N OT Í C I A S A n o
1 6 • n 0 7 3 | Dezem b ro - 2 0 1 9 | www . de c e a . g ov. br
PRIMEIRA TORRE DE CONTROLE DE AERÓDROMO REMOTA DA AMÉRICA LATINA
NOTÍCIAS - Ano 16
•
n 0 73 | Dezembro 2019 | www.decea.gov.br
04 REPORTAGEM
Pioneirismo é a nossa marca
Mais uma vez, o Brasil conquista um marco histórico com a implantação da primeira Torre de Controle de Aeródromo Remota da américa Latina.
10 REPORTAGEM
04
O perigo vem pelos ares
Campanha de testes coordenada pela CISCEA testa as soluções mais avançadas do mercado em termos de identificação e contenção de drones.
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REPORTAGEM
APP Guarani - segurança é questão de confiança
Toda parceria conta com disposição mútua, com a busca por nivelamento de conhecimentos e com
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muita confiança. 18 ARTIGO
Fronteiras do Alto Solimões O desafio de quem trabalha onde o Brasil termina para você voar
24 ARTIGO
Transformação digital nos órgãos operacionais do DECEA
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Mudança incrementa o padrão digital e a qualidade do serviço prestado ao usuário do controle do espaço aéreo
29 ARTIGO
Desafios e oportunidades do gerenciamento terminológico
Uniformização evitará inconsistência terminológica nos textos produzidos pelas várias
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entidades do segmento da aviação
Expediente Informativo do Departamento de Controle do Espaço Aéreo - DECEA produzido pela Assessoria de Comunicação Social - ASCOM/DECEA Diretor-Geral: Tenente-Brigadeiro do Ar Jeferson Domingues de Freitas Assessor de Comunicação Social e Editor: Paullo Esteves - Coronel Aviador Reformado (MTB 38412 RJ) Coordenação de pauta e edição: Daisy Meireles (RJ 21523 JP) Redação: Daniel Marinho (MTB 25768 RJ) Gisele Bastos (MTB 3833 PR) Telma Penteado (RJ 22794 JP)
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Projeto Gráfico/Diagramação: Aline da Silva Prete (MTB 38334 RJ) Fotos: Fábio Maciel (RJ 33110 RF) Luiz Eduardo Perez (RJ 201930 RF) Contatos: Home page: www.decea.gov.br Intraer: www.decea.intraer Email: contato@decea.gov.br Endereço: Av. General Justo, 160 Centro - CEP 20021-130 - Rio de Janeiro/RJ Telefone: (21) 2101-6031 Editada em dezembro - 2019
Nossa capa Na foto de Luiz Eduardo Perez Batista, a 2S BCT Jéssica (DTCEA-SC) na ativação da primeira R-TWR da América Latina.
EDITORIAL
Pioneirismo, qualidade e confiança
E
sta edição da Aeroespaço traz em sua capa o marco histórico para o controle de
tríplice fronteira (Brasil, Colômbia e Peru). O DECEA vem cumprindo seu papel na
tráfego aéreo brasileiro, quando destacamos
multiplicação de informação e conhecimento
a inauguração da primeira torre de controle
em benefício da sociedade para utilização do
remota da América Latina.
espaço aéreo de forma consciente e responsável
Implementada em Santa Cruz, no Rio
por drones. Nas páginas 10 a 17, publicamos
de Janeiro, a R-TWR é a primeira iniciativa do
uma reportagem sobre a campanha de testes
gênero no Brasil a ser capitaneada pelo DECEA.
coordenada pela CISCEA, para as soluções
A tecnologia, já empregada em alguns países
mais avançadas do mercado em termos de
do mundo, é um tema relativamente novo sob
identificação e contenção de drones.
o ponto de vista de regulação normativa e da documentação que trata do assunto. Outra grande novidade – que teve início
Em outro artigo, apresentamos os desafios e as oportunidades do gerenciamento terminológico. O assunto trata da uniformização
com um Acordo de Cooperação Mútua assinado
que evitará inconsistência terminológica nos
entre Brasil e Paraguai – foi o aumento da
textos produzidos pelas várias entidades do
eficácia do controle de tráfego aéreo na região de
segmento da aviação, como o DECEA e a ANAC.
fronteira que cobre as cidades de Foz do Iguaçu
Um dos diferenciais desta base é ser uma
e Ciudad del Este. A inauguração do Controle
ferramenta única no mercado, desenvolvida
de Aproximação Guarani contribuirá para a
mediante consulta a publicações oficiais, isto é,
melhoria das operações aéreas na região da
obras publicadas por autoridades de aviação no
tríplice fronteira.
Brasil.
Nas páginas seguintes falamos sobre a
Esta última edição da Aeroespaço de 2019
mudança que está incrementando o padrão
nos dá a oportunidade de desejar um novo ano
digital e a qualidade do serviço prestado
rico de novidades para todos. Sem vocês, não seria
ao usuário do controle do espaço aéreo: a
possível planejar, gerir e executar todas as nossas
transformação digital nos órgãos operacionais do
atividades.
DECEA.
Agradeço a contribuição de todos para que
Destacamos, ainda nesta edição, o serviço prestado pelo Destacamento de Controle do Espaço Aéreo de Tabatinga (AM), localizado na
o espaço aéreo continue sendo controlado com qualidade e segurança. Feliz ano novo!
Tenente-Brigadeiro do Ar Jeferson Domingues de Freitas Diretor-Geral do DECEA
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REPORTAGEM
Pioneirismo é nossa marca Mais uma vez, o Brasil conquista um marco histórico com a implantação da primeira Torre de Controle de Aeródromo Remota da América Latina Por Gisele Bastos Fotos de Luiz Eduardo Perez
L
onge de ser clichê, o uso de novas tecnologias traz transformações tão intensas e profundas que, em certos momentos, nos perguntamos como era a vida sem as facilidades do mundo moderno. Produtos cada vez menores, funcionalidades inéditas, descoberta de novos medicamentos, interatividade, nas mais diversas áreas do conhecimento. O acesso a produtos e serviços na ponta dos dedos a partir das telas touch screen passa a impressão de disponibilidade a partir de um toque, imediatamente.
O controlador de tráfego aéreo tem a visão de 360º das 16 câmeras da R-TWR 4
Pensar sobre as melhores práticas, como a redução de custos, a diminuição de poluição ao meio ambiente ou, ainda, a otimização de recursos humanos, é prerrogativa sine qua non de qualquer profissional do mercado de trabalho, nos dias de hoje se tornou prática comum. O progresso está intimamente ligado a importantes descobertas que podem ajudar ou mesmo dar as respostas. Atrás destas “soluções”, têm sido criados
ARTIGO
resultados extraordinários. Aqueles que já passaram dos 40 anos de idade, certamente são capazes de trazer à memória a imagem do primeiro computador digital, criado há mais de 70 anos. Seu peso era de 30 toneladas e 180 m² de área, algo completamente impensável para a realidade dos anos 2000. Na aviação não tem sido diferente. Depois de se tornar piloto de balões esféricos na França, Alberto Santos-Dumont iniciou, no ano de 1898, experiências de dirigibilidade com balões alongados, equipados com motor, hélice e leme. Muitas tentativas, acertos e prêmios depois, realizou um voo de 200 metros com o Demoiselle, o menor avião do mundo, precursor do ultraleve, em 17 de novembro de 1907. Considerado o pai da aviação, Santos-Dumont é reconhecido internacionalmente como o maior aeronauta do mundo. Na década de 20, as aeronaves realizavam apenas voos visuais, o que acontece quando o piloto usa referências no terreno para balizar sua navegação. Com o crescimento da atividade aérea foram criadas as aerovias, os centros de controle de área (ACC), as torres de controle de aeródromo (TWR) e as regras de voos. Também passaram a integrar a aviação equipamentos destinados a apoiar aeronaves na navegação em rota, em áreas de controle terminal (TMA) ou em manobras de pouso e decolagem. Assim sur-
giram diferentes auxílios rádio: NDB (radiofarol não direcional), VOR (radiofarol omnidirecional em frequência muito alta), DME (equipamento para medida de distância), ILS (sistema de pouso por instrumentos), RADAR (equipamento de radiodetecção que fornece informações de distância, azimute ou elevação de objetos), VHF (faixa de frequência muito alta) e auxílios visuais luminosos: ALS (sistema de luzes de aproximação), PAPI (sistema indicador de rampa de aproximação de precisão) e VASIS (sistema indicador de trajetória de aproximação visual), para citar alguns. No Brasil, a navegação aérea está balizada por mais de 900 auxílios, que operam 24/7 em uma área de 22 milhões de quilômetros quadrados, território que a Força Aérea Brasileira (FAB) protege por meio das ações de controlar, defender e integrar: a Dimensão 22. Subordinado ao Comando da Aeronáutica, o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) é responsável pelo controle do espaço aéreo, atuando como provedor dos serviços de navegação na viabilização de voos e ordenação dos fluxos de tráfego aéreo no País. Ocupando posição de destaque no cenário da aviação mundial, o Brasil foi reeleito para participar de Grupo I da Organização da Aviação Civil Internacional (OACI), espaço reservado aos países com maior representatividade no transporte
2S Simone foi testemunha da ativação da tecnologia de torre remota no Brasil
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aéreo internacional. A votação aconteceu durante a realização da 40ª Assembleia-Geral no final de setembro deste ano, em Montreal, no Canadá. O Brasil é signatário da OACI desde sua fundação, em 1944. Desde então, tem contribuído significativamente não apenas com o cumprimento das melhores práticas na aviação, mas, principalmente, atuando na implantação de novas tecnologias na América Latina.
do comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro do Ar Antonio Carlos Moretti Bermudez.
A posição de vanguarda (que vem do francês avant-garde) designa o pelotão que vai à frente, não poderia estar mais de acordo com a posição que o DECEA assume perante seus pares latinos. O mês de outubro, quando é comemorado o dia da Força Aérea Brasileira e do aviador, foi marcado por um grande evento. Uma marca histórica. No dia 18 de outubro de 2019, entrou em operação a primeira Torre de Controle Remota (do inglês, Remote Air Traffic Services R-TWR) da América Latina, no aeródromo de Santa Cruz, zona oeste do Rio de Janeiro.
