Hipóxia e Hiperventilação

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HIPÓXIA E HIPERVENTILAÇÃO

CONTEÚDO

Introdução Caracterização de Cada Tipo Sintomatologia Profilaxia da Hipóxia Tratamento da Hipóxia Hiperóxia Efeitos da Hipóxia de Altitude Perigos do Fumo na Aviação Conclusão


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I - INTRODUÇAO A hipóxia é classificada nos seguintes quatro tipos, conforme as circunstâncias que envolvam a sua manifestação: • Hipóxia hipoxêmica • Hipóxia anêmica • Hipóxia estagnante • Hipóxia histotóxica

II - CARACTERIZAÇÃO DE CADA TIPO 1 - Hipóxia Hipoxêmica

Resulta da deficiência de oxigênio no sangue arterial, pela queda da quantidade de oxigênio respirado. É o tipo que mais freqüentemente se apresenta em medicina de aviação, embora os outros tipos também possam surgir em vôo. Este tipo de hipóxia é também encontrado em doenças pulmonares, nas depressões respiratórias e em qualquer forma de asfixia. 2 - Hipóxia Anêmica

Resulta da deficiente capacidade do sangue para carrear uma quantidade suficiente de oxigênio, em virtude de seu baixo teor de hemoglobina. Sabendo-se que um grama de hemoglobina carreia 1,34 ml de oxigênio e que o indivíduo tem normalmente, em média quinze gramas de hemoglobina, deduzimos que no indivíduo normal 100 ml de sangue carreiam, aproximadamente 20 ml de oxigênio. Ora, se o indivíduo é portador de uma anemia, mesmo não havendo hipoxemia, isto é, mesmo havendo boa saturação de oxigênio pela hemoglobina, estando esta reduzida, o oxigênio que chega aos tecidos será insuficiente e teremos então uma hipóxia dita anêmica; este tipo é também encontrado no envenenamento pelo monóxido de carbono. 3 - Hipóxia Estagnante

Também chamada de hipóxia isquêmica, resulta de uma deficiência circulatória e é o tipo encontrado na vigência de uma insuficiência cardíaca congestiva, de uma insuficiência circulatória periférica ou de um grande efeito de G positivo.


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3/15 4 - Hipóxia Histotóxica

Resulta da ação de toxinas que, agindo sobre as enzimas respiratórias as incapacitam, não permitindo uma perfeita utilização do oxigênio para as oxi-reduções celulares. É o tipo que ocorre, por exemplo, na intoxicação pelos cianetos.

III - SINTOMATOLOGIA 1 - Generalidades

O aparecimento e a intensidade dos sintomas da hipóxia dependerão dos seguintes fatores: • Altitude absoluta de vôo; • Média de velocidade ascensional; • Duração da exposição à baixa pressão atmosférica; • Temperatura ambiente; • Atividade física; e • Fatores individuais: -Tolerância própria - Aptidão física - Emotividade - Aclimatação

Estudaremos a sintomatologia da hipóxia, considerando, primeiramente, o desenvolvimento da hipóxia durante uma ascensão normal. É chamada de hipóxia aguda. Esse estudo é feito considerando os seguintes quatro estágios:

2 – Estágio Indiferente

Ocorre do nível do mar até cerca de 2.000m (6.000 pés). A saturação da hemoglobina pelo oxigênio cai até 92%. Neste estágio nota-se apenas dificuldade na adaptação ao escuro (visão noturna prejudicada) o que encarece a necessidade do oxigênio desde o solo nos vôos noturnos, especialmente no caso dos pilotos de caça. Podem-se observar algumas modificações eletrocardiográficas, mas outras manifestações circulatórias estão ausentes. 3 - Estágio Compensatório

Ocorre de 2.000 m até cerca de 4.000 m (12.000 pés). A saturação da hemoglobina pelo oxigênio cai até 85%. Neste estágio as compensações fisiológicas (aumento do volume respiratório por minuto, taquicardia, aumento da velocidade circulatória, etc.), geralmente proporcionam


