K. BROMBERG
TRADUÇÃO: CLARA TAVEIRA
1ª EDIÇÃO – 2022 RIO DE JANEIROCOPYRIGHT © 2014. CRASHED BY K. BROMBERG.
COPYRIGHT © 2022. ALLBOOK EDITORA.
Direção Editorial BEATRIZ SOARES
Tradução CLARA TAVEIRA
Preparação e Revisão
ALLBOOK EDITORA E RAPHAEL PELLEGRINI
Capa original
TUGBOAT DESIGN
Adaptação de capa, projeto gráfico e diagramação CRISTIANE | SAAVEDRA EDIÇÕES
Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. Os direitos morais do autor foram declarados.
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SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Meri Gleice Rodrigues de Souza – Bibliotecária – CRB-7/6439
B886c
Bromberg, K. Crashed / K. Bromberg ; tradução Clara Taveira. – 1. ed. – Rio de Janeiro: AllBook, 2022. 426 p.; 16 x 23 cm. (Driven ; 3)
Tradução de: Crashed Sequência de: Fueled Continua com: Raced "Conteúdo: Colidindo com o amor ; Correndo para o felizes para sempre"
ISBN: 978-65-86624-80-9
22-76897
CDD 813
CDU: 82-31(73)
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995) 2022 PRODUZIDO NO BRASIL.
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1. Romance americano. I. Taveira, Clara. II. Título. III. Série.E finalmente estou dançando…
Para Mamãe e Papai.Obrigada pelo ensinamento de que a vida não é sobre como sobreviver à tempestade, mas sim sobre como dançar na chuva.
Pam. Pam. Pam.
A dor ressonante na cabeça pulsa junto do barulho que martela nos ouvidos.
Pam. Pam. Pam.
Há tanto barulho — alto, um ruído branco zumbindo —, mas ainda assim é assustadoramente silencioso. Silencioso, exceto por aquele maldito barulho de pancada.
Que diabo é isso?
Por que caralhos está tão quente — tão quente, que posso sentir o calor vindo em ondas do asfalto —, mas tudo o que sinto agora é frio?
Filho da puta!
Algo à minha direita chama minha atenção — metal amassado, pneus estourados, pele em pedaços — e tudo o que posso fazer é olhar. Becks vai me estrangular por ter fodido o carro. Vai me deixar em pedacinhos que nem meu carro espalhado por toda a pista. Que caralhos aconteceu?
A inquietação sobe pela minha coluna.
O batimento cardíaco acelera.
A confusão domina as camadas do meu inconsciente. Fecho os olhos para tentar afastar as batidas que de repente estão tocando percussão em meus pensamentos. Pensamentos que não consigo entender. Eles escorrem pela cabeça como areia entre os dedos.
Pam. Pam. Pam.
Abro os olhos para tentar encontrar a origem do maldito som que aumenta a dor…
… prazer para enterrar a dor…
Essas palavras são sussurradas em minha mente; eu balanço a cabeça para tentar compreender o que está acontecendo, e é aí que o vejo: o cabelo escuro precisando de um corte; pequenas mãos segurando um helicóptero de plástico; um Band-Aid do Homem-Aranha enrolado no dedo indicador que está girando as hélices de brinquedo.
Homem-Aranha. Batman. Super-Homem. Homem de Ferro.
— Pam, pam, pam — ele diz com a mais suave das vozes.
Então por que soa tão alto? Olhos grandes me mirando através de cílios grossos, inocência personificada naquele verde gracioso. Seu dedo vacila no rotor quando seus olhos encontram os meus, inclinando a cabeça para me estudar atentamente.
— Olá — eu digo, o silêncio ensurdecedor reverberando no espaço entre nós.
Há algo de errado.
Absolutamente errado para caralho.
A apreensão ressurge.
Pistas do desconhecido rodopiam na mente.
A confusão me sufoca.
Seus olhos verdes me consomem.
A ansiedade se dissipa quando um sorriso lento se curva no canto de sua boquinha manchada, uma covinha solitária aparecendo ao seu lado.
— Eu não deveria falar com estranhos — diz ele, endireitando um pouco as costas, tentando agir como o garoto grande que quer ser.
— É uma boa regra. Sua mãe te ensinou isso?
Por que ele parece tão familiar?
Ele dá de ombros com indiferença. Seu olhar percorre cada centímetro meu e depois para em meus olhos. Eles brilham ao ver algo por cima do meu ombro, mas por alguma porra de razão, eu não consigo desviar a atenção dele para olhar. Não é só porque ele é a porra do garotinho mais fofo que eu já vi… Não, é como se ele tivesse um poder de me atrair que eu não consigo quebrar.
Uma pequena linha enruga sua testa enquanto ele olha para baixo e pega outro Band-Aid de super-herói que mal cobre o grande arranhão em seu joelho.
Homem-Aranha. Batman. Super-Homem. Homem de Ferro.
Cala a boca, porra! Eu quero gritar com os demônios na minha cabeça. Ninguém tem o direito de estar aqui… não há razão para ninguém se aglomerar em torno desse garotinho de aparência doce, mas ainda assim eles continuam girando como em um carrossel. Como se meu carro estivesse na pista agora. Então por que estou dando um passo em direção a esse garotinho que parece um ímã em vez de me preparar para a merda da bronca que Becks vai me dar e que, a julgar pela aparência do carro, eu obviamente mereço?
E ainda assim não consigo resistir.
Dou outro passo em direção a ele, meus movimentos lentos e deliberados, como se estivesse com os meninos do Lar.
Os meninos.
Rylee.
Eu preciso vê-la.
Não quero mais ficar sozinho.
Eu preciso senti-la.
Não quero mais ficar destruído.
Por que estou nadando em um mar de confusão? E, no entanto, dou mais um passo através da neblina em direção a esse inesperado raio de luz. Seja minha centelha.
— É um belo dodói que você tem aí…
Ele solta o ar pelo nariz. É adorável para caralho ver esse garotinho com um rosto tão sério, nariz cheio de sardas, olhando para mim como se eu não estivesse entendendo alguma coisa.
— Obrigado, Capitão Óbvio!
E é todo espertinho também. Meu tipo de criança. Eu sufoco uma risada quando ele olha por cima do meu ombro novamente pela terceira vez. Eu começo a me virar para ver o que ele está olhando quando sua voz me para.
— Você está bem?
Ahn?
— O que você quer dizer?
— Você está bem? — ele pergunta novamente. — Você parece meio destruído.
— Do que você está falando? — Dou outro passo em direção a ele. Meus pensamentos fugazes misturados com a melancolia de seu tom e a preocupação gravada em seu rosto estão começando a me enervar.
— Bem, você parece destruído para mim — ele sussurra enquanto seu dedo envolto em Band-Aid vira a hélice novamente (pam, pam, pam) antes pairar com o brinquedo sobre meu corpo.
A ansiedade me atinge até que olho para o meu traje de corrida e o vejo intacto, minhas mãos o alisando em uma tentativa de me acalmar.
— Não. — As palavras saem em um jorro. — Estou bem, amigo. Tá vendo? Não há nada de errado — eu digo, suspirando de alívio. O filho da putinha me assustou por um segundo.
— Não, bobo — diz ele com um revirar de olhos e um resfolegar antes de apontar por cima do meu ombro. — Veja. Você está destruído.
Eu me viro, a simplicidade calma de seu tom me intrigando, e olho para trás.
Meu coração para.
Pam.
Minha respiração estrangula no peito.
Pam.
Meu corpo congela.
Pam.
Eu pisco repetidamente, tentando afastar as imagens diante de mim. As vistas permeiam através de uma névoa viscosa.
Homem-Aranha. Batman. Super-Homem. Homem de Ferro.
Porra. Não. Não. Não. Não.
— Viu? — sua voz angelical diz ao meu lado. — Eu te disse. Não. Não. Não. Não.
O ar finalmente sai dos meus pulmões. Eu tento engolir, a garganta parece uma lixa.
Eu sei o que estou vendo — o caos bem diante dos meus olhos —, mas como isso é possível? Como estou aqui e ali ?
Pam. Pam. Pam.
Eu tento me mover. Tento correr, porra! Tento chamar a atenção deles para dizer que estou bem aqui, que estou bem, mas meus pés não me obedecem com todo o pânico ricocheteando no meu cérebro.
Não. Eu não estou lá. Estou só aqui. Eu sei que estou bem — sei que estou vivo — porque posso sentir minha respiração travar no peito quando dou um passo à frente para olhar mais de perto. Sinto o pavor fazendo cócegas no couro cabeludo, porque o que eu vejo… não pode ser… simplesmente não é possível.
Homem-Aranha. Batman. Super-Homem. Homem de Ferro.
O zumbido suave da serra me puxa do estado de alerta enquanto a equipe médica corta o capacete do motorista bem no centro. No minuto em que separam as partes, minha cabeça parece explodir. Eu caio de joelhos, a dor é tão excruciante, que tudo o que posso fazer é levantar as mãos e segurar a cabeça. Eu preciso olhar para cima. Preciso ver quem estava no meu carro, na porra do meu carro, mas não consigo. Dói demais.
