Giovanni - Primeiros Capítulos

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Gio vanni

Autora best-seller da Amazon PALOMA

MAZZON

1ª EDIÇÃO – 2022 RIO DE JANEIRO
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Copyright © 2018 paloma mazzon

Copyright © 2022 allBook Editora

Preparação e Revisão

Direção Editorial

Beatriz Soares

Clara Taveira e Raphael Pellegrini Capa

Flavio Francisco

Projeto Gráfico e Diagramação: Cristiane | Saavedra Edições

Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. Os direitos morais do autor foram declarados

Esta obra literária é ficção. Qualquer nome, lugares, personagens e incidentes são produto da imaginação do autor. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas, eventos ou estabelecimentos é mera coincidência.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995)

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

Meri Gleice Rodrigues de Souza – Bibliotecária – CRB-7/6439

M429g

Mazzon, Paloma

Giovanni / Paloma Mazzon. – 1.ed. – Rio de Janeiro: Allbook, 2022.

192 p.; 23 cm.

Sequência de: Lucca

ISBN: 978-65-86624-74-8

1. Romance brasileiro. I. Título. II. Série.

22-75646

CDD: 869.3

CDU: 82-31(81)

PRODUZIDO NO BRASIL. CONTATO@ALLBOOKEDITORA.COM
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PRÓLOGO

Aurora Três anos antes

DanDo alguns passos para trás, até estar paraDa no hall de entrada do novo apartamento de Lucca Lazzari, admiro o meu trabalho. Após duas semanas seguidas decorando essa cobertura enorme, finalmente consegui terminar e, modéstia à parte, sou muito boa nisso. Eu estava um pouco desanimada porque minha supervisora na empresa não tinha me dado muitas chances de trabalhar, por ciúme da minha relação com Giovanni Lazzari — o segundo filho do dono da empresa —, até que Lucca, o filho mais novo, me entregou a chave de seu apartamento e pediu que eu o decorasse. Já havíamos trabalhado juntos em um hotel de Dubai, e tanto ele quanto os irmãos ficaram muito satisfeitos com meu trabalho. Mas Tiana Banks simplesmente me odiava e não media esforços para demonstrar isso. Pelo que eu soube por Lucca, Giovanni e ela tiveram um caso antes que eu chegasse à empresa, e ela não consegue aceitar que Giovanni a tenha deixado de lado por mim. Sua raiva só fez aumentar quando ele chamou a atenção de todos no saguão do prédio da empresa ao se ajoelhar e me pedir em casamento. Cada vez que ela olhava para minha mão e via o lindo anel, com um solitário perfeito de diamante, eu esperava que saísse fumaça de seus ouvidos e narinas.

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Eu sorrio e suspiro, satisfeita com o que acabei de fazer; saco o celular do bolso da calça e tiro uma foto da ampla sala de estar decorada com cores neutras e masculinas. Deslizo o dedo no botão de mensagens, e o contato “Meu amor” está logo em cima, então envio a foto.

Eu: Sinto ter de informar desse jeito, mas ganhei a aposta. Agora você terá de me levar para aquele passeio, lembra?

A resposta veio rápida, como sempre:

Meu amor: Desculpe. Não me lembro de aposta alguma…

Eu: Te dou umas dicas. Europa… França…

Meu amor: Você está maluca. Eu nem te conheço.

Eu: Que pena… Já até tinha comprado uma lingerie nova para hoje à noite…

Meu amor: Faça as malas! Voaremos para Marselha amanhã!

Eu solto uma risada. Tínhamos feito essa aposta há três dias, quando estávamos deitados um ao lado do outro, completamente esgotados depois de uma longa e incrível sessão de sexo. Eu disse a ele que acabaria em menos de cinco dias, e Giovanni defendeu que não, que eu trabalharia por mais duas semanas. Quando eu não concordei, ele propôs a aposta. Se eu ganhasse, me levaria à Marselha, um lugar maravilhoso na França onde eu sempre tive o sonho de visitar. Se ele ganhasse, eu teria de transar com ele em uma espreguiçadeira na varanda de seu quarto — uma fantasia que ele ficou obcecado depois que me viu pegando sol lá e um pedido que eu venho negando porque alguém pode muito bem nos ver.

O que Giovanni não sabe era que eu quero ir com ele até Marselha para poder contar, em uma paisagem incrivelmente linda, que finalmente conseguimos o que desejamos. Depois de meses tentando, eu finalmente estou grávida.

Volto minha atenção para o celular nas mãos quando o aparelho vibra com outra mensagem.

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Meu amor: Janta comigo hoje?

Eu: Claro. Logo após terminar de fazer minhas malas.

Meu amor: Ainda preciso me informar se você não trapaceou.

Eu: Marselha, aqui vou eu!

Meu amor: Engraçadinha. Vejo você às 19 h! Te amo.

Eu: Ok. Também te amo.

— Srta. Mitchell, há uma carta para você. Abrindo um sorriso largo, encaro José, o porteiro do meu prédio, com uma sobrancelha arqueada. Eu sabia exatamente quem a havia enviado, e o sorriso cúmplice que José está me direcionando neste exato momento confirma minhas suspeitas.

Além das mensagens diárias, Giovanni tem essa coisa de me enviar cartas à moda antiga. Todos os dias ele manda alguma, normalmente com mensagens românticas que me deixam com as emoções à flor da pele, principalmente agora, nessa fase de gravidez.

José me entrega um envelope vermelho. Eu nem preciso levá-la ao nariz para sentir o cheiro delicioso do perfume masculino do meu amor. Depois de agradecer a José, sigo para o elevador e aperto o número do meu andar. Estou ansiosa para ler a carta, mas só farei isso quando estiver dentro de casa, onde ninguém poderá me ver chorando feito uma boba.

Quando entro em casa, apoio a mão no encosto do sofá para tirar as sandálias, então dou a volta e me sento, cruzando as pernas debaixo do corpo; um sorriso abobado estica meus lábios quando abro o envelope. Mas logo começa a se desfazer quando começo a ler as palavras escritas em uma caligrafia masculina e familiar.

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Não poderei buscar você para o jantar. Na verdade, não poderei mais ver você. Esse noivado foi um erro, e você sabe muito bem disso. Estou disposto a pagar o quanto for para você não fazer um escândalo, então, por favor, não o faça; procure minha secretária, e ela lhe dará o que for necessário. Estou saindo do país agora por um tempo, e espero que, quando voltar, que você tenha pedido demissão da minha empresa. Sinto muito não dizer isso tudo pessoalmente, mas eu não queria ver você chorar na minha frente. Foi muito bom o que vivemos, mas somos muito diferentes, e eu não posso continuar com isso.

Adeus, Aurora!

Realmente sinto muito.

Giovanni.

Eu leio, releio e releio novamente, tentando entender se é algum tipo de pegadinha que ele está fazendo comigo. A caligrafia perfeita é igual à sua, o modo de se expressar, com certeza, também: frio, cheio de si. Mas eu não consigo acreditar que os sentimentos expressos no pequeno pedaço de papel são realmente dele. Mais cedo, em nossas mensagens, ele disse que me amava. Deus! Mais cedo, na minha cama, ele disse que me amava. Que me amava demais. Por que Giovanni está fazendo isso agora? Que brincadeira de mau gosto é essa? Ignorando a vista embaçada pelas lágrimas que estão escorrendo com violência, estendo as mãos trêmulas e alcanço minha bolsa. Começo a procurar freneticamente meu celular, mas estou tão fora de mim, que não consigo encontrá-lo rapidamente. O desespero está crescendo, meu peito tão apertado, que preciso abrir a boca e sugar um pouco de ar para respirar. Perdendo a paciência, viro a bolsa de cabeça para baixo, derrubando tudo sobre o sofá, para só assim finalmente conseguir achar o aparelho. Eu teclo com dificuldade o único número que eu sei de cor e o levo à orelha. Chama. Chama. Chama. Chama. Caixa-postal.

Eu continuo insistindo, a mão livre sobre o peito o massageando, numa tentativa de aliviar a dor latente que está dominando todo meu corpo. Quando o celular continua dando na caixa-postal, encerro a ligação e procuro pelo número do escritório.

Rita, a secretária, atende no segundo toque.

— Secretária do sr. Giovanni Lazzari.

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— Rita, onde está Giovanni? — Eu não consigo evitar o desespero em meu tom.

Ela fica em silêncio por alguns longos instantes, mas então suspira.

— Sr. Lazzari saiu há uns quinze minutos, Aurora.

— Para onde ele foi? Por que não atende o celular?

