Jane Porter - Indigna Para Um Rei (Paixão 292)

Page 1

Indigna para um Rei Not Fit For A King?

Jane Porter

Escândalo da Realeza 1/2 A princesa impostora… e o rei! Como num conto de fadas, Hannah concorda em ajudar uma princesa e, de uma hora para outra, se veê noiva de um rei! Este perigoso disfarce precisa acabar logo, pois a quíímica entre eles estaí ficando real demais! Aos olhos de Zale, sua noiva naã o passava de uma princesa mimada que se casaria apenas por obrigaçaã o. Mas, entaã o, como ela havia conseguido se transformar numa mulher divertida, fazendo seu sangue azul esquentar? Seria ela digna do posto de rainha? Zale teraí de encontrar respostas para suas perguntas por si mesmo, e para isso precisaraí convencer Hannah a se livrar de sua tiara de rainha!

Digitalização: Projeto Revisoras Revisão: Simone Bastos

PROJETO REVISORAS Querida leitora,


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Ser uma princesa é o sonho de dez entre dez meninas! Hannah teve a chance de assumir o posto de uma princesa, noiva de um rei, no lugar da verdadeira. Mas apesar da semelhança física, elas tinham personalidades completamente diferentes, e as novas atitudes de Hannah mexerão com os sentimentos de Zale, além de deixá-lo bastante confuso. Seria ela então adequada para o rei?

Boa leitura! Equipe Editorial Harlequin Books Traduçaã o Alexandre Raposo HARLEOUIN 2012 PUBLICADO SOB ACORDO COM HARLEQUIN ENTERPRISES II B.V./S.aà .r.l. Todos os direitos reservados. Proibidos a reproduçaã o, o armazenamento ou a transmissaã o, no todo ou em parte. Todos os personagens desta obra saã o fictíícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas eí mera coincideê ncia. Tíítulo original: NOT FIT FOR A KING? Copyright © 2011 by Jane Porter Originalmente publicado em 2011 por Mills & Boon Modem Romance Projeto graí fico de capa: nueleo i designers associados Arte-final de capa: Isabelle Paiva Editoraçaã o Eletroê nica: ABREU’S SYSTEM Tel.: (55 XX 21) 2220-3654 / 2524-8037 Impressaã o: RR DONNELLEY Tel.: (55 XX 11)2148-3500 www.rrdonnelley.com.br Distribuiçaã o exclusiva para bancas de jornais e revistas de todo o Brasil: Fernando Chinaglia Distribuidora S/A Rua Teodoro da Silva, 907 Grajauí , Rio de Janeiro, RJ — 20563-900 Para solicitar ediçoã es antigas, entre em contato com o DISK BANCAS: (55 XX 11) 2195-3186 / 2195-3185 / 2195-3182 Editora HR Ltda. Rua Argentina, 171,4° andar Saã o Cristoí vaã o, Rio de Janeiro, RJ — 20921-380 Correspondeê ncia para: Caixa Postal 8516 Rio de Janeiro, RJ — 20220-971 Aos cuidados de Virginia Rivera virginia.rivera@harlequinbooks.com.br

2


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

PRÓLOGO

Palm Beach, Flórida — VOCEÊ REALMENTE se parece comigo — murmurou a princesa Emmeline d’Arcy enquanto caminhava ao redor de Hannah. — Mesmo rosto, mesma altura, mesma idade… se a nossa cor de cabelo fosse a mesma poderííamos passar por geê meas. EÉ incríível. — Naã o exatamente geê meas. Vossa Alteza tem a metade do meu peso — disse Hannah. — EÉ magrela, como dizemos aqui na Ameí rica. A princesa Emmeline naã o pareceu ouvi-la, muito ocupada examinando Hannah da cabeça aos peí s. — Voceê tinge o cabelo? Ou eí natural? De qualquer modo, eí uma linda tonalidade de marrom. — EÉ artificial. Este tom eí bem mais escuro do que a minha cor natural. E eu mesma tinjo o meu cabelo — gaguejou Hannah. — EÉ possíível comprar essa tintura aqui em Palm Beach? Hannah naã o podia acreditar que a deslumbrante princesa de cabelo loiro-dourado estivesse interessada em seu tom de tintura. — Certamente. EÉ vendida em toda parte. — Eu quis dizer, voceê poderia compraí -la para mim? Hannah hesitou. — Eu poderia. Mas para queê ? Vossa Alteza eí taã o bonita. A expressaã o da princesa Emmeline ficou sombria. — Pensei em ser voceê por um dia. — O queê ? A princesa afastou-se de Hannah, foi ateí uma das janelas de sua suííte no hotel luxuoso e olhou para o belo jardim tropical. — Eu me meti em uma tremenda confusaã o — disse a princesa Emmeline. — Mas naã o posso sair daqui para resolver as coisas. Sou seguida aonde quer que eu vaí , naã o apenas pelos paparazzi como tambeí m pelos meus guarda-costas, minha secretaí ria, minhas damas de companhia. Ao menos por um dia quero ser normal. Comum. Talvez entaã o eu possa fazer algo para sair do pesadelo em que estou metida. — O que aconteceu, Alteza? — Naã o posso falar a respeito — disse a princesa com a voz embargada. — Mas eí algo ruim… Vai estragar tudo… — Estragar o queê , Alteza? Pode me contar. Pode confiar em mim. Sou muito boa em manter segredos e nunca trairia a sua confiança. A princesa levou a maã o ao rosto e rapidamente enxugou algumas laí grimas antes de se voltar para Hannah. — Sei que posso confiar em voceê . EÉ por isso que estou pedindo a sua ajuda. — A princesa inspirou profundamente. — Amanhaã aà tarde, trocaremos de lugar. Voceê ficaraí na suííte e eu serei voceê . Demorarei apenas algumas horas, quatro ou cinco no maí ximo. Depois voltarei e trocaremos de lugar outra vez. Hannah se sentou na cadeira ao lado da princesa. — Gostaria de ajudar, mas tenho de trabalhar amanhaã . O sheik Al-Makin Koury naã o me daí folga, e, mesmo que desse, eu nada sei sobre como ser uma princesa. Emmeline sentou diante de Hannah. 3


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — O sheik Al-Makin Koury naã o pode obrigaí -la a trabalhar se voceê estiver doente. Nem mesmo ele arrastaria uma mulher doente da cama. E voceê nem teria de deixar o hotel. Eu poderia marcar uma sessaã o no spa para voceê amanhaã aà tarde. — Mas eu falo como uma americana, naã o como uma nobre de Brabante! — Ontem, no torneio de polo, ouvi voceê apresentar o sheik em franceê s. Voceê fala franceê s perfeitamente, sem sotaque. — Isso eí porque, durante o secundaí rio, vivi com uma famíília na França durante um ano. — Entaã o, fale franceê s amanhaã . Isso sempre impressiona os americanos. — Emmeline sorriu. — Traga as tinturas de cabelo consigo pela manhaã , loiro para voceê e essa tonalidade de castanho para mim. Pintaremos os nossos cabelos e trocaremos de roupa. Seraí uma grande aventura! Havia algo de contagiante na risada da princesa Emmeline, e Hannah sorriu de volta, relutante. — Seraí apenas por algumas horas, amanhaã aà tarde. Certo? Emmeline assentiu. — Estarei de volta antes do jantar. — Vossa Alteza acha seguro sair por aíí por conta proí pria? — E por que naã o? As pessoas pensaraã o que eu sou voceê . — Mas naã o faraí nada de perigoso, certo? — Claro que naã o. Ficarei em Palm Beach. Diga que me ajudaraí , Hannah, por favor. Como Hannah poderia recusar? A princesa estava desesperada, e Hannah nunca fora capaz de negar ajuda para algueí m em apuros. — Estaí bem, mas apenas por uma tarde. — Obrigada! Merci ! Voceê eí um anjo, e naã o se arrependeraí , Hannah. Eu prometo.

CAPÍTULO UM

Raguva, três dias depois. MAS HANNAH se arrependeu. Mais do que jamais se arrependera de alguma coisa na vida. Treê s dias se passaram desde que trocara de lugar com Emmeline. Treê s dias interminaí veis fingindo ser algueí m que naã o era. Treê s dias vivendo uma mentira. Hannah deveria ter parado com aquilo na veí spera, antes de ir para o aeroporto. Ela deveria ter confessado a verdade quando ainda era tempo. Em vez disso, embarcou no aviaã o real e foi levada para Raguva como se realmente fosse a princesa mais famosa da Europa, e naã o uma secretaí ria americana que por acaso se parecia com a deslumbrante princesa Emmeline. Hannah prendeu a respiraçaã o, tentando conter o paê nico. Estava em seí rios apuros agora, e a uí nica maneira de ela e Emmeline sobreviverem intactas aà quela cataí strofe seria mantendo a cabeça fria. Naã o que fosse faí cil permanecer fria e calma, jaí que estava prestes a encontrar o noivo da princesa Emmeline, o poderoso rei Zale Ilia Patek — um homem considerado taã o brilhante quanto severo —, assim como toda a sua corte. Hannah nada sabia sobre ser nobre ou europeia. No entanto, laí estava ela, espremida em um vestido de 30 mil doí lares com uma delicada tiara de diamantes presa ao seu cabelo artificialmente clareado depois de ter passado uma noite inteira aprendendo tudo o que podia 4


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

aprender sobre Zale Patek de Raguva. Soí uma idiota apareceria diante de um rei e sua corte fingindo ser a sua noiva. Ningueí m a estava forçando a fingir ser Emmeline. Ningueí m aleí m dela mesma. Mas ela prometera ajudar Emmeline, dera a sua palavra para a princesa. Como poderia abandonaí -la agora? Hannah engoliu em seco quando as portas douradas se abriram, revelando a imensa sala do trono do palaí cio. Ela piscou, ofuscada pela luz intensa dos candelabros, e olhou para o trono no outro extremo da sala. Havia um longo tapete vermelho estendido aà sua frente. Entaã o uma voz anunciou-a, primeiro em franceê s, depois em raguviano, silenciando o burburinho. — Sua Alteza Real, princesa Emmeline de Brabante, duquesa de Vincotte, condessa d’Arcy. A apresentaçaã o formal fez Hannah estremecer. Como poderia ter pensado que trocar de lugar com Emmeline seria uma boa ideia? Como naã o percebera os perigos? Por que naã o se dera conta de que o plano de Emmeline estava longe de ser infalíível? Porque estava muito ocupada desfrutando dos tratamentos do spa, pensando na sorte que tivera ao poder dar aquela breve escapada antes de voltar aà vida desgastante, embora fascinante, de secretaí ria do sheik Al-Makin Koury, do Kadar, um paíís muito rico em petroí leo. Soí que Emmeline naã o voltou. Em vez disso, mandou uma mensagem de texto implorando que Hannah mantivesse a farsa por mais algumas horas. Entaã o, no dia seguinte, alegou haver um problema, depois outro, mas naã o se preocupe, tudo terminaraí bem. Tudo o que Hannah teria de fazer seria manter a farsa por mais algum tempo. Uma das damas de companhia murmurou: — Vossa Alteza Real, todos a esperam. Hannah voltou a olhar para o trono ao fim do longo tapete vermelho. E topou com o olhar intenso do rei Zale Patek observando-a de seu trono enquanto ela se aproximava. Nenhum homem jamais a olhara taã o atentamente. Mesmo sentado, o rei Patek parecia imponente. Era alto, ombros largos, traços belos e fortes. Mas foi a expressaã o de seu rosto que a fez perder o foê lego. Em seus olhos, ela viu posse. Propriedade. Eles soí se casariam dali a dez dias, mas aos olhos do rei, ela jaí era sua. A boca de Hannah secou. Seu coraçaã o disparou. Nunca deveria ter concordado em fingir ser uma princesa. Zale Patek de Raguva naã o gostaria nem um pouco de ser feito de bobo. — Majestade — disse ela. — Bem-vinda a Raguva, Alteza — respondeu ele em ingleê s impecaí vel. Ela levantou a cabeça para olhar para o rei de Raguva, um paíís vizinho aà Greí cia e aà Turquia, no mar Adriaí tico. Ele parecia ter menos que os seus 35 anos. Aleí m disso, era ridiculamente bonito. As fotografias que vira na internet naã o lhe faziam justiça. O rei era alto, imponente, forte. O paletoí formal que vestia naã o conseguia esconder a largura dos ombros, nem o peito musculoso. Ele nascera prííncipe, mas treinara para se tornar jogador de futebol. Contudo, quando o pai e a maã e morreram em um acidente de hidroaviaã o cinco anos antes, teve de desistir do esporte. Ela lera que Zale Patek tivera poucas namoradas durante a deí cada em que jogara para dois grandes times europeus porque o futebol era a sua paixaã o e, uma vez que ele herdasse o trono, aplicaria a mesma disciplina e paixaã o ao seu reinado. — Obrigada, Majestade — respondeu ela, levantando lentamente a cabeça para olhaí -lo nos olhos. Ele a encarou, e ela sentiu o coraçaã o disparar, os joelhos se dobrarem e todo o seu corpo desfalecer. O rei Patek desceu os degraus da plataforma do trono, tomou-lhe a maã o e a beijou. Hannah sentiu o corpo formigar da cabeça aos peí s. Ao atravessarem o tapete vermelho, o rei fez uma pausa para apresentaí -la para um de seus muitos conselheiros, mas a sensaçaã o de sua pele contra a dela impedia que se

5


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

concentrasse no que quer que fosse. Ao SAIÉREM da sala do trono, Zale levou-a atraveí s de uma antecaê mara escassamente mobiliada e de uma pequena sala de recepçaã o ateí chegarem ao Quarto de Prata, um coê modo que fora o favorito da falecida rainha. — Por favor — disse ele, levando-a ateí uma cadeira. Havia um lustre de cristal no teto e grandes espelhos venezianos pendurados nas paredes. Era um belo quarto, repleto de adornos de prata, cristal e seda, mas nada que pudesse comparar-se aà princesa. Ela estava deslumbrante. Mais que deslumbrante. Fazia um ano desde que o rei vira Emmeline pela uí ltima vez, durante o anuí ncio de seu noivado, no Palaí cio de Brabante. — Voceê estaí linda — disse ele quando ela afundou graciosamente na cadeira. — Obrigada — respondeu Hannah, baixando a cabeça, a pele de porcelana levemente enrubescida. — Voceê estaí aqui, enfim. — Ele odiava o intenso prazer que sentia ao olhaí -la. Deveria parecer distante, alheio, ausente. Em vez disso, estava curioso. Aleí m de atraíído fisicamente. — Sim, Majestade. — Por favor, me chame de Zale — corrigiu o rei. — Noí s nos comprometemos no ano passado. — E desde entaã o nunca mais nos vimos — respondeu ela, levantando o queixo. Ele ergueu uma sobrancelha. — Por sua escolha, Emmeline, naã o minha. — Isso o incomoda? — perguntou ela apoí s algum tempo. O rei deu de ombros. Ele sabia que Emmeline passara o ano anterior com um namorado, um playboy argentino chamado Alejandro, apesar de ter sido prometida em casamento a Zale. Ele naã o diria que sabia que a viagem de sete dias que ela fizera para Palm Beach na semana anterior fora para acompanhar Alejandro em uma partida de polo. Ou que nem mesmo tinha certeza se ela realmente viria para Raguva para o casamento, marcado para dali a dez dias, em 4 de junho. Mas ela veio. E estava ali. E ele estava disposto a usar os proí ximos dez dias antes de seu casamento para descobrir se ela estava pronta para honrar os seus compromissos ou se pretendia continuar brincando com ele. — Estou feliz por voceê estar aqui — respondeu o rei. — EÉ hora de começarmos a nos conhecer. Ela sorriu, um sorriso lento e radiante que iluminou os seus olhos de dentro para fora. O rei estremeceu. — Lamento naã o ter podido recebeê -la ontem aà noite quando chegou. Mas eí a tradiçaã o. Quinhentos anos de protocolo. — Compreendo. — Voceê quer beber algo? Ainda falta uma hora para o jantar. — Naã o, obrigada, eu posso esperar. — Soube que voceê naã o comeu nada hoje, tampouco na noite passada, depois que chegou. Ela lançou-lhe um olhar um tanto debochado e perguntou: — Qual dos criados me denunciou? — Meus cozinheiros ficaram preocupados quando voceê recusou as refeiçoã es. Acharam que naã o gostou da comida deles.

6


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — De modo algum. As bandejas do desjejum e do almoço pareciam deliciosas, mas eu estava muito consciente de que, aà s 17h, teria de entrar neste vestido. — Naã o estaí em uma dieta de fome, certo? — Pareço estar correndo o risco de desaparecer? Naã o, ela naã o parecia estar morrendo de fome. Ao contraí rio, parecia luxuriante, madura, comestíível, e ele sentiu uma suí bita vontade de tocaí -la. De provaí -la. Mas conteve-se. Fazia um ano desde que naã o recebia uma mulher em sua cama, disposto a respeitar o seu noivado com Emmeline, mas fora um longo ano, e ele esperava ansiosamente a consumaçaã o de seu casamento dali a dez dias. Isso se de fato houver casamento. Zale olhou para ela e descobriu que Hannah olhava firme para ele, seu olhar azul inflexivelmente direto. E ele sentiu-se profundamente atraíído por ela. Ele a possuiria, mesmo que ela naã o se tornasse sua rainha. SEM FOÊ LEGO, Hannah baixou o olhar. Sentia-se absolutamente perdida, enfeitiçada pelos sentidos, afogada em culpa e desejo. Fazia muito tempo que naã o se sentia assim, desejando algueí m taã o desesperadamente. Zale estava mexendo com algo dentro dela, algo que naã o era tocado havia anos. Fazia muito, muito tempo desde que ela levara algueí m a seí rio, ainda mais tempo desde que desejara ser amada por um homem. Hannah gostava de sexo quando compartilhado com algueí m especial. O problema era que naã o havia ningueí m especial em sua vida desde que ela se formara na Texas A&M University havia quatro anos. Aos 21 anos, receí m-formada, esperava que o namorado a pedisse em casamento. Em vez disso, ele rompeu com ela. Agora, poreí m, desde que Brad lhe dera o fora, ela sentia algo. Pela primeira vez em quatro anos, ela desejava alguma coisa. Hannah estremeceu, chocada por ter se esquecido, mesmo que por um instante, de quem ela era e o que fazia ali. E por queê . Voceê naã o eí Emmeline, disse para si mesma, furiosa. Voceê nunca seraí Emmeline. Ela se levantou, olhou para Zale e disse: — Se houver tempo, eu gostaria de me refrescar no meu quarto antes do jantar. — Soí seremos chamados aà sala de jantar em meia hora. — Voceê vai me desculpar, entaã o? — Claro. Mandarei algueí m acompanhaí -la ateí a sala de jantar quando for a hora. Ela deixou o quarto rapidamente e subiu a escadaria que levava aos seus aposentos no segundo andar. Loucura, loucura, loucura, pensou, de estoê mago revirado e coraçaã o acelerado, enquanto subia as escadas taã o raí pido quanto podia. Por favor, que Emmeline esteja a caminho. Por favor, por favor, tomara que haja uma mensagem de Emmeline dizendo que jaí estaí no aviaã o e que logo estarei livre para ir embora. Em sua suííte, Hannah fechou a porta e correu ateí a mesa de cabeceira ao lado da cama. Pegando o telefone, verificou as mensagens de texto, depois as de correio de voz, mas naã o havia nada. Nada. Nem uma palavra. Nada. Nada! Fazia horas desde que recebera a uí ltima mensagem de texto de Emmeline. Onde ela estava? Por que naã o respondia? Hannah tentou acalmar-se. Talvez a princesa jaí estivesse a caminho. Talvez estivesse em um aviaã o, voando para Raguva. Hannah sentiu um laivo de esperança. Era possíível. Emmeline poderia estar com tanta pressa para chegar ao aeroporto que se esquecera de enviar uma mensagem para Hannah dizendo que vinha vindo… Subitamente, o telefone tocou, Emmeline. Hannah atendeu imediatamente.

7


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Voceê estaí aqui? — perguntou, esperançosa. — Voceê jaí chegou? — Naã o, eu ainda estou na Floí rida. Estou tendo um pouco de dificuldade para voltar, jaí que voceê estaí com o meu aviaã o. Poderia mandaí -lo de volta para mim? — Voceê conseguiu resolver as coisas? — N-naã o — balbuciou a princesa. — Voceê estaí bem? — Eu naã o corro perigo fíísico, se eí o que quer saber. Hannah sentiu que a princesa estava a ponto de chorar. — As coisas naã o estaã o indo bem por aíí? — Naã o — respondeu Emmeline. — Como estaí Zale? Frio, como sempre? — Eu naã o o chamaria de frio… — Talvez naã o. Mas ele eí muito sisudo, naã o acha? Naã o creio que goste muito de mim. — Ele vai se casar com voceê . — Por 5 milhoã es de euros! — O queê ? — Hannah, este eí um casamento arranjado. O que voceê estava pensando? Hannah lembrou-se do rosto de Zale. Ele era lindo. Como Emmeline poderia naã o sentir nada por ele? — Talvez voceê se apaixone por ele depois de passarem algum tempo juntos. — Ah, espero que naã o. Isso soí complicaria as coisas. — Emmeline parou de falar, dirigiu-se a algueí m que estava ao seu lado, e entaã o voltou ao telefone. — Boas notíícias. Naã o preciso esperar pelo meu aviaã o. Meu amigo aqui tem um jato e eu poderei viajar hoje aà noite. Estarei aíí pela manhaã . Assim que eu chegar, envio uma mensagem de texto. Com alguma sorte, ningueí m perceberaí . Com alguma sorte, pensou Hannah, fechando o telefone, o coraçaã o estranhamente pesado.

CAPÍTULO DOIS

HANNAH TENTOU crer que estava aliviada por aquela farsa impossíível estar terminando. Tentou acreditar-se feliz por estar indo embora na manhaã seguinte. Mas parte dela se sentia desapontada. Zale era fascinante. Em seu quarto, Hannah retocou a maquiagem e ajustou a tiara antes de seguir com sua dama de companhia atraveí s de galerias e caê maras a caminho do salaã o de jantar. Ao passarem pelo salaã o imperial, Hannah teve um vislumbre de si mesma no imenso espelho sobre a lareira de maí rmore. O reflexo a assustou. Era assim que ela realmente estava? Elegante? Esfuziante? Bonita? Nunca se sentira bonita em sua vida. Inteligente, sim. Trabalhadora, eí claro. Mas seu pai nunca dera valor aà beleza fíísica, nunca a incentivara a usar maquiagem ou a vestir-se com apuro e, por um instante, ela realmente desejou ser a bela mulher que via no espelho. E se ela fosse uma princesa na vida real? Isso mudaria tudo? Isso a mudaria? A dama de companhia fez uma pausa do lado de fora das portas do salaã o de jantar. — Esperaremos aqui por Sua Majestade — disse ela. Hannah assentiu, ansiosa para ver o rei Zale Patek novamente. Ela naã o devia estar incomodada com isso. Naã o devia estar sentindo nada. De repente, o rei Patek e seus assistentes apareceram e a atmosfera tornou-se 8


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

positivamente carregada de eletricidade. Alto, aí gil, forte, Zale Patek era um homem cheio de vida. Ela nunca conhecera um homem assim. Nunca encontrara um homem taã o confiante. Erguendo a cabeça, ela olhou para os olhos dele e sentiu o coraçaã o disparar. — Voceê estaí linda — elogiou ele. Ela inclinou a cabeça. — Voceê , tambeí m, Majestade. — Eu, linda! — Bonito — corrigiu Hannah, corando. — E real. Ele levantou uma sobrancelha, intrigado, mas nesse momento as portas do salaã o se abriram simultaneamente, revelando um imenso salaã o com um peí -direito de dois andares. — Oh! — exclamou Hannah, impressionada com a grandeza medieval da sala. A enorme sala estava iluminada quase exclusivamente aà luz de velas. Havia lareiras de pedra em ambas as extremidades da sala, e magnííficas tapeçarias cobriam as paredes. Zale olhou para ela, um leve sorriso nos laí bios. — Vamos? — perguntou, oferecendo-lhe o braço. Ela olhou para ele, e seu coraçaã o voltou a acelerar. Rosto bonito, belos olhos, ombros largos, cintura estreita, pernas longas e musculosas. Uma fantasia que ganhara vida. Seria taã o ruim assim brincar de ser a princesa Emmeline apenas por uma noite? Seraí que gostar um pouquinho de Zale estragaria tudo? Na manhaã seguinte ela estaria retornando para casa e nunca voltaria a veê -lo, entaã o por que naã o poderia ser feliz apenas naquela noite? Juntos, entraram no salaã o lotado, onde os convidados jaí estavam sentados aà maior mesa de jantar que ela jaí vira na vida. Hannah podia sentir todos os olhares voltados para eles, e a conversa morreu enquanto caminhavam para os dois uí nicos lugares ainda vazios ao centro da mesa. — Que mesa grande — ela murmurou. — EÉ — concordou o rei. — Originalmente, foi construíída para acomodar cem pessoas. Mas, haí quinhentos anos, as pessoas deviam ser muito menores, ou talvez naã o se importassem em se espremer aà mesa, porque eu naã o acho que caibam mais de oitenta atualmente — afirmou, com uma pitada de humor na voz. Mordomos uniformizados puxaram as cadeiras para Hannah e Zale. Uma vez sentados, Zale inclinou-se para Hannah e murmurou: — E mesmo assim — acrescentou ele — como pode ver, oitenta ainda ficam bem apertados. “Apertado” era um eufemismo, pensou ela uma hora mais tarde, sentindo muito calor e uma ligeira claustrofobia aà medida que a refeiçaã o de cinco pratos progredia lentamente. Seu vestido azul-petroí leo estava muito apertado ao redor das costelas, Zale era um homem grande, com ombros muito largos, e ocupava espaço consideraí vel. Tudo sobre ele a intrigava, e era impossíível ignoraí -lo, mesmo que quisesse. Com cerca de 1,90m, ele dominava a mesa com seus ombros largos e suas longas pernas. Durante toda a noite, Hannah esteve consciente da presença dele ao seu lado, sentindo seu calor e sua energia, mesmo sem tocaí -lo. E, nas poucas vezes em que casualmente se tocaram, ela sentiu o coraçaã o disparar. Trabalhando para o sheik Al-Makin Koury, Hannah organizara diversos eventos e jantares, e se sentara ao lado de muitos homens ricos, mas nenhum deles a fizera se sentir daquela forma. Nervosa. Ansiosa. Autoconsciente. Sensíível. Ao lado de Zale, ela podia ouvir o bater do proí prio coraçaã o, sentir o calor de sua respiraçaã o, e experimentou um arrepio quando ele virou a cabeça para encaraí -la. Zale naã o era um menino. Era um homem. E, ao contraí rio de Brad, seu amor

9


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter universitaí rio, Zale era maduro, bem-sucedido, experiente. Um homem no auge de seus 35 anos. Deveria ser maravilhoso ser amada por um homem que sabia o que queria… — Nem todo jantar eí taã o demorado quanto este — disse ele em ingleê s. — Esta refeiçaã o estaí se saindo extraordinariamente longa. — Eu naã o me importo — disse ela, tentando moderar o sotaque texano. — O salaã o eí lindo, e estou em oí tima companhia. — Voceê estaí encantadora. — Naã o sou sempre? — Naã o. — Os laí bios dele se curvaram em um sorriso de escaí rnio. — Voceê naã o gostou da minha companhia haí um ano. Era a nossa festa de noivado, e ainda assim voceê me evitou a noite inteira. Seu pai disse que voceê era tíímida. Mas eu naã o acreditei. Era uma conversa estranha de se ter com oitenta pessoas em volta. — E acreditou em queê ? Ele a encarou durante algum tempo e disse a seguir: — Eu sabia que voceê era apaixonada por outro homem e que se casaria comigo por obrigaçaã o. Definitivamente, aquela naã o era uma conversa para ser ter em um jantar formal. — Talvez deveê ssemos discutir isso mais tarde… — Por queê ? — Voceê naã o tem medo de que algueí m nos ouça? Ele a encarou com severidade. — Tenho mais medo eí de naã o obter respostas diretas. Ela deu de ombros. — Entaã o, faça as suas perguntas. Esta eí a sua casa. A sua festa. Os seus convidados. — E voceê eí a minha noiva. Ela ergueu o queixo ligeiramente. — Sim, eu sou. Ele a encarou por um momento interminaí vel. — Quem eí voceê , Emmeline? — Como? — Estaí taã o diferente agora que chego a me perguntar se eí a mesma mulher. — Que coisa estranha de se dizer. — Mas voceê estaí diferente. Agora me olha nos olhos. Voceê tem opinioã es. Atitude. Chego a crer que poderia obter uma resposta honesta de voceê agora. — Tente. Os olhos dele se estreitaram. — EÉ exatamente isso o que quero dizer. Voceê jamais falaria assim comigo haí um ano. — Noí s nos casaremos em dez dias. Eu naã o deveria ser franca? — Sim. — Ele hesitou um instante. — O amor romaê ntico eí importante para voceê , naã o eí mesmo? — Claro. Para voceê naã o eí ? — Haí outras coisas mais importantes para mim. Famíília. Lealdade. Integridade. — Ele a encarou, como se a desafiando a discordar. — Fidelidade. Ela ergueu as sobrancelhas. — Mas o amor romaê ntico naã o incorpora todos os itens acima? Como se pode amar verdadeiramente uma pessoa sem se entregar de coraçaã o, mente, corpo e alma? — Se voceê amasse um homem, nunca o trairia? — Nunca. — Entaã o voceê naã o tolera a infidelidade, naã o importando quaã o discreta seja? — Absolutamente naã o.

10


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Voceê naã o espera ter um amante mais tarde, depois que estivermos casados e voceê tiver cumprido o seu dever? Hannah ficou horrorizada com a pergunta. — EÉ esse o tipo de mulher que pensa que eu sou? — Acho que voceê eí uma mulher que foi forçada a um casamento que naã o deseja. Ela fitou-o, incapaz de pensar em uma resposta. — Acho que voceê quer agradar aos outros, mesmo que isso lhe custe um preço terríível — disse Zale. — Diz isso por eu ter concordado com um casamento arranjado? — Por voceê ter concordado com este casamento. Seria capaz de casar-se e ser feliz, Emmeline? Voceê seria capaz de fazer este casamento funcionar? Ela piscou, atoê nita. — Voceê eí capaz? — Sim. — Como pode ter tanta certeza? — Eu tenho disciplina. E sou dez anos mais velho que voceê . Tenho mais experieê ncia de vida, sei do que preciso e o que eu quero. — E o que quer? — Quero prosperidade para meu paíís, paz em minha casa e herdeiros para garantir minha sucessaã o. — Soí isso? Paz, prosperidade e filhos? — Sou realista. Sei que naã o posso esperar muito da vida, por isso tenho desejos simples. Meus objetivos saã o factííveis. — Difíícil acreditar nisso. Voceê foi o jogador que levou Raguva aà s finais da Copa do Mundo. Naã o se alcança um sucesso como aquele sem ter grandes sonhos e ambiçoã es. — Isso foi antes da morte dos meus pais. Agora meu paíís e minha famíília veê m em primeiro lugar. Minhas responsabilidades para com Raguva compensam todo o resto. Seu tom de voz enfurecido a fez estremecer por dentro. — Preciso que voceê se dedique da mesma forma — acrescentou. — Se casar-se comigo, naã o haveraí divoí rcio. Nenhum espaço para duí vidas. Se casar, seraí para sempre. E se voceê naã o pode me prometer para sempre, entaã o naã o deveria estar aqui. Abruptamente Zale afastou a cadeira e estendeu a maã o para ela. — Mas isso eí uma conversa muito seí ria para um jantar. Deverííamos estar comemorando sua chegada e as boas coisas que viraã o. Vamos conversar com nossos convidados e tentar aproveitar a noite. O RESTO do jantar transcorreu com rapidez, todos competindo por uma oportunidade para falar com o rei Zale e com a glamorosa e popular princesa Emmeline. Finalmente, por volta das 22h30, os uí ltimos convidados foram embora, e Zale escoltou Emmeline de volta aà sua suííte no segundo andar. Que noite estranha! Desconcertante, pensou Zale, olhando para aquela cabeça loira com a delicada tiara de diamantes. Ele tinha sentimentos ambííguos em relaçaã o aà chegada da princesa. Raguva precisava de uma rainha, e Zale, de herdeiros. Contudo, em um níível estritamente pessoal, sabia que ela naã o era a mulher que ele teria escolhido como esposa. Zale conhecia os proí prios defeitos — muito trabalhador, excessivamente seí rio, intensamente dedicado —, mas ele era leal. Esse era um traço que respeitava em si mesmo e valorizava muito nos outros. Mas tardiamente percebeu que Emmeline talvez naã o valorizasse aquele tipo de coisa. O mundo podia veê -la como uma princesa linda e confiante, mas o pai dela jaí o alertara que Emmeline podia ser uma pessoa difíícil e, aà s vezes, muito insegura. A adverteê ncia do rei William d’Arcy preocupara Zale, jaí que ele naã o precisava de uma

11


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter mulher difíícil e insegura, que certamente se tornaria uma rainha fraca e exigente. Mas o pai de Zale queria muito que ele se casasse com ela. Aos seus olhos, a princesa Emmeline era a escolha perfeita para Zale e, embora o pai tivesse morrido havia cinco anos, Zale quis honrar os desejos dele, na esperança de que, uma vez que a bela Emmeline chegasse a Raguva, ela se estabeleceria e se tornaria a noiva ideal que seu pai imaginara. Ao chegarem aà sua suííte, ficaram em sileê ncio um instante. — Foi um longo dia — disse ele, quebrando o sileê ncio desconfortaí vel, ao mesmo tempo que se perguntava como poderia se casar com ela alimentando tantas duí vidas ao seu respeito. Mas ela estaí aqui, argumentou outra parte de seu ceí rebro. Veio quando disse que viria e se comportou de modo perfeitamente apropriado naquela noite. Mais do que apropriado: ela estava linda, acessíível, simpaí tica. — Foi — concordou ela. — Amanhaã aà noite seraí bem menos formal. Naã o seraí um banquete de gala, apenas um tranquilo jantar a dois, de modo que deve ser relativamente faí cil. Ela assentiu. — Tenho certeza de que seraí . Ele olhou para o rosto de Hannah, perguntando-se como aquela mulher, quente e atraente, poderia ser a Emmeline distante e fria do ano anterior. — Voceê precisa de algo? — perguntou ele. — Naã o. Tudo estaí maravilhoso. A resposta dela confundiu-o ainda mais. — Nenhum pedido especial? Sou todo ouvidos. Terei prazer em atender. Ela balançou a cabeça. — Voceê estaí feliz por estar aqui, entaã o? Hannah esboçou um sorriso treê mulo. — Claro. Ele naã o sabia se era o inexplicaí vel brilho das laí grimas nos olhos dela, ou aquele sorriso inseguro, mas de repente a princesa mais bonita da Europa parecia taã o solitaí ria e vulneraí vel que Zale a enlaçou pela cintura. Ela inclinou a cabeça para traí s e seu olhar azul encontrou-se com o dele. Ele a abraçou, sentindo seus seios macios apertados contra o seu peito, e a beijou. Era para ter sido um beijo breve, um beijo de boa noite, mas quando sentiu os laí bios dela estremecerem sob os seus, Zale sentiu um surto de desejo. De poder. A necessidade de possuíí-la tomou-o, consumindo-o, e impiedosamente ele aprofundou o beijo, tomando-a como se ela jaí lhe pertencesse. Hannah suspirou e ele sentiu os mamilos dela endurecerem contra o seu peito atraveí s da seda fina do vestido. Ela estava deliciosamente macia, deliciosamente curva, e ele queria mais dela, toda ela. Seu corpo latejava. Deus, ela era quente e doce. Ele queria rasgar-lhe o vestido, expor o seu corpo voluptuoso e explorar as suas curvas e reentraê ncias, o espaço atraí s de seu joelho, a maciez entre as suas coxas. Ele queria estar entre as coxas dela. Queria separar-lhe os joelhos e… A realidade voltou ao prumo. Que diabos estava fazendo? Eles estavam no corredor, aà vista das caê meras ocultas que transmitiam imagens para os seus seguranças. Lentamente, ele ergueu a cabeça e olhou para ela. - Acho que estamos dando espetaí culo para a minha segurança — disse ele, a voz baixa e rouca. Ela corou. — Sinto muito. Ele afastou um cacho loiro de seu rosto enrubescido. — Eu naã o. Boa noite, Alteza.

