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COPYRIGHT © 2018. RYAN’S BED BY TIJAN
COPYRIGHT © 2023. ALLBOOK EDITORA.
Direção Editorial BEATRIZ SOARES
Tradução ANA CAROLINA CONSOLINI
Preparação e Revisão CLARA TAVEIRA, RAPHAEL PELLEGRINI E ALLBOOK EDITORA.
Adaptação de capa e diagramação CRISTIANE | SAAVEDRA EDIÇÕES
Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. Os direitos morais do autor foram declarados.
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995)
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
Meri Gleice Rodrigues de Souza – Bibliotecária – CRB-7/6439
T45n
Tijan
Na cama do Ryan / Tijan; tradução Ana Carolina Consolini. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Allbook, 2023 296 p. ; 23 cm.
Tradução de: Ryan's bed
ISBN: 978-65-80455-58-4
1. Romance americano. I. Consolini, Ana Carolina. II. Título.
23-82202
2023
PRODUZIDO NO BRASIL.
CONTATO@ALLBOOKEDITORA.COM
CDD 813
CDU: 82-31(73)
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Onde ela não deveria estar
TIJAN
TRADUÇÃO: ANA CAROLINA CONSOLINI
1ª EDIÇÃO – 2023 RIO DE JANEIRO
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NOTA DA AUTORA
Esse livro é para aqueles que sofrem com uma dor tão profunda e intensa, que acham que nunca vão se livrar dela. É também para aqueles que sofrem enquanto veem seus entes queridos sofrerem, se sentem impotentes e não conseguem acabar com a dor.
Nota: Todas as cidades e localizações são ficcionais.
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CAPÍTULO UM
Aprimeira vez que me esgueirei para a cama de Ryan Jensen foi um acidente. Eu estava deitada na cama ao lado de uma garota a quem eu tinha sido apresentada doze horas antes em um piquenique da empresa. Minha família tinha acabado de se mudar para Portside, Oregon, vinda de Schilling, Arizona, porque meu pai fora promovido, então todo o piquenique foi cheio de novos rostos, novos nomes e aquela sensação de ser a novata na cena. Portside não era enorme, mas também não era pequena – talvez cerca de vinte mil pessoas morassem neste subúrbio fora de Merridell. Robbie saberia. Meu irmão conseguia cuspir estatísticas porque ele era o gênio da família. Willow era a artista da família. Ela se destacou em quase tudo que envolvesse criatividade, ou assim parecia. Piano. Dança. Pintura. Certa vez, ela fez um dragão de papel machê de um metro e oitenta que ganhou uma competição estadual.
Vai por mim. Isso foi grande. Ela apareceu no noticiário local. Talvez tenha sido quando começou. Talvez ela tenha sentido como se tivesse de competir com Robbie.
Encontrei garrafas vazias de laxantes em nosso banheiro compartilhado, senti o cheiro de vômito seco no vaso sanitário, e algumas vezes acordei e a encontrei se exercitando no meio da noite. Nós éramos as duas únicas mulheres dentre os irmãos, então fazia sentido que dividíssemos um banheiro.
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Nós dividimos o quarto também, até nossos anos de pré-adolescência, e então ficamos livreees! (Estou dizendo isso no melhor grito ao estilo “Coração Valente” que posso imaginar.)
Eu não sabia por que ela achou que tinha de competir com Robbie. Ninguém poderia competir com aquele garoto. Ele estava andando, falando e comendo tecnologia. Robbie nunca seria normal, mas Willow e eu éramos… Ou eu era.
Eu não era a melhor em nada.
Willow era popular no Arizona. Eu não era.
Bem, eu não tinha fama de popular. Eu não estava no nível mais alto da hierarquia social, mas era querida. Todos me conheciam. Todo mundo foi legal comigo, porém, pensando bem, isso pode ter sido por causa da Willow. Se alguém veio até mim, eles foram até ela. E ela não era uma pessoa para se mexer.
Mesma coisa com as notas. Eu me saía bem. Minha média B+ me fez sorrir de orgulho. Mas não Willow. Era A+ ou o fim do mundo. Houve conversas em nossa velha escola sobre aumentar nosso GPA de uma escala de 4,0 para 4,2. Willow era totalmente a favor disso.
Eu, não. Isso significava que eu teria de me esforçar mais. Sem chance. Talvez esse fosse o meu papel na família. Eu era a procrastinadora.
Sim. Eu gostava daquilo. Eu era a procrastinadora da família — ou talvez fosse a preguiçosa. Havia uma diferença entre ser uma pessoa procrastinadora e ser preguiçosa. Uma não faz esforço nenhum, e a outra se destaca por evitar o esforço. Isso parecia se encaixar melhor.
Sim, era eu, e eu estava mais uma vez cumprindo meu papel quando errei a porta de Peach e entrei na ponta dos pés no quarto errado. Fui em busca de um copo d’água e me perdi tentando encontrar o quarto dela novamente. Era fácil de acontecer. O lugar era uma mansão.
Eu não percebi isso na época. Ambos os quartos estavam frescos, com ventiladores criando uma brisa e camas grandes e confortáveis. Aquelas pessoas eram ricas.
Espere, não eram de fato ricos.
Eles eram bem de vida. De acordo com minha irmã, havia uma diferença. Conheci Ryan e Peach no piquenique da empresa — ou melhor, conheci Peach. Eu assumi que ela recebeu esse apelido por seu cabelo ruivo felpudo. Sardas por todo o rosto. Olhos azuis. Tentava se misturar na multidão. Foi
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o que ela fez, assim como eu. Eu me misturei na multidão, enquanto Willow nunca fazia isso. Foi o mesmo com Peach e Ryan. Ela se misturou, e seu irmão, não.
Na verdade, não fui apresentada a Ryan, mas ele não precisava disso. Eu o notei de qualquer maneira. Ele era esse tipo de cara. As pessoas o notavam, até mesmo os adultos.
Cabelos castanhos dourados, compridos o suficiente para que caíssem sobre o rosto e ainda parecessem adoravelmente desgrenhados, olhos castanhos, queixo quadrado e uma covinha na bochecha direita – Ryan tinha um rosto pelo qual as garotas suspiravam. Mesmo com ele sentado a uma mesa de piquenique, era evidente que era alto, com uma constituição magra e ombros largos. Uma vez que sua camisa estava achatada contra o braço, também era óbvio que havia uma boa definição muscular por baixo.