Eu me pergunto se dói quando você morre…
Eu tremo com a sensação de sua mão em meu ombro… Mas no minuto em que ela encosta em mim, a dor deixa de existir.
O quê…? Eu sei que preciso olhar. Eu preciso ver por mim mesmo quem está no carro, embora eu saiba a verdade. Memórias confusas se partem e piscam na mente como pedaços do espelho estilhaçado naquela porra de bar de quinta.
Porra de cabeça fodida.
O medo se espalha e reverbera por meu corpo. Eu não consigo. Eu não consigo olhar para cima . Não seja tão fresco, Donavan. Em vez disso, olho para a direita, nos olhos dele, a calma inesperada nesta tempestade.
— Aquele é…? Sou…? — eu pergunto ao garotinho enquanto minha respiração fica presa na garganta, a apreensão pela resposta mantém minha voz refém.
Ele apenas olha para mim — olhos claros, rosto sério, lábios franzidos, sardas como que dançando — antes de apertar meu ombro.
— O que você acha?
Eu quero sacudir esse menino até arrancar uma porra de uma resposta sua, mas sei que não vou. Não consigo. Com ele aqui ao meu lado, em meio a esse caos rodopiante, nunca me senti mais em paz e ao mesmo tempo mais assustado.
Eu desvio os olhos de seu rosto sereno para olhar para a cena à minha frente. Eu me sinto como se estivesse em um caleidoscópio de imagens irregulares enquanto observo o rosto — meu maldito rosto — na maca.
Meu coração dispara. Salta. Para. Morre.
Homem-Aranha.
Pele cinzenta. Olhos inchados, machucados e fechados. Lábios flácidos e pálidos.
Batman.
A devastação me arrebata, o desespero consome, a vida oscila, e ainda assim minha alma se agarra ao que pode.
Super-Homem.
— Não! — eu grito a plenos pulmões até ficar rouco. Ninguém se vira. Ninguém me ouve. Todo mundo está quieto — incluindo meu corpo e os médicos.
Homem de Ferro.
O corpo na maca — meu corpo — sacode quando alguém sobe na maca e começa a fazer compressões no meu peito. Alguém prende o colar cervical em mim. Levanta minhas pálpebras e verifica as pupilas.
Pam.
Rostos cautelosos. Olhos derrotados. Movimentos de rotina.
Pam.
— Não! — eu grito novamente, o pânico reinando dentro de cada pedaço de mim. — Não! Eu estou bem aqui! Bem aqui! Estou bem.
Pam.
Lágrimas caem. A descrença se manifesta. As possibilidades desaparecem. A esperança implode.
Minha vida esvanece.
Meus olhos se concentram na minha mão pendurada, flácida e sem vida, fora da maca — um único pingo de sangue lentamente descendo até a ponta do dedo antes de outra compressão no peito jogá-lo no chão. Concentro-me naquela faixa de sangue, incapaz de olhar para o meu rosto. Eu não aguento mais.
Não suporto ver a vida sendo drenada de mim. Não suporto o medo que rasteja pelo meu coração, o desconhecido que escorre no inconsciente e o frio que começa a se infiltrar na alma.
— Me ajuda! — Viro-me para o menino tão familiar, mas tão desconhecido. — Por favor — eu imploro, um sussurro suplicante, com cada grama de vida que tenho em mim. — Eu não estou pronto para… — Não consigo terminar a frase. Se eu fizer isso, estarei aceitando o que está acontecendo na maca diante de mim… estarei aceitando o significado da presença do menino ao meu lado.
— Não? — ele pergunta. Uma única palavra, mas a mais importante da porra da minha vida. Eu olho para ele, consumido pelo que está no fundo dos seus olhos (compreensão, aceitação, reconhecimento), e por mais que eu
não queira me afastar do sentimento que tenho quando estou perto dele, a pergunta que o garoto faz, sobre escolher entre a vida ou morte, é a decisão mais fácil que já tive de tomar na vida.
E, no entanto, a decisão de viver — voltar e provar para caralho que eu mereço ter esse poder de escolha — significa que terei de deixar seu rostinho angelical e a serenidade que sua presença traz para minha alma perturbada.
— Eu vou te ver de novo? — Não tenho certeza de onde vem a pergunta, mas ela surge antes que eu possa impedi-la. Prendo a respiração, esperando por sua resposta, desejando tanto um sim quanto um não.
Ele inclina a cabeça para o lado e sorri.
— Se estiver nas cartas.
Na porra das cartas de quem? Eu quero gritar com ele. Deuses? O Diabo? Minhas? De quem é a porra das cartas? Mas tudo o que posso dizer é:
— Cartas?
— Sim — ele responde com um pequeno aceno de cabeça enquanto olha para seu helicóptero e de volta para mim.
Pam. Pam. Pam.
O som fica mais alto agora, abafando todo o barulho ao meu redor, ainda posso ouvir sua respiração. Ainda ouço as batidas do meu coração nos tímpanos. Ainda posso sentir o suspiro suave de paz que envolve meu corpo como um sussurro quando ele coloca a mão no meu ombro.
De repente, vejo o helicóptero — um helicóptero de resgate — no campo interno, o som incessante dos rotores — pam, pam, pam — enquanto espera por mim. A maca começa a ser levada até ele.
— Você não vai? — ele me pergunta.
Eu tento engolir a saliva enquanto olho para o menino e dou um aceno de cabeça sutil e resignado.
— Vou… — É quase um sussurro repleto de medo do que me aguarda. Homem-Aranha. Batman. Super-Homem. Homem de Ferro.
— Ei — ele diz, e meus olhos voltam a se concentrar na porra do seu rosto perfeito. Ele aponta de novo para o movimento atrás de mim. — No final das contas, parece que seus super-heróis vieram desta vez.
Eu me viro, sentindo o coração na garganta e toda essa confusão bagunçando o que me é lógico. A princípio não vejo, o piloto está de costas para mim, ajudando a carregar a maca na evacuação médica, mas quando ele se vira para pular no assento e pegar o controle, fica claro como o dia.
Meu coração para.
E volta a bater.
Um suspiro hesitante de alívio passa pela minha alma.
O capacete do piloto é pintado.
De vermelho.
Com linhas pretas.
Com o emblema do Homem-Aranha estampado na frente.
O garotinho que há em mim comemora. O homem adulto em mim relaxa de alívio.
Eu me viro para me despedir do garotinho, mas ele não está mais por perto. Como diabos ele sabia dos super-heróis? Eu procuro por ele — precisando da resposta —, mas ele se foi.
Eu estou sozinho.
Sozinho, exceto pelo conforto daqueles por quem esperei uma vida inteira.
Eu tomei a decisão.
Os super-heróis finalmente chegaram.
CAPÍTULO 1
Adormência lentamente se infiltra em meu corpo. Não consigo me mexer, não consigo pensar, não consigo tirar os olhos do carro mutilado na pista. Se eu olhar para qualquer outro lugar, então tudo isso será de verdade. O helicóptero sobrevoando a pista estará realmente carregando o corpo destruído do homem que amo.
O homem que eu preciso.
O homem que não posso perder.
Fecho os olhos e apenas escuto, mas não consigo ouvir nada. A única coisa que há em meus ouvidos é a batida do meu pulso. A única coisa além da escuridão que meus olhos veem — que meu coração sente — são as imagens fragmentadas da minha mente. Max colidindo contra Colton e depois Colton voltando contra Max. Memórias que fazem a esperança, a qual estou agarrando como uma tábua de salvação, tremeluzir e arder antes de morrer, como a escuridão sufocando a luz em minha alma.
I race you, Ryles. Sua voz tão forte e inabalável preenche minha mente, brilhando em minhas memórias, e depois se dissipa.
Eu me curvo, desejando que as lágrimas sufocantes apareçam ou que uma centelha de esperança nasça dentro de mim, mas nada acontece, nada além de chumbo pesado sobre a alma e o corpo.
Eu me forço a respirar enquanto tento me enganar e acreditar que os últimos vinte e dois minutos nunca aconteceram. Que o carro não deu cambalhotas e piruetas no ar cheio de fumaça. Que o metal não foi cortado por médicos de rosto sombrio para libertar o corpo sem vida de Colton.
Nunca fizemos amor. Esse único pensamento voa pela minha cabeça. Nós nunca tivemos a chance de race depois que ele finalmente me disse as palavras que eu precisava ouvir — e que ele finalmente aceitou, admitiu e sentiu isso tudo sozinho.
Eu só quero voltar no tempo para o quarto, quando estávamos nos braços um do outro. Quando estávamos conectados — vestidos demais e com roupas de menos —, mas as visões horríveis do carro destroçado não me permitem. Eles marcaram minha memória de novo, de forma tão horrenda, que não é possível que eu mantenha minha esperança intacta depois disso tudo.