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uma adequada proteção contra hipóxia, de modo que seus efeitos, de regra, não se manifestam, a menos que o período de exposição seja prolongado ou que exercícios sejam efetuados. 4 - Estágio das Perturbações

Ocorre de 4.000 m até cerca de 6.500m (20.000 pés). A saturação da hemoglobina pelo oxigênio cai a 80% ou 70%. Neste estágio, também chamado estágio da hipóxia crescente, as compensações fisiológicas já não são suficientes para cobrir o déficit de oxigênio nos tecidos. Os efeitos da hipóxia surgem então de maneira progressiva crescente, até tornarem-se exuberantes. Podemos dividir os sintomas encontrados neste estágio em subjetivos, que incluem fadiga, lassidão, sonolência, tonteiras, cefaléia e euforia e objetivos, que podem ser assim agrupados: • Sintomas conseqüentes à depressão progressiva do S.N.C. - Órgãos dos sentidos - Há perturbação das percepções sensoriais. A visão está afetada com diminuição da acuidade visual. Também é reduzida a sensibilidade tátil. A audição é o último dos sentidos a ser afetado. - Processos mentais - Há dificuldade de discernimento. O raciocínio fica afetado precocemente, impossibilitando ao indivíduo uma perfeita compreensão do que está acontecendo. A memória é falha, o julgamento é deficiente e o tempo de reação é moroso. - Traços da personalidade - Modifica-se a personalidade, tal como ocorre no alcoolismo moderado. Pode haver euforia, excesso de confiança belicosidade ou morosidade. - Funções psicomotoras - Há diminuição ou perda de coordenação dos movimentos, tornando impossíveis os movimentos delicados ou que exigem muita precisão. Como conseqüência, o indivíduo dá esbarrões ao movimentar-se, não pode acompanhar corretamente os vôos acrobáticos ou em formação e tem letra ilegível. • Síndrome de Hiperventilação • Cianoses

5 - Estágio Crítico

Ocorre acima de 6.500m (20.000 pés) quando a saturação da hemoglobina pelo oxigênio cai a 60% ou menos. Neste estágio, por falha do sistema nervoso central ou por falha circulatória, há perda de consciência. Na hipóxia aguda a falha mais freqüentemente do sistema nervoso central; na hipóxia crônica, a falha é geralmente de origem circulatória. Em qualquer dos casos podem surgir convulsões. A inconsciência pode ser seguida de colapso e morte. Estudos realizados sobre o comportamento de pacientes sob anestesia geral, no solo, sugerem que o grau de hipoxemia, por si só, mesmo com concentrações de oxigênio próximas ao mínimo, não influi muito sobre a consciência, a qual desapareceria quase imediatamente no momento em que se produzisse uma hipercapnia e, ainda mais, se combinada com uma acidose respiratória descompensada.


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Considera-se como causa da perda do conhecimento na acidose respiratória no solo, a elevação da tensão do líquor cefalorraquidiano, sob ação congestiva da circulação cerebral por causa da hipercapnia. A tensão do líquor se normaliza logo que desapareça a hipercapnia. Daí a pronta reação e despertar dos enfermos quando se normaliza a tensão do anidrido carbôico por uma hiperventilação. Portanto, deve-se considerar, talvez, como inadequado, no solo, o termo “coma hipoxêmico” ou perda da consciência pela hipóxia, pois na realidade, deveria classificar-se como "coma hipercápnico" ou perda do conhecimento por hipercapnia. Em altitude não existe hipercapnia. Estudamos o desenvolvimento da hipóxia durante uma ascensão normal (hipóxia aguda). Vejamos, agora, como se desenvolve a hipóxia após a perda acidental do oxigênio. É chamada de hipóxia fulminante. Aqui devemos considerar os seguintes dois casos: Se a perda de oxigênio se verifica abaixo de 12.000 metros (38.000 pés) há um desenvolvimento acelerado dos acontecimentos descritos anteriormente; e Se a perda de oxigênio se verifica acima de 12.000 metros (38.000 pés) o indivíduo torna-se inconsciente e entra em colapso abruptamente, sem sintomas que prenunciem tais acontecimentos e, quando reavivado, muitas vezes não se recorda do fato. 6 - Tempo útil de Consciência (T.U.C.)

