Especial 100 anos da soja

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100 anos da soja

DEZEMBRO de 2014

que redesenhou o mapa do Brasil


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AGRONegócio – Especial Soja

Dezembro de 2014


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[editorial O grão que desbravou o país

D

e Norte a Sul, de Leste a Oeste, a soja não apenas redesenhou o mapa do Brasil como levou progresso, desenvolvimento e tecnologia às mais diferentes regiões do país. Ao longo de um século de história abriu estradas, construiu cidades e mudou o perfil da economia brasileira. Ampliou divisas e se transformou no principal item da pauta de exportação à frente inclusive do minério de ferro. Com liquidez comparada à do petróleo, assume relevância singular como grande ativo da economia do agronegócio e também da economia nacional. Moeda de troca nas transações da cadeia produtiva, a cultura conquistou espaço de destaque no mercado financeiro e virou investimento. Não necessariamente em produção física, mas em títulos e papéis negociados mundo afora. Do consumo animal à alimentação humana, a busca por uma destinação mais nobre também colocou a soja à mesa da população. E foi além. Mais recentemente passou a ser usada como matéria-prima para a produção de combustível, energia limpa e renovável chamada de biodiesel. Destinações polivalentes que elegeram o grão como a commodity agrícola mais cobiçada dos tempos modernos. Do início do plantio em Santa Rosa (RS), que permite ao Brasil comemorar 100 anos de cultivo, a soja subiu o mapa e desbravou fronteiras. Um legado que motivou a publicação desta revista, dedicada a contar um pouco dessa história. Um relato baseado em um recorte sem pretensões científicas, baseado em relatos e registros dos próprios personagens dessa saga, os produtores rurais. Cultivada continuamente há um século no Brasil, a história da soja enquanto commodity – que ganha área num ritmo surpreendente, causa efervescência no campo e redesenha o mapa da agricultura no país – é recente. Somente nos últimos 40 anos o grão assumiu papel fundamental. Modernizou o agronegócio e, na última década, foi o alicerce da balança comercial. A revista, portanto, não tem o propósito de encerrar a questão. Mas de mostrar a extensão de um ciclo econômico sem precedentes e que não tem prazo para terminar. Boa leitura!

Expediente A revista Agronegócio é uma publicação da Editora Gazeta do Povo. Diretora de Redação: Maria Sandra Gonçalves. Edito­r Execu­tivo: Giovani Ferreira. Edição: José Rocher. Edito­r Execu­tivo de Imagem: Marcos Tavares. Edito­res de Arte: Acir Nadolny e Dino R. Pezzole. Projeto Gráfico: Dino R. Pezzole, Joana dos Anjos e Marcos Tavares. Diagra­ma­ção: Kako Frare. Tratamento de Imagem: Edilson de Freitas e Marcos

Giovani Ferreira Núcleo de Agronegócio da Gazeta do Povo giovanif@gazetadopovo.com.br

Navarro. Capa: Jonathan Campos. Re­da­ção: (41) 3321-5050. Fax: (41) 3321-5472. Co­­mer­­cial: (41) 3321-5904. Fax: (41) 3321-5300. E-mail: agro@gazetadopovo.com. br Site: www.agrogp.com.br Endereço: R. Pedro Ivo, 459. Curitiba-PR. CEP: 80.010020. Não pode ser vendido separadamente. Impressão e acabamento: Gráfica Fotolaser.

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16 a 19

Grão de peso – O ciclo da soja não

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Século de expansão – Soja é plantada há um século na colônia de imigrantes que difundiu a cultura, no Rio Grande do Sul

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Coisa de gaúcho – Agricultores que migraram de terras gaúchas rumo ao norte levaram sementes na bagagem e atravessaram o Brasil

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Tudo pela China – Agronegócio

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Futuro no Cerrado – Líder na colheita, a região central do Brasil é a que tem mais áreas para ampliar o plantio de verão

Albari Rosa / Gazeta do Povo

[índice

Jonathan Campos/Gazeta do Povo

tem precedentes na história do Brasil e amplia a participação do agronegócio na economia

brasileiro amplia a sojicultura basicamente para atender a crescente demanda da China

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Liderança disputada – A produção

32

Custos milionários – Os

crescente de soja põe o Brasil em pé de igualdade ante os EUA e dá liderança à América do Sul

experimentos que levam a uma nova variedade de soja custam mais de R$ 300 milhões

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Passo decisivo – Associado a outras tecnologias, plantio direto criou as condições para que a soja se espalhasse pelo Brasil afora

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[marco zero

Colônia que pôs fé na soja fez história Há exatos 100 anos, imigrantes alemães e russos deram início ao plantio contínuo da oleaginosa no Brasil. Prioridade era engordar os porcos e produzir carne e banha

Fotos: Hugo Harada/Gazeta do Povo

Roberto e Reneldo Racho: vocação da Linha 15 de novembro agora é o leite.

BERÇO DA SOJA Apontado como local das primeiras lavouras de soja do Brasil, Santa Rosa fica no Noroeste do Rio Grande do Sul.

Santa rosa (RS)

Santa Rosa

José Rocher, enviado especial

RIO GRANDE DO SUL

:: A soja entrou no Brasil diversas vezes, mas em experiências descontínuas. Sementes dos Estados Unidos chegaram à Escola de Agronomia da Bahia em 1882 — 132 anos atrás. Há registro de estudos com a planta em 1891 no Instituto Agronômico de Campinas (SP), que inclusive distribuiu grãos a produtores. Segundo a Embrapa Soja, houve plantio experimental em 1901 também no Rio Grande do Sul, onde o clima mais parecido com o dos EUA favoreceu a lavoura. Mas foi em 1914, há exatos cem anos, que a região gaúcha onde a soja perseverou teve o primeiro contato com a Glycine max, relata a historiadora Teresa Christensen. Ela analisou os registros históricos do Noroeste gaúcho e chegou à conclusão que as experiências anteriores na verdade fracassaram ou tiveram interrupções. Para a pesquisadora, a região que

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200 km

SC

72 mil habitantes 25 mil hectares de lavouras 20 mil hectares de soja no verão HISTÓRICO

1876 A região é registrada como distrito do município de Santo Ângelo Porto Alegre

Oceano Atlântico

1915 Passa à condição de colônia para o assentamento de imigrantes alemães e russos. 1931 Emancipação do município, com mais de 35 mil habitantes, a maioria agricultores.

Fonte: Prefeitura de Santa Rosa e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Infografia: Gazeta do Povo.

literalmente pôs fé na oleaginosa — hoje o produto mais importante da agricultura brasileira — corresponde a Santa Rosa, município da Xuxa e do goleiro Taffarel que se orgulha do título de Berço Nacional da Soja. A 15 quilômetros da zona urbana, na Linha 15 de Novembro — vila rural de cem famílias —, instalou-se em 2008 o Memorial da Soja, desde então o marco zero da sojicultura no Brasil. O Memorial homenageia o pastor norte-americano Albert Lehenbauer,

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que viveu no local numa época de trabalho árduo e pobreza. Surpreso com o potencial da soja nos Estados Unidos, distribuiu sementes a meia dúzia de famílias e ajudou a difundir a cultura a partir de 1923. Os porcos engordavam bem mais com a forrageira do que os alimentados com abóbora ou mandioca. Era fartura de carne e banha. Cada agricultor tinha de repartir parte dos grãos com os vizinho. Três anos depois, a soja havia se alastrado, e não houve mais volta.


Rosa (RS), testemunhou não só a época do surgimento da soja no Brasil, mas todas as fases da história do cultivo. Até hoje as pequenas propriedades dedicam-se ao grão, competindo com a produção em escala. Quando passou a ser amplamente usada como forrageira na alimentação de suínos, por volta de 1950, a oleaginosa era cultivada no meio do milho, em corredores de um metro de largura formados por fileiras do cereal, conta o agricultor Reneldo Racho, de 68 anos. Ele era criança na época em que os imigrantes apostaram na oleaginosa e mostra guardar lembranças nítidas de como viviam os “importados”. A soja só se tornou o principal produto da colônia quando o comércio de grãos se estabeleceu, na década de 1960, recorda. As dificuldades daquela época ensinam muito sobre como enfrentar os desafios do agronegócio, assegura. Toda a atividade era “no muque”, incluindo a colheita. As primeiras máquinas de corte, usadas na década de 1950, eram arrastadas pelos tratores. O trabalho árduo faz as quebras climáticas ou preços baixos de hoje parecerem mais leves, sustenta. Além da produção agrícola, Racho montou uma transportadora de leite para prestar serviço a indústrias. Quando o preço da soja mal cobre custos, são 30 vacas jérseis e três

quilos de soja por hectare são colhidos hoje no Berço da Soja, no Rio Grande do Sul, enquanto outras regiões do Brasil chegam a 4,5 mil quilos. O Noroeste gaúcho deu início ao cultivo com sementes dos Estados Unidos, adaptadas ao clima temperado. Sementes adaptadas ao clima do Cerrado, onde o regime de chuva é mais regular, elevam a média nacional de produtividade, que chega a 3 mil quilos por hectare. Para competir com a produção em escala, as pequenas propriedades onde a soja surgiu um século atrás produzem também trigo, milho e leite.

caminhões que equilibram as contas. A pecuária é a nova vocação da Linha 15, assegura. As margens de lucro apertadas da soja, em regiões que produzem 2,5 mil quilos por hectare, ofuscam a euforia do passado, compara Arturo Rutker, 72 anos, que conviveu com os produtores pioneiros. Seu avô materno produziu sementes que foram distribuídas a vizinhos e difundiram a soja na região. “O gasto para plantar era o trabalho. O que se ganhava era lucro da terra”, compara. Os 15 hectares da propriedade mantêm dois f ilhos, Renato e Valdino, em casa. Para competir na produção em escala seria necessário se aventurar por outras regiões. Mas sua opção foi a família. (JR)

“Meu avô recebeu sementes de soja do pastor Lehenbauer. Parte da colheita ele devolveu para a igreja, para que outros também pudessem plantar. Eles usavam as plantas para fazer lavagem para os porcos, para produzir carne e banha.”