12


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Hannah o encarou por um momento interminaí vel. — Boa noite. Entaã o, entrou no quarto e fechou a porta.

CAPÍTULO TRÊS

AO ENTRAR em sua suííte, Hannah trancou a porta, coraçaã o disparado, corpo treê mulo. Durante um bom tempo, ficou encostada aà porta tapando a boca com a maã o. Ela o beijara. Beijara-o loucamente, apaixonadamente, beijara-o como se estivesse se afogando, morrendo; e, talvez, estivesse mesmo. Como poderia ir embora no dia seguinte? Como poderia partir e nunca mais voltar a veê lo? Mas naã o havia como ficar. O rei naã o a queria — ela, Hannah —, e sim Emmeline. Mas como poderia querer Emmeline quando a princesa naã o se importava com ele? Hannah sufocou um gemido de frustraçaã o. Seus olhos ardiam e sua garganta doíía, e ela estava se odiando por querer algueí m que naã o poderia ter. Naã o era o tipo de mulher que lidava bem com o fracasso. — Alteza — disse Celine, a criada, saindo do vestiaí rio com a camisola e o robe de Hannah. — Eu naã o a ouvi entrar. Hannah piscou para conter as laí grimas e se afastou da porta. — Acabei de chegar. Mas agradeceria a sua ajuda para sair deste vestido. AO SE separar de Emmeline, Zale tentou tiraí -la de sua mente e se concentrar em outras coisas — como Tinny. Ele foi em direçaã o aà sua ala do palaí cio mas, antes, parou no quarto de seu irmaã o mais novo. Ele nunca se recolhia sem dar uma uí ltima olhada em Tinny. Ao abrir a porta dos aposentos do irmaã o, Zale viu que todas as luzes estavam apagadas, exceto a pequena laê mpada em cima da estante na parede oposta. Tinny naã o conseguia dormir no escuro. Zale sentiu uma onda de afeto pelo irmaã o de 28 anos com necessidades especiais, um irmaã o que precisava dele ainda mais apoí s a morte dos pais. Constantino — ou Tinny, como sempre fora chamado pela famíília — deveria estar naquele voo fatíídico, mas, no uí ltimo minuto, implorou que, em vez disso, os pais o deixassem ir com Zale para St. Philippe, sua ilha particular no Caribe. Cinco anos depois, Zale ainda agradecia pelo fato de Tinny naã o estar a bordo. Tinny era tudo para ele, toda a famíília que lhe restava, mas Tinny ainda sentia muita falta dos pais, ainda perguntava muito por eles. — Majestade — sussurrou uma voz da escuridaã o. A Sra. Sivka, a babaí noturna de Tinny, emergiu das sombras vestindo um roupaã o. — Ele estaí bem. Dorme como um anjo. — Desculpe naã o ter vindo mais cedo para dizer boa noite. — Ele sabia que o senhor naã o viria. Quando esteve aqui para o chaí da tarde, o senhor mesmo disse para ele que esta seria uma noite muito importante. — A Sra. Sivka sorriu. — Como foi, Majestade? Ela eí taã o bonita quanto dizem? Zale sentiu um estranho aperto no peito. — Sim. — Tinny estaí ansioso para conheceê -la. Naã o falou outra coisa o dia inteiro. — Ele a conheceraí logo. 13


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Amanhaã ? Zale sabia que Tinny, inocente e idealista, imediatamente a colocaria em um pedestal. Ele a adoraria e permitiria que ela lhe partisse o coraçaã o. — Amanhaã naã o, mas em breve, eu prometo. — Ele ficaraí decepcionado se naã o for amanhaã . — Eu sei, mas haí algumas coisas a acertar. — Compreendo. O prííncipe Constantino conheceraí sua noiva na hora certa. — A Sra. Sivka tornou a sorrir. — Estou orgulhosa de Vossa Majestade. Seus pais ficariam orgulhosos, tambeí m. O senhor merece ser feliz. — Mas voceê eí suspeita para dizer isso, Sra. Sivka — disse ele, sempre grato por ela ter esquecido a aposentadoria para cuidar de Tinny apoí s o acidente com seus pais. — Voceê tambeí m foi minha babaí . — Sim, eu era. E olhe para o senhor agora. Ele sorriu. — Boa noite, Sra. Sivka. — Boa noite, Majestade. Zale deixou os aposentos do irmaã o, dirigiu-se aà sua suííte, e voltou a sentir um aperto no peito. Ele sentia como se tivesse descido uma montanha-russa de emoçoã es naquela noite. E naã o gostou da sensaçaã o. Raramente deixava suas emoçoã es aflorarem. Mas, naquela noite, tudo a respeito de Emmeline o tocara. Ela naã o era a pessoa de que ele se lembrava. Ela naã o se parecia nem um pouco com a fria princesa do passado. Isso naã o eí bom, disse para si mesmo. Zale sabia que naã o deveria se envolver emocionalmente com Emmeline. Como ambos sabiam, sua uniaã o naã o seria um ato de amor, e sim um arranjo cuidadosamente orquestrado. Cada passo de sua relaçaã o estava detalhadamente descrito no documento de setenta paí ginas que assinariam na manhaã seguinte. Ele poderia desejaí -la, desfrutaí -la, mas naã o poderia esquecer que o relacionamento dos dois era, acima de tudo, um negoí cio. Um negoí cio, disse para si mesmo com severidade, o que significava que ele naã o podia se deixar distrair, nem mesmo por um rosto bonito e um corpo exuberante. Felizmente, Zale era famoso por sua disciplina. Essa mesma disciplina assegurara-lhe o sucesso nos estudos, no esporte e, em seguida, como soberano de Raguva. Segundo de treê s filhos, ningueí m o pressionou. Ningueí m mantinha expectativas muito ambiciosas quanto a ele. Mas Zale tinha grandes expectativas para si mesmo. Desde muito jovem, estava determinado a encontrar o seu proí prio lugar no mundo, um nicho que fosse unicamente seu. E assim, enquanto o irmaã o mais velho, Stephen VII, prííncipe herdeiro da coroa de Raguva, aprendia os fundamentos de como ser um monarca, Zale aprendia os fundamentos do futebol. Aos 16 anos, Zale frequentava uma escola na Inglaterra quando Stephen, que cursava o segundo ano no Trinity College, foi diagnosticado com leucemia. Os pais e Tinny se mudaram para Londres para ficar ao lado de Stephen durante a quimioterapia e a radioterapia. Stephen lutou durante treê s anos. Durante treê s anos sofreu terrivelmente na esperança de que os tratamentos contra a leucemia dessem resultado. Zale sentia-se impotente. Naã o havia nada que ele pudesse fazer. Por isso, dedicou-se integralmente ao esporte. O regime de treinamento a que se impunha era muito severo: corria quatro horas por dia, fazia musculaçaã o, abdominais, flexoã es. Era o míínimo que poderia fazer. Stephen estava lutando pela proí pria vida. Zale tambeí m deveria lutar pela sua. Depois de passar nos exames, Zale estudou em Oxford, onde integrou o time de futebol da universidade, os Blues, e tornou-se campeaã o da receí m-criada primeira divisaã o de Oxford. Stephen insistiu em comparecer ao uí ltimo jogo da temporada, e foi seu pai, o proí prio

14


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter rei de Raguva, quem empurrou pessoalmente a sua cadeira de rodas ateí o estaí dio. Ningueí m torceu mais do que Stephen durante o jogo. Uma semana depois, Stephen morreu, e Zale sentiu-se culpado. Aquele dia no estaí dio fora demais para Stephen. Ele naã o deveria ter ido. Zale naã o se lembrava de nada de seu uí ltimo ano em Oxford. Soí se sentia presente quando estava em campo. Quando se formou, quatro clubes de futebol disputaram sua contrataçaã o. Ele acabou assinando contrato com um time da primeira divisaã o espanhola, apesar da desaprovaçaã o dos pais, que queriam que ele voltasse para Raguva, jaí que agora era o prííncipe herdeiro. Mas Zale naã o queria ser rei. Ele tinha um amor, uma paixaã o, um sonho: o futebol. — Foi uma boa noite, Majestade? — perguntou o criado, ajudando Zale a tirar o paletoí assim que chegou aos seus aposentos. — Foi, Armand, obrigado. A mandííbula de Zale se contraiu quando começou a desabotoar o colete e a camisa social. Naã o, ele nunca quisera ser rei, naã o tinha vontade de governar, mas, apoí s a morte dos pais, naã o lhe restou saíída a naã o ser voltar para casa. E direcionara sua tremenda disciplina para seu reinado. Ele seria um grande rei. Devia isso a seu povo, aos seus pais e, acima de tudo, a Stephen. HANNAH DORMIU mal naquela noite, revirando-se na cama de seu quarto suntuoso, sonhando com Zale, sonhando em ir embora, sonhando em encontrar Emmeline. Acordou diversas vezes durante a noite para verificar o reloí gio, preocupada com o horaí rio, ansiosa para saber como chegaria ao aeroporto na manhaã seguinte. AÀ s treê s, ela se levantou e abriu as pesadas cortinas, expondo o enluarado ceí u noturno. Finalmente, o sol despontou no horizonte. Por um instante, Hannah deixou-se ficar deitada na cama, observando o sol se erguer aos poucos. Seria uma bela manhaã . Nenhuma nuvem aà vista. Hannah saiu da cama e foi ateí a janela disposta a guardar tudo na memoí ria. As montanhas escarpadas. As casas com paredes de pedra. Os telhados vermelhos. Torres de igreja e os torreoã es do castelo. O brilho do sol sobre a aí gua. Naquela manhaã , a capital de Raguva parecia maí gica, como se tivesse sido tirada de um conto de fadas. Ela sentiu um aperto no coraçaã o, suficiente para fazeê -la se voltar para o interior do quarto. Naã o pensaria naquele dia. Tambeí m naã o sentiria nada. Voltaria para casa. De volta ao seu trabalho e ao seu mundo. De volta a uma vida na qual ela se destacara e poderia fazer alguma diferença. Mas primeiro precisava tomar banho, se vestir e arrumar os objetos pessoais que trouxera consigo em uma sacola de compras elegante que encontrara havia alguns dias. A sacola de compras fazia parte de seu plano de “fuga”. Era um plano. Ela iria aà s compras naquela manhaã . Um motorista poderia levaí -la a uma boutique de luxo onde admiraria as vitrines e esperaria o telefonema de Emmeline. Em seguida, Hannah iria ateí o aeroporto, onde ela e Emmeline se encontrariam no banheiro feminino para efetuar a mudança. Faí cil. Apoí s o banho, Hannah procurou um vestido no guarda-roupa de Emmeline. Uma vez vestida, a uí nica coisa que Hannah poderia fazer era esperar. Ela ligou pedindo o desjejum, e um empregado chegou com cafeí e croissants. Hannah mordiscou um croissant enquanto esperava pela ligaçaã o de Emmeline. AÀ s nove horas, lady Andrea chegou para revisar a programaçaã o do dia. — Seraí um dia muito atribulado — disse lady Andrea, sentando-se na sala de estar da

15


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter suííte e abrindo sua agenda de couro. — AÀ s dez, a senhorita tem um compromisso com Sua Majestade e os advogados na caê mara real. AÀ s onze, faraí cabelo e maquiagem para a primeira sessaã o de fotos de seu retrato oficial. Mais tarde, caso haja tempo apoí s o chaí , o Sr. Krek, o mordomo-chefe, a levaraí em uma excursaã o pelo palaí cio. AÀ noite, a senhorita jantaraí com Sua Majestade e alguns convidados. — Lady Andrea inspirou profundamente e olhou para Hannah. — Alguma pergunta? Uma meia duí zia de perguntas lhe ocorreram, mas nada taã o urgente quanto o encontro com Zale em pouco menos de uma hora. — Qual eí o propoí sito do encontro com Sua Majestade e seus advogados? Lady Andrea fechou a agenda de couro. — A senhorita vai se encontrar com eles para assinar a papelada, creio eu. Hannah ficou ansiosa. — Que papelada? O acordo preí -nupcial, Alteza, especificando a divisaã o de bens, bem como os arranjos de custoí dia, em caso de dissoluçaã o do casamento. Hannah ficou atoê nita. Naã o podia assinar um documento legal em nome da Emmeline. Graças a Deus, ela estava a caminho. O uí nico problema era que Hannah naã o sabia quando a princesa chegaria. Hannah deu uma raí pida olhada em seu reloí gio: 9h15. O encontro com Zale e os advogados seria dali a quarenta minutos, e, mesmo que Emmeline desembarcasse naquele instante, ainda assim seria impossíível trocarem de lugar. Ela teria de protelar, adiar a reuniaã o para mais tarde. — Voceê poderia dizer a Sua Majestade que eu gostaria de adiar a reuniaã o desta manhaã para esta tarde, ou, quem sabe, para amanhaã de manhaã ? — pediu Hannah. — Eu gostaria de ter algum tempo para analisar os documentos antes de assinar qualquer coisa. Lady Andrea hesitou, mas logo assentiu. - Claro, alteza, falarei com o secretaí rio de Sua Majestade para ver se ele pode remarcar a reuniaã o desta manhaã . Tambeí m solicitarei que coí pias dos documentos sejam imediatamente enviadas para seus aposentos. Assim que lady Andrea saiu, Hannah verificou o telefone para ver se perdera alguma ligaçaã o ou mensagem de texto. Nada. Ela apertou dois dedos contra as teê mporas, tentando aliviar a pressaã o crescente em sua cabeça. Onde estava Emmeline? Hannah mandou outra mensagem de texto. O que estaí acontecendo? Onde voceê estaí ? Quando vai chegar? Telefone firmemente agarrado em sua maã o, Hannah caminhou a esmo pela suííte, desesperada por uma resposta. Ligue, ligue, ligue, implorou, ansiosa. Mas os minutos passaram sem uma palavra de Emmeline. Cinco, dez, vinte. E, a cada minuto, Hannah ficava ainda mais nervosa. Lady Andrea voltou, confusa. — Sua Majestade naã o pode remarcar a reuniaã o desta manhaã . Ele me, pediu para lembraí -la que Vossa Alteza jaí aprovou o documento e seu conteuí do haí duas semanas. — Compreendo — interrompeu Hannah, o paê nico estampado em seu tom de voz. — Mas naã o estou me sentindo bem o suficiente para encontraí -lo e muito menos para assinar qualquer coisa agora. Por favor, envie o meu pedido de desculpas e… — Hannah interrompeuse quando seu telefone emitiu um bipe. Ela olhou para o aparelho. Era Emmeline. Graças a Deus. Ela deve ter acabado de pousar. Tudo ficaria bem. Hannah precisaria apenas adiar a assinatura uma ou duas horas para dar tempo de Emmeline chegar ao palaí cio. Hannah olhou para lady Andrea e sorriu.

16


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Por favor, veja se naã o podemos remarcar para depois do almoço. Tenho certeza de que minha dor de cabeça teraí passado ateí laí . Hannah nem esperou que a porta se fechasse atraí s de lady Andrea para ler a mensagem de texto de Emmeline. Naã o foi possíível aprovar o plano de voo ontem aà noite… O queê ? Naã o. Naã o! Emmeline ainda naã o tinha partido da Floí rida?! Hannah leu o resto da mensagem com laí grimas de frustraçaã o queimando-lhe os olhos. Tentando obter a permissaã o agora. Naã o entre em paê nico. Estarei aíí em breve! Emme. Naã o entre em paê nico?!, pensou Hannah, com vontade de atirar o telefone no outro lado da sala. Como poderia naã o entrar em paê nico? — Naã o! — Hannah exclamou, a adrenalina fazendo seu coraçaã o disparar. — Naã o, naã o, naã o! Estava taã o furiosa e frustrada que naã o ouviu a batida aà porta da suííte. Tambeí m naã o ouvira ningueí m entrar, mas sentiu imediatamente um formigamento na nuca e arrepios nos braços. Naã o estava mais sozinha. Hannah ergueu a cabeça, os dedos ainda sobre o teclado do telefone. Era Zale. E, por sua expressaã o, parecia muito aborrecido. Por que estava taã o irritado? Por ela ter adiado a assinatura do contrato? Mas aquilo naã o fazia sentido. Por que um adiamento o perturbaria tanto? — O que haí de errado? — perguntou ela, dando um passo atraí s. — O que eí isso? — exigiu ele, imperioso, aproximando-se dela. — Eu naã o entendo — disse Hannah, dando mais um passo para traí s. Zale continuou andando em sua direçaã o. — Nem eu — disse ele com rispidez. — Explique-me por que voceê cancelou a reuniaã o. Ela chocou-se contra a mesa de cafeí e viu que naã o tinha mais para onde recuar. — Acordei com uma dor de cabeça que soí piorou de laí para caí . — Tenho certeza de que voceê poderia suportar trinta minutos para assinar a papelada. — Naã o posso. A dor estaí taã o forte que nem posso ler agora. — Lerei para voceê , entaã o. O sarcasmo dele era contundente. Por que estava sendo taã o mau? Era necessaí rio ser taã o rude? Taã o inflexíível? — Tenho certeza de que podemos remarcar. — Naã o. — E por que naã o? — exigiu Hannah, igualmente rude. Zale inclinou a cabeça, estudando-a. Naquela manhaã , ele usava um terno preto e uma camisa branca aberta no colarinho. — Porque — disse ele lentamente — os advogados estaã o aqui, a papelada estaí pronta e o acordo deve ser assinado agora. — Mesmo que eu naã o esteja me sentindo bem? — Eu deveria ter me dado conta de que os jogos ainda naã o haviam terminado. — Naã o estou jogando. — O que quer voceê agora? Pretende exigir 10 milhoã es por filho gerado? O que eí , desta vez? — Isso eí loucura! — Tambeí m acho. Mas eí assim que voceê joga, Emmeline. — Naã o. Voceê naã o poderia estar mais errado. Naã o pretendo mudar nada. Soí peço um adiamento para que eu possa tomar um remeí dio, deitar-me e tentar me sentir melhor. — O que haí de errado? — Eu jaí disse. Estou com dor de cabeça. — EÉ isso mesmo? — perguntou ele, examinando-a lentamente da cabeça aos dedos peí s.

17


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Sim — respondeu Hannah, erguendo o queixo, olhando-o nos olhos, desafiando-o a chamaí -la de mentirosa. — Mas, se voceê naã o acredita em mim, por que naã o chama um meí dico para me examinar? — Isso naã o seraí necessaí rio — disse ele secamente. — Eu acho que eí . EÉ claro que voceê duvida da minha sinceridade. Voceê questionou a minha integridade. — Naã o questionei. — Sim, questionou. Voceê foi rude. Por queê ? Para queê ? Por um acordo preí -nupcial? — Foi seu pai quem exigiu o acordo, portanto, naã o me culpe por isso. Hannah empalideceu. O contrato fora ideia do pai da Emmeline? Que tipo de pai era aquele rei William de Brabante? — Todos estaã o aqui por sua causa — acrescentou Zale. — Cinco advogados, Emmeline. Dois dos quais vieram de seu paíís, e um do exterior. Devo mandaí -los para seus aposentos e pedir que esperem ateí amanhaã ? Ele tinha razaã o. Mas o que Hannah podia fazer? Assinar no lugar de Emmeline? Impossíível. — Sim — ela afirmou. — EÉ exatamente isso que voceê deve fazer quando sua futura rainha estiver doente, incapaz de comparecer a uma reuniaã o. Zale inspirou lentamente. — Peço desculpas, Alteza — disse ele entre os dentes cerrados. — Naã o pretendo parecer insensíível. Sua sauí de eí , naturalmente, a minha primeira preocupaçaã o. Tudo o mais pode e vai esperar. Entaã o, curvando-se ligeiramente em um breve cumprimento, ele saiu do quarto.

CAPÍTULO QUATRO

HANNAH AFUNDOU na cadeira mais proí xima logo que Zale saiu, o coraçaã o batendo taã o raí pido que ela sentiu vontade de vomitar. Por um longo instante, naã o conseguiu raciocinar, muito abalada com o confronto com Zale para poder fazer qualquer coisa. Ele estava muito zangado. E sua ira tinha caraí ter pessoal. Como se estivesse aborrecido com ela. Por queê ? Por que o adiamento da reuniaã o o perturbara tanto? Ela naã o tinha dito que naã o assinaria. Naã o pedira nenhuma mudança no contrato. Apenas um tempo. Mas, pelo visto, tempo naã o era algo que Zale estivesse disposto a conceder. Entaã o, lembrou-se de algo que ele dissera: Eu deveria ter me dado conta de que os jogos ainda naã o haviam terminado. Entaã o, acrescentou algo sobre 10 milhoã es por filho gerado, porque era assim que ela jogava. Eu naã o queria parecer insensíível. Sua sauí de eí a minha primeira preocupaçaã o. Todo o resto pode esperar. Mentiroso! Ele fora completamente insensíível e deliberadamente rude. A partir do momento em que entrou em sua suííte, ficou evidente que Zale naã o estava nem um pouco preocupado com a sauí de dela. Em vez disso, ele a intimidou. Acusou-a de estar jogando. Quem ele pensava que era para tratar uma mulher daquela forma? Líívida, Hannah foi atraí s de Zale, e alcançou-o quando ele descia a escadaria. 18


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Majestade, gostaria de lhe falar — disse ela bruscamente. Ele se voltou devagar, uma sobrancelha erguida em sinal de surpresa. — Sua cabeça parece estar bem melhor. — Naã o estaí — respondeu ela, faces coradas, corpo treê mulo de tensaã o. — Voceê me deve um pedido de desculpas. Foi imperdoavelmente rude comigo. — Eu, rude? — E cruel. Deveria ter vergonha de si mesmo! Naã o posso crer que foi assim que seus pais o educaram. — Eu poderia dizer o mesmo de voceê . Comprometida comigo, mas ainda na ativa… — Como se atreve?! — Poupe-me de seu teatro. Eu sei, Emmeline. Sei da verdade. — Qual verdade? — Eu sei por que voceê estava em Palm Beach. Sei o que estava fazendo por laí . — Assistindo a desfiles de moda, comparecendo a jantares e a uma partida de polo promovida por uma instituiçaã o de caridade. — Meu Deus, voceê eí boa nisso — disse ele, voltando a subir as escadas. — Uma partida de polo beneficente! Isso eí maravilhoso. Apegue-se aà sua histoí ria. Mantenha os fatos, certo? — Naã o tenho ideia do que voceê estaí falando. — Emmeline, eu sei de tudo. Sei por que voceê estava em Palm Beach. Sei que voceê foi ao encontro dele. Sei que voceê passou todos os momentos livres que teve na Floí rida ao lado dele. Hannah ficou atordoada. Naã o podia ser… — Naã o — murmurou, naã o querendo acreditar, naã o querendo imaginar que a bela e charmosa Emmeline d’Arcy era infiel. — Isso naã o eí verdade. — Naã o adicione insulto aà injuí ria! Jaí eí grave bastante o fato de ter ido veê -lo, mas naã o minta para mim, tambeí m. Voceê s foram vistos juntos diversas vezes. Alguns amigos se preocuparam em me telefonar, avisando. Hannah sentia frio. As palavras dele a deixaram atoê nita. — Que amigos? — murmurou, horrorizada ao perceber o tipo de relacionamento que Zale e Emmeline mantinham. Como poderiam se casar quando desconfiavam um do outro? Ocultando tantos segredos? Onde estava o amor? E o respeito? — Seraí que importa saber que amigos? — respondeu ele, cansado, expressaã o fechada. — Porque essa eí a verdade. Voceê esteve com Alejandro sempre que poê de. E eu nem mesmo tinha certeza se voceê pegaria o aviaã o para vir para caí . Hannah ficou desolada. Seria por isso que Emmeline queria que Hannah trocasse de lugar com ela? Porque queria mais tempo com o amante? Naã o. Naã o, naã o podia ser… Emmeline era assim taã o fria? Taã o calculista? Hannah balançou a cabeça, confusa, traíída, desejando de todo o coraçaã o nunca ter começado aquela farsa terríível. Pensara que seria uma brincadeira inocente fingir ser Emmeline por algumas horas, mas havia muito mais em jogo. Paííses. Reinos. O autorrespeito de um homem. Hannah teve de desviar o olhar para recuperar o controle. — Sinto muito — disse ela. Sabia, no entanto, que aquelas palavras nada significavam. Emmeline ainda naã o chegara. Hannah estava fingindo ser algueí m que naã o era. E a farsa continuava, o que fazia de Zale Patek um tolo. Seu pai ficaria com tanta vergonha se a visse agora… ele a criara para ser forte, independente e verdadeira. Sincera.

19


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Mas, oh, ela naã o estava sendo sincera. Tudo menos sincera. E Zale merecia mais do que

isso. No míínimo, ele merecia a verdade. — Mas voceê veio — disse ele apoí s um momento, quebrando o sileê ncio tenso. — Veio para ficar? Ou estaí apenas esperando uma oportunidade para fugir? Hannah sentiu calor, depois frio. O que poderia dizer? Nada. Entaã o ela se calou e apenas olhou para ele, o coraçaã o dolorido, desejando contar tudo, mas naã o sabendo por onde começar. Entaã o ele lhe deu as costas e continuou a descer as escadas. ZALE PRECISAVA de ar. Muito. Ele percorreu o corredor central do castelo e foi ateí a sua ala predileta, uma torre de pedra construíída havia quase mil anos, com paredes espessas e balaustradas para as sentinelas. Quando menino, aquele era o seu esconderijo favorito, um lugar onde nem os seus irmaã os poderiam encontraí -lo, e aonde seus pais jamais sonhariam ir. No topo daquela torre, ele se sentia livre. Precisava dessa liberdade agora. Liberdade para pensar, liberdade para respirar. Da balaustrada da torre, Zale tinha uma vista deslumbrante da cidade medieval murada, situada entre a encosta verde da montanha e as aí guas azuis do mar Adriaí tico. Emmeline estava louca ou fora ele quem enlouquecera? Como uma mulher podia parecer ser tantas coisas ao mesmo tempo? Ela estava taã o diferente do que ele esperava! Sempre fora bonita, mas jamais fora taã o firme e decidida. Mas a Emmeline que agora estava sob o seu teto era absolutamente decidida. Corajosa. Quente. Complexa. Ele se esforçou para lembrar-se da princesa que conhecera na festa de noivado havia um ano. Ela ainda se parecia fisicamente com aquela Emmeline — talvez uma versaã o mais saudaí vel e mais atleí tica —, ainda era taã o inteligente e articulada quanto a outra, mas tudo o mais havia mudado. Suas expressoã es. Seus maneirismos. Sua inflexaã o de voz. Tudo mudara desde aquela noite, e ele naã o entendia como. Ele naã o a entendia. Essa era a parte que mais o incomodava. Quem era a verdadeira Emmeline? Aquela mulher taã o reservada e fria que ele certa vez comparara a uma bela estaí tua de maí rmore, de linhas elegantes, rosto deslumbrante e proporçoã es perfeitas? Ou a Emmeline quente, envolvente e desafiadora de agora? A Emmeline que corava facilmente, falava com rapidez e respondera ao seu beijo na noite passada com paixaã o sensual? Se ele fosse um homem comum, poderia optar pela emoçaã o e pela paixaã o. Mas ele era um rei. Era responsaí vel pelo futuro de seu paíís. Assim, precisava de uma princesa adequada. Ele precisava da princesa certa. E, embora fosse muito bonita, Emmeline naã o parecia ser a princesa ideal. Embora desse boas-vindas aà paixaã o, ele precisava de adequaçaã o. Zale precisava de previsibilidade. De força de caraí ter. A Emmeline que estava ali parecia forte. Mas estaria sendo verdadeira ou aquilo era apenas uma encenaçaã o? Como ele poderia se dar ao luxo de arriscar o futuro de seu paíís apostando em um enigma? Em um ponto de interrogaçaã o?

20


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Contudo, se pretendia acabar com tudo, teria de agir logo. Ele assumiria a culpa, pagaria o preço e ficaria livre. Quanto mais tempo protelasse a decisaã o, piores seriam as consequeê ncias. EM SUA suííte, Hannah sentia-se verdadeiramente doente. Ansiosa, vagou pelo quarto, estoê mago revirado, nervos aà flor da pele. Zale achava que sabia a verdade. Achava que sabia de tudo. Mas naã o sabia, e ela deveria ter contado para ele. Ela deveria ter confessado quem realmente era, se desculpado por sua participaçaã o na fraude e, em seguida, se dirigido no aeroporto para pegar um aviaã o de volta para casa. Em vez disso, ela o deixou ir embora pensando que, talvez finalmente, tudo ficaria bem. Hannah ainda vagava pelo quarto quando lady Andrea gentilmente bateu aà sua porta. — Alteza? Seus estilistas estaã o aqui para preparaí -la para a sessaã o. Vamos começar? Hannah abriu a boca para protestar, mas fechou-a, sabendo que fora longe demais. E a uí nica maneira de sair inteira daquela enrascada seria esperar a chegada de Emmeline e ir embora. — Sim. Quase treê s horas depois do confronto com Zale, Hannah ainda estava sentada em uma cadeira diante do espelho, observando Camille, a cabeleireira particular de Emmeline, aplicar um pouco de fixador em seu cabelo para domar os fios rebeldes. — Nunca mais tente tingir o cabelo por conta proí pria, certo, princesa? — disse ela, tocando-lhe o ombro. — Se quiser uma tonalidade mais escura ou aplicar mechas, basta me pedir, oui? — Oui — concordou Hannah, ansiosa para poê r fim aà quela maratona. Estava havia duas horas e meia naquela cadeira, enquanto Camille coloria, cortava e secava o seu cabelo. Hannah raramente ia ao cabeleireiro, e ficou surpresa com como Emmeline podia suportar ter o cabelo tratado por uma estilista profissional toda vez que saíía em puí blico. Teresa, a maquiadora particular de Emmeline, aproveitou a oportunidade para aplicarlhe uma uí ltima camada de ríímel. — Perfeito! — murmurou Teresa, sorrindo em aprovaçaã o, enquanto ela e Camille examinavam criticamente o proí prio trabalho em busca de algum defeito. — O que acha, Alteza? Haí algo que gostaria de mudar? — Nada — respondeu Hannah, surpresa com o quanto ela se parecia com a princesa Emmeline, Nunca fora taã o loira em toda a vida! Agora que seu cabelo fora cortado e colorido, e ela, maquiada pelas maã os haí beis da mesma pessoa que fazia a maquiagem de Emmeline, realmente poderia passar por uma princesa. — Estou… estou… — Hannah procurava as palavras certas para se expressar, mas naã o conseguia encontraí -las. — Impressionante — disse uma voz grave junto aà porta. Ela agarrou os braços da cadeira quando seus olhos cruzaram com os de Zale no espelho. Ele naã o parecia estar com raiva, apenas carrancudo, mas ela naã o estava preparada para veê -lo. Jaí haviam se falado o bastante naquele dia. — Gostarííamos de alguma privacidade, por favor — pediu o rei para as estilistas. Hannah engoliu em seco quando as duas saííram do aposento e fecharam a porta, deixando-a sozinha com Zale. Durante um longo tempo, ele naã o disse uma palavra. — Eu estava errado — afirmou, afinal, quebrando o sileê ncio. — Lidei mal com a situaçaã o esta manhaã . Era a uí ltima coisa que Hannah esperava que ele dissesse. — Suponho que voceê nunca tenha cancelado uma reuniaã o por causa de uma dor de

21


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

cabeça — disse ela. — Naã o. — Assim como suponho que voceê nunca tenha permitido que uma dor de cabeça o impedisse de comparecer a um jogo de futebol. — Definitivamente naã o. — Voceê jogou com dor? — Meu trabalho era-jogar, naã o ficar sentado no banco. Ela esperava por isso. Afinal, voceê naã o se torna uma estrela do meio-campo sem muita dor e sacrifíício. — Entaã o, sem desculpas. — Sem desculpas — repetiu ele. Ao menos neste ponto, o pai de Hannah concordaria com Zale. Seu pai era fíísica e mentalmente duraã o, e ele a criara para ser assim tambeí m. Ela naã o deveria pedir desculpas por nada. Sempre faça o melhor que puder, diria ele, naã o importa o queê . Naã o que estar ali, passando por Emmeline, fosse o melhor que ela pudesse fazer. — Compreendo agora por que estava taã o chateado comigo — acrescentou ela, cautelosa. — Mas naã o entendi esta manhaã . Achei que voceê agia como um tirano. — Um tirano? — Uma pessoa intolerante. Ele pareceu assustado e, em seguida, sorriu. — Estamos cometendo um erro, Emmeline? A pergunta, feita taã o tranquilamente por aquela voz grave e profunda, a chocou. — O queê ? — Eu me pergunto se estamos forçando algo que naã o deveria acontecer. Ela olhou para ele, atordoada demais para falar. — Nosso relacionamento nunca foi faí cil — acrescentou Zale, inclinando-se contra a parede, a testa franzida. — Sei por que insisti nisso. Mas e voceê ? Haí uma meia duí zia de nobres com quem poderia se casar agora. Voceê poderia escolher qualquer um entre eles. — Mas eu escolhi me casar com voceê — interrompeu ela suavemente. — Por queê ? — Pelas mesmas razoã es que voceê me escolheu. Nossas famíílias aprovaram a nossa uniaã o e nossos paííses estreitariam os laços de amizade, garantindo a segurança da proí xima geraçaã o. Ele suspirou e passou a maã o pelo queixo. — Gostaria de poder acreditar em voceê . Ela se aprumou. — E por que naã o pode? — Por causa de seu comportamento no ano passado. Os fins de semana secretos com seu namorado argentino. As prolongadas negociaçoã es contratuais. Sua recusa em passar um tempo comigo ateí agora. — Ele fez uma pausa. — Eu seria um tolo se confiasse em voceê . Ela sabia que ele estava falando de Emmeline, mas, naquele momento, sua raiva e desconfiança a tocaram pessoalmente. — Voceê seria ainda mais tolo caso se me deixasse ir embora. Algo cintilou nos olhos dele. — Por queê ? — O seu paíís sofre com a mesma crise econoê mica que assola o resto da Europa, mas voceê tem planos para transformar a economia, e esses planos dependem de mim. — Hannah falava baseada em mateí rias jornalíísticas que lera na internet sobre o impacto que o casamento real teria sobre Raguva: aumento do turismo, maiores recursos financeiros, maior influeê ncia e visibilidade. — Desde o anuí ncio de nosso noivado, a popularidade de Raguva disparou. O litoral do paíís se tornou uma nova Riviera, e o puí blico estaí ansioso para saber sobre o nosso

22


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter casamento. A transmissaã o da cerimoê nia vai trazer milhoã es para o tesouro real. — Fez uma pausa. — Estaí disposto a jogar tudo isso fora por um mero capricho? — Naã o eí um capricho. Haí muito tempo estou preocupado com sua aptidaã o para ser minha rainha. — Entaã o por que deixou passar tanto tempo? O casamento seraí realizado em apenas nove dias. Os advogados estaã o aqui, todos os cinco. E, neste exato momento, o pintor retratista estaí laí fora, montando o cavalete. Os olhos dele se estreitaram. Ele contraiu a mandííbula. — Gosto de mulheres seguras de si, Emmeline, mas voceê estaí se revelando absolutamente descarada. Voceê circulou ostensivamente com seu namorado, durante meses, bem de baixo do meu nariz, e ainda assim espera que eu ignore tudo isso e me case com voceê ? Ela sentiu o rosto corar ao dizer: — Naã o haí nenhum namorado. — Emmeline, eu sei tudo sobre Alejandro. Voceê s estaã o juntos haí anos. — Mas isso foi antes de estarmos comprometidos. Noí s naã o estamos mais juntos. Zale lançou-lhe um olhar frio e sombrio. — Entaã o, como explica as fotos em que voceê e Alejandro aparecem no jogo de polo em Palm Beach? — Voceê sabe que eu compareci aà partida e posei para fotos depois. Era um evento beneficente, e tirei fotografias com todos os presentes. Por que naã o me pergunta sobre as fotos que tirei com os outros jogadores ingleses e australianos? — Porque voceê naã o estaí envolvida com nenhum daqueles jogadores. — Mas naã o estou envolvida com mais ningueí m. Estou aqui, comprometida com voceê . — Talvez esteja aqui em corpo, mas naã o em espíírito. — Voceê naã o sabe. Voceê naã o pode dizer isso! — rebateu ela. A uí ltima coisa que Hannah queria era ser responsaí vel pelo fim do relacionamento de Emmeline e Zale. Ela haã o pretendia que Zale rompesse o noivado naquele momento. Naã o. Se Zale queria acabar o noivado, que terminasse com a Emmeline verdadeira, naã o com ela. E se Emmeline queria terminar tudo, entaã o ela que viesse dizer isso pessoalmente para ele. A presença da princesa Emmeline se fazia necessaí ria. Imediatamente. — Voceê veê apenas meus defeitos e nenhuma de minhas qualidades — disse ela. — Talvez seja porque seus defeitos superem suas qualidades. — Entaã o eí isso? Voceê jaí estaí certo do que quer, jaí decidiu nosso destino? — Voceê me faz sentir como um carrasco prestes a decapitaí -la. — EÉ o que parece. — Emmeline! Ela balançou a cabeça. — Voceê naã o estaí me dando uma chance. — Eu lhe dei 12 meses de chance! — Mas eu estou aqui. Eu vim. Vamos jogar o maldito jogo, Zale! — O que significa isso? — Isso significa que ainda estamos no iníício da partida e voceê jaí estaí querendo abandonar o campo. Mas noí s temos nove dias ateí a cerimoê nia, nove dias para descobrir o que eí real e o que naã o eí . Entaã o, baixe a bola. Deê -me uma chance de jogar. — O que sugere? — Usemos esse tempo para nos conhecer. Façamos um esforço para vermos se isso poderia funcionar antes de tomarmos uma decisaã o precipitada. Ele parecia ceí tico. — Nos proí ximos nove dias tentaremos descobrir se somos compatííveis. Se realmente formos, noí s nos casamos, como planejado. Se naã o, terminamos tudo de maneira amigaí vel. — Parece razoaí vel, exceto por uma coisa. Naã o podemos cancelar o casamento na uí ltima

23


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter hora, naã o depois de todos terem viajado e gastado tanto tempo e dinheiro para estar aqui para o evento. Seria um pesadelo em termos de relaçoã es puí blicas. — Cinco dias, e tomamos uma decisaã o. — Quatro — respondeu ele. — Quatro dias devem ser mais do que suficientes se usarmos o tempo com sabedoria. E, entaã o, se eu ainda naã o estiver satisfeito, acabou. Naã o haveraí mais negociaçaã o. Entendeu? Hannah ergueu o queixo, a expressaã o determinada. — Entendo perfeitamente. Mas devo advertir que sou forte. Eu jogo duro. E estarei jogando para ganhar.