Chama-se tempo útil de consciência ao tempo decorrido entre a perda de suprimento do oxigênio até a falha do desempenho. A perda de suprimento do oxigênio pode decorrer devido a uma desconexão acidental da tubulação ou de uma descompressão súbita. O T.U.C. pode ser experimentalmente determinado, na câmara de baixa pressão, pelos testes psicomotores. A tabela a seguir nos mostra o tempo útil de consciência após uma desconexão acidental da tubulação de oxigênio e após uma descompressão rápida, em diversas altitudes, e com o indivíduo quieto (sentado) ou em atividade moderada.


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As primeiras e terceiras colunas foram obtidas de dados provenientes de várias fontes. As segunda e quarta colunas foram baseadas na opinião segura de que o exercício moderado diminui o T.U.C. em cerca de 50%. Estudaremos, finalmente, o desenvolvimento da hipóxia durante um vôo prolongado entre 3.000 m e 4.000 m (9.000 pés a 12.000 pés). É chamada de hipóxia crônica. Nesse caso, os seguintes três aspectos merecem atenção: • Não há nenhuma redução perceptível no desempenho das funções. • Após algumas horas surgem a fadiga e a cefaléia. • O menor esforço acarreta dispnéia e taquicardia.

IV - PROFILAXIA DA HIPÓXIA A prevenção da hipóxia é obtida pela administração de oxigênio em diluição com o ar, conforme é proporcionado pelo regulador do sistema de diluição demanda até 34.000 pés. Pela administração de oxigênio puro (100%) acima de 34.000 pés e até 40.000 pés. Pela administração de oxigênio sob pressão (respiração sobre pressão) acima de 40.000 pés e até o teto máximo de 47.000 pés. Pelo emprego de roupas e de cabines pressurizadas acima dessa altitude. A profilaxia consiste, pois, em aumentar a tensão parcial de oxigênio pelo aumento da percentagem desse gás ou pelo aumento da pressão atmosférica.


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V - TRATAMENTO DA HIPÓXIA O tratamento consiste na administração de oxigênio 100% puro. Havendo parada respiratória, emprega-se um dos métodos de respiração artificial. Às vezes persistem alguns sintomas, como seja, cefaléia (geralmente frontal), letargia, náuseas e vômitos. Tais sintomas, decorrentes, sobretudo de um edema cerebral, melhoram com o soro glicosado hipertônico e com uso de oxigênio.

VI - HIPERÓXIA O oxigênio é vitalmente necessário para o aviador operar sua aeronave segura e eficientemente. A condição indispensável de existência de oxigênio para manter a vida em altitude é indiscutível, entretanto, quantidades excessivas ou pressões parciais de oxigênio excessivamente altas podem ser fatais. A conseqüência do excesso de oxigênio respirado pelo pessoal de vôo não é bastante grande para causar danos ao organismo. Entretanto, o problema da toxidade de oxigênio é significativo nas operações submarinas e hiperbáricas, onde as pressões parciais dos gases respirados são excessivas. Por esta razão, um breve resumo dos efeitos das elevadas pressões de oxigênio é esboçado a seguir. As manifestações nocivas das elevadas pressões parciais de oxigênio estão diretamente relacionadas a dois fatores: • Nível de elevação de pressão parcial; e • Duração da exposição.