O surgimento da soja no Brasil têm diversas datas, mas algumas foram determinantes.

1882 Sementes de soja dos Estados Unidos são trazidas ao Brasil pelo professor Gustavo Dutra, da Escola de Agronomia da Bahia. Em 1891, experiências similares ocorrem no Instituto Agronômico de Campinas (SP). Hugo Harada/ Gazeta do Povo

::A Linha 15 de Novembro, em Santa

2,5 mil

1914 A soja chega à região que hoje corresponde a Santa Rosa, no Noroeste gaúcho, e passa a se expandir continuamente . Na Linha 15 de Novembro, fica o Memorial da Soja, marco zero da sojicultura no Brasil (foto).

1940-50 Até a década de 1950, o trabalho é manual e a colheita, com foices (foto). O Brasil figura pela nas estatísticas internacionais de produção só em 1949, com 25 mil toneladas (meio navio). Hugo Harada/ Gazeta do Povo

Produtores herdam lições da fase primitiva do cultivo

Primeiras safras

1960 A produção se multiplica por cinco em uma década. Sai o 1º milhão de toneladas.

Arturo Tutker, 72 anos.

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Fox - De primeira, sem dúvida.

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Jonathan Campos/Gazeta do Povo

[movimentos migratórios

De mudança rumo ao Norte Expansão da soja a partir do Rio Grande do Sul estimulou ondas de migração pelo interior do país. Agricultores se espalharam por Santa Catarina e Paraná, ocuparam o Centro-Oeste e chegaram ao Nordeste Área de soja irrigada em Barreiras, no Oeste da Bahia. Terras extensas, planas e mais baratas atraem agricultores do Sul.

José Rocher :: A expansão da soja seguiu movimentos migratórios de agricultores do Sul para o Centro-Oeste e o CentroNorte do país. Esses fenômenos têm origem nas dificuldades que os colonos enfrentavam nas terras mais antigas do país e demarcam a história da oleaginosa. Os imigrantes começaram a subir o mapa do Brasil logo que a soja surgiu no Noroeste gaúcho, relata o historiador Jean Roche — que estudou a inserção de agricultores alemães no Brasil. Por volta de 1915, começava a faltar terra agricultável no Rio Grande do Sul, aponta, e os colonos partiram rumo a Santa Catarina. Nos anos 1920, o Sudoeste do Paraná recebia famílias de descendentes italianos e alemães vindas do Rio Grande do Sul, conta João David Folador, que pesquisa e escreve sobre o assunto. O movimento seria contínuo e marcaria a chegada da soja nas décadas seguintes. Depois de ganhar o Oeste paranaense, nas décadas de 1950 e 1960 a 12

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oleaginosa seguiria para Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, hoje maior produtor nacional, responsável por 30% da colheita. O último movimento do gênero formou o polo de produção de soja conhecido como Matopiba, que soma lavouras de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia e responde por aproximadamente 10% da safra nacional. Terras mais baratas que as do Centro-Oeste atraem produtores a comunidades em construção. Não há um levantamento sobre quantos produtores migraram para formar novos polos de produção de soja. A migração contínua dificulta recortes temporais ou quantitativos, conforme os historiadores. A constatação, no entanto, é que a maioria dos produtores dessas regiões identifica-se como de origem gaúcha, catarinense ou paranaense. Esse movimento migratório, alimentado pela soja, fica à sombra de outros registros também pautados por atividades econômicas. No século 18, quando Minas Gerais vivia o ciclo da mineração, a população lito-

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40% da produção de soja do Brasil devemse aos dois movimentos migratórios que ocuparam Mato Grosso e, mais recentemente, o Matopiba — polo de produção que soma zonas agrícolas de Maranhã, Tocantins, Piauí e Bahia. A expansão das fronteiras agrícolas continua levando agricultores para o Norte e o Nordeste do país.

rânea foi atraída para o interior. No século 19, o país registrou o fluxo de escravos do Nordeste para plantações de café de São Paulo e Rio de Janeiro. Em meados do século passado, a construção de Brasília levou à formação de centros urbanos no coração do país. Nas últimas décadas, centros de emprego do Sudeste e do Sul atraem trabalhadores de regiões mais pobres. A expansão da fronteira agrícola, no entanto, marca o movimento mais longo, que ainda não foi encerrado.


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Henry Milleo/Gazeta do Povo

[relação milenar

De volta para a China

Porto de Paranaguá carrega navio graneleiro para exportação. Terminais brasileirostrabalham cada vez mais para atender mercado chinês.

A soja surgiu em terras chinesas há 5 mil anos. Ironicamente, o país asiático é o maior importador do grão e o principal cliente do Brasil Carlos Guimarães Filho :: A soja tem muito mais de um século. A planta é conhecida e explorada há 5 mil anos na China, curiosamente o principal importador do grão. O país asiático deve comprar 74 milhões de toneladas em 20014/15, volume sete vezes maior que o da produção local. Os chineses priorizam outras culturas, como arroz, trigo e milho, e não têm lavouras suficientes para alimentar o total de 1,35 bilhão de habitantes. “A China escolheu ser autossustentável em milho e importar soja”, explica o sócio-diretor da AGR Brasil, Pedro Djneka. Um navio da oleaginosa vale o dobro de um navio do cereal, diluindo o custo do transporte. Em plena expansão do cultivo, o Brasil remeteu à China 32,25 milhões de toneladas de soja em 2013, ou 75% dos embarques do grão, conforme o Ministério da Agricultura. Foi o maior volume negociado entre dois países no período, comércio do qual o Brasil não pode abrir mão. A China colhe 12 milhões de toneladas da oleaginosa em safras normais. A necessidade anual de importação está

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DEPENDÊNCIA A falta de investimento na produção de soja e opção pelo milho fazem com que a China importe cada vez mais soja. O contínuo crescimento da população impacta diretamente na quantidade de oleaginosa que o país asiático precisa comprar. A dependência pela oleaginosa produzida em outras nações irá continuar aumentando.

74,0

69,0

Em milhões de toneladas

59,2 50,3 37,8

25,8

28,3

59,8

52,3

41,0

28,7

16,9

2003 • 04 2004 •05 2005 •06 2006 •07 2007 •08 2008 •09 2009 •10 2010 •11 2011 •12 2012 •13 2013 • 14 2014 •15

*previsão Fonte: USDA. Infografia: Gazeta do Povo.

passando de 70 milhões para 74 milhões de toneladas nesta safra. “Mudanças na China podem virar de ponta cabeça o mercado global [da soja], devido ao tamanho do país. Mas não espera-se uma alteração drástica nos próximos anos”, aponta Dejneka. Para o presidente do Grupo AgResource, de Chicago, nos Estados Unidos, Dan Basse, os motivos para a

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dependência chinesa envolvem fatores financeiros e logísticos. “Os preços mínimos do governo chinês para o milho estimulam a produção do cereal. Além disso, como a maioria das empresas esmagadoras de oleaginosa estão localizadas no litoral do país, isso virou um incentivo maior para a importação de soja e produção doméstica de milho e trigo”, pontua o executivo.


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[um país de grãos

O Brasil calçado pela agricultura A importância assumida pela soja no país configura um ciclo econômico sem precedentes, com potencial e riscos globalizados Cassiano Ribeiro :: O peso da soja para o Brasil vai muito além das mais de 90 milhões de toneladas esperadas nesta safra. Com os preços atuais, esse volume vale mais de R$ 80 bilhões, riqueza que se multiplica em segmentos correlatos. O principal produto da agricultura brasileira faz com que o agronegócio tenha participação de 23% no Produto Interno Bruto (PIB). Em grão, farelo ou óleo, a soja responde por 13% das exportações do país. O próprio custo de vida passa a depender da oleaginosa, por sua inf luência nos preços das carnes, do óleo e do biodiesel, uma lista de produtos que só cresce. Em nenhuma cidade do Brasil alguma família vive isolada do ciclo econômico da soja. O aumento da produção e o consequente ganho de participação do Brasil no mercado internacional nos últimos anos fizeram da soja a segunda mais importante commodity nacional, atrás somente do minério de ferro. As exportações do complexo soja (grão, farelo e óleo) rendem mais US$ 30,9 bilhões (R$ 77,2 bilhões) ao país ao ano. O faturamento obtido com essas transações internacionais corresponde a 31% das exportações do agronegócio, que envolvem outros grãos, o setor sucroalcooleiro, a pecuária e a indústria florestal. Esse desempenho tem garantido saldo positivo na balança comercial do Brasil há 13 anos. No ano passado, quando o superávit foi de US$ 2,55 bilhões, sem a soja, o país teria um déficit de US$ 28,35 bilhões. Os resultados crescem com a produção, mas estão sujeitos a incertezas que vão além da inf luência do clima. “Há alguns anos, o que ditava os preços inter-

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23% do Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB) são compostos pelo agronegócio. Proporção devese à expansão da soja e à geração de riqueza em setores diretamente relacionados à oleaginosa, como as cadeias de produção de carnes.

31% das exportações do agronegócio ou 13% das exportações do país referem-se aos embarques do complexo soja (grão, farelo e óleo). O setor arrecada mais de US$ 30 bilhões em um ano, com perspectiva de crescimento, dependendo da China.