— Talvez porque não se pode atender celulares em aviões…

— Aviões? — Eu posso ouvir quando meu coração se parte ao meio.

— Ele… ele foi…

Sequer consigo terminar de formar a pergunta, de tanta falta de ar causada pela dor.

Por que diabos Giovanni fez isso comigo?

— Ele disse que se alguém perguntasse, estaria viajando com a srta. Thornburg — ela diz depois de algum tempo. — Aurora, eu sinto muito, mas preciso desligar!

Sinto muito.

Por algum motivo, eu estou odiando essas duas palavras.

Giovanni não sente muito.

Tampouco Rita sente muito.

Na verdade, eles devem estar rindo de mim, do quanto estou sofrendo.

Eu levo a mão à boca para me impedir de gritar quando a dor parece rasgar até minha garganta. Em seguida, sinto quando um redemoinho retorce meu estômago, empurrando tudo que eu comi durante o dia. Então eu corro rapidamente para o banheiro e me inclino sobre a privada, colocando tudo para fora, enquanto as lágrimas deixam meus olhos junto com os tremores que tomam conta do meu corpo.

Não sei por quanto tempo fico colocando para fora o que me pareceu ter sido consumido na semana anterior, até que o meu celular vibra em minha mão.

Meu melhor amigo, aquele que sempre tem o dom de sentir quando eu estou com problemas, mesmo à distância. Eu moro em Los Angeles, ele, em Chicago.

Posso sentir um resquício de alívio circular dentro de mim quando atendo a chamada e ouço sua voz amigável e carinhosa.

Talvez alguém sinta muito, afinal.

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Noah.
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CAPÍTULO 1

Giovanni

— Você só poDe estar De brincaDeira com a porra Da minha cara!

Largando a caneta que estava usando para assinar alguns papéis sobre a mesa, eu me encosto na poltrona e encaro meu irmão. Eu procuro manter a expressão neutra, mesmo com a raiva estalando no cérebro neste momento. Lucca faz o mesmo que eu, recostando-se na poltrona e segurando nos braços de couro, inclina o corpo para trás, fazendo as molas da poltrona se contraírem levemente com o movimento.

— Não estou, não — ele diz, balançando a cabeça. Seu sorriso preso e a cara cínica entregam o ato proposital. — A Mel viu alguns dos trabalhos dela e não quis outra pessoa. Você sabe que é a mulher quem manda…

Estreito os olhos para ele.

— Está me dizendo que, com tantas designers no caralho do país, algumas bem aqui, na empresa, ela exigiu aquela mulher? O quê? A Mel não gosta de mim, é isso?

— Fala sério, Giovanni! Sabe que ela adora você. — Ele revira os olhos. — Você, por acaso, já teve de lidar com uma mulher grávida? Elas são teimosas pra cacete. Melissa já era teimosa, agora grávida piorou muito. É só o que ela quer, e ai de mim se não concordar.

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Eu levanto uma mão e passo pelo cabelo, sentindo as palmas umedecidas apenas com o pensamento de precisar encontrá-la novamente. Pior, de precisar trabalhar com ela novamente… Não posso fazer isso; eu a odeio por ter ido embora e me deixado como um banana apaixonado depois de fazer tantas coisas por ela. Com qualquer outra pessoa, eu não me importaria de ir até lá e bloquear totalmente meus sentimentos, mantendo uma expressão relaxada, como se nada tivesse acontecido. Mas Aurora Mitchell não é qualquer pessoa. Tenho a impressão de que não conseguiria me manter neutro por muito tempo perto dela.

Não quando só de pensar em quão bom era sentir seu cheiro e seu corpo magro e delicioso enroscado ao meu, já fico com um nó no estômago e uma vontade absurda de quebrar as coisas ao meu redor.

— Ótimo. Então diga a Mel que, a partir de hoje, Nicolas Harper será o novo engenheiro responsável pela sua casa — aviso para Lucca, oferecendo-lhe um sorriso amarelo, e pego de volta minha caneta, lutando para controlar os dedos trêmulos de raiva.

Lucca me olha com uma expressão chocada e balança a cabeça, como se estivesse dizendo “Tão maduro…”

Mas eu não me importo com isso. Em vez de dar mais atenção a ele, volto a assinar os documentos postos na mesa. Pela visão periférica, vejo meu irmão mexendo no celular. Eu o conheço o bastante para saber que está aprontando alguma…

Em seguida, coloca o celular sobre a minha mesa.

— Ei, bebê. — A voz amorosa da Mel surge através do viva-voz.

Levanto os olhos, estreitos como fendas, para ele, mas Lucca ignora minha ameaça silenciosa e diz:

— Amor, acabei de falar com o Giovanni.

— E…?

— Você terá a Aurora, mas ele disse que seu engenheiro agora será o Nicolas. — Seu tom de voz está tão (ou mais) cínico que sua expressão. Ele tem uma sobrancelha erguida para mim, com divertimento claro.

Mel não tem mais o tom amoroso de quando atendeu a ligação. Ela parece um pouco decepcionada.

— Por quê?

Mesmo sabendo que ela não veria, Lucca dá de ombros.

— Pode perguntar para ele, se quiser. Está no viva-voz.

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— Giovanni?

— Hum? — respondo após praguejar baixinho para que ela não ouça. Lucca sabe que isso é jogo sujo, uma vez que tem muito bem conhecimento que eu não diria não para ela. Pelo menos, não quando Mel está esperando o meu sobrinho… Ou, talvez, nem mesmo se ela não estivesse grávida. Melissa tem uma coisa irritante de fazer todo mundo se derreter diante dela. O jeitinho inocente e frágil que demonstra nos olhos verdes — quando na verdade é uma mulher forte — é capaz de desmontar qualquer um. Foi o que ela fez com meu irmão e com todos da família. Eu a odeio por isso.

— Que história é essa que o Lucca me contou? Eu nem conheço esse Nicolas! Obviamente eu não a trato do mesmo jeito que trato Lucca, procuro ser o mais suave possível quando respondo.

— Nicolas é o segundo melhor engenheiro dessa empresa. Sua casa estará em boas mãos.

— Não, senhor! Eu não quero o segundo, quero o primeiro, e adivinha quem é? Desvio o olhar da tela do celular para meu irmão, que está prendendo o riso com minha situação. Eu aponto um dedo indicador para ele, em seguida o passo, em horizontal, sobre a minha garganta.

— Não vou trabalhar com a Aurora, Mel — aviso, voltando a me concentrar no telefonema. — Não sei o que você sabe a respeito do que aconteceu, mas posso garantir para você que não quero vê-la nem pintada de ouro na minha frente.

— Dividiremos os horários, então — ela diz como se fosse uma solução perfeita. — Providenciarei para que quando você estiver por lá, ela não esteja. Tá bom assim? Só faltam poucas coisas para você fazer na casa, então não pode ser tão difícil evitá-la nesse meio tempo.

Suspirando, chego à conclusão de que eu realmente odeio minha cunhada. Ela é a porra de uma mente boa que não desiste fácil.

— Tudo bem — eu me rendo e passo as mãos pelo rosto, tentando aliviar a tensão. — Tudo bem.

— Ufa. — Ela parece respirar aliviada do outro lado. — Obrigada. Muito obrigada. Eu amo você por isso, ok?!

Abro um sorriso.

— Ok, mas você ficará me devendo uma — aviso, o tom suavizando na medida em que eu deixo meu corpo relaxar.

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Apesar de toda minha história com Aurora, eu não teria coragem de deixar Mel na mão com o tanto que ela está correndo para resolver as questões do casamento e da casa. Eu a vi ontem, e ela parecia exausta, mesmo sem querer admitir. Acho que isso tudo vem do desejo de colocar todo o passado de lado e começar uma nova etapa na vida com meu irmão, e eu farei de tudo para ajudá-la com a tarefa; até mesmo enfrentar Aurora outra vez.

— Assim que toda essa bagunça acabar, prometo que estarei à disposição para fazer o que você pedir — Mel diz, com um sorriso em seu tom. — Bebê? — chama por Lucca, sua voz ficando quase derretida.

Meu irmão estende a mão e pega o aparelho, o tirando do viva-voz e o levando ao ouvido; um sorriso idiota dançando em sua boca quando responde.

— Estou ouvindo, bebê. — Seu sorriso vai diminuindo aos poucos enquanto ele escuta as palavras de Mel, e um brilho pervertido toma conta de seus olhos. — Oh, certo, anotado. Estarei em casa daqui a pouco para você. Balanço a cabeça, não podendo conter um sorriso zombeteiro ao vê-lo desligar e deslizar o aparelho de volta para o bolso da calça, um tanto inquieto agora.