JAMBOCK ZERO NOVE (piloto): PRIMAVE, JAMBOQUE ZERO NOVE PONTO DE ESPERA PISTA 23 [DOIS TRÊS] PRONTO. R-TWR-SC (controladora): JAMBOCK ZERO NOVE, A SUA AERONAVE É A PRIMEIRA A SER CONTROLADA PELA TORRE REMOTA DE SANTA CRUZ. UM MARCO PARA A FORÇA AÉREA BRASILEIRA E PARA O BRASIL. JAMBOCK ZERO NOVE (piloto): JAMBOCK ZERO NOVE, CIENTE, É UMA HONRA PARTICIPAR DESSE MOMENTO HISTÓRICO.
O lançamento da prestação do serviço remoto aconteceu durante a entrega da medalha Ordem do Mérito Aeronáutico (OMA), condecoração concedida pela FAB às personalidades civis e militares, brasileiras ou estrangeiras, que se destacaram no exercício da sua profissão ou em reconhecimento aos serviços prestados à Nação. O evento contou com a presença do presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e
Para a Sargento Jéssica, o protagonismo deste momento transportou-a para as experiências vividas no passado, que a fizeram sentir um profundo sentimento de gratidão. “Tenho muito orgulho em servir a Força Aérea Brasileira. Fiquei honrada e lisonjeada em participar deste momento, um marco para FAB e o Brasil. Levarei esta experiência comigo para sempre”, revelou a controladora.
Durante a cerimônia foi apresentado um vídeo com a primeira mensagem trocada entre controlador e piloto na inauguração do serviço, a 2º Sargento Básico em Controle de Tráfego Aéreo (BCT) Jéssica Gomes da Rocha Souza Barbosa e o Capitão Aviador André Vianna Vasconcelos Justo, do Primeiro Grupo de Aviação de Caça (1º GAvCa - Senta a Púa).
A operação teve ainda a participação da 2º Sargento BCT Simone Rosa Oliveira Silva Borrigueiro e do 1º Sargento BCT Vagner Luis Cruz de Farias.
Implantação e operacionalização A torre remota de Santa Cruz é a primeira iniciativa do gênero no Brasil a ser capitaneada pelo DECEA. A tecnologia, já em utilização em alguns países do mundo, é um tema relativamente novo sob o ponto de vista de regulação normativa e da documentação que trata do assunto. De acordo com o DOC 4444 da OACI (Procedimentos para os Serviços de Navegação Aérea - Gerenciamento de Tráfego Aéreo ou PANS-ATM), a torre remota é uma instalação geograficamente independente, que faz a observação indireta do aeródromo e de suas proximidades por meio de um sistema de vigilância visual. 6
No DTCEA-SC, o efetivo conversa em videoconferência com o comandante da Aeronáutica, após o término da OMA
É exatamente este modelo que está sendo aplicado em Santa Cruz, onde a torre convencional está sendo substituída pela remota. A estrutura externa ao prédio da nova R-TWR possui 16 câmeras fixas em uma torre de antena metálica, duas delas com tecnologia Pan Tilt Zoom (PTZ), que torna possível a mudança de enquadramento, ou melhor, o aumento da imagem em até 24 vezes para dar mais nitidez a objetos localizados a alguns metros de distância. Estas câmeras fixadas na área externa estão interligadas a 14 monitores de 55 polegadas de altíssima definição, que proporcionam uma visão 360 graus da área a ser controlada na parte interna da R-TWR. Será realizada a mesma atividade de controle prestada em uma torre convencional: informação de voo, prestação do serviço de alerta, autorização para pousos, decolagens e cruzamentos, orientação para o taxiamento de aeronaves, além da disponibilização de quaisquer informações necessárias à condução segura das operações aéreas, como dados meteorológicos e informações aeronáuticas. A diferença é que o controlador não fará a observação direta da pista, as operações serão visualizadas pelo conjunto de câmeras e o controlador terá a visão completa do aeródromo. “A visualização a partir de displays de controle permite a integração entre os sistemas necessários à operação, o que aumenta significativamente a consciência situacional do controlador de tráfego aéreo”, detalhou o presidente da Comissão
de Implantação do Sistema de Controle do Espaço Aéreo (CISCEA), Major-Brigadeiro Engenheiro Fernando Cesar Pereira Santos. O processo de construção foi acompanhado de perto pelo diretor-geral do DECEA, TenenteBrigadeiro do Ar Jeferson Domingues de Freitas, e demais oficiais-generais do Departamento. “Este projeto é uma marca para o nosso País”, descreveu o diretor-geral, em entrevista à Aeroespaço.
O início do processo Foram aproximadamente seis meses de construção em um tempo recorde para equipar a torre e tornar exequível a utilização desta nova tecnologia, a primeira a ser estabelecida no Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB). No entanto, segundo o coordenador do grupo de trabalho (GT) para implantação da Torre Remota em Santa Cruz (SBSC), 1º Tenente Especialista em Controle de Tráfego Aéreo Claudionor Silva de Macêdo, o projeto começou em 2017, quando se reuniram representantes de diversas áreas para estruturar os passos necessários para operacionalização e normatização de uma R-TWR. Desde então, passaram a ser realizadas reuniões regulares. Ainda em 2018, o projeto passou por modificações estruturais que ganharam força nos últimos seis meses, quando foi definida a data da entrega da operação da R-TWR: outubro de 2019. 7
Com o cronograma estabelecido, as empresas responsáveis pela execução da obra, gerenciadas pela CISCEA – responsável pelo planejamento, implantação e atualização de projetos em todo o SISCEAB – não mediram esforços para o cumprimento das metas estabelecidas.
inauguração fosse possível no dia de hoje. TenenteBrigadeiro Domingues, obrigado pelo esforço. Vocês são os primeiros controladores, eu sou o primeiro comandante a receber a torre remota. Estamos felizes!” - cumprimentou o Tenente-Brigadeiro Bermudez.
O engenheiro responsável e gerente de projetos da CISCEA, Renato di Iulio, descreveu sua experiência com a obra: "Nos mais de 15 anos de experiência com gerenciamento de projeto, esse certamente foi o mais desafiador. Implantamos o primeiro sistema de visualização por câmeras para um torre de controle dentro do prazo definido para entrega”, confidenciou.
O DTCEA-SC é responsável pela coordenação de tráfego aéreo do aeródromo de Santa Cruz, pelo acionamento de aeronaves de busca e salvamento (SAR, do inglês Search And Rescue) e de defesa aérea. O Destacamento exerce, ainda, a função de orientação das aeronaves que cruzam o interior da baía de Sepetiba, como, por exemplo, as que se deslocam do Rio de Janeiro para Angra dos Reis e Parati. Também dá suporte à operação da Terminal Rio de Janeiro (TMA-RJ), por meio de um radar que fornece informações de distância, azimute ou elevação de objeto, que é responsável, ainda, por auxiliar a operação reduzida e, consequentemente, otimizar o fluxo de tráfego aéreo no Rio de Janeiro e em São Paulo. Além disso, dispõe de um Radar de Aproximação de Precisão (PAR) usado para determinar a posição de uma aeronave durante a aproximação final e, em distância, em relação ao ponto de toque da aeronave na pista de pouso.
O primeiro obstáculo a ser vencido foi o tempo de execução, que teve início com a terraplanagem seis meses atrás. O modelo de construção adotado foi o de um container, incluindo espaços e funcionalidade, agregando todas as especificidades necessárias ao seu funcionamento. Uma vez concluída a infraestrutura, o próximo passo foi a instalação do sistema de comunicação para a transmissão de mensagens, técnicas e operacionais, entre uma aeronave e uma estação de solo, o sistema ACAMS (do inglês Airport Control and Monitoring System), além da central de áudio, do gravador e das comunicações em VHF e telefonia. “Foi, sem dúvida, um imenso desafio, que demandou o máximo esforço dos profissionais e das empresas envolvidas”, explicou o Major-Brigadeiro Fernando.
Valor agregado O reconhecimento aos esforços empreendidos foi compartilhado pelo diretor-geral do DECEA: “Agradeço a CISCEA e demais envolvidos no projeto, as indústrias parceiras, que trabalharam, inclusive aos domingos, em Santa Cruz, para que este projeto estivesse disponível na data da inauguração”. O mesmo sentimento foi manifestado pelo comandante da Aeronáutica, que após o término da cerimônia da OMA em Brasília, conversou por videoconferência com a Sargento Jéssica e com o comandante do Destacamento de Controle do Espaço A precisãoAéreo do GAD apontar nas Major Aviador de ao Santa Cruzobstáculos (DTCEA-SC), superfícies próximas a aeródromos é um dos Bruno Michel Marcondes Alves.
ganhos operacionais da ferramenta
“Parabéns aos que se envolveram para que essa
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O efetivo do DTCEA-SC no ambiente operacional da torre remota
“É motivo de muito orgulho para os profissionais do Destacamento participar de um momento como este. Para nós, não deixa de ser um ponto de reconhecimento e valorização, que motivou as pessoas a fazerem esta disruptura no conceito da prestação de serviço de torre”, declarou o Major Alves, comandante do DTCEA-SC. Nas palavras do Tenente Macêdo, coordenador do GT de implantação, o benefício imediato da operação remota é a acumulação de experiência: “Agregaremos conhecimento técnico ao processo de estruturação normativa, que será disponibilizado futuramente à comunidade aeronáutica. Seremos capazes de elaborar publicações que norteiam o processo de implantação da modalidade remota de controle de aeródromo como opção viável aos usuários do SISCEAB”, pontuou. Para o diretor-geral, a inauguração da torre remota significa uma nova página, representa um salto de qualidade na prestação de serviços, seja em termos de segurança operacional, avaliação de conformidade ou na diminuição de trabalho para o controlador. “Esta é uma marca histórica para o País”, completou o Tenente-Brigadeiro Domingues.
