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Morrendo De Amor (A Passionate Surrender)

Helen Bianchin

Resumo: Luc era seu marido, mas amava outra mulher! Ana não poderia continuar com Luc sabendo que o coração dele batia por outra mulher. Se Celine Moore era tão sofisticada e perfeita, que ficasse com ela! Não lhe interessava um casamento apenas de fachada. Melhor seria partir... De cabeça erguida. E sem dizer a Luc que ela carregava um filho dele, senão ele jamais a deixaria ir embora! Ana sabia que era uma decisão difícil, mas era a única que poderia tomar. Afinal, como viver com um homem morrendo de amor por ele sem ser correspondida?

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Morrendo De Amor (A Passionate Surrender) Bianca n° 801

Helen Bianchin

CAPÍTULO I

Luc Dimitriades não pôde deixar de resmungar ao ler o relatório detalhado sobre o que sua esposa fizera nos últimos nove dias. A maioria dos movimentos dela estava dentro da rotina, mas um deles lhe chamou muito a atenção. Sem pensar duas vezes, pegou o celular e fez a ligação. — Chame Marc Andreas — ordenou à recepcionista, sem maiores explicações. — O doutor está atendendo um paciente, neste momento. — É urgente — Luc disse com firmeza, sem se identificar. Chame-o e ele atenderá. Assim era um executivo acostumado apenas a ser obedecido. Permitia-se a um certo abuso de poder, pelo menos quando muito ansioso. Com o médico, Luc conseguiu a confirmação oficial e apanhou o telefone interno do escritório. Passou instruções claras e objetivas, querendo colocar no mesmo instante seu plano em ação. Mal cabia em si quando se levantou e caminhou em direção à janela, na esperança de que a bela vista que tinha dali o acalmasse um pouco. Havia o design moderno dos edifícios comerciais que o rodeavam, misturando concreto, aço, vidro em uma enorme variedade de formas e tamanhos. Entre eles, as poucas mansões que insistiam em se manter firmes em sua magnitude, esculpidas nas rochas, rodeadas por áreas verdes brilhantes. E, por fim, o mar, em seu indescritível tom de azul. Mas a realidade era que nada daquilo lhe importava, naquele momento. Estava preso apenas a seus pensamentos. Luc se casara cedo, aos vinte anos, com uma namorada de infância. A união durou muito pouco. A morte trágica de sua mulher, em um acidente, ocorreu poucos meses depois do enlace. Desde então, Luc mergulhara no trabalho, passando todo o tempo disponível no escritório, construindo uma carreira de sucesso, com competência e persistência. Casar-se de novo era algo que nem sequer lhe ocorria. Amara tanto, e perdera. Não suportaria se aquilo tornasse a acontecer. Naqueles últimos dez anos, tivera apenas alguns casos passageiros... sem compromissos, sem promessas vazias. Até a chegada de Ana. Ela era filha de um de seus subordinados, e tornara-se aos poucos uma grande companheira de sua madrasta, solitária desde a morte do marido. Planejavam passeios e viagens, e Ana parecia se divertir com ela. Era uma jovem atraente e inteligente, que possuía um delicioso senso de humor. E mais: não estava interessada nele, em seu status ou sua riqueza. A bem da verdade, ignorara-o... até que Luc começou a se aproximar dela.

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Namoraram por alguns meses, conheceram-se na cama. E, pela primeira vez desde o falecimento de Emma, Luc teve consciência de que também era mortal e de que estava desperdiçando, sem perceber, sua existência. Sentiu renascer em si o desejo de ter uma companheira, e ter filhos com ela, planejar o futuro... E quem melhor do que Ana para ser sua mulher? Luc se importava com ela, podia dar-lhe uma posição invejável. E sem dúvida Ana era mais que adequada, em todos os sentidos. O matrimônio fora comemorado apenas entre os familiares mais próximos, seguido por uma lua-de-mel no Havaí. Depois disso, entraram com facilidade na rotina diária, sempre juntos. Tudo correu bem por um ano, até o reaparecimento de Celine Moore, uma antiga namorada, que, depois que se divorciara, parecia decidida a causar-lhe dor de cabeça. Luc cerrou os dentes ao rememorar as várias armadilhas de Celine para forçá-lo a ficar com ela. Ele sempre as tratara como incidentes casuais, e, com sua inegável diplomacia, fazia com que se esgotassem em si mesmos. Mas Celine, por alguma razão, recusava-se a desistir, e acabou tornando-se para Ana um problema difícil de ser contornado. Duas semanas antes, Luc e Ana tiveram uma grande discussão no desjejum. Qual não foi a surpresa ao perceber, quando voltou à noite para casa, que Ana havia feito as malas e partido em um vôo para Golden Coast! Deixou um bilhete, no qual dizia apenas que precisava de alguns dias para pensar. Mas “alguns dias” se tornaram nove. As mensagens que deixava em seu celular não obtinham retorno. O pai dela, quando confrontado, jurava que a filha também não respondia a seus recados. E ele teria várias razões para não mentir. Rebekah, a irmã mais jovem e sócia dela nos negócios, também negava possuir qualquer informação sobre o paradeiro de Ana, a não ser o fato de que, quando partira, fizera reservas em um resort de Golden Coast. Luc não hesitara em contratar um detetive particular. Tudo o que o profissional lhe relatara pelo telefone estava naquele momento registrado em um relatório detalhado , em cima de sua mesa. Os movimentos de Ana só confirmavam as suspeitas de Luc. Ela alugara um apartamento e conseguira um emprego, o que indicava que pretendia permanecer por lá mais do que apenas alguns dias para pensar Entretanto, ele podia lidar com aquilo. Apenas não sabia como fazê-lo. Era apenas isso o que ocupava sua mente nos últimos dias. Lutava contra a vontade de ir até ela, colocá-la embaixo do braço e trazê-la de volta. Devia ter feito algo já no segundo ou terceiro dia, recriminou-se, com raiva, em vez de lhe dar distância e oportunidade, imaginando que fosse voltar correndo, dizendo o quanto precisava dele. 3


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êxito.

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E o pior era que Ana fizera o possível para apagar seus rastros. Claro que sem

Mas com certeza Ana sabia que o marido não concordaria com uma separação tão longa. O telefone em sua escrivaninha tocou. O piloto já fora chamado, e seu carro o aguardava. Era assim: pagava bem e exigia eficiência. Uma hora depois, Luc se encontrava a bordo de seu jato particular, pronto para decolar. Ana cortou os galhos delicados em vários tamanhos, amarrou-os e, com toda sua experiência, desenhou um buquê harmonioso. Era seu terceiro dia como assistente de uma das melhores floriculturas de Main Beach. Entrara na loja apenas em busca de vasos para a decoração de seu novo apartamento, mas o ambiente familiar a cativou, e resolveu perguntar, num tom de brincadeira, se não estavam precisando de uma assistente. Quando falou de sua experiência como florista em uma das lojas mais renomadas de Sydney, o proprietário não titubeou. Conseguir aquele emprego foi como estar no lugar certo, na hora certa. A sorte lhe estendera a mão, ajudando-a a afastar-se de seu casamento conflituoso em Sydney. Um pequeno sorriso se esboçou em seus lábios, ao pegar a bolsa e sair para a calçada, disposta a almoçar. Era um bonito dia de verão, o sol não estava tão quente e havia uma brisa suave vinda do oceano. Sentou-se, como nos últimos dias, em um dos muitos cafés que se alinhavam na Tedder Avenue. A semelhança com alguns dos cafés de Sydney não lhe passou despercebida. Era até fácil se readaptar à cidade em que nascera. Mas não era tão simples esquecer o homem com o qual se casara. Luc Dimitriades tinha tudo o que era necessário para virar a cabeça de uma mulher. Um charme sofisticado, uma aura de poder em torno de si, um físico estupendo... O resultado era mesmo devastador. Os pais dele eram gregos, mas Luc nascera na Austrália. Já na faculdade, começara a trabalhar no mercado financeiro e, por sua própria competência, logo se tornou conhecido e disputado para assumir cargos de diretoria e liderança. Agregando as posses de seus pais a um gênio astucioso, logo passou a figurar entre os homens mais ricos do mundo. Ana precisara apenas de um olhar para se sentir irremediavelmente atraída por ele. Não podia negar que havia entre os dois uma química sexual potente, eletrizante. Para ser franca, havia ainda mais que isso. Muito mais. Luc a afetava como nenhum outro conseguira, e ela se tornara muito apaixonada por ele.

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E foi por essa razão que aceitara sua proposta de casamento, e convencera a si mesma de que seria suficiente se ele jurasse que tomaria conta dela e que lhe seria fiel. Acreditava que com a convivência a afeição dele poderia se transformar em amor. No primeiro ano de união, considerara-se mesmo feliz. Tinha um marido atencioso, adquiriram uma rotina prazerosa e o sexo entre eles era sensacional! Até que Celine entrara em cena, caçadora, desejando sem nenhum pudor Luc como sua presa. Era impressionante como era hábil em minar a confiança que Ana tinha em si mesma e em seu marido. Parecia viver a maquinar artimanhas para atormentá-la. Bastava que Luc chegasse tarde depois de uma reunião de negócios, para que insinuasse que haviam estado juntos. Criava ocasiões para provocar Ana e soltar farpas afiadas. Claro, em momentos nos quais Luc não se achava por perto. Dúvidas e suspeitas, aliadas à raiva e ao ciúme, foram pouco a pouco instilados por ela durante semanas. Mesmo naquele momento, lembrar-se da figura daquela mulher fazia com que Ana cerrasse os dentes de ódio. Luc sempre negou qualquer envolvimento amoroso com Celine, mas fumaça era sinal de fogo. E infidelidade era algo que ela não podia suportar. Discutiram, palavras duras foram proferidas. Seria impossível continuar daquela maneira. Se não havia confiança, não podia haver casamento. Assim, Ana fizera algumas ligações, arrumara uma maleta e embarcara no vôo seguinte para Golden Coast. Além do bilhete, deixara uma gravação na secretária eletrônica do marido. Mas lógico que Luc não iria se satisfazer apenas com aquilo. — Ana? A voz tão familiar trazia uma emoção profunda e um tom de cinismo mordaz. Seu sexto sentido não funcionara para avisá-la da presença dele. Ana levantou a cabeça devagar, e deparou com o olhar de seu marido. Mas não pôde encará-lo. Sentia-se vulnerável, exposta, carente.., e não queria dar voz àqueles sentimentos. Não naquele instante, quando tinha de trabalhar com a cabeça, e não com o coração. Entretanto, bastou um vislumbre, alguns segundos em sua presença, para que suas emoções contidas quisessem se apresentar todas de uma vez. Como era possível amar e odiar alguém na mesma medida? Podia enumerar vários motivos pelos quais devia sentir-se magoada, desejando apenas ferir, do mesmo modo como fora ferida. Por que então o desejo tão forte de aninhar-se nos braços dele, de sentir o toque de sua boca? Forçou-se a dirigir-lhe um olhar seco, analítico. Luc vestia um terno completo, camisa de linho azul-escura e uma gravata de seda impecável, que criavam em torno dele um quê de invencibilidade difícil de se 5


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transpor. Os cabelos negros e sedosos pareciam um pouco mais compridos que o habitual. Logo, Ana já se fixava nos traços marcantes de seu rosto e nos olhos pretos, penetrantes, e nos lábios, que a faziam desfalecer de desejo. Podia sentir a torrente de ira por detrás do aparente controle dele. — Importa-se se eu me sentar? — E se eu me importar? Luc apenas esboçou um sorrisinho, como se pudesse ler seus sentimentos. Sentou-se a sua frente, pediu café a uma garçonete, e tornou a fitar sua mulher. Ana parecia pálida. Com certeza perdera alguns quilos de sua estrutura já delicada. Os sinais abaixo de seus olhos indicavam que não andava dormindo bem, o jeito sombrio mostrava fadiga. Ao contrário de seu estilo atraente, seus cabelos loiros sedosos estavam presos num rabo-de-cavalo. A apreciação silenciosa dele lhe pareceu insuportável. — O que quer aqui, Luc? A expressão dele era neutra, mas ela sabia que ali estava um predador, pronto a apanhar sua presa. Luc ia atacar. A questão era apenas saber quando. — Coma — Luc a incitou, tranqüilo. Ana se zangou ainda mais. — Perdi o apetite. — Peça alguma outra coisa. Ela mal podia resistir à tentação de atirar qualquer coisa naquele rosto arrogante. — Posso saber como descobriu onde eu estava? — Achei que já tivesse essa resposta. — Contratou um detetive concluiu, falando um pouco mais alto. — E ele me seguiu. — Jura que não sabia que eu faria isso? Luc a estivera caçando nos últimos dias. Invadiu seu sono, perturbou seus nervos. A garçonete trouxe o café, e ele pediu a conta. — Pago minha própria refeição. — Não seja ridícula. — O que quer, Luc? Sugiro que fale logo, pois tenho de voltar ao trabalho em dez minutos. — Não tem, não. — O que quer dizer com isso? — Você não tem mais um emprego, e o contrato de seu apartamento já foi cancelado. Ana sentiu o calor se espalhar em suas faces. Estava fora de si! — Você não tem o direito... — Tenho. 6


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Como podia estar tão seguro? Tão tranqüilo! E como controlar a vontade de partir para cima dele a socos? — Não, você não tem! — Podemos continuar essa discussão boba, mas o resultado será o mesmo. — Se pensa que vou deixar tudo, submissa e cordata, e voltar com você para Sydney, está enganado. — Esta tarde, à noite, daqui a dois dias... mas logo. —Olhou-a bem dentro dos olhos. Sua reação primeira foi a de levantar-se mas a mão forte em seu braço impediua de dar um passo que fosse. Sem se conter, Ana atirou nele o açucareiro, observando, estupefata, o modo como ele conseguiu apanhá-lo no ar, sem derrubar um grão de açúcar, e colocá-lo de volta no tampo. — Quero o divórcio! Deus do céu! De onde surgira aquela afirmação?! Até aquele segundo, não conseguira sequer considerar essa opção, em suas longas noites mal-dormidas desde que deixara Sydney. — Divórcio não é uma possibilidade. Luc não perdia o autocontrole, e a fazia sentir-se como que presa numa armadilha. O silêncio ganhava corpo entre eles e a punha mais e mais nervosa. Ana não conseguiu fazer nada quando ele aumentou a pressão em seu braço, de modo a forçá-la a sentar-se. — Não tem algo para me dizer? Não houve tempo. Luc captou a ansiedade em seu semblante antes que Ana conseguisse mascará-la. — Saia daqui e me deixe em paz! — Tente de novo, querida. Ele não poderia saber. Poderia? O sangue parecia fugir-lhe. Nas últimas semanas, já se acostumara a flutuar entre a alegria e o desespero. — Vou facilitar as coisas para você... Está esperando meu filho. — Um filho que também é meu, Luc! — Portanto, nosso. — Seu tom cortante fez com que Ana se arrepiasse. — Recuso-me a ser um mero pai de final de semana! — Foi por isso que veio atrás de mim? Porque de repente tenho algo que quer? O olhar dela tornou-se sombrio. Toda a raiva e mágoa que sentia ameaçavam vir à tona. Esforçava-se por conter as lágrimas. Pela criança que concebera e por si mesma. Por querer o amor de um homem que dificilmente chegaria a amá-la. — Prefiro criá-lo sozinha a viver com ele em uma casa na qual o pai divide seu tempo entre a esposa e a amante. Como poderei ensinar-lhe valores, moral, integridade, num ambiente assim? — Amante? — A entonação dele continuava calma. Calma demais, ela observou, e um arrepio lhe correu a espinha. 7


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— Está me acusando de ter um caso, Ana? — Com Celine. — Sabe que tive um breve relacionamento com ela, há três, quatro anos. — Pelo que essa moça diz, esse namoro continua bastante atual. Pela primeira vez Ana pôde ver alguma emoção no marido. — Ana, por que eu precisaria de uma amante se tenho você? Havia naquela afirmação uma sinceridade que acabou por abrandá-la por um instante. Lembrou-se no mesmo instante do amor que dividiam no leito, do prazer que sentia junto dele e que sempre lhe parecera recíproco. Mas a mágoa falou mais alto. — Talvez porque seja insaciável e apenas uma mulher não seja o suficiente. Ou porque... Ora, droga! Não sou eu quem deve responder a isso! Luc assumiu uma expressão severa, uma máscara implacável. — Não me force a dizer coisas das quais posso me arrepender. — Volte para Sydney, Luc. — As palavras saíam de sua boca sem que as pudesse conter. — Não há nada que você possa fazer ou dizer que me convença a partir com você. — Nada? Ana registrou a sutil ameaça. Sabia que ele tinha uma carta no bolso do colete, e que não hesitaria em usá-la. — Coerção é crime. — Cometer fraudes também. — Luc fez uma pausa, estudando com cuidado as feições dela. Tinha de checar se Ana tinha algum conhecimento dos débitos ilícitos realizados por William Stanford nos seis meses anteriores. — Não entendi. Luc escolheu com cuidado os termos, procurando sentir todo o impacto que causavam. — Os auditores de nosso banco descobriram toda uma série de discrepâncias em cálculos internos. — E o que eu tenho a ver com isso? Ana parecia mesmo muito confusa. — De forma indireta, tem muito a ver, querida. Mesmo um tolo poderia compreender aonde ele queria chegar. — Está querendo dizer que acredita que meu pai está envolvido? — Ana custava a acreditar. — Você não fala sério. Luc puxou um envelope do bolso do paletó e estendeu-o a ela. — Uma cópia do relatório dos auditores. Ana hesitou, mas leu o documento. Era conclusivo, listava cada uma das operações ilegais que haviam sido realizadas e as detalhava. Sentiu-se congelar. Fraude, roubo.., eram a mesma coisa, crimes passíveis de punição.

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Luc observou sua expressão carregada de emoção, e teve a confirmação de que Ana não sabia de nada até que ele lhe contasse. — Foram operações engenhosas — afirmou, com cinismo. Para ser sincero, não sabia o que o irritava mais: se a perda de confiança em um de seus melhores executivos ou o fato de William Stanford haver pensado que suas relações familiares o livrariam de um processo. — Desde quando sabe disso? — Ana indagou, quase sem querer ouvir a resposta, temerosa de que seus receios pudessem ser reais. — Faz nove dias. Ela escrevera aquela carta e deixara sua casa fazia exatos nove dias. “Oh, Deus!” Será que ele imaginara que essa fora a razão de sua partida? — O que você quer, Luc? — Nada de divórcio. Quero nosso bebê. — Esperou um momento. — E minha mulher em meu lar... ao meu lado. — Não me aborreça! Luc ergueu uma das sobrancelhas, com um ar maroto. — Contenha-se, querida. Ana enrubesceu e disse, cheia de fúria: — Acha que pode impor as condições que quiser e que vou me submeter com docilidade? — “Com docilidade”? Não mesmo... E ele ainda brincava! — Bem, vou explicar a meu chefe e ao dono do apartamento que você é um sujeito arrogante e presunçoso que não tem nenhum direito sobre mim! — E seu pai irá direto para a cadeia. Ana estacou e o encarou de um jeito que faria estremecer qualquer outro homem. — E pensa que é você quem faz as regras? — Eu posso fazê-las. — E serei obrigada a continuar casada com você para que não processe meu pai... Não havia a menor dúvida de que Luc encarava o assunto como qualquer outra proposta de negócios. Bem, ela agiria da mesma forma. — E a restituição do dinheiro? — Cuidarei disso. — E o emprego dele? — Já foi dispensado. Dependendo da decisão de Luc, William nunca mais conseguiria colocação em Sydney. E, o que era bem provável, em nenhum outro lugar do país. — Vou ponderar sobre o que me disse. — Ana tentava manter sob controle a ansiedade que ameaçava dominá-la. — Você tem uma hora. Ela cerrou as pálpebras por instantes, prendendo a respiração. 9


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— É sempre tão diabólico ao tratar de finanças? Uma questão estúpida, ela percebeu em seguida. Fora justo a determinação de aço de Luc que o fizera ganhar a reputação de um dos mais temidos negociantes da cidade. Puseram-se a caminhar pela rua, calados. Quando chegaram à floricultura, Ana se voltou para o marido, procurando ocultar a raiva que teimava em se revelar em seu olhar. — Há algumas condições, Luc. — Você não está em posição de impor nada, querida. Será que ele imaginava o quanto a machucava? Apenas vê-lo já fazia com que Ana sentisse uma dor quase física. Pensava nos planos e sonhos que tivera e os via despedaçados, um a um. Resolveu continuar com toda a frieza que conseguira reunir: — Quero sua palavra de que jamais tentará afastar meu filho de mim. Ana sentiu que os lábios dele se moviam, com muita sutileza, com uma emoção que ela não conseguiria definir. — Você a tem. — Exijo também sua fidelidade. — Eu lhe sou fiel desde que a conheci. Ela o estudou por vários minutos. — Não no que diz respeito a Celine. — Se prefere acreditar nela... — Luc deu de ombros, com um cinismo que seria melhor ignorar. — E há mais um pormenor. Era impossível decifrar a expressão dele, e Ana resolveu não tentar fazê-lo. — Quero tudo isso por escrito, antes que eu lhe dê minha resposta. Chegara a seu limite de controle, por isso deu-lhe as costas e entrou na floricultura. — Não estava mais esperando você. — Stiff sorriu, amigável, mas com formalidade, e Ana mais uma vez recriminou a interferência de Luc. — Sou a única responsável por minhas decisões, Stiff —assegurou ao chefe. — Ele não me parece do tipo que aceita um não sem espernear. — Pode esperar até a tarde para definirmos tudo? — Já coloquei um anúncio na agência de empregos. Bem, por que se enganar? — Voltará para Sydney com ele, não é, Ana? — Creio que sim — foi forçada a admitir, antes de guardar a bolsa na estante e dar início a seus afazeres. Concentração era a chave de que precisava, mas era impossível mantê-la na labuta, visto que estava ocupada formulando planos de encontrar um lugar onde Luc não pudesse achá-la. Ele armara uma teia, e ela se via presa e sem saída. Mas aquele jogo apenas começara. E Ana pretendia se sair muito bem, dessa vez. 10


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CAPÍTULO II

Ana sabia que Luc não teria problema algum para preparar os papéis que lhe exigira em tempo recorde. Com seus contatos e sua influência, já deviam até estar prontos. A loja se achava cheia, com muitos pedidos atendidos pelo telefone, muitas pessoas entrando para escolher seus presentes. Pequenos vasos, cestos, buquês para uma visita a um hospital, rosas para namoradas. As requisições eram diversas e variadas. Ana preparava um belo arranjo com juta e papel celofane, quando a campainha da porta soou pela vigésima vez. Ergueu o olhar para receber o cliente e deparou com Luc, que observava seus gestos. Sabia muito bem o que queria, não havia a menor dúvida. A força de sua personalidade a amedrontava. Por um instante, Ana interrompeu o movimento das mãos e ficou com o olhar preso ao dele. Em seguida, baixou a cabeça, fitando o spray dourado que utilizara momentos antes, na realidade sem nada enxergar. Num impulso, conseguiu dar os toques finais no buquê, ajeitando os últimos laços e prendendo o cartão. Quando o colocou na mesa de entregas, ouviu a voz de Luc: — Está pronta? Ele falava com suavidade, parecendo prestar atenção a uma mecha loira, que tornara a se soltar do rabo-de-cavalo. Ana tentou encará-lo com frieza. — Só saio às seis da tarde. O clima da sala mudou de súbito. Podia-se quase apanhar a tensão na atmosfera. Os olhos dele se estreitaram num brilho ameaçador. — Pode se esforçar um pouco mais. 11


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— A loja está lotada. — Consultando o relógio, completou: — Estou certa de que pode aguardar algumas horas. Claro que ele poderia. Entretanto, não parecia inclinado a se submeter à evidente manipulação de Ana. — Uma hora. — Luc lhe deu as costas e se foi. Assim que ele passou pela soleira, a mulher de Stiff, que ouvira a conversa, se dirigiu a Ana: — Você está louca? — Acho que sim... — Ana concordou, procurando parecer controlada. — Corajosa, também. Admiro isso numa mulher. Ana era uma tola se acreditava poder vencer Luc. Mas o fato de ele achar que tinha o direito de ditar os termos e que ela os aceitaria sem discussão a deixava enlouquecida! Como podia ser tão prepotente?! — Vou achar uma pena perder você, querida. Estávamos começando a nos conhecer. — Talvez eu retorne em breve. — Ana sorriu, bem-humorada. A senhora deu-lhe um largo sorriso. — Duvido que o rapaz a deixe afastar-se de novo. Se quiser, pode ir, eu consigo dar conta do resto. — Com as pupilas brilhando com malícia, completou: — Não sou contra uma boa provocação. Estaria sugerindo que Ana não estivesse ali quando Luc retornasse? — Você é malvada... — Boa sorte, anjinho. Se aparecer de novo por estes lados, não deixe de me ligar. Levou cinco minutos até que Ana chegasse ao apartamento e corresse para a geladeira em busca de água gelada. Em trinta segundos, já estava despida e embaixo do chuveiro. Sentia-se tão agitada que terminou depressa o banho, vestiu apenas um jeans e um top, e amarrou os cabelos molhados em um coque no alto da cabeça. Deveria começar a arrumar suas coisas na mala, mas sua teimosia falava mais alto. Além do mais, quanto demoraria para colocar as poucas roupas que havia trazido em uma maleta? Eram cinco horas quando a campainha soou, e Ana gelou. Só podia ser Luc, ninguém mais tinha seu endereço. Resolveu respirar fundo e atravessou a sala. Através da pequena abertura da porta pôde ver quem era. O homem que conhecia com tanta intimidade, e que naquele momento lhe parecia tão ameaçador. Luc estava sem o paletó, que trazia jogado sobre um ombro. Também não usava gravata, os primeiros botões da camisa se achavam desabotoados, as mangas enroladas até o cotovelo. O conjunto lhe dava um ar relaxado, casual, que combinava bem com a expressão enigmática em seu semblante.

