Revista Amazônia Viva ed. 42 / fevereiro de 2015

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FEVEREIRO 2O15 | EDIÇÃO NO 42 ANO 4 | ISSN 2237-2962

REVISTA ENCARTADA NO JORNAL O LIBERAL. NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE.

GENÉTICA NO AÇAIZAL

PESQUISA PODE SER A SOLUÇÃO PARA A FALTA DE AÇAÍ NA ENTRESSAFRA

FOTOGRAFIA, CORES E TONS

LUIZ BRAGA LANÇA LIVRO REUNINDO 40 ANOS DE CARREIRA

WALDEMAR HENRIQUE

NOSSO MAESTRO O PIANISTA E COMPOSITOR PARAENSE COMPLETARIA 110 ANOS DE NASCIMENTO NO DIA 15 DE FEVEREIRO. MAS SUA OBRA PERMANECE VIVA NO TRABALHO DAS NOVAS GERAÇÕES DE ARTISTAS DO ESTADO. REALIZAÇÃO

PATROCÍNIO


vale.c


com/brasil

Para um mundo com novos valores.


CARlOS BORgES

da editoria

puBlicação menSal DELTA PUBLICIDADE - Rm GRAPH EDIToRA FeVereiro 2015 / edição nº 42 ano 4 iSSn 2237-2962 presidente LUCIDÉA BATISTA mAIoRAnA presidente executivo RomULo mAIoRAnA JR. diretor Jurídico RonALDo mAIoRAnA diretora administrativa RoSÂnGELA mAIoRAnA KzAn diretora comercial RoSEmARY mAIoRAnA diretor industrial JoÃo PoJUCAm DE moRAES FILHo diretor corporativo de Jornalismo WALmIR BoTELHo D’oLIVEIRA

O MAEsTRO E sUA ObRA

waldemar Henrique completaria 110 anos e vida neste dia 15. Ele ainda permanece vivo no talento dos artistas da terra que tanto amou.

WAldEmAR HENRIqUE, Um UNIVERSO É possível que a música paraen-

paraenses. Em duas agradáveis tar-

se que conhecemos hoje não fosse

des de entrevistas e sessão de fotos,

a mesma sem as composições de

a equipe mergulhou num universo

Waldemar Henrique. O pianista,

chamado “Waldemar Henrique”.

autor de canções emblemáticas

Fomos recebidos pelo pesquisa-

como “Uirapuru”, “Tamba-Tajá” e

dor e amigo do pianista, o advoga-

“Cobra Grande”, popularizou a cul-

do Sebastião Godinho. Em sua casa,

tura do caboclo ribeirinho e ajudou

encontramos um imenso acervo da

a elevar a Amazônia ao status de

obra do artista. A equipe teve con-

detentora de uma parte do vasto

tato com escritos, partituras, fo-

conteúdo folclórico brasileiro.

tografias e instrumentos deixados

No dia 15 de fevereiro comemo-

FELIPE JORGE DE MELO Editor-chefe 4 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

diretor de marketing GUARAnY JÚnIoR diretores JoSÉ EDSon SALAmE JoSÉ LUIz SÁ PEREIRA conselho editorial RonALDo mAIoRAnA JoÃo PoJUCAm DE moRAES FILHo WALmIR BoTELHo D’oLIVEIRA GUARAnY JÚnIoR LÁzARo moRAES REDAÇÃo Jornalista responsável e editor-chefe FELIPE JoRGE DE mELo (Srte-pa 1769) coordenação geral LUCIAnA SARmAnHo editor de arte FILIPE ALVES SAnCHES (Srte-pa 2196) pesquisador e consultor técnico InoCÊnCIo GoRAYEB Colaboraram para esta edição o liberal, Vale, agência pará de notícias, agência Brasil, museu paraense emílio goeldi, universidade Federal do pará, Fundação cultural do pará - oficinas do curro Velho (acervo); camila machado, Fabrício Queiroz, Victor Furtado, anderson araújo, moisés Sarraf, abílio dantas, Brenda pantoja, Bruno rocha, natália mello, Sávio oliveira, João cunha, Vito gemaque, Janine Bargas (reportagem); moisés Sarraf, Fabrício Queiroz, Janine Bargas (produção); hely pamplona, carlos Borges, tarso Sarraf, roberta Brandão, luiz Braga (fotos); thiago Barros (artigo) andré abreu, leonardo nunes, Jocelyn alencar, Sávio oliveira, márcio euclides (ilustrações); alexsandro Santos (tratamento de imagem). FoTo DA CAPA acervo Sebastião godinho / Foto carlos Borges AmAzônIA VIVA é editada por delta publicidade/ rm graph ltda. cnpJ (mF) 03.547.690/0001-91. nire: 15.2.007.1152-3 inscrição estadual: 158.028-9. avenida romulo maiorana, 2473, marco - Belém - pará.

pelo maestro.

ra-se os 110 anos de nascimento do

O carinho e os detalhes de lem-

compositor. Passados 20 anos desde

branças com que nossos entrevis-

a sua morte, ou quase “dois ciclos

tados, artistas do passado e da atu-

jupiterianos completos” como ele

al cena cultural do Estado, falaram

mesmo diria em situações como

do “mestre” demonstram como a

essa, fomos em busca da obra do

influência de suas músicas e com-

maestro que permanece viva no tra-

posições são fundamentais para a

balho das novas gerações de artistas

identidade amazônica.

FEVEREIRO DE 2015

diretor de novos negócios RIBAmAR GomES

amazoniaviva@orm.com.br produção

realiZação

patrocÍnio

reViSta impreSSa com o papel certiFicado pelo FSc - ForeSt SteWardShip council


FEVEREIRO 2O15

neSta edição

EDIÇÃo nº 42 / ANO 4

O mAESTRO E O TEmPO

HERANÇA MUsICAl

Yuri Guedelha, Camila Honda, Sebastião Godinho, Juliana Sinimbú e Luiz Pardal: admiração pelo maestro soberano do Pará

Artistas de ontem e da atualidade veem no compositor Waldemar Henrique uma inesgotável fonte cultural, eternizada em obras-primas da música paraense. aSSuNTO DO MÊS HElY PAMPlOnA

36 16

ROBERTA BRAnDãO

ROBERTA BRAnDãO

ROBERTA BRAnDãO

54

58

FORmAçãO

OFíCIO

A professora Therezinha

As designers Fernanda

mUSICAlIdAdE

Valim coordena o Clube de

URbANA

Martins e Sâmia Batista

Doutora em Etnomusi-

Ciências e o Polo Acadêmi-

A cantora natália Matos

focam suas pesquisas

cologia, liliam Barros

co da UFPA e o doutorado

amadurece sua carreira

acadêmicas para o tra-

se aprofunda no conhe-

da Rede Amazônica de

profissional em Belém

balho dos “abridores de

cimento das músicas,

Educação em Ciências

após adquirir uma valiosa

letras”, profissionais que

ritmos e rituais indígenas,

e Matemática. Para ela,

experiência musical em

fazem da pintura de letrei-

que formam a diversidade

“pensar cientificamente”

uma das maiores cidades

ros de embarcações uma

cultural do norte do País.

é fundamental hoje.

brasileiras, São Paulo.

forma peculiar de arte.

QuEM É?

OuTraS CaBEçaS

DEDO DE PrOSa

arTE PESQuiSaDa

4 6 7 11 13 15 17 17 18 19 19 20 20 21 21 22 24 46 49 49 50 60 62 63 65 66

E MAIS Da EDiTOria aS MaiS CurTiDaS PriMEirO FOCO TrÊS QuESTõES aMaZÔNia CONNECTiON PErGuNTa-SE Eu DiSSE aPPliCaTiVOS COMO FuNCiONa FaTO rEGiSTraDO DEu N’O liBEral CuriOSiDaDES Da BiODiVErSiDaDE ElES SE aCHaM DESENHOS NaTuraliSTaS CONCEiTOS aMaZÔNiCOS EM NÚMErOS OlHarES NaTiVOS COMPOrTaMENTO SuSTENTÁVEl BONS EXEMPlOS MuDaNça DE aTiTuDE ViDa EM COMuNiDaDE MEMÓriaS BiOGrÁFiCaS aGENDa Faça VOCÊ MESMO BOa HiSTÓria NOVOS CaMiNHOS

FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 5

CARlOS BORgES

38


ASMAISCURTIDAS DESTAQUES DAs EDIÇões ANTERIORes

fernando sette

REVISTA Como sempre esta revista é muito abrangente e informativa sobre nossa biodiversidade natural e cultural. Ela é a cara da Amazônia! Parabéns. Eudália Fialho Belém-Pará Parabenizo a equipe da Revista Amazônia Viva pela SANTO CAMINHO DAS ÁGUAS

As fotos do Círio nas águas do igarapé do Caraparu encantaram nossos seguidores no Instagram. O clique de Fernando Sette conseguiu eternizar um momento de fé e cultura dos moradores de Santa Isabel, no Pará.

edição de janeiro de 2015. É perceptível o carinho e a dedicação com que são feitas as reportagens a cada nova edição. Já estou aguardando para ler as próximas. Luisa Meirelles Belém-Pará

tarso sarraf

ÁGUAS A reportagem sobre os recursos hídricos da região (“Amazônia das Águas”, Assunto do Mês, janeiro de 2015, edição nº 41) nos remete à constante preocupação que devemos ter com uma das nossas principais riquezas naturais. É preciso preservar sempre nossos mananciais. Maxwell Martins Colares-Pará é preciso cuidar do que é nosso

A reportagem especial sobre os mananciais da região recebeu o maior número de curtidas e comentários em nosso Facebook. Com texto de Bruno Rocha e fotos de Tarso Sarraf, a edição apresentou o patrimônio natural formado pelos recursos hídricos do Pará, além de ações, projetos e opiniões sobre uma gestão consciente e sustentável na região.