Parcela da aviação nacional O aeródromo de Santa Cruz está abarrotado de memórias da Força Aérea Brasileira. Em dezembro de 1936, foi inaugurado o primeiro aeródromo dedicado à operação de dirigíveis na América Latina, recebendo o nome de Aeroporto de Dirigíveis Bartolomeu de Gusmão, em homenagem ao padre brasileiro. Depois de poucos meses de operação as terras do aeroporto foram doadas ao então ministério da Aeronáutica e, em 1942, passou a integrar o local o Primeiro Regimento de Aviação (1º RAV), responsável por missões de patrulha marítima e escolta à navegação de comboios. Foi quando a operação do aeródromo passou a ser de uso estritamente militar. Um ano depois, o governo enviou ao local uma unidade aérea de combate. Assim, de forma estratégica, foi criado o Primeiro Grupo de Aviação de Caça (1º GAvCa), visto como unidade de treinamento para criar uma reserva de pilotos para atuação na guerra. À época, o grupo operava as aeronaves P-47 Thunderbolt. Atualmente, a operação é feita em F5-M. Foi do 1º GAvCa, hoje 1º Esquadrão do 1º GAvCa - Senta a Púa, a prerrogativa de ineditismo ao abrir caminho para a operação da primeira torre remota da América Latina. Ajudam a contar ou a preservar a história da aviação em outras organizações militares que passaram a compor a Base Aérea de Santa Cruz (BASC) ao longo dos anos: Prefeitura de Aeronáutica de Santa Cruz (1954), 1º Grupo de Aviação Embarcada (1957), 3º Esquadrão Misto de Reconhecimento e Ataque (1972), 1º Grupo de Comunicações e Controle (1982), 1º Esquadrão do 16º Grupo de Aviação (1990), 2ª Esquadrilha de Ligação e Observação (1995), 4º Esquadrão do 7º Grupo de Aviação (1998) e o 3º Esquadrão de Transporte Aéreo (2017). Mais uma vez, de posse da prerrogativa de ineditismo, Santa Cruz recebeu os cumprimentos do comandante da Aeronáutica: “Aos que ocupam a console, sorrindo e vibrando com este momento histórico, este é um marco no controle de tráfego aéreo no Brasil e, porque não dizer, no mundo. Novamente, seremos referência de excelência no controle do espaço aéreo brasileiro”, conclamou.
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REPORTAGEM
O perigo vem pelos ares Campanha de testes coordenada pela CISCEA testa as soluções mais avançadas do mercado em termos de identificação e contenção de drones Por Gisele Bastos Fotos: Luiz Eduardo Perez Por Ricardo Jatobá Figueiredo e Fábio dos Santos Leitão
A
té parece, ou pode ser, um brinquedo. Alguns pesam cerca de 250 gramas e são vendidos para entretenimento de crianças. Seu custo pode ser de quinhentos e tantos reais ou ultrapassar facilmente a casa de alguns, ou muitos, milhares de reais. E, assim, o mercado de drones tem se tornado cada vez mais popular, o que talvez se deva ao fascínio que a “altura” exerce sobre as pessoas. Afinal, olhar a vida sob a perspectiva do alto traz, literalmente, uma visão mais abrangente do todo. Fato concreto é que a utilização destes objetos voadores tem ganhado cada vez mais adeptos e simpatizantes. Com a popularização destes equipamentos surgiram regras, legislação específica e um sistema exclusivo para solicitação de acesso ao espaço aéreo. No final de 2016, o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) editou pela primeira vez a Instrução do Comando da Aeronáutica – ICA 100-40, que trata das aeronaves não tripuladas e o acesso ao espaço aéreo brasileiro. No ano seguinte, 2017, a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) publicou os requisitos para aeronaves não tripuladas de uso civil: o Regulamento Brasileiro de Aviação Civil Especial (RBAC-E) nº 94, e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), responsável pela regulamentação e fiscalização do uso do espectro de radiofrequências, lançou um Manual de Orientações para Homologação de Drones. Isto porque este tipo de equipamento utiliza, tanto na aeronave quanto no controle remoto, um transmissor de radiofrequência que precisa passar por um processo de avaliação de conformidade para evitar interferências fora da faixa para as quais tenha sido desenvolvido. O selo de homologação é imprescindível, caso não o solicite, o usuário estará descumprindo o Regulamento para Certificação e
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Homologação de Produtos para Telecomunicações da Anatel. Mas esta não é a única obrigatoriedade. Aeronaves acima de 250 gramas devem ser cadastradas e identificadas pela ANAC no Sistema de Aeronaves Não Tripuladas (SISANT). Este registro é necessário, independente do tipo de uso, se recreativo ou profissional. Também é necessário possuir um certificado de aeronavegabilidade, que dependerá da classe e tipo de operação. De acordo com dados de outubro de 2019, atualmente existem 78.648 drones cadastrados na ANAC, dos quais 49.229 para uso recreativo e 29.419 para uso laborativo. Um aumento de 75%, se considerado o número de cadastros dos dois últimos anos, o que mostra a franca expansão do setor. Ao DECEA cabe a regulamentação do espaço aéreo de drones e dos demais veículos aéreos. Para facilitar este trâmite, de cadastro e requerimento para uso do equipamento, o DECEA criou o Sistema de Solicitação de Acesso de Aeronaves Remotamente Pilotadas (SARPAS), através do
qual o usuário pode fazer seu pedido pela internet. Lançado em dezembro de 2016, o SARPAS já ganhou novas versões e atualizações em adequação ao crescimento do mercado. Desde então, o DECEA vem desenvolvendo campanhas de conscientização quanto a responsabilidade do usuário em relação à segurança, tanto a sua, como a de pessoas próximas. É regra: drones não podem ser utilizados em áreas de intensa aglomeração e em locais perto de aeródromos. Existem áreas específicas para a prática do aeromodelismo, a segurança é pré-requisito fundamental para a operação. Assim, o DECEA tem colaborado no sentido de ministrar palestras em várias cidades brasileiras na divulgação das boas práticas e sobre a regulamentação. Só em 2019, aconteceram participações no 1º Simpósio Drone Master na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na capital fluminense; no Fórum de Empresários de Drones, realizado em São Paulo; no Simpósio Integrado de Segurança Operacional do Rio de Janeiro; no DroneShow, também em São Paulo; além de palestras no Exército, Marinha e forças auxiliares. O DECEA também tem sido precursor no debate sobre as recentes tecnologias de contenção de drones em locais considerados de risco. Em maio deste ano, por exemplo, realizou, em parceira com o Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo (SRPV-SP), o 1° Simpósio de Tecnologias Antidrones – Aspectos Legais, no qual foram mostradas as tecnologias de identificação, detecção, monitoração e neutralização de drones. Ainda durante o evento, o diretor-geral do DECEA, Tenente-Brigadeiro do Ar Jeferson Domingues de Freitas, anunciou a realização de uma campanha de testes para validação das tecnologias exibidas pelas empresas participantes. Assim, em julho de 2019, tiveram início os testes em local próximo à área operacional do Aeroporto Internacional de São José dos Campos – Professor Urbano Ernesto Stumpf, no sítio de um VOR desativado. O trabalho, coordenado pelo Tenente-Coronel R1 Elton Bublitz, do Setor de Radiodeterminação, da Divisão Técnica da Comissão de Implantação do Sistema de Controle do Espaço Aéreo (CISCEA), contou com o apoio de militares do SRPV-SP, do Destacamento de Controle do Espaço Aéreo de São José dos Campos (DTCEA-SJ), do Primeiro Esquadrão do Primeiro Grupo de Comunicações e Controle (1º/1º GCC) e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (INFRAERO). Igualmente contribuíram para a realização da campanha de testes o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), o Instituto de Aplicações Operacionais (IAOP), a
Universidade Federal de Itajubá (Unifei), a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a Associação Brasileira de Multirrotores (ABM), entre outros.
Apoio irrestrito “Foi um longo trabalho de preparação, considerando segurança operacional, análise preliminar, redução do escopo e identificação de perigos. A operação era importante para o DECEA e para o Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB) e os dados da pesquisa também, principalmente por trazerem benefícios para os aeroportos do Brasil”, arbitrou o Capitão Especialista em Controle de Tráfego Aéreo Alessandro Geronimo Bonani, comandante do DTCEA-SJ. Ao longo de mais de quatro meses de testes, a contribuição dos controladores de tráfego aéreo da Torre de Controle de São José dos Campos, por meio das coordenações operacionais para viabilidade de operação, na maior parte das vezes segregada, foi diária. Devido à proximidade do aeroporto não era possível uma operação simultânea de uma aeronave tripulada e dos testes antidrones. Mas, graças a este trabalho coordenado, não houve nenhum tipo de interrupção nas operações aéreas, seja nos voos de ensaio e de certificação ou no treinamento e, ainda, no transporte aéreo regular de São José dos Campos. “Esta é uma área bastante peculiar. Temos a sede da Embraer, o Instituto de Pesquisas e Ensaios em Voo (IPEV) e o aeroclube. Fizemos um gerenciamento macro naquela região para não trazer nenhum perigo para a aviação nem para a população de áreas próximas habitadas”, pontuou o chefe do SRPV-SP, Coronel Aviador Anderson da Costa Turola. A participação do Aeroclube de São José dos Campos foi fundamental para acesso ao sítio, local de instalação dos equipamentos, para as equipes de pilotos de drones e das empresas partícipes durante o período de testes, na demonstração de seus sistemas e tecnologias. Da mesma forma, o apoio estrutural provido pelo 1°/1° GCC, que montou um shelter com geradores para provisão de energia elétrica e comunicação, rádios, antena VHF, refletores e refrigeração. Uma equipe do Primeiro Grupo de Comunicações e Controle (1º GCC) permaneceu de serviço full time para prover quaisquer necessidades. O Depósito Central da Aeronáutica (DCI), com sede no Rio de Janeiro, forneceu a barraca de campanha com banheiros para a equipe de serviço e o Grupo de Segurança e Defesa de São José dos Campos (GSD-RJ) disponibilizou militares para atuação na segurança do local. Não menos importante foi a cooperação da empresa 11
Thales, na preparação do terreno utilizado como área de testes, bem como na realização de melhorias na estrada de acesso ao sítio.
ram em consideração a distância em que o “alvo” era identificado e qual o tempo de reação para as medidas de contenção.
Antes do início dos testes, a CISCEA também solicitou à Anatel autorização para uso do espectro eletromagnético. Desta forma, foi concedido emprego temporário do espectro para que as empresas utilizassem seus jammers (bloqueadores de sinais de radiocomunicações), equipamentos que não possuem certificação para uso nos aeroportos do País. Também foi necessária coordenação da CISCEA junto à Receita Federal na chegada destes materiais ao Brasil, uma vez que houve autorização apenas para permanência temporária. Devido às dificuldades no cumprimento de alguns procedimentos alfandegários, algumas empresas não conseguiram participar dos testes.
A ABM, entidade que reúne aficionados por drones, contribuiu com demonstrações e testes de avaliação de sistemas de contenção. Vários associados, de forma voluntária, pilotos profissionais que utilizam o equipamento de forma recreativa, estiveram à disposição da CISCEA para agendamento de testes. Foram disponibilizadas desde pequenas aeronaves (com peso abaixo de 250g) até aeronaves limítrofes da classe III (250g-25quilos), de várias marcas e modelos existentes no mercado de multirrotores.