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Foi difícil para Ana enfrentar seu olhar procurando demonstrar desprezo, e ignorando as loucas batidas de seu coração. — Recuso-me a ser tratada como uma criança que foge casa e está prestes a ser arrastada de volta por seus pais. — O que aconteceu com o “Olá, Luc, sente-se”? Ana suspirou. — Ah, lógico, a cortesia... Luc arqueou uma sobrancelha, divertido. — Devemos começar de novo? — Não nesta vida. Ele deixou que seu olhar passeasse pelas belas curvas do corpo de Ana, até encontrar os olhos verdes, exalando sensualidade. — Pelo que me lembro, minha relação com você não poderia ser descrita como paternal. Uma nova onda de ressentimento a tomou. — Você dita regras, tira minha liberdade de escolha... — Estou lhe dando uma opção, isso sim, querida. — Ah, sem dúvida! Mas com apenas uma resposta. Luc deu um passo para dentro e bateu a porta. — Esperava de verdade que eu fizesse diferente? — Não, já que seu interesse é pelo bebê. Sem refutar, Luc tirou um envelope do bolso e estendeu a ela. — Aqui está o contrato que pediu. Havia um vislumbre de ressentimento em seu rosto, que não passou despercebido a Ana. Procurou se concentrar nas páginas impressas em sua mão. Várias cláusulas, prevendo cada eventualidade.., e então, o espaço em branco. — Espera que eu assine também? — A idéia de legalizar as coisas foi sua, lembra? Ele estava certo. Mas parecia haver algo errado em colocar sua assinatura ao lado da dele. Luc pegou o documento de sua mão estendida e tornou a guardá-lo no bolso. — Quer pedir alguma coisa ou comer fora? — Comer? Achei que você tinha pressa em voltar... Ana se interrompeu, sem querer dizer “para casa”. — ...para Sydney. — Você precisa se alimentar, meu bem. — Oh, sua preocupação é tocante! — Não brinque comigo. Ana ficou a observá-lo por um instante, pensativa. Luc tinha um apelo sexual inato, parecia emanar poder, força. Como podia ser tão bonito, tão atraente?

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Nos últimos nove dias apenas a imagem dele preenchera sua mente. Era uma tortura lembrar-se de suas formas fortes, do modo como se movia contra a pele dela quando faziam amor... Era muito mais que sexo. Sempre fora. Nos braços dele, toda racionalidade lhe escapava. Transformava-se em uma mulher ardente, atrevida, ávida por dar e receber prazer. Sabia que seu amor não era correspondido, mas podia suportar esse fato. Podia até mesmo dividi-lo com as lembranças de Emma, a primeira esposa de Luc. Mas tudo isso apenas enquanto acreditava que a afeição dele com o tempo pudesse se tornar mais profunda, mais significativa. Não podia dividi-lo com uma mulher de carne e osso. Aquilo era insustentável. No entanto, havia o bebê... Ana queria tanto que seu casamento sobrevivesse! Como isso poderia ser possível, contudo, sem honestidade, confiança? Seria a palavra de Luc, verbal, e não aquela do contrato, suficiente? Palavras eram uma expressão de intenções, não de sentimentos. — Está pronta? — Luc quebrou de propósito o fluxo de suas conjecturas, trazendo-a de volta ao presente. — Não. — Ana empinou o queixo. Enquanto vivesse, não estaria mais “pronta” para ele. Luc armara aquela armadilha, mas não teria mais o direito de saber o que esperar dela. Ele a fitou, desconfiado. — Quanto tempo leva para arrumar suas coisas? Ana trouxera poucas roupas consigo, e os pequenos enfeites que adquirira não teriam lugar na elegante mansão de Luc. — Posso estar pronta em quinze minutos. Ela também podia ser fria. Pelo menos naquele momento. Sem mais nada dizer, atravessou o quarto, abriu a mala vazia no chão e começou a arrumá-la. Percebeu que Luc se dirigia à cozinha. Abriu a geladeira para tomar água. Em seguida, ligou para seu piloto passando-lhe os detalhes do vôo. Não havia, na opinião dele, por que atrasar o inevitável. “Não olhe para trás”, Ana ordenou a si mesma, ao caminhar para o carro de Luc. A primeira parada foi no restaurante de um dos hotéis próximos, já que ele mantinha sua posição de que Ana precisava se alimentar. Mas ela mal conseguiu provar a comida. — Não sente fome? Ana o encarou. — Não. Se Luc sugerisse que devia comer mais, ela não teria dúvidas em atirar o prato, e tudo que restava na mesa, direto sobre ele. Porém, Luc ofereceu, gentil: — Talvez algumas frutas... 14


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Embora ele esperasse por uma resposta, Ana não a deu. O pedido foi feito ao garçom. Na realidade, as frutas frescas e geladas pareceram-lhe tão convidativas que Ana conseguiu prová-las. Não podia deixar de fitar as mãos dele. Não apenas para seu desenho tão masculino, mas para a textura da pele e para a força que ela sabia possuírem. Luc tinha habilidade de fazer com que nada no mundo importasse quando a tocava com seus dedos longos. Como podia seu coração se acelerar ante a mera recordação? Química sexual. Não havia outra conclusão. Vigorosa, letal. Meia hora depois, chegavam à pista, prontos para embarcar no jato luxuoso que os levaria de volta a Sydney. Com suavidade, o avião alçou vôo como um grande pássaro pelo céu, e Ana fechou os olhos, sem nenhuma disposição para conversar com o marido. Suas idéias eram confusas e cheias de ansiedade. Seu pai, Rebekah, a loja de flores... E pior, Celine Moore, sua pior inimiga. Quem ganharia? A esposa ou a amante? Ausentar-se por mais de uma semana não resolvera nada. Os problemas a esperavam, talvez agravados.

CAPÍTULO III

— Boa noite, sra. Dimitriades. Ana respondeu ao cumprimento sorrindo para Petros, que lhe abria a porta do carro. Luc já dera a volta pelo outro lado, e se preparava para sentar-se ao lado dela. Àquela hora da noite, as estradas estariam livres, e eles não demorariam a chegar a Vaucluse, pensou, recostando-se no banco confortável e observando os arredores através da janela. Luzes brilhantes, os luminosos de néon... A grande cidade quase emudecida pelo horário. Aquele era seu lar. O lugar onde nascera e crescera, tão familiar.

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Procurou por um assunto seguro para conversar com Luc, mas para que fingir? Não tinha a menor vontade de lhe dirigir a palavra. Vaucluse era um bairro elegante, com uma linda vista do porto, e a mansão de Luc era muito bem localizada e segura. Toda construída em linhas firmes e quadradas, tinha um ar imponente. O toque de suavidade ficava por conta dos jardins extensos, com espécimes variadas de flores e folhagens, de que Petros cuidava com tanto carinho. Ana sentiu-se muito tensa quando o portão eletrônico se abriu. O veículo parou, e ela sem demora abriu a porta e saiu, percebendo o olhar frustrado de Petros, que se preparava para ajudá-la. Foi obrigada a esperar que Luc desativasse o sistema de segurança e destravasse a porta dupla da entrada. Entra ram lado a lado, e Ana pôde rever o hall tão bem decorado com seus quadros e as estátuas, obras de arte caríssimas que faziam tão bem ao olhar. O piso de mármore claro, que combinava tonalidades pastel, se estendia à refinada sala de jantar, mais utilizada em ocasiões formais. Do lado oposto, viam-se várias salas em desnível, menores e mais aconchegantes. Mas o que mais causava espécie nesse andar era a escada de mármore suntuosa que levava aos quatro dormitórios superiores e às salas de estar privativas. — Trarei refrescos. — E Petros seguiu em direção à cozinha. — Para mim, não. — Ana procurou suavizar sua recusa com um sorriso suave, dirigindo-se em seguida à escadaria. Não queria continuar ali nem mais um instante. Luc seguiu seus passos, e assim que terminaram de subir ela se virou para encará-lo. — Irei para outro quarto. — Não. — Como assim?! — Achei que minhas respostas fossem claras. — Não quero dormir com você! — Talvez não essa noite. — Luc notou o lampejo de dor nos olhos verdes, visível por apenas um instante. — Nem esta noite, nem nunca mais! — Está assim tão decidida, Ana? Ela sentiu o sangue subir de novo a seu rosto. Queria gritar, esmurrá-lo, fazer qualquer coisa que extravasasse a ira que sentia. Como Luc podia se sentir tão poderoso? E como podia ela ser tão inábil para lidar com o marido? Estava presa em uma rede. Presa a Luc, pela criança que carregava em seu ventre. Presa a ele pela lealdade que tinha em relação a sua família. Segurando a maleta, Luc adiantou-se, e Ana ficou a observá-lo entrar na suíte principal, de onde voltou segundos depois com as mãos vazias. — Deixe-me em paz, Luc! 16


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olhos.

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Ele parou perto dela e segurou seu queixo, forçando-a a olhar direto em seus

— Cuidado, pedhaki mou. Posso me sentir tentado a fazer coisas que nem imagina! A zanga de Ana cresceu perante a tranqüilidade com que ele a ameaçava, e seus lábios tremeram de leve ao sentir a proximidade dos dedos dele, que escorregavam por sua face. — Não me assusto com tanta facilidade. — Uma de suas admiráveis qualidades. — E Luc a deixou, retornando à escada. Ele iria, Ana sabia, checar com Petros se havia algum recado, verificar seus emails, fazer chamadas e lidar com os documentos inadiáveis, o que poderia levar uma hora, ou mais. Isso lhe daria tempo para... Fazer o quê? Arrumar-se?, Ana pensou com ironia, entrando na suíte e caminhando mais alguns passos. Nada mudara. Porém, teria ela acalentado essa ilusão? A cama enorme, feita em madeira escura talhada, já se encontrava preparada com os finos lençóis de linho, bordados com exclusividade para o casal. Ocupava um lugar de destaque no aposento, que também possuía outros ambientes. O sofá de veludo macio, adornado com almofadas, fazia parte de um deles, aliás o preferido de Ana. Aconchegante, feito para o prazer... para prazeres sensuais. Um arrepio percorreu-lhe a espinha. Tensão, ansiedade. Amaldiçoou as memórias do que vivera com Luc naquele lugar. Lembranças vívidas de encontros eletrizantes, onde nem culpa nem vergonha tinham lugar. Como poderia escorregar para baixo das cobertas e fingir que nada havia acontecido? Teria de encarar a situação. Mas não naquela noite. Tudo o que queria era tirar sua roupa e dormir. Apagar todos os pensamentos que se misturavam em sua cabeça. Sabia que tinha de ligar para seu pai, sua irmã, avisá-los de que voltara. No entanto, não conseguiria. Tudo o que acontecera naquele dia, o vôo, o nervosismo de estar ao lado de Luc, combinados aos efeitos da própria gravidez, fez com que pegasse no sono segundos depois de colocar a cabeça no travesseiro. Acordou aos poucos, com uma sensação agradável.., ainda um tanto desorientada a respeito de onde estava. E então tudo foi se organizando... o retorno... Sydney... Luc. Seus olhos se arregalaram ao reconhecer a suíte, o leito tão grande e a presença familiar do homem deitado a seu lado, olhando para ela. Como podia estar ali, quando na noite anterior... — São quase sete horas.... — Luc falava com indolência. Ana ficou a analisá-lo por alguns instantes, o coração quase deixando de bater. Então ele se ergueu com facilidade, sentando-se. Ana admirou a beleza dos músculos bem torneados e da pele bronzeada. 17


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A penugem do peito largo causava-lhe frisson, tão grande era a vontade de tocá-la. Queria abraçá-lo, atrair a boca do marido para junto da sua. Mas não fez nada disso. Pelo contrário, deixou que sua ira voltasse de novo à superfície e se afastou para mais longe do marido. — Não tem o direito... — Tenho, sim. — Luc ergueu a mão e, com carinho, afastou uma mecha de cabelos do rosto dela. Ana se ergueu de um salto, mas, mais rápido que ela, Luc enlaçou-a, impedindo que se afastasse. — Deixe-me ir! — Não. Voltando-se contra ele, esmurrou-o com raiva, enquanto Luc a forçava a deitarse em seu colo. Não era uma boa posição, Ana logo descobriu. Ficava próxima demais do marido. E as ordens de seu cérebro eram muito diferentes das que ditavam seus sentidos. Contudo, o terror de sucumbir mais uma vez era maior do que podia agüentar, e ela tentou se soltar, consciente de que lutar contra Luc seria um exercício vão. — Não faça isso — fez o pedido, carregado de dor. — Por favor. Seu tom pareceu, enfim, tocá-lo. Luc olhou-a fixo, como a examinar seu semblante, a tentar entender o que sentia de verdade. Os olhos dela eram profundos o suficiente para que mergulhasse neles. Pareciam tão vulneráveis, as emoções tão à flor da pele, que o envolveram, um nó se formando em sua garganta. As lágrimas rolaram pelas faces de Ana, sem poderem mais ser contidas. Com extrema delicadeza, Luc secou-as com o polegar, inclinando em seguida a cabeça para beijar-lhe a face. Num gesto contínuo, sua mão desceu um pouco para apoiar-se na barriga dela. Ali estava seu bebê. Um pequenino embrião que crescia e ganhava força. Nunca experimentara nada tão forte como quando soubera de sua existência. — Venha tomar um banho comigo. — Não, Luc. Não. Ele não imaginava o quanto lhe custava aquela recusa. Mas não podia dar ouvidos ao coração e retomar o relacionamento como se nada houvesse acontecido. Luc pensaria que ela não se importava por ser ameaçada, por ser forçada a continuar casada, que não se importava com a traição. E Ana o odiaria ainda mais por isso. Bastava trazer à lembrança de novo a figura de Celine, para ter a certeza de que era necessário que se afastasse dele. Escorregou para longe, sabendo que só fizera isso porque ele permitira. Dirigiuse ao banheiro, fechando a porta. Vinte minutos depois, de banho tomado, Ana sentia-se bem melhor. Petros já a esperava com o café da manhã preparado: ovos mexidos e café fresco. Podia até sentir o aroma delicioso. 18


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— Preparei seu chá, senhora. — Mas eu prefiro... — Chá. Cafeína não é recomendada durante a gestação. Ana fez uma careta. — Está muito mandão, não acha? Posso levar isto? —Ana segurava uma bandeja. Estava morrendo de fome. — Ora, por favor, sra. Dimitriades! — Petros a fitava, com indignação. — É evidente que não! — Não acha que podia me chamar de Ana? Afinal, tenho idade para ser sua filha! Petros empertigou-se. — Você é a esposa de meu patrão. Não poderia tratá-la de modo tão familiar. Ana não conseguiu conter uma risada. — Mas você o chama de Luc. — Já nos conhecemos há muito tempo. — Nesse caso, quanto terei de esperar até que me dê a honra de me chamar pelo primeiro nome? — Cinco anos — afirmou, solene, transferindo com destreza o bacon frito para o prato, arrumando-os um a um ao lado dos ovos. — Pelo menos. Ana deu a batalha por perdida. Apanhou a bandeja que Petros acabara de preparar, e dirigiu-se à porta. A pequena sala de jantar familiar se localizava na parte de trás da residência e tinha uma agradável vista para a piscina, recebendo bastante claridade do sol da manhã. — Ovos mexidos a seu dispor... Luc estava sentado à cabeceira da mesa, o jornal do dia aberto a sua frente, uma xícara de café pela metade. Seu paletó fora pendurado no espaldar, e por cima estava a gravata. A maleta e o laptop se encontravam no chão, ao lado dele. Levantou o olhar ao ouvir a voz dela, e disse, divertido: — Como conseguiu isso? — Artimanhas femininas. — E pôs-se a distribuir os pratos no tampo, colocando também o café, o chá e os ovos. Feito isso, puxou uma cadeira e sentou-se. Serviu-se de chá, leite, ovos, torradas... “Céus!”, ela pensou, depois de provar a refeição. “Ninguém faz ovos como Petros!” — Vai ligar para seu pai e para Rebekah? — Para papai, assim que terminar de comer. Depois irei para a loja. — Não para trabalhar. Havia um tom de comando que a arrepiou. — Claro que vou para trabalhar, Luc. — Não há necessidade disso. — Está falando tão só de hoje? — Não. — Parecia não haver nada para esclarecer. — Pela gravidez? 19


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— Não vejo motivo para que fique de pé o dia todo, para que se esforce tanto. Ana apoiou o garfo no prato, com cuidado, e se afastou um pouco. — Prefere então que me junte às damas da alta sociedade, passe a tarde fazendo compras e nadando como um belo cisne no lago. — Pode continuar como sócia da loja, se quiser, mas deixe que Rebekah contrate uma funcionária para auxiliá-la. — Não. — Não estou lhe dando escolha. Ana decidiu ignorar os modos autoritários do marido. — Não tente me manipular, Luc. — As íris verdes e brilhantes faiscavam. — Não vou suportar isso. — Termine seu café. — Perdi o apetite. — Ana fez menção de se levantar. — Tenho algumas ligações a fazer. Luc segurou seu braço, impedindo-a de afastar-se, dano-lhe a certeza de que não adiantaria tentar puxá-lo. — Peça a Rebekah que contrate sua substituta. — Aqueles que o conheciam bem não se iludiriam pela entonação doce. Reconheceriam por trás dela o predador. — Ou eu o farei. Ele esperou um instante. — De todo modo, diminua ao mínimo sua permanência hoje por lá. — Não me aborreça! Luc a encarou com frieza. — É melhor fazer o que digo. Ana resistiu à vontade de responder quando ele a soltou. Optou por manter-se em silêncio e seguiu para o terraço, descendo em seguida alguns degraus para o jardim. Só então telefonou para William e convidou-o para o almoço. O pai tinha uma reunião de negócios logo mais, e propôs o dia seguinte. Parecia disperso, ansioso... Arrependido? Ana queria respostas, queria saber o porquê de um homem conhecido por sua honestidade e lealdade haver feito algo tão diverso a seu caráter. E teria de escutar aquilo da boca dele. Todavia, não seria naquele dia. Resolveu se conformar, ao caminhar de novo para a mansão.

