Jessica Hart - A Descoberta Do Amor

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Jessica Hart - A Descoberta Do Amor Contracted: Corporate Wife

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Patrick Farr é perfeitamente feliz com sua vida de solteiro, rodeado por mulheres lindas e jovens. Se pelo menos ele as fizesse entender que nunca se casaria por amor... Até Louisa Dennison, 1 assistente perfeita, mãe solteira de 2 filhos muito exigentes aparecer em sua vida! Mas será que as tentativas deles de evitar o amor os levarão diretamente para o altar? Digitação: Rita Cunha Revisão: Cris Veiga 2


Depois de ter ido tão longe, Patrick não sabia como proceder. Ele ficou de pé e andou de um lado para o outro no seu escritório, com as mãos no bolso e a testa franzida. - Estive pensando sobre sua proposta - ele disse finalmente ao parar próximo à janela. - Proposta? Qual proposta? - Ele se virou e olhou para ela. Lou ficou ruborizada. Patrick tinha que trazer isso à tona? Logo agora que ela já havia relaxado e pensava que aquele incidente estava esquecido. - Eu não estava prestando atenção às coisas que eu dizia naquela noite - ela tentou fazer uma piada da situação. - Bebi champanhe demais. Você disse que eu deveria pensar em me casar com você - disse Patrick. -E é isso que estive fazendo. Acho que você estava certa. Acho que devemos nos casar.

Copyright © 2005 by Jessica Hart Originalmente publicado por Mills & Book London Título original: CONTRACTED: CORPORATE WIFE

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Este Livro faz parte do Projeto-Romances, sem fins lucrativos e de fãs para fãs. A comercialização deste produto é estritamente proibida

Autor

Série Nine to Five Título Ebook

Data

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Two's Company

Jul-1996

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Lynne Graham

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Sep-1996

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Oct-1996

Susan Napier

Reckless Conduct

Nov-1996

Kathleen O'Brien

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Dec-1996

Cathy Williams

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Jun-1999

Charlotte Lamb

The Seduction Business

Feb-2000

4


Autor

TĂ­tulo

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A Boss in a Million

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Data Mar-2000

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Jan-2001

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His Secretary's Secret

Apr-2002

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The Boss's Daughter

Aug-2002

Cathy Williams

Secretary on Demand

Aug-2002

Helen Brooks The Irresistible Tycoon

Oct-2002

Jessica Steele

A Professional Marriage

Oct-2002

Rebecca Winters

The Tycoon's Proposition

Dec-2002

Helen Brooks

Sleeping Partners

Mar-2003

Sharon Kendrick

Back in the Boss's Bed

May-2003

Leigh Michaels

The Marriage Market

May-2003

K.N. Casper

The Woman in the News

Oct-2003

Barbara McMahon

The Boss's Convenient Proposal

Feb-2004

Jessica Steele

Her Boss's Marriage Agenda

Mar-2004

Leigh Michaels

The Takeover Bid

Jun-2004

Jackie Braun The Game Show Bride

Dec-2004 5


Autor

TĂ­tulo

Nicola Marsh

Hired By Mr. Right

Natasha Oakley

The Business Arrangement

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The Corporate Marriage Campaign

Aug-2005

Jessica Hart Contracted: Corporate HRomance

Sep-2005

Wife Barbara McMahon

Her Spanish Boss

Jennie Adams The Boss's Convenient

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Data Feb-2005

HRomance 10

Jul-2005

4 Jan-2006

Sep-2006

Bride Emma Darcy

The Playboy Boss's Chosen Bride

Jessica Hart Business Arrangement

Oct-2006

Oct-2006

Bride Barbara Hannay

Having The Boss's Babies

Nov-2006

Rebecca Winters

The Lazaridis Marriage

Jul-2007

Raye Morgan

The Boss's Double Trouble Twins

Nov-2007

Shirley Jump Boardroom Bride And

Jul-2008

Groom Jennie Adams

The Boss's Unconventional Assistant

Aug-2008

Rebecca Winters

Crazy About Her

Sep-2008

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Autor

TĂ­tulo

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Data

Spanish Boss Ally Blake

Hired: The Boss's Bride

Oct-2008

Barbara Hannay

Blind Date With The Boss

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Jennie Adams Promoted: Secretary

Jan-2009

To Bride! Jackie Braun

Marrying The Manhattan Millionaire

Apr-2009

Melissa McClone

Memo: The Billionaire's Proposal

Sep-2009

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Capítulo 1

As portas do elevador se abriram e Louisa Dennison saiu, bem a tempo. Como sempre. Ao vê-la do outro lado do lobby, Patrick ficou irritado. Droga, será que essa mulher não podia chegar cinco minutos atrasada, ao menos uma vez? Aí vem ela, em seu respeitável tailleur. A saia terminava precisamente no joelho; nem um fio de cabelo fora do lugar. Ela parecia sensível, discreta, bem arrumada, uma assistente perfeita. Patrick sabia que estava sendo irracional. Ele tivera sorte ao herdar uma assistente tão eficiente quando assumiu a Schola Systems. Lou — o nome era a única coisa descontraída sobre ela — era uma secretária modelo. Elegante, pontual, profissional. Ele nunca a pegara fazendo fofoca ou dando telefonemas pessoais no escritório. Ela não demonstrava interesse algum pela vida pessoal dele, e Patrick nunca se sentiu obrigado a perguntar sobre a vida dela. Não, ele não poderia querer uma assistente melhor. Às vezes, ele desejava que ela cometesse um erro, apenas um errinho. Um erro de digitação, algo que ele pudesse corrigi-la, ou um arquivo que ela não conseguisse abrir de imediato. Talvez ela pudesse puxar o fio da meia-calça ou derramar café. Fazer algo que provasse que era humana. Mas ela nunca fazia nada desse tipo. A verdade era que Patrick achava Lou intimidante às vezes, e isso o incomodava. Se fosse para alguém intimidar ali, esse alguém tinha de ser ele. Homens adultos tremiam quando ele entrava numa sala, e sua reputação de executivo durão era o suficiente para fazer com que as pessoas o respeitassem muito. Mas Lou Dennison era diferente. Ela apenas olhava para ele com aqueles olhos negros. Sua expressão era de completa indiferença. Às vezes, ele suspeitava que nessa mesma expressão havia algo de ironia, o que o irritava mais do que ele gostaria de admitir. E ela não tinha nada de especial, ele pensou um pouco ressentido. Era atraente, mas tinha pelo menos uns 45 anos, o que era óbvio pelas rugas em volta dos olhos. — Não estou atrasada, estou? — Lou perguntou ao se aproximar, e Patrick segurou a vontade de olhar no relógio e dizer que ela estava 15 segundos atrasada. — Claro que não. Ele forçou um sorriso e lembrou-se de que não era culpa dela o fato de ventos fortes terem forçado o fechamento da linha da Costa Leste 8


naquela noite, que era longe demais até um aeroporto, ou que ele preferiria jantar com qualquer outra pessoa. Não havia como não tê-la convidado para jantar pois estavam presos ali, mas ele torcia para que o jantar acabasse logo, para que pudessem seguir seus caminhos separados pelo resto da noite. Ele olhou na direção do restaurante. — Vamos direto? Ou você prefere uma bebida primeiro? A opção da bebida foi um pensamento de última hora tão óbvio que não teve dúvida de que Patrick não estava gostando nada da idéia do jantar, assim como ela. Também era óbvio que Lou deveria concordar em ir jantar direto, mas ela não quis. Ela tivera um dia longo. Começara com o relógio despertando às cinco da manhã, despachou dois adolescentes de casa mais cedo que o normal, continuou com atrasos no metrô, seguido de uma viagem estressante de trem com Patrick Farr. Essa fora a primeira vez que tiveram que viajar para garantir um contrato, e ela não achava que sua presença fosse necessária, mas Patrick insistira. No final, a reunião tinha sido um sucesso, mas fora longa e intensa, e Lou estava louca para chegar em casa e curtir uma rara noite sozinha para relaxar com uma boa dose de gim e um longo banho de banheira sem seus filhos batendo na porta e querendo saber o que tinha para comer, ou onde ela guardara os jeans rasgados de que precisavam agora. E agora ela estava presa nesse hotel com o chefe. Não teria sido tão mau se Patrick não se sentisse obrigado a convidá-la para jantar, ou se ela tivesse recusado o convite sem parecer rude. Assim, parecia que ambos estavam condenados a uma noite de conversas chatas, e para isso ela precisava mesmo de uma bebida! — Uma bebida seria ótimo, obrigada — disse ela, ignorando a forma como Patrick franzira a testa. Ele era, obviamente, um homem acostumado a conseguir o que queria — especialmente no que dizia respeito às mulheres, se ela fosse acreditar em rumores. Sem dúvida, Lou deveria ceder aos desejos dele, como todos. Mas, ela pensou, se ele não gostou, não deveria tê-la convidado! — Então, vamos para o bar — disse ele, com um toque de irritação. Lou não se importava. Nos três meses desde que assumira o controle da Schola Systems, Patrick Farr deixara claro que não tinha interesse algum em sua assistente. Ela não era jovem nem suficientemente bonita, é claro, Lou pensou. Ela não se importava com isso, mas também não via por que não provocar o ego dele em seu tempo livre. Ela não estava trabalhando nessa noite, e não faria mal a Patrick Farr se as coisas não fossem do seu jeito só uma vez. 9


O bar era pior do que Patrick imaginava. Quando eles se deram conta de que não havia mais trens para Londres naquela noite, e que todas as estradas e o tráfego aéreo estavam parados por causa do tempo, todos os melhores hotéis já estavam lotados. Há muito tempo, ele não ficava num lugar tão provinciano, pensou, olhando em volta do bar com desgosto. O lugar estava lotado de plantas, e tão escuro que eles tiveram que caminhar devagar até a mesa, o que não ajudou em nada o humor dele. — O que você gostaria de beber? — ele perguntou a Lou estalando os dedos para chamar o garçom, ainda que fosse quase impossível localizálos naquela escuridão. — Uma taça de champanhe seria ótimo — disse Lou ao sentar-se e arrumar a saia. Patrick ficou surpreso. Ela não dera a impressão de alguém que bebia champanhe. Ele imaginava o champanhe muito fútil para alguém tão eficiente. Ele poderia imaginar que ela bebesse algo mais sério, como um copo d'água, ou algo mais forte. Um martini seco, talvez. Lou levantou as sobrancelhas diante da reação dele. — Isso é extravagante demais? — ela perguntou, pensando que uma taça de champanhe era o mínimo que ele devia a ela depois do dia que tivera. E não era algo que ele não podia pagar. Pessoas como ele podiam comprar caminhões de champanhe sem se importar com o preço. — Nós ganhamos o contrato — ela o lembrou. — Achei que pudéssemos comemorar. — Claro — Patrick concordou, consciente de que ele deveria ter sugerido uma comemoração, dado o tamanho do contrato que tinham acabado de fechar. — Beberei o mesmo. O barman lutou para chegar até eles. Quando ia pedir duas taças de champanhe, Patrick mudou de idéia e pediu uma garrafa. Ele não deixaria que Lou pensasse que ele era um pão-duro. — Pois não, senhor. Sentada confortavelmente em sua cadeira, ela olhava ao redor, sem se incomodar com o silêncio enquanto esperavam pelo barman. Ela era bem diferente das mulheres com as quais ele saía para bares, Patrick refletiu. Ele admirara garotas que gostassem de se divertir. Ariel, por exemplo. Ariel estava sempre empolgada para sair com ele. Pelo menos, era o que dizia. Se ela estivesse aqui, já estaria falando sem parar, entretendo-o, fazendo um esforço para cativá-lo. Ao contrário de Lou, que estava ali sentada com aquele brilho irônico nos olhos, sem impressionar-se com a companhia dele. O que era 10


necessário para impressionar uma mulher como essa?, Patrick se perguntou. Alguém já devia ter feito isso. Ela era a Sra. Dennison, mesmo percebendo que ela não usava uma aliança de casamento. Divorciada, sem dúvida. O marido, provavelmente, não conseguira atingir as expectativas dela. Desconfortável com a situação, Patrick pegou um descanso de copo, e ficou dando batidinhas na mesa. Ele fazia um esforço enorme para não olhar o relógio. Provavelmente, seria uma longa noite. Lou pensava a mesma coisa. As batidinhas de Patrick a estavam deixando louca. Era a mesma coisa que Tom fazia, quando queria irritá-la. Os dedos dela coçavam de vontade de arrancar o descanso de copo da mão dele e dizer-lhe para parar com aquilo imediatamente, como faria se Tom estivesse sentado ali irritando-a dessa forma. Mas Tom era seu filho, e tinha apenas 11 anos, enquanto Patrick tinha quase 50, e era o seu chefe. E ela não podia perder esse emprego. Era melhor se segurar. Ela estava louca por uma bebida. Onde estava o champanhe? O barman devia ter ido colher as uvas em algum lugar. Não poderia demorar tanto para enfiar uma garrafa num balde de gelo e pegar duas taças, poderia? Se o champanhe não chegasse logo, ela pegaria aquele descanso de copo e... Finalmente! Lou sorriu para o barman ao vê-lo surgir da escuridão, e Patrick ficou surpreso. Ele não sabia que ela podia sorrir daquela maneira. Ela nunca sorrira para ele daquela maneira. Ela sorria, claro, mas era sempre um sorriso frio, educado, o tipo de sorriso que vinha com o tailleur imaculado dela, o cabelo perfeito e as maneiras profissionais infalíveis. Não aquele sorriso caloroso e amigável que dera ao barman, acendendo-lhe o rosto e fazendo-a parecer ao mesmo tempo atraente e acessível. O tipo de mulher com quem se gostaria de dividir uma garrafa de champanhe. Patrick se ajeitou na cadeira e a estudou com um interesse novo, enquanto o barman abria a garrafa com um floreio desnecessário. O rapaz queria impressionar Lou, Patrick pensou, ao assistir aquela cena. Ela apenas sorrira para ele, meu Deus. Qualquer um pensaria que ela era sexy, em vez de velha o suficiente para ser sua mãe. Era só o que faltava, um barman com uma fixação por mulheres mais velhas. E, agora, ele jogava o pano sobre o ombro de forma exagerada e ridícula, enquanto colocava a garrafa de volta no balde de gelo, dizendo para Lou aproveitar o champanhe. Patrick notou que ele nem ao menos ba11


lançara a cabeça para ele, considerando que era quem pagaria a conta. — Obrigada — Lou dizia, com outro sorriso desnecessário. Patrick ficou feliz quando o barman finalmente saiu. — Graças a Deus ele foi embora. Achei que fosse passar o resto da noite conosco. Estou surpreso por não ter pego uma taça e uma cadeira para ele mesmo. — Achei-o charmoso — disse Lou ao pegar sua taça. — Não me diga que você gosta de garotos! — Não... não que isso seja da sua conta. Patrick foi pego de surpresa pela franqueza dela. Ela era normalmente muito discreta. — Você não acha que isso seria um pouco inconveniente? — ele rebateu. Lou olhou para ele por um momento, e tomou um gole de seu champanhe. — Pelo que sei, suas namoradas tendem a ser bem jovens. Patrick foi pego de surpresa mais uma vez. — Como você sabe disso? — Ela deu de ombros. — De vez em quando, sua foto está nas páginas de fofocas. Normalmente, você aparece com uma loura, e tenho que dizer que elas parecem bem uns 20 anos mais jovens do que você. Isso era verdade. Patrick não via por que se desculpar disso. — Eu gosto de mulheres bonitas, e gosto especialmente de mulheres bonitas que não sejam velhas o suficiente para serem obcecadas com compromisso — disse ele. “Ah, ele tem medo de compromissos. Isso explica”, Lou pensou com um toque de cinismo. Ela conhecia o tipo. E como. Lawrie também nunca foi fã de compromisso, mas pelo menos era caloroso e tinha charme. Patrick, nem isso. Ela olhou para ele por cima dos óculos. Ele era um homem atraente, ela admitiu. Entre 45 e 50 anos, ela diria. Alto, ombros largos, corpo bonito. Tinha feições boas e fortes também, cabelos castanho-escuros e olhos claros — cinza ou verde, Lou ainda não descobrira, — mas havia uma frieza e uma arrogância nele que não a atraíam. Ele parecia dar-se bem com louras novas e imaturas, mas certamente não era o tipo dela. Não que isso incomodasse Patrick Farr. Ela era uma mulher de meiaidade, e era de conhecimento geral que uma mulher fica invisível depois dos 40, particularmente para homens como ele. Ela duvidava que ele 12


reparasse algo nela além de sua eficiência. — Não sabia que você se interessava tanto pela minha vida pessoal — Patrick dizia, incomodado pelo tom seco de Lou. — Não me interesso. Não tem absolutamente nada a ver comigo. — Você parece saber o suficiente sobre a minha vida! — Quase nada — disse Lou. — As meninas do Financeiro andaram passando artigos sobre você, para que soubéssemos quem está dirigindo a companhia agora. Você assumiu a companhia há mais de três meses e tudo o que sabemos de você é sua reputação. — E qual é minha reputação? — perguntou Patrick. Lou sorriu sem muita empolgação. — Você não sabe? — Ficaria interessado em ouvir seu ponto de vista. — Bem... Lou tomou outro gole de champanhe — estava descendo muito bem obrigada — e considerou. — Suponho que tenhamos ouvido que você é um tanto quanto impiedoso. Muito bem-sucedido. Viciado em trabalho, mas ao mesmo tempo tem um lado playboy. É isso. — Ela olhou para ele. — Parece justo? — Gostei da parte que diz que sou bem-sucedido — disse Patrick. — E quanto ao resto... bem, eu trabalho muito mesmo. Sei o que quero, e sempre consigo o que quero. Gosto de vencer. Não estou interessado em desistir e ficar em segundo lugar. Se as pessoas acham que isso é ser impiedoso, isso é problema delas — disse ele. — E o lado playboy? Ele fez um gesto de indiferença com a taça. — As pessoas só dizem isso se você é rico e não está amarrado a uma esposa e filhos. Gosto da companhia de mulheres bonitas, claro, e encontro muitas delas nas festas e eventos aos quais sou convidado, mas prefiro trabalhar a desfilar por aí em iates ou gastar dinheiro em cassinos ou o que quer que seja que os playboys fazem. — Entendo. Direi às meninas do Financeiro que você é um tédio, afinal. Patrick cruzou o olhar com Lou. Ele reparou um brilho distinto de diversão nos olhos dela e deu-se conta de que ela o estava provocando. Havia algo diferente nela essa noite, ele pensou, e não sabia muito bem como lidar com isso. Lou Dennison sempre fora o epítome de uma assistente eficiente, quieta, discreta, sempre vestida impecavelmente, mas 13


ele nunca a percebera como uma mulher além disso. Agora, de repente, era como se ele a visse pela primeira vez. Os olhos escuros dela emanavam um brilho desafiador, e havia uma vibração e objetividade nela que ele ainda não havia notado. O interesse de Patrick fora afetado. Talvez houvesse mais coisas sobre Lou do que o óbvio. Ele não sabia nada sobre ela, percebeu. Se ele pensasse sobre isso, podia imaginá-la indo para casa, para um apartamento imaculadamente organizado, mas a verdade era que ele jamais considerara o fato de ela ter uma existência fora do escritório. O que ela fazia? Aonde ia? Como ela era de verdade? Ele tinha que saber, Patrick pensou um pouco envergonhado. Ela fora sua assistente pessoal por três meses. Claro, eles estiveram muito ocupados tentando recuperar a firma de uma quase falência, e ela não era muito fácil de conhecer. Ela nunca encorajara qualquer forma de contato social... ou era ele que estava intimidado demais para se aproximar dela? Patrick sacudiu os ombros sentindo-se desconfortável. Ele deveria ter se esforçado mais. Ela era o membro da equipe mais próximo dele. A verdade era que ele estava mais acostumado com mulheres flertando e desfilando em volta dele. E Lou Dennison nunca faria isso. Ela não era esse tipo de mulher. Por outro lado, o que ele sabia? Talvez fosse a hora de saber mais sobre ela. — Então, e você? — ele perguntou. — Você corresponde à sua reputação? Lou pareceu surpresa. Bem, isso era melhor do que indiferença ou ironia. — Eu não tenho reputação — disse ela. — Tem, sim — Patrick a corrigiu. — Ouvi muitas coisas sobre você antes de ir para a Schola Systems. Ouvi que era você quem dirigia a companhia, e não Bill Sheeran. Lou franziu a testa. — Conversa fiada! — Não se preocupe, não acredito nisso. Se estivesse dirigindo a companhia, você nunca a teria deixado afundar. Você é competente demais para deixar que isso acontecesse. Ela fez uma cara de espanto. — Competente? — Isso não soara muito empolgante. Não como ser um playboy. — É assim que as pessoas me vêem? A taça dela estava vazia. Patrick levantou a garrafa sobre o balde para 14


deixá-la escorrer por um momento. — Competente... eficiente... prática... sim, tudo isso. — Você não tem muita escolha sobre ser prática quando tem filhos para criar sozinha — disse Lou suspirando. — É fácil ser relaxado quando só se tem a si mesmo para cuidar — disse ela, sem notar como ele estava surpreso. — É diferente quando se tem aluguel e contas para pagar e toda manhã uma enorme operação logística apenas para acordar os filhos, vesti-los, alimentá-los e checar se têm tudo o que precisam e se fizeram o dever de casa e se não estão atrasados para a escola. Patrick ainda não digerira a primeira revelação. — Você tem filhos? — disse ele, ignorando a última parte do discurso dela. Ele olhou para ela. Crianças significavam caos e pedidos de folga constantes, nada disso era associado a Lou Dennison. Ela levantou a sobrancelha ao notar a incredulidade na expressão dele. — Apenas dois. Grace tem 14 e Tom 11. — Você nunca mencionou que tinha filhos — disse Patrick em tom de acusação. — Você nunca perguntou — disse Lou, — e para ser honesta, não imaginei que você estivesse interessado na minha vida particular. Ele não estava — ele não estava, Patrick lembrou-se, — mesmo assim ela deveria ter dito algo. Ele se sentiu vagamente injustiçado. Duas crianças, adolescentes ainda por cima, era algo a se mencionar. — Por que você os manteve em segredo? — Não os mantive em segredo — Lou retrucou. — Tem um portaretrato com uma foto deles em cima da minha mesa. Se você está tão interessado, mostro a você amanhã! — Não precisa, acredito em você — disse Patrick. Ele não tinha a menor intenção de admirar fotos de adolescentes levados. — Só fiquei surpreso. Já tive secretárias com filhos antes, e elas sempre tiraram folga por conta de alguma crise — ele reclamou. — Depois da última, jurei nunca mais contratar uma assistente mãe. — Muito consciente em relação a famílias, você — disse Lou. — Não tenho nada contra famílias — disse ele. — É a escolha de cada um ter ou não uma família, mas não vejo por que deveria organizar minha vida de acordo com os filhos dos outros. Tive uma assistente, uma vez, cujos filhos dirigiam o escritório. Nós poderíamos estar num ponto crítico em uma negociação que Carol vestia o casaco, dizendo que tinha que ir à escola. 15


— Às vezes você tem mesmo que ir — disse Lou, ao terminar a segunda taça de champanhe. — Ainda mais quando as crianças são pequenas. Pelo menos os meus dois são crescidos o suficiente para irem sozinhos para a escola, mas se algo acontecesse, ou eles ficassem doentes, acho que estaria vestindo o meu casaco também. Patrick olhou para ela como se um cachorro que ele estivesse agradando virasse e ficasse bravo com ele, mas, mesmo assim, ele encheu a taça dela. — E eu tenho que concordar com isso? — Só estou lhe dizendo — disse Lou. Ela olhou direto para ele. — O fato de eu ter filhos será um problema para você? — Não enquanto eles não interferirem com o seu trabalho — disse Patrick. — Você sabe que eles não interferem, ou você teria ficado sabendo deles há muito tempo — disse ela com a voz afiada. — Isso não significa que não haverá situações em que vou precisar sair, e, sim, às vezes sem aviso prévio. — Oh, ótimo. — Patrick levantou um ombro e Lou chegou mais perto. — Obviamente, você não está ciente de que a Schola Systems sempre teve uma ótima reputação por ter regras tolerantes em relação às famílias dos funcionários. Eu tive sorte por conseguir um emprego lá quando meus filhos eram pequenos, e por ter um chefe compreensivo. Bill Sheeran sempre foi muito flexível quando seus empregados precisavam ir para casa por algum motivo. Ele ganhou muita lealdade da equipe por isso ela avisou, — então, se você estiver pensando em usar o fato de se ter uma família contra os seus funcionários, pode acabar sem equipe! — Não uso nada contra ninguém — disse Patrick, irritado. Ele não queria ouvir mais nada sobre como Bill Sheeran era maravilhoso. Só não foi maravilhoso o suficiente para salvar sua própria companhia, Patrick pensou cinicamente. Era muito bom ser amigável e flexível, mas se Patrick não houvesse assumido, todos esses funcionários admiradores da bondade de Sheeran passariam muito mais tempo em casa do que gostariam. Não fazia sentido ser respeitado pelas famílias dos seus funcionários enquanto sua firma afundava e sua equipe perdia o emprego. — Só queria que você tivesse me contado, só isso — ele resmungou. Lou não queria tornar as coisas mais fáceis para ele. Honestamente, esse homem nunca ao menos perguntara se ela tivera um bom fim de semana numa segunda-feira de manhã. — Se você tivesse demonstrado algum interesse na sua assistente pessoal você saberia. 16


— Estou demonstrando interesse agora — disse ele. — Mais alguma coisa que preciso saber? — Mais alguma coisa que você gostaria de saber? — ela retrucou. — Você não usa aliança de casamento — disse Patrick momentos depois. — Sou divorciada. Por quê? — O champanhe começava a fazer efeito. — Não me diga que você também tem problemas com pessoas divorciadas. — Claro que não. Eu também sou divorciado. — Mesmo? — Por que a surpresa? Isso não é algo incomum, você melhor do que ninguém sabe disso. Perfeitamente, pensou Lou. — Você está certo. Não sei por que fiquei surpresa. Acho que é porque você não parece o tipo casado — disse ela, pensando no estilo de vida dele. Playboy ou não, ele certamente não passava muito tempo em casa. — E não sou — disse Patrick. — É por isso que sou divorciado. Só fiquei casado por dois anos. Éramos muito jovens. — Ele deu de ombros. — Foi um erro para nós dois. Isso será uma boa novidade para as meninas do Financeiro — disse ele. — Vou passar adiante — disse Lou, sorrindo levemente. Patrick levantou a garrafa e olhou para o restante com surpresa. — Parece que terminamos a garrafa — disse ele, ao dividir as últimas gotas e colocando a garrafa de volta no balde. — Gostaria de outra? O seu barman favorito deve estar louco por uma desculpa para vir aqui de novo! — Acho melhor irmos comer — disse ela, ignorando o comentário dele. O champanhe caiu muito bem. Um pouco bem demais, de fato. Ela estava começando a se sentir agradavelmente embriagada, Lou se deu conta, torcendo para conseguir chegar ao restaurante sem cair ou fazer algo embaraçoso. Eles não tinham tido tempo para um almoço de verdade, e ela já sentia o efeito disso. Ela se sentiu melhor no restaurante. Os garçons andavam de um lado para o outro, trazendo pão e água sem serem solicitados. Obviamente, eles podiam ver o eles precisavam. Lou pegou um pedaço de pão e passou manteiga. Agora não era hora de se preocupar com a dieta. Ela precisava forrar o estômago o mais rápido possível. 17


Ela tentou se concentrar no menu, mas ficou distraída com a presença de Patrick. Ele era mais fácil de conversar do que ela esperava. Claro, o champanhe provavelmente ajudara. Ele certamente não estava tão frio e impessoal como de costume. Ela se viu abrindo-se com ele de uma forma diferente. Era como se os dois tivessem baixado suas guardas pela duração da noite. Tinha que ser algo a ver com o fato de estarem presos longe de casa e cansados... e, ah, sim, o champanhe. Ela não devia beber mais nada, Lou decidiu, mas de alguma forma uma taça de vinho apareceu na frente dela e pareceu-lhe descortês ignorála. Ela beberia o vinho devagar. — Então — disse Patrick depois de fazer o pedido. — O que aconteceu com os seus filhos essa noite? Estão com o pai deles? — Não, Lawrie vive em Manchester. — Houve uma certa hesitação na voz dela quando mencionou o ex-marido, ele notou. — Eu sabia que chegaria tarde em Londres mesmo com os trens funcionando, então combinei que eles ficassem com uma amiga. Eles adoram ficar com Marisa. Ela os deixa assistirem TV a noite toda e não os obriga a comer legumes. O que era provavelmente mais do que Patrick precisava ou queria saber. Ele só estava tentando ser educado. Ela estava ficando uma tagarela, um sinal de que bebera demais. Melhor comer outro pedaço de pão. — Você tem filhos? — ela perguntou, achando melhor passar a palavra para Patrick antes que ela começasse a falar como Grace era boa nos esportes e quão adorável Tom era quando bebê. — Não — disse Patrick. — Nunca quis ter filhos. Minha ex-mulher, Catriona, queria. Essa é uma das razões pelas quais nos separamos. Aparentemente, eu fui egoísta demais por querer viver minha própria vida. — Lou franziu a testa. — Mas não é por isso que as pessoas se casam, precisamente por quererem viver suas vidas com outras pessoas? — Ela falou sem pensar e por um momento achou que tinha ido longe demais. — Eu disse a Catriona, antes de nos casarmos, que não queria ter filhos — disse Patrick, aparentemente sem perceber o grau de intrusão da pergunta dela. — E ela disse que entendia. Ela disse que também não queria uma família, e que não me dividiria com ninguém, nem com um bebê. Ele rolou os olhos, como se a convidasse a debochar dele por ter acreditado em sua esposa, mas Lou pensou poder sentir dor na voz dele. Ele devia ter amado muito a esposa. — Nós concordamos — Patrick insistiu, mesmo quando parte dele sentia-se maravilhada por estar contando tudo isso para Lou. — Não fui só 18


eu. Achei que nós dois queríamos a mesma coisa e que tudo ficaria bem, mas em menos de um ano de casados ela começou uma campanha para termos um bebê. Ele parecia exasperado, e Lou não pôde deixar de sentir uma certa simpatia pela pobre Catriona. Era preciso ser muito corajosa para tentar convencer Patrick Farr de alguma coisa. — É muito comum uma mulher mudar de idéia sobre ter um bebê — disse ela. — É uma coisa hormonal. Você pode ter certeza de que não está interessada, e num belo dia acorda e o seu relógio biológico começa a girar, e de repente você não consegue parar de pensar em um bebê. Eu era assim antes de ter Grace. — Sim, bem, aprendi da pior maneira que as mulheres mudam de idéia o tempo todo — disse Patrick. — Se eu soubesse naquele tempo o que sei agora, não teria acreditado em Catriona, para início de conversa. Mas eu era jovem, e foi uma barra-pesada. — Aposto que para ela também — disse Lou. — Não parece que você estava preparado para fazer concessões mesmo. — Como você pode fazer concessões sobre um bebê? — Patrick perguntou. — Ou você tem, ou não tem. Não há meio-termo aqui. Isso seria novidade para Lawrie, Lou não pôde deixar de pensar. Ele parecia achar que podia entrar e sair da vida de seus filhos quando bem entendesse. — Muitos pais não têm escolha e apenas vêem os seus filhos de vez em quando — disse ela, lutando para parecer justa. — Isso também pode funcionar. — Eu não queria ser um pai dessa maneira — disse Patrick. — Não acredito em meias medidas. Ou você faz algo direito, ou não faz. Nada de comprometimentos, então.

