Amazônia Judaica - N.13/2018, Edição Rosh-Hashaná 5779

Page 1

Edição de Rosh Hashaná 5779

ANO 10 No 13 SETEMBRO DE 2018 ISSN 2527-0826

JUDEUS DE TÂNGER

REMINISCÊNCIAS DE OUTRORA IMIGRANTE IMPROVÁVEL

O MUNKATCHER REBBE NO BOM RETIRO YOM KIPUR EM RONDÔNIA

Lutando pela Preservação 1


Adquira seu exemplar em nossa loja virtual (www.Amazoniajudaica.Org/lojavirtual) ou pelo nosso email; ed.Amazoniajudaica@gmail.com

2 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


EDITORIAL Editores Fundadores David Salgado Elias Salgado Editor Elias Salgado Projeto Gráfico e Arte Diagramação Eddy Zlotnitzki Revisão Mariza Blanco Correspondente Especial para a Europa e Oriente Médio Henrique Cymerman Benarroch Colaboradores Paulo Valadares Rajae Boumediane El Metni Sara Bensabat Nilza Menezes Dina Paula Santos Nogueira Israel Blajberg Simão Aarão Pecher Portal e Arquivo Amazônia Judaica www.amazoniajudaica.org Amazônia Judaica no Facebook: Amazônia Judaica Amazônia Judaica no Issuu www.issuu.com/amazoniajudaica Emails Ed.amazoniajudaica@gmail.com contat@amazoniajudaica.org Equipe diretiva PhD Profa. Regina Igel PhD Prof. Renato Athias Eddy Zlotnitzki Elias Salgado Conselho Editorial Andre de Lemos Freixo Fernando Lattman-Weltman Heliete Vaitsman Henrique Cymerman Benarroch Ilana Feldman Isaac Dahan Jeffrey Lesser Michel Gherman Monica Grin Regina Igel Renato Athias Wagner Bentes Lins HOMENAGEM ESPECIAL: Prof. Samuel Isaac Benchimol z”l (De abençoada memória) Amazônia Judaica é uma publicação da

Diz a letra de uma música israelense bem antiga: “Haiamim cholfim, shaná overet. Aval hamanguiná, leolam nisheret” (Os dias se vão, o ano passa, mas a melodia para sempre fica). São dez anos de existência da Amazônia Judaica e chegamos à sua 13ª. edição. Completamos o nosso bar mitzvá. Portanto, a comemoração é dupla: chegamos à maioridade e a mais um Rosh Hashaná (Ano Novo judaico). O ano de 2017 foi um tempo de mudanças e crescimento para a nossa editora, que ganhou novo nome e agora se chama TALU CULTURAL. E 2018 não está sendo diferente. Por trás deste novo nome, uma nova estrutura organizacional e inúmeros novos projetos. Se tem uma coisa que não perdemos jamais, é o otimismo e o amor àquilo que fazemos há mais de 15 anos. TALU CULTURAL é o ”guarda-chuva“ que agora abriga 4 selos editoriais: AMAZÔNIA JUDAICA, UNIVERSO SEFARAD, TALU CULTURAL e o caçula, POSTAGENS SAGAZES. Uma nova Diretoria se formou, agregando à nossa organização, profissionais do mais alto gabarito: A Professora Doutora Regina Igel, da Universidade de Maryland (Editora Executiva); o Professor Doutor Renato Amram Athias, da Universidade Federal de Pernambuco (Diretor de Projetos Culturais) e Eddy Zlotnitzki (Diretor de Arte e Diagramação e nosso novo sócio). Amazônia Judaica seguirá firme, realizando todos os projetos já conhecidos (Revista AJ; Portal AJ; Arquivo Histórico Digital AJ; pesquisa, produção e edição de livros. E a eles agregaremos, em cada um dos novos selos, outros projetos editoriais e culturais. Portanto, aqui fica nosso convite a vocês, queridos leitores, para que continuem a nos prestigiar com sua atenta leitura dos nossos interessantíssimos artigos e reportagens, assinados por historiadores, acadêmicos, pesquisadores e autores altamente qualificados em seus campos de estudos. Por ocasião do Ano Novo judaico, recebam nossos votos de felicidades, alegrias e saúde! Shaná Tová le kulam! Um Bom Ano para todos! Os editores

3


A IMAGEM DA CAPA

Shofar: Um Chamamento Multi Milenar Que povo é este e que tradição religiosa é esta que inicia o novo ano, conclamando todos à uma reflexão profunda? Que gente é esta que por milênios toca o shofar para despertar a consciência do povo para pedir perdão? E que dias temíveis são estes em que a divindade desce das alturas para julgar-nos e perdoar-nos, e deixa à nosso critério que entender-se entre si e tentar por nossa livre escolha, perdoar e se fazer perdoado? Quanta confiança depositada sobre nós! Há milênios que é assim, ano após ano, e a corrente segue

Imagem da capa: Malka Partouche, “Shofar, Yom Kippur”

firme e intacta. Até aqui foi assim. Então que sigamos merecedores de tal confiança. Deixemos que o som do shofar ecoe no mais profundo do nosso ser e que mais um ano surja, para nos pôr à prova, fazendo a melhor escolha entre o bem e o mal.

4 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


AMAZÔNIA JUDAICA No 13 - SETEMBRO 2018

SIONISMO | 6

A gênese do sionismo no Brasil

ORIENTE MÉDIO | 16

Irã e seu plano nuclear: uma constante ameaça para a região

EDITORIAL A IMAGEM DA CAPA

Shofar: um chamamento multi - milenar

PRESENÇA

À sombra das mangueiras floresce uma Belém judaica

Minha sinagoguinha

20

MEMÓRIA

26

Imigrante improvável, um príncipe no Bom Retiro o Munkatcher Rebbe

CAPA

O último Yom Kipur

EM DESTAQUE

Livro sobre judeus na Amazônia é sucesso internacional

HISTÓRIA

Judeus na economia de Manaus

Portal Amazônia Judaica atinge 200 mil acessos

3 REMINISCÊNCIAS A comunidade judaica de Tânger 4 entre a lembrança e o esquecimento 12 LEMBRANÇAS

RESGATE

Sarah Bensabat: um mergulho nas origens

PORTAL | 30

46 52

CRÕNICA

58

RETROSPECTIVA

60

PERSPECTIVA

62

Certas perdas

Em retrospectiva 2018 Em perspectiva 2018

32 PORTAL 38 PELO NOSSO PORTAL MENSAGENS

64 66 68

40 5


SIONISMO

A Gênese do Sionismo no Brasil

*

Elias Salgado**

N

No Brasil a iniciativa sionista, nasceu no coração da selva amazônica, no seio da pequena e isolada comunidade sefaraditamarroqui(2) , e já na virada do século XIX para o século XX, travava contato com o diretivo do movimento sionista na Europa (3). Eram iniciativas isoladas, de um pequeno grupo de pioneiros ativistas, ainda sem nenhum cunho organizativo, fato que só viria a ocorrer na segunda década do século passado. Nasceu na Amazônia, pois ali existia desde as primeiras decadas do sec. XIX, a única comunidade judaica organizada do país, na cidade de Belém do Pará, e em outros pequenos núcleos isolados, do hiterland amazônico(4). Nos grandes centros do sudeste brasileiro ( Rio de Janeiro e São Paulo), não existia naquele então, uma vida judaica organizada comunitariamente. Fato que se daria somente mais tarde, a partir da segunda década deste século, com o incremento da imigração européia. Avraham Milgram(5), levanta a questão do porque desta iniciativa, se por razões humanísticas de solidariedade e identificação, já que nenhuma causa de outro gênero tal como reação ao antissemitismo, como

6 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

no caso do ocorrido com os judeus da Europa, poderia ser apontada, dado que os judeus na Amazônia gozavam de uma vida próspera e tranquila. E chama a atenção para a necessidade de um estudo mais profundo que assinale causas de tal questão histórica, apesar de citar o incidente ocorrido em 1901, nas cidades de Cametá e

O intelectual Max Nordau, braço direito de Hertzl na Organização Sionista Mundial Baião(6), que ficou conhecido como o “mata-judeus”, quando várias casas comerciais de judeus foram saqueadas por membros da população local.

Milgram afirma, que tal incidente não deixou marcas na história destes sefaraditas. Porém, neste ponto, creio ter encontrado um fato posterior, que acredito, tenha correlação com tal incidente e a reação da comunidade judaica local ao mesmo. Trata-se da alteração feita nos estatutos da antiga”Sociedade de Exercício de Caridade” (Hebrá Guimilut Hassadim), da comunidade de Belém, em 1902, que na oportunidade incluiu nos estatutos, um novo objetivo da Hebra:”defender os irmãos, de qualquer perseguição injusta que por acaso pudessem sofrer em todo o Estado”(7). Além disso, estudos posteriores (Benchimol, Benguigue, Salgado, entre outros), passarão a apontar que, mesmo concordando que a convivência dos judeus com as demais etnias locais pode ser considerada tranquila e que na realidade, jamais, exitiu um antissemitismo virulento, como aponta Milgram; houveram sim, momentos e ocorrências de tensão, como no período da 2ª. Guerra Mundial. Anteriormente, abordei a questão em dois trabalhos:“Judeus na Amazônia: o integralismo caboclo e o caso de


Pesquisando sobre os primórdios do Sionismo no Brasil(1), encontramos que as primeiras atividades sionistas no país, tiveram início quase que simultaneamente, ao início das atividades do movimento na Europa Rubem Salgado” e no livro, “História e Memória, judeus e industrialização no Amazonas ( ver os depoimentos de Saul Benchimol e Moisés Sabbá). Mas concordamos com Milgram em que o sionismo na Amazônia, se deu mais por razões “humanísticas de solidariedade e identificação”. Tais atividades sionistas se configuram por correspondências mantidas com o diretivo do Movimento Sionista de então. O grande intelectual e jornalista David José Pérez, fundador do primeiro jornal israelita em lingua portuguesa no Brasil, o “A Columna” – (“ Haamud”), cujo um dos principais objetivos era ”a luta em prol da causa sionista”, mantinha correspondência direta com o intelectual Max Nordau, 7


SIONISMO braço direito de Theodor Hertzel, criador do movimento sionista moderno. Além disso,a atividade compunha-se também, de parcas contribuições financeiras à causa ( ao K.K.L.), objetivando a compra de terras na Palestina , para assentamento dos chalutzim (pioneiros) e criação de novos núcleos judaicos. Nos dois anos em que circulou, “A Columna” foi o centro de toda a atividade judaica e sionista da então nascente, comunidade de judeus do Sudeste e Sul do Brasil e também da Amazõnia. De suma importância foi, também, o ativismo sionista do Major Eliezer Levy, de Belém, fundador do jornal O intelectual, linguista e professor, David José Pérez

O carro alegórico “ Viva a Palestina Livre”, comemorando a a Declaração Balfour

Kol Israel – A voz de Israel, criado em 1918. Em 1°. de dezembro de 1918 com o advento da Declaração Balfour celebrava-se em Belém do Pará o grande acontecimento, e entre outras solenidades organizavase na capital paraense um cortejo de carros alegóricos, e um deles, organizado pelo ativista sionista, Major Eliezer Levy, levava o nome 8 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

“Viva Palestina livre”. Atrás do carro levando o estandarte, grande número de sócios do Comitê “Ahavat Sion. O “Kol Israel” se definia como “jornal independente de propaganda sionista”, “órgão do Comitê Ahavat Sion” (Amor a Sião) e foi outra das iniciativas de Eliezer Levy. Seu primeiro número saiu em 8 de dezembro de 1918, extamente uma semana depois do cortejo de carros

alegóricos. Com a chegada ao sudeste, de levas imigratorias oriundas da Europa Oriental, ocorre uma mudança de eixo, e o sionismo brasileiro será dirigido pelas comunidades judaicas do sudeste brasileiro, que tomavam forma organizacional mais consistente, conseguência das novas imigrações. O ativismo sionista na Amazônia só voltaria a ter significado a partir da criação do Estado de Israel e ao longo das décadas seguintes, consequência, do esforço realizado pela Organização Sionista Mundial em Israel, a Agência Judaica para Israel e as próprias comunidades amazônicas. Como resultante deste ativismo, a comunidade judaica amazônica em Israel já conta com mais de 300 olim. Pode parecer, à princípio, um número insignificante. Mas se considerarmos que a comuniudade da Amazõnia não soma muito mais do que 1500 pessoas, veremos que


O MAJOR ELIEZER LEVY E A CRIAÇÃO DO ESTADO DE ISRAEL Entre 1918 e 1926, Eliezer Levy atuou como advogado no escritório de Francisco Jucá Filho, Procurador Geral da República e Álvaro Adolfo de Silveira, deputado estadual e chefe do Partido Conservador. Sua amizade com os colegas de trabalho teria futuramente importância decisiva na posição brasileira durante a votação na ONU para a criação do Estado de Israel. Ao filiar-se ao PSD, conseguiu eleger o amigo e advogado Álvaro Adolfo da Silveira, senador da República pelo partido. Este assessor político de Oswaldo Aranha à ONU, no momento em que foi votada a criação do Estado de Israel. Oswaldo Aranha, que presidiu a sessão, sabia muito sobre a realidade da Palestina, porque o assessor era um especialista do assunto, herança das conversas com Eliezer Levy no velho escritório da 13 de maio, em Belém, onde chegaram a discutir temas sobre a criação de Israel. Álvaro Adolfo, como coordenador da votação na histórica votação da ONU, convenceu Aranha a adiar a votação enquanto convencia 3 votos contrários a criação do Estado de Israel. Fontes: Judeus no Brasil – Estudos e Notas de Nachman Falbel via Amazônia Judaica (http://aj200.blogspot.com.br/2010/04/as-muitas-historias-domajor-eliezer.html) e http://pt.wikipedia.org/wiki/Álvaro_Adolfo_da_ Silveira. Colaboração de André Levy