Em altitude, por causa do decréscimo da pressão ambiente, a respiração de oxigênio 100% puro produz pressões parciais alveolares desse gás que geralmente não causam danos. Os seguintes três tipos de toxidez pelo oxigênio são conhecidos como ocorrendo no homem: 1 - E f e i t o L o r r a m- S m i t h ( T o x i d e z P u l m o n a r p e l o O x i g ê nio)

Este fenômeno, primeiramente reconhecido durante o tratamento da doença de descompressão em mergulhadores de grande profundidade (165 pés ou seis atmosferas absolutas - ata) usando do ar, pode ocorrer a níveis tão mais baixos como 0,7 - 0,8 ata, 532 mm Hg ou 9.500 pés, respirando oxigênio 100% puro. O dano pulmonar que pode resultar consiste no acúmulo de fluído e hemorragia dentro dos alvéolos, como resultado de uma condição semelhante à pneumonia e que pode ser fatal.


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Algumas pessoas são muito mais susceptíveis de sofrer danos que outras, mas Bean notou que maior quantidade de indivíduos desenvolvem sintomas e sinais em cerca de vinte horas respirando oxigênio puro ao nível do mar. Pode-se ver então que respirar oxigênio 100% puro, por muito tempo, mesmo em baixas altitudes, pode, teoricamente, causar danos ao organismo. A duração dos períodos de respiração de oxigênio em baixas altitudes não representa problema em aviação. Na terapia de compressão para a doença de descompressão de altitude, onde é administrado oxigênio 100% puro a 2,8 ata, (60 pés de profundidade) com duração acima de uma hora pode haver perigo, por isso, é tomada precaução de, para cada vinte minutos de respiração de oxigênio, há um intervalo de cinco minutos de respiração do ar ambiente. A exata causa da toxidade pulmonar pelo oxigênio ainda não foi satisfatoriamente compreendida, mas pensa-se numa interferência com a função normal da parede alveolar. 2 - Efeito Paul Bert (Toxidade no Sistema Nervoso Ce ntral pelo Oxigênio)

Este efeito da elevada pressão parcial do oxigênio é manifestado por convulsões generalizadas, iguais às convulsões do grande mal epiléptico. Nesta manifestação há ampla variação individual na susceptibilidade, mas em geral, pode-se dizer que respirar oxigênio 100% puro a 2,8 ata (60 pés de profundidade) por trinta minutos é seguro para a maior parte dos indivíduos e que só raramente serão encontradas convulsões com menos de duas horas de respiração de oxigênio 100% puro a essa pressão. Os sinais de perigo consistem em palidez, suores, abalos musculares, formigamento, parestesias, náusea, ansiedade e encurtamento da respiração, levando finalmente à convulsão completa. A intensidade e tempo de início são marcadamente afetados pelo exercício na profundidade durante a respiração de oxigênio. Por esta razão, a Marinha dos EUA limita a profundidade de uso da aparelhagem "SCUBA" de circuito fechado, para mergulho a 25 pés, enquanto o mergulhador estiver respirando oxigênio 100% puro e nadando.

VII – EFEITOS DA HIPÓXIA DE ALTITUDE 1 - Considerações Iniciais

O ar exerce pressão sobre a superfície da terra, demonstrada desde 1643 por Evangelista Torricelli. Ao nível do mar, a 45° de latitude, o seu valor é igual a 760 milímetros de mercúrio. A pressão barométrica decresce com a altitude. Assim, aos 5.500 m equivale a meia atmosfera (380 mm Hg) e aos 8.200m, a um terço. A atmosfera é essencialmente composta de azoto e oxigênio (Lavoisier) na proporção constante, em qualquer, que seja a altitude, de 79% e 21 % em volume. Outros gases nobres (hidrogênio, gás carbônico) são encontrados em mínimas quantidades, praticamente desprezíveis.


