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literatura, HQ, design, humor, arte
marca
negra
set_2017
a
internet é uma fonte inesgotável de recursos renováveis. Portanto, o tr3sdoi2 terá vida longa e periodicidade, se eu quiser. De publicação em publicação, de contato em contato, apesar da pequena quantidade de leitores que, atualmente, acredito, já sejam suficientes para lotar a final do campeonato de futebol de botão na sala da casa do Afonsinho Beira-rio, campeão das bocadas, terror das menininhas do Morro do Faisão-Faisãozinho, ex-traficante, ex-assaltante, ex-suplente de vereador e... (putz... perdi o fluxo do raciocínio). Bem, vamos lá: em homenagem ao ator e escritor Sam Shepard (eu nem sabia que era escritor), falecido esse ano, peguei um belo conto seu num site português (sorry, não lembro qual). De Giordano Andriola, contato recente do Facebook, um conto do livro Memórias pútridas de um voyeur cego. Agamenon Mendes Pedreira é uma pessoa fictícia que escreve crônicas geniais sobre o Brasil em alguns veículos de mídia impressa, e agora está aqui. De Vagner Xavier, um poema bem bacana sobre um pai, um filho e um carro amarelo. Nos quadrinhos, Allan Sieber, que dispensa apresentações (pelo menos para mim). Há também desenhos eróticos da revista neo-zelandeza Aotearotica para embelezar esse fanzine cinza, frases surreais de estudantes em provas escolares, uma reportagem sobre a Coreia do Norte. E, fechando, Paulinhagata novamente e sempre.
Contos
Sam Shepard
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Convulsão Giordano Andriola
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O tempo é o Caldeirão da Esperança Crônica
Agamenon Mendes Pedreira
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Vou privatizar, mas não vou acender agora Poesia
Vagner Xavier
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Eu lembro de quando... HQ
Allan Sieber
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A volta do velho e bom Deus punitivo Preto no branco Frases
de estudantes
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Respostas de provas Desenhos
Aotearotica
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Desenhos aróticos Reportagem
Kim Suki
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O Grande Chefe Relato
Saci Pererê
Paulinhagata (Parte 4)
Email tr3sdoi2@gmail.com Facebook www.facebook.com/groups/tr3sdoi2/ Editor Alfredo Albuqerque Capa Interferência sobre detalhe d’A Criação de Adão, Michelangelo, Capela Sistina
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CONTO
SAM SHEPARD
S
e ela pudesse me ver agora, estou certo de que se apaixonaria por mim, aposto o que for. Aposto o que for que sim. Como não se apaixonaria? Olha pra mim. Olha como estou. Se ela pudesse me ver assim: esperando por ela, horas antes, muito antes dela chegar, buscando qualquer sinal ou rumor de sua presença. Ela veria como estou empolgado com nosso lance. Veria o desespero no meu peito. Se ela pudesse me ver agora, lá de longe, sem que eu soubesse que está me olhando, me veria tal como eu sou. E aí, como poderia não sentir algo por mim? Ou talvez não. Talvez isso seja... quer dizer, talvez atitudes como essa provoquem repulsa. Não sei exatamente como isso funciona, mas... talvez nasça um sentimento de repulsa quando alguém está empolgado demais... disponível demais, dependente demais. Não sei. Alguma convulsão. Não. Não, isso não. Se pudesse recordar aquela vez – quando foi? Aquela vez em Knoxville quando a gente estava se beijando no trem, aquele beijo longo, longo, que demos na despedida, e de repente o trem começou a se mover, mas eu não ia com ela, e era justo por isso que a gente estava se despedindo, porque pensávamos 3
que não nos veríamos por muito, muito tempo e estávamos concentrados no beijo... apenas nos beijando e beijando e de repente o trem começou a se mexer e não havia maneira de descer. Árvores e casas desapareciam a toda velocidade. No final, me deixaram na estação seguinte, que ficava a muitas milhas de casa, e ali estava eu, esperando durante horas o próximo trem que me levasse de volta. Se ela pudesse me ver naquela hora, de pé, ali, esperando, estou certo, certo, de que iria me querer. Ou seja, como poderia não sentir algo... não sei. Já não sei o que é que faz com que as coisas aconteçam, essa conexão. Se é que houve alguma vez.