Manifestação de cunho sionista, pro Palestina Judaica, no Rio de Janeiro

se trata de um percentual de cerca de 20% deste total. Quiçá o maior percentual relativo de aliá, entre as diversas comunidades do país, e um dos maiores de toda a diáspora. Isso sem considerar, também, os judeus da Amazõnia peruana, que entraram no Brasil através do porto de Belém do Pará, oriundos como os nossos, do Marrocos e navegaram por toda a calha do Amazonas vindo a se estabelever em Iquitos e que recentemente, a cerca de 4 anos, fizeram aliá em grupo, somando mais algumas dezenas de pessoas. 9


SIONISMO Evento comemorativo aos 200 anos da presença judaica na Amazônia, realizado em Jerusalém e organizado pela Amazônia Judaica

BEFORE THE TURN OF THE 20TH. *Artigo escrito em outubri de 1997 em Jerusalém, durante o programa de pós graduação em História no Melton Centre da Universidade Hebraica de Jerusalém **Graduação em Economia e pós graduação em História pelo Melton Centre da Universidade Hebraica de Jerusalém. Diretor-editor do Amazônia Judaica e diretor -pesquisador do Arquivo Histórico Amazônia Judaica * Este artigo é parte integrante de trabalho apresentado no Congresso V BRASA, em 2000, comemorativo dos 500 anos do Brasil, intitulado: “ Presença judaica na Amazônia – séculos XIX e XX”

CENTURY”, in Frank Cass Journals - 1995; e na tese de doutorado para a

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

USP de Maria Liberman: “JUDEUS NA

Avni, Chaim , “THE ORIGENS OF

AMAZONIA BRASILEIRA (SEC.XIX E

ZIONISM IN LATIN AMERICA” , in “

XX).

The jewish presence in L.America - Elkin and Gilbert -1987;

(2) LIBERMAN, M. (3) LIBERMAN, M.

Liberman, Maria. Tese de doutorado

(4) LIBERMAN,M.

para a USP: “JUDEUS NA AMAZONIA

(5) PRECURSORS OF ZIONISM…

BRASILEIRA (SEC.XIX E XX).

(6) EGON E FRIDA WOLFF in, “JUDEUS NOS PRIMORDIOS DO

Milgram, Avraham “ PRECURSORS OF

BRASIL REPUBLICA”; (7)JOSE

ZIONISM IN BRASIL BEFORE THE

MARIA ABECASSIS in, “GENEALOGIA

TURN OF THE 20TH. CENTURY”, in

HEBRAICA”

Frank Cass Journals - 1995

(8)LIBEMERMAN, M.

(1) O presente artigo basei-se em em dois

(9)JORNAL ‘’A COLUMNA”

Salgado, Elias “ Judeus na Amazônia: o

artigos anteriores sobre o tema: Chaim

(“HAAMUD”) , numero 1 de 14 de janeiro

Integralismo caboclo e o caso de Rubem

Avni , “THE ORIGENS OF ZIONISM

de 1916

Salgado” - 2000

IN LATIN AMERICA” , in “ The jewish

(10)Manaus, 7 de fevereiro de 1907.

presence in L.America - Elkin and

ARQUIVO DAVID J. PEREZ, The Central

Gilbert -1987; e Avraham Milgram, “

Archives for the History of

PRECURSORS OF ZIONISM IN BRASIL 10 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

the Jewish People, Jerusalem, pag.124, doc.4

Salgado, Elias e Salgado David, “História e memória: judeus e industrialização no Amazonas – 2015


11


PRESENÇA

À Sombra das Mangueiras fl Por Israel Blajberg* (Fonte: PLETZ.com)

Um encontro de antigos alunos do CPOR nos enseja curta visita à Belém do Pará. Ao adentrar o local do evento, o 2º. Batalhão de Infantaria de Selva, surpresa! O busto do cristão-novo Pedro Teixeira, Capitão-Mor do GrãoPará, que dá o nome à unidade, símbolo da nossa soberania, desbravador dos Rios Amazonas e Negro 12 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


floresce uma Belém Judaica P

Vista aérea do centro histórico da cidade de Belém do Pará

edro jamais imaginaria, mas outros correligionários da fé mosaica que ele também abraçara seguiriam seu mesmo caminho. Já se vão mais de 200 anos. Tangidos pela intolerância, os judeus do Marrocos sofrido atravessaram o oceano, subindo o Grande Rio, chegando até Iquitos no Peru. Se estabeleceram ao longo das suas margens, penetrando rios e igarapés. Tinham nomes curiosos, os mesmos que hoje aparecem em placas de ruas, nas obras, em consultórios, atestando a ponderável densidade da contribuição judaica para o desenvolvimento do Pará, em Belém, Itacoatiara, Santarém, cidades onde foram erguidas sinagogas, cemitérios. Mas os séculos passaram, fazendo com que muitos olvidassem suas origens, na convivência com os descendentes do colonizador europeu, dos árabes mercadores, escravos d’Africa e indígenas, desmentindo a calunia dos antissemitas, que os judeus não se misturam. Os judeus se integraram muito bem na terra do Ver-o-Peso, do açaí, banhos de erva, carimbo, tucupi, graviola, cupuaçu e castanha, e hoje são tão paraenses quanto qualquer outro.

Curiosamente, até no portão da Basilica de N. S. de Nazaré, um bonito trabalho em cobre lembra a Arca da Aliança, onde desponta uma menorá. Andando pelas ruas arborizadas, contemplamos alguns rostos de passantes. Em um e outro, aqui e ali nos parece possível identificar traços do biótipo judaico-marroquino. Mesmo os que deixaram a Casa de David não puderam abjurar o DNA, que faz reviver fisionomias daqueles piedosos judeus de Tanger, Tetuan, Fez e Agadir. Adormecidos por gerações, um belo dia os cromossomos afloram num futuro distante, como que a confirmar que viemos de Abrahão. A força do DNA é fato até para a mais alta autoridade do Estado. Basta olhar seu retrato, à parede de uma repartição, envergando a faixa onde se destaca a estrela azul do Pará. Há em torno de mil judeus em Belém. Comunidade tradicional, observante, piedosa, igual a tantas. Uma típica mansão paraense abriga o Centro Israelita do Pará em tranquila rua arborizada.

O cristão-novo, Pedro Teixeira, conquistador da Amazônia e Capitão Mor do Grão Pará

Sinagogas centenárias, Shaar Hashamaim e Essel Avraham, e a mais nova, Beit Chabad. O ensino do judaísmo é conduzido em complementação a escola primária regular. Apreciando as salas de aula no Beit Chabad e no CIP, são iguaizinhas a qualquer escola judaica, coloridas, colchonetes, motivos judaicos nas paredes. A Shaar haShamaim impressiona pelo tamanho e beleza, a cúpula esférica visível à distância, pintada em belo tom suave azul e branco. A Essel 13


PRESENÇA

A Arca da Aliança (Mishkan) a Menorá:relevo em cobre no portão da Basilica de Nossa Senhora de Nazaré, em Belém

Fachada da Esnoga Essel Abraham, de Belém. A mais antiga em funcionamento no Brasil, fundada em 1824. O atual prédio é de 1850

Avraham é menor, tendo ao lado a Bet Pepe Larrat e Biblioteca Malka.

Os cemitérios são também antigos, destacando-se a pequena Necrópole Judaica de 1842, em frente ao histórico Cemitério da Soledade, e ao lado da Igreja Anglicana, que tem um pequeno cemitério de ingleses. Possivelmente ali estão os túmulos mais antigos conhecidos de judeus no Brasil, pelo menos enquanto a arqueologia não consegue levantar a pátina do tempo que pesa sobre o Cemitério Judaico perdido da antiga Mauritia, em Recife. Houve ainda 2 cemitérios judaicos, antigo e novo, contíguos ao Cemitério do Guamá, hoje já não mais utilizados, substituídos pelo atual Cemiterio Judaico do Tapanan.

Placa em homenagem aos construtores do Templo Shaar Hashamaim

14 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

No cemitério inglês de 1912 há 3 lápides de jovens tripulantes da RAF, falecidos durante a guerra. Em meio as ruas arborizadas, onde as mangueiras formam verdadeiros tuneis verdes, Belém esconde não poucas surpresas e segredos para o turista que busca o passado e o presente judaico. O tempo passou mais depressa que gostaríamos, e logo chegou a hora de partir. Adeus Belém !


Fachada da Esnoga Shaar Hashamaim, a segunda fundada em Belém

Presente do nosso grande amigo , Dr. Sergio Benchimol para Amazônia Judaica: a bandeira do estado do Paré “customizada”, tendo o Maguen David no lugar da estrela azul do estandarte paraense

A aeronave lotada de turistas leva várias horas até o Rio de Janeiro, atestando a imensidão desse Brasil. Levamos a lembrança das belas sinagogas, das escolinhas, dos eminentes rabinos, na terra dos rios de muitos meandros, imensos ainda que à distância, caudalosos, a selva protegendo as riquezas do subsolo, quantos trilhões ainda a pesquisar, fazer deste pais uma nação cada vez mais justa para seus filhos. SHALOM! SELVA!

* Israel Blajberg Há 10 séculos seus antepassados paternos saíram de Bleiberg, na Carinthia (Áustria), firmes como o chumbo (Blei) e imponentes como a montanha (Berg), entrando na Polônia sob o Grande Rei Kazimierz. Teve a honra de ser o primeiro Blajberg nascido no Brasil (Rio de Janeiro, 1945), estando hoje a família na terceira geração verde-e-amarela. Professor da UFRJ e UFF e Engenheiro do BNDES, aposentado em 2015. Palestrante e Autor de livros e artigos sobre Historia do Brasil, Militar, Judaica, Genealogia e Viagens. Membro das Ordens do Mérito da Defesa, Naval, Militar e Aeronáutico, e Medalha Pró-Memória da Republica da Polônia. 15


ORIENTE MÉDIO

Irã e seu plano nuclear

UMA CONSTANTE AMEAÇA PARA A REGIÃO Henrique Cymerman Benarroch Correspondente Especial no Oriente Médio

Ao que parece, os documentos extraídos pelos agentes do Mossad no Irâ, e que foram revelados em abril, numa chamativa encenação pelo primeiro ministro israelense Benjamin Netanyahu, revelam que o programa iraniano para desenvolver bombas nucleares” é mais extenso, sofisticado e melhor organizado” do que se suspeitava, segundo comentaram experts nucleares ao New York Times

16 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


T

rês repórteres norteamericanos tiveram acesso limitado à documentação apreendida pela inteligência externa israelense. A informação destaca que Teerâ planejava produzir a primeira de uma série de cinco bombas atômicas, e inclusive se discutia possíveis locais para testá-la. Segundo afirma o jornal americano “nenhuma foi construída porque os iranianos temiam ser caçados, ou por temor à campanha das agências de inteligência dos Estados Unidos e Israel, para sabotar a tentativa, que incluiu cyber ataques às instalaçõeschave”. Para o engenheiro nuclear Robert Kelley, as evidências são indiscutíveis: “os documentos demonstram que estes tipos estavam trabalhando para produzir bombas nucleares”. Os materiais apreendidos citam o atual presidente iraniano, Hassan Rouhani, como membro do “Conselho para as Tecnologias Avançadas”, que aprovou o programa nuclear, assim como, um

evidente apoio logístico das Guardas Revolucionárias e as “Forças Quds. Por sua vez, documentos revelados no passado provam que o exército do Iran foi responsável por supervisionar a conversão de urânio empobrecido em combustível apto para artefatos atômicos. No total, o Mossad se apropriou de uns 1000,000 documentos e Israel compartilhou a informação com a Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA), assim como, com agências de inteligência europeias e norte-americana. Em maio, pouco depois da revelação pública de Netanyahu, o presidente norteamericano, Donald Trump anunciou a saída do acordo nuclear com o Iran, um acordo firmado pelo regime dos aiatolás com a China, Rússia,

França, Alemanha, Reino Unido e USA e que previa que agentes da IAEA, pudessem supervisionar a atividade nuclear de Teerã. Além disso, Trump anunciou a renovação das sanções contra o plano nuclear do Irâ.. Netanyahu vaticinou em abril que “Irã mentiu”, e segundo as provas a que tiveram acesso os repórteres americanos, Teerâ “estava na ponta de um plano mestre de tecnologias para desenvolvimento de bombas”, que foi congelado em 2003. Para Israel, o arquivo revelado, demonstra que o regime iraniano não cessou seu intento de acumular um arsenal nuclear. Segundo apontou o Washington Post, apesar da estancada de 2003 “cientistas seguiram desenvolvendo planos

17


ORIENTE MÉDIO

Benjamin Netanyahu

secretamente, camuflados entre programas militares já existentes”. Um oficial iraniano citado nas provas publicadas pelo estado judeu afirmou que “ a quantidade de pessoal para o projeto não diminuirá, nem a estrutura do projeto será menor” Um oficial israelense comentou com os jornalistas que “em alguns anos, quando o programa de inspeções do acordo nuclear expirar, Irã poderá retomar seu trabalho em direção 18 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