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Considerando-se a constância da composição percentual do ar, a lei de Dalton se torna aplicável para explicar uma diminuição das pressões parciais de seus componentes, paralela com a queda barométrica nas diversas altitudes. A uma dada altitude, a pressão parcial do oxigênio (de interesse mais particular) no ar ambiente é igual ao valor da pressão atmosférica deste lugar multiplicada por 21% (praticamente a quinta parte). A passagem do oxigênio dos pulmões ao sangue obedeça às leis físicas da difusão, conseqüentemente, a fixação sobre a hemoglobina para formar a oxihemoglobina é essencialmente função da diferença entre as suas pressões parciais no ar inspirado alveolar e no sangue venoso que chega aos pulmões. Ao nível do mar, este gradiente de pressão é aproximadamente de 60 mm Hg (PA O2 = 100 mm Hg e o PV O2 = 40 mm Hg) o que permite uma saturação de 97% da hemoglobina. Com a ascensão através da atmosfera o gradiente alveolo-capilar do PO2 se reduz, a taxa de oxihemoglobina diminui segundo a curva de Barcrogt, o conteúdo em oxigênio do sangue arterial baixa, instalando-se assim uma hipóxia hipóxica. Com estas considerações, define-se a hipóxia atmosférica, ou hipóxia hipóxica como um estado de deficiência aguda ou gradual de oxigênio conseqüente à diminuição da pressão parcial do oxigênio no ar inspirado. A suboxigenação acarreta um grande número de reações por parte do organismo e estas, por sua vez, geram reações secundárias e terciárias. Dentro de certos limites, um mecanismo compensador de adaptação fisiológica permite a manutenção da homeostase. Strughold estudando a hipóxia das altitudes e os meios fisiológicos de adaptação a esta nova condição distingue: • Uma zona indiferente, estendendo-se até os 2.000 m (6.500 pés) na qual não se constata uma modificação notável na atividade das grandes funções. • Uma zona de compensação completa, de 2.000 m (nível de reação) a 4.500 m (1500 pés), evidenciando um esforço de adaptação cardiovascular. • Uma zona de compensação incompleta, acima dos 4.500 m (nível dos distúrbios), malgrado um esforço acrescido das grandes funções vegetativas. • A partir dos 6.500 m (22.000 pés), a vida está em perigo.

2 - Hipóxia e Respiração Somática

A hiperventilação é a primeira reação desenvolvida no homem normal e em repouso; resulta de um aumento de volume corrente, pouca modificação havendo na freqüência respiratória quando a hipóxia é moderada. A ação direta da hipoxemia sobre o centro respiratório (CR) é mínima, devendo-se a reação ventilatória ao mecanismo reflexo de estimulação dos quimioreceptores das zonas sinocarotidianas. Os efeitos da hiperventilação sobre o organismo são múltiplos: a) Ação Sobre a Pressão do Oxigênio Alveolar - A hiperventilação impede uma queda acentuada da pressão parcial do oxigênio alveolar, favorecendo assim um fornecimento de maior


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teor de oxigênio ao sangue. Um indivíduo que não hiperventila por uma razão qualquer sucumbe aos 4.500 m (15.000 pés). b) Ação Sobre a Pressão Alveolar de Gás Carbônico - Com a hiperventilação intensa prolongada há uma hipocapnia. A diminuição do CO2 sangüíneo ocasiona reações de compensação. (1) O pH sangüíneo se eleva (alcalose) e põe em jogo um mecanismo regulador: - Sobre o centro respiratório - a baixa de CO2, causa uma diminuição de sua atividade por ser um dos estímulos desse centro. - Sobre os rins - a eliminação de valências alcalinas tende a restabelecer um pH normal. - Sobre a Hipófise - com uma diminuição do hormônio antidiurético surge uma poliúria. - Sobre o estômago - há uma diminuição da secreção do ácido clorídrico, numa tentativa de reter hidrogeniontes. - Sobre o pâncreas - a eliminação do suco alcalino favorece a baixa do pH sangüíneo. (2) Alteração da curva de Barcroft. - A elevação do pH desloca a curva para a esquerda, o que explica o aumento da captação do oxigênio pela hemoglobina, havendo um transporte de maior teor do mesmo para os tecidos que estão em acidose. c) Ação Circulatória - A hipocapnia e a hipóxia determinam reações cardiovasculares. d) Ação sobre o Sistema Nervoso - A hipocapnia acentuada diminui a coordenação neuromuscular, determinando tremores, aumento do consumo do oxigênio, agravando a anoxia. e) Desidratação - Conseqüente a uma acentuada eliminação hídrica pelos pulmões e rins. Nos habitantes das grandes alturas, características próprias se desenvolvem diante da hipóxia crônica, tais como: • tórax mais volumoso; • inspiração curta e expiração mais longa; • maior capacidade pulmonar; e • capacidade vital aumentada.