Demonstração de tecnologias Antes do início das operações, a CISCEA entregou aos interessados um Guia de Ação para Testes em Campo de Sistemas de Detecção, Identificação e Contenção de Drones no Aeródromo de São José dos Campos (SP), com as orientações necessárias à participação de cada um. Foi disponibilizado o mesmo período de tempo, de uma semana, para demonstração do conceito operacional dos produtos, metodologia utilizada no sistema de detecção e na contenção dos drones. Ao todo, oito empresas demonstraram seus produtos. A Techshield participou nos testes de campo no período de 1 a 5 de julho. Em seguida, participou junto com a IDS, compartilhando sistemas, entre 15 e 19 de julho. Na sequência, a Rohde & Schwarz realizou testes entre 22 e 26 de julho. Quem veio posteriormente foi a Hensoldt, com testes de 29 de julho a 2 de agosto. A NEGER demonstrou seus sistemas entre 12 e 16 de agosto. A Thales Group, em parceria com a IACIT, apresentou seus equipamentos entre 2 e 6 de setembro, sucedida pela Rafael, de 9 a 12 de setembro.
Antes de cada teste, os pilotos da ABM recebiam um briefing para que cada um pudesse estar estrategicamente posicionado durante as provas de detecção, de forma padronizada. Para a Associação foi muito positivo participar dos testes, coordenados pelo Tenente-Coronel R1 Bublitz, que conduziu as equipes, orquestrando e definindo os locais de voo para que os pilotos da ABM contribuíssem clara, direta e concisamente. Para o presidente da ABM, Lincoln Alex Kadota, é de grande importância e responsabilidade operar estas aeronaves como um novo componente aéreo. “Infelizmente há um certo bloqueio por parte de alguns usuários que ainda tratam o drone como brinquedo. Existem outros que são refratários às leis e, mesmo com todo o trabalho de conscientização e divulgação feito pela ABM juntamente com o DECEA, por intermédio da campanha #Drone Consciente, ainda acontecem casos de voos irregulares que interrompem as operações de alguns aeroportos, como no caso de Congonhas, São Paulo, que ficou fechado por mais de duas horas, ocasionando um prejuízo milionário ao setor”, advertiu Kadota. O apoio nos testes também veio de pilotos de drones do IEAv, do Instituto de Controle do Espaço Aéreo (ICEA),
De modo geral, a primeira perspectiva apresentada pelas empresas foi com relação a detecção de drones ou outros elementos que apresentassem ameaça no entorno do aeroporto de São José dos Campos. Os testes leva-
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Participantes da campanha de testes acompanham o voo de drones e a ação dos sistemas de contenção
Tenente-Coronel Bublitz demonstra a área de testes no sítio operacional
de alunos da Unifei, da Assessoria em Sistemas de Energia e Comércio LTDA. e da Max Drone Brasil. Importante ressaltar, que não houve nenhuma remuneração para locação dos drones e a participação dos pilotos foi totalmente voluntária não havendo ônus para a CISCEA ou para o DECEA.
Resultado dos testes em campo De acordo com o coordenador, os testes foram considerados plenamente satisfatórios. “Nesta primeira campanha observou-se que não ocorreu interferência no sinal dos aparelhos celulares e nos sistemas de auxílios à navegação, uma vez que os drones utilizam uma faixa de frequência específica”, destacou o Tenente-Coronel R1 Bublitz. No entanto, o tema ainda requer mais informações, comprovações e pesquisas até que se chegue a uma conclusão efetiva. A própria Anatel participou da campanha de testes e fez as medições necessárias para verificação da conformidade dos produtos. Quando a Agência faz a avaliação de um produto, é submetido a um ensaio em laboratório para ver se atende aos requisitos estabelecidos como, por exemplo, os parâmetros de transmissão, de emissões intencionais e não intencionais e da segurança do usuário quanto a questão de choques elétrico ou acústico. “No caso do drone, nós temos esta avaliação de conformidade, que passa por um modelo de ensaio em laboratório para quem quer comercializar o produto no País e tem aqueles em que é feita a declaração de conformidade”, explicou o Leonardo Marques Campos, da Gerência de Certificação e Numeração da Anatel, responsável pela avaliação da conformidade técnica dos produtos para telecomunicações. Campos esclareceu que o jammer, por ser um emissor de radiofrequência, é passível de certificação para operação no Brasil. “Neste caso, a entrada deste produto no País foi autorizada a partir de uma licença de uso temporária do espectro, que é emitida pela Gerência de Outorga e Licença de Estações para fins de testes
Diretor-Geral do DECEA no 1º Simpósio de Tecnologias Antidrones em São Paulo
ou pesquisas”. O principal objetivo da participação da Anatel na campanha de testes foi coletar subsídios e conhecer os sistemas em utilização e desenvolvimento para, em um futuro próximo, revisar a Resolução nº 308, de 11 de setembro de 2002, que aprova a Norma de Uso do Bloqueador de Sinais de Radiocomunicações. A intenção é que o tema faça parte da agenda regulatória da Anatel, que prevê um cronograma de consulta pública. “Nesta fase vamos escutar os atores envolvidos, a sociedade, o DECEA e os fabricantes. É dado um prazo razoável de manifestação, de 30 dias no mínimo, para produzirmos uma norma que atenda as expectativas de todos os players”, destacou Carlos Evangelista da Silva Junior, da Gerência de Regulamentação da Agência. Com o desenvolvimento da aviação não tripulada e a proliferação dessa tecnologia em diversos setores, a ANAC está revendo as regras de uso drones no País. No início de novembro, a agência reguladora abriu uma consulta pública para receber sugestões e propostas da sociedade para mudanças na legislação atual, o Regulamento Brasileiro de Aviação Civil Especial nº 94 (RBAC-E nº 94). Quaisquer pessoas, usuárias ou não de drones, podem enviar suas sugestões até o dia 5 de fevereiro de 2020. Também para o ano que vem, o DECEA está desenvolvendo um novo aplicativo do SARPAS por aeronaves remotamente pilotadas (RPAs), que trará uma interface de programação de aplicações que tornará possível a unificação de informações com o banco de dados da ANAC. Contudo, o próximo ano trará ainda mais destaque para o setor. Será realizado no Brasil, a quarta edição do evento Drone Enable, com o que há de mais atual sobre regulamentação, Gerenciamento do Tráfego Aéreo Urbano (Urban Air Traffic Management – UATM) e muito mais. É o DECEA cumprindo seu papel na multiplicação de informação e conhecimento em benefício da sociedade para utilização do espaço aéreo de forma consciente e responsável por veículos aéreos não tripulados. Para os drones, o futuro já começou. 13
REPORTAGEM
APP Guarani
Segurança é questão de confiança Toda parceria conta com disposição mútua, com a busca por nivelamento de conhecimentos e com muita confiança Por Telma Penteado Fotos: SD T. Amorim e Luiz Eduardo Perez
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A
bem da verdade, confiança parece ter sido a palavra de ordem neste grande empreendimento formalizado entre o Brasil e o Paraguai, que culminou com a inauguração, em 24 de outubro de 2019, do Controle de Aproximação Radar Guarani – o APP Guarani, nas dependências do Aeroporto Internacional Guarani, no município de Minga Guazú, próximo à Ciudad del Este. A presença de grandes autoridades – como o presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez; o presidente da Dirección Nacional de Aeronáutica Civil do Paraguai (DINAC), Edgar Alberto Melgarejo Ginard; o comandante da Força Aérea Brasileira (FAB), Tenente-Brigadeiro do Ar Antônio Carlos Moretti Bermudez; o diretor-geral do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), Tenente-Brigadeiro do Ar Jeferson Domingues de Freitas – comprovaram a magnitude do evento. A história começou em 10 de fevereiro de 2000, quando um Acordo de Cooperação Mútua foi assinado entre estes dois países, com o objetivo de aumentar a eficácia do controle de tráfego aéreo nesta região de fronteira que cobre as cidades de Foz do Iguaçu (PR) e Ciudad del Este, no Paraguai. O gerenciamento de aeronaves se faz mais que necessário não só pelas questões de fluxo de tráfego aéreo, como também por questões próprias da defesa aérea, com a identificação e monitoramento de aeronaves envolvidas em atividades ilícitas transnacionais. Mais a diante, em 21 de maio de 2002, promulgando o Acordo e buscando prover com recursos técnicos, foi firmado o Decreto nº 4.240, entre as Repúblicas Federativas do Brasil e do Paraguai. Em seu Artigo I, inciso 1, ficou previsto “o inter-
câmbio de informações para execução dos objetivos propostos, além do fornecimento de equipamentos e suporte técnico e operacional para serem empregados em programas específicos na região de fronteira, bem como a assistência técnica mútua”. Dessa forma, interessados em desenvolver e aprimorar a gestão do controle do espaço aéreo na região de fronteira, a FAB, por meio do DECEA, ofereceu à DINAC a utilização dos equipamentos que foram substituídos do APP Salvador, com a proposta de serem instalados no Controle de Aproximação Convencional do Aeroporto Internacional Guarani, hoje Controle de Aproximação Radar. Uma comitiva de autoridades da DINAC esteve no Rio de Janeiro, no dia 7 de maio de 2019, para visitar o DECEA, o Instituto de Cartografia Aeronáutica (ICA) e o Centro de Gerenciamento da Navegação Aérea (CGNA) a fim de estreitar laços e trocar informações. No dia seguinte, 8 de maio, aconteceu a concretização do escopo e dos objetivos, firmados pelo Entendimento Técnico entre o Comando da Aeronáutica (COMAER) e a DINAC, no qual se confirmou o empréstimo dos sistemas e equipamentos. Nesta ocasião, estabeleceu-se que o software de controle de tráfego aéreo a ser usado no APP Guarani seria o X-4000, desenvolvido para modernizar e facilitar o trabalho dos controladores, aprimorando a segurança das operações aeronáuticas a partir da console de tráfego aéreo – o que foi posteriormente confirmado e ratificado pelo Entendimento Técnico aprovado em 3 de outubro de 2018. Todo o apoio logístico foi oferecido pelo Segundo Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA II), tramitando e autorizando as soluções técnicas e operacionais.
Sala técnica do APP Guarani
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Já o equipamento e suas centrais de áudio foram disponibilizados pelo Destacamento de Controle do Espaço Aéreo de Salvador (DTCEA-SV) e o seu transporte ficou a cargo da Comissão de Implantação do Sistema de Controle do Espaço Aéreo (CISCEA), assim como a coordenação para a instalação e o treinamento das equipes técnicas paraguaias.
do Paraguai. O DECEA, por intermédio da CISCEA, do CINDACTA II e do DTCEA-FI, junto com os companheiros do Paraguai, deu um passo muito importante para um futuro mais integrado entre os dois países”.