Donald Trump

à bomba atômica. E repetiu que o acordo do qual Trump se retirou, não bloqueia o caminho do Irã. Facilita”. Os três repórteres puderam ver e tocar, com luvas, várias páginas originais dos arquivos apreendidos, que incluíam notas à mão, assinadas por Mohsen Fakhrizadeh, um expert em física iraniano que segundo fontes da inteligência ocidental, etava à cargo do projeto nuclear “Amad”. Os documentos, também, provam que o

Irã recebeu “informação explícita sobre desenho de armas de uma fonte estrangeira”. A inteligência israelense não logrou esclarecer se os detalhes sobre a construção de armas, foi transmitida por um estado ou por um ator individual. No passado soube-se que Teerã recebeu assistência para enriquecer urânio do cientista paquistanês Abdul Qadeer Khan de quem os Estados Unidos suspeitam que entregou “planos


Hassan Rouhani

parciais de um aparelho nuclear de fabricação chinesa para ao menos um de seus clientes internacionais” O arquivo confirma que o plano nuclear iraniano foi posto em marcha no final dos anos 80 e foi congelado em 2003, quando a planta de enriquecimento de Natanz foi descoberta e Teerã temia um possível ataque de Washington. Além disso, uma série de fotografias demonstra a manipulação realizada pelo regime

iraniano em das instalações em Prchin, que iam ser visitadas por Yukiya Amano, chefe da IAEA. Quando ele chegou, o lugar estava vazio, porém as fotos “mostram uma uma longa câmara que Israel confirmou que toda a documentação sobre o programa nuclear do Irã estava sendo acumulada num armazém ao sul de Teerã, num edifício sem segurança excepcional, do qual poucos iranianos conheciam

sua existência. Para o NYT, não há dúvida que “os espiões israelenses contaram com ajuda interna” para apreender a documentação. A operação se desenvolveu em 31 de junho em seis horas e meia, em que os espiões removeram meia tonelada de documentos sem ser descobertos. No entanto, o Mossad não quis esclarecer qual foi a via utilizada para extrair o arquivo do país inimigo. 19


RESGATE

Sarah Bensabat

Um mergulho nas origens Amazônia Judaica mantém em seu portal (www.amazoniajudaica.org), um Arquivo Histórico Digital, que em seus oito anos de existência já foi visitado por mais de 200 mil pessoas de todo o mundo, uma vez que somos a maior referência mundial, sobre a presença judaica na amazônia

D

iariamente, somos contatados por vários motivos: pessoas que querem adquirir nossas edições; há os que buscam contato com as comunidades judaicas da região, em geral porque querem se aproximar do judaísmo. Porém, a causa que mais nos deixa realizados, é aquela que leva as pessoas a buscar e pedir nossa ajuda na busca por suas origens judaicas. Algumas vezes, logramos ajudar e encontramos dados sobre ante-

20 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

cedentes. Em outras orientamos a pessoa na melhor maneira para que ela mesma empreenda sua pesquisa. Porém o caso de Sarah Bensabat, que nos procurou pedindo nossa ajuda, ultrapassou em muito, os diversos casos que conhecemos. Sarah como os demais, nos contatou pedindo nossa ajuda na busca de suas origens judaicas. Acontece que mais do que nós, ela mesma, sozinha, realizou uma busca, como poucas, e mergulhou de cabeça e com raro

sucesso em suas raízes familiares paternas – a família Bensabat. Ela logrou reunir documentos históricos inéditos e de raro valor e construiu a sua árvore genealógica.

“Olá Elias, boa noite ! Gostaria de enviar o que escrevi e o resumo mais completo e correto da minha genealogia e a certidão de óbito de meu bisavô. Um grande abraço. Sarah”


UM DEPOIMENTO Por Sarah Bensabat

Eu sempre tive uma ligação muito forte com a minha família, escutava dos meus tios-avós como nossos antepassados eram judeus de grande importância, principalmente meu bisavô (que chamo de avô), José Isaac Bensabat, que era judeu de Belém. Ele concorreu à presidência da República juntamente com Getúlio Vargas e Prestes de acordo com o Jornal Correio da Manhã de 1928. Sempre foi meu exemplo de vida. Engenheiro Civil, perseverante e muito influente na alta sociedade carioca. Sabendo de todas essas informações resolvi correr atrás da minha linhagem familiar paterna, já que todos da minha família Bensabat eram judeus sefaraditas. Fui criada sem tipo de religião nenhuma, sempre fui muito persistente em querer fazer parte do que eu sou e querer gerar uma nova dinastia de judeus na minha família, já que foi quebrada com o casamento não religioso de meus pais. Sempre tive amigas judias, todas elas frequentavam o Hillel no Rio (uma ONG para jovens judeus ou não judeus mas que possuem uma ancestralidade judaica recente) , fui até lá e me senti totalmente acolhida, todos super gentis , me senti em casa, um lugar em que te oferecem grandes oportunidades de palestras e amizades. Meu avô José Isaac Bensabat Sabendo da existência do Taglit (um programa para Israel apenas para netos e filhos de judeus), corri atrás da minha história que sempre tive orgulho, montei minha árvore genealógica e descobri coisas incríveis! Sou descendente de Judeus Espanhóis, Marroquinos e de Açores. Achei o túmulo dos meus tataravós e do meu bisavô que tanto amo, eles eram pessoas de boa índole e muito religiosos; falavam aramaico e hebraico, liam e faziam parte da comunidade judaica da época. Pena que todos morreram muito jovens e não pude ter contato com eles, principalmente meu avô que morreu de tuberculose com apenas 52 anos. A tradição da minha família sempre foi ter apenas um sobrenome. Meu pai, Alexandre Bensabat, seguiu os costumes e colocou apenas esse sobrenome em mim, sou muito grata a ele, pois ser apenas Bensabat já basta para mim. Em minha casa fui criada sem nenhum tipo de religião meu pai sempre quis essa tradição e sonha em que eu forme minha família e resgate novamente a linhagem judaica (algo que eu farei e estou fazendo) para que não se perca com o tempo.

21


RESGATE

Jornal Correio da Manhã de 1929 Mostra Isaac Bensabat como um dos canditas à presidência da república

Certidão de óbito de Isaac Bensabat

Lápide de Isaac Bensabat que está no antigo cemitério dos judeus no Caju (RJ)

22 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


Testamento de minha família, deixado por minha tia de quarto grau Mery Sabat, feito na ilha de Açores

23


RESGATE

Familia Bensabat

Eu, Sarah Bensabat, Brasileira, nascida no Estado do Rio de Janeiro no dia 10\08\1995, dou continuidade a história do manuscrito do meu tio-avô Abraão Bensabat (20\08\1997). José Bensabat - Judeu nascido em Portugal na ilha de São Miguel, frequentava a Sinagoga Ets Haim em Açores.

em 1957 por volta de seus 90 anos. d Tiveram

meu bisavô José Isaac Bensabat , nascido dia 30\03\1901 em Belém do Pará.

dA

família de minha origem tem relações de parentesco e casamentos com as famílias SABBÁ, ABEN-ATHAR, BENSAUDE. José Isaac Bensabat - Judeu nascido em Belém do Pará, casou-se com Maria Helena Bensabat, tiveram 9 filhos.

d Frequentava d Em

1818, judeus norte-africanos cujos antepassados foram expulsos da Espanha vieram para os Açores.E permitiu-lhes importar e revender para empresas locais. Em 1820, a revolução liberal portuguesa levou à diversidade religiosa. Julia Bensabat (falecida em 04\09\1903 no cemitério Israelita de Guamá) - Judia nascida em Mequinez (Marrocos) se casou com José Bensabat.

d Se

casaram em Portugal , tiveram 5 filhos de nome: Abraham Bensabat, Felício Bensabat, Fortunato Bensabat, Moisés Bensabat e Helena Aben-Athar (nascida Bensabat) todos são da Amazônia brasileira em Belém do Pará.

a Sinagoga de sua família em Belém (Sinagoga Sahar Hassamain). Foi para São Paulo, com apenas 26 anos formou-se em Engenharia Mecânica ( Diário Oficial de São Paulo, Setembro de 1927).

d

Em 1928 até 1929 foi para o Rio de Janeiro e de acordo com o Jornal Correio da Manhã (dia 21 de abril de 1929) concorreu à presidência da república, era muito influente na alta sociedade carioca.

d

d Se

casou com Maria Helena Bensabat no dia 08\08\1933. Antes da sua morte, voltou para o Rio de Janeiro e frequentou a sinagoga Shel Guemilut Hassadim.

d

d José

tinha uma irmã chamada Mery Sabat (falecida em 4 de fevereiro de 1901) que ficou em Portugal em específico Ponta Delgada. Abraham Bensabat - Judeu nascido em Bragança (PA) em(15/04/1858), se casou com a judia de origem também Marroquina Rachel Bensabath (1870-1957)

d Foi

d Ambos

d

eram judeus e frequentavam a sinagoga de Belém (Sinagoga Sahar Hassamain).

d Abraham

Bensabat morreu dia (07\12\1915) no Cemitério Israelita de Guamá juntamente com sua mãe.

d Rachel

Bensabath morreu no Rio de Janeiro

24 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

sepultado no cemitério do Cajú no Rio de Janeiro em Maio de 1952 na quadra dos acatólicos ou quadra dos protestantes(onde estão sepultados mais de 2.000 judeus), pois não tinha um cemitério judaico , logo após sua morte foi construído anos depois o Cemitério Comunal Israelita do Cajú. Teve 9 filhos, dentre eles meu avô José Isaac Bensabat ( -10/1942 a 01\11\2010) , todos nascidos em São Paulo. Isaac Bensabat II - Pai de Marcelo, Alexandre (meu pai) e César Bensabat.

d José

Sarah Bensabat - 15\07\2018


Portal

www.amazoniajudaica.org A maior referência mundial no tema judeus na Amazônia

Arquivo Histórico Digital Loja Virtual para aquisição de nossas publicações

Acesso às revistas Amazônia Judaica e Universo Sefarad

Acesso aos blogs Amazônia Judaica e Universo Sefarad Acesso a newsletter Açaí & falafel

Ajude a manter vivo este belo projeto. Faça agora sua doação. Contate: ed.amazoniajudaica@gmail.com 25


MEMÓRIA

IMIGRANTE IMPROVÁVEL, UM

MUNKATCHER REBBE PAULO VALADARES, historiador e genealogista

Esta é uma boa hora para lembrar príncipes que perderam os tronos por suas qualidades

O Rebbe

26 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


M PRINCIPE NO BOM RETIRO, O

O filho: Moses, o atual sucessor

D

o que vou falar, poucos conhecem, apesar de ter vivido parte do seu desterro no Bom Retiro, antigo bairro judaico de S. Paulo. Trata-se do 6º “Munkatcher Rebbe”, líder espiritual e laico desta seita hassídica de origem húngara. Estas seitas – o termo é usado aqui como a fração de uma religião com identidade própria e não tem

Juta, a filha, que nasceu durante a fuga

nenhuma intenção depreciativa, apenas sociológica; são como pequenos reinos não-territoriais, fechados a estranhos e governados por um Rebbe ou Admor, sucedidos de forma hereditária. Como o(a) s filho(a)s dos Admores só casam entre si, eles tecem uma teia genealógica, formando uma nova aristocracia judaica.

Munkachevo é uma antiga cidade ucraniana; mas, já foi húngara. Nos anos Vinte do século passado ela tinha em torno de vinte e um mil habitantes, distribuídos assim: 48% de judeus, 24% de ucranianos e 22% de húngaros. A maioria judaica fazia-se notar não apenas na maioria dos estabelecimentos comerciais, observantes do 27


MEMÓRIA shabat, como também no grande número de sinagogas e outras instituições judaicas. Havia várias linhas de observância do Judaísmo e um destes grupos são os Munkacs Hasidim, liderados por um Rebbe ou Admor.

Os Munkacs Hasidim filiavam-se espiritualmente ao Baal Shem-Tov (1700-1760) e eram intransigentemente antissionistas. O grupo fora fundado pelo Grão-Rabino

só entrava num trem ao saber o seu número, após decodificar cabalísticamente o que resultaria dali. Aos sessenta anos ele começou a preocupar-se com a sucessão, que na tradição da comunidade deveria ser familiar. Como só tinha uma filha, Chaia Frima Rivka; já arranjara o casamento quando ela era muito jovem, com o filho do Partzever Rebbe, descendente de RASHI (R. Shlomo Yitzhaki, 10401105) e por consequência de David

O rebbe e um seguidor (foto tirada por Roman Vishniac) Tzvi Elimelech Spira (1783- HaMelech, jovem de genealogia e 1841), que se reconhecia como comportamento impecável. Nestes membro da tribo de Issachar e nos tempos que falo, eram liderados pelo seu bisneto Grão-Rabino Chaim Elazar Spira (1868-1937), 5º Munkatcher Rebbe, um homem inteligente e enérgico, autor de duas dezenas de livros sobre leis judaicas e preocupado com os destinos da sua “nação não-territorial”. Atento aos menores detalhes do cotidiano,

28 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

preparativos para a sucessão, em 1930, tomou uma empreitada maior, ele e o futuro genro, subiram a Israel, para consultarem o rabino Salomão Eliezer Alfandari (18201930), o Avô Santo (Saba Kadisha), cabalista turco de origem portuguesa e rabino-chefe de Sfat, sobre os dias que viriam. Eles ficaram numa sala por muitas horas e o resultado desta

consulta tornou-se um livro.