Idiota.

— Bom. — Ele tamborila os dedos nos braços da poltrona, forçando um sorriso amigável. — Minha missão está comprida por aqui. — Então se levanta e bate as mãos, me olhando com cuidado e começando a andar para trás, em direção à porta. — A Mel precisa de mim em casa, então… Boa sorte com essa coisa, irmão.

Estreito os olhos, lhe dizendo que não estou nada satisfeito com essa coisa e que estou prestes a socá-lo se ele não desaparecer da minha sala. Com uma risadinha ridícula, ele sai pela porta, a fechando atrás de si.

Solto uma bufada, deixo minha cabeça cair para trás no encosto e fecho os olhos. Minhas mãos estão suando e tremendo, desejando se mover contra alguma coisa enquanto a imagem de Aurora se forma em minha mente.

Porra. Mil vezes porra

Levo as mãos para cima e esfrego o rosto algumas vezes, soltando um grunhido frustrado; o coração apertando pela possibilidade de ficar cara a cara com ela de novo depois de tanto tempo.

Com um rosnado, coloco as mãos na beirada da minha mesa e a empurro, fazendo as pernas da minha poltrona de rodinhas deslizarem

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para trás; eu me levanto quase abruptamente. Caminho até as janelas panorâmicas do escritório e enfio as mãos nos bolsos. Olho o fluxo gigante de pessoas andando apressadamente de um lado para o outro nas calçadas, atravessando a pista, estendendo a mão para apanhar um táxi…

Eu sabia que Aurora tinha voltado para Los Angeles, mas nunca cheguei a cogitar o fato de que esbarraria com ela numa cidade tão grande e movimentada. É ainda mais frustrante saber que isso acontecerá por meio do meu irmão.

Pela primeira vez, após três malditos anos, penso em como seria vê-la novamente.

Ela ainda está linda como me lembro?

Ainda me olharia com aqueles olhos grandes, com a mesma adoração que eu amava ver?

Ela ainda cheira a gardênia?

— Foda-se! — Trinco os dentes, sentindo a raiva se mover por cada veia existente no meu corpo.

Eu não me importo se ela está linda ou se parece com a porra da esposa do Chucky. Eu não me importo como ela olhará para mim. E tampouco me importo com como ela cheira agora, porque não vou procurar saber de qualquer forma.

Ela não passa de um ser insignificante para mim, uma mulher que me abandonou faltando poucos dias para nosso casamento. Eu, definitivamente, não quero saber como que cheiro ela tem.

Alcançando os papéis que assinei em cima da mesa, caminho para fora do escritório e os coloco sobre a mesa de Rita, minha secretária. Eu ignoro seu sobressalto e aviso:

— Estou saindo agora. Caso alguém ligue me procurando, estarei na nova casa do Lucca, trabalhando.

O trajeto até o condomínio dura cerca de quinze minutos. Depois de passar pelo reconhecimento de digital da segurança, estaciono em frente à casa e bato a porta do carro quando saio.

O calor hoje está um tanto ridículo, então eu dispenso o paletó e arregaço as mangas da camisa branca até os cotovelos, com os dois primeiros

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botões abertos. Talvez um pouco de vento no corpo possa aliviar um pouco minha vontade de arrebentar a cara de alguém.

Uma vez dentro da casa, sigo direto para a parte dos fundos, onde ainda estou trabalhando. Só falta essa área, então vou procurar apressar as coisas para não ter de dar de cara com aquela mulher por um acaso desagradável do destino.

Mesmo Mel propondo dividir nossos horários, parece que não sou muito querido lá por cima e tenho quase certeza de que não terei tanta sorte de evitar um encontro com ela em algum momento.

Decido fazer meu caminho pela cozinha, mas assim que ponho os pés lá, sinto o coração entrar em modo pausa.

— …eu não estou entendendo o que você…

Com a mão livre na cintura, Aurora se vira em seu eixo, as sobrancelhas unidas numa confusão, enquanto ouve seja lá quem esteja do outro lado do telefone. Então seus olhos se deslocam do chão e sobem, se chocando com os meus; ela empalidece e sua expressão se torna horrorizada.

Eu noto quando seus ombros caem, e ela suspira. Inclinando a boca para o celular, sem tirar os olhos dos meus, diz para a pessoa do outro lado:

— Sim, acho que acabei de entender. — E desliga a chamada. Sinto o maxilar doer, de tanto que o estou travando, mas não me importo, a dor que estou sentindo no peito agora é ainda maior. Uma dor pode amenizar a outra. É isso que dizem, não é? Que se estiver sentindo dor em algum lugar do corpo, basta causar dor em outro lugar que ela passa, não é?!

Pelo menos é o que eu aprendi e pratiquei durante esses três anos. Eu mergulhei de cabeça nos treinos excessivos de boxe, Krav Magá… Tudo isso para sentir dor no corpo e amenizar a do coração; amenizar a dor insuportável que se instalou no lado esquerdo do peito, como se tivessem soltado uma âncora sobre ele e a deixado lá. A mesma dor que eu me proibi de sentir, até agora.

Eu encaro seus olhos castanhos, que antes eram doces e suaves, agora frios e duros. Mais do que nunca sinto como se estivesse sido enganado durante todo o tempo que estivemos juntos.

Ela está ainda mais linda do que me lembrava, seu corpo está mais cheio, mais formado, e se é que isso seja possível, parece ainda mais gostosa — não que eu esteja a notando agora, porque não desgrudo os olhos dos dela, e eu não sei o porquê.

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Meu bolso vibra, e eu enfio a mão nele para recuperar meu celular.

— Sim? — atendo, sem ao menos dar uma olhada na tela para saber quem é.

— Giovanni — a voz desesperada de Mel soa no meu ouvido. — Eu sinto muito, ok? Não sabia que ela estaria aí hoje, mas eu também não sabia que você ia resolver ir logo hoje. Eu não queria…

Ela continua falando no meu ouvido, mas eu estou muito ocupado lutando para manter minha raiva sob controle para escutar qualquer coisa. Aperto o aparelho entre os dedos, para não o arremessar para o outro lado do cômodo vazio.

Porra, ela está aqui, bem na minha frente!

Puxando, discretamente, o ar de volta para o pulmão, procuro acalmar minha cunhada.

— Mel, estou bem. Não se preocupe. — Eu aperto em desligar e deslizo o celular de volta para o bolso.

Basta manter os sentimentos escondidos, eu repito para mim mesmo. Não pode ser tão difícil.

Limpo a garganta e enfio as mãos nos bolsos, mas não digo nada. Espero que ela fale primeiro, e pelo modo como seus ombros se endireitaram e seu queixo levanta, ela começará:

— Bem… — Aurora pressiona os lábios um no outro por uns instantes, arrasta o cabelo da frente dos olhos e então entrelaça os dedos das mãos em frente ao corpo. — Eu não sabia que você estaria aqui, mas não precisa se preocupar, estou apenas terminando o que vim fazer e logo estarei fora.

Contra minha vontade, sua voz corre por cada nervo do meu corpo e se entranha no meu estômago, fazendo-o pesar com a saudade.

Eu não esboço nenhuma reação ou expressão, no entanto…

— Não me importo. — Atiro uma resposta, atravessando a cozinha em passos largos, o mais rápido que posso, evitando as batidas aceleradas do coração.

Eu não poderia ficar parado olhando para Aurora, ou ela veria o quanto ainda me afeta, e, puta que pariu, ela ainda me afeta demais. Eu não deveria estar com uma ereção agora só por colocar meus olhos sobre ela, mas estou. E eu não sei o que mais incomoda no momento — a dor do coração ou do pau —, e eu não posso fazer nada para aplacar nenhuma delas.

Nem se enfiasse uma faca na porra da minha perna.

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CAPÍTULO 2

Aurora

Eu não me importo.”

Ah, é claro que não.

Babaca.

E por que diabos eu quis dar algum tipo de explicação para ele?

Mantenho os olhos estreitos nas costas largas tão familiares para mim enquanto Giovanni atravessa a cozinha em direção à porta de vidro que leva aos jardins da casa.

Apesar do meu peito estar bastante apertado e o cérebro, atordoado por esse reencontro repentino e nada desejável, prendo o lábio inferior entre os dentes, admirando seu porte físico, claramente mais definido que há três anos.