NEGROS O trabalho da professora Marilu Campelo é fundamental para entendermos e respeitarmos a cultura negra na Amazônia (Quem É?, janeiro de 2015, edição nº 41). Em tempos de intolerância racial e religiosa nada melhor do que conhecer o outro para cultivarmos a paz. Paula Moreira

carlos borges

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Belém-Pará

Para se corresponder com a redação da Amazônia Viva envie comentários,

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FEVEREIRO DE 2015

para o endereço: Avenida Romulo USE um leitor de QR Code para acessar A EDIÇão digital de janeiro

Maiorana, 2473, Marco, Belém - Pará, CEP 66 093-000 ou FAX: 3216-1143.


O QUE É nOTÍCIA PARA A AMAzôNIA TARSO SARRAF / ARQUIVO O lIBERAl

PRImEIRoFOCO

PRA bOTAR O PÉ NA lAmA

O blOCO PRETINHOS dO mANGUE VOlTA àS RUAS dE CURUçÁ NO CARNAVAl dESTE ANO PARA FAzER UmA FOlIA ECOlÓGICA, mUITO AlÉm dO PURO dIVERTImENTO PÁGInA 8

EConomIA cresce a visibilidade do pará como rota internacional do turismo, tendo Belém e Santarém como principais destinos. PÁG.9

mAnGAS Experimento inovador de pesquisadores da Ufra para recuperar solo degradado em Salinas obtém sucesso. PÁG.11

InVESTImEnTo mercado financeiro volta os olhos para o incremento da produção de cacau na região amazônica internacional. PÁG.13

FEVEREIRO DE 2015

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primeiro Foco

CARNAVAl POR UmA bOA CAUSA

N

o lugar de plumas e paetês para o carnaval pelo menos 15 mil brincantes usam uma fantasia bem mais econômica e ecológica: a lama do mangue. Este é o principal diferencial do bloco Pretinhos do Mangue, que já é tradição no carnaval de Curuçá, município do nordeste paraense a 130 km da capital. Além da folia, o bloco também promove a responsabilidade ambiental e leva para as ruas da cidade questões como a proteção do caranguejo, o principal símbolo da festa, e a preservação dos recursos hídricos, tema desta edição da festa. O trabalho pode não parecer tão árduo, tamanha a diversão proporcionada pelo bloco, mas exige pesquisa e planejamento, o que tem surtido efeitos positivos. O coordenador da folia, Edmilson Campos, observou que o curuçaense passou a pescar com mais consciência. “Mudar isso é algo que leva tempo, mas hoje a gente 8 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2015

vê que a captura mudou no município. Os pescadores já se preocupam mais com o tamanho do animal, a quantidade e o período do ano”, conta ele, que é formado em Gestão Ambiental. Ele lembra que o que começou como uma brincadeira entre amigos, há 26 anos, cresceu e gerou a Associação Socioambiental e Cultural de Curuçá Pretinhos do Mangue, que é responsável por outras ações com foco em sustentabilidade durante o ano. “Começamos a distribuir lixeiras pelo trajeto no ano retrasado e antes do bloco sair, ainda na concentração, sempre repassamos informações de cunho ambiental para os brincantes. Dessa forma, alcançamos muitas pessoas que geralmente ficam de fora da discussão e isso é uma responsabilidade grande, por isso sempre pesquisamos bem o assunto, como fizemos na época da Rio+20, por exemplo”, diz. Na concentração, os participan-

TARSO SARRAF / ARQUIVO O lIBERAl

tes vão até o manguezal para se cobrirem de barro preto, chamado tijuco. Depois, saem em carros alegóricos até a cidade, onde os brincantes podem se lavar. “A gente costuma dizer que o abadá sai do mangue e volta para o mangue, sendo ecologicamente correto. Como o manguezal fica pequeno para tanta gente, orientamos as pessoas que moram perto dos mangues que já venham pintadas de casa”, diz Edmilson. O mascote do bloco é um caranguejo. Ele é representado no carro abre-alas com uma estrutura articulada de 3 metros de largura. Os outros carros são o da ostra, a garça e do guará, onde os foliões vão pintados com a tabatinga, uma argila avermelhada. O Pretinhos do Mangue vai abrir e fechar o carnaval de Curuçá, saindo nos dias 15 e 17 de fevereiro, abordando a discussão sobre as áreas da região com rios e nascentes que estão sendo degradados pela ação humana.

AbADÁ DE MANGUE

Os participantes da brincadeira se lambuzam com o tijuco, barro de cor escura encontrado nos manguezais

15

MIL

bRINCANTEs sãO EspERADOs EM CURUÇÁ este ano para o arrastão do bloco ecológico no município


cristino martins / agência Pará

seleção brasileira

arqueiro

A Seleção Brasileira de Tiro com Arco agora conta com o apoio do índio Dream Braga, de 18 anos. Ele é do Baixo Rio Negro, no Amazonas, e faz parte do projeto Arqueria Indígena, da Fundação Amazônia Sustentável, há dois anos. Ele participou de seletivas da Confederação Brasileira de Tiro ao Arco (CBTArco) e vai disputar os Jogos Pré-Pan em Santo Domingo, na República Dominicana. Assim, ele

Pará é destaque no desenvolvimento turístico do país

Os municípios de Belém e Santarém foram apontados na lista dos 65 destinos que ajudam a desenvolver o turismo regional, que faz parte da pesquisa de “Índice de Competitividade do Turismo Nacional: Destinos Indutores do Desenvolvimento Turístico Regional”. O ranking foi divulgado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Ministério do Turismo e Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). O levantamento foi realizado no ano passado e serve como referência para os investimentos e destaques das principais rotas turísticas do país. No Pará, a Secretaria de Estado de Turis-

mo (Setur) avaliou o levantamento como resultado positivo do planejamento estratégico implantado desde 2012. Para o secretário Adenauer Góes, o ano de 2015 marca a conclusão da primeira fase deste trabalho. “Esta etapa inicial durou três anos e agora começamos a nova fase, que tem como meta transformar o Pará numa referência do turismo na Pan Amazônia até o ano de 2020”, disse. Ele destacou, além do potencial da natureza e da cultura do Estado, a convergência de esforços entre gestão pública e iniciativa privada para consolidar o Pará como referência no turismo da região.

paraíso das águas

O balneário de Alter do Chão, em Santarém, é um dos pontos turísticos mais visitados no Estado

se torna o primeiro arqueiro indígena brasileiro em competições internacionais. Independentemente da classificação, Dream, cujo nome indígena é Yagoara Kambeba (que significa “caçador”), da etnia Kambeba, alcançou um marco ao entrar para o time, formado por mais de oito atletas, disse Márcia Lott, a treinadora que descobriu o jovem após seleções em mais de 30 aldeias.

alerta

saúde mundial

Pelo menos 16 milhões de mortes por doenças não transmissíveis, como câncer e diabetes, poderiam ser evitadas com medidas preventivas. A estimativa é da Organização Mundial

5

anos

é a meta de conclusão do governo para

transformar o Pará em referência do turismo na Pan Amazônia

da Saúde (OMS). Esses tipos de doenças, que também incluem problemas cardíacos, pulmonares e respiratórios, causam 38 milhões de mortes por ano e o relatório divulgado pela entidade aponta que os países poderiam reduzir bastante o número de doentes e de óbitos investindo entre US$ 1 e US$ 3 por ano por pessoa. “A

andré abreu

ÁGUA ATMOSFÉRICA

comunidade internacional tem a possibilidade de mudar o curso das doenças não

Tomar uma garrafa de água extraída diretamente da atmosfera da floresta

transmissíveis”, afirmou a diretora-geral

amazônica vai custar R$ 20 (ou 6,5 euros). Uma empresa brasileira vai iniciar

da OMS, Margaret Chan. Ela defendeu a

neste ano a produção de modo sustentável. Uma máquina irá condensar,

importância de políticas antitabagistas,

filtrar e mineralizar a umidade do ar, produzindo 5 mil litros de água por dia.