— Ry, eu não estou indo muito bem aqui. — São as palavras de Max penetrando em minha mente, mas é a voz de Colton. É Colton me avisando do que está por vir. O que eu já vivi uma vez na vida.
Ai, Deus. Por favor, não. Por favor, não.
Meu coração se contorce.
Minha determinação vacila.
As imagens passam em câmera lenta.
— Rylee, eu preciso que você se concentre. Olhe para mim! — As palavras de Max novamente. Eu começo a amolecer, o corpo cedendo assim como a esperança, mas os braços se fecham ao meu redor e me dão uma sacudida.
— Olhe para mim! — Não, não é Max. Não é Colton. É Becks.
Eu encontro dentro de mim forças para focar a vista e encontrar seus olhos — poças azuis marcadas com o súbito aparecimento de linhas nas beiradas. Eu vejo medo neles.
— Precisamos ir para o hospital agora, ok? — Sua voz é suave, mas severa. Ele parece pensar que se falar comigo como se eu fosse uma criança, não vou me quebrar em milhões de pedaços, como minha alma, que já está quebrada.
Não consigo engolir com a garganta seca nem responder, então ele me dá outra sacudida. Todas as minhas emoções sumiram, menos o medo. Eu balanço a cabeça, mas não faço nenhum outro movimento. É totalmente silencioso. Há dezenas de milhares de pessoas nas arquibancadas ao nosso redor, e, no entanto, ninguém diz nada. Seus olhos estão focados na equipe de limpeza e no que resta dos inúmeros carros na pista.
Eu me esforço para ouvir algum som. Para sentir um sinal de vida. Nada além de silêncio absoluto.
Sinto o braço de Becks ao meu redor, me apoiando, enquanto ele nos conduz para fora da torre na fila dos boxes, descendo os degraus e rumando em direção à porta de uma van que nos espera. Ele me empurra suavemente para me fazer entrar, como se eu fosse uma criança.
Beckett se senta ao meu lado no banco e coloca minha bolsa e meu celular em minhas mãos, aperta seu próprio cinto e então diz: “vai”.
A van acelera, me jogando para trás enquanto passa pelo campo interno. Olho para fora quando começamos a descer o túnel, tudo o que vejo são carros da Indy espalhados pela pista completamente imóveis. Lápides coloridas em um cemitério tranquilo de asfalto.
— Crash, crash, burn… — A letra da música flutua dos alto-falantes e entra no silêncio letal da van. Minha mente vazia a processa lentamente.
— Desliga isso! — eu grito em pânico, enquanto minhas mãos se apertam e os dentes rangem; as palavras se incorporam à realidade que estou tentando bloquear sem sucesso.
A histeria mostra as caras.
— Zander — eu sussurro. — Zander tem uma consulta no dentista na terça-feira. Ricky precisa de novas chuteiras. Aiden vai começar com as aulas particulares na quinta-feira, e Jax não colocou no calendário. — Eu olho para cima e vejo os olhos de Beckett fixos nos meus. Pela visão periférica noto outras pessoas sentadas atrás de nós, mas não sei como elas chegaram lá.
Ela borbulha.
— Beckett, eu preciso do meu celular. Dane vai esquecer, Zander realmente precisa ir ao dentista, e Scooter nã…
— Rylee — ele diz em um tom uniforme, mas eu balanço a cabeça.
— Não! — eu grito. — Não! Eu preciso do meu celular. — Começo a soltar meu cinto de segurança, tão nervosa, que nem percebo que está na minha mão. Eu tento me desvencilhar dele para alcançar a porta da van em movimento. Beckett se esforça para me impedir de abri-la.
Ela ferve.
— Me solta! — Luto com ele. Eu me contorço, e me contorço, mas ele consegue me conter com sucesso.
— Rylee — Beckett diz novamente, sua voz falhando combina com o sentimento em meu coração, afastando a vontade de lutar.
Eu desabo no banco, mas Beckett me mantém próxima a ele, as respirações difíceis unidas. Ele pega minha mão e aperta com força, a única
demonstração de desespero em seu semblante estoico; mas eu nem tenho como apertá-la de volta.
O mundo lá fora passa em um borrão, o meu está parado. Está em uma maca em algum lugar.
— Eu o amo, Beckett — finalmente sussurro.
Eu estou movida pelo medo…
— Eu sei — diz ele, exalando uma respiração trêmula e beijando minha cabeça. — Eu também.
… Repleta de desespero…
— Eu não posso perdê-lo. — As palavras são quase inaudíveis, como se dizer em voz alta fosse tornar tudo real.
… Colidindo contra o desconhecido.
— Eu também não.
O som das portas automáticas do pronto-socorro é paralisante. Eu congelo com o barulho.
Memórias assombrosas surgem quando ouço o som, e o branco angelical dos corredores me traz tudo menos calmaria. É estranho que as luzes fluorescentes no teto brilhem em minha mente — meu único foco possível quando minha maca foi direcionada pelo corredor —, jargão médico sendo trocado rapidamente entre os médicos, pensamentos incoerentes misturados e o tempo todo meu coração implorando por Max, por meu bebê, por esperança.
— Ry? — A voz de Beckett me afasta do pânico que estrangula minha garganta, das memórias me sufocando. — Você pode entrar?
A gentileza em seu tom vem até mim como um bálsamo que limpa minha ferida aberta. Tudo o que eu quero fazer é chorar ouvindo o conforto em sua voz. A vontade de cair em pranto fecha garganta e arde em meus olhos, e ainda assim as lágrimas não caem. Nunca caem.
Eu respiro fundo e forço meus pés a se moverem. Beckett coloca um braço em volta da minha cintura e me ajuda com o primeiro passo.
O rosto do médico passa pela minha mente. Estoico. Sem emoção. Cabeça balançando. Um lamento em seus olhos. Derrota em sua postura.
A lembrança de como eu queria fechar os olhos e desaparecer para sempre. As palavras “sinto muito” saindo de seus lábios.
Não. Não. Não. Não consigo ouvir essas palavras novamente. Não consigo ouvir alguém me dizendo que perdi Colton, especialmente quando acabamos de nos encontrar.
Eu fico de cabeça baixa. Conto os ladrilhos no chão enquanto Becks me leva para a sala de espera. Acho que ele está falando comigo. Ou com uma enfermeira? Não tenho certeza porque não consigo me concentrar em nada além do esforço para afastar as memórias. Afastar o desespero para que talvez apenas uma lasca de esperança possa abrir caminho e ocupar o lugar vago.
Sento em uma cadeira ao lado de Beckett e olho entorpecida para o celular vibrando constantemente na minha mão. Há mensagens e ligações intermináveis de Haddie, que eu nem consigo pensar em responder, mesmo sabendo que ela está doente de preocupação. É muito esforço agora, é muito tudo.
Ouço o ranger de sapatos no linóleo enquanto outros se enfileiram atrás de nós, mas me concentro no livro infantil sobre a mesa à minha frente. O Espetacular Homem-Aranha. Eu me distraio, foco em meus pensamentos. Colton estava com medo? Ele sabia o que estava acontecendo? Ele recitou a frase que havia ensinado para o Zander?
Esse pensamento me parte ao meio, mas ainda assim as lágrimas não vêm.
Vejo sapatos cirúrgicos pela visão periférica. Ouço Beckett sendo abordado.
— O especialista precisa saber exatamente como o impacto foi causado para que possamos conhecer melhor as circunstâncias. Tentamos pegar o replay, mas a ABC parou de transmiti-lo. — Não, não, não. Palavras gritam e ecoam na minha cabeça, e ainda assim o silêncio me sufoca. — Disseram que você provavelmente saberia.
Beckett se mexe ao meu lado. Sua voz está tão cheia de emoção quando começa a falar, que eu enterro meus dedos nas coxas. Ele limpa a garganta.
— Ele bateu na cerca de proteção invertida… eu acho. Estou tentando visualizar. Espera. — Ele coloca a cabeça nas mãos, esfrega os dedos na têmpora e suspira enquanto tenta organizar os pensamentos. — Sim. O carro estava de cabeça para baixo. O spoiler atingiu o topo da cerca de proteção com o nariz mais próximo do solo. O meio contra a barreira de concreto. O carro se desintegrou em torno da cápsula.
O resfolegar coletivo de milhares de pessoas em resposta ainda ressoa nos meus ouvidos.
— Há algo que você possa nos dizer? — Beckett pergunta à enfermeira. O ruído inconfundível de metal cedendo à força.
— Agora, não. Ainda estamos nos estágios iniciais e tentando avaliar tudo…
— Ele vai…?
— Daremos uma atualização assim que pudermos.
O cheiro de borracha queimada no asfalto cheio de óleo.
Os sapatos rangem novamente. Pessoas murmuram palavras. Beckett suspira e esfrega o rosto antes de seus dedos trêmulos pegarem minha mão agarrada na perna e a apertarem.
Um pneu solitário rolando pela grama e quicando contra a barreira do campo interno.