Precisei segurar o queixo no lugar quando meus olhos encontraram os seus. O mergulho no oceano azul imenso foi tão intenso quanto todas as outras vezes, mesmo capturando o desprezo dessa vez.

Ótimo, parece que três anos de sofrimento e dor não foram suficientes para ficar imune a Giovanni Lazzari.

Eu o observo deslizar a porta de vidro para o lado, abrindo-a apenas o suficiente para passar. Ele caminha com toda a confiança que sempre teve, e meu coração se parte mais uma vez quando Giovanni sequer olha para trás.

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Eu rio com tristeza.

Por que ele olharia?

Ele fez sua escolha há três anos, então por que voltaria atrás agora?

E mesmo se voltasse, eu não iria querer. Não mais. Ele me machucou, me quebrou ao meio, acabou comigo por meio de uma porcaria de uma carta.

Eu pisco para espantar as lágrimas dos olhos, ignorando a dor insuportável no peito, e volto até a ilha da cozinha para apanhar meu iPad. Eu preciso sair daqui, então tenho de terminar o que vim fazer. Passando a ponta do indicador na tela, abro novamente a câmera e volto ao trabalho, terminando de tirar fotos do restante da cozinha.

Ele disse que não se importava?

Suspiro, deixando a cabeça cair para trás no encosto do sofá e fecho os olhos, evitando o olhar questionador e, no momento, mal-humorado de Noah sobre mim.

— Aurora — ele chama, com uma voz mais suave. — Me diz se contou para ele.

Eu abro os olhos e viro a cabeça ainda encostada para olhar para ele, lhe dando meu olhar mais cansado como resposta à sua pergunta.

Foi a vez dele de suspirar. Sentado no carpete aveludado, com as costas no sofá, Noah ergue um joelho dobrado até o peito e se inclina para frente, depositando sua taça de vinho sobre a mesa de centro.

— Ele precisa saber — diz, num tom de aviso. — Já estamos aqui há quase um ano, e o único motivo para termos voltado foi esse, mas você está enrolando desde então.

— Primeiro, não estou enrolando. Ele nunca me receberia para uma conversa, e sinceramente? — Bato a mão livre contra a perna e me desencosto, a outra mão agarrada fortemente na minha taça. — Eu não tenho que ficar correndo atrás disso, Noah. Ele me deixou, não o contrário.

— Sim, ele deixou — Noah diz. — Merda, Aurora, o que ele fez foi muito errado, e eu ficaria tentado a matá-lo se o encontrasse. Não estou defendendo, estou apenas dizendo que Giovanni merece saber que tem uma filha. — Seu olhar preocupado procura meus olhos. Quando sua voz abaixa, diz: — A Pérola precisa de um pai.

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Faço uma careta com pontadas de dor por todo meu corpo. Eu odeio tanto essa parte, porque, sim, eu sei que Giovanni merece saber que tem uma filha e sei que minha filha precisa saber que tem um pai. Eu só não queria que tudo isso tivesse acontecesse com ele. Não é justo comigo ter de vincular minha vida à dele para sempre, mas eu já atrasei isso durante três anos e já está na hora de ter uma conversa séria com Giovanni. Eu volto meu olhar para Noah, notando que ele está vestido com uma calça jeans escura, uma camisa branca e um blazer azul-marinho por cima. Seu cabelo está do jeito desleixado de sempre, e em seus pés estão um par de sapatos fechados.

Franzo a testa, apontando para ele com o queixo.

— Vai sair hoje?

Eu não tinha percebido que ele estava arrumado até agora. Quando entrei em casa, vim direto para a adega na cozinha pegar um vinho, e Noah apareceu perguntando o que havia acontecido. Eu servi duas taças e comecei a despejar sobre ele os detalhes.

Um sorriso percorre seus lábios, em divertimento.

— Estou indo para uma reunião na galeria e mais tarde vou me encontrar com a Lake.

— Lake Patterson? — pergunto, curiosa. — A ruiva bonita de duas semanas atrás?

Noah franze as sobrancelhas e, no mesmo momento, a mão sobe para coçar o queixo redondo. Seu olhar parece perdido, como se só agora estivesse se lembrando disso.

— É — responde, pensativo. — Lake de duas semanas atrás.

— Hm. — Prendo os lábios entre os dentes, segurando meu sorriso, e tomo um gole do vinho. — Será que estou entendendo errado ou você realmente vai se encontrar com a mesma mulher duas vezes? — Não posso evitar o humor no tom da pergunta. — Estou presenciando um milagre aqui?

Noah bufa, revirando os olhos negros. Ele pega a taça de volta e vira a cabeça para cima, terminando a bebida de uma só vez. Então limpa a boca com as costas das mãos e se levanta do chão.

— Não pense que eu não notei que você mudou o foco da conversa — acusa, recuperando a carteira e o celular sobre a mesinha ao lado do sofá.

Volto a me encostar e torço o nariz em desgosto por Noah me conhecer tão bem.

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Ele se inclina para perto de mim e beija o topo da minha cabeça.

— É sério, Aurora, não mantenha isso em sigilo por mais tempo. Você sabe que deve contar a ele. — Noah caminha até a porta, mas antes de sair, pede, me olhando por cima dos ombros: — E dê um beijo na Pérola por mim quando ela chegar.

E então se vira e sai pela porta da frente, me deixando sozinha com o peito apertado e os olhos ardendo pelas lágrimas que começaram a inundá-los. As lágrimas que me neguei a derramar desde que vi minha filha pela primeira vez. Eu vi o quanto ela era frágil, então lhe prometi que seria forte por ela, que não choraria ou voltaria para a depressão em que estive mergulhada durante a gravidez e que quase a tirou de mim.

Enxugo meu rosto com os dedos e termino o vinho. Já são quase três da tarde, e isso significa que eu tenho apenas uma hora e meia para trabalhar antes que Pérola chegue da escolinha.

Depois de lavar as taças e guardá-las, sigo para o banheiro da suíte. Meu corpo está quente desde o reencontro inesperado e necessita de um banho bem gelado e de cabeça para refrescar um pouco.

Com o corpo menos quente e os nervos mais leves, saio, enrolando o cabelo em uma toalha e o corpo em um roupão, então volto para quarto e sigo direto para o armário.

Há mais ou menos um ano, quando Noah e eu compramos esse apartamento, fiz algumas mudanças na planta, e uma delas foi acabar com os closets dos quartos. Esse era um apartamento de proporções medianas, mas os quartos não tinham o tamanho que eu realmente queria, por isso optei por colocar armários embutidos e derrubei as paredes dos closets, dando mais espaço para os ambientes.

Como não espero sair mais hoje, me enfio em um short curto de pijama e uma camisa regata branca. Penteio os cabelos, mas não os seco. Eu gosto de sentir a umidade sobre os ombros e costas às vezes.

Apanho meu laptop, celular e iPad e sigo descalça de volta para sala, decidindo que vou mergulhar no trabalho e esquecer meu dia hoje até a Pérola chegar.

Chego à mesa de jantar, que divide a cozinha da sala, puxo a cadeira, espalho minhas coisas e em seguida vou até a geladeira para servir um copo de suco. O álcool do vinho ainda está no meu corpo, ele precisa sair para que eu possa trabalhar bem.

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Coloco o copo com cuidado na mesa e me sento, puxando a perna esquerda para cima da cadeira e para baixo do corpo. Estico os ombros para trás e torço o pescoço para direita, em seguida para esquerda, mandando toda a tensão embora. Em seguida, abro o laptop, clico no navegador e entro no Pinterest para começar a trabalhar com minhas ideias.

Eu fui à casa da Mel e do Lucca porque precisava dar uma olhada antes de realmente começar o trabalho. Tirei fotos de cada cômodo, então poderei trabalhar sobre elas com mais facilidade — e, consequentemente, com uma distância bem saudável de Giovanni. Pelo menos por enquanto. Mas não precisei pensar muito. Assim que entrei na casa, as ideias sobre o que fazer ali começaram a pipocar na cabeça, e eu, com certeza, vou mergulhar nelas.

A cada trabalho que começo, uma energia boa me invade, mas trabalhar na casa do homem que praticamente abriu as portas para que eu chegasse onde estou hoje é como estourar fogos de artifícios na minha barriga. Eu estou animada e ansiosa por isso.

E não há raiva ou qualquer tipo de sentimento ruim capaz de destruir isso.

Não hoje.

O toque do meu despertador soa, e eu resmungo, me revirando na cama para ficar com a barriga para baixo. Levo a mão até a mesinha ao lado da minha cama e tateio até conseguir desligar o som estridente.

