Maureen Child - Beije-me Agora (Momentos Intimos160)

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Beije-me Agora! Kiss Me, Cowboy!

Maureen Child

PERDENDO A VIRGINDADE... OU O CORAÇÃO?! Nora quer deixar de ser virgem! E resolve pôr em prática um plano para passar uma noite de paixão com Bill Hammond, o conquistador oficial da cidade. Mike Fallon não acredita no que vê: a recatada Nora Bailey está de porre na festa de casamento de sua amiga, e ainda o mais inacreditável: se atirando nos braços do playboy inveterado Bill Hammond. Mike acha um desperdício aquela bela mulher gastar seu tempo e sua reputação com um homem sem escrúpulos. Nora acha que já é hora de ir para a cama com alguém. Quem vai se candidatar?

Digitalização: Alice Akeru Revisão: Bruna Cardoso


Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child

Querida Leitora, Existem mulheres que sonham com o dia em que irão se casar de véu e grinalda e ter filhos, mulheres que sonham em encontrar uma pessoa especial, mulheres que nem sequer imaginam ter filhos!, Mulheres que sempre estão à procura do sucesso profissional, mulheres que gostam e são felizes cuidando da casa... Enfim, cada uma com sua mania, com seus sonhos e com suas "loucuras", mas com algo em comum: a busca pela felicidade! Fernanda Cardoso Editora Copyright © 2001 by Maureen Child Originalmente publicado em 2001 pela Silhouette Books, divisão da Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma. Esta edição é publicada através de contrato com a Harlequin Enterprises Limited, Toronto, Canadá. Silhouette, Silhouette Desire e colofão são marcas registradas da Harlequin Enterprises B.V. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Título original: Kiss Me, Cowboy! Tradução: Gracinda Vasconcelos Editor e Publisher: Janice Florido Editor: Fernanda Cardoso Chefe de Arte: Ana Suely S. Dobón e Mônica Maldonado Paginador: Dany EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Rua Paes Leme, 524 – 10º andar CEP: 05424-010 - São Paulo – Brasil Copyright para a língua portuguesa: 2001 EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Fotocomposição: Editora Nova Cultural Ltda. Impressão e acabamento: RR DONNELLEY AMÉRICA LATINA Tel.: (55 11) 4166-3500 Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child

CAPÍTULO I

Ser virgem não era algo tão aterrador. Por outro lado, Nora Bailey estava prestes a mudar aquela situação. Seria mesmo? A questão era: quem poderia ajudá-la a libertar-se de seu cinto de castidade? Contemplando o movimento em frente a sua panificação, Nora observou os cidadãos de Tesoro, Califórnia, desfrutando uma bonita manhã de primavera. Com olhar clínico, estudou apenas os homens que caminhavam ao longo da Main Street. O primeiro foi Dewy Fontaine, noventa anos, que entrava na farmácia, do outro lado da rua. Ele parou para cumprimentar Dixon Hill, pai de seis filhos e vivendo seu terceiro casamento. Nora estremeceu. Trevor Church deslizava em seu skate. Atraente, porém muito criança. Tinha apenas dezoito anos. Harrison DeLong, sessenta anos e pouco ágil, parou para acenar e mandar beijinhos para os bebês nos carrinhos. Tentava se eleger prefeito pela segunda vez... E como confiar em políticos? Mike Fallon caminhava rua abaixo em direção a sorveteria. Ao vê-lo, Nora suspirou. Nem pensar! Por um momento, seu olhar fixou-se no corpo másculo. Alto, usava calça jeans surrada e uma camisa vermelha. As botas desgastadas, os cabelos escuros desalinhados pelo vento. Nora sabia, sem mesmo ser capaz de vê-los, que os olhos verdes estavam semicerrados. Mike era uma criatura desconfiada. A única pessoa do sexo feminino em quem confiava era a filha de cinco anos de idade, Emily. Naquele instante, a menina correu ao encontro do pai e segurou a mão dele entre as suas. Mike fitou-a e lhe ofereceu um de seus raros e estonteantes sorrisos. Pena que ele não estava no páreo. Aos dezessete anos, na escola secundária, Nora tomara a decisão de permanecer virgem até se casar. Imaginou formar-se, para em seguida encontrar um rapaz maravilhoso, e teria muitos filhos. Sonhos antiquados, na atual conjuntura. Mas, na ocasião, lhe parecia à atitude mais sensata a tomar. Agora era diferente. Não contara ser a única virgem de vinte e oito anos de idade no país. Por outro lado, nascera e se criara em Tesoro, minúscula cidade costeira da Califórnia, onde as pessoas ainda se davam ao luxo de ter perspectivas simples. Onde os vizinhos todos se conheciam, as portas permaneciam destrancadas e os rapazes solteiros eram raros. Bem, ali estava ela, onze anos após terminar o segundo grau, tão pura quanto no dia em que nasceu. A história de se manter casta perdera todo o brilho. Nora insistira nessa idéia por anos, apesar do fato de suas duas irmãs mais jovens já estarem casadas Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child e com filhos. Convencera a si mesma repetidas vezes de que o homem certo ia aparecer. Todavia, para ser franca, começara a duvidar disso nos últimos tempos. Afinal, nunca fora o tipo de mulher desejável. Suas irmãs eram pequenas e atraentes. Nora era alta, muito franca e teimosa. Péssima no flerte, muito honesta para jogar e muito ocupada com seu trabalho para desperdiçar horas preciosas em bares e boates. Porém, o ímpeto de mudar toda aquela situação se apossara dela apenas na véspera. Becky Sloane ia se casar. A menina da qual cuidara como babá viera lhe encomendar um bolo de casamento. Becky, ou melhor, a mãe dela, não estava poupando despesas. Aos dezenove anos, a jovem já estava em seu segundo compromisso, enquanto Nora não chegara nem perto do primeiro. E foi quando um pensamento singular lhe ocorreu: para quem estava se guardando? Pelo visto, quando morresse seria enterrada intacta e em sua lápide poderia ser lido: "Devolvida, sem abrir". Isso era deprimente. Por essa razão, se achava tão determinada a mudar o rumo de sua vida. Evidente que discutira aquela decisão com sua melhor amiga, Molly, no dia anterior, na hora do almoço, mencionando o encontro com Becky Sloane. — Becky Sloane?! — repetiu Molly, na ocasião. — Lembro-me de quando ela ainda não sabia amarrar o cadarço dos sapatos. — Pois é. E quanto isso nos faz sentir velhas! — Deus, que humilhação! — Molly sorveu outro gole da bebida gelada. — Becky já vai se casar e você aqui sentada, tão pura como um bebê. — Ora... Obrigada. Sinto-me bem melhor agora. — Oh, querida, não quis ofendê-la! Os cabelos ruivos de Molly Jackson eram curtos e cacheados, o que combinava à perfeição com seus olhos verdes. Leal até a morte era divertida, impaciente e criativa o suficiente para estabelecer sua própria companhia de cartões comemorativos, que administrava em sua casa. Era casada com o xerife, um homem que a adorava, e mãe da menina de seis meses mais linda do mundo. — Quando será o casamento, Nora? — Na próxima semana. No sábado. — Já?! — Sim. E para ser franca, Becky não me pareceu muito bem. — Hum... Então talvez haja um motivo para toda essa pressa, não é? — Não sei. Mas se Becky estiver grávida, isso a coloca mais ainda a minha frente, não é mesmo? Molly sorriu e balançou a cabeça. — Trata-se de uma competição? — Não. Apenas fui babá dela, e agora a garota já vai ser mãe, enquanto eu... — Continua assando seus biscoitos maravilhosos. — Isso mesmo. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Bem, sabe o quanto gosto de dizer que a avisei — disse Molly. — Mas não vou insistir desta vez. Tudo o que sei é que não tem feito nada para mudar essa situação, Nora. Sabe muito bem que a maioria dos homens evita as virgens. Eles acham que são muito românticas e que com certeza lhes trarão problemas. — É verdade. Bem, para encontrar seu príncipe encantado, se é que isso existia, teria de perder a virgindade. Sem dúvida uma mulher mais experiente teria mais sorte. Nos fundos do bar, um velho jukebox entoava melodias dos anos sessenta. Ao longo de uma das paredes, via-se uma fileira de mesas com guarda-sóis. Nora e a amiga sentaram-se num canto afastado. Alguns fregueses habituais ocupavam os bancos do bar, enquanto casais sentavamse às mesas. Nora suspirou, fixando o olhar no casal mais enamorado do grupo, e olhou para Molly com uma expressão séria. — Bem, o que tenho a fazer é deixar de ser virgem. — Não venho lhe dizendo isso nos últimos cinco anos? — Você prometeu não falar mais "eu avisei". — Claro! — Molly ergueu uma das mãos, como se prestasse um juramento solene. — Jamais tornarei a dizer que demorou muito para chegar à conclusão de que os homens solteiros, livres e desimpedidos em Tesoro estão quase extintos. De qualquer forma, é melhor continuar procurando aqui. Quem sabe o tipo de pessoa que encontraria em uma cidade grande? Nora não conseguiu conter o riso. Se havia algo no mundo com que podia contar era com a sinceridade de Molly. Mesmo quando não gostava de ouvir certas coisas. — Sim, já me sinto melhor. — Vai se sentir, querida — prometeu à amiga, sorvendo o último gole de margarita. — Tão logo consiga se livrar desse pequeno obstáculo. — Pequeno? — Está bem, não tão pequeno. No entanto, vamos encontrar um parceiro para você. Espere e verá. Quero dizer, não que seja uma solteirona ou algo parecido. Não ainda. Nora se arrepiou. Uma terrível imagem perpassou-lhe a mente. Imaginou-se dali a quarenta anos, morando sozinha, a não ser pela companhia de uma dúzia de gatos rastejando por entre os móveis. Não. Esse não era o destino que queria para si. Desejava construir uma família... Ser amada. E já era hora de correr atrás de seus sonhos. — Sou capaz de conseguir isso, certo? — Óbvio! Porém, antes que Nora pudesse relaxar um pouco, Molly perguntou: — Qual o prazo que estabeleceremos? — Prazo? Molly assentiu. — Eu a conheço muito bem. Se tiver uma chance minúscula, vai desistir. Se não estabelecermos um prazo, voltará a se acomodar e esperar pelo príncipe encantado até o Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child fim de seus dias. — Acredita em príncipe encantado? — perguntou num tom tranqüilo. Nora sempre crera que todas as pessoas possuíam caras-metades. Todavia, com o passar dos anos essa teoria vinha se desvanecendo. — Sim, Nora, acredito. O sorriso suave no rosto de Molly despertou-lhe um sentimento, não de ciúme, pois jamais invejaria a felicidade que sua melhor amiga encontrara ao lado de Jeff, mas talvez certa vontade de ter a mesma sorte. — Como é esse seu príncipe? Molly sorriu mais largo. — Maravilhoso. Está cuidando do bebê no escritório. — Dizendo isso, consultou o relógio. — E é melhor me apressar para substituí-lo, para que Jeff possa voltar ao serviço. Mas antes de ir... Qual o prazo? — Como posso saber quanto tempo levarei? — O que acha de três meses? Nora refletiu sobre o assunto. Seria mesmo capaz de conseguir tal façanha? Colocar a si mesma como isca para algum sujeito que quisesse ajudá-la a libertar-se do que julgava ser o principal entrave à suprema alegria? E se não fosse? O que faria? Começaria a procurar gatos órfãos? Oh, não! — Combinado. Três meses. — Muito bem, garota! — Molly deu-lhe um soquinho carinhoso no braço. — Antes que se dê conta, estará vivendo feliz para sempre. Espere e verá. Um cronômetro disparou, interrompendo as lembranças de Nora sobre a conversa que tivera com Molly, na véspera. Caminhou apressada em direção à porta da cozinha e retirou do forno um tabuleiro de pães doces. Sorrindo, satisfeita, colocou-os sobre uma bandeja e, em seguida, com um movimento rápido, deslizou outro tabuleiro no forno. Enquanto o aroma de nozes e canela tomava conta do ambiente, Nora recostou-se na pia e deu uma olhada ao redor. Pequena mas eficiente, sua cozinha era equipada com os melhores aparelhos existentes no mercado. Conseguira uma boa reputação em Tesoro. Sua padaria estava ficando tão popular que já tinha fregueses até mesmo de Carmel e Monterey. O negócio prosperava. Nora possuía uma casa a apenas um quarteirão dali, e perto da residência dos pais e das duas irmãs, a quem tanto amava. No entanto, tudo o que faltava era construir sua própria família. E isso a incomodava sobremaneira. Sempre imaginou que haveria tempo suficiente. Durante a faculdade, concentrara-se tão só nos estudos. Após a formatura, matriculou-se em uma escola para chefes de cozinha e arte culinária. Em seguida, passou a se concentrar apenas em abrir seu próprio negócio. E, uma vez que a panificação foi inaugurada, dedicara todos os esforços para fazê-la prosperar. Havia pouco que se dera conta de que estava renunciando a uma vida pessoal. Os anos se passaram tão depressa que não notara que a maioria das suas amigas de infância estava casada e com filhos. Seu relógio biológico... Deus, como odiava aquele termo... Corria num ritmo acelerado, e seu tempo estava se esgotando. Não queria dar à luz seu primeiro bebê quando tivesse quarenta anos. Acontece com muitas mulheres, mas não era o que queria e esperava para si. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Embora adorasse ser a tia Nora de suas sobrinhas, isso não bastava. E, se pretendia mudar aquela situação, teria de tomar uma atitude de imediato. No entanto, havia uma luz no fim do túnel. Num raio de vinte quilômetros, todas as pessoas seriam convidadas para o casamento de Becky Sloane. Por certo seria capaz de encontrar pelo menos um ser humano do sexo oposto solteiro e disponível. — Por Deus, Nora, quando foi à última vez que esteve em uma manicura? Ela livrou-se da mão da irmã e examinou as unhas. — Tenho andado ocupada. Você sabe... Trabalhando. — Ninguém é tão ocupado assim — retrucou Jenny, agarrando-lhe a mão de novo e fazendo uma careta. — O que fez com seus cabelos? — Frannie encarou a irmã mais velha no espelho, os olhos refletindo um deslumbramento tímido. — Picotou-os novamente? Nora recuou e ergueu o braço livre para alisar as pontas ásperas de seu assim chamado "novo corte." — Fico ressentida com a palavra "picotar". — Como esteticista, eu me ressinto com o que fez a seus cabelos. — Frannie meneou a cabeça. Essas eram suas irmãs. Nora suspirou e olhou para as duas. Delicadas e loiras, ambas pareciam líderes de torcida. Jenny e Frannie, vinte e quatro e vinte e três anos, casaram-se com seus namorados de escola. Nora não as invejava. Mas, como a mais velha das três, não se importaria em ter um pouco da felicidade delas. Tão íntimas quanto gêmeas, Jenny e Frannie sempre foram muito unidas. Bonitas, populares e autoconfiantes, tiveram todos os homens de Tesoro a seus pés desde o jardim-de-infância. Nora jamais tivera problema algum com autoconfiança, mas sempre se sentira mais confortável participando de um jogo do que fazendo parte da torcida, agitando pompons. E enquanto suas irmãs jogavam charme para influenciar a opinião alheia, Nora era mais propensa a defender seu ponto de vista até que o oponente por fim desistisse. Assim, o que estava fazendo ali no minúsculo estabelecimento conectado à residência de Frannie, expondo-se àquela humilhação? Certo, disse a si mesma, talvez aquela não tivesse sido uma boa idéia, afinal. Pensara que o modo mais rápido e mais fácil de ficar em forma seria pedir ajuda às irmãs. Porém, valeria à pena passar por tamanha tortura? — Não posso acreditar que vai me deixar cuidar de seus cabelos, afinal. — Mas não faça nenhuma loucura — advertiu Nora. Frannie soltou uma gargalhada. — Não se apavore. Prometo não adotar um look muito louco. — Engraçadinha... — Acho que teremos de lhe colocar unhas postiças. — Jenny não escondia a repugnância. — As suas estão um verdadeiro lixo. Nora encarou a irmã, indignada. — Por que não corta logo minhas mãos fora? Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Isso não seria de todo ruim. Suas unhas estão rachadas e maltratadas. Uma verdadeira desgraça! Bem, ajuda era uma coisa. Mas ficar ali sentada ouvindo aquilo tudo era outra. Com um gesto súbito Nora se levantou da cadeira e disparou: — Chega! Vou embora agora mesmo! Frannie segurou-a pelo pulso e fitou seu reflexo no espelho. — Prometemos não atormentá-la mais, querida, mas não deixarei que saia daqui com essa cabeleira pavorosa. Minha reputação ficaria abalada. — Isso não é atormentar? — Foi à última vez. Juro. — Eu também. — Jenny levou os dedos em cruz aos lábios. — Não fique brava, está bem? Iremos deixá-la maravilhosa. Vai brilhar mais do que a noiva. Nora tornou a sentar-se. A tensão se dissipou, e Frannie deu uma risadinha. — Não será muito difícil. Pelo que ouvi dizer, os enjôos matinais podem fazer Becky vomitar durante todo o percurso até o altar. — A mãe dela insiste em dizer que é apenas uma gripe... — disse Jenny. — É uma virose com nove meses de duração. Aquele comentário de Frannie fez com que Jenny se aprofundasse no mexerico local e, enquanto as irmãs conversavam, Nora fechou os olhos, pedindo a Deus para se reconhecer quando elas terminassem de fazer a mágica que prometeram.

CAPÍTULO II

Mike Fallon afrouxou a gravata azul-escura que o estava quase estrangulando e disse a si mesmo que assistir ao casamento seria lucrativo para seus negócios. Em uma cidade do tamanho de Tesoro, era uma ótima oportunidade de contatar alguns de seus mais importantes clientes. Além disso, não podia viver isolado na fazenda. Tinha de pensar em Emily. Querendo ou não, ela iria crescer, e não gostaria que fosse conhecida como a filha do ermitão. Embora Deus fosse testemunha de que, se tivesse escolha, preferiria ficar no rancho a vir à cidade jogar conversa fora. Essa era uma das razões que levaram sua ex-mulher, Vicky, a se divorciar dele. "Pare com isso, Fallon. Não comece a pensar nela e no erro que foi seu casamento. Já não fora infeliz o bastante?" Tomando um gole de cerveja, apoiou um ombro contra uma parede ornada de flores e distraiu-se observando a multidão que circulava ao redor do grande salão do Country Club. Quase de pronto, seu olhar focalizou Nora Bailey. Agora, havia algo com que se distrair. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Seu exame seguiu dos cabelos bem tratados até as curvas escondidas sob um mínimo e provocante vestido preto. Quando a viu na igreja, teve de fitá-la outra vez para confirmar a primeira impressão. Aquela era uma Nora que jamais vira antes. Costumava vê-la atrás do balcão da panificação, distribuindo biscoitos grátis às crianças e passando as mãos por entre os cabelos, que mais pareciam ter passado pelo misturador elétrico. Naquela noite, entretanto, estava diferente. A mão de Mike apertou o copo de cerveja e, quando tomou outro gole da bebida, teve de forçar o líquido gelado além do nó que se formou na garganta. Nossa! Como estava bonita! Os cabelos de um loiro mel ficaram mais curtos, e uma massa de cachos soltos caía livre ao redor da face. Por alguma razão, os olhos azul-escuros pareciam mais enevoados, e as pernas revelavam-se perfeitas. Quem poderia adivinhar que sob o habitual uniforme de avental, calça jeans e camiseta ocultava-se uma figura tão surpreendente? Observou-a em meio à multidão, rindo, falando... Bebendo. Os passos dela se mostravam trôpegos, tendia a cambalear. Então, Nora caminhou em sua direção como um bêbado tentando ficar sóbrio. Fechando o cenho, Mike decidiu que o fato de Nora querer tomar um pileque não era de sua conta. — Desmoronando? — perguntou, quando ela se aproximou. Nora estacou pálida. Ergueu o queixo e tentou visualizá-lo melhor. Piscou várias vezes para clarear a visão. Mike Fallon parecia não ter apenas um rosto, mas sim dois, e deslumbrantes. E, por mais que tentasse mais obscuro ele ficava. Afinal, desistiu. Talvez não devesse terminar o último copo de margarita, pensou ela, enquanto uma onda de calor invadia-lhe o corpo. — Olá, Mike. — Suspirou fundo. — E... Não... Estou desmoronando. Balançando um pouco, talvez. — Estreitando os olhos, fitou-o de cima a baixo. — Estou surpresa em vê-lo aqui. — A cidade inteira está presente. — Sim. — Nora deu uma olhada nas pessoas que enchiam o salão. Da mesma maneira que suas irmãs haviam predito, a noiva aparentava estar nauseada. O noivo cuidava dela, enquanto a mãe contava a todos sobre a gripe da qual sua pobre filha fora acometida. Com exceção das deliciosas margaritas, a noite, até aquele momento, fora um fracasso. Nora não achara ninguém para livrá-la de sua virgindade. Embora a recepção ainda não tivesse terminado. Fez uma minuciosa inspeção pelas costas de Mike. Até mesmo um tanto mal definido, era muito bonito. O semblante austero e os olhos de um verde profundo eram fantásticos. Embora o preferisse de calça jeans, botas e jaqueta de couro, o terno lhe ficava muito bem. Inclinando-se em sua direção, Nora sorriu e pestanejou repetidas vezes. — Está com algum problema nos olhos? — Não. — Nora se endireitou. — Estou flertando. — Muito mal. — Ei! Obrigada! Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Nora, o que está acontecendo? Ela suspirou e levou as mãos aos cabelos, quando se lembrou de que Frannie os tinha borrifado com quase um frasco de fixador. Descendo a mão outra vez, murmurou: — Nada. Não está acontecendo nada. E, do jeito como as coisas iam, tinha certeza de que acabaria naquela casa cheia de gatos. — Se não se importa que eu diga — Mike usava um tom suave —, está agindo de forma um pouco... Estranha. — Estou agindo de forma estranha? — repetiu, colocando a palma no tórax dele e empurrando-o. Mike não se moveu. Nora deu uma gargalhada rápida. — Você vem a uma festa e se esconde em um canto e eu é que estou agindo estranho? — Balançando a cabeça, desculpou-se logo em seguida. — Pare... — sussurrou. Então, quando conseguiu distinguir as formas do salão, continuou: — Sabe Mike, pode-se ir a uma festa, mas se não estivermos na festa, sentimo-nos como se não estivéssemos na festa. Entende o que quero dizer? — Não faço a mínima idéia. Besteira tentar explicar-lhe, ela concluiu, deixando escapar outro suspiro. Enquanto perdia tempo ali falando com a estátua que era Mike Fallon, podia estar desperdiçando algumas oportunidades. — Não importa. Não estamos conseguindo mesmo nos comunic... — Fez uma pausa para desenrolar a língua. Os lábios dele se curvaram no que poderia ter sido um sorriso, mas desapareceu tão depressa que Nora não poderia garantir. Que belo homem... Céus, mesmo sem distinguilo muito bem, era bonito demais. — Isto é uma vergonha. — O que, Nora? Ela estendeu-lhe a mão. — Nada. Nada. Até logo, Mike. — E se afastou. Mike percorreu-lhe as curvas dos quadris à distância. Sim, que homem não a olharia? Afinal, Nora Bailey era uma bela mulher. Mas Mike arqueou uma sobrancelha, desejando saber o que Nora quisera dizer com "isto é uma vergonha". Durante as duas horas seguintes, observou-a rindo e falando com os amigos. Uma parte dele invejava a facilidade de Nora de lidar com as pessoas. Nunca fora muito sociável, e achava muito tarde para mudar esse traço de sua personalidade. Tomou um gole da segunda cerveja daquela noite e percebeu que a bebida ficara morna. Pousou o copo na mesa a sua frente e focalizou a loira alta vestida de preto. Estranho, mas não conseguia desviar a atenção de Nora um instante sequer. Ou mesmo deixar de pensar nela. Poderia ter saído da recepção uma hora atrás. Em outra ocasião teria feito isso. Contudo, por alguma razão, dessa vez, não estava com vontade de sair dali. Bill Hammond, o dom-juan de Tesoro, dirigiu-se a Nora. Quando ela virou a cabeça para fitá-lo, o olhar de Mike fixou-se na curva elegante de seu colo. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Nora, como você está linda! — Obrigada, Bill. De fato, tinha de admitir que o trabalho das irmãs fora magnífico. Embora precisasse lutar contra o desejo de puxar a bainha para baixo e o decote para cima. Jamais se expusera tanto, exceto em trajes de banho. Virando-se para agradecer, sorriu para Bill Hammond, esperando que ele não notasse seu desapontamento. Como conquistador oficial de Tesoro, Bill considerava interessante qualquer mulher solteira de dezoito a oitenta anos. Obter um elogio seu era tão especial quanto ver um floco de neve em uma nevasca. No entanto, Nora tinha consciência de que não estava em posição de escolher. Os cabelos castanho-escuros eram muito bem cortados. Os olhos, também castanho-escuros, deslizavam avaliadores sobre ela e perscrutavam ao redor, como se estivessem obtendo certeza de que não havia ninguém mais interessante por perto. Nora se aborreceu, mas disfarçou. Afinal, viera àquele casamento com o único propósito de encontrar um homem para ajudá-la a sair do celibato. E parecia que Bill era o único disponível... — Gostaria de dançar? — convidou-a, galanteador. Antes que pudesse raciocinar e dizer-lhe que sumisse, Nora se ouviu falando: — Claro! Quase tropeçou, mas disse a si mesma que eram os sapatos novos que lhe machucavam os pés. Quem decidira que as mulheres deveriam usar sapatos de salto alto?! Balançou um pouco para o lado, mas, como estava dançando, esperava que ninguém notasse. Não devia ter tomado o último copo de margarita. Porém, precisava de um pouco de falsa coragem para pôr seus planos em prática. Mas, como conseguira despertar o interesse de um homem, de fato, não saberia afirmar se estava satisfeita com aquilo. As mãos de Bill pareciam estar em todos os lugares. Em vez de se sentir excitada, Nora desejava fazê-lo parar. Contudo, engoliu o palavrão com que tinha vontade imprecar. Afinal de contas, esse era seu plano, certo? Não era hora para nervosismo. Deveria entrar no espírito da coisa. Bill a guiou ao redor da pista, e as pessoas que os cercavam se fundiam em uma profusão de cores e movimentos. Ainda assim, Nora conseguiu distinguir um par de olhos verdes que a observavam pelo salão. Mike. Ao vê-lo, Nora acreditou que seu coração fosse sair pela boca. Segundos depois, aquele sentimento se esvaiu, quando escutou Bill sussurrar: — Vamos tomar ar fresco. Ar fresco! Era tudo de que ela precisava. Ótima idéia! — Certo. O peso do braço de Bill Hammond caía-lhe sobre os ombros, à medida que ele a Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child conduzia em meio à multidão. Ao atravessarem as portas francesas, a brisa noturna soprou sobre eles, gostosa e perfumada. Nora livrou-se do braço de Bill e logo se sentiu mais leve e livre, quando cruzou o pátio em direção ao jardim. Inclinando a cabeça para trás, olhou o céu salpicado de estrelas. Um vento marinho suave soprava do oceano, agitando-lhe os cabelos, acariciando-lhe a pele e até mesmo clareando-lhe um pouco as idéias. De modo que, quando Bill se aproximou por trás, desejou estar em qualquer lugar, menos lá. — Já lhe disse que está sensacional, hoje? — Creio que sim. — Bem... — Bill acariciava seu braço nu. —... Por via das dúvidas, direi outra vez. Nossa, Nora, não fazia a menor idéia de que podia parecer tão bela! Céus, aquele era o elogio mais falso que já recebera! — Agradecida. — Está tão apetitosa quanto uma de suas tortas. Ela estremeceu. Será que aquele tipo de comentário ainda funcionava? — Agora quero provar se é tão saborosa quanto parece. E com expressão convidativa, Bill a virou e encarou com uma fome que ela jamais vira antes. Nora sentiu um frio no estômago, e, por um momento, acreditou que seria violentada. Então, Bill puxou-a para si com a sensibilidade de um homem faminto que tenta devorar o último pedaço de carne existente sobre a terra. Nora tentou afastá-lo espalmando contra o tórax rijo, mas foi inútil. Sua mente movia-se com uma velocidade que a pegou de surpresa, considerando o quanto estivera vacilante, momentos antes. Como chegou a se permitir ficar em tal situação? Criar quarenta gatos ainda lhe parecia mais sensato! Não teve tempo para detê-lo. Quando se deu conta, a boca de Bill já estava sobre a sua, e tudo em que pôde pensar foi que jamais notara como os lábios dele eram grossos e molhados. Não sentiu nada. Nenhuma excitação. Nenhuma antecipação. Nem mesmo medo ou ansiedade. Apenas uma moderada repugnância que teria de superar se quisesse perder o status de "intocada". — Deixe-a — alguém bem próximo ordenou. Os olhos de Nora procuraram no jardim mal iluminado para ver quem era o intruso. Um segundo depois, Bill foi arrancado de perto dela e, sem esforço, lançado para o lado. Cambaleou de leve, recuperou o fôlego e fez uma carranca para o homem que se encontrava parado ao lado de Nora. — Afaste-se dela, Bill. — Quem o chamou aqui, Mike? — Não preciso de um chamado. — Fitando o outro homem com desdém, acrescentou: — Não pode ver que Nora bebeu além da conta? — Oh, Mike... — Nora atirou-se em seus braços fortes. Ele se desvencilhou dela, sem se desviar de Bill, que não parecia satisfeito com aquela intromissão. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Isso é entre mim e Nora. — Em outra ocasião, eu concordaria Bill. Porém, esta noite, não. — Quem você pensa que é?! O pai dela? Nora tinha a impressão de estar assistindo a um filme antigo. O herói e o vilão se digladiando, com a heroína esperando ansiosa, esfregando as mãos. — Está bem, rapazes, por que vocês... — Cale-se, por favor. — Cale-se?! — Nora se enfureceu ao constatar que Mike não estava prestando atenção a ela. — Está me mandando calar a boca?! Por fim, ele lhe dirigiu um rápido olhar. — Vá se sentar está bem? — Fique sabendo que eu não preciso que você... — Nora, por favor, isto só vai levar alguns segundos. Os protestos dela não surtiram efeito. Mike avançou um passo para a esquerda e desferiu um soco na mandíbula do oponente. Bill fez um giro estranho e desabou sobre a grama sem emitir um som. Atordoada, Nora fitava seu pretenso amante, agora esparramado no meio dos arbustos. A música ainda tocava lá dentro. A multidão ainda celebrava. Ninguém mais, com exceção dela e dos dois homens envolvidos, sequer imaginava o que estava se passando ali. Menos mal. Metade do povo de Tesoro não havia testemunhado aquela cena ridícula. Agora estava tudo arruinado. Seu plano fora por água abaixo. Com um giro de calcanhares encarou aquele que, mesmo sem ter consciência disso, fora o responsável por mantê-la virgem por mais uma noite. Teria que ser cega para não ver o brilho de satisfação nos olhos de Mike. Como era... Viril! Levando uma mão ao peito largo de Mike, deu-lhe um empurrão e ficou muito contente ao vê-lo se desequilibrar um pouco para trás. — O que acha que está fazendo, Mike Fallon?! Muito confuso Mike apenas vacilou uns segundos, antes de dizer: — Acho que a salvei de um canalha. — Eu pedi para ser salva? — Não, mas... — Parecia estar assustada? Apavorada? — Não — teve de admitir, ajeitando o paletó. — Apenas um pouco enfastiada. — E isso requer salvamento? Ele se calou. Nora levou as mãos à cabeça e começou a caminhar. Os saltos dos sapatos bambeavam ameaçadores, sobre o piso de pedras irregulares. Mike observou-a cauteloso, mas teve de admitir que Nora ficava muito bem com as faces rosadas de raiva. E o motivo pelo qual ficara tão furiosa era-lhe um mistério total. Imaginara estar fazendo um favor. Nora costumava agir com sensatez. Era uma pessoa Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child bastante razoável. Naquela noite, entretanto, agia de modo esquisito. Quando Mike viu Bill guiá-la para fora do salão, percebeu que o homem não tinha boas intenções. E também sabia que Nora tomara uns drinques a mais e poderia precisar de auxílio para se livrar das garras daquele sujeito. Evidente que não contara com aquele ímpeto de... Algo que sentira quando viu Bill Hammond beijando Nora. E naquele momento também não queria explorar esse sentimento. Nesse instante, estava mais preocupado em ficar fora do alcance dela. — Deus! Trezentos dólares — Nora se lamentava. — Contando com a manicura e o corte de cabelo... Quero dizer, são minhas irmãs, mas afinal é o trabalho delas, certo? Elas têm direito de receber. E mais o vestido novo... E eu odeio fazer compras! Uma mulher que odeia fazer compras? — Do que está falando? — Mike se mantinha atento a ela, enquanto Nora andava de um lado para o outro atrás do corpo inerte de Bill. — Disto aqui! — Pôs-se a levantar e abaixar as mãos ao longo do corpo. — O vestido, os cabelos, a maquiagem, estes estúpidos sapatos caríssimos que estão me matando. Sem mencionar esta bolsa. Grande o suficiente para conter minhas chaves e a carteira de motorista! Como podem cobrar setenta e cinco dólares por algo assim?! — E por que eu deveria saber que... Ela tornou a interrompê-lo: — Entretanto, essa não é a questão. Não, a questão era que Mike fora até ali para salvá-la e Nora o estava fazendo sentir como um estraga-prazeres. Deveria ter seguido seu primeiro instinto. Afinal, aquilo não era problema seu. O que mesmo seu pai costumava dizer? Ah, sim: nenhuma boa ação passa em branco. Quase podia ouvi-lo rindo dele. Mike cruzou os braços musculosos, engolindo a ira que o queimava por dentro. — Por que não me diz qual é a questão? — Está bem... — Nora se aproximou, olhou-o fundo dentro dos olhos e cambaleou um pouco. Pestanejou apenas quando Mike moveu-se para segurá-la antes que caísse. — A questão é que eu tinha um plano maravilhoso, e você o arruinou. — Dando meiavolta, observou Bill ainda imóvel. — Bill era seu plano? — Fazia parte dele. — Virou-se de novo para Mike com uma carranca. As faces dela coraram, os olhos moviam-se, impacientes. A frustração e a raiva eram bem visíveis em seu belo rosto. — Está bem. Bill irá acordar em instantes. Irei embora daqui, e poderá retomar seu... Plano. Bill murmurou algo ininteligível, esfregou a mandíbula e devagar rastejou para fora dos arbustos. Uma vez de pé, lançou um olhar furioso para Mike, evitando encarar Nora, e seguiu em direção ao salão. Quando ficaram outra vez a sós no pátio, Nora ergueu as mãos e as deixou pender mais uma vez ao longo de si. — Viu? Tudo arruinado! Agora terei de procurar outra pessoa. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Por certo, não naquela noite, imaginou Mike, enquanto ela se afastava em direção ao caminho de pedras que levava para dentro. Antigos lampiões revestiam o passeio, iluminando parcamente o jardim. Nora prosseguiu a duras penas, de um lado para o outro. Mike pensou no salão de festas abarrotado. Com alguns passos, alcançou-a. Nora se movia com cautela e mancava. — Estas coisas estão me matando — reclamou, chutando primeiro o sapato do pé direito e em seguida o do pé esquerdo. Suspirou feliz, e recomeçou a andar, deixando os calçados para trás. Mike riu, pegou-os e a seguiu, desejando saber o que tinha acontecido para transformar aquela mulher sempre tão centrada em uma linda e irritante estranha. Estava muito disposto a descobrir.