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HQ
ALLAN SIEBER
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CRÔNICA
AGAMENON MENDES PEDREIRA
Vou privatizar, mas não vou acender agora
T
em que privatizar tudo, não tem jeito. O Brasil está quebrado, no maior miserê, na pindaíba, vivendo de favor na casa dos outros… Uma vergonha. Só tem um jeito para este país: privatizar tudo. De cabo a rabo. Por falar nisso, já privatizei a minha patroa, a Isaura, faz tempo, também de cabo a rabo. Principalmente o rabo, o que tem me permitido pagar os carnês em dia e botar um pedaço de carne na sopa uma vez por semana. Vamos privatizar o Brasil. Vamos começar pelas empresas estatais. Todas aquelas terminadas em “bras”, inclusive a Ferrabras! Vamos dividir o país em lotes para vender em leilão. Quem é que vai querer comprar as Alagoas com o Collor de Mello e o Renan Calheiros dentro? E o Piauí? Vamos vender o Piauí (o estado e a revista) para Israel. De repente os israelenses conseguem transformar o Piauí (o estado e a revista) em alguma coisa útil! Sergipe vai de brinde para quem comprar a Bahia. Mas quem comprar a Bahia vai ser obrigado a levar o Carlinhos 7
Brown junto! A Guiana já avisou que vai comprar o Amapá, onde pretende construir uma piscina e uma churrasqueira para a população passar o fim de semana. Um grupo de refugiados venezuelanos vai fazer uma vaquinha para comprar Roraima, mas sem o Romero Jucá. Quem vai querer comprar Pernambuco? E o Rio Grande do Norte? Os japoneses já pediram para reservar o Ceará e assim garantir um exército permanente de sushimen. A Paraíba vai ser desmontada para ser vendida num ferro-velho. O Acre, coitado, por falta de interessados, será doado ao Médicos Sem Fronteiras para poderem tratar os haitianos. O Vaticano está interessado em ficar com o Cristo Redentor e o Espírito Santo. A Estapark vai comprar o Pará para transformar em estacionamento. A Amazon.com vai ficar com o Amazonas e finalmente ter uma sede. O Comando Vermelho está pensando em ficar com o Rio de Janeiro (ué, mas já não está?) enquanto o PCC pretende arrematar o estado de São Paulo. Búzios e o litoral de Santa Catarina vão ficar com os argentinos. Um grupo de oftalmologistas quer ficar com as Cataratas do Iguaçu, que serão devidamente operadas. O Rio Grande do Sul será dividido em dois lotes: um fica para os gaúchos gays e o outro para os gays gaúchos. Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais vão ser comprados por um consórcio de bolivianos empreendedores que achavam que assim, finalmente, a Bolívia teria uma saída para o mar. Epa! Esqueci do Tocantins… Mas, se nem eu lembrei do Tocantins, quem é que vai lembrar? 8
E Brasília? Ninguém vai comprar Brasília? Não, ninguém vai comprar Brasília. Brasília já foi comprada há muito tempo. Agamenon Mendes Pedreira é presidente da Privatobras. Empresa estatal criada para privatizar o Brasil * Extraído do site O Antagonista.
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FRASES
ESTUDANTES
Respostas de estudantes a questões de provas às vezes beiram o genial
Lavoisier foi guilhotinado por ter inventado o oxigênio. O nervo ótico transmite ideias luminosas ao cérebro. O vento é uma imensa quantidade de ar. Os egípcios antigos desenvolveram a arte funerárias para que os mortos pudessem viver melhor. Péricles foi o principal ditador da democracia grega. O problema fundamental do terceiro mundo é a superabundância de necessidades. O petróleo apareceu há muitos séculos, numa época em que os peixes se afogavam dentro d’água. 10
A igreja ultimamente vem perdendo muita clientela. O sol nos dá luz, calor e turistas. As aves têm na boca um dente chamado bico. A unidade de força é o Newton, que significa a força que se tem que realizar em um metro da unidade de tempo, no sentido contrário. Lenda é toda narração em prosa de um tema confuso. A harpa é uma asa que toca. A febre amarela foi trazida da China por Marco Paulo. Os ruminantes se distinguem dos outros animais porque o que comem, comem por duas vezes. Quando um animal irracional não tem água para beber, só sobrevive se for empalhado. O Chile é um país muito alto e magro.
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A diferença entre o Romantismo e o Realismo é que os românticos escrevem romances e os realistas nos mostram como está a situação do país. As múmias tinham um profundo conhecimento de anatomia. O batismo é uma espécie de detergente do pecado original. A prosopopeia é o começo de uma epopeia. Os crustáceos fora d’água respiram como podem. A fé é uma graça através da qual podemos ver o que não vemos. O objetivo da Sociedade Anônima é ter muitas fábricas desconhecidas. A arquitetura gótica se notabilizou por fazer edifícios verticais.