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nacionais eram basicamente os estoques mundiais. Hoje estamos num mercado totalmente globalizado, sujeito à interferência de fundos de investimento especuladores e da indefinição na troca do ministro da Fazenda, por exemplo”, afirma o agricultor Gustavo Ribas, de Ponta Grossa, um dos polos brasileiros de produção de soja.

Cultivo pop Com um século de história nos campos brasileiros, a commodity completa o mais duradouro e importante ciclo agroeconômico do país. Nenhum outro produto teve expansão por quatro décadas consecutivas, ressalta o pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa-Soja), Amélio Dall’Agnol. Apesar da idade avançada, a soja está longe do seu ápice, avalia. “Ocupa quase metade da área cultivada no Brasil e continuará crescendo. As pastagens vão ceder espaço e também serão incorporadas na produção de soja e milho”, prevê Dall’Agnol. Para o sócio-diretor da consultoria MB Agro, José Carlos O’Farril, a única ameaça à expansão da soja no mundo e, principalmente no Brasil, vem do continente asiático. “A grande questão que se levanta hoje é a sustentabilidade do crescimento chinês”, frisa. “A China é o maior importador mundial e vem diminuindo suas taxas de crescimento”, acrescenta. Mas isso não é tudo. “A economia chinesa é muito maior, o PIB do país dobrou. Portanto, crescer 7% seria o mesmo que crescer 14% lá atrás”, pondera. O mercado da soja está relacionado ao aumento do consumo de proteína, que depende da renda per capita e de mudanças de hábito consideradas irreversíveis.


Os embarques do agronegócio foram responsáveis por 41% do total das vendas externas brasileiras no ano passado. Quase um terço do faturamento do setor, ou 13% da receita nacional com as exportações, veio do complexo soja. Juntos, grão óleo e farelo rendem hoje ao Brasil o equivalente ao que o agronegócio faturava há 10 anos. Em bilhões US$

Total Brasil

Agronegócio

Complexo Soja

256,0 242,6

242,2

201,9

197,9

13%

160,7

do total do Brasil

137,8

153,0

118,5 96,7 73,2

30,6

71,8 39,0

43,6

49,5

58,4

8,1

10,0

9,5

9,3

11,4

2003

2004

2005

2006

2007

64,8

95,0

95,8

24,1

26,1

2011

2012

100,0

76,4

18,0

17,2

17,1

2008

2009

2010

31,0

31% do total de Agronegócio

2013

Fonte: Ministério da Agricultura e Secretaria de Comércio Exterior. Infografia: Gazeta do Povo.

Fome mundial A expansão da soja em todas as regiões do Brasil está associada a mudanças na economia e no consumo notados também no Brasil. Metade da colheita do grão é processada e boa parte fica no mercado interno, para abastecer cadeias como as que produ-

zem carnes. O brasileiro passou a consumir mais frango que boi em 2006 e estimulou a formação de uma indústria que produz 12,3 milhões de toneladas de carne da ave ao ano (70% para consumo doméstico). É soja e milho transformados em proteína animal na mesa da população.

Além do consumo crescente no Brasil, explora-se o mercado externo. “Outros países da Ásia estão seguindo o caminho da China, como o Vietnã, que tem um potencial enorme, além da África e Índia, que possuem mais de 1 bilhão de habitantes”, diz o economista da MB Agro. GAZETA DO POVO

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Arquivo/ Gazeta do Povo

EFEITO SOJA


Cidades emergem no meio da lavoura :: A soja é capaz de fazer brotar cidades no interior do Brasil. Luis Eduardo Magalhães, no Oeste Baiano; Sorriso, ao Norte de Mato Grosso e Toledo, no Oeste do Paraná, são alguns exemplos. O Produto Interno Bruto (PIB) per capita desses municípios está acima da média nacional. No caso da cidade baiana, que pertence à mais recente fronteira agrícola do país, é de R$ 43 mil. Já a média brasileira é de cerca e R$ 28 mil, conforme dados do IBGE. Pesquisador do Cepea e professor da Universidade de São Paulo (USP), Lucílio Rogério Alves ressalta que o desenvolvimento da cultura, especialmente entre as décadas de 1970 e 1980, permitiu um avanço da colonização do Brasil Central. “Isso automaticamente promoveu um desenvolvimento de tecnologias para o campo, de infraestrutura”. Em outra frente, houve a “internacionalização do Brasil”. “Com a lei Kandir e os incentivos para exportar, intensificamos a relação do preço da soja com o mercado internacional”, comenta. E as cidades que giram em torno da oleaginosa, onde quer que se situem, passaram a ter conexão direta com o exterior. “Aqui não existia cidade. Éramos um distrito. Conforme a soja foi entrando nos campos e a produção foi crescendo, houve a transformação. A emancipação ocorreu em 1986”, conta Dilceu Rossato, prefeito de Sorriso (Mato Grosso), a “Capital Mundial da Soja”. No município, a commodity tem status de moeda. E, apesar de não gerar imposto para a prefeitura, alimenta o setor de transporte, líder em contribuição. “A agricultura está em segundo lugar, e depois vem o comércio”, afirma o prefeito. “A cidade vive em função da soja.” Em pouco mais de dez anos, Sorriso quintuplicou seu PIB, que hoje está em mais de R$ 3 bilhões. (CR)

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FORNECEDOR FIEL Em dez anos, o Brasil mais que dobrou o volume de soja destinado ao mercados externos, o que lhe garantiu ganho de fatia importante no comércio mundial. Nesse período, Estados Unidos e Argentina perderam espaço, mesmo com aumento da oferta disponível. Em milhões de toneladas | % de participação

Estados Unidos

Brasil

24,13 46%

Estados Unidos

Brasil

20,42 44,8 36% 40%

46,83 41%

2003

2013

Total mundial

Total mundial

113,39

56,05

Argentina

6,74 8%

Outros

Argentina

4,76 44,82 12% 12%

Outros

13,24 7%

Fonte: Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda). Infografia: Gazeta do Povo.

1 milhão de hectares de soja são plantados em Sorriso, no Norte de Mato Grosso. A área equivale a 9% das lavouras do estado e rende aos produtores mais de R$ 2 bilhões por ano. A marca de R$ 1 bilhão, alcançada na década anterior, ficou para trás com a valorização da commodity. O município agora tem área agrícola consolidada e é apontado como maior produtor da oleaginosa no planeta.

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Toledo multiplica riqueza da agricultura :: A riqueza da soja não acomoda uma região determinada a diversificar o agronegócio. É assim em Toledo, município do Oeste do Paraná responsável por 2,3% da Valor Bruto da Produção (VBP) do agronegócio no estado. Os produtos primários renderam R$ 1,59 bilhão aos produtores, conformeestimativadoDepartamento de Economia Rural (Deral), órgão da Secretaria Estadual da Agricultura e do Abastecimento. As lavouras de verão renderam R$ 382 milhões ao setor produtivo em 2013, mas ficaram pequenas diante dos R$ 870 milhões da pecuária (suíno, frango e leite). Um fenômeno que se repete em dois corredores, um na Região Oeste e outro nos Campos Gerais. (CR)


Albari Rosa/ Gazeta do Povo

Com estímulo interno, setor teria mais força :: O Brasil desponta no campo mas se intimida na indústria da soja. O sistema tributário estimula a exportação de grãos e deixam as fábricas de óleo e farelo ociosas. Um quadro a se lamentar, conforme a Associação Brasileira das Indústrias e Óleos Vegetais (Abiove). Mais da metade da produção do país – 46 milhões de toneladas – passa em frente a porta das esmagadoras, foge dos impostos e segue direto aos portos. Na década de 1980, 87% dos embarques eram de farelo e óleo. Essa inversão ocorreu a partir de meados da década de 1990 e início dos anos 2000, com a Lei Kandir, que isentou os exportadores de grãos, e a partir da expansão da demanda chinesa, que possui vasta estrutura de processamento. Trata-se de um processo de desindustrialização gradual, afirma Fábio Trigueirinho, secretário-

“É muito melhor trabalhar com um produto que tem formação de preço internacional do que um que depende da política brasileira.” Cândido Uemura, produtor de commodities em Mauá da Serra, no Paraná (foto), e em São Desidério, Oeste da Bahia.

-executivo da Abiove. “Enquanto a China aumenta suas importações de soja em grão e agrega valor com a produção de óleo, farelo e carnes, nós aqui no Brasil fechamos a indústria esmagadora”, critica. Levantamento da entidade revela que se a produção de um hectare de soja em Mato Grosso for transformada em carne e exportada, a receita supera os US$ 9 mil, enquanto a exportação do grão gera menos de US$ 3 mil. A própria indústria, com base na rentabilidade de cada operação, exporta soja que poderia ser processada.

Na zona rural também não faltam críticas ao governo, que não leva a efeito a garantia de preços mínimos. O agricultor Cândido Uemura, pioneiro no plantio direto, prefere não quebrar a cabeça com as contradições internas: planta commodities. “É muito melhor trabalhar com um produto que tem formação de preço internacional do que um que depende da política brasileira [como feijão e trigo]”. O cooperado da Integrada cultiva 500 hectares de soja em Mauá da Serra (PR) e 10 mil hectares de soja, algodão e milho em São Desidério (Oeste da Bahia). (CR) GAZETA DO POVO

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[expansão

Ninguém segura o Cerrado Duas décadas depois da chegada de sementes adaptadas, região central do Brasil passou a responder por metade da colheita de soja. Hoje, com 65% da produção, ainda conta com mais de 10 milhões de hectares livres

PLANALTINA (df) e campo mourão (PR)

José Rocher, enviado especial :: Depois de tomar conta do Sul, a soja se adaptou ao calor e logo encontrou uma vastidão de terras disponíveis na região central do Brasil: o Cerrado, hoje responsável por 59% do plantio (com 18 milhões de hectares) e 65% da produção nacional (ou 59 milhões de toneladas). E é nessa região de nove estados (Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, Distrito Federal, Tocantins, Maranhão, Piauí e Bahia) que a oleaginosa deve avançar com mais força.