Todo o mecanismo de compensação entra em falência quando se atinge a faixa da hipóxia severa pois, com ela, sobrevêm a hiperventilação, a acidose tissular com formação de ácidos fixos (acidose metabólica), a depressão cardiovascular e a parada cardíaca. 3 - Hipóxia e Circulação


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Diante da hipóxia moderada, o comportamento cardíaco se faz no sentido de um aumento de seu débito, conseqüente ao aumento da freqüência e do volume sistólico, o eletrocardiograma pouco varia, evidenciando apenas uma taquicardia sinusal, com um encurtamento da duração do PR: uma diminuição de amplitude da onda T pode ser notada. A pressão arterial sistólica e diastólica não se eleva a partir de 3.500 m (12.000 pés), embora em níveis inferiores já se observe o aumento do débito cardíaco, as artérias dos territórios chamados sacrificados (pele, fígado, rim etc) se contraem, favorecendo a dilatação das que irrigam os territórios privilegiados (cérebro, coração, musculatura estriada). A hipocapnia, quando acentuada, determina uma vasoconstrição cerebral predominando assim sobre o efeito vasodilatador da hipóxia. As hipóxias severas produzem sérios distúrbios cardíacos, podendo-se assinalar bloqueios auriculoventriculares de diversos graus, ritmo nodal, inversão da onda T, taquicardia ventricular precedendo a fibrilação e a parada cardíaca. Os nativos das grandes altitudes apresentam características cardiovasculares, tais como: hipertensão pulmonar, hipertrofia ventricular direita, bradicardia e moderada hipotensão, aumento de volume sangüíneo, aumento do leito capilar pulmonar e sistêmico. 4 - Hipóxia e o Meio lnterno

A hipóxia modifica os gases do sangue e os elementos figurados. A hipoxemia pode ser apreciada pela medida da taxa de saturação da hemoglobina e da pressão parcial do oxigênio arterial. A hiperventilação hipóxica favorece a eliminação pulmonar do gás carbônico. Além dos mecanismos de adaptação rápida à hipóxia, construídos pela hiperventilação pulmonar com aceleração circulatória e as demais reações decorrentes, surgem uma policitemia e um aumento da taxa de hemoglobina com um processo lento de aclimatação à altitude. Há assim, um aumento da capacidade veiculadora do sangue no transporte do oxigênio. Existe realmente uma correção perfeita entre a baixa da PC02 e o aumento da hemoglobina circulante. As seguintes taxas de hemoglobina são encontradas nos residentes permanentes: 16,3 g a 1.000 m; 17 g a 2.000m; 18 g a 3.000 m; 19 g a 4.000m; 22,8 g a 5.300m; 24,7g a 7.000 m (A. Furtado, D.F. Merino E. Delgado, 1945). O número de hemácias é mais elevado nos indivíduos adaptados a hipóxia: 5.420.000 hemácias por mm³ em Denver - 1.520 m de altitude; 5.990.000 em Johannesbourg - 1.750 m de altitude; 6.500.000 no México - 2.250 m de altitude; 7.500.000 em La Paz - 3.660 m de altitude; 8.000.000 em Nabga Parbat - 8.000 m de altitude (UAC. Luft, 1941). As taxas de plaquetas são aumentadas, embora de modo mais evidente na hipóxia aguda do que na crônica. A hipóxia moderada causa uma policitemia através de um mecanismo de neoformação. A taxa de reticulócitos, normalmente inferior a 1%, atinge 2% a 5% nos indivíduos adaptados.