CAPÍTULO CINCO

NO MOMENTO em que saiu do recinto, Hannah pegou o telefone e tentou ligar para Emmeline. A ligaçaã o caiu no correio de voz da princesa. — Voceê precisa vir para caí , Emmeline. Zale estaí ameaçando cancelar o casamento. Raí pido! — Hannah desligou no exato momento em que lady Andrea entrou na sala. — Alteza, monsieur Boucheron, o artista contratado para fazer o seu retrato, estaí pronto. Hannah colocou o telefone de volta na gaveta ao lado da cama antes de seguir lady Andrea ateí o quarto da rainha, onde monsieur Boucheron montara o seu cavalete. Nas duas horas seguintes, Hannah ficou imoí vel, sentada em uma luxuosa cadeira sem braços, enquanto a luz amarela da tarde iluminava os seus ombros e o seu rosto. Lady Andrea, Camille e Teresa aguardavam ao fundo da sala enquanto o artista desenhava. De vez em quando, Camille ou Teresa se aproximavam para ajeitar um fio de cabelo ou aplicar um pouco de poí na testa ou no nariz do modelo. Mas Hannah naã o se moveu, nem se queixou, olhar fixo num ponto distante. Sua calma era fingida. Debaixo do frescor de seu sorriso, ela se sentia uma pilha de nervos. E se Emmeline estivesse adiando o voo para Raguva deliberadamente, para que pudesse passar mais tempo com o namorado? Hannah apertou as maã os sobre o colo. Por favor, que naã o seja esse o caso. Emmeline naã o poderia ser taã o egoíísta. — Que tal uma pausa? — sugeriu o artista, baixando o pincel. — Vossa Alteza parece infeliz. Hannah assentiu, e correu para o quarto para tentar ligar para Emmeline novamente. Dessa vez, conseguiu. — Eu naã o compreendi a sua mensagem — disse Emmeline. A recepçaã o naã o estava boa, e a mensagem veio truncada. — Voceê estaí com Alejandro? — desferiu Hannah. — O queê ? — Voceê sabe, o seu namorado argentino, o jogador de polo! — Como sabe? — perguntou Emmeline, tensa. — Zale. Ele naã o estaí satisfeito. Voceê tem de vir agora. Hoje. Voceê tem de resolver isso antes que seja tarde demais. — Voceê sabe que estou tentando. — Naã o, Emmeline, naã o creio que voceê esteja tentando. E as coisas estaã o desmoronando por aqui. 24


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— As coisas tambeí m estaã o caindo aos pedaços por aqui! — Zale quer terminar o noivado. Ele naã o acha que voceê seja compatíível. — Como ele pode dizer isso? Ele nunca passou algum tempo comigo! — Exato. Se voceê quiser salvar seu casamento, teraí de chegar aqui raí pido, porque ele estaí nos dando… bem, estaí dando para voceê apenas quatro dias para que prove que voceê eí a noiva ideal para ele. — Mesmo que eu seja raí pida, naã o serei capaz de chegar aíí antes de amanhaã , entaã o, nas proí ximas 24 horas, caberaí a voceê convenceê -lo a se casar comigo. — Mas, Emmeline, eu naã o sou voceê ! — Entaã o, seja voceê mesma. Ajeite as coisas. Eu sei que voceê pode. — Por que deveria? O que voceê jaí fez por mim? — O que voceê quer que eu faça? Boa pergunta. O que Hannah queria? Ela jaí tinha um bom emprego e bons amigos. Gostava de si mesma. Gostava do que realizara na vida. Tudo o que ela realmente queria agora era se apaixonar, mas sabia que naã o encontraria o homem ideal no noivo de outra mulher. — Soí quero que voceê venha para caí e me tire dessa situaçaã o. Este eí o seu relacionamento. O seu compromisso. — Eu sei! — A voz de Emmeline falseou de suí bito. — Hannah, eu sei. Mas estou em apuros. — Voceê ainda quer se casar com o rei Patek? — Sim — respondeu Emmeline rapidamente. Entaã o, apoí s uma pausa: — Naã o, eu naã o quero. Mas tenho de casar. EÉ o que as nossas famíílias desejam. O pai de Zale e o meu pai. Eles chegaram a um acordo que, essencialmente, obriga-me ao casamento. Se eu naã o casar com Zale, meu pai teraí de pagar 5 milhoã es de euros. Se eu deixar de cumprir as minhas obrigaçoã es de qualquer forma, minha famíília teraí de pagar. — Ou seja, voceê naã o pode terminar o noivado. — Naã o. Naã o sem desonrar a minha famíília. — E se o rei Patek romper o noivado? — Se ele romper o noivado sem motivo, ele pagaraí aà minha famíília 2 milhoã es e meio de euros. Mas se ele o romper por justa causa, a minha famíília ainda teraí de pagar 5 milhoã es. — Por que ele soí tem de pagar metade do que paga a sua famíília? — Ele eí um rei. Eu sou apenas uma princesa. Apenas uma princesa, repetiu Hannah silenciosamente, oprimida por aquele mundo de riqueza, nobreza e poder. — Entaã o, como pode ver, eu preciso de voceê — disse Emmeline com a voz cansada. — Preciso de voceê para convencer Zale de que sou a mulher ideal para ele. — Voceê naã o pode conversar com a sua famíília a esse respeito? Naã o pode ir ateí o seu pai e dizer… — Naã o. Meu pai jamais entenderia. Ou me perdoaria. Meus pais… eles naã o saã o como eu. Saã o muito rigorosos. Muito antiquados. Sei que eles querem o meu bem, mas me desaprovam, me veem como se eu fosse… corrompida. — Corrompida? Mas como? — Naã o verdadeiramente nobre. — Mas por queê ? Houve um sileê ncio na linha, e Hannah demorou algum tempo ateí perceber que Emmeline estava chorando. Ela sentiu pena da princesa. — Emmeline, vai ficar tudo bem… — Naã o desta vez, Hannah. Desta vez eu vou perder, naã o importa o que aconteça. Hannah odiava o sofrimento, sob qualquer forma, e Emmeline estava sofrendo. — Naã o desista. Mantenha a calma. Eu vou fazer o melhor que puder ateí que voceê possa chegar aqui. ■

25


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Obrigada, Hannah, e eu chegarei. Assim que puder. Hannah desligou o telefone, exausta. Aquilo estava se tornando um desastre absoluto. E nada disso teria acontecido se Hannah naã o tivesse um coraçaã o mole. Seu pai sempre lhe dissera que ela era muito boa e que as pessoas se aproveitariam dela. Ele previu que um dia a sua falta de fibra lhe custaria caro, e ele estava certo, foi o que aconteceu. Meia hora depois, lady Andrea entrou na suííte de Hannah com a expectativa de encontraí -la vestida e pronta para o jantar. Em vez disso, Hannah estava deitada na cama usando o celular para fazer uma pesquisa na internet sobre o namorado argentino de Emmeline, Alejandro. — Alteza, Sua Majestade a espera em poucos minutos. Era uma pena ela ter esperado ateí agora para saber o que podia sobre Emmeline, mas nobres e celebridades nunca a interessaram. Agora, poreí m, desejava ter dedicado um pouco mais de atençaã o a celebridades de Hollywood e a membros da realeza europeia, principalmente a jovem realeza europeia contemporaê nea. — Eu sei. Estarei pronta — disse ela. — Assim que terminar de ler esta mateí ria. — Mas Vossa Alteza naã o estaí vestida para o jantar. Jaí sabe o que vai usar? — Naã o. Voceê pode escolher para mim. Lady Andrea escolheu um deslumbrante vestido azul-marinho, brincos de safira azul e elegantes sapatos de salto alto. Hannah sentiu-se mais glamorosa do que nunca. O mordomo de Zale abriu a porta dos aposentos reais, convidando-a a entrar. — Eu naã o tive o prazer de conheceê -la ainda, Alteza, mas estou ansioso para servi-la — disse o Sr. Krek com uma revereê ncia formal. Hannah sorriu calorosamente. — EÉ bom conheceê -lo. Ouvi falar muito bem de voceê . — Estou ansioso para servi-la, Alteza. — Obrigada, Sr. Krek. — Agora, se me daí licença, providenciarei as bebidas e os aperitivos. Hannah sentiu um arrepio de puro prazer percorrer-lhe a espinha no momento em que viu Zale Patek de peí junto aà porta, trajando um smoking elegantííssimo. — Majestade! — ela exclamou, sem foê lego. — Alteza — respondeu ele, caminhando em sua direçaã o. — Gostei do vestido. O coraçaã o de Hannah disparou. — Mas naã o gosta da mulher que o veste… Ele buscou os olhos dela. — Ainda estou decidindo. Ela ergueu uma sobrancelha. — Bem, quando chegar a uma decisaã o, me avise. O CALOR tomou conta do corpo de Zale. Meu Deus, como Emmeline era interessante. Inteligente, bonita, desafiadora e complexa. Pela manhaã , ele estava disposto a terminar o noivado com Emmeline. Transferiria o dinheiro que devia para a famíília d’Arcy e começaria a procurar uma noiva mais adequada. Fora por isso que ele a procurara em seu quarto. Por isso ele fora honesto. Direto. Contudo, agora que ela estava pedindo uma chance de mostrar-se digna, ele se sentia disposto a lhe dar essa oportunidade. Naã o por altruíísmo, eí claro: Em sua festa de noivado, ele a achara linda, mas naã o sentira a forte atraçaã o fíísica que sentia por ela naquela noite. A verdade era que ele naã o sentira muita coisa por ela durante todo o ano. Entretanto, desde o dia anterior, ele naã o conseguia evitar imaginaí -la nua em sua cama. Queria ver os seus longos cabelos loiros despenteados sobre o travesseiro. Queria

26


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter desestabilizaí -la, fazeê -la desmoronar e ver se havia uma mulher de verdade, uma mulher ardorosa, debaixo daquele rosto deslumbrante. — Noí s dois temos agendas lotadas — disse ele, — mas verei se consigo cancelar os nossos compromissos e as apariçoã es para que possamos passar algum tempo juntos nos proí ximos dias. — Quatro — interrompeu ela. — Voceê me prometeu quatro dias a partir de amanhaã . — Eu achava que eram quatro dias a partir de hoje. — A partir de amanhaã — insistiu ela com firmeza. — O dia de hoje jaí estava pela metade quando fizemos o acordo. — Talvez, mas, como pretendo passar todo esse tempo ao seu lado, eí possíível que voceê ache quatro dias um prazo excessivamente longo. Seraí que voceê naã o vai se cansar de mim logo? — Soí vou me cansar de voceê se voceê for chato. Pretende ser chato? Ela era escandalosa. E devia ser punida. Com maã os, boca e lííngua. Hannah olhou ao redor da sala, expressaã o serena. — Estou morrendo de fome. Sabe quando o jantar seraí servido? — Eu naã o me distraio taã o facilmente — disse ele. — Uma mudança de assunto naã o vai me fazer mudar de ideia. — Tenho certeza de que voceê jaí ouviu a expressaã o “naã o ponha a carroça na frente dos bois”. Ele deixou o olhar vagar lentamente sobre os seios, os quadris e as coxas de Hannah. — Voceê eí a carroça? Ou o boi? Ela ergueu o queixo. — Nem uma coisa e nem outra. O SR. Krek serviu o jantar em uma mesa redonda junto aà lareira da sala. — Eu sabia que o seu ingleê s era excelente — disse Zale no meio do jantar. — Mas naã o tinha percebido que voceê falava com sotaque americano. Estudou nos EUA ou teve um tutor americano? Ela lera em algum lugar que Zale Patek falava mais idiomas do que qualquer outro nobre europeu: espanhol, italiano, franceê s, ingleê s, sueco, turco, grego e, naturalmente, sua lííngua nativa, o raguviano. Era um tipo raro de atleta e estudante aplicado. — Tutor americano — disse ela, tentando lembrar se Emmeline estudara nos EUA. — E voceê ? — Fui educado na Inglaterra. Coleí gio interno aos 10 anos. Depois, cursei uma universidade. — Por que na Inglaterra? — Tradiçaã o. Frequentei as mesmas escolas que meu irmaã o, meu pai, meu avoê e meu bisavoê . — Quando voceê tiver filhos, eles estudaraã o no mesmo lugar? — Voceê quer dizer, os nossos filhos? — disse ele, ligeiramente zombeteiro. — Sim, os nossos filhos — ela afirmou, corando. — Nossos dois filhos — acrescentou Zale. — O herdeiro e o substituto. EÉ tudo o que voceê concordou em me dar, lembra? Hannah olhou-o sem dizer palavra. — Por que, Emmeline, voceê insiste em ter apenas dois filhos? Nunca me deu uma explicaçaã o adequada. — Ele sorriu, desanimado. — Finalmente temos tempo para conversar direito e discutir tudo aquilo que voceê naã o quis discutir no ano passado. Eu adoraria saber por que voceê insistiu em limitar a nossa famíília a dois filhos. Se pretendemos salvar o nosso relacionamento, creio que esse eí o melhor lugar por onde começarmos. — Eu naã o sei. Zale pegou a maã o dela e levou-a aà boca.

27


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Tem medo de perder a linha? Ela recolheu a maã o. — Naã o! — Sua liberdade, entaã o? — Isso eí bobagem. — Bem, eí difíícil ir para a balada quando se estaí graí vida. — Naã o pretendo ir para a balada e, apesar do que voceê possa imaginar, estou ansiosa para ter uma famíília. — Mas naã o uma grande famíília. — Exato. — Por queê ? — Prefereê ncia pessoal. Por que voceê quer uma famíília grande? — Porque gostei de ter irmaã os. A amizade e o companheirismo deles significaram muito para mim. Voceê acha que o seu medo da gravidez se deve aà morte de sua maã e apoí s o parto? Hannah ficou atoê nita. A maã e de Emmeline morrera no parto? Mas como seria possíível? A maã e de Emmeline, a rainha Claire, estava viva e bem, e estivera desfrutando feí rias na Espanha na semana anterior. — Minha maã e estaí viva — disse Hannah, atoê nita com a coincideê ncia, jaí que a sua maã e tambeí m morrera durante o parto. — Perdaã o. Eu deveria ter dito a sua maã e bioloí gica. Sei que voceê foi adotada por seus pais, o rei William e a rainha Claire d’Arcy, quando tinha apenas seis dias de vida. — Como descobriu? — ela murmurou. — Seu pai me contou haí alguns meses, quando esse impasse surgiu nas negociaçoã es dos nossos contratos. Ele queria que eu entendesse que a sua relutaê ncia em ter filhos naã o se devia ao egoíísmo e, sim, ao medo. — Entaã o, se meu pai lhe disse a razaã o, por que me perguntou? — Hannah esforçava-se para controlar seu temperamento agressivo. — Eu queria que voceê me dissesse. — Por queê ? — Porque, ao menos uma vez, gostaria de ouvir a verdade de voceê — disse ele, igualmente irritado. — Eu gostaria de conhecer a verdadeira Emmeline. Naã o sei quem voceê eí , o que voceê quer, ou o que realmente sente. Ela estremeceu. — Voceê quer saber o que penso? Pois eu acho um absurdo as mulheres ainda morrerem no parto. Colocamos homens na lua, criamos armas de destruiçaã o em massa, produzimos drogas milagrosas e construíímos modernos hospitais. Entaã o, por que naã o podemos fazer partos seguros? Como podemos permitir que as mulheres morram enquanto criam a vida? — Porque somos mortais. Todos acabamos morrendo um dia. O pai de Hannah, Jake, costumava dizer a mesma coisa. — EÉ traí gico — disse ela com tristeza. — As crianças precisam de suas maã es. — Assim como as maã es precisam de seus filhos. Minha maã e ficou muito triste ao saber que naã o poderia salvar a vida do meu irmaã o mais velho. Eu a ouvi dizer diversas vezes que desejava poder trocar de lugar com Stephen, seu primogeê nito. Ela sempre foi muito ligada a ele. — Voceê s naã o eram chegados? — Naã o tanto quanto eu gostaria. Mas eu era o filho do meio, e meu irmaã o mais novo precisava mais de minha maã e. — Onde estaí o seu irmaã o mais novo? — Aqui, no palaí cio.

28


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Por que naã o o conheci? Ele hesitou, escolhendo cuidadosamente as palavras. — Constantino tem necessidades especiais e requer muitos cuidados. Ele se apega aà s pessoas facilmente e naã o compreende as perdas. Hannah franziu a testa, intrigada. — Voceê tem medo de que eu o magoe? — Naã o deliberadamente. Mas, de modo a protegeê -lo, decidi esperar para apresentaí -la quando tiver certeza de que voceê vai ficar.

CAPÍTULO SEIS

MAIS TARDE naquela noite, deitada na cama, Hannah pegou o celular e pesquisou sobre a famíília Patek. Havia dezenas de mateí rias on-line, mas pouquííssimas refereê ncias ao prííncipe Constantino. Para o mundo exterior, o jovem prííncipe naã o existia. Hannah podia entender por que Zale protegia o irmaã o do resto do mundo, mas por que evitar que sua futura esposa conhecesse o uí nico familiar ainda vivo? Aquilo fazia Hannah pensar que Zale naã o tinha intençoã es de se casar com Emmeline. Hannah desligou o telefone e o abajur ao lado da cama, mas naã o conseguia dormir. Zale naã o era um homem faí cil. Era severo, orgulhoso e competitivo. E quanto mais ela o conhecia, mais se convencia que ele esmagaria Emmeline. Naã o intencionalmente, eí claro, mas apenas porque ele naã o conhecia a proí pria força. Ele jamais conquistaria o coraçaã o de Emmeline intimidando-a. Zale precisava cortejaí la, mostrar que tinha um lado mais ameno, que Hannah sabia que ele tinha, uma vez que vislumbrara esse seu lado em alguns momentos. Era hora de Zale esforçar-se um pouco, de fazer um esforço para conquistar Emmeline em vez de julgaí -la e criticaí -la. Ele podia ser rei, mas precisava começar a tratar a noiva como a rainha que ela viria a ser. Hannah acordou cedo na manhaã seguinte e chamou Celine para ajudaí -la a se vestir. — Voceê poderia dizer para Sua Majestade que eu gostaria de falar com ele? — pediu Hannah ao sair do chuveiro. Naquela manhaã , ela escolheu a proí pria roupa: um vestido de linho cor de damasco e um sueí ter de casimira na mesma tonalidade. Colocou uma pulseira e pequenos brincos de ouro, e puxou o cabelo para traí s em um rabo de cavalo. Ela fez a proí pria maquiagem e estava terminando de aplicar o ríímel quando chegou a notíícia de que Sua Majestade a esperava na sala de jantar familiar. A sala de jantar familiar era um coê modo acolhedor no segundo andar do palaí cio. Altas janelas ocupavam as paredes, e a luz do sol projetava raios brilhantes sobre a mesa. Zale estava sentado junto a uma pilha de jornais e uma xíícara de cafeí expresso. Ele levantou a cabeça quando ela entrou na sala. O criado serviu-lhe cafeí e trouxe-lhe um suco de laranja antes de entregar-lhe um pequeno menu impresso. Ela arqueou as sobrancelhas, surpresa. Um menu impresso para uma refeiçaã o em famíília? Zale deve ter lido a sua mente, pois disse: — O chefe pode preparar o que voceê desejar, mas ele tambeí m oferece itens especiais todas as manhaã s, dependendo do que encontrar no mercado local. — Como voceê descobriu o que eu estava pensando? 29


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Voceê eí faí cil de desvendar. — Ele dobrou o jornal e baixou-o sobre a mesa. — Entaã o, no que estou pensando agora? — perguntou ela. Zale estudou-a um instante, expressaã o inescrutaí vel. — Estaí aborrecida por eu naã o teê -la apresentado ao meu irmaã o, e estaí aqui para me convencer do contraí rio. — Nem um pouco — disse ela, tomando um gole do cafeí quente e forte. — Acho que voceê estaí certo. Seu irmaã o deve ser protegido. Ateí estarmos absolutamente certos de que vamos prosseguir com o casamento, devemos ser cuidadosos. Eu odiaria começar a gostar de seu irmaã o e, em seguida, descobrir que voceê naã o eí inteiramente adequado para mim. Ele ergueu uma sobrancelha. — Agora sou eu quem naã o eí adequado? — Andei pensando no que voceê me disse ontem aà noite, sobre a nossa falta de compatibilidade, e voceê pode ter razaã o. Ele se remexeu na cadeira. — EÉ isso mesmo? Ela assentiu e tomou outro gole de cafeí . — Noí s naã o conhecemos um ao outro, e a uí nica maneira de voceê saber se eu sou a noiva ideal eí sendo eu mesma. Entaã o, de agora em diante, serei eu mesma. E espero que voceê goste do meu eu verdadeiro. Se naã o gostar, poreí m, prefiro ir para casa e me casar com algueí m que goste de minha companhia. — Voceê me rejeitaria? Ela sorriu o mesmo sorriso paciente que dedicava ao sheik Al-Makin Koury quando este a incumbia de uma tarefa impossíível. — Jaí que estamos decididos a sermos completamente honestos, admito que tambeí m naã o quero me casar com algueí m de quem naã o gosto. Imagino que voceê tenha algumas atividades divertidas planejadas para os proí ximos quatro dias aleí m de assinar documentos, posar para retratos e selecionar padroã es de porcelana. — Se pretendemos nos casar… — Sim, se. Mas, como voceê deixou bem claro ontem, naã o sabemos se vamos. Na verdade, voceê estaí bem certo de que naã o nos casaremos. Entaã o, talvez, escolher um padraã o de porcelana possa ser uma colossal perda de tempo. Talvez deveê ssemos dar um tempo e… namorar, para começo de conversa. — Namorar? — Sim. Almoços. Jantares. Atividades que nos permitam passar o tempo juntos de uma forma descontraíída e agradaí vel. — Isso eí uma piada? — Naã o. Eu naã o faria piadas sobre o nosso futuro. Zale olhou-a com a expressaã o sombria. — Estaí taã o diferente daquela mulher que conheci haí um ano. Voceê estava taã o quieta em nossa festa de noivado. Mal olhou para mim. De onde veio tanta personalidade? Hannah deu de ombros. — Esteve sempre aqui, embora um pouco reprimida pela desaprovaçaã o dos meus pais. Mas meus pais naã o vaã o se casar com voceê . Eu sim. — E essa epifania ocorreu-lhe na noite passada? — Sim. Enquanto eu estava deitada. — Ela acenou para o criado. — Quero ovos florentinos e algumas frutas frescas. Obrigada. — Pegou o guardanapo de linho branco e pousou-o sobre o colo. — Pensei que ficaria satisfeito com minha epifania, mas voceê naã o parece feliz. De fato, ele naã o parecia muito contente. — Acho a sua atitude um tanto arrogante, considerando as circunstaê ncias. Seus pais investiram muito dinheiro em nosso casamento.

30


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Cinco milhoã es de euros. — E eu tambeí m estou investindo. — Dois milhoã es e meio. Porque voceê eí um rei e eí mais importante do que eu. — Emmeline… — Zale franziu o cenho, em sinal de adverteê ncia. Hannah ignorou-o. — Mas essa eí a realidade, naã o eí mesmo? Voceê eí um rei e eu sou apenas uma princesa. — Pare. — EÉ verdade. Voceê tem mais poder. Pode se dar ao luxo de ser críítico. Implacaí vel. — Eu naã o sou assim. — Voceê jaí me disse diversas vezes que naã o sou adequada, entaã o, por que eu deveria querer me casar com voceê ? Por que eu desejaria passar a vida inteira com uma pessoa que me trata como meus pais? Ele se recostou na cadeira e ficou calado por um longo tempo. Entaã o, balançou a cabeça e disse: — Eu respeito seus pais, mas naã o sou como eles. — Mas tudo que ouvi de voceê desde que cheguei aqui eí que sou uma decepçaã o e que voceê naã o veê a hora de se livrar de mim. — Eu acho que tambeí m jaí disse que voceê eí linda uma meia duí zia de vezes. — Mas prefiro que voceê goste de quem eu sou em vez de gostar de minha apareê ncia. A beleza acaba. As apareê ncias mudam. EÉ o interior que importa, e essa eí a parte de mim voceê naã o gosta. — Eu nunca disse isso. — Porque naã o haí nada em mim, aleí m da minha linhagem e da minha apareê ncia, de que voceê goste. Ele ficou em sileê ncio, e ela soube que ganhara aquela partida. Podia ver nos olhos dele. Zale respirou profundamente e disse, apoí s um instante: — Gosto de voceê agora. Gosto da sua franqueza. Eu valorizo a honestidade. — Zale, acho que haí um monte de coisas que voceê gostaria em mim caso tivesse a oportunidade de me conhecer. Eu adoro aventuras. Tenho um oí timo senso de humor. Gosto de viajar, ler e aprender sobre novas culturas. Mas, se voceê continuar jogando o passado na minha cara, nunca vai conhecer nada disso. — EÉ difíícil esquecer que ateí a semana passada voceê estava com Alejandro. — Seria seu orgulho falando? — Naã o. EÉ o realista que tenho dentro de mim. Aquele que sabe que as manchas dos leopardos naã o mudam. — Mas o realista tambeí m deveria ver que estou aqui. Pedi para acompanhaí -lo no cafeí da manhaã . Nos proí ximos dias, quero passar tanto tempo quanto possíível com Zale, o homem, naã o o rei. Mas voceê tem de querer estar comigo tambeí m, porque naã o quero me casar com meu pai. Quero um homem que goste de mim. Que aprecie minha companhia. E quem sabe, algum dia, venha a me amar. Zale se levantou, atravessou a sala e, em seguida, virou-se para encaraí -la. — Talvez precisemos apagar tudo e começar de novo — disse ele calmamente. — Voceê consegue? — Terei de tentar para saber. Mas vamos fazer o que voceê sugeriu. Tentemos agir como um casal normal que deseja se conhecer. Passaremos algum tempo juntos… vamos namorar. Ela sorriu ao ouvir o modo como ele disse a palavra “namorar”. Zale a fazia soar estranha e exoí tica, como se fosse algo que ele nunca fizesse normalmente. — OÉ timo. EÉ a uí nica forma de sabermos se de fato temos uma chance. — Sendo assim, vamos começar a… namorar… hoje. Tenho algumas reunioã es matinais, mas, uma vez que eu me livre delas, sairemos pelo resto do dia. Ele fez uma pausa, pensou por um momento e depois acrescentou:

31


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Iremos nos encontrar aà s 11hs. Vista algo confortaí vel, traga um agasalho e um maioê , apenas por garantia. Um agasalho e um maioê ? Ela ficou imediatamente curiosa de saber aonde iriam, mas naã o perguntou. — Estarei pronta. HANNAH VESTIU uma calça de linho branco e uma camisa de malha com listras azuis e brancas coberta por um casaco azul-marinho. Era uma combinaçaã o excessivamente naí utica, mas o conjunto mais casual que Hannah encontrara no guarda-roupa da elegante princesa Emmeline. Relutante, ela pegou um biquííni de Emmeline e duvidou que sua figura curvilíínea coubesse naqueles dois pedacinhos de pano, mas Zale dissera para ela trazer um traje de banho, e assim ela o faria. Desceu a escadaria aà s 10h55 e encontrou Zale jaí esperando. Hannah achava que um carro os estaria aguardando laí fora, mas em vez disso descobriu um helicoí ptero pousado no paí tio do estacionamento. O piloto deu fones de ouvido para que Hannah e Zale usassem durante o voo, de modo a abafar o ruíído do motor. Os fones de ouvido eram equipados com microfones, mas Zale permaneceu calado quando decolaram do heliporto do palaí cio e voaram sobre a cidade murada, sobre colinas, pinheiros e ciprestes, e encostas salpicadas de casas de telhados vermelhos. Mesmo com os microfones, seria impossíível conversar por causa do barulho, mas Hannah naã o se importou com o sileê ncio, uma vez que lhe dava a chance de realmente ver Raguva. Ela estava fascinada por aquele pequeno reino na costa da Dalmaí cia. — Estamos indo para a minha ilha — disse Zale, dez minutos depois da decolagem. — Naã o tenho ido laí nos uí ltimos anos, mas achei que seria bom desfrutarmos algum tempo de lazer fora do palaí cio. Durante vinte minutos, voaram sobre aí guas cor de safira, sobre veleiros, barcaças e iates ateí começarem a sobrevoar diversas ilhas rochosas. As ilhas eram quase esteí reis, com apenas algumas aí rvores retorcidas acima de abruptas faleí sias. Ela divisou ruíínas em uma ilha, uma modesta casa de pedra em outra. E foi nessa ilha que pousaram. O piloto aterrissou em uma clareira diante da casa. Zale abriu a porta do aparelho, saiu e ajudou Hannah a desembarcar. O piloto entregou a Zale uma mochila de couro, e ambos trocaram algumas palavras antes de o piloto voltar a decolar, deixando-os sozinhos em uma ilha deserta no meio do mar Adriaí tico. — Ele vai voltar para nos buscar, certo? Os laí bios Zale de se curvaram em vestíígio de sorriso. — Naã o se preocupe. Ele estaraí de volta antes que escureça. Mas, mesmo que naã o volte, minha equipe de segurança estaí trabalhando desde o iníício da manhaã . Eles jaí revistaram a ilha e podem chegar aqui em alguns minutos. A ruí stica casa de fazenda tinha grossas paredes de pedra e telhado de terracota. — Naã o venho aqui faz alguns anos. — Por queê ? — Naã o tive vontade, nem tempo. O sol estava bem a prumo e fazia calor. Hannah tirou o casaco azul-marinho. — Eu deveria ter trazido uma bermuda ou uma saia velha. — Em breve, voceê estaraí de maioê . Estamos prestes a ir ateí a praia para almoçar. — Esse eí o nosso piquenique? — perguntou ela, apontando para a pequena mochila de couro. — Naã o. Aqui estaã o as minhas roupas, toalhas e filtros solares. — Onde estaí o almoço? — Estaí com fome?