* Extraído do blog de Edgard Pereira.
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CONTO
GIORDANO ANDRIOLA
O Tempo é o Caldeirão da Esperança
G
uêpa, Milton e Claudemir. Amigos inseparáveis. Desde o tempo em que realizavam pequenos roubos nas praias urbanas de Natal. “Turistô, dançô!”, dizia Milton. Hoje, a situação é outra: o veloz Guêpa, antes responsável por correr feito um guepardo com os “achados”, agora trabalha como flanelinha na rua do Fórum. Milton, o cabeça da trempe, agora vende NatalCap, e Claudemir, mais conhecido como “gordo”, virou vendedor de amendoim nos coletivos da capital. Claudemir foi além: dia desses descolou uma camiseta da Manassés e saiu pelos coletivos contando o seu testemunho e arrecadando uns trocados. Foi descoberto enquanto acendia uma pedra de crack perto da Igreja do Galo. O trio, que aterrorizava as praias natalenses na deácada de 80, agora confunde-se com o decadentismo urbano das ruelas da cidade alta. Guêpa insurge: “Carai, doido. Que vidinha de fí de rapariga essa nossa. Temo que fazê alguma coisa”. Claudemir tem uma ideia: “Hômi, bora montá um morreem-pé. É garantido”. “Ô gordo buceta. Só pensa bosta. Nói râmo arrumá o dinheiro aonde, bicho da cabeça de pica!”, responde Milton. Começa a discussão. Guêpa é o mais ávido. 13
Logo se posiciona: “O negoço é o siguinte: bora voltá pu crime. Tô cansado de só tomá na tampa nessa porra, tá ligado?”. Gordo é pessimista: “E o tempo que tu passasse no caldeirão (do diabo)? Serviu não? Dêssê besta, rapái. Quero mái isso não. E ur meur doir minino?”. Gordo não queria mais a vida do crime. Tinha, agora, dois filhos. Tava pensando em aceitar Jesus e entrar pra Igreja Pentecostal dos Últimos Dias, como a sua esposa, Janiquelle, tanto pedia. “Rô entrá pá igreja viu, neguim? Meu primo rai me ajudá a montá o morre-em-pé, e rô vendê cremosin durante o dia, seus naiga!”. Guêpa e Milton ficam surpresos. Sem Gordo, o trio perdia um grande parceiro. “Apoi tá, seu gordo buçanha. Rá vendê essas gala desses cremosin, seu chupão”, respondeu Milton. É o fim da parceria. O que os unia era a malandragem, hoje perdida nos confins do tempo que não perdoa quem olha pra trás. Gordo cumpriu o que disse. Se virou bem. Comprou até um Passat 74 no “desmanche do gogó” e colocou um adesivo no vidro traseiro: “Foi Deus quem me deu”. Guêpa continua guardando carros na rua do Fórum. Agora manda no pedaço. Já tabela os preços e cobra por hora. Milton foi promovido: agora vende NatalCap debaixo de uma barraca na praia da Redinha. O tempo pode ter matado uma grande amizade, mas não matou as possibilidades.
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ILUSTRAÇÃO
AOTEAROTICA
A Aotearotica é uma revista neo-zelandeza publicada semestralmente. Veicula material pautado pelo erotismo, incluindo contos, ensaios, desenhos, fotos, etc. Os colaboradores, em geral, são da Nova Zelândia. Durante o período de captação de material, publica no Instagram as imagens que vão chegando. Foi lá que peguei essas aí.
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REPORTAGEM
KIM SUKI
O depoimento de uma jornalista coreana, residente nos Estados Unidos, que conseguiu furar o rĂgido bloqueio da Coreia do Norte dando aulas de inglĂŞs numa universidade particular para filhos da elite norte-coreana
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E
m 2011, Suki Kim, jornalista que nasceu e cresceu na Coreia do Sul e é cidadã americana, conseguiu um trabalho para dar aulas de inglês em uma universidade privada de Pyongyang, na qual estudam filhos homens da elite nortecoreana, “os futuros líderes do país”. Kim passou seis meses vivendo no campus da universidade tomando notas para convertê-las no livro ‘Without You, There Is No Us: My Time with the Sons of North Korea’s Elite’ (Sem você, não há nós: meu tempo com os filhos da elite nortecoreana), publicado em 2015. Suki Kim relatou à BBC Mundo como foi sua experiência, algo que poucos estrangeiros puderam experimentar no hermético país que nos últimos 70 anos esteve isolado do resto do mundo. É um lugar, como ela diz, onde o medo é constante, todos vivem se vigiando e onde o controle do governo “é o pior que se pode imaginar”. Veja abaixo o seu depoimento.