Leva alguns segundos até que eu consiga abrir os olhos, e então eu sorrio com a visão da minha bebê ao meu lado, ainda dormindo.

Desde que começou a andar com firmeza, sempre que dá duas e quarenta da manhã, ela acorda e faz seu caminho até meu quarto. Eu mantenho a porta aberta todos os dias quando vou dormir para que ela possa entrar.

Então Pérola entra e sacode meu braço para que eu a coloque para cima e volta a dormir rapidamente, como se fosse apenas um ato de sonambulismo; nesses momentos, não parece sequer acordar.

Eu me ergo do colchão e me apoio em um cotovelo, observando seu sono tranquilo. Ela está de bruços, com uma mão sob o rostinho; sua bochecha tem marcas, como se ela tivesse passado muito tempo de um lado

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só. Os cílios negros e cheios descansam suavemente sobre os olhos, e os lábios pequenos e rosados estão entreabertos enquanto ela puxa o ar para dentro e o manda de volta para fora em seguida.

Eu levo a mão até a sua bochecha e aliso de leve, com cuidado para não a acordar. A dor no peito, que sempre aparece quando olho para minha filha, dessa vez está mais do que dolorida. Não há como olhá-la e não me lembrar de Giovanni. A única coisa que ela puxou de mim foi o formato do rosto, um pouco redondo, e o narizinho, o restante parece uma cópia do pai. Definitivamente, não precisaria de um exame de DNA para provar nada.

Deixo-a dormindo, levanto e troco meu pijama por uma roupa de ginástica. Depois de ter a Pérola, fiquei um pouco acima do peso e por isso criei um amor especial por corrida matinal. Não consigo fazer nada no dia se não começar correndo para despertar de uma só vez.

Já arrumada, vou para a sala e encontro Noah e Clarice — a babá — já acordados.

— Bom dia! — cumprimento, seguindo para geladeira.

Clarice me oferece um sorriso amigável enquanto abaixa no carpete da sala para apanhar umas bonecas com que Pérola brincou ontem antes de dormir.

— Bom dia! — ela responde de volta.

Eu abro a geladeira para pegar minha garrafa térmica, mas paro no caminho, olhando para Noah.

Ele não está usando suas roupas de corrida, como em todas as manhãs; ele ainda está com a calça de pijama e uma camisa preta. Seus tornozelos estão cruzados um sobre o outro, e Noah se apoia, com uma mão espalmada sobre o mármore da ilha, enquanto com a outra enche duas xícaras de café fumegante.

— Noah? — eu o chamo. Em seguida, estendo a mão e tiro a garrafa cheia de água da geladeira. — Você está bem?

Ele vira brevemente a cabeça para me olhar e então volta sua atenção para o que está fazendo.

— Mmm — murmura distraído, e eu franzo o cenho.

— O que aconteceu? — pergunto, mas Noah parece não escutar.

Ele apenas termina de encher as xícaras e coça a mandíbula, torcendo o queixo um pouco para o lado.

Eu me inclino no tampo, do lado oposto ao seu, e estalo os dedos em frente aos seus olhos, chamando sua atenção.

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— Terra chamando Noah. — Eu sorrio, porque nunca o vi tão distraído antes.

Noah Ross não é um cara que se distrai facilmente. Nem quando está sozinho com suas telas brancas e tintas à sua frente, com os fones de ouvido, ouvindo algum rock pesado barulhento prestes a estourar os tímpanos.

Finalmente, balança a cabeça e junta as sobrancelhas, olhando para mim.

— Estou bem — diz, e empurra uma xícara de café para mim. — Sinto muito, mas não vou correr com você hoje.

Eu aceno com a cabeça, lentamente, seguro a xícara e tomo um gole.

— Estou vendo. — Aponto para sua roupa, como se fosse óbvio. — Como foi o encontro com a Lake ontem? Não vi a hora que você chegou.

Ele ri, fraco, captando meu tom malicioso e vira a cabeça, olhando o corredor que leva aos quartos. Sua sobrancelha se arqueia, e seu sorriso cai, e eu sei exatamente como terminou o encontro.

Deixo meus lábios se esticarem em um sorriso compreensivo e termino de tomar o café.

— Ok — digo, pegando meu fone de ouvido na mesa ao lado do sofá. — Você sabe que vou querer saber como isso está acontecendo, não sabe? Tipo, você é Noah Ross! Você é o cara do casual-de-uma-única-vez!

Ele levanta a sobrancelha para mim e se inclina, apoiando os antebraços na pedra da ilha e me olhando com diversão.

— Tenha uma boa corrida, Aurora.

Então eu desvio da Clarice no meio da sala, sem conseguir desmanchar o sorriso de satisfação em minha boca, e saio do apartamento.

Meu corpo está coberto com uma fina camada de suor quando completo meus quarenta minutos de corrida. Meu peito sobe e desce rápido e forte enquanto eu tento puxar o ar para os pulmões. Em seguida, viro quase toda a água da minha garrafa na garganta seca.

Quando eu estou mais recomposta, puxo a porta de vidro do Twinke’s, e entro no estabelecimento, logo agradecendo quando sinto o ar gelado do ar-condicionado abraçando minha pele quente. Twinke’s é um estabelecimento popular para lanches de todos os tipos que você possa imaginar, e é o favorito da Pérola quando se trata de suas preciosas rosquinhas.

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Mais uma coisa que ela tem em comum com Giovanni: Pérola idolatra doces, mas principalmente as rosquinhas. Se dependesse dela, comeria todos os dias. Coloquei um limite, só pode comê-las duas vezes por semana para não prejudicar sua saúde.

Aproximando-me do balcão, abro um sorriso amigável para Faith, uma das atendentes, e retiro os fones de ouvido.

— O de sempre? — ela pergunta, abrindo um sorriso.

Eu assinto.

— Você sabe, com cobertura de morango.

Enquanto ela se afasta para pegar as rosquinhas, eu me sento na banqueta ao meu lado e retiro o celular do suporte atado ao braço.

Ontem eu separei várias ideias para a casa da Mel e lhe enviei por e-mail, mas era muito tarde e ela não respondeu de imediato.

Eu entro na caixa de e-mail. Há vários sobre o trabalho: propostas, convites para eventos, pedidos para reuniões. Mas eu evito todas com um suspiro e abro minhas mensagens. A maioria delas é da minha mãe, mas, rolando a tela, vejo uma da Mel.

Eu a abro.

Ei, bom dia! Sinto muito por não ter respondido seu e-mail ontem, eu já tinha ido dormir. Mas adorei todas as ideias que você me mandou e estou ansiosa para ver tudo pronto. Será que você pode me encontrar hoje na casa, à uma e meia? Beijos!

Eu estou prestes a responder quando alguém bufa ao meu lado.

— Só pode estar de brincadeira comigo…

Meus dedos param de se mover e pairam sobre a tela do celular. Eu serpenteio a cabeça para o lado, o coração martelando contra minhas costelas com o reconhecimento da voz profunda e absurdamente sexy. Giovanni.

Eu gemo interiormente quando meus olhos se fecham ao ver os dele furiosos, por fora tento manter a expressão neutra, para não parecer afetada, porque, puta que pariu, estou muito afetada.

Não era para estar assim, passei três anos me preparando mentalmente para isso, mas pelo jeito que meu corpo se acendeu e meu coração afundou

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ontem e agora, com sua presença, posso dizer que esqueci de me preparar física e emocionalmente.

Eu estico a coluna e aperto os olhos, para disfarçar minha miséria.

— Perdão? — eu peço.

Giovanni ri com desdém, e seus olhos escurecem mais, com um brilho de raiva, mas por fim me ignora. Ele olha para baixo, para duas mãos entrelaçadas sobre o balcão, e passa a ponta da língua pelo lábio superior. E eu desmorono mais um pouco por dentro, a saudade querendo tomar conta de mim outra vez.

Outra atendente, Dora, pergunta a Giovanni o que ele deseja, e é claro que é a mesma coisa que eu pedi. Então Dora lhe oferece um sorriso um tanto sugestivo e se afasta para pegar o pedido.

Forçando-me a colocar a onda de ciúmes de lado e focar na minha raiva por ele ter me abandonado, volto o olhar para tela do meu celular, vasculhando na cabeça o que eu escreveria para Mel. Eu releio sua mensagem uma, duas vezes, numa tentativa de me concentrar, mas é impossível desligar da presença poderosa de Giovanni num estabelecimento tão pequeno.

O que diabos ele está fazendo aqui, afinal?