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Admite-se atualmente a existência de um hormônio mediador, a “hematopoietina”, elaborado pelos rins, que atua como excitante da medula óssea. O fígado e o baço retomam a sua função hematopoiética, como se regredissem a um estado fetal. Na hipóxia grave surge uma policitemia de mobilização, como conseqüência de uma esplenocontração. Os seguintes três mecanismos são responsabilizados: • Mecanismo Nervoso - ação de centros esidleno-constrictores. • Mecanismo Humoral - a adrenalina age diretamente sobre o baço. • Mecanismo Direto - a hipóxia produz diretamente uma esplenocontração.

5 - Hipóxia e o Aparelho Digestivo

De um modo geral a hipóxia aumenta a atividade motora e diminui as secreções do aparelho digestivo. Ao nível do estômago, o exagero do tônus pilórico favorece os vômitos; ao nível do intestino há igualmente hipertonia intrínseca, com a contração provocada pela dilatação dos gases devido à baixa da pressão atmosférica. Sob uma hipóxia severa, os fenômenos se invertem - diminuição do tônus e paralisia total do tubo digestivo. A diminuição das secreções digestivas ocorre por uma ação direta da hipóxia sobre a atividade celular e indiretamente por um mecanismo reflexo. 6 - Hipóxia e o Aparelho Urinário

Diante da alcalose respiratória, determinada pela hiperventilação compensatória, os rins atuam como órgãos de destaque na manutenção do equilíbrio ácido-básico. A resposta renal é reduzir a excreção do hidrogênio, eliminando o fosfato dibásico em vez de monobásico, frenando a formação de amônia e eliminando potássio; o cloro é retido enquanto que o anion CO³H e o sódio são eliminados. Sob uma hipóxia moderada observa-se uma poliúria devida a um mecanismo complexo: • Dilatação dos capilares renais. • Diminuição do hormônio antidiurético hipofisário.

Com a hipóxia severa há uma redução brutal do fluxo sanguíneo, o que acarreta uma oligúria e anúria. Lesões rapidamente aparecem ao nível dos tubos renais, determinando glicosúria, hematúria e albuminúria. 7 - Hipóxia e Glândulas Endócrinas

Hipófise - Como em face de toda agressão importante, a hipóxia determina um aumento de ACTH. A secreção do hormônio antidiurético é diminuída.


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Supra-renais - Exibem alterações através de nítido aumento da secreção de seus hormônios medulares e corticais. O excesso de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) estimula a aceleração cardíaca, a elevação ao tono vascular, a hiperglicemia, a esplenocontração. A hipersecreção de aldosterona justifica o aparecimento do edema ao nível das células, a retenção do cloro nos tecidos e a diminuição da excreção do cloro pelos rins. Rim endócrino - As células justa-glomerulares do rim elaboram uma enzima - a renina - cujo teor é aumentado pela hipóxia. Como se sabe, a renina, produz a angio-tensina a partir de uma globulina-plasmática que estimula a síntese da aldosterona no córtex supra-renal. Pâncreas endócrino - A hipóxia moderada provoca uma hiperrinsulinemia. 8 - Hipóxia e Vida de Relação

A hipóxia e a hipocapnia se associam em seus efeitos depressores. Os testes realizados em piloto comprovam alterações das funções intelectuais: atenção, memória, julgamento, raciocínio. As alterações do comportamento são também conhecidas: euforia ou, ao contrário, estado depressivo, estado pseudo-alcoólico, etc. A maior forma de falência dos centros superiores é a perda de consciência que sobrevêm com uma altitude superior aos 7.000 m (23.000 pés). Outros distúrbios funcionais podem ser observados, tais como: • Aumento do limiar dos reflexos tendinosos, desde os 2.000 m (6.500 pés). • Distúrbios do equilíbrio, com incoordenação motora e tremores, aos 5.000 m (17.000 pés). • Distúrbios sensoriais, sendo que a visão é particularmente sensível a hipóxia (déficit, da visão noturna), mesmo em altitudes de 1.500 m (5.000 pés).

