluções propostos pelas políticas econômicas, a fim de exercermos de forma consciente nosso direito de participar da tomada de decisões sobre o destino do país.


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