Pesquisas da Embrapa Cerrado abriram caminho. A variedade Doko, lançada duas décadas e meia atrás pela estatal, provou que a planta de clima temperado tinha condições de crescer e carregar vagens em solo arenoso e sob calor de 40 graus. Os resultados surpreenderam logo nos primeiros anos, conforme o pesquisador aposentado responsável pela seleção da Doko, Plínio de Mello. Nos laboratórios da Embrapa Soja, em Londrina (PR), o melhorista conhecido como “pai da soja”, Romeu Kiihl, ampliou o leque de sementes adaptadas. Em uma década, as novas variedades conferiram ao Cerrado a responsa-

EXPANSÃO COMERCIAL A soja subiu o mapa do Brasil rapidamente nas últimas quatro décadas e chegou a Roraima. O Cerrado abriu as portas à cultura e ainda tem espaço para novas lavouras. Cerrado

165%

de aumento na área plantada foram registrados em duas décadas

65% dos 31 milhões de hectares cultivados com soja nesta temporada estão localizados nos estados do Cerrado

Área plantada, em milhões de ha

1992

2002

2012

9,44

16,36

24,98

CERRADO

CERRADO

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Infografia: Gazeta do Povo.

20

bilidade de colher metade da safra brasileira de soja. O índice de 51% foi atingido ainda em 1997/98, quando a região ultrapassou a marca de 15 milhões de toneladas, conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Nos últimos 15 anos, a abertura de novas áreas e os avanços tecnológicos multiplicaram a produção por 3,5. A Embrapa já lançou 50 variedades destinadas à região. O Cerrado eleva a média brasileira de produtividade. Antes da expansão da oleaginosa na região, o Brasil colhia de 25 a 40 sacas (60 kg) por hectare de Minas Gerais para baixo. Hoje as marcas da região, entre 50 e 60 sc/ha,

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CERRADO


Hugo Harada/ Gazeta do Povo

aproximam a média nacional dos 50 sc/ha, compara o analista da Embrapa Cerrado José Maria Camargos. As duas regiões do Cerrado que mais expandem a produção de soja ficam em Mato Grosso (Norte e Nordeste) e no Matopiba (polo de produção de abrange Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). As estimativas locais são de que, somente nessas fronteiras, há mais de 10 milhões de hectares sem restrições ambientais para a abertura de novas lavouras. Trata-se de áreas onde o corte da vegetação é permitido ou de pastagens degradadas.

50 variedades de soja adaptadas ao Cerrado foram lançadas somente pela Embrapa nas últimas três décadas.

Império do Sul O fato de a soja ser vocação do Cerrado não diminui seu potencial em zonas tradicionais. A demanda internacional ainda tem muita força e não há outra fonte de proteína tão barata e com tanta disponibilidade, analisa o presidente da Coamo – maior cooperativa de produção da América Latina, com sede em Campo Mourão (PR), que se formou a partir da produção de soja–, José Aroldo Gallassini. “Com produção de 12 milhões de toneladas [e consumo estimado em 85,9 milhões nesta temporada], a China vai ser sempre um comprador”, prevê. Gallassini conta que, em 1970, quando a Coamo nasceu, a região Centro-Oeste do Paraná não transparecia ter vocação para pecuária. A escolha pelos grãos se baseou nisso, relata. Hoje, com a produção de frangos e de leite crescendo, o executivo não descarta investimentos nesta área. “Só Deus sabe.” Por enquanto, com a cooperativa faturando mais de R$ 8 bilhões ao ano, soja, milho e trigo seguem no comando. A empresa expande sua atuação rumo ao Cerrado, com sete unidades em Mato Grosso do Sul (há 50 no PR e 5 em SC). A Região Sul detinha a liderança na soja até a década de 1990. Perdeu a posição quando Mato Grosso ultrapassava os 20% da colheita nacional. Nesta temporada, o estado do CentroOeste alcançaria o volume total dos três estados sulistas se Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul não tivessem reduzido o milho em 11%, para 1,9 milhão de hectares, reafirmando sua aposta na oleaginosa.

10 milhões de hectares livres podem ser transformados em lavoura somente nas fronteiras agrícolas de Mato Grosso e Matopiba nos próximos anos.

Solo arenoso e temperaturas de 40 grãos pareciam improdutivos até a chegada da soja Doko.

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niderasementes.com.br Sempre ao seu lado, sempre à frente. Juntos produzimos mais. GAZETA DO POVO

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Jonathan Campos/Gazeta do Povo

[vocação continental

O produtor Matt McGinnis, em Indianola (EUA). Salto na produção norte-americana impõe desafio à agricultura brasileira.

Brasil e EUA fazem da soja o ‘grão das Américas’ 24

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Continente americano responde por 75% da produção e deve assumir parcela ainda maior se depender do potencial brasileiro Luana Gomes :: O crescimento contínuo da produção levou o Brasil ao topo do ranking mundial de exportação de soja. Mas o país não está sozinho. Os Estados Unidos, que nesta temporada abrem vantagem de mais de 10 milhões de toneladas na produção, deverão disputar a liderança global nas exportações, após os brasileiros terem fecha-

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do as últimas duas safras à frente dos norte-americanos. Uma competição entre gigantes que faz com que 75% da produção (ou 252,4 milhões de toneladas, em 2014/15) se concentrem nas Américas. Os números mais recentes do Usda, o departamento de agricultura dos EUA, para o ano-safra 2014/15 (setembro de 2014 a agosto de 2015) mostram um empate técnico entre os embarques norte-americanos e os brasileiros. A previsão é que 46,8 milhões de toneladas sejam exportadas pelos EUA e 46,7 milhões de toneladas pelo Brasil. Ainda que os EUA reassumam a ponta, essa liderança deve ser temporária, defende Eugênio Stefanelo, técnico da Companhia Nacional


FÁBRICA DE SOJA Três quartos da produção global da commodity estão concentrados nas Américas. Dos dez maiores produtores da oleaginosa do mundo, sete estão no continente — cinco são sul-americanos. Brasil e Estados Unidos disputam, ano a ano, a liderança do ranking.

7º Canadá

5,9

8º Ucrânia

3,5

4º China

1º EUA

11,8

106,9

5º Índia

11

México Nicarágua Guatemala Venezuela Colômbia Equador

2º Brasil

Peru

94

10º Bolívia 2,5 6º Paraguai 8,2 Chile

9º Uruguai 3,4 3º Argentina

países que produzem soja no continente americano

55

de Abastecimento (Conab) no Paraná. “Em poucos anos fatalmente passaremos os EUA novamente. Diferente do Brasil, eles não têm áreas novas para incorporar”, aponta o economista, citando a nova fronteira agrícola do Matopiba como o grande trunfo brasileiro sobre os norte-americanos. “Nos próximos dez anos, o mundo vai demandar 70 milhões de toneladas adicionais. E a América do Sul, liderada pelo Brasil, é a única região do mundo com vocação natural para atender a essa demanda”, afirma Steve Cachia, diretor de Inteligência de Mercado da Cerealpar. Segundo os especialistas, a marca das 100 milhões de toneladas de soja, rompida pelos EUA neste ano, deve ser atin-

dez maiores produtores de soja no mundo (produção em milhões de toneladas)

Fonte: USDA. Infografia: Gazeta do Povo.

gida no Brasil ainda nesta década, alavancada não apenas pelo crescimento da área dedicada à cultura, mas, principalmente, por ganhos de produtividade. Para este ano, a expectativa é de uma colheita de 94,5 milhões de toneladas no Brasil, segundo a Expedição Safra Gazeta do Povo – volume que, somado às cerca de 55 milhões de toneladas da Argentina e 16 milhões de toneladas de Paraguai, Uruguai e Bolívia, colocam a América do Sul em posição de destaque no ‘mapa mundi’ da soja. “Se formos analisar a América do Sul enquanto núcleo de produção, a liderança é incontestável, com larga vantagem sobre os EUA. Esses novos players como Paraguai e Uruguai são funda-

mentais nesse processo”, pontua Cachia. Segundo os analistas, a única região do globo que teria potencial para ameaçar a supremacia sul-americana na soja seria a África. “O lançamento de cultivares resistentes a estresse hídrico deve colocar o continente africano no mapa da soja, mas essa é uma realidade que só deve começar chegar aos campos nos próximos 10 ou 15 anos. Diria que pelo menos nos próximos 50 anos a liderança permanecerá com a América do Sul”, prevê Stefanelo. Para o economista, a evolução natural desse protagonismo na produção de soja seria a ponta na produção de leite e carnes. “E é para lá que estamos caminhando”, avalia. GAZETA DO POVO

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Giovani Ferreira/Gazeta do Povo

[arco-norte

Embarque na Linha do Equador Navio chinês carrega soja em Santarém (PA). Logística dispensa os custos do Sul e Sudeste.