CAPÍTULO III

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child O olhar preocupado de Mike recaía sobre Nora, enquanto ela se dirigia ao salão. Os passos trôpegos no passeio de pedras pareciam tremular através dos feixes de luz vindos dos lampiões espalhados pelo caminho. A brisa deliciosa vinha impregnada do perfume de flores, e os acordes das canções compunham um cenário suave. Nora continuava murmurando frases ininteligíveis. Mike a seguiu, comprimindo os calçados dela nos bolsos do paletó. Com certeza ela não lhe agradeceria, mas a coisa mais óbvia a fazer naquele momento era colocá-la no carro e levá-la para casa. Foi quando de súbito Nora estacou, virou-se e, antes que Mike pudesse reagir, bateu no tórax dele. Cambaleando, ergueu o queixo, encarou-o e pestanejou como se tentasse focalizá-lo. Mike reconheceu o que sentiu. Era como se a estivesse vendo pela primeira vez. Os olhos azuis sonhadores. A pele parecendo delicada porcelana sob a suavidade da luz. Um vento refrescante soprou do mar e agitou-lhe os cabelos. Por um breve momento, Mike quis puxá-la, beijá-la e... — Tudo culpa sua! Ele riu. A imagem romântica que construíra acabara de se desfazer. — Você bebe além da conta e a culpa é minha? — Não é isso. — Nora acenou com uma mão, fazendo uma careta. — Você não está prestando atenção. Era verdade. Não dera importância às palavras dela. Distraíra-se contemplando aquelas belas curvas. — Certo, mas agora estou ouvindo. Nora inspirou e em seguida expirou com força, arrepiando um cacho de cabelos que lhe caía sobre a testa. Mike jamais a vira daquele jeito, tão... Solta. No dia-a-dia, era cordial e eficiente, atrás do balcão da padaria. Mas naquela noite se tornara uma revelação em todos os sentidos. Uma grande frustração se apossou de Nora. Não que tivesse ficado excitada ao ser beijada por Bill Hammond. Para ser franca, o simples fato de se lembrar daquela boca molhada sobre a sua causava-lhe um embrulho no estômago. Mas, afinal de contas, fora o único homem disponível que encontrara. Passando a mão pela testa, ajeitou os cabelos e sentiu como se seu cérebro clareasse um pouco. — Onde é que eu estava com a cabeça? — Isso eu gostaria de saber, Nora. — Está bem... Bill foi um erro. — Concordo. A pergunta é: por que estava fazendo aquilo? Nora respirou fundo antes de responder: — Bem, eu não... Tinha muita escolha, entende? Mike fez que não. — O que será, em nome de Deus, que está tentando dizer? — E simples: você arruinou o plano. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Que plano? — Tudo culpa sua — repetiu. — Provocou toda essa confusão. Portanto, agora está em dívida comigo. — Eu a livrei de um canalha. — Isso é verdade. — Nora estreitou os olhos. — E vê se fica parado! — Não estou me movendo. — Ei, rapaz, isso não é nada bom. Está rindo de mim? Mike ergueu ambas as mãos num gesto de rendição e meneou a cabeça, disfarçando o riso. — De jeito nenhum. — Tem de prometer que vai me ajudar. — De que maneira? — Vou lhe dizer depois que prometer me ajudar. — Não faço promessas no escuro. — Mas está em dívida comigo. — Deixe de dizer bobagem. — Então, prometa. Mike olhou ao redor. A maioria dos convidados se encontrava no interior do salão, mas não sabia por quanto tempo ainda. Nora continuava cambaleante, e seus olhos azuis mostravam-se um pouco mais nebulosos devido aos vários copos de margarita que ingerira. Além do mais, parecia que estava disposta a permanecer ali discutindo aquele assunto até o amanhecer. Desse modo, Mike concluiu que o melhor era prometer, fosse lá o que fosse que ela estivesse querendo. Em seguida, poderia colocá-la no carro e levála embora. Talvez, quando ficasse sóbria, não se lembrasse de nada. — Está bem. estacionamento.

Prometo.

Segurando-a

por

um

braço,

conduziu-a

ao

Nora se desvencilhou dele. — Oh! — Piscou e em seguida sorriu. — Bem, assim está melhor. — Tocou-lhe o peito com um dedo. — Você é um príncipe entre as marés... Nenhum... Príncipe entre... Príncipes! — Sou eu. Príncipe Mike. Tomando-lhe a mão, tentou não pensar na inesperada onda de calor que o atingiu com aquele simples toque. Havia muito não experimentava nada parecido. Na realidade, poderia apostar que seu medidor de luxúria estava quebrado. Mas, ao que tudo indicava, não estava, não. Sim, era melhor levá-la para casa. Melhor para ambos. Nora se achava muito embriagada para que pudesse ter aquele tipo de pensamento em relação a ela. — Agora, irei levá-la antes que se meta em mais confusão. — Não me meti em nenhuma confusão, Mike. — Não era o que parecia. — Pensa que foi fácil para eu flertar com todo o mundo no salão? Que foi fácil fingir Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child estar interessada em como Adam Marshal conserta um motor? Ou olhar fascinada enquanto Dave Edwards descrevia suas manobras de Jet Sky pela quinta vez? — Respirou fundo. — E isso sem contar as inúmeras vezes que tive de ouvir o prefeito praticar seu discurso. — Parece terrível. — Você nem ao menos pode imaginar. — Mas por que precisou fazer tudo isso? — Porque estou com vinte e oito anos, e a criança que cuidei como babá se casou hoje. — E isso significa... —... Que, a menos que eu tome alguma atitude, permanecerei solteirona. — Você está louca? — Mike fitou-a, com dureza. Todas as curvas do corpo feminino estavam muito delineadas. Os olhos azuis flamejavam de encontro à luminosidade amarelo-pálida projetada pelos lampiões, e os cabelos cintilavam como ouro. — Louca? Quem sabe? Mas é muito pior do que isso, Mike. Sou a última de uma raça agonizante. Um dinossauro... Um... O que mais está extinto? — Do que está falando? — Eu sou virgem! — Virgem? Bem, agora enfim conseguira chamar sua atenção. Mike deu um passo instintivo para trás, como se tentasse manter uma distância segura entre os dois. — Fale um pouco mais alto. Não acredito que as pessoas no salão tenham conseguido escutar. — Ela riu, estudando a expressão dele. — Veja só esse pavor todo. Os homens, sem exceção, reagem a uma virgem como um vampiro à luz do sol. Dando meia-volta, Nora começou a caminhar para fora do estacionamento, resmungando a cada passo. — Os homens são todos iguais. Diga a palavra "virgem" e eles pulam fora como se fossem atingidos por uma bala no meio do coração. — Eu não pulei fora. — Ah! Mike a seguiu e, quando a alcançou, segurou-a pelo braço, virando-a para que o encarasse. Em seguida, passou a mão pelos cabelos e tentou se concentrar. Mas não era fácil. Jamais imaginou que existisse uma virgem de vinte e oito anos de idade. — Você me pegou de surpresa, Nora. — Lógico — ironizou e mostrou-lhe a língua. — É uma boa desculpa. — Inspirando o ar perfumado de jasmim, prosseguiu: — De qualquer maneira, a questão é que eu estava tentando achar alguém para me ajudar a sair dessa... Situação. — Bill? — Arregalou os olhos, surpreso. — Bill foi o sujeito que você escolheu?! Em vez de responder, Nora fez outra pergunta: Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Sou uma mulher bonita, não acha? Os olhos verdes contemplaram-na da cabeça aos pés. — Sem dúvida. — Sou até um pouco inteligente. — Eu pensava assim, até alguns minutos atrás. Ela esboçou um sorriso. — Então, creio que solucionar meu problema... Não seja nenhum sacrifício, certo? Mike não tinha certeza. Falando por experiência própria, jamais tivera um relacionamento com uma virgem. Para Nora, sexo deveria ter outro significado, envolvendo jantares em família, bebês e... Afastou aquelas imagens. De maneira alguma iria se envolver nisso. Nora era uma moça atraente, e suas curvas preenchiam um sexy vestido preto como jamais vira antes, mas não era o homem ideal para ela. Nem para nenhuma outra. — Nora... — Você disse que me ajudaria. Mike começava a entrar em pânico. — Eu prometi ajudar... Não... — Parou de falar e a estudou durante um longo minuto. Porém, Nora não o ouviu. Aproximou-se, fechou ambas as mãos nas lapelas do paletó dele e se pôs na ponta dos pés até encostar o nariz no dele. — Não quero ser uma velha solteirona. Não terminarei a vida criando gatos. Adoro gatos, posso até ter alguns, mas não há de ser só isso. Preciso de filhos... Uma família. Eu... Mesmo na penumbra, Mike notou que ela empalideceu. — Você está bem? — Oh, Céus! — Nora tapou a boca. — Estou longe de estar bem! Seu estômago revirou, e ela engoliu em seco, lutando para manter o controle. "Respire fundo", disse a si mesma, tentando colocar aquele pensamento em ação. Mas não parecia estar dando resultado. A cabeça flutuava, e as entranhas se contraíam como se fossem um barco minúsculo no meio a um mar tempestuoso. — Talvez seja melhor levá-la para casa, Nora. — Sim. Tem toda a razão. Com os dedos fortes e mornos de Mike segurando-a pelo cotovelo, concentrou-se no calor da pele dele para lutar contra os arrepios que a percorriam. Curvando a cabeça para trás, respirou fundo várias vezes e repetiu para si mesma que aquela náusea ia passar. A náusea ia passar... Ia passar... Com um gesto rápido Nora se afastou, apoiando-se nos arbustos, e pôs para fora tudo o que bebera. A mente girava com grande velocidade, lembrando-a de todas as humilhações por que passara naquela gloriosa noite. Flertara sem constrangimento... E mal. Permitira que Bill Hammond, entre todos os rapazes presentes, a beijasse. E, para encerrar com chave de ouro, vomitara na frente de Mike Fallon. Sim, isso era demais. Bem, já podia começar a procurar pelo primeiro gato. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Sua grande noite de sedução tinha se transformado em um pesadelo. Quando os espasmos pouco a pouco foram passando, Nora se deu conta de uma mão fresca e seca em sua testa e do som dos sussurros suaves e calmantes de Mike. Embora se sentisse envergonhada, estava feliz por tê-lo a seu lado. Pior do que vomitar na frente de alguém era vomitar sozinha. Erguendo-se, respirou bem fundo e notou que a neblina que envolvia seu cérebro se dissipara. Fora substituída por um som de batidas secas de tambor, mas pelo menos conseguia raciocinar e enxergar direito outra vez. Mike ofereceu-lhe um lenço. Ao aceitá-lo, ela sorriu. — Obrigada. Pensei que ninguém mais usasse isto. Ele deu de ombros. — Só um sujeito antiquado, como eu. E, ao que parecia cavalheiro o bastante para evitar mencionar mais aquele recente vexame. — Ainda quer aquela carona para casa? — Sem dúvida. Obrigada. Durante o curto trajeto, Mike permaneceu calado, estudando-a. Agora que Nora não se achava mais sob o efeito do álcool, podia apostar que estava começando a lamentar o fato de lhe confidenciar aquela história toda de ser virgem. E, lógico, ele ficaria feliz em esquecer tudo aquilo. Na realidade, depois que vira Nora sem a habitual calça jeans, não conseguia parar de imaginar como seria despi-la. "Droga!" Mike apertou o volante com força e aconselhou-se a manter a atenção na estrada, e parar de querer olhar para aqueles seios volumosos sob o decote. E, para se sentir mais seguro, tentaria esquecer a curva daqueles quadris e o brilho suave dos cabelos de Nora e... Entrando na rua em que ela morava, contemplou as casas bem-cuidadas e repletas de flores. Estacionou próximo à calçada, desligou o motor e voltou-se para encará-la. Até mesmo escondida pela penumbra Nora o excitava. — Obrigada mais uma vez, Mike. — Quer que eu providencie para que tragam seu automóvel ainda hoje? — Não. — Abriu a porta e foi saindo. — Posso andar até a padaria amanhã, e depois eu o apanho. Mike saiu do veículo e a seguiu, apenas um passo ou dois atrás dela. Nora deixara a lâmpada da varanda acesa, o que realçava com suavidade as cores do pequeno ambiente decorado com vasos de plantas variadas e uma cadeira de balanço repleta de almofadas. Mike teve curiosidade de saber como seria a casinha dela por dentro. Mas não se permitiria tal atitude. Nora poderia não querer pensar sobre o que dissera, enquanto estava sob o efeito das margaritas, mas ele se lembrava de tudo. Nora queria ser amada, ter uma família, filhos. E isso era o suficiente para convencê-lo a manter-se afastado. Ela abriu a porta da frente, acendeu o interruptor, e mais luz inundou o recinto, como Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child se lhe desse as boas-vindas. Aquilo poderia levá-lo a sérias dificuldades. — Vou fazer um café bem forte, Mike. Aceita uma xícara? "Diga que não!" Mike precisava sufocar seu desejo antes que fosse tarde demais. Mas por algum motivo desconhecido, não recusou. — Claro! — Ele entrou, e ela fechou a porta atrás dos dois. Nora caminhou em direção a um pequeno corredor. Mike foi junto, e quando ela acendeu a lâmpada, as paredes amarelas da cozinha ficaram visíveis. Uma mesa de pedestal branca rodeada por quadro cadeiras ficava em frente a uma janela. Plantas revestiam os batentes, e a bancada ostentava um sortimento dos mais modernos eletrodomésticos. Nora se movia com familiaridade. Mike a observava. Todos os movimentos eram precisos. Aquela era uma mulher acostumada a despender boa parte de seu tempo na cozinha. Parecia muito mais ambientada ali do que naquela festa. Pelo menos tinham algo em comum. Quando, por fim, Nora terminou de colocar o pó de café na cafeteira, virou-se para fitá-lo. — Irei trocar de roupa. Sente-se, estarei de volta em um minuto. Quando ela se afastou, Mike estudou a mesa e as cadeiras e contemplou a escuridão do exterior, através dos vidros da janela. Casinha confortável, pensou, aconselhando a si mesmo a partir. Mesmo porque Emily estava em casa com uma babá e o dia seguinte seria atarefado. Mas, por algum motivo, não tinha vontade de ir. — Sinto muito por tê-lo tirado da festa — Nora gritava lá do quarto. — Sem problemas. Não sou muito afeito a essas comemorações. — Está bem... Ele sorriu e sentou-se. Alguns minutos depois, Nora retornou à cozinha. Vestia short de brim e uma camiseta azul muito justa, revelando a curva dos seios sob o tecido. As pernas bem torneadas e bronzeadas estavam à mostra. Os pés, nus, adornados com um anel de prata em um dos dedos do pé esquerdo, e esmalte rosa - pálido nas unhas. Mike compreendeu que permaneceria ali mais tempo do que deveria. Ao ouvir o chiado da cafeteira, Nora pegou duas xícaras no armário. — Toma café puro, não é? Ele arqueou uma sobrancelha. — Como sabe? Nora sorriu, sentou-se diante dele e passou a mão pelos cabelos, que agora pareciam macios e indômitos. — Uma boa mulher de negócios lembra-se de como seus fregueses costumam tomar o café. — Dizendo isso, bebeu um gole e cerrou as pálpebras. — Vejamos. Você prefere os pães de canela, e Emily ama meus biscoitos de chocolate. E costumam ir todas as tardes de quarta-feira à padaria depois que a pega na escola. Mike não sabia se ficava impressionado ou irritado, por saber que se tornara uma Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child criatura de hábitos tão previsíveis que a dona da panificação poderia acertar seu relógio por ele. Quando é que isso ocorrera? Bem, mas se Nora estava dizendo... — Sem dúvida me viu em uma de minhas piores noites — disse ela, interrompendolhe as conjecturas. — Nora, por que não esquecemos tudo o que aconteceu e... — De jeito nenhum! — O quê? — Ouviu muito bem, Mike. — Ela se recostou no espaldar e sorriu de um modo que o deixou atordoado. — Prometeu me auxiliar, e estou contando com você para isso.