Por favor, apenas me dê um sinal, eu imploro em silêncio. Alguma coisa. Qualquer coisa. Uma coisinha que me permita me agarrar à esperança que escorre pelos meus dedos.
Os celulares tocando ecoam nas paredes estéreis da sala de espera. De novo, e de novo. Como os bipes das máquinas de suporte à vida que se infiltram na sala de espera. Cada vez que alguém fica em silêncio, uma pequena parte de mim também silencia.
Eu ouço o engate da respiração de Becks um momento antes de ele emitir um soluço estrangulado que me atinge como um furacão, rasgando o saco de papel onde tenho preservado minha determinação e fé. Por mais que ele tente afastar as lágrimas que ameaçam cair, não consegue. A dor surge e transforma seu rosto, e me mata que o homem que tem sido minha fortaleza agora esteja desmoronando. Eu aperto os olhos e me forço a ficar forte por Beckett, mas tudo que continuo ouvindo são suas palavras para mim na noite passada.
Eu balanço a cabeça em descrença e pânico.
— Me desculpa — sussurro. — Me desculpa, por favor. Isso é tudo minha culpa.
Beckett abaixa a cabeça momentaneamente antes de enxugar os olhos com as palmas das mãos. E o gesto — afastar as lágrimas como uma criança faz quando fica envergonhada — machuca ainda mais meu coração.
Eu não posso evitar o pânico que surge quando percebo que sou a razão de Colton estar aqui. Eu o afastei e não acreditei nele — o deixei
cansado na noite anterior a uma corrida —, e tudo porque eu fui teimosa e estava assustada.
— Eu sou responsável pelo que aconteceu com ele. — As palavras me matam. Rasgam minha alma.
Beckett ergue os olhos avermelhados.
— Do que você está falando? — Ele se aproxima, os olhos azuis em conflito procurando os meus.
— Tudo… — Minha respiração falha, e eu paro. — Eu enchi o saco dele nos últimos dois dias, e você me disse que se eu fizesse isso, a culpa seria minha…
— Ryl…
— E eu briguei com ele e o deixei, e ficamos acordados até tarde, e eu o fiz entrar naquele carro mesmo estando cansado e…
— Rylee! — ele finalmente consegue dizer, com um tom áspero. Eu apenas continuo balançando a cabeça para ele, olhos ardendo, emoções me afogando. — Isso não é culpa sua.
Eu estremeço quando Beckett coloca os braços ao meu redor e me puxa para perto. Eu coloco minhas mãos na frente de seu uniforme resistente a fogo, a rigidez do tecido áspero contra minha bochecha.
— Foi um acidente. Ele perdeu o controle. Isso é corrida. Não é sua culpa. — Sua voz falha. Seus braços ainda estão ao meu redor, me prendendo, e eu sinto a claustrofobia ameaçando surgir. Sinto as garras de asfixia. Eu me levanto abruptamente, precisando me movimentar para liberar o desconforto que varre minha alma. Eu ando até o outro lado da sala de espera e volto. Na minha segunda volta, o garotinho na cadeira do canto se levanta para pegar um giz de cera. As luzes em seus sapatos piscam em vermelho e chamam minha atenção. Estreito os olhos para ver mais de perto, para observar o triângulo invertido com o S no centro.
Super-Homem.
O nome atravessa meu inconsciente, mas minha atenção é atraída para a televisão quando alguém muda de canal. Eu ouço o nome de Colton e respiro fundo, com medo de olhar, mas querendo ver o que estão transmitindo.
Parece que toda a sala se endireita e se mexe ao mesmo tempo. Há uma massa de uniformes vermelhos, rostos tensos, emocionados e focados na tela.
O locutor diz que houve um acidente que interrompeu a corrida há mais de uma hora. Surge a imagem da nuvem de fumaça e carros se afastando uns
dos outros. O ângulo é diferente do nosso na pista e podemos ver melhor, mas quando o carro de Colton entra na curva, a transmissão corta a filmagem. Todos os ombros ao redor da televisão caem quando a equipe percebe que o que eles estavam esperando ansiosamente não será mostrado. O trecho termina com o locutor dizendo que ele está sendo tratado no Bayfront.
Eu vejo o corpo sem vida de Colton na maca, Max está ao meu lado em seu assento. As semelhanças da situação me tiram o fôlego, uma dor sem fim. Memórias colidindo.
Eu me viro para ver a família Westin entrar na sala de espera. A mãe régia e dominante de Colton parece pálida e perturbada. Eu engulo o nó na garganta, incapaz de tirar os olhos deles. Andy a apoia gentilmente, guiando-a para se sentar enquanto Quinlan segura sua outra mão.
Beckett vai para perto deles em um pulo, com os braços em volta de Dorothea e depois em Quinlan, trocando abraços rápidos, mas significativos. Andy estende a mão e agarra Beckett em um abraço mais longo, cheio de um desespero de partir o coração. Eu ouço um soluço sufocado e quase desmorono.
Observar toda a cena se desenrolar faz com que memórias do funeral de Max passem pela minha cabeça. Um caixão rosa em miniatura colocado em cima de um caixão preto de tamanho normal, ambos cobertos com rosas vermelhas, me lembram as palavras que não consigo ouvir de novo: do pó viemos, ao pó voltaremos. Isso me faz lembrar dos abraços vazios que não nos confortam de modo algum. Os que te deixam vazio, já que você perdeu tudo o que tinha.
Volto a caminhar em meio aos murmúrios abafados de “quando alguém vai dar alguma uma notícia?” Rostos geralmente tão fortes e enérgicos estão marcados com linhas de preocupação. E quando meus pés param, estou olhando nos olhos de Andy e Dorothea.
Nós apenas nos encaramos, encaramos o reflexo da descrença e angústia uma na outra, até que Dorothea estende a mão trêmula para a minha.
— Eu não sei o… Eu sinto muito… — Eu balanço a cabeça enquanto as palavras me escapam.
— Nós sabemos, querida — diz ela enquanto me puxa para os seus braços e me abraça, uma se agarrando na outra. — Nós sabemos.
— Ele é forte — é tudo o que Andy diz enquanto a mão sobe e desce nas minhas costas, numa tentativa de me confortar. Mas isso, abraçar seus
pais, todos nós confortando uns aos outros, as bochechas úmidas de lágrimas e os soluços abafados, torna tudo muito real. Minha esperança de que tudo isso seja um pesadelo muito ruim agora está estilhaçada.
Eu cambaleio para trás e tento me concentrar em algo, qualquer coisa que me faça sentir como se não estivesse perdendo o controle. Mas continuo vendo o rosto de Colton. O olhar de certeza inquestionável enquanto ele estava no meio de todo o caos de sua equipe — a mesma equipe que se senta ao meu redor, cabeça nas mãos, lábios apertados, olhos fechados em oração — e admitiu seus sentimentos por mim. Eu preciso tentar recuperar o fôlego, a dor irradiando pelo peito, no coração, simplesmente não para.
A televisão me atrai de novo. Algo sussurra em minha mente, e eu me viro para olhar. Trailer do novo filme do Batman. A esperança desperta quando vasculho as profundezas dos meus pensamentos — de tudo que houve na última hora.
O livro do Homem-Aranha sobre a mesa. Os sapatos do Super-Homem. O filme do Batman. Eu tento botar na cabeça que tudo isso é apenas uma coincidência — que ver três dos quatro super-heróis é uma ocorrência aleatória. Eu tento dizer a mim mesma que preciso do quarto para acreditar. Que eu preciso do Homem de Ferro para completar o ciclo — para que seja o sinal de que Colton vai sobreviver.
Que ele vai voltar para mim.
Eu começo a procurar, olhos voando ao redor da sala de espera enquanto a esperança se aproxima e se prepara para florescer, caso eu consiga encontrar o sinal que falta. Minhas mãos tremem; meu otimismo está lá, querendo surgir, mas cauteloso.
Há um som em direção ao corredor, e o barulho — a voz — faz com que o pavio de cada emoção que pulsa através de mim se acenda.
E estou imediatamente pronta para detonar.
Cabelo loiro e pernas longas passam pela porta, e eu não me importo que seu rosto pareça tão devastado e preocupado quanto eu neste momento.
Toda a minha mágoa, toda a minha angústia se eleva, e é como um elástico se rompendo.
Ou um relâmpago.
Estou do outro lado da sala em segundos, cabeças se virando quando escutam o rosnado que deixo sair quando desperto do torpor cheia de fúria.
— Sai daqui! — eu grito, tantas emoções correndo por mim, que tudo o que sinto é uma massa de confusão avassaladora. A cabeça de Tawny se ergue, e seus olhos assustados encontram os meus, seus lábios pintados abertos em forma de um O perfeito. — Sua pir…
O ar é arrancado de mim quando os braços fortes de Beckett me agarram por trás e me puxam de volta para seu peito.
— Me solta! — Eu luto com ele enquanto o aperto se torna mais duro.
— Me solta!