Igualmente essencial foi o apoio do Comando de Operações Aeroespaciais (COMAE), localizado em Brasília, para o translado dos equipamentos a bordo da aeronave C 130, do 1° Esquadrão do 1° Grupo de Transporte, sediado na ALA 11, no Rio de Janeiro.
O clima era de grande alegria e confraternização no saguão do Aeroporto Internacional Guarani.
Coube ao Subdepartamento de Operações (SDOP) do DECEA a capacitação operacional e o treinamento. O estágio do STVD X4000 para os controladores paraguaios foram realizados no Destacamento de Controle do Espaço Aéreo de Foz do Iguaçu (DTCEA-FI). Os controladores paraguaios receberam diversos cursos para habilitação na função, tais como: • Básico de Vigilância ATS (serviços de tráfego aéreo) e Técnicas do Serviço de Vigilância ATS em Rota e Área terminal; • Gerenciamento de Recursos de Equipe; • Gerenciamento de Risco à Segurança Operacional; • Sistema de Gerenciamento de Segurança Operacional (SGSO) e Organizações e Entidades Provedoras do Serviço de Navegação Aérea (ANS); • Capacidade do Sistema de Pistas; • Capacidade de Setor ATC (controle de tráfego aéreo); • PANS/OPS (teóricos) - métodos de Construção de Procedimentos de Voo por Instrumentos e Visual preconizados pela Organização da Aviação Civil Internacional (OACI); • Instrutor Radar. Para o Tenente-Brigadeiro Domingues, essa troca de conhecimentos terá como uma das muitas consequências a garantia da qualidade de voo esperada pela OACI com relação ao Brasil e aos países da América do Sul. “Esta instrução permitirá que o Paraguai possa integrar, num futuro bem próximo, o CGNA, com uma célula de gerenciamento de fluxo de tráfego aéreo em Assunção. Estamos dando um passo muito importante para garantir voos mais seguros, tranquilos e eficientes para os passageiros do Brasil e
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O grande dia
A poucos instantes da oficialização da entrada em operação do APP Guarani, o presidente da DINAC demonstrou a satisfação com este momento tão relevante para o Paraguai. “Demos um grande passo tecnológico, que é fruto desta cooperação com nosso país-irmão, o Brasil. Esta cooperação, senhor presidente, não somente nos trouxe todos os equipamentos, mas também toda a montagem e a formação dos controladores e técnicos de tráfego aéreo que, a partir de hoje, vão garantir a segurança das operações aéreas do nosso país”. Mais a diante, Ginard destacou a relevância da confiança para que um projeto como este saísse do papel e virasse realidade. “Quero, sobretudo, ressaltar um feito: a confiança. Como já disse um
sociólogo norte-americano, é a confiança mútua e o interesse mútuo que têm mantido os povos unidos. Agradecemos a confiança que o Brasil depositou em nosso país. O Paraguai confia no Brasil, confia nesta grande nação e em seu avanço tecnológico”, frisou. Compartilhando da mesma alegria, o comandante da Aeronáutica brasileira também proferiu suas palavras neste momento histórico. “Temos aqui, mais uma vez, a oportunidade de ratificar esse proveitoso convívio, quando testemunhamos a concretização de um trabalho iniciado em 2000, quando foi firmado um Acordo de Cooperação. A partir de hoje, o Controle de Aproximação Guarani terá a capacidade de operar o controle radar em sua Terminal, o que contribuirá para a melhoria das operações aéreas na região da tríplice fronteira. Manifesto a convicção de que o APP Guarani reforça, ao mesmo tempo, os laços de amizade que une nossos países e a consciência do papel significativo desempenhado por nossas Forças Aéreas na garantia da inviolabilidade do espaço aéreo que encobre nossos territórios”, declarou o Tenente-Brigadeiro Bermudez. A implantação do APP Guarani colaborou para que o espaço aéreo paraguaio esteja quase 100% coberto. Já havia radar em Asunción, mas o controle desta
Autoridades visualizam o tráfego aéreo em tempo real
área de fronteira com o Brasil e Argentina era feito de maneira convencional, ou seja, via fonia. Não havia visualização das aeronaves e, é claro, as que estivessem em situação ilegal, irregular, por exemplo, não se identificariam por iniciativa própria. Vemos, então, o impacto trazido pelo radar: a possibilidade de detectar movimentos aéreos em uma determinada área, independente da colaboração da aeronave, aumentando radicalmente a segurança na região de fronteira. No que diz respeito ao controle de tráfego aéreo, a visualização radar permite, entre tantas funcionalidades, a diminuição do espaço entre as aeronaves monitoradas, aumentando o fluxo de movimentos aéreos performando de maneira segura. Assim que se encerraram os discursos, as autoridades paraguaias e brasileiras foram à frente da plateia presente e, com a imagem da console X-4000 projetada no telão ao fundo, oficializaram a entrada em operação do APP Guarani. Para o diretor-geral do DECEA, foi um momento histórico para os dois países, Paraguai e Brasil. “É uma confiança mútua com troca de informações de radar e, o mais importante, além do reflexo no controle de tráfego aéreo paraguaio, o impacto positivo na nossa indústria, que participou e tem agora um novo mercado não só no Paraguai, como também em toda América do Sul. Aumentamos nosso portfólio. É um projeto brasileiro, com a indústria nacional, garantindo resultados positivos para a navegação aérea paraguaia com alto padrão de qualidade”, finalizou o Tenente-Brigadeiro Domingues.
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ARTIGO
Fronteiras do Alto Solimões
O desafio de quem trabalha onde o Brasil termina para você voar Por Daniel Marinho Fotos de Fábio Maciel
S
ão quatro horas da manhã. Da janela do avião, a madrugada é preta. E fria. Cinquenta graus negativos, diz o piloto. Acuidade informativa que preocupa Adriana dentro do avião, que agora não consegue pensar em outra coisa senão na eventualidade de um furinho na lataria. A conversa com o marido esfria, ela cobre os pés da filha ao colo. A poucas horas do pouso em Bogotá, Colômbia, o A330 sobrevoa o hiato da madrugada acima do Alto Solimões, ainda no Brasil; uma selva inóspita, recortada por um ou outro afluente amazônico e poucas habitações indígenas.
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Onze mil metros acima da mata, o comandante não está sozinho. A centenas de quilômetros dali, num salão asséptico e climatizado, em Manaus, Danielle vinha acompanhando o avião numa tela de visualização radar acinzentada. Danielle é sargento da Aeronáutica, controladora de tráfego aéreo do Quarto Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA IV). Pela fonia, a controladora orienta o piloto a manter o nível de voo até o próximo fixo, onde, em espaço aéreo estrangeiro, deverá chamar o controle colombiano.
Pode passar despercebido, mas para enxergar o que os pilotos não veem, orientá-los com segurança, ouvi-los e se fazer ouvir onde quer que estejam, o controlador de tráfego aéreo precisa se apoiar numa rede de ativos técnico-operacionais de dimensões colossais. Certamente desconhecida de Adriana, seu marido e sua filha, que agora dorme entre um capítulo e outro da Peppa na tela da poltrona. Uma infraestrutura tão desconhecida quanto
Radar LP23 e antena de Telecomunicações Aeronáuticas do DTCEA-TT
extensa e surpreendente, distribuída ao longo de cada canto do País. Boa parte dela, está alo-
e do Peru. Lá, o rio mais famoso do continente
cada em um dos muitos rincões desabitados
bate à porta do País. Nascido nos Andes Peruanos,
do Norte brasileiro. Geralmente em pequenas
o Rio Amazonas chega ao Brasil por Tabatinga,
cidades abraçadas pela selva, às margens dos
quando vira Solimões, e ruma ao leste até encon-
afluentes da Bacia Amazônica e em regiões de
trar o Rio Negro, em Manaus. Só então retoma o
fronteira, estratégicas para as Forças Armadas.
nome que lhe deu prestígio e vai procurar o Atlân-
É o caso de Tabatinga, no extremo oeste ama-
tico no Amapá.
zonense. A cidade incorpora uma tríplice fron-
Objeto de disputa de portugueses e espanhóis,
teira internacional. Separa o Brasil da Colômbia
em meio às tardias definições das fronteiras
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atmosférico nas altitudes de voos que cruzam a área. É também graças ao DTCEA-TT que os pilotos há mais de 11 mil metros de altitude conseguem se comunicar por voz com os controladores. São as antenas VHF da Estação de Telecomunicações Aeronáuticas do Destacamento que recebem os sinais com a voz dos pilotos e os reencaminham, por meio de antenas retransmissoras, até o CINDACTA IV, e vice-versa, com o áudio da controladora. Uma terra de contrastes - crianças da aldeia indígena de Umariaçú
Em outras palavras, o Airbus A330, aquele que sobrevoava a selva na escuridão da madrugada, só pode
coloniais no oeste da América do Sul, a região
ser identificado no radar, obter informações mete-
sempre foi tomada como estratégica do ponto
orológicas, solicitar e obter orientações do controle
de vista militar. Nas última décadas, por conta
aéreo, dado o empenho dos cerca de 50 profissionais
da intensificação do contrabando de ilícitos
que diariamente emprestam perícia e experiência ao
rasgando a mata da fronteira, as Forças Armadas
Destacamento na pequena cidade de fronteira.
vêm ampliando a presença local. Não à toa, em 1973, o então Ministério da Aeronáutica instalou a primeira unidade regional do Alto Solimões, o Destacamento de Proteção ao voo, Detecção e Telecomunicações.
Não é o único. Há seis DTCEAs nas faixas de divisa internacional do País. Isso decorre da importância estratégica para a atividade e para a defesa aérea. Tabatinga, porém, apresenta algumas particularidades. Daniel Barbosa Neves, capitão da Aeronáutica que
Hoje, mais de 40 anos depois, o Destacamen-
comanda o Destacamento, reitera que “a chegada do
to de Controle do Espaço Aéreo de Tabatinga
Rio Amazonas/Solimões no Brasil, a fronteira com
(DTCEA-TT), denominação atualizada pela Porta-
dois países sul-americanos, a diversidade étnico-cul-
ria 183/CG3 de 27 de fevereiro de 2003, é a unida-
tural numa mesma região e a convivência com forças
de do CINDACTA IV responsável pela execução de
armadas de nacionalidades diversas transformam
todas as atividades operacionais e de manuten-
Tabatinga em uma localidade complexa”.