Capítulo 2 — Você poderia dizer isso sobre o casamento também — disse Lou, com toda a coragem reforçada pelo champanhe. — Eu teria mantido o casamento a qualquer custo, mas Catriona quis o divórcio. E foi isso o que aconteceu. — O que aconteceu com Catriona? — Ah, ela conheceu alguém. Teve seus filhos... três... mas agora divorciou-se novamente. O marido dela abandonou-a e fugiu com a 19


secretária, em busca de uma vida sem crianças, pelo que sei, e ela está sozinha de novo. Ele continuou, lentamente: — Sabe de uma coisa? Catriona sempre disse que se pudesse ter um bebê, ela nunca mais ficaria triste, mas ou a vejo de vez em quando, e ela não me parece muito feliz. Ela teve as crianças que queria, mas parece exausta e acabada. — Não é surpresa, se o marido a deixou cuidando sozinha de três crianças — disse Lou. — Ela tem quem ajude — disse Patrick. — Tem uma casa e alguém para cuidar das crianças. Ela nem tem que trabalhar. E no final das contas, isso foi escolha dela. — Criar filhos é cansativo — disse Lou, dessa vez menos simpática ao ouvir que Catriona tinha empregada, babá e não precisa trabalhar para pagar a hipoteca. Uma faxineira, imagine! Imagine ter uma casa sem aluguel ou hipoteca para pagar. Melhor ainda. Mas ela dispensaria a babá. Grace acabaria com a pobre moça. — Crianças demandam muito esforço — disse ela. — Eu sei — disse Patrick. — É exatamente por isso que decidi não ter filhos. Pode ficar com as suas fraldas sujas, os seus joelhos ralados e os seus dramas de adolescentes. Não quero ser incomodado com nada disso. — Mas você é mais feliz do que Catriona? — Claro que sou! Lou pareceu não acreditar muito. — Você diz que ela não é feliz, mas aposto que é. Aposto que ela não se arrepende de ter tido esses filhos nem por um instante. Claro que é trabalho pesado. Tem dias que estou tão exausta que parece que estou em uma batalha sem fim, e então olho para a nuca de Tom, ou ouço a risada de Grace, e isso é um verdadeiro... milagre... Sinto o meu coração quase parar de emoção por eles. Você já se sentiu assim? — Fico assim quando olho para o meu Porsche — disse Patrick. — O suficiente para valer a pena por um casamento perdido e a perda da sua esposa? — Olha, eu fiquei amargo quando Catriona partiu. Claro que fiquei — disse ele com um tom levemente defensivo. — Não vou fingir que estive sempre feliz desde que segui com a minha vida. Tenho sido bem-sucedido de uma forma que nunca sonhei quando vivi com Catriona. Montei grandes companhias, e ganhei muito dinheiro enquanto fazia isso. Trabalhei duro, e 20


tive uma vida boa. E tenho o tipo de carro com que a maioria dos homens apenas sonha. — Ah, sim, tão logo você tenha um bom carro... — Você pode debochar, mas isso significa muito. — Acho que é preciso ser homem para entender essa — disse Lou. Tom e Lawrie certamente entenderiam. — Coloquemos dessa maneira — disse Patrick, apontando um garfo para ela para enfatizar. — Eu posso fazer o que eu quero. Posso ir aonde quero, com quem eu quero. Você não acha que isso me deixa feliz? — Certo. — Lou balançou a cabeça ao passar manteiga em outro pedaço de pão. Ela torcia para a comida chegar logo. Estava faminta. — Então, qual foi a última vez que você saiu de férias? Você, certamente, não foi a lugar nenhum nos últimos três meses. — Ando ocupado, caso você não tenha notado — disse Patrick, perdendo o rebolado pelo humor combativo de Lou. — Eu tinha uma companhia para salvar! — Ei, nós demos conta dela por vários anos antes de você aparecer! Não teríamos ido ralo abaixo se você tivesse tido um fim de semana prolongado. Você não viajou nem na Páscoa. Você nunca desejou trabalhar por algo além de dinheiro? Nunca desejou voltar para alguém em casa no final do dia? — Você está tentando me perguntar se eu me sinto solitário? — disse Patrick com ironia. — Bem, e você se sente? — Eu não preciso estar sozinho se não escolher isso. Já tive vários relacionamentos, e nunca me faltou companhia feminina. Disso sabia Lou, pelas colunas de fofoca. Talvez tenha sido bom o fato de a comida ter chegado antes que Lou tivesse tempo de elaborar uma resposta ácida. Patrick observou enquanto Lou sorria, e o garçom, dessa vez, velho o suficiente para ter algum bom senso, quase derreteu-se ao servi-la. Ele pegou o guardanapo, encheu ambos os copos dela e ofereceu-se para trazer mais pão e pimenta-doreino. Extraordinário, Patrick pensou. Ele olhava para ela. Ela tirara a jaqueta e usava apenas uma blusa de seda de gola em U, com a simplicidade quebrada apenas por um colar de prata. OK, tinha uma elegância clássica e um sorriso charmoso — e parecia funcionar com os garçons, — mas não havia nada particularmente especial no resto dela. Bem, tinha olhos bonitos, ele achava, corrigindo sua opinião, e toda a 21


autoconfiança de uma mulher madura, mas mesmo assim era impossível descrevê-la como sendo bonita. Diferente de Ariel, que tinha todo o brilho da juventude. Mas, agora que ele a observava melhor, podia ver que tinha certa elegância com aqueles cabelos e olhos escuros. Engraçado, essa era a primeira vez que ele a via como mulher. Ele devia ter visto o contorno do pescoço dela e a curva de sua boca quase todos os dias nos últimos três meses, e essa noite era a primeira vez que ele a notava. Patrick franziu a testa levemente. Ele não estava certo de que queria notar coisas desse tipo em Lou. Havia algo de perturbador em pensar nela como uma mulher calorosa e real, ao contrário da assistente impessoal que cuidava de seu escritório com tanta eficiência. Em perceber a combinação estranha daqueles lábios generosos com aquele ar de competência, ou o tom irônico de sua voz, às vezes. E havia algo de muito perturbador em notar a maneira como a blusa dela se mexia quando ela se inclinava para a frente para pegar o copo. O tecido parecia flutuar sobre a pele dela, e era impossível não imaginar como seria tocá-la com suas mãos, como o corpo dela seria suave e quente... Patrick desviou o olhar de repente. Chega. — E você? — disse ele, lutando para lembrar sobre o que conversavam. Ela o fizera reagir, e isso era bom. Qualquer coisa era melhor do que ficar olhando para a camiseta dela. — Você é a Sra. Feliz? — Acho que sou bem feliz — disse ela. — Contente, pelo menos. Não sou tão feliz quanto era, logo que me casei e quando Tom e Grace eram bebês, mas tenho muitas razões para ser feliz. Os meus filhos são saudáveis, tenho uma tia querida que é como uma mãe para mim, tenho bons amigos... A única vergonha é o meu emprego horrível. Tenho um chefe que faz da minha vida uma miséria. — O quê? — Patrick demorou para entender. Ele estava ocupado observando a blusa dela. — Foi uma piada — disse Lou. — Ah, certo. — Patrick ficou surpreso pelo fato de sentir-se tão aliviado. — Ha, ha — disse ele sem empolgação, e ficou surpreso de novo quando Lou riu. Era uma risada de verdade, uma risada que a deixava mais jovem, vibrante, interessante, muito... sexy. Será que fora isso que o garçom vira também? — Perdão — disse ela. — Só queria ter certeza de que você estava mesmo ouvindo! Patrick teve a sensação de que as coisas estavam saindo de controle 22


e se esforçou para se recompor. Devia ter algo muito estranho naquele champanhe. Ele parecia ser outra pessoa. — Mas você está sozinha. — Assim era melhor; pensar nela como uma triste divorciada. — Você não se sente sozinha? — Quando se vive num apartamento minúsculo com dois adolescentes, posso lhe dizer que às vezes até se deseja estar sozinho! — disse Lou. — Não foi isso que eu quis dizer, e você sabe disso — disse ele. — Não, tudo bem — ela concordou. — Às vezes, sinto falta de estar casada — disse ela devagar, empurrando o prato para o lado, para que pudesse repousar os braços sobre a mesa e apoiar o rosto com uma das mãos, sem se dar conta do que aquilo causava em seu decote, ou qual seria a reação em Patrick. — É difícil criar filhos sozinha — disse ela, enquanto ele tentava manter o foco. Não há ninguém com quem conversar à noite, ninguém para dividir suas preocupações, ninguém para se importar com a maneira como você lida com os pequenos triunfos deles. Ela olhava para a vela acesa, distante, pensando em seus filhos, e Patrick achou que ela pudesse ter esquecido que ele estava ali. Se ela tivesse mesmo esquecido, ele não gostava muito dessa idéia. — Seria bom ter alguém em quem se apoiar quando tudo parece dar errado — disse ela. — Alguém para lhe amparar? — disse ele, com a voz mais severa do que pretendia, e os olhos de Lou desviaram-se da vela para encontrar os dele por um breve instante, enquanto ambos tentavam não pensar em ser amparados. Ela abaixou o olhar primeiro. — Sim, alguém para me segurar nos braços — disse ela calmamente — de vez em quando. Patrick de repente lembrou-se de Lou cruzando o lobby no final daquela tarde. Ela parecera séria e formal, tão fria e composta. Nem um pouco atraente. Ele estava impressionado pelo calor e pela suavidade dela, pela forma como parecia convidativa com seus olhos negros brilhando à luz das velas, e com os cabelos levemente desarrumados. Ele imaginou como seria tocá-los, correr os dedos por eles e deixar as mechas sedosas caírem sobre o rosto dela. O que acontecera? Antes, o tailleur arrumado e a blusa simples pareceram-lhe tão sem graça. Agora eles pareciam tão provocadores, como se tivessem sido desenhados para fazê-lo imaginar o que havia por baixo. Se ela estivesse quente e cheia de desejo em seu colo, será que ele deslizaria a mão pelo joelho dela e por baixo de sua saia e descobriria que 23


ela estava usando meia-calça e cinta-liga? Patrick respirou fundo. Meu Deus, ele tinha que parar com aquilo agora. Como isso era inapropriado. Ele não queria que Lou pensasse que ele era apenas outro homem de negócios tarado, fantasiando sobre suas secretárias de saia justa, meia-calça, cinta-liga e salto alto. Mas, se a carapuça servisse... Levantando seu corpo, ele tomou um gole do vinho e esforçou-se para se recompor. — Sim, ser amparada... Eu sinto falta disso — dizia Lou, sem dar-se conta da confusão de Patrick. — Acho que do que mais sinto falta é o sentimento de que você não precisa cuidar de tudo sozinha, de que alguém está interessado em você pelo que você é, não só porque você é uma mãe você deveria ser encarada como alguém sem importância. Não me importo quando as crianças fazem isso, sei que é parte do jeito delas, mas ainda... Ela olhou para ele, e Patrick limpou a garganta e balançou a cabeça concordando. — Vamos lá, diga-me. Essa é a hora da confissão, lembra? Nada a ser lembrado ou ser usado contra você amanhã! Ela riu. — Ok, então, mas você também vai me contar uma fantasia embaraçosa. — Só uma fantasia? Melhor ainda! — Um leve rubor tomou o rosto dela, mas ela torcia para que a luz da vela não o revelasse. — A minha não é muito empolgante. Fantasio que poderia pular a parte sem graça de encontrar um homem, sair com ele, conhecê-lo e tudo mais. Não quero mais a fase da paixão. Consome demais, e machuca quando se perde. — Então, onde entra a fantasia? — Queria poder acordar e encontrar-me confortavelmente casada com alguém — ela confessou. — Alguém estável e... bom. Alguém em que eu pudesse me apoiar quando fosse preciso, que me desse apoio, e no resto do tempo seríamos... sei lá... amigos, eu acho. — E há algo de embaraçoso nisso? — perguntou Patrick, enquanto sua mente voltava à imagem da cinta-liga de Lou. Se fosse mesmo cintaliga o que ela estava vestindo. Ele queria muito saber. Será que poderia perguntar a ela? Patrick pensou, e em seguida se recompôs. O que ele estava pensando? Claro que ele não podia perguntar a sua assistente pessoal se ela estava usando cinta-liga. Isso seria assédio sexual.. 24


— É tão politicamente incorreto — disse Lou cheia de culpa. — Sou uma mulher forte e independente. Não deveria precisar de alguém que cuidasse de mim — disse ela. — Eu só penso em ter alguém comigo quando estou cansada ou me sentindo para baixo, ou algum dos meus filhos está numa fase difícil. O que era um número deprimente de vezes na semana, se ela pensasse bem. — Isso não me parece uma fantasia impossível — disse Patrick. — Você só precisa ficar de olho para encontrar alguém que se encaixa nisso. — Ah, sim, e existem tantos homens bons, generosos e solteiros por aí! — Deve haver alguém — disse Patrick. — Você é uma mulher atraente. — Atraente demais para o sossego dele, parecia. — Adicione a isso o fato de eu ter 45 anos e ter dois adolescentes difíceis que consomem cada instante em que não estou no trabalho — disse ela. — Você gostaria de assumir isso? — Com você falando dessa maneira, não. — Não existe nenhuma outra maneira de enxergar isso — disse Lou. — Já faz mais de seis anos que me divorciei, e já aprendi a me virar sozinha. Não estou procurando um homem. — Já ouvi isso antes — disse Patrick com ironia, ao pensar nas mulheres que lhe garantiram que só queriam se divertir um pouco e então começaram a desfilar em frente a joalherias e jogar indiretas sobre viver com ele. Isso era bom. Ele não estava mais pensando em cintas-ligas. Muito. — É verdade. — Lou lançou um olhar desconcertante sobre ele. — Francamente, eu não tenho mais energia para estar procurando um homem, muito menos para começar um relacionamento. Quando você trabalha o dia inteiro e depois vai para casa encontrar duas crianças que precisam de toda a sua atenção, é difícil se imaginar com alguém novo. E mesmo, por uma chance remota, se eu encontrasse alguém que não se importasse em se encontrar comigo uma vez ou outra, quando eu conseguisse persuadir uma amiga para ficar de babá, e ele não ficasse desanimado pelo humor de Grace, ou pelo fato de eu não ter um quarto próprio na minha casa, e estivesse feliz em ter apenas uma fração da minha atenção, eu ainda hesitaria — disse ela. — Eu levei muito tempo para reconstruir minha vida desde que Lawrie partiu. Não deixarei que tudo desmorone de novo. — Você quer dizer se for machucada novamente? — Sim. Não vou me expor a isso novamente. 25


— Então, você não arriscaria? — Se eu estivesse sozinha, talvez arriscasse — disse ela, ao pensar na dor pela qual passara. — Talvez. Mas tenho dois filhos que foram pegos num relacionamento que falhou. Não farei isso de novo. De qualquer forma — disse ela contra-atacando, — percebo que você também não se apressará a se casar novamente! — Não, uma vez foi o suficiente para mim — Patrick i concordou. — Eu não era bom nessa coisa de casamento. Odiava as negociações sem fim e os jogos de adivinhação. — Casamento não precisa ser assim — disse Lou. — Nunca houve negociações com Lawrie. — Ele fazia tudo com seu charme, sem se preocupar que ela poderia ser afetada pelo que ele fazia. — Não, mas na maioria das vezes é assim mesmo. Cada relacionamento que tive desde o meu divórcio tem sido a mesma coisa. As mulheres parecem nunca estar satisfeitas. Você dá a elas o que elas pedem, e em seguida elas querem mais. — Não acho que essa seja uma observação justa — disse Lou, tentando lembrar-se da última vez que tivera um desejo realizado por um homem. — Não é? — perguntou Patrick. Ele estava se sentindo como ele mesmo agora. Ótimo. A fixação com a cinta-liga dela fora apenas uma aberração momentânea. — Vocês estão se dando bem e divertindo-se juntos, então ela deixa um secador de cabelos ou algo do gênero em sua casa. Algo pequeno, apenas para marcar presença no seu espaço. Elas querem que você diga que as ama, e quando você diz, elas querem compromisso. E quando você se compromete, elas querem que você viva junto com elas, ou se case, e então elas querem filhos... E isso são apenas as coisas maiores — disse ele. — Ao mesmo tempo, elas tentam mudar sua vida por completo, elas querem que você as compreenda e converse com elas e surpreenda-as com presentinhos e viagens de fim de semana. Elas querem que você mande flores e e-mails e telefone do trabalho para que elas saibam que você pensa nelas o tempo todo. No final das contas, elas querem tomar o controle da sua vida. Lou não se impressionou com o sofrimento dele. — O que você está dizendo, então, é que você quer ter sexo, mas não quer um relacionamento? — Qual a importância de relacionamentos? — disse Patrick. — As mulheres são obcecadas com isso! Imaginei que pudesse me dar bem com mulheres mais jovens. Achei que elas ficassem felizes por estarem se divertindo, e não se importassem em assentar, mas não! Saímos umas duas vezes e elas já estão falando sobre o relacionamento! — ele suspirou. 26


— Antes de dar-se conta de onde você está, você já está no meio de toda aquela confusão emocional de novo. — Deve ser horrível para você — disse Lou, sem querer esconder o sarcasmo. Patrick olhou para ela. — Por que as mulheres fazem isso? — Bem, veja só, nós temos uma coisa esquisita chamada sentimentos — Lou explicou com uma paciência sarcástica. — É uma coisa chata nossa, eu sei, mas não há nada que possamos fazer sobre isso. Nós nos apaixonamos sem pensar em como isso é aborrecido para vocês, quando se tem alguém que os adora, e faria qualquer coisa por vocês. — Ela balançou a cabeça fingindo descrença. — Quero dizer, como isso é uma atitude egoísta... — Estou falando sério — disse Patrick. — Apenas gostaria de encontrar uma mulher que fosse feliz por aceitar as coisas como elas são sem se preocupar com o futuro, ou sobre o que tudo isso significa ou sobre o que acontecerá entre nós. Desse jeito, apenas saímos juntos por algumas semanas antes de ela tornar-se grudenta e eu me tornar claustrofóbico. A idéia de ficar preso a alguém por toda a vida é horrível demais para ser contemplada. Ficaria entediado dentro de um mês. — Você não ficou entediado com Catriona — disse Lou. Patrick pensou em viver com Catriona. Eles eram tão jovens e empolgados para viver juntos. Eles discutiam muito, mas não era aborrecido. Ele sentira a falta dela quando ela partiu. — Aquilo foi diferente. — Como? — Patrick desejou que Lou parasse de fazer perguntas difíceis. — Apenas era diferente — disse ele. — Nada a ver com o fato de você e Catriona terem a mesma idade e agora você ter o dobro da idade de qualquer garota com quem possa contemplar um casamento? — Não. É que quanto mais velho fico, mais dou valor à minha liberdade. Gosto da minha vida assim. Trabalho duro, divirto-me bastante, e se encontrar uma mulher atraente, faço algo em relação a isso. Embora nem sempre fosse o caso, ele pensou, ao lembrar da cintaliga de Lou. Droga. Patrick pensou. Era para ele ter esquecido isso. — Não quer dizer que não seria muito conveniente ter uma esposa — disse ele. — Seria bom ter alguém para lidar com o lado doméstico e social das coisas. Não me incomodo com tudo isso, mas às vezes preciso entreter convidados, e seria muito mais fácil se eu fosse casado. 27


— Você pode ter uma empregada para cuidar da casa, existem vários fornecedores que brigariam para cozinhar para pessoas como você. — Isso é exatamente o que faço no momento. Mas não é a mesma coisa que ter uma anfitriã para apresentar ÍIS pessoas e conduzir a conversa. — Você já tentou isso com alguma de suas namoradas? — Não. — Patrick pareceu horrorizado. — Já é difícil levá-las para recepções e festas. Elas não estão interessadas em negócios. Elas se entediam e acabam sendo mais um risco do que um trunfo. Posso até imaginar o que aconteceria se eu pedisse a elas para entreter os meus parceiros de negócios num jantar. Isso seria compromisso — ele torceu o nariz para a palavra. — Elas estariam comprando revistas de noivas no dia seguinte. — Não consigo acreditar que todas essas moças estejam tão desesperadas para casarem com você — disse Lou, irritada pela atitude dele. — Você não é assim tão maravilhoso. Claro, homens incrivelmente ricos, solteiros, inteligentes e com menos de 50 anos não aparecem tão facilmente, tinha que admitir. E Patrick não era feio. Ele devia ter noção de quão atraente era. Não era o tipo dela, claro. A petulância de Tom Cruise e a tranqüilidade de Clint Eastwood era como ela o descrevia para Marisa. — Diga-me que ele tem a beleza de George Clooney e eu vou trabalhar para ele! — Marisa dissera. Mas Patrick não era George Clooney. Ele era frio demais, suas feições, muito severas. Ele não tinha a beleza de Lawrie, nem ao menos o seu charme, mesmo assim... Lou considerou-o novamente. Havia algo de afirmativo nele, ela concluiu, algo sólido e estável, e quando ele ouvia, concentrava-se por completo no que você dizia. Ele olhava para você da maneira adequada, em vez de desviar o olhar em busca de algo mais interessante, como Lawrie fazia. Engraçado que ela não notara isso antes, Lou pensou. Ou sua boca, tão tranqüila, firme e misteriosa. O tipo de boca impossível de não se imaginar o beijo, a textura. Não que ela quisesse, Lou lembrou-se a si mesma. Era apenas engraçado o fato de ela não ter notado isso até esse momento, só isso. Engraçado descobrir a diferença que um brilho de humor poderia fazer, clareando a expressão dele, e aquecendo-lhe os olhos. Engraçado como o sorriso dele fazia o coração dela pular, só um pouco. Devia ser todo aquele champanhe que ela bebera. 28


— Por que você não tenta sair com mulheres ambiciosas? — disse ela, forçando sua mente a continuar no assunto em questão. — Alguém que tenha uma carreira própria e que não queira se comprometer, como você? — Acredite, eu sairia se pudesse encontrar alguém assim — disse Patrick. — Eu poderia até estar preparado para me casar com ela. — O quê, e desistir da sua liberdade tão preciosa? — Pelo menos calaria a boca de minha mãe. Ela fica no meu pé para eu me casar de novo. Ela acha que seria bom para mim ter alguém em quem pensar. Ela diz que isso evitaria que eu fosse tão egoísta. Ele pareceu irritado e Lou abriu um sorriso. Ela gostava da idéia de ele ter uma mãe que não se impressionava tanto com ele, assim como ela. — Ela quer netos? É por isso que ela quer que você se case? — Acho que ela já aceitou o fato de não conseguir netos de mim — disse ele, apontando o dedo para a expressão de Lou. — Pare de simpatizar com ela! Ela não tem do que reclamar. Já tem 11 netos. Acho que isso é mais do que suficiente. — Onze? — disse Lou, tentando ajustar-se à idéia de Patrick pertencer a uma grande família. — Tenho três irmãs, todas parecem ser muito férteis, o todas também acham que devo me casar. Todas as vezes em que nos encontramos, elas perguntam qual a graça de se ter tanto dinheiro e não poder aproveitar. Só porque elas têm famílias enormes, acham que eu também devo ter — ele resmungou. — Eu digo que estou feliz sozinho, e estou mesmo, mas às vezes vou para casa e a casa parece mesmo um pouco vazia — ele admitiu. — Aí esta é minha confissão embaraçosa! — Isto é uma confissão, não uma fantasia — disse Lou, com bom humor. Ela estava se sentindo extremamente relaxada. Era estranhamente confortável estar sentada ali com ele, conversando sobre coisas que ela nem sonharia conversar com as pessoas no trabalho, muito menos com o chefe, conversando com ele como se fossem amigos. Agora era estranho pensar que ela estivera satisfeita em ter um relacionamento profissional e frio com ele. Por um breve momento, Lou imaginou se se arrependeria dessa conversa pela manhã, mas ela logo evitou esse pensamento. Ela culparia o champanhe. Sem mencionar o vinho. Eles pareciam ter feito progresso naquela garrafa, apesar dos planos dela de beber apenas ocasionalmente. Ela não se preocuparia com isso agora. Ela estava aqui, longe de casa, longe das crianças. Era como se estivesse em uma bolha, um 29


descanso do cotidiano. Tudo parecia diferente. Até Patrick parecia diferente. Mais caloroso, mais humano, mais acessível. Muito mais atraente do que deveria, considerando que ele não era o tipo dela. — Continue — disse ela. — Você disse que era hora das confissões, e que esqueceríamos de tudo pela manhã. Eu lhe contei minha fantasia, acho que deveria me contar a sua. Patrick pensou em debruçar-se sobre a mesa e sussurrar para ela esquecer a sobremesa, que ele a levaria para o quarto; que ele queria explorar suas pernas enquanto a beijava, passar a mão sobre a coxa dela, levantando aquela pequena saia até os seus dedos encontrarem o topo de sua meia e, então... — Pelo menos uma — disse Lou, incomodada pela maneira como os olhos dele escureceram. Ela não sabia no que ele estava pensando naquele momento, mas tinha quase certeza de que era algo que a faria ruborizar. Ele a deixaria mais do que um pouco ciumenta. Havia algo na expressão dele que fazia o coração dela bater como não batia há um bom tempo. Agora não era hora para isso, e o chefe dela não podia ser a causa disso. Ela não queria ouvir o que quer que fosse que ele fantasiava com aquelas magricelas louras que ele gostava tanto. Uma fantasia que embaraçaria a você, não a mim ela especificou, foi bom ela ter dito isso, Patrick pensou, com uma mistura de satisfação e horror. Por um minuto ele se deixara levar um pouco longe demais. Felizmente, a intervenção dela deu-lhe o tempo necessário para desembaralhar seu pensamento. A realidade voltou ao seu lugar, assim como todas as desvantagens de explicar para sua secretária que você fantasiava sobre ela. De fato, isso não era uma boa idéia. — Ok... — disse ele. Ele tomou um gole do vinho enquanto tentava se concentrar. Claro que ele pensaria em algo para dizer. Uma fantasia... uma fantasia... e nada de meia-calça e cinta-liga... — Isso — disse ele. — Bom, que tal essa? Não é tão diferente da sua. O que eu gostaria muito era de todas as vantagens do casamento Mas nenhuma das desvantagens. Então, na minha fantasia, eu teria uma esposa que estivesse sempre por perto quando eu precisasse dela. Ela seria a perfeita anfitriã, lembraria dos aniversários das minhas irmãs e desapareceria misteriosamente toda vez que eu encontrasse uma garota nova e bonita, para que eu continuasse a ter meus casos sem sentir culpa. Lou rolou os olhos, sem se impressionar. — Ah, a velha história do sexo sem compromisso! Não acho que isso tenha algo a ver com a minha história, de jeito nenhum — ela rebateu. — 30


Mas entendo por que você pensa assim. Patrick não tinha certeza de como reagir àquilo. — Bem, como é bem possível que isso não passe de fantasia, eu me satisfaço com uma casa vazia, com bufês contratados e com o desgosto da minha mãe. Ao pensar sobre isso, Lou levantou a taça sem perceber, para ser preenchida novamente. — O que você precisa mesmo — disse ela — é de alguém preparado para casar-se com você por dinheiro, e tratar o casamento como emprego. — Isso não é muito romântico! — Você não precisa de romance — disse ela. — Você precisa de alguém para gerenciar sua casa, para ser sua secretária social, para ser agradável e interessada quando vocês saírem juntos, mas que finja não saber dos seus casos amorosos, e não espere nada de você além de acesso a sua conta bancária. Patrick ficou impressionado com a avaliação dela e confirmou, ao encher o copo dela. — É exatamente o que preciso. — Na verdade — disse Lou, — você precisa se casar comigo.

Capítulo 3 A mão de Patrick tremeu e ele errou o copo, derramando vinho sobre a toalha de mesa. — Perdão — disse ele ao tentar limpar com o guardanapo. — Pensei que você tivesse dito que eu deveria me casar com você! — Foi o que eu disse. — Lou pegou o copo de volta com um sorriso agradecido, sem embaraço. — Alguém como eu. Mas, na verdade, pensando bem, eu seria a esposa perfeita para você. — Seria? — Patrick não sabia se ficava feliz ou chocado. — Claro — Lou gesticulou com o copo. — Eu conheço os seus negócios, e poderia fazer a parte social facilmente. Sei para quem você precisa jogar charme para impressionar, e não tenho nenhuma ilusão em relação a quem você realmente é! — Certo — disse Patrick, fascinado. — Você estaria bem melhor com alguém sensível como eu, e que não 31


arrumaria confusão por causa das suas namoradas, ou esperaria que você prestasse alguma atenção em mim — disse ela. — Você não precisaria enviar-me e-mails todos os dias, comprar-me flores ou surpreender-me com passeios a Paris. — Ok — disse ele devagar, ganhando tempo enquanto tentava descobrir se ela estava falando sério ou apenas brincando. — Mas por que você se casaria comigo? — Ah, pelo seu dinheiro, claro — disse Lou cheia de empolgação. — Achei que você não queria um homem... — Não mesmo, mas quero segurança financeira. Você tem alguma idéia de como é difícil ser mãe solteira vivendo com uma renda limitada numa cidade como Londres? Patrick levantou as sobrancelhas. — Isso é uma forma de reclamar do seu salário? — Não. — Ela balançou a cabeça. — O meu salário é justo. Mais que justo, na verdade. Se não fosse, eu teria arrumado outro emprego. Ele apenas não vai muito longe quando se tem que pagar um aluguel absurdo e alimentar e sustentar duas crianças. — Sim, ouvi falar que crianças hoje em dia custam caro — disse Patrick, pensando nas reclamações de suas irmãs. — Custam mesmo, e quanto mais crescem, mais caro parecem custar. — Lou suspirou e bebeu o vinho. — Gostaria de poder dizer que criei duas crianças compreensivas, desapegadas a coisas materiais e que entendem que o amor e a segurança que você batalha tanto para lhes dar significa mais do que a última marca de tênis, ou o jogo de computador mais moderno, mas, infelizmente, eles não são nada assim. — Oh? — disse Patrick, surpreso pela idéia de que os filhos de Lou eram a antítese do que ele imaginava. Ele achou a atitude dela sincera e interessante. Ele já tivera que ouvir muitas mães lhe dizer como seus filhos eram inteligentes, talentosos e, geralmente, maravilhosos. — Eles não são crianças más — disse Lou, — apenas são como seus amiguinhos. Eles querem fazer parte do grupo, querem ser como todos e ter o que todos têm. Pelo menos tenho conseguido não mimá-los demais — ela completou com um sorriso amarelo. — A realidade de quem vive com renda restrita. Ainda que Grace e Tom não vejam as coisas dessa maneira! — E o pai deles não ajuda você financeiramente? — Patrick perguntou, com o seu ar de homem de negócios. Como um homem que se especializou em pegar negócios a um passo da falência e virar o jogo, ele ficava ofendido pela idéia de perder o controle sobre as finanças. Lou suspirou, pensando em Lawrie. 32


— Ele tem boa vontade, mas quando o assunto é transferência de dinheiro, tem sempre um grande esquema. de que ele precisa fazer parte, que resolverá todos os nossos problemas. — E resolve? — Não. A última vez que ele tinha dinheiro de verdade para investir, ele perdeu nossa casa — disse Lou, tentando diminuir a importância da situação. — Não tenho como voltar ao mercado imobiliário em Londres agora. — Uma tristeza — comentou Patrick, com um olhar de desaprovação. Ele era um homem de negócios muito cauteloso para correr os riscos que Lawrie corria o tempo todo. Lou pensou no dia que Lawrie chegou em casa e confessou que pegara dinheiro emprestado e dera a casa como garantia, e perdera tudo num empreendimento idiota que até uma criança de seis anos poderia terlhe dito que falharia. Ah, e que por falar nisso ele a estava deixando por uma moça mais jovem, mais bonita e que não era tão chata por se preocupar tanto com dinheiro. Claro, a outra mulher não tinha dois filhos para se preocupar, então era bem mais fácil. Lou perdera a casa e o marido num mesmo dia. Um golpe duplo enquanto o seu mundo se desmanchava. — Foi difícil — ela concordou, com um sorriso amargo. Houve uma pausa. Patrick precisava ajustar suas idéias sobre Lou. Ela sempre parecera tão fria e controlada, era difícil imaginá-la sendo passada para trás por um marido cafajeste, tendo que viver apertada. — Então, casar-se por dinheiro resolveria alguns de seus problemas? — disse ele, tentando suavizar a conversa, e Lou ficou feliz em seguir a conversa dele. — Bem, devo admitir que nunca pensei muito nisso como uma opção — disse ela, — mas acho que resolveria sim. Na verdade, acho que casar com você pode ser o que há! — Fico feliz em saber que sirvo para alguma coisa para você! — Quando se está na minha posição, não dá para se ter orgulho — disse Lou com franqueza. — Estou cansada de viver com migalhas e preocupar-me com dinheiro todo o tempo. E detesto não poder dar a Grace e Tom o tipo de vida que gostaria que eles tivessem. — Você disse que não queria dar-lhes coisas materiais — Patrick lembrou, e ela balançou a cabeça. 33


— Não quero mesmo. Eles não precisam de coisas, mas precisam de mais espaço, por exemplo. Se você visse onde vivemos agora... — Ela fez uma expressão de desgosto ao pensar no seu apartamento. — Sei que nossa situação é melhor do que a de muita gente, mas é um apartamento minúsculo para nós três. Grace e eu dividimos um quarto e o quarto de Tom é um pouco maior do que um armário. Se você quiser alguma privacidade, tem que ir para o banheiro, e mesmo assim tem sempre algum deles batendo na porta. — Lou suspirou. — É tão pequeno que estamos sempre um em cima do outro, e isso deixa todo mundo nervoso. Tenho certeza de que não brigaríamos tanto se tivéssemos mais espaço. Você tem uma casa grande, não tem? — Tenho três. — Então. Espaço suficiente para todos nós. E aposto que você não tem vizinhos passando por uma crise no casamento de um lado, enquanto aqueles do outro lado ligam a televisão alta às sete da manhã e não a desligam até bem depois da meia-noite. — Não sei a quantas anda o casamento dos meus vizinhos, ou os hábitos deles com a televisão, mas, certamente, não os ouço — Patrick concordou. — Imaginei que não. E você provavelmente não tem ninguém vivendo no andar de cima. — Não, tenho a casa toda para mim. — Lou suspirou de inveja. — Os nossos vizinhos de cima são perfeitamente agradáveis, mas cada passo reverbera pelo teto, e podemos ouvir tudo o que dizem. — Parece que o casamento comigo melhoraria suas possibilidades de acomodação — disse Patrick. — Oh, não se preocupe, eu ia querer o seu dinheiro também. Não seriam milhões, apenas o suficiente para poder fazer as coisas que poderia ter feito por eles se Lawrie tivesse ficado, e não tivesse perdido a casa. Adoraria estar numa posição em que pudesse apoiar os interesses deles, dar a eles a chance de desenvolver seus talentos, abrir-lhes os olhos para como as outras pessoas vivem... Gostaria muito de levá-los para fora do país nas férias. Grace tem amigos cujos pais os levaram para os Estados Unidos no verão passado. Eles ficaram uma semana na Flórida e uma semana em Nova York, onde ficaram num hotel elegante e foram até a Estátua da Liberdade numa lancha particular. Grace ficou com tanta inveja que quase não conseguiu falar com Alice e Harriet quando retornaram. Sei que ela adoraria férias como essas, mas tudo o que posso fazer é levá-los para ver minha tia em Yorkshire Dales. Não é nada empolgante para uma adolescente de 14 anos. 34


Não parecia nada empolgante para uma pessoa de 50 anos, Patrick pensou, e em seguida respirou fundo ao ver os garçons se aproximarem com os pratos principais. Eles tinham que passar por todo o ritual de novo, ambos os garçons voando baixo sobre Lou e competindo para encher o copo dela ou para expressar o desejo de que ela aproveitasse bem o jantar. E Lou apenas ficava ali, encorajando-os com aquele sorriso dela. Patrick assistiu-os debandar com uma expressão de desagrado. — Se as coisas estão tão difíceis assim, não seria mais intuito para você mudar para fora de Londres? — Sim, penso muito sobre isso — disse Lou ao pegar o garfo e a faca. — É o aluguel que é muito caro em qualquer lugar próximo a Londres. Adoraria viver no interior, e tenho certeza de que poderia encontrar algum trabalho, ainda que não seja tão fácil começar a viver em um novo lugar depois dos 40. — Então, por que você não faz isso? — Porque as crianças detestariam. Eles estudam em uma boa escola no centro de Londres. Londres é tudo o que eles sempre conheceram, eles são verdadeiros metropolitanos agora. Já é bastante ruim levá-los para Dales por uma semana. Eles andam de um lado para o outro de tanto que estão entediados. Tom não esquenta muito quando eu o levo para passear, mas Grace sente falta das amigas. — Você não pode organizar sua vida inteira ao redor de seus filhos — disse Patrick. Lou abaixou os talheres e olhou para ele, impressionada por sua falta de compreensão. — Mas é exatamente isso que tenho que fazer — ela o corrigiu. — Esse é o ponto de se ter filhos. Eles sempre vêm na frente. E o fato é que Grace e Tom ficariam péssimos vivendo no interior agora — ela continuou, pegando os talheres novamente. — Todos os amigos deles estão em Londres. E o lar deles. Eles estão acostumados a pegar o metrô e a saltar de ônibus. Não — disse ela; com ironia. — É uma escolha entre casar-me com você ou ganhar na loteria. Patrick estava gostando da nova tática de Lou. Não que ela tivesse verdadeira intenção de se casar, mas pelo menos sua franqueza sobre o dinheiro dele era uma mudança em relação aos protestos de amor e as conversas tediosas sobre o porquê dele não estar preparado para um compromisso. — Digamos então que eu me casasse com você — disse ele. — Como isso funcionaria? 35