Ele está a treze minutos de carro da sua casa, e pelo que me lembro, na mesma rua onde fica o prédio da LEA também há um Twinke’s.

— Por que voltou?

Eu aperto os dentes com a mandíbula travada, impedindo-me de soltar um gemido ou fechar os olhos com o som de sua voz. Quando olho em sua direção, ele não está olhando para mim; está observando um ponto à sua frente, mas seu maxilar está apertado.

Observo seu perfil por alguns instantes, as borboletas no estômago se agitando com saudade de quando eu arrastava as pontas dos meus dedos, os dentes, a língua por sua mandíbula forte e bem desenhada. Faz tanto tempo que eu não admirava seu rosto perfeito.

Por uma fração de segundos, considero contar o motivo pelo qual voltei, mas quando olho ao redor, notando todo o movimento, desisto mais uma vez. Eu quero contar, mas uma notícia dessas não pode ser dada dessa forma, com várias pessoas desconhecidas circulando por perto.

— Eu acho que isso não é da sua conta — retruco, tornando meu tom um pouco parecido com o seu: frio e duro.

Mas Giovanni ignora mais uma vez, mantendo o olhar ainda em frente.

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— Por que aceitou trabalhar na casa do Lucca? — pergunta.

Eu trinco os dentes, mas respiro fundo e respondo:

— Porque ele me ajudou muito no início da minha carreira — respondo entredentes. — Eu nunca poderia dizer não a ele, você sabe muito bem disso.

Giovanni se vira em sua banqueta, enfim travando seus olhos nos meus; minha pele é tomada por um arrepio ruim que sua frieza envia quando ele diz:

— Sim, sei, mas eu não me importo. Eu não gosto dessa proximidade que você está forçando.

É como um tiro certeiro no lado esquerdo do peito. Minha boca se abre por um momento, enquanto absorvo o que ele acabou de jogar em cima de mim.

“Eu não gosto dessa proximidade que você está forçando.”

Aperto os olhos sobre ele, sentindo ódio circular em minhas veias.

— O que estou fazendo? — Eu rio, desacreditada. — É algum tipo de piada, Giovanni?

Num gesto tranquilo do caralho, ele apoia a lateral do corpo contra o balcão, cruza os braços sobre o peito e arqueia uma sobrancelha negra para mim.

—Tenho cara de quem está brincando?

— Aqui está seu pedido de sempre, senhorita.

Faith põe o saco com rosquinhas quentes sobre o balcão e as empurras para mim. Ela tem um olhar curioso quando percebe que Giovanni e eu estamos nos encarando, prontos para matar um ao outro.

Enfim, engulo o caroço na garganta e balanço a cabeça, incrédula com o homem ao meu lado. Eu pego meu cartão, no suporte do telefone, e o entrego para Faith passar.

Estava fervendo de raiva, mas precisava respirar bem antes de abrir a boca outra vez, ou sairá tudo que esteve entupido durante três malditos anos.

Faith me devolve o cartão na mesma hora em que Dora entrega a Giovanni seu pedido. Ele ainda está me olhando, como se estivesse esperando minha reação, então eu lhe dou o que espera, mas não do jeito que ele provavelmente desejava.

Eu pego o saco de rosquinhas, guardo meu celular e cartão e me levanto da banqueta. Quando ergo o queixo para encará-lo outra vez, estou tão próxima, que sou capaz de sentir seu perfume. Mas eu não recuo ou vacilo, apenas empurro o indicador em seu peito e falo com uma calma controlada e sinistra:

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— Para sua informação, eu estou odiando isso tanto quanto você, mas infelizmente eu devo muito ao seu irmão.

Ele abaixa os olhos para o ponto onde eu estou tocando. Quando empurro com mais força, sua sobrancelha se levanta ainda mais, de uma forma quase divertida, e eu tenho vontade de bater nele.

Mas continuo:

— Se não quer esbarrar comigo, troque seu horário, mude de rota, chegue mais tarde, quando eu já estiver saído de lá ou foda-se, caso ache melhor. Mas eu não vou me intimidar, se é isso que você tentou fazer vindo até aqui, quando há uma loja dessas bem pertinho de você…

Ele estreita olhos azuis para os meus, o divertimento de antes parece ter ido embora com rapidez.

— Não seja ridícula!

Eu abaixo a mão para o lado do meu corpo e solto um riso dissimulado.

Oh, então eu estou sendo a ridícula aqui?

— Ah, e antes que eu me esqueça… — Eu passo por ele, me lembrando da sua maldita carta. — Reúna todo o seu dinheiro e soque você sabe onde!

Quando eu saio da lanchonete e o sol da Califórnia volta a aquecer minha pele, estou tremendo, com a raiva circulando nas veias, mas também feliz. Eu estive com isso entalado na garganta por três anos, só esperando uma oportunidade para colocar para fora.

Giovanni precisava saber que eu não sou mais a menina de vinte e um anos que se ajoelharia numa rua esburacada se ele pedisse; agora sou uma mulher independente de vinte e quatro anos, mãe solteira e uma profissional de sucesso.

Eu cresci e fiquei forte depois de toda a dor, todo o medo que passei durante uma gravidez problemática, um parto em que quase perdi minha filha e todo o esforço que ainda faço para garantir a ela uma saúde boa e para lidar com seu problema respiratório.

Mesmo com isso tudo, nunca recuei ou me intimidei. Muito pelo contrário. Isso me ajudou a meter a cara e não olhar para trás sempre que quiser alguma coisa.

Se eu vou contar sobre a Pérola? Sim, vou, é um direito dele saber, mas não ainda. Estou com muita raiva para me sentar com Giovanni em uma sala, a sós, e ter uma conversa civilizada.

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CAPÍTULO 3

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ela ainDa se afeta com a minha presença.

Mesmo tendo corrido para longe por tanto tempo, Aurora ainda é afetada pela minha proximidade, assim como eu com ela. Mas temos formas diferentes de esconder isso.

Eu tento me manter sério o máximo que consigo, erguendo meu muro particular anti-Aurora e focando apenas na raiva que corre nas veias. Ela ataca, encara, confronta. Muito diferente da Aurora doce e tímida que eu conhecia.

“Reúna todo seu dinheiro e soque você sabe onde!”

Mas do que ela estava falando?

Eu nunca fui de jogar a porcaria do dinheiro na cara dos outros, principalmente na dela. Sempre deixei muito claro que dinheiro é apenas uma coisa que caiu na minha cara de bandeja quando eu nasci. Eu nunca nem falei sobre isso com ela, então do que diabos ela está falando?

As portas dos elevadores se abrem no andar do meu escritório, e eu saio, a imagem de Aurora vestida com aquela roupa apertada de academia martelando na cabeça.

Caralho, ela mudou tanto.

Apesar dos traços duros de agora, seu belo rosto ainda continua lindo, perfeito; seu corpo, não, mudou completamente. Está mais cheio, mais

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definido. Eu pude ver com clareza enquanto ela se inclinava sobre o balcão antes de me ver.

Os quadris estão mais largos, a bunda, maior, mais malhada, as pernas, mais grossas e definidas. Pelo que pude notar quando ela se virou, os seios continuam do mesmo tamanho, mas com o restante todo mudado, lhe dão outra visão… Uma mais suculenta

Santo Deus, eu fiquei com água na boca e todo o corpo trêmulo por dentro, enquanto meu coração fazia seu trabalho na veia do meu pescoço; senti a necessidade imensa de tocá-la e sentir sua pele macia sob a fina camada de suor que a cobria.

São três anos de infelicidade. Eu forcei a mente para longe dela, depois que percebi que Aurora não iria mais voltar para mim, e agora é como se tudo estivesse voltando de uma só vez, num redemoinho do caralho.

Saudades, tesão, desejo, dor… tudo

Eu não me preocupo em cumprimentar ninguém quando sigo para o meu escritório. Ainda estou muito puto por Aurora ter insinuado que eu queria intimidá-la indo até aquela loja.

É ridículo!

Eu já aceitei essa merda, então tudo que preciso fazer agora é manter o máximo de distância possível. Eu só dirigi durante treze minutos até lá porque precisava do meu café da manhã, e a Twinke’s daqui da rua está fazendo uma porra de uma manutenção, então estará fechada durante os próximos dias; aquela é a mais próxima, que eu saiba. Realmente, eu não fazia ideia de que Aurora estaria ali, tampouco tinha ideia de que a encontraria justo comprando rosquinhas.