contra o abuso do álcool e a promoção de

Os empresários garantem que não haverá impacto algum à floresta.

atividades físicas e desportivas. FOTOS: agência brasil / wikicommons FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 9


primeiro Foco

VALE

NOVOS MORADORES

Abordagens inovadoras de empresas em

conjunta do Conselho Empresarial Mundial para o

OITO flAMINGOs sE JUNTAM à fAUNA DO MANGAl DAs GARÇAs

Desenvolvimento Sustentável (wBCSD, em inglês)

O Mangal das garças, em Be-

a reprodução e a realização

que são os mais comuns,

e a Corporação Financeira Internacional (IFC, em

lém, recebeu recentemente

de pesquisas sobre o animal.

sendo sete fêmeas e quatro

inglês). Os estudos de caso selecionados mostram

oito exemplares de flamin-

Entre os novos e velhos

machos. As aves pernaltas,

medidas adotadas pelos grupos para ampliar a

gos, aves que pertencem à

habitantes, há duas espécies

de patas longas e coloração

empregabilidade e o empreendedorismo em toda a

família Phoenicopteridae da

diferentes de flamingos: três

em tons de rosa, costumam

cadeia de valor, além de estimular o desenvolvimento

ordem Phoenicopteriformes.

chilenos (Phoenicopterus

viver em grandes grupos e se

de habilidades e a participação de jovens. A Vale

Os novos moradores se junta-

chilensis) sendo duas fêmeas

alimentam de vertebrados

contribuiu com o material incluindo dois casos.

ram aos seis que já viviam no

e um macho, e onze america-

aquáticos e algas.

O primeiro é da Valer, que investe em uma série

local. Eles vão contribuir com

nos (Phoenicopterus ruber),

PUblICAçãO

diversos mercados emergentes e setores foram compartilhadas em uma publicação

de iniciativas para fomento de mão de obra local e desenvolvimento de empregados, com 820 engenheiros e geólogos treinados em cinco anos. Só entre 2008 e 2011, 11.700 jovens também passaram por treinamento. O segundo é do programa de desenvolvimento de conteúdo local “Inove”, que busca colaborar para o desenvolvimento sustentável de fornecedores da mineradora e para construção de um legado positivo nas regiões onde opera. Através dessa ação, cerca de 700 fornecedores e mais de 4.000 pessoas foram treinadas de 2009 a 2013.

SOlO

PREOCUPAçãO

Eleito como tema deste ano pela Organização das nações Unidas (OnU), o solo é um dos materiais biológicos mais complexos do planeta. A escolha de 2015 é uma tentativa da OnU de chamar atenção para a riqueza e a fragilidade do recurso, além de mobilizar a população para a importância de preservar e de recuperar os solos, devido ao

Um ESTRANHO NO NINHO

Conheça algumas características dos flamingos ESTRUTURA FÍSICA De pescoço e pernas longos, têm os dedos anteriores unidos por uma membrana larga. O bico comprido se curva para baixo quase em ângulo reto e é dotado de lâminas transversais para filtrar os alimentos. ALIMENTAÇÃO Para a sua subsistência, as aves pescam larvas de moscas, algas, moluscos e pequenos crustáceos, alguns dos quais ricos em carotenoides, substâncias responsáveis pela coloração avermelhada da plumagem. REPRODUÇÃO Os flamingos fazem ninhos em montículos de barro, com uma depressão no centro que abriga um ou dois ovos. O período de incubação dura um mês. Macho e fêmea cuidam dos filhotes, que alimentam por regurgitação de comida parcialmente digerida e com

uma secreção vermelha que produzem no estômago. HABITAT Os bandos, com até centenas de indivíduos, reúnem-se à beira-mar, pântanos ou em lagunas salobras, à procura de alimento, e às vezes voam a consideráveis alturas em formação em V, como os patos selvagens.

desmatamento ou ao uso agrícola inadequado. A

Fonte: encicloPédia barsa/ arte: márcio euclides

ÁRVORES

qR COdES

lUz

UNESCO

Mais de 40 árvores da praça Batista Campos, em

A Unesco anunciou que 2015 é o Ano Internacio-

Belém, receberam placas com informações sobre as

nal da luz e das Tecnologias baseadas em luzes.O

espécies acessadas pela tecnologia QR Code em ta-

objetivo da agência da OnU é mostrar ao mundo

blets e smartphones (foto). O serviço foi instalado pela

a importância da luz na criação de um futuro mais

Companhia de Informática de Belém (Cinbesa), em

sustentável e pacífico.Durante todo o ano, a Unesco

parceria com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente

vai reunir sociedades científicas, instituições educacio-

(Semma) como parte de um projeto que pretende le-

nais, Ongs e o setor privado. Juntos, os especialistas

var os QR Codes a objetos e prédios que constituem

vão defender o uso de tecnologias para melhorar a

o patrimônio de Belém. Segundo o presidente da

qualidade de vida nos países desenvolvidos e em

Cinbesa, Régis Júnior, árvores de outras áreas verdes

desenvolvimento.

de Belém vão receber a tecnologia em breve.

10 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2015

ASCOM PRODEPA / DIVUlgAÇãO

agenda de debate do tema é para o ano todo.


wikimedia / CC

TRÊSQUESTÕES

biscoito regional inova com sabor amazônico O projeto Cookitos foi elaborado por quatro formandos do curso de Engenharia de Alimentos da Universidade Federal do Pará, que resultou na produção de um biscoito nutritivo para crianças em idade escolar, utilizando mandioca e outro ingredientes amazônicos. Livia

Mangueira ajuda a recuperar o solo em desuso Além de serem símbolo da capital paraense e embelezarem a paisagem urbana, as mangueiras também podem contribuir na recuperação de áreas degradadas que antes não tinham uso algum. Pesquisadores da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) realizaram um estudo no distrito de Cuiarana, em Salinópolis, nordeste paraense, e verificaram a eficácia da árvore, da manga tipo “Tommy Atkins”, na reabilitação do solo. A pesquisa foi feita em um terreno abandonado de 26 hectares e que havia sido plantado pela última vez em 1993. O gru-

po de pesquisadores começou o trabalho em 2010 e atualmente, o pomar tem 900 mangueiras. Segundo os pesquisadores, a espécie apresenta boa tolerância a níveis baixos de salinidade, conseguindo manter sua taxa transpiratória em níveis elevados nessas condições ambientais quando comparada a outras variedades de mangueira. Alguns resultados mostraram que esse tipo de ecossistemas regulariza o ciclo hidrológico de áreas degradadas e proporciona uma redução da energia direcionada ao solo. Os dados também mostram que houve uma melhoria na qualidade das mangas.

po, conta como foi o processo de elaboração. mangas pra que te quero

O plantio de mangas do tipo “Tommy Atkins” obteve sucesso na reabilitação de áreas degradadas

No que consiste o projeto dos biscoitos amazônicos? Criamos um biscoito tipo cookie, rico em proteínas, fibras e com baixo teor de sódio, incorporando em sua formulação matérias-primas da região amazônica, demonstrando como o produto poderia incentivar à economia da região local e de pequenos agricultores, além de poder ser utilizado como forma de combater a fome e a desnutrição infantil.

Como foi feita a integração com os agricultores? No trabalho, foi demonstrado como o processamento do biscoito “Cookitos” poderia gerar um impacto econômico positivo para pequenos agricultores e na agroindústria local, demonstrando inclusive a

900 mangueiras fazem parte do pomar do

projeto experimental no distrito de Cuiarana, em Salinópolis

adaptação do sistema produtivo das casas de farinha, a fim de que esses possam produzi-lo.

Como foi vencer um prêmio de produção alimentícia? Vencer a primeira edição do Prêmio da International Union of Food Science and Technology (IUFoST) foi extremamente gratificante.

andré abreu

PLANTA ESPERTINHA

Concorrer com equipes do mundo todo foi um pouco intimidador, mas nós mostramos que

Uma planta insetívora da ilha de Bórneu, na Ásia, usa as variações climáticas

o ensino da UFPA não está atrás das grandes

para tornar sua superfície mais ou menos escorregadia. Assim, ela consegue

universidades do mundo, além de a criação

capturar e devorar grandes quantidades de formigas de uma vez só. O vegetal

do Cookitos se tornar uma referência para os

secreta um tipo de néctar expelido quando a umidade do ar está baixa. Quan-

alunos que desejam participar da competição.

do os insetos chegam e a planta está seca, atraem outros e é aí que ela ataca. FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 11

arquivo pessoal

Martins, uma das integrantes do gru-


primeiro Foco

INOVAÇãO

MÁqUINA EXTRAI ÁGUA pOTÁvEl DE DEJETOs O engenheiro norte-americano Peter Janicki

aparelho submete fezes a uma alta tempera-

líquida novamente. O fundador da Microsoft

desenvolveu a máquina Janicki Bioenergy

tura, eliminando o cheiro e qualquer micro-

e filantropo, Bill gates, e sua fundação estão

Omni Processor com objetivo de levar água

organismo danoso para a saúde. Em seguida,

investindo para que um projeto piloto leve a

potável para regiões pobres, onde o acesso

o calor gera alta pressão para fazer com que

novidade para comunidades do Senegal, na

ao saneamento básico não é precário. O

o vapor das temperaturas elevadas se torne

África Ocidental.