— Seria um encontro de nossas duas fantasias — disse Lou, empolgada com a idéia. — Não teríamos que fingir amor, ou nada do tipo. Eu faria o papel da esposa responsável. Gerenciaria sua casa, apareceria nos compromissos de trabalho e lembraria você de telefonar para sua mãe, mas, além disso, você nem perceberia que estou lá. Você poderia ficar atrás de garotas o quanto quisesse que eu não ficaria nem um pouco enciumada. Apenas me despediria de você, dizendo para você se divertir, e lembrando-o para deixar seu cartão de credito! Ela riu do absurdo dessa idéia. Honestamente, ela devia ter bebido demais, mas estava num estado no qual não se importava muito com isso. Patrick tinha um pouco de dificuldade em separar as fantasias que eles discutiram e as fantasias que não discutiram. Certamente, Lou não estava falando das fantasias sobre a cinta-liga. Ele sabia, com toda a certeza, que ela fazia parte daquela. Esforçando-se, ele se lembrou que ela lhe contara mm fantasia. Algo sobre ter alguém para conversar, não era? Nada a ver com lingeries, isso era certo. — Então, o que eu precisaria fazer? — Lou estava se divertindo. — Ah, você só precisaria estar por perto de vez em quando para que eu pudesse falar de algumas coisas, mas nada que tomasse muito do seu tempo de sedução. E tudo o que eu queria mesmo seria cuidar da casa e a segurança de saber que não seria uma sem-teto de novo. — Isso significa que se isso não funcionasse e acabássemos nos divorciando eu teria que lhe dar minha casa? — Mas, se você tem três, você poderia abrir mão de uma — disse Lou.— Não parece muito justo, eu concordo. Ela pensou sobre o assunto, franzindo as sobrancelhas concentrada, enquanto bebia o vinho. — Tenho certeza de que poderíamos montar um contrato pré-nupcial. Do mesmo jeito que se faz em Hollywood. Apenas adicionaríamos uma cláusula dizendo que você teria que me dar algum dinheiro se algum dia enjoasse de mim — disse ela. — Mas por que você ia querer se divorciar de mim? — continuou ela. — Um casamento de conveniência resolveria todos os nossos problemas. Na verdade, nós dois conseguiríamos tudo o que queremos. — Certo — disse Patrick, com um sorriso despontando no canto da boca. — Lembre-me novamente onde nossas fantasias se encontram. — Eu quero segurança financeira. Você quer sexo sem compromisso. Honestamente, isso é ideal — disse Lou. — Saberíamos exatamente por onde passamos. Não haveria problemas de se apaixonar, ou nenhuma 36


dessas emoções perturbadoras de que você tem tanto medo. Não quero me envolver nem um pouco mais do que você quer. Patrick a estudou com interesse. Obviamente, ela bebera mais champanhe do que ele. Ele tinha a sensação de que ambos se arrependeriam daquela conversa de manhã, mas, por enquanto, ele estava achando tudo muito divertido. — Então você acha mesmo que é a esposa ideal para mim? — Acho — disse ela. — Estou lhe oferecendo um ótimo negócio! — E os dois adolescentes que vêm com você? — Sim, Grace e Tom viriam no pacote, entendo que eles poderiam ser uma desvantagem do seu ponto de vista — disse Lou, determinada a ser justa. — Mas você mesmo disse que a sua casa parece vazia às vezes, e eles a preencheriam sem problemas. Imagino que você tenha quartos para todos nós, correto? — Patrick fez um cálculo rápido. — Seis. — Seis? — Ela parou por um instante para pensar em quanto custaria uma casa de seis quartos em Chelsea. A resposta fez a cabeça dela embaralhar. — Que diabos estava fazendo quando comprou uma casa de seis quartos para morar sozinho? — Tinha uma boa garagem. — Ele pareceu muito sério. — Bem, chegou a hora de você preencher alguns desses quartos, se me pergunta — disse ela. — Parece excelente para nós. Haveria espaço suficiente para as crianças, e cada um pode ter um quarto, e ainda sobrariam dois para as visitas. — Ah, então você e eu não dividiríamos um quarto? — Os olhos negros dela encontraram os dele. — Não, enquanto você estiver dormindo por aí — disse ela. Ah. Nem tão embriagada, então, Patrick pensou. — Que esposa você seria... — ele fingiu resmungar. — Você não quer dormir comigo — disse Lou, — e eu certamente não quero dormir com você! E de nada valeram suas fantasias com a meia-calça e a cinta-liga dela. — Bem, isso parece claro o suficiente. — Patrick sabia que ela estava certa, mas não pôde impedir certa irritação na voz. Lou percebeu, e se deu conta de que aquilo não fora muito gentil. — Não quero dizer que você não seja atraente — ela tentou garantir a ele, mesmo com parte dela sem entender por que ela tentava inflar um ego 37


que já era grande o suficiente. — Na verdade, você é muito mais atraente do que eu pensei que fosse. Oh, Deus, ela bebera demais! Ela não queria ter dito aquilo. — Quando disse que não queria dormir com você, eu não quis dizer... pelo menos, eu quis dizer... Bem, só estava tentando dizer que não é que... Ela parou de repente. Aquela frase não ia a lugar algum, então era melhor desistir agora. — Sei o que quis dizer— disse Patrick, esforçando-se para manter o rosto direito. — Eu acho! Posso ver que isso seria um bom negócio para mim — disse ele. — Seria. — Ela olhou para ele, grata por ele a ter resgatado daquele buraco que ela cavara para si mesma. Ela pegou o copo. — Você deveria pensar sobre isso. Patrick olhou para ela, ruborizada e toda desalinhada. Ele quase não reconhecia sua assistente formal e respeitável. — Talvez sim. Lou olhou fixamente para o botão do elevador e tentou não balançar. Ela devia ter bebido mais do que pensara. — Eu normalmente não bebo tanto assim — disse ela a Patrick, com a sensação horrível de estar embolando as palavras. Ficar de pé foi mais difícil do que de costume, e a caminhada pelo lobby do hotel até os elevadores demandou muito mais concentração do que deveria. — Honestamente, ninguém teria adivinhado — disse ele e sorriu. — Talvez eu devesse levar você até seu quarto! Lou pensou em andar com ele pelo corredor escuro do hotel, pensou em dizer boa-noite. Com qualquer pessoa, ela não hesitaria em beijar no rosto para agradecer pelo jantar, mas Patrick não era qualquer pessoa. Ela não conseguia imaginar que pudesse dar-lhe um beijo. Será que isso era verdade? A mente dela imaginou isso muito bem. Com uma claridade estonteante. Lou se viu aproximar-se dele e beijar-lhe o rosto, sentindo o cheiro de pele masculina e camisa limpa. Ela viu o canto da boca dele se curvar naquele sorriso que ela notara a noite toda, quando ele se virou e seus lábios se encontraram. Ah, não... Lou ficou consternada ao descobrir que o seu subconsciente estivera trabalhando em cima disso o tempo todo. Evidentemente, seu subconsciente já tinha pensado exatamente como seria o beijo dele, já havia feito uns cálculos sobre como os ossos dela se derreteriam e os seus lábios se abririam pelo prazer do toque dele, então 38


estava tudo lá para ela imaginar, pronto, preparado. Ela poderia apertá-lo, enroscar os braços em seu corpo forte e em forma, e beijá-lo enquanto ele tirava a blusa dela e escorregava suas mãos pelo seu corpo e... Deus do céu, o que ela estava fazendo? Lou respirou fundo como se voltasse à superfície depois de um longo mergulho e tentou acalmar seu coração acelerado. De repente, seu corpo estava tremendo, sua boca seca, e parecia não haver oxigênio suficiente no ar. Ela estava com receio de olhar para Patrick, com medo de seus pensamentos estarem escritos por todo o seu rosto. Lou ficou ruborizada. Era isso. Ela nunca mais tocaria em álcool novamente. Onde estava o elevador? Por favor, apresse-se, Lou rezava. Como se percebesse a impaciência dela, Patrick se inclinou e apertou o botão novamente. Apesar de tudo, os olhos de Lou escorregaram para o lado, onde Patrick se encontrava, parecendo convencional e devastador em um terno, camisa azul e gravata azul-escura. A mera visão dele era suficiente para fazer os sentidos dela rangerem de desejo, e fazê-la tremer de vontade de pular em cima dele. E ela nem mesmo gostava desse homem! Ou pelo menos não gostava no início da noite. Lou respirou fundo e desejou que o elevador chegasse logo. Aquilo era terrível. Ela não se sentia como ela mesma. Apenas torcia para que esse sentimento passasse no momento em que a embriaguez diminuísse. O quanto antes ela caísse na cama — sozinha! — e tivesse uma boa noite de sono, melhor. Plim. Finalmente! Aporta do elevador se abriu e Patrick deixou que Lou entrasse primeiro. Ela passou por ele, com cuidado para não tocar nele, e se encostou no fundo do elevador, para não correr o risco de acidentalmente se esfregar nele. Do jeito que se sentia, ela começaria a pegar fogo, aí, sim, a coisa ficaria feia. — Que andar? — Patrick perguntou quando a porta se fechou. Oh, Deus, ela não podia responder perguntas que envolviam pensar! — Hã... quatro, eu acho. — Ele olhou para ela. — Você não parece estar muito certa. Você sabe o número do seu quarto? — Claro — disse Lou, confusa. — É... é... — Ela enfiou a mão na bolsa, atrás do cartão da porta, mas normalmente ele não continha o número do quarto. — Quatro zero sete — ela se lembrou, e Patrick olhou-a 39


com curiosidade enquanto apertava o botão 4, e 5 para o seu quarto. Claro que o elevador tinha que estar vazio, Lou pensou. Era tão pequeno assim na descida? Não havia mesmo espaço para duas pessoas, ela pensou, encolhendo a barriga para criar mais espaço entre eles. Patrick parecia estar muito perto, de fato. Como ela poderia evitar de agarrá-lo quando ele estava a apenas alguns centímetros de distância? Ela agarrou a bolsa contra o peito, para manter o controle. O silêncio parecia tocar um ritmo lento naquele espaço fechado e Lou olhava desesperadamente para os números acima da porta, enquanto eles subiam lentamente. Depois de conversar sem parar a noite toda, ela não conseguia pensar em uma só palavra para dizer, e foi um alívio enorme quando o elevador finalmente parou. — Hã... bem... obrigada pela noite agradável — disse ela quando a porta se abriu. — Até amanhã. Desviando-se de Patrick, ela saiu do elevador. Graças a Deus. Agora, tudo o que tinha a fazer era chegar no quarto, fechar a porta e torcer para que essa noite nunca tivesse acontecido. — Lou? Ela se virou e viu Patrick segurando a porta do elevador. — Esse é o segundo andar — ele explicou com ternura. Lou olhou à sua volta. Isso explicaria por que nada parecia familiar. — Oh. Sim. Que tolice a minha. Mortificada, ela voltou para o elevador. Ruborizada pelo furo. Excelente. Aqui estava ela, 45 anos, mãe responsável de dois filhos e assistente de primeira linha, agindo como uma pateta. — Aqui estamos, quarto andar — disse Patrick enquanto a porta do elevador se abria mais uma vez. — Tem certeza que não quer que eu a acompanhe até o seu quarto? Lou não conseguia olhar para ele, mas pôde perceber que ele estava sorrindo. — Não acho que isso seja necessário — disse ela, com toda a dignidade possível, o que não era muito. — Estou bem — disse ela e em seguida tropeçou no elevador, quase caindo de cara no chão. Ótimo. — Lou, você está bem? — Estou bem, bem. — Lou abriu um sorriso e arrumou a jaqueta. — Absolutamente bem. Um sorriso invadiu o rosto de Patrick, mas ela tinha que lhe dar crédito 40


por não rir em voz alta. — Bem, boa noite, então. — Ele soltou a porta e ela se fechou lentamente. — Boa noite — disse Lou bem a tempo, antes de Patrick desaparecer de vista. Levou séculos para ela conseguir abrir a porta com o cartão, mas finalmente conseguiu entrar, arrancou os sapatos e pulou na cama. Será que poderia ser apenas 11 da noite? Lou olhou no relógio. Ela levara apenas três horas para arruinar sua imagem, e provavelmente destruir sua carreira no processo. Ela escreveria uma carta de reclamação para o diretor da linha da Costa Leste, tão logo sua cabeça parasse de girar. Se eles não tivessem cancelado todos os trens por causa de uma chuvinha, ela estaria a salvo e sozinha em casa agora. Ela ainda estaria pensando em Patrick Farr como um homem de negócios arrogante com quem tinha que ter um relacionamento profissional frio e educado, mas em quem ela não tinha o menor interesse. Em vez disso, ela conversara com ele, ficara bêbada com ele e contara suas fantasias para ele, e agora ela gostava dele, droga. Ela não iria se prender pelo fato de achá-lo atraente. Isso estava definitivamente fora dos seus planos. Ela só desejava não ter feito papel de idiota na frente dele. Puxando o celular da bolsa, Lou ficou de bruços na cama. Ela precisava de conselho e Marisa nunca dormia antes da meia-noite. — Acho que acabei de pedir ao meu chefe para se casar comigo — disse ela quando Marisa atendeu o telefone. — Esse é o chefe que nunca pergunta sobre o seu fim de semana, é rude e arrogante e não parece nem um pouco com George Clooney, correto? — disse Marisa, que nunca se importara com telefonemas que começavam pelo meio de uma conversa. — Sim, exceto que eu não acho que ele é assim tão mau. — Lou rolou e olhou para o teto para se lembrar do rosto de Patrick e o olhar dele quando ela perguntou sobre sua fantasia. — Ele é legal quando você o conhece direito. — Legal não é o bastante para você se casar com ele — disse Marisa. — Você merece alguém que seja no mínimo fantástico. — Eu não quero me casar com ele — disse Lou, dando-se conta das implicações do que dissera para Patrick no restaurante. — Então, por que perguntou a ele se queria se casar com você? — 41


perguntou Marisa. — Na verdade eu não perguntei — Lou tentou explicar. — Ele estava falando sobre o tipo de esposa que queria, e eu disse que ele precisava de alguém como eu. — E como ele respondeu a isso? — Disse que pensaria no assunto. — Ele soa como um peixe frio — disse Marisa. — Mas acho que ele não é. Ele parece frio, mas na verdade acho que ele é muito... bem, quente... Houve uma pausa. — Você andou bebendo? — Um pouco. — Louisa Dennison, eu vou contar para os seus filhos! — Oh, não, por favor, não faça isso — ela implorou. — Eles nunca me deixarão esquecer! E por falar nisso, como eles estão? — Ela perguntou atrasada, sentindo-se como uma mãe horrível por não ter perguntado por eles antes. — Estão bem. Dormindo, e não mude de assunto — disse Marisa. — Quero saber o que está acontecendo entre você e Patrick Sei-lá-o-quê. — Não está acontecendo nada. Apenas jantamos juntos. — E tomaram um barril de vinho e falaram de casamento! Lou abaixou a cabeça ao lembrar. — O negócio é o seguinte: você acha que eu devo me desculpar amanhã quando encontrá-lo? — Se desculpar de quê? — Pela conversa de casamento. Eu posso ter ido longe demais. Eu disse que era a esposa perfeita para ele. — Mas, o mais importante, ele seria o marido perfeito para você? — Definitivamente, não — disse Lou. — Patrick gosta de suas mulheres uns bons 20 anos mais jovem, com corpos perfeitos e alergia a compromisso. — Ah, então ele é um homem! — Estou falando sério — disse Lou. — O meu emprego está em jogo. — Ele não vai despedir você por ficar um pouco bêbada no seu tempo livre — Marisa disse. — Você não o ofendeu, ofendeu? — Claro que não. 42


— Bem, então eu não me preocuparia com isso. Parece que ele também bebeu bastante, e se ele for como os homens que conheço, vem equipado com a habilidade de apagar qualquer conversa sobre casamento de sua memória. Ou ele vai ignorar essa conversa por completo, ou dizer que foi uma idéia genial e querer se casar mesmo com você. Lou ficou espantada por esse pensamento. — Eu não estava falando sério! Não tenho a menor intenção de me casar com ele. Uma vez foi o suficiente para mim! — Uma pena — disse Marisa. — Eu vi um chapéu maravilhoso outro dia. Seria perfeito para o seu casamento. — Compre-o e guarde-o para o casamento de Grace — disse Lou. — Ela se casará muito antes de mim! Marisa riu. — Veremos.

Capítulo 4 — Estava pensando se você gostaria de contratar uma assistente temporária — disse Lou, ao pegar o bloco de notas e levantar-se para sair. Patrick olhou por cima dos óculos, deixando de lado a carta que lia. — E por que diabos? — Tenho férias marcadas para o fim de maio. Eu lhe falei sobre isso — disse ela ao perceber que ele não concordaria. — Não me lembro — disse ele. — Tem que ser no fim de maio? Estaremos bastante ocupados nos preparando pura o contrato de Packenham. — Sim, tem que ser nessa data. É folga da escola, e eu preciso passar esse tempo com as crianças. E não comece com esse papo das crianças serem um prejuízo — Ela avisou antes que ele abrisse a boca. — Essa é a primeira vez que precisei de uma folga, e já está agendada desde o início do ano. Não acho que não seja razoável. Não era mesmo, mas Patrick não quis admitir. A verdade era que ele não gostava da idéia de Lou não estar por perto. Ele precisava dela para administrar o escritório. Ele não seria capaz de encontrar nada sem ela, ele se ocuparia demais e nada funcionaria direito. E ele já estava acostumado com ela. De uma maneira estranha. 43


Patrick ficou em dúvida se as coisas poderiam ter ficado esquisitas entre ele e Lou depois daquela noite em Newcastle, mas, apesar de nenhum dos dois ter mencionado a conversa daquela noite, de várias maneiras o clima entre eles estava muito melhor. Era difícil agir de forma fria, depois de conversar, rir e dividir suas fantasias... Ainda que nem todas, no caso de Patrick. Claro, Lou retomou sua personalidade correta e eficiente na manhã seguinte, mas Patrick não estava mais intimidado por ela. Ele a vira embriagada. Ele a vira tropeçar no elevador. Ela não podia enganá-lo mais. Ele sabia que ela não era a super-mulher fria que um dia aparentara. Agora que ele se permitira ver o brilho de humor seco no rosto dela, o seu sorriso caloroso, o tom irônico em sua voz. Diversas vezes, Patrick pegou-se a pensar sobre o contraste entre sua assistente prática e impessoal e a mulher calorosa e vibrante que ele pôde ver naquela mesa de restaurante. Eu seria a esposa perfeita para você, ela dissera. Era absurdo, lógico. Se ele estivesse pensando em se casar de novo, seria com uma mulher bonita, cheia de paixão e sexy: Ele, certamente, não se amarraria a uma mulher de meia-idade e mãe de dois filhos, não importava o quanto suas pernas fossem boas. E eram boas. Patrick sabia porque todas as vezes que ela entrava em seu escritório, ele olhava para elas e se lembrava de suas fantasias sobre a cinta-liga que ela poderia estar usando. As pernas dela eram ótimas, de luto. Ele não podia acreditar que não havia notado isso antes. Ele sabia que isso era patético. Ele sabia que isso era politicamente incorreto e profundamente inconveniente, e provavelmente pervertido, mas quando esse pensamento entrava em sua cabeça, era impossível parar' de pensar nisso. E Patrick tentava. A vida seria muito mais fácil se ele continuasse a pensar nas roupas dela como sendo modestas e sem graça, ao invés de sexy. Ele começou a pensar que seria mais fácil se Lou aparecesse para trabalhar de minissaia e blusinha. O tipo de coisa que Ariel usava, na verdade. Ele estava muito distraído, esse era o problema. Então decidiu parar de notar qualquer coisa. Afinal, ele não estava faminto por sexo. Ariel era muito mais bonita do que Lou. Tinha um corpo muito melhor, inclusive as pernas. E mais, Ariel ficava preocupada quando ele estava de mau humor. Ela não levantava uma sobrancelha irônica, como Lou. Ariel nunca o fazia se sentir um tolo. Ela nunca dizia nada comprometedor. Mas ela também nunca o fizera rir, ou deixava o escritório vazio quando ia embora no final da tarde. Agora Lou falava em se ausentar a semana inteira! 44


— Será uma inconveniência — ele resmungou. — É por isso que estou perguntando se você quer que eu arranje alguém para ficar no meu lugar — disse Lou. — Não será a mesma coisa — disse ele. — Não posso ficar explicando tudo de novo. — Bem, você pode atender os seus próprios telefonemas — disse Lou. — Ou tire folga você também. — O quê? — Tire a semana de folga, relaxe — disse ela. — Ou seria demais para você se divertir um pouco? — ela perguntou. — Sou perfeitamente capaz de me divertir — disse ele. Lou ficou em silêncio. Ela apenas levantou as sobrancelhas e abriu um sorriso forçado, daquela maneira irritante dela. — Tudo bem. — Irritado, Patrick tirou os óculos e os jogou na mesa. — Eu vou tirar folga também. Pode marcar tudo amanhã. Lou já estava em sua mesa quando Patrick chegou na manhã seguinte. O coração dela desenvolvera o hábito de acelerar na presença dele; pelo menos não dava para ver — pelo menos ela esperava que não. Ela se esforçava para manter sua expressão o mais indiferente possível. Foi um alívio enorme para ela encontrar Patrick no lobby na manhã seguinte à noite em que ela se fizera passar por idiota em Newcastle. Como Marisa previra, ele pareceu ter apagado o incidente da memória. — Como está a cabeça? — foi tudo o que ele disse. Lou fez uma cara feia. — Ruim — ela admitiu. — Eu também não me sinto tão bem, para dizer a verdade — disse Patrick. E foi isso. Nada mais fora dito, e, gradualmente, Lou começou a relaxar. Fora apenas uma noite boba. Patrick estava preparado para fingir que ela nunca acontecera, e para Lou isso estava bom. Tinha outras coisas com que se preocupar, como a determinação de Grace em colocar um piercing no nariz, e a briga de Tom com sua professora de inglês. Ela esqueceria tudo. Mas não era tão fácil assim esquecer. Lou estava consciente de Patrick como nunca antes. Fora horrível no trem. Sentada do lado oposto a ele no vagão de primeira classe na volta a Londres, ela não parava de olhar pura as mãos dele, para sua boca, o contorno do seu rosto, o movimento 45


de suas sobrancelhas. Patrick pegou-a olhando para ele, e o coração dela acelerou pelo entusiasmo nos olhos dele. Ruborizada, desviou o olhar e limpou a garganta, enquanto ele verificava alguns documentos. — Você queria os valores do orçamento do ano passado... Desde então, não tinha sido tão mau. Patrick não estava livre de defeitos, nos quais ela pudesse se concentrar, então Lou se forçou a lembrar de sua grosseria, em vez de sua boca, sua impaciência, em vez do brilho de seus olhos. Estava tudo bem. Lou decidira que já fizera papel de idiota o suficiente em Newcastle. Ela certamente não pioraria as coisas ficando obcecada com um chefe impiedoso, viciado em trabalho e que tinha fixação por mulheres mais jovens. Mesmo quando o coração dela acelerava um pouco ao vê-lo. Patrick parou na mesa dela no caminho para a sua sala. — Você pode me agendar umas férias quando acabar de fazer o que está fazendo — disse ele. Lou olhou para cima, pensou em perguntar se ele já tinha ouvido a expressão por favor e decidiu não perguntar quando viu o rosto dele. A maioria das pessoas ficava empolgada com a idéia de umas férias, mas, obviamente, Patrick Farr era diferente. — Você vai mesmo? — disse ela, um pouco surpresa. — A idéia foi sua — disse ele, um pouco rabugento. — Bom, eu tenho tendência a ter boas idéias — disse ela. Houve um breve silêncio enquanto a memória da idéia dela sobre o casamento pairou no ar entre eles. Patrick não precisava dizer nada. Lou sabia perfeitamente o que ele estava pensando. Ficou ruborizada, e se encolheu um pouco. — Às vezes — disse ela. Os olhos de Patrick brilharam. — Consiga passagens para as Maldivas e um hotel na semana em que você estiver fora. Lou levantou as sobrancelhas ao ouvir sua escolha, mas anotou. — Onde você quer ficar? — No melhor — disse ele, indiferente. Ele pegou um relatório da mesa dela e começou a folhear. — Reserve uma suíte, um chalé, ou o que houver por lá. 46


— Melhor em quê? Melhor lugar, melhor, comida, mais luxuoso? — Não sei. — Patrick gesticulou irritado. — O mais caro. — Certo. Imagino que você não viajará sozinho. — Não. — Ele fechou o relatório e jogou-o de volta na pilha. — Uma das passagens deve estar no nome de Ariel Harper. Ariel. Que charmoso, Lou pensou, mentalmente rangendo os dentes. Sem dúvida Haze, do Financeiro, seria capaz de conseguir uma foto, mas Lou podia apostar que Ariel era loura e etérea. Oh, e deveria ter uns 25 unos, no máximo. — Ponha na minha conta pessoal — disse Patrick, pronto para se virar quando notou a expressão de Lou. — O quê? — ele perguntou. — Nada, só estou surpresa pela sua escolha de destino — disse Lou. — Não consigo imaginar você numa praia por uma semana. Patrick também não conseguia. Ele ficava entediado em uma hora numa praia. Mas, incomodado pelo comentário de Lou sobre ele não saber relaxar e se divertir, ele perguntara a Ariel na noite passada se ela queria viajar com ele por uma semana. Ela adorou a idéia. As Maldivas foram idéia dela, e como Patrick não conseguia pensar em nada além disso, as Maldivas foram escolhidas. — Eu tenho gostos secretos — disse ele, fazendo Lou rir. Patrick desejou que ela não tivesse feito isso. Ele sempre ficava impressionado com a maneira como ela ficava quando ria, tão cheia de vida, tão diferente da assistente sisuda que ele meio que desejava que ainda fosse. — É bem longe para ir apenas por uma semana — disse ela. — Por que não fica duas semanas? Patrick pensou na semana na praia com a conversa de Ariel. Ela era muito bonita, mas falava muito. — Uma semana será o suficiente — disse ele. — E você só vai ficar fora uma semana. — Sim, mas isso é porque Tom e Grace têm que voltar para a escola na semana seguinte — disse ela. — E vamos apenas para Yorkshire Dales, o que é um pouco diferente de uma longa viagem para as Maldivas. Ele não queria lembrar a ela que só estava saindo de férias porque ela estava. Pareceria um tanto patético. — Por que Yorkshire? — ele perguntou. — Minha tia mora lá. Os meus pais morreram quando eu era muito 47


jovem, e desde então Fenny tem sido uma mãe para mim. Ela mora num vilarejo adorável, no meio do vale, e tem um jardim lindo. Não é bem o oceano Índico — disse ela, — mas é como se eu estivesse voltando para casa. Ficarei feliz passeando pelo jardim e forçando as crianças a caminhar pelos morros. E ela teve a cara-de-pau de sugerir que ele não gostaria de ficar à toa numa praia! — Se isso a deixa excitada — disse ele, e então desejou ter escolhido outra frase. Praticamente arrancando as cartas que Lou entregava para ele, foi em direção a sua sala, antes que ficasse distraído imaginando o que mais a deixava excitada. Lou levou grande parte da manhã pesquisando hotéis nas Maldivas. Ela escolheu um cujos preços fizeram seus olhos saltarem, e então reservou dois vôos de primeira classe, ida e volta, tentando não pensar sobre as passagens de trem que comprara com o seu cartão da ferrovia no dia anterior. Ela mal desligara o telefone para continuar com o seu trabalho quando uma garota distraída entrou em sua sala. Tinha um tipo longilíneo, e cabelos louros que indicavam que passava a vida toda ao sol, e chamava a atenção para eles o tempo todo, tirando-os do rosto. Como se isso já não bastasse, Lou notou que a pele dela brilhava, e que tinha enormes olhos azuis e um corpo perfeito, bem visível considerando que ela usava uma minissaia com um cinto quase tão grande quanto a saia, e um top leve que parecia consistir de alguns retalhos presos, que provavelmente tinham custado uma fortuna. Apenas o fato de estar numa mesma sala com ela fez com que Lou se desbotasse e ficasse cinza e parecesse uma senhora. — Posso lhe ajudar? Mais balanço de cabelos. — O Pat está? Pat? Levou um momento para Lou entender de quem ela estava falando. Pat? Pat parecia caloroso e aconchegante demais para Patrick. Ele não era um homem desse tipo. — Sinto muito, mas ele está numa reunião — disse Lou, tão educada quanto pôde. — Oh. — A garota fez um biquinho. — Preciso falar com ele sobre nossa viagem. — Você deve ser Ariel — disse Lou. Ela acertara em cheio em suas especulações. Ariel deveria ter pouco mais de 20 anos. Patrick deveria se envergonhar. — Estive fazendo as reservas de vocês hoje de manhã — 48


disse ela. Ariel olhou para ela sem interesse. — Ah, sim, Pat disse que pediria para a secretária arrumar tudo. Ah, é mesmo? Certamente ela não tinha nem um nome quando ele conversava com Ariel. Lou não pôde deixar de ficar magoada. — Bem, não se preocupe, está tudo arrumado — disse ela. E o cabelo voltou. — Espero que você tenha reservado o Kandarai Beach Hotel... — Não — disse Lou. — Não fui orientada para reservar esse. Reservei um hotel lindo na área, o mais luxuoso que encontrei. — Oh, mas eu queria ir para o Kandarai Beach! — O rostinho bonito de Ariel se desfez e por um momento ela pareceu muito com Grace à beira de um ataque. — Era sobre isso que eu queria conversar com o Pat. Estive falando com uma amiga. Ela disse que é fabuloso. Não achei que você fosse reservar tão rápido, mas você pode mudar, não pode? — Posso dizer isso a Patrick — disse Lou. Francamente, ela já estava de saco cheio de reservar férias de luxo nas Maldivas. — Dizer o quê? — perguntou Patrick. Ele olhou para Ariel, e franziu a testa, ainda que Ariel não notasse sua falta de empolgação pela aparição inesperada dela em seu escritório. — Oh, Pat, aí está você! — disse ela, voando no pescoço dele e beijando-o. Patrick não teve escolha senão beijá-la também, mas ao levantar a cabeça os olhos dele encontraram os olhos negros e irônicos de Lou, sobre os cabelos louros de Ariel. Ele fixou o olhar na expressão de Lou, mas ela apenas olhou para o teto, com toda a inocência. Irritado, ele deixou Ariel de lado. — Ariel, o que está fazendo aqui? Você sabe que eu não gosto de misturar trabalho com prazer. — Ah, seu! — Ariel fez uma cara de criança brava que deixou Lou enjoada. — Só estava empolgada com a nossa viagem, queria ter certeza que fosse tudo perfeito — disse ela. — Pat, ela reservou o hotel errado! — Você quer dizer, a Lou — disse Patrick. — O que seja. — Ariel gesticulou como se Lou não fosse importante. — Oh, Pat, por favor, por favor, por favor, diga a ela para reservar o Kandarai Beach! Eu ficaria tão feliz. — Ela agarrava o braço dele como uma menininha, olhando para ele com aqueles olhos azuis enormes. — Eu amarei você para sempre! 49


Ops, grande erro, Ariel, Lou pensou, uma testemunha relutante desse gesto. Nem mesmo Ariel poderia não ter visto a irritação no rosto de Patrick. Ele olhou para Lou, apelando. A única preocupação dele era de calar Ariel e removê-la do escritório. — Verei o que posso fazer — disse ela a ele, e ele relaxou um pouco. Aparentemente, Ariel não viu o olhar irritado dele. Ou então ela não se importava. — Oh, obrigada, obrigada, obrigada — disse ela a Patrick, ainda que não fosse ele quem passaria a tarde no telefone. Ariel estava extasiada. — Vamos almoçar e celebrar! — Não tenho tempo para almoçar hoje — disse Patrick. — Tenho uma reunião. Ariel balançou os cabelos. — Vejo você à noite, então — disse ela, fazendo biquinho. Patrick fingiu não ver. — Eu lhe telefono — disse ele. — Agora, sinto muito, Ariel, mas estou muito ocupado. Lou não sabia se estava feliz por ver Ariel ir embora ou revoltada pela forma passiva como a garota aceitou a maneira como foi tratada por Patrick. Ariel parecia perfeitamente feliz, como deveria, pois estava ganhando uma semana num hotel nas Maldivas de graça. Na porta, ela se virou, balançou mais uma vez suas madeixas e soprou um beijo para Patrick. — Divirta-se! — disse ela, e saiu. Patrick olhou nos olhos de Lou. — Não diga uma palavra — ele avisou. Lou permaneceu com uma expressão inocente. — Nem em sonho — disse ela, e pegou um arquivo. — Aqui estão os valores que você queria. — Obrigado. Ela não pôde resistir. — Sabe, isso soaria tão mais sincero se você repelisse três vezes e prometesse me amar para sempre — disse ela com doçura, quando ele chegou na porta de sua sala. Patrick virou-se para olhar para ela, mas Lou apenas riu, e soprou-lhe um beijo, imitando Ariel. — Divirta-se! — Ela sorriu, e teve a satisfação de fazer Patrick entrar 50


em sua sala e bater a porta. Ela ficou menos empolgada quando Ariel começou a ligar todos os dias, tendo decidido que Lou era sua agente de viagens particular. Depois de vários telefonemas e muita conversa, Lou finalmente conseguiu reservar uma suíte no Kandarai Beach Hotel, mas isso não foi suficiente para Ariel. Acabou que ela não queria uma suíte, ela queria um daqueles chalés luxuosos construídos sobre a água, então Lou teve que rearranjar tudo de novo. E, então, Ariel quis partir um dia depois para que pudesse ir numa festa, e logo que Lou conseguiu isso, ela queria mudar a passagem de novo, para que pudesse voltar via Mombasa. Um dia depois, ela precisava que Lou descobrisse se o hotel tinha leite de soja, pois ela era alérgica a leite de vaca. Quando chegou a folga da escola das crianças, a mandíbula de Lou estava doendo, de tanto ranger os dentes. Ariel não se importava em lembrar o nome dela, mas estava sempre no telefone arrumando coisas para ela fazer. Hazel, do Financeiro, disse que Ariel era uma modelo. Lou não ficou surpresa. Ariel tinha mesmo a aparência necessária. E a personalidade também. Lou sabia que não estava sendo justa, e que, provavelmente, havia várias modelos legais por aí, mas Ariel preenchia bem o estereótipo de uma mulher mimada e manipuladora, constantemente necessitada de atenção. Lou não conseguia imaginar sobre o que Patrick conseguia conversar com ela. Mas, também, eles não deviam conversar muito, Lou pensou, sentindo uma tristeza. Fazia tanto tempo que não dormia com alguém que quase não se lembrava de como era. Ela já estava certa de que não se lembrava mais como fazer. Na maior parte do tempo, ela aceitava a ausência de conforto físico pelo preço de se recusar a se envolver emocionalmente, e como não conseguia dormir com um homem a menos que o amasse, e ela não arriscaria a dor que acompanhava o amor, parecia que tinha mesmo que aceitar isso. Era melhor cuidar do jardim, disse Lou a si mesma. Ela poderia não passar uma semana de romance no oceano Índico, mas teria uma semana de jardinagem pela frente, e ficaria muito feliz com isso. Era um alívio deixar Ariel e suas exigências para trás quando partiram para Yorkshire, mas Lou não pôde deixar de comparar sua viagem de trem, lotado, com o vôo de primeira classe de Patrick. Ficou feliz ao lembrar que, apesar de estar cercado de luxo, ele ainda teria Ariel falando em seus ouvidos sem parar. E, então, ela olhou para Grace, sentada no banco à frente, com uma 51


expressão de insatisfação, e para Tom, grudado em seu Game Boy, e suspirou para si mesma. Patrick também não ficaria com inveja das companhias de viagem dela. Fenny os encontrou na estação em Skipton e levou-os para casa de carro. Aquilo acabou sendo uma experiência e tanto, pois sua tia Fenny nunca fora uma boa motorista, mas logo que Lou desceu do carro e respirou fundo, saboreando o ar puro das montanhas, sentiu-se melhor. Até as crianças ficaram mais alegres. Eles podiam resmungar e reclamar quando a conversa era ir para o interior, mas amavam Fenny. Sim, fora uma boa idéia ter vindo para cá, Lou pensou. Ela não ficaria pensando nas contas que deviam ser pagas. Ela não ficaria pensando no trabalho. Não pensaria em nada. E também não pensaria em Patrick. Mas, de vez em quando, durante a semana, Lou se encontrou pensando no oceano Índico. Ela arrancava ervas daninhas do jardim de Fenny, e de repente pensava no que Patrick poderia estar fazendo. Ele estava caminhando por uma praia cercada de palmeiras, de mãos dadas com Ariel? Eles estavam brincando nas águas verdes de uma lagoa? Provavelmente, não, Lou decidiu. Ela não conseguia imaginar Patrick brincando. Ou eles simplesmente passaram a semana na cama? — Você parece muito distraída, Lou — disse Fenny. Ela trouxera duas xícaras de chá, e elas se sentaram lado a lado no degrau da porta. — Perdão, foi sem querer — disse Lou, cheia de culpa. — É que tenho umas coisas na cabeça neste momento. — Que tipo de coisas? Patrick na cama, seu corpo nu e bronzeado num lençol branco. — Ah, você sabe... as coisas de sempre. Contas para pagar, sapatos para comprar para as crianças. — Ela sorriu, mas não funcionou. — Ajudaria se eles parassem de crescer! — Achei que pudesse ser um homem — disse Fenny. Desde quando sua tia era telepática? — Ah, Fenny, estou velha demais para essas coisas! — Conversa fiada! Você nunca é velha demais para essas coisas! — Ela suspirou. — Fico torcendo para você me dizer que vai se casar novamente — ela admitiu. — Seria uma pena se aquele Lawrence afastasse você dos homens. Eles não são todos irresponsáveis e cafajestes, sabia? Fenny nunca gostara de Lawrie, e o sentimento era mútuo. 52