CAPÍTULO IV

Mike retesou o corpo na cadeira. Agora que tinha ciência do que Nora pretendia, seria mais cauteloso do que o habitual. Não havia a mínima chance de se envolver com uma virgem ávida por descobrir o sexo. E além desse detalhe... Bem, não estava interessado em nenhum relacionamento. — De que tipo de ajuda estamos falando, afinal? — perguntou, olhando-a nos olhos. Apesar de aqueles olhos azuis parecerem brilhantes e tentadores, ainda era mais seguro do que fitar o corpo esguio e cheio de curvas. Nora jogou a cabeça para trás e riu alto. — Calma! Relaxe, Mike. — Erguendo a xícara, tomou mais um gole de café. — Está parecendo um condenado à forca, vendado e implorando pelo último desejo. — Não... É impressão sua. — Já fora bem melhor em esconder suas emoções. — Está bem. — Nora meneou a cabeça. Mike se recusou a notar quantas nuances diferentes de loiro os cabelos dela possuíam. Além do mais, ela estava falando. De novo. — Não quero que você mesmo me ajude a resolver essa questão. — Ah, assim é melhor... — redargüiu certo de que fora insultado. Nora se levantou, caminhou até a biscoiteira e encheu um prato com os biscoitos que assara na véspera. Levando-os à mesa, colocou-os na frente dele. Em seguida, pegou um e sentou-se outra vez. Mike olhou para o prato. Cobertura de chocolate, manteiga de amendoim, açúcar e canela. Se estivesse procurando uma esposa... O que não era o caso... Mesmo assim ainda evitaria Nora. Casar-se com uma moça assim decerto o faria engordar uns dez quilos. — Todos na cidade sabem que não está interessado em mulheres. Mike lhe dirigiu um olhar curioso. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Como assim? Nora não conseguiu conter o riso. — Sinto muito. Não me interprete mal. Apenas quis dizer que não está interessado em compromissos. Desde que Vicky partiu você olha para todos como se tivesse um letreiro de "Mantenha Distância" tatuado no meio da testa. Respirando fundo, Mike tentou se controlar para não esmigalhar o biscoito que segurava. Não tinha a menor disposição para falar sobre sua ex-esposa. Não com qualquer um. E, pelo visto, Nora percebeu certa tensão no ar, pois ela corou. — Por favor, Mike, me perdoe! — Tudo bem. — Dá para perceber. Olhe, eu não pretendia mencionar o nome de... Ele estendeu os braços para relaxar e sentiu os músculos descontraírem. Uma expressão ambígua assomou-lhe ao rosto. — Já lhe disse que está tudo bem, Nora. Vicky é coisa do passado. Mike fora o primeiro a admitir que, desde que Vicky partira, não vinha se comportando como um ser social. Preferia o cotidiano na fazenda. Lá, apenas precisava lidar com os animais, a colheita e o preço das laranjas. E, claro, com Emily. Sentiu uma pontada de tristeza ao se lembrar da filha. Já estava com cinco anos de idade, e fora a única coisa boa que restara do seu casamento. Sabia muito bem que a ex-mulher se sentia entediada com o casamento, com a vida no rancho... Com ele. Só não conseguia compreender era como uma mãe abandonava o lar sem sequer olhar para trás. Mas, afinal, Vicky sempre tivera horror à maternidade. Tanto que quando partiu abdicou à custódia de Emily. Ora, fora melhor assim. Um dia, no entanto, teria de explicar à menina o porquê de sua mãe tê-la abandonado. Porém, até lá, os dois formavam uma equipe, e protegeria aquela criança com todo seu amor. E se isso significasse manter-se afastado de mulheres até que Emily completasse dezoito anos, não seria um preço tão alto a pagar. Não queria ninguém entrando e saindo da vida de Emily. Iria proporcionar a sua menina estabilidade e segurança. E se isso fizesse dele um ermitão, aceitaria resignado. Todavia, o fato de não estar procurando relacionamentos não significava que estivesse morto. — Hum, hum... Se for coisa do passado, por que a simples menção do nome dela o perturba tanto? — Nora o encarou por alguns instantes. Mike pôde sentir os minutos se escoando. Uma parte dele imaginava por que jamais reparara na quantidade de matizes de azul que havia naquelas íris. "Concentre-se, Fallon!" — Não gosto de relembrar o que passou. — Emily por si só já é uma grande lembrança. — É diferente. Emily é... Emily. Nora assentiu. — Ela é um amor de garota. Mike relaxou um pouco. — Concordo. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Alguns minutos se passaram, e eles permaneceram ali, olhando um para o outro. A escuridão noturna se refletia nos vidros da janela. A cozinha aquecida, confortável... A casa em silêncio... Existia uma atmosfera de... Intimidade no ar. — De qualquer maneira... — disse Nora, um pouco mais alto do que o necessário, forçando o termo "intimidade" para o fundo da consciência. —... Voltando ao assunto, a questão é que não está procurando uma esposa, então você está a salvo. Ele esboçou um meio sorriso. — Isso é tudo o que um homem deseja ouvir. — Pelo menos, pode ficar mais descansado sabendo que não está no páreo. — Mas todos os outros homens da cidade estão? — Não é bem assim. Não se trata apenas de perder minha virgindade, e sim de achar meu príncipe encantado. — Em Tesoro? Ela franziu o cenho. — Na realidade, Mike, as opções são um pouco limitadas, mas estou certa de que conseguirei. Conheço o pessoal daqui. Em outras cidades, não conheço ninguém. Depois, não sou do tipo que entra em um bar e aborda um estranho. — Suspirou. — Além do mais, minha mãe tem lido os classificados sentimentais e assegurou-me de que há muitos rapazes interessantes em Monterey, que fica aqui pertinho. — Classificados sentimentais? Você?! A surpresa dele a envaideceu. — Obrigada, mas mamãe está mais desesperada para arranjar um namorado para mim do que eu mesma. Tem loucura para ganhar mais netos. — Mas você tem irmãs. — É... Mas Frannie e Jenny já fizeram a parte delas. — Desgostosa, recostou-se melhor, cruzou os braços e apoiou um dos pés sobre outra cadeira próxima. — Confesso que essa coisa de virgindade fugiu de meu controle. Isso se tornou um fardo, em vez de uma virtude. — Poderia manter sua virgindade em segredo, Nora. — Já pensei nisso, mas não daria certo. Creio que os homens têm radar para detectar as inexperientes. — Tem razão. — Bem, já que está em dívida comigo por atrapalhar meu plano... — Grande plano... —... E, levando em conta o fato de estar fora do páreo, acho que seria justo que me arrumasse o homem ideal. — Agora virei casamenteiro? — Digamos, um caçador. — Receio que isso seja contra as normas de um representante do sexo masculino. Nora tornou a sorrir, e um forte calor se apossou dele. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Não contarei a ninguém se você não contar, Mike. — Confie em mim. Não sairei por aí espalhando a novidade. — Excelente! Então, cá entre nós, seremos capazes de encontrar alguém. Mike não tinha idéia de como se envolvera naquilo. Tudo o que fez foi dar a ela uma mão para sair de uma situação ruim. E agora estava metido em uma confusão que fazia a pequena cena de Nora com Bill Hammond parecer um piquenique. — Então, negócio fechado? — Nora estendeu-lhe a mão para selar o acordo. Mike ainda quis fazer uma última tentativa de se livrar daquilo tudo. Mas, quando fitou aqueles lindos olhos outra vez, percebeu que era uma causa perdida. Agarrou a mão dela, ignorou o modo como todos os nervos pareciam vibrar e murmurou: — Negócio fechado. Teve a impressão de que lamentaria sua atitude durante muito e muito tempo... — O que aconteceu com Bill? — Molly quis saber. Na tarde do dia seguinte à recepção de Becky, o movimento na panificação estava calmo. Nora atendera apenas a um ou dois clientes naquele começo de tarde. — Nada. Absolutamente nada. Fez-se um longo silêncio antes que sua melhor amiga dissesse: — Mas vocês saíram juntos e não voltaram mais. — Sim, bem... — Nora conferia uma lista de produtos de supermercado. — Houve um pequeno imprevisto. — Prossiga. — Mike surgiu não sei de onde e deu um soco em Bill. — Mike Fallon? — O próprio. — Oh! Agora está ficando interessante! — Não é o que está pensando. Embora a conversa com Mike em sua cozinha, na véspera, tivesse sido uma experiência agradável. Nos últimos anos, quase não se falaram, exceto pelas poucas palavras que trocavam no balcão. E talvez fosse o efeito das margaritas, mas ele parecera tão diferente... Mais acessível. Mais desejável... — Ah, vamos, deixe uma senhora casada aproveitar suas fantasias, está bem? Quer dizer que o belo Mike Fallon bancou o herói? E conseguiu salvá-la? — Creio que sim. Acho que Bill não vai querer vê-lo tão cedo. — Que bom! Afinal, não podemos dizer que Bill Hammond é o homem ideal, concorda? — Eu sei, mas... — Você merece coisa melhor, Nora. Molly estava certa. Não que Bill fosse assim tão repugnante. Contudo, pelo amor de Deus, será que queria mesmo entregar sua virgindade a um homem que nem notaria Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child esse detalhe? Engraçado como mudara de idéia em apenas uma noite. No dia anterior, dispuserase a fazer qualquer coisa para se livrar de sua castidade. Agora, porém, queria um pouco... Mais. O sino soou na porta da frente anunciando a chegada de um freguês. — Está chegando alguém, Molly. Tenho de desligar. — Certo, mas quero saber das últimas novidades. — Prometo. — E desligou. Erguendo-se, contornou o balcão e, antes do que esperava, deparou com seu freguês. — Olá! Eu não tinha visto você. Emily Fallon sorriu, e Nora se comoveu. — É porque ainda sou muito pequena. — Acho que sim, meu amor. Então, em que posso ajudá-la, Srta. Fallon? A garotinha deu uma risada e estendeu a mãozinha fechada. Quando a abriu, revelou uma nota amassada de um dólar. — Papai disse que posso comprar cem gramas de biscoitos com cobertura de chocolate. — É mesmo? Nora desviou o olhar em direção à entrada. Mike aguardava do lado de fora e, por um segundo, Nora sentiu seu coração bater mais rápido. O que era estranho. Conhecia Mike fazia anos, e até a véspera jamais pensara nele de outro modo que não o de ser o pai de Emily e um homem bem educado. De repente, entretanto, aquelas pernas longas e fortes pareciam fantásticas na calça jeans. As botas desgastadas até o tornozelo, muito sensuais. A camisa azul de manga comprida aberta o suficiente para revelar um tórax largo e musculoso. E os olhos verdes pareciam mais misteriosos do que quando os fitara pela última vez. Com um frio no estômago, respirou fundo em uma tentativa inútil de controlar seus hormônios furiosos. "Isso é ridículo", tentava se convencer. Mike não estava interessado nela. E em nenhuma outra mulher. Não seria aquele que a ajudaria a resolver seu problema. Portanto, não existia motivo para se abandonar àquelas fantasias maravilhosas. — Srta. Nora? Ela balançou a cabeça, mas não conseguiu afastar as imagens. Determinada, entretanto, olhou para a filha de Mike. "Muito bem, concentre-se em outra coisa. Como este doce rostinho, com sardas pontilhando um nariz minúsculo, emoldurado por um lindo par de trancas, um sorriso encantador e olhos verdes idênticos aos do pai... Pare com isso, Nora!" — Biscoitos com cobertura de chocolate, certo? — Voltou para trás do balcão. Como todas as outras crianças que conhecia, Emily gostava de algumas coisas, e de outras, não. Biscoitos com cobertura de chocolate constavam da lista dos aprovados. — Sim, senhorita. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Nora achou uma graça o tom educado da criança. Foi até o centro do estabelecimento e entregou à menina uma bolsinha de plástico branco. — Aqui está querida. — Obrigada. — Devemos perguntar ao papai se quer biscoitos também? — Ele não quer, não. Ouvi papai dizer para Rick que não vai mais comer doces. — Sério? — Nora o fitou de longe. Então, Mike dissera ao capataz que estava largando o açúcar. Estaria mesmo? Era provável que tivesse imaginado que, se não entrasse na padaria, conseguiria se manter a salvo das tentações e fora do alcance de suas garras. Será que Mike pretendia se livrar da promessa que lhe fizera assim tão fácil? — De qualquer maneira, vamos falar com seu pai e ver se conseguimos fazê-lo mudar de idéia. — Nora segurou a mãozinha de Emily, e juntas alcançaram a porta, saindo para a calçada. Mike se desencostou do poste no mesmo instante. O sol da tarde derramava seus últimos raios, banhando a rua e tudo ao redor com uma suave luz cor de âmbar. — Olá, Nora. — Como vai, Mike? Emily olhou de um para o outro e suas trancinhas balançavam. — A Srta. Nora disse que você deveria comer uns biscoitos, papai. — Então prometeu não comer mais doces, hein? Mike franziu o cenho. — Não é bem assim, Nora. Estou apenas evitando. — Doces em geral ou apenas os de minha panificação? — Nora, suponho que depois de curar aquele pileque... — Ele parou, olhou para a filha e reformulou a frase: — Quero dizer, após uma boa noite de sono, você perceberia que isso tudo é uma idéia maluca e esqueceria essa tolice. — Está muito enganado. — Acariciou a cabeça de Emily. — Sabe, estou pretendendo ir a sua fazenda esta noite, para dar andamento ao que planejamos. — Você não vai desistir, não é mesmo? — Mike cocou o queixo, pensativo. — De jeito nenhum. Mike soltou um longo e profundo suspiro. — Está bem. Hoje à noite. — Vai trazer biscoitos, Srta. Nora? Ela fitou a pequena, sorrindo. — Que tal se eu chegasse mais cedo e juntas fizéssemos biscoitos? — Não, não precisa... — Mike tentou argumentar. — Que bom! — gritou Emily arruinando o protesto do pai. — Ótimo! — Nora encarou Mike. — Sendo assim, eu os verei dentro de uma ou duas horas. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Mike a fitou durante um minuto, ponderando sobre tudo aquilo. — Bem, vocês venceram. — Não dá para esperar, Mike, tenho um prazo a cumprir. Ao ver Mike caminhando com a filha em direção ao carro, Nora sentiu o pulso acelerado. Mike tentava se convencer de que a presença de Nora em sua casa não era um bom negócio. Mas as batidas fortes de seu coração despertavam-lhe desejos e sensações que a repeliam e atraíam, ao mesmo tempo. Os hormônios estavam atacando seu cérebro. Gostaria muito de saber quem venceria aquela batalha.

CAPÍTULO V

— Podemos fazer biscoitos de chocolate? — Emily perguntou. — Claro que sim, querida — respondeu Nora, esfregando-lhe um pouco de farinha na ponta do nariz. — Isto é muito divertido! — a menina colocou as mãozinhas na tigela de massa. — Papai não me deixa cozinhar porque sou muito pequena. Nora refletiu sobre o que a garotinha acabara de dizer. Talvez fosse mais prudente ter falado com Mike primeiro. Por outro lado, ele não estava ali. E, desde que a criança não se aproximasse do fogão, não via problema algum. — Bem, só precisamos lhe contar sobre o ótimo trabalho que você fez, não é mesmo? Emily abriu os lábios num sorriso encantador, e Nora supôs que aquela recompensa era suficiente para superar qualquer desentendimento que pudesse vir a ter com o pai Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child dela. E por falar em Mike, onde se metera? Chegara à fazenda fazia duas horas, e nem sinal dele. Quando chegou, Donna Dixon, a mulher do capataz do rancho, tomava conta de Emily. Grávida de oito meses, Donna ficara satisfeita ao entregar a menina a seus cuidados e ir para casa descansar. Assim, Nora e Emily passaram o tempo jogando Banco Imobiliário, colorindo desenhos, e tomaram chá com as bonecas favoritas da pequena. Quando o chá terminou, a criança levou-a pela mão para conhecer o resto da residência. Para surpresa de Nora, com exceção do aposento de Emily, que era o quarto dos sonhos de toda menina, a casa da fazenda era decorada com bastante simplicidade. No dormitório de Emily, as paredes eram azuis, as cortinas, de renda, e havia uma estante repleta de clássicos infantis. Sem mencionar a quantidade de bonecas e bichinhos de pelúcia sobre várias prateleiras. Mas, nos demais cômodos, não se via requinte algum. Na enorme sala existia apenas um conjunto de sofás de couro e uma cadeira antiga em frente à lareira. Nas paredes, nada de quadros. As janelas eram desprovidas de cortinas. Naquele instante, o cérebro de Nora começou a girar com mil idéias para tornar aquele espaço mais aconchegante. Mas isso não era de sua conta, não é mesmo? Mike não a convidara para decorar a casa dele. Na verdade, não a convidara para coisa alguma. Praticamente, obrigou-o a recebê-la. — Será que os biscoitos já estão prontos, Nora? — Hum? Oh, os biscoitos! Vamos ver, está bem? Emily correu saltitante, em direção à porta do forno. — Não toque agora, está quente. A garota se afastou, com os olhos brilhando de expectativa. Sorridente, Nora apanhou uma luva de pano, abriu o forno e foi de imediato contemplada por uma onda de calor e o aroma maravilhoso de chocolate quente, que se espalhou pelo ambiente. — Pronto! — afirmou. Em alguns segundos, Nora dispôs os biscoitos sobre uma bandeja e colocou outra leva para assar. Emily tomou fôlego e em seguida olhou para Nora. — Podemos provar um? Qualquer adulto razoável sem dúvida diria que não... Que seria melhor esperar até depois do jantar para não estragar o apetite. Sua própria mãe era uma seguidora ferrenha dessa teoria. Mas não estava com coragem de dizer "não" àqueles olhinhos verdes que cintilavam com tamanha intensidade. — Sem dúvida que podemos! Nada melhor do que comer biscoitos de chocolate mornos. — Nora apanhou a bandeja e ofereceu um à menina. — Tome cuidado para não queimar a língua. — Certo. Céus! Que delícia! — Tenho certeza de que estão ótimos. — Nora sorriu ao ver o rostinho corado sujo de chocolate transbordando de orgulho. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Pobre criança... Sem mãe para compartilhar essas poucas aventuras e um pai que, embora a amasse muito, tinha de se dedicar ao trabalho no rancho. Donna lhe fazia companhia durante o dia, mas desde que engravidara não pudera mais dispensar-lhe tanta atenção. Nora sentiu um aperto no peito, tornou a sorrir e disse, com suavidade: — Você é uma excelente cozinheira, sabia? — Eu?! Sou mesmo? Posso falar para papai que cozinho bem, não posso? — Garanto que ele vai ficar impressionado — assegurou Nora, torcendo para que Mike se orgulhasse da filha. — Podemos fazer um pouco mais de massa? Achando graça, Nora se levantou e passou a mão pela testa de Emily. — Vamos terminar esta primeiro, está bem? — Como você quiser senhorita. Com todo o cuidado, da mesma maneira que Nora lhe ensinara, a garotinha colocou colherada após colherada de massa de biscoito sobre um tabuleiro. Nora mantinha um olho na criança e outro na janela da cozinha. O sol havia muito desaparecera por trás do horizonte. Através do jardim, via-se o reflexo da luz vinda da residência de Rick e Donna. De repente, viu-se comparando aquele ambiente ao de seu lar. Acostumara-se a contemplar a paisagem de sua janela e ver postes de luz elétrica e carros que passavam ao longo da estrada. Mas ali, além dos limites da cidade, a escuridão era total. Muito escuro, mesmo... Caminhando para o lado oposto, abriu a porta dos fundos e deixou a brisa noturna, tão fresca, entrar. Com exceção do som de Emily cantarolando e de sua própria respiração, o silêncio era extremo e profundo. Deveria achar tal quietude opressiva. No entanto, em vez disso achou... Relaxante. Existia um clima de paz naquele lugar que parecia quase mágico. Consultando o relógio, desejou saber onde estaria Mike e quanto tempo ainda levaria para aparecer ali. Mike se manteve ocupado até não ter mais nada para fazer. Seu capataz já o chamara para retornarem fazia mais de uma hora. Rick estava ansioso para chegar à casinha que compartilhava com a esposa grávida. Não tinha uma mulher com uma missão no mínimo bizarra a sua espera. As primeiras estrelas piscavam no Armamento, e a lua banhava as planícies com sua luminosidade prateada. Exausto, Mike tirou o chapéu, passou os dedos por entre os cabelos e disse a si mesmo que já estava na hora de voltar. Não era apenas Nora que o esperava. Emily deveria estar preocupada com aquela demora. Entrando na caminhonete, bateu a porta, acionou o motor e recostou a cabeça no banco. A razão ordenava que seguisse adiante, mas recusava-se a acatar aquela instrução. Protelou o retorno o máximo que pôde. Porém, se permanecesse ali ainda mais, ficaria com as pernas dormentes. Além disso, por que permitiria que Nora o mantivesse longe de sua própria casa? Engrenando a primeira marcha, ligou os faróis e pôs o caro em movimento. "Idiota! Trata-se apenas de Nora Bailey. Costuma vê-la pelo menos umas duas vezes por semana, há anos. Agora, de uma hora para outra, não pode mais ficar perto dela?" Apertando os dedos no volante, acelerou. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Cinco minutos mais tarde, desligou o motor e desceu do veículo. Convenceu-se mais uma vez de que não havia motivo para se preocupar em relação a Nora. Ela lhe assegurara que ele não constava da lista de pretendentes a livrá-la do cinto de castidade. E isso o deixava numa posição mais confortável. Pegou o chapéu no banco do passageiro, apertou as abas com força e estacou próximo à janela da cozinha. No interior, duas cabeças loiras se mantinham juntas e curvadas. Eram Nora e Emily, lado a lado, rindo, conversando e fazendo biscoitos. Naquele instante, a filha ergueu o rosto, olhou nos olhos de Nora, e Mike pôde notar o brilho de satisfação e o rubor no rostinho delicado. Havia apenas uma palavra para descrever a expressão na face de sua filhinha: veneração. Nora Bailey era sua nova heroína. Mas, antes que pudesse ponderar se isso era bom ou ruim, Emily o avistou e deu um grito de felicidade. Contornando a mesa, correu em direção à entrada. Em segundos, saltava nos braços do pai. E, do mesmo modo como aconteciam todas as noites, o coração de Mike se derreteu. Abraçou-a bem junto a si e não se esqueceu de agradecer a Deus por ter lhe dado aquela criança. Ela era tudo em sua vida. — Papai, fiz um monte de biscoitos! — É mesmo? A pequena assentiu e virou-se em direção à mesa. — Nora ajudou, mas fiz quase tudo sozinha. Antes que Mike pudesse falar, a voz de Nora se fez ouvir: — Emily disse que não permite que ela cozinhe, mas achei que apenas esta vez não teria nada de mais. Que você entenderia e... Mike ergueu a mão para interrompê-la. Soava como se ela o estivesse advertindo para não ficar furioso. Como se ele fosse repreender Emily por ter assado biscoitos. Será que Nora o achava um simplório ignorante? Além do mais, mesmo se quisesse repreender a filha, não teria coragem. A menina não cabia em si de tanta alegria. — Quer um, papai? — Claro que sim! Vá pegar e traga-o para mim. — Escolherei o maior e mais gostoso! Enquanto Emily estava ocupada, Nora se aproximou dele. — Obrigada por não brigar com ela. — Não sou um pai severo. — Não falei que era. Mas Emily comentou que você não quer que ela cozinhe e... Mike pendurou a jaqueta atrás da porta e enfiou ambas as mãos nos bolsos da calça jeans. — Isso é porque Donna não é muito prendada nas artes culinárias. Quase incendiou a cozinha uma vez, quando esqueceu uma panela no fogo. Não quero que minha filha corra riscos desnecessários. — Que horror! — Pois é. — Mas não se importa se eu e Emily fizermos uns biscoitos de vez em quando. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child "De vez em quando?", pensou desconfiado. Então aquilo não se tratava de uma visita única? — Quanto acha que isso vai demorar? — indagou, estreitando o olhar. — Bem, pelo menos até resolvemos meu problema. — Nora se virou para olhar Emily, que examinava cada biscoito. — Quanto tempo imagina que levará? Quanto tempo levaria para achar um homem merecedor de Nora Bailey? Estava começando a suspeitar que pudesse ser uma tarefa impossível. Emily trouxe os biscoitos e os ofereceu: — Prove isto, papai. Nora apanhou um também, deu uma mordida e passou a língua pelo lábio inferior. Um calor intenso o envolveu, fazendo-o sentir um arrepio que lhe percorreu a pele. — Não está com fome, papai? — Estou filhinha. Mas não de biscoitos. Nora lançou-lhe um sorriso rápido, virou-se e caminhou para o outro lado da cozinha. Mike observou as curvas da silhueta feminina e desejou saber se um jeans assim tão justo não deveria ser considerado ilegal. Tentando distrair os pensamentos, enfiou o biscoito de uma só vez na boca. Emily se deleitou. Todavia, continuava faminto... E não haveria biscoito de chocolate suficiente no país para saciar aquele desejo crescente que o consumia. Durante as duas semanas seguintes, Nora dividiu-se entre a fazenda e a panificação. Acordava antes de o dia amanhecer para fazer as fornadas e quase sempre deixava o trabalho no começo da tarde para ir ao rancho dos Fallon. E, a cada dia que passava, fechava o estabelecimento mais cedo. Se continuasse assim, logo estaria servindo o café da manhã e fechando em seguida. Tudo começara com a idéia de Mike ajudá-la a encontrar um homem. Mas percebeu que havia algo, além disso. Gostava de estar junto de Emily. Afeiçoara-se demais à menina. Emily tinha tanta necessidade do amor e atenção de uma mãe que absorvia qualquer afeto que Nora lhe desse, e o devolvia em dobro. Mike, entretanto, era uma história bem diferente. Nora apoiou os antebraços na cerca de arame, próxima aos estábulos. No amplo espaço circular fechado, o corpo viril se empertigou, segurando uma correia de couro longa em uma das mãos. Mike tentava controlar com palavras carinhosas uma bela égua que se empinava nas patas traseiras, lançando a cabeça e bufando sem parar. O ritmo da voz máscula pouco a pouco conseguiu acalmar o animal. Nora observou, hipnotizada, a musculatura do peito largo, quando Mike contornou o circuito. A camisa azul estava manchada de suor. A calça jeans, coberta de poeira. As botas, imundas, e a aba do chapéu, inclinada sobre os olhos, obscurecendo-os a ponto de não se poder vêlos. Mas, afinal, era melhor assim. Nora tinha perfeita ciência do poder daquele olhar. Afinal, não vinha sonhando com ele desde a noite da festa? A garganta ficou seca, e o estômago se contraiu em antecipação. Algo apertado, escuro e quente vibrava em cada célula de seu corpo. Era tortura, pura e simples. Mas expunha-se a isso de boa vontade todas as tardes. Tornara-se uma rotina. Algo que Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child aguardava com ansiedade. Observar Mike trabalhar com os animais era... Muito excitante. Desviou-se para o jardim próximo à casa da fazenda e depois para as verdes colinas avistadas a distância. Era tudo tão calmo... Nunca se imaginou gostando de um lugar como aquele. Estar distante da civilização era como recarregar as baterias. Sentia-se revigorada, com a alma fortalecida. A falta de pessoas e barulho de automóveis lhe dera a chance de pensar. E concluiu que toda aquela tranqüilidade era propícia a devaneios. A atenção voltou para Mike, seu devaneio favorito. — Muito bem, já chega por hoje. — Sua entonação grave a trouxe de volta à realidade. Controlando as emoções, Nora observou-o entregar a correia de couro a Rick e caminhar com passos decididos em sua direção. — Ela é uma beleza — comentou Nora. — Muito teimosa, também. — Mike arrancou as luvas de couro das mãos. — Vai levar uma eternidade para eu convencer essa égua a usar sela e rédeas. Mike dava a impressão de estar aborrecido, mas Nora não se deixava enganar. Notara o vislumbre de admiração no semblante dele, enquanto o animal era conduzido para o estábulo. Rindo, ela afirmou: — Você a adora. Mike fitou-a, surpreso. — Sim. É verdade. — Tirando o chapéu, passou os dedos por entre os cabelos e apoiou um cotovelo no topo da cerca. — Montar e treinar cavalos é a parte divertida do trabalho no rancho. — E a parte maçante? Seus olhares se encontraram. — Gosto de viver aqui e de tudo o que se relaciona com o campo. Nunca me ocorreu me mudar para a cidade. Nunca. Nora teve a nítida impressão de que havia uma mensagem implícita naquela última frase. Porém, sem ter uma pista do que poderia significar, concordou: — Não o censuro por isso. — O quê? Ela o encarou, e em seguida contemplou o cenário que se descortinava adiante. Ao longe, os pomares repletos de frutas formavam corredores, como soldados alinhados para inspeção. Em cima, o vasto céu, cujo azul era realçado por nuvens muito brancas, que pareciam marshmallow. — Falei que não o censuro, Mike. Aqui é muito bonito... Muito tranqüilo. — Sim. — Quero dizer, sei que Tesoro é uma cidade pequena, mas mesmo assim, às vezes, o barulho e as pessoas me incomodam. — Hum, hum... Reagindo à ironia dele, Nora voltou-se para fitá-lo. — Não acredita em mim. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Digamos que já ouvi isso uma vez. — É mesmo? De quem? — De Vicky. Nora sentiu um frio percorrer-lhe a espinha e percebeu que era mais prudente não pisar naquele terreno. Um brilho estranho nas pupilas dele deixava claro que Mike não pretendia falar sobre aquele tema. No entanto, aquele olhar continha algo mais. Alguns ecos de decepção. Alguma coisa que não soube decifrar, mas que lhe provocou mais um arrepio. — Do que Vicky não gostava? Mike inspirou lenta e profundamente e se virou para o horizonte. — Seria mais fácil descrever o que ela gostava. — Certo. Do que Vicky gostava? Mike tornou a encará-la. — De nada. Nem da tranqüilidade, nem da solidão, nem de Emily... E por fim, nem de mim. — Porque era uma idiota. Ele encolheu os ombros, mas Nora sabia muito bem o que havia por trás daquele gesto de pouco-caso. Uma mágoa antiga, que ainda o angustiava. — E eu, outro — retrucou. — Achei que o desejo fosse um bom começo para um casamento. Deixei meus hormônios me guiarem uma vez. Mas não farei isso de novo, entendeu? — Ninguém está lhe pedindo para fazer — ela o lembrou. Embora não fosse uma má idéia. — Você parece gostar disto aqui. — Sim. É deslumbrante. E a casa é tão grande! O lugar inteiro é imenso. Largo, aberto... Podemos ver onde os búfalos estão pastando... Ele deu uma risada rápida. — Búfalos, não. Apenas cavalos e... — É o bastante — interrompeu-o. — É um excelente local para se criar filhos. As feições dele endureceram. — Esse era o plano, Nora. Todavia, nem sempre as coisas saem como se espera. Mike falara tão baixo que ela mal pudera ouvir as últimas palavras que proferiu. Era muitíssimo angustiante para aquele homem falar da ex-esposa. Era como uma faca cravada em seu peito. Nora gostaria de encontrar Vicky e lhe dar um bom puxão de orelhas. Mas, já que não poderia fazer isso, resolveu mudar o rumo da conversa mais uma vez e notou o brilho de alívio nas feições dele. — Bem, faça um bom trabalho para me arranjar um marido e depois use a mesma tática para arrumar uma mulher para você. — Não vai ser difícil. — Ótimo! Estive pensando em... Que tal Tony Diaz? — Ficou louca? Ele é vinte anos mais velho que você! Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — É um camarada experiente. — Velho. — Então, com certeza me consideraria uma doce jovem. Isso é uma vantagem. — Tem vinte e oito anos, Nora. Não vai querer trabalhar no programa de assistência a idosos, vai? — Ei, o que importa é a idade mental, não a cronológica! — Tony vende sapatos em uma loja de departamentos. Nora se divertia com aquela situação. Estava tão interessada em Tony Diaz quanto em dançar nua na Main Street. — É um emprego estável, ora bolas. Pessoas com pés sempre precisarão de calçados. — E o fato de ele ter uma filha com sua idade? — Poderemos compartilhar as mesmas roupas. Mike a estudou durante um longo minuto, até notar o quê de divertido nos olhos dela. Cerrou os dentes, tentando conter o riso. — Está me fazendo de bobo... As sobrancelhas loiras se ergueram, e um canto da boca se ergueu. — Ainda não. Gostaria que estivesse?