Três anos depois, a 15 de março de 1933, na sua cidade e durante uma semana foram os esposórios da filha Chaia Frima Rivka Spira com o então delfim político e religioso, rabino Baruch Yehoshua Yerachmiel Rabinovich (em idish: Boruch

Sia Rachmiel Rabinovich), nascido em Parezew, a 13 de setembro de 1914. A festa teve entre 20 a 30 mil convidados. Foi o maior casamento entre filhos de líderes religiosos em todos os tempos. Há filmes deste casamento no Youtube. O jovem noivo e depois marido, era muito inteligente, estudioso e orador talentoso. O seu pai, David Nathan Rabinovich (1868-1930), fora o Partzever Rebbe e a sua mãe, Yitta Spira, pertencia a parentela dos Munkatcher Rebbes, era prima em primeiro grau do Munkatcher Rebbe daquela geração. Em 13 de maio de 1937 morreu o rabino Chaim Elazar Spira e o rabino Baruch Rabinovich, aos 23 anos, recebeu o encargo de cuidar religiosamente daquele pequeno reino, tornando-se o 6º Munkatcher Rebbe. Ela já era uma comunidade bem estruturada, possuía instituições de ajuda mútua, uma rede de escolas para meninos e meninas, ieshiva, sinagogas, tribunal; e principalmente, cultura e identidade próprias. Possuíam interlocução com não-judeus importantes como Tomás Masaryk (1850-1937), primeiro presidente da Checoslováquia; Edvard Benes (1884-1948), várias vezes presidente do país; a rainha Guilhermina da Holanda (1880-1962); que foram


Documento de imigração de Moses

Documento de imigração de Juta

recebidos em seu território e abençoados pelo Munkatcher Rebbe anterior. Mostrando esta ligação com o Estado, o novo Munkatcher Rebbe serviu o exército por seis meses em 1937. Em 14 de fevereiro de 1934, nasceu-lhe Hirsch Natan David, primogênito; em 5 de março de 1939 nasceu o filho Chaim Lazar; e em 25 de dezembro de 1940, outro

filho, Moshe Yehuda Leib, futuro 7º Munkatcher Rebbe; em 1º de abril de 1942, e Isak Jakab, futuro Dinover Rebbe. Todos nasceram em Munchevo.

Porém uma tempestade se avizinhava: o Shoah (Holocausto). Assim de uma hora a outra, tudo se desmoronou. Ele tentou por

todos os expedientes salvar os seus seguidores. Não se deve esquecer que ele era muito jovem, enfrentava algo impensável e não tinha nenhum exército. Esteve preso num campo de trabalho forçado junto ao primogênito Hirsch Nathan David, de dez anos. Foi solto e no começo de 1944 falou na Grande Sinagoga de Budapeste para uma multidão que 29


MEMÓRIA tomava até as janelas, aconselhouos a venderem tudo e seguirem com ele ao Eretz Israel, que estava sobre o Mandato Britânico; pois os nazistas destruiriam os judeus da Europa. O seu raciocínio era que os nazistas perderiam na frente russa e voltariam destruindo todas as comunidades que encontrassem. Ele já sabia das implicações do massacre de judeus em Moguilev-Podolsk. Foi repreendido ironicamente por um dirigente local: “Não nos assuste com a história de que os nazistas estão vindo para Hungria. Se precisar de dinheiro, tente outro expediente”. Ele não deixou-se intimidar pelos descrentes na violência nazista. Negociou com o governo checo documentação para duas mil famílias, onde se afirmavam que eram “cristãs” – destas, 150 foram para a Republica Dominicana. Mesmo assim, muitos dos seguidores e parentes foram deportados e mortos em Auschwitz; ele, a esposa e os filhos seguiram para Istambul, onde nasceu a filha Juta em 12 de março de 1944 e dali seguiram para Israel, onde tentou começar uma nova vida. Em 30 de maio de 1944, depois de assassinarem e deportarem os judeus locais para campos de extermínio, os nazistas declararam a cidade de Muncachevo: “Judenrein” (sem judeus). De uma hora a outra ele não tinha mais seguidores, tudo agora era com consigo, inclusive reconstruir a sua comunidade religiosa. Sem encontrar os

seus Munkacs Hasidim, deslocados pelo mundo, ele tentou ser o rabino-chefe de Tel-Aviv em 1946.

Pretendia ser escolhido por seus 30 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

A GENEALOGIA DO MUNKATCHER REBBE I - R. MEIR KATZNELLENBOGEN, 1482-1565, MaHaRam Padua; Descendente do R. Shlomo Itzhaki, 1040-1105 e por este do Rei David; II - R. SAMUEL JUDAH KATZNELLENBOGEN, 1521-1597; III - R. SAUL JUDAH KATZNELLENBOGEN, “Rei da Polônia por um dia”; IV - R. MEIR KATZNELLENBOGEN; V - BEILA KATZNELLENBOGEN, c.c. R. Jonah Teomim; VI - R. EZEKIEL FEIVEL TEOMIM; VII - R. ARIEH LEIB, ABD (cabeça de um tribunal) Kreszow; VIII - R. HAIM JOSEPH TEOMIM, ABD Ostrowiec; IX - R. EZEKIEL FEIVEL FRANKEL-TEOMIM, ABD Ostrowiec; X - SARAH TEOMIM, c.c. R. DovBer, ABD Belaia Tserkov; XI - GOLDA TEOMIM, c.c. R. Jerachmiel Moses Rabinowicz, ABD Przysucha; XII - R. NATHAN DAVID RABINOWICZ, 1814 -1865, Admor de Szydlowiec; XIII - R. ISAAC JACOB RABINOWICZ, 1847 - 1905; XIV - R. NATHAN DAVID RABINOWICZ, 1868-1930, Partzever Rebbe; XV - R. BARUCH JOSHUA JERACHMIEL RABINOWICZ, 19141997, Admor Parczew e 6º Munkatcher Rebbe. FONTE: ROSENSTEIN, Neil. The unbroken chain, pp. 325-328

méritos e não disputar o cargo; como isto não aconteceu, abandonou a disputa. Um ano antes, a sua esposa Chaia Frima Rivka, falecera em Jerusalém. O Munkatcher Rebbe ficou sozinho com cinco órfãos em situação de extrema penúria. Teve dias em que ele e a governanta

se privaram das refeições para alimentarem os filhos. Percebendo que os meninos respeitavam-na, ele casou-se com ela, Yehudit (“Irit”) Walhaus (no registro brasileiro: Irene Wahihavs, fª de Oskar e Rosi Wahihavs, 1926-1999), criando mais um problema para si. O grupo


dirigente dos Munkacs Hasidim não aprovou o casamento: pois, apesar de extremamente educada, ela era ieke (alemã) e de família simples, sem ligações genealógicas com as conhecidas dinastias hassídicas. Tiveram dois filhos: Rachel e R. Yair Bezalel Meir Rabinovich. Não se sabe claramente qual a razão; mas, foi neste momento que ele escolheu o Brasil, como um lugar para recomeçar ou reinventar-se como líder religioso. Uma versão, afirma, que os seus seguidores estavam incomodados com a sua postura sionista, com o seu casamento com a jovem alemã e não queriam ser liderados por ele. Esperavam apenas a maioridade do seu filho, R. Moshe Yehuda Leib, para ter um novo chefe.

Em 9 de outubro de 1947 ele desembarcou no porto do Rio de Janeiro, com um visto para trinta dias. Era um

bonito homem de barbas pretas esplêndidas, tímido, identificado nacionalmente como “palestino” e estava em trânsito. A foto mostra-o tenso, os ombros contraídos como se carregasse o “anão corcunda” (bucklicht männlein), na imagem da filósofa Hannah Arendt (19061975), aquele peso de angustia vivido pelo refugiado. Durante um pequeno período ele foi e voltou a Nova York por algumas vezes. É possível que estivesse providenciando a nova morada, que foi na rua Prates nº 143 e depois na Rua Júlio Conceição nº 353, no Bairro do Bom Retiro, em S. Paulo; onde os filhos puderam brincar e dissipar os dias de tristeza que enfrentaram na Europa. Logo ele buscou inserir-se numa cidade onde não viviam hassidis e mesmo

o nome do seu reino era pouco conhecido entre os judeus locais. A historiadora paulistana Rachel Mizrahi no livro Imigrantes judeus do Oriente Médio: S. Paulo e Rio de Janeiro (S. Paulo: Ateliê Editorial, 2003) registrou uma intervenção dele na vida religiosa da cidade: a conversão do santista Geraldo Porto (1918 - 2007), que vivia entre os sefaradis da Mooca. Algo incomum para aquele momento. Ele era católico praticante; mas, tinha inquietações religiosas, que aumentou ao ter amizade com o egípcio Jacques Sarraf (1894-1959). Apresentado por este ao Rebbe, foi dissuadido da conversão, tal a praxe tradicional. Porto e a família ficavam por horas sentados nos bancos do Jardim da Luz a espera de serem recebidos pela autoridade religiosa. Cinco anos depois o processo de conversão foi concluído e a família Porto tornou-se praticante da religião judaica; tanto que os três filhos casaram-se com moças judias. Quando começou conhecer a cidade, descobriu a Universidade de S. Paulo (USP), onde cursou Filosofia e Psicologia. A professora

Regina Igel, da Universidade de Maryland, lembra-se dele: “numa fila diante do guichê

da secretaria da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (como era chamada então), no primeiro andar, na Rua Maria Antônia. Quando contei para o meu pai que vi o Munkasher Rébbe na fila da Faculdade, ele ficou pasmo. “O rabino! na fila, como todos!” Na Europa de ‘antes’, ele jamais ficaria em fila alguma... seria levado - por seus acólitos e admiradores para a frente de qualquer fila... e com o

apoio de todos...”. Neste momento já deixara de ser Anti-Sionista e a partir dali passou a citar os filósofos gregos Platão e Aristóteles, algo incompatível para os seus antigos súditos. Em 1963 deixou o Brasil para ser o rabino-chefe de Holon. Publicou em 1996, dois livros que escrevera, Divrei Nevonim, um comentário sobre a Torah; e Binat Nevonim, um tratado sobre o Holocausto, que ele atribuía ao ódio entre os judeus. Depois do Shoah, o 6º Munkatcher Rebbe esteve deslocado entre a Europa e a Ásia, e por alguns anos viveu como imigrante em S. Paulo. Ele e os filhos. O processo de destruição do seu reino, levou-o a sair deste casulo protetor e identitário, expondo as outras visões de mundo, mesmo judaicas, perdendo a identidade que devia representar junto aos seus seguidores e que num movimento extremo, foi recusado por eles. O “reino” Munkatcher passou ao filho R. Moshe Yehuda Leib Rabinovich, que fora educado nos valores do grupo, na ieshiva Telshe em Cleveland, EUA; e que continua na liderança dos Munkacs Hasidim, agora reunidos entre Boro Park e Williamsburg. O 6º Munkatcher Rebbe subiu a Israel onde viveu anonimamente os últimos dias de sua vida, dirigindo uma sinagoga própria, administrada hoje pelo R. Yair Meir Bezalel Rabinovich, filho do segundo casamento e frequentada ainda por alguns brasileiros. Morreu em Petah Tikva, a 26 de dezembro de 1997. (Fotos, com a exceção do Roman, do Arquivo Nacional, RJ. Roman Vishniac (1897-1990), fotografo e etnografo das comunidades judias do Leste Europeu) 31


CAPA

POR UM YOM KIPUR QUE SEJA ETERNO 32 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


Iamim Noraim, em especial o Yom Kipur, para todo o povo judeu, onde quer que ele esteja nesta grande diáspora e em Eretz Israel, sempre foi o período mais importante e sagrado do ano judaico Na Amazônia não foi distinto. O Kipur, desde sempre, representou e representa até hoje, não só, o período mais solene do calendário judaico, mas também é sua celebração, um dos grandes elos de identificação e preservação da tradição judaica, bem como do sentido de pertinência de cada judeu da região ao seu povo. O artigo a seguir, trata da luta pela manutenção desta tradição e do risco que ela corre de desaparecer em Rondônia. Sem discordar com o artigo, pois acreditamos que o perigo exista, trazemos aqui, também, exemplos de iniciativas que poderão reverter a situação apresentada pela autora em sua pesquisa.