— Seria tão mais fácil para você se tivesse um marido. Alguém para lhe ajudar. É muito difícil cuidar de tudo sozinha. Lou não pôde deixar de pensar sobre a fantasia que confessara para Patrick. — Parece uma boa idéia Fenny — disse ela. — Mas não é tão fácil encontrar um homem que queira fazer isso. — Eu sei. — Fenny a olhou de lado. — Só pensei que você já tivesse encontrado alguém assim. Tem algo diferente em você — disse ela. Por alguma razão, Lou pensou em Patrick, e sentiu o rosto ruborizar. — Não, não há ninguém. Ninguém desse tipo, pelo menos. Ela já estava sob controle quando retornou ao trabalho na segundafeira. Ela estava de pé em frente a sua mesa, olhando para a pilha de mensagens, quando Patrick entrou, e ainda que o seu coração acelerasse como de costume, Lou ficou orgulhosa por poder sorrir de maneira descompromissada para ele. — Olá — disse ela, como se não tivesse passado a maior parte do tempo em sua folga imaginando Patrick esticado na cama, seu corpo em forma e bronzeado, e com um sorriso preguiçoso no rosto. Patrick parou ao vê-la, arrumada como sempre. Ela vestia uma saia reta cinza e camisa rosa-clara, com um toque de pérolas no pescoço. Não era um conjunto excitante, mas depois de uma semana vendo mulheres de biquíni, ou shorts e vestidos reveladores, Lou parecia descontraída e com classe. — Oh — disse ele. — É você. — Lou levantou as sobrancelhas. — É o meu escritório — disse ela. — Você não deveria estar tão surpreso de me encontrar aqui. — Achei que você ainda não tivesse chegado — disse Patrick, detestando a maneira como ela o fazia parecer um idiota, às vezes. — Eu também não esperava ver você. Ninguém sabia dos horários de vôo dele melhor do que Lou, que teve que trocá-los tantas vezes. Ele não voltara até tarde da noite de ontem. — Você teve um bom descanso? — Não — disse Patrick, e foi para sua sala, fechando a porta. — Tive uma ótima semana também, obrigada — disse Lou para a porta fechada. — Muito gentil de sua parte perguntar! 53


Em sua mesa, Patrick ligou o computador com uma expressão severa. Foi uma longa semana e ele estava feliz de estar de volta ao escritório e longe de Ariel, que enxergou o convite para passar a semana com ele como sinal de compromisso da parte dele. Possessiva e fingindo timidez ao tentar seduzi-lo, ela simplesmente ignorou as tentativas dele de explicar que não havia a possibilidade de um relacionamento a longo prazo, e muito menos de casamento. Patrick se arrependeu de tê-la convidado. Ele fizera isso apenas para provar algo para Lou, e nem ao menos se lembrava o que prometera. Tudo o que sabia era que isso, de alguma maneira, era culpa de Lou. Durante as tardes ele sentara e assistira o sol se pôr no oceano Índico num espetáculo de cores, e sem a menor explicação sua mente era transportada para Yorkshire Dales. Enquanto o vento quente soprava nas palmeiras, Patrick pensava em ar fresco e montanhas verdes. Ele imaginara Lou sentada conversando num jardim perfumado, enquanto escurecia, num entardecer típico inglês, e ficara alarmado por isso ter significado tanto para ele. Havia algo de errado com ele, Patrick concluiu. Lá estava ele, numa linda praia tropical, num luxo inimaginável, ótimo serviço. Com ele, uma garota que fazia com que todos os homens na ilha o olhassem com inveja. Ariel era maravilhosa. Linda, sexy, a pele brilhante, um corpo fantástico e pernas enormes, ela era a fantasia de qualquer homem. Então, por que ele estava ali sentado pensando numa mulher de meiaidade com rugas em volta dos olhos? Lou tinha as pernas bonitas, mas não era o personagem da fantasia de ninguém, era? Patrick apenas desejava uma dose da ironia fria dela, em vez da conversa fiada de Ariel, desejava também suas respostas irônicas, o brilho de humor no seu olhar e a forma direta como ela olhava nos olhos dele, em vez de evitá-lo numa falsa timidez, como fazia Ariel. E então ele se lembrou de como Lou estava calorosa e cheia de vida naquela noite em Newcastle, como ela removera aquela barreira em volta dela e o deixara ver a mulher sensual que era, e desejou poder vê-la daquela maneira mais uma vez. Ele pensou sobre o que ela sugerira naquela noite. E pensou muito. Patrick se jogou em sua cadeira e ficou girando exasperado. Ele detestava se sentir assim, irritado e incerto sobre as coisas. Ele não era ele mesmo. Veja como ele se comportara agora. Ele estivera pensando em Lou, e quando entrou no escritório e a viu, o coração dele perdeu o compasso. Ela sorriu, mas fora apenas um sorriso educado, e então ela levantou a sobrancelha e ele se sentiu como um idiota. Era óbvio, que ela não estava 54


morrendo de felicidade por vê-lo, e Patrick ficara tão desapontado que apenas resmungou e entrou em sua sala. Ele teria que se desculpar. Mas se ao menos ela não o deixasse tão desconcertado. Patrick batia com os dedos na mesa, imaginando como dizer o que queria. — Sinto muito por ter sido tão tempestuoso quando cheguei — disse ele quando ela entrou em sua sala e eles resolveram um assunto urgente. — Tudo bem — disse Lou. — Sinto muito por você não ter aproveitado o descanso. Houve algum problema com o hotel? — Não. — O clima estava bom? — Perfeito, e, antes de você perguntar, os vôos foram pontuais e todos os seus arranjos funcionaram perfeitamente. — Ele hesitou. — Como foi o seu descanso? — Bem, os trens atrasaram e o clima estava horrível, mas foi tudo bem e tia Fenny é uma ótima cozinheira, então foi muito relaxante. Era o que eu precisava. — Bom — disse Patrick, mas ele sabia que soava um tanto quanto rabugento. Obviamente, ela não sentira falta dele. Ela se divertira bastante com a tia e com os filhos. Aquilo pareceu ser o fim da interrogação sobre a semana de descanso. Lou pegou o bloco de notas e a caneta e levantouse. — Não vá — disse Patrick. — Quero falar com você. Sentando-se de volta, Lou abriu o bloco de notas mais uma vez e empunhou a caneta. — Você não precisará anotar nada — disse ele, desconcertado pela atitude profissional dela. Ele estava fazendo tudo errado, ele pensou. Ele deveria ter esperado até o final da tarde e a convidado para uma bebida, mas era tarde demais para isso agora. Ele deveria resolver isso agora, já que chegara tão longe. — Isso é pessoal — ele explicou. — Oh? — Lou abaixou a caneta e olhou para ele um tanto preocupada. Patrick não sabia como agir. Levantou-se e andou de' um lado para o outro da sala, com as mãos nos bolsos e a testa franzida. — Estive pensando no que você falou — disse ele finalmente ao parar próximo à janela. — O que eu falei? Quando? 55


— Naquela noite em Newcastle. — Ele se virou e olhou para ela. Lou ficou ruborizada. Patrick tinha que trazer isso à tona? Logo agora que ela já havia relaxado e pensava que aquele incidente estava esquecido. — Eu não deveria levar a sério nada que disse naquela noite — ela tentou fazer uma piada da situação. — Bebi champanhe demais. — Você disse que eu deveria pensar em casar com você — disse Patrick. — Foi nisso que estive pensando. Acho que você estava certa. Acho que devíamos nos casar. Capítulo 5 Lou olhou para ele. — Eu não estava falando sério! — Eu sei, mas quanto mais penso sobre isso, mais lógico me parece. Lógico...? — Espere aí — disse Lou. — Isso é uma piada? — Se você tivesse a semana que tive, saberia que não estou com humor para piadas — disse Patrick. — Foi um erro levar Ariel para a viagem, agora eu vejo. Ela ficou achando que eu queria compromisso. E você não me' disse que as Maldivas eram repletas de casais em lua-de-mel — disse ele. — Não sou responsável por você não saber algo que qualquer pessoa que já viu um catálogo de viagens sabe — disse Lou. Patrick olhou-a malhumorado. — Foi um desastre. Ariel passou o tempo todo tentando faturar um anel de noivado. Eu disse a ela que aquilo não ia acontecer, mas não pude impedi-la de ter conversinhas sobre casamentos com moças recémcasadas, e pegar dicas sobre vestidos e decoração e o que o padrinho deve usar — disse ele. — Eu voltei para casa sabendo que nunca mais entraria numa situação como essa. Concluí que a única maneira de convencer as garotas de que um relacionamento comigo não envolve compromisso é mostrando que já sou casado. — Lou quase não acreditou no que ouvia. — Você não acha que está levando sua fantasia de sexo sem compromisso longe demais? — ela perguntou. — Por quê? Faria sentido, não faria? — Ela balançou a cabeça, descrente. — Por que você ia querer se envolver com uma mulher disposta a 56


dormir com um homem casado? — Mas essa é a idéia — disse Patrick. — Eu não quero me envolver. Não estou interessado em nada além de relacionamento físico. Eu sempre deixo isso claro, mas talvez elas acreditassem se soubessem que tenho uma esposa. — Existe uma coisa chamada divórcio, você sabe — disse Lou, irritada. — Como vai impedir que essas pobres moças acreditem que você se apaixonará por elas e largará sua esposa? Patrick pensou por um momento. — Digo que assinei um contrato pré-nupcial e que minha esposa leva 70 por cento dos meus bens no caso de um divórcio. Lou olhou para ele. — Valeria a pena casar com você dessa maneira! — disse ela, ainda achando que ele estava brincando. — Estou falando sério — disse Patrick. Ele se sentou de frente para ela e fechou as mãos em cima da mesa. — Ofereço a você uma chance e tanto de nunca mais ter que se preocupar com dinheiro. Tudo o que peço em retorno é que você seja uma esposa visível e que me ajude a entreter meus parceiros de negócios... minha mãe e minha irmã — ele completou. — E verdade que você não é absolutamente ideal — ele continuou, aparentemente sem perceber a expressão de revolta em Lou. — Você não é o tipo de esposa com que sonhei — ele admitiu, — e é uma pena que tenha filhos. Não me vejo como um padrasto, mas espero que possamos chegar a uma solução. Existem colégios internos, ele pensou. — Não vejo por que precisamos ter tanta coisa em comum — disse Patrick. — Então, ainda que você não seja exatamente o que eu quero, você tem outras vantagens, especialmente seu conhecimento dos negócios, como você mesma disse. E sendo mais velha, você é madura o suficiente para entender que o casamento seria um acordo prático entre ambos os lados. E, claro, você tem mais incentivos do que a maioria — ele terminou. — Você precisa de dinheiro. — Nem tanto assim — disse Lou. Agora ela sabia como Elizabeth Bennett se sentira quando o Sr. Darcy insultou sua família e os seus contatos e em seguida a pediu em casamento, ela se levantou. — Aonde você vai? — perguntou Patrick. — De volta ao trabalho. — Mas e a minha proposta? — Oh, isso foi uma proposta! — disse Lou com sarcasmo na voz. — 57


Não me dei conta de que isso requeria uma resposta. — Claro que quero uma resposta — disse Patrick. O que ela estava pensando, que ele estava de conversa fiada? — Oh, ok. — Lou inclinou a cabeça fingindo pensar por um breve período de tempo. — Não. — Não? — Ele estava revoltado. — Não — ela repetiu. — Essa proposta foi horrível! Não há a menor chance de eu me casar com você, Patrick. É melhor você encontrar alguém para resolver seu problema de compromisso, pois certamente esse alguém não serei eu! Patrick também ficou de pé. — Espere aí, a idéia foi sua — disse ele com raiva. — Não consigo acreditar que você me levou a sério — disse Lou, com tanta raiva quanto ele. Na verdade com mais raiva ainda, quanto mais ela pensava sobre isso. — Eu estava entornando champanhe a noite toda, pelo amor de Deus! Claro que eu não estava falando sério. — Você foi muito persuasiva! — Eu certamente não teria sido se soubesse que você usaria essa piada para me insultar! — Acabei de lhe pedir em casamento — disse Patrick, menos nervoso. — Como você chama isso de insulto? — Que tipo de mulher você pensa que eu sou? — ela perguntou, furiosa. — Você acha mesmo que eu me casaria com um homem que não amo, de quem nem ao menos gosto um pouco, apenas pelo seu dinheiro? Um homem que me diz na cara que não pode ser incomodado pelos meus filhos, um homem que nem ao menos me quer ou me acha atraente, e pensa que estou desesperada o suficiente para concordar com isso? Tenho que lhe dizer, Patrick, que acho isso um insulto muito grande — disse ela. — Digo, já ouvi propostas insensíveis antes, mas a sua foi campeã. — O que eu deveria ter feito, cair de joelhos e criar uma ceninha romântica? Não me diga que você esperava que lhe dissesse que a amo? Lou respirou fundo. — Eu esperava que você me tratasse com algum respeito — disse ela. — Eu estava sendo honesto! — ele protestou. — Oh, sim, você foi honesto mesmo. Você foi muito claro. Você acha que pode me comprar assim como compra todas as mulheres na sua vida. Bem, posso não ter muito dinheiro, mas não estou à venda! 58


Patrick se esforçou para controlar a raiva, sem muito sucesso. — Ouça, era você quem estava toda cheia de si, dizendo como seria uma ótima esposa e como seria bom se se casasse comigo. Seria sua fantasia, você mesma disse. — Posso lhe assegurar que uma proposta como essa nunca fez parte de uma fantasia minha — disse Lou, com a voz fria. — Eu já fui informada por um marido que não era a esposa que ele queria — disse ela. — Não preciso de um outro pensando a mesma coisa. E se você pensa que vou expor os meus filhos a um tipo de homem que trata mulheres jovens como objetos, e mulheres de meia-idade como tendo suas datas de validade vencidas, está muito enganado! Sua mãe está certa — ela continuou, consumida pela dor e pela raiva, sem se preocupar com o emprego. — Você é egoísta. Pensa que só porque é rico pode ter o que quiser, e nunca dar nada em troca. Bem, sinto muito, mas essa não é uma lição que eu quero ensinar para os meus filhos. Eles já quase não têm bons exemplos, e eu certamente não os presentearei com um exemplo de egoísmo tão monumental! — Eu nunca sugeri não lhe dar algo em troca — Patrick rebateu. — Eu propus lhe dar muito dinheiro, se você se lembra. — Não estou falando de dinheiro — disse Lou. — Estou falando de sentimentos! — Oh, sentimentos! — ele debochou. — Sim, aquelas coisas que apenas o resto das pessoas tem, e você não. Você fala tanto sobre como as suas namoradas perturbam você com essa história de casamento, mas você já pensou em como elas se sentem ao estar com você e ter as emoções delas jogadas em suas caras o tempo todo? — Ouça, ninguém as força a nada. Se elas não querem sair comigo, elas podem dizer não. — Sim, bom, estou dizendo não também — disse Lou. — Quero que meus filhos acreditem que é possível para dois adultos viverem num relacionamento cheio de amor. Eles não são estúpidos. Eles não achariam convincente se vissem você por aí com as suas menininhas e eu em casa sendo tratada como uma empregada, e você voltando para casa quando quisesse. — Você deveria pensar um pouco sobre expor os seus filhos às realidades da vida — disse ele. — Todas essas idéias românticas não servirão para muita coisa quando eles saírem para esse mundo grande e mau e se derem conta de que nada é de graça. Se você quer alguma coisa, tem que trabalhar por ela, de um jeito ou de outro. Por que o casamento deveria ser diferente? 59


— Porque, se não for diferente, então não faz sentido se casar! — Lou explodiu. — O foco não deveria ser quem leva o quê, e sim compartilhar. As lágrimas eram eminentes e ela se virou para a porta. — Sinto muito se deixei uma impressão equivocada em Newcastle. Estava torcendo para você esquecer aquela conversa. Eu, certamente, tentarei esquecer essa — disse ela. — Se é isso que você quer — disse Patrick. — Eu trarei aquelas cartas para você assinar assim que estiverem prontas — disse Lou ao sair, fechando a porta cuidadosamente. Patrick não conseguia acreditar que ela dissera não e saíra daquela maneira. Ele não imaginava que ela o recusaria. Ele era Patrick Farr, e sempre conseguia o que queria. Até agora. Como Lou tivera a coragem de falar com ele daquela maneira? Ele oferecera a ela a solução para todos os seus problemas, e ele seria generoso. Será que ela tinha noção do que estava perdendo? Bem, se ela não queria se casar com ele, tudo bem, ele disse a si mesmo. Isso era, provavelmente, uma boa coisa. Ele poderia ter passado sem os últimos minutos humilhantes, mas viveria perfeitamente feliz como antes. Não fora ele quem perdera a chance de sua vida. Oh, não, não seria ele quem se arrependeria. — Mãe, preciso de tênis novos — disse Tom para Lou quando ela o pegou à noite. Lou ficou arrasada. Tom estava crescendo tão rápido. Ele parecia precisar de tênis novos a cada dois meses, e eles eram tão caros. Eles tinham que ser da marca certa, do modelo certo e na cor certa. Nos tempos dela, havia apenas tênis simples, de lona e borracha. O que será que acontecera com eles? — Compraremos um par nesse fim de semana — ela prometeu. — Legal. A gente pode ir à cidade, onde o Charlie comprou o dele? Charlie era o melhor amigo de Tom e um rival em tudo. Ele era um menino bom, mas Lou às vezes desejava que seus pais não o mimassem tanto. Mas, então, ela se sentia culpada por pensar assim. Se ela pudesse, provavelmente faria o mesmo por Tom. — Charlie vai para um curso de esportes muito legal no verão — Tom disse a ela, com sua mochila nas costas. — É um lugar onde as pessoas vão por duas semanas, e lá tem treinadores especiais e você experimenta um monte de esportes novos. Posso ir? 60


Lou olhou para o rosto dele e o seu coração doeu. A única coisa que Tom gostava mais do que esportes eram carros, e, felizmente, ele era jovem demais para satisfazer esse gosto. Ele aproveitaria muito um curso de esportes como esse, mas com certeza sairia muito caro. — Veremos, Tom — disse ela, e o rosto dele se apagou. — Não é justo — disse ele, raspando os sapatos no pavimento. — Sempre que você diz veremos significa não. Eu sou tão bom no futebol quanto Charlie, mas ele vai ter treinamento especial e eu ficarei para trás. Provavelmente, nem entrarei no time no próximo ano — disse ele amargurado. O pior estava por vir quando Grace se aproximou, ela sempre fora uma criança instável, mudando de humor de repente. Quando estava feliz, era uma companhia maravilhosa, mas ela podia transformar a vida de qualquer um em um tormento de uma hora para outra, o que ela fazia com muito mais freqüência ao se tornar adolescente, ainda que houvesse momentos em que Lou reconhecesse a criança encantadora que ela fora quando pequena. — Mãe, olha! — disse ela sem fôlego, balançando um pedaço de papel. — Vai ter uma viagem para uma estação de esqui no ano que vem. Por favor, diz que eu posso ir! — Esquiar? — O rosto de Tom se acendeu. — Posso ir? Quero tentar snowboarding. — Não é para sua turma, seu bobão — disse Grace, arrancando o papel de perto dele. — O que você acha, mãe? — ela perguntou. — Posso ir? A cabeça de Lou estava doendo de tensão depois da discussão com Patrick, e quando chegou em casa, encontrou três contas e uma carta do banco sugerindo que ela marcasse uma visita ao seu gerente. — Posso ver o que diz aí? Grace entregou o pedaço de papel com relutância. Ela estava empolgada demais para ficar parada e pulava de um lado para o outro perto da mesa da cozinha. — Emily foi no ano passado, e adorou. Eles ficaram num chalé de madeira e saíam todas as noites. A neve estava dessa altura. — Ela apontou para o próprio ombro. Lou ouviu Grace, e tentava se concentrar nos detalhes que a escola enviara. Ela fixou o olhar no preço da viagem. Como suspeitava, não podia fazer nem o depósito. Ela mordeu o lábio inferior. Grace estava tão animada, ela não podia suportar desapontá-la. E Tom merecia uma chance naquele curso de 61


esportes. Ela teria que ver se Lawrie ajudaria. Talvez ele tivesse algum dinheiro. Era impossível saber ao certo. — Deixe-me falar com seu pai — disse ela. — Ah, mãe, ele não vai fazer nada — disse Grace. — Ele disse que nos levaria para a Grécia nesse verão, mas então comprou aquele carro esporte estúpido, e agora diz que está sem dinheiro para viajar. — É um carro legal — disse Tom. — É um Audi Quatro coupé. Tem até placa personalizada. Lou queria gritar. Um carro esporte! Por que Lawrie não conseguia pensar em seus filhos primeiro? Ah, haveria alguma desculpa esfarrapada. Ele explicaria muito pacientemente que precisava daquele carro para projetar a imagem certa da sua nova companhia, uma companhia que, sem dúvida, acabaria como as outras pelas quais ele se interessara. — Mãe, o papai não vai ajudar — disse Grace. — Ele nunca ajuda. Ele vai dizer que ajudará, mas nunca ajuda. Isso resumia bem Lawrie. Lou odiava aquele olhar em sua filha. Não havia nada que ela pudesse fazer em relação ao relacionamento de Lawrie com os filhos, mas ela queria que ele entendesse o quanto eles se machucavam cada vez que ele os deixava para trás. Grace e Tom amavam o pai, mas aprenderam a não depender dele. Lou sabia como era isso. Ela suspirou. — Verei o que posso fazer. — Era tudo o que podia prometer a Grace, já debruçada na mesa da cozinha saiu sem a menor animação. Lawrie não era um homem mau. Ele não era malicioso nem tinha o objetivo de ferir ninguém. Era inteligente e engraçado, e charmoso quando preciso, mas não pensava muito nas conseqüências e visava apenas seu lado das coisas. Lou não se importava mais com isso, apenas quando dizia respeito às crianças. Não era a vida que ela queria para os seus filhos. Ela tentara por tanto tempo protegê-los das atitudes irresponsáveis de seu pai, mas a realidade era que Lawrie decidiu deixá-los. Ele escolhera uma nova família, e não havia nada que ela pudesse fazer para mudar aquela situação para eles. Eles perderam o pai e a casa, e não fora fácil para nenhum deles. Lou estava fazendo o melhor que podia. Ela os amava incondicionalmente, confortava-os quando eles estavam tristes, alimentava-os, cuidava deles e os encorajava, e lhes dava a segurança e a estabilidade que eles não sabiam que precisavam. Ela foi cuidadosa em nunca falar mal de Lawrie na frente deles, ainda que fosse muito difícil resistir. Era Lou quem telefonava 62


para ele para lembrá-lo que era aniversário deles, era ela quem sugeria maneiras como ele podia se encontrar com Tom, e quem os fazia telefonar para ele regularmente. E ela tentava diverti-los ao máximo, mesmo que na maioria das vezes estivesse cansada demais do trabalho. Lawrie era bom em diversão, mas ele não estava sempre lá. Lou sofria por eles às vezes. Como agora, ao saber que provavelmente os desapontaria. Ela faria qualquer coisa para tornar as coisas diferentes para eles. Pronta para deixar de lado o papel que Grace trouxera, Lou parou. Qualquer coisa? Inclusive casar-se com Patrick Farr? Ela olhou para o papel mais uma vez. Onde mais ela poderia encontrar o dinheiro extra que precisava para mandar Grace para suas férias? E se Grace fosse esquiar, Tom poderia ir para o seu curso de esportes... Na mesa da cozinha, Grace desabara numa posição familiar, apoiada em um braço, com os cabelos negros e encaracolados caídos sobre o rosto. Do outro lado, Tom jogara sua mochila no chão, e estava agachado tirando canetas e pedaços de papel de dentro da mochila. Provavelmente, não procurando o dever de casa, a julgar pelo seu entusiasmo. Enquanto olhava para eles, Lou sentiu um amor tão intenso lhe apertar o peito, que era quase doloroso. Era fácil dizer — eu faço qualquer coisa pelos meus filhos, — mas ela estava mesmo preparada para isso? Pensativa, ela abriu a geladeira e pegou alguns tomates. Macarrão de novo. Era barato, divertido e nutritivo, mas às vezes ela ficava enjoada de cozinhá-lo. Ela recolheu a bagunça de Tom e tirou a cesta de roupas do banquinho para que pudesse pegar o óleo no armário. Isso era outra característica desse apartamento. Não havia espaço para nada. Se ela se casasse com Patrick, haveria espaço suficiente para eles se espalharem. Ela pensou nos seis quartos da casa dele. Talvez, se eles não vivessem amontoados assim, não se irritariam tanto. Lá fora era uma linda noite de verão, mas era difícil ver dali, pois estavam cercados de casas atrás. Os quintais nessa área eram escuros e sombrios, mas pelo menos, se você tivesse um, dava para sair de casa e olhar para o céu. Patrick provavelmente tinha um jardim, Lou pensou. Ela poderia cultivar ervas frescas, e quando fizesse um macarrão como esse, ela poderia ir até o jardim e colher os condimentos. Ela poderia ter as ervas em suas mãos e sentir o aroma da grama e o sol em seu rosto. Tudo o que precisava fazer era se casar com Patrick. 63


Lou umedeceu os lábios com nervosismo. — Posso ter uma palavra com você? Patrick estivera em reuniões a maior parte do dia, o que era um alívio. O clima naquela manhã tinha sido inevitavelmente frio, mas Lou estava determinada a não perder o controle. Tomada a decisão, ela não tivera a chance de tocar no assunto até que Patrick voltasse às cinco da tarde, o que significava que ela passara o dia inteiro indecisa sobre o que dizer. Intimidada pelo ar frio e reservado dele, Lou entregou-lhe suas mensagens e fez seu pedido. Era agora ou nunca. Ela não podia passar mais uma noite como a noite passada, remoendo-se em agonia sobre a indecisão. Patrick olhou direto para ela pela primeira vez naquele dia. — Uma palavra? — Bem, algumas palavras. — Lou respirou fundo. — Eu... eu queria me desculpar pela forma como reagi ontem — disse ela. — Você fez uma oferta justa. Eu apenas... não esperava por isso, e reagi exageradamente. Sinto muito. Algo mudou na expressão de Patrick. — Sou eu quem deveria estar pedindo desculpas — disse ele. — Eu não me expressei bem. Mais tarde, quando pensei sobre o assunto, não fiquei surpreso por você ter se irritado. Então, sinto muito também. — É que... — Lou parou, sem saber como perguntar se a oferta ainda estava de pé. Ela não poderia culpá-lo se tivesse mudado de idéia depois do escândalo que ela armara. — Olha, por que não começamos de novo? — disse Patrick. — Mas vamos a um lugar onde possamos conversar melhor, longe do escritório. — Ele olhou para o relógio. — Você precisa sair para apanhar as crianças, ou pode sair para uma bebida? Grace ia para a casa de uma amiga para fazer o dever de casa e Tom tinha futebol. — Uma bebida seria bom — disse Lou, agradecida. Tinha a sensação de que precisaria. Patrick olhou rapidamente suas mensagens. Tudo isso pode esperar até amanhã. — Vamos agora. Lou estava muito consciente dele enquanto desciam de elevador. Ele parecia reservado, o que era justo, depois da forma como ela falara com ele ontem, mas não estava com raiva, como ela esperava. Ela não tinha 64


certeza sobre o que diria. Parecia uma tarefa complicada pedir a ele que se casasse com ela — ainda mais sem o benefício de um barril de champanhe. Patrick levou-a para um pub não muito longe do rio. Para a alegria de Lou, havia um pequeno jardim na parte de trás, com duas árvores e uns arbustos, e alguns gerânios em vasos. Eles chegaram antes da hora do rush e conseguiram uma mesa. — Você, sente-se aí e guarde o lugar — disse Patrick, impedindo Lou de tentar pegar as bebidas. Fechando os olhos e virando o rosto para o sol, Lou sentiu um pouco da tensão se esvair de seu corpo. Era bom estar ao ar livre, mesmo num jardim de um pub lotado, e com o tráfego intenso na frente do prédio. Claro, ela se sentiria ainda melhor se não tivesse que pedir a seu chefe que se casasse com ela quando ele voltasse do bar. — Aí está. — Os olhos dela se abriram quando Patrick pôs as bebidas em cima da mesa e se sentou de frente para ela. Ele deixara o paletó no escritório e estava apenas de camisa, com as mangas enroladas. A visão dele provocava em Lou um frio na barriga e era difícil saber se era causado por seus nervos ou por uma atração muito mais primitiva. De qualquer maneira, ela estava quase paralisada pela timidez, e bebia o seu gim-tônica nervosamente, tentando, com desespero, pensar numa maneira de começar. Ela não conseguia. Não havia como perguntar a Patrick, com calma, se ela podia mudar de idéia sobre o casamento, depois de tudo o que dissera sobre não ser o tipo de mulher que se casa por dinheiro. De jeito nenhum. Ela devia estar louca por ter pensado nisso. Ela fingiria que queria falar sobre suas horas extras, Lou decidiu. Mas, então, ela se lembrou do rosto de Grace, aceso pela empolgação ao pensar na viagem de férias, por ir a um lugar diferente, fazer coisas diferentes e conhecer pessoas diferentes. E se lembrou da forma como Tom reagiu quando ela disse "Veremos". Ela pensou no apartamento apertado onde, às vezes, era difícil até respirar, e onde os vizinhos discutiam aos gritos fazendo com que Tom e Grace soubessem mais do que deveriam sobre os detalhes íntimos da vida de casado. O silêncio se estendeu de maneira desconfortável. Os olhos de Lou passearam desesperadamente pelo jardim, mas ela estava muito consciente da presença de Patrick na frente dela. Patrick também estava nervoso, ela percebeu. Isso deu a ela a autoconfiança necessária para começar a falar. 65


— Estive pensando... — Ela começou no momento exato em que Patrick dizia: — Eu não deveria dizer isso, mas... — Ambos pararam, sentindo-se como idiotas. — Você primeiro — disse ele. Lou ajeitou os ombros e respirou fundo. — Vá em frente. — Olha, você foi honesto comigo ontem, então também serei honesta hoje. Fiquei furiosa quando você me fez aquela proposta, mas pensei muito sobre isso ontem e estive conjeturando.... bem, se está tarde demais para mudar de idéia. Pronto, feito. Patrick passara a noite passada tentando se convencer que escapara dessa com sorte. A idéia era ridícula, e se ele não tivesse tido uma semana tão horrível nas Maldivas, nem teria considerado idéia. E se Lou tivesse aceitado? Ele estaria encalhado com dois adolescentes e uma esposa de meia-idade. Loucura. Então o alívio que ele sentiu ao ouvir as palavras dela não fizeram muito sentido. Ele ainda estava machucado pela humilhação da rejeição dela — um homem de quem nem ao menos gosto, ela dissera a ele — e cheio de culpa pela maneira como ele lidou com tudo aquilo. Ele machucara Lou também, e isso não era um sentimento bom. Ele bebia sua cerveja vagarosamente. — O que fez você mudar de idéia? — Dinheiro — disse Lou. Ela contou sobre a viagem à estação de esqui e o curso de esportes de Tom. — Estou cansada de batalhar e ainda assim desapontar as crianças. Ontem você me ofereceu uma chance de mudar isso. Ela hesitou. — Eu sei que falei muito sobre não ser o tipo de pessoa que se casa por dinheiro, mas talvez eu seja. Talvez tenha que ser. Tentei me casar por amor e não funcionou, então, talvez dessa vez eu deva pensar em me casar por uma razão diferente, pelos meus filhos. Essa pode ser a coisa certa a fazer. — Você não parece tão convencida — disse Patrick. — Não estou completamente convencida — Lou admitiu. — Era sobre isso que eu queria conversar com você. Queria perguntar se posso pensar um pouco sobre isso. Não posso decidir nada até que Tom e Grace conheçam você, e você os conheça. — Ela abriu um sorriso fraco. — Talvez você mude de idéia! 66


A expressão de Patrick era impossível de decifrar, mas pelo menos ele não estava gritando com ela, ou se comportando da maneira como ela se comportou quando ele lhe fazia a proposta. Lou continuou: — Estive pensando se poderíamos manter nossas opções em aberto — ela disse. — Talvez possamos almoçar juntos, e então veríamos se o casamento ainda pode funcionar. Talvez decidamos esquecer essa idéia por completo, ou talvez cheguemos à conclusão de que isso pode mesmo funcionar. De qualquer maneira, poderíamos conversar sobre o que ambos esperamos de um casamento como esse. — Isso faz sentido — disse Patrick. Muito mais sentido do que despejar uma proposta sobre ela e esperar uma resposta imediata. Era o que ele deveria ter sugerido a princípio. — Tudo bem, façamos então dessa maneira. Pela primeira vez, um sorriso apareceu em seus lábios. — O que você vai fazer nesse fim de semana? Por que não traz os seus filhos para um almoço no domingo? Isso daria a você, pelo menos, a chance de ver onde você poderá viver. — Ele hesitou. — Devo dizer que não tenho a menor experiência em entreter crianças dessa idade, mas tenho uma piscina, se eles gostarem de nadar. Quando o domingo chegou, Lou já havia tentado se convencer a desistir da idéia de casamento tantas vezes que ela sabia mais o que pensava. Mas era tarde demais para desistir do almoço, então todos iriam. Ela achava que ao ver Patrick com as crianças ela saberia o que fazer. Era difícil imaginar que eles pudessem se dar bem. Patrick não tinha interesse em crianças, e Grace e Tom deixariam muito claro se não gostassem dele. Lou previu um almoço desastroso. Bem, se fosse um desastre, sua decisão estaria tomada, ela pensou. Ela apenas diria a Patrick que o casamento não funcionaria, e encontraria outra maneira de mandar Grace para o passeio de esqui. E Tom, de alguma maneira, também faria seu curso de esportes. Ela faria isso. Amanhã. Mas ela tentaria a opção de Patrick primeiro.