32


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Sede. — Venha. Vamos ateí a praia. Jaí estaí tudo laí . Caminharam pela clareira em direçaã o aos ciprestes e chegaram a uma escada ííngreme esculpida na pedra do penhasco. Hannah seguiu Zale descendo a escada lentamente, cuidando para naã o tropeçar. O sol batia no topo de sua cabeça e ela sentia ainda mais calor. Suas sandaí lias elegantes eram totalmente inviaí veis para aquela descida ííngreme, e suas calça branca começou a ficar empoeiradas na bainha. O mar brilhava laí embaixo, as ondas arrebentando contra a areia cor de marfim. A aí gua azul-safira parecia tentadora. Hannah mal podia esperar para molhar os peí s. Zale esperava por ela ao fim da escada. Ele tirara os sapatos e arregaçara as mangas da camisa, revelando antebraços fortes e bronzeados. — Nada de escadas ateí mais tarde. Ela tirou as sandaí lias e flexionou os dedos dos peí s. — OÉ timo. Isso foi um pouco assustador. Havia uma toalha sobre a areia com uma grande cesta de piquenique a um canto, e uma caixa de isopor no outro. Zale agachou-se ao lado do isopor e abriu a tampa. — Cerveja, vinho, aí gua, suco. O que voceê gostaria de beber? — Cerveja, por favor — disse ela, ajoelhando-se sobre a toalha. — Cerveja? — Eu adoro uma cerveja gelada em um dia quente de veraã o. Voceê naã o? — Sim, mas muitas mulheres naã o gostam de cerveja. Ele retirou duas garrafas e um copo gelado da caixa de isopor. — Naã o preciso de copo — disse ela, pegando uma das garrafas e apontando para a cesta e para a caixa de isopor. — Como tudo isso chegou aqui? — Minha equipe de segurança trouxe quando revistou a ilha. — Esta ilha eí uma propriedade familiar? Ele desabotoou a camisa, oferecendo-lhe uma visaã o tentadora de seus muí sculos bronzeados. — Naã o, eu a comprei na eí poca em que jogava futebol. Precisava de um lugar longe das multidoã es, dos paparazzi e dos faã s. — Voceê jaí trouxe muitas amigas ateí aqui? — Apenas uma, e apenas uma vez. Ela achou o lugar muito isolado. — Entaã o o que voceê faz quando estaí aqui? — Durmo. Leio. Relaxo. Ela tomou um gole de cerveja. — O que gosta de ler? — Leio de tudo. Romances. Biografias. Histoí ria. O que cair em minhas maã os. — Tem um autor favorito? — Sim, mas naã o creio que ele ainda escreva. A maioria de seus livros foi publicada haí quase vinte anos. Chama-se James Clavell. Escreveu Shogun, Tai-Pan, Casa nobre. — O rei rato — disse ela, sorrindo. — Eu adorava os livros dele. Foi meu pai quem me apresentou esse autor. Durante anos desejei aprender a falar japoneê s. — E aprendeu? — Naã o. Naã o eí faí cil encontrar um curso de japoneê s em B… — Hannah parou de falar ao se dar conta de que estava a ponto de dizer Bandera, que era o nome de sua cidade natal no Texas. Ela corou e tomou um gole raí pido de cerveja. — Em vez disso, aprendi espanhol e italiano. — Voceê eí fluente em ambos os idiomas? — Sim. E voceê , tambeí m. Li em algum lugar que voceê sabe mais líínguas do que qualquer

33


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

outro rei moderno. Tem facilidade para líínguas estrangeiras? — Tive de me esforçar. Naã o haí outro meio. — Nem todo o mundo estaí disposto a se esforçar. Ele deu de ombros. — Eu naã o me importo. Nunca me importei. Hannah mordeu o laí bio inferior. A cada momento que passava, gostava mais de Zale. Ele era o seu tipo de homem: lindo, alto e inteligente. Naã o eí justo, pensou ela, sem foê lego, mais encantada do que gostaria de estar. — Vamos nadar? — ela convidou. — Boa ideia. Estaí quente. — Zale apontou para uma cavidade ao peí da faleí sia. — Haí uma gruta logo ali, onde voceê pode trocar de roupa. Ou, caso naã o goste de cavernas, pode se trocar aqui mesmo. Prometo naã o olhar. — A caverna me parece uma boa ideia — respondeu Hannah. No interior da gruta, ela tirou a roupa e vestiu o minuí sculo biquííni cor de tangerina. Quando voltou aà praia, Zale a esperava aà beira da aí gua, observando-a. Ele vestia uma bermuda de surfista preta e vermelha em vez de um dos calçoã es de banho europeus tradicionais. Parecia um surfista bronzeado, magro, musculoso, e ela naã o conseguia se lembrar da uí ltima vez em que conhecera um homem taã o sensual. — Gostei da sua bermuda. Voceê surfa? — Sim. — Ele fez uma pausa. — Bem, jaí surfei. Meu irmaã o Stephen era muito bom nisso. Mas naã o surfo jaí haí alguns anos. Ela entrou na aí gua. — Onde costumava surfar? — Onde quer que houvesse boas ondas. Rincoí n, Brasil, Indoneí sia, Costa Rica. — Ele passou a maã o pelos cabelos. Sinto falta de surfar, da mesma forma que sinto falta de jogar futebol. Acho difíícil ficar dentro de casa, sentado diante de uma mesa. — Entaã o, como lida com isso? — perguntou ela, afundando na aí gua ateí os ombros. — Eu corro e faço ginaí stica. Muita ginaí stica. Hannah sentiu um aperto no coraçaã o. Tudo nele era taã o real, taã o fíísico. Naquela ilha, Zale era apenas um homem, naã o um rei. E ela acabou por descobrir que ele era um homem incrivelmente atraente. Seu instinto de sobreviveê ncia lhe dizia para ser cautelosa, que seria perigoso se envolver com ele. Mas Zale era taã o difíícil de resistir! Quem mais reunia tal combinaçaã o de muí sculos, pele reluzente, intelecto aguçado e ambiçaã o ardente? — Voceê precisa de um bom tempo de feí rias — disse ela com a voz rouca. — Uma oportunidade para desligar e relaxar. — Seria bom. — Por que naã o tira feí rias? — Tirarei em nossa lua de mel. Hannah inspirou profundamente, como se tivesse levado um chute nas costelas. Mais uma vez ela se esquecera de que ele se casaria com Emmeline. Que, em breve, viajaria com ela em sua lua de mel. Pensar em Zale com Emmeline a deixou magoada. — O que faremos em nossa lua de mel? — perguntou, odiando a si mesma por estar sentindo ciuí me. Odiava a ideia dos dois juntos em uma praia como aquela, conversando daquela forma… — Passaremos dez dias no meu iate na Greí cia e, depois, alguns dias em Paris para que voceê possa fazer compras. Hannah mordeu o laí bio inferior, pensando que Zale naã o parecia o tipo de homem que gostaria de fazer um cruzeiro de dez dias pelas ilhas gregas, tomando sol a bordo de um iate.

34


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Voceê naã o parece muito animado com a ideia. — Foi voceê quem quis assim. Emmeline queria assim, era o que ele queria dizer. Hannah balançou a cabeça, inexplicavelmente aborrecida. Emmeline e Zale naã o eram um bom par. Eles naã o foram feitos um para o outro. Emmeline naã o queria se casar com ele, estava fazendo aquilo por obrigaçaã o. Como poderiam ter um casamento feliz? Mas Hannah naã o podia dizer nada. Naã o lhe cabia dizer nada. Ela soí estava guardando o lugar de Emmeline. E ateí mesmo isso a deixava furiosa. Ela mergulhou, atravessou uma onda e voltou aà superfíície. Ainda aborrecida, deu algumas braçadas antes de se virar de costas e começar a boiar. O sol brilhava laí em cima. A aí gua estava fria e ela podia sentir o gosto de sal em seus laí bios. Zale naã o era dela. Nunca seria. Ela devia se lembrar disso. Naã o podia esquecer. Naã o devia deixar que sentimentos pessoais a impedissem de cumprir o compromisso que tinha com Emmeline. Mesmo que tal compromisso magoasse o seu coraçaã o. Virou-se e nadou lentamente de volta aà praia, onde Zale a esperava sentado na areia. — Voceê eí boa nadadora. — Seu olhar percorreu lentamente o corpo de Hannah, detendo-se nos pequenos triaê ngulos que mal cobriam os seus seios fartos, bem como sobre o minuí sculo pedaço de tecido entre as suas coxas. Pela sua expressaã o, dava para ver que ele gostava do que via, e os mamilos de Hannah endureceram contra o tecido molhado do tope do biquííni. — Eu adoro o mar — disse ela, nervosa, sentindo as pernas estranhamente bambas. Nenhum homem jamais olhara para ela daquela forma. Ningueí m nunca a fizera se sentir especial ou bonita. — Adoro nadar. — E eu gosto de olhar para voceê — afirmou Zale. Nervosismo. Adrenalina. — Bem, eu adoraria veê -lo surfando algum dia — respondeu ela, sentando-se ao lado dele. — Podemos planejar uma viagem de surfe. Para onde iremos? Bali? Perth? Durban? — Para qualquer lugar — Hannah murmurou, os seios doloridos, os mamilos endurecidos forçando o biquííni. — O que voceê vai fazer enquanto eu estiver surfando? — perguntou ele. — Naã o posso simplesmente deixaí -la no hotel, entediada. Ela tocou o laí bio superior com a ponta da lííngua, entontecida pela necessidade de ser tocada. Desejava as maã os dele sobre o seu corpo, desejava as palmas de suas maã os sobre os seus seios. — Naã o ficaria entediada — disse ela, a voz denunciando sua excitaçaã o. Desejava-o entre as suas pernas, a boca de Zale sobre o seu mamilo, suas maã os tocando-a em toda parte… — O que voceê faria? Ela mal conseguia pensar. — Eu iria ler. — Naã o sei se funcionaria — sussurrou ele, passando a maã o sobre o cabelo molhado. — Por que naã o? O desejo ardia nos olhos dele. — Naã o creio que a deixaria sozinha para ir surfar. Naã o creio que desejaria surfar tendo voceê em minha cama. Ela apenas olhou para ele.

35


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Eu a desejo. Mas voceê sabe disso, naã o eí mesmo? Sabe que naã o consigo ficar longe de voceê , mesmo quando deveria. Ela estremeceu, indefesa, quando ele baixou os laí bios e começou a beijar-lhe o rosto delicadamente. Hannah mal conseguia se concentrar no que ele estava dizendo. — Contudo, eí o que eu devo fazer — acrescentou Zale. — Ao menos ateí noí s dois sabermos o que queremos. Mas Hannah sabia o que queria. Zale beijou-lhe o pescoço antes de viraí -la e puxaí -la para cima de seu corpo. O sol estava quente, mas nada parecia taã o quente quanto o corpo de Hannah quando ele deslizou uma das maã os ateí a sua naí dega e envolveu um de seus seios com a outra. — Acho que sei o que eu quero — murmurou Hannah quando o polegar de Zale acariciou seu mamilo enrijecido. — Mas talvez naã o seja a isso que voceê estaí se referindo. — E o que voceê quer? Ela mal conseguia raciocinar direito, nem sabia ao certo o que de fato estava acontecendo. Soí sabia que queria mais. — Eu quero voceê . — Mas por quanto tempo? — perguntou ele, beijando-lhe o pescoço. Hannah retribuiu o beijo, puxando-o pela nuca. Ele era taã o alto, taã o forte. Ela estava em segurança ao seu lado. Ele jamais deixaria algueí m magoaí -la. — Para sempre — ela murmurou. Quando voltaria a encontrar algueí m como Zale Patek? Quando voltaria a se sentir taã o viva e taã o bela outra vez? Ele ergueu a cabeça para olhaí -la nos olhos. Zale parecia selvagem. Feroz. Primal. — Cuidado com o que diz — murmurou ele, puxando o corpo quase desnudo de Hannah contra o seu. Ela poê de sentir a espessura e a extensaã o de seu membro atraveí s da bermuda. — Eu quero voceê — disse ela, a voz ofegante. — Mesmo que seja errado. Ele baixou a cabeça e beijou-a apaixonadamente. — Naã o posso fazer amor com voceê agora — disse ele, a voz rouca em seu ouvido. — Mas se ainda estiver se sentindo assim esta noite, Emmeline, voceê naã o seraí capaz de me afastar de sua cama.

CAPÍTULO SETE

— POR QUE VOCEÊ naã o quer fazer amor agora? — perguntou Hannah, entontecida, maã os apertadas contra o peito nu de Zale. A pele dele era taã o macia e seu cheiro viciante, quase taã o viciante quanto seu beijo. — Eu naã o quero me aproveitar de voceê . Sob as palmas das maã os, ela sentiu a batida constante do coraçaã o de Zale. — Acha que vou me arrepender? — Possivelmente. E eu odiaria caso isso acontecesse. — Esperto — respondeu ela, a voz rouca. E sentou-se, desapontada. Mas Hannah sabia que ele estava certo. Provavelmente iria se arrepender. Obviamente, ele era mais controlado do que ela. Zale se sentou e beijou a parte de traí s de sua cabeça. — Naã o fique taã o magoada. Estou tentando protegeê -la, Emmeline. Mas naã o eí faí cil fazer a coisa certa. 36


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Ela balançou a cabeça e levantou-se. — Compreendo — disse Hannah, terrivelmente perto das laí grimas. Gostava tanto de Zale! Zale se levantou e limpou a areia da bermuda, expressaã o igualmente sombria. — Vamos ver o que o chefe preparou para o nosso almoço? — Sim — respondeu ela, pegando a toalha e enrolando-a ao redor da cintura. Sentaram-se no meio da toalha de piquenique e Zale abriu o cesto. Hannah observavao, ainda entontecida. Se os seus beijos eram assim taã o potentes, ela naã o conseguia nem imaginar como se sentiria quando fizessem amor. Zale vasculhou o cesto do almoço em sileê ncio e Hannah gostou disso. Ela naã o se sentia em condiçoã es de conversar amenidades quando suas emoçoã es estavam taã o aà flor da pele. Como poderia estar se apaixonando por Zale daquela forma? Como poderia desejaí -lo tanto assim quando sabia que ele pertencia a Emmeline? Necessidade. Desejo. Ela nunca desejara tanto um homem como desejava Zale. — Vou deixar que voceê se sirva — disse ele, entregando-lhe um prato. Hannah olhou para a comida que o chefe enviara: frango assado, baguetes, queijos, salada de batata, de beterraba, de frutas. Mas ela estava sem fome. — Voceê se arrependeria de fazer amor comigo? — perguntou ela abruptamente, olhando-o de frente. Zale suspirou. — Voceê tem um corpo incríível, e eu naã o vejo nenhum problema em possuíí-la. Mas, considerando que ainda haí seí rias decisoã es a serem tomadas, naã o creio que possamos simplesmente nos jogar na cama. — Entaã o voceê ainda estaí se decidindo ao meu respeito. Ele hesitou, depois assentiu. Hannah apertou as maã os. — Esquecendo o passado, o que mais o preocupa sobre mim? Ele desviou o olhar para um ponto fixo no mar. — Voceê estaí taã o diferente, Emmeline. Naã o eí a mulher com quem eu pensei que estava me casando. E naã o entendo o que mudou. Hannah sentiu o coraçaã o se estreitar. — Voceê naã o gosta… de mim? — Eu gosto de voceê . Gosto muito da mulher que estaí na praia aqui e agora. Voceê eí inteligente, brincalhona, confiante e sensual. Mas essa naã o era a mulher com quem me comprometi haí um ano. E isso me preocupa. As pessoas naã o mudam tanto assim. Naã o na nossa idade. — Voceê se sentiria melhor se eu me parecesse mais com a mulher com quem voceê se comprometeu? — Talvez. Provavelmente. Ao menos eu estaria pisando em terreno conhecido. Hannah conseguiu sorrir, embora em verdade estivesse com vontade de chorar. — Nesse caso, vou me esforçar para voltar a ser como era. Retornaram ao palaí cio no meio da tarde, depois de mais banhos de mar e de sol, mas a tensaã o entre os dois era taã o forte que ela ficou aliviada quando o helicoí ptero chegou para levaí los de volta ao palaí cio, e mais ainda quando Zale deixou-a voltar sozinha para a sua suííte. Contudo, ela naã o estava feliz. Naã o queria ficar sozinha em seus aposentos. Queria estar com ele. Queria que tivessem compartilhado um pouco de ternura, intimidade e paixaã o na praia. Hannah passeou pela sala absolutamente desesperada. Concordara em brincar de fazer de conta, e aquilo a estava matando. Queria dizer para

37


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Zale quem ela era, queria que ele soubesse a verdade, mas sabia que, uma vez que o fizesse, ela o perderia para sempre. Naã o era justo que o homem que ela mais desejava no mundo fosse aquele que ela naã o poderia ter. Hannah ouviu um som abafado e aguçou os ouvidos. Era meio um choro, meio um resmungo, e soava como se estivesse vindo do quarto ao lado. Hannah ficou tensa, pele arrepiada. E estava prestes a chamar a guarda do palaí cio quando ouviu a palavra mari, que quer dizer maã e em raguviano. Entaã o, ouviu outra vez. Algueí m estava chamando pela maã e. Ela foi ateí a porta do quarto e a entreabriu. Ela ouviu o choro mais claramente. Mamaã e, mamaã e. Hannah abriu a porta completamente, a luz da sala iluminou o quarto e ela viu uma figura agachada a um canto. A figura estremeceu. — Maã e? — disse ele, erguendo a cabeça lentamente. Era uma voz de criança saindo de um corpo adulto, e Hannah soube imediatamente quem era. Cabelo castanho-escuro, ombros caíídos, joelhos dobrados firmemente contra o corpo. Prííncipe Constantino. — Tinny? — ela murmurou, sem querer assustaí -lo. Ele esfregou o rosto com o antebraço e a olhou parecendo esperançoso. — Mamaã e, voltou para casa? Por um instante, Hannah naã o conseguia respirar e seus olhos se encheram de laí grimas. Ela se agachou lentamente na soleira da porta. — Naã o, meu amor, sua maã e naã o estaí em casa. — E, de repente, seu coraçaã o se estreitou. As maã es precisam de seus filhos. Crianças precisam de suas maã es. Mas nem sempre funciona dessa maneira. — Voceê quer encontrar Zale? Aposto que ele gostaria de veê -lo. — Zale — disse Tinny. — Meu irmaã o. — Isso mesmo. Vamos encontrar Zale? Hannah chamou um criado, e o criado chamou a Sra. Sivka, uma vez que o rei naã o poê de ser localizado. Hannah estava sentada com Tinny em um sofaí em sua sala de estar, vendo fotos em uma revista, quando algueí m bateu aà porta. Ao abrir, ela se deparou com uma mulher pequena e idosa, com cerca de 70 anos. — Perdoe-me me intrometer, Alteza. Soube que meu menino desaparecido estaí aqui. — Sim, eu encontrei o prííncipe Constantino no meu quarto. — Hannah abriu mais a porta, convidando a mulher a entrar. — Mas naã o sei por que ele estava laí . — Esses saã o os aposentos da rainha, Alteza. Hannah olhou fixo para a mulher antes de compreender. Aquele era o quarto da maã e de Tinny. O prííncipe viera ateí ali procurando por ela. — Ele ainda sente falta da maã e. A mulher sorriu com tristeza. — Ele naã o entende por que ela naã o voltou. — Zale me disse… — Hannah parou de falar e corrigiu-se: — Sua Majestade. Noí s conversamos sobre ele. — O prííncipe Constantino adora o irmaã o. — A velhinha olhou para Hannah mais atentamente. — Eu tenho certeza de que jaí ouviu isso diversas vezes, mas o prííncipe eí ideê ntico aà sua maã e. Hannah sentiu um noí na garganta. — Como sabe?

38


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Eu a conheci. — A mulher franziu a testa. — Meu Deus, acho que ainda naã o me apresentei. Sou a Sra. Sivka, a babaí de Sua Majestade. — Sua Majestade? Zale Patek? — Ele mesmo. Cuidei de todos os prííncipes Patek quando bebeê s, e continuo cuidando do prííncipe Constantino, agora que seus pais morreram. Hannah apontou para o sofaí . — Por favor, sente-se. Eu adoraria saber mais sobre a famíília real, sobre Sua Majestade quando menino. Como ele era? Um menino levado? O rosto redondo e enrugado da Sra. Sivka abriu-se em um largo sorriso. — Sim, era; mas, afinal, todos os meninos saã o levados, e os prííncipes Stephen e Zale naã o foram exceçoã es. Eram crianças brilhantes, travessas, aí vidas por aventuras e brincadeiras. O prííncipe Stephen naã o era taã o astuto quanto o prííncipe Zale, e sempre era pego em flagrante, mas Sua Majestade era um garoto pequeno, raí pido e muito mais sorrateiro. — Pequeno, raí pido e sorrateiro, Sra. Sivka? — disse Zale, que entrara na sala taã o silenciosamente que nem Hannah, nem a babaí ouviram-no entrar. — Isso naã o me soa muito lisonjeiro. O rosto redondo da Sra. Sivka se abriu em um sorriso. — Vossa Majestade era um menino malandro, mas um malandro muito querido e muito doce. Zale revirou os olhos e se agachou diante do irmaã o. — Tinny — disse ele com firmeza —, voceê naã o pode fugir da Sra. Daum. Voceê deu-lhe um susto. Ela estaí muito aborrecida. Tinny levou a maã o aà boca, olhos arregalados. — Brincando, Zale. Tinny estava brincando. — Eu sei que voceê gosta de brincar, mas naã o pode simplesmente deixaí -la assim. Ela estaí chorando. — Tinny ama Daum. — Sei que ama. Mas voceê naã o pode sair por aíí sozinho. Tem que levar a Sra. Daum ou a Sra. Sivka com voceê quando quiser passear ou vir me ver. Os olhos castanhos de Tinny se encheram de laí grimas. — Tinny quer ver a mamaã e. Tinny sente falta da mamaã e. Zale engoliu em seco. — Eu sei que sente, Tinny. Tambeí m sinto falta da mamaã e. Tinny enxugou as laí grimas com as costas das maã os. — Cama agora. Histoí ria. Zale balançou a cabeça e deu um tapinha no joelho do irmaã o. — Sim, vamos levaí -lo para a cama e vamos ler uma histoí ria, estaí bem? A Sra. Sivka tomou Tinny pela maã o enquanto caminhavam de volta para a suííte. Zale e Hannah os seguiram. — Ele demora um tempo ateí se acalmar quando fica aborrecido — disse Zale para Hannah. — Ele ainda sente falta da maã e. Zale pareceu incomodado com aquilo. — EÉ difíícil, porque naã o haí nada que eu possa fazer a respeito. Ele era muito ligado aà minha maã e, e ela era muito dedicada a ele. Passava quase todo o seu tempo com Tinny. — Como eí que ele chegou ao meu quarto? — Ele fugiu da Sra. Daum enquanto passeavam apoí s o jantar. Haí centenas de portas ocultas e passagens secretas no palaí cio e, quando ele desapareceu, a Sra. Daum foi para um lado, o meu irmaã o para o outro, e o paê nico se instalou. — Ele vai ateí os aposentos da rainha com muita frequeê ncia? — Costumava ir, mas faz quase um ano que parou de fazeê -lo. EÉ por isso que ningueí m foi

39


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

ateí laí primeiro. Ao chegarem aà suííte de Tinny, Zale se ofereceu para ajudar o irmaã o a vestir o pijama, mas a Sra. Sivka recusou a ajuda, dizendo que achava que Sua Majestade e Sua Alteza deveriam passar o tempo juntos. — Quando os convidados chegarem para o casamento, naã o poderaã o ficar muito a soí s; assim, devem aproveitar o tempo livre agora. Hannah abraçou o prííncipe Constantino. — Boa noite, Tinny — disse ela em raguviano, beijando-lhe o rosto. — Durma bem — acrescentou em ingleê s. Tinny abraçou-a com força. — Noite, Emmie. Emmie. O apelido da princesa Emmeline. Hannah sentiu um noí na garganta. Enquanto Zale dava boa noite ao irmaã o, Hannah voltou-se para a Sra. Sivka. — Voceê eí absolutamente maravilhosa, Sra. Sivka — disse ela com a voz rouca, perto das laí grimas. — Estou muito feliz por teê -la conhecido, e creio que Sua Majestade teve muita sorte ao ter voceê como babaí . — Ainda penso nele como meu menino — respondeu a babaí calmamente. — Eles saã o meus filhos, mesmo sendo homens agora. — Hesitou e buscou os olhos de Hannah. — Estaí bem acomodada, Alteza? Estaí tudo ao seu gosto? — Tudo estaí maravilhoso, obrigada. — Soube que hoje conheceu a ilha de Sua Majestade. Estava um bom dia para ir aà praia. — Sim. Um belo dia. Mas, afinal, tudo eí muito lindo por aqui, e todos saã o muito gentis. — Acha que poderia ser feliz aqui? — Sim. — E Sua Majestade? Ele a estaí tratando bem? Hannah olhou rapidamente para Zale e percebeu que ele estava ouvindo. — Ele estaí tentando — respondeu, laí bios contraíídos. — Acho que eí hora de separaí -las! — exclamou Zale, tomando a maã o de Hannah. — Venha, Emmeline. E boa noite, Sra. Sivka, eu a vejo pela manhaã . Ainda de maã os dadas, Zale e Hannah caminharam de volta aà escadaria e passaram para outra ala do palaí cio. — A Sra. Sivka me disse que meus aposentos pertenceram aà rainha — disse Hannah enquanto percorriam o longo e elegante corredor que levava aà sua suííte. — Sim, eí verdade. — Zale meneou a cabeça para um guarda que estava de prontidaã o no corredor. — Mas por que os aposentos da rainha ficam taã o longe dos aposentos do rei? — Nem todos os reis queriam que as suas rainhas dormissem no quarto ao lado — disse Zale, chegando aà porta de entrada da suííte. — Porque os reis tinham amantes? — Possivelmente. Mas haí outra explicaçaã o. — Qual? — Nem todos os reis gostavam de suas rainhas. Zale abriu a porta para ela. — Parece ser um tema comum por aqui… — Pode parecer completamente contraditoí rio, mas estou começando a gostar de voceê . O coraçaã o de Hannah disparou. — Que terríível! — Eu sei — respondeu ele secamente. — Isso complica as coisas. — Como assim? Suas paí lpebras baixaram e seu olhar se voltou lentamente para o rosto de Hannah. — Naã o desejarei que voceê vaí embora caso eu realmente goste de voceê .

40


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Ela corou. — Mas voceê ainda naã o gosta de mim de verdade. — Eu naã o teria tanta certeza disso, Alteza. O pulso de Hannah disparou. — Ceí us — ela murmurou —, que desastre! — EÉ exatamente o que estou sentindo. — Voceê quer entrar? — EÉ tarde. — Naã o eí tarde. Saã o apenas 22hs. Poderííamos tomar um cafeí ou um caí lice de vinho do porto. Ele lançou-lhe um olhar demorado. — Se eu entrar, naã o vou querer tomar cafeí . O sangue afluiu ao rosto de Hannah, e ela sentiu o corpo incrivelmente quente. — Poderííamos apenas conversar. — Voceê sabe que naã o. — O olhar dele baixou para os laí bios de Hannah. — Se eu a tiver a portas fechadas, farei o que desejo fazer desde a noite em que voceê chegou. Ela respirava com dificuldade. — E o que seria? — Estou tentando me conter. — Estou apenas curiosa. — E voceê sabe o que a curiosidade fez com o gato. — Sim, mas naã o se sente bem? Uma luz rebrilhou nos olhos dele. — Voceê eí taã o linda. — Zale a puxou para si. Ela inclinou a cabeça para traí s. — Quer dizer que foi o prazer que matou o gato? — Voceê eí impossíível — disse ele. — E completamente irresistíível. Se voceê naã o tomar cuidado, vou despi-la aqui no corredor e beijar cada centíímetro de seu corpo. Ela estremeceu. — A segurança do palaí cio vai adorar o espetaí culo. Ele suspirou. — Estaí testando a minha força de vontade… Ela apertou o corpo contra o dele, esfregando-se como um gato. — Voceê eí taã o gostoso… Ele rangia os dentes, a tensaã o evidente em seu rosto. — Naã o podemos fazer isso aqui. Eu me sentiria mal no quarto de minha maã e. — Entaã o me deixe ir aos seus aposentos. Ele a encarou. — Estaí falando seí rio? Ela assentiu. — Eu quero… quero voceê . — Espere uma hora. Esfrie a cabeça. Pense a respeito. Porque, uma vez que fizermos isso, uma vez que façamos amor, naã o haveraí como voltar atraí s.

CAPÍTULO OITO

41


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

HANNAH ENTROU no quarto do rei vestindo um casaco preto sobre a camisola e calçando chinelos de veludo negro. Tentou agir com indiferença enquanto atravessava a porta do quarto, embora seu coraçaã o estivesse disparado. Ela viu Zale no outro extremo do coê modo, e experimentou um frio no estoê mago. Ele estava descalço, a camisa branca desabotoada no colarinho e as mangas enroladas sobre os antebraços bronzeados. — Menina corajosa — disse Zale. O coê modo era suntuoso, com paredes revestidas com paineí is de madeira e decoradas com ricas tapeçarias flamengas, mas nada era mais imponente que a enorme cama com dossel que dominava o ambiente. A cama era enorme, maior do que uma king-size americana. — Voceê veio. — Com as maã os nos quadris, ele a estudava. Nem taã o corajosa assim, pensou ela, sentindo como se tivesse entrado no covil de um leaã o. Hannah olhou mais uma vez para a cama imensa, e percebeu que a colcha de brocado fora afastada, revelando lençoí is e travesseiros imaculadamente brancos. Durante seí culos, reis poderosos dormiram, sonharam e rezaram naquela cama. E logo ela estaria se deitando ali. Umedeceu os laí bios secos com a ponta da lííngua. — Vim. — E voceê pensou com cuidado a respeito? Seus olhares se encontraram. Hannah mergulhou as maã os nos bolsos do casaco, ciente de que Zale ainda estava vestido, ao passo que ela nada vestia sob o casaco afora uma fina camisola. — Pensei. Ele sorriu e terminou de desabotoar a camisa. — Entaã o, por que estaí taã o longe? Mas os peí s de Hannah naã o se moviam. Ela estava plantada naquele lugar, hipnotizada pelos dedos longos e magros que desabotoavam os botoã es da camisa. Seraí que ele realmente se despiria diante dela? Zale tirou a camisa, revelando ombros largos e musculosos. Meu Deus, como ele era bonito. Ele jogou a camisa sobre o encosto de uma cadeira. — Mudou de ideia? Ela balançou a cabeça. — Naã o. — Entaã o venha. Zale tinha um corpo incríível, o corpo de um atleta, com ombros e peito largos e um abdome plano e ríígido. Ele era alto, muito alto, musculoso, e esmagadoramente masculino. — Venha — repetiu ele. — Estou com fome de voceê . Hannah estremeceu ao ouvir a ordem. Por um momento, sua conscieê ncia protestou, mas ela logo a silenciou. Hannah precisava de Zale. Precisava daquilo. Naã o que aquilo fosse amor. Mas jaí seria alguma coisa. Zale gostava dela. Ele a desejava. E era o que bastaria naquela noite. Hannah caminhou em sua direçaã o. Ele estendeu a maã o, desatou a faixa de seu casaco e afastou-o por sobre os seus ombros magros. Seu olhar recaiu sobre o ousado decote da camisola. Seus mamilos eretos forçavam o tecido, as aureí olas mais escuras visíível atraveí s do cetim. — Voceê eí sem duí vida a mulher mais linda que eu jaí vi. — Sua voz era grave, e estava aí spera de desejo.

42


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Beleza naã o eí tudo — ela murmurou. — Voceê estaí certa — disse Zale, acariciando-lhe o rosto. — Entaã o, o que importa, Emmeline? Ela olhou para ele. — Voceê . Eu. Noí s. Zale voltou o seu olhar para os laí bios de Hannah. — Sendo assim, voceê sabe que agora estou jogando para valer. Ela sentia as faces em chamas, o corpo febril. Nada mais importava agora. O futuro naã o lhe pertencia. Tudo o que tinha era aquela noite. Tudo o que tinha era o agora. — Bom. Ela deu um passo aà frente e pousou as maã os sobre o peito de Zale. — Faça-me esquecer de tudo, Majestade. Faça-me esquecer de tudo, menos de voceê . Zale afastou as alças de sua camisola, que caiu aos seus peí s. Ele se afastou e olhou para ela enquanto o fogo na lareira crepitava e iluminava o corpo de Hannah, destacando suas curvas, antes de lentamente tomaí -la em seus braços. Ele a beijou como se tivesse gosto de vinho e mel, e ela retribuiu. — Quero voceê — afirmou ele, a voz engrolada de prazer. Ela assentiu e desatou-lhe o cinto, depois o botaã o da calça, e, finalmente, o zííper. Mas, antes que ela pudesse arrancar-lhe a calça, ele se afastou, inclinou-se para tirar os sapatos, as meias, e entaã o a calça caiu, sobrando apenas a cueca apertada que mal era capaz de conter o volume de seu sexo. Ela observou, olhos arregalados, quando ele tirou a cueca e seu membro se libertou, muito grande, muito duro e ereto. Eis aíí um rei bem dotado, pensou Hannah, sem foê lego, sentindo uma pontada de paê nico, visto que fazia muito tempo desde que fizera aquilo pela uí ltima vez e ele parecia um pouco grande demais para ela. — Voceê parece nervosa. — E estou. — Por queê ? — Voceê eí … grande. Naã o sei se isso vai dar certo. — Naã o se preocupe. Sei como fazer. Ele pegou a maã o dela e a puxou ateí o tapete em frente aà lareira. Ela olhou para o fogo. — Naã o vamos ficar na cama? — Sua voz estava alterada. Fazia quatro anos desde que fizera amor pela uí ltima vez e mio estava certa de que conseguiria. Ele a deitou no tapete, recostou-se ao seu lado e tocou-lhe os seios. — Adoro os seus seios — murmurou ele. — Saã o absolutamente perfeitos. Ele beijou-lhe a barriga, a lííngua explorando-lhe o umbigo, entaã o baixou a cabeça, os laí bios roçando a parte interior de suas coxas e, em seguida, suas dobras mais macias. A lííngua de Zale percorreu seus pequenos laí bios, entaã o se concentrou em seu clitoí ris enrijecido. Ofegante, Hannah lutou contra a sensaçaã o que se acumulava dentro dela. Ela nunca fizera aquilo antes com algueí m. Mas, quanto mais ela resistia, mais intensa a sensaçaã o se tornava. — Naã o — ofegou, balançando a cabeça, pernas tremendo violentamente. — Entregue-se — disse ele com a voz rouca. — Entregue-se para mim. Ela ouviu o que ele dissera e sabia o que ele queria, mas naã o tinha certeza de que seria capaz de se deixar levar. Contudo, quando Zale introduziu um dedo nela enquanto sugava seu clitoí ris, ela cedeu, gritando-lhe o nome. Por um momento interminaí vel, Hannah caiu atraveí s do tempo e do espaço, sensaçoã es intensas, corpo descontrolado. Ao fim de tudo, ela se sentia exausta e naã o acreditava que fosse capaz de desejar mais alguma coisa, mas quando Zale se ergueu e passou a sugar-lhe o mamilo, o desejo voltou a se

43


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

acumular em seu ventre, fazendo com que ela voltasse a desejaí -lo. Ele se posicionou entre as pernas dela, mas naã o a penetrou imediatamente. Em vez disso, continuou a sugar-lhe os mamilos, fazendo-a projetar os quadris em sua direçaã o, desesperada para ser preenchida. — Zale… — gemeu, sentindo a ponta grossa de seu membro roçar contra o seu sexo. — Por favor… Ele a penetrou lentamente. Hannah ofegou. Embora seu corpo estivesse relaxado e pronto para ser possuíído, ainda assim ele era grande demais. Ela lutou para recuperar o foê lego, desejando relaxar. Ele retirou o membro, entaã o voltou a penetraí -la, desta vez mais profundamente. Diversas vezes ele recuou apenas para voltar a penetraí -la, cada vez mais profundamente, com mais força, ateí que, de repente, a tensaã o se transformou em prazer inigualaí vel. Ela queria mais, queria que ele continuasse a penetraí -la, sentindo a intensa sensaçaã o que indicava que ela estava a caminho de outro orgasmo. — Mais — ela ofegou, quente, uí mida. — Mais. Entaã o, ele a possuiu completamente. E justo quando ela achou que naã o conseguiria, o mundo começou a rodar fora de controle e ela gritou-lhe o nome outra vez, sentindo um prazer taã o intenso que quase podia ser confundido com algum tipo de dor. Entaã o, em uma uí ltima e profunda estocada, ele atingiu o auge, corpo ríígido, muí sculos tensos. Ao fim de tudo, Zale se afastou dela e ficou deitado ao seu lado durante alguns minutos. Entaã o, ele a tomou nos braços e levou-a ateí a cama imensa. — Durma. — Zale afastou o cabelo de seu rosto e beijou-lhe a testa, o nariz e, finalmente, os laí bios. — Voceê precisa descansar. — Voceê vai dormir tambeí m? — murmurou Hannah. — Sim. UMA HORA depois, Zale ainda estava desperto, deitado de costas na cama ao lado dela. Gostaria de poder dormir. Mas sua mente estava a mil. Fazer sexo com Emmeline mudava tudo. Mas aquilo naã o fora apenas sexo. Fora mais parecido com… amor. Ele naã o planejara amaí -la. O amor naã o fazia parte do acordo. Intrigado pelas emoçoã es contraditoí rias que sentia, Zale virou-se e olhou para ela. Ele sempre soube que ela seria sua. Desde que tinha 15 anos sabia que aquela era a sua escolhida. Mas naã o esperava por aquilo… nunca imaginara que sentiria aquele imenso desejo de teê -la ao seu lado, protegeê -la, naã o apenas agora, mas para sempre.