CAPÍTULO IV

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Petros estava limpando a mesa quando Ana entrou na sala de jantar. — Luc já foi para a cidade, senhora. — Preciso das chaves de meu carro. O criado continuou colocando as louças usadas na bandeja. — Receio que não seja uma boa idéia. Ana lançou-lhe um olhar irritado. — Luc está ciente de meus planos para hoje. — Mas não concorda com eles, não é? — Tenho coisas para fazer, lugares para ir. — A loja — Petros concluiu. — Onde vai ficar trabalhando o dia todo. — Tenho de cuidar de meus negócios — Ana disse com firmeza. — Luc vai desaprovar isso. Ela pegou a pasta e a bolsa, alcançou as chaves do automóvel e virou-se para partir. — Fique tranqüilo. Farei com que ele saiba que me avisou. — Eu levo você. — Obrigada. — Ana sabia do grau de lealdade de Petros ao patrão. — Mas não é preciso. A loja ficava localizada em uma galeria com várias butiques de renome, e tinha uma clientela regular. Rebekah possuía muito talento com a arte dos arranjos florais, e Ana cuidava da administração, da contabilidade, fazia pedidos, atendia os clientes. Fitas, tesouras, arames e um toque de magia haviam feito com que a Laços e Toques ficasse muito conhecida e fosse renomada na cidade. Ana inspirou fundo o aroma que preenchia o ar, doce e inebriante. — Ana! Que bom vê-la! Quando chegou? — Na noite passada. Um abraço tão afetivo fez com que sua depressão viesse de novo à tona. A irmã percebeu no mesmo instante. — E então, o que está havendo? — Como assim? — Não entendi nada das mensagens que deixou na secretária eletrônica. E não acredito que Celine tenha sido a única razão para sua partida — Rebekah foi logo dizendo. — Sendo assim, comece! Ana podia tentar desviar o assunto, mas para quê? — Estou grávida. Houve uma surpresa inicial, mas logo em seguida sua irmã abriu um grande sorriso afetuoso, a expressão terna. — E por que você não chegou aqui dançando e pulando para comemorar? — Não foi planejado. Rebekah lançou-lhe um olhar de quem sabia que faltavam informações. — E é esse o problema? 21


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— Não exatamente. — O que a está aborrecendo? Não quer me contar de que se trata? Ana permaneceu em silêncio por alguns segundos, e Rebekah falou, ainda mais carinhosa: — Você contou a Luc o que Celine fez? O quanto ela tem sido destrutiva? Que diferença faria? — Não. —Não acha que deveria? — Posso lidar com Celine. — Querida... — Rebekah a preveniu, quase em tom de censura. — Dê-lhe meia chance e ela a engolirá e cuspirá fora antes que perceba o que está acontecendo. Ana deu um sorriso sem graça. — Obrigada pelo voto de confiança. — Fico preocupada com você... O que mais está havendo? Vamos, me conte! Ana titubeou entre revelar ou não o que ocorrera com o pai delas. — Não se preocupe, Rebekah. Acho que posso jogar todo o resto na conta de uma alteração hormonal — despistou, dando de ombros. — E apenas por um palpite, meu querido cunhado não preferiria que sua esposa ficasse em casa? — Pode apostar. — Por que está aqui, então? Um pequeno sorriso se esboçou em seus lábios. — Você me conhece bem. — Sim, mas com o não quero que Luc me esfole viva, não deixarei que faça nenhum serviço pesado, certo? Você só carregará pedaços de papel, e nada além disso! — Vou tentar. — E tirará duas horas de almoço. — Rebekah, não preciso disso! — E só fará o trabalho com o computador. Ana assumiu uma expressão de vítima. — Quem disse que você foi nomeada minha chefe? — Eu. — Rebekah piscou, marota. — E se eu não a obedecer? — Você pode até tentar... Trabalharam juntas, com a facilidade da experiência. As entregas foram feitas no horário, os pedidos, encaminhados de forma correta, e ainda houve tempo para uma tarefa das mais prazerosas: auxiliar uma noiva a escolher o buquê para dia de seu casamento. Ana ajeitava as rosas que haviam acabado de chegar, maravilhosas, com sua cor vívida, quando Rebekah lhe entre o telefone sem fio. — O pai de seu filho. Ana ajeitou os cabelos. — Alô? 22


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— Pensei que havíamos concordado que você limitaria seu tempo aí. — Não me lembro de ter aceitado sua sugestão. — Essa teimosia não leva a nada. — Teimosia? — Ana... — A voz dele tinha um quê de advertência que ela se esforçou por ignorar, permanecendo calada. — Discutiremos isso mais tarde. — Mal posso esperar. — E desligou, antes que o marido tivesse a chance de dar a última palavra. Não foi uma boa estratégia, pois jantariam com amigos aquela noite. Correção: Com alguns colegas de Luc e suas parceiras, esposas, namoradas, e amantes. Ana tinha certeza de que Celine se incluiria no grupo, como um gato entre pombos. A magnífica Celine, a rainha dos felinos.., perigosa e fatal. As mulheres se incomodavam com seu poder, os homens ficavam atordoados com sua incrível sensualidade. Deixar de comparecer ao jantar estava fora de questão, e Ana ficava mais e mais tensa com o cair da tarde. — Vá para casa — Rebekah a aconselhou. — Posso cuidar de tudo até o horário de fechar. — Não está cansada? — Nada em que um bom banho e um retoque na maquiagem não dêem um jeito. Ana olhou-a, sem alternativa. — Obrigada. — Não há por quê. E, Ana, vista uma roupa bem charmosa e coloque Celine no chinelo. — Como se fosse possível... — Dentre outras vantagens, você tem a aliança de Luc no dedo e carrega o filho dele na barriga. — A aliança não surtiu muito efeito. O que a faz crer que com a gravidez será diferente? — Estamos falando de Luc, meu bem, e não de alguém como o rato com que me casei, e de quem me divorciei em tempo recorde. Ana sabia do impacto que o divórcio tivera sobre a vida de sua irmã. O sentimento de rejeição, o coração partido. Três anos curaram as feridas superficiais, mas a decepção e a desconfiança em relação ao sexo oposto ainda permaneciam. Apenas quem conhecia melhor Rebekah sabia que sua aparente prepotência era apenas uma concha em que se escondera para não sofrer demais. Como reagiria se soubesse que seu cunhado usara de ameaças para trazer a irmã de volta para casa? — Vá! Rebekah ordenou. — Arrumarei o resto. — Isso não é justo. — Ajeitar as flores recém-chegadas era um de seus maiores prazeres. — Estou grávida, e não doente. Além disso, já teve de fazer tudo sozinha enquanto estive fora. 23


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— Não acho que Luc se convencerá com esse argumento. — Luc não manda em mim! Melhor não pensar muito sobre isso, Ana decidiu, ao enfrentar o trânsito na volta para a mansão. — Luc irá se atrasar por meia hora, sra. Dimitriades. — Ana — corrigiu pela enésima vez, consciente de que talvez jamais ganhasse essa batalha com Petros. O homem muitas vezes parecia estar num campo militar. Não se podia calcular sua idade e havia uma severidade em suas maneiras que causavam alguma dúvida sobre sua real posição na casa. Era mordomo, motorista, e Ana não se surpreenderia se agisse como um guarda-costas. Quando fizera essa pergunta ao marido, Luc afirmara que Petros já fora empregado de seu pai antes de trabalhar com ele. — Seria desrespeitoso de minha parte tratar com familiaridade a esposa de meu patrão. Exasperada, Ana exclamou: — Oh, esqueça! — e afastou-se apressada, subindo as escadas. Deveria ser fácil escolher o que vestir com tantas opções, mas era justo isso o que complicava tudo. Um vestido preto clássico ou um vermelho escarlate? Talvez a túnica esmeralda? Ou um tom pastel com um lenço de seda? Quinze minutos depois, Ana jogava em cima da cama uma calça elegante de seda preta, uma camisa transparente da mesma cor, colares e brincos combinando e sandálias altas de saltos finíssimos. Claro que escolhera sua roupa íntima em renda também preta. Quando saiu do banho, Luc ainda estava tirando a roupa, e o coração de Ana falhou uma batida vendo-o livrar-se da camisa. Os ombros largos eram acentuados pela musculatura firme e pela pele rija, bronzeada. Os pêlos espessos do tórax desapareciam, provocantes, pela linha da cintura. Ana tinha uma memória vivida do contato com aquela carne quente, a sensação dos músculos fortes sob seus dedos... seus lábios. Do corpo dele escorregando sobre o dela, de sua respiração forte e entrecortada quando estava por perder o controle. Lembrava-se mesmo de seu próprio gemido quando se perdia no auge de todas as delícias, quando cada ponto parecia carregado de eletricidade... Genuína, sem pudores, sem censura. Luc tirou também a calça, deixando transparecer toda sua anatomia em detalhes. Ana suspirou, enlevada. Mas qual era o problema com ela? Ali parada, aquele tempo todo, paralisada ante a mera visão de seu marido seminu? Como podia ficar tão excitada ao vê-lo se acreditava possuir todos os motivos da face da terra para odiá-lo? Sentou-se na beira da cama e começou a vestir suas meias finas, passando-as bem devagar pelas pernas, depois pelas coxas... Sem querer, seu olhar se voltou e se viu preso ao dele. 24


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Por um instante que pareceu eterno, o mundo deixou de existir. Havia apenas Luc e a magia que os unia. Perigosa, letal. Com movimentos de uma lentidão avassaladora, Luc se despiu por inteiro e caminhou pisando duro para o banheiro. Passaram-se ainda alguns segundos até que o barulho do jato de água do chuveiro quebrasse o encantamento, e Ana conseguisse respirar com regularidade. Ainda trêmula, pegou seu vestido e deslizou para dentro dele, fechando o zíper. Os cabelos e a maquiagem demoraram um pouco mais do que previra. Seus dedos inseguros não ajudavam em nada na tentativa de pintar os olhos, e pelo mesmo motivo precisou fazer e refazer o penteado duas vezes para conseguir um resultado próximo ao desejado. Escutou Luc retornando ao quarto, e percebeu a rápida avaliação que fazia dela. Sentindo o sangue correr rápido nas veias, procurou escolher com cuidado a única jóia que usaria. De nada adiantava que Ana estivesse atenta ao farfalhar da seda que roçava o corpo dele e ao ruído do linho da camisa que tocava sua pele... que pudesse imaginar com exatidão a calça que Luc colocava sobre as coxas grossas e cobertas de pêlos negros e espessos, e que pudesse ouvir o mínimo som do zíper se fechando. Ela não faria nenhum movimento em sua direção. Não podia negar que a epiderme se aquecera com um calor sensual e seus seios chegavam a doer por não poder tocá-lo, abraçá-lo. Será que Luc também sentia alguma coisa? Ana duvidava disso. E ela estava presa a uma rede de orgulho, raiva e ressentimento, que a impedia de tomar a iniciativa de aproximar-se. Será que Luc estava jogando? Para um homem sempre tão ardente... De súbito, a dor em seu peito transformou-se em horror, Ana sentiu-se paralisar. Será que ele havia se encontrado Celine em sua ausência e por isso não a desejava mais? A mera possibilidade quase a impediu de respirar. Não. Luc jurara que não lhe faltara com a fidelidade. Até havia documentado isso. Mas podiam ser apenas palavras. Celine era uma mulher sedutora, muitos homens teriam dificuldade em resistir a seu charme. Os homens são filhos de Marte, as mulheres, de Vênus, não era assim? Bem traduzido, isso queria dizer que são as mulheres que buscam amor. Homens buscam sexo. — Problemas? Já fazia algum tempo que tentava prender a gargantilha, e nem se dera conta disso. — Não, nenhum. Mas suas mãos tremiam, tornando dificílimo encontrar a conexão entre os pequenos elos. Com a agilidade de um gato, Luc cruzou o aposento e, tomando a jóia, prendeu-a com facilidade. 25


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Será que ele havia ficado ali alguns segundos além do necessário? Será que tinha roçado os dedos contra seu pescoço de propósito, ou fora apenas um toque acidental? “Contenha-se!”, ordenou a si mesma, sentindo a necessidade de acabar logo com aquela tortura. Com firmeza, ergueu-se nos saltos finíssimos e pegou a bolsinha para a noite. — Está pronta? — Tanto quanto poderia estar. Seus anfitriões residiam em uma mansão antiga, toda restaurada, no coração de Double Bay. Era interessante sua localização, já que seus vizinhos eram os cafés, as casas com terraços estreitos que haviam sido transformadas em butiques. Via-se muito movimento na rua. Quando chegaram, dez convidados já estavam reunidos no magnífico saguão, e Ana sentiu um enorme alívio ao não avistar Celine. Pediu um suco de laranja e se incluiu em uma conversa sobre as novidades que o mercado trazia em termos de cosméticos. “Excelente assunto”, decidiu, evitando avaliar as prioridades que algumas mulheres escolhiam para suas vidas. Conseguiriam elas manter fiéis seus ricos maridos, tão disputados? Ou os perdiam na primeira esquina para moças mais jovens, que aguardavam nos bastidores, prontas para agradá-los? Manicuras, pedicuras, tratamento para os cabelos, massagens faciais, banhos, cremes, bronzeamento artificial... Somados às jóias caríssimas e às confecções sob medida. Tudo o que sonhavam que lhes traria a imagem almejada. Quanto mais os anos passavam, mais desesperadas ficavam. Tratamentos na América, na Suíça, França eram vitais. A busca não tinha fim. — No que está pensando, querida? — Você não seria capaz de adivinhar. — Ana ficou sem graça, percebendo que desviara a atenção das obras de arte de um mestre em cirurgia plástica, cuja fama crescia a cada dia. — Ele é mesmo incrível. Maravilhoso. Precisa conhecê-lo. —Na primeira oportunidade... — Ana começou a dizer, quando sentiu que era enlaçada pela cintura. Pedindo licença, Luc se afastou alguns passos com ela, antes de falar, aborrecido: — Tema profundo, não é? “Incrível, maravilhoso...” quem é esse deus a quem se referiam? — Fez uma pequena pausa — Ana, precisa se manter tão longe de mim? — Esqueci que temos de desempenhar bem nosso papel. — Papel? — De que vivemos um casamento feliz. Luc estreitou os olhos. — Cuidado, querida. Minha paciência tem limite. — A minha também. 26


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Foi naquele preciso instante que todos se viraram na direção da entrada, por terem ouvido o som da risada rouca feminina que cumprimentava os primeiros conhecidos. Celine Moore. Os cabelos escuros e sedosos estavam cuidadosamente presos em um coque alto, que deixava algumas mechas soltas caindo, muito sensuais, por seu rosto. A maquiagem era perfeita. Aquela mulher poderia concorrer com qualquer super-modelo internacional. E ainda havia que se acrescentar o olhar sedutor e as curvas irrepreensíveis. Não havia como negar, ela era esplêndida! Vinha acompanhada por um homem belíssimo, quase demais para um simples mortal. Seria modelo? Talvez um acompanhante de aluguel? “Que maldade!” Ana sorriu, disfarçando, com cinismo. Os cumprimentos de Celine pareciam a Ana por demais afetados para serem genuínos, seu sorriso carecia de afetividade. Como um míssil teleguiado, ela caminhou rápido até Luc, deixando claro para todos os presentes quem ela viera encontrar naquela festa. Ana podia quase ouvir a ameaça não verbalizada, e sentiu que seu estômago se contraía com a tremenda antipatia. — A atração da noite chegou — ela comentou, procurando manter uma entonação desinteressada, sentindo que os dedos do marido apertavam com um pouco mais de força sua cintura. — Comporte-se. — Não sonharia em fazer nada diferente disso. — Ana mal terminara a frase quando sentiu o aroma do perfume caríssimo de Celine, que se postara à frente deles. — Luc, querido! Os lábios dela estalaram ruidosos no rosto dele, fazendo muito mais do que o necessário para um cumprimento amigável. Ana por pouco não foi obrigada a cerrar os dentes para se conter. Claro que na hora do jantar Celine manipulou os lugares. Uma pessoa podia até se divertir com tamanho descaramento, Ana decidiu com resignação, ao sentar-se diante do acompanhante dela. Existiam muitas formas de se aproveitar uma noite, e observar seu marido sendo devorado vivo por sua ex-amante não era uma delas. Uma pena que não pudesse tomar nem uma taça de vinho para relaxar um pouco. E nem a comida a distraía. Na realidade, pelo modo como seu estômago vinha se comportando, era mesmo difícil saber se comida de qualquer tipo seria recomendável. — Está fazendo dieta, querida? — É sempre bom ser equilibrada. — Ana não faltava com a verdade. Iria precisar de muito equilíbrio nessas horas em que passariam juntas. Celine lançou-lhe um olhar desanimado, e tornou a encarar Luc com um sorriso sensacional. A conversa à mesa continuava fluindo, assim como o vinho. Ana imaginou se era a única a perceber o comportamento cada vez mais sedutor de Celine. Em determinado

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momento, olhou para Luc direto nos olhos e umedeceu os lábios, como a despertar lembranças. Ana mordeu a língua. Mal continha a vontade de atirar o vinho e a taça em cima dela. No mínimo para diminuir um pouco o fogo da oponente. O problema era que uma cena daquelas causaria uma situação imperdoável, que faria com que ela própria se sentisse muito mal. Mas foi durante a sobremesa que Ana sentiu alguma coisa tocar sua perna. Um toque acidental, ou feito para chamar sua atenção para o fato de que Celine roçava a perna de Luc, ou algo pior, por baixo da mesa com a ponta do pé. «Basta!” — Perdeu seu sapato, Celine? — Não. Por que pergunta? Ana tinha de lhe dar o crédito. Ela era uma excelente atriz. Melhor desistir. Aquele não era nem o momento nem local para um show particular. Com a mão esquerda, começou a picar o guardanapo por baixo da mesa, para em seguida sentir a mão de Luc sobre a sua. Com qual propósito? Um ato de compaixão ou uma tentativa de fazê-la não ver os movimentos de Celine? Num gesto rápido, ela afastou a mão para uma das coxas dele e cravou nela as unhas com toda a força de que dispunha. Ele também era um perfeito ator. Ninguém perceberia a batalha que se travava por baixo daquela toalha. Luc apenas tomou sua mão com delicadeza e levou-a aos lábios, num gesto que fez Ana corar. Apenas ela podia perceber a frieza escondida sob aquele falso carinho. Manter toda a educação nas horas que se seguiram exigira muita habilidade. “Acostume-se a isso”, seu íntimo a avisava. Ana tentou não reagir quando Luc a enlaçou, conduzindo-a para a saída. Ainda demorou algum tempo até que o último “boa noite” fosse dito. Despedidas, combinações para novas reuniões, comentários sobre as que já estavam marcadas, a demora inevitável. Ao entrar no automóvel, Ana recostou a cabeça no assento e cerrou as pálpebras. Não queria rememorar as atitude de Celine, nem nenhum outro assunto desagradável. Uma música suave fluía das caixas acústicas, e depois d um suspiro, seus músculos tensos começaram a relaxar. Uma parte dela queria chorar pelo amor que não podia conquistar, outra, queria agredir Celine por tirar-lhe o pouco que conseguira. Mas, como sempre, Ana nada fez, e quando o carro entrou na garagem, ela saiu bem depressa. Tão logo Luc desativou o sistema de segurança, dirigiu-se a seu quarto, sem dizer nem uma palavra. Ele não a seguiu. Ana tirou a roupa, limpou a maquiagem, soltou os cabelos e caiu na cama. 28


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Só bem depois Luc entrou na suíte. Sem demora tirou gravata, camisa, calça e paletó, descalçou os sapatos e, antes de se aproximar do leito, observou sua mulher. Ana parecia tão vulnerável no sono... quase frágil. Tudo o que ele queria era poder deslizar seus dedos pela pele aveludada, sentir sua maciez, afastar a mecha loira que caía sobre sua face. Ana era tão feminina! Os ombros delgados, os braços torneados e as mãos finas. Tão habilidosas, rápidas, suas unhas bem-feitas. Luc sorriu lembrando-se de como Ana lhe cravara as mesmas unhas na carne, e dos motivos pelos quais fizera aquilo. Sabia que podia entrar embaixo das cobertas e tocá-la. Perdida no sono, Ana não resistiria. Sabia muito bem como se arrepiaria quando tocasse sua nuca com os lábios, que soltaria um gemido suave quando lhe beliscasse os mamilos bem de leve.., e como lhe provocaria uma resposta imediata se colocasse a mão na parte úmida entre suas coxas. Saberia como persuadi-la até que fosse sua. Mas a queria desperta, voltando para ele porque sentira, e coração, sua falta. Queria a Ana ardente, cheia de volúpia, como sempre fora. E mais, muito mais que isso. Queria tudo que ela pudesse e dar... corpo e alma. Sabia que nada disso aconteceria sem muita luta.

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CAPÍTULO V

Ana escolheu um restaurante próximo à Laços e Toques para almoçar com seu pai.

A ocasião prometia ser tensa. Para completar, William se atrasara muito, e ainda chegara dizendo que teria de sair logo. Apesar disso, cumprimentou-a com afeto. Interessante como sua presença era marcante. Talvez sua agilidade, ou o modo como falava. Mas naquele dia não se podia dizer que estava em sua melhor forma. Parecia triste, encolhido. Pediram água gelada, antes de qualquer outra coisa. — Você está bem, papai? Será que fora algo no tom de Ana que havia causado a dor no olhar dele? — Luc lhe contou, não é? Fingir que não sabia de nada seria um exercício inútil, e Ana odiou o remorso que viu surgir por segundos na expressão dele. — Achava que ele não diria? William pareceu embaraçado. Qual seria sua reação se lhe contasse que Luc usara essa arma para forçar a reconciliação entre eles? O garçom os serviu, e eles almoçaram. Ambos sabiam que não teriam por que demorar com aquilo. — Diga a razão, papai. — Uma mulher... — William interrompeu o que dizia, para em seguida continuar, com óbvia relutância: — Quando descobri que ela estava colocando pelo menos três homens em conflito, eu já havia pegado uma fortuna em empréstimos para satisfazêla. A questão ocorreu de imediato a Ana: — O que pretende fazer a respeito? — Vender o apartamento e tentar recuperar minha reputação, longe daqui. Tenho contatos em Nova York. Talvez fosse mesmo uma boa estratégia, e ela lhe disse isso. — Gostou de sua viagem, filha? — É bom estar de volta. — Ana não queria estender o assunto, já que não estava disposta a fazer confidências. —O que acha da idéia de se tornar vovô? Um sorriso terno aflorou ao rosto de William, que cobriu a mão dela com a sua. — Estamos falando de projetos ou de fatos? 30


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— Fato consumado. — Amor, estou tão feliz!

Passava de duas horas quando Ana retornou à loja. O final tarde passou rápido, visto que tinha muito o que fazer atualizando os arquivos no computador, lidando com o balanço financeiro da Laços e Toques, atendendo ao telefone. O trânsito estava intenso, e ela demorou a chegar a Vaucluse. Sonhava com um banho, roupas folgadas e um enorme de água gelada, quando estacionou o carro na garagem. Uma refeição leve, talvez um vídeo. Mas pretendia dormir cedo. Petros logo surgiu na varanda, e Ana lhe dirigiu um belo sorriso. — Olá, como foi seu dia? — O de sempre, sra. Dimitriades. E o seu? — O mesmo. — Sua resposta tinha um tom de falsa solenidade, que o mordomo notou muito bem. — Luc pediu que lhe avisasse que chegará tarde. Um jantar de negócios, pelo que entendi. — Então somos só eu e o gato? Por favor, sirva apenas uma salada no jantar. Os lábios dele deixaram transparecer uma visível desaprovação. — Preparei algo mais substancial do que “uma salada”. Se você puder me dizer a que horas quer comer, poderei servir-lhe a refeição. — E o gato? — Ana não pôde resistir à tentação de provocá-lo, pois sabia que Petros era contra o acolhimento que ela e Luc resolveram dar ao bichinho. — Esteve de mau humor por todo o tempo em que você esteve fora. Assim como o dono da casa, Ana pensou. — Ah, então devo me corrigir e me dedicar mais a ele. Qualquer pessoa deduziria que, se Luc tivesse em casa um animal de quatro patas, seria um cão enorme, de raça. Mas, na verdade, fora Oliver quem os adotara, um mês antes. Chegara faminto, molhado e com um ar patético. Depois de alimentado, continuou por ali. Só lhe era permitido ficar pela cozinha e pela lavanderia, mas o espertinho corria pela mansão inteira, dia e noite. — Uma sugestão excelente. Ana encontrou o animal dormindo no cesto da lavanderia. Ele a olhou, preguiçoso, como a decidir se deveria se levantar para cumprimentá-la ou não. Ana não vinha sendo muito presente, mesmo. Mas ou a entonação carinhosa, ou o modo gentil como o tocou, fez com que logo rolasse pelo chão. Era um afeto incondicional, Ana pensava, ao subir as escadas. Se ao menos os humanos fossem um pouco mais parecidos com ele, fossem menos complicados... Depois de um banho demorado e relaxante, Ana vestiu um jeans folgado e uma blusinha fresca, presa com pequenos laços de barbante. Prendeu os cabelos em um 31


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coque frouxo e dirigiu-se à cozinha, onde Petros acabava de arrumar um prato com um bife suculento por cima de uma grossa camada de arroz. Ana pegou um garfo e levou um tanto de arroz à boca, dirigindo ao mordomo um sorriso maroto, disposta a quebrar a severidade de sempre. — Não se preocupe com a mesa. Vou jantar no terraço. — É meu trabalho servir você. — Petros ainda tentou argumentar, depois de um longo suspiro. — Luc iria... — Luc não está aqui. Assim, faça-me apenas um favor, acenda a luz. — Está bem — anuiu, embora ainda em crise com sua consciência. O silêncio e a brisa fresca noturna em suas faces lhe traziam tranqüilidade. O céu estrelado estava muito bonito, e a vista para o porto era espetacular. Fácil deixar que sua mente vagasse. Lembrava-se da primeira vez em que estivera naquela casa. O prazer de estar com o homem que amava, as promessas do que viveriam juntos, apesar de parte do coração dele pertencer a Emma, a jovem com quem se casara e que tão cedo perdera. Nos onze anos que se seguiram entre o primeiro e o segundo casamento de Luc, houvera outras mulheres. Um homem como ele exercia inevitável magnetismo sobre o sexo oposto. Ana podia aceitar aquilo. Podia inclusive lidar com os flertes inocentes que aconteciam em seu ambiente social. No entanto, para uma amante ela não poderia fechar os olhos. Celine fazia de tudo para que Ana acreditasse que o caso ela e Luc estava vivo, mais ardente do que nunca. mesmo? Luc jurava que não. Em quem deveria acreditar? — Se já terminou, vou levar seu prato. Saindo do devaneio, Ana se voltou para Petros. — Obrigada, estava uma delícia. — Quer uma sobremesa? Frutas? — Não. Agradeço. — Talvez um pouco de chá? — Logo vou entrar, e aí me sirvo, obrigada. — Fique aqui mesmo. — Petros olhou ao redor. — Está uma noite muito agradável. Ana sorriu. — Conversando comigo, Petros? Como ousou? — Irei preparar seu chá. Suspirando, Ana voltou sua atenção para Oliver, que dormia enrolado a seu lado. Acariciou-lhe as orelhas, coçou-lhe a barriga, e ele respondeu com um ronronar satisfeito. — Bem... — Petros disse, atencioso, enquanto apoiava com cuidado a xícara na mesinha. — ... parece que ele decidiu fazer as pazes com você. Oliver levantou a cabeça e encarou Petros com os olho semicerrados, como se aprovasse o que ele dizia. 32


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— Vou apanhar um xale para você. Ana recostou a cabeça na cadeira estofada e ficou a observar as luzes que brilhavam nas ruas ao longe. Pareciam-se também com pequenas estrelas. Foi assim que Luc a encontrou, dormindo, quando chegou. Parou diante da espreguiçadeira, admirando suas feições tranqüilas, seu corpo relaxado. Devagar, agachou-se, e com todo o cuidado ajeitou uma das mechas loiras para trás de sua orelha. Ana começou a despertar, e ele pôs a mão em seu ombro, vendo-a erguer as pálpebras, apreensiva. — O que está fazendo aqui fora, pedhaki mou? Admirando o firmamento? Ana estendeu a mão para tocar o lugar vazio onde o gato estivera dormindo. — Onde está Oliver? — Petros o levou para o cesto, na lavanderia. — Num gesto fluido, Luc se colocou de pé e pegou-a no colo. — Eu posso andar. Ele beijou-lhe a testa. — Deixe que eu faça isso. Luc carregava-a com facilidade, ainda apagando as luzes e acionando os alarmes, ao caminhar pelos cômodos. Depois subiu a escadaria, dirigindo-se ao quarto deles. — Você pode... Ele a calou com os lábios, provocando-a com a língua. A carícia durou apenas um instante.., o suficiente para acender seu desejo. Ana pensou com tristeza nos sonhos e esperanças que tivera, no que realmente existia entre eles e no que poderia vir a existir. Pensou sobretudo naquele instante. Luc a colocou de pé e desceu as mãos, segurando-a por trás. Inclinou a cabeça, e começou a acariciar-lhe as costas e o pescoço com a boca, com uma doçura tamanha que Ana sentiu vontade de chorar. — Não quero continuar, Luc. — Foi um sussurro cheio de tristeza, que chegou direto ao coração dele. — Então me diga para parar. Era impossível. Apesar do que dissera, Ana queria demais que o marido a tocasse. Seu corpo todo ansiava por aquilo, como se guiado por uma força maior que sua racionalidade. Com beijos suaves nos lábios, no rosto, Luc a provocava, forçando-a a abrir-se numa entrega total. E ela o fez, imaginando que iria protestar, mas na realidade, desejosa de que pudessem aprofundar mais o beijo. Luc afagava suas costas, alcançava a nuca, destruía com habilidade toda e qualquer resistência que ela pudesse impor. Os dois queriam muito mais que aquilo, e tinham consciência disso.