CAPÍTULO VI

Mike estava certo de que seu coração falhara algumas batidas. Imagens povoaramlhe rápido o cérebro. Sentiu dificuldade até para respirar. Teve a impressão de que Nora percebera. Ela apertou o lábio inferior com força, e todos os nervos do corpo másculo Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child reagiram à sensualidade que emanou daquele gesto. Com a expressão carregada de austeridade e desconfiança, Mike se recusou a morder a isca. Em vez disso, perguntou, num tom um pouco mais ríspido do que pretendia: — O que está fazendo aqui? O débil sorriso de Nora desapareceu. — Está falando aqui existencial ou literalmente? — Literalmente. — Vim ao rancho por causa de nosso trato. "Droga de trato! Fora o mesmo que fazer acordo com o diabo!" Mike não teve mais um minuto de paz desde que aceitara se meter naquilo. — Sabe as coisas não estão indo muito bem. — Porque você coloca defeito em todos os candidatos que sugiro. Ela estava certa. Já tinha notado isso, mas esperava que Nora não tivesse. Não era que não quisesse ajudá-la a encontrar um homem... Ou talvez não quisesse mesmo. Não tinha mais certeza de nada. Tudo o que sabia era que, sempre que Nora sugeria um dos cidadãos locais, apontava uma razão para descartá-lo. Muito velho. Muito jovem. Muito gordo. Muito pobre. Bebe demais. Aquilo era ridículo. A maioria daqueles homens foram seus amigos durante anos. E jamais tivera problema algum com nenhum deles. Até chegar o momento de apresentálos a Nora. Por algum motivo, não gostava da idéia de vê-la com... "Vamos, seu tolo, admita: com qualquer um!" O que representava um entrave e tanto. Não ia se meter em encrenca de novo por causa de seus hormônios. Quando vira Vicky pela primeira vez, seu corpo entrou em estado de alerta, e tudo que conseguia pensar era em possuir aquela moça. E depois, a relação fracassara. De modo algum deixaria que tal estupidez se repetisse. Então, por que não procurava um bom rapaz para apresentar a Nora e a tirava de uma vez por todas da cabeça? De seus sonhos? Afastando-se da cerca, deu dois passos à frente, como se aquela distância entre ambos fizesse toda a diferença. Em seguida, voltou-se para fitá-la. — Você tem razão. — Tenho? — Sim. — Não imagina como uma mulher adora ouvir um homem dizer isso. Mas poderia esclarecer sobre o que exatamente estou certa? Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Sobre eu estar rejeitando todas as suas sugestões. — Ah! Então, concorda em me apresentar a Tony Diaz? Os olhos verdes contemplaram os dela, com firmeza. — Não. Ele é muito velho para você, já disse. Por Deus, Nora! Está procurando um companheiro, não um pai. — Está bem. Então o que sugere? — Ela deu de ombros, o que fez o decote arredondado da camiseta deslizar um pouco para o lado, revelando-lhe parte do colo. O olhar de Mike demorou-se na pele sedosa, e ele desejou saber se era tão macia quanto aparentava. Enterrando os dedos nas palmas das mãos, sufocou o súbito impulso de tocá-la. Vasculhou o cérebro em busca de alguma figura do sexo masculino que ainda não fora rejeitada. Quando estava quase desistindo, um nome lhe ocorreu: — Seth — disse, aliviado. — Seth Thomas. Nora franziu a testa, pensativa. — O deputado? — Por que não? — Mike tentou convencer a si mesmo de que era uma boa sugestão. — Seth é novo na cidade. Não deve conhecer muitas pessoas ainda. Nora o observou por minutos. Perdido no magnetismo daquelas íris azuis era difícil colocar o raciocínio em ordem. Entretanto, Mike se lembrou de que Nora não era para ele. Lembrou-se de que as duas últimas semanas não significaram nada. Ela apenas queria que a ajudasse a encontrar outra pessoa. O fato de ter se acostumado à presença dela em sua casa não tinha significado algum. O fato de ter se tornado a melhor amiga de Emily... Bem, isso o preocupava. Cedo ou tarde, Nora deixaria de vir, e então sua filha iria sentir sua falta. Mas, para o bem da filha e de sua sanidade mental, quanto mais cedo isso acontecesse, melhor. — Sabe que você está certo? — Nora afirmou, após alguns instantes de silêncio. — Thomas é novo por aqui. Não pode haver ninguém melhor para eu jogar meu charme. Ela se afastou da cerca com uma expressão indecifrável. Tudo o que Mike pôde ver foram os olhos muito azuis. Olhos que de repente pareciam enormes, inocentes e... Desapontados? — Nora... — Mike tentou falar, mas foi interrompido, o que agradeceu aos céus, pois não sabia o que estava prestes a falar. — Nora! — gritou Emily ao mesmo tempo em que o pai. O som da voz infantil vinha do interior da casa, e um segundo depois a menina surgiu próximo ao cercado. — O que foi querida? — Terminei meu desenho. Venha ver. Fiz para você. — Mal posso esperar para vê-lo. — Nora ergueu a criança no colo. Com um gesto carinhoso, alisou-lhe os esvoaçantes cabelinhos loiros. Então, sem olhar para trás, fez uma ligeira saudação. — Até mais tarde, Mike. Nossa como esta menina é pesada! Ele deu um passo atrás delas e se deteve. Ficou olhando as duas seguindo avante, e por alguns segundos sentiu-se sobrando. Nos últimos quinze dias, Nora e Emily haviam se tornado companheiras inseparáveis. E tudo o que tinha a fazer era se manter longe daquele elo de afeto que as envolvia. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Antes que pudesse esquecer suas árduas lições, virou-se e seguiu sozinho para o frio e escuro celeiro. A padaria estava movimentada. Os dois empregados de meio período circulavam pelo salão, anotando os pedidos. Lá fora, a luz do sol iluminava a Main Street como um refletor. Nas calçadas, alguns pedestres caminhavam apressados, e outros paravam para conversar com amigos queridos. Mas para Nora não havia tempo para conversas. E ela agradecia por isso. Mantendo-se ocupada, não pensaria na noite anterior. "Estúpida!", censurou-se, fatiando outro rocambole de limão. Por puro instinto, fazia cortes rápidos e bem-feitos, enquanto sua mente era tomada pelas lembranças. "Está me fazendo de bobo?" "Não ainda. Gostaria que estivesse?" — Deus, como fui idiota! Onde estava com a cabeça quando tentou flertar com Mike? Jamais poderia sequer sonhar em nutrir qualquer tipo de sentimento em relação a Mike Fallon. Aquele homem era apenas um meio que encontrara para atingir seus objetivos. Deixando a faca de lado por um segundo, recordou a reação dele. Se fosse cega, ainda assim perceberia o "Vá embora" estampado em seus olhos. E o que ela fizera? Continuou lá! Resmungando baixinho, terminou de fatiar o rocambole, pousou a faca e procurou uma espátula. Continuando a criticar-se, colocou os rocamboles em uma travessa forrada com papel-manteiga. — Terry! — Nora chamou. — Aqui estão os rocamboles. — Ótimo! Os fregueses estão ficando impacientes. — Oh! — Molly exclamou, entrando na cozinha. — Então, é melhor eu pegar uma fatia antes que esse bando de famintos as devore todas. — Olá, meu anjo! Onde está o bebê? — Lá fora, com Donna Dixon. Ela queria ver a menina, e eu queria ver você. — Molly moveu-se em direção ao outro canto, encostando-se na pia. — Jeff me falou que tem um encontro esta noite com o novo deputado, Nora... Ela polvilhou as mãos com farinha e mergulhou-as na massa que repousava em uma tigela. Trabalhar a massa sempre lhe acalmava os nervos, e naquele dia precisava relaxar mais do que o habitual. Seth Thomas. O sujeito que Mike jogara para cima dela como um osso lançado a um cão de guarda, a fim de distrair o animal o suficiente para poder escapar. Muito romântico... — Nossa! As notícias se espalham depressa. — Poderia ter sabido bem antes. — Molly mordeu um pedaço do rocambole. — Pensei que minha melhor amiga fosse me contar quando tivesse um encontro amoroso. Mas não... Tive que ser informada por meu marido. — Jeff é um linguarudo. — Sim, eu sei. Essa é uma das razões por que o amo. Não consegue manter um Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child segredo, assim, fico sabendo de tudo. — Dizendo isso, contornou o ambiente, pegou a garrafa térmica e serviu-se de café. — Exceto, é claro, o porquê de essa melhor amiga não ter me contado. Nora estremeceu. Era verdade. Deixara muitas coisas de lado nas duas últimas semanas. Seu negócio, os amigos, a família. Tudo para ficar ao lado de um cabeça-dura que, era evidente, não estava interessado nela. — Eu pretendia ligar, mas tenho andado muito ocupada e... — Sei. E essa ocupação toda tem a ver com o rancho de Mike Fallon. — Ah, já sabe disso também... Na realidade, era impossível manter algum segredo em Tesoro. Todos sabiam da vida uns dos outros, e se deleitavam espalhando os acontecimentos. E, considerando o tempo que passara na fazenda de Mike, era de espantar que sua mãe ainda não tivesse mandado imprimir convites de casamento. — Diga-me, o que está acontecendo por lá? Você não tem... Nada com Mike Fallon? — Não. — O tom da voz dela soou insípido e muito desgostoso para ser interpretado como uma mentira. — Ainda estou na lista das virgens com mais de vinte anos de idade. —- Isso é frustrante. — Está desapontada? Molly sorriu. — Ora, sou uma mulher casada há alguns anos. Tenho de viver minhas fantasias secretas através de alguém. — Não vai encontrar muito estímulo comigo, meu bem. — O que está acontecendo, Nora? Existe algo que está escondendo de mim? Nora suspirou. Virou, torceu e puxou a massa, cravando os dedos com força. Não queria admitir, nem mesmo para Molly, que estava interessada em um homem que era um beco sem saída. Não queria admitir nem para si mesma, a bem da verdade. — Sim. Antes que pudesse seguir avante e revelar logo tudo, um murmúrio agudo veio do salão. Sacudindo a cabeça, Nora sorriu. — Acho que é Tracy. — É melhor eu ir ver Donna Dixon. Preciso pegar o bebê e levá-lo para casa de minha sogra esta manhã. — Molly caminhou em direção à saída, porém, antes de ir, olhou Nora por sobre o ombro. — Mas ainda quero saber o que está acontecendo com você. E também sobre o encontro de hoje à noite. Ligue-me, está bem? Nora assentiu. — Pode deixar, vou lhe contar tudo. Tão logo consiga compreender o que está acontecendo comigo. Mike perambulou pela casa escura, tentando não pensar sobre o que Nora estaria fazendo e com quem. Emily adormecera, e a residência mergulhou na quietude. O silêncio era tanto que o estava deixando louco. Não havia nenhuma distração que o impedisse de se lembrar sem cessar da mulher errada. Àquela hora, ela deveria estar com o deputado. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Parou em frente às largas janelas da sala. Fitou a escuridão. Além de seu reflexo no vidro, avistou as imagens que sua imaginação insistia em criar. Sem o mínimo esforço visualizou Nora naquele mini-vestido preto que usara no casamento de Becky Sloane. Aquele que se colava a cada curva sensual como uma segunda pele, capaz de fazer um homem cometer qualquer loucura para despi-lo. Pôde ver com clareza o deputado sentado à mesa de jantar sorrindo... Acariciando-lhe a mão com um toque prolongado... Viu como Nora sorria para alguém que não era ele, e a dor que o invadiu chegou quase a ser física. Virgem... Nora era um cordeiro sendo lançado aos lobos. E se o deputado se comportasse como Bill Hammond, naquela festa? O que aconteceria se Nora dissesse "não" e o sujeito não a escutasse? Se precisasse de sua ajuda e ele não estivesse lá para ajudá-la? — Tenho de dar um jeito nisso. — E caminhou em direção à mesa de telefone ao lado do sofá. Discou e esperou a conexão da chamada. Nesse momento, notou um pequeno vaso de rosas e correu o dedo ao longo de uma frágil pétala. Flores. Nas duas semanas últimas, notara algumas mudanças na casa da fazenda. Nora trouxera flores frescas e as espalhou em vasos, jarros e até em copos de vidro. Comprara almofadas de cetim para o velho sofá de couro da sala. Pendurara cortinas de renda e vários quadros nas paredes. Enfeitara os cabelos de Emily com fitas coloridas e sempre fazia o jantar para os três. O toque dela estava em todos os lugares. O ambiente encontrava-se impregnado de sua presença, até mesmo quando não estava ali. A mão forte apertou o fone, quando alguém atendeu do outro lado da linha e disse: — Alô? — Rick, sou eu, Mike. Você pode tomar conta de Emily durante algumas horas? Preciso ir à cidade. Seth Thomas era um rapaz agradável e culto. Sendo assim por que não lhe despertava emoções? Nora desejou saber. Por que o sangue não lhe corria mais rápido nas veias? Por que não sentia o coração bater acelerado? Sentada do outro lado da mesa, escutava-o falar, sem prestar muita atenção, sobre o programa de treinamento da academia do xerife. Acenava com a cabeça e, vez ou outra, lançava-lhe um sorriso encorajador, mas a realidade é que não estava nem um pouco interessada naquele assunto. Certo, talvez não desejasse se casar com Seth. Mas um pouco de excitação não era pedir muito, era? Para ser franca, queria ir para casa, vestir seu pijama predileto e assistir a um filme antigo. Ou melhor ainda, ir para a casa de Mike, tirar o pijama e... Pôs fim àquelas divagações perigosas. — Quando Jeff me ofereceu esse emprego em Tesoro, decidi aceitar... — Seth se reclinou no assento e cruzou os braços. —... Porque acho que o segredo para o bom cumprimento da lei é... Deixando a mente vagar outra vez, Nora desejou saber o que Mike estaria fazendo naquele exato momento. Sentiria sua falta? Desejaria saber como ia indo seu encontro Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child com o deputado? Uma hora mais tarde, Mike se achava sentando no banco da caminhonete, diante da residência de Nora. Fixando o olhar na janela principal, avistou dois vultos através do tecido das cortinas. Imagens desfocadas, mas boas o suficiente para perceber que Nora convidara Seth para entrar. Seus dedos apertaram o volante de novo. Deveria ter ficado na fazenda. Não tinha nada a fazer ali. Nora não significava nada para ele. Caso contrário, não a teria feito sair com o deputado. Portanto, não poderia culpar mais ninguém a não ser a si mesmo. — Mas quem está falando em culpa, aqui? Ligou o motor e deslizou o veículo no asfalto, pegando a estrada em direção ao rancho. Sozinho.