O cara malhava.
E a julgar pelo olhar em seu rosto, ele estava entediado. Ryan estava sentado em uma mesa de piquenique com dois amigos, sem fazer nada. Ele não estava falando ou gritando ou acenando com os braços. Ele estava literalmente sentado com os pés descansando onde as pessoas normalmente sentam, e assim ele chamou a atenção. Seus cotovelos estavam apoiados nas pernas, e havia um ar ao redor dele. Ele exalava um carisma indiferente.
Eu não era o tipo de garota que vê um cara e o persegue de longe. Não, não, eu era do tipo que notava um cara e depois notava o cachorro-quente perto dele. Willow iria para o cara, eu iria para o cachorro-quente.
Prioridades, certo?
Mas mesmo não tendo falado com Ryan antes, eu sabia que ele era popular. Uma pessoa simplesmente sabe, e meu palpite foi confirmado quando duas garotas passaram por ele. Elas pararam, com as mãos na frente de seus rostos, e sussurraram uma para a outra. Um dos amigos de Ryan bateu em sua perna e gesticulou para as meninas. Ele olhou, e as garotas explodiram em risadinhas antes de fugir, os rostos vermelhos de vergonha.
Enquanto isso, Willow se recusou a vir, então eu estava sozinha, sentada à minha própria mesa, me sentindo uma perdedora enquanto olhava para todas as outras crianças do local.
Todos eles eram bonitos ou notáveis de alguma forma. E todos conseguiram se encontrar, como com meu irmãozinho. Ele estava em uma mesa com dois outros meninos e uma menina. Todos estavam focados em seus iPads.
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Eu tinha quase certeza de que eles estavam falando a língua dos nerds, e se eu tivesse ido até lá, a conversa entre as crianças de onze anos teria passado por cima da minha cabeça.
Mais uma vez, eu era a preguiçosa da família. Eu deveria ser capaz de me comunicar com uma criança de onze anos, mas não. Eu tinha ido a outros passeios com Robbie. Eu conhecia a rotina. Ele encontrava sua turma, e eu poderia dizer que ele estava feliz.
Por outro lado, Robbie nunca suportou o que outro gênio de onze anos de idade poderia.
Ele nunca foi intimidado por ser inteligente. Ele quase foi adorado. As pessoas achavam que ele seria o próximo Steve Jobs, e seus colegas de classe tinham percebido, já o puxando para cima. Sim, talvez houvesse um garoto invejoso de vez em quando, mas Robbie nunca falava sobre isso. Se ele foi perseguido, eu me perguntei se ele estava mesmo ciente disso.
Eu me perguntava como as coisas seriam para ele… depois. Robbie sempre pareceu feliz. Será que parte disso desapareceria? Eu esperava que não — pare.
Mente, volte aqui. Uma volta mental, e foquemos em Ryan novamente. Eu deveria saber que algo estava diferente no minuto em que minha cabeça encostou no travesseiro em seu quarto. Eu me senti quente, à vontade, e meu corpo relaxou. Não deveria. Eu deveria ter permanecido acordada, assim como estava na cama de Peach. Eles disseram que seria “melhor” não estar sozinha naquela noite, então eu estava na cama de uma estranha. Eu estava tensa e agarrando o lençol com as mãos, deixando os nós dos dedos brancos e repassando na minha cabeça o que tinha acontecido na minha nova casa mais cedo, de novo, e de novo.
Mas não na cama de Ryan.
Ele ficou tão surpreso quanto eu quando acordamos na manhã seguinte. Ele se endireitou.
— O quê? — ele perguntou, sua boca aberta olhando para mim.
Eu agarrei as cobertas, me certifiquei de que elas estavam bem puxadas sobre mim e olhei de volta para ele. Era isso, realmente. Meu corpo ainda estava relaxado. Apenas minha mente estava alarmada, mas então minha mente perdeu a batalha. Havia outra merda lá em cima que eu não queria mexer e pensar, então cedi e deixei minhas pálpebras caírem novamente.
— Eu devo ter me perdido — murmurei.
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Ryan e eu não conversamos – nem no piquenique mais cedo, quando nossos pais se cumprimentaram, nem quando Robbie e eu estávamos entrando em sua casa naquela noite. Tudo estava em silêncio quando chegamos lá.
A sra. Jensen havia sussurrado algo para Peach, e ela ofegou, sua mão cobrindo a boca enquanto seus olhos se enchiam de lágrimas.
Desviei o olhar naquele momento. Meu queixo começou a tremer, e eu não queria começar. Se eu começasse, não sabia se conseguiria parar.
Então, lá na escuridão foi a primeira vez que Ryan e eu conversamos, e não era realmente uma conversa. Ele olhou para a porta como se devesse contar a alguém, mas eu disse:
— Por favor, não. Eu não consegui dormir até chegar aqui. Não sei por que, mas agora consigo. Eu só quero dormir.
Suas sobrancelhas se juntaram. Sua covinha desapareceu, e lentamente ele se deitou. Ryan não disse nada. Um minuto se passou, e eu percebi que ele não iria. Ele ia me deixar dormir, e, felizmente, foi exatamente o que aconteceu. Eu dormi.
— Não sei, mãe. Acordei, e ela estava lá. — Eu podia ouvir Ryan do outro lado da porta.
— Bem, eu não entendo.
— Eu também não — ele resmungou.
— Achei estranho quando ela não voltou ontem à noite. — Um suspiro. Reconheci a voz de Peach, mas não consegui identificar de onde vinha. Então não importava. Eu estava dormindo novamente. b
A cama se mexeu embaixo de mim e ouvi um sussurro:
— Mackenzie. — Uma mão tocou meu braço e tremeu. — Ei. Você está acordada?
Era Robbie. Eu rolei e abri um olho.
— O quê? — Ele estava chorando. As lágrimas secaram em seu rosto, e eu pude ver duas novas grudadas em seus cílios. Ele enxugou o rosto, envergonhado.
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— Você vai dormir o dia todo?
— Se eu tiver sorte.
Ele franziu a testa e então olhou para a porta.
— Eu não quero estar lá sozinho. Eu não conheço essas pessoas.