Capítulo 6 Patrick vivia em uma rua tranqüila no Chelsea, que cheirava a dinheiro. Lou sentiu como se, em algum lugar entre o metrô e o lugar onde estavam, eles tivessem entrado num universo paralelo que não tinha a menor relação com a rua movimentada de Tooting, onde moravam. Ela 67


sabia que Patrick era rico, claro, mas essa era a primeira vez que ela ficava frente a frente com a realidade da diferença entre a vida dele e a dela. Era muito desconfortável. Essa rua era povoada por pessoas diferentes, e os três não pertenciam a ela. Fora um erro ter vindo. Lou fizera o melhor possível para manter as crianças apresentáveis, mas não tinha certeza se Patrick apreciaria as correntes enormes em volta da cintura de Grace ou as enormes botas dela. O cabelo encaracolado que ela herdara do pai, estava uma bagunça. Os dedos do Lou coçaram para passar um pente nos cabelos da filha, mas ela se recusara. Estava passando por uma fase gótica, e achava que já estava fazendo muito em não usar batom preto. Tom era menos preocupado com estilo, mas nem um pouco mais bem-arrumado. Ele era um daqueles garotos que você arrumava todo para sair de casa e, quando chegava na esquina, já estava uma bagunça. Hoje, ele calçava tênis velhos, calça jeans surrada e uma camiseta que estava limpa antes de sair de casa, e que adquirira uma marca de sujeira misteriosa ao longo do caminho, provavelmente quando bagunçava na escada rolante do metrô. Só a promessa de um mergulho em uma piscina particular pôde convencer as crianças a participar de um almoço entediante, mas eles estavam visivelmente impressionados por todo o luxo que emanava das casas naquele local. Não havia casas amontoadas por lá. Nem casas divididas em apartamentos, nem lojas, nem companhias de táxi. Cada casa ficava em seu próprio terreno, parcialmente escondida por cercas vivas, de modo que apenas se via o luxo através das grades dos portões. Os passos de Tom se desaceleravam a cada vez que passavam por um portão, enquanto ele tentava ver carros estacionados nas garagens. — Uau, olha isso! — ele dizia, oferecendo comentários sobre os carros à mostra. — BMW... Mercedes.. Mercedes... Rolls Royce... Porsche... Jaguar... — O seu chefe deve ser podre de rico se ele mora aqui — disse Grace. Lou não respondeu. Ela se sentia levemente enjoada, e seus nervos estavam à flor da pele. Não era nada demais querer segurança financeira, mas esse tipo de riqueza era obscena. Ela não podia se casar com Patrick. Isso nunca funcionaria. Ela era velha demais para bancar a Cinderela. — É essa? — Grace parou e olhou para uma casa um pouco afastada da rua. Lou pegou o endereço e checou o número. — 33... sim, parece que é essa. — Ela respirou fundo no olhar para a casa. — Deus do céu. 68


Juntando-se a sua filha próximo ao portão de ferro, ela olhou pela grade para uma casa enorme e charmosa, com janelas grandes, fachada de reboco creme suavizada por trepadeiras maravilhosas. Um caminho de cascalhos levava até a enorme porta da frente, e o jardim fora plantado de modo a manter certa privacidade, para cobrir a vista da casa. Tom se aproximou, e os três ficaram ali parados, olhando para a casa, como prisioneiros olhando o mundo por trás das grades. — Mãe... — Tom respirou maravilhado. — Mãe, aquele é o carro dele? Lou nem tinha notado o carro parado em frente à casa. — Hã... talvez. Eu não sei — disse ela, nervosa. — Como entramos? — disse Grace. Havia um interfone no poste enorme do portão. Lou apertou o botão, quase esperando que um respeitável mordomo atendesse. Ou um segurança musculoso, com um Rottweiler raivoso. Mas foi a voz de Patrick que se ouviu no interfone. — Sou eu — disse ela com a voz fraca. — Lou. Estamos aqui. — Ótimo — disse ele. — Entrem. Os enormes portões se abriram, e eles entraram, nervosos ao perceber quão rápido os portões se fechavam atrás deles. — É como estar em uma prisão — Grace sussurrou enquanto se aproximavam da porta da frente. A frente deles, a porta se abriu e Patrick apareceu de repente, de calça esporte e uma camisa azul aberta no colarinho, mas parecendo formidável como sempre, apesar das roupas informais. Por alguma razão, Lou não conseguia respirar direito. — Olá — disse ela com uma voz alta e estridente. — Olá. Fico feliz por terem vindo. — Para o incômodo dela, Patrick estava exatamente como sempre. Ele não deveria estar nervoso por estar conhecendo os filhos dela? Mas, não. Estava da mesma maneira de sempre, um tanto brusco e direto ao ponto. Limpando a garganta, Lou pôs um braço em volta de Grace. — Essa é minha filha, Grace. — Patrick e Grace se entreolharam. A princípio, tudo o que Patrick viu foi uma jovem menina com os cabelos bagunçados e vestida em estilo gótico, mas quando olhou bem, ele pôde ver que tinha um rosto encantador, um queixo empinado e os olhos negros da mãe. Da parte de Grace, ela viu um homem alto vestido com roupas bregas 69


e convencionais, mas ela não pôde deixar de se impressionar por ele, como gostaria. Havia algo de firme nele, uma frieza nos olhos que indicava que ele não aceitava abuso de ninguém. E ele não tentava impressioná-la, o que ela gostou muito. — Olá, Grace — disse ele. — Oi — disse ela. Lou soltou a respiração. — E esse... Ela parou, dando-se conta de que Tom não estava mais seu lado. Ao virar-se, ela viu, para seu espanto, que seu filho tinha gravitado em direção ao carro e estava com o nariz espremido contra a janela do motorista, com as mãos sujas na pintura imaculada do carro, sem se importar com as apresentações que aconteciam próximo aporta. — Tom! — disse ela, horrorizada. — O que você pensa que está fazendo? Venha aqui, agora. Tom nem mesmo se virou para olhar. — Mãe, você sabe o que é isso? — disse ele. — É um Porsche 911 Turbo duplo! — Deixe isso aí e venha conhecer Patrick. Agora, Tom. Tom olhou para trás. — Mas, mãe, você não entende! Este é o melhor carro do mundo! Lou olhou desconcertada para Patrick. — Sinto muito, Patrick. Ele adora carros. — Estou vendo. — Patrick foi ao encontro de Tom, surpreso mas feliz por descobrir alguém que como ele adorava carros, mesmo sendo o filho de 11 anos de Lou. Ele amava aquele carro, mas nunca encontrara alguém que entendesse quão belo era aquele Porsche. As mulheres simplesmente não entendem. Elas podem gostar da idéia de um carro esporte, mas, segundo a experiência de Patrick, não fazem idéia do que fazia aquele carro tão especial. Ele já desistira de conversar com elas sobre carros. Ele tinha certeza de que se perguntasse a Lou de que tipo de carro ela gostava, ela responderia com algo irritante como "Um que anda" ou "Um vermelho", como suas irmãs faziam. — Você está certo — disse ele a Tom. — É mesmo o melhor do mundo. Quer sentar no banco do motorista? Os olhos de Tom brilharam. 70


— Eu posso? Patrick pegou a chave no bolso e apertou um botão que fez com que a capota abaixasse enquanto Tom abria a porta do motorista. Maravilhado por ter a chance de mostrar seu carro a alguém que sabia como apreciá-lo, Patrick entrou ao lado dele. Lou e Grace ficaram paradas perto da porta, e ouviam, enquanto os dois conversavam empolgados sobre aerofólios, rotações por minuto e caixas de marcha de seis velocidades. Lou olhou para Grace e Grace olhou para Lou. — Nós nunca almoçaremos agora — Grace suspirou. — Você conhece Tom. Lou aproximou-se do carro. — Nós entraremos e ficaremos à vontade, está bem? — disse ela brincando. A pausa que ocorreu deixou claro que Patrick havia esquecido que deixara as duas esperando. — Oh, sim, sim... se você não se importar — disse ele, desviando sua atenção do painel do carro com dificuldade. — Vou só mostrar o motor para o Tom. Só um minuto... Obviamente, seria um minuto muito longo. Lou e Grace deixaram os dois no carro. Do lado de dentro, havia um corredor vasto com uma escada grandiosa para o andar de cima e várias portas. Lou morria de vontade de explorar a casa, mas não queria parecer intrometida, então seguiram a luz pela casa até a parte de trás onde havia um salão com teto de vidro, onde estava a piscina. — Uau — disse Grace. —É Uma porta de vidro abria-se em um terraço que parecia sair direto de uma revista de decoração. Grace sentou-se à mesa embaixo de um guarda-sol charmosíssimo creme e tentava desesperadamente não parecer tão impressionada, enquanto Lou andava pelo jardim, agitada demais para ficar parada. O jardim era desenhado num tema verde e branco. Elegante, Lou pensou, mas faltava um pouco de vida. Pessoalmente, ela gostava de um pouco mais de cor e caos num jardim. Ela estava observando algumas flores, distraída — flores brancas, é claro, — quando Patrick e Tom apareceram, já bastante próximos, sem se preocupar com as apresentações. — Sinto muito. — Pelo menos Patrick teve o tato de parecer um tanto envergonhado de ter demorado tanto com Tom. — Nós nos empolgamos. 71


O rosto de Tom estava radiante, sem a menor vergonha. — Você devia ir olhar, mãe — disse ele. — É um carro de sonho! Patrick deixou que eu brincasse com as marchas. São seis, e tração nas quatro rodas, e adivinha a velocidade máxima? — Muito rápido, imagino. — Trezentos quilômetros por hora! — Muito prático — disse Lou, pensando na utilidade dessa velocidade, quando o limite é de 110 quilômetros por hora. Grace também não se impressionou, pois já ouvira o irmão falar durante horas sobre carros. — Ele vai de zero a l00km/h em 4,2s — disse ele a sua mãe, ignorando a irmã. — E quando você corre, o aerofólio se dobra, aumentando a estabilidade. — Aerofólio? É mesmo? — Lou não tinha a menor idéia do que o seu filho estava falando, mas adorava olhar para o rosto dele quando ele se acendia de tanto entusiasmo. — Muito bom. Patrick sorriu. — Quer apostar como sua mãe nem sabe o que é um aerofólio, Tom? — É tipo uma asa, mãe — Tom explicou. — Meio de cabeça para baixo. Ele dobra para manter o carro estável em alta velocidade. Patrick me mostrou. É o oposto do que acontece nos aviões, não é, Patrick? Diz a ela. — Tom está certo. Aviões têm asas desenhadas para poder levantar do chão — disse Patrick. — Num carro de alta performance, a asa, ao contrário, é para mantê-los firmes no chão. Eles geram uma força tão grande que você poderia dirigir um carro de Fórmula 1 de cabeça para baixo num teto a 320km/h. — Tom balançou a cabeça concordando. — Consegue imaginar? — francamente, Lou não conseguia. Por que alguém iria querer dirigir de cabeça para baixo? — Uau — disse ela, e em seguida viu os olhos de Patrick. Ele estava sorrindo, e parecia mais relaxado do que ela já o vira, e se sentiu oca por dentro. — Eu não sabia que você era assim tão fissurado por carros — disse ela, tentando encobrir o descompasso de seu coração. — Minha mãe sempre reclamou que carros eram minha única paixão — disse Patrick. — Suponho que eles requerem menos de você do que as mulheres — disse Lou. — Exatamente. Mas não é sempre que encontro alguém que goste de 72


carros como eu. Tom sabe muito sobre carros — disse ele, parecendo genuinamente impressionado, e Lou ficou muito feliz em ouvir isso. — Ele puxou ao pai dele. Lawrie também é louco por carros. — Espere só até eu contar para ele que estive em um Porsche 911! — disse Tom. — Ele vai ficar com inveja! — Com muito mais inveja do que ficará quando ouvir que ela estava pensando em se casar de novo, Lou não pode deixar de pensar. — Que tal uma bebida? — disse Patrick. — E em seguida podemos almoçar. É tudo frio, então é só colocar na mesa. — Você ficou se matando na cozinha a semana inteira? — Minha empregada ficou — ele admitiu. — Ela deixou tudo pronto para mim ontem. Eles comeram na cozinha, um salão claro e ensolarado que dava para o terraço. Patrick disse que a sala de jantar estava muito sombria. — Eu só uso para jantares formais. A empregada não morava ali, ele disse a eles, mas viera no sábado especialmente para preparar o almoço. — Deve ser um pouco solitário ficar nessa casa sozinho, não é mesmo? — disse Lou, olhando à sua volta e calculando que o apartamento deles caberia dentro da cozinha de Patrick. — De vez em quando — disse Patrick. — Eu saio bastante. Ah, sim, com aquelas lourinhas pernudas. Isso não era um assunto que Lou levantaria na frente das crianças. Felizmente, Grace mudou a conversa, perguntando a Patrick se ele já fora esquiar. — Eu vi aquelas fotos de montanhas no seu banheiro — ela explicou, e em seguida começou a contar para ele com entusiasmo sobre a viagem que gostaria de fazer, e sua pose gótica foi praticamente esquecida. — Eu queria ir também — disse Tom. — Charlie já fez snowboarding. Ele disse que é muito legal. — Parece uma ótima maneira para começar — disse Patrick para Grace. — Quando você vai? O rosto de Grace se fechou quando ela lembrou. — Talvez eu não vá — ela balbuciou. — É muito caro. Mas mamãe vai ver o que pode fazer. Patrick olhou para Lou, que cruzou olhares com ele por um momento, antes de desviar o olhar. 73


— Pode me passar um pouco mais desse salmão delicioso? — disse ela. Então era por isso que ela mudara de idéia, ele pensou, passando o prato para ela. O casamento com ele parecia ser a única maneira de mandar Grace para a viagem que ela tanto queria. Não era como se ele não soubesse que ela só considerara se casar com ele por dinheiro, Patrick lembrou n si mesmo. Ninguém podia dizer que ela não tinha sido honesta com ele. E era isso o que ele queria, também. Ele não queria uma esposa que se casasse por amor. Isso acabaria em lágrimas, da mesma maneira que todos os seus outros relacionamentos acabaram. Ele queria que fosse diferente com Lou. Havia algo desconhecido nela hoje. Patrick não conseguia descobrir o que era, até que se deu conta que era a primeira vez que ele a via sem um daqueles terninhos que ela vestia para o trabalho. Em vez disso, Lou usava calças de linho e uma blusinha de seda, com braceletes e brincos de prata. Ela estava vestida informalmente, mas com elegância. As crianças quiseram entrar na piscina depois do almoço. Os olhos de Lou seguiram Patrick enquanto ele levava as crianças para mostrar onde podiam se trocar. Era muito estranho ver os três juntos. Estranho, também, era lembrar como ela ficara nervosa ao pensar se eles se dariam bem. Eles pareciam bem, Lou pensou. E lá se foi aquela desculpa para não se casar com ele. E agora que o vira com as crianças, ela não tinha certeza se queria uma desculpa. Quando Patrick voltou, ela juntava as louças do almoço. — Deixe isso aí — disse ele. — Vá sentar lá no jardim. Vou lhe levar um café. Sem dúvida, era bom ter alguém que cuidasse dela. Lou protestou, mas Patrick insistiu, e no final ela foi para o terraço como ele havia proposto. Ela parou por um momento para olhar as crianças brincando animadas na piscina, e então sentou à mesa e suspirou. A temperatura estava perfeita debaixo do guarda-sol, com uma brisa suave balançando a folhagem. Seria fácil se acostumar com tudo isso aqui. Perigosamente fácil. — O que você achou do jardim? — perguntou Patrick, colocando a bandeja de café em cima da mesa. — É adorável — disse Lou. — Fico feliz que você tenha gostado — disse ele. — Gastei uma fortuna para tê-lo redesenhado há uns dois anos. — Dá para ver — disse Lou. 74


— Ai — disse Patrick. — Esta não era a idéia. — Não, honestamente, é lindo — disse ela, tentando se explicar. — É apenas perfeito demais para mim, só isso. — Perfeito demais? Esta é nova. — Bem, dá para ver que é um jardim planejado. Ele não cresceu gradualmente. Não é cheio de mudas que o vizinho lhe deu, ou de plantas que se fixaram lá e são tão determinadas a florescer que você não tem coragem de arrancá-las, mesmo se elas não combinam com nada. Lou apontou para o jardim. — Não há campânulas crescendo por toda parte porque você as plantou há alguns anos sem pensar e agora estão fora de controle. — Uma criminosa terrível no jardim, Fenny sempre dizia sobre as campânulas. — Só acho que ele não parece um jardim adorado — ela terminou de dizer. Patrick olhou para ela com curiosidade. Ela estava sempre surpreendendo-o ultimamente, — Achei que você fosse gostar de tudo arrumadinho e organizado, da maneira como você mantém as coisas no escritório. — Não. — Havia um vaso de lavanda branca próximo a ela, e Lou puxou um galho. — Gosto de ordem na minha vida, mas não nos meus jardins. — Levantando a inflorescência até o nariz, ela sentiu o aroma maravilhoso de lavanda. — O meu jardim perfeito seria todo misturado e colorido, com plantas surgindo de todas as partes, e com um aroma forte numa noite de verão... — Ela suspirou. — e de dia... — Você é uma romântica — Patrick descobriu, encantado. — Nunca achei que você fosse do tipo! O rosto de Lou se apagou quando ela pensou em Lawrie. — Eu foi romântica, agora não sou mais. As pessoas tendem a perder a fé em romances depois que se divorciam. — O que aconteceu? — Patrick perguntou, e em seguida fez uma pausa. — Perdão, isso não é da minha conta. — Não, tudo bem. — Ele contara a ela o porquê de seu casamento com Catriona ter acabado, afinal de contas. "E se vamos nos casar, isso é da sua conta sim." Lou tomou um gole de café, e olhou para os raios de sol penetrando através dos galhos das árvores. — Nem tudo foi um desastre. Por um bom tempo, fomos muito felizes. Eu era feliz, pelo menos. — Ela suspirou. — Eu era muito romântica naquela época. Pensava que se duas pessoas se amassem, nada poderia dar errado, e eu amava muito Lawrie. Eu o amei desde a primeira vez que 75


o vi. — Amor à primeira vista? — Patrick parecia descrente. Lou não ficou surpresa. Patrick nunca seria um homem do tipo que se apaixonaria à primeira vista. — Eu também não acreditava — disse ela. — Até que aconteceu comigo. Um olhar e eu estava perdida. Eu nunca havia encontrado alguém como Lawrie antes. Ele era tão bonito e engraçado, e seu charme transbordava por todos os poros. Eu nunca pensei que ele fosse olhar para uma menina boazinha e racional como eu. Ele me fez sentir. .. maravilhosa... viva... excitante. Ele me fez sentir como se eu não fosse uma menina boazinha e racional. Os olhos dela estavam brilhando pelas memórias, seu rosto suave e caloroso, e ela sorria ao lembrar-se desse fase de sua vida. Ao vê-la dessa maneira, Patrick sentiu algo revirar dentro de si. Será que ele já fizera uma mulher brilhar apenas ao pensar nele? — Claro, se eu tivesse sido uma menina racional, nunca teria me casado com ele — dizia Lou. — Estar com Lawrie era como andar numa montanha-russa. Num minuto você estava se divertindo muito, e no outro estava em desespero. Ele não telefonava, não aparecia quando dizia que apareceria, ele me adorava em um minuto, e no outro dava em cima de outra garota... Ela enrugou a testa ao lembrar desses maus momentos. — Fenny dizia que eu estava louca por querer me casar com ele, mas eu estava cega de paixão. Não que eu não pudesse ver os defeitos dele, mas nenhum deles importava quando apenas estar ao lado dele já era suficiente para me dar as maiores sensações. — Então, o que mudou? — Patrick perguntou. Ele estava começando a se arrepender de ter perguntado. — Eu mudei. Foi tudo muito bom até o nascimento de Grace, mas é preciso mudar a maneira de pensar se tem um bebê para cuidar. Não há como ser irresponsável e livre. Bebês não precisam de emoção e romance, eles precisam de segurança e rotina, e Lawrie não era bom em nenhuma das duas coisas. Ele não gostava de ficar amarrado à responsabilidade, e eu não gostava de não poder contar com ele quando precisava. Quando era só eu, ainda dava para agüentar — disse ela. — A irresponsabilidade dele era parte de seu charme, eu acho, mas o que o fazia divertido e imprevisível como amante não era tão agradável nele como pai. Tantas vezes as crianças esperaram por ele quando ele dizia que vinha e nunca aparecia, ou esperavam por uma promessa dele e ele nunca cumpria. — Terrível para as crianças — disse Patrick, pensando em como Lawrie era um imbecil. Por que Lou ficara com ele por tanto tempo? Ela 76


devia tê-lo amado muito. — Sim, quase tão terrível quanto descobrir que o seu marido pegou dinheiro emprestado usando a casa como garantia para financiar um esquema que deu errado, e você perder sua casa — disse Lou. — Ou mesmo ouvir que você é tão irritante com suas preocupações domésticas que ele decidiu trocá-la por uma mulher mais jovem e empolgante. — Por que você ficou tanto tempo com ele? — Patrick perguntou, ávido por uma resposta. — Por causa das crianças. E porque eu o amava. — Você ainda o ama? Lou olhou para ele, surpresa pela severidade em sua voz. Patrick também ficou surpreso consigo. Ele não pretendia perguntar isso, mas fizera a pergunta antes que pudesse evitar. — Creio que isso também não seja da minha conta — disse ele. Ela ainda amava Lawrie? — Acho que parte de mim sempre o amará — disse ela devagar. — Não me imagino amando alguém com tanta intensidade, e também não quero. Lawrie me machucou muito no final. Não conseguiria passar por isso de novo. Nunca amarei de novo. Não daquela maneira. Ela olhou para Patrick. Ele parecia um pouco preocupado. Provavelmente temendo uma enxurrada de sentimentos. — Essa é a única razão que eu pude pensar para me casar com você — disse ela. — Saber que você não espera que eu o ame, nem quer. — Não. — Patrick pôde perceber uma ponta de dúvida em sua própria voz e franziu a testa. De onde viera essa dúvida? — Não, não espero mesmo — disse ele com mais firmeza. Um pouco firme demais, felizmente, Lou pareceu não ter notado. — E eu não esperaria que você fosse fiel — disse ela. Sei que você terá outros relacionamentos, e eu os perdoarei. — Ela hesitou um pouco. — A única coisa que quero é que as crianças não sejam expostas a isso. Tudo o que peço é que você seja o mais discreto possível, e que não traga nenhuma namorada para casa quando estivermos aqui. Falando dessa maneira, a idéia de ter outros relacionamentos durante o casamento com ela parecia um tanto degradante. Patrick se mexeu com desconforto. Talvez fosse mesmo degradante. Ele não havia pensado muito em como isso funcionaria na prática. Ele só estava determinado a evitar complicações emocionais e manter suas opções em aberto. Não era essa a razão de se casar com Lou? Mas ele certamente não queria machucá-la ou humilhá-la. Como ela 77


poderia pensar que ele fosse tão canalha? — Sem problemas — disse ele. — Não trarei ninguém aqui, prometo. — Parece então que você poderá ter sua fantasia realizada — disse Lou. — Isso significa que você vai se casar mesmo comigo? — Ela mordeu o lábio. — Se você ainda quiser. — Ei, você acabou de me oferecer a minha fantasia. Como eu poderia não querer? — Bem, dizendo dessa maneira... — Lou tentou sorrir, mas não conseguiu. — A questão é, você quer? — Patrick perguntou. — Só estou preocupada com Grace e Tom. Você foi muito claro dizendo que não quer ser um padrasto, e eu não suportaria um casamento sabendo que você não gosta deles. — Não é que eu não goste deles — disse Patrick. — Apenas nunca tinha pensado em ter crianças por perto. Mas, agora que os conheci, sinto algo diferente. Não achei que fosse gostar deles, honestamente, mas gostei. — Você não está dizendo isso só porque Tom admirou seu carro? Ele sorriu. — Não, não é por isso. — Ele pensou no assunto por um instante. — Antes eles eram complicações, agora são indivíduos. Agora vejo como são importantes para você. Acho que entendo melhor o porquê de você estar preparada para isso. Eles ouviram o barulho das crianças na piscina. Elas estavam se divertindo muito. Quando as crianças estavam entretidas e se esqueciam de brigar, elas se davam muito bem. — Não creio que serei um padrasto muito carinhoso — disse Patrick, — mas farei o melhor possível. Você quer que Grace vá esquiar, não quer? — Sim — disse Lou com a voz baixa. — Ela pode ir se você se casar comigo. Posso levar o Tom para fazer snowboarding se ele quiser. Você pode dar a eles todas as oportunidades que quiser. — Ele fez uma pausa. — Você poderá ter sua fantasia também, Lou. Você não terá que se preocupar com tudo sozinha. Terá alguém com quem conversar no final do dia. E alguém para lhe amparar, se você quiser. Lou ouvia a tudo isso em silêncio, mas de repente olhou para ele. — Como um amigo — Patrick esclareceu. — Você já foi franca ao 78


dizer que não me amará. Bom, eu também não a amarei. Não complicaremos as coisas com sexo. E isso seria uma complicação, ele pensou. E muito desnecessária. Muito melhor deixar essa idéia de lado. — Seríamos parceiros — ele a tranqüilizou. — Amigos, em vez de marido e mulher no sentido corriqueiro. Teremos uma chance de fazer nossas fantasias se realizarem, Lou — disse ele. Houve uma pausa. Lou olhava uma abelha voando sobre as flores e refletiu sobre o que Patrick lhe dissera. Tudo parecia fazer sentido quando ele falava dessa maneira. Por que ela hesitava? Certamente, não era pela maneira como ele garantia que não a amaria, era? — Lou, eu fiz uma bagunça com tudo isso — disse Patrick. — Posso lhe pedir em casamento de novo? Ela balançou a cabeça concordando, já convencida. — Sim, peça-me de novo. — Quer se casar comigo, Lou? Lou respirou fundo e olhou dentro dos olhos cinza-verdes dele. — Sim — disse ela. — Quero.

Capítulo 7 Houve uma pausa estranha quando eles se olharam. Se fossem um casal de verdade, cairiam um nos braços do outro neste momento, mas, certamente, um beijo passional não era apropriado nesse caso. — Podemos apertar as mãos nesse negócio — Patrick sugeriu, fazendo graça. — Mas isso parece mesmo um negócio. Acho que deveríamos nos beijar, você não acha? O coração de Lou deu uma cambalhota ao considerar essa idéia. — Beijo? — ela ecoou, horrorizada ao perceber como mm voz soara aguda. — Não seremos amantes, mas espero que possamos ser amigos — disse ele. Certo. Um beijo entre amigos. Foi o que ele disse. Certo. Acalme-se, Lou disse ao seu coração ainda em descompasso, e suprimiu uma sensação um tanto irracional de desapontamento. Amigos, tudo bem. Ela podia ser uma amiga. Ela fora bem clara ao dizer que aquilo 79


era tudo o que queria, e estava satisfeita que Patrick tivesse entendido a mensagem. Muito satisfeita. Claro. Ela limpou a garganta para livrar-se daquele agudo ridículo. — Parece bom para mim — disse ela, bem casual. — Bom — disse Patrick, e inclinou-se na mesa para beijar o rosto dela. Lou teve uma sensação de vertigem com a proximidade dele e um repentino desejo de virar a cabeça e beijá-lo de volta, mas esse desejo se esvaiu num instante, e ele voltou a se sentar com um sorriso no rosto. — Bom — ele disse novamente, ao olhar para Lou do outro lado da mesa com o seu sorriso largo. Ela parecia bem, sentada no jardim da casa dele. Ele gostou da idéia de que existiriam outros dias quando ele voltaria para casa e a encontraria ali. As garotas poderiam ir e vir, mas Lou estaria sempre lá. Foi um bom pensamento, e Patrick irradiava satisfação. Tudo funcionava perfeitamente. — Vamos nos casar em breve — disse ele. Lou respirou fundo e decidiu arriscar. — Quero conversar com vocês — disse ela ao pegar uma concha de feijão cozido e colocar sobre as torradas. Eles tiveram um almoço tão bom que ela achou que poderiam ficar sem o lanche de domingo à noite. — Feijão cozido? Oba! — Tom sentou em sua cadeira. — Meu favorito — disse entusiasmado, e Lou sorriu apesar de seu nervosismo. Haveria de ter algo a ser dito a uma criança cujos gostos vão de um carro que mesmo de segunda mão custa tanto quanto uma casa a feijão com torradas. — Odeio feijão — disse Grace. Mas pegou seu garfo e faca de qualquer maneira. — Há algo que eu quero dizer — Lou dizia enquanto eles começavam a comer. Ela não poderia enfrentar nada sozinha. Estava amedrontada demais com a decisão que tinha tomado, e ansiosa para ver como as crianças reagiriam. Para não dizer tão apavorada com o que um mero beijo no rosto a fez sentir. Patrick sugeriu que eles contassem para as crianças quando eles finalmente saíssem da piscina, mas Lou queria fazer isso sozinha. Então ele os levou para casa, terminando o dia de Tom com chave de ouro ao 80


deixá-lo sentar no banco da frente e brincar com todos os botões do carro. — Papai tem um carro esporte também — disse ele a Patrick. — Mas não é tão bom quanto este. Os dois conversaram sobre carros enquanto Lou e Grace se espremiam no banco de trás. Sentada atrás de Tom, Lou se pegou olhando o perfil de Patrick, sua nuca forte e a linha de seu queixo, e de repente o brilho de seu sorriso fez com que o coração dela se apertar. Ela dissera que se casaria com ele, se casaria com ele. Em que ela se metera? Pânico, felicidade, terror, um tipo estranho de entusiasmo invadia-lhe o pensamento, e ela quase não notou o passeio por Londres até que Patrick estacionou o carro. Tom devia tê-lo guiado até aqui. Parecia improvável que a vizinhança já tivesse visto um carro como aquele. — Eu convidaria você para subir, mas acho que não deveria deixar o carro aqui — disse Lou. Patrick riu. — Até amanhã — disse ele e então dirigiu de volta para sua fabulosa casa, seu jardim e sua piscina e Lou voltou para o seu feijão com torradas. — Terra chamando planeta Lou! — Grace acenava com as mãos em frente ao rosto de sua mãe. — Acorda, mãe! Você está nos assustando. Assustando-os? De onde eles tiraram isso? — Desculpe. — Lou se recompôs. — Sim. Então. — Ela limpou a garganta. — Hum... vocês gostaram do dia? — Foi legal — disse Tom. — Eu não acredito que ele tem um Porshe 911! Eu gostei da piscina também. — Sim, a piscina estava ótima — disse Grace. — E você viu aquela televisão? — Tom começou a descrever todas as características técnicas antes de Lou interrompê-lo. — Esqueçam essas coisas — disse ela severamente. — Vocês gostaram de Patrick? Tom deu seu último parecer. — Ele foi muito legal. Como de costume, Grace estava menos entusiasmada — Ele foi mais ou menos — disse ela. — Pelo menos não conversou com a gente como se fôssemos crianças. 81


— Fico feliz por vocês terem gostado dele — disse Lou. — É sobre isso que quero conversar com vocês. O negócio é o seguinte, Patrick e eu estamos pensando em nos casar. Lou sempre lia sobre como as crianças percebiam os sinais em adultos, mas se ela dependesse que eles admitissem que perceberam alguma coisa, ficaria desapontada. Grace e Tom ficaram sem saber o que dizer, eles olharam para ela e esqueceram os seus pratos de feijão. — Você está brincando! — Hã... não, na verdade não estou. — Você quer dizer que Patrick está apaixonado por você? — Não havia como não perceber a incredulidade na voz de Grace. Lou não podia culpá-la. — Não — disse ela. Ela queria ser honesta com eles. Eles mereciam isso. — Não, ele não está. E eu também não estou apaixonada por ele. Pelo menos ela torcia para não estar. Ela certamente reagira de forma muito estranha a um beijinho no rosto Poderia ser um sinal de desejo, mas amor? Não. Ela não estava amando novamente. Ela dissera isso a Patrick. Lou parou, tentando descobrir a melhor maneira de explicar. — Patrick e eu não nos amamos, mas somos amigos, gostamos um ao outro, e essas coisas significam muito num casamento. Seria bom se nos amássemos, mas às vezes é possível ter um relacionamento forte o honesto sem paixão. Ela estava confundindo os filhos. — Olha, se vocês não gostarem da idéia, eu não me casarei com ele — ela tentou tranqüiliza-los. — Patrick sabe disso. O mais importante é que nós três sejamos uma família. Continuaremos a ser uma família se eu me casar com Patrick. Ele apenas estaria lá também. — Ainda poderemos ver o papai? — Tom perguntou ansioso. — Claro que sim. Patrick não tentará ser o pai de vocês. Ele sabe que vocês já têm um pai. E as coisas não mudarão muito. Você continuará indo para a mesma escola. Apenas não viveríamos mais aqui. — Quer dizer que viveríamos naquela casa com a piscina o tempo todo? — Os olhos de Tom se arregalaram. — Bem, sim, provavelmente. — Grace se ajeitou na cadeira. — Eu vou poder ter o meu próprio quarto? — Sim — disse Lou. — Você vai poder ir esquiar. — Grace olhou para sua mãe por um longo momento e então sorriu. — Valeu, mãe — disse ela, e por alguma razão Lou sentiu as lágrimas 82


brotarem em seus olhos. — Sei que isso significa uma grande mudança para vocês dois — disse ela, tentando segurar o choro. — Mas nada mudará em relação a nós três, eu prometo. Sei que acabei despejando tudo isso em vocês, e pode levar um tempo para vocês se acostumarem à idéia, mas... — Está tudo bem, mãe — Tom a interrompeu com carinho. — Não quero ser mau, mas a casa do Patrick é muito melhor do que essa. Morar lá será melhor do que morar aqui, não é verdade? Lou olhou à sua volta naquela cozinha apertada, onde os três se espremiam em volta da mesa. Em cima, passos ressoavam pelo teto, e a televisão berrava no apartamento ao lado. Se ela um dia ficasse em dúvida sobre essa decisão, teria que se lembrar disso. — Sim — disse ela. — É verdade. Lou ficou de pé no topo do morro e levantou o rosto em direção ao vento. Era o final de julho, meados do verão, mas aqui do alto de Yorkshire Dales não havia nem sinal de calor. Nuvens cinzentas desfilavam pelo céu, trazendo chuvas ocasionais, e o vento estava gelado. Patrick despejou café na tampa de plástico da garrafa e deu a Lou. Ao pegá-la, ela se sentou próxima a ele numa pedra e agarrou a caneca de plástico, olhando para o vilarejo abaixo. Ela podia ver o rio, o emaranhado de casas de pedra cinza em volta da igreja. Do outro lado do vale, quase escondido entre as árvores, estava o hotel onde eles se casariam no dia seguinte. Os dois últimos meses tinham sido bastante agitados. Lou achou difícil continuar trabalhando para Patrick estando casada com ele, então ela contratara uma nova assistente para ele e entregara o escritório para ela na mais perfeita ordem, mas não sem uma certa dor. Tinha planos de fazer um curso de design de jardins, mas era triste deixar para trás os amigos de tanto tempo da Schola Systems. Ela não se arrependeu muito de deixar o apartamento. Agora ele estava vazio, suas coisas estavam todas embaladas esperando por eles em Chelsea. Eles mudariam para a casa de Patrick depois do casamento, e a vida deles mudaria por completo. Patrick também estava pensando no futuro. — É difícil acreditar que vamos mesmo fazer isso — disse ele. — Ainda não é tarde demais para mudar de idéia — disse ela. — O quê, e desapontar Fenny? Eu não teria coragem — disse ele. — Ela me disse que por muito tempo torceu para que você encontrasse alguém como eu para se casar! 83


Lou ficou aliviada e mais do que surpresa pela aceitação de sua tia. Ela achara que Fenny e Patrick não se dariam bem. — Espero que você reconheça a honra que isso significa — disse ela a ele, desembrulhando os sanduíches que Fenny fizera para eles antes de despachá-los para fora de casa. — Fenny é como Grace. Ela não aprova as coisas com facilidade. Ela nunca tinha tempo para Lawrie, — Lou se lembrou, oferecendo um sanduíche a Patrick. — Ela me disse que ele não era uma pessoa confiável, e Lawrie dizia que ela era uma velha rude e excêntrica. Eu tinha que vir vê-la sozinha. Ele simplesmente se recusava a vir, e Fenny também não fazia questão da presença dele. Sem querer esconder nada de sua tia, ela disse a Fenny a verdade sobre o casamento com Patrick. Ela esperava que Fenny ficasse chocada e desaprovasse o casamento, mas ela apenas ouviu tudo com cuidado e balançou a cabeça concordando. — Muito inteligente, querida — foi tudo o que disse. — Você pode se casar aqui logo que as crianças entrarem de férias no verão. Patrick limpou os farelos de pão da calça. — Você quer mudar de idéia? — ele perguntou com cuidado. — Eu não culparia você depois de ser encurralada pela minha mãe na noite passada. As duas famílias se encontraram para uma festa no hotel. Grace e Tom se misturaram ao grande grupo de sobrinhas e sobrinhos, um dos quais encontrou uma mesa de sinuca. Lou quase não os viu a noite toda. Ela gostou bastante da mãe e das irmãs de Patrick. Todos tinham os pés no chão e provocavam Patrick o tempo todo, sem se impressionar com sua riqueza. — Que diabos vocês conversaram por tanto tempo? — ele perguntou, ao pegar outro sanduíche. — Sobre você, claro — disse Lou. O vento balançava os cabelos dela, e ela os segurava com uma das mãos e comia o sanduíche com a outra. Ela já tinha desistido de Patrick se casar novamente dissera Kate Farr a Lou quando conversavam a sós. — Este menino bobo passou muito tempo andando por aí com meninas inadequadas. Posso lhe dizer o quanto fico satisfeita por ele ter tomado juízo, e encontrado uma mulher de verdade! Lou não pôde deixar de se divertir ao ouvir a mãe de Patrick descrevêlo como um menino bobo, mas ficou um tanto desconcertada pela recepção tão calorosa que recebera da família dele. Ele, obviamente, não dissera à família toda a verdade sobre o casamento. — É uma pena que o pai dele tenha morrido tão cedo — disse Kate. 84