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child

CAPÍTULO VII

— Mas é um moço tão atraente! — Molly encarava Nora como se sua melhor amiga estivesse ficando louca. — E aborrecido como ele só. — Deixou-se cair sobre o colorido sofá borgonhês de Molly. Só de pensar no encontro da noite anterior, Nora se sentia entediada até os ossos. Não que Seth fosse um sujeito ruim. Mas, mesmo que fosse apenas por sexo, gostaria de sair com alguém que fizesse seu corpo esquentar com um único olhar. E esse não era, de modo algum, o caso do deputado Thomas. — Ficou o tempo inteiro narrando com pormenores como ganhou a medalha de honra ao mérito. Gabando-se de ter sido o número um da classe de atiradores. Descrevendo como se faz para algemar uma pessoa. — É mesmo? Hum... Nora sorriu. — Pare com isso! — Estou apenas pensando alto, querida. — A questão é que não existiu... —... Entusiasmo? — Isso mesmo. — E de repente está exigindo entusiasmo, excitação e até fogos de artifício, Nora? — Bem... Os olhos de Nora deslizaram ao redor da sala. Aconchegante e confortável, a casa de Molly era cheia de vida. Havia impressões digitais nas janelas, livros empilhados sobre as mesas e uma camada de pó sobre quase todos os móveis. Mas como costumava dizer a todos, não era nenhuma escrava do lar. Poderia muito bem se dedicar a uma boa faxina, mas sua filha seria um bebê apenas por um curto período, e queria aproveitar bem aquela fase. Tracy, uma menina perfeitíssima, de seis meses de idade, crescia como... Um pé de feijão. Rastejava pelo chão repleto de brinquedos, murmurando sons ininteligíveis. Nora observou aquele ser tão pequenino e tão amado, e sentiu um aperto no coração. Do jeito que as coisas iam, jamais teria filhos. E essa simples constatação lhe causou arrepios. — Continue Nora. Você estava dizendo... —... Que sua filha está cada dia mais bonita — elogiou, tentando mudar de assunto. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Oh! Sim... Tracy é linda mesmo. — A distração não durou muito. — Então, tem alguém em mente que a estimule? — Mais ou menos. — E por um acaso estamos falando de um belo fazendeiro com uma filha de cinco anos? Nora a encarou. — Você é paranormal? — Não sabia? Chame-me de Molly, a Magnífica. Convenhamos, Nora, tem passado quase todos os minutos do dia em companhia de Mike Fallon nas duas últimas semanas. De quem mais poderíamos estar falando? — Pelo amor de Deus! De qualquer outra pessoa! — Mike é um ótimo rapaz. — Sim, é maravilhoso. Mas quer me ver pelas costas. — Essa sua tendência a exagerar está passando dos limites. — Não estou exagerando. — Nora se lembrava de como Mike praticamente a forçara a sair com Seth Thomas. — Ele faz tudo o que pode para me manter a distância. Molly sorriu. — Mesmo se mantiver distância, meu bem, poderá alcançá-lo. — É fácil falar. Jeff se derrete todo sempre que olha para você. — Querida, seja mais atirada. Nenhum homem resiste a isso. Nora achou graça. Entretanto, lembrou-se do olhar lascivo de Mike ao fitá-la... E como o corpo másculo enrijecia quando estava ao seu lado. Suspirando, contente, disse a si mesma: se conseguisse excitá-lo, talvez ele não impusesse resistência. O sol da tarde aquecia a terra e cobria de luz e calor as costas desnudas de Mike. Jamais deveria ter ido à cidade na véspera. E muito menos ter ido à casa de Nora. Não devia ter se torturado, imaginando-a nos braços do deputado, sendo beijada, tocada... Apertando o martelo com força, bateu na cabeça de um prego, até transpassar a estaca da cerca de um lado ao outro. Uma pequena contração no braço direito o fez migrar os pensamentos para o que estava fazendo, durante um breve segundo. Ao ouvir o barulho familiar do motor de um carro se aproximando, sentiu um frio na boca do estômago. Voltou-se devagar, muito devagar, como se o fato de se virar depressa pudesse fazer o veículo desaparecer. Quando a porta se abriu, Nora saltou. A luminosidade solar cintilava nas pontas dos cabelos loiros, criando efeitos brilhantes semelhantes a ouro. Nora cravou os olhos em Mike, como se o magnetismo que emanasse dele fosse tão potente que não pudesse ser evitado. Até mesmo de longe, Mike pôde sentir a energia poderosa daqueles olhos azuis sobre os seus, o que o fez prender a respiração. Ela contornou o automóvel, com passos lentos, e sorriu. O olhar dele a varreu como se fosse um homem cego a quem de repente fora concedido o poder de enxergar. Reparou em cada detalhe das formas femininas, a pele macia do pescoço, os seios, que Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child arfavam sobre o tecido, ombros, braços que o faziam arder de desejo. A bainha descosturada do short verde deixava à mostra parte das coxas bronzeadas do abdome. Nora caminhou alguns metros e descansou os antebraços no alto da cerca. Aquele gesto descobriu-lhe um pouco mais da cintura delgada. Mike cerrou as pálpebras, tentando se controlar, e em seguida tornou a fitá-la. — Quem será o próximo? — O quê? — O sangue pulsava tão forte em suas têmporas que ele teve de se esforçar para ouvir, quando ela repetiu a pergunta. — Eu disse: quem será o próximo de sua lista? Mike pigarreou, prendeu o martelo no cinto e caminhou em direção a Nora. Se a deixasse perceber o poder que seu olhar tinha sobre ele estaria perdido. — Do que está falando? — Sabe muito bem, Mike. Futuros defloradores. Ainda se usa esse termo? — Poderia ser mais clara? — Olhou-a bem fundo nos olhos. Era menos perigoso do que se permitir outro rápido vislumbre daquela pele macia. Nora sorriu, e os lábios dele se apertaram. — Vamos, Mike... Suponho que Seth Thomas não tenha sido sua melhor tentativa. O nó que se hospedara no centro do tórax dele, desde a noite anterior, se dissolveu. — Não gostou de Thomas? — Sem dúvida, trata-se de um rapaz agradável, mas em matéria de carícias, parece um cavalo. — Ele a acariciou? — Não era essa a intenção? — Nora correu as pontas das unhas ao longo da extremidade da cerca. — Quero dizer, não posso perder a virgindade a menos que haja algum tipo de envolvimento, não concorda? — Lógico. — Mike acompanhava o movimento lânguido dos dedos dela. — Mas não foi o que eu esperava... — Encolheu os ombros, e o tecido da blusa moldou-se à curva dos seios. — Você sabe, não é? Tudo o que ele sabia era que, se não se afastasse daquela mulher o mais rápido possível, ela não teria de se preocupar em achar alguém para deflorá-la. — Mike? — Nora chacoalhou a mão em frente do rosto dele. — Sim! — Você está bem? — Estou. — Tirando o chapéu, passou a mão pelos cabelos. Pelo menos, ficaria bem assim que pudesse mergulhar em bastante água fria. O mar da Groenlândia talvez fosse suficiente. — Pois não parece — Nora o provocou com uma ponta de malícia. Era bom saber que, mesmo não tendo muita experiência em matéria de flertes, era boa o bastante para deixar um homem de joelhos. — Talvez tenha pegado muito sol, hoje — sugeriu, fingindo estar preocupada. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Já disse que estou bem, Nora. — Mas está fazendo muito calor. — Inclinou a cabeça para trás, acariciando o pescoço. — Tenho a impressão de que minha pele está pegando fogo. Ele inalou lenta e profundamente. Nora vibrou ao tomar consciência da facilidade com que conseguia excitá-lo. — Tenho de voltar ao trabalho. — Com firmeza, Mike se afastou alguns passos para trás. — Certo. — Nora o encarou. — Vou entrar e dar um beijo em Emily. Mike parou, engolindo com dificuldade, e a fitou por sobre o ombro. — Pretende ficar mais tempo? — perguntou, olhando-a, ansioso. — Evidente! — Esboçou um sorriso magnífico. — Ainda temos de pensar em alguém de sua lista, não é mesmo? Girando nos calcanhares, Nora se foi em direção a casa, meneando os quadris com um movimento provocante. Ao caminhar, podia sentir que Mike a observava, e, se fosse feita de palha, teria se incendiado sob a admiração escaldante daquele turrão. E era assim que se sentia. A pele ardendo, o corpo trêmulo, os joelhos bambos, o desejo tomando conta de cada fibra. Então, quem estava torturando quem ali? Mike chegou tarde. Rick estava passando cada vez mais tempo com Donna, e isso significava mais serviço para ele e menos tempo para Emily. Logo deveria ficar contente por Nora estar ali, não é? Pelo menos sua filha estava feliz e bem-cuidada. Entrando na cozinha, pendurou o chapéu na parede e deu uma olhada ao redor. Havia um prato coberto com uma tampa sobre o fogão. Alguns pratos tinham sido lavados e guardados, mas a mesa se mantinha posta apenas para uma pessoa. Pelo visto, Emily e Nora já tinham jantado. E, apesar do fato de ter retardado seu retorno, ficou desapontado ao perceber que elas não o esperaram. O relógio em cima da pia marcava dezenove horas e trinta minutos, e Mike sentiu uma pontada de remorso. Estava quase na hora de Emily ir para cama e mal colocara os olhos na filha durante o dia. Entretanto, cuidaria disso tão logo tomasse uma ducha rápida e... — Mike? — A voz de Nora veio da sala. Ele refreou seus hormônios e caminhou pelo largo corredor. — Sim, acabei de chegar, entrei e... — Estacou na entrada da sala. Avistou Emily deitada no sofá sob uma grossa coberta, com Nora ao seu lado. Preocupação e medo invadiram o peito de Mike, ao cruzar o cômodo com rapidez. Ajoelhando-se ao lado da menina, observou o olhar preocupado de Nora, e perguntou: — O que está havendo? — Não sei. Emily estava bem alguns minutos atrás... — Papai... Não me sinto bem... — Onde está doendo, minha querida? É sua barriga? Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Não. — A pequena colocou a mãozinha ao redor do pescoço. — Minha garganta dói. — Mike, eu juro, até alguns minutos atrás, Emily estava ótima. Estávamos desenhando... — Crianças adoecem de repente — interrompeu-a, evitando olhá-la. — Não se preocupe com isso. — Papai, está doendo... — Fique calma, meu amor. Darei um jeito nisso. Emily fechou os olhos e virou-se de lado. Mike beijou-lhe a testa e levantou-se, fazendo um gesto para que Nora o seguisse. Ela o fez relutante, fitando a criança deitada, tão estranhamente quieta. — Nora, olhe, eu não queria pedir... Mas estou imundo. Importa-se de ficar com Emily enquanto tomo uma ducha rápida? Depois tomarei conta dela, e você poderá ir para casa. Ela o encarou como se Mike tivesse duas cabeças. — Eu não vou a lugar algum! — afirmou, após alguns minutos calada. — Você não precisa ficar Nora. Emily já teve isso antes. É apenas uma dor de garganta. Vou lhe dar um remédio para a febre, e ela logo ficará bem. — É óbvio que ficará bem. — Cruzou os braços sobre o peito e lançou-lhe um olhar irredutível. — E eu ficarei aqui para constatar isso com meus próprios olhos. — Nora? — soou uma lamúria baixa, vinda do sofá. — Leia para mim... Ela estremeceu, e a emoção marejou-lhe os olhos. Virou-se para fitar a criança. — Já estou indo, anjinho. — Em seguida, dirigiu-se de novo para Mike, acrescentando em uma entonação que não admitia réplica: — Ande, vá tomar um banho e depois jante. E pode ir se acostumando com minha presença, porque não irei embora. Então, antes que ele pudesse argumentar, deu-lhe as costas e se afastou em direção à menina. Apanhando o livro favorito de Emily, começou a ler, e o som calmo, carinhoso e suave de sua voz inundou o ambiente. Mike as observava. Ainda estava parado lá, quando Emily estendeu a mãozinha e segurou a de Nora. Aquela cena encheu-lhe o coração de ternura e calor humano. Vivia apenas com Emily havia tanto tempo que não sabia direito como compartilhá-la com outro alguém. Mas era evidente que a menina encontrara em Nora algo de que precisava. E isso o preocupava. Porque, mais cedo ou mais tarde, Nora deixaria de vir ao rancho. E o que seria de sua filha, quando perdesse a atenção dela? Duas horas mais tarde, Nora se sentia exausta. Todos os pensamentos de sedução foram banidos, e concentrava sua atenção inteira em Emily. A garota parecia tão frágil, tão desamparada deitada naquela cama cercada de bichinhos de pelúcia... As bochechas, coradas, e os olhos mostrando o brilho vítreo da febre. — Leia outra vez — sussurrou a garotinha, e tamanha debilidade causou um nó na garganta de Nora. — Claro, querida. — E puxou a criança para o colo. Emily aninhou-se no peito de Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Nora e, mesmo sob o tecido da blusa, ela pôde sentir a quentura que emanava daquele corpinho, ardendo contra o seu. A preocupação tomou conta dela e invadiu-lhe os sentidos. Mas releu o livro de contos, tentando distrair Emily. E, enquanto lia a história de um pequeno coelho doente e seus amigos, concentrou-se no contato suave de Emily encostada nela. Embora odiasse o fato de a criança estar doente, adorava sentir-se querida e saber que sua presença confortava a filha de Mike. — Será que estarei boa na sexta-feira? Nora parou de ler e contemplou os tristes olhos azuis que a fitavam. — Não sei meu anjo. Por quê? — Mandy, uma colega de minha classe, fará aniversário, e nós íamos dormir na casa dela e fazer um monte de coisas... O lábio inferior da menina se contraiu, e uma lágrima deslizou do olho esquerdo, rolando ao longo da face gordinha. — Minha doçura, não chore... — Quem está chorando? — Mike quis saber. Nora deparou-se com Mike apoiado contra o batente, com as mãos nos bolsos do jeans. Desde quando estaria parado lá? — Eu, papai. — Emily o fitou com o rosto inundado de lágrimas. Mike sorriu muito suave, entrou no quarto e se sentou em frente à Nora. — Não se preocupe sobre a festa, querida. — Ele afagava o rosto febril. — Você ficará boa até lá. — Tem certeza? — A menina esboçou um meio sorriso. — Sim! Agora, por que não tenta dormir? — Certo. — A garotinha abraçou Nora e se colocou numa posição confortável. Mike meneou a cabeça. — Não seria melhor você se deitar, amorzinho? — Nora está lendo para mim, papai. — Sim. — Nora sorriu. — Estou lendo para Emily. Um sorriso largo curvou os lábios bem-feitos de Mike. O impacto sensual daquela masculinidade era tanto que Nora podia sentir suas células vibrando. Respirando fundo, obrigou-se a desviar o rosto, fixando o olhar nas páginas do livro que mal podia ver devido à névoa de volúpia que lhe toldava a visão. Como Mike podia fazer isso? Por que aquele homem a perturbava tanto? Como conseguia despertar-lhe a vontade irracional de arrancar as roupas e se atirar na fortaleza daqueles músculos? — Importam-se de que eu fique escutando? — ele indagou rouco, arrepiando a nuca de Nora. — Pode abraçar Nora, também, papai. Ela umedeceu os lábios, mesmo sem notar. Mike percebeu e lançou-lhe um olhar que a deixou tonta. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child

CAPÍTULO VIII

Alguns minutos mais tarde, a febre cedeu, e Emily conseguiu dormir. Contudo, Nora recusava-se a ir embora. Mike a observava na entrada do corredor e, sob o brilho suave da luz do abajur, seu rosto ficava ainda mais belo. Ela parecia... Céus, como era atraente! Inclinando-se para frente, ele apoiou os braços no batente e pressionou-os até ouvir um estalido da madeira. Os olhos verdes percorreram o corpo feminino, detendo-se em cada curva. A blusa que Nora usava quando chegou agora estava enrugada e úmida, com algumas gotas do remédio para febre que a menina ingeriu. Nora passava as mãos pelos cabelos com tanta freqüência que ficaram desalinhados, e o olhar parecia pesado e aflito. Ainda assim, o desejo flamejou dentro dele, mais vivo e mais intenso do que naquela tarde. Aquilo era mais do que uma simples reação à aparência de Nora. Estava fascinado com a personalidade daquela mulher. Seu jeito de ser... Sua dedicação a Emily. Com sua preocupação, lendo uma história infantil repetidas vezes até se assegurar de que a pequena adormecera. A volúpia poderosa que lhe varria o corpo aumentava, à medida que a conhecia melhor. Eram os arranjos florais enfeitando os ambientes, a risada que iluminava todos os cantos da casa, antes escura, o calor que lhe aquecia a alma, sem importar o quanto lutara contra isso. Nora virará sua vida do avesso. Porém, Mike sabia que esse querer era absurdo. Não existia futuro para um relacionamento entre os dois. Não podia lhe dar o que ela procurava. Não se permitiria correr esse tipo de risco. Se fosse sozinho, quem sabe pudesse se render a tais sentimentos, mas tinha de Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child pensar em Emily, também. E protegê-la de outra possível rejeição era fundamental. Mesmo que isso significasse renegar a mulher que desejava mais do que a própria vida. Como se percebesse que era observada, Nora ergueu a cabeça e o fitou de maneira intensa. Quando seus olhares se encontraram, Mike sentiu que se achava em apuros. Nora se levantou, inclinou-se para frente e acariciou a testa de Emily. Em seguida, endireitou-se e atravessou o quarto em direção à porta. Mike recuou um passo quando a viu se aproximar. Ao transpor o limiar, o corpo curvilíneo esbarrou no dele, e um tremor percorreu-o da cabeça aos pés. Deus, aquela situação estava fugindo ao controle! Meneando a cabeça, Mike deu um último olhar para a filha adormecida, virou-se e a seguiu até a sala. Nora continuou caminhando até parar diante da lareira. Sobre a cornija de carvalho escuro que a revestia, viam-se dispostos vários porta-retratos. A maioria das fotos era de Emily, mas havia outras, também. — São seus pais? — ela perguntou, sem se virar. — Sim. — Mike parou perto dela. — Eles vivem no Norte, próximo ao Reno. — É um lugar muito bonito. — Nora deslizou os dedos ao longo da madeira até o próximo quadro. — E esta? — Minha irmã. — Ele enfiou as mãos nos bolsos da calça jeans. — Ela e a família vivem em Montana. — Você é o único que está distante, não é? — Nós nos damos bem assim. Na realidade, sua família nunca fora muito afetuosa. Visitavam-se, comunicavam-se uma vez ou outra por telefone e e-mail, mas sem muito apego. — Isso pode até ser vergonhoso, sabia? Meus familiares, de vez em quando, me deixam louca, mas não posso imaginar viver sem tê-los por perto. — Eu tenho Emily. — E basta? — Ela é tudo para mim. Nora virou-se para encará-lo. Tinha os olhos marejados de lágrimas e, mesmo sem estar esperando, aquela emoção dela o tocou fundo. Mike chegou mais perto de Nora e estacou outra vez, sem saber que atitude tomar. Lágrimas sempre o arrastavam para uma armadilha. Nora usou ambas as mãos para enxugar o rosto. Em seguida, respirou com dificuldade, meneou a cabeça e, esboçando um sorriso, sussurrou: — Ela é tudo para você. Pude perceber quando estavam juntos. — Suspirou, acrescentando: — Eu o invejo por isso, sabia? O que responder? Ele quis saber. "Obrigado"? Mas Nora não lhe deu uma chance de pensar em algo para dizer. Em vez disso, continuou falando. As palavras apressadas, atropelando umas às outras, confundiam o fluxo do som. Mike esforçava-se para ouvi-la e assimilar o que estava dizendo. — Observei vocês dois e notei sua imensa ternura, seu carinho... Você soube muito Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child bem o que fazer sem ficar assustado. Não estava preocupado. Vi em seu semblante. — Nora apontava um dedo em riste, como se o acusasse de algo medonho. — Preocupado, talvez, mas não assustado. Eu estava assustadíssima, não sabia por onde começar a cuidar dela. Emily ficou febril em questão de minutos. Uma febre que veio do nada... Ela encolheu os ombros, levantou as mãos e em seguida deixou-as cair ao longo do corpo. — Se não tivesse entrado por aquela porta naquele momento, Mike, eu teria ido procurá-lo. Estava apavorada. Quero dizer, já fiquei doente, e isso não é uma coisa do outro mundo. E só tomar uma aspirina e repousar. Mas ver Emily chorar, o rostinho vermelho, os olhos vítreos... Deus foi terrível! Senti-me tão desamparada! Céus, como sou estúpida! Como pode lidar com isso com tanta tranqüilidade? Como pode cuidar de uma criança que em um minuto está gozando de perfeita saúde e no próximo fica doente? — Nora... — Vez ou outra, ele tentava conter o fluxo de seu falatório. Nora chorava, sem nem ao menos tentar se conter. — Meu Deus! Não tenho o direito de querer constituir uma família. Ter filhos? Nem pensar! Se reajo dessa forma, o que seria deles? Quero dizer, se caírem... E se ferirem? Eu desmaiaria ao ver o sangue? Ou simplesmente iria me sentar no chão e chorar com eles? — Ela passou as mãos pelos cabelos, num gesto de impaciência. — Não sou o tipo de pessoa mais indicado para se ter ao lado em um momento de crise. — Que bobagem! — O quê? Nora ergueu o queixo, e seus olhares se encontraram. Mike foi dominado por uma angústia imensa ao fitar aquelas feições aflitas, as faces molhadas de pranto. Não conseguindo mais se deter, deu três passos largos e postou-se ao lado dela. Segurando-a de leve pelos ombros, encarou-a bem fundo nos olhos. Naquele instante, sentiu um tremor percorrer o corpo de Nora e atingir o seu. As íris dela pareciam tão azuis quanto um lago... E da mesma maneira impenetráveis. Nora mordeu o lábio inferior numa tentativa inútil de conter o choro, que teimava em lhe rolar pela face. Segurando-a com mais firmeza, Mike repetiu: — Isso é tudo bobagem. Tudo. Pelo menos o que pude depreender desse monólogo. — Meneou a cabeça. — Você fala muito rápido. É difícil de entender. Um sorriso trêmulo curvou os lábios delicados, esmorecendo logo em seguida. — Minha mãe sempre diz que quando fico nervosa não consegue distinguir uma palavra do que eu digo. — Ela tem toda a razão. Mas o motivo disso tudo é que está se culpando por ter ficado com medo. — Isso mesmo — concordou, tentando se desvencilhar das mãos que a apertavam. Mas não havia jeito de se livrar daqueles braços fortes, se Mike não o fizesse de livre e espontânea vontade. — Você não se apavorou, Nora. Agiu de maneira correta. Cuidou de Emily muito bem. Leu para ela a mesma história uma centena de vezes. Eu, em seu lugar, teria Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child arrancado os cabelos. — Um leve sorriso estampou-se em seu rosto e foi recompensado com outro. — Isso não é verdade. — Apoiou-se nele. — Emily me disse que você lê essa história para ela todas as noites. — Que injustiça! — Mike exalou um longo suspiro, desfrutando do contato daquelas formas delicadas contra si. — Eu a recito. Decorei essa história há meses. Nora deu risada. O som era hesitante, inseguro, mas mesmo por alguns segundos, sorriu. Por um segundo, Mike a percorreu com o olhar, observando cada detalhe da face delicada. Demorou-se sobre a cabeleira, os olhos... Tão azuis, tão inocentes.... Jamais imaginara que no século XXI encontraria uma mulher de vinte e oito anos que fosse inocente. Contudo, ela estava ali, diante dele. E em seus braços. Seus polegares roçaram a pele nua dos braços de Nora de um lado para outro. Aquele contato provocou-lhe algo semelhante ao impacto de uma descarga elétrica, dificultando-lhe a respiração. Mas não a estava segurando para sua própria satisfação, certo? Apenas queria consolá-la. Retomando o assunto, tentou colocar os pensamentos de novo no lugar: — Crianças adoecem de uma hora para outra. Por sorte, ficam curadas com a mesma rapidez. — Deu de ombros. — E, na maioria dos casos, tudo o que se tem a fazer é confortá-las e esperar que melhorem. Nora se movimentou. Mike acompanhou-lhe o movimento para restabelecer a conexão. — Ler para elas é uma ótima opção. Nora tornou a sorrir, a respirar fundo, e soltou o ar, arrepiando uma mecha caída sobre a testa. — Se estiver mentindo para me consolar, quero que saiba que está fazendo um ótimo trabalho. -— Não sou um mentiroso. Nora o estudou com atenção, tentando ler o que lhe ia ao íntimo. O que viu a convenceu, porque acabou por assentir, sussurrando: — Obrigada. — Por nada. Os dedos quentes e ágeis moveram-se outra vez sobre a pele dela, causando-lhe um estremecimento que o excitou. Porém, dessa vez, Mike a soltou, numa reação instintiva, dominado pela sensação de que deveria se afastar um pouco... De que estavam muito próximos, naquela sala mal iluminada. O brilho do luar penetrava pelas janelas da frente e derramava um feixe prateado sobre os tapetes e os tacos do piso. Um abajur aceso no canto projetava um pequeno halo dourado no teto, criando um ambiente doce e romântico, enquanto eles se fitavam próximos à lareira. — Mike... — disse ela, baixinho, e a voz pareceu roçar a nuca dele, causando uma forte vibração em cada nervo de Mike. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Procurando controlar a paixão que o deixara ofegante, Mike permitiu que ela recuasse um pouco. Esforçou-se para pensar em algo além do perfume da mão delicada, que lhe acariciava o rosto. Era um aroma floral, suave, envolvente... Que dominava o ambiente e entorpecia-lhe os sentidos. — Ouça — falou com firmeza, lembrando a si mesmo que não existia futuro para os dois —, Emily está dormindo. Amanhã já estará bem. Talvez seja melhor voltar para sua casa. — Não quero ir embora, ainda. — Nora deu um passo adiante, aumentando a proximidade. Bem, ela poderia ser virgem, mas Mike por certo não era, e já tinha visto aquele olhar determinado em uma garota antes. Nora tinha algo em mente, e estava decidida a conseguir o que queria. Com certeza precisaria mais do que lógica para demovê-la de seu objetivo. — Nora... Isso não é uma boa idéia. — Mike sentia-se melhor por estar fazendo pelo menos uma tentativa, apesar da chance pífia de obter sucesso. — Relaxe, caubói. Aí é que você se engana. — E então, aproximou-se ainda mais. —Acho que é uma idéia excelente. Foi inevitável. No instante seguinte, Nora o enlaçou, pressionando cada curva contra Mike. Suas mãos percorriam o pescoço másculo com toques sensuais e provocantes. Estava tão perto que suas bocas ficaram apenas a alguns milímetros uma da outra. Mike ficou excitado em um segundo. Todos os músculos, todas as células ardiam de desejo. Contraiu a mandíbula com firmeza. As mãos se apertaram em seus quadris, enquanto ouvia as batidas intensas e descompassadas do próprio coração. A respiração quente de Nora aqueceu-o ainda mais. Os dedos longos afundaram nos cabelos escuros e fartos, ameaçando levá-lo à loucura. Remexendo-se um pouco, ela esfregou os seios contra o peito bronzeado e largo, e sorriu consciente de seu poder. — Sabe Mike, acho que isto tudo o agrada mais do que você possa imaginar. Ele piscou, balançou a cabeça e disparou: — Nem imagino o que quer dizer com isso. — Oh, sim... — Com o dedo indicador, Nora passou a unha ao redor da gola da camiseta vermelha que ele usava. — Sabe muito bem do que falo. Mike estremeceu e, como querendo se defender envolveu-a pela cintura, estreitando-a e mantendo-lhe os braços cativos. — Nossa, que vigor! — Nora respirava com dificuldade, mas não parecia desconfortável. — Olhe... — Mike se esforçava para se livrar do enorme nó que se formara em sua garganta. — Não sou o tipo de homem que está procurando. Ela ergueu o queixo e brindou-o com um sorriso encantador. — Como sabe o que procuro caubói? — Pare de me chamar assim. Sou um fazendeiro. — Você é um caubói — insistiu e, mais uma vez, seus dedos se moveram com Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child sensualidade pelos cabelos de Mike, fazendo-o delirar. — Não vou fazer isso. — Acho que vai. Venha, caubói. — Mesmo parecendo impossível, Nora chegou ainda mais perto. — Seja um herói de verdade e beije a mocinha. As mãos dele a envolveram pela cintura, mais uma vez. Num gesto lento, deslizaram pelas costas até se deterem no pescoço. Afagando a cabeleira sedosa, ele prendeu-lhe a nuca, forçando-lhe a cabeça para trás, e fitou-a com tremenda intensidade. Mas a volúpia foi mais forte. Sem conseguir resistir mais um segundo sequer, o último pensamento racional que lhe passou pela mente foi: "Que droga! Qual o mal que um mero beijo pode causar?". — Sim, madame. — E se apossou dos lábios dela num beijo possessivo e exigente. Nora foi assaltada por uma espécie de encantamento, ao desfrutar aquela nova experiência. Durante toda a noite, fora assolada por uma montanha-russa de emoções. Primeiro, provocando Mike sem o menor pudor, depois cuidando de Emily, que adoecera de repente, e agora ali na penumbra, a sós com ele. Conversando com Mike, observandoo, sentindo o poder daqueles olhos verdes capazes de enlouquecer qualquer mulher. No entanto, vê-lo agir como um pai dedicado e amoroso só serviu para enaltecer a imagem que construíra dele ao longo das duas últimas semanas. Mike Fallon era muito mais do que podia supor encontrar em um homem. Seu corpo vibrava quando ele estava por perto. Odiava deixá-lo todas as noites, e mal podia esperar para vê-lo no dia seguinte. Isso seria amor? Não saberia dizer. Não queria pensar sobre isso. Pelo menos não naquele momento. Por ora, tudo o que pretendia era se entregar àqueles instantes. Havia se guardado a vida toda, esperando, rezando para lhe aparecer o parceiro ideal. Depois, perdera a esperança. Porém, ali, naquela ocasião, recuperara-a. O fato de ele não estar interessado em amor, casamento ou em compromisso duradouro era algo com que se preocuparia só depois. Naquele instante, queria estar em seus braços, provar, sentir e experimentar tudo o que perdera durante todos aqueles anos. A língua de Mike, cada vez mais ágil e ousada, explorava-lhe todos os pontos sensíveis da boca, deixando-a ainda mais maravilhada. Já fora beijada antes, isso era um fato óbvio. Mas seu corpo era mais sábio. Poderia ter sido beijada, mas jamais daquela maneira, com aquele ardor. Mike era um perito na arte de beijar. Nora não pôde conter um gemido abafado, à medida que o beijo se aprofundava, absorvendo-a, explorando-a. O coração ganhara um ritmo mais acelerado, mais intenso. Inebriada, sentiu o hálito quente de Mike em seu rosto, enquanto ele se apossava de seus lábios sem a menor cerimônia. As mãos quentes e fortes afagavam as curvas do corpo esguio e bem-feito, pondo-a em chamas sob o efeito inebriante daquelas carícias. Nora o agarrou pelos ombros, puxando-o para si como se sua vida dependesse daquele homem. De olhos fechados, vislumbrou fogos de artifício explodindo, e as faíscas cadentes pareciam se partir e derramar-se ao longo de suas formas. O raciocínio foi bloqueado, mas isso não tinha importância. Já não pensava. O ar lhe faltou, mas isso também não a preocupava. Nada mais importava. Não existia tempo ou espaço, apenas a necessidade premente de sentir aquela potência Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child masculina projetando-se contra suas coxas. Quis muito que aquele beijo durasse para sempre. Ansiava por se perder no prazer do toque daqueles dedos, que lhe provocavam arrepios. Queria arder naquele fogo. Queria mais, muito mais... Momentos depois, Mike afastou os lábios dos dela. Nora lutou para respirar e aconchegou a cabeça no tórax largo, tentando restabelecer o equilíbrio. Seus joelhos estavam trêmulos, e teve receio de que, se Mike se movesse muito rápido, a derrubasse no chão. Ele respirou fundo e expirou o ar devagar, descansando o queixo sobre a cabeça dela. — Nora, faça um favor a nós dois e vá para casa. Agora. — Acho que não estou em condições de caminhar, confesso. — Eu a acompanho até seu carro. Jogando a cabeça para trás, ela o encarou. Quando percebeu o brilho de luxúria que iluminava as pupilas dele, seus joelhos bambearam outra vez. — Mike, você não quer que eu vá. Posso ver isto em seus olhos. — O que quero e o que devo fazer são duas coisas bem diferentes. Ela foi invadida por um imenso desapontamento. — Mas não tem de ser assim. — Errado. Tem, sim. — Ele a soltou de repente e deu alguns passos para trás. Nora sentiu o corpo viril afastar-se para longe da proximidade que havia pouco compartilharam. Queria impedi-lo. — Não pode parar agora. Não desse jeito. — Sacudindo a cabeça, ela o encarou, tentando não pensar no fato de que sua boca ainda estava latejando e o sangue pulsando feito louco nas veias. — Se pensa que está sendo fácil para mim, engana-se. — Então, por quê?! — A raiva e a frustração misturaram-se, exigindo uma resposta lógica. — Porque um de nós tem de raciocinar. — Ah! — Procurando se recompor, Nora colocou ambas as mãos nos quadris, bateu o pé esquerdo no chão e disparou: — Ou seja, o que está querendo dizer é que precisa pensar pela pobre mulher que não tem capacidade de raciocínio próprio? As mandíbulas dele se apertaram, e os músculos faciais se contraíram. — Eu não quis dizer isso. — Mas disse Mike. Caminhando a passos lentos, ela circulou ao redor dele, forçando-o a virar a cabeça para acompanhar-lhe o movimento. — Você é alto, forte, inteligente e tudo o mais. E já deve ter feito sexo... Pelo menos uma vez na vida, sem dúvida. — Ei... Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Sendo assim, é óbvio que deveria comandar o show, certo? — Não falei que eu... — Está bem, Mike. Irei embora, mesmo porque não estou mais com vontade, caso não tenha percebido. A propósito, estou falando muito rápido, as palavras estão saindo... — É verdade, mas... — Quer saber de uma coisa? — Nora se aproximou o suficiente para tocá-lo no tórax com o dedo indicador. — Ainda vai lamentar muito essa sua atitude. Chegou mais perto, encarando-o sem piscar, e, com voz baixa e rouca, quase sumida, murmurou: — Hoje à noite, quando estiver deitado, sozinho, em sua cama, quero que se lembre de que me dispensou. — Correndo os dedos pelo peito dele, segurou o tecido da camiseta na altura da gola, forçando-o a baixar a cabeça. — Vai sentir minha falta, caubói. E sabe bem disso. Ato contínuo, Nora o puxou e deu-lhe um beijo lascivo, expressando tudo que estava sentindo naquele último contato. Sentiu-o render-se àquele momento e, quando as mãos fortes moldaram-se às curvas dos seus quadris, afastou-se, contente. Afinal, era um pequeno consolo perceber que o excitava em questão de segundos. — Bem, já chega por esta noite, caubói. — Empinando o queixo, muito altiva, fitou-o com um brilho frio nos olhos, e acrescentou: — Mas apenas por esta noite. Por fim, com o coração batendo descompassado e com a cabeça girando, caminhou em direção à porta da frente, abriu-a e saiu sem se virar para trás.