— Para com isso, Ry! — ele retruca enquanto me contém, seu tom calmo, porém firme, atingindo meus ouvidos. — Você precisa economizar toda essa energia, porque Colton vai precisar de você. Cada parte disso, droga! — Suas palavras me atingem, penetram em minhas feridas e esgotam minha adrenalina. Eu paro de lutar, seu aperto em volta de mim ainda rígido, e o calor de sua respiração ofegante atingindo minha bochecha. — Ela não vale a pena, ok?
Não consigo dizer nada — não acho que sou capaz de ser coerente neste momento —, então apenas balanço a cabeça, me forçando a me concentrar em um ponto no chão à minha frente, em vez de me atentar às pernas longas à direita.
— Tem certeza? — ele confirma antes de me soltar lentamente e parar na minha frente, me forçando a olhar em seus olhos, para ver se vou ser fiel à minha palavra.
Meu corpo começa a tremer, cativo à mistura de raiva, tristeza e medo do desconhecido que corre em mim.
A respiração fica travada na minha garganta, e meus pulmões doem. É o único indício da turbulência que sinto por dentro quando vejo nos olhos de Beckett a gentileza salpicada de preocupação. E eu me sinto péssima porque ele está tentando cuidar de mim, mesmo amando Colton, tentando lidar com tudo que está acontecendo. Eu me forço a assentir. Ele imita meu gesto antes de se virar, o corpo bloqueando Tawny das minhas vistas.
— Becks… — ela fala, suspirando, e sua voz me irrita.
— Nem uma merda de palavra, Tawny! — A voz de Beckett é baixa e cautelosa, audível apenas para nós três, apesar dos numerosos pares de olhos observando o confronto. Vejo Andy se levantar do outro lado da sala enquanto tenta descobrir o que está acontecendo. — Eu vou te deixar ficar por uma razão, e apenas uma… Wood vai precisar de todos os amigos por
perto… se ele… — diz, engasgando com as palavras. — Quando ele sair disso… E isso inclui você, mesmo que, depois do que você fez, te chamar de amiga talvez seja um termo muito forte.
As palavras de Becks me pegam de surpresa. Eu ouço o som evasivo que ela faz antes de um silêncio momentâneo surgir… E então eu a ouço começar a chorar. Silenciosos gemidos tristes que partem meu controle de um jeito que nem a voz de Beckett conseguiria.
E eu surto. Minha promessa de que economizaria minhas forças some.
— Não! — eu grito, tentando tirar Beckett do caminho e dar a volta. — Você não pode chorar por ele! Você não pode chorar pelo homem que tentou manipular! — Braços se fecham em volta de mim, por trás, me impedindo de dar o soco que desejo, mas não me importo, já perdi o senso de realidade. — Sai daqui! — eu grito, a voz vacilando enquanto sou arrastada para longe de seu rosto atordoado. — Não! — Eu luto contra os braços restritivos. — Me solta!
— Sh-shh-shh! — É a voz de Andy, são os braços de Andy que estão me segurando firme, tentando me acalmar e me controlar ao mesmo tempo.
E a única coisa em que posso me concentrar — a única em que consigo me agarrar enquanto meu coração dispara e meu corpo treme de raiva — é que preciso de um pit stop. Eu preciso encontrar Colton. Preciso tocá-lo, vê-lo, acalmar o tumulto em minha alma.
Mas não posso.
Ele está em algum lugar por perto, meu rebelde incapaz de deixar o garotinho danificado que há dentro de si ir embora. O homem que acabou de começar a se curar agora está destruído, e me mata não poder consertá-lo. Me mata que minhas palavras murmuradas de encorajamento e paciência não serão capazes de reparar o corpo imóvel que foi carregado naquela maca e trazido para algum lugar dentro dessas paredes — tão perto, mas tão longe de mim. Que ele precise confiar em estranhos para consertá-lo e curá-lo. Estranhos que não têm ideia do tecido cicatricial invisível que ainda permanece sob a superfície.
Mais mãos se estendem para me tocar e me acalmar, as de Dorothea e Quinlan, mas elas não são as que eu quero. Eles não são de Colton.
E então um pensamento aterrorizante me atinge. Toda vez que Colton está perto, posso sentir aquele formigamento — o zumbido que me diz que ele está ao meu alcance —, mas agora não consigo sentir nada. Eu sei que ele está fisicamente perto, mas sua centelha é inexistente.
Seja minha centelha, Ry. Eu posso ouvir sua voz falando isso, posso sentir a lembrança de sua respiração sobre minha pele… mas não posso senti-lo. — Eu não consigo! — eu grito. — Eu não consigo ser sua centelha se não posso sentir a sua, então não se atreva a se extinguir. — Eu não me importo que eu esteja em uma sala cheia de pessoas, sendo virada e cercada pelos braços de Dorothea, porque a única pessoa que desejo que me ouça não pode me ouvir. E saber disso faz com que o desespero consuma cada parte de mim que ainda não esteja congelada de medo. Eu levo as mãos às costas de Dorothea, agarrando-me a ela enquanto eu imploro a seu filho. — Não se atreva a morrer, Colton! Eu preciso de você, droga! — eu grito em meio ao silêncio agora estéril da sala de espera. — Eu preciso tanto de você, que estou morrendo aqui sem você! — Minha voz acelera como meu coração, e por mais que os braços de Dorothea, os murmúrios abafados de Quinlan e a determinação silenciosa de Andy ajudem, eu não consigo lidar com tudo. Eu me afasto e olho para eles antes de tropeçar cegamente pelo corredor. Eu sei que estou enlouquecendo. Estou tão entorpecida, tão vazia, que nem tenho energia para discutir com Beckett e reacender o ódio que sinto por Tawny. Se eu sou culpada por Colton estar aqui, então com certeza ela precisa assumir um pouco da porra dessa culpa também.
Viro a esquina para ir em direção ao banheiro, preciso me esforçar para me movimentar. Eu apoio as mãos contra a parede, caso contrário vou desmoronar. Eu me lembro de respirar, digo a mim mesma para colocar um pé na frente do outro, mas é quase impossível quando o único pensamento em que minha mente consegue se concentrar é aquele em que o homem que eu amo está lutando por sua vida, e eu não posso fazer porra nenhuma a respeito disso. Estou sem esperança e impotente.
Eu estou morrendo por dentro.
Minhas mãos encostam no batente da porta, e eu cambaleio entre a porta e a cabine mais próxima, dando boas-vindas ao silêncio reconfortante do banheiro vazio. Eu desabotoo meu short, e quando começo a descer a peça pelos quadris, meus olhos avistam a estampa xadrez na minha calcinha. Meu corpo quer desistir, quer deslizar para o chão e afundar no esquecimento, mas eu, não. Em vez disso, minhas mãos agarram os passantes do short ainda em meus quadris. Não consigo recuperar o fôlego rápido o suficiente. Começo a hiperventilar e ficar tonta, então apoio as mãos na parede, mas nada ajuda quando o ataque de pânico me atinge com força total.
Você pode apostar sua bunda que essa é uma bandeira quadriculada que vou pegar.
Dou boas-vindas à memória de sua voz. Eu deixo seu estrondo circular por mim como se fosse a cola que preciso para unir as partes do meu eu quebrado. Minha respiração se arrasta entre os lábios enquanto tento manter viva a memória — aquele sorriso incrível e a travessura de menino em seus olhos — de antes de ele me beijar uma última vez. Levo meus dedos aos lábios querendo fazer uma conexão com ele, o medo do desconhecido pesando em meu coração.
— Rylee? — A voz me traz de volta, e eu só quero que ela vá embora. Eu quero ser reparada com a memória do calor de sua pele, com o gosto de seu beijo, com posse em seu toque. — Rylee?
Há uma batida na porta da cabine.
— Mmm-hmm? — é tudo o que consigo dizer, porque minha respiração ainda está irregular.
— É Quin. — Sua voz é suave e irregular, e me mata ouvir o quanto quebrada está. — Ry, por favor, saia…
Eu me aproximo e destranco a porta, e ela abre, olhando para mim de uma forma estranha; seu rosto úmido de lágrimas e manchado de rímel apenas enfatizando a devastação em seus olhos. Ela franze os lábios e começa a rir, de um jeito quase histérico, então quando o som ecoa nas paredes de azulejo ao nosso redor, tudo o que ouço é desespero e medo. Ela aponta para meu short meio descido e a calcinha xadrez e continua rindo, as lágrimas marcando suas bochechas em um estranho contraste com o som vindo de sua boca.
Eu começo a rir com ela. É a única coisa que posso fazer. As lágrimas não virão, o medo não diminuirá, e a esperança começa a sumir quando a primeira risada sai dos meus lábios. Parece tão errado. Tudo está tão errado, e em um instante, Quinlan — a mulher que me odiou à primeira vista — estende a mão e passa seus braços em volta de mim, enquanto sua risada se transforma em soluços. Soluços dilacerantes de medo irrestrito. Seu corpo minúsculo treme enquanto a angústia se intensifica.