— Patrick tinha apenas 15 anos, e sempre achei que ele cresceu rápido demais depois disso. E em seguida veio Catriona. Ela era uma moça boa — disse ela, — mas errada para Patrick. Aquele casamento nunca daria certo. O divórcio foi amigável, mas eu sei que Patrick se machucou muito mais do que admite. Ele se atirou o trabalho depois disso, e acho que ficou rico rápido demais. Aquela vida de playboy não era o que ele precisava. Ele criou essa imagem de Sr. Não Estou Nem Aí, mas claro que o que ele temia era gostar de alguém de novo. — Eu sei bem como é isso — Lou confessou, enquanto a mãe de Patrick a estudava com aqueles olhos misteriosamente iguais aos do filho. — Imaginei que soubesse — disse ela. — É por isso que você é a pessoa certa para ele. Só espero que saiba que muito do que ele mostra para o mundo é apenas uma fachada. Por baixo ele é generoso e atencioso, e tem um bom coração. Nada é um problema paras pessoas de quem ele gosta. Você sabe disso, não sabe? Lou olhou para Patrick, e sentiu algo mudar dentro dela. Ele estava cercado por suas irmãs, rindo e jogando as mãos para o ar em derrota, como se estivesse cansado de ser o motivo das piadas delas. Era difícil reconhecer o homem duro e frio com quem ela não queria ter jantado em Newcastle. — Sim — disse ela para a mãe dele, — eu sei. Ela estava certa de que, se pedisse, ele faria qualquer coisa para os seus filhos, assim como Kate lhe dissera. Mas ele faria isso porque haviam assinado um contrato pré-nupcial garantindo que assim seria. Lou queria que ele fizesse tudo por vontade própria. E isso não estava no contrato. As nuvens cinzentas desapareceram miraculosamente no dia do casamento de Lou. Ela acordou com o sol entrando pela janela do quarto e com um nó no estornado. Um dia perfeito de verão. Um dia perfeito para um casamento. Se você estivesse se casando com um homem que a amasse. Os dedos de Lou tremiam enquanto ela preparava a roupa. Um vestido branco estava fora de questão — o casamento já seria uma fraude suficiente, — e ela escolhem um terninho rosa-claro para vestir com o colar de pérolas que Fenny lhe dera. — Gostaria que você usasse isso no seu casamento — disse ela, abrindo o invólucro de veludo onde as pérolas estavam guardadas havia anos. — Oh, Fenny, elas são lindas! — O meu pescoço está velho e enrugado demais para usá-las — 85


disse Fenny. — E elas não são feitas para se usar fazendo jardinagem. Donald me deu esse colar quando nos casamos, Deus sabe quanto tempo faz... Isso faz dele algo antigo para você usar com o seu traje! Fique com ele. — Marisa aprovou. — Eu trouxe um par de brincos de pérola para lhe emprestar. Eles vão combinar perfeitamente com o colar de Fenny — disse ela, entrando no quarto enquanto Lou se vestia. Ela insistira em ajudar Lou a se vestir, apesar de Lou ter lhe dito que não seria um casamento convencional. — Então agora você tem uma coisa antiga e uma coisa emprestada — disse ela, ao pegar um batom em cima da penteadeira. — Espero que tenha comprado peças íntimas novas. Tudo o que você precisa é de algo azul. Ela abriu a tampa do batom e franziu a testa. — Você não vai usar isso com o seu terninho, vai? — Eu o comprei especialmente para essa ocasião — Lou protestou. Marisa ficou chocada. — É pálido demais! Você precisa de algo muito mais brilhante. Verei o que posso encontrar. — Ela enfiou a mão em sua mala em busca de sua nécessaire repleta de cosméticos que sempre trazia consigo. — Você está bem, Lou? Você normalmente não comete erros quando o assunto é estilo! — Estou nervosa. E se eu estiver fazendo a coisa errada? — Marisa deixou a nécessaire de lado e se concentrou em Lou. — Muito bem, o que poderia dar errado? — ela perguntou. — Tudo! As crianças podem não se dar bem com Patrick; ele pode não se dar bem com elas. — Eles parecem se dar muito bem no momento. — Agora sim, mas e se Patrick se entediar conosco? Talvez ele encontre uma... uma modelo linda e decida ter filhos com ela! — disse Lou. — Concordo que as chances de Patrick conhecer uma modelo é maior do que a da maioria dos homens — disse Marisa, — mas se ele quisesse se casar com alguém assim, ele poderia ter feito. É com você que ele está se casando. — Sim, mas não pelas razões certas — disse Lou. — Se tudo der errado, eu terei dado um péssimo exemplo para os meus filhos de como formar relacionamentos, não acha? Marisa suspirou. — Detesto ser rude, mas aquele imprestável do Lawrie não é um modelo de pessoa quando o assunto é relacionamentos, e você se casou com ele. — Mais um motivo para não cometer o mesmo erro mais uma vez. Eu 86


não deveria ensinar às crianças sobre adultos que se amam, em vez de adultos que fazem negócios? — É sempre um negócio, Lou — disse Marisa. — Sim, você fez um negócio, mas é um negócio aberto e honesto. É um bom começo... e quem garante que você e Patrick não se amarão? — Lou balançou a cabeça. — Não, não vamos fazer isso — disse ela. — Eu lhe disse que concordamos que nenhum dos dois queria — Bem, parece um desperdício enorme para mim. — Sua amiga suspirou. — Não acredito que você não tenha notado como ele é atraente. Eu não deixaria nenhuma lourinha imbecil chegar perto se ele fosse meu! Lou se virou para pegar as pérolas. — Não quero me machucar de novo — disse ela. — Prefiro que ele machuque as louras. — Se eu fosse você, relaxaria e esperaria para ver o que acontece — Marisa aconselhou. — E não acho que ele magoaria você. — Você não tem como saber isso. — Bem, eu disse que se ele magoasse você, eu iria atrás dele, pessoalmente, com uma tesoura... e não cortaria apenas as mangas de seus ternos! Lou não pôde deixar de rir, e se sentiu melhor imediatamente. — Pobre Patrick! O que ele disse? — Com muita sensibilidade ele disse que não a magoaria. — Marisa sorriu e fez um gesto com os dedos indicando uma tesoura. — Mas ele está avisado. Depois de resolver o problema do batom, Marisa insistiu em trazer uma taça de champanhe para Lou. Lou hesitou. — Foi o champanhe que me botou nessa enrascada! — Ei, você está se casando com um milionário — disse Marisa. — E você também está se casando pela segunda vez, enquanto a maioria de nós ainda está procurando o primeiro rapaz para dançar a valsa uma vez, quanto mais duas. Então pare com isso! Grace entrou no quarto quando Marisa saiu para pegar a garrafa de champanhe. O coração de Lou apertou quando ela viu a filha, que deixou as roupas góticas para usar um vestido verde-claro coberto de bolinhas rosas. Nos pés, sapatilhas de bailarina em vez das bolas pesadas. Lou havia lhe dito para vestir o que quisesse, e ficou muito emocionada ao descobrir que Grace optara por um vestido do qual ela sabia que a mãe gostaria. Ela até penteou os cabelos. 87


— Você está linda — disse Lou sinceramente. — Obrigada. Você também está linda, mamãe — disse Grace. Ela tirou a mão de trás das costas. — Marisa disse que você precisava de algo azul. Era um bracelete horrível, feito de cubos de plástico, mas Lou sabia como Grace o adorava. Um menino de quem Grace gostava na escola dera a ela no Natal passado. — Você pode usar ele, se quiser. Era um enorme sacrifício, Lou sabia, e ela sentiu um aperto no peito ao se levantar e abraçar sua filha. Grace não era uma criança muito carinhosa, mas riu e se agarrou à mãe por um instante. — Só queria dizer obrigada — disse ela apressada. — Sei que está fazendo isso por mim e pelo Tom. Lou apertou-a, com o coração inebriado de amor. — Estou fazendo isso por todos nós, Grace — disse ela. — Tudo vai ficar bem. Afastando-se com um sorriso, ela colocou o bracelete no pulso. Ele acabou com as regras de estilo de Marisa, e sua amiga teria um ataque quando visse, mas aquilo significou mais para Lou do que tudo mais naquele dia. — Vou cuidar bem dele — ela prometeu a Grace. Depois disso, Lou quase não se lembrou do casamento. A cerimônia simples aconteceu no jardim do hotel, e, ainda que eles tivessem convidado apenas familiares, e Marisa, que era um membro honorário da família, como disse Fenny... parecia haver muita gente em volta deles. Enquanto aguardavam a mestre-de-cerimônias se preparar para dar início ao casamento, Lou viu a mãe de Patrick vestida elegantemente, com chapéu, antes de olhar para Fenny, vestida de forma excêntrica com um vestido de listras de pelo menos 30 anos atrás. E então ela viu Grace, e Tom com sua camisa já por fora da calça, e Marisa, que acenou para ela com o polegar erguido. Lou sorriu para todos, e virou-se para Patrick e tudo mais pareceu perder a nitidez. Era como se o restante da festa fosse nada mais do que uma coleção de rostos e figuras desfocadas, separados deles por uma barreira invisível. Somente Patrick era real e sólido. Ele estava muito elegante num terno cinza, camisa branca e gravata cinza-clara. Lou olhou para o rosto dele como se nunca o tivesse visto vestido daquela maneira antes. Aquele 88


queixo, aquela boca firme, a linha severa de seu rosto... será que ele sempre fora assim? Os olhos dela vagaram por Patrick com fascínio até que encontraram os olhos dele. A mestre-de-cerimônias limpou a garganta. — Podemos começar? — ela perguntou num tom baixo, e Patrick virou-se de frente para ela. Depois de um momento de hesitação, Lou fez o mesmo. Casar-se era uma experiência esquisita dessa vez. Lou não ouviu as palavras, e respondeu de acordo, maravilhada com a firmeza de sua própria voz, mas parte dela parecia não estar ali. Parecia que assistia a si mesma num filme. Em seguida Patrick pegou a mão dela, colocando a aliança em seu dedo, e de repente tudo aquilo pareceu muito real. Os dedos dele estavam quentes e firmes, e Lou se sentiu oca por dentro ao sentir seu toque. As mãos dela tremiam ao colocar a aliança nos dedos dele, mas, finalmente, estava feito. Estavam casados. Patrick sorriu e virou-se para Lou naturalmente, tocando o queixo dela e levantando-lhe o rosto para beijá-la. Quando os lábios dele tocaram os dela, o chão pareceu desaparecer debaixo dos pés de Lou. Os lábios dele não eram frios, como ela achou que fossem. Eles pareciam quentes e firmes e perigosamente excitantes, e o coração dela disparou em resposta. Incapaz de resistir, Lou apoiou-se nele, e a boca de Patrick permaneceu na dela por um pouco mais do que o necessário antes dele se forçar a levantar a cabeça. Ela parecia tão surpresa quanto ele. Patrick ficou gelado pela doçura inesperada daquele beijo. Ele não conseguia acreditar que um gesto tão breve poderia fazê-lo perder o equilíbrio, ou como era trabalhoso abrir um sorriso. — Bem, está feito — disse ele. — Sim — disse Lou, sorrindo um tanto incerta para ele. Patrick teve vontade de puxá-la para perto de si e pegá-la em seus braços, mas ela já se virava, abrindo o sorriso enquanto Grace e Tom se aproximavam. Patrick a olhou enquanto ela os abraçava, consciente de um sentimento que ele descobriu ser ciúme. Só porque Lou amava seus filhos e eles a amavam e poderiam ficar junto dela quando quisessem ou precisassem. Como era patético sentir ciúme disso... Patrick se deu conta de que Grace estava sorrindo para ele, e então 89


se recompôs. Ele abriu os braços, e para sua surpresa foi em direção às crianças para um abraço rápido. — Obrigado, Grace — disse ele. Ele a conhecia o suficiente para saber que ela só abraçava as pessoas que significavam muito para ela, e ele sentiu orgulho e prazer por ser uma dessas pessoas. Passando a mão no cabelo de Tom, ele olhou para Lou e a viu olhando para ele com as crianças. Era impossível decifrar a expressão naqueles olhos negros, mas ela sorria para ele, e Patrick sentiu algo se soltar dentro dele. De repente, ele desejou estar a sós com ela, mas não havia como, com todas aquelas pessoas ali, todas querendo dar os parabéns e beijar a noiva. E as coisas não melhoraram. Num dado momento, à tarde, parecia que Patrick era a única pessoa que não beijava a noiva. Era difícil chegar perto dela. Ele apenas a via de relance. Patrick ficou ainda mais frustrado. — Não se preocupe, você a terá só para você em breve — disse sua irmã mais velha, vindo por trás dele. Ela riu da expressão desconcertada dele. — Estamos todos nos divertindo com sua cara de bobo apaixonado. Você não conseguiu tirar os olhos dela o dia todo. Bobo apaixonado? Ele não estava apaixonado, Patrick pensou. Que idéia ridícula. Ele nunca ficara bobo por ninguém em sua vida. Todos sabiam que era ele quem corria de qualquer sinal de sentimento. Ficar de olho na noiva era apenas o trabalho do noivo. Sem pensar, ele avistou Lou na multidão. Ela estava de pé ao lado de sua mãe e de Fenny, todos riam. O rosto de Lou estava cheio de vida, seus olhos brilhavam, e de repente Patrick sentiu um aperto no peito. Ela estava maravilhosa vestida com aquele traje, tão diferente dos ternos cinza e formais que usava no escritório. A cor rosa-clara do vestido fazia a pele dela brilhar, e o terninho de seda sobre o vestido abria-se o suficiente para mostrar o detalhe de algo que parecia um leito de cetim e renda por baixo. Patrick ficava sem respiração apenas por pensar nisso. De salto alto, ela estava ao mesmo tempo muito sexy e elegante. Patrick não tinha certeza onde o bracelete de plástico azul se encaixava no estilo dela, mas para ele estava tudo bem. Hoje, Lou podia fazer o que quisesse. Mas ele não estava apaixonado. Apenas desejava estar com ela. Apenas desejava estar a sós com ela, e que fosse a pessoa que a fizesse rir. Desejava remover o terninho dela e descobrir o que havia por baixo... Patrick respirou fundo. — Bobo apaixonado — sua irmã confirmou com satisfação. — Já era 90


hora de você se apaixonar por uma mulher de verdade, em vez daquelas peruas louras com quem andava por aí tentando provar que não estava envelhecendo como o resto de nós. Isso é que é crise de meia-idade. Oh, lá está Michael! — Ela acenou para um homem na multidão. — Preciso falar com ele. Patrick ficou revoltado com os comentários sinceros de sua irmã. Ele não tentara provar nada, ele não passava por nenhuma crise de meia-idade e certamente não estava apaixonado por Lou. Apesar disso, ele olhou para Lou mais uma vez. Ela estava abaixada conversando com uma de suas sobrinhas. Ele via a maneira como os seios dela se moviam por debaixo do terninho, a maneira como os cabelos sedosos dela moviam-se por seu rosto, a maneira como ela sorria com aqueles lábios de sabor tão doce. A cabeça de Patrick girou e ele fechou os olhos por um instante. Ele não amava sua esposa. Um pouco de desejo, talvez, mas isso era tudo. Ele estava apenas frustrado. Ele não saía com ninguém desde que ele e Lou concordaram em se casar. Lou deixou claro que não haveria problemas, mas do alguma forma ele não sentira vontade de sair. Isso teria que mudar. Lou também deixara claro que um relacionamento físico estava fora de questão, e de forma alguma Patrick abriria mão de suas opções com outras mulheres. Esta era razão pela qual ele se casara com ela! Não, esqueça a roupa de baixo de Lou, ele disse a si mesmo. Mantenha apenas a amizade, assim como fora combinado antes de ela vestir terninhos cor-de-rosa e beijá-lo. Patrick estava feliz por ter uma nova assistente para reservar suítes nos hotéis onde ficariam no caminho de volta para Londres. Não parecera apropriado sair em lua-de-mel, mas ele sugerira que eles voltassem para casa devagar, contemplando os jardins no caminho, se Lou quisesse. — Mas você não se interessa por isso — ela protestou. — Não, mas me interesso pelo meu carro. Ficarei feliz por dirigir por todo o caminho. Lou riu. — Ah, agora entendi. — Todos os hotéis têm suítes — disse ele. — Você ficará bem confortável. Poderá ter um quarto só para você toda noite. Ela nem ao menos hesitou. — Ótimo — disse ela. — Obrigada por estar fazendo isso. — Então, tudo bem. Camas separadas o tempo todo. — Patrick olhou 91


mais uma vez para Lou. Isso estava bom para ele também. Com certeza.

Capítulo 8 Eram quase sete da noite antes que Patrick e Lou conseguissem se despedir de todos. A capota do carro estava abaixada quando eles partiram naquele anoitecer dourado de verão. Isso deveria ser o início de uma luade-mel maravilhosa, pensou Lou, deitando a cabeça no banco de couro. Só que não era uma lua-de-mel de verdade, claro. Eles apenas ficariam em alguns hotéis no caminho de volta para Londres. Não haveria comemorações íntimas, felicidade, risos ou beijos. Eles não fariam amor. Patrick deixara claro que eles não dividiriam um quarto, muito menos uma cama. Para ela isso estava bom, Lou disse a si mesma, mas isso fazia dessa lua-de-mel uma piada. Eles poderiam muito bem ter voltado com Grace ou Tom, mas Lawrie apareceu como combinado e pegou as crianças na recepção. Elas passariam a semana com ele. Era bom para eles estar com o pai, Lou pensou, mas isso significava que ela passaria a semana sozinha com Patrick Claro, eles passaram bastante tempo sozinhos no escritório, mas agora era diferente. Lou olhou para Patrick com o rabo de olho. O marido dela. Ela ainda não conseguia entender. Ele parecia preocupado, mas suas mãos estavam firmes no volante. Enquanto ela olhava, ele trocou de marcha para fazer uma curva, completamente no controle do seu poderoso carro, e algo apertou e revirou-se dentro de Lou. Algo profundo e perturbador. Algo que trouxe de volta a memória do beijo que eles compartilharam depois da cerimônia. Ela tremeu toda por conta da presença dele, e teve que desviar o olhar. Sentir isso ao olhar para o seu marido não era problema, mas não quando haviam combinado que não existiria contato físico. Era bom mesmo o fato de Patrick ter reservado quartos separados. Eles levaram menos de uma hora para chegar ao hotel reservado para aquela noite, e a gerente apareceu para dar-lhes atenção especial. — Permita-me parabenizá-los, Sr. e Sra. Farr — disse ela. — Sei que vocês acabaram de se casar. Patrick olhou para ela. — Como você sabe disso? Ela olhou suas anotações. 92


— Ah... deixe-me ver, sim... Marisa Brandon... telefonou. Ela solicitou que puséssemos uma garrafa de champanhe na suíte de vocês, e disse que vocês viriam direto do casamento, então será um prazer levá-los para a nossa suíte especial de lua-de-mel. Ela acabou de ser reformada e redecorada para criar uma atmosfera íntima e romântica. Patrick olhou para Lou, mas ela balançou a cabeça levemente para indicar que ele não deveria insistir no acordo inicial. Ela, certamente, não queria ficar ali parada enquanto ele explicava que eles prefeririam quartos separados. Que tipo de lua-de-mel seria essa, então! A gerente insistiu em escoltá-los até a suíte, falando com orgulho sobre ela. — Espero que gostem — disse ela, abrindo a porta para eles. — É o lugar perfeito para uma lua-de-mel, eu acho. — É adorável — disse Lou, tentando não olhar para a cama. Só havia uma, naturalmente. Ela mataria Marisa quando a visse. — Bom — disse ela, quando a gerente terminou o tour da suíte e os deixou a sós. — Sinto muito sobre isso — disse Patrick. — Não foi o que planejei. — Não tem problema — disse Lou. — Não morreremos se dividirmos uma cama por uma noite — ela continuou. — Fique tranqüilo. Olha, é enorme — disse ela ao apontar para a cama. Sim, e que cama ótima para se fazer amor, Patrick pensou. — Tem espaço suficiente para nós dois — dizia Lou, determinada a mostrar que não estava incomodada com a situação. — Não vejo por que isso seria um desconforto. Nós concordamos que o relacionamento seria de amizade e nada mais, e se vamos mesmo ser amigos. devemos estar aptos a dividir uma cama sem problemas. A atitude objetiva dela começava a perturbar Patrick. Então ela não se importava em dividir uma cama com ele! Isso não o ajudava, ajudava? Lou, obviamente, não passara o dia imaginando o que ele estava vestindo por baixo do seu paletó. Se tivesse imaginado, ela acharia a perspectiva de dividir uma cama com ele muito mais problemática. Bem, ele só teria que mostrar que estava tão tranqüilo quanto ela. — Certo, bem, se você está feliz assim, comigo está bem — disse ele. — Mas eu ficaria feliz em ter uma palavrinha na recepção para ver se eles nos devolvem a suíte original. — Não precisa. — Lou sentou-se na cama e tirou os sapatos, só para provar como ela estava relaxada com a idéia de dormir com Patrick. — 93


Agora que estamos casados, é bem provável que passemos por outras situações como esta, então é melhor nos acostumarmos. Patrick abriu o frigobar. — Nesse caso, podemos aproveitar e beber o champanhe que Marisa nos arranjou — disse ele. Massageando os pés, Lou olhava-o abrir a garrafa. Patrick parecia convencido da atitude despreocupada dela, ainda que por dentro ela não estivesse tão despreocupada. Ela ainda tinha muitas dúvidas sobre tudo isso, tremia de nervosismo com a idéia de deitar-se numa cama com ele. Patrick serviu o champanhe e pôs as taças próximas à cama, e em seguida afrouxou a gravata. Abrindo a camisa no pescoço, ele enrolou as mangas, tirou os sapatos e sentou-se na cama. — Bem melhor — disse ele, ajustando um travesseiro às suas costas. — Finalmente podemos relaxar. Bem, ele até poderia relaxar, Lou pensou, ainda sentada respeitosamente na beirada da cama. Ele estava acostumado a dividir camas com mulheres do tipo de Ariel Harper. E isso significava que ele dificilmente sentiria desejo ao ver Lou do outro lado da cama, Lou se lembrou e se acalmou um pouco. De verdade, ela estava sendo boba. Ela tinha 45 anos, pelo amor de Deus! Velha demais para se importar com algo tão ridículo. Então, quando Patrick bateu no lado da cama, chamando-a para se acomodar, Lou sentou-se rapidamente ao lado dele. Ele deu a ela uma taça de champanhe antes de pegar uma para si. — Um brinde a nós — disse ele. — Para nós e para nosso acordo — ela concordou ao brindar. Não que o acordo fosse muito confortável para ele nesta noite, Patrick pensou. Parecia que eles teriam uma longa noite pela frente. E foi uma noite longa. Foi muito conveniente lembrar a si mesmo que já era um adulto, e velho demais para ficar envergonhado com algo tão bobo, mas do alguma forma isso não ajudou muito quando se tinha que imaginar tirar as roupas e deitar juntos numa cama. Sentindo-se como se tivesse 16 anos, Lou trancou-se no banheiro para vestir sua camisola de seda que Marisa lhe dera como presente de brincadeira. — Aproveite e fique bonita na sua lua-de-mel, mesmo que você apenas durma — dissera. Se a camisola não tivesse sido feita para seduzir... Lou olhou-se no espelho do banheiro consternada. A seda era uma onda fresca sobre sua pele, com as costas abertas e segura apenas por 94


alças finíssimas que pareciam implorar pelo toque da mão de um homem para removê-las do ombro. Era adorável e perfeita para uma lua-de-mel sofisticada. Ela desejou que fosse um pijama de flanela de gola alta, do tipo que Fenny usava no inverno. Segurando suas roupas na frente do corpo para esconder ao máximo sua camisola, Lou respirou fundo antes de sair do banheiro. — O banheiro é todo seu — disse ela sem olhar para ele ao guardar suas roupas. — Obrigado. Quando Patrick saiu do banheiro, Lou estava deitada de lado na cama, com o edredom até o queixo. Ela deixara um abajur aceso no lado dele da cama, mas, fora disso, o quarto estava escuro, para alívio de Patrick. Ele sempre dormira nu, e nunca lhe ocorrera comprar pijamas, mas ele se esforçou para manter a decência e ficou de short. Mesmo assim, ele ficou grato por Lou não olhar para ele quando voltou do banheiro. A visão das costas nuas dela atrás daquela seda tivera um pleito alarmante em sua pressão sangüínea. O colchão balançou quando ele deitou e apagou a luz. — Boa noite — disse ele bruscamente. — Boa noite. Oh, sim, foi tudo muito educado. Eles eram adultos. Era fácil lidar com aquela situação. Mas isso não impediu Patrick de se revirar por dentro pela proximidade dela, enquanto, a alguns centímetros de distância, Lou podia ouvir a respiração dele. Fazia tanto tempo que ela não dividia uma cama que prestou atenção em cada movimento dele enquanto ele se esticava e se acomodava. Longos minutos se passaram. Eles não se tocavam, mas estava desconfortável debaixo do edredom. Lou relaxou, soltando as pernas sem fazer barulho, e xingou a camisola de seda que se enroscava nela. Ela queria se virar, mas morria de medo de encostar em Patrick — não que ele fosse notar. Pela respiração dele, ela sabia que eleja estava dormindo. Melhor assim, mais ou menos, ela pensou. Ela estava exausta, mas tensa demais para dormir, e parecia que estava deitada ali havia horas, tentando relaxar. E então, quando estava pronta para dormir, ela acordava ao ouvir Patrick suspirar ou se mexer. Ela estava com frio, também, mas de alguma forma o edredom acabou ficando todo no lado de Patrick. Lou se cobriu mais uma vez, com cuidado, mas acabou acordando-o. Ele rolou e jogou o braço por cima dela, puxando-a para perto do calor de seu corpo, e respirando em seu pescoço. A tentativa dela de se livrar dele só fez com que ele a abraçasse com mais 95


força, instintivamente. — Patrick! — disse ela, dando-lhe uma cotovelada. Acordando assustado, Patrick levou um momento pura se lembrar de onde estava e com quem. Em seguida, ele se retraiu como se estivesse abraçando uma cobra venenosa. — Perdão — ele balbuciou ao rolar para o outro lado da cama. — Eu devo ter pensado... — Tudo bem — disse Lou, sem querer saber com quem ele achou que estivesse. — Volte a dormir. Patrick passou o restante da noite deitado rígido e triste na beirada do colchão tentando não se lembrar de como se sentira acordando abraçado a ela. Eles não precisavam mais dividir um quarto, e isso tornou as coisas muito mais fáceis. Patrick não tinha mais que dormir imóvel na beirada da cama. Não precisava mais pensar em como ela estava perto ou como era fácil alcançá-la e agarrar-se a ela como fizera anteriormente. E que erro isso seria, Patrick dizia a si mesmo. Isso seria o fim do seu estilo de vida livre e fácil, o fim das garotas bonitas, o fim da liberdade. Então, ele não conseguia esquecer o corpo quente de Lou? Então, ele continuava a pensar em como a pele dela parecia iluminada naquela luz fraca, e a curva do ombro dela naquela escuridão? Ele superaria tudo aquilo tão logo chegasse em casa e as coisas voltassem ao normal. Enquanto isso, eles eram amigos, tudo bem. Ambos ficaram felizes quando a suposta lua-de-mel checou ao fim. Patrick voltou ao trabalho com sua nova assistente, e Lou ficou naquela casa enorme e vazia tentando não sentir saudades dele. As coisas melhoraram quando as crianças voltaram da casa de Lawrie. Eles adoravam viver com Patrick, e a piscina era a melhor parte, especialmente durante as férias, quando a casa ficava repleta de seus amiguinhos. Não havia muito o que fazer para Lou. — Como vão as coisas no escritório? — ela perguntou quando Patrick retornou para casa. — Tudo bem — disse ele sem entusiasmo. — Jo é muito eficiente, mas não é como você. — Ele olhou para Lou, que podava as plantas na parte de trás da casa. — É estranho não ter você lá — disse ele. — Sinto sua falta. Lou continuou podando, em cima da escada. Não havia por que ficar encantada apenas porque ele dissera que sentia a falta dela. — Sinto falta de trabalhar com você mais do que esperava — ela 96


confessou. — Todos esses anos indo trabalhar e desejando não ter que trabalhar, e, agora que não estou trabalhando, sinto-me estranha. Estou feliz por Theresa ter ido embora. Pelo menos posso cuidar da casa. Quando ela estava aqui, sempre me sentia mal ao ir na cozinha. Patrick sentou-se à mesa e esticou as pernas, e ficou vendo Lou podar as plantas próximas ao muro. — Que silêncio — disse ele, dando-se conta de que não havia ninguém na piscina. — Onde estão as crianças? — Vão dormir na casa de amigos — disse Lou ao descer da escada. — Estranho como a casa fica silenciosa sem eles — disse Patrick. Era extraordinário, ele pensou, como se acostumara tão rapidamente a chegar em casa e ouvir barulho e o que parecia um constante movimento. Parecia sempre haver um bando de crianças correndo por todos os lados, ou pulando na piscina. A televisão ligada em um quarto, um CD com uma música estranha tocando em outro. A casa fora tão silenciosa, ele lembrou. Silenciosa e sem graça, pensando melhor. Não era à toa que ele passava a maioria das noites fora. Agora, ele chegava em casa cada vez mais cedo. Ele podia apostar que encontraria Lou no jardim, normalmente de joelhos removendo ervas daninhas, podando ou regando plantas. Patrick passou a gostar da forma como ela olhava para ele e sorria quando ele chegava. Ela se sentava apoiada no calcanhar e tirava os cabelos do rosto, deixando uma marca de terra na testa. Na maioria das noites, eles sentavam juntos no terraço e conversavam, saboreando um copo de vinho. Era muito confortável estar com Lou, Patrick pensava, e estava feliz por terem optado pela amizade apenas. Mais tarde, jantariam na cozinha com Grace e Tom, e normalmente um monte de outras crianças cujos nomes Patrick nunca se lembrava. As férias de verão eram as mais caóticas, mas Lou estava sempre serena, apesar de tudo. Ela parecia saber o que estava acontecendo e quem ia aonde, e depois de um tempo, Patrick relaxou e deixou tudo por conta dela. Tudo havia funcionado melhor do que ele imaginara. De vez em quando ele se lembrava da vida que planejara para si, mas agora era difícil imaginar como ela teria funcionado. Ele iria levar uma vida muito livre, não iria? A idéia era sair com outras mulheres sem peso na consciência, sem se preocupar muito com Lou e muito menos com os filhos dela. Patrick estivera certo de aquilo era o que queria. Agora... agora, de alguma maneira, era diferente. Ele olhou para Lou enquanto ela tirava as luvas de jardinagem e as folhas dos cabelos. Ela vestia uma camisa desbotada, calças largas, e suas 97


mãos estavam sujas. Por um momento ele se lembrou da assistente impecável em seus terninhos, mas era difícil associá-la com a mulher calorosa e levemente relaxada ali na frente dele. — Então estamos sozinhos essa noite? — ele perguntou. — Sim, estamos. — Lou pegou uma vassoura e começou a varrer. — Então vamos jantar fora? — Patrick perguntou no calor do momento, e ela o olhou rapidamente antes de continuar a varrer. — Você não precisa me entreter — disse ela com cautela. — Estou bem sozinha. Por que não leva Ariel? Ariel? Patrick levou um momento para se lembrar de quem Lou estava falando. — Eu não lhe falei? Ariel voltou para as Maldivas. — Lou olhou para ele. — É mesmo? — Parece que ela conheceu um instrutor de mergulho ou algo parecido quando estivemos lá, e agora ela decidiu que quer se casar com ele e ter filhos. Se ele viu conseguir mantê-la da maneira como ela está acostumada, isso é um outro assunto — disse Patrick. — E você está bem com tudo isso? — Lou perguntou, rir parecia bem, mas, com Patrick, era difícil dizer. — Claro — disse ele, surpreso. — Fiquei feliz de poder ter evitado uma cena horrivelmente emocional quando voltamos. Ela já tinha decidido. Para ser honesto, eu já tinha me esquecido dela até que você a mencionou. — Lou se abaixou para recolher as folhas com uma pá e as jogou num barril. — Você não encontrou ninguém para satisfazer sua fantasia? — ela perguntou. Isso era o tipo de coisa que ela perguntaria a Marisa. Ela e Patrick eram amigos, e perguntar sobre a vida amorosa era o que amigos faziam. — Não — disse Patrick lentamente, dando-se conta que era verdade. — Ainda não. — Bem, não me importo que me leve para jantar até que encontre outra pessoa — disse Lou com animação. — Só preciso tomar um banho. — Sem pressa. — Patrick teve que se esforçar para não pensar em Lou debaixo do chuveiro enquanto olhava o endereço do restaurante em sua agenda eletrônica. Havia vários restaurantes onde ele sabia que conseguiria uma mesa, mas fui difícil imaginar Lou neles. Eram lugares para se levar mulheres glamourosas como Ariel, que se importavam em ver e ser vistas. Lou não se importava com nada disso. 98


— Não vamos a nenhum lugar chique, vamos? — Lou gritou do andar de cima, como se lesse os pensamentos dele. Patrick foi até o corredor e esticou o pescoço para vê-la pendurada no corrimão. Os cabelos dela estavam molhados, seus ombros nus acima da toalha envolta no seu corpo e sua pele rosada e brilhante. E perigosamente desejável. Patrick imaginou como seria. Patrick imaginou como seria subir as escadas e dizer a ela como estava. Como seria se ela sorrisse para a expressão nos olhos dele e o lembrasse que eles estavam a sós era casa? Será que ela riria se ele a levasse para o quarto? Será que ela cairia com ele na cama? Será que ela o deixaria arrancar-lhe as roupas e deslizar as mãos sobre suas curvas enquanto saboreava a textura de sua pele, seu sabor, seu toque? Não, ela não deixaria. Patrick logo deixou esses pensamentos de lado. Claro que ela não deixaria. Isso não era o tipo de coisa que se faria quando se era apenas amigos, era? — Aonde você gostaria de ir? — ele perguntou. — Vamos àquele restaurante italiano aqui perto — disse Lou. — Lá é sempre bom, e não precisaremos fazer reserva. Já estou descendo — ela disse, desaparecendo de vista. Patrick entrou na sala de estar e sentou-se em um dos sofás, com a cabeça baixa. Ele tinha que parar de pensar em Lou dessa maneira, ou a qualquer momento não se seguraria e estragaria tudo. Só agora ele se dera conta de como ela era importante para ele e não queria perdê-la como amiga. Ele estava feliz com essa situação, e Lou também parecia feliz, mas isso só duraria se eles mantivessem o acordo. Então ele manteria o acordo. E encontraria uma nova namorada o mais rápido possível. — Tudo bem, Patrick? Patrick levantou a cabeça e encontrou Lou, na porta, preocupada, olhando para ele. Ela estava vestida com uma saia de seda azul-clara, um top branco com uma blusinha leve de lã e parecia tranqüila, leve e confortável. E tão desejável como quando estava enrolada na toalha. Patrick respirou fundo e se levantou, — Estou bem — disse ele. — Vamos? — Brewer’s First vai dar uma grande festa para comemorar o aniversário de 50 anos — disse ele a Lou enquanto comiam espaguete. — Fomos convidados. 99


— Você quer que eu vá com você e faça o papel da esposa executiva? — Lou perguntou. — Você se importaria? — Claro que não. Eu ainda não fiz nada para fazer jus a minha parte no combinado. — Ela sorriu. — Eu não esqueci nosso acordo. — Ótimo. — Patrick desviou o olhar, mas o sorriso dela ainda era visível. Ele limpou a garganta. — Ótimo. — Vai ser uma festa chique? — Lou perguntou intrigada pelo silêncio dele. — Como devo me vestir? — Você vai precisar de um vestido de gala. Por que não compra algo novo? Lou imaginou seu guarda-roupa. Ela não tinha nada muito interessante, mas possuía umas peças básicas que poderia incrementar. — Tenho certeza de que posso encontrar alguma coisa em casa — ela lhe disse. — Você nunca compra nada novo — disse Patrick. — Eu notei isso. Você ainda usa as mesmas roupas de quando nos casamos. — Há alguma coisa errada com elas? — Não é isso — disse ele, magoado mas sem querer admitir. — Parece que você não quer gastar o meu dinheiro. — Ele explicou da melhor forma possível. — Você quase não toca no dinheiro que eu depositei em sua conta. — Eu uso o dinheiro para a alimentação. — Esse dinheiro é seu — disse ele irritado. — Você não precisa prestar contas do que faz com ele. Compre o que quiser. Lou fechou a cara. — Não me sinto confortável com isso — disse ela. — Eu pensei que você tivesse se casado comigo pelo meu dinheiro. — Eu me casei com você por segurança — disse ela. — Por uma vida melhor para mim e para as crianças, e você nos deu isso. Você não faz idéia o que é viver em sua casa enorme depois de viver naquele apartamento apertado. Não precisamos do seu dinheiro. — Tente gastar algum, de qualquer maneira — disse Patrick com um suspiro nervoso. — Compre um vestido novo para essa recepção... e veja se não compra nada barato pensando que o dinheiro não é seu! — disse ele com um olhar severo. — Você estará lá como minha esposa, e não quero que você passe a impressão de que eu sou pão-duro. 100