ção do controle do espaço aéreo da região.
Com uma população estimada em 65 mil pessoas,
Graças ao destacamento, o oeste do estado do
Tabatinga é conurbada com um município colombia-
Amazonas e a tríplice fronteira internacional es-
no, Letícia, a capital do estado do Amazonas deles. O
tão sob vigilância radar. Mais exatamente, cerca
único marco limítrofe entre as cidades é um obelisco
de 500 mil km2 sob o monitoramento dos contro-
com duas bandeiras. Não há postos de fronteira com
ladores brasileiros. Com um raio de alcance de
as tradicionais cancelas na rua. A fiscalização poli-
400 km, o Radar LP23 monitora todos os voos em rota dessa região e encaminha os dados ao Centro de Controle de Aérea Amazônico (ACC- AZ) no CINDACTA IV. Com o mesmo raio de alcance de 400 km, o Radar Meteorológico do Destacamento fornece os dados que irão apoiar todas as operações aéreas sobre o sudoeste amazonense. Ele incorpora a detecção de dados relevantes sobre o clima
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Bejarano, o soldado poliglota
Operador do AFIS no DTCEA-TT autoriza o pouso da aeronave no Aeroporto de Tabatinga
cial é realizada nas saídas e chegadas dos passageiros às cidades nos aeroportos e, eventualmente, nas grandes embarcações dos rios. Em terra firme, a população local transita livremente entre os dois países como se as duas cidades fossem uma. Não à toa, os dois municípios são interdependentes quanto ao acesso a combustíveis, bens de consumo e serviços, por exemplo. As idas e vindas cotidianas ao Peru também são comuns em Tabatinga. Uma canoa motorizada (e dois reais) levam o viajante urbano à Isla Rosa, no departamento peruano de Loreto. Idem, no sentido oposto. Os dois países estão separados por três minutos de barco sobre o Solimões. Essa comutação internacional cotidiana reúne às margens do Alto Solimões uma diversidade de línguas, nacionalidades e grupos étnicos. Além dos brasileiros, peruanos e colombianos, há também os povos originários, que ainda lá permanecem nas 42 aldeias dos arredores das cidades. No caso, os índios Ticuna: etnia mais populosa da Amazônia brasileira com 54 mil índios (SESAI/ Ministério da Saúde, 2014). Isso se reflete no próprio efetivo do DTCEA-TT. Meta-
Rio Solimões ao entardecer
de é de origem indígena. É o caso do soldado Bejarano. Filho de índia brasileira e pastor evangélico peruano, nasceu na aldeia indígena de Lauro Sodré, em Benjamin Constant (AM), ao sul de Tabatinga. Ainda na infância, morou em comunidades ribeirinhas do Peru e, posteriormente, da Colômbia, terra de sua avó materna.
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Marco da fronteira Brasil - Colômbia em Tabatinga
Na adolescência, a mãe o trouxe de volta ao Bra-
apta a apoiar logisticamente a cidade e servir
sil para morar na cidade. Não foi fácil. Bejarano
de base importante às movimentações da Força
sofria preconceitos por ser índio; não falar por-
Aérea Brasileira (FAB) e dos Pelotões Especiais
tuguês. O tempo, o estudo e a convivência com a
de Fronteira (PEF) do Exército Brasileiro (EB),
diferença, no entanto, outorgou ao militar uma
instalados no oeste amazonense.
formação invejável: fluência em espanhol, em português e na sua língua indígena de origem.
maior do sul da Colômbia. Recebe mais de três mil
Não parou por aí. "Na escola indígena o pessoal estuda, termina e depois volta à roça. Minha mãe
voos por ano; cerca de 220 mil passageiros e 11 mil toneladas de carga anuais.
não deixou. Exigiu que eu continuasse os estudos.
Voos sobre um espaço aéreo de soberania trinacio-
Fiz o vestibular para o curso de Biologia da UEA
nal, no entanto, terminaram por exigir a elaboração
(Universidade Estadual do Amazonas) e fui aprova-
de regras específicas e de procedimentos de navega-
do", conta o soldado poliglota, que hoje, já formado
ção aérea transacionais.
como biólogo, faz Mestrado em Ciências da Educação, em paralelo aos serviços no DTCEA-TT.
Dependendo do procedimento de aproximação para pouso em curso, por exemplo, um voo domés-
Limitação maior em Tabatinga ainda é o acesso. Há um voo comercial por dia. De barco, leva-se até
tico colombiano ou brasileiro precisa usar o espaço aéreo soberano do outro país para descer ao solo.
seis dias para vir de Manaus. O percurso oposto,
Em outro caso, um voo de Manaus com destino a
no sentido do rio, é um pouco mais rápido, quatro
Tabatinga deve contatar o controle colombiano ao
dias. Ainda cansativo.
iniciar a aproximação para pouso, mesmo que ain-
Construído em 1968, o Aeroporto Internacional
da em espaço aéreo brasileiro. O contato com a fonia
de Tabatinga dista 1.105 Km de Manaus. É
do Brasil só é retomado na solicitação de pouso, pro-
administrado
pela
Empresa
Brasileira
de
Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) desde 1980 e possui uma boa pista de 2,1 km de comprimento, 22
Letícia possui um aeroporto mais movimentado. O
priamente, quando o piloto chama o Serviço de Informação de Voo de Aeródromo (AFIS) do DTCEA-TT. Voos
colombianos,
peruanos
e
brasileiros
utilizam regularmente os serviços de navegação
Idiossincrasias de uma navegação aérea tripar-
aérea de qualquer um dos três países, mesmo que
tite sobre a fronteira amazônica. Porque assim
em seus respectivos espaços aéreos domésticos,
é a vida em Tabatinga para quem vive de botar
nas adjacências das fronteiras. Tudo previsto na
avião para voar. E os desafios enfrentados numa
Circular Normativa de Controle do Espaço Aéreo
localidade de acesso remoto e complexo, alta-
(CIRCEA 100-1), vulgo Carta de Acordo Operacional
mente dependente de recursos externos, acolhi-
Tripartite para a TMA Amazônica (Brasil, Colômbia e Peru). Assinado em Lima, Peru, em 2009, o documento oficializou as definições quanto ao encaminhamento dos tráfegos e se aplica aos Centros de Controle de Área (ACC – Area Control Center) dos três países, bem como ao Controle de Aproximação (APP – Approach Control) colombiano de Letícia e ao AFIS Tabatinga. Vale mencionar que essas normas foram
da pelo isolamento da selva, onde - como diriam os caboclos da região -“tudo é lonjura”, são transpostos diariamente por essa gente que põe radares, estações de telecomunicação, estações meteorológicas, auxílios à navegação aérea, antenas, rádios, sistemas e dispositivos diversos todos os dias para funcionar. Para que, lá em cima, a qualquer momento, al-
acordadas com o único intuito de facilitar a
guma menina possa assistir à Peppa no avião ao
prestação dos serviços de tráfego aéreo nas
colo de uma mãe tranquila. Onze mil metros aci-
áreas descritas, sem que a aceitação desses
ma da selva, sobre o escuro da madrugada fria,
limites signifique a cessão, de qualquer ordem,
mas segura de que há muita gente cuidando de
dos direitos de soberania que cada um dos três
tudo para que ela esteja, em alguns instantes,
Estados signatários exercem sobre suas regiões.
curtindo o destino das férias da família.
Efetivo do DTCEA-TT
23
ARTIGO
Transformação Digital nos órgãos operacionais do DECEA Por Glória Galembeck Jornalista e Mestre em Ciências Aeroespaciais Fotos de Fábio Maciel
Mudança incrementa o padrão digital e a qualidade do serviço prestado ao usuário do controle do espaço aéreo
24
E
stá em curso, no mundo, uma
científica pois, em sua maioria, as tec-
transformação na maneira como
nologias empregadas são simples e já
realizamos as atividades do dia a dia:
existem há algum tempo. A principal
usar serviços bancários, fazer reservas
transformação é na maneira como o
em hotel, pedir comida para entrega,
consumidor interage com o produto ou
ler notícias ou nos deslocarmos de um
serviço, isto é, via smartphone, tablet
ponto a outro da cidade. Muitas gran-
ou computador, e a consequente aber-
des corporações, consolidadas no mer-
tura do mercado para empresas que
cado há décadas, se vêm competindo
entendam essa cultura e saibam como
com empresas jovens, pequenas, com
“se vender” neste cenário.
modelos de negócios diferentes e que,
Algumas empresas que surgiram
devido a essas características, conse-
num mercado mais tradicional estão
guem oferecem vantagens competiti-
sofrendo as consequências desta reali-
vas mais diferentes ainda.
dade. Em setembro de 2019, a operado-
Essa transformação atinge os mais
ra de turismo britânica Thomas Cook,
variados segmentos de negócio e tem
no ramo há 178 anos, declarou falên-
em sua origem a tecnologia, por isso,
cia. Entre as causas apontadas para
o nome de transformação digital. Mas
a derrocada da história empresa, que
não se trata de um cenário de ficção
possuía cerca de 22 mil funcionários
em todo mundo, está a dificuldade em modernizar
dade e a qualidade dos serviços do SDOP, desenvol-
sua abordagem em meio a um mercado de turismo
vendo produtos a partir da digitalização e automa-
cada vez mais digital.
tização de seus processos, e tornando-o capaz de, a
As empresas grandes e bem-sucedidas se deparam
partir de métricas e indicadores, identificar deman-
com a necessidade de se transformar digitalmente,
das e o nível de satisfação de seus clientes, sendo
o que vai muito além de, meramente, se adaptar a
isto ponto de partida para melhorias constantes,
um mercado modificado pela tecnologia. O que está
criando um círculo virtuoso de aumento de capaci-
em jogo é a manutenção da competitividade, a ga-
dade operacional.”
rantia do mercado e a geração de receita. Ou seja, a própria sobrevivência.
Para conduzir a nova seção neste desafio, foi destacado o analista de sistemas João Ximenes, que des-
Este processo, que muda a forma como as pessoas
de 2009 atua no DECEA, inicialmente, na Assessoria
interagem com prestadores de serviços e consomem
de Comunicação Social (ASCOM). Ximenes foi o de-
produtos, não está restrito a empresas privadas.
senvolvedor de algumas das soluções digitais que o
Qualquer prestador de serviço, público ou privado,
DECEA já adota e recrutou profissionais de tecnolo-
está sujeito aos efeitos que a transformação digital
gia da informação para, com base em metodologias
provoca nos clientes, cada vez mais exigentes e de-
de desenvolvimento ágil, prover soluções digitais.
mandantes de serviços oferecidos via internet, pelo smartphone ou computador.