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Ana precisava sentir sua pele contra a dele, sem a barreira das roupas. Num gesto impulsivo, começou a desabotoar os botões da camisa de linho, depois da calça. Luc a acompanhou no mesmo instante, tirando primeiro seu xale, em seguida a blusa. Ana não pôde conter o gemido rouco que lhe escapou quando ele lhe acariciou os seios por cima do sutiã, antes de desabotoá-lo e atirá-lo longe. Colocando-se por trás dela, Luc continuou a carícia, envolvendo seus seios com as mãos, o polegar provocando-lhe os mamilos rosados, excitando-os até que Ana se sentisse queimar de paixão. Era como se percorresse uma espiral que a levaria à loucura. Tornou a gemer, o som se perdendo no beijo de Luc, que já a deitava na cama. Fitando-a com os olhos cheios de volúpia, ele a cobriu com seu corpo muito excitado, pronto para ela. Ana achou que devia gritar, exigir que interrompessem aquela loucura, mas não tinha forças para ir contra o poderoso ardor que a envolvia. Quando Luc passou a sugar seus seios com avidez, Ana sentiu seu sangue entrar em ebulição. Não podia suportar mais a espera para que o marido a possuísse. Quase desfaleceu quando ele começou a penetrá-la devagar, com todo o controle de que ainda dispunha. Com as mãos em sua cintura, mantinha um lento movimento de vaivém, fazendo-a implorar para que lhe desse o que tanto almejava. Aos poucos ele aumentou o ritmo, beijando seus lábios com lascívia, sugando-os, como se procurasse domá-la. Apenas quando Ana disse o quanto o queria, ele permitiu se soltar por completo, atingindo com ela o clímax, vibrante, intenso, único. Depois de rolar para o lado, mantendo-se ainda abraçado a sua mulher, Luc murmurou: — Adorei sua relutância. — Eu te odeio. — Ahã... — Luc mordiscou-lhe o ombro. — Celine... — ...não faz parte do que temos juntos. —Não é isso o que ela pensa. Luc não pôde deixar de notar a tensão que se formou de imediato no semblante de Ana. O toque de seus lábios foi como o pousar de uma borboleta, suave e sensível. — Insiste em falar de outra mulher, quando a única que me interessa é você. Ele conseguia mesmo desfazer suas defesas usando aquele tom. — São apenas palavras, Luc. — O que quer que eu faça? “Quero que diga que me ama.” O apelo silencioso vinha do fundo de sua alma. Ana estava quase em lágrimas, sabendo que esperava por uma declaração que jamais iria ouvir. — Você é minha, pedhaki mou. Está grávida de meu filho. E isso é o suficiente. Luc estava errado. Nunca seria o suficiente, mas ela não poderia lhe dizer. — Ainda quer continuar essa discussão? 34


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Com muito esforço, Ana conseguiu falar com alguma firmeza: — Para quê? — E, apesar do nó em sua garganta, finalizou: — Não há o que discutir.

CAPÍTULO VI

— Está pretendendo ir para a loja? Ana não queria acreditar naquela pergunta. — Sim. — Resolveu me desafiar? Ela respirou fundo, tentando não perder a calma. — Combinamos, eu e Rebekah, que farei apenas os pedidos, lidarei com o computador e atenderei ao telefone. Se for necessário, contratarei mais alguém para nos ajudar. Satisfeito? — Não totalmente. — Pior para você. Luc mostrava um olhar sombrio. — Está jogando um jogo perigoso, agape mou. — Nada mudou, Luc. — Acha que não? Não houve resposta. O celular de Ana tocou, e ao ler a mensagem de texto ela se levantou, já apanhando a bolsa. — Tenho de ir. Luc também se ergueu e parou à frente dela, escorregando a mão por seus cabelos enquanto lhe dava um beijo rápido e provocante, apenas atiçando o desejo. — Aproveite seu dia. Ana não queria dar atenção à ironia daquelas palavras. Se Luc imaginava que o sexo resolvia todos os problemas, estava enganado. Não conseguia deixar de se recriminar por haver sucumbido à sedução dele, desprezando a única forma de resistência que lhe restava. Mas bastava lembrar-se do que vivera seus braços para que lhe subisse no mesmo instante um calor intenso. Foi uma longa manhã. Mesmo esforçando-se por diminuir o ritmo, Ana não parou um segundo. — Vá almoçar — Rebekah insistiu. — Sente-se na parte fora de um dos cafés e tome um pouco de ar fresco. Pode trazer um sanduíche? Tomates secos no pão de centeio? Num dia tão lindo, Double Bay mantinha seu estilo elegante, com suas 35


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butiques finas e os vários cafés. Perto do mar, a brisa refrescante amainava a temperatura alta. Sentindo necessidade de caminhar, Ana atravessou a rua e seguiu alguns quarteirões, escolhendo por fim um pequeno café, que tinha apenas algumas mesas desocupadas. No mesmo instante, um garçom a atendeu, e seu pedido chegou em tempo recorde. O sanduíche de frango com salada estava delicioso. Ana sorriu ao pensar que, com a gravidez, seu apetite lhe exigia pelo menos seis refeições diárias. E não podia passar da hora de alimentar o bebê, senão se sentia nauseada. — Ana? “Oh, Deus, não! Por favor, não! Celine!” Ela mesma, vestida como uma rainha em seus trajes caros e impecáveis, e como sempre maquiada com perfeição. — Não se importa se eu dividir com você, não é? Por que ela sempre trabalhava com duplo sentido? — A mesa, Celine? — Evidente, querida. Quero apenas um café. — E foi logo se acomodando. — E precisamos conversar. — Ah, é mesmo? — Ana estava muito tentada a se levantar e sair. Mas foi uma espécie de fascinação que a manteve no lugar. — A respeito... — De Luc, claro. Imagine! O que mais poderia ser? Ana olhou para o relógio. — Tenho de voltar à loja em poucos minutos. — Luc e eu estávamos discutindo nossa situação ontem. — Não diga. — Pôde ver muito bem o brilho nos olhos da outra mulher, e arqueou uma sobrancelha. — Voltamos ao passado e... Era o suficiente. — Esta é mesmo uma boa palavra: passado. — Ana se pôs de pé e pediu a conta. — Talvez você deva perguntar-se por que Luc não consegue se desligar dele. Por que sempre se sentia abalada com o veneno de Celine? — Você é quem deve descobrir por que continua obsessivamente ligada a um homem que não a quer mais. Não sou dona dele, Celine. Se Luc achar que deve jogar fora seu casamento, é livre para fazê-lo. Com rapidez, Ana pagou a despesa, pegou o sanduíche de Rebekah e saiu, sem olhar na direção de Celine. — O que houve? Você parece abatida! — Rebekah notou, assim que Ana entrou no estabelecimento. — Tive companhia no almoço. — Celine. — Pois é. Você nem precisou de três tentativas.

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irmã?

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— Ela ligou para cá. Essa mulher é uma peste. O que fará a respeito, minha

— Quer dizer além de ficar louca da vida? Estou tentando lidar com isso. — Talvez devesse deixar que Luc lidasse com essa situação. — Chegar para ele soluçando e contar essa história patética? E admitir que não consigo fazer nada a respeito? —Colocou mais folhas na impressora. — Não. São meus problemas, eu os resolvo. No final da tarde, Ana ainda separava pedidos de buquês e arranjos florais. Naquele dia, somavam-se a eles também várias solicitações de orçamento para trabalhos de paisagismo, visto que Ana e Rebekah haviam anunciado em uma revista da moda que a Laços e Toques também desenvolvia esse tipo de atividade. Dentre elas, porém, deparou com uma que a sobressaltou. A surpresa era pelo nome do cliente: Celine Moore. Não havia dúvida de que a intenção não era boa. — O que está havendo? Ana mostrou à irmã o pedido. — Cuidarei disso. — Não, Rebekah. Eu o farei. Celine, pelo jeito, não tinha intenção alguma de desistir. — Mais uma batalha nessa guerra. — Ana esboçou um desanimado. — Luc não vai aprovar. — Ele não precisa saber. — Mas saberá, Ana. Celine se encarregará disso. — Vou tratar como questão de negócios. — Mesmo assim, continuará sendo pessoal — Rebekah argumentou. — Nós duas sabemos disso. — Mas e então? O que de pior pode acontecer? O apartamento de Celine ficava em um condomínio parem Rose Bay. Evidente que sua situação financeira do divórcio continuara muito boa.

Já no hall do prédio viam-se quadros de artistas famosos, caros. Quando o empregado abriu a porta do apartamento, Ana pôde avistar a sala de estar e comprovar sua elegância. A decoração toda seguia o tema de leopardos. Sofás brancos de veludo com almofadas também aveludadas imitavam a pele do animal. Coleções de leopardo em poses adornando os móveis, quadros com o mesmo pelas paredes. Ana pensava que tudo aquilo se adequava muito bem à personalidade de Celine, quando ela apareceu de uma das portas. Celine cumprimentou-a, seca, mas Ana não esperaria outra coisa. Não iria apenas realizar um serviço, mas sim mais batalha na guerra pelo homem que ambas desejavam. resolveu ir direto ao ponto: 37


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— Por onde devemos começar? Ajudaria se me contasse o que planejou. Celine expôs com prepotência algumas de suas idéias, incluíam fontes pela sala, pedras caríssimas, e o que parecia importar: as plantas em si. Em seguida, afirmou teria disponível uma quantia irrisória aos olhos de Ana, refletiu no mesmo instante se a outra estaria brincando. — Não pode atingir o que quer pelo preço que está dispondo a pagar — Ana sintetizou, informando em o orçamento de alguns dos itens, que já ultrapassava valor colocado por Celine. — Mas qual é sua margem de lucros? Está cobrando uma exorbitância. Ana queria virar-se e sair dali. Apenas não o fazia porque viera a negócios. — Rebekah e eu sabemos muito bem a qualidade de nosso trabalho, e seguimos sempre um mesmo padrão de preço. Sugiro que consulte outros profissionais. A expressão de Celine era de pura arrogância. — Não perderei nem mais um minuto de meu tempo isso. Diga seu preço e eu pagarei. Ana descreveu tudo o que utilizaria nos mínimos detalhes, checou todos os valores, fez Celine assinar a nota entregou-lhe a cópia do cliente. A rival dobrou o papel, apertando-o com suas unhas pecáveis. — Por esta quantia, espero perfeição. — Será difícil que venha a ter alguma reclamação. Ana tinha certeza de que Celine faria de tudo para denegrir a imagem de Laços e Toques pelo puro prazer de fazê-lo. Sabia que deveria seguir seus instintos e recusar a tarefa. Por que não fazia isso, então? Pura teimosia. Não queria que Celine triunfasse de forma alguma. — Espero que não acredite ter vencido. Ah, até que enfim o motivo de sua presença ali! — Não sabia que havia uma competição. — Não se faça de tola. Apenas lembre, querida. — Celine exibiu um sorriso cheio de falsidade. — Tive Luc antes de você. Pense nisso, e imagine se algum dia você pôde ser uma substituta à altura. — Mas você se casou com outra pessoa. Por quê? Luc não pediu em casamento? Os olhos de Celine faiscaram. Antes que ela pudesse responder, Ana continuou: — Viva sua vida, Celine. E fique fora da minha. — Não há a menor chance disso. Nada do que possa fazer dizer me fará desistir. — Estou grávida. Celine levantou uma das sobrancelhas, com desprezo. — E acha que isso faz alguma diferença? — Esqueci-me de que você não tem escrúpulos, senso moral ou algo parecido. — Não acredite que tem alguma vantagem por carregar herdeiro dos Dimitriades. — Celine a mediu de alto a baixo. — Mesmo porque gestantes barrigudas são tão sensuais quanto baleias prenhes. 38


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— É uma pena que só tenha mesmo uma visão superficial... Sei que você nunca pôde sentir um homem apaixonado por sua barriga, pelo filho que juntos conceberam. — Pobre Ana! Cheia de ilusões a respeito dos homens. Hora de sair. Já tinha ouvido muito mais do que deveria. — Tenha uma boa tarde, Celine. Ana se concentrava em seus passos até a saída, procurando não falhar em nenhum deles. Só conseguiu respirar depois de haver saído daquele lugar. Apanhou o celular e percebeu que havia duas mensagens na caixa-postal: Luc e Rebekah. Sua irmã foi a escolhida. — Problemas? — Eu que pergunto! Como foram as coisas com Celine? — Poderiam ter sido piores. Estarei aí em quinze minutos. Luc foi localizado em sua linha privativa. — Dimitriades. — Você me deixou um recado. — Deixei sim. — Ele parecia cansado, e Ana pôde imaginá-lo recostando-se no espaldar. — Estou entrando no carro para sair. — Devo ser rápido, é isso? O mau humor foi claro em seu tom, mas Ana revidou ser nem mesmo pensar: — Ou nos falamos depois. — Jace estará chegando de Nova York no domingo. Convide Rebekah para jantar conosco. O tão cobiçado Jace Dimitriades. Os homens da família Dimitriades eram muito parecidos. Personalidades marcantes, charmosos, vigorosos. Enfim, dinamite pura para a mulheres. — Vai bancar o cupido, Luc? — A sugestão partiu de Jace — Luc falava de um modo quase divertido. Ana lembrou-se da tensão existente entre sua irmã e primo de Luc. — Não sei se minha irmã vai querer ir.

— Não! — Rebekah recusou, enfática, vinte minutos de pois. — De jeito nenhum! — Tudo bem. — Como “tudo bem”? Não vai tentar me persuadir, me adular, agarrar meu braço? — Não. — Jace é... Ana dirigiu-lhe um sorriso cínico. — Um outro Luc? — ...perfeitamente capaz de me convidar por ele mesmo. 39


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— O que lhe daria o enorme prazer de recusar. — Acertou na mosca. Foi até bom que o telefone tocasse naquele momento. Rebekah o atendeu, e Ana voltou para o computador. Rebekah tapou o bocal e disse para a irmã: — É papai. — Parou para conversar com ele por segundos e tornou a se dirigir a Ana: — Convidou-nos para jantar esta noite. Diz que é muito importante. Tem idéia do que se trata? Ana sabia que não podia revelar toda a verdade, mas pelo menos parte dela. — Ele comentou que tinha feito alguns contatos de trabalho em Nova York, quando almoçamos juntos. — Acha que pode estar pensando em se mudar para lá? — É possível. Bem, vai nos contar no jantar. — Ana queria encerrar logo o assunto. Odiava omitir o que quer que fosse de Rebekah. Ligou em seguida para Luc, para avisar-lhe que não jantaria em casa. Como ele estava em uma reunião, ela deixou-lhe um recado no celular. — Luc pediu que avisasse que vai chegar depois de seis e trinta — Petros informou-lhe logo que entrou na mansão. Com sorte, àquele horário, já estaria com William e Rebekah. — Obrigada. Ana tomou um banho e vestiu um conjunto elegante de calça e camisa de seda violeta. Estava fazendo os últimos retoques na maquiagem quando Luc entrou na suíte. Ele era incrível! Mesmo um tanto abatido, sem a gravata e com os primeiros botões da camisa abertos, Ana sentia que seu coração batia forte ao vê-lo. Tinha uma sofisticação misturada a uma masculinidade quase rude, sensual, que lhe provocava arrepios. Tudo o que desejava era cruzar o espaço que havia entre eles e tocar seu rosto, beijá-lo, encantar-se com todas as promessas que esse gesto lhes traria. Queria sorrir e perguntar: “Muito cansado? Em seguida,ajudá-lo a repousar em seus braços. Mas não fez nada disso. Ao contrário, pegou a bolsa e as chaves. — Ouviu meu recado? Luc jogou o paletó sobre a cama e começou a tirar os sapatos. — Ouvi, sim — Despiu a camisa e baixou o zíper da calça. — Petros a levará. Ligue-me quando quiser vir embora, e irei buscá-la. — Não seja ridículo! Eu mesma dirijo. — Não. Não dirige. A raiva começou a subir pelas faces de Ana. — É claro que... Luc a interrompeu. Seu olhar era brilhante e feroz. — Podemos fazer isso do jeito mais difícil, meu anjo. Todavia, o resultado será o mesmo. 40


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— Não está sendo muito presunçoso? — As negociações não estão abertas — reafirmou, tirando de uma vez a calça. — O que quer? Ficar rodando pela cidade em busca de um lugar para estacionar? Andar sozinha pela rua escura até o restaurante? Fazer o mesmo na volta? —Fez uma pausa. — Acredita mesmo que eu permitirei isso? Tirou também a cueca e saiu nu pelo quarto. Ana não se sentia disposta a uma discussão. Ainda mais com Luc daquele jeito. Lógico que queria dar a última palavra, mas compensaria? Desceu as escadas, em direção ao hall, onde Petros com certeza já a esperava. — Terá de brincar de chofer, Petros. — E seguiu-o até o Mercedes do marido. — As intenções dele são as melhores. — Ele é um ditador, isso sim. Um tirano! — Você é esposa de um homem que é sensato o suficiente para não correr riscos desnecessários. — Então, cale-se e dance conforme sua música. É assim? — Algumas pessoas achariam isso o máximo. — Pois esta pessoa em especial não gosta de receber ordens. William e Rebekah já estavam em uma das mesas. Ana os cumprimentou com efusividade e sentou-se também. William Stanford não esperou nem mesmo que o garçom tomasse os pedidos. — Já coloquei meu apartamento à venda, em uma imobiliária. Partirei para Nova York amanhã cedo. Rebekah fez algumas poucas perguntas ao pai, mas logo se aquietou, percebendo que ele dava voltas, omitindo informações. William levantou-se depois de terminarem a refeição. Desculpou-se por sair apressado, justificando que ainda tinha muito o que organizar antes de sua partida. Mal o pai se foi, Rebekah voltou-se para Ana. — Você já sabia, não é? — Da possibilidade de que se mudasse, sim. — Por que assim, tão de repente? E por que vender o apartamento? É evidente que há algo errado. — Os olhos dela se estreitaram. — Papai está com problemas. E tenho um palpite de que Luc está envolvido, logo, tem algo a ver com o banco. E você pode me colocar a par de tudo. Tudo! Não apenas o que acha que eu deva saber. Não havia escolha. Assim, Ana contou-lhe toda a conversa que tivera com William naquele almoço, e o que Luc lhe dissera. — Apenas me diga que você não fez nada para que Luc não o processasse — Rebekah choramingou. — Eu o mataria se soubesse que fez com que você retomasse um casamento que não queria manter. Ela era esperta, mas estava apenas testando. Não sabia de todos os fatos. — Rebekah, eu me afastei de Luc apenas porque queria um corte naquela intrusão de Celine. 41


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— E conseguiu? Era o máximo que Ana podia admitir. Teve de se esforçar para não cruzar os dedos atrás de si de forma a suavizar a mentira. — Sim. — De repente, pareceu-lhe oportuna uma mudança de tema. — Jura que não aceitará o convite de Luc para jantar? — Juro. Não posso suportar aquele homem. — Jace? — É lógico. — Por quê? Ana se lembrou que os dois haviam se encontrado em sua casa, em uma outra ocasião em que Jace visitara Sydney. Mas eles não chegaram a namorar. Não que Ana soubesse. — Ele falou algo de que você não gostou? Foi indelicado? Era claro que havia mais ali do que Ana sabia. — Não. Apenas não quero encontrá-lo. — Mas tem de saber o porquê. — Sei muito bem. E não quero mais explorar esses porquês. — Talvez devesse. — Não banque a psicóloga amadora. — Não foi minha intenção. — Oh, está bem! — Rebekah se fingiu de zangada. — Irei a esse jantar. Afinal, por que me furtar ao prazer de colocar Jace Dimitriades em seu devido lugar? Ana apenas assentiu. Estava exausta. Foram muitos os acontecimentos naquele dia. — Vou chamar um táxi. — Está sem carro? Levo você então, Ana. Luc estava parado diante da mansão, quando chegaram. — Pronto, está entregue a seu anjo da guarda — Rebekah brincou, despedindose com um beijo rápido na irmã. — Vejo você de manhã. E obrigada. — Por quê? — Por ser você mesma. Ana saiu do veículo, esperou até que Rebekah se afastasse e se aproximou de Luc, sentindo que ele a examinava. — Estava esperando por sua ligação — disse, um tanto ameaçador. — Por que o chamaria se Rebekah se ofereceu para me trazer? — Já é tarde. — Nós conversamos muito. Ele estudou seu rosto pálido e as olheiras sob os olhos. — Devia ter chegado mais cedo. — Não faça isso, Luc. Não me diga algo que já sei.