Eu me afastei até sentir a parede, puxei a colcha para trás e dei um tapinha no lugar ao meu lado.
— Vem.
Ele olhou para a porta novamente, indecisão em seu rosto, e então soltou um pequeno suspiro. Seus ombros minúsculos caíram, como se ele tivesse perdido a pequena luta mental que travava em silêncio. Ele afundou na cama, apertando as cobertas sobre o ombro, e olhou para mim, deitado de lado. Aproximei-me, espelhando-o para que nossas testas quase se tocassem. Não conversamos, mas uma nova lágrima brotou, acumulando-se na ponta de seu nariz. Estendi a mão e enxuguei-a.
— Mamãe e papai vão ficar fora o dia todo hoje. Eu verifiquei o calendário do telefone deles.
Como Robbie poderia fazer isso, eu não tinha ideia, mas não fiquei surpresa.
— Por que você não está chorando? — ele sussurrou.
— Não consigo.
Ele assentiu como se isso fizesse todo o sentido.
— Eu gostaria de ser como você às vezes. Você é a forte, Kenz. Forte? Era esse o meu papel na família?
Tentei dar um sorriso, mas sabia que havia falhado. Eu provavelmente parecia o Coringa em vez disso.
— Consegue dormir?
— Vou tentar. Podemos ficar aqui o dia todo?
— Vou tentar.
Parecia o suficiente para ele. Ele fechou os olhos, e uma expressão serena apareceu em seu rosto, uma que parecia de paz. Mas eu sabia que era mentira. Não havia paz. Não mais.
— Ei, Kenz — ele sussurrou um minuto depois.
— Sim?
— Feliz aniversário. b
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Estava escuro quando acordei novamente, e Robbie tinha ido embora. A porta estava aberta, e eu podia ouvir o som de talheres raspando nos pratos. O cheiro de comida deve ter me acordado, e, por um momento, fiquei zangada.
Eles poderiam ter fechado a porta. Mas então o nevoeiro deixou meu cérebro e percebi que provavelmente foi Robbie quem a deixou aberta. Ele tinha o hábito de fazer isso, e isso sempre irritava Willow.
Willow…
O pequeno sorriso que tinha puxado o canto da minha boca desapareceu. Deus.
Eu respirei fundo, e desta vez eu sabia que não poderia manter os pensamentos sob controle. b
Era um cheiro estranho. Um cheiro rico e enferrujado, como metal molhado. Isso fez meu estômago doer, eu estava mordendo o lábio antes mesmo de abrir a porta do banheiro. O braço de Willow tinha sido arranhado mais cedo quando estávamos movendo caixas pela casa. Se ela tivesse tirado o curativo e jogado no balcão, eu ficaria chateada. Ela estava sempre gritando comigo por deixar minha escova de dentes e pasta no balcão. Tudo tinha um lugar em seu mundo, e pela vida dela, ela não conseguia entender por que eu não me lembrava disso.
Minha resposta era sempre a mesma: porque eu não era uma maníaca por controle totalmente obsessiva. Isso geralmente a irritava, mas, desta vez, eu seria a única a explodir. Willow não saberia o que estava vindo em sua direção. Eu ia agitar meus braços no ar, bater os pés e gritar como se não me importasse.
Ela sabia o quanto eu odiava sangue.
Mas então eu estava lá, empurrando a porta.
Não me lembro quando percebi o que estava vendo. Acho que senti alguma coisa, porque depois me contaram que entrei em choque. Meu corpo se desligou, e eu o deixei ficar assim. Eles disseram que isso poderia acontecer quando uma pessoa passa por um evento traumático, mas tudo o que eu sabia era que assisti da porta enquanto meu corpo caía de joelhos.
Minha mão cobriu minha boca, e meus ombros estremeceram como se eu estivesse vomitando. Soube mais tarde que estava gritando.
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Então eu a estava sacudindo, deslizando no sangue no chão, porque estava em toda parte. Pensando nisso, eu podia reviver a sensação nas minhas mãos. Quente. Os líquidos deveriam ser refrescantes e leves. Aquilo era pesado. Não parecia diferente da temperatura do meu próprio corpo. Eu não gostei. Deveria ser diferente. Porque era de Willow, deveria parecer perfeito. Fiquei na porta enquanto me observava. E continuei gritando, até que, de repente, parei. Engasguei com um soluço, e assim, eu estava de volta ao meu corpo.
Meu rosto: olhos escuros, cabelo loiro dourado, queixo em forma de coração.
Meu corpo: braços finos, pernas longas e estrutura pequena.
Meu coração: lindo, partido, sangrando.
Tudo isso no chão do banheiro em uma pilha ensanguentada.
Sentindo uma estranha serenidade, respirei fundo e me aproximei de Willow. Sentei-me no azulejo que o sangue ainda não havia tocado. Mas tocaria. Estava vazando dela.
Eu sabia que ela já tinha ido. Seus olhos estavam vagos, mas eu queria mais um momento. Minha irmã e eu.
Eu me deitei, assim como ela.
De bruços.
Meu rosto se virou para o dela.
Minha mão no chão, palma para cima, espelhando-a.
Eu cuidei da minha irmã uma última vez antes de sermos descobertas.
Houve um clarão de luz. Alguém estava entrando pelo meu quarto — mamãe. Eu não olhei para ela. Não consegui ouvir muito. Uma nuvem densa veio sobre mim, entorpecendo meus sentidos, mas eu a ouvi gritando, como se ela estivesse longe.
Ela estava sacudindo Willow.
O tempo acelerou. O tempo diminuiu para um lento arrastar. O tempo estava em todo lugar, em pedaços.
Quando notei as sirenes, o flash de vermelho e branco do lado de fora da janela do meu quarto, estendi a mão e segurei a mão de Willow.
Meu rosto. Meu corpo. Meu coração – tudo se foi com ela, porque ela era eu.
Minha irmã gêmea se suicidou em 29 de junho.
Faríamos dezoito anos no dia seguinte.
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CAPÍTULO DOIS
A h. Ei.
Eram quase onze horas da noite seguinte. Robbie e eu estávamos lá há quase vinte e quatro horas. Eu não tinha saído do quarto de Ryan, exceto para ir ao banheiro, e atualmente estava sentada em sua cama, livro na mão. Ele entrou no quarto, com as mãos nos bolsos e os ombros curvados para a frente.
