Relatorio do processo territorial Pankararu 01

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5.ª REGIÃO Gabinete da Desembargadora Federal Margarida Cantarelli

APELAÇÃO CÍVEL Nº 344734-PE (2004.05.00.024999-0) APTE INCRA - INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA REPTE : PROCURADORIA REPRESENTANTE DA ENTIDADE APTE UNIÃO APDO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARTE R : FUNAI - FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO REPTE : PROCURADORIA REPRESENTANTE DA ENTIDADE PARTE R : JOSE FREIRE DE LIMA e outro ADV/PROC : JOSE DANTAS DE LIMA PARTE R : ANTONIO ARAUJO DA SILVA e outros ADV/PROC : CELSO PEREIRA DE SOUZA e outro Origem : PE RELATORA : Desembargadora Federal MARGARIDA CANTARELLI RELATÓRIO A EXMA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARGARIDA CANTARELLI (Relatora): Trata-se de apelação do INCRA e da União contra sentença que, nos autos de Ação Civil Pública, julgou procedente o pedido de retirada da área indígena Pankararu de todos os ocupantes não-índios. A presente ação foi movida pelo Ministério Público em 1992, com a finalidade de retirar da área indígena de Pankararu, localizada nos municípios de Petrolândia e Tacaratu, todos os ocupantes não índios. O decreto 94.603, de 14 de julho de 1987 homologou a demarcação da área. Há notícia nos autos de seguidas representações da Promotoria de Petrolândia, dando conta dos posseiros que invadiam a área com ameaças. Foi pedida liminar para imediata retirada de todos os ocupantes, concedida pelo Juiz Federal Petrônio Maranhão Gomes de Sá, em 11/05/1993. Entretanto, o juiz da Comarca de Petrolândia solicitou força pública federal e transporte para as pessoas que seriam retiradas, sem o qual não poderia cumprir a decisão. Em posterior ofício, o juízo de Direito de Petrolândia informa das dificuldades em atender a ordem judicial exarada. O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 113, informando haverem 27 famílias consideradas posseiros de boa-fé. Requereu que fosse realizada inspeção judicial para ser constatada in loco a situação fática, a suspensão do cumprimento da medida liminar até a realização da inspeção e ainda que fosse solicitado aos Cartórios de Registro de Imóveis de Tacaratu e Petrolândia, para informarem a existência de imóveis urbanos ou rurais em nome dos posseiros. As providencias solicitadas foram encaminhadas e as contestações apresentadas. Em despacho de fls. 493/494, o MM. juiz a quo entendeu que a competência para o feito seria do juízo da Comarca de Petrolândia, determinando a remessa dos autos para aquele. A FUNAI interpôs agravo da decisão, que foi provido pelo TRF em outubro de 1995, permanecendo o feito a tramitar na Justiça Federal. mapg AC 344734

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Em outubro de 1996, a União foi intimada a manifestar-se sobre o interesse em prosseguir na ação, ocasião em que requereu o julgamento do feito. A MM. juíza a quo, em sentença prolatada em setembro de 2003, condenou a FUNAI a identificar os posseiros não índios ocupantes da área indígena de Pankararu, bem como averiguar dentre estes, aqueles que de boa-fé e quais benfeitorias realizaram na área. Condenou a União a indenizar as benfeitorias dos posseiros de boa-fé. Por fim, condenou o INCRA a proceder ao reassentamento dos aludidos posseiros não índios, de boa-fé ou não, que forem, por força da sentença, obrigados a desocupar a área. O INCRA apela da sentença, argumentando ser parte ilegítima para figurar no pólo passivo da ação, já que não tem relação com o objeto desta. Alega ainda, que somente deveriam ser beneficiados aqueles que viessem a preencher as condições legais exigidas para participarem do programa de reforma agrária, sob pena de contemplar com áreas rurais os aludidos invasores. A União, em preliminar, pugna pela anulação da decisão de fls. 622, que julgou os embargos interpostos contra a sentença, pois estes não poderiam ser apreciados por mero despacho, mas sim por sentença. Quanto ao mérito, sustenta que a União não tem obrigação legal de expulsar os posseiros, sendo da FUNAI tal função. Ainda, afirma que houve julgamento extra petita quanto à condenação da União em indenizar os posseiros já que esta providência não foi objeto do pedido inicial. Ainda, havendo necessidade de identificar os posseiros de boa-fé, entende ser necessário que se faça a liquidação por artigos, conforme dispõe o artigo 608 do Código Civil. O Ministério Público Federal requereu vista ao processo, apresentando parecer às fls. 679. Em síntese, manifesta-se pela legitimidade do INCRA em figurar no pólo passivo da ação e pelo parcial provimento do apelo do INCRA, para que a Autarquia dê prioridade de assentamento apenas aos posseiros de boa-fé. Quanto ao apelo da União, opina pela rejeição da preliminar de nulidade da decisão que julgou os embargos, fls. 622, por entender que não existe qualquer vício na decisão atacada. Rejeita também os argumentos de ilegitimidade da União para, juntamente com a FUNAI, promover a desocupação da área indígena. Quanto à parte do decisum que trata da indenização dos posseiros de boa-fé, posiciona-se favorável à sua reforma, já que não consta da inicial qualquer pedido neste sentido. Após apelação, subiram os autos, me sendo conclusos por força de distribuição. Peço a inclusão do feito em pauta para julgamento. É o relatório.