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Todos os últimos acontecimentos, Celine, seu pai, não poder ser totalmente honesta com Rebekah... Sua cabeça não agüentaria mais nada. Nada. — Vá para a cama. Quer que leve alguma coisa para você? “Só você. Como era antes. Antes que Celine reaparecesse em cena.” Mas as palavras não foram pronunciadas, e Ana meneou a cabeça, sentindo-se desamparada, apesar do gesto carinhoso dele. Daria qualquer coisa para acreditar que o marido se importava com ela, e não apenas com o bebê que carregava no ventre. Deitaram-se ao mesmo tempo. Luc apagou a luz da cabeceira e puxou-a para mais perto. Calou seus protestos com um leve roçar de lábios, que só a fez querê-lo mais e mais. Devagar, acariciou todo seu corpo, deleitando-se com a suavidade de seus seios, causando-lhe uma intensa resposta quando traçou uma linha de fogo em sua barriga, quando explorou com doçura a parte interna de suas coxas. Luc a acariciava com tanta delicadeza, mostrando conhecê-la tão bem, que sem poder se conter Ana chorou sem reservas, num misto de cansaço e emoção. Luc apenas abraçou-a por algum tempo, beijando, afetuoso, suas lágrimas de quando em quando, sem nada questionar. Aos poucos, as carícias foram reiniciadas e o choro foi sendo substituído pela excitação. Tudo o que Ana queria era que ele a possuísse com toda energia, para que nada mais no mundo existisse além dos dois corpos unidos pela volúpia.

CAPÍTULO VII

— Esta tudo aí, Harry? Meia hora teria sido o suficiente, mas já haviam se passado duas. Celine mudava de idéia a todo instante. Estava claro que aquilo era uma provocação, mas Ana mantinha sua postura profissional, repetindo para si mesma o mantra: “O cliente tem sempre razão”. Mas era difícil, muito difícil! Por fim, Celine pareceu desistir, e aprovou o trabalho. Ana dirigiu-se então à lavanderia para sair em poucos instantes com seu equipamento nas mãos: tesouras, enxadinhas, potes vazios. — Fique bem atenta, querida — Celine avisou-a, quando ela se dirigia ao hall. — Sempre jogo para ganhar. — Não importa quem se machuque? — De jeito nenhum. 43


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— E, claro, Luc é o prêmio. — Pode apostar. — Você só esqueceu um item em sua estratégia, doçura. — E qual foi, anjinho? — O desejo dele. — Você ainda não entendeu, não é? Homens como Luc mantêm uma amante sem o menor problema. — Enquanto a esposa se finge de cega em troca de crédito ilimitado em sua conta no banco? — Poderia ser pior. — Desculpe-me, Celine, não é o que desejo para minha vida, e muito menos para meu filho. Celine desenhou com cuidado um sorriso nos lábios. — Então posso considerar que o prêmio é meu? — De forma alguma. Não era a melhor resposta, mas Ana sentia que mantinha ainda alguma dignidade ao cruzar a porta do saguão do prédio e dirigir-se ao carro. Chegou em casa tarde, mas o Mercedes de Luc não estava na garagem. Verificando seu celular, encontrou uma mensagem dele, avisando que se achava em uma reunião que, decerto, se estenderia pelo jantar. Petros também já fora avisado. — Preparei uma sopa de legumes, carne grelhada e salada, sra. Dimitriades. Oliver também viera recebê-la, muito festivo, enrolando-se em sua perna e ronronando, enquanto Ana acariciava-lhe a orelha. — Desço em quinze minutos, Petros. Vou tomar um banho. Dessa vez, Ana resolveu jantar na sala mesmo. Não queria ser surpreendida em posição tão frágil, como na véspera. Resolveu assistir a um dos DVDs de sua coleção. Logo no início do filme, já se sentia mais relaxada. As nove horas, Petros levou-lhe um chá, e em seguida retirou-se para seus aposentos. Depois de um instante de dúvida quanto a assistir ou não a outro filme, Ana colocou Oliver na lavanderia e subiu para a suíte. Um jantar de negócios. Ana queria poder ver o que estava acontecendo, quem eram os convidados. De repente, suas mãos gelaram. Celine mencionara que queria a nova decoração porque ofereceria um jantar. Não podia ser, Luc não poderia ser um de seus convidados. Poderia? Entretanto, a semente da dúvida fora plantada, e na meia hora seguinte o terreno foi bastante fértil. Como a imaginação podia ser terrível, Ana ponderou, ao se virar pela centésima vez no colchão. O relógio de cabeceira marcava onze horas. 44


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Onze e dez. Luc e seus colegas deviam ter jantado muito devagar, e naquele momento ainda saboreavam um cafezinho. Ela o mataria se descobrisse que era um dos convidados de Celine. Em sua mente, já previa a discussão que teriam, as acusações que lançaria contra ele, e até mesmo a luta física. E então, colocaria algumas roupas em sua maleta e dessa vez sairia, de sua casa e de sua vida, para sempre, para nunca mais voltar. Luc Dimitriades não veria seu filho, e também não a veria mais. O toque do telefone despertou-a de suas fantasias. Ana tirou-o do gancho. — Luc? — Ele logo estará aí, querida — Celine parecia deliciada. — Não se queixe de que não a avisei. Ana ouviu o dique do aparelho sendo desligado, e pôs o fone de novo no lugar. A ira a tomou de um jeito tão forte que parecia que não caberia em seu peito. Como ele podia ter feito aquilo?! A cena ficara muito clara. Luc conversando, distraído, com os convidados de Celine à mesa, dizendo pilhérias, sorrindo. Ou talvez não houvesse convidados. Talvez fosse um jantar a dois. E depois... Não. Ana não queria imaginar o depois. Luc lhe prometera fidelidade. Poderia quebrar sua palavra? Teria feito isso? “Caia na realidade! Luc jamais admitira isso. Um pequeno ruído fez com que Ana quase parasse de respirar. Depois, a porta do quarto se abriu e se fechou, suave. Evidente que ele não acendeu a luz. Segundos depois, Ana ouviu-o tirando as roupas. Na certa já subira sem o paletó. Não era difícil imaginá-lo desabotoando a camisa e pendurando-a no cabide do quarto. Os sapatos e as meias se seguiriam. Pôde ouviu o som do zíper, quando ele começava a tirar a calça. Tudo o que restava era a cueca, que logo também estaria fora. Luc sempre preferira dormir nu. Por um momento, Ana pôde visualizar, sem que ele notasse, as formas masculinas. Seu vigor, a penugem escura de seu tórax, as coxas firmes. O modo ágil como se movia. Não sabia se morreria de raiva ou de tristeza ao imaginá-lo tocando Celine. Nos breves segundos que se seguiram, várias cenas se formaram diante dela. Sem que notasse, prendeu a respiração quando sentiu Luc escorregando para baixo das cobertas. O roçar de suas pernas e o toque de seus braços quando se achegou a ela causaram-lhe uma reação imediata. Com um movimento brusco que o pegou desprevenido, Ana golpeou seu peito com o cotovelo e bateu ambos os calcanhares em suas canelas.

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— Não ouse tocar em mim! — ela gritou, furiosa, quando ele a abraçou procurando contê-la. Luc era muito grande, muito forte, e Ana não podia escapar. Suas tentativas de chutá-lo foram contidas quando ele prendeu suas pernas entre as dele. Com facilidade, Luc rolou seu corpo, levando-a junto, e com uma das mãos acendeu a luz da cabeceira. Ana estava linda em sua fúria, Luc decidiu, estreitando os olhos. Seus cabelos, soltos e desarrumados, as faces, muito vermelhas, os olhos cor de esmeralda soltando chispas que pareciam querer rasgá-lo em pedaços. A curta camisola que usava não cobria suas curvas atraentes, e terminava no início das coxas esguias e bem-feitas. — Pode me dizer o que está acontecendo? — Luc exigiu, com aspereza, sem soltá-la. Ana voltou a se debater, procurando libertar as mãos. Agia sem raciocinar, e apenas o barulho seco da palma de sua mão no rosto dele a fez despertar de seu estado, registrando com horror o que havia feito. Os olhos dele se arregalaram com o susto. Os músculos faciais se retesaram, o cintilar da ira também em suas pupilas. — Deixe-me ir! — Não nesta vida, pedhaki mou. — Você está me machucando! — Não. Estou sendo muitíssimo cuidadoso para não machucá-la. — Não precisava de muito esforço para restringir os movimentos dela e também para proteger o próprio braço quando ela se virou para mordê-lo. — Pare com isso. Vai acabar se ferindo, mesmo. — Seu cretino! — Tenha modos, mocinha. Ora, vamos! Não é a primeira vez que vou a um jantar de negócios e chego tarde. Por que tudo isso, esta noite? Ana queria esmurrá-lo, e tentou mesmo fazê-lo, mas foi em vão. — Como se não soubesse! O olhar de Luc estava sombrio, e apenas nele sua emoção ficava clara. — Não sou tão tolo de perguntar o que já sei. Ela fez mais uma tentativa frustrada de se livrar. — Odeio você! — Pelo quê? Posso saber? A raiva dela cresceu mais um ponto. — Passei várias horas no apartamento de Celine supervisionando a decoração que ela encomendou e que tinha de ficar pronta até esta data, por causa do jantar que daria hoje. — Ana o encarou. — Há vinte minutos, ela me telefonou, avisando que você já estava a caminho. Luc ficou calado por um instante. — Acredita que eu estava com Celine? 46


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— Faça os cálculos. — Acha que eu mentiria para você? Ela não respondeu, não poderia. Sua voz parecia haver desaparecido. — Ou pior. — Ele falava com muita tranqüilidade. E aquilo a assustava. — Sairia da cama dela para a sua? Gélido, fitou Ana, segurando sua cabeça com ambas as mãos. — Espera que eu acredite no que me diz, sem nunca duvidar? — É assim tão difícil? — Baseada em quê? Em uma fé inabalável? — Ana sorriu, com ironia. — Luc, por favor, não insulte minha inteligência. — Por que eu procuraria outra mulher se já tenho você? Quer saber? Isso já foi longe demais. Luc se levantou de um salto, abriu a gaveta da escrivaninha e pegou a agenda de telefones. Segundos depois, já estava discando para um deles. Ana jurou para si mesma que não iria ouvir, mas não havia como abafar o som da voz dele. Palavras duras, inflexíveis e nenhuma formalidade social. Foi este o tom que Luc usou, avisando, de forma que não deixava margem a dúvidas, que, se aquilo não cessasse, tomaria medidas legais. Quando recolocou o fone no gancho, voltou-se para Ana e exigiu: — Quero que me fale tudo, Ana. Desde o começo. — Sobre Celine? — Tudo. Cada indireta, cada acusação... não deixe nada de fora. Demorou muito tempo até que ela conseguisse falar. Suas faces estavam pálidas quando terminou. — Foi isso? Tudo isso. E ainda aumentaria se fosse contar o tom de voz zombeteiro, os sorrisos maliciosos. Luc queria se vestir, pegar as chaves do carro e ir até o apartamento de Celine, e apresentar-lhe uma intimação para prestar contas do que fizera. Mas, mesmo tendo poder suficiente para tirar seu advogado da cama, jamais encontraria um juiz que se dispusesse a assinar qualquer ordem àquele horário. — Você devia ter me dito tudo isso antes. — Pensei que o tinha feito. Pelo menos uma boa parte disso — Ana disse, irritada. — Ela não a incomodará de novo. Quem poderia apostar nisso? Duvidava que Celine fosse se dar por vencida. Pelo contrário, a vingança viria a seguir. Luc tornou a deslizar para baixo das cobertas.

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— Não deixe de me dizer mais nada. — E encostou a boca na dela, provocando-a para em seguida beijá-la. Ana quis protestar, mas logo foi dominada por um desejo forte, primitivo, que a calou por completo. Ardente, sensual, Luc a acariciou até sentir que ela não mais lutava contra a volúpia. Por cima do tecido fino da camisola, traçava círculos suaves ao redor de seus mamilos, causando-lhe sucessivos arrepios de cima a baixo. No minuto seguinte, já se tocavam por inteiro, sentindo o calor que emanava de seus corpos nus. Beijando-a com paixão, Luc penetrou-a devagar, controlando seu movimento até deixá-la ofegante, desejando-o, enlouquecida. Em desespero, Ana cravou os dentes em seu ombro, sem conseguir abafar os gemidos de prazer que vinham aos borbotões. — Então gosta disso, hein? Fora ela mesma quem gritara tão alto, quando ele aumentou o ritmo e a profundidade de seus movimentos, levando-a ao clímax, a um deleite descontrolado que a sacudiu vezes seguidas? Ana não queria se mover, sentia que não seria capaz. Descansou satisfeita nos braços do marido, que ainda beijava seu rosto e afagava suas costas. Logo depois, Luc se levantou, caminhou nu até o cabide, pegou sua carteira e retirou de lá uma nota do cartão de crédito, estendendo-a para Ana. — É do Ritz, restaurante do Carlton Hotel. Reservei uma mesa para quatro pessoas. — Apanhou o telefone. — Quer que eu ligue para Henri, o maitre, e lhe peça que conte a você a que horas nós saímos? A data, a quantia, as provas bastavam. — Desculpe-me... Não foi fácil dizer aquilo. E muito menos encarar os olhos dele ao falar. Mas ela o fez, e com firmeza. Para alguém mal-intencionado como Celine, não devia ter sido difícil subornar um garçom para avisá-la assim que Luc saísse. — É claro que sim.

CAPÍTULO VIII

Quando viu o trânsito que enfrentaria, Ana soube que devia ter aceitado o conselho de Rebekah e deixado a loja mais cedo. Não havia mais como não chegar atrasada. 48


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— Por que eu?! Porém, ninguém poderia ouvi-la. O tráfego parara. Portanto, não iria a lugar algum. Para que a pressa? Luc ficaria muito contrariado. O evento daquela noite seria uma homenagem a um ex-presidente americano. Todas as pessoas com quem negociava, todos os seus colegas, estariam lá. Incluindo Celine. Mas não à mesma mesa, Ana torcia. Checou o relógio e hesitou entre ligar para Luc e esperar que ele a contatasse. Era melhor que ligasse ela mesma. Luc atendeu ao segundo toque, e apenas ouvir o som de sua voz já alterou impressionante o efeito que ele tinha sobre ela, mesmo a distância. Seu coração batia mais forte, sua respiração se acelerava. Pensar nele fazia com que imagens eróticas, no mesmo instante, se formassem em sua imaginação. — Não vou dizer que você devia ter saído mais cedo da loja. — Por favor, não diga mesmo. Estarei lá tão logo esta fila de carros se mova. Ao conseguir, enfim, chegar à mansão, Ana sabia que precisaria de um milagre para tomar banho, se vestir e brilhar, em menos de dez minutos. Em meia hora, ficou pronta. O corte do vestido escarlate falava por si mesmo. Além dele, apenas os cabelos presos com um brilho molhado, um mínimo de maquiagem muito bem aplicada e poucas jóias. Luc já estava pronto quando ela saiu do banheiro, e naquele momento Ana sentia-se insegura sob sua avaliação. Será que o vestido era muito ousado? Apaixonara-se por ele ainda na modelo, e comprara-o num impulso. Será que Luc aprovaria? — Se está esperando o efeito “Oh!”, com todos de boca aberta, com certeza vai atingi-lo. Sucesso! Ana dirigiu-lhe apenas um sorriso maroto. Luc ficava maravilhoso com o que quer que vestisse. Tinha um quê especial, que o diferenciaria de outros homens onde quer que estivesse. Era difícil elucidar o que era. Talvez uma mistura de força e alta estatura, o modo como se movia e falava. Parecia conter algo de primitivo por baixo de uma superfície polida. A autoconfiança dele, seu magnetismo, um toque de arrogância... Enfim, Luc seria o centro das atenções mesmo de jeans e camiseta. Com uma camisa branca e black-tie, então, ficava simplesmente o máximo! — Se não parar de me olhar assim, não iremos a lugar algum. Ana corou. Apanhou em um segundo sua bolsa e dirigiu-se à saída. Mas Luc a deteve. — Antes... — Inclinou a cabeça para beijá-la. Não foi apenas um roçar de lábios, como previra ela. Na realidade, beijaram-se com avidez, perdendo muito de sua compostura. Luc achou ter feito aquilo apenas para aumentar a confiança dela. Mas sabia que era uma mentira.

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O hotel estava todo iluminado, a avenida, lotada de carros esperando pelo serviço de manobristas, seguranças por todos os lados. Levou um tempo até que conseguissem passar pelo cordão de isolamento. Quando conseguiram adentrar o salão principal, a grande maioria dos convidados já havia se acomodado. Os fotógrafos se achavam bastante ocupados, capturando poses da nata da sociedade para os jornais e revistas de todo o país. Era hora de sorrir, Ana logo percebeu. Brilho e glamour, jóias caríssimas, o aroma de perfumes caros. O ruído das conversas era alto, e Ana ficou grata a Luc por tomar sua mão e guiá-la à mesa reservada para eles. Sentaram-se no exato instante em que as luzes se apagaram para o início do discurso de abertura. Em seguida, houve mais um intervalo. O assunto a seu redor fluía fácil, os comentários eram interessantes e variados. Apesar de atenta e participante, Ana se manteve muito consciente da presença de Luc a seu lado. Na véspera... Não, não devia retornar àquele momento, alertou-se. Mas era difícil não rememorar a raiva que sentira e suas reações impensadas. Nunca batera em ninguém em toda a vida. A mera lembrança do que fizera a Luc a constrangia. Por todo o dia procurara afastar as imagens da briga, e não fora tão complicado, visto que estivera ocupada com os clientes e todas as tarefas pertinentes. Mas naquele momento não era capaz de afastar de sua memória as acusações que fizera ao marido e o resultado delas. Como era possível odiar alguém num momento e, no segundo seguinte, fazer amor com ele como se nada mais na face da terra importasse? Era como entrar em uma descida emocional sem freios. Ana resolveu levantar-se para ir ao toalete. Precisava quebrar o rumo de seus pensamentos, senão Luc acabaria desconfiando. Parou diante do espelho para repassar o batom, ainda imersa em seus devaneios. — Choramingar nos ouvidos de Luc talvez não seja a melhor estratégia, querida. — Celine, em sua costumeira missão. Não havia dúvida quanto a seus objetivos. — Por que diz isso? — Ora, por favor... Luc e eu não temos segredos um para o outro. Será que sua mão tremeu? Esperava que não. — Você não tem mesmo nada melhor para fazer? — Como o quê? — Como parar de se intrometer na vida dos outros. Na minha, em particular. — Não posso crer que estou então atingindo meu objetivo com você! — Oh, está sim, Celine! Está se intrometendo de modo eficaz. Ana fez uma pequena pausa. — Pena que esteja apenas jogando fora seu tempo e sua energia. — Luc está...

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— ...livre para escolher, Celine — Ana disse, com uma ênfase deliberada. — E parece que já escolheu a mim. A expressão da outra era de sarcasmo. — Porque usa uma aliança e espera um filho dele? Querida, como pode ser tão inocente? Guardando o batom na bolsa, Ana dirigiu-se para a porta. — Não tenho mais nada a lhe dizer. Deu um passo, e Celine segurou-lhe o braço. — Tire a mão de mim. — Posso enumerar um grande número de mulheres, aqui mesmo nessa sala, que fazem vista grossa para os casos de seus maridos. — Pois não sou uma delas. Calma, tinha de se manter calma. Se perdesse a elegância, decerto aquela discussão acabaria numa briga de gatos. Celine apertou um pouco mais as unhas no braço de Ana. — Luc me ligou na noite passada, dizendo que não poderia me ver por algum tempo, já que você estava tornando as coisas difíceis. O sorriso dela carregava um tom malévolo que era quase assustador. — Não foi um movimento sábio... Ana já agüentara o suficiente. — Continue com isso, Celine, e logo terá de responder à justiça. — Luc jamais permitiria isso. — Afrouxou a pressão em seu braço. Ana foi para a porta, mas parou ainda um instante. — Pode ser que esse seja um bom momento para lhe dizer que eu estava no quarto quando Luc ligou para você, ontem. O ex-presidente já dera início a seu discurso, e Luc lançou a sua mulher um olhar demorado quando ela se acomodou novamente em sua cadeira. O discurso foi seguido de aplausos entusiasmados, as luzes tornaram a brilhar, os garçons apressaram-se em servir o café e a sobremesa. — Você está bem, Ana? — Adivinhe! — Não preciso. Celine a seguiu ao toalete. — Acertou de primeira. — Vocês discutiram. — Ah, você tem poderes psíquicos! — Fez ameaças? — Bem, ela não fica atrás de você. Ana não queria ter sido tão rascante, mas percebeu que o fora quando o olhar de Luc se tornou frio. Ele tomou sua mão e entrelaçou seus dedos aos dele, apertando-os firme, quando ela tentou soltar-se. — Já tratamos disso na noite passada. 51


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— Tem certeza? Pensei que só tivéssemos feito sexo. — Isso também. O garçom colocou xícaras e pires na mesa, e Ana informou que preferia o chá. — Vou levá-la para casa. — Não quero ir ainda, Luc. Escapar não é a solução. — E uma discussão em público também não é. Ana arqueou uma sobrancelha. — Era isso o que íamos fazer? — Esteja certa disso. Ela pegou um envelope extra de açúcar e colocou no chá. — Preciso, então, acumular energia para a briga. — Não me provoque. — Estou tremendo! — Ela o brindou com sorriso charmoso. — Muito corajosa... — O tom brincalhão com que ele disse isso fez com que a raiva de Ana chegasse ao topo. — O que mais devo temer de você? O que faria além do que já fez? A emoção transpareceu no semblante dele, e Ana sentiu um arrepio de apreensão correr-lhe por toda a espinha. — Cuidado, pedhaki mou. Estavam quase indo além de um diálogo civilizado. Por isso, Ana iniciou em seguida uma conversação animada com um outro convidado. Dois minutos depois, Luc anunciava que deviam ir embora. O rosto de Ana chegou a doer, tamanho esforço que fazia para sorrir, ao caminharem de uma mesa a outra, despedindo-se de amigos e conhecidos. Mas, ao se dirigirem a Vaucluse, mantiveram-se calados. Uma vez dentro de casa, Ana subiu correndo para a suíte. Luc ligou os alarmes e também se recolheu, abrindo a porta do quarto no momento em que ela tentava, sem sucesso, livrar-se da gargantilha em seu pescoço. Ele pendurou o paletó no cabide, como sempre, afrouxou a gravata e desabotoou os primeiros botões da camisa. Sem demora, cruzou o aposento até Ana. — Deixe-me fazer isso. Ana sentiu o toque dos dedos quentes em sua pele, e teve vontade de se afastar para muito longe dali. Mas aquilo iria apenas colocar lenha em uma fogueira que já estava bastante poderosa. Em menos de dois segundos, a gargantilha estava solta. Luc a fez virar-se para ele, para que Ana o encarasse. — Ainda quer brigar ou podemos fazer uma trégua? — Quero brigar! — Está bem, o primeiro soco é seu. Ela fechou o punho e mirou o peito de Luc, apenas para sentir a rigidez e o vigor dos músculos machucando seu pulso. — O certo é que seus joelhos se dobrem e que em seguida você caia ao chão. 52


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— Quer tentar de novo? — Ele estava se divertindo, e Ana não sabia o que estava fazendo. Com um olhar irado, massageou os dedos, que doíam. — Não neste momento. Luc colocou ambas as mãos nos ombros dela, tomando cuidado para não prender seus cabelos. Em seguida, soltou o zíper de seu vestido, que caiu de uma só vez, deixando à mostra apenas a lingerie de seda e rendas, que enfeitavam suas curvas bem-feitas. O efeito que seu corpo causava em Luc era evidente. Por um momento ele mal respirou, atento à epiderme alva e macia, aos seios firmes, à cintura estreita e coxas esbeltas. Ele tinha de tocá-la, sentir aquelas formas em suas mãos, sentir seu gosto. Precisava possuí-la, sentir todo seu calor. Inclinou-se para beijá-la. Dessa vez, sem titubear, Ana acertou um soco bem abaixo de suas costelas. — Isso é que se chama efeito surpresa! A partir daí, Luc a tomou no colo, zangado, fazendo com que cruzasse as pernas ao redor de sua cintura. Sem soltá-la, tirou toda sua própria roupa, mantendo sempre o olhar preso no dela, fitando-a de um modo primitivo. Através da seda fina da calcinha, Ana podia sentir a excitação crescente do marido. E, com apenas um movimento, Luc puxou com os dedos a fina tirinha que a cobria. Não havia nenhuma sombra de controle ou de medida nas atitudes dele. Apenas uma paixão eletrizante, o desejo que precisava ser satisfeito. Penetrou-a de uma só vez. Seu impulso forte e ritmado fazia Ana arfar, querendo mais e mais. — Luc... — Ela mal pôde falar quando uma forte sensação de prazer explodiu dentro dela e a fez contrair-se seguidas vezes. Quando pensou que não poderia agüentar mais, Luc se dirigiu à cama e deitou-se em cima de Ana, no colchão. Mais uma vez ela entrou em êxtase, o gemido deleitado abafado pela boca de Luc, que tomava a sua com paixão, como se duplicasse o ato sexual. Quando o clímax chegou, ele a abraçou forte, e assim permaneceram ainda por um longo tempo, sem se mover, ouvindo as batidas dos corações, que aos poucos voltavam a se acalmar. — Acorde, meu anjo. Ana registrou a voz de Luc e o que dizia, e abriu os olhos apenas um pouquinho. Era manhã de domingo. Não tinha de ir para a loja, e não sentia a menor vontade de sair do leito às... oito horas, constatou, consultando o relógio.