Eu deveria ter sentido todo tipo de estranheza, mas estava naquele ponto em que me sentaria no telhado e não daria a mínima para o que alguém tivesse a dizer. Mantendo meu dedo entre as páginas, fechei o livro e esperei.
— Hm… — Ele fez uma pausa, olhando diretamente para mim.
Ele não tinha ideia do que dizer. Eu via a confusão em seu rosto, mas Ryan sacudiu a cabeça, e um pequeno sorriso apareceu. Sua covinha piscou para mim. Ele passou a mão pelo cabelo, deixando-o tão desarrumado quanto ontem. Eu sabia por que aquelas duas garotas cochicharam. Ele era do tipo garoto dos sonhos.
Esperei que a faísca piscasse para mim. Eu deveria corar? Rir?
Suspirar?
Não. Nada.
Eu não senti nada, e então me lembrei de como era deitar na cama dele, e percebi que não era verdade. Eu senti alguma paz em torno dele por algum motivo.
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Ele entrou mais no cômodo, olhando para trás na porta antes de se encostar em seu armário.
— A coisa toda da minha cama… — Ele apontou para onde eu estava sentada. — Você quer a cama de novo esta noite?
Olhei para baixo. Eu não queria ver seus olhos quando fiz essa pergunta.
— Meus pais vão voltar?
Houve silêncio, e se estendeu além do ponto de não ter uma resposta. Ele tinha uma. Ele só não queria dizer isso.
Eu balancei minha cabeça, deixando o livro cair na cama. Passando meus braços em volta de mim, eu me virei.
— Deixa para lá.
Ele limpou a garganta.
— Para que conste, eu não deveria saber sobre seus pais.
Eu olhei para trás.
— Mas você sabe?
A hesitação e o medo que eu tinha visto em seu rosto se dissiparam, revelando tristeza, e ele assentiu.
— Sim. Eu escutei a ligação. Eles estão em um hotel. Acho que seus avós estão vindo amanhã.
— Oh. Ok. — Limpei a garganta. — Obrigada.
— Sim. — Ele suspirou. — Você não precisa me agradecer por nada, mas eu tenho que saber sobre a cama. Eu estava tentando dizer à minha mãe que talvez fosse melhor eu, tipo, você consegue dormir quando está perto de mim por causa dos meus feromônios adolescentes ou algo assim. Eu abri um sorriso.
— É uma teoria.
— Ei, nem todos nós somos crianças Einsteins como seu irmão.
— Touché, nem eu. Eu sou a única normal na minha família. Mas eu não era mais normal.
— Sim.
Talvez ele tenha pensado a mesma coisa, porque outro silêncio desceu sobre nós. Parecia um silêncio sombrio também, como se talvez nós dois tivéssemos percebido a verdadeira caricatura dessa situação. Minha notável qualidade passou de preguiçosa para a gêmea sobrevivente.
— Bem, foda-se — soltei em um fôlego só.
Ele estava mexendo em seu jeans, mas olhou para cima.
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— O quê?
— Nada. Sim, eu gostaria de dormir na sua cama, se estiver tudo bem para você.
— Tudo bem por mim. — Ele sorriu. — Foi meio legal acordar e encontrar uma gostosa na cama comigo. Meus amigos vão se divertir com isso…
— Você não vai contar a eles!
Seus olhos se arregalaram.
— Não. Eu sei, eu não faria isso, quero dizer, eu não sou esse tipo de cara. Minha irmã tem uma queda por um dos meus amigos. Ela já disse a ele. Eu também ouvi esse telefonema.
— O que você é? Uma Veronica Mars versão masculina?
Ele bufou, mas aquela covinha dele estava flertando comigo.
— Eu fico entediado facilmente — disse ele. — Eu presto atenção nas coisas para me manter ocupado. Você sabe, como a síndrome das pernas inquietas? Eu tenho isso, mas é todo o meu corpo e cérebro. Às vezes não desliga.
— Oh.
— De qualquer forma, mamãe disse que eu não poderia jogar hoje. Ela estava preocupada que alguns dos meus amigos aparecessem, e ela não queria que nenhuma notícia se espalhasse. — Ele bufou, revirando os olhos. — Serei culpado por isso, mas é sempre Peach quem conta. Ela nunca fica em apuros.
Robbie era amado. Willow era perfeita. E acho que fui eu que tive problemas, como ele.
— É o mesmo para mim — eu completei fracamente. Fui culpada pelos laxantes. Eles achavam que era eu quem tinha um distúrbio alimentar. Eles ignoraram a tigela de Cheetos na minha frente durante a conversa de “intervenção”.
— Mackenzie, seu pai e eu queremos que você saiba que nós te amamos muito. A aparência não define nossa autoestima… Houve outras vezes, como quando Willow queria que eu pedisse para eles uma esteira. Eles não a viram durante o dia, só eu. Ela correu no parque durante o dia e depois usou a esteira à noite. Fiz os trinta minutos normais que o treinador Ellerson exigia de nós durante o período entre temporadas para o futebol. Eu deveria ter feito mais, mas Cheetos e ser preguiçosa eram muito mais divertidos.
— Então… — Ryan me tirou dos meus pensamentos.
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Eu quase caí no chão, de tanto alívio. Sem mais memórias.
Ele puxou uma de suas mangas.
— Você, uh, quer que eu fique com você? Ou, quero dizer, você quer dormir sozinha? — Ele falou apressadamente: — Eu topo qualquer uma das opções, sem problemas. Você só me avisa.
— O quê? — Alguém bateu na porta. Um toque rápido e forte. Ele gemeu.
— Minha mãe disse que está tudo bem, mas ela vai colocar uma câmera de babá em nós. Então, você sabe, sem gracinhas. — Sua cabeça se ergueu rapidamente. — Não que seja isso que eu tenho em mente. Quero dizer, você é gostosa, mas está de luto. Você perdeu sua irmã, então… você sabe…
— Ele se encolheu, xingando baixinho. — Desculpa. Eu não deveria ter dito essa última parte. Desculpa. Vou calar a boca antes de dizer mais merda.