2 1

ÁGUA PRA bEbER

Conheça o procedimento da máquina que transforma fezes em água de beber

3

4

5

3

4

5

1

O Omni Processor é um depósito de resíduos humanos capaz de reunir o esgoto produzido por uma comunidade de 100 mil pessoas.

2

Passando por grandes tubos, o material orgânico é processado e o vapor de água é separado do material sólido e seco.

Em seguida, esse material passa por uma espécie de incinerador com temperaturas superiores a 1.000°C, que também produz vapor.

O vapor de água resultante do processo passa por outros tubos e volta ao estado líquido, resultando em água limpa e pronta para o consumo humano. Os resíduos de 100 mil pessoas podem produzir até 86 mil litros de água potável.

O vapor é também direcionado para um gerador que produz eletricidade capaz de alimentar a própria máquina e cujo excedente pode ser direcionado para uso da comunidade onde o Omniprocessor for instalado. Pode ser gerado até 250 kw de eletricidade.

Fontes: canaltecH.com.br e Portal bol notícias/ inFoGráFico: márcio euclides

CANAÃ DOS CARAJÁS

SAúdE mENTAl

ARARINHA-AZUL

Canaã dos Carajás participaram do

O nascimento de dois filhotes de ararinha-azul (Cyanopsitta spixii) no Brasil quebrou um jejum de 14 anos sem registros de reprodução desta ave em cativeiro no país. Os filhotes nasceram em um criadouro científico do interior de São Paulo no final de outubro, mas a informação só foi divulgada recentemente. Ainda sem sexo definido, pois o material genético está em análise, os pássaros terão seus nomes escolhidos por meio de votação popular. A última reprodução em cativeiro feita no Brasil foi em 2000, quando nasceu a ararinha batizada de Flor, mãe dos filhotes que acabam de chegar.

Cerca de 40 profissionais de saúde de curso sobre Rede de Atenção à Saúde Mental no mês passado. A capacitação tratou tópicos como a humanização do atendimento, abordagem acolhedora aos pacientes e cuidado integrado por meio de uma equipe multidisciplinar. O treinamento faz parte do projeto Ciclo Saúde, da Fundação Vale, e envolveu equipes de saúde da família, saúde bucal, núcleo de Atenção à Saúde da Família, Centro serviços de saúde da rede. O objetivo é contribuir para o fortalecimento da atenção básica. 12 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2015

ICMBIO / DIVUlgAÇãO

de Atenção Psicossocial e gestores de

CONqUISTA


CARlOS SODRÉ / AgênCIA PARÁ

AmAzônIACONNECTION

dA EUROPA PARA A VIdA RIbEIRINHA

Há tempos a discussão sobre os recursos hídricos no mundo deixou de ser um tópico restrito às ciências naturais. Estudiosos de todas as áreas e represenMOEDA vAlIOsA

Mercado financeiro da América latina também aposta na retomada da produção do fruto

100 MIl TONElADAs é A MéDIA DA EsCAssEz mundial por ano, estima organização internacional

INVESTIdORES qUEREm PlANTAR CACAU NA REGIãO

A escassez de cacau e o aumento da demanda por chocolate no mundo inteiro têm estimulado investidores a reativarem o cultivo do fruto na bacia amazônica, onde acredita-se que os grãos se originaram há quase 15 mil anos. A retomada da produção faz parte de uma iniciativa latino-americana para conquistar um controle maior do setor, que atualmente é dominado por produtores da África Ocidental, responsáveis por 70% do mercado. A seca, as doenças e os controles governamentais de preços naquela região, no entanto, reduziram a capacidade dos produtores africanos. O cul-

tivo do cacau é sensível e só pode ser realizado a cerca de 10 graus da linha do Equador. Para o fundador da United Cacao, Dennis Melka, a região amazônica desponta como um fornecedor primordial para os produtores de chocolate por ter terras em condições ideais e disponíveis imediatamente na selva sul-americana. Desde 2011, os preços do cacau vêm aumentando e agora estão em torno de US$ 2.900 por tonelada. A Organização Internacional do Cacau estima que a escassez chegue a 100 mil toneladas por ano, mas há projeções de que em 2020 essa quantidade seja de 1 milhão de toneladas.

tações políticas passaram a debruçar-se também sobre esse tema intrinsicamente ligado à vida na Terra. Para contribuir com novos estudos no assunto e ideias para a construção de políticas públicas, foi criado em 2013 o Projeto AguaSocial (Inovação Social no setor de tratamento de Água na Amazônia), que reúne instituições de ensino da Itália, Espanha, Inglaterra e duas do Brasil, a Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Universidade Estadual do Amazonas (UEA). O bioantropólogo e professor do Programa de Pós-graduação de Antropologia da UFPA, Hilton Silva, explica que o projeto investiga os diversos aspectos, tanto técnicos quanto socioeconômicos, da realidade amazônica. “Os projetos a serem desenvolvidos implicam, entre outras coisas, em estudar os impactos da qualidade e disponibilidade da água na saúde das pessoas e identificar as tecnologias existentes que sejam socialmente aceitáveis para serem realizadas participativamente”, afirma. De acordo com Hilton Silva, docentes e discentes de pós-graduação da UFPA e da UEA serão treinados por instituições europeias reconhecidas por suas

AnDRÉ ABREU

PlÁSTICO dE COmER

pesquisas e oficinas serão realizadas em comunidades ribeirinhas do Pará e Ama-

Já é possível produzir filme plástico comestível a partir de alimentos como es-

zonas. Participam do Projeto AguaSocial

pinafre, mamão, goiaba e tomate. O projeto é da Empresa Brasileira de Pesqui-

a Universitá degli Studi Roma Tré, leeds

sa Agropecuária (Embrapa) e alguns dos usos imaginados pelos pesquisadores

Metropolitan University e a Universidade

são para fabricação de sachês de sopas que se dissolvem em água fervente e

Autônoma de Barcelona.

goiabadas em plásticos feitos do próprio fruto. FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 13


primeiro Foco

MARABÁ

CIdAdANIA

IDENTIDADE

Cultura, ecologia, esporte e cidadania foram

IbGE DIvUlGA NÚMERO DE líNGUAs INDíGENAs NO pAís

alguns dos temas abordados na Colônia de Férias da Estação Conhecimento de

O Instituto Brasileiro de geografia e Estatística (IBgE) divulgou que, atualmente, 150 línguas indígenas são

Marabá, implantada no bairro São Félix pela Fundação Vale em parceria com o

faladas no Brasil. Dentre elas, cinco possuem mais de dez mil falantes. As mais encontradas são a língua,

lar Fabiano de Cristo. As crianças entre 6

com 34 mil falantes; a guarani Kaiowá, com 26,5 mil; a Kaingang, com 22 mil; a Xavante, com 13,3 mil; e a

e 12 anos participaram, ainda, do Clube

Yanomami, com 12,7 mil.

do Jacaré Poió, que usou o imaginário da

O estudioso wilmar da Rocha D’Angelis, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), destaca algu-

lenda de um jacaré cacique para trabalhar

mas singularidades encontradas nesses idiomas, como uma linguagem de sinais usada pelos índios Urubu

a convivência solidária, estimular a leitura

Kaapor, a comunicação por assovios na língua Pirahã e línguas tonais, que usam o tom para dar diferentes

e discutir direitos e deveres. Esse projeto de

significados à mesma palavra, como o Tikuna e o Suruí.

Sateré-mawé

Guajajara Tikuna

ensino será adotado na unidade também no SEM BLÁ BLÁ BLÁ Os povos indígenas e seus idiomas enriquecem a cultura do Brasil

decorrer do ano. As Estações Conhecimento são centros promotores e irradiadores de vivências e práticas de educação, geração de

1

Guajajara - 9,5 mil falantes Falada por um dos povos mais numerosos do País, a língua pertence aos povos que habitam mais de dez terras indígenas na margem oriental da Amazônia, todas situadas no Estado do Maranhão.

trabalho e renda, esporte, cultura e de convivência e cidadania. O objetivo é promover a inclusão social e contribuir com a melhoria da qualidade de vida das comunidades onde

Tukano Suruí Kayapó

Kaingang Tikuna

Guarani Kaiowá TikunaPirahã Kayapó Guajajara Terena Pirahã Sateré-mawé Kayapó Tukano

2

estão presentes. Atualmente, a unidade de Marabá atende a 200 famílias. AnTÔnIO SIlVA / AgênCIA PARÁ

Sateré-mawé - 8,9 mil falantes Idioma falado pelo povo que inventou a cultura do guaraná. Esses indígenas também domesticaram a trepadeira silvestre e criaram o processo de beneficiamento da planta.