— Estou com tanto medo, Rylee. — É a única coisa que consegue dizer entre um resfolegar e outro, mas não precisa dizer mais nada, porque é exatamente como me sinto. A derrota em sua postura, a firmeza de sua dor e a força em seu abraço refletem o medo que não sou capaz de expressar;
então me agarro a ela com tudo o que tenho — precisando dessa conexão mais do que qualquer outra coisa.
Eu a abraço e a acalmo o melhor que posso, tentando entrar no papel de conselheira paciente que conheço tão bem. É muito mais fácil aplacar o desespero de outra pessoa do que enfrentar o meu. Ela tenta se afastar, mas eu simplesmente não consigo soltar. Não consigo passar pelas portas e esperar que o médico dê as notícias que tenho medo de ouvir.
Eu fecho meu short e olho para cima, vendo meu reflexo no espelho. Eu posso ver as memórias assustadoras refletidas em meus olhos. Minha atenção se direciona para um espelho retrovisor quebrado, o sol refletindo em suas bordas irregulares salpicadas de sangue, enquanto Max engasga ao dar seu último suspiro. E então minha mente se agarra a uma memória mais feliz com outro espelho. Um usado no calor da paixão para demonstrar por que sou suficiente para Colton. Por que ele me escolheu.
— Vamos — ela sussurra, quebrando meu transe enquanto me solta, mas envolvendo em seguida minha cintura com a mão. — Não quero perder nenhuma novidade.
CAPÍTULO 2
Otempo passa. Cada minuto parece uma hora. E cada uma das três horas que se passaram parece uma eternidade. Cada movimento das portas nos assusta e depois nos faz sentar de volta. Copos descartáveis vazios enchem a lixeira. Os trajes à prova de fogo estão amarrados na cintura, e a sala de espera fica mais abafada. Os celulares tocam incessantemente com pessoas em busca de notícias. Mas ainda não há novidades.
Beckett senta-se com Andy. Quinlan está ao lado de Dorothea, Tawny, do outro. A sala de espera está cheia de murmúrios abafados, e a televisão é um pano de fundo para os meus pensamentos. Sento-me sozinha, e exceto pelas mensagens constantes de Haddie, acolho a solidão para não ter de confortar ninguém ou ser confortada — a esquizofrenia em minha mente só fica mais alta a cada segundo que passa.
Meu estômago revira. Estou com fome, mas pensar em comida me dá náusea. A cabeça lateja, mas dou boas-vindas à dor, dou boas-vindas às suas batidas, que eu conto enquanto tento acelerar o tempo. Ou diminuir — o que for melhor para Colton.
O bipe eletrônico da porta. O rangido dos sapatos. Eu nem abro os olhos dessa vez.
— Tenho notícias do sr. Donavan. — A voz me sacode. Pés se arrastam enquanto os caras se levantam, uma ansiedade discreta zumbe pela sala em antecipação ao que vai ser dito.
O medo toma conta de mim. Eu não consigo me levantar. Não consigo me mover. Estou tão petrificada com as palavras que vão passar por seus lábios, que tento engolir em seco, mas permaneço paralisada de apreensão.
Aperto as mãos contra a pele nua de minhas coxas, tentando usar a dor para afastar as memórias. Desejando que o passado não se repita — que eu não troque um carro destruído com um homem que eu amo dentro por outro.
Ele limpa a garganta, e eu respiro — rezando, esperando, precisando de algum tipo de sucata para segurar.
— Só posso adiantar que os exames ainda estão em andamento neste momento, mas pelo que podemos ver provisoriamente, é óbvio que o sr. Donavan sofreu uma lesão pela desaceleração repentina, com ruptura de órgãos internos devido à intensidade com que atingiu a cerca. A lesão ocorre porque o corpo é freado à força, mas os órgãos permanecem em movimento devido à inércia. Pelo que sabemos…
— Na minha língua, por favor — sussurro. Minha mente tenta compreender o jargão médico, sabendo que se eu não estivesse nadando nessa névoa de incerteza, seria capaz de processar tudo o que ele diz. Ele para de falar ao ouvir meu comentário, e mesmo que eu não consiga erguer os olhos, digo mais alto desta vez. — Na minha língua, por favor, doutor. — O medo me domina. Eu cautelosamente ergo a cabeça para encontrar os olhos dele, a equipe se virando para me olhar enquanto encaro o médico. — Estamos todos muito preocupados, e embora você compreenda o que está dizendo, a terminologia está nos assustando… — Minha voz desaparece, e ele assente gentilmente. — Nossas mentes estão sobrecarregadas demais para processar isso agora… Foi uma longa espera enquanto você estava com ele… Então você pode nos contar em termos mais simples?
Ele sorri gentilmente para mim, mas seus olhos mostram a seriedade da situação.
— Quando Colton bateu na parede, o carro parou, seu corpo parou, mas seu cérebro continuou em movimento, batendo no crânio que o cercava. Felizmente, ele estava usando um dispositivo HANS que ajudou a proteger o ponto entre a coluna e o pescoço, mas a lesão que sofreu é grave mesmo assim. Meu coração dispara, e minha respiração se esforça enquanto um milhão de possibilidades diferentes passam pela minha mente.
— Ele vai…? — Andy aparece na minha frente e faz a pergunta, mas não consegue completar. O silêncio recai sobre a sala, e os movimentos nervosos dos pés param enquanto todos esperamos pela resposta com a respiração presa.
— Senhor Westin, eu presumo? — o médico pergunta e estende a mão para Andy, que assente. — Eu sou o doutor Irons. Não vou mentir para você… o coração do seu filho falhou, parou duas vezes durante o transporte. Sinto como se minha alma tivesse caído no fundo do poço com essas palavras. Não me deixe. Por favor, não me deixe. Eu imploro silenciosamente, desejando que as palavras o atinjam em algum lugar dentro dos limites deste hospital. Andy estende a mão e aperta a mão de Dorothea.
— Conseguimos regularizar seus batimentos depois de um tempo, o que é um bom sinal, pois temíamos que a aorta tivesse se rasgado com a força do impacto. Neste momento, sabemos que ele tem um hematoma subdural. — O médico me olha antes de continuar. — Isso significa que os vasos sanguíneos se romperam, e a área entre o cérebro e o crânio está se enchendo de sangue. A situação é complicada, porque o cérebro de Colton está inchando pelo trauma. Ao mesmo tempo, o sangue acumulado está pressionando o cérebro, porque não há para onde escapar para aliviar a pressão. — Dr. Irons olha para as pessoas ao seu redor. — Neste momento, ele está estável, então estamos preparando-o para a cirurgia. É primordial que aliviemos a pressão em seu cérebro para tentar parar o inchaço.
Eu vejo Dorothea estender a mão e se agarrar a Andy em busca de apoio, e o óbvio amor incondicional pelo filho atiça todas as minhas emoções.
— Quanto tempo dura a cirurgia? Ele está consciente? Houve outros ferimentos? — Beckett fala pela primeira vez, disparando rapidamente as perguntas que todos estamos pensando.
Dr. Irons engole em seco e une as mãos enquanto encontra os olhos de Beckett.
— Quanto a outras lesões, são pequenas em comparação com a lesão na cabeça. Ele não está consciente e não recuperou a consciência até agora. Ele estava no estado comatoso típico que vemos nesses ferimentos: murmurando incoerentemente, lutando contra nós, em ataques muito esporádicos. Quanto a todo o resto, saberemos mais quando estivermos no centro cirúrgico, lá poderemos ver quão ruim é o sangramento no cérebro.
Beckett solta a respiração que estava segurando, e eu posso ver seus ombros murchando, embora eu não tenha certeza se de alívio ou resignação. Nenhuma das palavras do médico fez com que o medo que pesava no fundo da minha alma diminuísse. Quinlan dá um passo à frente e pega a mão de Becks, olhando para seus pais antes de perguntar a única coisa que todos tememos.
— Se o inchaço não diminuir com a cirurgia… — Sua voz vacila, Beckett dá um beijo fraternal em sua cabeça, como forma de encorajamento.
— O que… isso significa? O que quero saber é, se você está falando de lesão cerebral, qual é o prognóstico? — Sua respiração fica presa por um soluço contido. — Quais são as chances de Colton?
O médico suspira alto e olha para Quinlan.
— Neste momento, antes de ir para a cirurgia e ver se há algum dano, não me sinto confortável em fazer um prognóstico. — O suspiro estrangulado que vem de Andy quebra o silêncio. Dr. Irons dá um passo à frente e coloca a mão em seu ombro, até que Andy ergue o rosto e encontra seus olhos.