Lou telefonou para Marisa na manhã seguinte. — Patrick praticamente me ordenou a gastar uma fortuna num vestido — disse ela. — É melhor você vir aqui me ajudar a escolher. — Oh, ele não acordou você com um cartão de crédito na frente do seu rosto dizendo que você tinha que fazer compras, acordou? — disse Marisa com inveja. — Isso é o meu sonho desde que vi Uma linda mulher. — Não, mas parece que estou sendo comprada — Lou confessou. — Eu não gosto disso. — Honestamente, Lou, você é a mulher dele, e não uma garota de programa! A maioria das mulheres mataria para gastar o dinheiro dele. Não é que ele não possa pagar algumas contas de cartão de crédito. — Essa não é a questão — disse Lou. — Patrick já está sendo mais do que generoso. Vivemos de graça numa casa fantástica... as crianças têm até uma piscina! E não fazemos nada para ele em troca. Seria diferente se estivéssemos casados de verdade. — Ei, eu fui sua testemunha, lembra-se? — disse Marina, sem se impressionar. — Parecia uma casamento de verdade para mim. E você pode fazer algo para ele agora — disse ela. — Ele pediu a você para que comprasse uma roupa de gala, então vamos logo encontrar algo que o deixará de queixo caído! Elas encontraram um vestido no final da tarde, logo quando Lou estava pronta para desistir e voltar para casa. — É isto! — Marisa levantou um vestido maravilhoso e brilhante num tom perfeito de vermelho entre o rosa e o vermelho escarlate. Uma camada de chiffon cobria os braços e passava sobre um vestido de seda. Quando Lou experimentou o vestido, o tecido deslizou suavemente sobre sua pele. — Ela ficará com ele — disse Marisa à assistente de vendas logo que Lou saiu do provador. Lou ficou escandalizada com o preço, mas Marisa passou por cima dela e a fez comprar um par de sandálias que combinassem, brincos brilhantes e uma linda bolsa feita à mão com penas e lantejoulas. — E você precisa de um novo batom também — disse ela a Lou, — eu sei a cor exata. Ela insistiu em ir até a casa de Lou para ajudá-la com a maquiagem no dia da festa. — Você está linda! — disse ela, olhando para Lou. — Você não acha que é um pouco... demais? — disse Lou, já perdendo a calma. Ela se sentiu com 16 anos, antes do primeiro encontro. 101


O que era estúpido. Aquilo não era um encontro. Ela apenas iria a uma recepção com o marido. Nada com o que ficar nervosa. O vestido a fazia consciente de seu corpo. Ele a fazia se sentir... sexy. Sexy demais para uma mulher de 45 anos, que deveria estar contente em ser apenas uma amiga. Patrick não ajudou muito ao aparecer charmoso vestindo um paletó cujo preto e branco severo acentuava as linhas fortes de seu rosto e vestia perfeitamente seu poderoso porte. Ele esperava no corredor e Lou quase ficou sem fôlego ao descer as escadas. — Você está bonita — disse Patrick, com uma voz estranha. Atrás dela, Lou ouviu Marisa dizer, um tanto quanto irritada. — Não, ela não está bonita, Patrick. Ela está absolutamente linda! Tente de novo — disse ela, ignorando a cara feia de Lou. — Você está linda — disse Patrick, obediente. Uma limusine com chofer esperava por eles do lado de fora, mas Lou sentia uma mistura de desapontamento e vergonha, o que a impedia de apreciar todo aquele luxo. Ela queria que Patrick pensasse que ela estava linda sem a intervenção de Marisa. Ao lado dela, Patrick parecia distante e preocupado. Provavelmente, horrorizado pensando que ela pularia em cima dele. Por que diabos deixara que Marisa a convencesse a comprar esse vestido? Ela deveria ter vestido suas velhas calças de seda preta e uma blusa creme. Foi um alívio chegar à recepção. Era uma festa muito elegante, e o salão estava repleto de homens parecendo muito mais notáveis do que realmente eram, e mulheres lindas, com vestidos fabulosos, a maioria muito mais exóticos do que o de Lou. Pelo menos ela chamava menos a atenção. Ela estava muito consciente de Patrick ao seu lado e de sua mão quente em seu braço enquanto ele a apresentava para as pessoas. Inevitavelmente, eles se separaram. Lou não sabia se isso tornava as coisas mais fáceis ou mais difíceis. Ela era perfeitamente capaz de conversar com as pessoas por conta própria, mas mesmo sorrindo, conversando e ouvindo, ela não deixava de notar a presença de Patrick a alguns metros de distância. Logo que eles se separaram, várias garotas se aproximaram dele. Ela pôde vê-las paquerando-o abertamente e se aproximando com sorrisos sugestivos. Lou quis marchar até ele e arrancar as mãos delas de cima dele. Mas ela não tinha o direito de fazer isso. Estava escrito no contrato. Ela não estava ali para ser ciumenta ou possessiva. Apenas para apoiar 102


Patrick e os seus negócios, era melhor que não se esquecesse disso. Virando-se para longe dele, Lou sorriu para sua companhia, um jovem banqueiro chamado Charles que parecia encantado com ela. Era bom ser apreciada, Lou pensou. Bom encontrar um homem que não achava que garotas louras de pernas longas eram a companhia per feita. — Acho que devemos ir — Patrick se materializou ao lado dela, parecendo irritado. — O quê, já? — Lou perguntou surpresa. Eles tinham acabado de chegar. — Já ficamos o suficiente — disse ele. Charles parecia um tanto surpreso pela maneira que Patrick o olhava, e Lou os apresentou, descrevendo tom dificuldade Patrick como seu marido. Como não tinha motivo para permanecer ali, Charles se retirou. — Espero vê-la novamente — disse ele a Lou. — Eu também — disse ela, tentando aliviar o clima devido à grosseria de Patrick. — Foi muito bom conhecer você. De verdade. — "Foi muito bom conhecer você" — Patrick a imitou furioso ao guiá-la até a porta. — Por que você foi tão rude com ele? — ela perguntou, praticamente correndo para acompanhá-lo. — Eu não gostei da maneira como ele estava encarando você. Lou olhou para Patrick. — Encarando? Ele não estava me encarando! — Deixe disso Lou, o rapaz estava de olho no seu vestido! — Pelo menos ele me notou. — A paciência de Lou estava se esgotando ao entrar no carro que aguardava por eles no final da escadaria. — Foi muito mais do que você fez. Eu nem precisava estar lá, pelo tanto que você me notou. Patrick se inclinou e falou com o motorista, e em seguida fechou a janela entre a parte da frente e a de trás do carro com um puxão. — Claro que notei — disse ele. — Era difícil não notar a forma como você paquerava. — Eu não estava paquerando — disse Lou, cerrando os dentes. — Estava sendo agradável com os seus parceiros de negócios, como você me pediu para ser. Patrick sabia disso. Ele a observara a noite toda pelo canto do olho. Ela não era a mulher mais jovem naquela festa, nem a mais bonita, ou a mais bem vestida, mas tinha o estilo e a autoconfiança de uma mulher 103


madura, e um charme misterioso que atraía as pessoas à sua volta. Ele só não gostou da forma como os homens olhavam para ela com aquele vestido. Suspirando, Patrick passou a mão pelos cabelos. — Você está certa, sinto muito — disse ele. — Você fez um bom trabalho. Várias pessoas me disseram que você é muito charmosa. Você será um grande trunfo para mim. Mas preferiria que você não usasse mais este vestido — disse ele, tentando parecer engraçado sem conseguir. — Ouça, você me disse para comprar um vestido — disse Lou, com raiva. — Foi o que fiz. O que há de erra do com ele? — Nada. É apenas... — Apenas o que? — É muito perturbador — disse Patrick. — É o tipo ele vestido que passa a idéia errada. E de repente o clima mudou. Lou ficou impressionada com a velocidade com que ela mudava de raiva e frustração para uma prontidão elétrica. O ar entre eles parecia vibrar quando Patrick a olhou nos olhos e com voz grave acariciou a pele dela. — É o tipo de vestido que faz um homem querer arrancá-lo de você — disse ele com a voz suave. — Faz com que ele pense no que você está vestindo por baixo, na sua pele... Parecia que o ar ficara rarefeito. Incapaz de desviar o olhar dele, ela umedeceu os lábios. — Não era para o vestido fazer você pensar isso — ela disse. — Eu sei, mas faz. — Patrick afastou o cabelo dela do rosto, — Esse vestido me faz imaginar como seria beijar você. — Você deveria tentar vesti-lo — disse Lou, tentando fazer uma piada da situação. — Faria você imaginar muito mais que isso! — Ah, é? — O sorriso de Patrick brilhou no escuro. — Então deveríamos parar de imaginar e descobrir. Parte de Lou dizia que isso era uma péssima idéia, mas era difícil prestar atenção quando cada nervo em seu corpo a lembrava que era isso o que ela esperava há meses. Ela não aceitava a forma como seus dedos coçavam para tocá-lo cada vez que ele chegava perto. Ela não queria admitir o quanto queria correr suas mãos sobre os ombros dele, para sentir a força de seus músculos. O quanto ela queria se enterrar no corpo dele, ou se arrastar por cima dele, apertar os lábios em seu pescoço, beijar-lhe os cantos dos olhos, o canto da boca. O quanto queria vê-lo sorrindo enquanto o beijava. 104


O quanto ela desejava que ele a tomasse nos braços para a rolar embaixo dele, para fazer amor com ele até que se esquecessem de tudo, menos do clamor de seus corpos. E agora, aqui, no escurinho do carro, isolados do mundo lá fora, ela tinha a chance. Vá em frente, seu corpo dizia. Não ouça o seu cérebro! Lou fechou os olhos e se entregou à tentação. Ela nem ao menos hesitou quando Patrick se inclinou devagar na direção dela. Repleta de excitação, ela levantou as mãos até os ombros dele e as deixou flutuar sobre suas costas, descobrindo a força de seus músculos por baixo do paletó, enquanto a boca de Patrick tocava a dela. Entregando-se ao prazer, ao gosto e ao toque dele, ao seu cheiro, ela o beijou com força. Era maravilhoso abraçar aquele corpo forte, sentir suas mãos deslizando sobre ela, quente e insistente sobre o material delicado do vestido, fazendo-a perder o fôlego de tanta excitação, e ela tremia quando ele a beijava o pescoço. O coração dela acelerava, a pulsação era tão forte que levou alguns instantes antes de ela se dar conta de que o carro estava parado. — Estamos em casa — disse Patrick, a voz entrecortada dele penetrou em sua mente em turbilhão. Casa? Lou se esforçou para entender a palavra, tentando se lembrar de onde estava, o que estava fazendo, De alguma maneira, ela se viu do lado de fora. Patrick debruçava na janela do carro, dizendo algo para o motorista, e em seguida o carro partiu e os portões se fecharam silenciosamente. Patrick ainda girava de excitação. Há quanto tempo não beijava alguém dentro de um carro daquela forma. Se o motorista não tivesse batido na janela para avisar que haviam chegado...! Sorrindo, ele caminhou até Lou. Quem diria que um beijo poderia fugir ao controle daquela maneira? — — No seu quarto ou no meu? — disse Patrick. Espere. — Lou levantou as mãos para mantê-lo a distância. — Não tenho certeza se deveríamos fazer isso. — Não tem certeza? — Patrick não podia acreditar. — Você parecia muito certa naquele carro! — Eu sei, eu sei. — Ela estava tremendo, mas o ar clareara sua mente e ela pôde pensar nitidamente. — Não tente me dizer que não me quer — disse ele com raiva. — Não, não farei isso. — Lou respirou fundo. — Mas você precisa escolher, Patrick. Ou você fica comigo ou então com as suas louras, mas 105


não pode ficar com as duas coisas. Não vou dormir com você agora e depois deixar que você tenha outras namoradas. — Lou... — Patrick passou as mãos pelos cabelos. — Precisamos falar sobre isso agora? — Sim, precisamos — disse ela. — Preciso saber se você me quer o suficiente para deixar de lado a liberdade que queria tanto quando nos casamos. Patrick a encarou. Meu Deus, como ele a queria. Ele a desejava havia meses. Mas deixar de lado a liberdade? Amarrar-se ao compromisso e à fidelidade depois de um beijo? Como ele decidiria isso? A hesitação dele disse a Lou tudo o que ela precisava saber. — Bem, parece que já tenho uma resposta — disse ela, virando-se para entrar em casa. Sozinha.

Capítulo 9 Lou estava cuidando do jardim quando Patrick retornou do trabalho na noite seguinte. Foi a primeira chance que ele teve de conversar com ela a sós depois de ter sido deixado zangado e perplexo na porta de casa. — Sinto muito sobre ontem à noite — disse ele. Ela se apoiou em seus calcanhares e olhou para ele. — Você não precisa se desculpar — disse ela. — A culpa foi tanto sua quanto minha. Eu fiquei empolgada demais com aquele vestido, foi só isso. — Você estava certa em me parar — disse Patrick. — Teria sido um erro. — Ele hesitou. — Quero que continuemos amigos. — Claro — ela concordou instantaneamente. — Também prefiro assim. Ontem à noite... era só uma coceira que nós dois tínhamos vontade de cocar, mas isso só teria complicado tudo. Vamos esquecer o que aconteceu! — Ela abriu um sorriso fraco. — Não usarei aquele vestido novamente! Isso ajudaria, Patrick pensou. Mas ele não pensou direito nas chances de esquecer aquele beijo. Ele disse: — Estive pensando que eu deveria sair mais. Ver outras mulheres, como havia planejado. Lou arrancou uma erva daninha para esconder a pontada de decepção que sentiu. — Boa idéia — disse ela. 106


Era mesmo uma boa idéia. Ela chegara bem perto de se machucar na noite passada, e não se arriscaria do novo. — Você tem alguém em mente? — Bem, sim — disse Patrick. Ele encontrou o cartão que a jovem advogada lhe enfiara no bolso do paletó na recepção naquela manhã. Segurando o cartão, ele se lembrava dela vagamente. Alta, loura, muito atraente, segura de si. O cartão dizia que seu nome era Holly. Patrick não se lembrava disso. Tudo o que ele se lembrava era o desconforto ao perceber o interesse direto dela. Ela deveria ter visto a aliança de casamento no dedo dele. Ele apenas pegara o cartão porque recusá-lo daria mais trabalho. Holly não era muito o seu tipo, mas era inteligente, bonita e ambiciosa. Ela não lhe pareceu uma mulher que se importaria com compromisso emocional, ou com o fato de ele ser casado. Depois de uma noite sem dormir tentando se convencer de que tomara a decisão certa ao escolher sua liberdade em vez de Lou, Patrick pensou que Holly talvez fosse a mulher certa no momento. — Ótimo. — Lou abriu um sorriso brilhante, determinada a mostrar para ele que manteria seu lado do acordo de agora em diante. — Ela é uma pessoa legal? — Parece ser — disse Patrick, mas não conseguiu deixar de lembrar o que Lou dissera sobre ter um relacionamento com alguém preparado para dormir com um homem casado. — O nome dela é Holly — disse ele, tentando evitar a memória. — Um nome bonito — disse Lou arrancando outra erva. Ela estava de cabeça baixa e Patrick a olhava, desejando saber o que ela estava pensando. — Pensei em levá-la para jantar — disse ele. — Tudo bem para você? — Claro. — Lou jogou o cabelo para trás e sorriu. — Esse foi o nosso trato, não foi? Não se preocupe comigo. Estou mais que feliz com a forma como as coisas tem acontecido, Patrick. Fizemos um acordo e fico feliz por mantê-lo. Vá em frente. Divirta-se. Ele não se divertiu, claro. Holly era inteligente, bonita, bem-sucedida e pronta para um relacionamento sem compromisso. Exatamente o tipo de mulher que Patrick tinha em mente quando fizera o acordo com Lou. Ela não tinha a intenção de se comprometer antes de se projetar por si própria. Holly estava indo bem e não podia ser incomodada com compromissos emocionais que pudessem complicar sua vida. Ele deveria ter saído com mulheres como ela antes, Patrick disse a si 107


mesmo, mas quanto mais Holly falava sobre sua necessidade de independência, mais ele captava coisas que dissera a si mesmo no passado, e se mexia desconfortavelmente. Tinha uma qualidade inescrupulosa e fria que o incomodava. Será que era assim que ele aparecia para as outras pessoas? Ele levou Holly para o restaurante da moda, onde ela quase não mexeu na comida, e pensou em Lou. Ela devia ter comido com as crianças. Patrick pensava em como Grace teria se saído no seu teste de matemática enquanto Holly falava sobre a carreira que tinha planejado para si. Tom participara de um jogo de futebol naquela tarde, ele lembrou. Lou fora assistir. Patrick gostaria de ter ido. A noite parecia não ter fim. Ele levou Holly de volta para o seu apartamento, mas inventou uma desculpa quando ela o convidou para subir. Ele queria ir para casa. Lou já estava na cama quando ele entrou, mas deixara algumas luzes acesas para ele. Patrick andou pela casa, percebendo o quanto ela parecia calorosa e convidativa ultimamente. A mesa da cozinha estava coberta de livros escolares. Ele pegou o caderno de francês de Tom e sorriu ao ver os erros dele. Tom era um mecânico, não um lingüista. Havia um jarro de flores na janela da cozinha, e um aroma delicioso. Eles deviam ter jantado algo com queijo. Ele desejou ter estado ali em vez de ter tido àquele jantar elaborado e caro que dividira com Holly. Ele subiu caminhando levemente. A porta de Lou estava fechada. Hesitando do lado de fora, Patrick desejou que pudesse entrar e se sentar na beirada da cama.Eles poderiam conversar do jeito que conversavam, e ele contaria a ela sobre sua noite horrível e a sensação de ler feito tudo errado. Mas ele não podia fazer isso, não depois da noite passada. Ele fizera sua escolha, e agora devia arcar com ela. — Mãe, podemos viajar no feriado da escola? Lou embrulhava sanduíches e tentava não prestar muita atenção em Patrick lendo o Financial Times na cabeceira da mesa da cozinha. O clima entre eles estava difícil desde que ele começara a sair com Holly. Lou não sabia o que Patrick via na mulher, mas o relacionamento certamente não o deixava feliz. Ele estava irritado e brusco o tempo todo, Lou pensou. Era difícil manter a amizade que florescera tão facilmente naquele verão. Parte disso era culpa dela, Lou sabia. Ela tentava parecer bem com a situação, mas o esforço que fazia a deixava tensa, e a única maneira de 108


suportar tudo isso era fechando-se dentro de si. Lou passava muito tempo no jardim, mas o efeito positivo nela já não era o mesmo. Ela estava nervosa com as crianças também, o que não era justo com elas, e a culpa só fazia piorar II situação. — Achei que fôssemos ver Fenny — disse ela para Grace, colocando os sanduíches nas lancheiras. — Não a vemos desde o casamento. — Ah, mãe... — Grace reclamou. — Yorkshire de novo não! — É, podemos ir a algum lugar diferente? — Tom perguntou, com a boca cheia de cereais. Lou tentou manter a voz calma. — Vocês adoram Fenny — ela lembrou a eles. — Sim, mas ela podia vir aqui, não podia? — disse Grace. — Não precisamos passar a semana toda lá. É tão chato lá. Lou pensou nos morros verdes e no rio, a caminhada ao vento, a chuva e os bolos de Fenny. Pensou no ar puro e em necessidades simples sem Patrick a sufocá-la. Sem tentar convencer a si mesma que fora melhor evitá-lo naquela noite, e que era melhor serem apenas amigos. De repente, ela quis estar lá. — Não é chato, Grace — disse ela. — Se você fica entediada lá, o problema é seu e não de Yorkshire. Grace pareceu rebelde. — Índia vai para Majorca. E o pai da Marina disseque vai levá-la para Nova York! — Você também tem pai — disse Lou com certa irritação. — Peça a ele para levar você. — Eu pedi, e ele disse que era melhor se fôssemos com você. Soa mesmo como Lawrie, Lou pensou com amargura. — Ele disse ele que você pode mais do que ele agora — acrescentou Tom. Lou respirou fundo e se segurou. Ela tentou não criticar Lawrie na frente das crianças, mas quando pensou que com uma fração do dinheiro que ele gastara em seu novo carro esporte poderia levar Grace e Tom para viajar, ela queria gritar e dar um murro em alguma coisa. Ela soltou a raiva nas lancheiras, fechando-as com força. — Sinto muito, mas já disse a Fenny que iremos vê-la. As crianças disseram juntas: — Isso não é justo! — Se vocês não tomarem cuidado, não vamos a lugar nenhum — disse ela. — Vocês não perderão muita coisa. Tem uma piscina aqui! O 109


que mais vocês precisam? Tom e Grace se entreolharam. — Não é a mesma coisa — disse Tom. — E você pode pagar, mãe. Não foi por isso que se casou com Patrick? Percebendo que Lou estava perdendo a paciência, Patrick abaixou o jornal. — Já chega — disse ele com a voz severa. — Mas, Patrick, você também quer viajar, não quer? — disse Grace. — Patrick precisa trabalhar — disse Lou, sem querer envolver Patrick. — Ele deve estar muito ocupado no final de outubro. E agora tinha Holly para mantê-lo em casa. — Eu poderia tirar uma folga — disse Patrick. Ele olhou para Lou. Ela não lhe dissera nada sobre feriado escolar, ele se deu conta. Talvez ela não quisesse que ele fosse com eles? — Lou? — disse Patrick. — Talvez encontremos uma solução para isso. Ela se virou, limpando as mãos numa toalha. — Que tipo de solução? — Por que você não vai ver Fenny sozinha? Não há por que você não ir na semana que vem, se quiser. Eu fico com as crianças. E, então, talvez possamos todos viajar no feriado. — Oh, sim! Sim! Por favor! — Grace e Tom ficaram extasiados, mas Patrick levantou uma das mãos. — Primeiro quero saber o que sua mãe pensa. Lou sentia-se partida ao meio. Parte dela desejava viajar sozinha, mas não havia nada no acordo sobre Patrick ficar com as crianças. Ele não queria nada com as crianças, a princípio, mas agora oferecia não só cuidar delas, mas também viajar com elas por uma semana, que Lou sabia que ele não aproveitaria. — Isso parece exigir muito de você — disse ela. — Não mesmo. — Ele deu de ombros. — Fico feliz em poder fazer isso. Só não quero passar por cima da sua autoridade. Se você achar que Tom e Grace devem ir com você para Yorkshire, então é isso que vai acontecer, sem mais conversa. Estava apenas sugerindo um acordo. Ele oferecia a ela uma saída do que se tornaria uma verdadeira fogueira dos desejos, Lou pensou. Essa não era a hora de afirmar sua dignidade. Isso só complicaria as coisas. 110


— Parece um bom acordo — disse ela. Grace e Tom ficaram muito felizes e logo começaram a fazer pedidos conflitantes para o feriado. — Tudo bem, vai ser assim — disse Patrick, acalmando-os. — Vocês dois saiam daqui e decidam que tipo de viagem querem. Escolham um país a três horas de vôo de Londres, e o que querem fazer quando chegarem lá, e todos iremos passar uma semana lá. — Podemos escolher? — Eles quase não conseguiam acreditar na sorte deles. — Só se pararem de amolar sua mãe — ele avisou, e as crianças concordaram ao se levantar e pegar suas mochilas. — Legal, Patrick. — Muita gentileza a sua — disse Lou quando eles saíram. Patrick dobrou o jornal com muita ênfase. — Tudo por uma vida tranqüila — disse ele. — Mesmo assim... — Ele olhou para cima e seus olhares se cruzaram pelo que parecia ser a primeira vez em semanas. — Você parece cansada— disse ele rispidamente, sem gostar do olhar dela. — Não tenho dormido bem ultimamente — ela admitiu. — Não sei por quê. Ainda que isso provavelmente tivesse a ver com o fato de Patrick estar saindo com outra mulher e Lou teoricamente não se incomodasse. — Você precisa mesmo de um descanso — disse Patrick, e a preocupação e o calor em seus olhos fizeram com que ela quisesse chorar. — Parece uma ótima idéia — ela admitiu. — Mas não sinto que mereço. Não que eu tenha tido uma vida dura aqui. — Vá e aproveite o feriado. Imagino que Fenny queira ver você sozinha. — Mas não posso deixar as crianças — disse ela, lutando com a tentação. — Alguém precisa estar aqui quando eles retornam da escola. — Posso fazer isso por alguns dias. Tenho um computador aqui. Posso fazer muitas coisas daqui de casa mesmo. — E as refeições? — Lou perguntou. — Não sou completamente imprestável. Posso descascar um tomate e usar o microondas. Eles não terão as refeições que você prepara, mas não morrerão em alguns dias. Daremos conta. Lou pensou que Tom e Grace provavelmente adorariam passar uma 111


semana sem ter que comer frutas frescas e legumes o tempo inteiro. — E Holly? — ela falou, e Patrick ficou imóvel por um momento enquanto encolhia os ombros dentro do seu paletó. Ele saíra com Holly mais uma vez. Eles foram à ópera numa noite, mas o programa não fora um sucesso maior do que o primeiro, e ele se pegou incomodado com a indiferença dela com o fato de ele ser casado. Quando ele inventou outra desculpa para deixá-la na porta, ela riu sarcasticamente. — Engraçado, eu não tive a impressão de que você fosse do tipo controlado pela esposa. Ela é muito brava, sua esposa? Patrick ficou furioso por Holly ter mencionado Lou. — Ela vale mil de você — disse ele friamente. Holly sorriu com um ar calculado e atraente e chegou perto dele, correndo a mão por sua lapela. — Então por que está aqui? — Patrick removeu a mão dela. — Não sei — disse ele. Agora ele olhava para Lou, ainda sentada à mesa da cozinha com os olhos cansados e a expressão preocupada. Ela pareceria um trapo comparada com Holly hoje. Holly era mais inteligente, esperta, bonita, mas Lou era calorosa, carinhosa e mais amável. — Não precisa se preocupar com Holly — disse ele. Lou partiu para Yorkshire dois dias depois. Patrick sentiu muito a falta dela. Ele vivia procurando por ela, esperando virar-se e vê-la. Ele se sentia agitado e desconfortável, sem conseguir se concentrar no trabalho. Era como se ele estivesse esperando e esperando por algo, sem saber o quê. O que quer que fosse, ele só queria que chegasse logo. Ele odiava se sentir daquela maneira. Patrick tinha orgulho de sua habilidade de manter o foco. Afinal, esse era o segredo de seu sucesso. Ele sempre identificava aquilo que queria, e ia buscar. Agora, ele nem ao menos sabia o que queria. Só se fosse a volta de Lou o que desejava. A casa estava vazia sem ela, mesmo com Tom e Grafe por perto. Eles pareciam aceitar a ausência de Lou melhor do que ele, e estavam cheios de planos para o feriado, discutindo calorosamente qual resort teria mais atrações para eles. Patrick fazia-os telefonar para Lou toda noite. Ele achava que Lou gostaria de saber notícias deles, mas no fundo ele fazia isso por outras razões. Ele sempre aparecia com uma desculpa para pegar o telefone quando as crianças terminavam de falar para ouvir a voz dela. Ela estava se divertindo bastante, ela disse. Ela e Fenny cuidavam do jardim, e Lou saía para longas caminhadas sozinha. Ela se sentia muito 112


melhor. O clima estava perfeito. Se não fosse pelas crianças, ela ficaria lá para sempre. — Acho que eles sentiriam sua falta — disse Patrick. Eu sentiria. — Eles me pareceram muito bem — disse Lou, e ele pôde perceber o sorriso dela pela voz. — Mas acho que é melhor voltar para casa e deixar você trabalhar. Vejo você na sexta. Patrick não agüentava esperar. Ele se pegou olhando para o relógio e calculando quantas horas até o momento de vê-la novamente. Patético. Qualquer um pensaria que ele estava apaixonado por ela. Qualquer um pensaria que ele estava apaixonado por ela. Ele rebobinou mentalmente e tocou esse pensamento de novo mais vagarosamente até que a verdade entrasse em sua mente. Claro que qualquer pessoa pensaria isso. Eles pensariam porque era verdade. Ele estava apaixonado por Lou. Como isso fora acontecer? Apaixonar-se por Lou não estava nos planos. Patrick permaneceu sentado, atônito pela sua própria falta do compreensão. Oh, ele apreciava a ironia. Depois de todos esses anos evitando o amor, o compromisso, fugindo das garotas bonitas que tentavam se aproximar demais, a única mulher que queria era uma de meia-idade e mãe de dois filhos. Uma mãe de meia-idade que só queria ser sua amiga. Nunca vou me apaixonar de novo, ela dissera. Lawrie a machucara muito. Ela não queria amar de novo. Amá-lo como ele a amava exigiria muito dela, Patrick pensou, especialmente levando em consideração o acordo que fizeram. Então, ele não diria nada a ela, ainda. Ele tentaria recuperar aquela amizade que haviam perdido desde o beijo na limusine. Ambos tentavam, mas não era o mesmo, e ambos sabiam. Mas isso podia mudar. E quando fossem amigos de novo, ele diria a ela que não queria mais sua preciosa liberdade. E que só queria ela. Afinal, Lou era sua esposa. Certamente, ele poderia dizer isso. Junto de Tom e Grace, Patrick planejou um jantar especial para receber Lou na sexta. Grande parte era comida pronta, é verdade, mas eles escolheram cada prato cuidadosamente, prepararam a mesa e acenderam as velas. — Temos até salada para você, mãe — disse Tom. Lou olhou para os três e sua garganta apertou tanto que ela teve vontade de chorar. — Está tudo lindo. Obrigada. 113


— Sentimos sua falta — disse Grace. — Não sentimos, Patrick? — Sentimos. — Patrick ficou maravilhado ao perceber como sua voz estava calma. Por dentro, ele se sentia como um menininho. O peito dele doía quando ele via o sorriso dela, e estava tão feliz por vê-la que quase não podia falar. Lou estava feliz por estar de volta. Ela aproveitara bastante o tempo com Fenny e se sentia restaurada pela semana fora. Ela pensara bastante em suas longas caminhadas, e sabia como chegara perto de se apaixonar por Patrick. Patrick nunca fingira amá-la, ou que havia uma chance de amá-la. Ela fora estúpida por esquecer o quanto doera quando se deu conta de que Lawrie não a amava mais. O mundo dela desabou, e ela não deixaria que isso acontecesse de novo. A dorzínha que sentiu quando ele contou a ela sobre Holly era apenas uma prévia do que estava por vir, e Lou não suportaria isso. Ela fora longe demais. Ela podia parar agora, selar seu coração e não se deixar sentir nada por ele além de amizade. E assim foi. Lou não pensou que seria fácil, mas sabia que conseguiria. Morar com Patrick complicaria um pouco a questão, mas ela não podia largá-lo. Grace e Tom estavam muito felizes. Eles não apenas aceitaram Patrick, eles gostavam dele, e ele gostava deles. Lou não faria nada para prejudicar essa amizade. Seus filhos já haviam passado por muitas confusões na vida. Mas tinha que se proteger, então, voltaria a ser amiga de Patrick, tal como prometera. Sem ficar acordada à noite imaginando o que ele e Holly estavam fazendo. Sem desejar o impossível. O seu coração não aceleraria mais quando ele entrasse no quarto, Lou prometeu a si mesma. Ela nem ao menos pensaria em tocá-lo, abraçá-lo, beijá-lo. O coração dela já estava bem cicatrizado. — Sinto muito por estar tão tensa antes de viajar — disse ela a Patrick naquela noite depois de Tom e Grace irem para a cama. — Você parece bem mais relaxada agora — ele comentou, ao pensar em como o mundo parecia tão melhor só porque ela estava do outro lado da mesa. — E estou — disse ela. — Andei pensando bastante. — Sobre o quê? — Sobre nós. Nosso casamento. — Oh? — As entranhas de Patrick se reviravam em antecipação. Era possível que ela tivesse mudado de idéia também? 114


— Eu me dei conta de como nossa amizade é importante para mim — disse Lou. — Acho que fiquei com um pouco de ciúme da Holly — ela admitiu, — mas sei que a amizade é muito mais importante do que um relacionamento físico. Só queria que você soubesse que não ficarei tensa daquele jeito quando você sair com ela ou com qualquer outra pessoa. Essa parte da sua vida não tem nada a ver comigo, e quero que continue assim. Certo, então sem mudança de idéia. Patrick tentou esconder o desapontamento. — Ótimo — disse ele. Lou se levantou e sorriu para ele. — Acho que nunca lhe agradeci por tudo que tem feito por nós, Patrick — disse ela. — Você nos deu um lugar maravilhoso para morar. As crianças estão felizes. Graças a você, Fenny e eu tivemos uma ótima semana juntas. — Ela apontou para as velas. — E agora esse jantar adorável. Sentado em sua cadeira, Patrick fechou os olhos e respirou a fragrância do perfume dela enquanto ela beijava-lhe o rosto. — Obrigada — disse ela. — Esta é a única maneira como lhe beijarei agora, para você não ter que se preocupar com problemas emocionais. Estou feliz por não termos ido para a cama naquela noite. E melhor sermos amigos, não é? O que ele poderia dizer? — Sim — disse Patrick, com uma voz estranha. — Muito melhor. — Então, como andam as coisas entre você e Patrick? — Marisa perguntou algumas semanas depois. Ela estava sentada à mesa da cozinha, lixando as unhas, enquanto Lou preparava o jantar. Eles sairiam juntos logo que Patrick chegasse. — Bem — disse Lou. — Muito bem, na verdade. Estavam mesmo muito bem, ela pensou. A escolha de Tom e Grace de passar o feriado em Majorca fora um grande sucesso, e Patrick participava de tudo com muita boa vontade. Em casa, ele parecia não sair muito, de tal maneira que eles quase recuperaram o companheirismo dos bons tempos. Quase, mas não completamente. Nem uma vez, através de palavras ou olhares, Patrick sugerira que queria mais do que apenas amizade. Às vezes, Lou ficava em dúvida se tinha sonhado com aquele beijo selvagem e apaixonado na limusine. Nessas circunstâncias, ela devia ser capaz de relaxar por completo, mas ainda era incapaz de evitar a contração instintiva de seus músculos cada vez que o via, ou a mudança de clima quando ele 115


entrava na sala. Concentre-se, Lou se lembrava quando se percebia notando demais. — Ainda naquela de apenas amigos? — Marisa perguntou. — Sim. Por quê? — Nada de mais. Eu vi o seu rosto quando Patrick chegou no outro dia, só isso. — Que dia foi esse? — Você sabe, no aniversário de Grace. — Ah. — Lou revirou a geladeira para evitar os olhos de Marisa. Apesar de sua amiga parecer que só se preocupava com a aparência dela, não deixava passar nada. Patrick voltara do trabalho naquela noite chuvosa de novembro e encontrara a cozinha cheia de calor, luz e risos. Grace havia convidado suas três amigas mais próximas e elas insistiram em fazer panquecas em vez de uma festa de aniversário tradicional. Havia farinha e respingos de panqueca por toda parte. Lou ficara supervisionando. Marisa, no seu papel de madrinha, estivera bebendo champanhe longe da massa das panquecas arremessadas para o ar. Todos riam muito quando Patrick chegou. — Patrick, venha aqui, faça uma panqueca — Grace insistiu, puxandoo para perto da mesa. — Deixe-o tirar o casaco, Grace — Lou protestou. Patrick foi forçado a tirar o casaco e arregaçar as mangas. — Nunca fiz isso antes — disse ele ao desafrouxar a gravata. — É bem difícil — disse Tom. — Mamãe sabe fazer, mas nós somos inúteis para isso. — Eu fiz — Grace respondeu de imediato. — Quase. Mas mostre a ele mãe — disse ela. Então Lou mostrou a Patrick como despejar a massa e balançar a frigideira e esperar pelo momento certo antes de girá-la rapidamente, arremessando a panqueca no ar. Ela estava de pé bem próxima a ele, perto o suficiente para sentir o cheiro distinto dele. Perto o suficiente para ver a textura de sua pele, o jeito como seu cabelo crescera e a barba despontando em seu rosto, perto o suficiente para contar as linhas em volta de seus olhos. Ficou difícil respirar ali por um instante. Patrick fez uma expressão engraçada e jogou a panqueca, pegando-a 116


de volta com a frigideira. Ele se virou e se curvou brincando para receber os aplausos. — Você conseguiu! — As crianças ficaram impressionadas. — Sorte de iniciante — Patrick explicou e olhou para Lou com um sorriso nos lábios. — E uma boa professora! Ele dera a Grace botas de neve como presente de aniversário. Era para ela levar em sua viagem à estação de esqui que tanto queria e agora estava confirmada. Lou se lembrou de como o rosto de Grace se acendera na manhã em que ela ganhou o presente, da forma como beijara Patrick para agradecer. Ela o viu rindo com as crianças enquanto elas insistiam que ele comesse a panqueca que fizera com tanto sucesso. Grace jogou o açúcar enquanto Tom se apoiava no ombro de Patrick, e o coração de Lou se apertou ao vê-los juntos. E, claro, Marisa também viu. — Por quanto tempo você vai conseguir levar essa farsa de que não o ama? — disse Marisa. Houve uma pequena pausa. — Eu não o amo — disse Lou. Marisa suspirou. — Lou. Olhe para mim. — Com relutância, Lou olhou pura sua amiga. — Agora diga isso de novo. — Eu não quero amá-lo — disse Lou, abandonando o imitar para se sentar à mesa de frente para Marisa. — Quero que as coisas fiquem como estão. Quero que selamos amigos. — Se ela dissesse isso muitas vezes, passaria a acreditar. — Amigos não é suficiente quando você olha para um homem da forma como você olhou para Patrick — disse Marisa. — É melhor do que se machucar. — Lou, Patrick não é Lawrie. Imagino que ele seja um cabeça-dura e difícil na maioria das vezes, mas ele é um homem bom. E ele ama você. — Não ama. — Claro que ama. Deus do céu, é tão óbvio! Honestamente, Lou, é difícil de acreditar que vocês demorem tanto para entender. O homem não tira os olhos de você. — É mesmo? — Lou ficou dividida entre descrença e esperança. — Sim, e já passou da hora de você fazer alguma coisa. Você está casada com um homem bom a quem você ama e que ama você. Por que está perdendo tempo assim? — Não quero arriscar o que temos — ela tentou explicar. 117