— O quê? — eu perguntei, esperando que a curva ascendente dos meus lábios se assemelhasse a um sorriso, ou melhor ainda, algo legal e talvez até sedutor. — Você quer dizer que nunca lhe pediram para fingir que é um conselheiro de luto?
Ele soltou uma risada. Então seus olhos escureceram.
— Perdi um amigo há quase dois anos, então sei o que você está passando. Mais ou menos. Na verdade, não. Quero dizer, ele não era meu irmão ou meu gêmeo ou qualquer coisa, então não é a mesma coisa. Mas… — Ryan parou, fechando os olhos por um momento.
Perda era perda, no que me dizia respeito. Sim, poderia haver diferentes graus disso, mas era a mesma emoção. A única coisa que diferenciava era se vinha de repente ou devagar. Mas guardei isso para mim porque, honestamente, quem diabos queria falar sobre isso?
Apontei para sua televisão e videogame.
— Você tem Warcraft?
— Sim. — Ele se iluminou. — Você joga?
— Tive uma vontade repentina de aprender.
— Tudo bem. — Ele pegou um controle na mesa, encontrou o outro ao lado da cama, então subiu ao meu lado. Encostado na parede, com a perna ao lado da minha, Ryan me ensinou a jogar. Seu braço e mão roçaram nos meus aleatoriamente, e toda vez que faziam isso, eu sentia um formigamento pequeno, mas quente.
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Jogamos Warcraft a maior parte da noite. Robbie jogou conosco também, até que eu o convenci a ir para a cama. Ryan e eu só apagamos a luz quando sua mãe enfiou a cabeça pela porta.
— Já passa das duas — ela nos disse. — Hora de dormir. — Ela me deu um sorriso suave. — Espero que você consiga dormir bem, Mackenzie. Eu também.
Ela deu a Ryan um olhar aguçado, virando os olhos para um rinoceronte de pelúcia em sua mesa. Uma luz vermelha piscou em seu nariz. Ryan passou a mão pelo cabelo.
— Sim, mãe.
— Boa noite para vocês dois. b
Na manhã seguinte, me aventurei pela primeira vez na cozinha e a encontrei cheia de uma tensão desconfortável. Eles podiam já estar sentados em silêncio antes de eu aparecer, mas eu duvidava. Eu não precisava que Robbie decifrasse quem tinha sido o assunto da conversa dois segundos antes da minha chegada. Foi uma daquelas cenas em que você entra e sabe que eles estavam falando de você.
A sra. Jensen estava no balcão, fazendo café. Peach sentou-se à mesa, e uma senhora de meia-idade – eu assumi ser a empregada ou algo assim –colocou Cheerios na frente dela. Eu tive de parar e absorver isso. Uma empregada. E ela estava usando um vestido azul com um avental branco por cima.
Essas pessoas não tinham apenas funcionários; eles tinham funcionários uniformizados. Isso foi, tipo, um outro nível. Ricos, bem de vida mesmo. Isso era o que Willow teria dito, e ela estava certa. Ela sempre estava certa.
— Mackenzie. — A sra. Jensen parecia sem fôlego. Suas bochechas coraram um pouco, e ela passou a mão pelo cabelo. — Como você está?
Você dormiu bem?
Eu tinha dormido bem, e olhei para Ryan, que estava vindo do lado de fora. Uma brisa quente veio com ele. Ao me ver, ele parou com a mão ainda na maçaneta da porta. Sua boca formou um O, e ele agarrou uma bola de basquete na outra mão.
— Ei!
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Peach fez um som. Eu registrei no fundo da minha mente, mas ignorei. Eu podia ouvir a desaprovação em sua voz, e eu já sabia quem seriam os amigos de Peach na escola. Ela andava com as garotas esnobes – más, maliciosas, julgando os outros alunos abaixo delas. Esse tipo de garota. E em outras palavras, definitivamente não é meu tipo.
— Ei. — Dei um breve aceno, olhando para o lado. Robbie sentou-se ao lado de Peach e levantou a mão para acenar antes de cair de volta em seu colo. Notei a torrada na frente dele, como estava intocada. Meu olhar desviou. Eu não queria ver a tristeza ou as bolsas sob os olhos do meu irmãozinho. Eu não queria lembrar por quê.
— Uh, que tal se sentar, Mackenzie? — A sra. Jensen estendeu um braço para uma cadeira em frente a Peach.
Sentei-me na cadeira ao lado, em frente ao meu irmão. Ela limpou a garganta, segurando uma xícara de café bem na frente do peito como se estivesse se protegendo.
— Torrada, Mackenzie? Rose poderia fazer uma para você. No momento seguinte, eu tinha um pedaço de torrada com manteiga na minha frente, mas não conseguia tocá-lo. Peach circulou sua colher em sua tigela de Cheerios. Ela estava olhando para mim com uma pitada de confusão. Eu levantei uma sobrancelha.
— Sim?
Ela baixou o olhar, mas ainda circulou a colher em torno de sua tigela. Ryan caiu na cadeira no final da mesa, entre meu irmão e eu, então ele estava de frente para a cozinha.
Tanto a sra. Jensen, quanto Rose se preocuparam com ele. Que tipo de cereal ele queria? Ah, ele não queria cereais. Torrada? Bacon? Espere, Rose poderia preparar algumas panquecas. Não quer panquecas? Rabanada, então? Após a quinta pergunta, Ryan se levantou e serviu sua própria tigela de cereal, revirando os olhos enquanto voltava para sua cadeira.
— Lei… — Sua mãe começou a sugerir, mas ele já pegou e derramou um bocado em sua tigela.
— Pare com isso, mãe — ele resmungou, curvando-se sobre sua tigela.
— Faz isso com a Peach. Ela realmente gosta disso.
— Eu não.
Ele atirou-lhe um olhar, a colher posicionada na frente de seu corpo.
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— Você gosta, sim. A coisa toda de ser mimada funciona para você. Você adora.
Ela transferiu seu olhar para ele, me dando um descanso.
— Você é tão idiota às vezes.
Um sorriso arrogante se espalhou por seu rosto.
— Às vezes? Eu ouvi você no telefone com Erin. Eu achei que eu era idiota sempre, não?
Seus olhos se arregalaram, e ela bateu a mão na mesa.
— Pare de ouvir minhas ligações! — Sua cabeça virou. — Mamãe!