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 344734-PE (2004.05.00.024999-0) APTE : INCRA - INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA REPTE : PROCURADORIA REPRESENTANTE DA ENTIDADE APTE : UNIÃO APDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARTE R : FUNAI - FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO REPTE : PROCURADORIA REPRESENTANTE DA ENTIDADE PARTE R : JOSE FREIRE DE LIMA e outro ADV/PROC : JOSE DANTAS DE LIMA PARTE R : ANTONIO ARAUJO DA SILVA e outros ADV/PROC : CELSO PEREIRA DE SOUZA e outro Origem : PE RELATORA : Desembargadora Federal MARGARIDA CANTARELLI VOTO

A EXMA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARGARIDA CANTARELLI (Relatora): A questão versa sobre a determinação judicial de desocupação de área indígena, do direito dos posseiros em serem assentados pelo INCRA em área de rurais, e da indenização das benfeitorias realizadas na área de ocupação. Observo, de início, que este processo de longa tramitação teve uma liminar do juízo a quo nunca cumprida por falta de condições do juízo da comarca de Petrolândia que, sem a força pública, não a poderia executar. Tais providências nunca foram tomadas e restou a pendência até os dias atuais. A União, em caráter preliminar, pugna pela nulidade da decisão de fls. 622, que rejeitou os embargos de declaração interpostos por ela. Aduz em seu favor, que houve afronta ao artigo 93, IX, da Constituição Federal e ao artigo 535, I, do CPC. Não vislumbro qualquer afronta ao artigo 535, I, do CPC, já que tal dispositivo trata do cabimento dos embargos. Também não há qualquer descumprimento do comando constitucional citado. Ademais, ainda que julgado por despacho, há de ser considerado o princípio da instrumentalidade das formas. Assim, é de se rejeitar a preliminar. Quanto ao mérito, a União discorda ter obrigação legal de expulsar os posseiros que ocupam as terras indígenas. Ocorre que, demarcadas como área indígena, pertencem à União. Assim preceituam os artigo 20, XI e 231 da Carta Magna, cabendo-lhe sua proteção e preservação. Conforme se pode inferir da decisão trazida à colação, a União e a FUNAI são solidariamente responsáveis pela proteção das áreas indígenas. “CONSTITUCIONAL - ADMINISTRATIVO - PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - RESERVA BIOLÓGICA DO GUAPORÉ - GRUPO INDÍGENA – DEMARCAÇÃO E PROTEÇÃO - SUPERVISÃO MINISTERIAL mapg AC 344734

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RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA UNIÃO FEDERAL - PROVIMENTO PARCIAL À REMESSA DE OFÍCIO. 1. Descumprimento de obrigação pelo IBAMA, pela UNIÃO e pela FUNAI. 2. Os entes autárquicos da União Federal devem atingir os seus objetivos públicos e a União Federal não exercendo a supervisão ministerial prevista em lei, impossibilitando esses entes de cumprirem suas obrigações, deve ser reconhecida sua responsabilidade subsidiária. 3. Em se tratando de condenação em obrigação de fazer e havendo tutela sobre interesse difusos, não se faz necessária a expedição de precatório.4. Necessária a redução do valor da multa, pois ela pode gerar a insolvência do condenado e desvirtuar o fim da condenação, que é a tutela do interesse difuso. 5. Apelação e remessa oficial parcialmente providas. 6. Sentença reformada em parte.” (AC 9501082849, Rel. Juiz Catão Alves, 1ª Turma, TRF 1ª Região, DJ 04/10/99, p. 11).