Agricultura faz nascer um segundo sistema de exportação

Jonathan Campos/Gazeta do Povo

na metade norte do Brasil, mais próximo do Pacífico Cassiano Ribeiro :: Caminhões carregados de grãos do Centro-Oeste brasileiro se deslocam cada vez mais rumo a um novo sistema logístico que está nascendo na metade norte do país, movido basicamente a soja. Empresas que têm a commodity como principal ativo investem mais de R$ 3 bilhões no chamado Arco-Norte, um complexo de seis portos que começa em Rondônia e segue ao Maranhão. Neste “segundo” Brasil agrícola — que envolve principalmente Mato Grosso, Rondônia, Amazonas, Roraima, Amapá, Pará, Tocantins e o Nordeste —, os grãos navegam pelas águas dos rios Madeira, Tapajós e Amazonas antes de embarcarem no Atlântico com destino ao mercado externo. Para chegar aos principais destinos, os navios podem seguir à Ásia pelo Pacífico, via Canal do Panamá. Para o campo, a alternativa significa redução dos gastos fora da porteira e um país mais competitivo no mercado internacional. Com a ampliação do Canal do Panamá, embarcações que hoje seguem para a China contornando a África vão percorrer 3 mil quilô-

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metros a menos. “Ficaremos imbatíveis”, crava Renato Pavan, presidente da Macrologística, consultoria responsável pelos primeiros estudos de viabilidade econômica do Arco-Norte. A partir da próxima safra, o Canal do Panamá deverá receber navios com 120 mil toneladas de grãos, o dobro do volume atual. O Arco-Norte exporta cada vez mais soja. Na safra passada, os embarques passaram de 6 milhões de toneladas, um salto de 39% em relação ao ciclo anterior. Por enquanto, são quatro novas portas de saída: Itacoatiara (Amazonas), São Luís (Maranhão), Barcarena (Pará) e Santarém (Pará), as mais próximas da Linha do Equador. Com a conclusão de obras que estão em execução, ao menos mais dois portos graneleiros colocarão a região no páreo em relação ao sistema do Sul e Sudeste, onde estão concentradas outras seis vias de escoamento da soja. Os portos de Vitória (Espírito Santo), Santos (São Paulo), Paranaguá (Paraná), São Francisco do Sul e Imbituba (Santa Catarina) e Rio Grande (Rio Grande do Sul) são responsáveis por mais de 84% dos embarques brasileiros da commodity, ou 35 milhões de toneladas.

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Agricultores participam de evento técnico em Roraima: lavoura em expansão.

Miritituba, um pequeno e pobre município ao Sul do Pará, tem visto pulsar os investimentos portuários do Arco-Norte. Segundo o coordenador do movimento Pró-logística, Edeon Vaz Ferreira, serão 11 estações de transbordo para grãos de caminhão para barcaças. “Tudo o que está acontecendo ali vai ter um contraponto em outro lugar lá em cima [para entrada no Atlântico]”, explica. Um desses contrapontos está em Santana (Amapá). A Cianport, empresa que pertence à holding Fiagril, de Mato Grosso, pretende realizar o primeiro embarque até a metade do próximo ano. “O objetivo é ter opção logística própria, reduzir custo de transporte”, afirma Jaime Binsfeld, diretor-presidente da Fiagril. A companhia produz cerca de 2 milhões de toneladas de grãos por ano em Mato Grosso. Segundo o executivo, o desvio de cargas ao Norte representa economia de 50% nos custos logísticos.


CORREDOR RODOFLUVIAL A abertura das exportações pelo Norte do Brasil significa redução de custos logísticos para a nova fronteira agrícola do Brasil e principalmente Mato Grosso. No ano passado, os embarques da soja em três portos aumentaram 39%. Os terminais são alimentados por estações fluviais de transbordo de cargas no Pará e em Rondônia. Boa Vista

Amapá Roraima

Santana (Amapá): A construção de silos nas docas de Santana deve viabilizar embarques de soja em 2015. Posteriormente, a Cianport prevê construir um terminal privado no local, que será alimentado por Miritituba (PA).

Porto Velho (Rondônia): Caminhões carregados com soja de Mato Grosso percorrem a BR-364 até Porto Velho (RO), onde é feito operação de transbordo das cargas para barcaças, que descem o Rio Madeira para abastecer os terminais de Itacoatiara (Amazonas), Santarém (Pará) e Belém (PA). Nesses portos os grãos saem das barcaças e são carregados em navios de grande porte.

Rio Amaz

Porto de Santana

Belém

onas

BR-174

Santarém Manaus

ra

Miritituba/Itaituba (Pará): Doze

s

dei

ajó

Ma

Exportação de soja (2013): 2,94 milhões de toneladas.

Tap

Rio

São Luís (Maranhão):

Itacoatiar a

Rio

Movimentação: 4,6 milhões de toneladas

Exportação de soja (2013): 916 mil de toneladas

Exportação de soja (2013): 400 mil de toneladas

Exportação de soja (2013): 2,12 milhões de toneladas

Amazonas

BR-163

Pará

estações de transbordo para grãos serão construídas no município ao Sul do Pará – uma já está em operação (Bunge). As cargas chegam por rodovia (BR-163) e depois descem os rios Tapajós e Amazonas com destino a Belém (PA) ou Santarém (PA) e, mais tarde, em Santana (AP).

BR-364

Rondônia

Mato Grosso

84% dos embarques de soja ainda saem do país pelos portos do Sul e Sudeste, que também apostam em mais movimento e se especializam, por exemplo, no embarque de soja em contêineres. “Há muito espaço neste segmento. A nossa movimentação cresceu oito vezes desde 2011”, conta Cláudio Humberto Flores, coordenador comercial do Terminal Portuário Santa Catarina (Tesc) em São Francisco do Sul. A reportagem apurou que um terminal privado a ser construído na região terá capacidade para 4 milhões de toneladas de grãos.

Fonte: Redação. Infografia: Gazeta do Povo.

Nova estrutura, mais produção As exportações pelo corredor norte do Brasil têm estimulado a produção regional de soja. Estados como Pará e Roraima preveem incremento de 300 mil e 500 mil hectares, conferiu a Expedição Safra Gazeta do Povo em viagem pela região. Roraima, estado que cumpre o mesmo calendário agrícola dos Estados Unidos por cultivar a soja acima da Linha do Equador, direciona toda a produção ao exterior e depende do Arco Norte. O setor torce para que os investimentos logísticos se concretizem rapidamente para reduzir também os custos dos insumos. “Estamos a 800 quilômetros ao Norte de Manaus (AM). Como não temos jazidas de calcário, esse e todos os outros insumos das lavouras precisam ser trazidos por estrada. Mas o futuro é bastante promissor”, diz Alvaro Calegari, secretário de Agricultura de Roraima. O maior incentivador dos investimentos em logística no Arco Norte é o Mato Grosso, principal produtor de soja da região. Em seguida, vêm o Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), que está expandindo as lavouras e forma a nova fronteira agrícola. (CR) GAZETA DO POVO

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Daniel Castellano/Gazeta do Povo

NOVA SAÍDA Mato Grosso inaugurou as exportações de soja do Arco Norte em 1997, estimulando a produção de soja na região.

Crescimento O cultivo de soja cresce até 10% ao ano na zona atendida pelo novo sistema de escoamento. O “Nortão” de Mato Grosso é uma das regiões que mais expande a agricultura no país.

Amazonas Os embarques do Arco Norte começaram pelo porto de Itacoatiara (AM), num terminal flutuante. Navios recebem cargas que chegam de Porto Velho (RO) pelo Rio Madeira em barcaças.

Por terra Para chegar aos portos fluviais, a soja percorre até mil quilômetros de caminhão. Maior parte do percurso é cumprida na BR-364, para Porto Velho (RO), e na BR-163, para Miritituba (PA) ou Santarém (PA).

Potencial Mais próximo de Mato Grosso do que Santarém, Miritituba deve se tornar o principal fornecedor de cargas fluviais dos portos do Arco Norte. Ao todo, 12 estações de transbordo estão previstas. A primeira começou a operar em março deste ano.

Destino As embarcações com soja seguem para Santana, no Amapá. No futuro, a região portuária deve abastecer navios de até 120 mil toneladas, que atravessarão o Canal do Panamá com o dobro do volume admitido atualmente, encurtando distâncias e barateando custos.

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Esperança na estrada

Caminhão percorre a BR-163 em Mato Grosso. Rodovia atravessa a região que mais produz soja no Brasil.

Cassiano Ribeiro Embora os investimentos privados no sistema de exportação do Arco-Norte estejam ocorrendo rapidamente, o asfaltamento da BR-163 entre o Norte de Mato Grosso e o Centro-Norte do Pará se arrasta. A obra do governo federal — que seria entregue em 2010 e constitui ponto chave para o escoamento da produção — não tem prazo para terminar. Dos 400 quilômetros de estrada de chão, 121 estão em asfaltamento e devem ser entregues dentro de um ano. Brasília acena ainda com a concessão do trecho à iniciativa privada, alegando que não faltam interessados. A evolução lenta da pavimentação tem sido suficiente para elevar o f luxo de caminhões de Sinop (MT) em direção ao porto de Santarém (PA). As carretas percorrem até 1,2 mil quilômetros. Apesar da distância e de parte do trajeto ser de chão batido, o transporte rodoviário chega a custar metade do valor cobrado para escoamento até os portos do Sul e Sudeste, conforme o setor produtivo.