Suruí Pirahã

Pirahã Yanomami Terena Tikuna Sateré-mawé

3

Terena - 8,2 mil falantes O povo Terena é uma das maiores populações indígenas do país e está localizado no estado do Mato grosso do Sul.

4

Tukano - 7,1 mil falantes Esta língua é falada por índios que integram atualmente 17 etnias, das quais algumas podem ser encontradas também na Colômbia.

5

Kayapó - 6,2 mil falantes Os Kayapó, falantes da língua de mesmo nome, vivem em aldeias dispersas ao longo do curso superior dos rios Iriri, Bacajá, Fresco e de outros afluentes do rio Xingu. Fonte: censo ibGe 2010/ Pib.socioambiental.orG/ arte: márcio euclides

QUILOMBOLAS

POlíTICAS PúblICAS As ações do governo do Pará voltadas aos povos quilombolas foram o tema da

CARANGUEJOS

PROTEçãO

A “andada” do caranguejo-uçá é o momento em que os

discussão da primeira reunião do núcleo

machos e fêmeas saem de suas galerias (tocas) e andam pelo

de Apoio aos Povos Indígenas, Comunida-

manguezal, para acasalamento e liberação de ovos. Nesta

des negras e Remanescentes de Quilom-

época ficam vulneráveis e são presas fáceis. Para proteger a

bo. Várias secretarias e representantes

espécie, a Secretaria de Estado de Aquicultura e Pesca (Se-

de diversas comunidades integram o

paq) definiu seis períodos de defeso para o ano, quando fica

trabalho, que vai atuar na área da seguran-

proibido capturar, transportar e comercializar os crustáceos.

ça, educação e saúde, com políticas que

Para vender nas feiras livres, os caranguejeiros precisam

tenham um olhar global, respeitando as

obter uma Declaração de Estoque do Ibama. A fiscalização

diferenças e necessidades específicas. A

nos pontos de venda e de pesca é feita por uma força-tarefa

Malungu - Associações das Comunidades

de órgãos ambientais.

Remanescentes de Quilombos do Pará é uma das entidades que vai participar da outras comunidades negras. 14 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2015

CAlENdÁRIO

A medida estará em vigor em todo o Estado nos seguintes períodos De 19 a 24 de fevereiro / De 6 a 11 de março / De 21 a 26 de março

AgênCIA PARÁ

iniciativa, além de lideranças indígenas e

XX


renato chalú / divulgação vale

PERGUNTA-SE

Pingar limão no açaí facilita a digestão?

O açaí é uma grande fonte de lendas sobre o que faz bem e o que faz mal quando misturado a outros alimentos. Justamente por ser muito consumido na região amazônica e um fruto de digestão nada simples. E uma delas é que algumas gotas de limão podem facilitar a digestão e melhorar a absorção de um dos principais nutrientes do produto, o ferro. O rumor, no entanto, tem fundamento cien-

FESTIVAL musical celebra os 399 anos de belém

X

O grupo de pagode Nosso Tom foi uma das diversas atrações no “Ver-o-Peso da Nossa Música”

banda Espoleta Blues, que reúne quatro pais e seus filhos. Um dos pontos altos foi a apresentação do músico e produtor Manoel Cordeiro, que tem mais de 40 anos de carreira, ao lado da cantora pernambucana Gina Lobrista, que se firmou na música paraense em 2014 com o codinome de “Índia Apaixonada”. Manoel e Gina encantaram o público com um repertório escolhido especialmente para homenagear a Cidade das Mangueiras, que incluiu os bregas saudosos e as dançantes lambadas. Assim como a dupla, todos os artistas que passaram pelo festival emocionaram paraenses de todas as idades ao cantarem grandes clássicos da música regional. Para muitos belenenses, o “Ver-o-Peso da Nossa Música” já faz parte das celebrações pelo aniversário da capital.

tífico, como explica a nutricionista Carolina Vieira Bezerra, professora da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal do Pará (UFPA) e doutoranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos. Contudo, nada é comprovado ainda, ressalta a pesquisadora. “No caso do açaí, o ferro encontra-se na forma férrica, apresentando, naturalmente, uma baixa disponibilidade em pH básico. Muitos trabalhos evidenciam que o ácido ascórbico (vitamina C) presente em vários alimentos, como o limão, a laranja e a acerola, pode estimular a absorção do ferro. Teoricamente, o limão facilitaria a absorção do ferro presente no açaí, porém há a necessidade de serem realizados trabalhos que avaliem o quanto de limão seria necessário adicionar ao açaí”, explica a professora. Ferro, ressalta Carolina, é um nutriente essencial para a vida e atua principalmente na produção das células vermelhas do sangue e no transporte do oxigênio para todas as células do corpo, gerando energia. hely pamplona

Ao completar 399 anos, Belém foi homenageada com o festival “Ver-oPeso da Nossa Música”, que mostrou a riqueza cultural da música feita no Pará. As apresentações foram realizadas nos dias 11 e 12 de janeiro, no Centur, e a programação foi promovida pela MM Produções, com patrocínio da Vale. Nos dois dias de espetáculo, passaram pelo palco a cantora Gina Lobrista, o guitarrista Manoel Cordeiro, além dos grupos Espoleta Blues, Warilou, Nosso Tom e o show “Elas por Elas”, com as cantoras Juliana Sinimbú, Natalia Matos, Nana Reis e Camila Honda O grupo de percussão do Projeto Vale Música também marcou presença no festival, que chegou ao terceiro ano de realização consecutiva. O diferencial nesse ano foi a atração voltada para o público infantil, com a

grandes SHOWS

golpe baixo Quando identifica a presa, o molusco da espécie Conus geographus lança insulina na água para provocar hipoglicemia em cardumes de peandré abreu

queno porte. Os peixes ficam desorientados, tornando-se alvos fáceis. A insulina do molusco revelou uma função até então desconhecida, o que

MANDE A SUA PERGUNTA

Envie perguntas instigantes sobre hábitos, costumes e fenômenos da região amazônica para o e-mail: amazoniaviva@orm.com.br

pode ajudar a entender a ação da substância no corpo humano. FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 15


Quem É?

lílIAm bARROS

umA conHecedorA de mÚSicA indígenA NOME

líliam Cristina Barros Cohen

IDADE 36 anos

fORMAÇãO

graduada em música/piano; doutora em Etnomusicologia e Pós-Doutorado em Antropologia

TEMpO DE pROfIssãO 15 anos

V

inda de formação clássica em piano, Líliam Barros se formou bacharel em música pela Universidade Estadual do Pará, e, desde então, por meio de projetos na própria instituição iniciou a sua trajetória como pesquisadora. Mesmo tendo publicado trabalhos sobre memória musical e história do ensino da música no Pará, Líliam tem como principal linha de pesquisa a etnomusicologia, que ela explica como sendo “o estudo de tradições musicais de maneira interdisciplinar, usando ferramentas da teoria e análise musical, musicologia, antropologia, sociologia, história entre outras disciplinas”. É através da etnomusicologia que é possível estudar as conexões entre as práticas musicais e os modos de vida de determinados grupos em diferentes contextos. “A etnomusicologia estuda as práticas musicais levando em conta sua gênese histórica, social e cultural e suas relações com a vida

16 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2015

TEXTO bRUNO ROChA FOTO RObERTA bRANDãO

cotidiana, com a política, com a construção dos sujeitos e dos saberes”, explica Líliam. É para essa conexão entre música e sociedade que apontam os estudos da pesquisadora. No projeto “Música e Mito no Alto Rio Negro: criação e transformação da humanidade” Líliam observa que os processos musicais dos povos indígenas dessa região está intimamente ligado aos rituais xamânicos. “A confecção dos instrumentos, a composição e execução das músicas fazem parte de uma mitologia que tenta explicar e dar sentido a eventos naturais”, conta. O projeto buscou ainda entender a importância da cerimônia e culto a Miriá Porã Masú no processo de construção e transformação entre os povos indígenas do Alto Rio Negro. Em uma pesquisa anterior, Líliam conviveu diretamente com famílias Desana, na comunidade de Santa Marta, onde realizou importantes estudos para uma etnografia das práticas musicais indígenas na Amazô-

nia. Lá ela pode observar que “eles possuem rico acervo mitológico conectado aos repertórios musicais, que pode ser explicado através da própria mitologia, como a do herói Yurupari, que tem o corpo cheio de buracos por onde o vento passava e produzia sons.” Atualmente, Líliam Barros desenvolve, em parceria com o Museu Paraense Emílio Goeldi, a “Arqueologia Musical Amazônica”, para interpretar os usos cerimoniais e práticas sociais associados aos instrumentos musicais pré-colombianos existentes na coleção do Museu, inclusive com a possibilidade de reconstrução de algumas dessas peças. “Na nossa região há uma multiplicidade cultural tão grande quanto a biodiversidade. São indígenas, quilombolas, ribeirinhos, imigrantes e urbanos que se apresentam como um desafio que ultrapassam a mera etnografia. Daí a grande relevância da etnomusicologia para a pesquisa nas culturas musicais amazônicas”.