Ryan deu de ombros.
— Não é minha culpa que sua voz alcance toda a casa. Feche a porta da próxima vez. — Ele revirou os olhos. — Pode ajudar, gênio.
— Ok, vocês dois. Parem com isso — a mãe decidiu interromper, sentada à cabeceira da mesa. Sua xícara permaneceu sendo agarrada com ambas as mãos. Um sorriso congelado, mas educado, apareceu quando ela se virou para mim. — Mackenzie, você e Ryan estão na mesma série. Você é veterana, certo?
Afinal, milagres aconteciam.
Eu balancei a cabeça.
Os olhos de Peach se estreitaram em mim, esperando uma reação. Mantive meu rosto reto, mas estava dando cambalhotas por dentro.
A sra. Jensen limpou a garganta.
— Seus avós vão chegar hoje. Eles vão pegar você e seu irmão e levá-los de volta para casa… ou… um hotel. Na verdade, não tenho certeza de para onde vocês vão, mas sei que eles estão ansiosos para vê-los.
— Vovó está vindo? — A cabeça de Robbie levantou. Lancei-lhe um olhar.
— Não viu isso no calendário, hein?
Ele revirou os olhos, mas um canto de sua boca se ergueu. Ele se recostou em seu assento.
— Eu não posso verificar tudo.
— O quê? — eu o provoquei. — Como isso é possível?
Ele deu de ombros, mas qualquer coisa que ele pudesse dizer foi interrompida. A sra. Jensen exalou uma risada aliviada e forçada.
— Brian me disse que um dos filhos de Phillip era brilhante. Deve ser você, Robert.
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Robert. Eu quase zombei do nome que ninguém o chamava, exceto vovó.
A sra. Jensen continuou, inclinando-se para frente para sorrir para Robbie.
— Portside tem um programa avançado para crianças superdotadas como você. Acho que você vai gostar muito. Eu sei que às vezes as crianças excepcionais podem ser rejeitadas por seus pares em outros lugares, mas tenha certeza… — Sua voz estava tão alegre. — Esse não é o caso de Portside. Ela fez uma pausa, esperando que Robbie dissesse alguma coisa. Ele olhou para ela e depois para mim. Sua pequena mão agarrou um garfo, e duas lágrimas brotaram em seus olhos. Ele desviou o olhar.
— Oh. — O canto de sua boca baixou. — Querido. Merda. Era hora de cumprir meu dever de irmã mais velha. Eu tossi e empurrei minha cadeira para trás.
— Obrigada pelo café da manhã, sra. Jensen. Ela empalideceu, mas tentou reunir outro sorriso para mim.
— Sim, bem, você deveria agradecer a Rose. Ela faz a maioria das nossas refeições. Não saberíamos o que fazer sem ela. — Ela se virou para Rose, que parou na pia. — Certo, Rose? A casa inteira desmoronaria se não fosse por você.
— Sim, sra. Jensen. Sim.
A sra. Jensen riu, e eu tentei não estremecer com quão falso isso soava. Sua mão veio descansar em seu peito.
— Bem, eu mencionei a escola antes porque Peach vai receber alguns de seus amigos no final da semana. Se você quiser… Ryan gemeu.
Ela não mostrou nenhum sinal de ouvi-lo.
— Vir e conhecer alguns deles. Suas amigas são tão bem-comportadas e são boas garotas. Elas são do tipo com quem você gostaria de ser amiga. Certo, Peach? Você e suas amigas parecem as garotas populares da sua classe, embora Mackenzie esteja uma série acima de você.
— Mamãe! — Ela também ficou horrorizada. — Cale-se.
— Mãe — Ryan falou lentamente. — Ela não quer sair com estranhos agora.
— Mmm?
Eu só pude ficar sentada assistindo àquilo se desenrolar na minha frente.
A sra. Jensen parecia alheia, tomando seu café como se fosse um soro cheio de morfina. Eu fiz uma careta, examinando os fundos da cozinha em busca
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de uma dica de que talvez ela colocasse outra coisa lá além de café. Então senti o pé de Robbie pressionando o topo do meu joelho. Ele se empurrou contra a mesa, se apoiando enquanto esticava a perna até mim.
Eu pensei que tinha feito meu dever de irmã antes, tirando a atenção dele, então levantei uma sobrancelha para ele. Ele murmurou a palavra banheiro. Eu balancei a cabeça.
— Podemos nos levantar da mesa?
— Nós? — A sra. Jensen olhou de mim para meu irmão. — Oh. Sim. É claro. — Seus olhos caíram para nossos pratos. — Nenhum de vocês comeu. Tudo bem, Rose? Podemos ter certeza de que há comida pronta caso eles queiram comer algo mais tarde? Podemos pedir bagels se não tivermos nenhum à mão.
Deus. Bagels. Senti uma chicotada com essa palavra.
— Willow, você não está com fome?
Minha mãe nunca soube. Certo? Não que ela não quisesse saber. Certo?
— Bem, nós temos bagels, Willow. Certifique-se de pegar um, ok? Você precisa começar bem a manhã. Faça um lanche durante o dia, se precisar.
Lágrimas ameaçaram cair, mas não, eu não choraria. Sem chance. A cadeira de Robbie raspou no chão. Ele empurrou de volta e ficou ali, com uma expressão de surpresa no rosto, como se não percebesse o que tinha feito.
— hm… — Sua boca se abriu: nada. Fechou. Então abriu. Nada ainda.
Eu disse baixinho:
— Banheiro.
— Oh, sim. — Ele disparou ao redor da mesa, ao redor de Ryan, e correu escada acima.
Outro silêncio desconfortável desceu.
Olhei para o meu colo, afinal, honestamente, por que eu iria querer ver a pena deles? Eu tive de lembrar meu irmãozinho do motivo para ele se levantar da mesa. Isso não era normal, e nada sobre a nossa visita era. Não éramos amigos dessas pessoas. Mal os conhecíamos. Não tínhamos outros amigos ou familiares aqui. Quer dizer, eu tinha certeza de que era meio que amiga de Ryan, mas não estávamos lá para uma visita divertida.
Eu podia sentir a atenção deles. Eu odiava isso.
Willow queria atenção. Ela e Robbie. Mas eu recebia, e não do jeito que eu sempre entendia antes. Eu era a descontraída. Aquela que sabia brincar.