33


CAPA

O ÚLTIMO YOM KIPUR Nilza Menezes*

Página de um livro cartorial pertencente ao Centro de Documentação Histórica do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia

A

s fontes utilizadas são os documentos pertencentes ao acervo do Centro de Documentação Histórica do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia: processos judiciais, livros cartoriais de Imóveis e Registro Civil que registram a movimentação das pessoas pelas vilas ao longo 34 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

do trecho ligado pela Vila de Porto Velho, ponto de partida da Estrada de Ferro Madeira Mamoré a GuajaráMirim, ponto final da ferrovia. O registro pessoal proporcionado pela ficha de mapeamento, onde os descendentes narram a história das suas famílias foi fonte importante, contribuindo para a observação

das trajetórias pessoais dos judeus na região, e proporcionou a percepção das relações familiares e principalmente a observação do momento de rompimento que o título desse trabalho propõe, a quebra da tradição religiosa. A narrativa de Mirian, filha de um judeu casado com uma mulher,


identificada como não judia que era filha de bolivianos, nascida na Bolívia, traz de forma clara essa observação. O pai de Mirian até morrer guardou os costumes religiosos. Os filhos possuem nomes típicos, Abrão, Mirian e Muny, mas somente ele praticou nas datas próprias do judaísmo a sua fé. Para os filhos o dia do yom Kipur, era um dia em que ninguém podia falar com o pai e que ele comia um pão que vinha de São Paulo (sic). Eva Blay nos informa sobre a realização da circuncisão na Vila de Porto Velho por volta de 1909. O mais provável é que fosse na localidade de Santo Antonio do Rio Madeira, vez que no ano de 1909 em Porto Velho existia apenas o barracão da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, sendo que todo o centro político, econômico e social estava em Santo Antônio e nas localidades até Guajará-Mirim. Grande número de nomes é encontrado nos documentos de compra e venda de imóveis, nas transações comerciais, nos casamentos e informações sobre falecimento proporcionado pelos inventários.

No caso dos judeus que habitavam a região de Santo Antônio do Rio Madeira, muitos deles são identificáveis através da ata de casamento onde encontramos o nome dos pais dos noivos oriundos do Marrocos e onde é registrado o casamento religioso já realizado de acordo com as tradições hebraicas. Possivelmente

essa

cerimônia

Inauguração da Ferrovia MadeiraMamoré, entre Porto Velho e Guajará-Mirin, construída entre os anos 1907 e 1912

tivesse sido realizada em Belém, onde havia uma sinagoga(sic) e um rabino, sendo o casamento civil realizado após, em Santo Antônio, onde residiam as famílias. A característica comum entre eles é a procedência. Oriundos de Tanger no Marrocos refaziam na Amazônia a continuidade das suas tradições, casando-secom os iguais. A premissa de que para se criar uma sinagoga são necessários dez judeus (homens) com certeza poderia ser aplicada em Santo Antônio do Rio Madeira no começo do século. Relacionamos aqui nomes de família, alguns já registrados por Benchimol e que aparecem nos documentos de Santo Antônio do Rio Madeira, entre os anos de 1912 e 1930, residindo ou comercializando temporariamente: Israel, Azulay, Nabeth, Reich, Guitart, Chermont, Larramaga, Meyer, Bensabaht, Essabá, Serfaty, Benarech, Eshrique, Benchimol, Benchitrit, Buzaglo, Cerreuya ou Serruja, Malaquias, Marache, Benayon, Chacon, Dantas, Bastos, França, Castillo, Sotello, Barbiery, Drervell, Norton e Gusman.

Observamos nomes como Siqueira, Penha, Pessoa, Barchilon, Paiva, Barreto, qualificados como portugueses e que são encontrados nas mesmas listas onde se encontram os judeus estabelecendo casamentos e relações comerciais.

Eles mantinham relações comerciais com os árabes em pequena escala, observandose um relacionamento mais estreito com os portugueses. Percebe-se pela relação dos nomes nas cerimônias de casamento e as testemunhas arroladas nas questões judiciais e nas transações imobiliárias que as duas nacionalidades (sic) se serviam uma da outra, havendo troca nas relações. A evidência oferecida pela documentação das atividades dessa comunidade na região é bastante ampla e diversificada. Encontramos registros com nomes hebraicos como o caso de Ida Bentes Azulay sem muitas qualificações; consta que ela vivia com Orlando Pereira da Costa com quem teve 35


CAPA dois filhos que não receberam o nome Azulay em seus registros de nascimento, constando apenas o nome do pai. Ida era doméstica e Orlando carregador de Malas, e pelo nome de família acreditamos que fosse Ida uma judia, mas Orlando não nos dá essa pista. Apesar da premissa de que a condição de judeu seja transmitida pelo ventre

Abrão Levy, comerciante representante da Firma B. Levy. Moises Serfaty era comerciante em Porto Velho, Saleb Merheb, que foi comerciante na povoação de Generoso Ponce, cujo inventário tramitou em 1923. O montante da herança que foi de cinco contos e dezoito mil e novecentos réis foram adjudicados pela viúva Rosa Morheb e pelos fi-

O grande empresário e político ,Moysés Bennesby e sua família

O empresário judeu marroquino, Saul Bennesby materno, o documento não nos propicia esse entendimento, assim como a condição paterna. Com relação às atividades comerciais, essa presença também é notável. Francisco da Cunha Bembom, Elias Leão Buzaglo, e Jacob Essabá, que também traduzia documentos do espanhol para o português, tinham firmas estabelecidas em Manaus. 36 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

lhos José Saleh Morheb de 11 anos, Genoveva Saleh Morheb de 07 anos e Josephina Saleh Morheb de cinco anos. Salomão Rengito era comerciante em Santo Antônio do Rio Madeira em 1926. As firmas estabelecidas apresentam os nomes: Dinard Benayon e Companhia tendo como sócio Moyses José Bensabath; foi

liquidada em 1916. Castillo & Companhia, Benayon & Companhia, B. Levy e Companhia, N. Ariola e Companhia, que nos induzem a afirmar pertenciam aos judeus em razão da forma de comercializar, sempre dentro de uma organização oportunizada pela rede partindo de Belém para Manaus e até GuajaráMirim. Muitos deles tinham

firma estabelecida em Manaus e mantinham negócios em Santo Antônio, assim como nas demais localidades ao longo da ferrovia até Guajará-Mirim, sendo administrada por algum parente. É certo e deve ser registrada a importância desses imigrantes na localidade que além das atividades comerciais exerciam os cargos públicos relevantes na sociedade de Santo Antônio. O nome Chacon do primeiro juiz da Comarca (19121914) de Santo Antônio figura na lista das famílias hebraicas da Amazônia, assim como Moyses José Bensabaht, comerciante e juiz suplente (1913 –1916) e José Penha, que era juiz adjunto do Distrito Judiciário do Estado do Amazonas. Os nomes de família são como uma bandeira, significam tradição


de famílias importantes da região. Nomes que já figuraram e figuram nas listas dos deputados, prefeitos, médicos, comerciantes, advogados, enfim, pessoas de destaque da sociedade. Muitos nem mesmo tem muita consciência, desconhecem os significados de ser um neto de judeu em face da identidade perdida.

As famílias, Benesby e Israel são citadas no trabalho de Samuel Benchimol como sendo os únicos remanescentes dos judeus na região do Guaporé. Ao que se observa pelas pesquisas desenvolvidas, a família Benesby permanece tanto em Guajará-Mirim como em Porto Velho mantendo as tradições culturais.

Para concluir vale lembrar as observações de Benchimol em capítulo sobre a demografia judaica (Valer, 1999), onde ele aborda a questão dos filhos de judeus espalhados pelas barrancas de rios, dos tempos em que os judeus viajavam com seus regatões, antes dos árabes, ocorrendo o desaparecimento para o judaísmo de um grande número de famílias judaicas no interior amazônico. O ser, viver, ficar e sobrevier judeu não se tornou possível, e assim como o pai de Miriam que foi o último da família a comemorar o Yom Kipur, tantos outros esqueceram do dia de pedir perdão e acabaram incorporados e integrados à população amazônica. Nilza Menezes é doutorada pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp), historiadora especializada em ciências da religião. Coordenadora do Centro de Documentação Histórica do TJRO.

A DEPENDER DE INICIATIVAS RECENTES, RONDÔNIA AINDA NÃO VIVEU SEU ÚLTIMO YOM KIPUR “Boa trade! Gostaria de saber como registrar minha Sinagoga no portal. É a Sinagoga Isaac Bennesby ( Sociedade Israelita de Rondônia) e fica em Porto Velho, RO” Messody Bennesby Esta mensagem nos foi enviada ao nosso site, o Portal Amazônia Judaica (www.amazoniajudaica. org), por Messody Bennesby, membro da tradicional família de Rondônia. Os atuais Bennesby são descendentes do judeu marroquino, Saul Bennesby e da filha de judeus marroquinos, Anita Salgado Bennesby. Eles compõe uma das últimas famílias judias que permaneceram em Rondônia. Saul, que havia se estabelecido, anteriormente no Amazonas, na década de 40 mudou-se para a região, que na época era um antigo Território Federal, e lá estabeleceu um pequeno comércio. Moysés seu primogênito, seguindo os passos de seu pai, tornou-se um dos maiores empresários de Rondônia, criando o Grupo Bennesby, composto de dezenas de empresas e que posteriormente, ampliou sua presença para Guajará-Mirim, Rio e São Paulo. Além de participação na economia local, os Bennesby, enveredaram, também, na política: Moysés foi deputado estadual, federal e candidato ao Senado. Já seu irmão Isaac Bennesby, engenheiro de formação, estabeleceu-se em Guajará-Miriam e lá chegou a ser prefeito da cidade – um dos mais populares de sua história.

Messody nos informa, que: “O nome da sinagoga homenageia o grande político judeu e de família tradicional em Rondônia. Não poderia colocar os nomes de todos da família, então homenageei o Isaac. Eu sou a presidente. O vice-presidente é Paulo Daniel Benito, o secretário Ozanam Amoz Teixeira e a tesoureira, Suhellen Bennesby Pinto Dias. Temos também um conselho. Nossa sinagoga funciona com a ajuda dos participantes, quando eles têm para ajudar. Não recebemos nenhum outro tipo de ajuda. As vezes faço rifas de objetos meus, da mãe, para angariar algum dinheiro para comprar, matzot, sidurim, vinhos, e outros artigos religiosos” É importante registrar que a iniciativa de Messody Bennesby e seus companheiros de criar a Sinagoga Isaac Bennesby, não é a única entidade judaica de Rondônia. Ela é sim, a mais recente. Em Porto Velho, a capital do estado, funciona, também o CEJURON – Centro Judaico de Rondônia. Como podemos ver, apesar das inúmeras dificuldades, este ainda não será o último Yom Kipur de Rondônia. 37


EM DESTAQUE

LIVRO SOBRE JUDEUS DA AMAZÔNIA É SUCESSO INTERNACIONAL Foi um enorme sucesso o lançamento da coletânea “Amazônia Judaica, 15 anos de travessia”, no exterior

38 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


Lançamento no CCB – Centro da Cultura Brasileira, em Tel Aviv

Lançamento no Centro Israel Sefarad, em Madri

Lançamento na CIL – Comunidade Israelita de Lisboa

Lançado no Brasil em 2017 (Rio, São Paulo, Manaus e Belém) para comemorar os 15 anos de fundação da editora Amazônia Judaica, a coletânea é uma seleção de matérias, artigos, crônicas e ensaios, publicados no jornal e na revista que leva o nome da editora; o livro foi editado em português e espanhol. Em 2018 o calendário de lançamentos do livro está marcado por eventos internacionais. Já foi lançado com enorme sucesso, por Elias Salgado, co- organizador da coletânea e diretor/editor do Amazônia Judaica, em Israel, Espanha e Portugal. Para o segundo semestre deste ano, estão previstos lançamentos na Argentina e no Uruguai. 39


HISTÓRIA

OS JUDEUS NA ECONOMIA DE MANAUS Dina Paula Santos Nogueira

No ano de 2010, decidi que a Comunidade Judaica de Manaus seria o tema da minha Monografia de conclusão do Curso de Serviço Social na Faculdade Nilton Lins 40 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

D

e maneira específica, e inspirada pela leitura do livro Eretz Amazônia escrito pelo professor Samuel Benchimol, procurei traçar um breve histórico acerca da imigração judaica para a Amazônia e a participação desta comunidade no desenvolvimento econômico da cidade de Manaus. Nesta pesquisa busquei destacar que a “participação judaica no Amazonas em especial na cidade


de Manaus, se deu de forma dinâmica, desde o trabalho como regatão, nos pequenos comércios no período do Ciclo da Borracha até as grandes empresas judaicas administradas atualmente por seus descendentes. Desta forma, o texto a seguir traz um resumo de pontos da minha monografia escrita em 2010, destacando o que considerei relevante para este artigo1. A geração pioneira (1º e 2º Ciclos da Borracha – 1880 a 1912/ 1942 a 1945) composta principalmente de jovens rapazes, que chegavam à região em pleno Ciclo da Borracha, atuou como seringalista, 2 regatão , donos de firmas comerciais exportadoras e importadoras de borracha varejistas ou proprietários de estabelecimentos comerciais. Estes jovens também foram para o interior como aprendizes, empregados, balconistas e vendedores ambulantes, contratados por firmas judias de Belém e Manaus ou partiram com suas famílias para trabalhar como regatão nos rios Tapajós, Madeira, Purus, Juruá e Tarauacá até chegar em Cruzeiro do Sul no Acre (BENCHIMOL, 2008). Como podemos notar, os pioneiros aproveitaram o sistema econômico vigente na época de sua chegada para construir seus negócios e desenvolver suas atividades comerciais. Com o aumento da demanda e os altos preços da Borracha muitos judeus obtiveram sucesso em seus empreendimentos. Alguns tornaramse proprietários de empresas de navegação e faziam parte do mercado de transporte de passageiros

O livro Eretz Amazônia do Prof. Samuel Benchimol. Um clássico e a maior obra de referência sobre a presença judaica na Amazônia