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[ingrediente neutro

Proteína ganha sabor e forma nos alimentos Hugo Harada/Gazeta do Povo

Com mil e uma utilidades, grão chega à mesa no hambúrguer, no suco e até no chocolate. E pode substituir o trigo Carlos Guimarães Filho :: Praticamente toda a população mundial sem restrição alimentar consome soja. Seja na carne, no molho da salada, no suco, na barra de cereal ou no chocolate. Em função das suas características, o ingrediente se tornou essencial para a indústria de alimentos. Centenas de produtos encontrados nos supermercados usam a fonte de proteína. Até 50 anos atrás, a soja era usada basicamente na alimentação animal e, depois de processada, como óleo para o consumo humano. A partir da década de 70, a indústria de alimentos passou a utilizar a oleaginosa também como farinha, na forma de proteínas isolada e concentrada, no óleo de lecitina (fração do óleo). O grão ganhou espaço na dieta alimentar, principalmente por ser um ingrediente funcional. “A farinha de soja absorve 2,5 vezes o seu volume em água. Ou seja, no final do processo é possível ter um produto, como um hambúrguer, bastante hidratado”, cita José Marcos Mandarino, pesquisador da Embrapa Soja. Na prática, a oleaginosa — rica em vitamina B, ferro e cálcio — é cada vez mais explorada em novos alimentos. Países como Estados Unidos estimulam o consumo com uma lista cada vez maior de alimentos à base de soja. Os médicos acreditam que, no Japão, o câncer de mama é combatido pelo uso maior do ingrediente. Novas pesquisas mostram que até o trigo pode ser substituído pela farinha de soja na produção do “pão nosso de cada dia”. A expectativa de aumento na produção indica também redução de custo. Com mais de 50 milhões de hecta-

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Vagem de quatro grãos: inovação no campo e nas fábricas de alimentos.

“Um boom de pesquisas nas universidades mostrou importantes características como a absorção de sabor e de água, a extensão de massa e a formação de gel e espuma. São muitos aspectos positivos para o uso das indústrias de alimentos.” José Marcos Gontijo Mandarino, pesquisador da Embrapa Soja, sobre a utilização do grão a partir dos anos 1970.

res de terras agrícolas disponíveis, o Brasil pode dobrar a produção nas próximas décadas. Os três líderes mundiais em produção, incluindo Estados Unidos e Argentina, podem ultrapassar rapidamente a atual marca global, que foi de 285 milhões de toneladas em 2013/14 e pode chegar a 312 milhões nesta temporada, conforme o Departamento de Agricultura dos EUA (Usda). Do ponto de vista nutricional, a soja se compara ao feijão, à lentilha e à ervilha, que têm produção insuficiente para a indústria, afirma a nutricionista do Sesi Cozinha Brasil no Paraná Ana Paula Leitoles Remer. “Nenhuma proteína tem tantas características diferentes como a soja. Isso potencializa o seu uso”, complementa Mandarino.


Marcelo Elias/Gazeta do Povo

Transporte ecológico movido a agroenergia O uso de soja para a produção do chamado “combustível verde” está em franco crescimento no Brasil -- e também em países como Estados Unidos e Argentina. O grão resulta em biodiesel e complementa o uso de combustível fóssil. De acordo com dados da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), o Brasil produziu 2,91 milhões de metros cúbicos de biodiesel no ano passado, aumento de 150% em cinco anos. E 73% desse volume tiveram o óleo de soja como matéria-prima. “O óleo de soja é a principal matéria-prima do biodiesel desde o início do programa, em 2005. E deve continuar assim”, aponta Leonardo Botelho Zilio, assessor econômico da Abiove. A indústria também utiliza gordura

À base de Glycine max O uso da soja não se restringe à indústria de alimentos ou à de biocombustível. A indústria de cosméticos tem utilizado o grão em seus produtos por conta do efeito antioxidante. Estão à venda também filtros solares à base de soja. Outro segmento de olho na Glycine max, nome científico da soja, é das fábricas de velas, pois a queima da cera com oleaginosa na composição produz uma fumaça menos tóxica. E segue o uso tradicional na alimentação. Produtos com a oleaginosa na composição assumem a missão de diversificar as refeições diárias. Confira lista de produtos com soja facilmente encontrados nos supermercados:

Veículos que usam só biodiesel são exceção, mas adição de 20% é considerada segura.

animal, óleo de algodão e de mamona, por exemplo. Hoje o Brasil utiliza B7 (diesel com 7% de biodiesel). Zilio acredita que o país tem potencial para atender o B15. A cadeia produtiva aponta que o B20 pode ser implantado em poucos anos.

O uso da soja para produção de biodiesel ameniza outro problema de mercado: o aumento da produção num ritmo que vai além do crescimento da demanda mundial. O biocombustível passa a contribuir para o crescimento sustentável do cultivo da oleaginosa. (CGF)

COMBUSTÍVEL À BASE DE SOJA A indústria brasileira de biodiesel é movida pela soja, principal matéria-prima para produção do combustível. No ano passado, o país produziu 2,14 milhões de metros cúbicos do “combustível verde”, sendo 73% com o uso do óleo da oleaginosa. O setor ainda utiliza outras matérias-primas, em menor proporção, como gordura animal, óleo de algodão e óleo de fritura usado.

2,15 1,96

2,04

2,14

1,36

1,25 0,80

Achocolatado Barra de cereal Bolacha recheada Chocolates Cookies Hambúrguer Iogurte Leite Leite condensado Maionese

Massas Molho shoyo Molhos para salada Nuggets Óleo de cozinha Pão de forma Patês Queijo tofu Salgadinhos Sopa desidratada

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014 (até abril)

69%

78%

82%

81%

75%

73%

76%

A soja como matéria-prima no volume de biodiesel Fonte: Abiove. Infografia: Gazeta do Povo.

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Josué Teixeira/Gazeta do Povo

[tecnologia

O agricultor Eduardo Guedes com sementes de alta produtividade em Ventania, no Paraná. Tecnologias exigem cada vez mais investimento no campo.

R$ 350 milhões para se chegar a um grão Investimentos milionários e anos de pesquisa dão origem a novas cultivares, que prometem salto de produtividade mesmo em ciclos cada vez mais curtos Igor Castanho :: Parte da história centenária da soja no Brasil pode ser contada pela evolução das sementes. O grão lançado no campo no Noroeste do Rio Grande do Sul em 1914 rendia menos da metade do volume oferecido pelas novas variedades, que carregam um histórico de décadas de pesquisa e investimentos milionários. E as novas tecnologias se alastram cada vez mais rapidamente. Prova disso é a soja geneticamente modificada (GM), que foi lançada 32

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pela norte-americana Monsanto e, na última década, passou de 40% para mais de 90% das lavouras do Brasil. Nos últimos anos, a preferência por lavouras de ciclo mais curto e com menos folhas fez tecnologias argentinas da Nidera e da Don Mario se alastrarem por 40% das plantações, ou 12 milhões de hectares. As novas variedades avançam em diversas frentes, da adaptação a condições ambientais severas como a seca até a resistência a insetos. Para desenvolver as cultivares de soja, a indústria percorre um longo processo, que mobiliza profissio-

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nais de diversas áreas, como biologia, química e engenharia. O primeiro passo é a busca de eventos de interesse para a pesquisa. Segundo o setor, um mesmo projeto chega a realizar mais de 100 mil experimentos, que envolvem a seleção de sementes já existentes e simulações em estufas na procura por perfis genéticos ideais. Se o resultado é positivo nesta etapa, passa-se para um ciclo de pré-desenvolvimento. Caso o investimento seja considerado viável, a pesquisa segue adiante. A última etapa é o lançamento e a comercialização.


INVERSÃO DE PAPÉIS O crescimento no uso de sementes transgênicas elevou a participação das cultivares no custo de produção da soja, e contribuiu para a redução da participação dos defensivos. PARTICIPAÇÃO NO CUSTO DE PRODUÇÃO Semente (%)

25

20

Defensivos (%)

22,8

“No início da década de 1990, o ciclo médio da soja era de 140 a 150 dias, com 500 mil a 550 mil plantas por hectare. Atualmente essa relação caiu para 100 a 120 dias e 250 mil plantas/ha. Em 2030, será possível, com 200 plantas/ha, produzir 8,4 mil quilos em 110 a 115 dias.” Elíbio Rech, pesquisador da Embrapa Soja.

21,8 19,9

20,4 15,4 16,4

15

12,9 12,5

8,8

10

6,9 5,1

6,0

5

8,4

10,2

10,2

4,8

0 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 /99 /00 /01 /02 /03 /04 /05 /06 /07 /08 /09 /10 /11 /12 /13 /14 /15*

*Estimativa da Conab Fonte: Conab. Infografia: Gazeta do Povo.

Esse processo custa em média US$ 136 milhões (ou R$ 345 milhões) e leva 13 anos, aponta a multinacional Dow AgroSciences, que tem sede em Indianápolis (Estados Unidos). “É cada vez mais caro desenvolver uma molécula ou novo evento genético e há muitas barreiras, como a burocracia. Isso tem levado o mercado a reduzir o número de lançamentos”, resume Ramiro de La Cruz, diretor de Negócios em Proteção de Cultivos da empresa. No campo, o acesso às tecnologias também exige mais recursos. Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) mostram que em uma década o custo médio da semente dobrou, saindo de R$ 2 para R$ 4,65 para produção de uma saca de 60 quilos. Os reajustes se sustentam no aumento da produtividade, mas podem estar perto de um limite. “O mercado se autorregula. Se o custo subir demais o produtor simplesmente não vai com-

Eficiência exige compromisso coletivo

prar essa variedade mais cara” avalia o pesquisador da Embrapa Soja e integrante do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB), Elíbio Rech. Futuro Os pesquisadores avaliam que os avanços da soja estão longe de um ápice. Além das empresas que pesquisam sementes, multinacionais como Bayer e Basf desenvolvem sistemas de proteção das lavouras que elevam os índices de produção. Problemas no campo abrem espaço a tecnologias específicas. A soja Intacta RR2 PRO, da Monsanto, ganha mercado com promessa de incremento na produtividade e principalmente por ser resistente a lagartas numa época de aumento da pressão dos insetos. Foram mais de 10 anos de pesquisa e investimentos que passam de US$ 150 milhões (ou R$ 382 milhões), conforme o diretor do projeto e do setor de soja da Monsanto para a América do Sul, Ernst Sanders.