A ATD tem duas frentes: Produto e Desenvolvimento. A equipe de Produto tem a atribuição de
O governo federal possui uma Secretaria de Go-
fazer a linha de frente no atendimento ao usuário
verno Digital (SGD), ligada ao Ministério da Econo-
interno e externo, por meio do Serviço de Atendi-
mia, que é responsável pela definição de políticas,
mento ao Cidadão (SAC) e do contato com as unida-
pela orientação e supervisão das atividades de ges-
des de negócio na área operacional, por exemplo,
tão dos recursos de TI do Poder Executivo Federal. A
informações aeronáuticas, meteorologia e aeródro-
SGD conduz o processo de transformação digital do
mos, no intuito de identificar as demandas.
governo, com o objetivo de melhorar o atendimento
A equipe de Desenvolvimento trabalha em Cabi-
ao cidadão e às empresas, por meio da eliminação de
nes, que são duplas de desenvolvedores dedicadas a
barreiras, do aumento da transparência, do controle
viabilizar, do ponto de vista técnico, as soluções por
social das ações e da promoção da cidadania. Em ou-
meio de produtos digitais, que podem ser sistemas e
tubro de 2019, mais de 3,2 mil serviços públicos di-
aplicativos. A divisão do trabalho das Cabines é feita
ferentes estavam disponíveis no portal www.gov.br.
por área de negócio. Por exemplo: a dupla encarregada de realizar correções e melhorias no Sistema
Transformação digital no DECEA Atento a este cenário, o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) ativou, em fevereiro de 2019, a Assessoria de Transformação Digital (ATD),
Na ATD, o objetivo é aumentar a capacidade operacional do DECEA
subordinada ao Subdepartamento de Operações (SDOP). A ATD nasceu com alguns produtos digitais legados em seu portfólio, como REDEMET, SARPAS, AISWEB e SysAGA, e com o desafio de digitalizar muitos outros serviços utilizados tanto pelo cidadão, ou seja, pelo público externo, como pelo efetivo operacional do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB) distribuído pelo território brasileiro. A ATD tem a seguinte missão: “Aumentar a veloci-
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de Gerenciamento de Testes Operacionais (SGTO) é a
da linha”, os desenvolvedores do órgão operacional
mesma que desenvolve o Sistema de Gerenciamento
têm condições de conhecer melhor as necessidades
do Pessoal Operacional (SGPO) e a Licença Pessoal de
dos usuários internos. Com a proximidade física, o
Navegação Aérea (LPNA). Os três produtos digitais
processo de propor e testar soluções fica mais rápido,
têm em comum serem afetos à vida funcional do
pois o feedback pode ser colhido instantaneamente
efetivo operacional. O conhecimento adquirido no
e já ser incluído no aprimoramento de alguma
desenho de um sistema auxilia na compreensão das
funcionalidade.
necessidades de outro.
Independentemente da localização física da equi-
Um dos resultados desse trabalho é primeiro apli-
pe da ATD, todos os envolvidos na transformação
cativo de celular desenvolvido pela ATD, a versão
digital, civis e militares, trabalham com o propósito
mobile da LPNA, que agiliza o contato do DECEA com
de prover soluções digitais rápidas, de baixo custo,
os civis e militares da área de controle de tráfego aé-
que aumentem a padronização dos serviços presta-
reo, por meio de notificações, e disponibiliza todos
dos pelo DECEA, de modo a aumentar a qualidade, a
os dados da ficha cadastral. O aplicativo LPNA está
eficiência e a satisfação dos usuários.
disponível na Google Play (Android) e na Apple Store (iOS). Além da equipe sediada no Rio de Janeiro, no Complexo Santos Dumont, a ATD possui polos em Brasília e em Recife. A equipe sediada no Primeiro Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA I), em Brasília, é dedicada aos produtos digitais de Meteorologia Aeronáutica e Busca e Salvamento (SAR). A equipe do Terceiro Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA III), em Recife, tem como missão desenvolver sistemas da área de Aeródromos e de Defesa Aérea. Um dos problemas que a estrutura de polos se propõe a resolver é diminuir a distância entre a área operacional. Estando mais próximo da “ponta
A transformação além do digital O desafio que a transformação digital apresenta para as organizações e empresas já consolidadas certamente não é o acesso à tecnologia e aos recursos humanos qualificados. O ponto crucial é a capacidade de reagir rapidamente às exigências dos clientes. As demandas dos clientes estão relacionadas, em grande parte, a ter os seus anseios atendidos na medida exata. Para efeito de comparação: um grande banco, que disponibiliza fácil acesso a um gerente na agência, durante o horário comercial, pode não corresponder tão bem às expectativas de um cliente que quer resolver seus assuntos por aplicativo de celular ou, no máximo, ter contato por telefone com um atendente bem informado e solícito.
Os profissionais da ATD trabalham em prol da qualidade na prestação dos serviços do DECEA
Ou seja: a transformação digital não se restringe à tecnologia. Este processo está intimamente relacionado à compreensão das necessidades do cliente, que serão supridas por meio da tecnologia presente em softwares e aplicativos. Entre uma ponta e a outra, isto é, entre identificar a necessidade do cliente e prover a solução digital pronta, existe um caminho que passa, invariavelmente, pela cultura organizacional. A cultura de uma corporação é, de forma bem simplificada, seu conjunto de crenças e valores, é a forma pela qual ela “faz as coisas acontecem”. Considerando que uma companhia, empresa, organização é um agrupamento de indivíduos reunidos em prol de um objetivo comum,
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a cultura é que dá o tom, unindo todo esse ecos-
a transformação digital dos negócios, é possível
sistema. A principal função da cultura é garan-
haver uma disrupção em determinados elemen-
tir a coesão necessária perante todos os agentes
tos de uma cultura organizacional. Crenças que,
organizacionais, assegurando seu alinhamento
progressivamente, deixam de fazer sentido com
com o conjunto de crenças e normas definidos
a mudança do cenário. A cultura é um resultado,
por aquele sistema [1].
sendo assim, é importante que as organizações es-
Com as mudanças conjunturais trazidas com
tejam atentas a ajustes que se façam necessários.
Os domínios da transformação digital Qualquer negócio nascido antes do surgimento da internet se depara com a questão: como se transformar para competir em uma economia digital? David Rogers, pesquisador na área de estratégia de negócios digitais da Columbia Business School, lista cinco domínios afetados pela transformação digital: usuários, dados, colaboração, inovação e valor [2]. Usuários Os clientes se comportam cada vez mais como indivíduos conectados em rede que interferem diretamente na reputação de marcas e serviços. Essa realidade abre oportunidade para aproveitar o conhecimento e as experiências desses usuários para envolvê-los e co-criar junto com eles. A criação de uma estratégia eficaz para lidar com clientes inclui compreender conceitos-chave, como seus hábitos digitais e o que os mantém conectados a um produto. Colaboração Tradicionalmente, competição e colaboração são vistos como opostos. No cenário atual, as fronteiras entre estes conceitos são fluídas, à medida que um fornecedor pode começar a negociar diretamente com o consumidor final de uma empresa e vir a ser um concorrente. Por outro lado, rivais históricos podem precisar se unir para fazer frente a desafios mútuos externos.
VALOR
DADOS
INOVAÇÃO
USUÁRIOS
COLABORAÇÃO
Dados Tradicionalmente, as organizações tomam decisões e avaliam seus processos baseadas em dados. A crescente digitalização dos negócios têm gerado uma enxurrada de dados, o que abre novas possibilidades, como encontrar padrões inesperados nos hábitos dos usuários. O desafio é compreender tantos dados de modo a transformá-los em ativos capazes de gerar valor para o negócio. Inovação É o processo pelo qual novas ideias são desenvolvidas, testadas e colocadas em circulação. As tecnologias digitais permitem uma abordagem que, diferente da tradicional, diminui o custo de uma ideia que não venha a ser implementada e o tempo investido. Ou seja, há mais campo para testar
ideias de produtos e serviços e obter feedback, validado por clientes reais. Valor Em um ambiente de negócios em constante mudança, as organizações precisam se adaptar para aproveitar oportunidades emergentes para permanecer à frente da curva da transformação. Ou seja, na era digital, insistir em uma proposta de valor imutável significa atrair desafios desnecessários. A regra é adaptar a proposta de valor. [1] O novo código da cultura: vida e morte na era exponencial,Sandro Magaldi e José Salibi Neto, Editora Gente. [2] The digital transformation playbook: rethink your business for the digital age - David L. Rogers, Columbia Business School Publishing 27
ENTREVISTA
Brigadeiro do Ar Ary Rodrigues Bertolino, chefe do Subdepartamento de Operações (SDOP) O que motivou a iniciativa de investir em transformação digital? O uso da tecnologia abre possibilidades de gestão que, uma década atrás, não eram possíveis e que estão trazendo muito mais agilidade para os nossos órgãos operacionais. Vou citar um exemplo: periodicamente, o efetivo operacional realiza provas para verificar o nível de conhecimento das normas do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB). Esse processo, feito analogicamente, demandava tempo, pessoal e logística dos órgãos regionais, que precisavam ir até aos destacamentos para aplicar a prova em papel, com várias versões diferentes. Essa situação está mudando com a implementação do Sistema de Gerenciamento de Testes Operacionais (SGTO), desenvolvido pela Assessoria de Transformação Digital (ATD). O SGTO possui um banco de questões, gerenciado pelo Instituto de Controle do Espaço Aéreo (ICEA). Cada tutor (responsável por aplicar o teste) gera a prova de acordo com os parâmetros necessários, em quantas versões precisar. A prova é feita on-line, sem a necessidade de deslocamento, e cada prova é diferente da outra, até a ordem das alternativas muda. Este é apenas um exemplo de como a transformação digital vem para ajudar o efetivo operacional do DECEA a focar nas suas atividades-fim, e realizar as demais tarefas com menos tempo e recursos. Quais os benefícios esperados com essa transformação? Existem ganhos para o público interno do DECEA e para os nossos clientes externos. Além do já citado ganho de agilidade nas atividades de rotina dos órgãos operacionais, que vai reduzir a carga de trabalho em tarefas de gestão administrativa, melhoram as condições para a padronização de procedimentos. Não é raro, no âmbito do SISCEAB,
os órgãos regionais adotarem soluções distintas para problemas semelhantes. Ao disponibilizar plataformas e produtos digitais para a realização de tarefas, naturalmente, a padronização aumenta. Evidentemente que as particularidades de cada regional são respeitadas, na medida do possível. Esse incremento no padrão conduz à melhoria na qualidade do serviço prestado ao nosso público externo. Quando o DECEA amplia o acesso a serviços para a comunidade aeronáutica, por meio de aplicativo (celular ou computador), ele se alinha a uma tendência mundial, de utilizar a tecnologia disponível para prover serviços mais adequados às expectativas e demandas dos usuários. Como a automatização viabilizada pela tecnologia pode melhorar os serviços do SDOP? Quando determinadas tarefas são feitas com o apoio de sistemas, que eliminam uma grande parte de trabalho repetitivo e de mera execução, o efetivo operacional fica mais livre para pensar naquilo que de fato é o negócio do SDOP e do DECEA. De certa forma, é promovido para tarefas mais estratégicas no âmbito operacional. Esse avanço é fundamental para que o DECEA enfrente alguns dos seus próximos desafios, que estão relacionados à automatização em nível mundial. Um bom exemplo é o UTM, ou Unmanned Traffic Management, o gerenciamento do tráfego aéreo nãotripulado dos drones. O mundo todo está pesquisando e buscando formas de prover o UTM de forma segura. O desafio é como conciliar a aviação e o voo comercial de drones para entregas e transporte de pessoas com segurança. Para isso, cada vez mais, vemos uma maior automatização no gerenciamento desse espaço aéreo como um requisito para que seja implementado. O Brasil é um dos países mais avançados nessa pesquisa. O conhecimento e o comprometimento do nosso efetivo para pensar em soluções para esse futuro próximo são fundamentais para continuarmos nesse patamar. Quando se fala em transformação digital, a tecnologia é apenas uma parte do processo. Como o SDOP está vivenciando essa mudança? A transformação digital carrega uma necessidade de mudança na cultura organizacional para se adaptar a este novo estilo de trabalhar. Na medida em que o SDOP se transforma em uma plataforma digital, com seus processos e serviços rodando em sistemas, o efetivo precisa ter mais conhecimento da área tecnológica. Não é tanto no sentido de conhecer sobre informática, mas na maneira de raciocinar sobre a solução de problemas a partir de tecnologia. Outro ponto é que os sistemas geram uma infinidade de dados. Dessa forma, o modo de gerenciar e a tomada de decisão passam a ser ainda mais orientadas por dados, de forma menos empírica.