Sede da Associação Comercial do Amazonas

e cargas3. Outros foram escolhidos como vice-presidentes, secretários e tesoureiros na Associação Comercial do Amazonas (ACA, criada em 1871)4. E atuavam nas firmas recebedoras/ aviadoras de borracha entre os anos de 1909 a 1916, e em Manauschegaram a atingir o número de 361 firmas5. Empresa de aviadores, recebendo borracha vinda dos seringais do interior

Além destes, existiram muitos recebedores que não atingiram 100.000 quilos anuais, mas que também contribuíam com a movimentação da economia da cidade, Loureiro (2008, p. 279/287) cita pelo menos 32 destas firmas que pertenciam a judeus. É realmente significativo o que esta fase representou para a comunidade judaica tanto de Manaus quanto de Belém, pois muitos de seus 41


HISTÓRIA

Seringalistas e seringueiros: os patrões e seus empregados uma relação bastante desigual

A Campanha da Borracha, período da 2ª. Guerra Mundial

membros se tornaram expoentes no cenário empresarial. No entanto em meados de 1876, com a produção da borracha ainda em expansão, ocorreu o contrabando 42 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

de sementes da seringueira do Brasil para a Inglaterra e daí para as colônias inglesas da Ásia. Este acontecimento iniciou o fim do monopólio da borracha pelo Brasil

e em 1913, as exportações asiáticas superaram a produção brasileira inviabilizando cada vez mais esta atividade na Amazônia. Com a crise e o fim do monopólio amazônico, a região passa a ser um imenso território empobrecido e os casos de falência passam a ser comuns na capital (SANTOS, 2010). Entre os anos de 1930 a 1950 os judeus marroquinos que vivam no interior do Estado iniciaram o êxodo para as capitais Manaus e Belém. Oriundos de Itacoatiara, Parintins, Maués, Borba, Humaitá, Porto Velho, Guajará-Mirim, Fortaleza do Rio Abuanã, Tefé, Coari, Tarauacá e Iquitos; alem de cidades do Pará como Alenquer, Óbidos, Santarém e Belém estas famílias abandonaram seus seringais, castanhais, regatões, flutuantes, casas de comércio, sítios e fazendas, aumentando


A atual Av. Eduardo Ribeiro em Manaus – principal artéria do centro da cidade do final doséculo XIX até os anos 70

Empresa de aviadores, recebendo borracha vinda dos seringais do interior

O Ciclo da Borracha trouxe para Manaus uma série de novidades e a cidade foi a primeira do país a ter luz elétrica e bondes

a comunidade judaica para 250 famílias. (BENCHIMOL, 2008). Após o declínio da borracha outros produtos passaram a constituir a base da economia regional entre 1920-40, houve um período de prosperidade para a comunidade judaica. Então, de 1925 a 1940 inúmeras empresas de exportação e importação de produtos regionais6 negociavam em Manaus7. Com o advento da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), houve um breve crescimento da economia da borracha já que havia a demanda dos EUA por este produto, porém, terminada a Guerra, a Amazônia foi novamente abandonada. A fim de reestruturar a economia do Estado algumas medidas são implementadas, é nesse momento que surge a Zona Franca de Manaus (ZFM) criada pela Lei Nº 3.173 de 06 de junho de 1957. Dez anos depois, o Governo Federal, por meio do Decreto-Lei Nº. 288, de 28 de fevereiro de 1967, ampliou essa legislação e reformulou o modelo, estabelecendo incentivos fiscais por 30 anos para implantação de um polo industrial, comercial e agropecuário na Amazônia8. Nesta fase econômica o empresário Isaac Benayon Sabbá ganha destaque, pois conforme relata Benchimol (1994), ele esteve diretamente ligado à criação da ZFM sugerindo e propondo a criação da mesma, Além disso, construiu a Companhia de Petróleo da Amazônia – COPAM, inaugurada em 3 de janeiro de 1957 pelo Presidente Juscelino Kubitschek. (BENCHIMOL, 1994). Neste período, além de investiram na área industrial de beneficiamento 43


HISTÓRIA

de produtos regionais como e refino de petróleo os judeus também se fizeram notar nos polos joalheiros, eletroeletrônico e industrial além de exercerem cargos públicos e atuarem como profissionais liberais. Benchimol (2008, p. 138-146) apresenta uma lista de 77 empresas judaicas que existiram entre os anos de 1940/1950 e outras 61 empresas comerciais da ZFM a partir de 1967, além de 25 firmas industriais e de serviços no Distrito Industrial. Porém, muitas delas não resistiram à falta de recursos do Governo Federal e Estadual e à decadência da ZFM. Outras já não pertencem majoritariamente a sócios judeus ou descendentes, mantendo em seu quadro de diretores pessoas de diversos Estados do país. Mas algumas permaneceram com suas 44 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

Prédio principal da FOGÁS, empresa do Grupo BEMOL-FOGÁS, fundado por Samuel Isaac Benchimol

atividades e só fortaleceram seus empreendimentos ao longo dos anos como é o caso da Empresa BEMOL–FOGÁS fundada em 1942 por Samuel Benchimol. Refletindo sobra o tema desta monografia, pude concluir que hoje, em Manaus, ainda existe uma parcela significativa de empresários judeus atuando no campo econômico manauara. Aliado a isso, uma nova geração de judeus amazônicos participa ativamente de vários segmentos da sociedade como médicos, professores, advogados, políticos e empresários. Sendo

uma

Comunidade

relativamente pequena, com um número estimado de 180 a 200 famílias residentes na capital, estes dados resumidamente apresentados, proporcionam uma rápida visão acerca do envolvimento constante e positivo desta Comunidade no desenvolvimento da economia de Manaus. 1 SANTOS, Dina Paula Pinheiro. A participação da Comunidade Judaica no desenvolvimento da Economia de Manaus: do Ciclo da Borracha a zona franca de Manaus. Monografia apresentada ao Curso de Serviço Social no Centro Universitário Nilton Lins. Manaus, 2010.


2 Seringalistas: O dono do seringal, patrão do seringueiro. Depois do surto da borracha passou a ser chamado de seringalista. (SANTOS, 2007, p. 200/207). Regatões: O comerciante dos igarapés, seu negócio se caracterizava pelo fornecimento das mercadorias de que o seringueiro necessitava (SANTOS, 2007, p. 200/207).

3 Benzecry & Cia dona do navio Belém, E. Levy e Cia com o Tocantins, Issac J. Roffé com navios Cássio Reis, Isaac Roffé e Annita além dos vapores Walter e Mazaltov de propriedade de S. M. Marques, Tupã de Marque e Benchimol e o União de Abraham Chocron (LIBERMAN, 1990, p. 56). 4 Raphael Benoliel, Isaac Benayon Sabbá, Jacob Paulo Levy Benoliel e Elias .Jacob Benzecry 5 Entre estes recebedores de borracha encontram-se as firmas: B. Levy & Cia, Emanuel Levy & Cia, Theodoro Levy, Camile & Cia, Serfaty & Bezerra, J. Essabá (LOUREIRO, 2008). 6 Borracha silvestre, Castanha, Balata, Peles e couros, Guaraná, Copaíba, Cumarú, Jarina, Penas, Resinas, Algodão, Puxuri, Salsa, Borracha em lâminas, Ucuquirana, Piaçaba, Madeiras, Cacau.

7 B. Levy & Cia, Paulo Lévy & Cia, I. B. Sabbá, Ezagui, Irmão & Cia, I. J. Benzecry, M. E. Serfati & Cia, Peres, Sabbá & Cia, J. Abecassis (BENCHIMOL, 2008) 8 Disponível no site http://www.suframa. gov.br/download/legislacao/federal/legi_ dl_288.pdf, acesso em janeiro de 2010.

REFERÊNCIAS AZRIA, Régine. La Femme dans la tradition et la modernité juives. In: Archives des sciences sociales des religions, n. 95, 1996, p. 117-132. Disponível em: <http://www.persee.fr/web/revues/ home/prescript/article/assr_03355985_1996_num_95_1_1039>. Acesso em: jul. 2014. BENCHIMOL, Samuel. Eretz Amazônia – Os judeus na Amazônia. 3ª ed. revista. Manaus: Valer, 2008. BENCHIMOL, Samuel. Judeus no Ciclo da Borracha. Edição Xérox. Manaus, 1994. BENTES, Abraham Ramiro. Das ruínas de Jerusalém à verdejante Amazônia – Formação da primeira comunidade Israelita Brasileira. Rio de Janeiro: Bloch, 1987. Primeira comunidade Israelita Brasileira: tradições, genealogia, pré-história. Rio de Janeiro: Gráficos Borsoi, 1989. GIDDENS, Anthony. As consequêncIas da modernidade. Tradução de Raul Fiker. São Paulo: Editora Unesp, 1991. HERVIEU-LÉGER, Danièle. O Peregrino e o Convertido: a religião em movimento. Tradução de João Batista Kreuch. Petrópolis: Vozes, 2008. LIBERMAN, Maria. Judeus na Amazônia brasileira, séculos XIX e XX. Tese de doutorado, USP, 1990.

LOUREIRO, Antônio. A grande crise. 2ª ed. Manaus: Editora Valer, 2008. NOGUEIRA, Dina Paula Santos. Identidade e Tradição: Um estudo sobre as mulheres da Comunidade Judaica de Manaus. Dissertação apresentada à Universidade Federal do Amazonas como parte das exigências do Programa de PósGraduação em Sociologia para a obtenção do título de Mestre. Manaus, 2015. Editado pela Ed. Amazônia Judaica SANTOS, Dina Paula Pinheiro. A participação da Comunidade Judaica no desenvolvimento da Economia de Manaus: do Ciclo da Borracha a zona franca de Manaus. Monografia apresentada ao Curso de Serviço Social no Centro Universitário Nilton Lins. Manaus, 2010. PONTES FILHO, Raimundo Pereira. Estudos de História do Amazonas. Manaus: Editora Valer, 2000. SANTOS, Francisco Jorge dos. História geral da Amazônia. Rio de Janeiro: Memvavmem, 2007. SCHLESINGER, Michel. Curso de Introdução ao Judaísmo. Congregação Israelita Paulista, 2007. SOUZA, Márcio. História da Amazônia. Manaus: Editora Valer, 2009.

45


REMINISCÊNCIAS

A Comunidade Judaica de Tanger

ENTRE A LEMBRANÇA E O ESQUECIMENTO POR RAJAE BOUMEDIANE EL * METNI Rajae Boumediane El Metni (Tradução Elias Salgado) (Fontes: Raíces)

Vista aérea de Tanger

A

comunidade judaica de Tanger persiste ainda, menos numerosa, porém se matem viva. Das 17.000 almas que chegaram a conviver em Tanger, restam apenas 189 judeus(2) e a maioria são pessoas idosas. Este fato nos leva a perguntar porque diminui tanto o número de judeus de Tanger em tão pouco tempo? Quais 46 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

são as razões e circunstâncias que os levaram a emigrar para outros países?(3) São muitas as perguntas que que se faz sobre a emigração massiva dos judeus tangerinos e para respondelas, haveria que realizar um retrocesso na história, coisa que se poderia fazer em outro momento. A única coisa que se pode assegurar

é que os sefaraditas, temerosos de ser perseguidos, trocaram sua Tanger pela França, Canadé, Estados Unidos, Espanha, América do Sul e Israel. Consequência disso, é que não só se truncava uma comunidade, mas também, se separava os membros de uma mesma família. A comunidade judaica de Tanger


A memória coletiva de um passado que nunca voltará a ressuscitar e a saudade do que existia e já não existe, mantem viva a comunidade judaica de Tanger. O pouco que resta desta comunidade se nutre das lembranças que sempre estão em processo de flash back arrancando um “ya hasra!”(1)

tinha sua própria identidade. Se a religião constituía o ponto relevante e distintivo do resto da população marroquina e as diversas colônias estrangeiras, a língua e a cultura a diferenciavam dos “outros”, “los forasteiros”(4), os judeus do interior do Marrocos. Como os judeus de Tetuan, Larache, Asilah, Chaouen ou

Alcázar, o judeu tangerino conservou, carinhosa e cuidadosamente, o idioma familiar e comunitário: o judeo-español. Este idioma, convivendo com outros idiomas e logrando maior entendimento com árabes e cristãos, evolui para dar como resultado uma mescla que

recebe o nome de “hakitia”. José Benoliel qualifica esta mistura como “um dialeto peculiar aos judeus”, de origem ibérica estabelecidos no Marrocos desde a expulsão de Espanha, é uma mistura do castelhano antigo, mais ou menos bem conservado, de árabe, de hebraico, etc...a que se dá vulgarmente o nome de hakitia”(5). Porém, a “infidelidade” dos falantes que o criaram e usaram junto com a reispanhização massiva a qual foi submetido o dialeto, a fins do século XIX e finalmente a sedução do francês que culminou com a criação das escolas da Aliança Israelita Universal(6), acentuaram e aceleraram o processo de extinção. Consequentemente, a hakitia sofreu uma decadência e muitos assinaram seu atestado de óbito, afirmando que resta somente uma mera lembrança. Entretanto, numa cidade sem mellah, os judeus – dedicados, principalmente ao comércio e em contato contínuo, tanto com a população marroquina, como com sua língua – se haviam integrado na sociedade marroquina e essa mesma hakitia seguiu seu processo de evolução, dando lugar a outro tipo de hakitia, que tem como raiz , palavras do dialeto marroquino e terminação do espanhol moderno A esta mesma hakitia se referia nosso informante quando nos afirmou: a hakitia falamos de brincadeira, porém, acontece que a hakitia que nós falamos é o árabe espanholizado. Por exemplo, dizemos: “bastante bsslha venga ya feddi liya de uma vez” 47


REMINISCÊNCIAS

A rua das Sinagogas ou “se fue fulano a Itália y soy muy wnachiado” “ andi wach dial hada eso wshchiado. Ou seja , falamos mal o espanhol e mal o árabe”.(7) Enquanto este informante reconhecia a existência de outro tipo de hakitia, a maioria dos demais nega saber palavras haquetiescas, alegando: “na casa dos meus pais falávamos espanhol, nós vivíamos no bou48 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

levard, nós não vivíamos no soko”, “ quando eu era pequena e dizia alguma palavra de kakitia, meus pais me proibiam de falar hakitia”, “ quando dizia alguma palavra de hakitia, minha mãe me dizia “isso não se diz” e as vezes me castigava. Sabe porque? Porque era mal visto falar hakitia. Era um dialeto vulgar e de gente ignorante.”