— Estamos fazendo absolutamente tudo o que podemos. Temos muita prática nesse tipo de situação e estamos dando ao seu filho tudo que aprendemos ao longo dos anos. Por favor, entenda que eu não deixo de dar informações porque se trata de uma causa perdida, mas sim porque preciso descobrir mais para saber o que estamos enfrentando. Assim que eu souber, poderemos estabelecer um plano de ação. — Andy acena sutilmente para ele, esfregando a mão sobre os olhos, e o Dr. Irons olha para cima e examina os rostos de todos na sala. — Ele é forte e saudável, e é sempre bom ter isso a nosso favor. É mais do que óbvio que Colton é amado por muitas pessoas… Por favor, saiba que eu carrego comigo esse fato para a sala de cirurgia. — Com isso, ele dá um sorriso contido, então se vira e sai da sala.
Após sua partida, ninguém se mexe. Ainda estamos todos em choque. Todos ainda deixando a severidade de suas palavras escorrer pelas feridas abertas. As pessoas lentamente começam a se movimentar à medida que os pensamentos se fundem e as emoções tentam se estabelecer. Mas não consigo.
Ele está vivo. Não morto como Max. Vivo.
A dor surda de alívio que sinto não é nada comparada à pontada afiada do desconhecido. E não é suficiente para aplacar o medo assentado nas profundezas da minha alma. Começo a sentir as garras da claustrofobia queimando sob minha pele. Eu solto um longo suspiro, tentando diminuir o suor que escorre no meu lábio superior e o que desce por minhas costas.
A respiração escapa dos meus pulmões sem ter reabastecido meu corpo.
As imagens surgem novamente. De Max para Colton. De Colton para Max. Sangue escorrendo lentamente de sua orelha. Nos cantos de sua boca. Manchando o carro despedaçado. Meu nome estrangulado em seus lábios.
Suas súplicas marcando minha mente. Gravadas como uma marca que me assombrará para sempre.
A pitada de desconforto se transforma em uma tempestade de pânico. Eu preciso de ar fresco. Eu preciso de uma pausa dessa opressão que sufoca esta maldita sala de espera. Eu preciso de cor e vibração — algo cheio de vigor e vida, como Colton — algo para além dos tons monocromáticos e das memórias avassaladoras.
Eu me levanto e quase corro para fora da sala de espera, ignorando o chamado de Beckett atrás de mim. Eu cambaleio cegamente em direção à saída, porque desta vez o barulho das portas me convoca, oferece uma trégua da histeria que suga minha esperança.
Você me faz sentir, Rylee…
Eu tropeço pelas portas, a memória atravessa minha alma, mas me atinge como um soco no abdômen. Eu suspiro alto, dor irradiando por todas as sinapses. Eu respiro de forma irregular, precisando de algo, qualquer coisa que ajude a recuperar a fé necessária para enfrentar a realidade de que Colton pode não sobreviver à cirurgia. À noite. À manhã.
Eu sacudo a cabeça para me livrar do veneno que está devorando meus pensamentos, quando viro a esquina do prédio e sou jogada em um redemoinho. Eu juro que há mais de cem flashes de câmeras piscando de uma vez. O rugido das perguntas é tão alto, que sou atingida por uma onda de barulho. Estou imediatamente cercada, minhas costas pressionadas contra a parede enquanto microfones e câmeras são enfiados no meu rosto, registrando minha tentativa de manter o controle da realidade.
— É verdade que Colton está em seus momentos finais?
Palavras ficam presas na minha garganta.
— O que está acontecendo entre você e o sr. Donavan?
A raiva se intensifica, mas estou sobrecarregada pelo dilúvio.
— É verdade que Colton está em seu leito de morte e os pais estão ao seu lado?
Meus lábios se abrem e se fecham, minhas mãos se contraem em punhos, os olhos queimam, a alma chora, e minha fé na humanidade desmorona. Eu pareço um cervo no meio de uma estrada, sem conseguir desviar dos faróis se aproximando, mas na verdade estou presa aqui. Se eu achava que tinha sentido as garras da claustrofobia lá dentro, agora sinto o aperto na traqueia quando as mãos da mídia me sufocam e tiram meu ar. Minha respiração vem em ondas curtas e afiadas. O céu azul gira enquanto minha
mente o distorce em um redemoinho preguiçoso, e a escuridão começa a se infiltrar enquanto minha consciência desaparece.
Assim que estou prestes a mergulhar na escuridão acolhedora, braços fortes me envolvem e impedem minha queda. Meu corpo se choca contra o de Sammy como um trem de carga, e as lembranças da última vez em que caí nos braços de um homem voltam à mente. Imagens agridoces de placas de leilão perdidas e portas de armário emperradas tremeluzem. Olhos verdes vibrantes e um sorriso arrogante e confiante. Perigoso. Rebelde. Imprudente.
A voz de Sammy atravessa minha mente nublada enquanto ele dá bronca na imprensa.
— Saia de perto! — ele resmunga enquanto sustenta meu peso morto com o braço em volta da minha cintura. — Daremos notícias quando houver alguma. — Flashes reacendem no céu.
Novamente o barulho de portas, mas desta vez eu não me encolho. A fera do lado de dentro é muito mais palatável do que a do lado de fora. Minha respiração começa a ficar uniforme, e meu coração desacelera. Sou empurrada para sentar em uma cadeira, e quando olho para cima, os olhos de Sammy encontram os meus, procurando por algo.
— O que diabos você acha que estava fazendo? Eles podiam ter comido você viva — ele reclama. É uma demonstração tão flagrante de emoção do guarda-costas estoico, que percebo meu erro. Ainda estou me acostumando com a vida muito pública de Colton, então me sinto horrível porque, enquanto estou na sala de espera cercada por todos, percebo que Sammy esteve aqui sozinho, certificando-se de que estivéssemos sozinhos e imperturbáveis.
— Desculpe, Sammy — eu peço em um fôlego só. — Eu só precisava de um pouco de ar e… Me desculpe.
A preocupação surge em seus olhos.
— Você está bem? Você comeu alguma coisa? Você quase desmaiou. Acho que você precisa comer algo…
— Estou bem. Obrigada — eu digo e me levanto lentamente. Acho que o surpreendo quando estendo a mão e o cumprimento. — Como você está?
Ele dá de ombros com indiferença, embora o gesto mostre tudo menos isso.
— Contanto que ele esteja bem, vou ficar bem.
Ele balança a cabeça para mim e se vira para recuperar seu posto nas portas do hospital antes que eu possa dizer qualquer outra coisa. Meus olhos
acompanham seus movimentos por um momento, os comentários insensíveis da imprensa reverberando em minha mente, enquanto crio coragem para voltar para a sala de espera.
Fecho os olhos e me forço a sentir outra coisa além do entorpecimento que consome minha alma. Eu tento puxar das profundezas do desespero o som de sua risada, o gosto de seu beijo, até mesmo sua natureza teimosa e sua determinação — qualquer coisa que reforce as costuras do meu coração cerzidas pelo amor de Colton.
“Não significa nada? Isso jamais diria respeito a você, Rylee.”
A memória sussurra em minha mente, e é como se pequenos lampejos de esperança ganhassem vida. Respiro fundo e me forço a avançar pelo longo corredor até onde todos os outros esperam impacientemente. Estou passando pelo posto de enfermagem quando ouço o nome de Colton mencionado por duas enfermeiras de costas para mim. Diminuo o passo, tentando pegar qualquer informação. Eu tento forçar a mente a não perder tempo pensando que estamos sendo enganados sobre a gravidade da situação, e de repente ouço as palavras que roubam o ar dos meus pulmões.
Fazem meu coração parar.
Fazem com que um arrepio ricocheteie pelo meu corpo.
— Quem está na sala de operações 1 com o sr. Donavan?
— Dr. Irons é o líder do caso.
— Bem, caramba, se tem alguém que eu gostaria que me operasse nessas circunstâncias com certeza seria o Homem de Ferro.
Homem-Aranha.
Eu suspiro, as enfermeiras se voltam e me notam. A mais alta das duas dá um passo à frente e inclina a cabeça para mim.
— Posso te ajudar em algo, senhorita?
Batman.
— Do que você acabou de chamar o dr. Irons?
Super-Homem.
Ela olha para mim, uma ligeira ruga em sua testa.
— Você se refere ao apelido do dr. Irons?
Homem de Ferro.
Tudo o que consigo fazer é balançar a cabeça, porque a garganta foi bloqueada pela esperança que sinto.
— Ah, ele é conhecido como Homem de Ferro. Você precisa de algo?
Homem-Aranha. Batman. Super-Homem. Homem de Ferro.
Eu apenas balanço a cabeça novamente, então dou os três passos em direção à sala de espera, mas tombo contra a parede e deslizo para o chão, sobrecarregada de esperança, dominada pela presença dos amados super-heróis de Colton.
Uma obsessão infantil agora se transformou na esperança de um adulto. Eu descanso o rosto nos joelhos dobrados enquanto me agarro à noção de que essa coincidência é mais do que apenas isso — uma coincidência. Balanço a cabeça para frente e para trás, seus nomes saindo dos meus lábios em um cântico abafado que eu sei que, pela primeira vez, foi pronunciado com absoluta reverência.
— Colton costumava dizer isso dormindo quando era um garotinho.