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A do fundo. Aquela que todos sempre esqueceram. Eu era a firme. Esse tipo de atenção - ou falta de atenção - era o que eu gostava. Essa atenção, eu detestava.
Não era minha praia. Tinha sido forçada em mim.
Limpei a garganta e decidi que precisava sair de lá. Eu me virei para Ryan.
— Warcraft até meus avós aparecerem?
Ele se levantou imediatamente.
— Claro que sim.
Ele estava tão feliz quanto eu por deixar aquela cozinha. Eu deveria ter me perguntado por que, mas não o fiz.
Passamos o resto do dia em seu quarto, Robbie também, até que a campainha tocou por volta das sete da noite.
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CAPÍTULO TRÊS
Tudo ficou real quando vovó e vovô Bill chegaram. Houve lágrimas. Abraços. Batidas nas costas, muitas. E isso foi entre os adultos.
— Eles já se conheciam antes? — Robbie me perguntou em um sussurro. Uma vez que eles se viraram para nós, ele ficou do meu lado. Ainda assim, Robbie quase foi atacado por vovó.
Ryan, que estava encostado na parede ao meu lado, bufou, mas tossiu para disfarçar quando sua irmã lhe lançou um olhar sombrio. Em seguida, transferiu para mim antes que ela parecesse lembrar do motivo de eu estar lá. Sua cabeça pendeu, e ela chutou o chão. Eu realmente não podia culpar Peach. Acho que eu não era como as outras garotas que ela conhecia. Quer dizer, eu não estava chorando. Eu saí de sua cama e grudei como cola em seu irmão, e nas poucas vezes que ela falou comigo, não fui a mais receptiva. Eu não fui rude. Mas não respondi a ela do jeito que ela estava claramente acostumada. Esse era o papel de Willow. Ela tinha sido a social, a envolvente.
A perfeita.
Cruzei os braços sobre Robbie, puxando-o de volta contra mim, e descansei meu queixo em cima de sua cabeça.
— Não. Acho que a vovó precisa chorar. Isso é tudo. Robbie encontrou minhas mãos e segurou firme.
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— Parece que o vovô também quer chorar.
De pé ao lado, vovô Bill segurava um lenço de pano branco na mão. Ele sempre tinha um no bolso, vovó insistia, mas eu nunca o tinha visto usá-lo antes de hoje. Enquanto a vovó conversava com o sr. e a sra. Jensen, vovô Bill torceu o nariz, piscou algumas vezes e virou para o lado. Sua mão se ergueu ele se virasse, e ele piscou os olhos mais algumas vezes. No final, ele ergueu os ombros e os rolou para trás, como se tivesse que ficar se lembrando de ficar de pé.
A conversa começou a diminuir, e essa foi a minha deixa para me preparar.
Eu sabia que as perguntas de vovó para mim começariam em breve.
Se eu sabia de alguma coisa? Willow disse alguma coisa antes de acontecer? Alguém poderia ter feito algo para impedir isso? Aconteceu alguma coisa naquele dia? Respirei fundo, já sentindo o tapa de cada pergunta.
— Ai, Kenz. — Robbie se soltou do meu aperto. — Você está machucando minhas mãos.
Eu o soltei imediatamente, vendo marcas brancas onde eu estava segurando. Uma onda de desgosto rolou sobre mim, e eu imitei vovô Bill.
Piscar. Piscar. Virar. Eu não vou chorar. Eu não vou chorar. Piscar. Piscar. Estou bem.
Levante a cabeça.
Fique de pé.
Eu posso fazer isso.
Robbie tocou minha mão, e sua empatia quase desfez tudo o que eu havia repelido. Eu era a forte, foi o que ele disse.
Cabeça erguida.
Não podia chorar. Ainda não.
Eu dei um pequeno sorriso para Robbie, fingindo bater em seu ombro.
— Pronto para o melodrama adulto?
— Mackenzie!
Vovó tinha me ouvido.
— Que grosseiro e insensível de sua parte! Sua irmã morreu há dois dias.
Melodrama? Isso é o que você chama de luto?
Limpei a garganta.
— Você está certa, vovó. Muito insensível da minha parte.
Willow não era sua irmã gêmea, sua outra metade, sua parceira de útero. Como fui rude.
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— Mamãe? — Ryan se endireitou. — Vocês vão conversar mais um pouco?
— Uh… — A sra. Jensen olhou para vovó, a pergunta em seus olhos.
— Charlotte e Phillip esperavam que pudéssemos conversar sobre as crianças antes de irmos para o hotel — disse vovó.
— É claro. — A sra. Jensen tocou o braço de vovó, e os dois casais viraram para o corredor.
Quando eles estavam fora do alcance da voz, Ryan disse:
— Eles estão indo para a sala de jantar formal. É para lá que mamãe leva todos os nossos convidados, a menos que ela realmente queira impressioná-los. Eles iriam para a sala de estar formal, então. Podemos voltar para a cozinha se você quiser comer alguma coisa.
Eu não tinha comido o dia todo.
Isso foi estranho. Eu estava tentando ser como Willow? Eu estava tentando me aproximar dela ou perdi o apetite?
O estômago de Robbie roncou, e eu apertei seus ombros suavemente.
— Parece que temos uma resposta.
Rose estava lá, e era como se ela tivesse lido a mente de Robbie. Um pacote de pãezinhos de pizza apareceu, e não demorou muito para que meu irmão os enfiasse na boca. Eu levantei uma sobrancelha.
— Você não comeu hoje?
Ele fez uma pausa e deu de ombros enquanto engolia um monte de tudo de uma vez.
— Você não comeu. Eu não tinha certeza se deveria ou não. Definitivamente não como Willow. Eu sabia então.
— Você pode comer a hora que quiser. Hoje não tive apetite.
— Ryan, por que você está agindo assim?
A pergunta de Peach veio do lado esquerdo. Ela estava quase carrancuda em seu assento na mesa da cozinha. Ela nos seguiu e trancou o olhar no irmão. Ele franziu a testa.
— O que você quer dizer?
— Você nunca age assim. — Ela gesticulou para nós com um movimento rápido. — Sendo bom anfitrião e outras coisas. Você geralmente mal pode esperar para se afastar dos convidados. Você está agindo como se ela fosse sua namorada ou algo assim. Ela não é.
