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Testemunhos

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Espiritualidade

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Pe. Vicente Euteneuer msf, um “evangelho ambulante”

Nascido na Alemanha, em 1930, Vicente Euteneuer veio ao Brasil como missionário em formação em 1961, e isso certamente favoreceu sua notória e conhecida fl uência na língua portuguesa. Com uma habilidade muito peculiar, ele se aproximava das pessoas, fazendo perguntas e considerações acerca da realidade, com uma simplicidade e um senso de humor que contagiava as pessoas. Sua presença era acompanhada de uma atenção cativante, traduzida em uma mística que despertava uma sensação de bem-estar impressionante.

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Depois de ter sido coordenador de Pastoral da Diocese de Januária/MG, Pe. Vicente foi nomeado pároco da Paróquia São José, na cidade de São Francisco, em 1971. Tornou-se conhecido no extenso território do município, admirado e respeitado por todo o povo. Como pároco, desbravou a vasta região, enfrentando os desafios das estradas, ou da falta de estradas de acesso às moradias das pobres famílias, distantes dos escassos recursos que a cidade oferecia ou se recusava a oferecer.

Inicialmente, quando não havia capelas, ele celebrava na frente da casa de uma liderança. No dia anterior, quando não tinha uma árvore grande por perto, fazia-se um mutirão para preparar uma sombra no local da celebração debaixo da qual os fiéis podiam se abrigar do sol escaldante e sempre constante, no clima semiárido da nossa região. O dia da celebração era como que uma só missa, da manhã até a tarde.

A longa permanência do Pe. Vicente em São Francisco e a sua incansável atuação na Paróquia São José deixou marcas profundas na vida da igreja local. Sua atuação se destaca pela criação de muitas comunidades eclesiais, urbanas e rurais; pela formação e animação de lideranças leigas e pela construção de capelas, proporcionando melhores condições para as famílias se reunirem para celebrar em comunidade.

Em 1979, uma grande enchente que atingiu muitas famílias sensibilizou muito o Pe. Vicente, e ele iniciou um projeto de construção de moradias, envolvendo os próprios habitantes e benfeitores da Alemanha. Esta vila, que se transformou em Bairro Sagrada Família, recebeu mais de mil casas para os pobres, e hoje, com mais de quinze mil habitantes, é a sede da mais nova paróquia, a Paróquia Sagrada Família de Nazaré.

O Pe. Vicente viveu como pobre no meio dos pobres, sempre atento às necessidades das pessoas que batiam na sua porta, sem distinção de pessoas. Com simplicidade e teimosia ele exercitou com firme convicção a prática da caridade até o último dia de sua vida. O testemunho de uma pessoa que o conhecia profundamente resume tudo: “Pe. Vicente é o Evangelho ambulante, anunciado não somente por palavras, mas por cada gesto seu. Falar do Pe. Vicente é fácil, difícil é continuar os trabalhos que ele realizou e nos ensinou a realizar por amor a Jesus Cristo”. O nosso fundador, Pe. Berthier, havia ensinado que “os pobres, os doentes, os abandonados são quinhão mais querido do verdadeiro discípulo de Jesus Cristo”. É isso que o Pe. Vicente assumiu radicalmente e deixa como testemunho.

O Pe. Vicente terminou sua jornada missionária no dia 1º de julho de 2021, nas dependências da casa onde ele passou a residir nos últimos meses, deixando encaminhado o projeto de continuidade de suas ações em forma de uma entidade denominada “Associação Comunitária de Caridade Pe. Vicente”. Que a memória desse Missionário da Sagrada Família, generoso na acolhida das pessoas, mãos estendidas para partilhar o pão com os necessitados, nos inspire no amor ao próximo e na prática da justiça social.

Pe. Pedro Leonides Rocha da Silva msf

Na beleza e na simplicidade da catedral dos cajueiros

No dia 27 de junho, celebrei juntamente com os amigos e amigas, formandos e coirmãos, a minha consagração definitiva como Missionário da Sagrada Família. Foi uma celebração cheia de emoção e simbologia, que aconteceu na “catedral dos cajueiros”, um espaço aberto e arborizado na sede da missão, em Mecubúri. As mangueiras e cajueiros juntam suas copas e formam uma magnífica obra-prima, um belo e decorado teto de catedral.

Este é o meu quarto ano na missão. Cada dia que passei nestas terras tão acolhedoras de Moçambique me fortaleceram na decisão de professar os votos perpétuos. Claro que gostaria de ter tido minha família de sangue ao meu lado neste momento tão importante, mas a distância impediu que isso acontecesse. Contudo, graças à internet eles puderam fazer parte deste lindo momento.

Mas tem outra coisa: em todos esses anos de missão fui construindo amizades que se tornaram família. Estes representaram cada familiar, cada amigo. Minha família de sangue estava longe, mas eu estava rodeado de irmãos missionários e das irmãs da imensa “família das criaturas”, como gosta de falar o Papa Francisco. Eles foram testemunhas do meu sim, da entrega da minha vida ao serviço dos irmãos e da Igreja. Senti-me acolhido e amparado por todos que estiveram presentes na celebração, física ou virtualmente.

Mas as emoções não pararam por aí. Após a celebração, num momento de confraternização, recebi belas homenagens dos meus familiares e amigos. Foi muito bom ver através de vídeos, palavras de incentivo e apoio dos meus tios e tias, dos meus pais, da minha irmã, dos meus amigos. Todos esses presentes e palavras só me impulsionam e fortalecem ainda mais no meu ser missionário.

Tomei como lema da celebração dos votos perpétuos a passagem do cego Bartimeu: “Coragem, levante-se, Jesus está chamando você!” (Mc 10, 49) É assim que sempre me senti impulsionado a seguir minha vocação: tomando coragem para colocar-me em pé num salto e seguir adiante, deixando para trás as coisas que me prendiam. Não é fácil deixar coisas, porém é preciso fazer isso para aceitar novos desafios. Na missão os desafios são diários, mas é por causa desses desafios, desse amor que sinto pelo trabalho que realizo e pelas pessoas com as quais convivo, que escolhi a catedral dos cajueiros como lugar para celebrar este momento;

Os votos são dons recebidos, caminhos escolhidos e compromissos assumidos para toda uma vida, e devem ser vividos com fé e dedicação. É na simplicidade, a mesma simplicidade que encontramos na “catedral dos cajueiros”, e sonhando com uma fraternidade que abrace a humanidade e a criação inteira, que pretendo viver os meus votos. É para isso que vivo e viverei, com a graça de Deus.

Fr. Ricardo Klock msf

Nampula, Moçambique

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