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ARTIGO
Desafios e oportunidades do gerenciamento terminológico Por Adriana Ceschin Rieche e Rafaela Araújo Jordão Rigaud Peixoto
A
base terminológica foi inicialmente concebida para suprir as necessidades do efetivo do extinto Departamento de Aviação Civil (DAC), visando à unificação de termos técnicos e disponibilização on-line em 2013 para o público geral. Em 2014, o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) passou a colaborar com essa base, sugerindo novos termos e propondo incrementos à metodologia de pesquisa. A partir daí, com maior divulgação, o projeto tornou-se referência em terminologia da Aviação. Inicialmente, desde 2004, a base
tinha o propósito de auxiliar e facilitar o trabalho de profissionais cujas atividades englobavam as áreas de tradução, tradução inversa (ou versão) e redação de documentos variados nas línguas inglesa e espanhola; e auxiliar os profissionais na produção de textos em português (com base em documentos redigidos em inglês ou espanhol) ou nos idiomas estrangeiros. Percebeu-se que cada servidor traduzia livremente termos ou siglas, o que gerava confusão terminológica nos textos produzidos. Assim sendo, um grupo de ser-
vidores especializados nas áreas de Letras e Linguística decidiu começar a compilar palavras, termos e siglas, e suas respectivas traduções (oficiais ou não), para posterior tratamento linguístico e unificação terminológica, quando possível. Optou-se por uma ferramenta on-line, para possibilitar uma interface mais otimizada com o usuário, com maior agilidade e refinamento de pesquisa, além de ser possível ter atualizações constantes, integração com outros recursos (som, imagem etc.) e interatividade com o usuário. 29
Características e funcionamento A base é constituída por dicionários bilíngues nos pares de idiomas inglês-português, portuguêsinglês, espanhol-português, português-espanhol, francês-português e português-francês, além de um glossário de siglas em português e inglês. A base também conta com um dicionário de definições exclusivamente em português, com termos característicos da produção textual na área da aviação, tanto no Brasil quanto no exterior. Esses elementos são inseridos conforme os seguintes critérios de catalogação: termo em inglês, termo em português, definição em inglês, definição em português, variantes, sinônimos e termos relacionados, além de exemplos de uso (contexto), imagens e notas. O mesmo se aplica aos outros idiomas da base, tomando sempre o inglês como referência.
Os dicionários compreendem termos e definições de 25 subáreas: • administradores aeroportuários; • aerodesporto; • aerodinâmica; • aeronautas; • aeronavegabilidade; • aeronaves; • aeronaves de asas rotativas; • aeroviários; • ANAC; • agências relacionadas à aviação; • alfabeto internacional da aviação; • assessorias relacionadas à aviação; • associações relacionadas à aviação; • autoridade aeronáutica; • autoridade brasileira de aviação civil; • autoridades estrangeiras de aviação civil; • auxílios à navegação aérea; • aviação; • aviação civil; • aviação geral; • aviação militar; • busca e salvamento; • capacitação; • cartografia aeronáutica; • carga aérea; • ciência e tecnologia aeroespacial; • COMAER;
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O público-alvo da base são os profissionais que atuam no segmento aeronáutico, tais como o pessoal da indústria da aviação, pilotos, controladores de tráfego aéreo, mecânicos de manutenção aeronáutica, despachantes operacionais de voo, pessoal de solo e de empresas de auxílio às operações aeronáuticas. Dentre esses, destacam-se os militares e servidores da área de aviação que atuam no DECEA e na Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Um dos diferenciais desta base é ser uma ferramenta única no mercado, desenvolvida mediante consulta a publicações oficiais, isto é, obras publicadas por autoridades de aviação no Brasil – ANAC, Comando da Aeronáutica (COMAER), DECEA e Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) – e no exterior – Organização da Aviação Civil Internacional (OACI), Administração Federal de Aviação (FAA) e Organização Europeia para a Segurança da Navegação Aérea (EUROCONTROL). Além disso, também são utilizadas outras fontes de referência como dicionários especializados e publicações acadêmicas.
• comissões relacionadas à aviação; • controle do espaço aéreo; • controle de tráfego aéreo; • correio aéreo; • defesa aérea; • DECEA; • despacho operacional; • dirigível; • estrutura da aeronave; • fases do voo; • fatores humanos; • federações relacionadas à aviação; • fiscalização; • habilitação técnica; • indústria aeronáutica; • informação aeronáutica; • infraestrutura aeroportuária; • inspeção em voo; • instrumentos de voo; • legislação aeronáutica; • legislação da aviação civil; • manutenção aeronáutica; • medicina aeroespacial; • meteorologia; • meteorologia aeronáutica; • Ministério da Defesa; • motores; • navegação aérea;
• organismos internacionais; • operações de helicópteros; • operações de aeronaves; • paraquedismo; • pilotagem; • presidência da república; • prestadores de serviços aéreos; • produto aeronáutico; • proteção ambiental na aviação; • publicações da autoridade aeronáutica; • publicações da autoridade de aviação civil; • regulação econômica; • restrição de operação do aeroporto; • segurança da aviação/ operacional; • segurança da aviação/ interferência ilícita; • serviços aéreos especializados; • sindicatos relacionados à aviação; • telecomunicações aeronáuticas; • terminologia geral da aviação; • tráfego aéreo; • transmissão a rádio; • transporte aéreo.
mento do trabalho para análise mais dedicada de cada subárea, tais como meteorologia aeronáutica e comunicações.
Como o público pode acessar o glossário Recentemente, a equipe publicou um artigo, disponível na Biblioteca Digital da ANAC, com uma análise dos dados estatísticos de acesso aos Dicionários ANACpédia desde 2014, realizada com a finalidade de direcionar os trabalhos para melhor atender às expectativas e necessidades dos usuários, permitindo conhecer melhor o públicoalvo, as regiões e os países que mais acessam os Dicionários, assim como o alcance internacional das informações terminológicas gerenciadas. As colaborações e sugestões podem ser enviadas por e-mail para a Equipe de Produção Linguística da ANAC (anacpedia@anac.gov.br) e para as servidoras tradutoras do DECEA: Adriana Rieche (adrianaacr@decea.gov.br) e Rafaela Rigaud (rafaelarajrp@decea.gov.br).
Participação do DECEA e relevância para seu efetivo A atualização da base em parceria com o DECEA permite uniformização da terminologia, evitando inconsistência terminológica nos textos produzidos pelas várias entidades do segmento da aviação. Particularmente para o DECEA, cuja participação passou a ocorrer em 2014, está sendo importante a inclusão de termos especificamente sobre tráfego aéreo e navegação aérea, inicialmente menos representados na base. Em 12 de dezembro de 2016, foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) um Acordo de Cooperação Técnica (ACT), com duração de três anos, podendo ser prorrogado, o que deve acontecer em breve. Como fruto desse trabalho, foram publicados alguns artigos em veículos especializados em aviação, como a Aviation in Focus e ICAO Training Report.
Como se trata de um trabalho em constante atualização, é possível sempre aprimorar o projeto em andamento, ajustando eventuais imprecisões, ampliando o número de subáreas e incorporando novos termos.
Considerações finais A parceria entre a ANAC e o DECEA no âmbito do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) para o projeto ANACpédia promoveu maior diálogo entre essas instituições. Essa união de sucesso certamente trará outras contribuições para a comunidade aeronáutica como um todo e, sem dúvida, para o DECEA.
O aporte técnico do DECEA foi muito bem recebido pela ANAC, pois trouxe uma outra perspectiva de análise, com a participação de servidoras tradutoras, com experiência mais consolidada na área terminológica e uso mais frequente de programas de apoio à tradução. Dentre os próximos desafios do trabalho, destacam-se a inclusão de outras línguas e o direciona-
Equipe de produção linguística. Reunião com representantes da ANAC e do DECEA: as servidoras Fernanda Alves, Raquel Cozzolino e Camila Mello, da ANAC; e as servidoras Adriana Rieche e Rafaela Rigaud, do DECEA
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