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child

CAPÍTULO IX

— Você tem de jogar o laço e amarrar esse homem bem amarrado! — A mãe de Nora olhou de relance para a filha e em seguida voltou à atenção para o crochê que estava fazendo. — Isso mesmo! — concordou Frannie, acariciando o queixo de seu bebê. — Convenhamos, Nora. — Jenny endireitou a filha no colo para arrotar. — Como conseguiu viver todos esses anos sem aprender as regras do jogo? O olhar de Nora vagueou pelas irmãs e dirigiu-se ao rosto da mãe. Rosa se sentara em uma cadeira de vime. Os cabelos e os ombros eram banhados pela luz do sol que penetrava através da janela da sala. Frannie e Jenny se mantinham ocupadas com seus filhos, porém, pelo visto, ainda dispunham de tempo para dar a Nora o conselho que achavam que ela tanto precisava ouvir. A casa onde cresceu pouco mudara ao longo daqueles anos todos. Apenas a mobília e o carpete foram substituídos algumas vezes. A ausência do pai ainda era muito sentida, após cinco anos de sua morte. Mas, na realidade, era o mesmo velho e confortável imóvel em estilo vitoriano. Aonde vinha a cada duas semanas almoçar e ser atormentada com opiniões acerca de seu comportamento. Durante a última meia hora, o ponto forte da discussão era seu relacionamento com Mike Fallon. Ao que tudo indicava a cidade inteira não parava de comentar. Não era de se espantar. Não havia muita coisa para se fazer em Tesoro, e um falatório desse tipo era motivo suficiente para um verdadeiro carnaval. Tendo se dedicado de tal maneira a fazer companhia a Mike, como vinha fazendo nas últimas semanas, não era de se admirar que Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child as pessoas especulassem. — Quem disse que temos de jogar? — perguntou Nora, de repente. As três mulheres contiveram o riso, e ela defendeu sua posição. — Jogos são para crianças. Homens e mulheres devem ser honestos entre si. — Ah, falou a irmã ainda intocada... — murmurou Frannie. — A sabedoria da deusa virgem — acrescentou Jenny, desviando o olhar para brincar com a filha. Nora apertou os lábios e fulminou a irmã com o olhar, mas, antes que pudesse responder outra voz a interrompeu: — Parem com isso, meninas! — bradou Rosa, e Nora revirou o rosto para a mulher de cabelos loiros, matizados de branco. — Nora, querida, nem sempre o que é bom para uns é bom para outros. Dando uma laçada apertada, pousou a agulha de crochê e descansou as mãos sobre o colo. Sorrindo, seguiu em frente: — Você sempre foi muito sincera, meu bem. Não faz sentido querer mudar agora. — Obrigada, mamãe. — E encarou as irmãs com uma sobrancelha erguida, achando que vencera aquela batalha. — Mas, para ser muito franca com você, não é a política mais correta em se tratando de homens. — De acordo! — exclamou Frannie. A mãe ignorou aquele comentário. — Não ligue Nora querida. O que estou tentando dizer é que não será fácil, mas, se quer Mike, deverá convencê-lo disso a sua própria maneira. — Inclinando-se para adiante, apoiou os cotovelos nos joelhos e sorriu para a filha primogênita. — Eu a conheço, meu amor. Quando você ama, ama para valer. Se isso for amor de verdade, lute por ele, ouviu? Siga sua intuição e faça o que achar melhor. Lágrimas brotaram nos olhos de Nora, enquanto fitava a face terna e delicada da mãe. Era bom ter um lugar onde às pessoas a conheciam e compreendiam tão bem, decidiu. — De fato, Nora, tudo o que você precisa fazer é se decidir, e então convencê-lo a decidir-se também. — Jenny sorria do outro lado da sala. Ao ouvir a irmã falar, aquilo soou mais fácil do que na verdade seria. — Oh! — Frannie apontou para o filho. — Olhem! Olhem! O menino de apenas onze meses ficara de pé sem ajuda de ninguém. As mulheres, fascinadas, prenderam a respiração, ao ver as minúsculas mãozinhas se agarrarem no tecido da almofada do sofá. E, sob o olhar da orgulhosa família, o pequeno Jake deu seus primeiros passinhos cambaleantes. Quando a criança caiu sentada no carpete acolchoado, a mãe, encantada, o tomou no colo e vibrou com aquela vitória. Nora sentou-se no chão, assistindo às irmãs e Rosa, que felicitavam o menininho. As lágrimas voltaram a brotar-lhe nos olhos. Uma emoção intensa tomou conta de seu corpo, deixando-a sem ar. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Família. Isso era tudo o que importava. Era tudo o que mais queria na vida. E sabia muito bem o que teria de fazer para realizar seu sonho. A vida retomou o ritmo normal. Pelo menos, isso era o que Mike repetia para si mesmo. Não via Nora fazia quase dois dias. Desde que ela ateara fogo ao corpo dele e partira, deixando-o sozinho, ardendo de desejo e paixão. De qualquer maneira, fora melhor assim, pensou, colocando o saco de dormir corde-rosa de Emily na parte traseira da caminhonete. Nora, pelo visto, percebera que um relacionamento entre os dois não teria futuro. — Ei, chefe! Mike ergueu a cabeça e piscou contra a luz do sol da tarde, para ver Rick se aproximar. — O que é? O capataz meneou a cabeça e apontou com o dedo polegar para sua própria casa, do outro lado do pátio da fazenda. — Voltará logo da cidade? — Sim. Mais ou menos dentro de meia hora. — Ótimo. Na volta, pode comprar alguns tacos para Donna? Mike deu risada. — Achei que ela estivesse com desejo de tomar sorvete. — Isso foi na semana passada. — Rick exalou um longo suspiro. — Esta semana, são tacos. — Certo. Pode deixar, eu comprarei. — Obrigado. — O empregado já caminhava em direção ao celeiro, quando se virou. — Fico lhe devendo essa, chefe. — Não se preocupe. Mike se lembrava muito bem de como era lidar com uma esposa grávida. Claro que Vicky se ressentira de toda aquela situação. Reclamara durante os longos nove meses. Odiou as transformações físicas que se processaram em seu belo corpo. Odiou o bebê. E, mais especificamente, odiava Mike por ter sido o responsável. No entanto, por mais longa e miserável que aquela gestação tivesse sido, para Mike nada mais importou a partir do minuto em que a enfermeira lhe deu a notícia do nascimento da filha. Ainda podia ver Emily... Minúscula, corada, emitindo o primeiro choro. Um momento milagroso, sem sombra de dúvida. Parecia que lhe estamparam na testa a palavra "bobalhão" desde o instante em que pusera os olhos na garotinha. Sempre quis ter três ou quatro crianças. Sorriu ao imaginar a algazarra que seria naquele rancho. Mas, no instante seguinte, aquele sorriso desapareceu, ao relembrar que Emily seria sua primeira e única filha. E isso era uma vergonha, admitiu, pelo menos para si mesmo. Não fizera planos de viver sozinho até o fim de seus dias. Queria uma companheira. Uma família grande. Mas nada dera certo nesse sentido para ele. E agora era tarde demais para correr atrás da felicidade. Não deixaria Emily se apegar a outra pessoa, para depois sofrer uma nova rejeição. Sua filha era sua maior prioridade. Agora era a vez de Emily. E faria tudo o que Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child estivesse ao seu alcance para fazê-la feliz. Nora tinha um plano para pôr em prática. Pediu a Jenny e Frannie que a acompanhassem ao shopping e escolheu um lingerie tão sensual que ficou meio surpresa consigo mesma ao abrir a bolsa e pagar por ela. Com os cabelos arrumados e as unhas feitas, sentiu-se atraente, bonita e... Bem... Pronta para a batalha. Os dedos tremiam, ao se maquiar no espelho retrovisor de seu carro. Desejou que seus nervos fossem feitos de aço, quando passou o delineador nos olhos. Um verdadeiro redemoinho se formou em seu estômago, como se tivesse engolido centenas de borboletas. A boca ficara tão seca que sentia dificuldade até para engolir. Respirando devagar e de maneira profunda, encorajou-se: "Ora, vamos, Nora. Você é capaz de fazer isso". Levando a mão à base da garganta, sentiu as batidas frenéticas do pulso. Bem, a estratégia não teria chance de dar certo se ela desmaiasse antes de colocar a mão na massa. Através do pára-brisa, fixou o olhar na casa da fazenda, no fim do caminho escuro e silencioso. Ainda ao longe, a luz vinda da cozinha denunciava a presença de Mike no interior da velha residência, e seu coração começou a bater ainda mais rápido. Ele estava sozinho. Aquela era a noite da festa de aniversário da coleguinha de Emily. Engolindo várias vezes seguidas, tentou firmar a respiração. Guiou o automóvel através da pequena estrada de terra, seguindo o rastro de luminosidade que os faróis projetavam. O som familiar do cascalho sob os pneus parecia de alguma maneira... Dar-lhe as boas-vindas. Quando alcançou o pátio, estacionou o veículo, apanhou a bolsa e saltou, fechando a porta atrás de si. Espreitou de viés a casinha de Rick e Donna, e ficou satisfeita ao avistar várias lâmpadas acesas e o bruxuleio da televisão ligada. Daquela parte, não haveria interrupções. Agora, tudo o que precisava fazer era controlar os nervos para levar a cabo seu plano. A porta da cozinha se abriu, e um feixe de luz amarela projetou-se na escuridão, delineando a silhueta máscula de Mike, parado à soleira. Ele parecia enorme... Alto, ombros largos e... Bem, era tudo o que ela queria. — Nora? — disse ele. E, apesar do tom de voz baixo, podia ser ouvido com clareza na quietude daquele lugar, tão longe de Tesoro, que Nora aprendera a apreciar. — Surpresa! Mike saiu para a varanda, e a luminosidade recaiu sobre ele. Com os traços ainda meio sombreados, parecia misterioso e intocável. Uma parte de Nora lutava por dizer: "Esqueça essa loucura toda e volte para casa". Porém já tinha ido longe demais para desistir e deixar tudo para trás. Além do mais, aquela vozinha minúscula e covarde no fundo de sua mente era fácil de ignorar. — Não esperava vê-la por aqui outra vez. — Mike cruzou os braços. Nora contornou o carro e caminhou com cuidado sobre o cascalho, sentindo os saltos dos sapatos bambearem. A brisa fresca da noite penetrou-lhe pela bainha do casaco de linho, e um calafrio percorreu-lhe a espinha. Contudo, estava quase certa de Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child que era apenas o ar fresco que lhe provocara aquele formigamento. — Precisamos conversar — disse, com muita suavidade, subindo os degraus e se postando ao lado dele. Os dez centímetros dos saltos dos calçados a deixaram alta o suficiente para fitá-lo olhos nos olhos. Nora notou que, apesar da falta de acolhimento, havia um flash de... Algo nos olhos verdes que a encorajou a prosseguir. Respirando fundo, caminhou alguns metros em direção à cozinha. No interior, sobre a mesa, havia uma pequena sacola plástica. O cheiro de tempero mexicano impregnava o ambiente, e Nora sorriu, olhando ao redor. Tudo ali era caseiro e familiar. O lugar ideal para sua primeira tentativa de sedução. — Se veio até aqui para falar sobre aquela noite... — começou ele. — Não. — Nora jogou a bolsa em cima da mesa e se virou para encará-lo. — Estou aqui para falar sobre esta noite. Mike se mantinha distante. Não precisava de mais complicações. Vê-la ali outra vez já era o suficiente para despertar todo o desejo que passara os dois últimos dias tentando reprimir. Os cabelos loiros, um pouco cacheados, caíam ao redor das faces de Nora, emprestando-lhe um ar selvagem. Os olhos azul-escuros pareciam enevoados e mais perigosos do que nunca. Os sapatos muito altos sustentavam-lhe as pernas esguias e aparentavam ser os mesmos que lhe ficaram tão bem na festa de casamento. E até mesmo o casaco de linho azul parecia sensual, cingido ao redor da cintura fina. Um casaco? As noites de primavera estavam frescas, mas não frias o bastante para justificar o uso de um agasalho como aquele. Não a esse ponto, disse a si mesmo. Bem, mas a questão principal no momento era tirá-la dali o mais rápido possível. Sem dizer nada, Nora deslizou as mãos até a cintura e em poucos segundos desatou o cinto que apertava o casaco. Os olhos de Mike assistiram a seus movimentos, aturdidos. Ao que tudo indicava, ela planejava ficar ali por algum tempo. — O que está fazendo, Nora? — Estabelecendo a primeira fase de nossa conversinha. — Fase? — indagou atônito, e, antes que pudesse entender o que ela quis dizer com aquilo, Nora encolheu os ombros e deixou o casaco escorregar até o piso. Mike teve a impressão de que seu coração parou por alguns segundos. Sob aquele casaco feito de linho simples ela usava a mais surpreendente combinação de seda e renda que ele já vira. A trama suave do tecido vermelho acariciava as formas femininas, deslizando ao longo da pele, abraçando-lhe as curvas até terminar em uma minissaia que mal lhe cobria as coxas. Tiras finas de renda misturavam-se à seda do lingerie, modelando-lhe os ombros e a curva generosa dos seios. As pernas pareciam esbeltas e bronzeadas, e as mãos dele ansiavam por tocar e explorar cada centímetro da carne macia. Com passos ágeis, Mike fechou a porta dos fundos e quis muito ter cortinas para fechar, também. "Oh, Deus!" — Então? Gosta? — Nora perguntou cínica. Mike decidiu que aquela foi à pergunta mais boba que já ouvira em toda sua vida. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Suspirando, ergueu a cabeça e a encarou, sem piscar. — Gostar? Bem, eu diria que sim. — Ótimo! Os lábios tentadores curvaram-se num sorriso, revelando que Nora sabia muitíssimo bem o efeito que causava nele. Ela fez um giro demorado e sexy, permitindo a Mike excelentes ângulos para apreciá-la como bem entendesse. "Essa garota é fantástica da cabeça aos pés!" Mike sentiu o corpo enrijecer. Uma volúpia crescente pareceu atear fogo em suas veias, e o coração martelava sua caixa torácica com vigor. — Eu sabia que você ia gostar. Pelo menos compensa o fato de eu estar aqui congelando. — Nora... Ela tornou a fitá-lo, inclinando um pouco a cabeça para lado. — Não vai me mandar embora, não é mesmo? — Adiantaria? — Não. Dizendo isso, Nora se aproximou. Mike amaldiçoou a si mesmo. Ah, se pudesse recuar... Todavia, nenhum de seus músculos queria obedecê-lo. Fez menção de dizer algo, mas mudou de idéia. Passou os dedos entre os cabelos, sentindo-lhe o perfume cálido e sensual. Uma fragrância de flores que Mike seria capaz de reconhecer no escuro e encontrá-la onde quer que fosse seguindo esse aroma. — Mas você poderia me aquecer um pouquinho — Nora o provocou. — Aquecer? — Ele não conseguiu conter uma risada gutural. — Doçura, se não tomar cuidado, vai terminar no meio de uma floresta em chamas. As pupilas dela cintilaram, e os lábios se entreabriram num sorriso devastador. Mike soube que estava perdido. Não havia a menor chance de mandá-la sair dali... A menor chance de resistir pelo resto da noite sem tocá-la... A menor chance de passar os próximos dez segundos sem possuí-la. — É por isso que estou aqui. — Nora chegou perto o suficiente para acariciar-lhe o tórax com delicadeza. Uma vontade louca se apossou dele. Nora ergueu os braços, rodeou-lhe o pescoço e mergulhou as mãos nos cabelos escuros e sedosos. Mike sentiu cada uma de suas células vibrando e lutou para manter o controle sobre as sensações que o invadiam. — Eu te quero Mike. Por favor... Faça amor comigo. — Nora, isso é loucura! Ela assentiu, sustentando-lhe o olhar. — Sei muito bem disso. Desde o início. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Não sou o homem ideal para você. — Mas é exatamente o homem que eu quero. Mike respirou fundo e soltou o ar, afobado. Abraçando-a pela cintura, deslizou os dedos ao longo das costas dela, causando-lhe arrepios de puro deleite. Nora buscou moldar suas formas nas dele e beijou-lhe o canto da boca. Mike sentiu que suas defesas foram por água abaixo. Vinha lutando contra aquele sentimento fazia duas semanas. O desejo se tornara um companheiro inseparável, e a frustração, seu estilo de viver. Ora, um homem não pode resistir à vida inteira! — Nora, tem certeza de que é isso que você quer? Ela deu risada. — Está brincando?! Eu me vesti a rigor, dirigi até aqui, entrei em sua casa e fiz um verdadeiro strip-tease, e está me perguntando se tenho certeza? Nossa, Mike, pode-se dizer que o estou atacando! Um leve sorriso curvou os lábios masculinos. Nora estava certa. Então, ela o beijou. Um beijo enlouquecedor, ardente. E, quando terminou, ergueu a cabeça, tornando a sorrir. — Que tal, caubói? Meneando a cabeça, Mike disse a si mesmo que no dia seguinte, sem dúvida, pensaria nas centenas de razões lógicas pelas quais não deveria ter feito aquilo. Mas, naquele instante, não era capaz de raciocinar e encontrar uma sequer. Ainda segurando-a pela cintura, ergueu-a nos braços e, quando Nora riu, deliciada, aconselhou-se a aproveitar aqueles momentos como se fossem únicos, e não se importar com nada além daquela noite. — Aguarde-me, mocinha — disse, com seu sotaque arrastado de caubói. — Esta vai ser uma longa noite... — Promete? Nora gargalhou, enlaçando-o pelo pescoço, enquanto ele cruzava a cozinha em direção ao quarto.