:: O desempenho das sementes depende de rigor no manejo e as pesquisas requerem segurança institucional, conforme a indústria. Além da promessa de maior rendimento, a disciplina no campo prolonga a vida útil das novas tecnologias, evitando o aparecimento de plantas daninhas resistentes a determinados herbicidas, por exemplo. O pesquisador da Embrapa Soja e membro do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB) Décio Luiz Gazzoni defende que é preciso mais integração entre governo, empresas e setor produtivo. “Sem isso, coloca-se em risco tecnologias muito boas para os produtores”, indica. Medidas como a obrigatoriedade de plantio de refúgio vêm sendo discutidas. Nessas áreas, insetos não resistentes a uma tecnologia específica se reproduzem com insetos resistentes, gerando descendentes suscetíveis ao controle. O manejo eficiente é estimulado em competições como Desaf io Nacional de Máxima Produtividade de Soja, realizado pelo Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb). O programa é apoiado pelas próprias empresas e visa premiar os produtores que colhem volumes recordes de soja por hectare. Nos últimos dois anos, a liderança nacional foi conquistada por agricultores paranaenses, que conseguiram retirar mais de 100 sacas da oleaginosa em um hectare – dobro da média nacional. (IC) GAZETA DO POVO

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[biotecnologia

Revolução feita em laboratório Introduzida ilegalmente no Brasil na década de 1990, semente transgênica mudou rumo da sojicultura e hoje está presente em mais de 90% da área dedicada à soja Igor Castanho :: A introdução das sementes transgênicas no Brasil marca o capítulo mais polêmico da história da sojicultura nacional neste século. Inaugurada ilegalmente no país na safra 1996/97, a adoção de variedades geneticamente foi inicialmente vista com desconfiança, despertando debates e protestos que envolveram toda a cadeia produtiva e a sociedade. Apesar da incerteza, a tecnologia RR, de tolerância ao herbicida Roundup Ready (glifosato), proporcionou uma revolução técnica e econômica no campo que, pouco mais de uma década depois, garante unanimidade entre os agricultores: mais de 90% das lavouras da oleaginosa são de grãos geneticamente modificados (GM), e a soja abriu caminho para a

adoção de sementes transgênicas também nas lavouras de milho, algodão e feijão. A polêmica Os primeiros grãos de soja GM entraram no país no mesmo estado que foi o berço da cultura um século atrás. Já difundida nos Estados Unidos e Argentina, a biotecnologia atraiu os produtores do Rio Grande do Sul, que começaram a plantar sementes contrabandeadas do país vizinho. A aposta resultou em plantas de porte menor e com mais grãos, apelidadas de “soja Maradona.” “As variedades cultivadas naquela época ainda não eram adaptadas às diferentes condições de clima e solo existentes no Brasil”, contextualiza o pesquisador da Embrapa Soja e membro do Conselho de Informações sobre

Biotecnologia (CIB) Décio Luiz Gazzoni. Sem uma regulamentação oficial definida, o assunto virou caso de polícia. Operações de fiscalização apreenderam toneladas de grãos irregulares e multaram os agricultores que descumpriram a legislação da época. “O contrabando foi uma consequência, e não uma causa. A questão institucional não acompanhou a evolução tecnológica daquele momento, e o agricultor resolveu da sua maneira”, pontua Gazzoni. O desfecho O impasse durou até 2003, quando uma medida provisória autorizou o cultivo da oleaginosa geneticamente modificada. Naquele ano o grão já ocupava 4,7 milhões de hectares (25% da área total de soja) e desde então não parou mais de crescer. A produtividade aumentou 20% em dez anos, ante 5% registrados na década anterior. O salto, que permite ao país colher média de 3 mil quilos por hectare e se equiparar aos Estados Unidos, é parcialmente atribuído às sementes GM. Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Soja RR foi divisor de águas para agricultura brasileira, facilitando o manejo de plantas daninhas por sua tolerância ao glifosato.

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Pouco mais de dez anos depois da oficialização dos transgênicos a produtividade da soja está 20% maior: EVOLUÇÃO NA PRODUTIVIDADE Ano Safra

Produtividade (kg/hectare)

Jonathan Campos/Gazeta do Povo

GANHO EXPONENCIAL

Pesquisadores mapeiam a soja e conseguem enxergar a genética da planta como uma rede eletrônica, que pode ter características selecionadas.

Área Cultivada (milhões de hectares)

2003/04

2.329

4,7

2004/05

2.245

5,6

2005/06

2.419

9,0

2006/07

2.823

11,5

2007/08

2.816

12,6

2008/09

2.629

13,9

2009/10

2.927

16,5

2010/11

3.115

18,4

2011/12

2.651

21,5

2012/13

2.938

24,7

2013/14*

2.854

27,0

*Estimativa da Conab Fonte: Conab. Infografia: Gazeta do Povo.

Circuito eletrônico define lavouras do futuro Igor Castanho :: As pesquisa de ponta sobre soja anunciam uma nova revolução para os próximos anos. O mapeamento do grão está cada vez mais detalhado e abre múltiplas possibilidades. “A biotecnologia sintética permite transformar a soja em um circuito eletrônico, completamente mapeado. Podemos selecionar somente as tecnologias mais interessantes para a produção e inseri-las na semente”, detalha o pesquisador da Embrapa Soja e integrante do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB) Elíbio Rech. Além de elevarem a produtividade, as novas sementes devem mudar a dinâmica das fazendas, a exemplo

da primeira soja modificada, a RR, que permitiu o uso de glifosato com a lavoura já crescida. “O produtor ganhou f lexibilidade no manejo, com um prazo maior para aplicação de herbicida”, aponta a gerente de Negócios da Soja da Monsanto, Maria Luiza Nachreiner. As aplicações precisam ser feitas no momento certo e uma “janela” maior é decisiva, confirma o pesquisador da Embrapa Soja Décio Gazzoni. O surgimento de plantas daninhas resistentes a glifosato e o aumento da pressão dos insetos elevou novamente a necessidade de pulverização nas lavouras nos últimos anos. Do Rio Grande do Sul ao Maranhão, os relatos são de até seis aplicações por safra. (IC) GAZETA DO POVO

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Albari Rosa/ Gazeta do Povo

[plantio direto

Entra a tecnologia, saem os arados Criado há quase 40 anos, sistema que dispensa o revolvimento do solo e lança máquinas sobre a palhada somou-se a outros avanços e abriu caminho à expansão da agricultura

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Henry Milléo/Gazeta do Povo

Carlos Guimarães Filho :: De Norte a Sul e de Leste a Oeste do Brasil existe, ao menos, uma unanimidade no agronegócio: o Sistema Plantio Direto (SPD) revolucionou a agricultura. Associado a novas tecnologias, o SPD aposentou os arados e abriu caminho para expansão das lavouras e consecutivos recordes de produtividade, especialmente na soja. Atualmente, predomina em 80% dos 36 milhões de hectares dedicados à produção de grãos. Desenvolvido há quatro décadas, no Paraná, o SPD se confirmou como contribuição decisiva do estado para viabilizar as lavouras nas novas fronteiras agrícolas do país. Ao dispensar o revolvimento do solo — que sempre era feito antes do plantio, para que as plantas daninhas fossem arrancadas e a terra ficasse menos compactada —, reduziu problemas como a erosão e a perda de água e nutrientes, quadro que teve reflexo automático na produtividade. “O modelo [anterior] era agressivo. O plantio direto foi a salvação da lavoura. Produzir 3 mil quilos de soja por hectare parecia inatingível”, afirma o agrônomo Norberto Ortigara, hoje secretário da Agricultura do Paraná. Décadas atrás, época em que percorria as diversas regiões do estado como técnico, Ortigara viu muita “terra arrasada” pelo constante uso de arados, que expunha o solo ao sol e às enxurradas. Essa exposição é ainda mais arrasadora em regiões arenosas como o Cerrado, que abrange o corredor de Mato Grosso ao Maranhão. O SPD foi fundamental para a expansão da fronteira agrícola, aponta o pesquisador Henrique Debiasi, da Embrapa Soja. Áreas consideradas inúteis para a produção de grãos foram “revitalizadas” nas últimas três décadas. Sem o sistema, seria inviável a segunda safra de milho, acrescenta. O cereal é plantado durante a própria colheita da oleaginosa, numa dinâmica que põe plantadeiras trabalhando logo atrás das colheitadeiras. “A janela seria curta para preparar o solo para o milho”, explica. Há 30 anos, a Embrapa Soja realiza experimentos com plantio direto. Os resultados comprovam a eficiência do

A qualidade do solo gerada pelo plantio direto atingiu a planilha de custo. Os nutrientes foram mantidos, reduzindo gastos. Hoje existe fartura no solo Manoel Henrique “Nonô” Pereira, um dos pioneiros do sistema no Brasil.

Herança paranaense

Origem A autoria da tecnologia do Sistema Plantio Direto (SPD) é compartilhada. O sistema brasileiro se desenvolveu a partir de experiências realizadas na década de 1970 pelos produtores Herbert Bartz, na região de Rolândia (Norte do Paraná), e pelos amigos Manoel Henrique “Nonô” Pereira e Frank Dijkstra, na região de Ponta Grossa (Campos Gerais). A Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação considera que o SPD tem 42 anos no país.