Testemunhos como estes confirmam a opinião que se tinha da haketia: era proibido falar em algumas casa, estava limitada ás pessoas que viviam no zoco e era um dialeto vulgar, peculiar, apenas, para as pessoas ignorantes. Os preconceitos que se tinha, infelizmente, da hakitia, favoreceram sua decadência, sua agonia e sua ex-


tinção. De fato seu desaparecimento se deve, principalmente, a razões de caráter sócio econômico e cultural. Na verdade, quando ouvi tais testemunhos, me dei conta de como um idioma pode desaparecer por preconceitos e cheguei a dizer a mim mesmo: Ya hasra! Porém apesar disso não me resignei. Queria averiguar se aqueles que manifestaram não saber nada de hakitia, poderiam me dizer algumas palavras. Foi difícil romper a barreira do “não sei nada de hakitia”. E quando disse que para mim a hakitia não é absolutamente vulgar, quando adquiriram alguma confiança, quando perceberam minha grande curiosidade para com este dialeto totalmente ignorado por mim; quando se sentiram seguros e relaxados e finalmente quando um conhecido de meu pai me apresentou

como estudante que investiga a comunidade judaica de Tanger, somente neste momento, liberaram suas recordações e começaram a me dizer palavras e frases como: “está wahleado” (está em apuros), «está chonjreando» (está roncando), «fraja» (alegria), «farezmal» (fuera o mal). Havia, inclusive, um informante que, sendo originário de Casablanca. Manifestava um certo orgulho: eu sou de Casablanca e sei algumas palavras em hakitia porque aprendi aqui no cassino. Eles quando estão juntos às vezes falam, porém quando há um desconhecido, não querem falar, mas sabem muitas palavras de haketia. Eu sei, por exemplo a palavra, ”alhotar”, “se arsó el mazzal”, “me vaya kapara por tí” e muitas outras.(8) Outro infomante me cantou a

seguinte “canción”: «Por esos bulevares/ de 7 a 8/ pasean las alhasbas/ buscando novio/ me vaya kapara/ me vaya hálala.» (as alhasbas são as moças). Destacamos que a maioria das palavras que recorremos, tem a raiz do árabe dialetal e terminação do castelhano. Grande número dos meus informantes foram localizados no cassino, enquanto festejavam Hanukah, outros foram entrevistados na comunidade. Estes últimos me falaram das muitas sinagogas que existiam em Tanger e dos cemitérios judaicos, o velho e o novo. Luis Tangir, secretário dos cemitérios judaicos. Luis Tangir, secretário da comunidade, referindo-se a sinagoga de Nahon, me explicou: “Esta sinagoga estava destruída e tem mais de cem anos. Eu a descobri e tratei pessoalme de

Rajae Boumediane el Metni logrou reconhecimento unânime por suas traduções ao espanhol das novelas de Mohamed Chukri, que reeditou a editora Cabaret Voltaire. Obras como “El pan desnudo” (Al-jubz alhafi) ou “Paul Bowles, el recluso de Tánger” (Paul Bowles wa´uzlatu tanya), A pesquisadora Rajae Boumediane El Metni graças a seu minucioso trabalho de tradução e interpretação, ganharam qualidade e integridade nestas novas versões ao catelhano. 49


REMINISCÊNCIAS

Cemitério antigo de Tanger restaurá-la. Ela era frequentada pela nata dos judeus de Tanger” A sinagoga mencionada vai se converter num museu em memórioa de todos os judeus tangerinos; tem a tebá (arca) na frente, diferente das outras sinagogas. Já não se celebram ofícios nesta sinagoga. Como todos os informantes me falavam da semelhança que tem a sinagoga Nahon com a Alhambra de Granada, queria visita-la para ter a oportunidade de averiguar, pessoalmente, dita semelhança. Pedi permissão ao secretário e ele me ofereceu prazerosamente sua ajuda. Graças a sua enorme generosidade e acompanhada por um funcionário da comunidade, logrei visitar todas 50 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

as sinagogas existentes em Tanger e pude notar a semelhança que possui a sinagoga Nahon com a Alhambra de Granada. A grande semelhança reside, principalmente, nas placas de gesso usadas nos arcos e nos cristais coloridos. Estas foram trazidas, precisamente, de Granada há mais de 100 anos Fora esta, restaram apenas quatro sinagogas(9): a sinagoga de Benathar, a sinagoga Bendrihen, a sinago Assayag e a sinagoga Suiri. As duas primeiras tem ofício diário, enquanto as últimas, apenas no Shabat e festividades. Após visitar as sinagogas, desejava entrar no cemitério. Consegui visitar, somente,

o cemitério velho, onde descansam os antigos judeus tangerinos, os que nasceram, viveram e morreram na sua querida Tanger, os que formaram a comunidade judaica. Comecei a buscar nomes que me são familiares entre as numerosas lápides e pude ler, entre outros, o nome de Isaac Laredo (1946), autor de “Memórias de un viejo tangerino”. Até os anos sessenta, se enterrava no velho cemitério, porém, há uns 30 anos deixaram de faze-lo. Há uns dez anos, enterraram o filho do Presidente da Comunidade. Os minutos contados que passei no


cemitério me causaram uma emoção e uma paz tão grandes que enquanto mirava as intermináveis lápides, cheguei a dizer a mim mesmo “ya hasra! Quem dera pudesse voltar no tempo para ter a oportunidade de conhecer a tantos ilustres judeus tangerinos”. Porém me consolava me dizendo que ao menos ficou algo da antiga, fascinante e mítica Tanger, porém o que fica daquela saudosa Tanger? Ficam os cemitérios, em cujas lápides se encontram gravados para sempre os nomes dos que um dia formaram parte da comunidade judaica. Ficam as sinagogas, que mesmo sendo poucas, mantém viva esta religião que apresenta o único ponto distintivo do resto da população. Ficam resíduos deste idioma que chegou a ser meio de comunicação de “los nuestros”. Ficam os testemunhos das pessoas que conviveram e seguem convivendo com a comunidade marroquí. Ficam as várias instituições criadas como o asilo e hospital Benchimol, a sede da comunidade e o cassino, que cada tarde reúne, com orgulho aos “suyos” e se converte na única testemunha que presencia os restos da hakitia. Ficam os testemunhos das pessoas que conviveram e ficam as pessoas que mantiveram viva a comunidade judaica de Tanger. Ficam aqueles que não transformaram – por nada no mundo – sua cidade, porque “ em Tanger as ruas falam, te falam as pedras, tudo te fala”(10) Ficam membros de famílias de muito ´prestígio, como Azancot, Bengio e Assayag. Ficam, finalmente, as lembranças que permanecem vivas na mente de cada judeu tangerino, lembranças que só a morte é capaz de

apagar, le3mbranças que se nutrem cada dia com uma referência, por muito infame que seja, ao passado, porque como disse Milán Kundera: “ A luta do ser na vida é luta da lembrança contra o esquecimento” Tanger seguirá sendo esse “paraíso perdido” que sempre está disposto a acolher a “los suyos”, a esses “filhos adotivos” que um dia abandonaram sua Tanger de corpo, porém, não de alma. Esses filhos que sempre voltam, iniciando um flash back com um ya hasra! Esses filhos que foram, são e serão, fiéis a cidade que um dia viu nascer e crescer a um antepassado. E agora com a sinagoga de Nahon que está se convertendo num museu em memória a todos os judeus de Tanger, a cidade aguarda com grande orgulho e imensa impaciência, esse dia que lhe brindará – uma vez mais – a oportunidade de abraçar a todos seus seres queridos. Não queria terminar com um ya hasra!, porque enquanto siga viva uma minoria judaica em Tanger, se poderá recolher esse eco que recobra força e ressonância, ressonância e vida.

GLOSSÁRIO:

1 – Expressão árabe que significa: que pena! 2 – Estatística fornecida por Luis Tangir, secretário da Comunidade Israelita de Tanger. 12 entre 15 e 25; 6 entre 25 e 50, 12 entre 90 e 100 e os demais tem mais de 60 anos. A maioria dos jovens estudam fora de Tanger.

4 – Assim chamavam os judeus do norte do Marrocos aos do interior. 5 – J. Benoliel, Dialecto judeohispano-marroquí o hakitía, Madrid, 1977, p. 27. 6 – A primeira escola da Aliança Israelita Universal foi aberta em Tetuan, em 1862. 7 – Este informante reconheceu a existência de outro tipo de hakitia formada, principalmente, de palavras do dialeto marroqui. A tradução respectiva dos dois exemplos, é: “basta já de gracinha, termina de uma vez”, “se foi fulano para a Itália e tiveram muita saudade dele. Wahchiado é ficar com saudade”. 8 – Esta é a tradução que me forneceu o mesmo informa: “alhotar” (poupar, guardar); «se arsó el mazzal» (teve muita sorte), «me vaya kapara por tí» (dou tudo por ti). 9 – Antes chegaram a coexistir 17 sinagogas numa mesma rua, denominada por isso “rua das sinagogas”. Até hoje em dia, a paesar da rua possuir outro nome, o letreiro continua com o mesmo nome, escrito em árabe e em francês. Atualmente nesta mesma rua existem apenas duas sinagogas: a de Nahon e a de Suiri. 10 – São palavras de um judeus tangerino que me causaram grande emoção. Nacida en Tánger, Rajae Boumediane el Metni é filóloga hispânica pela Universidade Sidi Mohamed Ben Abdelá de Tetuán e doutora em linguística pela Universidade Complutense de Madrid.

3 – Em 1960, a comunidade contava com 6.300 judeus. 51


LEMBRANÇAS

Minha Sina Por: Simão Arão Pecher (*)

52 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


agoguinha Ah! Que saudade da minha Sinagoguinha em Macapá, capital do antigo Território Federal do Amapá (atual Estado do Amapá), situada no alpendre da casa da tia Esther Zagury Bemerguy (Z’L), irmã da minha mãe Syme (Z’L) 53


LEMBRANÇAS

Leon Zagury e Sara Roffé Zagury

L

á estava uma grande mesa retangular, que nas grandes festividades judaicas abrigava toda a comunidade em volta da Torázinha que meu pai Nuta (Natan) (Z’L) ganhou da sua irmã Susy (Z’L) de Israel. Rosh Hashaná, Yom Kipur e Pessach eram comemorados com fervor pelas nossas poucas famílias. O esteio maior dos judeus no Amapá foi plantado pelo meu avô Leão Zagury (Z’L), que lá chegou 54 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

com sua esposa Sara Roffé Zagury (Z’L) em fins do século XIX, oriundo de Marrocos, chegando a receber patente de Capitão do Exército pela defesa do solo brasileiro na Fortaleza de Macapá, marco histórico da conquista portuguesa na Amazônia. Meu pai (Nuta Wolf Pecher) (Z’L) foi o primeiro asquenazi do Amapá ao chegar em 1949 com sua grande família (eu e minha mãe Syme Zagury Pecher(Z’L) oriundos de

Belém do Pará. Os Zagury, os Bemerguy, os Alcolumbre, os Peres, os Benoliel, os Barcessat e os Amar eram todos descendentes de sefaradis marroquinos fugiram dos “pogroms” e perseguições, para tentar uma vida melhor no Novo Mundo. Havia dois Jaimes, o Barcessat, que nós chamávamos de Jaimão (Z’L), por ser alto, e o Amar (Z’L), que era baixinho e franzino, carinhosamente apelidado de Jaiminho (Z’L).