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Olhando-o com mais atenção, percebeu que o marido já tomara banho, e vestia uma calça jeans desbotada e camiseta. Parecia revitalizado, e pronto a tirar a paz de qualquer mulher que o visse. Sobretudo ela. — É melhor que tenha uma boa razão para sugerir que eu acorde neste horário. Luc indicou a bandeja na mesinha ao lado. — Chá com torradas. E frutas. Ana sentou-se. Ao notar que estava nua, procurou desviar a atenção dele, enquanto se cobria. — Foi você quem preparou tudo isso? Luc sentou-se no canto da cama. — Não fique tão surpresa. — Obrigada. — Os lábios dela se curvaram num sorriso suave. — Só não entendo por que me quer fora do leito, em vez de tentar me manter nele. O que planeja? — Um passeio de barco que dure o dia todo? Ana mal conteve a excitação, e respondeu de pronto: — A que horas quer sair? — Tão logo você esteja pronta. Ela estava corada, seus olhos, brilhantes e profundos. Luc queria passar todo o tempo possível com Ana, para tentar sanar todo o mal que Celine pudesse ter lhe causado. — Vai ficar aí sentado me vendo comer? Luc se mostrava muito relaxado, e mesmo assim tinha um ar sensual que mexia com as emoções dela. — Já tomei meu desjejum. Ana terminou o chá e as torradas, descascou a banana e comeu-a também. — Preciso de um banho. — Vejo-a lá embaixo. Vinte minutos? Em quinze Ana já estava pronta. Jeans, um top e um agasalho leve para protegêla da brisa no final da tarde. O céu estava tingido por um azul maravilhoso, nenhuma nuvem à vista. O calor do verão se fazia sentir quando chegaram à marina. Depois de uma semana tão difícil, a idéia de passar todo o dia no mar, no conforto do barco de Luc, parecia-lhe um sonho. Em poucos minutos, ele já ligava os motores e dirigia para mar aberto. Ana se manteve a seu lado, admirando o beiral de pedras que avançava para o oceano, coberto de luxuosas mansões, muitas com ancoradouros. Ouvia-se apenas o barulho dos motores. — Vai se encontrar com seu primo no aeroporto? Luc dirigiu-lhe um rápido olhar. — O avião de Jace chegará tarde. Ele apanhará um táxi até o hotel, e me ligará de manhã.

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Havia outras perguntas que Ana gostaria de fazer, mas resolveu deixá-las de lado. Não queria nada que pudesse quebrar a harmonia que vivenciavam. O sol ficou mais alto no firmamento, as águas refletiam sua luz. Já perto de meio-dia, Luc desligou os motores e jogou a âncora. — Hora do almoço. Quer comer aqui fora ou na cabine? — Aqui mesmo — Ana disse, sem hesitação, correndo a ajudá-lo com o suco gelado que colocara no freezer. Petros tivera muito trabalho, ela notou, quando viu que Luc arrumava um presunto suculento, várias saladas, salpicão de frango, vários tipos de pão fresco e frutas. Era um banquete, Ana decidiu, enquanto organizava pratos e talheres, e se acomodava na cadeira estofada. Luc chegou pelo lado oposto, trazendo a bandeja com o salpicão, em visível contentamento. Sem querer, Ana transportou-se para a semana anterior, lembrando-se das emoções tão ambivalentes que experimentara. Será que Luc teria ido buscá-la se não houvesse descoberto que esperava um bebê? E se ela houvesse insistido com a idéia do divórcio, ele teria lutado para que se reconciliassem ou apenas chamado seu advogado? Ana queria essas respostas, mas não tinha coragem de fazer as perguntas. E se o que iria ouvir de Luc não fosse o que ele iria dizer? Será que o marido se importava mesmo com ela? Ou era tão-só uma esposa conveniente que satisfazia seus desejos? Na cama, tinham um acordo perfeito. Longe dela, Ana passava as horas tentando se convencer de que estava feliz com seu status. Dias antes imaginara que tinha escolhas e opções. Naquele momento, sabia que isso não era verdade. — Sim. Os olhos dela se arregalaram por trás das lentes dos óculos escuros. — Está lendo pensamentos? — Posso ler sua expressão. Sim... Eu teria ido buscá-la em Sydney. E não... — Luc continuou, com extrema suavidade. — Não apenas porque descobri que você espera meu filho. Ou por alguma forma de vingança por seu pai haver se apropriado indevidamente dos fundos do banco. Será que ousaria acreditar nele agora? Queria tanto poder fazê-lo... O chamado do celular se intrometeu naquele segundo de um jeito bastante inadequado. Ana demorou um pouco para perceber que era o seu próprio aparelho. Não reconheceu o número, e se espantou quando, ao ouvir o recado, soube que era de William, que chegara a Nova York sem problemas, e resolvera lhe passar o número de telefone e endereço do hotel onde estava hospedado. Ana ligou para Rebekah, para contar as novidades. Em seguida, arrumou os restos do almoço deles, e Luc tornou a acionar o motor para se dirigir a Botany Bay.

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Estava tão quente que Ana resolveu ficar só de biquíni, cobrindo cada centímetro de pele com um filtro solar potente. Deitou-se sobre uma toalha e permitiu que o ar marinho fizesse sua mágica. Devia ter cochilado, porque quando voltou a abrir os olhos, o astro-rei já estava bem mais baixo no horizonte. Ainda fazia muito calor, mas Ana resolveu vestir-se antes de se levantar. Os motores estavam silenciosos, e ela localizou Luc deitado numa espreguiçadeira, lendo um romance. Assim que a viu, deixou o livro de lado. — Pronta para voltarmos? — Sim. Obrigada. Um pequeno sorriso surgiu nos lábios dele. — Podemos sair mais tarde, para jantar. A idéia de ter de se arrumar não a agradou. — Por que não compramos alguma coisa e jantamos na mansão? — Algo em particular? — Macarrão com legumes, camarão e arroz. Que tal comida chinesa? — Fechado. Ela olhou para ele, espantada. — Não vai discordar de mim? — Por que o faria? — Luc adorou ver o brilho de alegria nos olhos dela. — Está ficando muito tolerante. — E isso é tão terrível? — A provocação dele fez Ana rir. Ana quase podia imaginar que estavam como em seus primeiros dias de casamento, antes de pensar que seria apenas alimentar ilusões. Mas havia uma parte dela que desejava demais voltar ao que já haviam vivido: a afeição, o carinho, o clima de brincadeira, a espontaneidade. O amor sem inibições, quando não havia dúvidas e inseguranças. Eram quase seis horas da tarde quando deixaram a marina. Luc parou em um restaurante chinês conhecido, e puderam comer pasteizinhos fritos, sentados a uma mesa no terraço da mansão. Oliver sentou-se junto deles, sempre na expectativa de que algo pudesse ser derrubado sem querer no chão. Depois disso, apreciaram o pôr-do-sol, os raios laranja cintilantes que aos poucos iam se entremeando aos rosados. Fora um dia perfeito, e Ana não queria de forma alguma que chegasse ao fim. Na segunda-feira, voltaria ao trabalho, e à noite jantariam com Rebekah e Jace. Não deveria se esquecer de Celine. Aquela mulher estava sempre à espreita, pronta a atacar à menor chance.

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CAPÍTULO IX

Segunda-feira foi um dia cheio, e nem Ana, nem Rebekah tiveram um só minuto de descanso na Laços e Toques. Já passava das seis da tarde quando conseguiram encerrar o expediente. O trânsito para Vaucluse estava intenso, ainda mais lento que o usual. Luc se encontrava poucos metros à frente de Ana na estrada, e ela seguiu o Mercedes para a garagem, descendo do automóvel. — Você está atrasada. Percebendo o tom de desaprovação, Ana forçou um sorriso. — Bem, então você também está. Um pequeno sorriso se esboçou nos lábios dele. Colocou a mão por trás do pescoço dela e puxou-a para mais perto de si. — Tem uma língua ferina, mocinha. — Inclinando a cabeça, deu-lhe um beijo provocante, que a fez flutuar. — Por que isso, agora? — Porque tive vontade. — Luc traçava com o polegar a linha dos lábios dela. Será que ele fazia idéia do que o simples gesto lhe causava? Na cama, Ana não tinha a menor dúvida de que sim. Mas e fora dela? Apenas pensar nele já fazia com que o sangue lhe corresse mais rápido nas veias. Química sexual, ela sempre se dizia, era uma entidade poderosa. Mas e amor? O encontro de uma alma gêmea a quem entregar sem reservas o coração? Será que era algo impossível de se atingir na vida real? Será que esse tipo de sentimento só existia em fantasias românticas? Quando se casara com Luc, Ana sabia que amor não fazia parte do acordo. Mas no fundo desejava muito que isso mudasse. — No que está pensando? Ana piscou ao ouvi-lo, e transportou-se de suas reflexões para o presente. — Estava apenas imaginando o que pode acontecer entre Jace e Rebekah. Luc passou um braço por seus ombros, e se dirigiram ao hall. — Garanto que Jace não precisará de muito esforço para adoçá-la. “Como você faz comigo?” Já subindo as escadas, enquanto Luc parava para conversar com Petros, Ana afirmou apenas: — Rebekah não concordaria com você.

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O barulho da água não permitiu que ela percebesse que a porta se abria. Levou um susto enorme quando Luc abriu a porta do boxe. — O que acha que está fazendo?! Ele pegou o vidro de condicionador das mãos dela e espalhou uma boa quantidade em suas próprias mãos, começando a massagear seus cabelos. — Mimando-a um pouco. A entonação sensual com que disse isso colocou os nervos dela à flor da pele. — Não preciso disso, Luc. As mãos dele passaram por seu pescoço, e então foi como se um toque mágico se espalhasse até os ombros. Toda ela se aqueceu, o pulso acelerou. Luc a colocou debaixo do chuveiro, esfregando com cuidado sua cabeleira, e com delicadeza encostou a boca na dela, em movimentos rápidos e provocantes. Ana se achegou a ele sem poder se conter, a volúpia crescendo. A excitação de Luc foi instantânea. Ana sentia a força de sua virilidade de encontro a si. Gentil, ele se afastou um pouco e segurou seus braços, o olhar passeando por todas as curvas perfeitas, apreciando sua formas arredondadas. Seu filho estava ali, dentro dela. Aquilo o inebriava. Era um milagre, uma maravilha. Já podia perceber a diferença no tamanho dos seios de Ana, nos mamilos... Traçando seu contorno com carinho, apertou—os com suavidade com a ponta dos dedos. Deixou que uma de suas mãos pousasse na barriga dela, imaginando quanto tempo demoraria até que começasse a crescer. Mais algumas semanas? — Luc... — Quero olhar para você. — Não... — Não o quê? — Vamos nos atrasar. Ele sorriu, divertido. — Então vamos nos atrasar. O protesto morreu ali mesmo. Ana sentia que algo mágico passava a ter início. Com certeza poderia ser perdoada por querer prolongá-lo. — Rebekah não vai me perdoar. Ana deu um gemido alto quando, sem aviso, os dedos dele escorregaram por seu ventre, pousando direto no ponto mais sensível de sua anatomia. Tudo o que Luc precisou fazer foi movimentar um pouco os dedos, e ela se esqueceu de tudo... para ser apenas dele. Nada mais importava. Apenas aquele homem, aquele momento.

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Era até possível imaginar que tudo corria bem em seu mundo. Não havia intrusos, não havia amantes, e nenhum fantasma da primeira esposa de seu marido teria alguma interferência na perfeição do momento que dividiam. Mais tarde a realidade voltaria. Porém, naquele instante Luc era só dela, seus sentidos, seu afeto. Seria tão errado querer tudo? O coração dele, a alma? Já eram quase oito horas quando chegaram ao restaurante, e Ana sentiu a tensão no ar antes mesmo de se aproximar da mesa. — Ana... — Jace se levantou e cumprimentou-a com um abraço afetuoso. — Você está linda, querida. Se já não estivesse casada com meu primo, não teria pudores em roubá-la dele. Os olhos negros tinham um brilho malicioso. — Se Luc a maltratar, pode me dizer que o mato. — Galanteador... — Ana esboçou um sorriso charmoso, sentando-se na cadeira que o garçom lhe oferecia. A semelhança entre os dois primos era notável. Tinham a mesma altura, os mesmos ombros largos, olhos pretos. Poder e um ar selvagem, uma combinação bombástica. Qual seria a diferença de idade entre os dois? Um ou dois anos apenas, na certa. — Você sabia que eu não queria ficar sozinha com ele —Rebekah sussurrou, enquanto Luc e Jace escolhiam os vinhos. — Tenho certeza de que soube lidar muito bem com a situação. Dada a expressão pensativa e ao mesmo tempo divertida de Jace, não era difícil imaginar que ele tivera sucesso em irritar Rebekah. — Bem, contem-me como vão indo com a floricultura —Jace pediu, o olhar vivaz, atento. — Estive fora por algumas semanas. Rebekah pode lhe dar mais detalhes, porque está mais envolvida com a loja nesse momento. — Para quê? — Rebekah reagiu de pronto. — Duvido que Jace esteja mesmo interessado. — Lógico que estou! Interesso-me por tudo que você faz. Ana previa uma discussão pouco amigável se aproximando. — Oh, é mesmo? — Rebekah o encarou com ironia. Quem a visse diria que não estava se importando com o clima pesado, mas Ana conhecia muito bem sua irmã. A questão era saber se Jace também poderia enxergar por baixo da máscara. — Quer ouvir que o dia de uma florista começa às quatro da manhã, quando ela sai do mercado de flores? E que, se ela chega depois das cinco, os melhores botões já foram todos vendidos? — Ela ergueu as mãos. — E que estas são nossas principais ferramentas. Rebekah dirigiu-lhes um olhar desanimado.

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— Elas ficam na água, são cortadas e rasgadas pelos espinhos, e criam calos permanentes. As luvas nunca adiantam, ou são muito pesadas ou muito finas, e os cremes não conseguem conter os danos. Manicuras? Jamais! — Fitou a todos, com cinismo. — Querem mais? — Esqueceu-se de mencionar que têm de ficar em pé o dia todo, e também lidar com os clientes mais difíceis. E os pedidos para endereços que não existem? — Jace brincou. Rebekah preferiu ficar em silêncio, e Ana sabia bem o quanto isso lhe custava. A comida pelo menos estava maravilhosa, e foi um prazer para Ana degustá-la. — Até quando ficará em Sydney? — Só o necessário para negociar algumas propriedades. Luc lhe falou que estou pretendendo levá-lo a Melbourne daqui a dois dias, Ana? — Ainda não. Jace sorriu, malicioso. — Pode agüentar ficar sem ele por algumas noites? — Com facilidade. Luc segurou a mão dela e levou-a aos lábios. — Esperava que dissesse que não. As íris negras tinham um brilho afetuoso, sensual, que fez com que seu pulso se acelerasse no mesmo instante. — É mesmo? Jace, sorrindo, brindou com Ana. — Saúde! Não conheço outra mulher que ousaria colocar Luc à prova! — Essa é a especialidade dela... — Dê-se por feliz, primo. Ana percebeu um olhar expressivo de Rebekah, e resolveu levar a conversa para um terreno mais amistoso. — Podemos jantar e ir ao cinema enquanto Luc estiver fora. — Quarta-feira à noite? — Combinado. — Tenho direito à palavra? — Luc perguntou, com um jeito brando. — Há como escapar? — Deixe que Petros as leve, querida. — Não seja ridículo. — Posso ir sem o carro — Rebekah sugeriu, querendo se dar uma folga. — Ótimo! Afinal, Petros também é nosso chofer. — Lembre-me de lhe dar um soco quando chegarmos em casa — Ana disse em tom de brincadeira, mas a expressão era bastante séria. — Vou, então, fazer jus a ele. Ana não poderia mesmo ganhar, por que tentar? Mesmo assim, a batalha tornou o clima mais ameno, e a noite não deixou de ser agradável.

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Já passavam de dez horas quando saíram do restaurante e voltaram para a mansão. — A que horas irá para Melbourne? — Ansiosa por se ver livre de mim, pedhaki mou? — Preciso responder? Não havia como não atacá-lo. Mesmo que não fosse a vontade de Ana. Quando se deitaram, ela não protestou quando Luc a abraçou, mantendo-a colada a ele. Luc beijou sua nuca, traçando uma trilha sensível até poder mordiscar sua orelha. Ela adorava senti-lo, o aconchego do peito largo, o corpo vigoroso. Luc a fazia saber-se viva, como nenhum outro homem jamais conseguira. O sexo entre eles era o melhor. Incrível. Por algum tempo ela se sentiu eufórica, por estar ali, abraçada ao dono de seu coração e sua alma.

Ana se virou ao ouvir o som da campainha da porta da loja. — Jace! — E brindou-o com um sorriso muito afetuoso. — Que bom vê-lo! Ele beijou-lhe a face. — Bom ver você também, Ana. — Está nos visitando a negócios ou diversão? — As duas coisas. — Rebekah saiu, mas voltará em poucos minutos. — Então, vou esperá-la. — Sabia que iria... — Sou tão transparente? Ana inclinou um pouco a cabeça, fingindo refletir. — Você é um Dimitriades. Transparência não é um de seus traços. Procurar desafios, sim. — E continuou, em um tom autoritário: — Tome cuidado com minha irmã. — Senão vai guerrear comigo? — Pode contar com isso. — Considero-me avisado. — Não acredito que vá me dar alguma pista quanto a suas intenções... — Não. — Ora! Jace afastou uma mecha do rosto dela. — Posso entender por que meu primo colocou uma aliança em seu dedo. — E por que teria sido? — Para deixá-la fora do alcance de outros homens. — Nesse caso, ele precisa se lembrar de que também coloquei uma aliança no dedo dele. 61


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Jace ficou sério. — Problemas, Ana? O telefone proporcionou uma interrupção bem-vinda. Ana anotou o pedido, pegou o número do cartão de crédito e acenou para um cliente que passava pela rua. O retorno de Rebekah coincidiu com um outro chamado telefônico, e o assunto com Jace não foi retomado. Ana resolveu atendê-lo, percebendo que Jace havia feito um pedido de flores para Rebekah. Pelo menos duas dúzias de rosas, Ana percebeu pelo tamanho do papel celofane que Rebekah estendeu sobre a mesa, posicionando nele os botões, com todo o cuidado. Foi só Ana colocar o fone no gancho, e um homem entrou no estabelecimento. Escolheu um dos arranjos já preparados, pagou por ele e tornou a sair. Ana consultou o relógio da parede. O rapaz que faria as entregas logo chegaria, e os pedidos precisariam estar prontos. O que quer que estivesse acontecendo entre Rebekah e Jace chegara ao fim, e ela respondeu à despedida dele com um sorriso, observando-o passar pela porta. — Aquele homem... — Rebekah começou a desabafar, juntando-se a Ana à mesa. — O que tem ele? — Não entende a palavra não. — É mesmo? — Viu o que Jace acabou de fazer? Comprou um ramalhete, pagou por ele, escreveu um cartão e entregou-o para mim! — Uma atitude imperdoável... — Ana brincou. — E o que dizia o cartão? ‘‘Pego você às sete horas para jantar”. — E é óbvio que você não vai. — Claro que não! — E não estará aqui quando ele ligar. — Acertou. Ana colocou mais um buquê ao lado, apanhou o próximo pedido e começou a prepará-lo. — Talvez devesse jantar com Jace... — Está louca? — ...e dizer-lhe tudo o que pensa dele — Ana continuou, ignorando o protesto da irmã. — Se eu não soubesse que se importa comigo... — Rebekah a encarou, com ironia. — ...acharia que quer que eu saia com o primo de seu marido. — Nem todos os homens são como Brad. — Ainda bem. Mas não serei eu a comprovar isso. — Jace é... — Um bom sujeito? Vamos, Ana! A maioria dos rapazes tem uma fachada civilizada. No início. No entanto, quando o sol se põe... transformam-se em polvos. E não vou ficar com alguém apenas para satisfazer seus desejos. 62


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— Pretende se trancar numa redoma para não correr riscos? — Isso mesmo. Melhor não responder, Rebekah já sabia tudo o que iria dizer. — Está bem. — Como é?! Não fará nenhum sermão? — Não. — Está me decepcionando, Ana. — Se quer brigar, vá procurar outra pessoa. — Como Jace? No jantar? Ana escondeu o rosto para não sorrir, observando a irmã, que cortava os botões que ganhara de Jace em numerosos pedaços. — As flores não têm culpa de sua raiva. — Não, não têm. — Interrompeu o que fazia. — Vou colocá-las de novo no estoque. — Jace pagou por isso. — E então? Devo apenas deixá-los onde estão? — Leve-os para casa. Rebekah fuzilou-a com o olhar. — Leve você! — O presente é seu. — Vão voltar para o estoque. Ana fez uma pausa, para depois falar, com toda a calma: — Não permita que um erro do passado lhe tire a chance de ser feliz no futuro. — Com Jace Dimitriades? Está mesmo louca! — Jace... Ou qualquer homem. Rebekah abriu a boca para falar, mas fechou-a de novo. — Considerando o que vivi com Brad, antes e depois do casamento, está sugerindo que mergulhe em águas infestadas de tubarões mais uma vez? — Tubarões são perigosos. — E Jace não? — Se for, sei muito bem que você também tem bons dentes. Rebekah apertou as mãos e suspirou, sorrindo em seguida. — Eu desisto. — Além do mais, se você o morder, poderá saber que gosto tem. A campainha da porta tocou ao mesmo tempo que o telefone. Negócios, Ana reconheceu, eram prioridade naquele momento. Mas não pôde deixar de pensar que talvez Jace Dimitriades fosse quem Rebekah precisasse para restabelecer um pouco de sua fé nos homens. Estavam no meio da tarde quando Ana ouviu seu celular, que atendeu ao segundo toque. — Olá, Luc. — O que acha de irmos ao cinema esta noite? 63