— A voz de Andy me assusta quando ele encosta na parede ao meu lado, soltando uma respiração pesada. Eu me mexo um pouco para o olhar. Ele parece ter envelhecido anos desde que a corrida começou esta manhã. Seus olhos guardam uma tristeza silenciosa, e sua boca tenta se erguer em um sorriso suave, mas falha miseravelmente. O homem que eu só conhecia como alguém cheio de vida perdeu sua exuberância. — Eu não ouço isso há muito tempo. Na verdade, tinha esquecido até ouvir você dizer.
Ele ri baixinho, estende a mão e dá um tapinha no meu joelho enquanto estica as pernas.
— Andy… — Seu nome é um murmúrio em meus lábios enquanto o vejo lutar contra a emoção. Eu quero desesperadamente contar a ele sobre os sinais, a ocorrência aleatória dos super-heróis amados de seu filho, mas me preocupo que ele pense que estou perdendo a noção da realidade, assim como, eu receio, Beckett pensa.
Como eu me preocupo que possa estar perdendo.
— Estou surpreso que ele tenha falado sobre eles. Costumava ser um código secreto que ele repetia quando tinha um pesadelo ou estava com medo. Ele nunca contou… nunca explicou por que esses quatro super-heróis eram tão reconfortantes. — Ele olha para mim, o sorriso suave murchando.
— Dottie e eu nos perguntávamos do que ele esperava que aqueles super-heróis o salvassem…
As palavras flutuam entre nós e se agarram nas perguntas que ambos queremos fazer, mas não as dizemos em voz alta. O que Andy sabe que eu não sei, e vice-versa? Ele passa as costas da mão nos olhos e exala um suspiro trêmulo.
— Ele é forte, Andy… Ele vai ser… Ele tem que ficar bem — eu finalmente digo e confio na determinação em minha voz.
Ele apenas concorda com a cabeça. Vemos médicos passando por nós, e meu coração se aloja na garganta, preocupado que seja por causa de Colton. Ele esfrega a mão sobre o rosto e vejo o amor encher seus olhos.
— A primeira vez que o vi, ele partiu meu coração, ganhou tudo de mim com um único olhar. — Eu balanço a cabeça para que ele continue, porque entendo completamente essa afirmação, o filho dele fez a mesma coisa comigo.
Ele capturou meu coração, roubou, quebrou, curou e se tornou seu dono para sempre.
— Eu estava no set, no meu trailer reescrevendo uma cena. Tinha sido uma longa noite. Quin estava doente e virou a noite acordada. — Ele balança a cabeça e encontra meus olhos por um momento antes de olhar para baixo e focar na pulseira de seu relógio. — Eu estava atrasado para uma chamada. Abri a porta e quase tropecei nele. — Ele leva um momento para dissipar as lágrimas que vejo surgindo em seus olhos. — Acho que xinguei em voz alta e vi seu corpinho recuar com um medo inconfundível. Eu só sei que ele me assustou para caralho, e eu nem podia imaginar por que uma criança teria esse tipo de reação. Ele se recusou a olhar para mim, não importa quão gentil eu fosse depois.
Eu pego em sua mão, a apertando para que Andy saiba que conheço os demônios de Colton sem que ele os revele. Posso não saber os detalhes, mas já vi o suficiente para entender a essência.
— Eu sentei no chão ao lado dele e aguardei que entendesse que eu não iria machucá-lo. Eu cantei a única música que consegui pensar. — Ele ri. — Puff the Magic Dragon. Na segunda vez, ele levantou a cabeça e finalmente olhou para mim. Jesus Cristo, fiquei sem fôlego. Ele tinha os maiores olhos verdes que eu já vi em um rostinho pálido, e eles olharam para mim com tanto medo… tanto receio… que me esforcei ao máximo para não o abraçar e o confortar.
— Eu nem consigo imaginar — murmuro, fazendo menção de retirar minha mão, mas parando quando Andy a aperta.
— Ele não quis falar comigo no começo. Tentei de tudo para que ele me dissesse seu nome ou o que estava fazendo, mas não adiantava. Nada me importava, o fato de eu ter perdido o horário, o dinheiro desperdiçado,
nada, porque eu estava hipnotizado pelo garotinho frágil cujos olhos me diziam que tinham visto e experimentado muita coisa em sua curta vida. Quinlan tinha seis anos na época. Colton era menor do que ela, então pensei que ele tinha cerca de cinco anos. Fiquei chocado mais tarde, naquela noite, quando a polícia me disse que ele tinha oito anos.
Eu me forço a engolir o nó preso na garganta enquanto ouço sobre os primeiros momentos na vida de Colton em que ele recebeu amor incondicional. A primeira vez que lhe foi dada uma vida com possibilidades em vez de uma vida de medo.
— Acabei perguntando se ele estava com fome, e aqueles olhos dele ficaram imensos. Não havia no trailer muita coisa que uma criança gostaria de comer, mas tinha uma barra de Snickers, e eu admito — ele diz com uma risada. — Eu realmente queria que ele gostasse de mim… Então pensei: que criança não pode ser comprada com doces?
Eu sorrio com ele, lembrando que Colton come uma barrinha de Snickers antes de cada corrida. Que ele comeu uma barra de Snickers hoje. Meu peito se aperta. Isso aconteceu realmente apenas algumas horas atrás? Parecem dias.
— Sabe, Dottie e eu conversamos sobre a possibilidade de mais filhos… Mas decidimos que Quinlan era suficiente para nós dois. Bem, preciso dizer que Dottie teria tido mais filhos, eu é que estava contente com apenas uma. Merda, levávamos vidas atarefadas, com muitas viagens, tivemos sorte suficiente de ter uma garotinha saudável, então como poderíamos pedir mais? Minha carreira estava decolando, e Dottie participava quando queria. Mas depois daquelas primeiras horas com Colton, não houve sequer hesitação. Como eu poderia me afastar daqueles olhos e do sorriso que eu sabia que estava escondido em algum lugar sob o medo e a vergonha? — Uma lágrima escorre por seu rosto, a preocupação com o filho, naquela época e agora, emanando em ondas. Ele olha para mim com olhos cinza cheios de emoções profundas. — Ele é a pessoa mais forte, o homem mais forte que eu já conheci, Rylee. — Ele engasga com um soluço. — Eu só preciso que ele continue sendo desse jeito agora… Eu não posso perder meu garoto.
Suas palavras me rasgam em lugares profundos, pois entendo a angústia de um pai com medo de perder seu filho. O medo intenso que você não quer reconhecer que sente, mas que aperta cada parte do seu coração. A empatia me inunda por este homem que deu tudo a Colton, e ainda assim a dormência dentro de mim encarcera minhas lágrimas.
— Nenhum de nós pode, Andy. Ele é o centro do nosso mundo — eu sussurro com a voz quebrada.
Andy inclina a cabeça para o lado e me estuda por um momento.
— Eu tenho medo toda vez que ele entra naquele carro. Toda porcaria de vez… Mas é o único lugar em que o vejo livre do fardo do passado… Em que o vejo fugir dos demônios que o assombram. — Ele aperta minha mão até que eu me vire e veja a sinceridade em seus olhos. — O único momento, quero dizer, até recentemente. Até que eu o vi conversar, se preocupar, interagir com… você.
Minha respiração fica presa, meus olhos se enchem de lágrimas pela primeira vez, mas elas não caem. Depois de ter a mãe de Max, Claire, me odiando por tanto tempo, a aprovação tácita do pai de Colton é monumental. Solto um soluço, tentando conter o furacão de emoções girando dentro de mim.
— Eu o amo. — É tudo o que consigo dizer. É tudo em que consigo pensar. Eu o amo, e talvez nunca consiga mostrar isso a Colton, agora que ele admitiu sentir o mesmo por mim. Estou em um precipício de circunstâncias tão fora do meu controle, que temo nunca ter a chance de fazer isso.
A voz de Andy me tira do meu ataque de pânico crescente.
— Colton me disse que você o encorajou a ir atrás de informações sobre a mãe biológica.
Eu olho para baixo e desenho círculos no meu joelho com a ponta do dedo, cautelosa que esta conversa possa seguir por duas direções: em uma Andy fica grato por eu estar tentando ajudar seu filho a se curar, em outra se mostra chateado e acredita que estou tentando arrumar um conflito entre eles.
— Obrigado. — Ele exala suavemente. — Eu acho que sempre faltou uma peça nele, e talvez descobrir mais sobre ela ajude a preencher essa lacuna. Só o fato de estar falando sobre isso, perguntando sobre o assunto, é um grande passo… — Ele estende a mão, coloca um braço em volta do meu ombro e me puxa para perto, para que minha cabeça descanse em seu ombro
— Então obrigado por ajudá-lo se encontrar, de todas as formas possíveis. Eu balanço a cabeça em reconhecimento, sua confissão fazendo com que as palavras me sumam. Nós ficamos sentados juntos assim por algum tempo, dando e recebendo conforto um do outro, quando tudo o que sentimos é um vazio interior.