CAPÍTULO X

Agarrada a Mike, que se movia depressa pela casa escura, Nora sentiu a boca seca, e os músculos retesados de tensão. Na entrada do dormitório, ele parou, alcançou a maçaneta e abriu uma pesada porta de madeira. O brilho do luar penetrava pela janela desprovida de cortinas, esparramando-se pela enorme cama de casal, como um convite mágico e sensual. A colcha artesanal que Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child recobria o lençol de baixo parecia alva e perfumada, dando-lhes as boas-vindas. Mike caminhou alguns passos e parou ao lado do leito. Olhando-a nos olhos, perguntou outra vez: — Tem certeza de que é isso o que você quer? Nora levou a mão pelo peito largo e abriu um dos botões da camisa dele. — Já lhe garanti que sim, caubói. Não existe nenhuma dúvida em minha mente. Isso é tudo o que eu quero. Agora mesmo. Você. Aqui. Comigo. Nessa cama. Quero dizer... Mike sorriu, e Nora sentiu o pulso disparar. — Entendi... Entendi — disse ele, e, ainda segurando-a nos braços, inclinou-se, jogando a colcha para o lado. — Você tem certeza. — Pode apostar. — Ótimo. — Mike se ajoelhou e a colocou deitada. — Porque, caso pretenda mudar de idéia agora, não sei se vou conseguir parar. — Não quero que pare. Eu garanto. Cada centímetro da pele de Nora parecia vibrar. Havia um brilho malicioso naqueles olhos verdes que a atingia como a força de um vulcão, prestes a entrar em erupção. O sangue pulsava-lhe nas veias com uma necessidade tão in-controlável que jamais imaginou ser capaz de sentir. E breve, muito breve, estaria deixando para trás sua virgindade. Daria o importante passo para concretizar aquilo por que esperava fazia tanto tempo. E o melhor de tudo era que sua primeira vez seria com Mike. Deslizando os dedos por baixo da saia dela, ele acariciou-lhe a pele nua e... — Minha bolsa! — Nora exclamou, aflita. — O quê? — Preciso de minha bolsa. Eu a deixei na cozinha... — Está pensando em ir a algum lugar? — sussurrou Mike, de encontro a seu ouvido. Nora respirou fundo, soltou o ar devagar e sacudiu a cabeça. — Não. E que... Ah... Não quis comprá-los em Tesoro. Sabe como é uma cidade pequena. Há esta hora, todo o mundo estaria falando e sabendo que eu estava fazendo... Quero dizer, o que nós estávamos fazendo. Por isso, parei em uma loja em Monterey hoje à tarde e... — Não entendi uma palavra do que balbuciou. — Mike esboçou um sorriso meigo. — Tenho muita sorte de ainda conseguir falar. — Nora lutava para respirar, pois as pontas dos dedos fortes roçavam ao longo da renda elástica de sua calcinha. — Então, não fale. — E deu-lhe uma série de beijos rápidos nos lábios. — Não fale meu bem. Apenas sinta. Apenas... — Eu gosto disso... — Excelente! Eu também. Outro beijo. Outro gosto. Outro beijo muito rápido que despertou nela uma ânsia louca e inexplicável de ser acariciada, tocada, amada. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Ofegou quando os lábios de Mike beijaram-lhe a face, desceram pelo pescoço, traçando um caminho de fogo na pele sensível... Levando-a a loucura. Ela precisava lhe contar algo. Começara a falar sobre a loja... E que tinha alguns... Deus! Ar! Precisava de ar! Nora ordenou a si mesma respirar. Mas sua capacidade de raciocínio estava arruinada, e temia que essa ordem ficasse por último em sua lista de prioridades. — Tão macia... — Mike... "Pense Nora!" — Em minha bolsa... Ele se levantou, fitou-a com intensidade e sorriu. — O que há de tão importante em sua bolsa? Nora o encarou com o olhar enevoado de paixão. Aquela era a única explicação para o fato de Mike parecer tão obscuro. Inalando bem fundo, tentou focalizá-lo. Quando recuperou a voz outra vez, conseguiu dizer: — Preservativos. Há preservativos em minha bolsa. Ele curvou os lábios num sorriso devastador e meneou a cabeça. — Você é surpreendente, sabia disso? Uma agitação deliciosa se apossou dela. — Porque tive coragem de comprá-los? — Isso mesmo. Dizendo isso, Mike tornou a se deliciar com os contornos curvilíneos, explorando-os com as pontas dos dedos. Tocou-a de leve, acariciando-a com tanta suavidade como se uma pena roçasse a pele sensível. A expectativa de Nora se desenrolava numa crescente espiral. O sangue fluía apressado nas veias e uma chama ardente e pulsante instalou-se em seu baixo-ventre, fazendo-a contrair-se e contorcer-se embaixo de Mike. Aquela resposta erótica aumentou a excitação de Mike. Sua pulsação batia num ritmo alucinado e sensações indescritíveis tomavam conta de seu ser, impedindo-o de respirar direito. Estava pronto para o amor, mas precisava se conter. Tinha de reduzir a velocidade das coisas. Fazia anos desde que fizera amor com uma virgem. E, naquela época, ele era virgem também. Porém, ao longo de todo esse período, adquirira vasta experiência, e estava determinado a fazer da primeira vez de Nora algo memorável. Os preservativos podiam esperar, entretanto, agradeceu aos céus pelo fato de ela ter pensado nisso. Mesmo porque não tinha seu próprio estoque. Não tivera muitos encontros amorosos nos últimos dois anos. Mas nada disso tinha importância. Sua única preocupação era Nora. Como satisfazer seus anseios mais íntimos. Como excitá-la o bastante para levá-la às alturas sem se importar com a queda. Afagando a parte interna das coxas macias, Mike apreciou o contato com a epiderme sedosa. As curvas do corpo feminino eram muito generosas, e ele explorou cada linha até senti-la estremecer. — Quero tocá-lo, também — sussurrou Nora, e ele não pôde conter o riso. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Desejava o toque daquelas mãos tanto quanto ela. Assim, levantando-se depressa, livrou-se das roupas e das botas, lançando-as em um canto do quarto. Fitando-a, percebeu que os olhos azuis assumiram uma expressão de deleite ante a visão de sua virilidade. Quando Mike se deitou mais uma vez a seu lado, Nora desceu a mão pelo tórax forte, seguindo pela trilha de pêlos escuros e arrastando as unhas contra a pele em brasa, como se quisesse imprimir sua marca naquele corpo viril. Mike friccionou os dentes e respirou com dificuldade, lutando para se controlar. Era uma batalha difícil de ser vencida. Por fim, quando não pôde mais resistir àquela doce tortura, com um braço seguroulhe ambas as mãos de encontro ao colchão. Nora se arqueou, e os mamilos enrijecidos ergueram-se de encontro ao tecido macio. Um prazer intenso e primitivo o dominou. Usando a mão livre, empurrou o lingerie para o alto até que os seios dela escaparam nus, à luz do luar. Nora se contorceu, tornando a se arquear, sem conseguir conter os murmúrios lascivos que lhe escapavam dos lábios. Mike sentiu a ternura tocar seu coração escuro e solitário. Baixou a cabeça. Nora prendeu a respiração. Sem hesitar, Mike se colocou sobre ela e tomou-lhe um mamilo entre os lábios. Sugou-o de leve, depois traçou uma linha com a língua até o outro seio. Nora aproximou mais os quadris, puxando-o para si, como se tivesse medo de que ele parasse. Porém, não havia a menor chance de isso acontecer. — Você é maravilhosa, perfeita! — exclamou, contornando com a ponta da língua o outro mamilo enrijecido. — Mike... Mike... Ele sorriu, sem parar um segundo de acariciá-la. E Nora continuava proferindo frases desconexas. Mike deliciava-se com seu sabor. Ofegante, beijou-lhe o seio direito e mordiscou o mamilo sensível, com uma sensualidade que lhe provocou arrepios e contrações nos lugares mais incríveis. — Isso é muito bom! — ela murmurou. — É tão... Bom. Tão gostoso! A luxúria crescia dentro dele, à medida que Nora se arqueava como uma gata à procura de algo que jamais experimentara antes. Mike sentiu sua frustração e compadeceu-se dela. Também queria mais. Queria aquela mulher... Por inteiro. — Mike, eu quero... Preciso... — Sei disso, querida. — E tornou a roçar-lhe os mamilos, agora com o dedo polegar. Nora se contorceu outra vez. Quase em desespero, tentou cerrar os dedos ao redor do pescoço dele, mas Mike a impediu, estendendo-lhe os braços acima de sua cabeça e segurando-a com força. Não podia permitir que o tocasse ainda, senão perderia o controle. Enquanto ele corria os lábios de um lado para o outro, beijando-lhe os seios, a mão livre passeava ao longo das curvas intocadas. Alcançando uma das extremidades da calcinha de seda, Mike a puxou. Com um Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child movimento gracioso, escorregou-a pelos quadris e logo se livrou da peça incômoda. Devagar, fez o caminho de volta, correndo a ponta dos dedos pelas pernas, em direção à pele aveludada entre as coxas. Nora correspondeu àquela carícia, oferecendo-se a seus afagos. Virando a cabeça de um lado para o outro no travesseiro, engoliu em seco, mordeu o lábio inferior e tentou se libertar do aperto forte de Mike em seus pulsos. — Por favor... — implorou. A voz suplicante ecoou dentro dele. — Por favor, eu preciso... —... Disto. — Olhando-a bem dentro dos olhos, Mike cobriu-lhe com a palma a zona quente e úmida na parte interna das coxas. O corpo inexplorado estremeceu àquele primeiro toque íntimo, e um pequeno grito escapou-lhe da garganta. — Mike... — Relaxe, meu bem. Apenas sinta... — E inclinou a cabeça para beijar-lhe a boca e o rosto. — Isso, deixe vir e aproveite. — Mas... Eu... Não posso... Respirar... Ele achou graça. — Para isso, não precisa de ar. Os olhos dela adquiriram um tom enevoado, enquanto se movimentava de encontro a Mike. Fincando os pés no colchão, ergueu os quadris, convidando-o a um contato mais profundo. Naquele instante, Nora se esqueceu de tentar respirar. Tudo o que desejava saber era o que estava acontecendo com as outras partes dela. Jamais experimentara sensações semelhantes àquelas. Nada na vida a preparara para a dimensão do poder do sexo. Seu cérebro obscureceu. Já não conseguia raciocinar. Os dedos de Mike, aqueles dedos mágicos, imergiram num ritmo louco que latejava e atiçava-lhe todos os sentidos. Quando ele, por fim, esbarrou no ponto tão sensível, que ansiava por seu toque, Nora quase gritou. Ou teria gritado se tivesse ar suficiente nos pulmões. Mike era tudo. Suas carícias. Seus beijos. Seu corpo viril, rijo... Ele continuou atiçando-a de maneira erótica, vibrando os dedos com maior intensidade. Nora cerrou as pálpebras, entregando-se àquelas vibrações intensas e indescritíveis, até que um espasmo violento de prazer inimaginável percorreu-lhe cada fibra. O mundo explodiu em milhões de partículas coloridas. Tudo era mistério, revelação, loucura... — Eu volto logo — Mike sussurrou, junto ao seu ouvido. Nora não foi capaz de se mover. Não conseguia sair do transe em que se encontrava. "Abra os olhos!", ordenou a si mesma. Obedecendo, abriu-os e fitou o teto. Estava girando. Não, sua cabeça estava girando. — Mike? — Tinha quase certeza de que o chamava, mas sua audição parecia estar Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child arruinada, também. — Estou aqui, Nora. — Aonde você foi? — Pegar sua bolsa. Os olhos dela se alargaram, enquanto virava o rosto para fitá-lo. As sobrancelhas espessas estavam arqueadas, e um sorriso curvava os lábios sedutores. No mesmo instante, ficou em alerta. Supôs que fosse impossível, mas estava pronta para mais. Estava pronta para o amor... — Eu te quero dentro de mim, Mike. Quero senti-lo por inteiro. Mike enfiou os dedos pelos cabelos sedosos e cingiu-lhe o pescoço, enquanto a outra mão afagava-lhe a face. — Você está acabando comigo, garota. Ela sorriu. — Oh, ainda não... — Ainda não se cansou de mim, então? — Sem chance, caubói. Dizendo isso, rolou para o lado e o abraçou, trazendo-o para si. Com um movimento sensual, deslizou a língua sobre os lábios dele, apartando-os. Respirou fundo, enchendo os pulmões de ar, e agradeceu a Deus por isso. Todos os seus nervos estavam eletrizados. Acariciou-o, explorando a rigidez do tórax desnudo, molhado pelas primeiras gotas de suor. Movendo-se num jogo erótico, roçou os seios enrijecidos contra a musculatura poderosa até Mike ficar ofegante e quase sem fôlego. Ele aceitou todas aquelas carícias e as retribuiu com ardor. Passou a explorar o corpo delicado, definindo cada curva, descendo e subindo em movimentos suaves e circulares. Estava faminto. Não podia mais sentir aquela fragrância suave de flores que emanava da pele perfeita sem enlouquecer. Precisava dela. E, quando nenhum dos dois agüentava esperar nem mais um segundo, afastou-se e colocou um dos preservativos, com o que ainda lhe restava de bom senso. Em seguida, deitou-a e se ajoelhou entre as pernas, que se afastavam, receptivas, num oferecimento irrecusável. Tomando-a pelos quadris, roçou-a com suavidade. Nora estremeceu em seus braços. Sem hesitar, Mike colocou-se sobre ela, cobrindo-a com o corpo nu, reivindicando o que era seu. Nora enterrou as unhas nos ombros largos, sem se desviar nem por um instante dos olhos muito verdes. Sentiu quando Mike a penetrou. Centímetro por centímetro. Com movimentos lentos e deliberados ele investiu mais fundo, mais íntimo. Ela remexeu-se, tentando acomodá-lo e aliviar o calor que a consumia por inteiro. Então, Mike parou por um momento e, com um impulso preciso, afundou por completo dentro dela. Nora soltou um gemido de dor e prazer. Trêmula, contorceu-se, desfrutando daquele instante. De alguma maneira, eles haviam se tornado um único ser. Seus corações Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child pulsavam na mesma cadência de volúpia e paixão. — Você está bem, Nora? — Melhor não poderia estar — conseguiu responder, apesar do nó que se formara em sua garganta. Erguendo a cabeça, beijou-o, entregue. E, cada vez que Mike investia, puxava-o para si, revelando que o desejava mais e mais. De repente, Mike começou a se mover numa dança frenética. Por puro instinto, Nora o acompanhava, indo para frente e para trás, ansiando por experimentar aquela explosão de deleite outra vez. Foi então que percebeu que o clímax se aproximava e relaxou o corpo sedento, deixando-se levar por aquelas ondas de magia. "Não se contenha... Não se contenha." Nora se abriu para os sentimentos. Para Mike. Para o horizonte novo que se descortinava a sua frente. Mágico! Maravilhoso! Suas emoções voltaram-se todas para o homem que a possuía. A adrenalina corria feito louca em seu sangue. O coração pulava, ensandecido. Prendeu a respiração ao sentir a primeira contração que lhe atingiu a alma e espalhou-se por todas as células em espasmos selvagens de puro êxtase que ela jamais imaginou sentir. — Mike! — A voz parecia ecoar no quarto banhado, pela luz do luar. — Venha comigo — murmurou rouco, apoiando-se nos cotovelos e fitando-a com intensidade. — Venha comigo, Nora... Vamos voar juntos. — Leve-me com você! Envolvendo-a e apertando-a junto de si, Mike rendeu-se ao desejo que o consumira naquelas duas últimas semanas. Gritando o nome dela na noite iluminada pelo brilho do luar, mergulharam no centro da tempestade.

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child

CAPÍTULO XI

— Magnífico! — exclamou Nora, com a voz trêmula de emoção. Contudo, ficara impressionada consigo mesma por ter conseguido pronunciar aquela palavra. Claro que não era suficiente para descrever todas as sensações que a invadiram nas últimas horas. — Concordo. — Mike rolou para o lado, lutando por respirar com normalidade, como um náufrago agonizante. Mantendo o olhar fixo no teto, ela esperou até a visão voltar ao normal para falar: — Embora eu não tenha experiência sobre o assunto, acho que foi bom. Um leve sorriso curvou os lábios dele. — Hum, hum... Eu diria que sim. — Meu Deus, jamais imaginei me ouvir perguntando isso a alguém. Parece até que estou assistindo a um filme bobo e antigo, mas não posso evitar, porque de fato quero mesmo saber... E como saberia se não perguntasse? Portanto, pensando bem, não é tão antiquado assim. Mike ergueu a mão. — Sobre o que está falando, Nora? — Foi bom para você? Ele lhe dirigiu um olhar repleto de significado. A expressão das íris, iluminadas por um brilho malicioso, revelava mais do que qualquer coisa que pudesse dizer. Mas ainda era mais gratificante ouvi-lo falar. — Foi o máximo! — murmurou, encarando-a como se a estivesse vendo pela primeira vez. — Sensacional! Esplêndido! Aproximando-se mais, acariciou Nora, e ela adorou o toque. A respiração dela tornou-se mais rápida, e um desejo louco, agora familiar, cresceu em seu interior. — Oh, meu Deus... — Contorcendo-se, encorajou-o em silêncio. Mike captou aquela reação e sorriu. — O que significa isso, mocinha? Nora suspirou. — Não fazia a menor idéia de que eu poderia passar de virgem a libertina no curto Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child espaço de uma hora. — Libertina? Não acha que está exagerando? — De que outra forma posso descrever meu comportamento? Mike gemeu, e seus braços moveram-se para enlaçá-la, fazendo-a debruçar-se sobre ele. Nora pôde ouvir o ritmo acelerado de seus corações. As mãos fortes exploravam-lhe as costas e os quadris. Fechando os olhos, entregou-se ao contato sensual dos dedos quentes e ágeis em sua carne. Das mãos que podiam levá-la às alturas. Apertando-o mais contra si, sentiu a força de seu desejo. De súbito, um intenso fluxo de calor a invadiu, incendiando-a por completo. — Mike... Por favor... — Quer que eu pare? — provocou-a. Segurando-lhe o rosto entre as mãos, Nora o olhou bem dentro dos olhos e advertiu: — Não ouse caubói! Dizendo isso, ela o beijou. Bocas, lábios e línguas unidos num ritmo incontido, intensificando o contato de seus corpos. Movendo-se contra a pele do peito rijo, Nora aprofundou ainda mais o beijo, adorando o roçar dos seus seios nos contornos dos músculos bem delineados. Só havia paixão e desejo, fazendo com que todas as fibras de seu ser vibrassem. Adorava o modo como ele a tocava. O som de sua voz, seu sorriso, seu sabor, seu cheiro. O amor que dedicava a Emily, a força que demonstrara, reconstruindo a própria vida após sua separação. O senso de humor e de responsabilidade. Enfim, amava aquele homem de todas as formas que uma mulher é capaz de amar. Desejava ficar perto dele, ser parte dele. Aquela constatação atingiu-a com uma clareza surpreendente, enquanto as mãos de Mike a exploravam com mais intimidade ainda. Afastando os lábios dos dele devagar, pôs-se de joelhos e o fitou. A expressão de Mike era de pura lascívia, e ela ofegou. Meneando os quadris, ouviu-o gemer, fechando os olhos como se suplicasse por energia. Mas a súplica não teve tempo de ser atendida. Erguendo-se, Nora o puxou. Orgulhosa, começou a se movimentar como bem queria, levando-o consigo. Mike a acolheu, preenchendo-a, alcançando as partes antes escuras e vazias de seu coração e de sua alma. Os seios arredondados e ardentes pediam o toque daquelas mãos. O coração desejava com ansiedade ouvir as palavras que ele não estava disposto a pronunciar. Nora passou a se movimentar mais devagar, prolongando as sensações que explodiam dentro dela. Mike a tocava com mestria, beliscando-lhe os mamilos sensíveis até levá-la à loucura. E, quando seu cérebro se concentrou no prazer, tentou memorizar aquele instante. Queria guardá-lo no recesso mais profundo da mente. Não podia esquecer aquele momento especial. O momento em que descobrira seu amor por aquele homem e celebrava esse amor amoldando-se às formas viris, num ajuste tão perfeito que jamais julgou ser possível. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Mike sentiu o sangue latejar-lhe nas veias, o corpo estremecer e o pensamento lógico se apagar. Tudo em que conseguia pensar era em prová-la, tocá-la, explorá-la. Queria se colocar sobre aquele corpo nu e macio. Afastar-lhe as pernas e desvendar-lhe os segredos. Queria tudo... E tinha de ser com Nora. Os cabelos loiros brilhavam como prata à luz do luar. A pele sedosa tinha aspecto de porcelana e o corpo curvilíneo, movendo-se de encontro ao dele, assemelhava-se ao de uma deusa mitológica. Naquela noite, pensou que seria o professor. Mas, em vez disso, Nora lhe ensinara o quanto ainda precisava aprender. Jamais sentira algo parecido. Nunca experimentara... Tamanho prazer com nenhuma outra mulher. Nora era especial e satisfazê-la tornara-se a coisa mais importante para ele. Mas aquele não era o melhor momento para tentar compreender o que se passava em seu íntimo. Louco de paixão desceu os dedos até o ponto sensível da anatomia dela, com um toque delicado que a fez delirar. Havia algo tão sedutor nesse gesto que Nora não pôde impedir que seu coração disparasse uma vez mais. Enrijeceu-se, estreitando-se contra ele. E quando Mike não conseguiu mais se conter, tomou-a nos braços, deitou-a de costas e a fitou com intensidade. — Mike... — Nora... — Os lábios bem-feitos se abriram num sorriso tenso. — Faça um favor a nós dois: fique quieta. — Certo. — E cingiu as pernas ao redor dele. Puxando-o para si, começou a se mover para frente e para trás, cravando-lhe as unhas nas costas. A respiração de Mike ficou pesada. E quando sentiu um espasmo violento que a fez convulsionar, esqueceu-se de tudo a sua volta, deixando-se levar num delírio alucinante. Num turbilhão de sensações inigualáveis. Uma ou duas horas mais tarde... Quem poderia afirmar? Nora caminhou do quarto até a cozinha, com a intenção de beber um copo de água e talvez comer algo. Nunca se sentira tão energizada, cansada, inebriada e... Dolorida em toda sua vida. Sexo, sem sombra de dúvida, era o melhor exercício do mundo, ao mesmo tempo cansativo e revigorante. Gostaria de saber por que ninguém jamais mencionara isso nos vídeos e livros sobre o assunto. Nada que havia sonhado se comparava ao que acabara de vivenciar ao lado daquele homem esplêndido. Apenas uma palavra o definia: masculinidade. Um leve arrepio percorreu-lhe a espinha, impelindo-a a apertar as extremidades do roupão de Mike ao redor da cintura. Encontrara aquela peça pendurada em um canto do banheiro e, como Mike ainda cochilava, ela o vestiu. O toque da peça macia a envolvê-la causava-lhe um indescritível sentimento de proteção. Caminhando na ponta dos pés, atravessou o corredor e alcançou a cozinha. Foi direto ao refrigerador e o abriu. Para sua surpresa, estava bem provido, levando-se em consideração o fato de que um homem fizera todas as compras. E que homem! Pensou ela, pegando uma coxa de frango frita e uma garrafa de água. Fechando o refrigerador, dirigiu-se à mesa e sentou-se. Procurou um guardanapo e em seguida abriu a garrafa, sorvendo o líquido até se satisfazer. Seu corpo ainda se encontrava trêmulo, e o raciocínio, confuso. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Tentava decidir o que fazer sobre seus sentimentos em relação a Mike, quando a porta dos fundos se abriu de repente. Levando a mão à garganta, Nora ergueu-se, assustada, ao ouvir Rick gritar: — Mike! — Céus... — Nora ficou muito envergonhada. Não só estava nua sob o roupão de Mike, mas a veste se encontrava rota, puída e... "Oh, por Deus! Será que esse detalhe tem alguma importância?!" Um segundo depois, Rick a notou. Tirando o chapéu, fitou-a de alto a baixo, e em seguida baixou a cabeça, desviando o olhar. — Desculpe-me, Nora. Eu... Bem... Não sabia que você estava aqui. Vim procurar Mike e... Por que estaria tão encabulado? Pelo menos estava vestido! Ela, sim, tinha razões de sentir vergonha. — Quem está gritando aí? — bradou Mike, entrando apressado na cozinha. O dorso bronzeado e musculoso estava desnudo. Era evidente que ele levara algum tempo para vestir a calça jeans e se esquecera de fechar o zíper e calçar os sapatos. Os cabelos escuros caíam-lhe em desalinho sobre a testa e parecia... Que acabara de participar de uma maratona de sexo. Rick encarou Mike, passando a mão pelo queixo. — Sinto muito interromper e... Olhe, eu apenas queria lhe dizer que Donna entrou em trabalho de parto e estamos indo para o hospital. Com certeza não estarei aqui pela manhã. O olhar de Mike se desviou de Rick para Nora e voltou para o capataz. Batendo de leve nas costas do empregado, exclamou: — Isso é maravilhoso! Dê um beijo em Donna por mim e diga que desejo toda a sorte do mundo a ela e ao bebê. — Obrigado. — Rick deu uma olhada em Nora, enquanto caminhava em direção à porta e, antes de sair, estacou e disse: — Boa noite, Nora. Uma vez a porta dos fundos fechada, ficaram a sós outra vez. Nora encarou Mike. — Bem, essa foi boa! Mike curvou os lábios num sorriso. — Mesmo se não a tivesse visto esta noite, Rick notaria seu carro amanhã de manhã. E descobriria que você passou a noite aqui. — É verdade — admitiu, resignada. — Mas não se lembraria de mim vestida neste roupão. Correndo os dedos pelo tecido atoalhado, acrescentou: — E falando em roupões, caubói, está mais do que na hora de comprar um novo, sabia? — Por quê? — Mike deu um passo em sua direção. — De onde estou, parece excelente. — Acha mesmo? Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Posso garantir. Ao chegar mais perto, com um gesto sedutor, abriu-lhe a roupa. Suas mãos deslizaram pelas laterais e puxaram a peça, despindo-a. Com um gemido abafado, tocoulhe os seios cheios e firmes. — Meu Deus... — Nora exalou um longo suspiro, adorando o contato dos dedos fortes em seus mamilos. Um toque íntimo e suave, que lhe provocava uma resposta selvagem e imediata. — Pelo visto, estava faminta, não é? — perguntou ele, olhando a coxa de frango esquecida sobre a mesa. — Hu-hum... — Eu também. — E, antes que ela pudesse entender o que estava acontecendo, Mike tomou-a nos braços e a fez sentar sobre uma das extremidades do tampo, alojandose entre suas pernas. — Mike... — Nora sentiu o coração disparar dentro do peito, e teve a sensação de que ia explodir, quando ele se ajoelhou diante dela. — O que você está... — Eu lhe disse que estava com fome. — Em seguida, afastou-lhe as coxas, mergulhando a cabeça, beijando-lhe os pêlos macios. Excitada, Nora se abriu por inteiro, permitindo a ele todo o acesso que queria. Lutou para respirar. Não conseguia desviar os olhos do homem a sua frente. Inebriada, quase enlouqueceu, quando ele a beijou com uma lascívia estonteante. Apertando com força as extremidades da velha mesa de carvalho, estremeceu e quase caiu ao sentir a língua quente provando-a, torturando-a. Jamais experimentara prazer semelhante. "Não pare! Não pare!" Quase com desespero, afundou os dedos nos cabelos sedosos e os acariciou. Perdida de volúpia ergueu as pernas, descansando-as sobre os ombros dele. Os músculos dos braços de Mike se contraíram, segurando-a com firmeza, enquanto seus lábios a levavam a lugares que Nora jamais sonhou existirem. Naquele instante, com os pensamentos desconexos, Nora não pôde evitar que as palavras lhe escapassem da boca. — Mike... Eu te amo! Minutos mais tarde, o eco daquela frase ainda pairava no ar. Não podia ser ignorado. Mike ajudou-a a descer da mesa. Então, virou-se e caminhou para o outro lado, em direção à sala, tentando pensar em algo para dizer que não a ferisse. Mas não era fácil. A última coisa que queria era decepcionar aquela garota sensacional, mas não podia continuar aquele jogo, pois poderia pôr em risco sua tão importante tranqüilidade. — Nora — disse, observando o céu escuro do lado de fora da janela —, deixei isso bem claro. Não sou o homem que está procurando. Mike notou que ela se aproximara, ao ouvir seus passos roçando o tapete macio. Parou logo atrás dele, que pôde ver o corpo esguio refletido no vidro da janela. Os olhos pareciam mais brilhantes do que nunca, e ele rezou para que não fossem lágrimas. Se arrependimento matasse, estaria fulminado. Jamais deveria ter deixado o desejo dominá-lo outra vez. Não devia ter permitido que seu corpo se sobrepusesse a sua Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child mente. Deveria tê-la mandado embora no momento em que Nora entrou naquela cozinha, transformando a fantasia de qualquer homem em realidade. No entanto, para fazer isso teria de ser santo. E Deus sabia que jamais chegara perto da santidade. Nora tocou-lhe o braço, e o calor dos dedos longos o atingiu em cheio. Fazia muito que não sentia algo parecido. — Relaxe, Mike. — Ela apoiou a testa em seu ombro nu. — Não estou lhe propondo nada. Não quero pressioná-lo. — Não quero magoá-la, Nora. — Porém, sabia que isso seria inevitável. — Está dando muita importância ao que aconteceu esta noite. Foi sexo. Delicioso, mas apenas sexo. Volúpia. Não Amor. Ela não disse nada, e Mike continuou falando. Pela primeira vez em três semanas, Nora permanecia calada. E aquele silêncio o enervou. Virando-se de frente, baixou o olhar para fitá-la. Nenhuma lágrima. Isso era um bom sinal. — Você é virgem e... — Era. — Certo. É uma moça romântica. Quero dizer, sou seu primeiro homem, logo, está fantasiando... Nora endireitou o roupão e apertou o cinto ao redor da cintura. — Não comece a me tratar como se eu fosse uma idiota, ou vou me aborrecer de verdade. — Está bem. A questão é que gosto... Bem... Droga! Sinto-me muito atraído por você! — Ah, sei... Mike ignorou o sarcasmo e tentou outra vez: — É uma mulher divina. Eu a admiro muito. Gosto de passar o tempo ao seu lado. — Segurou-a pelos ombros com firmeza. — Mas amor não está em meus planos. Nora o encarou com intensidade. O sentimento de culpa estampado nos lindos olhos verdes fez algo ruir dentro dela. Mais do que as palavras, isso quebrou o encanto do momento. A frustração se apoderou de seus sentidos. Por algum estúpido motivo, nutriu a esperança de que, uma vez dizendo que o amava, Mike admitiria existir mais do que simples desejo entre os dois. Todavia, era óbvio que estava disposto a ignorar as próprias emoções e prosseguir com aquela vida solitária. Bem, ele poderia fazer o que quisesse. Mas Nora não permitiria que Mike sentisse pena dela. Não queria sua compaixão. Queria seu amor. E, se isso não fosse possível, não lhe permitiria saber que a magoara tanto. Sempre acreditou em honestidade. Mas, às vezes, até mesmo a pessoa mais honesta era obrigada a mentir para manter o pouco de dignidade e amor-próprio que ainda lhe restava. Respirando fundo, olhou-o no fundo dos olhos e contou a maior mentira de que seria capaz: Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Muito bem, Mike, não quero forçá-lo a nada. — Erguendo o braço, afagou-lhe o rosto. O peito estava apertado, mas a voz saía com clareza: — Eu te amo, mas vou superar isso. Mike piscou várias vezes e mudou de posição. Por incrível que pudesse parecer, aquilo a fez sentir-se melhor. Nora prosseguiu: — A realidade é que tenho de admitir que você foi de grande valia. Agora que não sou mais virgem, tenho certeza de que será mais fácil encontrar outra pessoa. O cenho dele ficou carregado, ou era impressão sua? Erguendo-se na ponta dos pés, ela lhe deu um beijo rápido. — Posso garantir que, quando começar a desfrutar da liberdade dos solteiros, eu o esquecerei. Céus, mentir estava ficando mais fácil do que imaginara! Aquilo não era nada bom. Se Hollywood a descobrisse, poderia até ganhar um Oscar. Nora estava pasma consigo mesma. Será que Mike acreditara mesmo que ela teria coragem de procurar outra pessoa, depois do que viveram juntos naquela noite? Jamais conseguiria esquecer o toque daquelas mãos fortes em sua pele, a magia que encontrou naqueles braços. Como outro alguém poderia tocá-la como ele fizera? Mas Mike não precisava saber disso, não é mesmo? — Liberdade dos solteiros? — indagou, numa entonação firme, contraindo a mandíbula. — Ora, sabe o que quero dizer... — Nora ajeitou os cabelos. — Nós dois sabíamos que isto era temporário. Você cumpriu sua parte no acordo, ajudando-me a livrar-me de algo incômodo. Agora, creio que terei de procurar minha cara-metade por aí, porque não é uma boa idéia ficarmos perdendo tempo juntos. Ou seja... Você... Tem sua vida própria, e eu não me encaixo em seus planos. — Está balbuciando outra vez! — Mike a enlaçou. Nora se moldou àquele corpo delicioso e desejou com ardor que aquela não fosse à última vez. Seus olhares se encontraram. — Se as coisas fossem diferentes... — As coisas são diferentes! — Nora afirmou enfática. — Eu não sou Vicky. — Sei muito bem disso. Mas também imaginei que daria certo com ela, e não deu. Não posso arriscar a felicidade de Emily. "Ah, quem se importa com a ex-esposa dele?!" Vicky se fora, mas havia deixado um terrível legado. Desiludira Mike de tal forma que ele estava disposto a fechar para sempre seu coração, com medo de tornar a errar. — Não estou lhe pedindo nada, Mike. — Está sim. Pede algo que não posso lhe dar. Sim, o que Nora queria era seu amor, mas ele não estava pronto ou disposto a permitir-se se apaixonar. Desse modo, tentando não demonstrar sua frustração, disfarçou: — Quem sabe outro beijo? O último? — Nora... — Não diga mais nada. Beije-me, caubói. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Mike começou devagar e depois aprofundou a carícia. Hipnotizada, Nora se entregou à magia daquele momento. E, quando os braços fortes a carregaram de volta para o quarto, tentou não pensar no fato de que era muito provável que aquela seria a última vez. Ao acordar, na manhã do dia seguinte, após uma tórrida noite de amor, Mike constatou que estava só. Nora se fora. Nora se entregou de corpo e alma ao trabalho. Pela primeira vez, desde que se conhecia por gente, não tinha apetite, nem para provar suas tortas. Os últimos dias foram muito longos, as horas se arrastavam, mas prometera a si mesma que tudo iria melhorar. O que precisava fazer era esquecer Mike. Sem problema. Não deveria ser mais difícil do que esquecer como respirar. A panificação mantinha-a ocupada durante o dia, mas à noite, sozinha em casa, era atormentada pelas recordações. Seu corpo ansiava pelo toque de Mike e, sem que soubesse como, flagrava-se tentando escutar o barulho do motor da caminhonete dele estacionando a sua porta. Pensou em lhe telefonar, mas recusou-se a fazer aquele papel patético. Contudo, não se tornaria uma mulher cheia de queixumes, necessitada. Afinal, sobrevivera por vinte e oito anos sem um homem, e era capaz de lidar com isso. — Embora... — murmurou, tirando outro tabuleiro de biscoitos de canela do forno —... Seja fácil viver sem algo que nunca experimentamos. Mas, uma vez experimentado, sentimos falta quando o perdemos. — Falando com seus botões de novo? Nora dirigiu o olhar para a entrada e esboçou um leve sorriso ao ver Molly. — Olá. — Nossa! Que saudação mais calorosa para fazer uma pessoa sentir-se bem-vinda! — Quer uma torrada quentinha? — Nora apontou para uma bandeja. — Sirva-se. Molly meneou a cabeça, pegou uma cadeira e a arrastou para frente da bancada, onde Nora fatiava um rolo de massa de biscoito. — Ei! Como está quente aqui! Sinto-me em meio ao deserto do Saara. — É por causa do forno. Seus tops e short ajudavam-na a driblar a alta temperatura dentro da cozinha, mas de algum modo estava achando aquele calor reconfortante. — Você anda sumida, Nora. — Não estou sumida, Molly. Apenas muito ocupada. — Nem me telefonou para contar como foi aquela noite com Mike. Ah, já sei, não foi tão boa assim... Nora ergueu os olhos para fitar o rosto da amiga. — Na verdade, foi... — Nora parou, pousando a extremidade da faca sobre a massa. —... Estupenda! Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Meus parabéns! Trato cumprido. — E muito bem. Várias vezes. — Oh! — exclamou Molly, surpresa. — Tudo estava perfeito. — Suspirou fundo. — Até eu dizer que o amava. — Ai! — E isso resume toda a história. Como convinha a uma amiga leal e verdadeira, Molly disse a coisa certa: — Ele é um idiota! — Concordo. — Nora terminou de fatiar a massa. Em seguida, colocou as fatias sobre um tabuleiro untado. — Mas é meu idiota. — Hum... E o que pretende fazer? — Estou deixando que Mike sinta minha falta. — E está dando certo? — Eu sinto falta dele. Isso conta? Molly tomou um pedacinho de massa, levou-o à boca e falou pensativa: — Tenho um palpite. Se sente saudade dele, então Mike também deve estar sentindo de você. Que grande consolo! Pensou Nora, deslizando o tabuleiro no forno. Mike não estava sentindo falta dela o suficiente para vir à cidade. Não o vira nos últimos três dias, nem tampouco Emily. Endireitou o corpo, virou-se e encarou Molly. — O amor não é para os covardes, é? Molly meneou a cabeça. — Não. Por isso vale à pena persegui-lo. — Não sei... Nora se sentou em frente à amiga, apoiou os cotovelos na bancada, sentindo o contato do mármore frio em sua pele e desejou que aquilo ajudasse a esfriar o fogo que ainda ardia em seu interior. — Enfim, conheci o amor... Com um homem que não me quer. Isso era algo difícil de admitir. Suas irmãs estavam furiosas com Mike. Rosa voltara a ler os classificados sentimentais e seus clientes sussurravam sempre que ela aparecia no salão da frente. Todos em Tesoro comentavam sobre seu relacionamento com Mike Fallon. Porém, isso não a preocupava. O que importava era que seu trabalho não tinha graça se não pudesse contar a Mike sobre seu dia. As tardes pareciam intermináveis porque não podia ir para a fazenda ajudá-lo a exercitar os cavalos. As noites vazias porque não podia ler histórias de dormir para Emily. Sozinha na escuridão revivia tudo o que experimentara nos braços de Mike. Recordava o beijo, o toque... Tudo parecia tão real que sentia o cheiro da pele dele, as batidas de seu coração, os braços fortes a envolvê-la e o corpo másculo e potente deitado ao lado do seu. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Molly permaneceu calada, e Nora piscou, enxugando as lágrimas, que insistiam em descer pelo rosto delicado. — Ele me fez tão feliz, Molly! Poderíamos ter tudo, se Mike estivesse disposto a ser feliz comigo.