CAPÍTULO NOVE

HANNAH ACORDOU cedo na manhaã seguinte em um quarto muito escuro, em uma cama estranha, sentindo-se totalmente desorientada. Ao se virar, poreí m, viu Zale adormecido ao seu lado e lembrou-se de tudo. A culpa abateu-se sobre ela. Por que deixara aquilo acontecer? Pior ainda, como poê de ter gostado tanto? Mas fora incríível. Corando na escuridaã o, ela lembrou como gritara o nome dele, como adorara… Hannah naã o conseguia imaginar Emmeline gritando durante o sexo. Naã o era possíível imaginar que uma princesa perdesse o controle daquela forma. Hannah deitou-se de barriga para baixo, enfiou a cabeça no travesseiro e emitiu um grito abafado. 44


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Eu ouvi isso — disse secamente Zale, ao seu lado no escuro. — Algo que voceê gostaria de compartilhar? Ela se ergueu sobre os cotovelos e olhou para ele, embora o quarto estivesse completamente escuro. — Eu me atirei em seus braços. — E eu gostei — disse ele. — Voceê tambeí m gostou. — Sei que gostei, mas… — Ela afastou as cobertas e fez mençaã o de sair da cama, mas Zale tomou-a pelo pulso e a puxou em sua direçaã o. — Mas o que, Emmeline? — perguntou Zale. Emmeline. Oh, meu Deus, pensou ela. Durante todo aquele tempo, naã o eram eles a fazer amor, naã o ele e ela, e sim ele e Emmeline. Porque era isso o que ele queria: Emmeline. Naã o ela. Seus olhos ardiam. Hannah estava presa a uma mentira. Se Zale descobrisse a verdade, ele a odiaria. E jamais a perdoaria. E poderia culpaí -lo? Ela fizera tudo aquilo que ele mais desprezava: ela o enganara, o manipulara e brincara com ele. Zale tocou-lhe a face. — Emmeline, por que voceê estaí chorando? — Naã o estou. — Confie em mim. Voceê pode me contar. Pode me dizer qualquer coisa. O coraçaã o de Hannah parecia a ponto de estourar. — Estaí tudo bem — disse ela, lutando para manter a voz serena. — Entaã o, por que as laí grimas? — Estou feliz — ofegou. — Apenas feliz por estar com voceê . Zale parecia relaxado, saciado, alegre, enquanto ela se atormentava. Ela era maí , muito maí . Como podia ter feito aquilo? Hannah deveria ter dito a verdade para ele na veí spera. Deveria ter confessado seu papel na farsa, aceitado as consequeê ncias e, em seguida, voltado para casa. Ou, no míínimo, deveria ter apenas voltado para casa. Em vez disso, ficou e deixou-se seduzir pelos sentidos e por aquela fantasia impossíível. Como se ela pudesse ser uma princesa. Como se sua vida fosse um conto de fadas. Pior, ela naã o ficara para ajudar Emmeline. Ficara por si mesma. Ficara pela mais egoíísta das razoã es: ela queria Zale. E, assim, ela possuííra aquilo que naã o lhe pertencia. E agora, a realidade de sua loucura, de seu egoíísmo, se abatia sobre ela. Zale acariciou seu quadril, uma caríícia lenta, preguiçosa. — Noí s naã o dormimos muito na noite passada e, no entanto, teremos um dia atarefado. — Teremos? — Eu tenho reunioã es pela manhaã , e voceê precisa terminar de posar para seu retrato. Quando terminar, pedirei que Krek faça um passeio com voceê por nossa ala privativa e, em seguida, espero que possamos nos encontrar para o almoço. — Voceê naã o deve se preocupar comigo. Eu naã o preciso de entretenimento — disse ela, tentando ignorar o calor de sua maã o. — Eu tenho muito a fazer. — Tenho certeza de que sim, mas voceê disse que queria aprender tudo o que podia a meu respeito, de modo que pedi para Krek levaí -la em um passeio pelo palaí cio. Zale se levantou e foi ateí a janela para abrir as pesadas cortinas, permitindo que a luz da manhaã inundasse o quarto. — Pode passar o meu casaco, por favor? — perguntou ela, sentando-se na cama e escondendo os seios com o lençol. — Eu naã o posso crer que voceê seja tíímida — disse ele, pegando a camisola e o casaco e levando-os para ela. — Ouvi dizer que voceê toma sol de topless em iate de amigos.

45


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Hannah franziu o nariz, incapaz de se imaginar fazendo topless em puí blico. O pai de Hannah era muito rigoroso e frequentemente a lembrava de que sua maã e tinha sido uma dama, e que Hannah tambeí m deveria seê -lo. O que significava nada de shorts curtos ou topes reveladores. E ela soí foi autorizada a sair com algueí m aos 16 anos. — Estaí frio. — Hannah vestiu o casaco. Cabeça erguida, Hannah se levantou da cama, pronta para sair correndo do quarto, mas Zale a pegou pelo pulso quando ela passou por ele e puxou-a para perto. — Voceê continua me surpreendendo — disse ele com voz rouca. — E isso eí bom ou ruim? — As duas coisas. — Como pode ser bom e ruim? — Voceê eí mais do que eu esperava. — Ele hesitou. — O que eí bom. — Entaã o, o que eí ruim? — O quanto eu ainda a desejo. O reloí gio em cima da lareira de maí rmore soou. — Mas naã o pode ser — murmurou Zale, olhando para o reloí gio e, em seguida, afastando-a com firmeza. — Tenho uma reuniaã o em apenas alguns minutos e ainda estou aqui. — Naã o eí minha culpa! — Naã o, eu sei. EÉ minha. E essa eí a parte que eu naã o gosto. Porque autocontrole nunca foi um problema para mim. Naã o ateí eu conheceê -la. E, com um breve menear de cabeça, ele foi ateí o banheiro para tomar banho, fazer a barba e iniciar o seu dia. Hannah puxou as cobertas ateí o queixo. Estava perdida e queria a sua vida de volta. E Zale precisava saber a verdade. Ela devia lhe contar tudo. Ele tinha de saber que ela naã o era a sua Emmeline. HANNAH DEVE ter caíído no sono logo em seguida porque a proí xima coisa que ouviu foi o barulho das rodas de um carrinho de cafeí da manhaã repleto de guloseimas tentadoras que Celine empurrava em seu quarto. Celine posicionou o carrinho ao lado da cama e começou a descobrir pratos de morangos, creme de leite, croissants amanteigados, ovos quentes, iogurte grego, granola, suco de laranja e cafeí . Hannah sentou-se na cama. — Tudo isso soí para mim? — Sua Majestade me disse que Vossa Alteza teraí um longo dia pela frente, a começar pelo retrato esta manhaã , entaã o precisaraí de um bom desjejum. Assim que terminar, vamos voltar aos aposentos da rainha e preparaí -la para a sua sessaã o de retrato. As estilistas particulares de Emmeline a esperavam quando ela saiu do banho meia hora depois, enrolada em uma toalha turca, e naã o demorou muito ateí que Hannah se visse novamente trajando o vestido que usava para o retrato. Teresa, que estava sentada em um banquinho folheando uma revista, subitamente exclamou: — Aqui estaí ela! A tal Hannah Smith, Alteza, sua soí sia norte-americana de Palm Beach de quem lhe falamos outro dia. — Aquela que ajudou a organizar o torneio de polo? — indagou Hannah. Camille, a cabeleireira, acrescentou: , — Sim, e eí uma pena voceê naã o conheceê -la. Teresa e eu estaí vamos morrendo de vontade de ver voceê s duas juntas… seria fascinante. — Hum. — Hannah fingiu estar entediada. — Voceê disse que ela estaí na revista? — Sim, na ediçaã o desta semana. — Teresa aproximou a revista do rosto para melhor observar a foto e ler a legenda. — Ela estaí saindo de uma boate em South Beach com algueí m… oooh! EÉ o sheik Al-Makin Koury. Parece que ele a estaí arrastando para fora da boate. — Teresa

46


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

olhou para Hannah. — Seraí que eí o namorado dela? — Pensei que ela soí trabalhava para ele. — Naã o sei. Mas o sheik parece furioso. Ele estaí praticamente arrastando-a para fora do clube. — Teresa sorriu. — Como um namorado ciumento. — O que diz a legenda? — Naã o muito: “O sheik Al-Makin Koury e uma amiga naã o identificada deixando o Mynt Lounge.” — Tenho certeza de que naã o estaã o namorando — disse Hannah com firmeza, chocada com a notíícia de que Emmeline e Al-Makin Koury estavam juntos. — Sheiks naã o namoram as suas secretaí rias. — Estendeu a maã o, com impacieê ncia. — Posso ver? — Veja — disse Teresa, estendendo a revista para Hannah enquanto Camille espiava por cima de seu ombro. — Ele naã o parece estar com raiva dela? Hannah naã o podia acreditar no que via: Emmeline e Makin saindo de uma boate de South Beach, o que era ainda mais incríível uma vez que o sheik Al-Makin Koury naã o ia a boates. Ele era um homem muito discreto e nunca namorou mulheres que gostavam de ser o centro das atençoã es. Emmeline parecia terríível na foto. Cadaveí rica. Fraí gil. Olheiras profundas. — Ela naã o me parece bem — disse Hannah. — Estaí muito magra. Camille se inclinou para ver a foto mais de perto. — Provavelmente tem saíído muito. Todo o mundo faz de tudo em South Beach. — Naã o Makin — Hannah sussurrou, pensando que Teresa talvez estivesse certa. Makin parecia absolutamente líívido na foto. O que estaria acontecendo entre eles? O que faziam juntos? E quando a princesa Emmeline se encontrara com o seu chefe? — O que estaã o olhando? — perguntou Zale aà porta do quarto. Hannah sobressaltou-se e entregou a revista para Teresa. — Nada. — Nada? — perguntou ele lentamente, entrando no quarto. — Entaã o, por que as treê s estaã o com essas expressoã es de culpa? — Porque estaí vamos admirando roupas. Roupas caras. Algo que voceê jamais faria. — respondeu Hannah em meio a uma risada. — O que o traz aqui, Majestade? — Voceê . Ela corou ao se virar na cadeira para encaraí -lo. — Sinto-me honrada, Majestade. — Como estaã o os preparativos para a sessaã o de retrato? — Muito bem. Soí preciso terminar a maquiagem e estarei pronta. Camille e Teresa saííram discretamente, e Zale se aproximou carregando uma grande caixa de veludo preto. — Trouxe um presente — disse ele. — Algo que deveria ter lhe dado assim que voceê chegou. Ela inclinou a cabeça para traí s e olhou diretamente nos olhos dele. — Mas voceê ainda naã o estava certo a meu respeito. — De fato. — Ele entregou a caixa de veludo para ela. — Mas agora estou. Hannah abriu a tampa da caixa preta e descobriu uma tiara de brilhantes. — Foi de minha maã e, e, antes de ser dela, pertenceu aà minha avoí . Era uma joia impressionante, claí ssica, simples, de tirar o foê lego. — Naã o posso aceitar isso — murmurou Hannah. — EÉ muito valioso. EÉ uma herança de famíília. — Claro que pode. E esse eí apenas o primeiro de muitos presentes, Emmeline. Quando se tornar minha rainha, voceê seraí afogada em joias. Seu olhar possessivo a fez perder o foê lego.

47


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Voceê realmente pretende se casar comigo? — Sim. — Naã o tem duí vidas? — Naã o. Quando fiz amor com voceê , eu me comprometi, como se estiveí ssemos casados. Naã o haí como voltar atraí s.

CAPÍTULO DEZ

HANNAH TENTOU naã o entrar em paê nico. Zale dissera que naã o havia como voltar atraí s. Que era como se jaí estivessem casados. O que seria um grande problema caso Emmeline naã o aparecesse. Emmeline tinha de aparecer. O que Hannah faria? O casamento seria dali a uma semana. Todos esperavam um magníífico casamento real, a ser televisionado para o mundo. Hannah precisava contar-lhe a verdade. Mas como diria aquilo para ele? Como lhe daria a notíícia? Ei, rei Patek, naã o sou realmente a sua noiva, mas sim Hannah Smith, de Bandera, Texas, e estou aqui para manteê -lo ocupado enquanto sua noiva de verdade resolve alguns problemas em Palm Beach. Coraçaã o apertado, estoê mago revirado, Hannah tentou se acalmar. Emmeline viria. Emmeline dissera que viria. Ela manteria sua palavra. Meia hora depois, Celine ajudou Hannah a tirar o vestido de gala e vestir uma saia de seda azul-marinho e uma blusa branca para o passeio pelo palaí cio com Krek. — Venho servindo aà famíília Patek haí quase 35 anos — disse-lhe o criado. — Comecei servindo aà falecida rainha antes de me tornar mordomo de Sua Majestade. Como mordomochefe do Palaí cio Patek, organizo banquetes e recepçoã es. — EÉ uma grande responsabilidade — respondeu Hannah. — Sim, Alteza, mas fiz isso por toda a minha vida. Naã o consigo me imaginar fazendo outra coisa. Eles atravessaram um extenso corredor, desceram uma escadaria e chegaram a uma sala profusamente iluminada, com paredes pintadas de amarelo e frisos brancos. — Este era o quarto favorito da rainha Madeleine. Amarelo era a cor favorita dela. E este era o lugar onde ela gostava de se divertir. — Krek olhou para ela. — Vossa Alteza a conheceu? Ela era prima de sua avoí . Hannah ficou embaraçada. — Eu… eu naã o me lembro. — Decerto se lembraria caso a tivesse conhecido. Era uma mulher adoraí vel. Tivemos um oí timo relacionamento, e eu era muito feliz trabalhando para ela. Contudo, a princesa Helena, a maã e de Sua Majestade, chegou da Greí cia para se casar com o pai de Sua Majestade, o rei Stephen IV, e fui designado para a casa dos noivos. — Voceê se importou com a mudança? — Nem um pouco. Era um prazer trabalhar para o rei Stephen e a princesa Helena. O casamento deles tambeí m foi arranjado, mas, logo apoí s o casamento, eles se apaixonaram um pelo outro. — Entaã o, eram felizes em seu casamento? — Muito — respondeu Zale, que entrara por uma porta lateral e caminhava em sua 48


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

direçaã o. — Os dois eram inseparaí veis nos bons e nos maus momentos. — Majestade… — Krek se curvou quando Zale se juntou a eles. — Ainda naã o fomos muito longe na visita. — Posso assumir daqui por diante? — sugeriu Zale. Krek voltou a se curvar. — Claro, Majestade. — Em seguida, inclinou a cabeça para Hannah. — Alteza… — E se foi, discretamente. — Gostando do passeio? — perguntou Zale. — Sim — respondeu ela. — Mas ainda estaí vamos no começo. — Entaã o, vamos prosseguir. — Zale a levou para o coê modo anexo, a Sala Carmim, que era a sala de recepçaã o favorita do avoê de Zale, o rei Stephen Mikal. — Neste quarto, meu avoê , o rei Mikal, hospedou um czar, um sultaã o, dois reis britaê nicos, uma duí zia de duques, assim como um papa. — Voceê o conheceu? — Ele morreu quando eu tinha 14 meses de vida, mas aparentemente passou muito tempo comigo e com Stephen. Temos muitas fotos juntos com ele. — Voceê e o prííncipe Stephen eram muito proí ximos? — Sim. Mas isso naã o significa que sempre tenhamos nos dado bem. EÉ ramos muito competitivos — afirmou Zale, com tristeza. — Pelo menos eu era. — Voceê s brigavam? — Brigas? Naã o. Mas, de vez em quando, disputaí vamos corridas ou praticaí vamos pugilato. — Zale sorriu. — Lembre-se, Stephen tinha dois anos e meio a mais do que eu, e eu fui magrelo ateí a adolesceê ncia, mas naã o deixava Stephen me derrotar sem luta. Hannah naã o conseguia imaginar Zale pequeno. — Defina magro. — Magro, desengonçado, baixo. — Naã o consigo crer. — Nem poderia. Eu odiava aquilo. Mas ao menos era raí pido. — Entaã o, quando voceê cresceu? Porque ningueí m poderia chamaí -lo de magro agora. — Cresci cerca de 20 centíímetros quando tinha 17 anos. Cresci mais 12 centíímetros aos 18. E continuei crescendo ateí completar 20 anos. Mas eí difíícil ser levado a seí rio no futebol quando se eí taã o franzino. Felizmente, isso me forçou a trabalhar duro, mais do que todos ao meu redor. Foi quando desenvolvi minha eí tica profissional. — Admiro a sua eí tica profissional. — Ajudou-me a me tornar quem eu sou. Zale abriu as portas de um amplo salaã o, paredes cobertas de retratos. — Estamos entrando na Galeria Real. Todos os retratos de reis e rainhas de Raguva estaã o aqui pendurados. O seu retrato se juntaraí ao meu quando for terminado. — Realmente vamos nos casar? — Sim. O sexo selou o nosso pacto, Emmeline. Eu lhe disse que seria assim. Estaí no acordo preí -nupcial, faz parte do nosso contrato. Ao fazermos amor, voceê se tornou minha. Eles estavam diante do enorme retrato de um rei de cabelo e olhos castanhos, muito parecido com Zale. — Podemos ser felizes — disse ele. — Acredita mesmo nisso? — Sim. Os olhos de Hannah ardiam, sua garganta estava apertada. Ela teve de se afastar para que ele naã o a visse chorar. — Como pode ter tanta certeza? — Porque tenho fortes sentimentos por voceê . Ela sentiu o coraçaã o apertar.

49


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — -Acho que jaí vimos o suficiente — disse ele. — Vamos almoçar. Planejei algo especial. Ele a guiou escada abaixo, atraveí s de um corredor e depois outro, ateí uma ala antiga que mais parecia pertencer a um castelo medieval do que a um palaí cio. — A fortaleza original — disse Zale quando soldados de prontidaã o abriram uma enorme porta de madeira com adornos de metal que levava a uma estreita escadaria. — Esta torre de menagem foi construíída em fins do seí culo XIV e ampliada e reforçada em 1500. — Tomou a maã o de Hannah enquanto subiam uma escada em caracol. — Durante centenas de anos, os reis fizeram reformas no castelo, modernizando as alas existentes, transformando a fortaleza em algo mais palaciano, mas esta parte permaneceu como era haí quinhentos anos. Ao chegarem ao topo da torre, Zale empurrou outra porta, revelando o ceí u azul e paredes de pedra incrivelmente espessas. — A balaustrada da fortaleza — disse ele. — Meu lugar favorito quando menino. Estavam no ponto mais alto do castelo. O dia estava lindo, ceí u inteiramente azul, sem nuvens aà vista. — Entendo por que voceê gosta daqui — ela afirmou, juntando-se a ele na balaustrada. — EÉ um lugar onde um garoto pode se esconder e onde um rei pode pensar. — EÉ exatamente isso. Aqui tenho calma e espaço. Perspectiva. Acho perspectiva essencial. AÀ s vezes, eí muito faí cil se deixar levar pelas emoçoã es ou pelo estresse de uma situaçaã o, seja real ou imaginaí ria. Ela jamais imaginaria que Zale pudesse se deixar levar pelas emoçoã es. Parecia muito sensato para isso. — Obrigada por me trazer ateí aqui. — Ainda naã o terminamos. — Ele estendeu-lhe a maã o. — Venha. Vamos comer. Contudo, em vez de descerem a escada, continuaram andando ao longo da balaustrada ateí o outro lado, onde havia uma torre redonda com paredes arruinadas e sem teto. No centro da torre arruinada havia uma pequena mesa redonda com duas cadeiras. A mesa estava coberta por um pano de linho rosa-paí lido com um arranjo floral de rosas, freí sias e líírios ao centro. Fora posta para duas pessoas, com talheres de prata, pratos de porcelana e caí lices de cristal. — Alteza — disse Zale, puxando uma cadeira para ela. — Por favor. — Obrigada. — Gostei tanto de nosso piquenique na praia que pensei que deverííamos voltar a fazer uma refeiçaã o a dois, sem criados por perto. EÉ mais relaxante. — E mais divertido — acrescentou ela, lembrando-se do quanto gostara do piquenique na ilha. — Obrigada. — O prazer eí todo meu — respondeu ele, sentado aà sua frente e pegando uma garrafa de vinho branco de dentro de um balde de prata. Abriu a garrafa e encheu os dois caí lices. — A voceê , a mim e ao nosso futuro juntos. — E ergueu o caí lice em um brinde. Os olhos de Hannah ardiam, e ela teve de sorrir para conter as laí grimas. — Ao nosso futuro — repetiu ela. — Sauí de — disse ele. O vinho foi bem-vindo. Desceu pela garganta de Hannah e aqueceu o seu estoê mago. Ela estava com frio por dentro, e com medo. Isso vai acabar mal. Muito mal. Entaã o, para disfarçar a dor quase insuportaí vel, ela se inclinou para cheirar uma das rosas. — Cheiram como rosas de verdade. Graças a Deus. Ele olhou para ela, ligeiramente confuso. — E quando as rosas deixaram de cheirar como rosas? — Haí alguns anos, quando algueí m teve a ideia de tornaí -las mais resistentes a doenças.

50


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

As flores crescem mais, mas seu perfume se foi. — Eu naã o sabia disso. — Naã o suponho que haja uma seçaã o sobre cultivo de roseiras em seu manual de comoser-rei. — Infelizmente naã o existe tal manual. Seria muito uí til. — Por queê ? — Os primeiros anos foram difííceis. Eu frequentemente me lamentava por naã o ter passado mais tempo com meu pai antes de ele morrer. Ele poderia ter me ensinado muito. — Mas para isso voceê teria de abrir maã o de sua carreira mais cedo. — Eu sei. Naã o pretendia desistir do futebol. Provavelmente jamais desistiria. Mas entaã o eles morreram, e seu acidente obrigou-me a crescer. Ela ficou em sileê ncio um instante. — EÉ assim que voceê pensa? — Eu era o prííncipe herdeiro. Devia estar aqui, aprendendo com meu pai. — Mas o futebol era a sua paixaã o desde menino. Seus ombros largos baixaram. — Os meninos crescem. Ela segurou a maã o dele. — Naã o eí da minha conta, mas estou feliz que voceê tenha podido fazer o que gostava de fazer. Tantas pessoas saã o infelizes. Odeiam seus empregos, odeiam suas vidas. Naã o eí assim que eu quero viver. — Voceê eí feliz, entaã o? — Eu amo o meu trabalho. E tenho sorte por fazer o que faço. Ele sorriu para ela. Se Hannah pudesse lhe dizer a verdade… Seus olhos ainda ardiam e ela tomou um gole raí pido de vinho para ocultar a dor. Zale estendeu a maã o e afastou uma mecha de cabelo de seu rosto. — Voceê continua chorando. O que haí de errado? O que foi que eu fiz? — Nada. Soí estou pensando no passado e no futuro de nossas famíílias. — Temos sofrido muita pressaã o de nossas famíílias, naã o eí mesmo? Ela assentiu. — Voceê sabe que foi meu pai quem quis nos casar. Ele escolheu voceê para mim quando eu tinha 15 anos. Voceê tinha 5 anos. Era gorducha. Eu fiquei horrorizado. Hannah sorriu. — Eu tambeí m teria ficado horrorizada. — Meu pai me garantiu que voceê cresceria e se tornaria uma bela mulher. Ele estava certo. Voceê … combina comigo. — Estou contente. — Voceê ? — Sim, muito. — Entaã o naã o se arrependeu de ontem aà noite? — Naã o. Eu amo… — Ela parou de falar, ciente de chegara perto de dizer como se sentia. — Eu amei cada momento. — Acho que deverííamos assinar o acordo preí -nupcial. Seu pai me liga todos os dias, aà s vezes duas vezes por dia, para perguntar por que ainda naã o assinamos. — E o que voceê diz para ele? — Que vamos assinaí -lo quando estivermos prontos. — Acho que ele naã o deve estar gostando muito disso. — Naã o. Mas eí entre voceê e mim agora, e pretendo que continue assim. — Entaã o, por que precisamos do acordo preí -nupcial? Naã o podemos simplesmente nos casar? Zale estudou-a do outro lado da mesa.

51


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Voceê se casaria comigo sem estabelecer nenhum acordo financeiro? — Confio em voceê . — No que faz muito bem. Eu nunca a trairia. A culpa inundou sua alma. Culpa e tristeza. Contudo, embora culpada, ela estava ansiosa para registrar tudo em sua memoí ria. Cada palavra. Cada sorriso. Cada detalhe. Queria se lembrar para sempre daquele almoço com Zale na torre em ruíínas com vista para a cidade murada, erguida entre as montanhas e o mar. Porque, naquele dia, ela se apaixonou por ele para sempre. — Voceê teria se sentido atraíído por mim se tiveí ssemos nos encontrado de outra maneira? — perguntou Hannah. Zale pareceu intrigado com a pergunta. — Voceê quer dizer, se tiveí ssemos acabado de nos conhecer aleatoriamente… como duas pessoas na rua? Ela assentiu. Ele olhou detidamente para ela. — Sim. Sem sombra de duí vida. Se alguma outra pessoa a olhasse daquela forma, ela se sentiria desconfortaí vel, mas quando Zale a olhava assim, Hannah se sentia bonita… segura. Sim, segura. Ele era um guerreiro. Um protetor. Um homem corajoso e ííntegro. — Voceê gosta de mim? — perguntou ele, recostado na cadeira. Os olhos de Hannah ardiam. Absolutamente. Com toda certeza. — Sim. Ele sorriu. — Entaã o, o prííncipe e a princesa partiram a cavalo em direçaã o ao poê r do sol e viveram felizes para sempre? O noí na garganta de Hannah dificultava-lhe a respiraçaã o. — Espero que sim. — Eu tambeí m. — Ainda sorrindo, ele olhou para a cuí pula de prata que cobria o prato. — Assim, jaí que estamos de acordo, podemos comer? Ela assentiu e levantou a tampa de prata de seu prato revelando uma salada de frutos do mar. — Parece deliciosa — disse ela, sabendo de antemaã o que naã o conseguiria comer aquilo. — Sim — concordou Zale, olhando para ela em vez de olhar para o prato. — Absolutamente deliciosa. Ela corou. — Como poderei comer agora? — Talvez deveê ssemos simplesmente pular o almoço e voltar para o meu quarto. — Naã o! — Ela o interrompeu com uma risada ofegante. — De modo algum. — De modo algum? A uí ltima noite foi assim taã o ruim? Ela sorriu. — Voceê sabe que foi oí tima. — Graças a Deus. Eu estava começando a ficar preocupado. Ela conteve o riso. — Eu queria ficar mais um pouco. Aqui eí taã o bonito e voceê teve tanto trabalho para organizar este almoço. Mas se voceê quiser, podemos ir. — Estaí me deixando tomar a decisaã o? Ela fez uma careta.

52


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Voceê eí o rei. O olhar quente de Zale percorreu o seu rosto lentamente, demorando-se em seus laí bios carnudos. — Ficaremos — disse ele apoí s algum tempo. — Vamos comer. Mas, assim que acabarmos, vou levaí -la para minha cama.

CAPÍTULO ONZE

HANNAH LUTOU para mastigar sua comida, mas comer era quase impossíível, com todas aquelas emoçoã es que experimentava. Zale naã o ajudava, lançando-lhe aqueles olhares de estoucom-tanta-fome-que-poderia-comer-voceê . Depois de algumas garfadas, ela desistiu e tomou um gole do vinho. Quando terminou o segundo caí lice, deu-se conta de que bebera demais. — Voceê naã o vai comer? — perguntou Zale, percebendo que o prato dela estava praticamente intocado enquanto o dele estava quase vazio. — Naã o gosta de lagosta? EÉ um de meus pratos favoritos. — Gosto. Estava muito bom. — Como pode saber? Voceê naã o comeu nada. Ela tomou foê lego, rosto quente, membros pesados. — Estou feliz, apesar de tudo. — Voceê ? — Jamais me esquecerei disso aqui. A vista. As flores. A conversa com voceê . Ele sorriu, divertido. — EÉ muito a ser lembrado. — Eu sei, mas vale a pena. Quantas mulheres podem fazer algo assim? Almoçar com o rei Zale Patek em uma torre de menagem com vista para o mar? Naã o saã o muitas. — Naã o. Soí voceê . Algo nos olhos dele fez disparar o coraçaã o de Hannah. — Algum dia vamos repetir a dose — prometeu ele, um leve sorriso brincando em seus laí bios enquanto seus olhos cor de aê mbar se voltavam para ela. — Talvez no nosso primeiro aniversaí rio de casamento. Por um instante, Hannah naã o conseguiu falar. Sua garganta fechou e ela sentiu o coraçaã o despedaçado. Mas logo suprimiu as intensas emoçoã es que sentia, recusando-se a deixar a dor estragar o seu dia. — Eu gostaria que voceê me beijasse. Zale levantou-se, ergueu-a da cadeira e a encostou em uma das paredes da torre. Em seguida, ele a beijou, um beijo taã o suave que ela naã o teve como reprimir um gemido. — Entaã o? — murmurou ele — Foi bom? — Naã o. — Naã o? Por que naã o? — Porque naã o foi o bastante — murmurou. — Quero mais. Quero que voceê me beije de forma adequada. — Assim? — perguntou Zale, mordiscando a sua orelha. Ela sentiu um frio no estoê mago. Seu ventre doíía e ela sentiu um imenso vazio em seus lugares mais ííntimos. — Naã o. Um beijo de verdade. Um beijo para tornar o dia perfeito. 53


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Zale a beijou lentamente, com delicadeza, buscando provocar-lhe uma reaçaã o, a princíípio quente e doce que, pouco a pouco, se tornou desesperada e quente. Hannah precisava dele, ela o desejava, desejava fazer tudo com ele — casamento, filhos, envelhecer juntos —, mas naã o teria aquilo que desejava. Teria apenas o que estavam tendo naquele momento. Ela sentiu-lhe a barba por fazer que despontava de seu queixo, o sutil cheiro da coloê nia que ele usava, o gosto de vinho em sua lííngua. — Preciso de voceê — ela sussurrou. — Preciso tanto de voceê … Zale ergueu a cabeça e olhou para ela. O peito dele ofegava e seus olhos estavam enevoados de desejo. Ela tocou-lhe os laí bios com a ponta dos dedos, maravilhada com tudo o que sentia por ele. Era magníífico. E aterrador. — Voceê eí taã o linda — disse ele, beijando-lhe as pontas dos dedos. — Sinceramente, naã o consigo me cansar de voceê . — Entaã o naã o se canse. Ele a ergueu em seus braços, levou-a ateí uma pedra quebrada e a sentou na beirada. Afastando-lhe a saia, expoê s as suas pernas nuas e abriu suas coxas revelando a calcinha que ela usava. — Inacreditavelmente quente! — exclamou Zale, percorrendo um dedo sobre a seda umedecida da calcinha, molhando-a ainda mais. Ela ofegou quando os dedos dele percorreram seus laí bios intumescidos, fazendo suas coxas estremecerem e sua barriga ficar tensa de desejo. — Taã o uí mida — murmurou ele, fascinado pela seda que se amoldava sobre as suas partes mais ííntimas, e acariciando-a ainda mais lentamente para senti-la estremecer contra os seus dedos. — E taã o ansiosa por mais prazer — acrescentou, a voz rouca, antes de afastar o tecido. Zale emitiu uma exclamaçaã o admirada quando divisou seus pequenos laí bios e o interior rosado e brilhante de seu sexo. Hannah agarrou as laterais da pedra onde estava sentada, incapaz de respirar. Nenhum homem a olhara taã o de perto, taã o intensamente. Tentou fechar as pernas, mas Zale estava agachado entre as suas coxas, mantendo-as abertas. — O que seraí que tem voceê ? — rosnou ele, acariciando a pele macia e uí mida. — Por que faz isso comigo? Ela estremeceu quando a ponta do dedo de Zale tocou-lhe o clitoí ris, taã o sensíível que ela achou que poderia explodir de desejo. — Naã o sou… naã o sou eu… — ofegou Hannah, o fogo lambendo a sua pele, fazendo-a queimar, doer. — EÉ … voceê . — Naã o. Nunca precisei ou desejei uma mulher tanto quanto eu a desejo. Ela agarrou a pedra com mais força enquanto ele acariciava a pequena protuberaê ncia, usando a ponta do polegar para fazer pequenos cíírculos contra as bordas escorregadias. Hannah sentia a pressaã o se acumulando dentro de seu corpo, o desejo se tornando cada vez mais intenso e feroz. Ela estava a ponto de chegar ao clíímax, mas Zale olhava para seu rosto enquanto a acariciava, atento aà s suas emoçoã es e reaçoã es. Ficar taã o exposta diante de um homem era sensual, embora fíísica e emocionalmente assustador. Havia tanto em jogo, pensou ela, esforçando-se para respirar, jaí completamente entontecida. — Quero veê -la perder todo o controle. Ela balançou a cabeça enquanto seu corpo saltava e se retorcia, terminaçoã es nervosas esticadas a um ponto de ruptura. — Naã o posso — murmurou, pele quente, corpo em chamas, desesperada para

54


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

encontrar alíívio, mas incapaz de deixar acontecer e se expor. Ela nunca fora taã o selvagem, nunca fora taã o ousada sexualmente, a ponto de seu namorado de faculdade se queixar que ela era fria na cama. Com Zale, entretanto, sentia-se ousada. Desesperada. Libertina. — Sim, voceê pode — ele insistiu. — N-n-naã o. N-n-n-aã o posso — gaguejou Hannah, incapaz de olhaí -lo enquanto suas pernas estremeciam. — Por que naã o? — murmurou Zale. — Voceê estaí … olhando. — Gosto de olhar. Me daí prazer. Ela balançou a cabeça, mordendo o laí bio inferior. A tensaã o dentro dela era avassaladora. Hannah naã o conseguiria aguentar muito mais tempo. — Entaã o feche os olhos. Ela balançou a cabeça outra vez, ele abriu suas pernas ainda mais e inclinou-se para cobrir-lhe o clitoí ris com a boca. Ele a sugou com força e quando ela tentou repeli-lo, ele introduziu um dedo nela, atingindo certo ponto de sua intimidade enquanto sugava-lhe o clitoí ris. Ela gritou quando ele finalmente conseguir destruir o seu controle e a levou a um orgasmo taã o intenso que os quadris de Hannah ergueram-se da pedra. Mas ele naã o parou. Ele continuou a sugar e a tocaí -la com o dedo, cada vez mais fundo, fazendo-a se sentir novamente quente e sensíível Ela tentou dizer que aquilo naã o funcionaria, que ela jamais teria outro orgasmo, mas ele continuou a sugar sua pequena protuberaê ncia. Ela explodiu uma segunda vez, gritando o nome de Zale. Dessa vez, ao fim de tudo, Hannah o afastou. — Chega. Ainda treê mula, ela ajeitou a calcinha uí mida e baixou a saia sobre as pernas. — O que voceê fez comigo? — perguntou, todo seu corpo arrepiado. — O que voceê faz comigo toda vez que olho para voceê . Laí grimas quentes e salgadas afloraram aos olhos dela, que as enxugou. — Eu acho que voceê acabou comigo — sussurrou. Ele sorriu e beijou-lhe o joelho atraveí s da saia antes de se levantar. Hannah ergueu a cabeça para olhar para ele. — E voceê ? — Seu olhar voltou-se para a calça de Zale, onde uma poderosa ereçaã o forçava o tecido. — Naã o vai querer tambeí m? Ele estendeu a maã o para ela. — Sim. Mas no meu quarto. Naã o seraí confortaí vel colocaí -la de quatro sobre a pedra. Ela engoliu um suspiro. De quatro? Ela nunca fizera aquilo. — Talvez deveê ssemos ir. Zale riu baixinho e ambos contornaram a balaustrada e desceram a escada circular da torre ateí chegarem ao teí rreo. Estavam a caminho dos aposentos do rei quando um dos criados veio ter com Zale e lhe disse que a Sra. Sivka precisava que ele a ajudasse com o prííncipe Constantino. A mandííbula de Zale se contraiu, a preocupaçaã o evidente na sua expressaã o. — Irei imediatamente — disse ele antes de se voltar para Hannah. — Eu a encontrarei em seu quarto. — Haí algo que eu possa fazer? — Espere por mim. Zale e o criado seguiram para a suííte do prííncipe Constantino.