Ela nem gostava delas, pelo que me lembro…

Rita bate na minha porta alguns instantes depois, segurando a agenda contra o peito, e começa a listar os compromissos marcados para hoje. Sua voz está um pouco hesitante, amedrontada, e eu sei exatamente o motivo.

Tenho noção da carranca na minha expressão enquanto desato os dois botões do paletó, o deslizo pelos ombros e o estendo no encosto da cadeira; então me afundo nela. Eu provavelmente não estarei de bom humor hoje.

— Também há alguns projetos que solicitam um pouco de sua atenção — Rita continua a listar, tirando o cabelo negro da testa, com os dedos pálidos e finos. — E, a senhorita Thornburg ligou e agendou dez minutos com o senhor.

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— Que horas? — eu procuro saber, enquanto me inclino para ligar o monitor do computador.

— Hmm… — Ela dá uma olhada rápida na agenda. — Ah! Às onze.

Eu concordo, me encostando na cadeira.

— Ótimo, obrigado!

Eu a dispenso com um aceno de cabeça e relaxo a cabeça no encosto da cadeira; fecho os olhos por um tempo, afastando toda a imagem perfeita e deliciosa de Aurora Mitchell em roupas de academia. Em seguida, mergulho no trabalho.

Às onze em ponto, Rita põe a cabeça para dentro da minha sala. Quando ergo meu olhar do monitor, ela me oferece um sorriso de desculpas e diz:

— Senhor, a srta. Thornburg está aqui para vê-lo.

Eu balanço a cabeça, permitindo sua entrada, e minimizo a aba aberta do computador. Em seguida, um corpo alto e esguio adentra minha sala, com passos confiantes e sensuais.

Amanda Thornburg é uns poucos centímetros mais baixa do que eu. Ela tem uma beleza impressionante, com um corpo cheio de curvas e um rosto angular, perfeitamente desenhado; lábios cheios, olhos grandes, verde-escuros, e um nariz afilado, que ela faz questão de empinar ainda mais quando está em situações delicadas.

Amanda vive basicamente da própria imagem, apesar de ter recusado as inúmeras propostas para se tornar modelo profissional. Com milhões de seguidores no Instagram, Amanda é uma das mulheres mais cobiçadas do país, mas ainda assim, por algum motivo, cismou comigo.

Alguns blogs e revistas acham que é apenas pelo motivo óbvio: imagem, fama e seguidores. Uma vez que seu nome foi vinculado ao meu, e fotos nossas tiradas por paparazzi começaram a ser divulgadas, seu número de seguidores aumentou na velocidade da luz, como um blogueiro famoso defendeu. Em um minuto, ela tinha setecentos mil seguidores, no outro, estava ultrapassando os dois milhões.

O poder de um sobrenome importante, disse uma apresentadora de um programa de fofocas.

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Mas, por outro lado, outros acham apenas que ela sente algo por mim e que tem esperança de que possa preencher meu coração um dia. Não que eu perca meu tempo lendo sites de fofocas ou esse tipo de coisa, mas é simplesmente impossível não saber disso quando se tem uma irmã de dezenove anos e se é cercado de mulheres no trabalho e fora dele.

Amanda larga a bolsa em uma das cadeiras em frente à minha mesa e dá a volta, como sempre faz quando vem aqui. Ela para ao lado da minha cadeira e empurra a bunda contra a mesa, encostando-se e cruzando as pernas nuas uma sobre a outra. Eu mantenho o olhar em suas pernas, as mesmas que estiveram tanto ao redor da minha cintura depois que Aurora me deixou. Eu curti cada momento, mas então, de repente, eu não as acho tão macias e bonitas como costumava achar. De repente, minha mente está tentando despir a maldita calça de academia e saber se aquelas pernas grossas de Aurora ainda são tão macias como me lembro.

— Ei — Amanda chama em um sussurro que, até ontem de manhã, eu achava sexy e excitante. — Ei, tudo bem? — ela insiste, quando eu não movo os olhos de suas pernas. Acho que ela pode ver a expressão incrédula no meu rosto. Eu pisco, balançando a cabeça, e olho para ela.

— Sim. Tudo bem comigo. — Suspiro pesadamente. — Você? Então ela ri, meneando a cabeça levemente.

— Melhor agora. Estava preocupada, na verdade. Você não me ligou ontem, Gio, passei uma noite solitária sem você.

Ela faz seu beicinho bastante familiar para mim, mas que não causa nenhum efeito.

— Estava ocupado — minto.

Ela me observa, não acreditando em mim, e então se inclina um pouco e levanta a mão, passando suas unhas bem-feitas pelo meu maxilar.

— Eu sei que estou diante de um dos engenheiros mais solicitados do país, mas também sei que você não esteve ocupado ontem à noite. — Ela sorri quando suas unhas alcançam meu lábio inferior e pede em seguida:

— Me conte o que está acontecendo, Gio. Talvez eu possa ajudar.

— Não pode — garanto, me afastando do seu toque.

Ela estica a coluna, voltando à posição ereta, e suspira baixinho.

— Diz, por favor.

Aperto os olhos por sua insistência, e ela se encolhe um pouco em seu lugar.

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Amanda é uma mulher inteligente, mas infelizmente não o suficiente para entender que mesmo depois de três anos, essa coisa entre nós não passa de sexo. Ela age como se fôssemos namorados e quer sempre se meter na porra da minha vida particular com suas perguntas insistentes.

É tão incrivelmente frustrante tentar, em vão, colocar na sua cabeça que após o lance fodido com Aurora, não confio em nenhuma mulher. Que eu não quero ter um envolvimento sério com nenhuma, e isso a inclui no jogo. Mas, depois de alguns instantes, percebo que esse assunto não diz respeito à minha vida particular, porque Aurora não faz mais parte da minha vida, então é algo que ela ficará sabendo a qualquer momento por qualquer outra pessoa. Então eu apenas digo, como se fosse uma coisa sem importância — o que, de fato, é para mim.

— Melissa e Lucca chamaram Aurora para trabalhar na decoração da casa nova.

Amanda solta uma exclamação incrédula.

— Por quê?!

Dou de ombros e reabro a aba que estava trabalhando, encarando-a sem a menor ideia do que eu estou fazendo, assim Amanda não verá os sentimentos irritantes que insistem em se infiltrar em meus olhos quando penso nela.

— Quem essa… Melissa pensa que é? Ela é louca, por acaso? Eu nunca fui com aquela cara…

— Pare — eu a corto, meu tom é duro, assim como meu olhar. — Eu já avisei para você não falar assim da Mel, Amanda. Não toque no nome dela outra vez dessa forma, respeite-a. De qualquer forma, tenho certeza de que sua aprovação nunca foi uma coisa que ela precisasse.

Amanda abre a boca, atordoada, mas logo a fecha, engolindo duro, seus olhos frios. Mas quando ela volta a falar, a voz tem um tom de calma fingida:

— Sinto muito, Gio.

Eu permaneço com o maxilar trincado, e ela solta um lamento baixinho antes de se desencostar da mesa e caminhar para o centro da sala, com seus saltos fazendo um som irritante contra o piso de mármore do escritório.

— Mas por que a chamaram se vocês têm a Tiana bem aqui? — Ela se vira para me encarar, com suas mãos na cintura. — Você concordou com isso?

Eu desencosto da cadeira e posiciono meus braços sobre a mesa.

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— A Tiana é boa, mas a Aurora, infelizmente, é a melhor, e ela já trabalhou para Lucca antes, então ele confia nela.

Seus olhos inflamam, e ela repete a pergunta.

— Você concordou com isso?

Eu sinto a irritação chegar ao limite.

— Não tenho nada a ver com isso, porra! Eles a querem e eles a têm agora, e eu não me importo com isso!

— Não é isso que está demonstrando, Giovanni. — Ela aponta para mim. — Ela fugiu, lembra? Ela fugiu de você, e ainda assim você parece afetado por ela.

Rangendo os dentes, cerro as mãos em punhos, sabendo que Amanda está certa; nesse momento, só desejo que ela desapareça da minha frente.

Eu não preciso de ninguém me lembrando de que reagi à mulher que partiu meu coração! Eu não preciso de ninguém me lembrando do quanto pareço ridículo agora!

Então inalo algumas vezes e forço um tom tranquilo quando aponto para porta:

— Eu estou ocupado, Amanda. Por favor, me dê licença.

Eu vejo quando ela caminha até o outro lado da mesa e me lança um olhar de desculpas.