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Meu interesse na Coreia do Norte vem de uma combinação de duas razões. Como jornalista, tinha uma frustração por não saber a verdade sobre o que ocorre neste lugar, o que é uma enorme tragédia. E minha família foi separada pela guerra das Coreias em 1950, o que trouxe a razão pessoal. Essa guerra e a posterior divisão da península separaram milhões de coreanos. Meu tio, irmão da minha mãe, ficou no norte, e minha avó nunca voltou a vê-lo. O mesmo ocorreu com os primos do meu pai. De Pyongyang a Seul (capital de Coreia do Sul), são necessárias apenas duas horas de carro. Mas quando traçou-se a linha que dividiu a península, o Paralelo 38, em 1953, as pessoas que ficaram no norte nunca voltaram a ver seus familiares. Eu cresci neste clima na Coreia do Sul, onde minha avó literalmente morreu de aflição esperando o filho que acidentalmente ficou do outro lado e não pôde nunca regressar. A dor e ansiedade causados por esta situação se converteram em uma obsessão. Como podemos entender esta tragédia? Foi assim que comecei a buscar uma oportunidade para poder entrar e viver na Coreia do Norte. Durante uma década estive fazendo uma pesquisa sobre o país. Falei com quase cem desertores em países vizinhos: China, Mongólia, Tailândia e Laos. Nesta época, entrei por períodos curtos na Coreia do Nor te, mas o que buscava era a possibilidade de poder viver ali, incógnita. Em 2011, Suki Kim conseguiu um emprego na recém-inaugu20
rada Universidade para a Ciência e Tecnologia de Pyongyang (PUST), a única universidade privada da Coreia do Norte, frequentada por filhos de dirigentes norte-coreanos. A PUST foi fundada por grupos evangélicos de vários países. Seus funcionários são principalmente professores americanos que estão ali como voluntários, financiados por suas igrejas. Kim foi contratada para dar aulas de inglês por um período de seis meses. A Coreia do Norte está cheia de paradoxos. E esta universidade é uma delas. A religião aqui não é permitida, e o proselitismo é um crime muito sério, castigado com a morte. O único que se venera no país é o Grande Líder. Mas a comunidade evangélica fez um acordo com a Coreia do Norte: ela bancaria a universidade e não faria proselitismo - apesar de ser óbvio que este era o objetivo de longo prazo. Assim, grupos evangélicos fundamentalistas estão financiando a educação dos futuros líderes do país em troca de um potencial propósito missionário de longo prazo. O governo tem que aprovar tudo o que ocorre na universidade. Eles selecionam os estudantes, que são principalmente filhos dos funcionários do partido dirigente. Na Coreia do Norte, o governo decide tudo sobre o indivíduo: a carreira que seguirá, a escola onde estudará, as atividades que fará. Quando estive ali, havia 270 estudantes, todos homens que viviam no campus. Eu ensinava inglês para duas classes, com cerca de 50 alunos de 19 e 20 anos cada. 21
A universidade é vigiada por militares e ninguém tem permissão para sair. Em 2011 os O governo define as escoltas que vivem estudantes com os professores no campus e seu trabalho nunca é monitorá-los 24 horas por dia. Eu tive uma tinham escolta me vigiando dia e noite, literalmente, já que dormia no quarto abaixo do meu. ouvido falar Tudo o que fazíamos e ensinávamos de internet, devia ser aprovado, monitorado e gravado. e eu era Vivi o tempo todo aterrorizada. Se não proibida tivesse escrevendo o livro, minha situação teria sido diferente, mas estava tomando de falar notas em segredo e sabia que nunca ninsobre isto guém tinha tentado fazer isto no país. Mantive minhas notas em memórias de USB e sempre as levava comigo. Todos os dias apagava tudo do meu computador e não deixava nenhum rastro do meu trabalho. A possibilidade de que a minha escolta descobrisse essas notas me dava arrepios. No meu quarto, havia microfones ocultos; e todas as aulas que eu dava eram gravadas. É um sistema de medo constante e vivi aterrorizada pensando que poderia morrer ali. O que pensava de meus alunos? É uma pergunta bastante complexa. Para o meu livro, estava tratando de entender o que pensavam e sentiam, mas vivendo em um sistema de constante controle e vigilância ninguém sabe realmente o que as pessoas pensam ou sentem. 22