55


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Em seus aposentos, Hannah lavou as maã os, e ainda passava uma escova no cabelo quando ouviu o telefone vibrar na gaveta do criado mudo. Emmeline! Hannah correu para atender ao telefone. — Aloê ? — Hannah, sou eu. Hannah olhou para traí s, para se certificar de que nenhum dos criados estava por perto para ouvir. — Voceê estaí bem? — Eu… eu naã o sei. — Voceê vem? — Eu… naã o… sei. Atordoada, Hannah levou a maã o aà testa, sentindo como se estivesse perto de perder o controle. — Como assim? — Estou em Kadar. — Kadar? O paíís do sheik Makin? Por queê ? — Ele acha que eu sou voceê . — Diga-lhe que naã o eí ! — Naã o posso. — Por que naã o? — Ele estragaria tudo! Hannah lançou outro raí pido olhar por cima do ombro e acrescentou com mais urgeê ncia: , — Mas jaí estaí tudo estragado! Voceê naã o tem ideia do que aconteceu… — Sinto muito — interrompeu Emmeline, o choro engrolando-lhe a voz. — Mas estaí fora do meu controle. — Seu controle. Sua vida. EÉ sempre sobre voceê , naã o eí mesmo? — Eu naã o quis dizer isso. — Mas voceê me colocou aqui em seu lugar embora naã o tivesse a intençaã o de vir imediatamente. — Hannah estava taã o furiosa que praticamente gritava. — Voceê me usou, me manipulou. Como acha que eu estou me sentindo presa aqui, fingindo… Hannah ouviu o assoalho ranger atraí s dela. Ela naã o estava sozinha. Voltou-se. Zale. O telefone fechado quase escorregou de seus dedos. — Gomo vai nosso bom amigo Alejandro? — perguntou Zale, entrando no quarto e fechando a porta aà sua passagem. O coraçaã o de Hannah disparou e ela lançou um olhar de paê nico para a porta fechada. — Q-q-quem? — Emmeline. — Naã o era quem voceê pensa. — Claro, voceê estava jogando. As coisas nunca saã o faí ceis com voceê . — Ele foi ateí a cama e sentou-se aà borda. — Entaã o venha, sente-se. Vamos tentar tirar algum divertimento de tudo isso. Zale sorriu para ela, mas sua expressaã o era fria. Furiosa. — Vamos brincar de perguntas e respostas? Eu pergunto, voceê responde. — Zale, naã o era um homem! Naã o foi Alejandro. Era uma das minhas amigas. — E voceê espera que eu acredite nisso? — Sim. — Sei o que ouvi. Voceê estava implorando para que ele viesse buscaí -la e levaí -la para

56


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

casa. — Naã o! Naã o era ele. Eu juro. Por tudo o que eí mais… — Naã o! — exclamou Zale, imperioso. — Naã o faça isso. Hannah atravessou o coê modo, tremendo da cabeça aos peí s e entregou o telefone para ele. — Tome. Ligue para o uí ltimo nuí mero. Veja quem responde. Naã o eí um homem. Mas Zale naã o segurou o aparelho, que tombou sobre o colchaã o e caiu no chaã o ao lado da cama. Ela nunca o vira taã o furioso. — Toda vez que eu começo a me sentir confortaí vel, voceê faz isso. Toda vez que me comprometo com voceê , voceê me faz de bobo. — Naã o. Eu jamais faria isso com voceê . Nunca. — Contudo, ao ouvir o que dizia, ela percebeu que de fato o estava fazendo de bobo desde que chegara. Fingindo ser Emmeline. Fingindo estar resolvendo as diferenças em seu relacionamento. Fingindo conheceê -lo antes de se casarem quando, na realidade, ela naã o era a pessoa com quem ele se casaria. — Voceê naã o eí uma donzela em apuros, princesa. — Ele cuspiu as palavras como se estivessem machucando a sua boca. — Naã o haí tranca na porta. Nenhum guarda para manteê -la prisioneira. Se quiser ir, vaí . Quanto a mim, tenho muito a fazer e naã o vou perder nem mais um minuto com voceê . — Zale. Ele ergueu a maã o para silenciaí -la. — Basta. Tenha algum respeito, por favor. E, com a maã o ainda erguida, saiu pela porta.

CAPÍTULO DOZE

ZALE SAIU do quarto, atravessou o grande salaã o medieval que ainda ostentava brasoã es e armaduras em suas paredes, e dirigiu-se aà nova ala, uma ala que ele construííra havia cinco anos para abrigar sua academia e instalaçoã es esportivas particulares. Aquelas instalaçoã es eram, na verdade, um complexo desportivo de níível internacional, abrigando um campo de futebol oficial no primeiro andar, com grama de verdade, redes e iluminaçaã o de estaí dio. O segundo andar fora dividido em diversas quadras esportivas — teê nis, basquete e, handebol —, aleí m de uma sala de musculaçaã o, onde ele ainda treinava todos os dias. Contííguo aà sala de musculaçaã o, havia um vestiaí rio equipado com uma sauna, uma jacuzzi e uma mesa de massagem para tratar suas contusoã es. Naã o que Zale se contundisse muito ultimamente. Mas aquilo o fazia se sentir ligado aà pessoa que ele fora outrora, algueí m que vivia e respirava esporte acima de tudo. A instalaçaã o lhe custara milhoã es, mas ele a financiara e a mantinha com seu proí prio dinheiro. Naquela parte do palaí cio, ele naã o era um rei, mas um homem. Um homem que naã o precisava de nada aleí m de uma bola, uma rede e um campo gramado. No vestiaí rio, despiu a camisa e a calça e vestiu um moletom, uma camiseta e um par de teê nis. Naquele dia ele naã o correria na esteira. Em vez disso, correu na pista ao redor do campo, um quiloê metro apoí s o outro. Contudo, naã o importando quaã o raí pido corresse, naã o 57


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

conseguia fugir de seus pensamentos. Fora uma loucura ter confiado nela. Loucura se importar com ela. Eles naã o assinaram o acordo preí -nupcial, mas fizeram sexo. Poreí m, ela o estava traindo, ainda estava com Alejandro. Ele tinha direito de mandaí -la embora. Mas romper o noivado com Emmeline naã o sairia barato. Aquilo se transformaria em uma enorme crise, pessoal e políítica. Contudo, uma vez que ela fosse embora, uma vez que o choque da notíícia passasse, as pessoas seguiriam em frente. Ele seguiria em frente. Mas quando Zale a imaginava indo embora, naã o sentia alíívio. Ele sentia… dor. Perda. A culpa era dela, pensou. O vazio que sentia dentro do peito, aquele sentimento de perda, era culpa dela. Ela era uma bruxa, naã o uma princesa, e lançara um feitiço sobre ele. Mas era um feitiço que ele tinha de romper. Mais cedo ou mais tarde. Entaã o ele correu, cada vez mais raí pido, abandonando a pista para correr em ziguezague ateí o centro do campo, repetindo a rotina diversas vezes durante uma hora, ateí sentir as pernas tremendo, o coraçaã o batendo forte e a respiraçaã o ofegante. Finalmente, sua mente se acalmou. Seus pensamentos ficaram mais luí cidos. Sim, o peito ainda doíía, mas naã o devido aà exaustaã o ou aà emoçaã o. E ele podia lidar com aquilo. NOS APOSENTOS da rainha, Hannah caminhou impaciente durante meia hora depois que ele a deixou, pensando que Zale talvez mudasse de ideia e voltasse. Mas ele naã o voltou. Trinta minutos depois, ela foi ateí os aposentos de Zale, mas ele naã o estava laí . Ela voltou para seu quarto, afundou no sofaí de seda rosa e pegou uma das revistas de moda francesa que lady Andrea comprara, embora naã o conseguisse ler os textos ou se concentrar nas imagens. Ela queria consertar as coisas com Zale de algum modo, mas ele naã o voltou aos aposentos dela, nem a chamou aos seus. A tarde passou, a noite chegou. Alheia, Hannah observou Celine acender o fogo da lareira da sala de estar. Contudo, apesar do calor do fogo, Hannah continuava gelada. E se aquele fosse o seu uí ltimo dia ali? E se Zale a mandasse embora? E se, naquele momento, ele estivesse planejando embarcaí -la em um aviaã o? Naã o, ela naã o podia ir embora assim. Tinha de veê -lo. Tinha de fazeê -lo entender. Hannah estava se levantando do sofaí quando pensou: mas o que tinha de fazeê -lo entender? Que ela o enganara, sim, mas com a melhor das intençoã es? Ou que ela o enganara deliberadamente porque se apaixonara por ele aà primeira vista? Hannah voltou a afundar na almofada do sofaí sabendo que jamais poderia confessar. Sabendo que jamais poderia se redimir. Algumas coisas eram horrííveis demais para serem perdoadas. AÀ s 19hs, como Zale ainda naã o tivesse aparecido, nem tivesse mandado chamaí -la para o jantar, Hannah comeu a refeiçaã o que Celine trouxera da cozinha. As 21hs, Celine perguntou a Hannah se ela gostaria de vestir sua camisola de dormir e seu robe. Hannah balançou a cabeça em negativa. — Ainda naã o — respondeu ela com a voz rouca. — Mas naã o haí necessidade de voceê ficar. Posso me trocar mais tarde, quando estiver pronta. Sei onde encontrar tudo. — Estaí certa disso, Alteza? Hannah estremeceu ao ouvir a palavra Alteza. — Claro. Boa noite, Celine. Durma bem. AÀ s 22hs, Hannah decidiu que ficara sentada tempo bastante esperando, preocupada. Tinha de fazer algo. Qualquer coisa. Mover-se. Andar. Encontrar Zale. Encontrar Zale. Sim, era isso o que ela precisava fazer. Imediatamente. Ignorando os guardas uniformizados postados do lado de fora de seu quarto e por todo

58


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter o palaí cio, ela desceu ateí a ala que abrigava os escritoí rios e a biblioteca. Mas ele naã o estava ali. As salas estavam aà s escuras, suas portas, trancadas. ' Onde mais Zale estaria aà quela hora da noite? Com o irmaã o, talvez? Hannah foi ateí a ala familiar, mas, ao chegar aà suííte de Tinny, encontrou-a aà s escuras. Ela se deteve no topo da escadaria, confusa. Um criado aproximou-se. — Procura algo, Alteza? — perguntou ele. Ela tentou sorrir. — Sim, procuro Sua Majestade. — Sinto muito, Alteza — desculpou-se o criado. — Eu naã o o vi, mas posso perguntar se algueí m sabe onde ele estaí . — Seria maravilhoso. Obrigada. — Estaraí em seus aposentos, Alteza? — Sim. Quinze minutos depois, Krek bateu aà sua porta com a notíícia de que Zale naã o saííra, mas que naã o estava com o irmaã o, nem em sua academia particular, mas que certamente estava em algum lugar do palaí cio. Exatamente onde, poreí m, ningueí m sabia dizer. Quando Krek se foi, Hannah pensou que talvez soubesse onde Zale estava. Na balaustrada. No lugar onde haviam almoçado. Ele naã o dissera que gostava de ir ateí laí quando queria pensar ou ficar sozinho? Hannah vestiu um manto de veludo macio e saiu do quarto. Desceu a escada, atravessou rapidamente as salas e os grandes corredores do palaí cio, agora desertos, e foi ateí a velha torre de menagem. Aquela parte do palaí cio era parcamente iluminada, e seus passos ecoavam assustadoramente no salaã o medieval enquanto ela procurava o corredor que a levaria ateí a escada. Por fim, descobriu o arco de pedra da entrada e ganhou a escadaria circular que serpeava ateí o topo da torre. Havia um guarda de prontidaã o ao fim da escada, mas, ao veê -la, ele se inclinou, reverente, e imediatamente abriu-lhe a porta. Hannah respirou o ar frio da noite. Era uma noite clara, e as luzes da cidade laí embaixo rivalizavam com as estrelas brilhantes do ceí u. Ela apertou o manto de veludo azul-escuro contra o peito e caminhou ao longo da balaustrada aà procura de Zale, imaginando todas as pessoas que haviam feito aquele mesmo percurso nos uí ltimos oitocentos anos. Imaginou quais seriam as preocupaçoã es, as esperanças, os sonhos, assim como as tristezas dessas pessoas. Em oitocentos anos, a políítica, a moda e a tecnologia mudaram muito, mas os coraçoã es humanos continuavam os mesmos. — O que voceê estaí fazendo? Era a voz de Zale, vinda da escuridaã o. Ela estremeceu e se voltou. — Onde estaí voceê ? Ele se afastou da sombra do muro e se expoê s aà luz do luar. — Aqui. Ela naã o conseguia ver a expressaã o de seu rosto, mas sua voz soava rííspida e impaciente. Por um instante, ela vacilou, mas logo em seguida, reuniu coragem para dizer: — Lamento que tenha ouvido o que eu disse, mas naã o eí o que voceê estaí pensando. Naã o era Alejandro. Naã o falo com ele desde Palm Beach e, mesmo naquela oportunidade, nada aconteceu entre noí s. — Naã o me importo com isso — disse ele bruscamente. — Mas eu sim, e eí por isso que tinha de encontraí -lo. — Ela inspirou profundamente. — Sei que naã o tenho sido faí cil. Sei que naã o sou a mulher que voceê queria. Mas eu gostaria de ser a mulher perfeita para voceê .

59


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Naã o preciso de perfeiçaã o — ele a interrompeu. — Mas tambeí m naã o tolero desonestidade ou traiçaã o. — Sinto muito. Mas eu gostaria que soubesse que, desde que cheguei, soí desejei uma coisa: voceê . Ele emitiu um som de desagrado. Ela se voltou para ele. — Eu juro, Zale. Naã o haí mais ningueí m. Preciso que voceê acredite em mim. — Emmeline — disse ele em adverteê ncia. Ela ignorou a ameaça em sua voz. — Eu odeio que voceê esteja aborrecido. Por favor, me perdoe. — Emme… Ela se ergueu na ponta dos peí s e interrompeu o protesto dele com um beijo. Seus laí bios estavam frios, ríígidos, mas ela naã o podia desistir. Tinha de tentar. Beijou-o lentamente, com doçura, apertando o rosto dele entre as maã os. Ela sentia a barba aí spera contra as palmas e o aquecimento gradual dos laí bios dele contra os seus. Entaã o, ele retribuiu o beijo com força, de modo quase agressivo. Logo, o beijo explodiu em algo quente, faminto e feroz. Ele a beijou ateí que a cabeça de Hannah começou a girar e pequenas estrelas a dançar diante de seus olhos. Em dado momento, poreí m, ele a empurrou para traí s, pressionando-a contra a fria parede de pedra. Em seguida, tomou as suas maã os e as imobilizou acima de sua cabeça. — Isso naã o estaí dando certo — disse ele, inclinando-se em direçaã o a ela. — Noí s naã o estamos dando certo. Ela podia sentir o calor de seus dedos ao redor de seus pulsos e a pressaã o de seus quadris contra os dela. Seu peito esmagava os seus seios, e seu joelho pressionava o espaço entre as suas coxas, roçando suas partes mais sensííveis e, ainda assim, ela naã o sentia medo algum. Apenas prazer. E desejo. Ela precisava dele. Ela o desejava. Hannah o desejava mesmo quando ele estava selvagem e furioso, com a intençaã o de castigaí -la, porque sabia que ele jamais a magoaria. Ele sempre a protegeria. Mesmo que fosse de si mesmo. — Mas noí s estamos dando certo — respondeu Hannah. — Ao menos esta parte funciona… quando estamos juntos assim. — Mas sexo, mesmo que seja muito sexo, naã o faz um casamento dar certo. Tem de haver mais. E eu quero mais. — Mas poderííamos ter mais — protestou ela. — Sim, mais drama. Mais mentiras. — Voceê me prometeu quatro dias, Zale. Noí s ainda temos dois dias. EÉ tudo o que peço. — Naã o. — Por favor. — Absolutamente naã o. — Mas a noite do Baile da Ametista e do Gelo naã o eí amanhaã ? Sei que eí um grande evento para levantar fundos para caridade. Naã o pareceraí estranho se eu naã o estiver laí ? — Seria pior se eu tentasse passar a noite agindo como se gostasse de voceê . Hannah se retraiu. Ele a soltou. — Odeio ser cruel, Emmeline, mas noí s dois sabemos que voceê naã o eí a mulher certa para mim. Foi quando ela percebeu que lutava uma batalha perdida. Zale rompera com ela. Ele tinha a intençaã o de mandaí -la embora. E talvez isso fosse o mais correto. Talvez fosse a maneira certa de terminar tudo aquilo. Ela poderia ir embora pela manhaã e Zale jamais saberia a verdade. Ele jamais saberia

60


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter que naã o era Emmeline quem estava ali, e sim Hannah. Ele nunca teria de saber que fora enganado. Ele deu-lhe as costas e foi ateí a balaustrada de pedra para olhar para a cidade iluminada. — Estou cansado — disse ele apoí s um instante. — Cansado de falar. Cansado de argumentar. Cansado de tentar levar isso adiante. Ela podia sentir a exaustaã o em sua voz, em seus ombros caíídos. — Eu entendo. — Vou telefonar para seu pai pela manhaã e dizer-lhe que percebemos que naã o funcionaria. Vou dizer que foi uma decisaã o muí tua e que nossas diferenças eram muito grandes para serem superadas. — Certo. Ele olhou para ela por cima do ombro. — EÉ melhor fazer isso agora do que esperar ateí o uí ltimo minuto para cancelar o casamento. — Eu concordo. Ele baixou a cabeça e fechou os olhos. — Entaã o, por que me sinto taã o mal? Hannah sentiu um noí na garganta e seus olhos começaram a arder. — Porque, apesar de nossas diferenças, noí s cultivamos sentimentos um pelo outro. Ele inspirou lentamente. — Perdoe-me. Ela foi ateí ele e o abraçou pela cintura, pressionando o rosto contra as suas costas. — A culpa eí minha. EÉ voceê que precisa me perdoar. — EÉ tarde — disse ele com aspereza. — Devemos ir para a cama. Logo amanheceraí . — Posso dormir com voceê esta noite? — Seria apenas arranjar mais confusaã o. — Eu naã o arranjarei confusaã o — sussurrou ela. — Soí quero estar perto de voceê . Soí quero dormir com voceê uma uí ltima vez. — Eu naã o vou mudar de ideia, Emmeline. Ainda assim, voceê iraí embora pela manhaã . — Sim. Zale ficou em sileê ncio por tanto tempo que ela teve certeza de que ele a recusaria, e beijou a palma de sua maã o. — Entaã o, passaremos a nossa uí ltima noite juntos e nos despediremos pela manhaã . Eles fizeram amor na cama grande, os paineí is de brocado fechados formando um casulo exclusivo para os dois amantes. Na escuridaã o Zale fez amor lentamente, contendo o proí prio orgasmo e levando-a duas vezes ao clíímax. Fechando os olhos, Hannah saboreava seu corpo ríígido deitado sobre o dela, sua pele quente e agradaí vel ao toque. Ela o amava. E ele jamais saberia disso. Laí grimas queimaram sob as suas paí lpebras e ela estremeceu em seus braços. Perdoeme, Zale, sussurrou silenciosamente, beijando seu peito. Perdoe-me por naã o ser quem voceê precisava que eu fosse. APESAR DE estar exausto, Zale naã o conseguia dormir. Sua mente naã o desligava. Ele naã o conseguia parar de pensar. Seu peito doíía. Zale precisava de ordem. Ele naã o se saíía bem com a incerteza. Para ele, a ambivaleê ncia era semelhante ao caos. E caos era sinoê nimo de perda. Perda da paz. Perda de concentraçaã o. Perda de controle. E Zale precisava de controle. Ele precisava estar no controle. Sempre. E as poucas vezes em que naã o estivera, coisas terrííveis aconteceram, coisas com um desfecho traí gico.

61


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

A leucemia de Stephen. O acidente de seus pais. As convulsoã es de Tinny. Naã o, o controle era tudo. Motivo pelo qual ele treinara tanto quando era jogador de futebol. Ele sabia que se trabalhasse muito, implacavelmente, seria bem-sucedido. Zale sabia que tinha talento, mas foi seu compromisso que o levou ao topo. E naã o por acaso. Seu sucesso era resultado direto de disciplina, unidade e sacrifíício. Ele aplicara controle ao trabalho e fora recompensado. Fizera os sacrifíícios necessaí rios e ganhara a paz de espíírito. Era baí sico. Simples. Preto e branco. Mas com Emmeline era diferente. Com Emmeline, suas emoçoã es eram caoí ticas. Primitivas. Ele se sentia selvagem ao lado dela. Feroz. Como se mal conseguisse se controlar. Ultimamente, Zale queria agarraí -la pelos cabelos e puxaí -la para a sua casa e manteê -la ali soí para ele, aà moda de um homem das cavernas. Mesmo agora, ele ainda desejava trancaí -la, protegeê -la, afastar toda a incerteza. Talvez, entaã o, ele se sentisse confortaí vel. Talvez. Hannah suspirou de repente e, murmurando algo ininteligíível em seu sono, aconchegou-se contra o calor do seu corpo, e ele sentiu no peito uma dor quente e cruciante. Como poderia amaí -la? Como poderia querer abraçaí -la?

CAPÍTULO TREZE

AO ACORDAR, Hannah percebeu que estava sozinha. Ela estendeu a maã o para o lado e sentiu os lençoí is frios. Zale fora embora havia algum tempo. Ao se dar conta disso, ela sentiu um aperto no coraçaã o e enterrou o rosto no travesseiro. Jaí era manhaã . Zale fora embora. A qualquer momento, ela teria de arrumar as suas coisas e se despedir. Contudo, a ideia de se despedir de Zale deixou-a deprimida. Ela o amava, mas teria de deixaí -lo. Aquilo era certo? Aquilo era justo? E como Zale se despediria dela? Seraí que viria ao seu quarto? Ou seraí que a encontraria na porta? Ou seraí que ele se recusaria a veê -la, e naã o diria absolutamente nada? Hannah sentia o coraçaã o apertado. Mas voceê naã o pode chorar, disse para si mesma. Voceê deve se controlar, por Zale. Deve manter a calma ateí ir embora. E ela manteria a calma. Ela se concentraria no futuro, no retorno aà sua vida, aà sua proí pria vida, a vida de uma mulher normal de 25 anos que trabalhava para pagar as suas contas, a prestaçaã o do carro e o aluguel. Outrora, ela gostara de ser comum. Sempre apreciara sua independeê ncia e autonomia. Gostava de trabalhar e depois voltar para seu apartamento aà noite, enrolar-se no sofaí e assistir a programas de TV ou ler seus livros favoritos. Eu posso fazer isso, repetiu, afastando as cobertas para enfrentar o seu dia. Hannah mal acabara de tomar banho quando lady Andrea bateu aà sua porta. — Vai ser um dia agitado, e teremos um baile aà noite — disse lady Andrea, consultando 62


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter a agenda de eventos. — Vossa Alteza encontraraí Sua Majestade em seu escritoí rio para o cafeí da manhaã , e, em seguida, iraí se encontrar com monsieur Pierre, que chegou esta manhaã trazendo seu vestido para o baile desta noite. Entaã o seria assim que Zale a dispensaria, pensou Hannah, incapaz de falar. Ele a estava convocando ao seu escritoí rio, onde diria algumas palavras breves e, depois, lhe mostraria a porta da rua. Tudo perfeitamente profissional. Tudo maravilhosamente real. — Obrigada — disse ela. — Vou me vestir logo. — Eu naã o deveria dizer nada, Alteza, mas vi o salaã o de baile. A decoraçaã o estaí de tirar o foê lego. A sala inteira foi transformada em uma terra das maravilhas, com esculturas de gelo do chaã o ao teto. Hannah naã o estava preocupada com o baile. Ela naã o estaria laí . Mas preocupava-se com Zale; com o modo como se despediria dele. Tinha de controlar as emoçoã es. Teria de agir com muita calma e tranquilidade quando se encontrasse com Zale. Vinte minutos depois, Hannah viu-se sentando-se no estuí dio particular de Zale — uma sala revestida de livros do chaã o ao teto que a fez pensar em uma biblioteca —, bebendo uma xíícara de cafeí e desejando que ele falasse alguma coisa. Zale mal a olhara desde que ela chegara havia alguns minutos. Tambeí m naã o tocara no seu cafeí . — Voceê dormiu bem? — disse ele, afinal, rompendo o sileê ncio insuportaí vel. Ela assentiu. — Sim, obrigada. — Ontem eu fiquei muito chateado. Ouvi voceê ao telefone e me senti traíído. — Estaí tudo bem, Zale. Eu entendo. Naã o vou fazer uma cena. — Eu lhe devo um pedido de desculpas — interrompeu ele. — Entendi tudo errado. Voceê estava me dizendo a verdade. Voceê naã o estava falando com Alejandro. Ela sentiu um arrepio e ficou alarmada. — Como sabe? — Ele se feriu gravemente em um acidente de polo ontem, em Buenos Aires. Esteve horas em cirurgia e permanece inconsciente na UTI. — Zale finalmente olhou para ela com a expressaã o neutra. — Imagino que voceê jaí saiba. — — Eu naã o sabia. Ele desviou o olhar e engoliu em seco. — Sinto muito, Emmeline. Sei que voceê tem fortes… sentimentos por ele. Ela olhou para as proí prias maã os, dedos entrelaçados. — Lamento que ele tenha se ferido, mas naã o estou apaixonada por ele se eí o que quer dizer. — Naã o? Ela balançou a cabeça e o encarou. — Como eu poderia quando gosto tanto de voceê ? Por um longo instante ele a encarou tambeí m, olhos nos olhos, antes de inspirar profundamente e dizer: — Voceê ainda gosta? Mesmo depois da noite passada, quando eu estava determinado a mandaí -la embora? Os laí bios dela se curvaram em um sorriso treê mulo. — Sim. Ele parecia paí lido, tenso e infeliz. — Sinto muito. Eu deveria ter confiado em voceê . Sentindo-se culpada, ela forçou-se a abrir um sorriso. — Erros acontecem. — Voceê me perdoa? — Sim.

63


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Poderia ficar, por favor? Naã o quero comparecer ao baile de hoje aà noite sem voceê ao meu lado. — Sim, claro. Eu adoraria estar ao seu lado. — Obrigado. — Ele parecia aliviado, mas sua expressaã o permanecia sombria. — Nesse caso, eu a aconselho a voltar ao seu quarto para provar o vestido do baile. Ela assentiu, forçou outro sorriso e saiu do estuí dio silenciosamente. ZALE A viu sair e ouviu a porta se fechando silenciosamente aà sua passagem. Por um momento, sentiu-se estranhamente desamparado. Oco, vazio e sozinho. E naã o gostou de se sentir assim. Ele gostava de teê -la em seu estuí dio. Gostava de sua companhia. Adorava teê -la ao seu lado. Na noite anterior, ela dissera que sabia naã o ser a mulher que ele queria, mas estava enganada. Ela era exatamente o que ele queria. Agora, soí precisava provaí -lo. Era hora de tentar parar de controlar tudo. Hora de parar de definir as coisas de modo taã o radical. Seraí que conseguiria se abrir um pouco? Crescer um pouco? Mudar para ela? Sim. Ele lembrou-se dela dormindo em seus braços na noite anterior, e queria que isso acontecesse todas as noites. Queria uma vida com ela, um futuro juntos. Casamento, filhos e tudo o mais. DO OUTRO lado do palaí cio, nos aposentos da rainha, Hannah estava sentada em um banquinho tentando entrar em um vestido grego branco e fino que naã o fechava de modo algum, sua imagem refletida nos diversos espelhos do quarto. Lady Andrea, sentada a um canto, trabalhava em seu notebook. Camille e Teresa estavam recostadas aà parede oposta, e Celine pairava atraí s de Anton Pierre, o estilista parisiense que chegara pela manhaã trazendo os dois trajes encomendados: o vestido do baile de gala daquela noite e o vestido para a cerimoê nia de casamento, no saí bado. O elegante vestido de chiffon deveria ter entrado facilmente. Em vez disso, estava apertado nas axilas e naã o fechava nas costas. — Encolha a barriga — disse Anton Pierre, puxando o zííper do vestido, laí bios contraíídos, expressaã o críítica. — Estou encolhendo — respondeu Hannah, estremecendo ao sentir o zííper beliscando a sua pele. — Ai, pare! Isso doí i! Anton ergueu as maã os em sinal de desagrado. — Se este vestido estaí apertado, o de casamento tambeí m naã o caberaí . Seus seios e quadris estaã o enormes. O que anda comendo, Alteza? — Naã o muito — respondeu Hannah, sabendo que perdera peso na semana anterior, ao menos treê s quilos. -Acho que estaí abusando de manteiga e carboidratos. Eu a visto haí anos, e Vossa Alteza sempre me pediu para dizer a verdade. Entaã o eu estou lhe dizendo a verdade. Estaí gorducha e teraí de perder dez quilos rapidamente. De outro modo, naã o entraraí no vestido de casamento. O traje foi feito para uma princesa, naã o para um meio-campista. — Fora! — A voz Zale trovejou atraveí s do vestiaí rio, fazendo balançar um dos espelhos na parede. Ele parecia tremendamente irritado ao gesticular em direçaã o aà porta. — Saia, Pierre, antes que eu o expulse daqui pessoalmente. Entaã o ele se voltou para lady Andrea. — Como ousa permitir que um estilista fale com Sua Alteza desse jeito? Onde estaí sua lealdade? Talvez voceê tambeí m precise arrumar suas coisas e juntar-se a monsieur Pierre em seu voo de volta para casa. Lady Andrea cobriu a boca com a maã o contendo um soluço. — Perdoe-me, Majestade. Eu estava prestes a intervir. — Quando? — interrompeu-a Zale. — Eu estava escutando do lado de fora da porta. Ouvi tudo isso. Quando voceê interviria? Ateí onde pretendia deixaí -lo chegar?