CAPÍTULO XII

Os três dias mais longos da vida de Mike arrastaram-se a passo de tartaruga. Pareciam não ter fim. Estava mal-humorado, e qualquer pessoa com o mínimo de percepção teria reparado nisso. Mas Rick, ainda nas nuvens com o nascimento do filho, mantinha-se alheio a tudo o que se passava a seu redor. — Estou lhe dizendo, Mike, que meu garoto mama mais de dois litros de leite de cada vez. — Que exagero... Mike concentrou-se na estaca da cerca. Empurrando-a com o ombro, colocou-a de novo no lugar. Aquela estaca tinha de dar problemas antes que pudesse substituí-la! E pelo visto, precisaria fazer todo o trabalho da fazenda sozinho. Olhou para Rick. O capataz apoiava-se contra o pára-lama da caminhonete, tornozelos cruzados, braços dobrados sobre o peito e um estúpido sorriso no rosto. Engraçado. Mike jamais se dera conta de como a felicidade de alguém podia ser tão irritante. — Donna fez um ótimo serviço — disse Rick, e a voz soou cheia de orgulho, ao recordar os fatos. — Você precisava ter visto. Nenhuma lágrima. Nenhum grito. Tinha uma mulher no fundo do corredor gritando o suficiente para derrubar o hospital. Mike estremeceu. Lembrou-se do nascimento de Emily, com bastante clareza. Vicky fora uma dessas escandalosas. Xingou-o de todos os palavrões que sabia e mais alguns. Reclamou com as enfermeiras, com os médicos, e não se interessou pela criança quando ela nasceu. Não queria nem amamentá-la, com receio de estragar seu corpo escultural. Sem sombra de dúvida, existiam mulheres que não nasceram para a maternidade, e Vicky era um exemplo vivo. Talvez fosse melhor para a ex-esposa se aquela gravidez acidental não tivesse acontecido. Mike, porém, jamais lamentaria o nascimento de Emily. Ao contrário da exmulher, sentia um imenso prazer em ser pai. Era como se a vida lhe tivesse dado uma nova chance de ser feliz. E, de certa forma, também fora bom para Vicky, que acabou encontrando seu rumo e fizera o favor de desaparecer do caminho dele. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Acostumara-se a contar apenas consigo e a filha, e vinha se dando muito bem assim. Até Nora aparecer. De súbito, a imagem do sorriso dela lhe veio à memória, fazendo-o contrair o maxilar. Era tão feliz antes... Bem, mais ou menos. E então ela apareceu, fazendo-o olhar para frente e notá-la, ouvi-la, desejá-la... Povoando seus pensamentos em todas as horas do dia e invadindo seus sonhos à noite. Enchera a velha casa do rancho de flores, iluminando-lhe o coração. Deixara seu toque feminino marcado naquele ambiente austero, como ferro em brasa. E... Não lhe pedira para fazer isso. — Donna foi surpreendente! — repetiu Rick, ainda extasiado pelo milagre do nascimento do bebê. Contagiado pela felicidade de seu empregado, Mike se pegou conjeturando como seria se Nora fosse à mãe de Emily. Não conseguia imaginá-la gritando ou o amaldiçoando, quanto mais rejeitando a própria filha. Parou com seus esforços na estaca e permitiu à mente vaguear mais além. Viu imagens de Nora, grávida, com a filha dele nos braços... Nora segurando a mão de Emily e sorrindo. Os três sentados à mesa da cozinha para jantar. E então deu asas à imaginação. Tão claro quanto o dia, pôde ver quatro ou cinco crianças, correndo livres na fazenda. Imaginou-se sentado na varanda ao entardecer. Nora aninhada em seus braços, sorridente, enquanto as crianças brincavam com filhotes de cachorro. Em sua fantasia, a velha casa estava toda iluminada, como uma árvore de Natal, e os sons das risadas infantis cercavam-na como um halo protetor. Do mesmo modo como vieram, as visões se desvaneceram, e Mike retornou à realidade, lutando com uma estaca de cerca e escutando as divagações de Rick. Num rompante de irritação, virou-se para o outro homem e explodiu: — Você vai me ajudar com isto ou pretende passar o resto do dia encostado nessa caminhonete?! — Desculpe! — Rick afastou-se do veículo, assumiu uma posição do outro lado da estaca e começou a empurrar. Mas, enquanto trabalhava, o capataz decidiu especular sobre a vida do patrão: — Não tenho visto Nora por aqui. Está tudo bem? Mike fulminou-o com o olhar. — Tudo na mais perfeita ordem. Podemos trabalhar agora? — Sim, senhor, chefe. — Rick baixou a cabeça, mas não antes que Mike percebesse o desconforto no olhar do empregado. Ótimo. Já perdera Nora e se, continuasse naquele humor de urso ferido, perderia os amigos também! — Estes biscoitos estão horríveis! — reclamou Emily, sentando-se no banco de passageiros da caminhonete. — Mas biscoitos com cobertura de chocolate são seus favoritos, filha. — Os de Nora são mais gostosos, papai. "Tem razão", Mike concordou em silêncio. Levara Emily a uma padaria em Monterey, mas não era a mesma coisa. Já fazia cinco dias que não via Nora, e estava quase convencido de que talvez fosse melhor assim. Para ajudar a si mesmo, deveria evitá-la. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Contudo, essa atitude não estava surtindo efeito algum. Poderia se privar de vê-la, mas continuava sentindo sua presença. Nora se infiltrara em todos os cantos de seu mundo. O amor que dedicava a sua filha. As pinturas que fizera com Emily. O cheiro feminino e excitante que ainda impregnava todos os ambientes da residência. — Nora falou que vai me ajudar a fazer uma fantasia para os jogos de primavera. — O quê? — Mike afastou os pensamentos e se concentrou no que a filha dizia. Emily suspirou dramaticamente e lhe enviou um olhar com uma expressão paciente, que só as mulheres sabem fazer. — Nora falou que vai me ajudar... — Sim, eu ouvi essa parte — interrompeu sua garotinha favorita antes que ela se alongasse demais. — Quando conversou com Nora? — Ontem. — Emily lambeu o chocolate das pontas dos dedos. — Ontem? — Hu-hum. Fazendo uma carranca, Mike perguntou: — Onde? — Na escola. Ela veio almoçar comigo. Nora fora à escola de Emily? — Desde quando Nora vem fazendo isso? — Faz bastante tempo — a menina respondeu, como se as duas almoçassem juntas havia séculos. — Gosto de Nora. Ela é tão agradável, papai! Mike encarou a filha por alguns segundos. Quanto tempo fazia que Nora ia almoçar com Emily? Por que ninguém lhe dissera nada? E por que Nora Bailey ainda continuava indo à escola? O trato deles acabara. Ela não era mais virgem, logo, o motivo que os unia não existia mais. Nora não aparecia no rancho por cinco longos dias. Ele queria evitá-la, e tinha certeza de que ela fazia o mesmo. Mas, pelo visto, não cortara seus laços com Emily. Uma centelha de esperança insinuou-se em seu peito. Entretanto, também se defrontou com a dura constatação de que, na realidade, fora um grande estúpido. Riscara Nora de sua vida. Virará as costas para tudo o que aconteceu entre eles, porque se convenceu de que era o único modo de proteger Emily. Mas, na verdade, Nora tinha um estilo próprio de cuidar de crianças. E isso envolvia manter laços que Mike estava tão interessado em cortar. — Papai? — a pequena perguntou com a voz repleta de dúvidas. — O que aconteceu para Nora não vir mais ao rancho? Como responder àquilo? Sendo sincero? De modo algum. Afinal de contas, não podia admitir para sua única filha que o pai dela era um idiota. Então, o que dizer? — Bem, Nora anda muito ocupada... — Você lhe pediu para ficar conosco? — Emily o encarou, exigindo uma resposta coerente. — Não, meu bem. Não. — Então, o que aconteceu? — Esfregou a boca suja de chocolate, tentando limpáProjeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child la. — As pessoas não ficam em nossa casa se ninguém pedir para ficarem — concluiu, com toda a doce sabedoria das crianças. — Acho que tem razão, meu amorzinho. Se tivesse aceitado a declaração de amor de Nora e retribuído, ela teria ficado? Teria se arriscado num relacionamento com um homem e sua meia família? Desejava saber a resposta para essas questões sem mesmo ter pensado sobre o assunto. Evidente que ela teria. Nora não era Vicky. Não era fútil e insensível como sua ex-mulher, mas sim divertida, inteligente, compreensiva e já amava Emily como se fosse sua própria filha. E lhe demonstrara mais amor nas últimas semanas do que conhecera em anos. Um terrível nó cresceu e se alojou em seu estômago. Os olhos escureceram de desgosto. Estivera tão ocupado protegendo a si mesmo e usando Emily como desculpa para se esconder do mundo que perdera a chance de encontrar um amor verdadeiro. E só podia culpar a si próprio por isso. Era um rematado covarde. O amor o tornara vulnerável o suficiente para convencê-lo a não correr o risco de expor-se a novos sofrimentos. Jurara jamais entregar seu coração à outra mulher para não se arriscar a sofrer outra decepção. No entanto, era preciso encarar os fatos e admitir que uma vez mais estivesse sendo alvo das teias do amor. E isso o assustava sobremaneira. Dessa vez, a dor de perder o que poderia ter tido seria bem pior. Porque o que sentia por Nora era maior e mais profundo do que qualquer outra coisa que já vivenciara antes. Ligou o motor. — Aperte o cinto de segurança, Em. — Vamos ver Nora? — a menina quis saber, esperançosa, afivelando o cinto. — Não. — Mike constatou a expressão decepcionada no rostinho da criança. Assim, estendendo o braço, ergueu o queixo da filha, obrigando-a a encará-lo, e sorriu. — Você vai para casa. Eu vou ver Nora. Existem certas atitudes que se deve tomar estando sozinho. Embora achando que a presença de Emily pudesse facilitar tudo, Mike descartou a hipótese de levá-la consigo. Queria que Nora o aceitasse. Não apenas por sua filha, mas por si próprio. Desejava com ardor saber se as palavras que ela murmurara naquele memorável momento de amor eram de fato verdadeiras e se o amava o suficiente para lhe dar uma segunda chance. Por outro lado, seu coração se contraía, receando tê-la perdido para sempre. — Vai lhe pedir para ficar conosco, papai? A voz da menina arrancou-o de seus devaneios. "Pergunte. Implore. Discuta. Por mais que isso lhe custe", disse a si mesmo, dando partida na caminhonete. Nora deu uma olhada ao redor e observou os clientes. Em seguida, desviou a atenção para a rua, através do vidro da janela da frente. O sol de primavera esparramava-se pelo chão como uma promessa do verão que se aproximava. Observou os transeuntes andando nas calçadas. A cidade estava movimentada, e tudo o que desejava fazer era fechar a padaria e correr para a fazenda. Apoiando os cotovelos sobre o balcão, imaginou-se assistindo a Mike trabalhar com os cavalos. O dorso másculo molhado de suor. Os cabelos em desalinho, caindo-lhe sobre a testa. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Sua postura transmitia força e poder. Se tentasse, poderia até sentir o calor do sol na pele e ouvir o sibilar do vento entre as árvores. O Mike imaginário virando-se e fitandoa com o mais devastador dos sorrisos. Sem poder se conter, sentiu um arrepio na espinha. — Olá, boneca. Nora foi arrancada daquele agradável devaneio para deparar com Bill Hammond. Os lascivos olhos castanhos a percorreram da cabeça aos pés, fazendo-a sentir ímpetos de cobrir os seios com as mãos. — Como está, Bill. Em que posso ajudá-lo? — Quase estremeceu ao fazer aquela simples indagação que empregava todos os dias. — Bem, eu... — Bill se inclinou sobre o display de vidro e lhe lançou um olhar que considerava uma de suas melhores armas de sedução. — Ouça meu anjo, creio que haja uma infinidade de coisas interessantes que possa fazer por mim. Nora esboçou um sorriso cortês, mas se manteve a distância. Seu coração não estava mais interessado em flertar. Mike parou do lado de fora da panificação e ensaiou pela décima vez naqueles últimos quinze minutos o que pretendia dizer a Nora. Isso é claro, se ela estivesse com disposição para ouvi-lo. Por fim, decidiu entrar. Aprumou a coluna e alcançou a maçaneta. Foi quando avistou Bill inclinando-se em direção a Nora. Uma gigantesca advertência soou em seu íntimo. Sabia que a decisão estava em suas mãos. Se não lutasse pelo que queria naquele momento, passaria o resto de seus dias se lamentando por isso. Assim, observou os movimentos galanteadores de Bill e, em resposta, frustração e raiva se misturaram dentro dele. "Eis ali seu futuro, Fallon." Se não pudesse convencer Nora de que a amava, estaria fadado a vê-la nos braços de outro homem. Um que teria o direito de tocá-la, amá-la. Que ouviria os seus segredos e compartilharia seus sonhos. Um homem que não era ele. Abrindo a porta com força, entrou. Ignorando o burburinho dos clientes sentados às pequenas mesas, olhou direto para o balcão. Seus olhares se encontraram, mas Nora conseguiu esconder tudo que estava sentindo. E isso o preocupou. Entretanto, o simples fato de fitar aqueles olhos azuis era suficiente para convencê-lo a permanecer firme e lutar para consegui-la de volta. Sentia que toda sua vida dependia daquele momento. Mas primeiro era necessário cuidar de alguns detalhes. Aproximando-se, pousou uma mão sobre o ombro de Bill. Quando o camarada se voltou, surpreso, Mike foi sucinto: — Dê o fora daqui, Bill. — O quê? — Deu um passo atrás. — Ora, não me amole! Não pode me mandar embora. Este lugar pertence à Nora, e sou um cliente. Ao redor deles, as pessoas começaram a prestar atenção. Mike percebeu os olhares interessados, mas parecia não dar à mínima. De súbito, era como se no mundo só existissem duas pessoas: ele e a mulher maravilhosa que o fitava, muito surpresa. — A única pessoa aqui que pode me mandar embora é Nora! — bradou Bill. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child Ambos a fitaram. Nora encarou Mike. — Vá embora, Bill — disse ela, convicta. Muitíssimo desgostoso Bill bateu ambas as mãos sobre o display e, com um giro de calcanhares, se afastou. No silêncio aterrador que se seguiu à saída de Bill, Mike fixou o olhar em Nora, enquanto contornava o balcão, aproximando-se o suficiente para segurar-lhe o rosto entre as mãos e beijá-la com todo ímpeto. Quando os clientes começaram a aplaudir, interrompeu o beijo, e, ignorando a multidão, afirmou ofegante: — Preciso falar com você. Os joelhos dela bambearam, mas, afinal, os beijos de Mike sempre a deixaram tonta. Acrescentando isso ao choque total de vê-lo adentrar a padaria e beijá-la na frente de quase metade da população de Tesoro, não era o suficiente para deixá-la um pouco trêmula? E agora ele queria lhe falar. Falar sobre o quê? Que a queria? Que sentira sua falta? Era maravilhoso, mas queria mais do que isso, agora que descobrira o quanto Mike a desejava. Ansiava ouvir as palavras mágicas que a transportariam ao paraíso. Esfregando os dedos nos lábios, fingiu-se de muito segura e incitou-o: — Então, fale. Mike indicou os clientes. — Em particular. Ora! Quando a cidade inteira já sabia o que estava acontecendo entre os dois! Nora fitou os clientes, que os observavam com ávido interesse, e de novo Mike. Tudo o que tivesse para lhe dizer poderia ser dito ali. Perante testemunhas. — Não. — Não? Alguém atrás deles soltou uma gargalhada. Nora meneou a cabeça e prosseguiu: — Se tem algo para me dizer, diga logo. Mike deslizou a mão pela face e esfregou a nuca. Agora não havia como retroceder. Se queria reconquistar a mulher que amava, precisava aceitar o desafio. — Não vai mesmo mudar de idéia, não é? — Não. — Certo. — Assentiu com a cabeça, acenou aos clientes e disse: — Se é necessário falar na frente de toda esta gente simpática, é isso mesmo o que farei. — Estou ouvindo. — Nora o encarou, sem piscar. — Eu estava errado — revelou, imaginando que o melhor modo para começar era admitir o pior. — Sobre o quê? — Acho que você deveria explicar... — murmurou. — Não, Mike — retrucou, inclinando a cabeça. — Creio que você deve fazer isso. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Tem toda a razão. — Sorriu, meneou a cabeça, ergueu as mãos e, em seguida, deixou-as cair ao longo do corpo. — Bem, outra vez... Você estava certa acerca de tudo o que me falou, também. As pupilas de Nora brilharam, e o sorriso se alargou. Aquela pequena centelha de esperança que se instalara em seu coração no momento em que ele entrara na panificação agora parecia transbordar por seus poros. — Muito bem, estou gostando dessa conversa. — E tem mais — continuou ele. No mesmo instante, segurou-a pelos ombros. Os dedos fortes pressionaram a pele macia, e uma quentura intensa apoderou-se dela, espalhando-se pelo corpo todo. — Até que enfim compreendi que preciso de você. Minha vida não tem o menor sentido se não estiver ao meu lado, Nora. Desde que partiu de meu rancho, não tive um minuto sequer de sossego. Não consigo me concentrar no trabalho. Meus dias são vazios e sem cor. Nora engoliu em seco e mordeu o lábio inferior, abstendo-se de falar. Agora era hora de escutar e rezar para que Mike dissesse o que tanto precisava ouvir. — Nada do que aconteceu antes tem a ver com você. Tudo fica melhor quando está por perto, querida. Sou melhor quando estou ao seu lado. Eu te amo, Nora. Suspirando de felicidade, ela saboreou aquelas frases. — Eu não esperava... Não queria... — Mike torceu a boca e a segurou com mais força, como se ela pudesse tentar escapar. — Contudo, não pude evitar. Isto é amor verdadeiro, e é mais intenso do que julguei ser capaz de sentir. Mordendo o lábio com mais força, Nora se conteve. Ainda precisava ouvir mais uma coisa, aquilo que era imprescindível para ela. — Por favor, case-se comigo. Seja a mãe de Emily e me ajude a lhe dar um monte de irmãozinhos. Vamos constituir uma família sólida e feliz. Nora sentiu uma alegria tamanha que achou que ia desmaiar. De uma hora para outra, seu mundo se tornara colorido. Podia antever o porvir fantástico que tanto almejara, agora finalmente a seu alcance. Poderia sonhar em ter sua própria família e ser feliz. Por um instante, estudou aqueles irresistíveis olhos verdes e, pela primeira vez, notou um brilho apaixonado. Mas, mesmo assim, não conseguiu evitar a pergunta: — Antes de lhe responder, tenho de saber, Mike. O que o fez mudar de opinião? Mike dirigiu um olhar rápido à platéia, e mudou de posição, de forma que só pudesse ver o rosto dela. — Acabei por compreender algo que estava muito evidente. — O quê? — Eu tinha... Medo de amá-la. — Foi como se acabasse de tirar um peso de cima dos ombros. — Estava assustado com a idéia de acreditar outra vez... De me arriscar. E então, hoje percebi que, se não corresse esse risco, perderia você para sempre. Puxando-a, enlaçou-a pela cintura. Quando Nora inclinou a cabeça, disse com suavidade: — Não posso mais viver sem você. Projeto Revisoras

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child — Oh, Mike, eu... Ele riu. — Ei, sei o quanto lhe custou ficar calada durante os últimos minutos! Mas agüente só mais um pouquinho, para que eu possa fazer tudo como manda o figurino, certo? Nora fez que sim, entre risos e lágrimas. — Eu te amo, Nora. — A sinceridade estampava-se em seu semblante. — Quer se casar comigo? O pulso dela disparou, e Nora achou que não conseguiria se manter de pé. Tinha vontade de beliscar-se para se certificar de que não estava em sua cama, sonhando. Ouvir Mike dizer tudo aquilo significava que, enfim, realizaria o grande sonho que sempre alimentara, e que concretizaria esse sonho em grande estilo. — Posso falar agora? — Depende do que irá dizer. — Quero dizer "sim", caubói. Mike abriu os lábios num sorriso radiante, fazendo-a sentir aquele frio no estômago tão familiar. — Então fale Nora. — Sim! Com um gesto súbito, Mike a tomou nos braços como se fosse uma criança. — Acho que foi a resposta mais curta que já ouvi de você. Nora enlaçou-o pelo pescoço e o beijou de leve. Então, muito sorridente, afirmou: — Não se acostume com isso, porque preciso falar. Ficar calada este tempo todo foi um verdadeiro martírio... Já que... Que tenho tanta coisa para lhe dizer e saber... Para lhe contar... Senti tanto sua falta e a de Emily... Não pode imaginar o esforço supremo que tive de fazer para não sair correndo daqui e ir para a fazenda e... Ele gargalhou. — Está gaguejando, Nora. — Nesse caso, beije-me, caubói. E não ouse parar! Suspirando de felicidade, Nora sentiu os lábios quentes de Mike sobre os seus. A princípio, com carinho, e depois com volúpia. Sentiu um prazer inigualável tomar conta de seus sentidos. A platéia, enternecida, foi ao delírio.

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Momentos Íntimos 160 * Beije-me Agora! * Maureen Child

MAUREEN CHILD nasceu na Califórnia e adora viajar. Toda chance que encontra ela e o marido aproveitam para embarcar em mais uma viagem de pesquisa. Autora de mais de sessenta livros, Maureen adora um final feliz e ainda jura ter o melhor emprego do mundo. Mora no Sul da Califórnia com seu marido, dois filhos e um golden retriever que tem mania de grandeza.

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