Ketubá de Nuta Pecher e Syme Zagury Pecher

Os dois rezavam em todas as festividades, portanto eram os nossos Hazans. Aprendi a “meldar” (rezar) com o meu querido professor Jaiminho(Z’L), claro tendo minhas limitações pois ele não era letrado. Assim, em 1951, ao completar treze anos fiz o meu BAR-MITZVÁ. Pela primeira vez coloquei o “talit” enviado pelas minhas tias Suzy (Z’L) e Pepi (Z’L) irmãs do papai. Foi uma festa bonita em nossa casa de madeira, que batizei de “Primeira Missa no Brasil”, pois as poucas famílias judaicas estavam carinhosamente cercadas por amigos gentios, tal como quando Cabral rezou ao aportar em solo brasileiro em 1500. Na minha Sinagoguinha foi apresentada a nossa “grande” comunidade tia Rachel, recém-

Bar Mitzvá de Simão Arão Pecher 55


LEMBRANÇAS

Casamento de Nuta Pecher e Syme Zagury

Legenda

bem que meu pai e meus tios tinham que “mandar recado” para os compatriotas fechar seus “negócios”, isto é, casas comerciais e repartições onde trabalhavam e vir rezar pois eram dias santificados, que jamais poderíamos esquecer e que tinha de ter “minian”. casada no Rio de Janeiro com o tio Moisés Zagury (Z’L). Também vi o início do namoro do primo Mair (Z’L) (filho dos tios Esther (Z’L) e Naftali Bemerguy (Z’L) com a Helena AbenAthar, que veio de Belém, que culminou em um feliz casamento, igualzinho como se faz até hoje nas grandes sinagogas de alhures. 56 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

Saboreei naquela grande mesa retangular pela primeira vez o gostoso “Halawi” oriundo de Israel. Lá ouvi pela primeira vez os acordes de “HATIKVA” (Esperança), hino de Israel, tocado numa vitrola em setenta e oito rotações por minuto. Foi uma grande festa neste dia e para cumprir as “mitzvot” das festas judaicas, lembro-me perfeitamente

(*) Dr.Simão Arão Pecher : Imortal da Academia Brasileira de Médicos Escritores (ABRAMES) e Prof. Titular de Dermatologia da Universidade Federal do Amazonas. Especialista em alergia e dermatologia. Tel= 92- 30844614. simaopecher@yahoo.com.br


TALU CULTURAL segue inovando e lança novo selo editorial

com publicação do livro: “Certas Certezas e Muitas Incertezas” de Michel Gherman Em breve anunciaremos e convidaremos a todos para a noite de autógrafos. Contato: Email: edicoestalu@gmail.com Facebook: Talu Cultural Cel. (21) 99345-8731 57


CRÔNICA

Perdas Irreparáve Por Elias Salgado

Tal vez uma das grandes razões para as coisas estarem do jeito em que estão, seja o fato de que, como o consumismo é a ordem do dia, perder qualquer coisa, por mais importante ou não que seja, por menor ou maior valor que possua, se transforma para as pessoas, em situação de tragédia

58 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


eis

H

á também, nisso tudo, casos de inversão de valores: poucos sabem valorizar adequadamente o nível de importância de uma perda, fator que gera, certamente, mais angustia e sofrimento inútil em cada um de nós. Esta semana, tive duas perdas consideráveis. É bem difícil mensurar o grau de importância de cada uma delas, qual das duas é maior.

Não sei por que me veio à memória agora, uma prática judaica. Na verdade, uma proibição, ou seja, aquele que comete o tal ato, estaria cometendo um “pecado”. Trata-se da proibição de acordar alguém. Mas como assim? Sim roubar o sono a uma pessoa é uma das mais graves transgressões que se pode cometer, segundo os sábios do Talmud. Sabem por que? É que o sono roubado é algo que não pode ser devolvido. Talvez a lembrança desta passagem talmúdica me tenha ocorrido porque ela trata de uma perda irreparável. É que este critério utilizado por nossos sábios, aparentemente tão simples, para determinar o que viria a ser mais ou menos grave numa perda (ou roubo)- a meu ver, quase sempre, duas faces da mesma questão, é perfeito para dimensionar o tamanho real de nossas perdas. Mas voltando às minhas duas últimas perdas. Uma delas foi que deixei cair em algum lugar na rua, um bilhete da mega sena premiado, de um valor bem considerável, que com muita dificuldade eu poderia recuperar.

A outra é que flanando por meu bairro, como faço costumeiramente, me ocorrei, do nada, um argumento para uma história que me pareceu muito bom. Pensei com meus botões: “ Caramba! Isto, certamente, dá um excelente conto, ou quem sabe até tenha fôlego suficiente para o primeiro romance” Mas aconteceu algo que comigo nunca havia acontecido antes. O argumento “assim como veio se foi, não se sabe pra onde”. Poucas vezes me vi tão arrasado, tão órfão de mim mesmo, como alguém que padece de uma perda irreparável. Talvez vocês dificilmente acreditem no que eu vou dizer: eu senti muito mais a perda do argumento do que do bilhete premiado. E por que? Pois bem, o dinheiro é algo que pode voltar, ou através de outro bilhete premiado ou através de trabalho. Já o argumento, muitos outros virão tão bons ou até melhores, quem sabe. Mas aquele, especificamente, que me parecia tão especial e único, este jamais terei de volta. 59


PERSPECTIVA

2018 EM PERSPECTIVA Aos que pensam que as atividades, da Talu Cultural para 2018, (edições, publicações e lançamentos) estão encerradas, informamos que muito ainda vem por aí. Estão previstos para até o final deste ano, os seguintes eventos: * Lançamento do novo selo editoria e coleção, Postagens Sagazes, com a publicação do livro do historiador, Michel Gherman, “Certas Certezas e muitas incertezas” Noite de lançamento no Rio: quarta-feira, 22 de setembro, às 18:30, no Museu da República Noite de lançamento em São Paulo: data e local a confirmar * Lançamento do livro “ Força e Coragem: Hashomer Hatzair Rio, 70 anos de História e Memória” Noite de Lançamento: sábado, 29 de setembro, 19:30, na sede do Hashomer Hatzair, Rua das Palmeiras, 54, Botafogo

* Publicação do 2º. número da revista Universo Sefarad, Edição Especial de Chanuká Além disso, temos uma vasta agenda de palestras sobre os judeus na Amazônia, em escolas e entidades judaicas. 60 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


Desejamos a todo Am Israel Shaná Tová Umetuká Deseja um 5779 de muitas realizações.

Shaná Tová Umevorechet Deseja a todos os chaverim de nossa kehilá Shaná Tová

Deseja a todo Am Israel Um Feliz 5779 –

Shaná Tová 61


RETROSPECTIVA

2018 EM RETROSPECTIVA Poucos anos foram tão plenos de novidades, atividades e eventos em nossa editora

Estamos crescendo e nos diversificando como editores. Uma nova estrutura organizacional e diretiva foi criada e intensificamos nossas ações de edição com novos selos editoriais, novas publicações e lançamentos e participação em diversos eventos culturais. * A NOVA ESTRUTURA: Foi criada a Talu Cultural que congrega 4 selos editoriais – Amazônia Judaica, Universo Sefarad, Talu Cultural e Postagens Sagazes * A NOVA DIRETORIA: Para comandar esta nova estrutura editorial, juntamos um time de gigantes do setor cultural:

Editora Executiva: PhD Regina Igel, Maryland University

Diretor Editor: Elias Salgado 62 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

Diretor de Projetos: PhD Renato Athias, UFPE

Diretor Artístico: Eddy Zotnitzki


NOVOS LANÇAMENTOS EDITORIAIS:

Lançamento Internacional da coletânea Amazônia Judaica, 15 anos de travessia ( Israel, Espanha e Portugal)

Lançamento da nova revista Universo Sefarad – Usf

PARTICIPAÇÃO EM EVENTOS:

XIV Congresso Mundial da BRASA – Brazilian Studies Association, com lançamento de várias publicações.

Lançamento do novo livro de contos e crônicas de Elias Salgado, Vou ali e volto já, e exposição Desenhos Ecológicos, de Eddy Zlotnitzki, no Rio de Janeiro

II Fest Rio Judaico – Promoção de publicações 63


PORTAL

PORTAL AMAZÔNIA JUDAICA O PORTAL AMAZÔNIA JUDAICA é composto de um imenso acervo, um repositório de informações – o ARQUIVO HISTÓRICO DIGITAL AMAZÔNIA JUDAICA; dois blogs – BLOG AMAZÔNIA JUDAICA e BLOG UNIVERSO SEFARADI e o newsletter AÇAÍ E FALAFEL. Através dele é possível acessar as revistas AMAZÔNIA JUDAICA e UNIVERSO SEFARAD e nossa loja virtual para aquisição das publicações impressas dos nossos selos editoriais: AMAZÔNIA JUDAICA, UNIVERSO SEFARAD, TALU CULTURAL E POSTAGENS SAGAZES. Nosso portal e seu arquivo, recebem “visitas” e solicitações, as mais diversas possíveis, de pessoas de todo o Brasil e de diversos países do mundo. São pedidos de informações sobre o tema judeus na Amazônia; genealógicas, referências bibliográficas, apoio em trabalhos de pesquisa acadêmica (já orientamos,“extra oficialmente”, várias graduações, mestrados e doutorados sobre o tema judeus na Amazônia); para produção de matérias e artigos para a mídia, além de solicitações de contato 64 AJ No 13 - SETEMBRO 2018

Criado por Elias e David Salgado, em 2010, ano dos festejos do bicentenário da presença judaica na Amazônia, nosso portal (www.amazoniajudaica.org) atingiu o patamar de 200 mil acessos, tornando-se a maior referência mundial sobre o tema judeus na Amazônia com as comunidades da região e de cursos de judaísmo e de hebraico. AMAZÔNIA JUDAICA, convida todos os leitores a conhecerem o nosso portal. E aos que puderem, solicitamos apoio na manutenção deste projeto tão importante e singular.


A ATINGE 200.000 ACESSOS!

65


Caro Elias, boa noite! Eu gostaria de saber qualquer documento que comprove uma ligação da minha família (por parte de pai) com a comunidade judaica. Meu bisavô era judeu paraense e se mudou para São Paulo (Guaratinguetá) e morreu no Rio de Janeiro e está sepultado no Cemitério do Caju. Obrigada Sarah Bensabat

Caros pesquisadores/professores, Sou advogada no Estado do Amapá e estou atualmente cursando Mestrado em História Jurídica na Universidade de Lisboa-Portugal. Estou fazendo uma pesquisa acerca dos judeus que migraram para a Amazônia e, infelizmente ainda não tenho material suficiente. Preciso tanto de dados históricos como de estatutos jurídicos que embasaram essa migração. Seria possível os senhores me fornecerem ou indicarem esses materiais? Conheci este portal faz pouco tempo, mas já estou aproveitando a riqueza das informações. Grata. Clacy Paivas

Boa tarde! Gostaria de saber como registrar minha Sinagoga no portal? Sinagoga Isaac Bennesby ( Sociedade Israelita de Rondônia) , fica em Porto Velho, RO Messody Bennesby

Bom dia, me chamo Tarcísio e estou dando entrada na minha nacionalidade espanhola por ser descendente do Rabino Abraham Senior. já fiz minha genealogia. Já recebi o meu certificado da FCJE (Federação Comunidade Judia da Espanha). Agora preciso de um certificado, de alguma Sinagoga Sefardita no Brasil que também comprove, através de minha genealogia, que tenho ascendência com Judeus Sefarditas espanhóis. Gostaria de saber se vocês emitem esse certificado caso eu encaminhe minha genealogia. Obrigado Tarcísio

Como eu faço para aprender hebraico com vcs ? Iury Anderson

66 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


Olá, sou o Silvio Zacarias de Minas Gerais e com ajuda de Hashem estarei em Porto velho em meados de agosto e gostaria de passar o Shabat em um comunidade Judaica. Podem me indicar uma? rato! Shalom Uvracha! Silvio Zacarias Olá! Acabei de receber o e-mail da Pletz falando da publicação Universo Safarad. Gostaria de obter, por favor, informações sobre o número de publicações e área de circulação. Obg! Ana Addobbati

Olá, Sou Rodrigo da Familia Encaua. Há muitos anos desejo saber mais sobre a minha família de origem, porém, não sei por onde. Gostaria de saber se vocês poderiam me indicar alguma sinagoga, aqui em Manaus, onde eu posso saber um pouco mais sobre a Família Encaua.

Alegria e José Joaquim Pazuello (ambos marroquinos de Tetuan) Não sei o sobrenome de solteira de Alegria , porém acredito que possua o sobrenome Pazuello também, seu pai se chamava Mohluf. Estou montando a árvore da família , e queria saber se vocês têm esses registros. Yaeli Abecassis

Boa tarde, estou à procura de registros de meu bisavô Diogo Carvalho Pinto de Souza, filho de Augusto Cesar de Almeida Pinto de Souza e de Branca Carvalho Pinto de Souza, judeu português que migrou para Belém/PA. O senhor poderia ajudar? Muito grata pela atenção. Ana Borges

Rodrigo Encaua

Olá, Gostaria de saber se a comunidade israelita do Pará poderia me fornecer informações sobre a data de falecimento de 2 pessoas.

67


Jaime, Anne Benchimol e família, desejam a toda nossa kehilá,

Shaná Tová Umetuká Os alunos do Projeto Sefaradi do Colégio Mossinzon, Israel, anos 1975-1976, unidos por laços de eterna amizade, juntos desejam a todos, um

Feliz e Exitoso Shaná Tová 68 AJ No 13 - SETEMBRO 2018


Que 5779 seja um Ano Novo bom e doce. São os votos de Vidinha Salgado, seus filhos, noras, netos e bisnetos

Sergio Benchimol e família, desejam a todo Am Israel,

Que 5779 nos traga melhores dias.

Shaná Tová

Um Ano Novo de muita alegria e paz. Shaná Tová

Isaac Dahan e Familia

Beni Alter e família

Shaná Tová Umevorechet

69


HASHOMER HATZAIR - CCMA - TALU CULTURAL

CONVIDAM A TODOS PARA O LANÇAMENTO DO LIVRO COMEMORATIVO DOS 70 ANOS DO HASHOMER-RIO

Sábado, 29 de setembro, às 19:30, na sede do Hashomer Hatzair Rua das Palmeiras, 54 - Botafogo


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.