Os estudantes também estão sob um sistema de supervisão constante. Nunca estavam sozinhos. Eles se vigiavam e me vigiavam e informavam sobre mim. Costumavam ter uma reunião semanal na qual informavam sobre os outros estudantes e sobre os professores. Eles são tratados como soldados. Fazem exercícios em grupo, correm em grupo, cada hora saem para marchar em grupo para honrar o Grande Líder, e constantemente são dou trinados sobre a grandeza do Grande Líder e o ódio aos Esta dos Unidos. Eu cheguei a sentir um grande afeto por meus estudantes, que pareciam muito mais inocentes que outros jovens de 20 anos em outras partes do mundo. Eram adoráveis, enérgicos e curiosos. Os típicos estudantes desta idade que fazem piadas o tempo todo, que falam de garotas o tempo todo. Esse aspecto humano é um enorme contraste com o estilo de vida que lhes é imposto e ao qual estão continuamente expostos. Foi sob esta constante vigilância que entendi a insuportável situação na qual vivem, o medo de estar sempre vigiando e denunciando os demais, a impossibilidade de ir a qualquer lugar ou com qualquer pessoa, e a forma como se restringe seu mundo, sua imaginação. Para o resto do mundo, a Coreia do Norte é um enigma. Mas o que pensam os norte-coreanos sobre o que está além de suas fronteiras? Suki Kim assegura que estes jovens não têm permissão de expressar nenhuma curiosidade sobre o mundo exterior. E isto, diz a escritora, é um tipo de abuso 23
psicológico que condiciona cidadãos a aceitar o que lhes rodeia sem questionamentos. Nesta época, em 2011, os estudantes nunca tinham ouvido falar de internet, e eu era proibida de falar sobre isto. Eu tinha ordens estritas de não revelar nada sobre o mundo exterior e eles não tinham nenhuma informação sobre o que ocorria fora de seus país, não conheciam o Taj Mahal, nem a Torre Eiffel, e tampouco sabiam quem era Michael Jackson. A televisão na Coreia do Norte tem apenas um canal com programas sobre o Grande Líder. Também são transmitidos programas da China ou da Rússia, todos baseados nos “ideais socialistas”. Há apenas um jornal e os artigos publicados também estão vinculados ao Grande Líder. O mesmo ocorre com os livros que leem e com todas as outras formas de educação e entretenimento. Toda sua rotina e seu entretenimento funcionam para hon rar o regime e a filosofia do sistema. Na universidade, ocasionalmente jogavam futebol e basquete. É preciso lembrar que estes são os jovens das elites, mas que o resto da população vive sob o mesmo controle. Houve ocasiões, aos domingos, quando nos permitiram sair em grupo e com escoltas em excursões que tinham sido previamente aprovadas, entre elas para visitar e colocar flores em edificações do Grande Líder. Às vezes, saíamos de Pyongyang para visitar as Grandes Montanhas ou alguma fazenda. Fora da capital não se veem muitas coisas. As estradas estão vazias, não há carros nas ruas. 24
Pude ver que as pessoas fora a capital eram menores. As pessoas com quem tínhamos permissão de interagir, como os estudantes, pareciam com a gente. Mas as pessoas que se veem nas margens de estradas são marcadamente menores e parecem malnutridas. Nunca nos permitiram falar com ninguém nas ruas. Os lugares para onde nos levavam pareciam cenários de filme e nunca havia pessoas nesses lugares. Só víamos os outros membros do grupo e, por toda parte, todos os lugares estavam cobertos com milhares de slogans do Grande Líder. Esta é a realidade que te mostram. O controle no país é algo muito forte. Controlam cada aspecto da vida e tudo está relacionado ao Grande Líder. Depois de toda a investigação que tinha feito sobre a Coreia do Norte, nunca tinha imaginado que pudesse existir um controle tão grande. A realidade é pior do que se pode imaginar. Além de ‘Without You, There Is No Us”, Kim Suki é autora do romance “The Interpreter”(O Intérprete) e escreve regularmente para o New York Times, Washington Post, Harper’s e New Republic. *Reportagem extraída do site da BBC Brasil.