VIII - PERIGOS DO FUMO NA AVIAÇÃO Fonte de monóxido de carbono (gás letal produzido pela combustão incompleta de qualquer material orgânico) o cigarro é um grande inimigo do aviador. A diminuição da capacidade de transporte de oxigênio por parte das hemoglobinas, nos fumantes, acarreta graves conseqüências. A retina é o tecido que mais sente a falta de oxigênio no sangue. A 15.000 pés necessita-se duas vezes mais luz para distinguir-se um objeto, do que se ele estivesse ao nível do mar. Assim, um piloto fumante teria dificuldade nessa altitude, onde o ar é rarefeito. A tonalidade dos objetos também é prejudicada, dificultando distinguir, numa mesma cor, se ela é mais clara ou mais escura. A coordenação dos membros, centros sensoriais e funções psicomotoras são também afetados em um nível de 10% de monóxido de carbono no sangue, percentual de dois maços de cigarros por dia. Uma pessoa que se encontre numa sala de 40 m³ e acabou de fumar um cigarro, produziu 2.700 microgramas de partículas de alcatrão por metro cúbico, o que significa haver poluído trinta e seis vezes o nível do ar limpo.


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Uma só baforada contém 1,63 miligramas de monóxido de carbono. Como um fumante aspira, em média, oito baforadas por cigarro, e consome dez cigarros em oito horas de prazer, ao final deste período, os que não fumam, mas que trabalham ao seu lado, tiveram que respirar 130 miligramas de veneno letal. Um fumante que consome vinte cigarros por dia inala, com os 10 m³ de ar que respira diariamente, 46.000 miligramas de partículas de alcatrão por metro cúbico, o que equivale, simplesmente, a cinqüenta vezes o nível de emergência de ar contaminado e seiscentas vezes o nível de ar limpo. Se você é aeronauta, pense duas vezes antes de acender o próximo cigarro.

UM CIGARRO DISSE PARA UM FUMANTE: HOJE VOCÊ ME ACENDE... AM ANHÃ, EU TE APAGO...

IX - CONCLUSÃO Conforme já se havia antecipado, vimos que todos os órgãos e funções são afetados pela hipóxia e, mobilizados na reação contra ela, sempre buscam manter as condições de vida dentro da estreita faixa da homeostase. Vimos, ainda, como interfere no metabolismo orgânico, afetando o funcionamento de praticamente todos os territórios orgânicos, e que o organismo lança mão de uma série de recursos fisiológicos para compensá-la. Quando esses recursos são insuficientes, sobrevém a morte.


P r e v e n ç ã o H i p ó x i a

e

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A c i d e n t e s

H i p e r v e n t i l a ç ã o

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ÍNDICE

CONTEÚDO I - INTRODUÇÃO II - CARACTERIZAÇÃO DE CADA TIPO 1 - Hipóxia Hipoxêmica 2 - Hipóxia Anêmica 3 - Hipóxia Estagnante 4 - Hipóxia Histotóxica III - SINTOMATOLOGIA 1 - Generalidades 2 - Estágio Indiferente 3 - Estágio Compensatório 4 - Estágio das Perturbações 5 - Estágio Crítico 6 - Tempo útil de Consciência - T.U.C. IV - PROFILAXIA DA HIPÓXIA V - TRATAMENTO DA HIPÓXIA VI - HIPERÓXIA 1 - Efeito Lorram-Smith 2 - Efeito Paul Bert VII - EFEITOS DA HIPÓXIA DE ALTITUDE 1 - Considerações Iniciais 2 - Hipóxia e Respiração Somática 3 - Hipóxia e Circulação 4 - Hipóxia e o Meio Interno 5 - Hipóxia e o Aparelho Digestivo 6 - Hipóxia e o Aparelho Urinário 7 - Hipóxia e Glândulas Endócrinas 8 - Hipóxia e Vida de Relação VIII - PERIGOS DO FUMO NA AVIAÇÃO IX - CONCLUSÃO


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