— Cala a boca, P. Sério. Estou sendo legal, e a razão pela qual geralmente saio quando temos convidados é porque não gosto dos convidados.
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— Você não se importou quando Erin veio no domingo. Ele ergueu a sobrancelha.
— Eu comi uma pizza na mesma mesa com vocês duas e depois fui embora. Não faça disso algo que não é.
O rosto dela ficou vermelho, e se é que era possível, sua carranca franziu um pouco.
— Que seja. Você está agindo estranho.
— O que isso importa?
Robbie estava em seu segundo punhado de pãezinhos de pizza. Ele estava quase terminando todos eles, e Rose deve ter notado, porque pegou um segundo pacote. Depois de cozidos, todos foram para um único prato. Só para ele.
— Não importa. É só… — Peach me lançou um olhar, mordendo o lábio inferior. — Não. Deixa para lá.
Ryan parecia tão confuso quanto eu quando encontrou meu olhar. Ele balançou a cabeça, e por um momento, éramos apenas nós dois. Eu sabia que os outros estavam lá, mas todos eles derreteram, e um peso invisível e insuportável saiu momentaneamente do meu peito. Acabou assim que aconteceu, mas eu já ansiava pela próxima vez.
— Ok. — O sr. Jensen entrou na cozinha, esfregando as mãos. Ele varreu um olhar sobre todos nós, demorando em Robbie antes de se voltar para mim. — Seus avós vão levar você com eles. Acho que sua mãe fez algumas malas para vocês dois. Está tudo os esperando na suíte.
— Minha mãe e meu pai vão estar lá?
Minha garganta queimava, e eu estava feliz por Robbie ter feito a pergunta. Eu não conseguia me forçar a expressar as palavras.
— Uh…
E como seu filho na noite anterior, o sr. Jensen me deu a resposta sem dizer uma palavra.
Empurrando meu assento para trás, evitei seu olhar e disse a Robbie:
— Vamos. Temos que ser fortes para a vovó agora.
— Eu não quero ser.
Eu me virei para encará-lo.
— Robby! Apenas… vamos. — Seu lábio começou a tremer, e eu experimentei instantaneamente auto-ódio.
Pegando sua mão, eu o puxei comigo.
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— Se você ainda estiver com fome, podemos fazer o vovô parar em um drive-thru em algum lugar.
Eu queria ficar.
Eu também não queria ter que ser forte para vovó. Eu não queria ver o vovô lutando para não chorar, porque ele também tinha de ser forte para vovó, e eu realmente não queria pensar sobre como a última vez que eu tinha visto minha mãe, ela parecia muito aliviada por me ver partir.
Segurei a mão de Robbie com força até ouvi-lo sibilar. Eu relaxei meu aperto.
— Desculpe.
— Tudo bem.
Mas não estava. Nada mais estava bem.
Estávamos a meio caminho do carro quando Ryan chamou meu nome. Olhei para trás, parando enquanto Robbie continuava. Ryan estava descendo a calçada, a porta da casa fechada atrás dele. Todos os outros ficaram lá dentro. Olhando por cima do ombro, pude ver Robbie se acomodando no carro. Vovó já estava sentada, e vovô foi para o lado do motorista. Ele deixou a porta traseira aberta para mim.
— Ei — eu disse.
Ryan parou, e uma enxurrada de expressões surgiu em seu rosto. Dúvida. Confusão. Então cautela. Ele começou a passar a mão pelo cabelo, mas percebeu o que estava fazendo e parou.
Ele riu brevemente.
— Eu faço isso o tempo todo. Meu cabelo está sempre uma bagunça.
— Combina com você. Você está uma graça. Seus olhos se arregalaram.
— Ah. Obrigado.
Dei de ombros. Era a verdade. Bem, isso o deixou gostoso, não uma graça. Mas guardei isso para mim.
Ele olhou de volta para sua casa, como se estivesse decidindo se deveria dizer o que quer que desejava falar. Ele enfiou as mãos nos bolsos.
— Você vai conseguir dormir bem? — Ah. A cama. — Você vai sentir minha falta?
Sua covinha piscou para mim, provocando.
— Pode ser.
Ele sorriu de lado, e percebi que ele tinha uma segunda covinha.
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— De verdade. Você vai ficar bem? Sua avó não parece o tipo mais calma, sabe?
— Ah, cara. Eu sei. — Tentei sorrir, mas falhei. Ignorando sua pergunta, eu disse: — Obrigada.
— Por dormir com você?
— Isso também. Obrigada por passar algum tempo comigo. Eu sei que estou… não sou eu mesma.
— Com razão.
— Sim. — Eu tinha de ir. Eu provavelmente tinha mais três segundos antes que vovó abaixasse a janela para me chamar. — Olha…
— Minha irmã não é tão ruim — disse ele.
— O quê?
— Minha irmã. — Ele apontou por cima do ombro para sua casa. — Eu sei que você pensou que ela era uma vaca mimada, e sim, ela pode ser isso. Mas ela nem sempre é. Acho que ela queria ser sua amiga.
— Por quê?
Ryan parecia estar tentando não rir.
— Tá brincando, né?!
Eu não estava. Eu não sabia o que ele queria dizer. Dois segundos. Eu já estava me preparando para ouvir a voz de vovó.
— Eu tenho que ir.
— Nolesrock arroba Gmail. Você pode me enviar um e-mail se quiser. Ele vai direto para o meu telefone, e eu vou receber um alerta. Eu posso te ligar se você quiser. — Abri a boca, mas ouvi a janela do carro descer e engoli meus agradecimentos. Antes que vovó pudesse dizer qualquer coisa, lembrei de que não estava com meu telefone. deixei cair quando vi Willow.
Willow…
— Eu te mando um e-mail — eu disse antes de correr para o carro. Eu queria olhar para trás para ver se Ryan tinha ficado para nos ver partir. Mas eu não fiz isso. Eu não sabia por quê. E assim que chegamos a um quarteirão de distância, me arrependi. Desejei ter olhado, mas, novamente, não consegui explicar por quê. Eu apenas fiz.
Então Robbie disse o que eu estava pensando.
— Ryan é legal.
Sim. Sim ele é.
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