Vantagem extra O SPD simplifica o cultivo da terra e também reduz custos de produção. Sem a necessidade do mexer no solo antes de cada plantio, diminui o uso de tratores e o gasto com diesel e horas de serviço. Estimativas da Embrapa apontam economia de 40 litros de diesel por hectare/ano com o sistema.

sistema: em média, a produtividade da soja numa área de plantio direto é 27% maior do que numa lavoura convencional. “Em alguns casos a vantagem chega a 60%”, garante Debiasi. “A qualidade do solo gerada pelo plantio direto atingiu a planilha de custo. Os nutrientes foram mantidos, reduzindo gastos. Hoje são anos de fartura no solo”, destaca Manoel Henrique “Nonô” Pereira, um dos pioneiros do sistema no Brasil.

História viva: Nonô Pereira montou acervo com primeiras máquinas do plantio direto.

80% das lavouras dedicadas à produção de grãos no Brasil usam o Sistema Plantio Direto (SPD), indicam dados de instituições como a Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação. Esse índice indica que entre 28 milhões e 30 milhões de hectares dispensam o revolvimento do solo, acumulando palha da safra anterior. Parte dessas áreas, amplamente usadas no verão para produção de soja e milho, é cultivada também no inverno com trigo, aveia, cevada e outros culturas. O tamanho da área de plantio direto considera diversos tipos de SPD, inclusive sistemas menos rigorosos, que permitem intervenções de baixo impacto no solo.

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Uso incorreto reduz benefícios

Salvação da lavoura O plantio direto chegou na hora certa à agricultura brasileira. Não só abriu portas para expansão das lavouras como permitiu a recuperação das terras degradadas.

:: Apesar das inúmeras vantagens do Sistema Plantio Direto (PDP), cresce a preocupação do setor com uso incorreto da tecnologia. Parte dos produtores estaria abrindo mão de benefícios arriscando mexer no solo ou desmontando curvas de nível (que ajudam a conter a erosão). Outro pilar do PDP é a rotação de cultura, prática que é deixada de lado nas fazendas que expandem a soja a mais de um terço das lavouras, reduzindo culturas como o milho. “O ideal é que haja rotação também com outras culturas além do milho e da soja. Mas o que manda é o retorno comercial no curto prazo. Com queda na produtividade, ficará mais difícil pagar a conta lá na frente”, alerta o pesquisador da Embrapa Soja Henrique Debiasi. Após viagem pelos dois maiores produtores brasileiros de soja, Mato Grosso e Paraná, ele ficou impressionado com a quantidade de áreas que foram submetidas a preparo. Os motivos são o combate às ervas daninhas, o controle de doenças e o uso de grades para picar restos da palha de milho. O secretário da Agricultura do Paraná, Norberto Ortigara, afirma que práticas inadequadas ao SDP crescem no estado, o que traz preocupação para o agronegócio local. O setor se mobiliza para relembrar as vantagens do sistema e da rotação de culturas. (CGF)

Abertura —As lavouras do Sul do Brasil foram abertas com trabalho braçal. Os arados puxados por bois e cavalos (foto) viravam o solo para o controle do mato e enterravam a palha. Terras virgens eram mais férteis do que áreas revolvidas ano após ano, principalmente nas encostas. Plantar sem arar ou capinar era impossível pela própria pressão das ervas daninhas. Arquivo/ Gazeta do Povo

Hugo Harada/Gazeta do Povo

Degradação —A mecanização das lavouras deu salto na década de 70. Os tratores arrastaram arados em solos frágeis, que perdiam potencial ano após ano no Centro-Sul do país e no Centro-Oeste. Sem a proteção da palha, as enxurradas provocavam erosão e levavam fertilizantes e outros insumos embora, com danos ambientais e aumento nos custos de produção. O quadro desvarolizava os próprios imóveis. Mudança — Foi justamente em solos arenosos e frágeis, nos Campos Gerais, que os produtores buscaram alternativas para conter a degradação. Testaram o plantio sobre a palhada da cultura anterior e avançaram no controle químico de plantas daninhas e na rotação de culturas. O sistema hoje é considerado agricultura de baixo carbono e a adoção pode se dar com incentivo do Plano Agrícola e Pecuário do governo federal.

Solos arenosos ficam expostos ao sol e à erosão pela falta de palha.

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Josué Teixeira/Gazeta do Povo

[batalha no campo

Ameaças custam caro ao produtor Doenças, plantas daninhas e insetos se revezam

A lagarta Helicoverpa armigera elevou gastos com pulverizações em até R$ 200 por hectare, o equivalente a 3,5 sacas de soja.

no ataque às plantações e colocam em risco rendimentos. Desafio é proteger as lavouras sem elevar custos Igor Castanho :: O plantio de lavouras que vão além do horizonte exige reforço no controle de doenças, plantas daninhas e insetos que ameaçam a soja. Nos últimos anos, por exemplo, surgiram inimigos de peso como a ferrugem asiática, a lagarta Helicoverpa armigera e a buva resistente ao glifosato. Segundo os especialistas, a situação foi controlada, mas com aumento nos custos. O gerente de Educação da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), Fábio Kagi, avalia que houve evolução expressiva no manejo. “O produtor acompanhou o avanço das tecnologias. A própria indústria [de insumos] e o trabalho dos consultores e extensionistas ajudaram no controle.” Gastar mais na defesa das lavouras significa preservar produtividade e evitar perdas expressivas. Estudo da Embrapa e da Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária (SBDA) mostra que só no caso da ferrugem as perdas dos sojicultores somaram US$ 25 bilhões entre 2003 e 2013. O valor inclui custos extras de aplicações e redução no potencial de produção das lavouras. No caso da Helicoverpa armigera, houve alarde após o surto de 2012/13. Os produtores gastaram até R$ 200 a mais por hectare em aplicações para tentar controlar o inseto. Em paralelo o governo federal interviu, liberando a importação emergencial de defensivos capazes de controlar a praga. No fim, as perdas passaram de US$ 1 bilhão, conforme análise da Embrapa. No caso das plantas daninhas resistentes a herbicidas, apontadas como a maior ameaça dos próximos anos, o controle depende de mudanças na própria rotação de culturas, com impactos ainda em avaliação.

Plantas daninhas mais fortes que herbicidas exigem manejo orquestrado ::As ameaças sanitárias que vão atormentar os produtores de soja do Brasil nos próximos anos já estão no país. Os técnicos e pesquisadores adiantam que a principal preocupação será controlar plantas daninhas que sobrevivem a aplicações de glifosato, o herbicida mais usado pela agricultura brasileira, e consomem nutrientes do solo e energia solar. Hoje o país possui seis plantas com esse tipo de característica (azevém, capim-amargoso, capim-branco e três espécies de buva), mas há outras 23 em lavouras do exterior. A entrada dessas espécies em solo brasileiro passa a depender de controle sanitário e de condições climáticas. Mais uma vez, a saída é apostar em mudanças no manejo, defende o pesquisador da Embrapa Soja, de Londrina, Fernando Adegas. “O ideal é fazer uma rotação de herbicidas, associada a práticas como a rotação de culturas e a presença de uma boa cobertura de solo”, aponta. A migração de pragas é outra preocupação. Pesquisa da Embrapa e da Sociedade Brasileira de Defesa Agropecuária (SBDA) aponta que predadores como o pulgão da soja, que reduz em até 50% o desempenho das lavouras, podem chegar ao país. A praga era restrita aos países asiáticos, mas desde 2000 vêm sendo encontrados focos em fazendas norte-americanas. O Sul do Brasil seria a região com maior exposição ao risco atualmente, indicam os especialistas. (IC) GAZETA DO POVO

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[notas

Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Vídeos na web Assista as entrevistas que complementam as reportagens da revista especial “100 Anos da Soja: O grão que redesenhou o mapa do Brasil” na internet. O site www. agrogp.com.br tem um canal de “Vídeos”, onde o material pode ser encontrado. Outro canal, dedicado a edições “Especiais”, traz a revista na íntegra em formato flip page. A produção do Agronegócio Gazeta do Povo foi planejada e elaborada nos últimos seis meses, com viagens e entrevistas que mostram o Brasil da soja, construído de grão em grão. Henry Milléo/Gazeta do Povo

Ano de recorde

Proteína animal A estratégia de agregação de valor aos grãos que mais vem crescendo no Brasil é a produção de carnes. A cadeia do frango se supera no Paraná e em Santa Catarina. Os dois estados lideram um projeto nacional que produz 12,3 milhões e exporta 3,7 milhões de toneladas do alimento. O sistema consome mais de 20 milhões de toneladas de ração, à base de soja e milho. A carne de frango exportada segue principalmente para o Oriente Médio, mas o mercado interno, destino de cortes tradicionais (foto), recebe 70% da produção. 42

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Apesar dos preços abaixo do esperado, a soja deve fechar 2014 com recorde de exportação, mostram dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). De janeiro a outubro, foram embarcadas 45,4 milhões de toneladas – 2,6 milhões de toneladas a mais do que em todo o ano passado, recorde até então. São 15,5 milhões de toneladas acima do volume embarcado pelos EUA no mesmo período. Os volumes históricos embarcados neste ano fizeram da soja em grão o principal produto de exportação do Brasil, com faturamento acumulado de US$ 23,1 bilhões em 2014 – US$ 300 milhões acima do total arrecadado em 2013. A safra que está em fase final de plantio deve render 94,5 milhões de toneladas, estima a Expedição Safra Gazeta do Povo. Se a marca for atingida, a expansão será de 8,55% ante o recorde de 87,10 milhões de toneladas da temporada 2013/14, aponta a sondagem técnico-jornalística.


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