— Então você é uma boba — disse Marisa. — Claro, bom ser amigos, mas você tem outros amigos. Você pode ter Patrick como amante também. Você pode te um casamento de verdade. Ela suspirou ao ver Lou ainda incerta. — Você já falou bastante sobre querer que Tom e Grace crescessem com um bom exemplo de relacionamento, Lou. Bem, dê isso a eles! Não desperdice sua vida com medo de que ele vá machucar você como Lawrie o fez. Não há garantias em relacionamentos, e acho que você terá que trabalhar nisso, mas me parece que um casamento forte e cheio de amor valeria o risco e o esforço. Valeria. Claro que valeria. Mas somente se Patrick também quisesse isso, e Lou não tinha certeza se ele queria. Ele já escolhera a liberdade em vez dela, antes. Ela tentou explicar para Marisa. — Mas eu passei tanto tempo insistindo que queria ser apenas uma amiga, que não saberia como dizer a ele que mudei de idéia. — Você pode mandar as crianças para a cama mais cedo e descer de cinta-liga e meia-calça, salto alto e uns lacinhos — disse Marisa. — Ele entenderia. — Não posso fazer isso! — Lou ficou ruborizada ao pensar na cena. — Envergonharia Patrick. — Marisa sorriu. — Faz muito tempo desde a última vez que esteve com um homem, não faz, Lou? Claro que ele não ficaria envergonhado. Ele estaria ocupado demais pensando em como era um homem de sorte! E Patrick me parece um homem que gosta dessas coisas. Eu vi como ele ficou olhando para sua roupa no casamento. — Não vou sair por aí de cinta-liga! — Bem, então, você vai ter que recorrer à última opção num relacionamento em crise. — O que é isso? — Conversa — disse Marisa. — Odeio ter de explicar tudo a você, Lou, mas vocês dois já são grandinhos. Pelo amor de Deus, senta e conta para ele o que você está sentindo! Fácil para Marisa falar, Lou pensou na noite seguinte enquanto esperava pela hora de mandar Tom e Grace para a cama. Quando ela e Patrick estavam finalmente a sós, ela estava tão indecisa que quase não conseguia ficar sentada. — Eu estive... pensando se poderíamos conversar —

disse ela, 118


contorcendo-se por dentro ao ouvir-se. Ela soava como se estivesse chamando o novato do escritório para uma conversa sobre pontualidade. — Claro. — Patrick pareceu surpreso pelo tom formal dela. — É sério? — Não... bem, sim... de certa forma... — Lou perdeu o fio da meada. — Vamos tomar uma bebida? — Boa idéia. — Ela certamente precisava de uma. Quando Patrick trouxe um uísque para ela, ela tomou um gole em busca de coragem. Depois de um momento de hesitação, ele se sentou no outro lado do sofá. — O que foi, Lou? — Lou limpou a garganta. — Bem, só estive pensando... isto é... bem, não, é o seguinte... — Oh, Deus, como se pede ao próprio marido para fazer amor com você? Ela ainda estava em dúvida sobre como colocar o assunto, e começando a achar que teria sido mais fácil optar pela cinta-liga e pela meia-calça, quando o telefone tocou. Foi a distração perfeita. Lou se levantou para atender, mas ao ouvir a voz do outro lado da linha, ficou pálida. — Lou? — Patrick se levantou preocupado enquanto ela desligava o telefone. — O que houve? — Fenny — disse ela com uma voz que parecia pertencer a outra pessoa. — Ela teve um derrame.

Capítulo 10 Lou quis sair imediatamente. — Preciso ir para o hospital — disse ela, andando de um lado para o outro na sala, desesperada, tentando decidir o que fazer. — Se eu pegar um táxi até a estação, talvez ainda consiga pegar o trem... Terei de contar para as crianças... Talvez eu as leve comigo, mas é tarde demais para acordá-las... Nervosa, ela olhou para Patrick. — O que você acha? — Acho que deveria se sentar e beber isso — disse Patrick, enchendo o copo dela de uísque. — Você não vai a lugar nenhum esta noite. — Mas preciso ver Fenny! — Ela protestou enquanto ele a levava gentilmente para o sofá e se assegurou de que os dedos dela estavam 119


firmes em volta do copo. — Não há nada que você possa fazer hoje, Lou. Mesmo que pegue o último trem para o norte, você não conseguirá pegar a conexão até Skipton. Acordamos cedo amanhã e levo você de carro até o hospital. Se sairmos às cinco, chegaremos lá às nove. — Mas você tem reuniões... — Ele deu de ombros. — Reuniões podem ser remarcadas. Lou se sentiu tremer e teve vontade de chorar. — E Tom e Grace? — Ligaremos para Marisa num minuto. Ela vem e cuida das coisas aqui. — Patrick sentou-se próximo a Lou e balançou a cabeça em direção ao uísque. — Beba isso. Vai equilibrar você. Obediente, Lou provou, engasgando um pouco enquanto aquele líquido quente descia-lhe pela garganta, — Melhor? O calor espalhava-se pela garganta dela e se assentava no estômago, e Lou se sentiu mais tranqüila, como ele dissera. — Sim. Desculpe. Eu pareço não estar pensando claramente. — Não precisa pensar em nada agora. — Ele pego a mão dela. — Eu resolvo isso. Agora, diga-me o que vizinha de Fenny lhe disse. A mão quente e firme de Patrick era muito confortante, mas tornava difícil ser forte. Lágrimas se formavam nos olhos de Lou e ela tentava segurá-las. — Ela não sabia de muita coisa. Ela apenas apareceu na casa de Fenny para colher flores para a igreja e encontrou caída no chão da cozinha. Ela chamou uma ambulância e foi com eles até o hospital, pois não havia mais ninguém. — Lou respirou fundo. — Ela me disse que os médicos disseram que a situação não era muito boa. Ela olhou para Patrick. — Fenny é minha fortaleza — disse ela, tentando manter a voz sob controle, sem muito sucesso. — Não posso perdê-la. Seria como perder minha mãe de novo. — Eu sei — disse ele, apertando ainda mais a mão dela. — Eu sei. Com grande esforço, Lou se recompôs. Ela deixou o copo de uísque e passou os dedos no olhos para parar quaisquer lágrimas de rolarem pelo seu rosto. — Não posso ser assim — disse ela. — Tenho que ser forte. 120


Patrick soltou a mão dela e puxou-a para os seus braços. Não era a maneira como ele gostaria de segurá-la, mas agora ela precisava ser segurada como uma criança e não como uma mulher, e depois de um momento de resistência ele sentiu-a enfraquecer e se virar instintivamente para ele. — Não precisa ser forte esta noite — disse ele, encostando o rosto nos cabelos sedosos dela. — Estou aqui. Fenny parecia muito pequena e frágil na cama do hospital. Ela sempre fora tão ativa que Lou nunca a vira como uma idosa. Ela parecia velha agora. Com um buraco no peito, Lou sentou-se ao lado da tia e segurou suas mãos, desejando que ela melhorasse. Mas Fenny não melhorou. Num dado momento ela abriu os olhos e viu Lou sentada e desesperada ao lado dela. — ... Lou — ela balbuciou. — Sim, Fenny, sou eu, Lou. Estou aqui. Fenny tentou dizer algo mais, e Lou chegou mais perto para tentar entender. — Patrick? — Ela adivinhou, e Fenny conseguiu balançar a cabeça levemente, concordando. — Patrick está comigo. Ele está lá fora. Olha, aqui está ele — disse ela, virando-se ao ouvir a porta se abrindo. Patrick se aproximou da cama para que Fenny pudesse vê-lo. Ele estava falando com a enfermeira que lhe disse que Fenny estava piorando rapidamente. — Olá, Fenny — disse ele, com a voz tão normal, tão segura, que Lou quis chorar de novo. Engraçado como ele podia fazer as coisas ficarem tão bem apenas por estar ali. Fenny lutou para dizer algo mais, seus olhos tentavam mandar uma mensagem urgente enquanto oscilavam entre ele e Lou. De repente, Patrick se deu conta do que ela queria. Ele pôs a mão no ombro de Lou. — Não se preocupe, Fenny — disse ele. — Toma conta de Lou. Eu prometo. Foi fácil perceber o alívio nos olhos de Fenny, e um lado de sua boca tentou sorrir. Visivelmente relaxada, ela dormiu. Ela morreu cerca de uma hora depois, em silêncio com Lou segurando sua mão. Patrick cuidou de tudo. Ele conversou com as enfermeiras e fez todos os arranjos, enquanto Lou permanecia sentada, incapaz de admitir que 121


Fenny havia morrido. Então, ele guiou-a para fora do hospital e colocou-a no carro. Ele não tentou fazê-la falar. Apenas quis ter certeza de que o carro estava quente, e dirigiu com ela até a casa de Fenny, onde acendeu a lareira e fez chá, e em seguida a segurou nos braços quando ela começou a chorar. Ele deixou-a chorar até a exaustão, e então levou-a para o andar de cima e a colocou numa cadeira enquanto arrumava a cama para ela. Amortecida de tanta dor, e com os olhos inchados de tanto chorar, Lou continuou sentada enquanto ele limpava-lhe o rosto com um lenço e ajudava-a a tirar as roupas. Nos dois dias seguintes, ele estava por toda parte, lidando com todas as situações, gentilmente fazendo-a comer, abotoando seu casaco e levando-a para uma caminhada, limpando a lareira e preparando-a para que pudesse acendê-la logo que Lou entrasse. E, gradualmente, Lou começou a se sentir melhor, melhor o suficiente para sentir uma dor imensa quando Patrick disse que voltaria para Londres. — Eu vou buscar Grace e Tom — disse ele. — Eles gostariam de estar aqui para o funeral. Estaremos aqui amanhã. — Ele hesitou, olhando para Lou preocupado. — Você ficará bem aqui sozinha por uma noite? — Sim, ficarei bem — disse Lou. — Estou bem agora. Mas ela sentiu muita falta dele quando partiu. Estou me apoiando nele, ela pensou, vendo o Porsche sumir de vista. Fazia tanto tempo que ela não se deixava apoiar em ninguém que ela se sentia estranha. Estranha e indescritivelmente confortada. Eles enterraram Fenny num dia claro de inverno. As silhuetas das árvores podiam ser vistas contra o céu azul, e o ar frio trazia cor para as bochechas de Grace. Lou segurou a mão dela e Patrick ficou ao lado dela, com a mão no ombro de Tom. Lou assistiu desolada enquanto o caixão de Fenny era colocado na cova ao lado do marido. Fenny estivera presente quando os pais de Lou morreram, quando Lawrie a deixara, nos momentos ruins e nos bons. Viúva por 35 anos, tinha apenas 49 quando Donald morrera. Não muito mais velha do que Lou agora. Lou se sentiu mal ao pensar nisso. Como se sentiria se perdesse Patrick? Se ela tivesse que passar 35 anos desejando que tivesse aproveitado ao máximo o tempo que tiveram juntos, como Fenny e Donald fizeram, em vez de fingir que não se importava, e que não importava se Patrick não a amava da forma como ela o amava? 122


Ela olhou para Patrick, de pé, forte e seguro ao lado dela, oferecendo conforto ao seu filho, e ela se lembrou de como Fenny ficara ansiosa por vê-lo, e com ela relaxara com a promessa dele. Eu cuidarei dela, ele dissera. Era claro que ele também a amava? Como Fenny ele estivera por perto quando ela precisara. Pela primeira vez, Lou não teve que lidar com tudo sozinha. Patrick tomou conta de tudo. Ele não teria feito tudo isso ao menos que a amasse, não é? A única pergunta era como ele a amava. Ele a amava como uma amiga querida ou como esposa? Ela teria que descobrir isso, Lou pensou. Não agora, enquanto estavam tristes pela morte de Fenny, mas logo. Marisa estava certa. Esse casamento não podia continuar assim. Ser amigos não era suficiente, e Lou teria que fazer algo para mudar isso. Patrick levou Grace e Tom de volta para Londres no dia seguinte. Lou ficaria por mais alguns dias para separar as coisas de Fenny e falar com o procurador dela para resolver os assuntos pendentes, mas as crianças tinham de voltar para a escola, e Patrick tinha algumas reuniões urgentes que não podia mais adiar. — Venho buscar você no próximo fim de semana — disse ele a Lou ao fechar o bagageiro do carro. Ela se despedira de Tom e Grace, e esperou o carro sair, abraçando-se para se proteger do frio. — Não tem necessidade de você cruzar o país dessa maneira — disse ela. — Posso pegar o trem de volta. Patrick abriu a porta do carro. — Estarei aqui na sexta à noite — disse ele, como se Lou não tivesse dito nada. Ela já estava se acostumando com os cuidados de Patrick, Lou pensou sentindo um pouco de culpa. Mas era um sentimento bom. — Obrigada por tudo, Patrick — disse ela. Ele hesitou e voltou para beijá-la no rosto. — Cuide-se — disse ele. Um beijo no rosto, só isso? Isso mudaria. — Dirija com cuidado — disse Lou ao abraçá-lo. Ela poderia ser amiga. Por enquanto. O que ela precisava era de um plano de ação. Lou acenou até o carro sumir de vista, e virou-se para entrar na casa. Lá dentro, a lareira estava apagada, mas preparada para ela acendê-la. Patrick devia ter feito isso de 123


manhã enquanto ela tomava banho. Ela procurou pelos fósforos na armação da lareira. Agachada, acendeu um fósforo e segurou um pedaço de papel, vendo o fogo oscilar e se alastrar na lareira. Como os sentimentos dela por Patrick. Era difícil lembrar-se de como ela estivera desinteressada por ele quando se conheceram. Três meses trabalhando juntos, e ela não havia notado sua boca, suas mãos, ou a maneira como seus olhos se acendiam quando ele ria. Então aquela noite em Newcastle. Aquilo fora uma faísca. E em seguida o beijo na limusine. Aquilo, com certeza, fora uma labareda. Agora Lou queria um incêndio. Patrick tinha sido tão bom nos últimos dias. Ela pensou naquela noite quando voltaram do hospital e encontraram a casa de Fenny vazia. A bondade e a gentileza dele eram tudo o que ela precisava naquele momento, mas não mais agora. Ela queria que ele a levasse para a cama de novo, mas dessa vez ela queria ser tratada como mulher, não como amiga. Queria que ele a desejasse, não fosse apenas gentil, queria ele quente e não caloroso, mas ele não seria enquanto continuasse a ser apenas amigos. O casamento deles era como a lareira que Patrick preparara para ela nessa manhã, Lou pensou. Tinha tudo o que era preciso para queimar, mas agora estava fria, perfeitamente preparada, precisando apenas de um fósforo para acendê-la. E ela acenderia quando Patrick voltasse. Patrick estacionou o carro do lado de fora da casa. Era tarde, mas ele não queria esperar mais um dia para ver Lou. As luzes estavam acesas na casa, brilhantes e acolhedoras no meio daquela escuridão e da chuva. A porta da frente se abriu e Lou apareceu. Patrick sentiu a tensão dentro de si desaparecer ao vê-la. Fora uma viagem complicada por causa da chuva, do vento e dos engarrafamentos, mas valia a pena chegar em casa e encontrar Lou sorrindo. Ele falaria a ela sobre os seus sentimentos. Patrick decidira durante a viagem. Ele só não tinha certeza se era o momento certo — afinal, não fazia muito tempo que Fenny morrera, — mas ele não pediria nada a Lou nem faria alguma exigência. Ele daria a ela todo o tempo que ela quisesse. Ele só precisava dizer que a amava, só isso. Vestindo sua capa de chuva, ele pegou a mala e correu até a aporta. 124


— Olá. — Lou se afastou e o deixou entrar, e Patrick ficou tímido de repente ao sacudir a água da chuva de sua capa. O que estava acontecendo? Ele nunca fora tímido na vida. Era apenas Lou. Sua esposa. Ela estava tão linda, com aqueles olhos e cabelos negros. Ela estava vestida com uma blusa vermelha e uma saia até o joelho que o lembravam daqueles terninhos que ela usava quando era sua assistente, os mesmos com os quais ela podia ou não estar usando uma cinta-liga. O peito de Patrick doía apenas de olhar para ela. Mas havia algo nela que o fez hesitar. Não era timidez, ele pensou. Era medo de ela não o querer da maneira como ele a queria. Ele teria que ter muito cuidado — Deixe-me pegar isso para você. — Lou pegou a capa dele e pendurou-a num gancho. Ela estava nervosa. Ela pensara muito sobre tudo isso, e agora tinha um plano. Mesmo se não tivessem sido interrompidos por aquele telefonema fatídico, Lou sabia que teria bagunçado tudo ao conversar com ele. Era muito difícil encontrar as palavras certas. Então, agora ela tentaria a sugestão de Marisa. Ela seduziria o próprio marido. Tudo o que precisava fazer, Lou pensou, era acumular alguma tensão sexual, do tipo que cruzava aquela mesa de restaurante em Newcastle. E então era uma questão de não assustá-lo. Ela precisava ser sexy, mas sutil. Ela já criara um clima íntimo na sala de estar com o sofá próximo à lareira, e um único abajur adicionando um brilho quente à luz da lareira. O único problema era o seu traje. Ela não tinha nada sexy consigo. Isso fora a última coisa em sua mente quando arrumou as malas na noite em que ficara sabendo do ataque de Fenny. Aquele conjunto foi o melhor que conseguira. Não era nada como o vestidinho gracioso e brilhante que escorregaria de seus ombros com o toque dos dedos dele. Mesmo assim, aqueles vestidinhos não eram o ideal para abrir a porta numa noite como essa, ou para ficar em cozinhas frias. Uma vez ali, tudo ficaria bem. Ela sentaria próxima a Patrick e chegaria cada vez mais perto. Ela passaria os dedos pelos cabelos dele, olharia bastante nos olhos e umedeceria os lábios. Ela vira isso na TV, e sempre funcionava. E, então — Lou não sabia bem como isso aconteceria, eles se beijariam, e... o fósforo acenderia o fogo! Era um plano bom, mas sua imagem desejada de sedutora misteriosa foi imediatamente abalada quando Patrick entrou em casa, a proximidade dele deixava-a tonta, tornando difícil se lembrar de seu plano, fazendo-a 125


querer pular em cima dele e dizer que morreria SE ele não fizesse amor com ela, bem ali, próximo nos casacos pendurados na parede daquele corredor estreito. E isso, provavelmente, não cairia bem depois dele ter dirigido por cinco horas pela chuva e pelo trânsito pesado, não é? Lou respirou fundo. Não, deixe-o entrar, sentar e descansar um pouco. E então ela poria seu plano em ação. — Quer uma xícara de chá? — ela perguntou, afastando-se antes que encostasse nele e terminasse pulando em cima dele. — Ou algo mais forte? — Chá seria ótimo — disse Patrick, esfregando a mão no rosto, e o coração dela apertou. — Sente-se perto da lareira. Eu trago uma xícara. Lou se concentrou para controlar a respiração enquanto esperava a chaleira ferver. — Eu consigo — disse ela a si mesma. — Só preciso ser aquele fósforo. Quando ela levou o chá até a sala de estar, Patrick estava sentado no sofá, com a cabeça para trás e os olhos fechados, mas ele se mexeu quando ela pôs a bandeja próxima à lareira. Lou sentiu um peso na consciência por um instante. Talvez ele estivesse cansado demais para sedução? Mas amanhã eles voltariam para Londres e seria mais difícil, uma vez que voltassem à rotina com as crianças, dever de casa e longas horas no escritório. Ela serviu o chá e deu uma xícara a Patrick, antes de se sentar perto dele olhando para o fogo, tomando coragem. O relacionamento com Patrick poderia ser quente como aquele fogo, se ela conseguisse convencê-lo disso. — Como estão as crianças? — ela perguntou. Fraquíssimo no que diz respeito à sedução, mas ela tinha que começar a conversa de alguma maneira. — Estão bem — disse ele. — Vão ficar felizes de ter você de volta e voltar ao normal. Lou bebeu o chá. — Engraçado, é difícil lembrar o que é o normal — disse ela. Talvez essa fosse uma boa chance de rolar a bola? — Nossas vidas mudaram tanto nesse ano — ela continuou. — Não faz muito tempo que o normal era viver naquele apartamento apertado e pegar o metrô para o trabalho toda manhã. Desde que me casei com você, o normal é outra coisa, completamente diferente. Não que se possa chamar 126


nosso casamento de normal, não é? — É verdade. — Era uma abertura boa demais para deixar passar, e Patrick decidiu arriscar. — Imagino que a maioria dos casais não tem o acordo que temos — disse ele. — E falando nisso, Lou, há algo que você deveria saber. Lou ficou fria ao ouvir aquela frase. Ele ia contar a ela sobre alguma namorada nova. A dica era óbvia. O que o?, ela deveria dizer, e em seguida ele contaria sobre e alguma loura de pernas longas por quem ele se encantara. Incapaz de ouvir aquilo nesse momento, ela se apressou a falar: — Na verdade, tem algo que você precisa saber também — disse ela. — Algo incrível, de verdade. — Sim? — disse Patrick. — Fui ver o procurador de Fenny ontem — disse Lou. — Patrick, Fenny deixou tudo para mim! — Você já esperava isso, não esperava? — disse ele com cuidado. — Sei que ela queria deixar a casa para mim, mas não sabia que tinha mais coisas — disse Lou. — Fenny vivia fazendo tanta economia que eu sempre pensei que tinha que ser cuidadosa com sua pensão. Tanto que eu me lembro que esperava poder manter a casa aqui quando chegasse o momento. Sabia que detestaria vendê-la. Ela olhou à sua volta, lembrando-se de quando se sentava ali com sua tia. — Isso é o mais próximo que tive de um lar. Você tem um lar comigo, Patrick quis dizer, mas não disse. Talvez não parecesse um lar para Lou? Esse pensamento doeu nele. — E ela tinha algum dinheiro guardado? — ele perguntou. — Um pouco. — A boca de Lou se contorceu ao dizer aquilo, lembrando-se de como ela estava despreparada quando o procurador fechou as mãos e olhou para ela por cima dos óculos. — Sua tia era uma mulher muito rica, Sra. Farr — disse ele. — Diversas vezes tentei fazê-la usar seus bens para tornar sua vida mais confortável, mas ela sempre insistiu que tinha tudo o que queria. Disse que não queria ser incomodada com isso, e me disse para investir tudo no seu nome. Eu, naturalmente, obedeci às ordens dela. O procurador abriu um sorriso contido de satisfação. — Devo lhe dizer que você herdou uma soma substancial de dinheiro, Sra. Farr. 127


— Eu fiquei sem palavras — disse Lou, contando a história para Patrick, que ouvia com o coração apertado. — Eu não fazia idéia que Fenny tinha investimentos, e quando ele me disse de quanto eram, eu quase desmaiei! Patrick abaixou sua xícara de chá. — É muito dinheiro — disse ele. — Eu sei. Ele estava cheio de conselhos sobre reinvestir, e pensar bem antes de tomar alguma decisão. Acho que ele pensou que eu fosse correr e gastar indo. — Você deveria ouvi-lo — disse Patrick. — Pense no que você realmente quer e não tome decisões apressadas. — Bem, eu sei, mas nada vai mudar, vai? — disse Lou. — E não vai? — disse Patrick sem rodeios. — Eu achei que tudo mudaria, — ela olhou para ele. — O que você quer dizer? — Você não vai querer continuar casada comigo, para inicio de conversa — disse ele com um sorriso forçado. — Sei que você sente muita falta de Fenny, mas se você soubesse que isso aconteceria, não teria feito aquele acordo comigo, teria? — Não — disse Lou devagar. Ela não gostava do rumo que a conversa estava tomando. Ela apenas falara sobre o dinheiro para distrai-lo do que ele iria dizer, e agora parecia que ela lhe dera outra abertura. — Não, não teria. — A julgar pelo que me disse, agora você tem toda a segurança financeira que desejava — disse Patrick, tentando ser justo, e feliz por ela, mas tudo o que pensava era que agora ela não precisava mais dele. Lou não pensara nisso dessa forma antes. Ela não absorvera muito além do fato de Fenny ser mais rica do que ela imaginava. Bem típico dela. Ela poderia ter comprado um vestido novo de vez em quando, ou um fogão novo para a cozinha, mas Fenny nunca se incomodava com coisas assim. Poder ficar em sua casa cuidando do jardim era tudo o que ela sempre quis. — Sim, tenho — disse ela sem entusiasmo. Patrick respirou fundo. Não era justo confundir Lou com emoções até que ela se desse conta de todos os fatores envolvidos em se ter independência financeira. Ela precisava de um tempo sozinha para pensar sobre tudo. — Entenderei se você quiser reconsiderar o acordo que fizemos — disse ele. — Eu não contestaria um divórcio. Lou não acreditava que ele estava ali sentado com toda a calma, 128


oferecendo-lhe o divórcio, como se ele não se importasse. Como se fosse isso o que ele queria. Era isso o que ele queria? Ela se sentiu mal. — E você? — disse ela. — Você também queria algo do nosso acordo — ela o lembrou. Patrick evitou os olhos dela. — As coisas mudaram agora. Não quero que você fique presa a um acordo que não faz mais sentido para você. Nós concordamos que poderíamos nos divorciar sem problemas. Ele poderia não ter nenhum problema em se divorciar, mas ela tinha. Lou ficou zangada de repente. Se Patrick queria se livrar daquele casamento, era só dizer. Ela não permitiria que ele usasse a herança deixada por Fenny como desculpa para desistir de um acordo que não servia mais a ele. — Era sobre reconsiderar nosso acordo que você queria conversar? — ela perguntou. Patrick se mexeu com desconforto. Ele não queria mentir para ela, mas, obviamente, agora não era hora de falar sobre os seus sentimentos. — Sim, de certa forma — disse ele relutante. — Qual o seu problema com o acordo? — Não quero falar sobre isso agora — disse ele, encurralado. Lou podia não pensar que herdar mais de 2 milhões de libras não mudava as coisas, mas claro que mudava. — Mas eu quero! — disse Lou muito zangada. — Acho que agora é o momento perfeito para falar sobre isso. Diga-me o que o incomoda sobre o nosso acordo. — É muito... proibitivo. — Como? Eu já reclamei por você sair com alguém? — Não. — Então, você apenas cansou do acordo? — Sim — admitiu Patrick. Pelo menos ele podia ser honesto sobre isso. — Eu vim aqui planejando perguntar se você consideraria rasgar o contrato que assinamos. E agora que você é uma mulher rica, é do seu próprio interesse fazer isso. Lou pôs a xícara de café na bandeja e se virou no sofá. — Quero que seja honesto comigo — disse ela, mantendo a voz 129


estável com certo esforço. — Você encontrou alguém? — Não. — Então, você não quer se casar com mais ninguém? — Claro que não — disse Patrick atônito. — Muito bem. — Lou tentou pensar numa outra razão pela qual ele pudesse querer acabar com o casamento, como ele parecia querer. — Então você simplesmente não quer ficar casado? — Não! — ele protestou, forçado a dizer a verdade. — Eu gosto de estar casado. Gosto de estar casado com você — ele completou. — Gosto de voltar para casa e encontrar você lá. Gosto de Grace e de Tom. Gosto da maneira como a casa parece um lar. Gosto da bagunça e do barulho e do fato de você ter desfeito tudo o que paguei uma fortuna para o designer de jardins fazer. Estou acostumado com você — disse ele. — Sinto sua falta quando você não está lá — acrescentou ele. A raiva de Lou começou a evaporar-se enquanto uma ponta de esperança desabrochava dentro dela. — Então, o que há de errado? — O acordo está errado. — Patrick passou a mão pelos cabelos. — Detesto não poder tocar em você. Detesto chegar em casa e você não me beijar. Detesto dormir em quartos separados. É claro que não tem ninguém mais na minha vida! Eu não quero ninguém mais. Só quero você — ele terminou, parecendo derrotado. — Eu amo você — disse ele enquanto Lou permanecia ali sentada, sem palavras. — Pensei em você a viagem inteira. Planejei o que dizer. Diria como me sinto e perguntaria se você seria capaz de esquecer aquele acordo estúpido, se poderíamos ficar casados como as outras pessoas, brigando às vezes, e entrando em confusões, mas conversando e superando os problemas, e amando um ao outro... E agora você me diz que não precisa mais de mim. A surpresa fez com que Lou começasse a falar. — Quando foi que eu disse isso? — Agora. A herança de Fenny fez de você uma pessoa independente. — É verdade — disse ela, perplexa com a frieza dele. — Eu não preciso do seu dinheiro — ela concordou. — Mas preciso de outras coisas, Patrick. Preciso que você me prepare chá quando eu estiver cansada. Preciso que me ajude a lidar com as crianças. Preciso que você saia para cima e para baixo pelo país comigo e esteja por perto quando eu precisar, assim como você tem feito nas últimas semanas. Porém, mais que isso, preciso ver você. Preciso saber que você vem para casa. Preciso poder tocar você quando quiser. Um sorriso invadiu o rosto dela. 130


— E o que preciso mais do que tudo é de um beijo seu. Patrick olhava para ela, como se não pudesse acreditar no que ouvia. — Agora — disse ela, caso ele não tivesse entendido, e um sorriso que começou no fundo dos olhos dele se espalhou pelo seu rosto. — Se você insiste — disse ele, e Lou se aproximou dele, e então eles se beijaram, doces beijos que continuaram sem parar enquanto eles chegavam mais perto, apertando-se, sentindo um ao outro. As mãos de Patrick deslizavam por baixo da blusa dela, quentes sobre a pele dela, explorando-a até que ela suspirasse de prazer. — Preciso que você me ame — ela sussurrava entre os beijos. — Você acha que pode fazer isso? Patrick puxou-a até que ela deslizasse por baixo dele. — Sim, posso — disse ele, beijando-lhe o pescoço, com os lábios quentes e possessivos, e ela tremia de prazer. — Somente eu? Ninguém mais? — Ele parou e levantou a cabeça. — O que, nem Grace nem Tom? — Não, não me importo que você os ame — disse ela, arrancando-lhe a camisa de dentro da calça. — E minha mãe? — ele brincou. — Ninguém jovem e bonita com quem você não tenha nenhum parentesco — disse Lou, tentando parecer severa, mas era difícil quando a mão dele tocava-lhe o seio e o seu sorriso era quente sobre sua pele. — Não, não amarei ninguém dessa maneira — ele prometeu. — Apenas amarei você... e o meu carro. Você não se importa com isso, importa? Lou sorriu e passou os braços em volta do pescoço dele. — Isso eu posso suportar — disse ela, e continuou a beijá-lo. — Você é a única mulher que amei dessa maneira — disse Patrick a ela momentos depois. — Você é a única que desejei dessa maneira. Não fui capaz de pensar em outra mulher desde aquela noite em Newcastle. — Ah, suponho que você só estava brincando de cabra-cega com Ariel nas Maldivas! — Os lábios dele tremeram. — Só a levei lá para provar a mim mesmo que não estava obcecado com você, mas não funcionou. — Não acredito que você estivesse obcecado comigo! — Estava, sim. Demais. Tenho estado assim desde que vi você naquela mesa e imaginei se você estava de cinta-liga. Depois disso, não 131


consegui mais parar de pensar. Eu fantasiava sobre você o tempo todo. — Ele olhou nos olhos de Lou. — Agora você pode me dizer. Você estava de cinta-liga por baixo daqueles terninhos? — Lou sorriu e pôs a mão dele em seu joelho. — Por que você não vem descobrir? — ela sussurrou. A mão de Patrick escorregou por baixo da saia dela,sentindo o calor de sua coxa por baixo de uma cobertura fina, subindo até ele perder o fôlego quando seus dedos encontraram o topo da meia, e a liga. — Se não fôssemos casados, eu pediria você em casamento — disse ele com a voz carregada de desejo. — E eu diria sim — disse Lou, também cheia de desejo. — Casaria mesmo? Você se casaria comigo e não com o meu dinheiro? — Se você prometer me amar para sempre e nunca mais olhar para uma loura. — Parece que não precisaremos do divórcio, então — disse ela. — Agora você é meu. Patrick sorriu e puxou-a para perto. — Você é a única pessoa a quem quero pertencer! — disse ele ao beijá-la mais uma vez. — Sabe de uma coisa, eu tinha um plano para seduzir você esta noite — disse Lou sem fôlego, longos e deliciosos momentos depois. Ela se mexia em cima dele fazendo os cabelos lhe tocarem o rosto e logo começou a desabotoar-lhe a camisa e beijar-lhe o peito. — Esse é o problema com vocês, mulheres de meia-idade — Patrick fingiu resmungar. — Vocês só querem saber de sexo. Você nem ao menos disse que me ama! Lou foi beijando-o até o pescoço. — Eu te amo, eu te amo, eu te amo. — Patrick sorriu com os beijos dela. — Parece então que você vai se dar bem — disse ele, ao rolar com ela, escorregando do sofá para o tapete. As mãos dele estavam quentes nas coxas dela, tocando-lhe a bainha da meia-calça, e Lou esqueceu que precisava de fósforos. O fogo deles ardia a todo vapor, nada podia apagálo agora.

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