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— Estamos falando de um evento de gala ou de uma sessão tranqüila em um local pequeno? — Uma première, nos Estúdios Fox. Sim, seria uma noite de gala. — Eu havia esquecido — Luc se justificou. — Caroline me lembrou, esta manhã. A secretária ultra-eficiente, que controlava toda a agenda de Luc. — A que horas precisamos sair? — As sete. Petros servirá o jantar às seis. Tente não se atrasar. Dessa vez Ana conseguiu ir embora no horário. Em parte pela prontidão de Rebekah, em parte pela funcionária que contrataram para ajudá-las. Escolher o que vestir não foi difícil. Ana tirou do cabide um vestido que lhe caía muito bem, acentuando suas formas bem-feitas. Estendeu-o sobre a cama e parou para admirar o brilhante tom azul-esverdeado. Era como se tivesse uma luminosidade própria. Perfeito para a noite, acentuava a cor de seus cabelos e destacava o verde de seus olhos. — Qual é o filme? Quem são os atores? — Ana quis saber, a caminho dos estúdios. — A atriz principal é uma americana, criada na Austrália, assim como o produtor. Ana lembrou-se de haver lido a propaganda no jornal e alguns trailers na TV. Prometia ser um filme interessante e divertido. A presença de Celine era garantida, visto que todas as socialites haviam sido convidadas. Ana só esperava que houvesse uma boa distância entre seus lugares. O jogo social era uma arte refinada, Ana pensava, quando um dos convidados chamou por Luc. Houve a costumeira troca de gentilezas, as opiniões ocasionais sobre negócios e a necessidade de memorizar vários nomes. Tinha de cumprimentar Luc. Seu marido se saía sempre muito bem. — Tem uma memória invejável — Ana murmurou, ao se dirigirem a seus lugares. — É um talento adquirido. — Parte dos negócios. — Ela não desejava ter colocado de cinismo em sua fala. — Uma cortesia essencial — ele elaborou, o olhar se tornando mais sério quando percebeu que Ana apertava a alça da bolsa. — Prometo que ela não se aproximará de você. Ao escutar aquilo, Ana quase se sentiu protegida. — Pretende ficar a meu lado a noite toda? — Como cola. — Isso pode ser bem interessante... Os dedos dele se enlaçaram aos dela. — Estou contando com isso. — Vamos suportar tudo juntos? A expressão dele ficou séria por um segundo, e ela pôde perceber sua forte determinação. 64


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—Sim. Ana não imaginava o quão junto Luc ficaria dela. O tempo todo, pôde sentir o toque suave em seu braço, ou o enlaçar em sua cintura, o jeito como a mão dele lhe fez massagens na nuca de quando em quando, como sua palma descansava em seus ombros e a acariciava. A sensação de segurança que Luc lhe transmitia, enquanto conversavam com os demais convidados, era reconfortante, e Ana desejava muito que fosse real. Sentia-se viva com as sensações que o toque dele lhe provocava. Poderia jurar que o sangue corria mais rápido em suas veias e todos seus nervos eram ativados. Luc a completava, eram duas metades que formavam um todo perfeito. Apenas ele era sua alma gêmea, ninguém jamais poderia substituí-lo. Amor. Incondicional. Um presente que não tinha preço. E se fosse recíproco, então... Seria com o paraíso na terra. Ana surpreendeu-se com o beijo suave e repentino dele em sua boca, e não pôde conter a emoção que o olhar impenetrável lhe causou. Por um momento, sentiu-se vulnerável e mordeu o lábio, tentando evitar que tremesse. Será que o marido notava o que ela tentava desesperadamente esconder? Com o polegar, Luc traçou o rosto dela, e depois beijou-a repetidas vezes, fazendo-a quase implorar para que não parasse mais. Sua voz emergiu como um rouco sussurro: — Por que isso? O sorriso simples dele a desarmou. — Porque eu quis. Por alguns segundos, Ana deixou de notar tudo a seu redor. Só havia Luc e aquele momento. Observou sua força, sua integridade... Será que sua paixão a fazia imaginar tudo aquilo? “Tome jeito”, ordenou a si mesma, piscando rápido para se libertar do encantamento. Luc estava tão-só desempenhando seu papel. Querendo desviar o foco de sua atenção, Ana observou o salão. Lá estava Celine, com o olhar fixo neles. A inveja estava refletida em seu semblante. Seu ódio transparecia a quem quisesse vê-lo. Tudo parou de repente, e Ana, sem se dar conta, prendeu a respiração. Levou uma mão à garganta por um segundo, e em seguida tocou seu pingente de diamantes, mantendo o braço a sua frente num gesto de autodefesa. Como era possível uma pessoa carregar uma aura tão maligna? Ou ficar possuída por uma obsessão que trazia apenas destruição? Ana sentiu um arrepio de apreensão correndo por sua espinha. Seria uma premonição? Mas qual? E onde, quando?

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Estavam em uma sociedade civilizada, e Celine fazia parte do círculo da elite de Sydney. Que dano poderia causar? Uma coisa era sentir inveja, ciúme. Outra era transformar esses sentimentos em atos. — Ana! Luc! Que bom ver vocês aqui. Ana reconheceu a voz feminina e fez questão de estimular ainda mais uma conversa com um outro convidado, que era famoso por dirigir instituições de grande importância social. Ele falava sobre um grande evento que realizariam no mês seguinte. — Tem passado bem, querida? Uma pergunta politicamente correta? Qual sua verdadeira intenção? Por sorte, foi interrompida pelo anúncio de que os atores do filme logo chegariam ao auditório. O tapete vermelho, as luzes extras, a segurança já se posicionavam. Tudo fazia parte do glamour daquele evento. De uma só vez, os convivas caminharam até o tapete vermelho, para esperar pela chegada dos VIPs. Ao sentir que Luc a abraçava, Ana se aproximou ainda mais dele. Experimentou o hálito morno bem perto de seu rosto, e, cedendo à tentação, achegou-se ainda mais ao marido, adorando o modo como seu braço a apertou ainda um pouco mais. Colada a Luc daquele jeito, podia até fingir que seu casamento corria bem. Que ele a adorava e que ninguém conseguiria se impor entre os dois. Uma agitação tomou conta dos presentes e o primeiro dos atores entrou no auditório, seguido de perto pelos outros. A atriz principal, sozinha, já era um show. Com um vestido incrível, um corpo maravilhoso, uma maquiagem muitíssimo bem aplicada, tinha um brilho estonteante. Todos sabiam, as revistas noticiaram, que ela passara havia pouco por uma série de problemas emocionais, mas nada se percebia por trás de seu sorriso, pelo modo seguro com que caminhava, cumprimentando a todos que estavam ali para vê-la. Ana a aplaudiu por sua imponência, e sobretudo pelo modo como conseguiu manter sua vida pessoal fora do alcance do público. O ator principal a seguia, charmoso, cumprindo à altura seu papel na máquina da publicidade: fazer com que as mulheres suspirassem. Toda a equipe se encontrava ali, e seguiu para os lugares reservados a eles, o que encorajou os convidados a retornarem a seus próprios assentos. Celine, Ana percebeu com alívio, sentara-se três fileiras à esquerda deles. Sentiu-se então relaxar quando as luzes se apagaram e o filme começou. Ana esteve muito consciente da proximidade de Luc durante todo o filme. O calor de sua mão que segurava a dela, os olhares e sorrisos que trocavam em cenas engraçadas.

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Á trama prendeu a atenção de todos, sua qualidade era excelente. Durou duas horas, e foram muitos os aplausos quando a linha de créditos começou a rolar. Ana se sentia bem, tranqüila. As pessoas começaram a se deslocar para o salão, onde estavam sendo servidos champanhe, café e chá. Todos traçavam comentários sobre o filme e recordavam-se das cenas mais marcantes. Será que Celine se aproximaria deles? Parecia impossível imaginar que não o fizesse, e Ana resolveu tomar um gole de chá, quase esperando pelo momento em que ela iria se intrometer. Vários minutos se seguiram, e não houve sinal dela. Não era possível. Celine não perderia uma oportunidade daquelas! — Podemos ir? Ana encarou Luc e inclinou a cabeça em sua direção. — Quando você quiser. Demorou bastante até que conseguissem deixar o auditório... e nem sinal de Celine. Será que ela havia ido embora? O Mercedes seguiu seu caminho pelas avenidas da cidade, e Ana se permitiu pensar em Rebekah e Jace Dimitriades. Teriam eles se entendido? Ana torcia por isso. Só no dia seguinte, porém, ficaria a par dos detalhes. Já em seu quarto, Luc ajudou-a a tirar o colar com extrema delicadeza. Acariciou seu rosto com os lábios, como se quisesse prová-lo, sentir seu sabor, guardála dentro de si. Logo o vestido dela foi jogado no tapete. A ausência do sutiã fora uma provocação por toda a noite. Luc sentia-se quase obcecado pela idéia de chegar logo em casa e libertar os seios quentes, macios, sugá-los até que ela soltasse um daqueles seus gemidos roucos, que o enlouqueciam. Será que Ana imaginava como o fazia perder o fôlego, tão linda que era? Não apenas fisicamente, mas em seu coração, sua alma? Ela era tão generosa... era parte dele. E Luc queria provar-lhe isso com as mãos, com a língua, exultando com o prazer que lhe proporcionava, com sua respiração ofegante. Queria lhe proporcionar todo o prazer que sentia com ela. Ana amava o sabor da pele dele, o aroma masculino sua expressão de prazer quando ela o acariciava com a boca em seus pontos mais sensíveis. Fizeram amor de um jeito tão afetuoso que uma forte emoção tomou conta dos dois. Força e delicadeza. A sensualidade sutil e o desejo que queimava. Juntos, misturavam opostos, diferenças, transformavam-se em um só corpo, um só desejo. Era fascinante. Mesmo depois, satisfeitos, as carícias suaves continuavam, o toque delicado dos lábios, a languidez da satisfação completa, as demonstrações de carinho. No dia seguinte, ele partiria para Melbourne. Seriam três dias, duas noites, sem Luc. Ana sentiria demais sua falta. 67


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CAPÍTULO X

Ana acordou tarde, e percebeu, desapontada, que Luc já havia partido. Por que aquela dor tão forte no peito? Seriam só alguns dias... Três dias e duas noites, para ser mais exata. Como sempre, manteve-se muito ocupada por toda a manhã. Apenas no almoço, enquanto comiam sanduíches, ali mesmo na loja, foi que conseguiu conversar com Rebekah. — E o jantar com Jace, como foi? Conte-me! A irmã parecia hesitante. — Não foi como eu esperava. — O que quer dizer? — O restaurante era ótimo, a comida, maravilhosa... —Deu um suspiro. — Foi diferente. — Em quê? — Nós conversamos. Ana começava a achar graça. — Não esperava conversar com ele? — Não. Quer dizer, é claro, mas trocamos opiniões, pontos de vista... — Algum tema em particular ou apenas generalidades? — “Um dia na vida de uma florista.” Você iria rir muito. Foram muitas piadas também. — E... nada? — Sem provocações, flertes ou tentativas de sedução. Jace parecia haver mudado sua estratégia, Ana entendeu, e imaginou se ele tinha conseguido enxergar através da armadura que Rebekah impusera a si mesma, desde que seu coração, que tinha tanto amor para dar ao homem certo, fora traído. — Tornará a vê-lo? — Acho que não.

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Bem, a reposta parecia mesmo nova em comparação a seu costumeiro “Não!”. De todo modo, parecia melhor encerrar a conversa por ali. Rebekah parecia estar precisando conversar consigo mesma antes de qualquer coisa. O telefone tocou, e Ana atendeu de pronto, sua voz afetuosa, simpática, profissional: — Laços e Toques, Ana falando, boa tarde. — Quero fazer um pedido, se vocês garantirem a entrega até a tarde. Seria apertado, mas possível, e Ana anotou todos os detalhes, endereço, número do cartão de crédito, estilo do buquê. — Seu nome, por favor? — Celine Moore. Celine nunca encomendara flores antes, e Ana não percebeu ou não quis perceber que era ela ao telefone. A questão era: por que naquele momento? — Algum problema? — De modo algum — Ana disse, logo agradecendo pelo pedido e terminando a ligação. Mordendo o lábio inferior, resolveu tomar logo as providências para a entrega. — Era Celine. — Encomendou flores? — Sim, para daqui a pouco. Não lhe parece suspeito? — Sem dúvida alguma intenção maligna ela tem. — Rebekah checou os detalhes e foi para sua mesa de trabalho. — Vou logo preparar o buquê. Ana também voltou ao computador, e não reparou no sorrisinho de Rebekah, ao cortar o celofane e as fitas para o arranjo. Apenas ouviu quando ela falou: — Pensa que venceu, hein? Aguarde-me... — Falando sozinha? — Ana resolveu provocá-la. — Acho que estou cansada. Por falar nisso, daqui a pouco você irá se sentar em um café e tomar chá, com toda a calma, lendo uma revista, ouviu? Precisa ir devagar, não esqueça. Perto das duas horas o ramalhete de flores já havia seguido com o entregador. Minutos depois, a campainha da porta se fez ouvir, e Rebekah imprecou, baixinho. Ana desviou o olhar da tela do computador. Como gostaria de não tê-lo feito! Celine estava parada no balcão com um ar indignado. — Algum problema, Celine? — E eu estaria aqui se não houvesse? — Talvez pudesse ser mais específica. A mulher pareceu se colocar na ponta dos pés e assumir sua expressão mais arrogante. — Fiz um pedido de flores esta manhã. E ele ainda não chegou a seu destino. Paguei uma taxa extra para que tivesse prioridade de entrega! Ana checou a lista do dia. 69


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— Wilson Place, número 7, apartamento 5. — Não, não! Número 5, apartamento 7! Atenta à facilidade de inverter os números, Ana repetira para Celine todos os números que anotara, no momento em que recebia a informação. Não era um sistema infalível, mas sempre fora muito cuidadosa. — Não acredito que tenha havido algum engano. — Você cometeu esse erro e é uma mentirosa! E eu já cancelei o pagamento em meu cartão de crédito. — Vou falar com a empresa de entregas e pedir que chequem o endereço. Celine começou a tamborilar com suas unhas perfeitas em cima do balcão. — Faça isso, Ana. Não sairei daqui até que essa confusão que criou esteja desfeita. Ana acessou o entregador pelo celular e verificou que a entrega já havia sido realizada. — O pedido foi entregue no endereço que você me passou pelo telefone. Apartamento 5, número 7. — Nunca mais encomendarei flores aqui — afirmou, em um tom de voz bem alto, visando ser ouvida por dois fregueses que acabavam de entrar. — É a segunda vez esta semana que você se atrapalha! Como atriz ela era o máximo, Ana tinha de admitir. Os gestos melodramáticos, o tom histérico... Aplaudiria sua performance. — A escolha é sua, Celine. Ana já planejava fazer uma pequena investigação em seu caminho para casa. Visitaria ambos os apartamentos. — Ainda não chegamos ao final! — Celine saiu, majestosa, da floricultura, seguida, para seu triunfo, pelos dois clientes, que recolocaram os buquês já prontos que estiveram verificando no balcão. Rebekah suspirou. — Não se pode negar que é convincente. — Com amigos como Celine, Luc não precisa de inimigos. Mas o que vamos fazer a respeito dela? — Não tenho nenhuma idéia! — Ana quase berrou, nervosa que estava. Rebekah esboçou um sorrisinho malicioso. — Vamos as duas reconhecer o local do crime, depois jantaremos e pegaremos um cinema. — Feito! Já passava das seis horas quando conseguiram fechar a Laços e Toques. Pouco depois, estacionavam em Wilson Place e entravam no primeiro edifício.

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Os moradores do apartamento 7 haviam recebido as flores e estavam imaginando quem as teria enviado. Foram ao prédio ao lado e descobriram que Celine Moore era a dona do apartamento número 5. — Bingo! — Está pensando o mesmo que eu? — Rebekah perguntou, zombeteira, ao retornarem ao carro. — Ela fez de propósito? — Eu diria que há uma grande chance, de... cem por cento. Ana escorregou para trás da direção do veículo e colocou a chave na ignição. — E então? O que acha que devemos fazer? — Uma confrontação, claro. — Você, ou eu mesma? Os olhos de Rebekah brilharam. — Oh, me permita fazer isso... — Tem de ser sutil. — Como um elefante numa loja de cristais. Ninguém arma uma cena como essa e sai ileso. — Certo. Agora, devemos tomar um banho e jantar. Petros ficou desconsolado. — Eu preparei o jantar, sra. Dimitriades. — Ana — corrigiu-o, como de costume. — Mas eu o avisei, no café da manhã, que era provável que jantássemos fora. — Você não ligou para confirmar. — Sinto muito, Petros. Espero que não tenha tido muito trabalho. — Frango ao molho de damasco com arroz, legumes na manteiga e um suflê de limão. O cardápio fazia com que a pizza que planejavam comer parecesse a coisa mais sem graça do mundo. Ana olhou para a irmã e arqueou uma sobrancelha. — Quer sair ou fazer a refeição aqui mesmo? Decida você! — Já jantou, Petros? — Rebekah perguntou, e o mordomo balançou a cabeça. — Ainda não. Pretendia servi-las primeiro. — Se é assim, pode ficar com nossa parte. Vamos ao Cross, pedir uma pizza. Petros pareceu escandalizado. — O King’s Cross?! — Isso mesmo. — Tenho de lhe dizer que não faça isso, sra. Dimitriades. Luc com certeza não aprovaria. Ana torceu o nariz para ele. — Luc não está aqui. — Mas saberá disso. 71


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— Só se você contar. — Não é recomendável, de forma alguma. — Estamos em duas, vamos apenas comer uma pizza e seguir para o cinema. O que pode acontecer? — Pelo menos, me deixe levá-las. — Prometemos não estacionar na calçada, e nós duas temos celular — Ana tranqüilizou-o. — Confie em mim ao primeiro sinal de problemas, ligarei para você no ato. — Há tantos lugares para se comer pizza. Por que o Cross? — Porque eu tenho um amigo que trabalha lá, e ele faz a melhor pizza que já provei. — Rebekah sorriu, simpática. Petros estava muito contrariado, e Ana quase se apiedou dele. — Estaremos bem. Ligarei para você quando chegarmos lá, e quando estivermos a caminho do cinema. — Obrigado. Rebekah esperou que entrassem no automóvel para dizer: — Qualquer um diria que arrumou um pai adotivo. — Petros é muito fiel a Luc. — Mas em excesso. — Lançou um olhar severo à irmã. — O que é isso? Proteção, possessividade... ou apenas precaução? — Luc lida com transações comerciais que envolvem muito dinheiro. — E é muito protetor em relação a sua esposa grávida. — Em relação à responsável pelo herdeiro Dimitriades. — Está sendo irônica. Por quê? Chegaram a Rose Bay e pegaram a rotatória em direção a Double Bay. — Culpe os hormônios e o nervosismo com os últimos contratempos envolvendo Celine. — Acha que foi para atrair a atenção de Luc que ela fez tudo aquilo? — De algum jeito, sim. — Luc está mesmo disputado! — Obrigada por me informar. Rebekah riu, acelerando, depois de haver parado em um sinal. — Está preocupada? Ana não respondeu. — Mas que droga! Você está mesmo aflita! Seu marido lhe deu razões para isso? Ana hesitou por instantes. — Na verdade, não. — Não confia nele? Oh, Deus! Será que confiava? Sem restrições? — Não confio em Celine. — O que não era toda a verdade. — Não respondeu a minha pergunta, Ana. Estavam quase chegando ao Cross. — Os dois já tiveram um relacionamento. 72


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— E daí? — Rebekah fez uma pausa. — Também já me relacionei com um homem, e nunca mais quero vê-lo por perto. — Com eles não foi assim. — Como sabe? Rebekah teve de concentrar sua atenção em localizar uma vaga para estacionar, tarefa nada fácil no Cross. Ana apreciou muito aquela distração. Àquele horário, perto do pôr-do-sol, a estrada principal ficava muito movimentada. Uma mistura de pessoas de diversas culturas, desde as mais formais até as quase bizarras, caminhavam agitadas pelas calçadas. Havia cavalheiros em ternos de estilistas famosos, que chegavam a parecer elegantes demais para homens de negócios. E também os tipos musculosos, com um estilo extravagante de se vestir, piercings e tatuagens por todo lado. Enfim, aquele era o local ideal para se observar gente. A pizzaria ficava situada ali mesmo, na estrada principal, e por sorte, assim que entraram, Ana e Rebekah conseguiram uma mesa bem próxima à janela. Os aromas que impregnavam o ambiente eram de dar água na boca, e elas acabaram por fazer um pedido que procurava combinar a maioria deles na pizza. Era interessante observar a cena que se passava na rua. A diferença entre os que ali vieram para se distrair e os que estavam a trabalho. Na frente das portas de vidro fumê, os luminosos em néon, os pisca-pisca brilhantes, que convidavam os transeuntes para os shows de strip-tease, propagandas de garotas fluas... Quando a noite caísse, chegariam as prostitutas, e o tráfego ficaria ainda pior com os veículos que parariam para pegar as garotas. Existiam mais celulares por quadra, nas proximidades do Cross, do que em qualquer outro lugar da cidade. Essa era a parte visível. O que não se via direito era o submundo, as transversais nas quais havia o comércio de drogas e outras atividades do círculo da marginalidade. O pedido delas chegou, e, depois do primeiro pedaço, Ana já podia concordar que aquele era o melhor sabor da face da terra. — Luc já lhe deu motivos para desconfiar dele? — Rebekah tinha a tenacidade de um detetive profissional. Ana cerrou as pálpebras, irritada, abrindo-as em seguida. Encolheu os ombros num gesto de indecisão. — Luc viaja muito. Nova York, Londres, Paris, Atenas... Vive em jantares de negócios. Como eu saberia se estivesse se encontrando com alguém? Rebekah refletiu sobre aquilo. — Seu marido tem tanto cuidado com você... Ana comeu mais um pedaço da pizza. — Se não fosse por seu filho, não sei. — Querida, pense bem nisso. Ele esperou alguns dias, dando-lhe espaço para ponderar, antes de ir buscá-la. Poderia ter destruído a vida profissional de papai, mas 73


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não o fez. Luc lhe dá todo o apoio em relação a Celine. — Rebekah respirou fundo. — Ana, encare a realidade. Esse homem te adora! Ela se inclinou e cobriu a mão da irmã com a sua. — Além disso, não faz o tipo do sujeito que fica ciscando por aí. — É sempre mais fácil pensar do que sentir. Rebekah se recostou de novo no espaldar. — Estou certa disso. Ana forçou-se a sorrir. — Vou lhe retornar esse favor quando nossas posições se inverterem e você estiver caída por Jace Dimitriades. — Mal posso esperar. Passava das oito horas quando elas entraram no cinema. Foi muito divertido. O filme era de muita ação e com toques de um humor bastante inteligente. Logo após a exibição, entraram no automóvel e foram para casa, combinando tomar um chocolate quente assim que chegassem. Ana encontrou uma mensagem de Luc no celular, que preferiu ignorar. Se ele quisesse mesmo falar com ela, ligaria de novo. E ele o fez, assim que Ana se deitou na cama. — Você não retornou minha ligação. — Ah, boa noite para você também! — Eu não a acordei, não é? Ana quase respondeu com uma brincadeira, mas preferiu não fazê-la. — Não. — Telefonei mais cedo, e Petros disse que você tinha saído — Estava comendo pizza no Cross, e depois fui ao cinema. Quase pôde sentir o peso do silêncio do outro lado da linha. — Se é uma piada, é de mau gosto. — Rebekah tem um amigo lá que faz uma pizza divina. — No Cross?! Ana começava a gostar daquilo. — Isso mesmo. — Posso confiar que não irá lá de novo? — Talvez. — Está se divertindo com isso, não é? Ana não agüentou e deu uma risada gostosa. — Pode apostar! — Lembre-se apenas de que estarei em casa daqui a um dia e meio. Estará tão corajosa então? — Claro. Você também não me amedronta. Tome cuidado, pedhaki mou. — Sempre. Boa noite. — E Ana recolocou o fone no gancho. 74


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CAPÍTULO XI

— Perigo vinte metros à frente — Rebekah avisou. Ana levantou a cabeça e avistou Celine. “Lá vamos nós de novo. A bruxa de Rose Bay.” — Suponho que pense que é muito esperta. — Mais problemas, Celine? Os olhos da mulher cintilavam de raiva. — Que direito você tem de checar seus clientes? — Qualquer reclamação a respeito de nossos serviços é sempre investigada. Você acusou a Laços e Toques de haver cometido um erro e bloqueou o pagamento. — Isso a autoriza a atormentar as pessoas? Não havia a menor dúvida de que a discussão seria bastante desagradável. — Atormentar, Celine? Minha irmã e eu checamos os apartamentos pessoalmente. A moça do apartamento 5 confirmou que recebeu um ramalhete não endereçado a ela. E confirmamos que o apartamento 7 no número 5 pertence a você. — Mas que falta de bom senso! Por que eu enviaria flores a um apartamento que está vago? — Isso mesmo, por quê? Celine parecia furiosa. — Está me acusando de ser louca?! — As palavras são suas, não minhas. Ana não previu o que aconteceria. Celine foi tão rápida que ela não pôde nem ao menos se proteger. Em um movimento certeiro, Celine atirou um vaso de porcelana grande, que estava ao lado do balcão, em sua direção. Ele bateu contra o braço de Ana, molhando suas pernas e se espatifando ao contato com o piso de concreto, lançando pedaços do vidro para todos os lados.