REnATA CARnEIRO / UEPA

eu diSSe

aPPLICATIVoS

“A abertura do primeiro núcleo de ensino, Pesquisa e extensão vai dar oportunidade aos alunos de cursinhos populares pré-vestibular até ações voltadas para a área da saúde”

bOAS IdEIAS NUm TOqUE dE dEdOS

bATTERY dOCTOR

Juarez quaresma, reitor da Universidade Estadual do Pará (UEPA) sobre a

Para quem ainda não adquiriu um carrega-

inauguração do primeiro núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Marituba.

dor portátil de bateria para a curta vida da

(Portal Uepa)

energia do smartphone ou tablet pode baixar esse app. Entre a funções estão a de geren-

“Precisamos estudar como reaproveitar a mesma gota d’água várias vezes, como se faz hoje com a reciclagem de plásticos”

ciador de tarefas, que eliminam aplicações não usadas, monitoramento de aplicações e funções que consomem mais carga e cálculo preciso do tempo restante de bateria. Plataformas: Android e iOS Preço: gratuito

Tim Duggan, arquiteto da Ong norte-americana Make it Right, dedicada a projetos ambientais. (Portal Época)

9d+ Meses após a implantação do nono dígito para

“Se a floresta é destruída, há menos evaporação e parte maior da energia solar se converte em radiação emitida para a superfície da terra”

celulares no Pará, ainda é comum encontrar usuários desconfiados em permitir alterações na agenda do telefone pelas operadoras, que, em alguns casos, mudam as configurações personalizadas de chamadas, contatos e funciona-

Anastassia Makarieva, do Instituto de Física nuclear de São Petersburgo (Rússia),

lidades. O 9d+ é um app mais neutro e que, além

sobre a importância da floresta amazônica. (Portal D24AM)

de acrescentar o nono dígito, cria cópias de segurança originais dos contatos telefônicos. Plataformas: Android, iOS e windows Phone Preço: gratuito TARSO SARRAF / ARQUIVO O lIBERAl

IRPF Todos sabem que devem manter em dia suas obrigações com a Receita Federal para ter certeza de não estarem devendo imposto de renda e cair nas garras do leão. O aplicativo ajuda a organizar as despesas para a prestação de contas com o Fisco. Vale lembrar que

“As pessoas passam a tornar belém sua história de vida. isso é muito recompensador” Michel pinho, historiador que criou um roteiro

a declaração deve ser entregue entre março e abril deste ano. Como as informações são muito detalhistas, uma dica é baixar o app num tablet para maior comodidade. Plataformas: Android e iOS

turístico para comemorar os 399 anos de Belém

Preço: gratuito FOnTES: PlAY STORE E ITUnES FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 17


como Funciona

O sistema de captação de água da chuva TEXTO E iluSTraçÃO SáVIO OlIVEIRA

na chuva, na rua ou na fazenda, a

dade. Com 81% da disponibilidade

mais generosa. Segundo o Instituto

paradoxo que pode ser equacio-

água é um importante recurso hídri-

dos recursos hídricos brasileiros, a

Brasileiro de geografia e Estatísti-

nado com um sistema de capta-

co, finito como todos os outros bens

Amazônia concentra 12% da água

ca (IBgE), a Região norte possui o

ção de água da chuva, um modelo

naturais do nosso planeta, e por isso

doce do mundo. Tamanha abun-

maior percentual de municípios sem

alternativo de abastecimento

deve ser tratada com responsabili-

dância carece de uma distribuição

nenhum tratamento de água. Um

para os lares ribeirinhos.

CHOVE, CHUVA

O abastecimento doméstico pode cair do céu

1

4

Para tratar a água com

...Filtro, que pode ser

carinho que vem suja

de barro ou vela de car-

do ar, primeiro é preci-

vão, que funciona para

so conduzi-la por um

purificar a água com

telhado impermeável,

sujeira, que se acumula

arejado e limpo, que irá

no ar por causa da

escorregá-la até a...

poluição. nessa etapa,

2

a água já pode ser

Calha de coleta,

como lavar o piso ou no

equipada com telas

vaso sanitário. Feita a

ou redes, para separar

limpeza, ainda falta a...

utilizada para diversas tarefas domésticas,

folhas e outros insetos

5

enxeridos da água, que irá cair até o...

3

...Desinfecção, que deve ser feita através

...Tubo de descarte ou

de radiação ultraviole-

autolimpeza, um reci-

ta, hipoclorito de sódio

piente que armazena

ou água sanitária, com

uma quantidade de

o objetivo de eliminar

água proporcional ao

bactérias ou vírus,

tamanho do telha-

deixando a água tra-

do. Para cada metro

tada para o consumo

quadrado de telhado,

humano ou banho.

é preciso acumular um litro de água. Quando o tubo encher com

Fonte: artiGo “áGua da cHuVa Para reaProVeitamento na amazônia”. GruPo de Pesquisas aProVeitamento de áGua de cHuVa na amazônia (GPac amazônia); ProFessora luiza Girard, Faculdade de enGenHaria sanitária da uniVersidade Federal do Pará.

a água da primeira lavagem, o restante vai direto para o... 18 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2015


DEU N’O LIBERAL reprodução / o liberal/ hely pamplona

arquivo museu goeldi

FATO REGISTRADO

mistério na amazônia que veio do espaço

Ciência na zona rural do Baixo Amazonas O auge do cultivo de cana-de-açúcar no Brasil colonial já havia passado, mas a foto é testemunha de atividades pontuais que sobreviviam a uma nova realidade amazônica. Longe da cana nordestina e mesmo dos engenhos do então Grão-Pará, o botânico suíço Jacques Huber empreendia uma campanha de campo na região do Baixo Amazonas, mais precisamente no município de Santarém, onde o nativo é o mocorongo e a principal avenida é o rio Tapajós. A inscrição no próprio negativo da imagem deixa claro: “Fazenda Diamantino, 1903”. À época, a produção de açúcar e cachaça não era a principal commoditie regional. A Amazônia vivia a vertiginosa escalada da

extração de látex nos seringais, com as cidades de Belém (PA) e Manaus (AM) se tornando centros exportadores do produto para o mercado internacional. A roda d’água da imagem, porém, era o demarcador de outra atividade de alguma forma integrada à economia gomífera. Até hoje, há saudade do que ficou conhecido como Belle Époque. Emoldurando a imagem, açaizeiros, buritizeiros, bananeiras e sororocas compõem a mata. A natureza contribuía – além da água para a roda – com a madeira a sustentar tudo o que fosse possível, tal qual a acariquara (Minquartiaguia nensis Aubl), o barro para a cerâmica e as folhas das palmeiras na cobertura das residências. A foto tam-

fazenda diamantino

Em 1903, equipe do botânico suíço Jacques Huber visitou a localidade em Santarém

bém registra a empreitada em busca de conhecimento. Na imagem, os pesquisadores conversam com trabalhadores do engenho. Era apenas um verso perdido na literatura econômica e científica da Amazônia: a roda rodou. Também se percebe na foto do acervo do Museu Paraense Emílio Goeldi, uma carroça rústica grande é puxada por um boi. Veem-se pesquisadores conversando com trabalhadores do engenho, todos vestidos com blusas de manga comprida, com exceção de um que está sem blusa. Naquela época muitas propriedades rurais plantavam cana e funcionavam como engenhos que contribuíam com a economia local.

O desconhecido fez parte da rotina de municípios da zona bragantina paraense em 1977, quando possíveis objetos voadores em formatos cilíndricos apareceram iluminando no céu. Alguns relatos diziam que os Objetos Voadores Não-Identificados (OVNIs) lançavam feixes de luz nas pessoas. As vítimas ficavam fracas durante vários dias. O caso ainda hoje é lembrado como ChupaChupa, devido às aparições misteriosas, que, segundo os moradores, sugavam o sangue das vítimas. O LIBERAL noticiou os relatos, o medo e a descrença da população de Viseu nas reportagens “Luz Misteriosa Apavora Viseu” e “Luz Misteriosa Ainda Causa Pavor Em Viseu” publicadas respectivamente nos dias 10 e 11 de julho de 1977. A maioria dos casos aconteceu na divisão entre o Maranhão e o Pará, próximo ao município entre os rios Piriá e Gurupi. O pânico da população fez com que o Exército destacasse guarnições à localidade para investigar o que estava acontecendo. A ação ficou conhecida como Operação Prato, já que os objetos, segundo os relatos, tinham formato de pratos.

FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 19


pedro peloso / divulgação

CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE

Sapo Ozzy, o anfíbio do metal também tem variações agudas. Os olhos negros lembram, de certo modo, os óculos escuros redondos e o forte lápis de olhos usados pelo cantor homônimo. Mas as semelhanças vão encerrando-se por aí, já que o anfíbio não é todo preto para lembrar as roupas, não se alimenta de morcegos e o canto não está na trilha sonora dos filmes do Homem de Ferro. “Até onde sabemos, nessa espécie somente os machos cantam. O canto de anúncio serve para atrair fêmeas. Em outras espécies existem outros tipos de canto, como para defender território contra outros machos ou até mesmo cantos de agonia. Em algumas poucas espécies, as fêmeas também podem cantar. Não sabemos se essas variações também existem nessa nova espécie”, acrescenta o biólogo.

NOS VOCAIS

O sapo de canto agudo descoberto na Amazônia foi batizado com o nome de Ozzy Osbourne, uma lenda do rock

Ozzy.com / divulgação

Um sapo recém-descoberto na Floresta Nacional de PauRosa, Estado do Amazonas, por um grupo de biólogos ganhou o nome de um dos ícones do heavy metal, Ozzy Osbourne. Cientificamente, o anfíbio é chamado de Dendropsophus ozzyi, pois tem um canto muito agudo para atrair as fêmeas, que chega a lembrar um morcego, mamífero que o vocalista líder do Black Sabbath certa vez comeu no palco e entrou para o currículo de bizarrices do artista. A equipe da qual o biólogo doutor em Biologia Comparada, Pedro Peloso, fazia parte, é fã da banda. O sapo pode ser encontrado na região do interflúvio dos rios Madeira e Tapajós. “Só pelo canto, tivemos uma suspeita forte de que se tratava de uma nova espécie”, lembra Peloso. E a voz de Ozzy, o sapo,

pescador só

O socozinho é um hábil caçador, apesar da aparência desengonçada

ELES SE ACHAM inocêncio gorayeb

Saramandaia da seringueira

A seringueira Hevea brasiliensis L.

brião e endosperma, carregadas de

tem frutos cuja semelhança com

nutrientes (albúmen).

Dona Redonda, personagem icôni-

Depois de lançadas, as sementes,

ca da telenovela Saramandaia, de

que são rajadas e com cores do solo,

Dias Gomes, são mera coincidên-

confundindo-se com o ambiente,

cia: explodem. Mas não de tanto

ficam protegidas de predadores. As

comer. A explosão natural lança as

cores vivas de terra e a madeira da

sementes bem longe para germina-

semente muitas vezes são usadas

rem. O fenômeno ocorre quando as

na fabricação de vernizes, tintas

condições climáticas para procria-

e óleos. Depois do estouro, novas

ção são adequadas. As sementes

explosões de vida não devem ocor-

são óvulos maduros e fecundados

rer até que a nova árvore esteja

da árvore, formados de casca, em-

pronta.

20 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2015

da cor da terra

As sementes da seringueira Hevea brasiliensis L. se confundem com o solo para despistar predadores


DESENHOS NATURALISTAS

CONCEITOSAMAZÔNICOS

Sociobiology: The New Synthesis / reprodução

sávio oliveira

coletividade

As aranhas da espécie Anelosimus eximius, descrita por Simon, em 1891, dividem as tarefas para sobrevivência em um único espaço

O convívio social das aranhas

Uma sociedade em que seus membros trabalham de maneira cooperativa para o avanço mútuo da coletividade é uma ideia comum entre os humanos, mas também é encontrada no mundo animal. Na ilustração, por exemplo, o retiro central do ninho, uma espécie de prefeitura da municipalidade, é composto por folhas mortas e envolto em teia de seda. Uma estrutura descrita no desenho feito por Sarah Landry para o livro “Sociobiology: The New Synthesis”, obra de Edward Osbourne Wilson (1975). A gravura é uma reinterpretação do desenho de Simon para um estudo realizado na Venezuela, em 1891. A espécie é a Anelosimus eximius, membro da

família Theridiidae, e descrita por Keyserling, em 1884. Ela habita as ilhas Caribbees, um longo arco de ilhas vulcânicas do mar caribenho, e ainda no Panamá, na Argentina e nas matas das redondezas de Belém. Essa figura foi incluída no livro para ilustrar o tópico “Subsocialidade e Quasicocialidade em Aranhas”, que também fala sobre a vida comunitária do ponto de vista evolutivo dos aracnídeos. Podem chegar a mil indivíduos trabalhando para construir uma grande teia emaranhada com um retiro central: a sociedade. Há cordialidade. Nos afazeres de todo o dia, as aranhas se tocam continuamente por meio de suas patas dianteiras e palpos – espécie peça bucal

–, como se saudando toda vez que passam umas pelas outras. O alimento do grupo também advém de atividades coletivas, quando arrastam as presas ao retiro central para alimentar toda a comunidade. O retiro, porém, ao contrário do que se pensa, não é onde nascem as pequenas aranhas, mas é ali que fêmeas guardam seus sacos de ovos individualmente. Nessa sociedade, as aranhas estão divididas em grupos. A maior parte delas constrói ninhos, mas, dentre essas, uma subdivisão é intitulada de gregárias, já que tendem a viver em agregados populacionais. Outra subdivisão é responsável pela manutenção dos sacos de imaturos, suprimindo o canibalismo entre os jovens.

“Auvaite!”, um grito inocente de guerra

Existe um grito de guerra, um clássico slogan, que ao seu retumbar inicia a batalha mais importante, dá a largada para que a tropa se ponha em marcha, a ordem que vai superar a última trincheira: “Auvaite!” Está declarada a “guerra” nas ruelas do Guamá ou do Benguí, em Belém, ou de qualquer rua na Amazônia recheada de moleques no chão e papagaios no céu. É a palavra-chave dos melhores anos dos gloriosos pracinhas destacados para laços, linhas e rabiolas. Auvaite, cidadãos! O papagaio salpica ao alto durante o ano inteiro, mas o conhecido “tempo de pipa” explode nos meses dos melhores ventos do verão amazônico, justamente nas férias escolares, quando o céu azulzinho clama por outras cores: junho e julho. E a molecada fica encegueirada para ganhar as ruas, corar a pele com o sol inclemente e viver a vida dos melhores anos dos “subúrbios dos melhores dias”, como bem sabia o sambista João Nogueira. Empinar pipa é um mundo – um mundo de expressões. Há um sinônimo para empinar: “soltar” pipa ou papagaio. A criança coloca a rabiola no ar e inicia a disputa para cortar a pipa adversária. Está iniciado o “laço”. E, ao romper de uma linha, a pipa vai “chinar”, que nem folha seca no ar. FEVEREIRO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 21


em nÚmeroS

OS CRUzEIROS ESTãO CHEGANdO

AtÉ mAio deSte Ano, turiSmo fluViomArinHo injetArÁ r$ 7 milHõeS no PArÁ TEXTO VICTOR FURTADO iNFOGraFia MáRCIO EUClIDES

A temporada 2014-2015 de cruzei-

deste ano. São aguardados pelo

baixa temporada no Estado. As

apresentar a cidade, ao lado do

ros está aberta no Pará e os navios

menos 23 mil turistas, que gastam,

praias sempre são os principais

Ver-o-Peso, a maior feira livre da

volta e meia estão chegando em

em média, R$ 305 cada, resultan-

destinos mais procurados, além

América latina e um dos princi-

diversos pontos paraenses, prin-

do numa injeção média de R$ 7

de atrações culturais e religiosas.

pais cartões-postais de Belém. A

cipalmente em Belém, Santarém

milhões na economia local.

Ao desembarcarem na capital

culinária também já é um atrativo

e Alter do Chão. A temporada

Os navios virão, principalmente,

paraense, os turistas conhe-

aos visitantes, que depois podem

iniciou-se em novembro do ano

dos Estados Unidos, Alemanha e

cem a Estação das Docas, um

seguir ao centro comercial ou

passado e encerra-se em maio

Reino Unido. E tudo isso para uma

ponto de recepção propício para

centro histórico.