64


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Lady Andrea sacudiu a cabeça e enxugou as laí grimas. — Essa resposta jaí me basta — retrucou Zale. — Arrume as suas coisas e vaí embora. Ele se voltou para Celine, Camille e Teresa. — E voceê s treê s? Qual a sua desculpa? Por que nenhuma de voceê s defendeu Sua Alteza? Celine arregalou os olhos. — Eu deveria ter intervindo, Majestade. Eu queria. Mas estava com medo. — Por queê ? Celine olhou para Hannah e depois se voltou para Zale. — Porque monsieur Pierre eí o estilista favorito da princesa Emmeline… Devo arrumar as minhas coisas, tambeí m? Zale olhou para Hannah, que ainda estava sentada no banquinho. — Vou deixar que Sua Alteza tome tal decisaã o. Mas quero que todos voceê s nos deixem agora. Eu gostaria de falar com a princesa Emmeline em particular. A equipe saiu do quarto e fechou a porta da suííte. Zale foi ateí o banco onde Hannah estava sentada. — Deê -me a sua maã o. Ela obedeceu e ele a ajudou a descer. — Vire-se — instruiu Zale. Ela obedeceu e ele baixou o zííper para que ela pudesse tirar o vestido. — Como pode deixar que ele fale com voceê desse jeito? — Eu tenho de ser magra — murmurou Hannah. — Besteira. Voceê eí perfeita. Eu naã o mudaria coisa alguma em voceê . — Sim, mas os estilistas preferem modelos muito magras. As roupas caem melhor. — Pouco me importo com roupas. Eu me preocupo eí com voceê . Ela sentiu o coraçaã o disparar. — Voceê se preocupa? — Naã o daí para notar? Naã o tirei as maã os de voceê desde que chegou. — Achei que era apenas porque voceê tinha um apetite sexual saudaí vel. — Tenho, mas naã o tive nenhum problema para administraí -lo ateí conheceê -la. Ela sorriu. — Voceê ainda faz isso parecer um problema. — EÉ . Eu me orgulho de meu autocontrole, mas voceê o tem desafiado a cada passo. Poreí m, estou feliz. Isso me fez perceber quaã o fortes saã o os meus sentimentos por voceê . — Ele inspirou profundamente. — Meu Deus, como Pierre se atreveu a falar com voceê daquele jeito? Quase bati no sujeito! E ainda quero ir atraí s dele para lhe dar uma liçaã o. Ele parecia enraivecido, irritado. — Mas e o baile de hoje aà noite? Preciso de algo para vestir. — Vamos fazer uma troca — disse ele. — Conheço uma estilista raguviana muito melhor que Anton Pierre. — Acha que ela pode acertar o vestido? — Naã o soí acertar. Eva iraí melhoraí -lo. — Zale olhou para ela e balançou a cabeça. — Ela vai pegar esse vestido sem graça e tornaí -lo extraordinaí rio. Voceê eí uma mulher extraordinaí ria e naã o merece menos que isso. O coraçaã o de Hannah se sobressaltou. Ele acabara de chamaí -la de extraordinaí ria. — Obrigada — agradeceu ela com a voz embargada. Zale a beijou suavemente, mas quando o beijo se tornou mais intenso, ele a afastou com delicadeza. — Se eu naã o fizer alguns telefonemas agora, voceê naã o teraí vestido para usar esta noite. Ela lançou-lhe um sorriso maroto. — Que bom. Entaã o eu irei nua ao baile. — EÉ o que voceê pensa — rosnou Zale.

65


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Hannah ainda ria depois que ele saiu, lembrando-se de como Zale expulsara Pierre. Fora uma cena de filme. Zale Patek em seu cavalo branco, adiantando-se para salvar sua donzela em apuros. O sorriso de Hannah desapareceu quando ela pensou em lady Andrea. Pobre lady Andrea. Hannah naã o tinha certeza se ela merecia ser demitida e decidiu que falaria com Zale e pediria que ele voltasse a admiti-la. Hannah descansava na cama quando o telefone na gaveta do criado-mudo emitiu um bipe, indicando que recebera uma mensagem. Hannah sabia que era de Emmeline. Soí que, dessa vez, ela naã o queria saber o que Emmeline tinha a dizer. Um minuto se passou. E depois outro. Por fim, relutantemente, Hannah pegou o telefone e abriu-o. O texto era breve. Eu naã o vou para Raguva. Naã o haveraí casamento. Quando voceê for embora, darei a notíícia a Zale. Mande mensagem para mim quando tiver partido. Desculpe. Hannah piscou e releu a mensagem, increí dula. Tudo fora em vaã o. Emmeline naã o se casaria com Zale. E Zale ficaria muito constrangido e irritado. Tinha de ir embora dali o quanto antes. Uma batida soou aà porta do quarto. — Alteza? — disse Celine. — Posso entrar? Hannah naã o conseguia falar, o ar preso em seus pulmoã es. — Alteza? Laí grimas encheram os olhos de Hannah. Ela teria de ir embora. Mas naã o poderia ir naquele mesmo dia, poucas horas antes do baile. Naã o podia humilhar Zale daquela forma. Naã o, ela soí iria embora na manhaã seguinte. — Sim — respondeu Hannah, afinal. — Por favor, entre, Celine. Celine abriu a porta e viu Hannah sentada na cama enxugando as laí grimas. — Estaí tudo bem, Alteza? — Estaí tudo oí timo.

CAPÍTULO CATORZE

MENOS DE treê s horas antes do baile, Hannah recebia uma massagem sueca em seus aposentos. As luzes foram diminuíídas, havia algumas velas acesas e tocava uma suave muí sica instrumental. Supostamente, aquilo deveria ser um deleite, mas Hannah estava muito nervosa para se divertir. — Inspire lenta e profundamente — disse a massagista, esfregando oí leo de lavanda nos ombros tensos de Hannah. — Agora expire. Devagar, devagar, alteza. Bom. Agora, novamente. Hannah tentou fazer o que lhe era pedido, mas era difíícil relaxar quando tudo dentro dela parecia amarrado em noí s. Agora, ela estava odiando Emmeline. Odiava-a pelo que ela fizera. Hannah nunca deveria ter vindo para Raguva. Ela jamais deveria ter concordado em ocupar o lugar dela por uma tarde, muito menos por uma semana. Se ela naã o tivesse vindo… Se tivesse se recusado a continuar aquela farsa… — Alteza — murmurou a massagista, massageando os ombros de Hannah. — Deixe tudo de lado. Apenas se concentre na sua respiraçaã o. Concentre-se em sentir-se bem na proí xima meia hora. 66


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter E de alguma forma, sob as maã os maí gicas da massagista, Hannah relaxou nos trinta minutos seguintes. Contudo, uma vez em seu banheiro, tomando banho para remover o oí leo, a ansiedade voltou. . Como poderia consertar as coisas com Zale? Tinha de haver algo que ela pudesse fazer. Contudo, de peí sob a ducha de aí gua quente, Hannah naã o conseguia pensar em nada. Hannah sempre se orgulhara de ser capaz de lidar com o que seu chefe, o difíícil e exigente sheik Koury, colocava no seu caminho. O sheik tivera uma duí zia de secretaí rias antes de encontrar Hannah, que falava quatro idiomas fluentemente e sabia lidar com as exigeê ncias daquele trabalho. Naã o importando o que lhe era pedido, ela lidava calmamente com a situaçaã o. Era preciso organizar uma reuniaã o de conscientizaçaã o ambiental com os principais executivos de petroí leo do mundo? Sem problemas. Planejar atividades para as esposas dos executivos do petroí leo? Hannah nem mesmo piscava. Organizar um torneio internacional de polo em Dubai e, em seguida, transferi-lo para Buenos Aires? Fornecer transporte para todos os jogadores e cavalos? Considere feito. Hannah adorava desafios, mas a uí nica coisa que ela naã o podia fazer, a uí nica coisa que estava desesperada para fazer, era proteger Zale do que estava por vir. Protegeê -lo da verdade. EVA, A estilista raguviana, reformulara o vestido de baile para Hannah, transformando-o de um vestido branco simples em um vestido de chiffon cintilante. — Voceê estaí uma deusa esta noite — disse Zale ao pararem aà s portas do salaã o de festa. — Mais bonita do que qualquer mulher tem o direito de ser. Ela corou. — Eu naã o sei o que dizer. Zale, que vestia um smoking preto e camisa e colete brancos, estava devastadoramente atraente. — Basta dizer “obrigada”. Entaã o, eles foram anunciados e entraram no salaã o, que brilhava com esculturas de gelo que iam do chaã o ao teto e fora decorado com aí rvores inteiras plantadas em vasos, trazidas especialmente para a ocasiaã o. Zale e Hannah atravessaram o salaã o a caminho do tablado sobre o qual sua mesa fora posta, a maã o de Zale pousada suavemente sobre as suas costas. — O que voceê acha? — perguntou ele quando subiram no tablado, alguns metros acima do restante da sala. — EÉ absolutamente maí gico. Eu me sinto como uma princesa de conto de fadas. Ele sorriu. -Qual? — Cinderela. — Ela tocou levemente a cintura do vestido. — Eva acenou com sua varinha maí gica, e voilaà ! Criados uniformizados encheram as suas taças de champanhe. Zale aproveitou para brindar: — Para a minha princesa — disse ele, um meio sorriso brincando em seus laí bios. — Para o meu rei — respondeu ela, brindando com ele. — Todos os reis raguvianos se casaram com nobres? — perguntou logo a seguir, devolvendo a taça aà mesa. — Nenhum se casou com uma plebeia? — Apenas uma vez nos uí ltimos duzentos anos. E ele abdicou do trono para se casar com ela. — Por que eí essencial ter uma noiva de sangue azul? — Nossa monarquia emergiu de uma realeza tribal que durou quase mil anos. O povo raguviano lutou duramente para preservar a sua monarquia, embora hoje sejamos, assim

67


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

como Brabante, uma monarquia constitucional. Hannah sabia as diferenças entre as monarquias graças ao seu trabalho para o sheik Koury. Havia monarquias absolutas, como as do Oriente Meí dio, Brunei, Araí bia Saudita, Catar, e monarquias constitucionais como as da Beí lgica, Sueí cia, Moê naco e Reino Unido. O poder do rei em uma monarquia constitucional eí definido pela constituiçaã o de cada paíís. Ela franziu a testa. — Sua constituiçaã o determina que voceê deve se casar com uma nobre? — Sim. — Voceê naã o poderia se casar com uma plebeia? — Naã o sem ter de renunciar ao trono. — E voceê naã o faria isso? — Eu naã o poderia. Ela notou a sua escolha de palavras. Naã o que ele naã o quisesse. Ele naã o poderia fazeê -lo. — Por que naã o pode? — Eu jamais poderia ser taã o egoíísta a ponto de colocar minhas necessidades pessoais aà frente das necessidades do meu paíís. Ela correu um dedo ao longo da taça de champanhe, observando as bolhas minuí sculas que estouravam aà superfíície. Mesmo que Zale quisesse se casar com Hannah Smith, ele naã o poderia fazeê -lo. Mesmo que Zale a amasse, naã o poderia ficar com ela. — Voceê jaí namorou alguma plebeia? — perguntou ela com a voz embargada. — Todas as minhas namoradas foram plebeias. — Seus laí bios curvaram-se, ligeiramente zombeteiros. — Voceê eí a minha primeira princesa. Mas ela tambeí m naã o era uma princesa. O coraçaã o de Hannah ficou ainda mais pesado durante o jantar. Contudo, sempre que Zale a olhava, ela perdia a noçaã o do tempo. Em seus olhos, havia apenas o agora. E, agora, ela estava feliz. De repente, Zale se levantou e estendeu-lhe a maã o. — Alteza — disse ele —, conceda-me o prazer desta dança. Ela olhou para o rosto de Zale e sentiu um arrepio percorrer o seu corpo. — Sim. Zale conduziu-a ateí a pista de dança quando a orquestra começou a tocar as primeiras notas de uma cançaã o de amor com a qual ela estava muito familiarizada, e que costumava tocar incessantemente em seu violaã o quando era pequena. — Sua muí sica favorita — murmurou Zale enquanto a puxava para os seus braços. Fortes sentimentos invadiram-lhe o coraçaã o. Como ele poderia saber? Entaã o, ela se deu conta de que ele se referia a Emmeline. Claro que ele se referia a Emmeline. Mas Emmeline naã o viria. Tudo acabaria naquela noite. Por um instante ela naã o conseguiu respirar, sufocada por uma dor pungente. Na manhaã seguinte ela iria embora, deixando-lhe um bilhete. Ele a odiaria quando encontrasse o bilhete. Ele tambeí m jamais a perdoaria por teê -lo enganado. — Voceê eí um bom dançarino — murmurou. — Isso porque voceê eí uma parceira perfeita. Olhos ardendo, coraçaã o em chamas, ela inclinou a cabeça para traí s e imediatamente se perdeu nos olhos de Zale. Ela amava o seu rosto. Amava tudo que dizia respeito a ele. — Vossa Majestade estaí cheia de elogios esta noite. Ele sorriu. — Estou feliz. Ele realmente parecia feliz. Seus olhos castanhos brilhavam. — Estou contente.

68


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Case-se comigo, Emmeline. — Pensei que isso jaí estivesse resolvido. — Estou propondo novamente para que possamos começar de novo. Do começo. Isto naã o diz respeito aà s nossas famíílias ou aos nossos paííses. Diz respeito a noí s. Voceê quer se casar comigo? Os olhos dela se encheram de laí grimas. Hannah piscou para clarear a visaã o. — Estou me sentindo nas nuvens. — EÉ o que eu deveria ter feito desde o iníício. — Eu naã o tinha ideia de que voceê fosse taã o romaê ntico. Ele a olhou com determinaçaã o. — Isso eí um sim, Alteza? Ou precisa de tempo para pensar? O peito de Hannah doíía. Como poderia dizer naã o? Como poderia recusar-lhe qualquer coisa? — Sim. Ele sorriu, um grande sorriso de menino que iluminou o seu rosto e tornou o seu olhar totalmente irresistíível. — Graças a Deus. Por um instante, achei que voceê quisesse me abandonar ao peí do altar. Ele estava brincando. Tentando ser engraçado. Mas Hannah estremeceu. Zale sentiu os arrepios em seus braços e puxou-a para mais perto. — Estaí com frio? , — Um pouco. Ele abraçou-a ainda mais firmemente, e ela pousou o ouvido sobre o peito dele, um pouco acima de seu coraçaã o. E lembrou-se de Cinderela. Em Cinderela, a magia acabava aà meia-noite. A carruagem de cristal voltava a ser uma aboí bora. O vestido da Cinderela se transformava em farrapos. E Cinderela se tornava uma ningueí m. A cançaã o estava terminando e Zale levou a maã o de Hannah aà boca, beijando-lhe os dedos. — Obrigado. Ela olhou para ele e perguntou: — Alguma vez voceê jaí se apaixonou? — Sim. — Ela era uma plebeia? Ele assentiu. — O que aconteceu? Sua mandííbula se contraiu. — Meus pais morreram e eu me tomei rei. Ela olhou para ele. — Voceê a abandonou? Ele assentiu novamente. — Doeu — admitiu Zale. — Mas era o que tinha de acontecer. Afinal, se eu naã o tivesse terminado com ela, naã o estaria aqui com voceê . Zale olhou para Hannah e pegou a maã o dela. — Vejo alguns amigos no outro lado do salaã o. Vamos dizer olaí . DURANTE TODA a noite, ele a apresentou para pessoas que achava que ela deveria conhecer, membros de seu gabinete, membros do parlamento, e alguns dos homens e das mulheres mais influentes do mundo. Mas, agora, Zale a estava levando para conhecer velhos amigos, amigos ííntimos, gente do conhecimento de Emmeline. Cruzando o salaã o de baile, aproximaram-se do prííncipe grego, Stavros Kallas, e de sua noiva, a estonteante greco-britaê nica Demi Nowles. O prííncipe Stavros era primo de Zale, suas

69


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter maã es eram meias-irmaã s e Stavros fora amigo de Emmeline desde a infaê ncia. Quando Stavros pediu Demi Nowles em casamento apoí s um caso relaê mpago, ningueí m ficou mais feliz do que Emmeline, que era amiga de Demi havia muito tempo. Durante um ano, as duas foram uma dupla inseparaí vel, frequentando os clubes noturnos mais exclusivos do continente. — Creio que voceê conhece estes dois — disse Zale. — Talvez devesse me apresentar, Alteza. Ela sorriu, mas sua expressaã o estava tensa. Hannah estendeu a maã o para o prííncipe Stavros. — EÉ um prazer — disse ela educadamente. — EÉ bom veê -lo outra vez. Stavros olhou para a maã o estendida de Emmeline, olhou para Zale e depois olhou de volta para Emmeline antes de lentamente tomar-lhe a maã o. — Sim — concordou ele, desconfortaí vel. — Voceê me parece bem, Emmeline. Zale franziu a testa, e Demi assistiu a tudo, igualmente perplexa. Por um instante, Demi pareceu naã o saber o que fazer, mas, entaã o, sua expressaã o subitamente se iluminou. — Ah, Emi, entendo agora! Voceê estaí tirando sarro dos americanos e seus costumes estranhos. Soube que esteve em Palm Beach para o torneio de polo. Ouvi dizer que foi oí timo. — Sim, foi — concordou Hannah. — Quanto tempo ficaraí conosco? Todos ficaram em sileê ncio ao ouvirem a pergunta de Hannah. — Ateí o casamento, eí claro — respondeu Demi, perplexa, testa levemente franzida. — A menos que voceê decida substituir-me por uma de suas damas de companhia. Novamente, houve um sileê ncio, e Zale, Stavros e Demi trocaram olhares perplexos. Zale pegou a maã o da Hannah. Ela estava treê mula. Ele naã o entendia o que estava acontecendo. — Naã o — respondeu ela, quebrando o sileê ncio torturante. Hannah sorriu, mas parecia assustadoramente fraí gil. — Naã o seja ridíícula. Como eu poderia me casar sem ter voceê ao meu lado? Stavros sorriu. Demi abraçou Hannah. Mas Zale naã o se deixou enganar. Havia algo de errado com Emmeline. Ambos se afastaram do prííncipe e da princesa Kallas. — Voceê estaí bem? — murmurou Zale. — Eu naã o me sinto bem — respondeu ela, entontecida. Ele a enlaçou pela cintura para sustentar-lhe o peso. — Daí para notar. — Zale a conduziu ateí uma porta estreita que os levou ateí uma saleta anexa ao salaã o de baile, onde ele a tomou nos braços e a levou ateí uma espreguiçadeira. — Estaí se sentindo fraca? Ela assentiu. — Um pouco. — O que posso fazer por voceê ? Laí grimas afloraram aos seus olhos. — Nada. Zale chamou um criado. — Conhaque e aí gua — ordenou. O criado voltou rapidamente, e Zale levou a taça de conhaque aos laí bios de Hannah. — Beba. Vai ajudar. Ela sentou-se, enxugou as laí grimas e tomou um gole, arfando um pouco quando o aí lcool queimou-lhe a garganta. Zale esperou que ela bebesse outro gole antes de se levantar. — Como se sente agora? — Melhor.

70


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Mas seus dentes rangiam e ela ainda estava muito paí lida. Zale tirou o paletoí e pousou-o ao redor dos ombros dela antes de caminhar ateí a lareira apagada. — Voceê naã o os reconheceu — disse ele sem rodeios. — Naã o sabe quem saã o eles. Ela ergueu a cabeça e olhou para Zale. — Naã o. Eu naã o sei. — E voceê apertou a maã o de Stavros. Ele eí um amigo de infaê ncia. — Eu… o envergonhei. — Naã o eí essa a questaã o. Apenas naã o entendo. Como poê de naã o reconheceê -los? Ela naã o respondeu, cabeça curvada de vergonha. Mas ele naã o queria sua vergonha. Tampouco um pedido de desculpas. Ele queria respostas. — Voceê estaí tomando alguma coisa? Comprimidos? Excitantes? Calmantes? Remeí dios contra a dor? — Naã o. — Remeí dios para emagrecer, um inibidor de apetite? — Naã o. — Anda cheirando alguma coisa? Fumando alguma coisa? Ela ergueu a cabeça e lançou-lhe um olhar horrorizado. — Naã o! — Entaã o o queê ? — A voz dele vibrava de emoçaã o. — O que diabos estaí acontecendo aqui? — Estou cansada, Zale. Confusa. Eu naã o tenho dormido muito ultimamente. — Bobagem. Voceê sempre viajou. EÉ uma nobre itinerante, nunca fica muito tempo no mesmo lugar. — Mas estou sofrendo muita tensaã o. Noí s tivemos problemas. E o casamento seraí daqui a alguns dias. — Essa eu naã o engulo. Naã o de voceê . Voceê eí Emmeline d’Arcy. Voceê prospera no estresse. Entaã o me diga o que aconteceu laí dentro. Diga-me por que estaí agindo assim. — Eu estou dizendo, mas voceê naã o estaí me ouvindo. — Naã o. O que voceê estaí dizendo saã o mentiras. Posso ver isso em seu rosto. Voceê naã o me falou a verdade ainda. E eu quero a verdade. Ela estendeu a maã o treê mula para o copo de conhaque, tomou mais um gole e disse: — Talvez voceê deva se sentar. — Prefiro ficar de peí . Ela assentiu. — Isso naã o vai ser faí cil. — Por favor — resmungou Zale, impaciente. — Poupe-me do teatro. Ela ergueu o queixo e olhou para ele, a expressaã o neutra. Por um longo tempo ela naã o disse nada e, entaã o, deu de ombros. — Eu naã o sou Emmeline.

CAPÍTULO QUINZE

71


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

ZALE RANGEU OS dentes. Ela naã o era Emmeline? Aquilo era ridíículo. Ela estava sendo ridíícula. — Esta naã o eí uma boa hora para fazer drama — disse ele, esforçando-se para se controlar, tentando naã o pensar nos 350 convidados no salaã o de baile que esperavam pelo seu retorno. — Estamos dando uma festa. Uma enorme festa para levantamento de fundos. Ateí agora tem sido um sucesso. Vamos resolver logo isso para que possamos voltar… — Eu naã o sou Emmeline — repetiu ela, categoí rica, nenhuma emoçaã o na voz, expressaã o igualmente neutra. — Eu sou Hannah. Hannah Smith. Novamente ele sentiu vontade de rir, mas, entaã o, olhou para ela e finalmente entendeu que ela naã o estava brincando. Ela falava seí rio. Zale sentou-se abruptamente. — O que quer dizer com voceê naã o eí Emmeline? — Eu estava fingindo — murmurou, maã os fechadas sobre o colo. — Estava fazendo um favor para Emmeline. Eu soí seria ela durante algumas horas para que Emmeline pudesse ver alguns amigos, mas ela naã o voltou, entaã o peguei o aviaã o e vim para caí . Zale olhou para ela em estado de choque. Ela havia enlouquecido. E precisava de ajuda. — Vou chamar um meí dico — murmurou ele. — Noí s cuidaremos de voceê . — Eu naã o estou doente — interrompeu, a voz baixa, embora firme. — Apenas sou muito tola. Indesculpavelmente tola. E naã o espero que voceê me perdoe, mas eí hora de voceê saber a verdade. Hannah olhou para ele, olhos brilhantes, suas faces finalmente recuperando um pouco de cor. — Sou americana. Trabalho em Dallas como secretaí ria para um sheik aí rabe chamado Al-Makin Koury… — Conheço o sheik Al-Makin Koury. Ele patrocinou o torneio de polo de Palm Beach. — Eu organizei o evento. Foi quando conheci Sua Alteza, a princesa Emmeline d’Arcy. Fomos confundidas uma com a outra tantas vezes que ela me convocou para uma reuniaã o. A princesa precisava resolver um problema, e pediu a minha ajuda. — Para ocupar o lugar dela? Ela assentiu. — Sua Alteza disse que naã o seria capaz de sair sem um disfarce e, por isso, deixou o hotel como se fosse eu. — Aonde ela foi? — Naã o sei. Ela naã o me disse. Soí disse que precisava resolver algo e que estaria de volta em algumas horas. — Hannah espremeu as maã os. — Mas naã o voltou naquele dia. Nem no seguinte. Entaã o, aqui estou. Zale e Hannah naã o voltaram ao salaã o de baile. O Baile da Ametista e Gelo terminou sem eles. Em vez disso, Zale mandou que ela fosse escoltada de volta aos aposentos da rainha, o paletoí de seu smoking ainda ao redor dos ombros dela, e dirigiu-se aà torre de menagem, onde vagou durante meia hora. Ele naã o acreditava nela. Naã o era possíível. Emmeline naã o era Emmeline, mas uma secretaí ria americana chamada Hannah Smith? Impossíível. Naã o havia duas Emmelines do mundo, e Emmeline d’Arcy era uma beleza rara, taã o distinta que naã o poderia haver outra mulher que se parecesse com ela. Ou se movesse igual a ela. Ou sorrisse do mesmo jeito que ela. O que significava que Emmeline naã o estava bem, e que ele precisava afastaí -la de

72


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Raguva, das pressoã es do palaí cio e dos preparativos do casamento. Ela precisava de cuidados meí dicos e repouso, e ele se certificaria de que ela tivesse toda a ajuda de que necessitava. Ao voltar ao palaí cio, deu instruçoã es para que seu jato fosse preparado para partir na manhaã seguinte. Entaã o, chamou Krek e disse ao mordomo que ele precisava de uma mala cheia. — Naã o sei quanto tempo estarei fora: uma semana, talvez duas. Peça que a criada de Sua Alteza tambeí m prepare a mala dela. Krek pareceu confuso. — Quer que prepare outra mala, Majestade? — Naã o, Krek. Ela soí precisa de uma. — Mas Sua Alteza desceu as escadas com uma mala pequena jaí faz algum tempo. A empregada encontrou isto no chaã o da sala. Ela deve ter deixado cair. — O mordomo enfiou a maã o no bolso e retirou dali o telefone de Emmeline. Zale pegou o aparelho. O telefone infame. A fonte de tanta tensaã o. Silencioso, peito apertado, ele abriu o celular e consultou a caixa de entrada. Mensagem de Emmeline. Mensagem de Emmeline. Mensagem de Emmeline. Por um instante, Zale desejou arremessar o telefone no outro lado da sala. Em vez disso, sentou-se em uma cadeira para ler as mensagens. Estava disposto a ir ateí o iníício e ler todas elas, tanto as de entrada quanto as de saíída, uma vez que tinha tempo, porque Emmeline, ou Hannah, ou quem quer que ela dissesse que era, naã o iria a lugar algum. Os portoã es do palaí cio ficavam sempre trancados, e ningueí m entrava ou saíía sem o conhecimento e a permissaã o de Zale. COMO KREK acabara de informar, Hannah de fato fizera a mala e vestira roupas de viagem, mas naã o conseguiu sair do palaí cio. As portas estavam trancadas. De prontidaã o, os guardas se recusavam ateí mesmo a fazer contato visual com ela. Ela tentou persuadi-los a abrir os portoã es, mas as sentinelas continuaram a olhar para a frente, como se ela nem mesmo estivesse ali. Hannah desistiu de implorar e sentou-se em um degrau na entrada do palaí cio. Era uma noite clara e ela sentia frio, mas preferia congelar ateí a morte a voltar a entrar. E jaí estava começando a pensar que de fato congelaria ateí a morte quando ouviu a voz grave de Zale ecoando aà s suas costas: — Hannah Smith, voceê teraí de me dar algumas explicaçoã es. Ela sentiu um frio no estoê mago e se levantou lentamente, sabendo que aquela conversa com Zale seria terríível. Hannah estava certa. Ele a interrogou durante horas, repetindo as mesmas perguntas vaí rias vezes. Eram treê s e meia da manhaã , e Zale ficava mais nervoso a cada minuto. — O que voceê fez eí ilegal — disse ele quando ela finalmente se calou, cansada de tentar fazeê -lo entender. — Voceê transgrediu muitas leis. Naã o apenas fingiu ser a princesa Emmeline, como cometeu fraude e perjuí rio. Ela olhou para ele com os olhos secos, corpo treê mulo de fadiga. — Eu sinto muito. — Naã o basta. — Como posso te reparar? Eu quero fazer as pazes. — Voceê naã o pode — respondeu ele bruscamente. — E quanto mais penso nisso, mais certo estou de que deveria prendeê -la. Deixar voceê apodrecendo na cadeia alguns anos. — Zale… Mas ele estava implacaí vel. — Que tipo de pessoa eí voceê ? Que tipo de gente faz o que voceê fez? — Eu nunca deveria ter vindo para caí . Nunca concordei em vir.

73


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Mas veio. Hannah deu de ombros, impotente. — Eu achava que Emmeline aparecia a qualquer momento, noí s trocarííamos de lugar outra vez e estaria tudo resolvido. — Voceê cometeu um crime grave! Entrou no paíís sob falsos pretextos, usando identidade falsa, e interferiu nos negoí cios do Estado. Qualquer um desses crimes jaí lhe garantiria uma pena pesada, mas todos os treê s juntos? — Ele balançou a cabeça. — Como poê de fazer isso? — Naã o sei. — Hannah sentia-se peí ssima. — E naã o tenho uma boa desculpa. Fui estuí pida. Mais que estuí pida. Eu sabia estar em apuros quando cheguei aqui, mas como colocar um ponto final em tudo isso? Eu gostei de voceê imediatamente. Apaixonei-me por voceê . — Por favor, naã o faça isso. — EÉ verdade. Eu me apaixonei por voceê aà primeira vista. E sabia que voceê naã o era meu. Eu sabia que voceê pertencia a Emmeline. — Entaã o, decidiu ficar e brincar de princesa, achando que ningueí m jamais descobriria a verdade? Ela mordeu o laí bio inferior, incapaz de se defender. Porque, sim, era isso que ela ingenuamente pensava. Idiota, Hannah. Voceê eí uma idiota. O sileê ncio pairou entre eles, tenso, angustiante, e, em seguida, Zale se voltou, emitindo um som aí spero e gutural. — E pensar que eu quase me apaixonei por voceê ! Uma mentirosa. Uma impostora! Meu Deus, e eu cheguei a levaí -la para a minha cama! — Naã o pode me culpar por isso. Voceê tambeí m queria fazer amor comigo! — Sim, porque pensei que voceê fosse Emmeline. Naã o tinha ideia de que voceê era uma garota americana fingindo ser a minha noiva. — Naã o foi assim. Eu naã o pretendia traíí-lo. Nem aà verdadeira princesa. — Mas traiu, e veio ateí a minha cama. E gostou. — Ele foi ateí ela e voltou-lhe o rosto em sua direçaã o. — Voceê naã o gostou? A mandííbula de Hannah se contraiu e ela o encarou com raiva. Zale notou e gostou do que viu. Bem, deixe-a ficar com raiva. Deixe-a magoada. Deixe-a sentir um deí cimo de sua dor e vergonha. Ser enganado assim… Tratado como um tolo… Ele nunca a perdoaria. Nunca. — Entaã o, onde estaí Emmeline agora? — perguntou ele, afastando-se um passo. — Por que ela naã o estaí aqui? Hannah balançou a cabeça. — Naã o sei. Ela naã o disse. Zale deu-lhe as costas e atravessou a sala em direçaã o aà s janelas. — Preciso ligar para o pai dela e dizer o que aconteceu. Devemos avisar os convidados que o casamento foi cancelado. — Posso fazer alguma coisa? — Sim. Voceê pode ir embora — Zale falou sem se voltar, mantendo as costas para ela. — Quero que vaí embora logo cedo pela manhaã , e nunca mais quero voltar a veê -la. HANNAH SE foi antes do amanhecer. Desta vez, a guarda deixou-a sair. Ela atravessou os portoã es do palaí cio e, com passos instaí veis, ganhou as ruas de paralelepíípedos. O pior finalmente acontecera. Zale descobrira a verdade. Agora ele sabia quem ela era e sabia que Emmeline naã o viria. Agora, ela estava livre para voltar aà sua proí pria vida, retomar seu trabalho, rever seus amigos. Era isto o que ela queria. Esse era seu objetivo. E sim, ela estava triste, na verdade se

74


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter sentia peí ssima, mas acabaria ficando bem. Hannah sabia ser uma mulher de fibra. Resistente. E, talvez algum dia, se tivesse sorte, voltaria a se apaixonar. Ao chegar ao centro da cidade e ir ateí a estaçaã o ferroviaí ria para comprar uma passagem, Hannah descobriu que naã o tinha dinheiro suficiente para sair do paíís, jaí que deixara os seus cartoã es de creí dito em seu quarto de hotel em Palm Beach. Ela precisava que o pai transferisse dinheiro e que uma das secretaí rias do escritoí rio em Dallas lhe enviasse o seu passaporte. Hannah meteu a maã o no bolso do casaco para ligar para o pai quando viu que estava sem o telefone. Ela procurou nos outros bolsos antes de abrir a maleta, mas nada encontrou, o que significava que ela devia teê -lo deixado no palaí cio ou que o deixara cair enquanto caminhava ateí o centro da cidade. Ela sentiu o coraçaã o apertar ao se imaginar voltando ao palaí cio e sendo obrigada a encarar Zale. Hannah naã o conseguiria olhar para ele outra vez. Naã o conseguiria suportar sua expressaã o de raiva e desilusaã o. Na veí spera, ela se sentira como Cinderela no baile: uma linda princesa dançando com um belo rei, assim como nos contos de fadas. Hoje ela naã o era ningueí m. Fora expulsa do castelo. Exausta, Hannah fechou a mala e ficou em peí no meio da estaçaã o de trem, desejando ter uma fada madrinha com uma varinha maí gica que fizesse tudo ficar bem outra vez. Mas fadas madrinhas naã o existem, e as mulheres da vida real como Hannah Smith tinham de resolver seus problemas e seus erros por conta proí pria. Contudo, ela naã o passou despercebida. Um senhor idoso que trabalhava no balcaã o da estaçaã o deixou a cabina e se aproximou, falando uma mistura de ingleê s e raguviano: — Voceê precisa de ajuda? Ela assentiu. — Preciso encontrar um hotel, algo barato, por uma noite ou duas, ateí que meu pai possa me enviar algum dinheiro. Ele apontou para um preí dio do outro lado da rua. — Bom e limpo — disse ele, com um sorriso simpaí tico. — E naã o muito caro. Diga-lhes que Alfred a recomendou. Ela lançou-lhe um sorriso agradecido. — Obrigada. Ele balançou a cabeça e, observou-a atravessar a praça em direçaã o ao pequeno hotel do outro lado da rua de paralelepíípedos. A recepcionista parecia estar esperando Hannah aà porta da frente. Ela conduziu-a ateí a recepçaã o e, em seguida, ateí o quarto, explicando atraveí s de gestos e sorrisos como funcionava a televisaã o e o termostato. Quando Hannah disse que precisava fazer uma chamada a cobrar para os Estados Unidos, a mulher entregou o proí prio celular, que tirou do bolso do vestido. Mas a telefonista naã o conseguiu encontrar o pai de Hannah e ela desistiu na segunda tentativa. — Voceê pode tentar novamente mais tarde, quantas vezes precisar — assegurou-lhe a recepcionista. — Vou estar aqui o dia inteiro. Hannah tentou mais treê s vezes, mas todas as chamadas foram atendida pela secretaí ria eletroê nica de seu pai. Ao fim da tarde, Hannah finalmente se convenceu de que ficaria presa em Raguva mais um dia. Ou dois. DURANTE AS primeiras 24 horas apoí s a partida de Hannah, Zale desejou vingança. Imaginou ir atraí s dela e fazeê -la sofrer tanto quanto ele estava sofrendo. Ele ainda estava com raiva no segundo dia, mas agora, toda vez que imaginava o que