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POESIA
VAGNER XAVIER
Eu lembro de quando Eu pedi pra você comprar Um carro e você comprou Aquele automóvel amarelo Eu era aliás sou tão durão Que queria até mandar No meu pai, justo nele _ Que era mais livre que o ar _ Pedi pra ele comprar Um Kadett e no outro dia O Marcos entregou o Tal automóvel amarelo E eu fiquei puto Disse, você está enganado Ele comprou um Kadett E não esse automóvel amarelo Deve estar havendo Algum equívoco de sua parte Marcos, ele sorriu Um doce sorriso Foi embora cedo demais também Eu lembro um dia de chuva Meu pai e minha irmã foram de carro E eu fui a pé de guarda chuva Eles pararam do meu lado 26
E eu continuei seguindo Meu caminho & Pisando duro Mais triste que o Diabo Me recusava a andar A passear no automóvel Com o passar do tempo Peguei amor no automóvel amarelo Depois meu pai vendeu o carro Para o Tranquilo Crippa Fui contra a venda Mas ele vendeu Esse garoto às vezes contraditório Com o tempo tudo se foi E ficaram as doces lembranças Do automóvel amarelo
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RELATO
SACI PERERÊ
paulinhagata
(parte 4)
27 Jun 2010 Experiência Positiva Conforme combinado na véspera, ela ligou às 5 da tarde para eu ir buscá-la. Com a passageira a bordo segui para o cabelei reiro, antes passando na esteticista - também minha amiga - para verificação do estado de saúde do ros to de Paulinha, cuja pele (do rosto) demonstra sé rios e profundos sinais de rebeldia. Longe de ser bonita ela agrada pelo conjunto. Mas é uma gostosa! Havia me prontificado, como conhecedor de bons canais, de orientá-la na direção de alcançar o objetivo de estar com os cabelos e rosto de acordo com os próprios padrões que ela mesma estabeleceu. E assim fiz... A esteticista apresentou um plano de tratamento e assegurou bons resultados se tudo fosse seguido à risca. O valor total da primeira etapa para ter uma pele aceitável importou em R$ 1.200,00 (mil e duzentos) reais, a serem divididos suavemente. Valor a ser pago por Paula. 29
Depois da esteticista rumamos para o cabeleireiro – Aracaju é uma cidade pequenininha e esses lugares são próximos um do outro. Com o cabelo lavado no salão, Paulinha me sugeriu que, como já estávamos ali mesmo, ela fizesse também escova. Perguntei se eu pagaria a conta e ela, cinicamente, respondeu que sim. Até então imaginava que eu apenas estaria levando-a aos lugares capazes de satisfazer o que ela tanto buscava. Mas pagar, nunca me havia passado pela cabeça... Estava lá mesmo, paguei... Entre tudo ficou em R$ 150,00 (cento e cinqüenta) reais. Naturalmente esperando um redobrado retorno em rala-e-rola. Lá ainda comemos uma salada de frango defumado com aspargos e molho tártaro - no cabeleireiro tem um mini restaurante. Já na, rua tentei fazer um carinho de elogio ao resultado do make up, mas ela me rechaçou dizendo que em público não. Digeri mal a forma pouco civilizada como fui tratado, mas relevei. Argumentei que após o primeiro encontro ela me agarrou aos abraços e chupões na porta do condomínio onde mora, sem preocupar-se com quem pudesse ver o nosso tórrido idílio. De olho na foda eu havia produzido elementos para fazê-la uma massagem tântrica. Da minha bagagem fazia parte tâmaras, damasco, pão de amei30
xa, velas aromatizadas, óleo se semente de uva, vinho entre outros paramentos esotéricos que seriam utilizados ao som de Nando Carneiro no disco Topázio. No Amore Mio (pousada) a massagem serviu pra amaciar a carne de Paulinha. Ela voltou da catarse com fome de leoa e devorou com talo e tudo o meu modesto apetite sexual. Imaginei que o grau no cabelo teria levado embora a boa foda, pois mulher quando dá escova ninguém pode chegar perto. Muito pelo contrário. Ela enfiou-se em mim com escova e tudo tendo eu aproveitado a situação para estraçalhar o cabelo que eu ajudara ($) a embelezar. Diante de tudo imaginei que iríamos viver os sonhos das mil e uma noites, mas depois do primeiro ato o furor de Paulinha enfiou-lhe a roupa e partiu para a retirada sem respeitar nenhum princípio ético, moral, vaginal, anal, oral, e muito menos espiritual... Por fim paguei os 100 do programa, mais os 150 do cabeleireiro, perfazendo um total de 250 reais. E nem um muito obrigado... Comecei a ficar puto, mas vai um positivo pela energia e pela beleza do espetáculo. Muito obrigado, (continua...) 31
ANTES O S
R
L
QUE MAL ACOMPANHADO 32