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O que se deu em seguida também foi inacreditável. Celine a empurrou com tanta força que ela perdeu o equilíbrio, escorregou no chão molhado e caiu, como em câmara lenta. — Sua cretina! — E Rebekah aplicou um poderoso bofetão no rosto de Celine. Em seguida, a irmã se abaixou para socorrer Ana, pálida ao ver que havia mesmo se machucado. Ana levantou o olhar confuso, e então seguiu a direção do olhar da irmã. Havia vidro por toda parte. O sangue corria de seu pé, e seu braço e a mão, nos quais ela tentara se apoiar, também sangravam. — Não se mexa, Ana. Fique bem aí que eu vou chamar uma ambulância. A queda inesperada... Será que poderia afetar o bebê? Não, de modo algum. Não fora assim tão forte. — Ambulância, não. Não é necessário. São apenas alguns cortes. Consiga algumas toalhas de papel, e eu mesma me limparei. — A surpresa inicial começava a se desvanecer, e em seu lugar veio a indignação. — Petros, então. — Rebekah já estava telefonando, e segundos depois conversava rápido com alguém ao telefone. — Ele já está vindo para cá. Bem, vamos colocá-la em uma cadeira, e depois limparei toda essa confusão. Mas antes tirarei uma foto para usarmos como prova. — Está brincando comigo, não é? — Não mesmo! Segundos depois, Rebekah já a havia erguido e ajudado a sentar-se. Dentro dos sapatos de Ana havia cacos, e em toda sua roupa também. — Você está bem? — Fora alguns arranhões, sim. — Fique aqui sentada enquanto dou um jeito nisso. Rebekah apanhou algumas toalhinhas descartáveis e limpou o sangue dos pés da irmã. Pouco depois todo o vidro já estava recolhido em jornais, e, com um aspirador, Rebekah limpava os últimos vestígios. Algumas poucas puxadas e tudo voltou ao normal. Petros não demorou a aparecer, e Ana teve certeza de que ele tinha ultrapassado todos os limites de velocidade para chegar tão depressa. Ele olhou para ela com incrível doçura. — Vou levá-la ao hospital. — Para casa, Petros. São apenas alguns arranhões. — Para o hospital, Ana — reiterou, com firmeza. Aquela foi, ela registrou, divertida, a primeira vez em que ele a chamou pelo primeiro nome. Mais tarde Ana o provocaria por aquilo. Mas naquele momento estava contente por Petros tomar as iniciativas. Sem que ela esperasse, o mordomo a tomou nos braços, ignorando seus protestos, e disse a Rebekah, ao caminhar em direção à porta: 76


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— Ligarei para você assim que um médico a examinar. O Mercedes estava estacionado em fila dupla, a porta do passageiro, aberta. Com facilidade, Petros a colocou no assento. — Petros, não sabia o quanto se preocupava comigo. —Os olhos de Ana se encheram de lágrimas. Estava emocionada pelo susto e grata pela prontidão do mordomo. Tinha certeza de haver visto um músculo no queixo dele tremer, antes que Petros fechasse a porta, sem nada dizer, e desse a volta no veículo para tomar a direção. A equipe do hospital foi muito eficiente. E detalhista também. Petros ficou a maior parte do tempo ao lado de Ana. Saiu apenas por um momento, para reaparecer pouco depois. Ana precisou de pontos em dois dos cortes. Foi examinada de cima a baixo e fez um ultra-som. O obstetra fez exames detalhados, e por fim a deixaram em observação por algumas horas. Petros continuava em guarda, apenas saindo de perto quando a enfermeira assim solicitou. — Você está bem, querida — o médico assegurou. — O bebê está bem. Nenhum sinal de que isso tudo o tenha afetado. — Posso ir para casa? — Amanhã. — O doutor sorriu. — Vamos mantê-la aqui esta noite, apenas por precaução. Por que tinha a sensação de que aquilo era uma conspiração? Tão logo o obstetra saiu, Ana telefonou para a loja e falou com Rebekah. Depois, recostou-se nos travesseiros e pô-se a pensar na atitude de Celine, lembrando-se do momento em que entrara na loja. Será que Celine quisera mesmo lhe causar mal? Ou fora um simples ato impulsivo? Era difícil de adivinhar. Uma enfermeira trouxe-lhe um chá e algumas revistas, e Ana pouco depois adormeceu. Devia ter dormido bastante, pois, quando abriu os olhos, deparou-se com Luc sentado na poltrona ao lado de seu leito. — O que está fazendo aqui? Ele se ergueu de um salto e foi até ela. O sorriso no rosto pálido era afetuoso, mas havia algo mais em seus olhos que Ana não podia definir. — Isso é jeito de cumprimentar seu marido? — Ele inclinou a cabeça para beijar-lhe os lábios, com suavidade a princípio, depois mais profundamente, ansioso por sentir a resposta dela. Será que Ana fazia idéia da angústia que ele vivera nas últimas horas? A chamada de Petros o deixara transtornado. Em poucos minutos, já saía da reunião em que se encontrava, tomava emprestado o carro de um dos colegas, e dirigisse ao hotel.

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Depois, enquanto fazia seus preparativos para retornar a Sydney, fora tomado por uma raiva extrema. Depois de ligar para o obstetra de Ana e de checar as informações do hospital, telefonou para Celine. Seu sangue fervia de ira ao lembrar-se do cinismo com que ela respondera a suas acusações, fingindo-se aturdida, surpresa, e em seguida consternada, pelo que acontecera a Ana. Quando desligou o aparelho, Luc não tinha dúvida quanto às intenções das ações daquela mulher ensandecida. Nem de sua raiva. O vôo de uma hora pareceu-lhe uma eternidade. A corrida entre o aeroporto e o hospital quase chegou à velocidade da luz. O médico já o havia tranqüilizado, mas Luc precisava vê-la com seus próprios olhos. Ninguém ousou interrompê-lo quando passou pela recepção, ou quando subiu as escadas. A enfermeira do primeiro andar ainda abriu a boca para protestar, mas fechou-a em seguida, constatando a determinação dele. Luc nem mesmo bateu na porta do quarto de Ana, como mandava a boa educação. Só conseguiu parar quando a viu dormindo tranqüila, recostada nos travesseiros. Sua cabeça pendia para um lado, e seus olhos estavam fechados no sono. Por um longo momento Luc ficou apenas ali, apreciando suas feições em repouso. Foi necessário se impor extrema força de vontade para não tomá-la nos braços naquele mesmo instante. E o teria feito, se tivesse certeza de que o movimento não a machucaria. Ao contrário, porém, sentou-se na poltrona e esperou até então, quando ela acordou. — Hum... — Ana murmurou, quando Luc interrompeu o beijo. — Muito bom! Um calor aqueceu todo o seu corpo. Aquele perfume, uma mistura de musk e madeira, que era só de Luc, a inebriava. — Talvez eu devesse me hospitalizar mais vezes. — Não se eu puder evitar. Ele estava maravilhoso, tão masculino, tão parte dela!

— O bebê está bem — ela informou, querendo reafirmar as palavras do obstetra. Luc ergueu uma mão e roçou os dedos pela face dela. — E quanto a você, pedhaki mou? Quer me contar o que houve? Ana o encarou bem dentro dos olhos. — Já acabou. — Sim. — Não tenho a menor dúvida de que Petros o colocou a par de tudo o que sabe. — É lógico. Tanto ele quanto Rebekah. — Sua mão desceu, massageando-a na nuca e na base do pescoço. — Prometo que Celine nunca mais se aproximará de você.

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Devia ser apenas uma reação de momento, mas Ana sentia que algo profundo e cheio de significado estava acontecendo ali, naquele minuto. Mas não compreendia bem o que era. Luc se importava com ela, não havia a menor dúvida. Sua voz se mostrava embargada pela emoção. Seria apenas paixão por alguém por quem ele tinha um afeto especial? — É você quem ela quer, Luc. E eu estou atrapalhando. — A única pessoa que atrapalha é Celine. A porta se abriu, e uma enfermeira veio até Ana, medir-lhe a pressão e a temperatura. Minutos depois, a moça deixou o aposento, afirmando que tudo estava em ordem. — Há algo de que você precise? Como Ana devia responder àquilo? Ergueu uma mão e baixou-a de novo, meneando a cabeça. — Petros já me trouxe algumas coisas. — E ao lembrar-se abriu um sorriso contente. — E me chamou de Ana pela primeira vez! — Grande conquista! — Luc continuava massageando seu ombro. — Está com alguma dor? Nenhuma que fosse física. Mas Ana continuava abalada com o que a rival fizera. Não se preocupava consigo mesma, mas aquele fora um ataque contra seu bebê, que nem havia nascido ainda.

Fechou os olhos, como se pudesse também tirar da memória o gesto daquela mulher, motivada apenas pela inveja. — Vá para casa, Luc. Você deve estar cansado. — Sem chance. — Ele alcançou a poltrona, deixando-se cair nela. Ana cerrou as pálpebras e, quando tornou a erguê-las, o marido ainda estava lá. As enfermeiras foram e vieram, durante toda a tarde, e a chegada do jantar para duas pessoas fez com que Ana reclamasse de novo: — Não há necessidade de que fique aqui. — Deixe—me. — Não ouvi seu celular tocando nem uma vez. — Está desligado. Quando terminou o horário de visitas, Luc foi obrigado a deixá-la. Sem que Ana soubesse, entretanto, um segurança foi contratado para ficar a sua porta, e a enfermagem foi colocada em estado de alerta com a informação de que Ana ainda corria riscos. Era um exagero, sem dúvida, mas ele próprio não queria correr risco algum. Ninguém mexia com Luc Dimitriades ou com um dos seus sem pagar o preço.

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agir.

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No caminho de volta, pôde pensar muito, e logo que chegou à mansão, começou a

Reorganizou suas obrigações mais urgentes em relação ao trabalho, deu instruções a Petros, arrumou sua mala. Não havia a necessidade de mais palavras. A influência de Luc era conhecida por todos. Como inimigo ele era mortal.

CAPÍTULO XII

O novo dia trouxe consigo uma sensação de vida nova, de novos inícios. Ana levantou-se cedo, tomou um banho e sentiu-se pronta para correr e saltar. Mas havia a rotina do hospital, que era obrigada a seguir. O obstetra veio vê-la, ela comeu um saudável café da manhã e conversou com as enfermeiras. Tinha de esperar até as nove horas, quando Luc chegaria para levá-la embora. Petros estava na garagem quando o Mercedes passou pelo portão, e abriu sem demora a porta de passageiros, enquanto Luc dava a volta no veículo. — É bom vê-la em casa, sra... — Ana. Se ousar me chamar por outro nome, não sei o que farei com você. — Muito bem. Ela continuou a olhá-lo, esperando pela resposta. — Apenas Ana — reafirmou, gentil. — Perdeu sua armadura, Petros. — Luc o precedia porta adentro. O mordomo escondeu um sorriso desanimado. — Então deverei reencontrá-la. — Está tudo em ordem por aqui? Petros inclinou a cabeça. — Só falta Ana verificar o que mais quer na mala. 80


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Ela parou no meio da escadaria. — Mala? Luc enlaçou-a pela cintura e conduziu-a para cima. — Vamos passar alguns dias na casa de praia. — Mas você pode deixar o escritório? — O mundo não irá parar se eu não aparecer por alguns dias. Não, não iria. Mas Luc até então nunca percebera isso. Entraram na espaçosa suíte, e Ana sentiu-se feliz por apreciar a familiaridade do ambiente. As duas malas estavam encostadas na cama. Uma fechada, a outra vazia. O laptop de Luc se achava no chão. Luc a virou em seus braços e inclinou a cabeça de encontro a Ana, beijando-a. Ana ficou excitada, mas ele interrompeu as carícias. — Arrume suas coisas, pedhaki mou. Senão não iremos a lugar algum tão cedo. Luc estava certo, e Ana sabia que tinham muito tempo pela frente. Assim, escapou de seus braços e ajeitou a bagagem. Em menos de uma hora, chegavam à casa de praia, na verdade um magnífico sobrado, construído a apenas alguns metros da areia. As paredes externas eram feitas de vidro temperado, e as palmeiras e os arbustos garantiam a privacidade da propriedade ao mesmo tempo que decoravam a vista maravilhosa e tranqüila para o oceano. Petros estivera lá pouco antes, e pusera provisões na geladeira, leite fresco, suco pronto e todo o imóvel limpíssimo. — O que acha de caminharmos pela praia? Ana se voltou para ele e tomou-lhe a mão, para, juntos, saírem a percorrer o caminho entre as palmeiras, seguindo para a areia branca, que se encontrava com a água salgada. O dia estava esplêndido. Quente, o sol brilhando, pouquíssimas nuvens no céu. Encontraram a praia vazia e, para Ana, parecia haver mesmo apenas os dois no planeta. Seguiram devagar a linha das águas até as grandes pedras, que marcavam seu final. Havia muitas perguntas que Ana queria fazer, mas hesitava em começar, receosa de quebrar o encantamento que viviam. Tanto acontecera naqueles últimos meses, tantos mal-entendidos, tantas falsas impressões, mentiras e acusações! Uma pessoa não podia voltar para trás, desfazer o que dissera ou fizera. Existia apenas uma direção, e era para a frente. Embora algumas atitudes do passado pudessem afetar o futuro se não fossem confrontadas e resolvidas. Só então surgiria possibilidade de seguir-se avante. Uma dessas coisas, no passado imediato, era Celine. Talvez pudesse começar por ai. 81


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— Celine significou muito para você? Nada como pegar o touro à unha. Luc parou de caminhar e virou-se para ela. Seu olhar estava sombrio. Era quase palpável a raiva que aparecia por trás do autocontrole dele. — Não. Tivemos uma relação breve, anos atrás. Celine queria se casar, eu não. Deixei isso claro, e ela se casou com outra pessoa. — Mas continuaram a se ver — Ana insistiu, sentindo que ele retesava a musculatura do queixo. — Moramos na mesma cidade, freqüentamos um mesmo círculo social. — A expressão dele assumiu um quê de cinismo. — Éramos, até então, cidadãos civilizados. — Até o divórcio. Luc deslizou os dedos pelos braços dela até chegar aos ombros. — Até depois de ela ter se divorciado. Por que eu iria querer ter algum envolvimento com Celine se já tinha você? Algo que vinha de dentro de Ana ameaçava despontar. Será que se atreveria a ter esperanças? — Celine entrou em uma campanha implacável, Luc. — E eu entrei com uma ação legal contra ela. — Luc envolveu seu rosto com as mãos. — Aquela louca pagará, e muito caro, por tudo o que fez. Se ainda lhe restar algum bom senso, se mudará de cidade. Talvez, de país. Como inimigo, ele era implacável. — Entendo. — Entende mesmo, Ana? — Emma... Luc colocou um dedo sobre os lábios dela, calando-a. — Emma foi o amor de minha juventude. Sofri muito com sua perda. Não apenas por minha causa, mas pela indignação por ter tido tão pouco tempo sobre a Terra. — Sua boca se curvou num sorriso afetuoso. — Emma era alegre, vivaz, minha melhor amiga. Mas nunca poderia ser você. Ana sentiu que seus ossos iriam derreter, e que seus olhos começavam a arder de tanta emoção. — Você, além de roubar meu coração, capturou minha alma. Por pouco Ana não desmaiou. Estaria ele dizendo que a amava? — Luc... Ele não a deixou terminar: — Você é minha vida. Meu amor. Tudo para mim. Os olhos dela se encheram de lágrimas, e Ana teve de piscar rápido para detêlas. Porém, uma delas escapou e correu por sua face. Luc seguiu sua trilha com o polegar e sorriu.

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— Como podia não saber disso, meu anjo? Cada momento que a segurei em meus braços, em todas as vezes em que fizemos amor... Não sentiu a batida de meu coração, meu toque? Ana não iria conseguir segurar o choro. — Você nunca verbalizou nada disso. — Terei de lhe ensinar grego. — Achava... — ...que eu tinha me casado com você pela conveniência de ter uma mulher em minha cama, uma anfitriã para as ocasiões sociais? Se fosse isso tudo o que eu desejava, já teria me casado anos antes. Ana chegou a abrir a boca, para em seguida tornar a fechá-la. — Eu te amo, Ana. Amo. Sem você, não ia querer viver. Ela não era mais capaz de dizer uma sílaba sequer. Até aquele segundo, sentira que apenas afeto era a base de seu casamento. A surpresa era boa demais. — Celine teve muito sucesso em destilar seus venenos —Luc prosseguiu. — Pior: você preferiu acreditar nela, e nada do que eu dissesse parecia convencê-la do contrário. Agora posso entender por quê. Um sucesso diabólico? Sim, talvez tivesse sido. Celine sabia muito bem quais botões apertar e em que ordem, utilizando-se da insegurança de Ana em relação aos sentimentos de Luc. — Quando você embarcou para Golden Coast, achei que alguns dias iriam ajudála a refletir e a se fortalecer. Mas, ao contrário disso, só fez duvidar mais ainda de mim, não foi? — Luc a acariciava sem cessar. — Tem alguma idéia do quanto me apavorou a idéia de perdê-la? Os lábios dela chegaram a se abrir, mas o que quer que Ana tivesse a dizer permaneceu preso em sua garganta. — Ou como me senti quando descobri que estava esperando nosso filho? — Você me ameaçou. — Era a única arma que eu tinha. — Queria a criança... — Queria você. — Luc a trouxe para mais perto e segurou-lhe o queixo. — Pedhaki mou, nosso filho é tão importante! É um presente tão incrível porque é fruto de nosso amor. Mas não confunda. Você é minha razão de viver. Meu coração. Minha alma. Ana o alcançou e puxou seu rosto de encontro a si. — Eu te amo, Luc. Sempre o amei e sempre o amarei. Pelo resto de meus dias. — E então, beijou-o, com toda a entrega que transbordava em seu ser, com toda a paixão que os envolvia. — Tem certeza de que quer muito caminhar pela praia? O sorriso maroto se refletia nos olhos dele, que preferiu continuar a brincadeira:

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— Tem alguma idéia melhor? Ana começou a contar nos dedos. — Podemos andar e conversar um pouco mais. Ou nos sentar na areia e admirar o oceano, refletindo sobre a espiritualidade do ser. Ou começar uma discussão sobre quanto tempo mais vou trabalhar. — Sabe como me sinto a respeito de seu trabalho. — Por favor... — Ela tomou os dedos dele e levou-os à boca, beijando-os. — Pelas manhãs. — Três manhãs por semana. — Quatro — Ana negociou. — Por mais dois meses. — Três. — Ah, o que vou fazer com você, mulher?! — Que tal me amar? Você faz isso muito bem. — Que esperanças terei se tivermos uma loirinha de olhos verdes.., sua imagem em miniatura? — Gemeu, colando a boca na dela. — Ela o terá nas mãos na primeira piscada. — Ana sorriu, deliciada. — E você será seu escravo devoto por toda a vida. — Não tenho a menor dúvida. O pensamento de segurar seu filho nos braços pela primeira vez fez o coração dele bater mais depressa. — É claro que podemos ter um garoto... Um bebê de cabelos negros que cresceria alto e forte como o pai. Ana adorou essa imagem. — Será que já conversamos o bastante? — Luc a provocou, passando o braço ao redor de seus ombros. — Podíamos voltar para casa, não é? — Acho que é uma opção. — Mas ainda não é hora do almoço... — Ana fingiu considerar. Para Luc, era um imenso prazer vê-la brincando, descontraída. — Mas você tem a hora certa em mente? — Bem, visto que estou meio incapacitada... — Ana indicou seus curativos. — ...parece que você terá de fazer a maior parte do trabalho. Talvez queira descansar um pouco, primeiro. — Atrevida! — É óbvio que as preliminares não precisarão ser tão... energéticas. Ele deu uma risada profunda e rouca. — Veremos quem ficará sem energia primeiro. Que tal? — Luc a ergueu no colo. — Coloque-me no chão! — Sua gargalhada ecoou pelo ar. — E se alguém estiver olhando? O que vai pensar?! — Que somos duas pessoas apaixonadas. E estariam certos. 84


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— Então está tudo bem. — Ana beijou-lhe a testa. — Mas, mesmo assim, me ponha de pé. Quero que conserve toda sua energia. Aquele sorriso aquecia a alma de Luc, que a colocou, com todo o cuidado, no chão. — Para casa, meu amor. Preciso abraçá-la, tocá-la, fazer amor com você. — Feito! Aquele fora, Ana refletiu mais tarde, quando o sol já se punha no horizonte, o dia mais perfeito de sua existência. Luc estava atrás dela, enlaçando-a pelas costas. Ana, recostada nele, era acarinhada pelos lábios que tocavam a pele sensível de seu pescoço. — Maravilhosa! Luc não se referia à vista que tinham por trás da parede de vidro, mas à mulher que segurava tão perto de seu peito. Sua mulher, o amor de sua vida.

FIM

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