Ainda, a União insurge-se quanto à parte do decisum que a obrigou a indenizar as benfeitorias realizadas pelos posseiros de boa-fé, já que não consta tal pedido da inicial. Neste aspecto, entendo que não houve julgamento extra-petita. A decisão encontra fundamento no artigo 231, § 6º da Constituição Federal: “Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens ... § 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos eu tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nela existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé. ...”

É de se aplicar também ao posseiro de boa-fé, por extensão, o disposto na Lei Civil, artigos 1.201 e 1.219. Neste sentido, veja-se o julgado abaixo: “AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. BENFEITORIAS. O possuidor que exercia posse de boa-fé tem o direito que lhe assegura o art. 516 do CC, consideradas as benfeitorias feitas até a data em que deveria ter devolvido o imóvel, conforme fora acordado. Multa do art. 538 CPC excluída. Recurso conhecido em parte e provido.” (RESP 345463, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4ª Turma, STJ, DJ 06/05/2002. p.296).

O INCRA, em suas razões recursais sustenta sua ilegitimidade passiva. A Lei 6.969/81, que dispõe sobre a aquisição, por usucapião especial, de imóveis rurais, determina em seu artigo 3º: mapg AC 344734

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“Art. 3º - A usucapião especial não ocorrerá nas áreas indispensáveis à segurança nacional, nas terras habitadas por silvícolas, nem nas áreas de interesse ecológico, consideradas como tais as reservas biológicas ou florestais e os parques nacionais, estaduais ou municipais, assim declarados pelo Poder Executivo, assegurada aos atuais ocupantes a preferência para assentamento em outras regiões, pelo órgão competente.”

O Decreto nº 1.775/96, dispões sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, aborda a matéria em questão em seu artigo 4º: Art. 4° Verificada a presença de ocupantes não índios na área sob demarcação, o órgão fundiário federal dará prioridade ao respectivo reassentamento, segundo o levantamento efetuado pelo grupo técnico, observada a legislação pertinente.

Como pode ser observado dos dispositivos legais citados, é incontestável a responsabilidade do INCRA em promover o assentamento dos posseiros que deverão desocupar a área indígena por força da sentença, obviamente, como preceitua o final do artigo 4º supra referido, “observada a legislação pertinente”. Opina o Ministério Público pelo parcial provimento do apelo do INCRA, entretanto, o recurso da autarquia limita-se a pedir que seja reconhecida sua ilegitimidade passiva e que o processo seja extinto, com relação ao apelante, nos termos dos artigos 301, X e 267, VI, do CPC. Não cabe, portanto, razão ao apelante. Diante do exposto, nego provimento às apelações. É como voto.

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EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DESOCUPAÇÃO DA ÁREA INDÍGENA PANKARARU. LEGITIMIDADE DA FUNAI, DO INCRA E DA UNIÃO PARA FIGURAREM NO POLO PASSIVO DA AÇÃO. REASSENTAMENTO DOS POSSEIROS. RESPONSABILIDADE DO INCRA. INDENIZAÇÃO DOS POSSEIROS DE BOA-FÉ. ARTIGO 231, § 6º DA CF/88.

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I.

A reserva indígena Pankararu deverá ser desocupada dos “não índios” pela FUNAI e União, cabendo ao INCRA reassentar os posseiros obrigados a sair da área.

II.

Tratando-se de área indígena, a União e a FUNAI são solidariamente responsáveis pela proteção destas, conforme artigos 20, XI e 231 da Carta Magna.

III.

É incontestável a responsabilidade do INCRA em promover o assentamento dos posseiros que deverão desocupar a área indígena por força da sentença. Lei 6.969/81 e Decreto 1.775/96.

IV.

Não há julgamento extra-petita na condenação à indenização dos posseiros de boa-fé, pois esta fundamenta-se na Constituição Federal, artigo 231, § 6º. É de se aplicar também ao posseiro de boa-fé, por extensão, o disposto na Lei Civil, artigos 1.201 e 1.219.

V.

Apelações improvidas.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL, em que são partes as acima mencionadas. ACORDAM os Desembargadores Federais da Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, em negar provimento às apelações, nos termos do voto da Relatora e das notas taquigráficas que estão nos autos e que fazem parte deste julgado. Recife, 13 de setembro de 2005.

Desembargadora Federal MARGARIDA CANTARELLI RELATORA

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