75


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter fazer, naã o conseguia deixar de pensar em fazer algo com o corpo dela. Algo… agradaí vel. Zale odiava a si mesmo por estar pensando nela. Ainda mais por desejaí -la. Por que pensava nela? Como poderia? Ele devia odiaí -la. Mas naã o odiava. Naã o podia. Ele a amava. Zale passou a maã o no cabelo, lembrando-se de que soí se apaixonara uma uí nica vez na vida. Fora seis anos antes, quando ainda morava em Madri. Ela era jovem, brilhante e vivaz, uma beleza espanhola de tirar o foê lego, mas, quando seus pais morreram, ele se aposentou do futebol, terminou seu caso de amor e voltou para Raguva sem olhar para traí s. Zale sabia como seguir em frente sem olhar para traí s. Sabia ser cruel, implacaí vel, ríígido. E ele se obrigaria a ser implacaí vel e duro agora. Ela fora embora. E naã o haveria perdaã o. Naã o haveria segundas chances. No terceiro dia, Zale acordou ainda mais irritado e frustrado do que quando fora se deitar na veí spera. Ele a encontraria. Ele a obrigaria a pagar por aquilo. Mas, primeiro, teria de encontraí -la. Zale passou a manhaã fazendo perguntas antes de apelar para Krek por volta do meiodia. Deveria ter perguntado ao mordomo primeiro, uma vez que ele jaí sabia onde ela estava. — Estaí no Hotel Divok, Majestade, sob o nome de Hannah Smith. Zale tentou esconder sua irritaçaã o. — Como voceê sabia onde ela estava? — Sua Alteza eí uma mulher distinta. A notíícia se espalhou raí pido. — Ningueí m me disse. — Todo o mundo sabia que estava descontente com ela, Majestade… — Seraí que todo o mundo tambeí m sabe por queê ? Krek deu de ombros. — Briga de casal, algo dessa natureza. — Eles estaã o cientes de que o casamento foi cancelado? — Sim, Majestade, mas estaã o todos esperando que mude de ideia e a perdoe de modo que o casamento possa ser realizado. — Naã o seraí . — O que preferir, Majestade. — Krek, sei que voceê nos ouviu discutir. Sei que voceê e metade do palaí cio devem saber a verdade. Ela naã o eí Emmeline d’Arcy. Ela eí uma impostora norte-americana. — Sim, Majestade. — O mordomo fez uma mesura. — Vai sair, Majestade? Zale olhou feio para ele. — Sim. — Muito bem, meu senhor. Zale ficou irritado por ter de ir ao obscuro Hotel Divok com escolta completa, mas naã o poderia ir sozinho. Ele era um rei. Havia o protocolo. E a segurança sempre fora um problema, mesmo em seu paíís. Zale esperou em seu carro blindado enquanto sua equipe de segurança verificava o hotel antes de ele entrar. Radiante, a recepcionista curvou-se e deu-lhe as boas-vindas antes de levar o rei e quatro de seus guarda-costas ateí o andar de cima, onde Hannah Smith tinha um quarto. — EÉ um dos nossos melhores aposentos — disse ela -, e todo dia eu me certifico de que ela receba flores frescas. Zale agradeceu aà recepcionista pela gentileza e bateu aà porta de Hannah. Ele esperou um momento, e, em seguida, voltou a bater. Enfim, ela abriu uma fresta e olhou para fora, seu longo cabelo despenteado, o rosto paí lido, olheiras profundas sob os olhos. O interior do quarto estava escuro, com as persianas ainda fechadas embora jaí fosse quase

76


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

meio-dia. Hannah piscou para ele, obviamente, atordoada, embora sonolenta. — O que faz aqui? — Naã o sei — respondeu ele apontando para o interior do aposento. — Posso? O corredor naã o eí o lugar mais adequado para conversarmos. Ela assentiu, puxou o cabelo para traí s das orelhas e abriu mais a porta. — Entre. ENQUANTO OS seguranças esperavam no corredor, Hannah acendeu as luzes, abriu as persianas e alisou as cobertas da cama desfeita. Zale olhou ao redor e viu o buqueê de violetas em um pequeno vaso de vidro ao lado da cama. — Por que ainda estaí aqui? Ela estremeceu. — Porque naã o tenho como ir embora. — Voceê devia ter me dito. — E o que voceê teria feito? Riria na minha cara? Ou me jogaria na prisaã o? Ele deu de ombros. — Eu estava com raiva. Ainda estou. Ela se sentou de pernas cruzadas ao peí da cama. — Meu pai me enviou um cartaã o de creí dito e meu passaporte pelo correio expresso. Deve chegar esta tarde. Em breve irei embora. — Naã o se eu a prender. — EÉ por isso que voceê trouxe tantos guardas do palaí cio? Acha que vou resistir? — Voceê naã o parece arrependida. — O que mais posso dizer que jaí naã o tenha dito? Eu jaí pedi desculpas diversas vezes, e fui sincera sempre que… — Entaã o, diga novamente. Ela sentiu um arrepio percorrer-lhe a coluna. Algo na voz dele insinuava perigo. Ou talvez tivesse sido a expressaã o de seus olhos. Mas, de repente, a sala se tornou sexualmente carregada. — Sinto muito. — Soí isso? Esse eí o seu mais sincero pedido de desculpas? — Jaí lhe pedi desculpas sinceras haí duas noites, e voceê naã o aceitou. — Entaã o? Quero ouvir de novo. E quero sentir sua sinceridade. Quero que prove sua sinceridade. — Como? Ele mediu-a da cabeça aos peí s. — Tenho certeza de que voceê pode pensar em algo. Um arrepio de raiva e antecipaçaã o percorreu os nervos de Hannah. — Voceê naã o pode me chutar para fora de seu palaí cio e, em seguida, esperar que eu o convide para minha cama. — Por que naã o? — Porque naã o quero dormir com voceê — respondeu ela com raiva. — Isso eí bom, porque posso assegurar que, caso se deite comigo, voceê naã o dormiraí . — Naã o vai acontecer. Voceê foi horríível. Malvado. Cruel. — Sim, sim, fui todos os itens citados. Entaã o, como voceê pretende me dar prazer? — Naã o farei isso! — Faraí , sim. — Ele se aproximou e parou diante da cama. Zale estava taã o perto que Hannah sentiu os cabelos da nuca se arrepiarem. Infelizmente naã o havia para onde correr. Naã o no terceiro andar de um hotel com quatro seguranças aà porta. — E por que eu? — ela murmurou, umedecendo os laí bios ressecados.

77


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Porque eu me lembro do que voceê me disse, na noite do baile. Voceê falou que se apaixonou por mim aà primeira vista. Ou seraí que inventou isso tambeí m, assim como tudo o mais? Ela olhou para os olhos de Zale e sentiu-lhe a tensaã o. — Naã o — ela sussurrou. — Eu me apaixonei por voceê desde o iníício. Sabia que era errado continuar fingindo ser Emmeline, mas adorei estar com voceê … perto de voceê … amei tudo sobre voceê . — Voceê gostava de estar comigo. Ela assentiu com a cabeça. — Mais do que jamais gostei de estar com algueí m. Zale estendeu a maã o e acariciou-lhe o cabelo espesso, enrolando os dedos nos longos fios dourados. -Assim como jamais gostei de estar com algueí m como gostei de estar com voceê . Sua voz rouca e o calor em seus olhos fizeram o pulso dela disparar e seu corpo se aquecer. Sua pele e seus nervos formigavam, e ela teve de se lembrar de respirar. — Entaã o o que fazemos agora? — perguntou ele. — Naã o estaí zangado comigo? A maã o de Zale se moveu para seu pescoço e, dali, ateí a base de sua garganta, sentindo o pulsar erraí tico de seu coraçaã o. — Estou, mas isso naã o parece mudar o que sinto por voceê . Ela estremeceu ao seu toque. Sua boca estava seca. — E o que voceê sente por mim? Com a emoçaã o ardendo em seus olhos, ele respondeu: — Amor. O coraçaã o dela quase parou. Ar preso nos pulmoã es, ela olhou para ele com admiraçaã o. — Voceê … me ama? Ele baixou a cabeça e roçou os laí bios nos dela. — Tolo como sou… sim, eu a amo. Ela fechou os olhos, coraçaã o acelerado. — Voceê naã o eí tolo, Zale, porque eu tambeí m o amo muito, muito mesmo. — Diga isso de novo. Ela abriu os olhos, e viu desejo e esperança nos olhos dele. — Eu o amo, Zale. Eu o amo mais do que jamais amei algueí m na vida.

CAPÍTULO DEZESSEIS

ZALE FICOU deitado na cama com Hannah em seus braços, persianas ainda abertas para que ambos pudessem assistir ao poê r do sol. Momentos antes, o ceí u fora tomado por tons espetaculares de vermelho e laranja, mas as cores acabaram desaparecendo, estendendo longas sombras sobre a praça. Os elegantes postes de luz da estaçaã o de trem foram acesos, projetando piscinas de luz amarela sobre a rua de paralelepíípedos. Eles estiveram na cama fazendo amor durante horas. Seu ato sexual fora quente, suave e agridoce. Desde pequeno, Zale sabia que teria de se casar com uma mulher de sangue azul, uma princesa de verdade. E desde os 15 anos, jaí sabia que tal princesa seria Emmeline. Mas tudo aquilo mudara em um piscar de olhos. 78


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Ele naã o se casaria com Emmeline. A mulher que amava definitivamente naã o era uma nobre. O dever exigia que ele se afastasse de Hannah. O bom senso sugeria o mesmo, mas, de algum modo, ela parecia essencial para sua vida, assim como Tinny. E ele jamais se afastaria de Tinny. Mas quem assumiria o trono caso ele decidisse se casar com Hannah? Quem seria bom o bastante para liderar aquele paíís? Ele tinha primos, eí verdade, mas nenhum deles vivia em Raguva, optando por morar em lugares distantes como Sydney, Paris, Londres, San Francisco e Buenos Aires. Lugares urbanos, sofisticados e emocionantes. Por outro lado, Zale tambeí m naã o morava em Raguva quando seus pais morreram: ele estava em Madri, mas voltou e aprendeu o que tinha de aprender para servir adequadamente ao seu paíís. Outros poderiam fazer o mesmo. Seu primo mais velho, Emmanuel, um homem compassivo, educado, era o primeiro da fila. Ele seria uma boa opçaã o, mas sua sauí de naã o era boa. Tanto que ele e a esposa ainda naã o tinham constituíído famíília devido ao coraçaã o fraco de Emmanuel, o que significava que a sucessaã o voltaria a ser um problema. O irmaã o mais novo de Emmanuel, Nicolas, era o proí ximo na linha de sucessaã o, e Nicolas era um homem carismaí tico, embora um perdulaí rio notoí rio. Apesar de receber um consideraí vel subsíídio, estava sempre endividado e pedindo empreí stimos de emergeê ncia aos membros da famíília. Naã o, Nicolas naã o era uma opçaã o. Ele arruinaria Raguva em um ou dois anos. Entaã o, quem seria o rei de Raguva depois que Zale abdicasse? Quem poderia proteger Raguva? Quem poderia fazer o melhor pelo paíís? Hannah pousou a maã o sobre o seu peito. — Pare — ela murmurou. — Naã o haí nada a fazer, nada a decidir. Noí s dois sabemos como isso vai acabar. Eu irei embora de manhaã . — Naã o. — Naã o quero ir, mas naã o posso lhe dar herdeiros, e voceê precisa de herdeiros. Naã o apenas um herdeiro e um substituto, mas uma ninhada inteira. — Eu naã o vou perder voceê . — Seraí melhor que eu vaí . Noí s dois sabemos que, quanto mais tempo eu ficar, pior seraí : — Perdi tanto em minha vida, Hannah. Como pode esperar que tambeí m abra maã o de voceê ? Ela ficou em sileê ncio por um longo tempo. — Naã o sei — disse ela, afinal. — Mas eí a uí nica opçaã o. Voceê naã o pode abandonar seu paíís, e voceê precisa estar aqui com Tinny. — Tinny pode ir aonde quer que noí s formos. — Mas o palaí cio eí a uí nica casa que Tinny conhece. Voceê naã o pode levaí -lo daqui. Tambeí m naã o pode se afastar de suas responsabilidades. Voceê eí o rei. Este eí seu paíís. Este eí seu destino. Ele a olhou com uma expressaã o feroz, seus olhos cor de aê mbar em chamas. — Voceê eí meu destino. Tenho certeza disso. Mais certeza do que jaí tive a respeito de qualquer coisa. Ela o beijou. — Eu o amo, Zale, mas voceê estaí errado. Naã o posso ser seu destino. Naã o quando Raguva precisa tanto de voceê . — Para voceê eí assim taã o faí cil ir embora? — Naã o, naã o eí faí cil. Mas se voceê abdicar do trono por minha causa, eu me sentirei muito culpada. — Tem de haver outra maneira.

79


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter Hannah pressionou o rosto contra o peito de Zale. Ele era um bom homem e um rei de verdade. — Mas naã o haí , querido, naã o eí mesmo? Entaã o estava decidido. Ela iria embora na manhaã seguinte. Zale a levaria ao aeroporto e a colocaria em seu aviaã o para Dallas. Decisaã o tomada, Zale ligou para o palaí cio para pedir que o chefe enviasse o jantar. Eles comeram no quarto de Hannah, beberam uma garrafa de vinho tinto e conversaram durante horas a respeito de tudo, menos sobre a partida de Hannah na manhaã seguinte. AÀ meia-noite, fizeram amor novamente e conversaram mais um pouco, e entaã o, de repente jaí era madrugada, e o sol nascia por traí s das montanhas, tingindo o ceí u de um amarelo paí lido. Hannah estava nos braços de Zale observando o ceí u clarear aos poucos. Ela sentia a maã o de Zale em seu cabelo, enfiando os dedos atraveí s dos longos fios. Ele naã o falava havia horas, mas ela podia sentir a emoçaã o que se agitava dentro dele. — Sei que naã o estou em posiçaã o de pedir favores — disse ela, rompendo o sileê ncio —, mas gostaria de pedir um de qualquer modo. Posso ver Tinny mais uma vez antes de ir embora? Zale naã o respondeu. — Apenas uma breve visita — acrescentou. — Naã o sei, Hannah. Tinny acha que voceê seraí a irmaã dele e naã o vai entender por que voceê naã o estaí mais laí . — Mas seraí que ele jaí naã o estaí confuso por eu naã o estar laí ? — Ela se voltou para ver melhor o rosto de Zale. — Posso dizer a Tinny que tenho de ir para o Texas visitar minha famíília. Tambeí m posso contar para ele sobre o Texas, suas fazendas e seus vaqueiros. — Buscou os olhos de Zale. — Por favor, Zale. Facilitaria as coisas para mim saber que naã o me afastei de Tinny como se ele naã o tivesse a menor importaê ncia. A expressaã o de Zale ficou tensa. — Muito bem. Vou ligar para a Sra. Sivka e avisar que tomaremos o chaí matinal com Tinny. — Obrigada. Treê s horas depois, eles estavam sentados na suííte de Tinny a uma pequena mesa. A Sra. Sivka serviu-lhes o chaí . Como prometido, Hannah entreteve o prííncipe Tinny com histoí rias, contando-lhe sobre o Texas e todos os animais de sua fazenda. Ele adorou saber que ela possuíía cavalos, vacas, galinhas e uma cabra. Hannah adorou o entusiasmo de Tinny. Mas o chaí terminou, e chegou a hora das despedidas. Tinny deu-lhe um grande abraço e um beijo. Hannah correspondeu. Entaã o, ela tomou as maã os rechonchudas da Sra. Sivka. Com olhos cheios de laí grimas, a Sra. Sivka apertou as maã os de Hannah com firmeza. — Sinto muito, Alteza. Hannah lutou para conter as proí prias laí grimas. — Ora, Sra. Sivka, voceê naã o deve me chamar assim. Sou simplesmente Hannah Smith. — Simplesmente, naã o — disse a Sra. Sivka. — Cuide-se. — Vou me cuidar — assegurou-lhe Hannah. ' — E seja feliz. O sorriso de Hannah vacilou. — Tentarei. Entaã o, Zale conduziu-a para fora da suííte e ambos desceram a escadaria ateí a limusine que os esperava laí fora. A viagem ateí o aeroporto real foi tranquila, e ele acompanhou-a ateí seu aviaã o particular. Zale mal conseguia olhar para Hannah quando ela se sentou na poltrona de couro de

80


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

seu jato. — Entaã o, devo deixaí -la ir assim? — perguntou ele, a voz aí spera. Ainda na limusine, ela decidira que naã o choraria quando se separassem, disse para si mesma que manteria a calma, e estava determinada a fazeê -lo. — Sim. -- E o que devo dizer agora? — perguntou ele, tenso. Hannah sentiu um aperto na garganta, e uma dor terríível em seu peito. Como amava aquele homem! Como sentiria saudade dele! — Voceê diz adeus. — Naã o. Ela naã o choraria. Naã o choraria. Naã o, naã o. Levantando-se, pegou o belo rosto de Zale entre as maã os, olhou-o nos olhos e beijou-o suavemente, com ternura. — Adeus, Zale. EÉ hora de voceê me deixar ir. ZALE SENTIA-SE no inferno. Um inferno diferente de qualquer outro que ele conhecera. Ele sofreu terrivelmente enquanto Stephen lutava contra a leucemia. Ficou furioso quando o irmaã o morreu. Lamentou a morte dos pais e chorou escondido pelo jovem Tinny, que perdera a maã e e naã o entendia por que ela naã o voltaria mais para casa. Mas nada se compara aà dor de agora, porque Hannah lhe dera algo que ningueí m mais fora capaz de dar: paz. Com Hannah, ele se sentia completo. Forte. IÉntegro. Ateí ela chegar a Raguva, Zale ainda naã o havia percebido quaã o vazio se sentia. Sim, ele cumprira o seu dever e assumira as suas responsabilidades, mas agia como um sonaê mbulo. Entaã o, ela chegou e trouxe-o de volta aà vida. E agora ela fora embora. Sua mulher. E levara seu coraçaã o. Durante duas semanas interminaí veis, Zale mal falava, movendo-se silenciosamente do quarto de dormir para o escritoí rio, e dali para a torre de menagem; e vice-versa. Ele comia pouco. Dormia menos ainda. E naã o permitia que Krek o servisse. Quando naã o estava trabalhando, corria. Corria no iníício da manhaã , no meio do dia, noite dentro. E, quando naã o podia mais correr, deitava-se em sua cama e rezava. Rezava como naã o o fazia havia anos, desde que Stephen adoecera. As oraçoã es de Zale naã o foram ouvidas naquela ocasiaã o, mas agora ele rezava de qualquer maneira. Ele a amava. Precisava dela. FAZIA QUASE um meê s desde que Hannah fora embora, e Zale estava em peí junto aà janela de seu estuí dio, olhando para o nada, quando ouviu uma batida aà porta. A Sra. Sivka entrou. — Perdoe-me por me intrometer, Majestade, mas insisti para que me deixassem veê -lo. Zale manteve-se de costas, para que ela naã o pudesse ver seu rosto. — Tinny naã o estaí bem? — O prííncipe estaí bem. Ele estaí com a Sra. Daum agora. Mas preciso falar com Vossa Majestade. — O queê ? Ela permaneceu em sileê ncio durante tanto tempo que Zale olhou-a por cima do ombro. — Sra. Sivka? — disse ele, impaciente. A ansiedade estava estampada nos olhos da mulher. — EÉ algo que eu nunca disse para ningueí m. Algo que jurei que nunca diria. Era um juramento de sangue. Uma dessas promessas que voceê naã o pode trair, por nenhum motivo, nunca. E eu naã o a traíí. Zale suspirou, irritado. Vivia em um inferno absoluto havia um meê s e a uí ltima coisa que queria agora era brincar de jogos de palavras. — E voceê sente necessidade de traíí-la agora? — disse ele com sarcasmo. — Sim. Zale voltou-se, braços cruzados sobre o peito.

81


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

— Por queê ? — Porque pode mudar tudo. — O que pode mudar tudo? — A verdade. — Sra. Sivka, por favor. Ela prosseguiu: — Havia dois bebeê s, Majestade. Duas meninas, naã o uma. A princesa Emmeline e a princesa Jacqueline. Zale piscou. Ele ouviu o que ela dissera, mas naã o registrara a informaçaã o completamente. — O queê ? — A princesa Emmeline tinha uma irmaã geê mea. — Isso eí um absurdo. Ficçaã o absoluta. O rei William teria me dito caso Emmeline tivesse uma irmaã geê mea. — Ele naã o sabia. Ningueí m sabia. — Ouça as proí prias palavras, Sra. Sivka! Naã o sou Tinny. Naã o estou interessado em jogos de faz de conta. — Mas eí a verdade. Eu estava laí . Estava em Marmonte, no abrigo de caça da famíília real de Brabante do Norte durante o parto da princesa Jacqueline. A babaí de Sua Alteza Real era a minha melhor amiga desde a infaê ncia, e ela me pediu para ficar laí durante o parto. Eu cuidaria do receí m-nascido nos primeiros dias enquanto ela atenderia a princesa Jacqueline. — A Sra. Sivka inspirou profundamente. — Claro que eu fui, e pensaí vamos que estaí vamos preparadas para o parto. Mas foi um parto difíícil. Ningueí m esperava por geê meos e, embora houvesse uma parteira na ocasiaã o, logo ficou evidente que algo estava muito errado. Sua Alteza precisava de uma cirurgia. Ela estava com hemorragia interna. Mas, como o meu senhor sabe, Marmonte eí longe, ao menos uma hora da cidade mais proí xima, ainda mais de um hospital moderno. Chamamos por socorro, mas naã o havia helicoí ptero disponíível, nenhuma equipe meí dica de emergeê ncia por perto. Sua Alteza sabia que estava morrendo. As laí grimas caííam de seu rosto, mas ela se esforçou para manter o controle. — Sua Alteza Real foi muito corajosa, e muito calma. E foi muito clara a respeito do que queria que fizeí ssemos. Uma das meninas seria entregue ao seu irmaã o, no palaí cio de Brabante. A outra, iria para o pai dos bebeê s nos EUA. Levei a pequena princesa Jacqueline para ele com a notíícia de que Sua Alteza Real morrera no parto, mas que queria que ele ficasse com a sua filha. — Ele sabia que Jacqueline estava graí vida? A Sra. Sivka assentiu. — Sua Alteza Real escrevera para ele informando-o sobre a gravidez. — Naã o posso acreditar nisso. A Sra. Sivka deu de ombros. — Mas eu naã o disse para ele que havia outra criança. Naã o podia, naã o apoí s o juramento que fiz. Zale parecia absolutamente insensíível. — Por que me dizer isso agora? — Porque isso muda tudo. — Naã o muda nada. — Entaã o meu senhor naã o estaí me ouvindo. — Sim, estou ouvindo. Contos de fadas, segredos e juramentos de sangue. — Naã o precisa ter medo, Majestade. — Medo?! — ele explodiu, furioso. — Voceê acha que estou com medo? — Sim. — Ela cruzou os braços sobre o peito. — E fazia exatamente a mesma coisa quando era menino. Voceê odiava se desapontar, odiava a dor, entaã o se machucava primeiro,

82


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

para que ningueí m pudesse fazer voceê sofrer mais. — Voceê jaí pode ir, Sra. Sivka. Mas ela naã o se moveu. — Majestade, oraçoã es podem ser atendidas, e haí bondade e justiça no mundo, naã o apenas dor. Porque, em seu coraçaã o, meu senhor jaí sabe o final da minha histoí ria. Zale rangeu os dentes, muí sculos tensos. — Essa princesa… Jacqueline… ela eí … — EÉ a sua princesa Hannah. Zale sentou-se abruptamente, as pernas bambas. Naã o pode ser. Naã o pode. Impossíível. — Voceê naã o devia mentir — disse ele, quase odiando a Sra. Sivka por torturaí -lo daquela forma. — Nunca menti para Vossa Majestade. E naã o começaria a fazeê -lo justo agora. — A Sra. Sivka foi ateí a porta e abriu-a, revelando uma Hannah de apareê ncia comum, vestindo jeans e blusa branca, os cabelos soltos e o belo rosto livre de qualquer maquiagem. Hannah olhou para ele, olhos azuis enormes em seu rosto paí lido. — Olaí , Majestade. Zale naã o conseguia respirar. Hannah. Ali. Ali. E sua. Princesa ou naã o. Naã o importava. Naã o fazia diferença. Ele abriria maã o de tudo pela chance de ter uma vida ao lado dela. A Sra. Sivka abriu um largo sorriso. — Majestade, permita que eu lhe apresente Sua Alteza Real, Hannah Jacqueline Smith. Zale naã o se lembrava de quem se moveu primeiro, mas de repente Hannah estava em seus braços no meio do estuí dios, abraçando-o pelo pescoço. — Nunca pensei que voltaria a veê -lo — disse ela, a voz treê mula. — E nunca eí um tempo muito longo. — Eu sei. Jaí estava ficando louco sem voceê aqui. — Ouvi dizer. — Como? — Eu ligava para o palaí cio todos os dias e conversava com a Sra. Sivka ou com Krek, perguntando por voceê . Fiquei arrasada ao saber que voceê estava taã o infeliz. Ele tomou o rosto dela entre as maã os. — Minha equipe falou de mim pelas minhas costas? — Sim. Mas desculpe-os. Eu os importunei ateí que me dissessem a verdade. Eu tinha de saber. — Seus olhos se encheram de laí grimas. — E fiquei absolutamente desolada quando soube que voceê estava correndo vinte, trinta quiloê metros por dia sem comer. Queria muito entrar em um aviaã o e vir veê -lo, mas tinha medo de nunca mais ir embora caso o fizesse. — Mas voceê estaí aqui agora. Ela piscou, e as laí grimas rolaram por seu rosto. — Porque naã o pretendo ir embora. A naã o ser que voceê me jogue na rua aà força. — Eu preciso de voceê aqui, Hannah. Naã o posso nem quero viver sem voceê . — Foi o que a Sra. Sivka me disse quando liguei para ela na terça-feira. Ela me falou que temia que voceê se tornasse autodestrutivo, e foi entaã o que ela me revelou quem eu era. — Hannah mordeu o laí bio inferior para que parasse de tremer. — O nome em minha certidaã o de nascimento eí Hannah Jacqueline Smith. Sempre me perguntei de onde meu pai tirara o nome Jacqueline. Ele nunca me disse, naã o ateí esta semana, depois que a Sra. Sivka me contou toda a verdade. Zale voltou-se para a Sra. Sivka.

83


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Naã o posso crer que voceê tenha esperado tanto tempo para me dizer a verdade! Voceê poderia ter resolvido isso haí semanas… — Eu fiz uma promessa, Majestade. — Ridíículo — murmurou ele, antes de apertar o rosto de Hannah entre as maã os e beijar-lhe a testa. Hannah sorriu. — Naã o seja taã o mau — ela murmurou. — Ao menos ela nos contou. — Eu deveria demiti-la. — Zale! — Hannah recuou e olhou-o com severidade. — Ela eí sua babaí ! — E acrescentou: — Meu pai confirma a histoí ria da Sra. Sivka. Ela me entregou para ele quando eu tinha apenas uma semana de vida. — Ele deve estar perplexo ao descobrir que tem outra filha. Hannah hesitou. — Ainda naã o contei esta parte. Pensei em fazeê -lo quando ele chegar a Raguva para nosso casamento. O canto da boca Zale curvou-se lentamente. — E quando seraí nosso casamento, Alteza? Hannah sorriu de volta. — A Sra. Sivka e eu estaí vamos pensando que pudesse ser daqui a uma semana. Zale olhou para a babaí , que sorria, radiante. — Voceê andou planejando meu casamento, Sra. Sivka? — Por que naã o? Eu costumava trocar suas fraldas… — Pode ir agora, Sra. Sivka — disse Zale, simulando severidade na voz. — Sim, Majestade — respondeu ela, encaminhando-se para a porta. Mas Zale chamou-a antes que ela saíísse: — Sra. Sivka? A babaí olhou-o com ternura. — Sim, Majestade? — Obrigado. Obrigado por tudo. — O prazer eí todo meu. Quando ela se foi, Zale aproximou-se de Hannah. — Que tipo de casamento voceê quer, Hannah? — Naã o me importo, desde que voceê e eu estejamos laí . — Ela puxou-o pelos quadris, e o zííper da calça de Zale roçou-lhe a parte interna das coxas. — Mas as pessoas vaã o comentar — acrescentou ela, deslizando a maã o sobre a virilha dele e sentindo-lhe a ereçaã o crescente. — Como voceê vai explicar que naã o sou a princesa Emmeline, mas Hannah? — Princesa Hannah — corrigiu ele, tentando naã o se distrair com o calor da dela maã o em seu membro dolorido. — A irmaã geê mea de Emmeline, uma princesa de Brabante. — Baixou a cabeça e beijou-a novamente. — Minha princesa de Brabante. Ela suspirou e sugeriu: — Hum, rei Patek, podemos fechar a porta? — Acho que eí uma excelente ideia. Ela o beijou, as pernas envolvendo-lhe os quadris. — Zale, eu o amo. — Naã o tanto quanto eu amo voceê . Ela deu um sorriso perverso. — Prove. — Naã o se preocupe, princesa. Provarei.

84


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter EPÍLOGO

AO

FIM

daquele longo dia, Zale foi ateí os aposentos de Tinny para dar boa noite ao

irmaã o. Mas, ao chegar aà sala de estar de Tinny, Zale viu que Hannah jaí estava laí , sentada no sofaí , lendo sua histoí ria de ninar favorita. Zale ficou aà porta um instante, ouvindo. Hannah, sua amada princesa, graí vida de seu primeiro filho. E o doce e inocente Tinny, que adorava Hannah de todo o coraçaã o. O que poderia ser melhor? O que mais poderia um homem desejar? Do que mais precisaria um rei? Por um instante, Zale sentiu o peito taã o apertado que naã o conseguia respirar. O acaso levara Stephen e seus pais, mas salvara Tinny e, depois, lhe dera Hannah. Se Hannah e Emmeline naã o tivessem se encontrado em Palm Beach… Se Emmeline naã o tivesse pedido para trocar de lugar com Hannah… Se Hannah naã o tivesse vindo para Raguva… Se a Sra. Sivka naã o tivesse revelado o segredo… Tantas coisas poderiam ter dado errado. Tantas coisas poderiam teê -lo mantido afastado Hannah… Mas naã o mantiveram. De repente, Hannah ergueu a cabeça e o viu. — Chegou a tempo de ouvir o uí ltimo capíítulo — disse ela, sorridente. — Bom. — Zale entrou na sala e se sentou no sofaí ao lado de Hannah e Tinny. — EÉ a minha parte favorita. — Porque voceê ama finais felizes? — perguntou ela, sorrindo. — Exato — respondeu ele, tomando-lhe a maã o e levando-a aos laí bios. — Voceê estaí cansada? O bebeê estaí chutando muito? Ela tocou a barriga. — Estava. Mas agora acho que deve estar ouvindo a histoí ria. E ele sabe que o pai estaí aqui. — Entaã o, posso ler o uí ltimo capíítulo? Voceê gostaria, Tinny? — Zale indagou. — Sim! — Tinny tirou o livro das maã os de Hannah e o entregou para o irmaã o. — Sim. Leia-o agora. Hannah sorriu quando o bebeê dentro dela chutou forte na altura de suas costelas. — Acho que teremos um futuro jogador de futebol — disse ela, correndo os dedos pela barriga. Os olhos de Zale brilharam. — Chuta forte, naã o eí mesmo? — Com certeza. — Ela descansou a cabeça sobre o ombro dele. — Agora, leia, por favor. Estou ansiosa para chegarmos aà parte em que o prííncipe se casa com a princesa e todos vivem felizes para sempre. — E foi o que aconteceu, naã o eí ? — Zale abriu a primeira paí gina do uí ltimo capíítulo. A voz de Hannah estava rouca ao dizer: — Sim, Majestade. Foram muito felizes.

FIM

85


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter

Próximo Lançamento

ILHA DE ENCANTOS SUSAN STEPHENS

Ningueí m disse que planejar um casamento em uma ilha remota seria faí cil, considerou Maxie. E tempo era essencial, havia insistido a noiva. Naã o era de se espantar, pensara ela quando vira a foto do noivo. Maxie sempre soube que encontraria muitas dificuldades em organizar um evento importante numa pequena ilha, mas naã o contava ser recebida por um homem que fazia seu coraçaã o acelerar. Ela adorava um desafio, mas sendo bolsista em uma escola cara, e com uma vida familiar que podia ser descrita como caoí tica, decidira cedo permanecer segura do outro lado da festa, enquanto outras pessoas aproveitavam a organizaçaã o dos casamentos que fazia. Seguro? Maxie respirou um pouco antes de se preparar para desembarcar. Nada era seguro ali… Especialmente o homem de olhos ríígidos que permanecia na costa. — Olhe onde anda — aconselhou ele enquanto ela começava seu caminho pela estreita prancha. — Pode deixar — disse ela, tensa, perguntando-se por que ele naã o tinha ido ajudaí -la, jaí que estava preocupado. Ah, pare de exagero. Maxie podia se virar. Estava bem. A comissaã o que receberia era o sonho de qualquer organizadora de casamentos, e ela naã o tinha nenhuma intençaã o de começar caindo no mar. Seria um grande casamento entre Ruiz Acosta, um fabuloso e rico jogador argentino de polo, e Holly Valiant, uma escritora que fizera seu nome escrevendo uma coluna de conselhos baseada em sua vida com Ruiz. Tendo domado o playboy, Holly estava prestes a se casar… e o mundo estava ansioso para ver o casamento. Um evento que Maxie organizaria. E com uma comissaã o que levaria seu negoí cio a outro níível, ela faria de tudo para que aquela viagem fosse um sucesso. O homem na praia tinha voltado sua atençaã o para o comandante. Maxie entendia apenas o baí sico de espanhol. — Ele estaí se oferecendo para nos ajudar? — perguntou ela. — Algo desse tipo — admitiu o velho comandante com timidez. Aposto que o senor Acosta seria mais charmoso, pensou ela. Maxie o encarou novamente e logo desviou o olhar. Havia algo nos olhos daquele homem que dizia que ele era o tipo que faria com que nenhuma mulher de bom senso se aproximasse. E Maxie era muito sensata, apesar de ser abominaí vel quando se tratava de relacionamento. Seu encontro ideal era uma conversa civilizada, em um restaurante civilizado e com um homem civilizado… Naã o uma conversa ao vento com um baí rbaro de brincos e tatuagens. Ela naã o podia negar que a beleza dele atiçara algo dentro de si, mas ele era objeto para suas fantasias, e nada mais. — Voceê eí da ageê ncia matrimonial? — perguntou ele com uma voz profunda e rouca. — Isso mesmo — confirmou ela, na metade do caminho da prancha. — Voceê podia me ajudar? Maxie parara na metade da prancha, desconfortavelmente ciente da turbulenta aí gua debaixo de seus peí s. Se ele tivesse pegado sua pasta, poderia se amparar nas cordas de segurança com as duas maã os. — Olhe para cima em vez de olhar para baixo… Muito obrigada. Quando ele direcionou sua irritaçaã o ao comandante, ela naã o aguentou.

86


Paixão 292

Indigna Para Um Rei Jane Porter — Se voceê tem algo a dizer, diga para mim — insistiu Maxie em espanhol. — Eu aluguei o barco e tomei a decisaã o de velejar ateí aqui. O olhar dele escureceu. — Voceê fala nossa lííngua? — Eu teria reconhecido o seu tom de voz mesmo se estivesse falando em ket… Um idioma que soí eí falado na Sibeí ria Central — murmurou ela para si mesma. Mas ele escutou. — Se voceê eí taã o esperta, devia ter tido mais bom senso ao pedir a um velho para trazeê la ateí a ilha com essa tempestade. Dirigindo as proí ximas palavras a Fernando, ele falou em um tom bem diferente: — Voceê parece estar com muito frio, Fernando. Ficaraí na casa de hoí spedes ateí o vento diminuir. Pedirei que Maria leve comida quente e roupas secas para voceê . — Si, senor Acosta, y muchas gracias. Senor Acosta? Maxie gemeu internamente.

87


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.