— Sinto muito, eu apenas estou tendo uma crise de ciúmes. Não me afaste…

Eu a corto:

— Você não precisa ter ciúmes de algo que não é seu, Amanda. — Eu deixo um suspiro cansado escapar. — Agora me dê licença. Se mais tarde eu precisar de você, eu ligo.

Ela inclina a cabeça.

— Promete?

— Vá!

Estou respirando de maneira pesada agora, cheio de tanta raiva, que preciso arrancar os primeiros botões da camisa para ajudar minha inalação quando Amanda finalmente vai embora.

Estou com raiva dela por sempre ser tão insignificante; estou com raiva da Aurora por ter entrado na minha vida outra vez, só para me perturbar; eu estou com raiva de mim porque não consigo esquecer essa mulher.

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Eu sempre me considerei um homem forte, mesmo depois de ser dilacerado, mas agora parece que foi tudo uma mentira. É como se a minha vida fosse uma mentira.

Eu não sou forte… pelo menos não perto dela; não quando se trata dela.

Estou com tesão só de pensar em Aurora e, de repente, não confio mais em mim quando penso nela.

Pela manhã, me levanto mais cedo que de costume para poder ter meia hora com meu saco de pancadas. Eu sequer consegui dormir à noite. Fechava os olhos, e a imagem de Aurora vinha na minha cabeça, como acontecia no começo, há três anos.

Quando desisti de tentar dormir e me levantei, meu peito estava apertado, e o pau duro como aço.

Eu estava com tanto ódio dela... Mas ao mesmo tempo com tanta saudade…

Depois de passar mais um bom tempo debaixo do jato forte do chuveiro, coloco apenas uma calça jeans e uma camisa branca. Havia mandado uma mensagem para Mel ontem avisando que estarei o dia inteiro em sua casa para terminar tudo antes da semana que vem.

Ela me liga, em vez de responder, para avisar que Aurora também estará lá a partir das dez da manhã, porque deseja começar hoje. Mel tem um tom preocupado, mas também posso notar um pouco de divertimento.

Eu desligo e então disco o número de Rita, minha secretária, e peço para ela ir ao Twinke’s comprar meu café da manhã. Estou indo para a casa ciente de que vou esbarrar com a fugitiva, mas não preciso esbarrar com ela antes disso.

Eu chego ao condomínio às nove e logo estou muito ocupado para pensar em qualquer outra coisa que não seja meu trabalho.

Estou puxando as mangas até o cotovelo quando minha visão periférica pega um movimento na cozinha da casa. Eu levanto os olhos com curiosidade, e meus dentes se fecham quando vejo Aurora dando ordens para dois homens vestidos com macacões de pintores.

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Eles a escutam atentamente, enquanto ela gesticula para todo lado, como se estivesse indicando as coisas.

Não posso evitar quando os olhos descem para seu corpo. Ela está toda de preto; a calça jeans de cintura alta agarra suas pernas grossas do mesmo jeito que a calça de academia fez ontem; a parte de cima é um body tomara que caia, forçando os seios para cima e deixando-os mais empinados do que já são, e ela está sobre um salto assassino, com os cabelos estão soltos ao redor dos ombros. Aurora segura o celular em uma mão e um iPad na outra.

Eu vejo Lucca entrar na cozinha, e então Aurora se vira para cumprimentá-lo, me dando a visão perfeita do seu bumbum sob a calça apertada.

Puta merda!

Eu forço os olhos a voltarem para minha camisa, repreendendo-me mentalmente. Você tem raiva dela, Giovanni! Apenas foque nisso. Ela pode estar gostosa, mas ela te abandonou. Foque na raiva!

— Como estamos indo? — Lucca se aproxima, com os braços abertos e o sorriso idiota para mim.

Reviro os olhos, ciente de que ele não pode ver através dos meus óculos de sol.

— O que faz aqui?

Ele encolhe os ombros e enfia as mãos nos bolsos.

— Fugi um pouco. Toda a agitação das garotas lá em casa com essa organização do casamento estava me deixando louco. Estão escolhendo cores, lembranças, vestido… — Ele ri, balançando a cabeça. — Eu não sei nem mais o que é sexo durante o dia, cara.

Sorrio, imaginando as garotas colocando-o para correr com tudo isso.

— Isso deve ser uma dor de cabeça e tanto — eu digo a ele.

— Você não imagina o quanto — murmura, divertido.

Então meus olhos estão de volta para a cozinha, eu vejo Aurora com uma mão na cintura fina, enquanto a outra está digitando algo no celular.

Sim, eu não posso imaginar…

— Você conversou com ela?

Eu pisco de volta para meu irmão, apertando o maxilar fechado.

— Por que eu deveria?

— Não sei. — Lucca dá de ombros. — Saber o motivo de ter ido embora, talvez? Deve ter uma explicação.

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Soltando um riso descrente, junto as palmas das mãos uma na outra e me viro para encará-lo.

— Lucca, ela não foi embora, ela fugiu — digo. — Nós íamos nos casar, íamos ter uma casa como esta… — Aponto brevemente para a casa. — E planejávamos ter filhos; um casal, para ser mais exato. Iam se chamar Nico e Pérola. Nós íamos viajar para Marselha… mas então ela fugiu . Ela fugiu e sequer teve a consideração de ligar para dar qualquer tipo absurdo de explicação.

Eu deixei o ar sair e entrar pela minha boca com calma e olhei na direção dela outra vez. Com o peito perto de explodir, falei em tom baixo para Lucca:

— E eu esperei. Você sabe que eu esperei, Lucca. Esperei por pelo menos uma mensagem por um bom tempo, porque, talvez, eu tivesse feito algo errado sem ter percebido e ela estivesse precisando dar um tempo. Mas Aurora nunca voltou ou ligou ou mandou mensagem. Ela apenas… nunca voltou.

Silêncio.

Pela primeira vez, Lucca Lazzari fica em silêncio por alguns instantes. Mas então ele cruza os braços sobre o peito e leva uma mão para cima, para coçar a sobrancelha.

— E você não acha suspeito? Não acha que para ela ter feito isso deve ter um motivo muito foda?

Eu rosno baixo.

— Lucca, ela fugiu porque quis

— Não, Giovanni. Tem de haver um motivo — ele insiste, com a voz dura. — Eu vi o modo como ela olhava para você, maravilhada e entregue. Eu presenciei o relacionamento de vocês, e era como Mel e eu somos agora. Vocês se amavam de verdade, pra caralho, e isso não morre de uma hora para outra, para ela correr para longe e não voltar mais.

Eu respiro fundo.

— Certo. Digamos que tenha um motivo… Não que isso sirva para alguma coisa agora. Mas então por que ela já não veio e contou? Ela voltou há quase um ano para a cidade, está trabalhando logo ali, na sua cozinha, por que diabos não vem até mim e diz qual foi o raio do motivo?

— Talvez porque ela ainda não descobriu como chegar até você.

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— Ela esteve cara a cara comigo nesses últimos dois dias e ontem, quando realmente falou, tudo que fez foi empurrar um dedo no peito e me mandar pegar meu dinheiro e enfiar você sabe onde.

Podia sentir a confusão correr através das minhas veias, juntamente com a raiva quando me lembro dessa parte.

Lucca me encarou, parecendo tão confuso quanto eu.

— Por que ela disse isso?

Eu rio, mas não um riso engraçado.

— Ah, mais um enigma para desvendar sobre Aurora Mitchell… — zombo.

— Ok. — Lucca bate as palmas para chamar minha atenção. — Você realmente precisa conversar com ela, irmão. Você é um homem adulto, de vinte e nove anos, porra! Até parece que eu sou mais velho que você. Abaixando o queixo, levanto uma sobrancelha.

— Sim, muito maduro, Lucca Lazzari de vinte e sete anos.

Ele sorri amplamente e caminha de costas até uma mesa que eu mandei colocar ali, olhando para mim enquanto fala.

— É claro que eu sou muito maduro. Eu vou casar e ter um filho!

Eu balanço a cabeça sorrindo, deixando o corpo relaxar um pouco da tensão quando vejo Lucca apontar para as rosquinhas que eu pedi para Rita trazer até aqui junto com meu café expresso.

Seu sorriso aumenta quando olha para mim.

— Isso são rosquinhas com cobertura de morango?

Eu aponto o dedo indicador, tentando parecer o mais sério possível quando aviso:

— Não ouse pegar. Nenhuma delas.

Mas para confirmar quão maduro meu irmão mais novo é, rapidamente pega uma das rosquinhas e volta com pressa para dentro da casa, olhando apenas por cima do ombro quando alcança as portas da cozinha, se certificando que não estou em seu encalço.

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