NO CAIS dO PORTO

Os cruzeiros ajudam a alavancar o turismo no Pará

TEMPORADA 2013-2014

17.400

32

cruzeiros aportaram no Estado

turistas visitaram o Pará entre os meses de novembro e maio na última temporada Belém, Santarém e Alter do Chão foram os locais mais visitados na temporada

R$ 304

foi a média de contribuição por turista

Os turistas vieram principalmente da Inglaterra, Estados Unidos, França, Alemanha e Japão

R$ 5,2 milhões

foi a renda média gerada para a economia local naquela temporada belém

santarém

876 km

é a distância percorrida pelos cruzeiros nos rios entre Belém e Santarém

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TEMPORADA 2014-2015 23.093 turistas são esperados nesta temporada, que vai de novembro a maio

22

navios são aguardados

TERRA à VISTA

OS PRInCIPAIS VISITAnTES E DESTInOS nESTA TEMPORADA

R$ 305

Marco polo, do reino unido, com destino a alter do chão

é a expectativa de gastos de cada turista nesta temporada

830

R$ 7 milhões

passageiros

deverão ser injetados pelo turismo fluviomarinho na economia paraense até maio

Adonia, do reino unido, com destino a santarém

830 passageiros

Insignia dos eua, Insignia, com destino a belém

800 passageiros

jOGUEm A ÂNCORA

OnDE OS nAVIOS DE CRUzEIRO VãO APORTAR

33 7 1 TOTAl: ............................................................................41 atracações

atracações Região do Tapajós (Santarém e Alter do Chão) ....... Belém.................................................................................. atracações Região de Marajó ................................................................ atracação

Fonte: secretaria de estado de turismo do Pará

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OLHARES NATIVOS

24 窶「 REVISTA AMAZテ年IA VIVA 窶「

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O homem, as cores, o olhar, a Amazônia Os olhos intermediados pela lente já produziram obras-primas em 40 anos de fotografia. Agora, Luiz Braga desemboca em um livro homônimo a carreira premiada e debruçada sobre a realidade amazônica que para ele sempre terá cores em profusão em cenas singelas que estão no âmbito da sugestão bem documentada no olhar da criança, no gesto do adulto, na choupana de madeira, no bar perdido numa beira de rio, no trançado das redes dos barcos de passageiros, no vazio dos espaços das cidades do interior, na mudança sutil no território urbano. O livro com 232 páginas, editado pela Cabogó e organizado pelo teórico da fotografia Eder Chiodetto com design da artista visual Pinky Wainer, traz preciosas 80 imagens de lugares amazônicos, como Alter do Chão, Marajó, Bragança, Vigia, além de sua Belém, muitas conhecidas no mundo todo, e são marcas do arquiteto que virou fotógrafo escarafunchando as minúcias, inicialmente, da Estrada Nova, periferia da capital do Estado, lançando o olhar ao longo de quatro décadas sobre região. O resultado é um mapa sentimental-imagético curioso, tomado de referências artísticas e honestamente interessado, não pelo clichê, mas pelo que a Amazônia é de verdade, iluminando a gente de bronze, movimentada pela roda de cores chamada vida. Nesta edição, Braga nos presenteia com algumas imagens de seu livro.

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OLHARES NATIVOS

Coletivo de redes É sufoco? Qual o quê? Sufoco nada. É estranhamento entre estranhos. É labirinto. É o resfolegar do outro a meio palmo. É um sonho narrado pertinho de quem nunca se viu. É conversa que brota na jogada da maresia. É o plano traçado no punho antes de desmaiar.

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A mulher com travessa na cabeça Guarda no coração um segredo, mulher. Mas, não guarde tanto. Não te demoras, que teus olhos escondem o que queremos compreender da tua postura impávida, ancestral, divinamente humana dos que conhecem o tamanho do valor da alma e dizem tanto embora calados.

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OLHARES NATIVOS

O mundo gira Sugere a tontura e a velocidade. Sugere a risada e o contentamento. A emoção e a lembrança. As cadeiras e as crianças. As cores e as cores. Mas, no olho de Braga, sugere o vazio e o infinito. A nostalgia, certa tristeza de quem aguarda a próxima tropa de pequenos ou findou os serviços. Sugere o amanhã.

Direção certeira Firme é tua mão a guiar nos caminhos de água. Firme é teu olho de pupila alargada no escuro líquido tateando o vento. Firme é teu pensamento em quem ficou à espera. Firme é a noite longa a jogar na baía. Firme é o chão que queres na chegada. 28 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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O menino na moldura O que será quando crescer não se sabe,

Vendedor de balões

mas, enquanto jito será peixe no rio e ave no

Perde-se o tempo da

céu quando estiver de

brincadeira. Ganha-se

peito pra cima comen-

o sustento e história. O

do nuvens e cuspindo

menino que segura-

caroços de abiu. Será

va os balões, agora

visagem entre árvores

sustenta o olhar-anzol

e soldado à beira da

em busca do freguês,

praia e mais tudo o que

da ajuda em trocado da

quiser porque o mundo

vez. Ambula pelas pra-

é seu nesse tamaninho.

ças, é graça no cenário, tristeza na vida adulta que ainda começa já com as mãos ocupadas. FEVEREIRO DE 2015

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OLHARES NATIVOS

De frente para o rio-mar Tem uma melancolia na espera de quem vem do rio, no olhar o rio como quem espera alguém. Tem muita nostalgia no lilás sutil do céu e no verde berrante das touceiras de capim. O que pensa o menino? Quem ama a mulher? Esta é uma das belas facetas de Mosqueiro sob o olhar de Luiz Braga.

Cidadania da periferia A cidade é uma entidade de engolir memórias. O tempo a arrastar dos palacetes aos casebres. Do paralelepípedo à taipa. Dar armação de aço inglês à estiva. Impregnadas no limbo e nos olhos dos meninos estão as imagens das frágeis palafitas, ainda realidade, cada vez mais raras na paisagem.

Envie as suas fotos para a seção Olhares Nativos 30 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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Para participar da seção “Olhares Nativos” da revista Amazônia Viva basta enviar fotos com temática amazônica para o e-mail amazoniaviva@orm.com.br acompanhadas pelo nome completo do autor, número de identidade e uma breve informação sobre o contexto do registro fotográfico. As imagens devem ser autorais e com resolução de no mínimo 300 dpi. A publicação das fotos tem fins meramente de divulgação, não implicando em qualquer tipo de remuneração aos autores. Participe!





Fotos: Fernando Sette.


OPInIãO, IDENTIDADE, InICIATIVAS E sOlUÇõEs JOCElYn AlEnCAR

IDEIASVERDES

NOSSO mAESTRO

SObERANO WAldEmAR HENRIqUE NASCEU HÁ 110 ANOS, mAS AINdA HOjE SUA ObRA-PRImA RESSOA COmO REFERêNCIA PARA OS jOVENS múSICOS PARAENSES PÁGInA 38

EDUCAÇÃo coordenadora do clube de ciências

PESQUISA melhoramento genético do açaí e do polo acadêmico da uFpa,therezinha Valim se é uma alternativa para suprir a demanda do dedica ao incentivo da iniciação científica. PÁG. 36 produto no período da entressafra. PÁG.46

PLAnTIo produção e venda de mangas alavancam a renda de famílias ribeirinhas de comunidades de abaetetuba. PÁG.50

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OUTRAS CABEÇAS

É

cada vez mais frequente a aceitação da importância que tem a educação para o desenvolvimento humano, sendo hoje considerada mais do que um simples acumulo de informações e conhecimento. É ela que propicia o crescimento econômico e social de qualquer país, dá a base para construção da cidadania e prepara os cidadãos para uma participação política ativa. Mas é bem verdade que para que tudo isso funcione a qualidade dos estudos é imprescindível. Diante dessa realidade nos deparamos com o ensino da ciência nas escolas brasileiras que deve, por objetivo principal, ajudar a desenvolver mentes capazes de raciocinar criticamente o cotidiano. Acontece que a educação científica no Brasil ainda tem um grande desafio pela frente: fazer com que investimentos realizados no ensino de ciências sejam mais efetivos. A professora da Universidade Federal do Pará, Therezinha Valim Gonçalves, coordenadora do Clube de Ciências e do Polo Acadêmico da UFPA, do doutorado da Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, fala sobre a importância de pensar cientificamente, do desenvolvimento científico e da sua importância na produção de conhecimento crítico na Amazônia. O que é educação científica e como ela é entendida hoje? Ela tem uma compreensão bastante ampla. Há um tempo era entendida somente como a iniciação a pesquisa feita a partir do curso superior e mesmo assim ainda era restrita a estudantes que conseguissem bolsas de pesquisa. Em 1979, quando entrei na UFPA, não tínhamos nem 1% de estudantes na iniciação científica. Passei a adotar nas minhas aulas de ecologia básica a possibilidade de elaboração de projetos 36 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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“É preciso mostrar a ciência”

Para a coordenadora do Clube de Ciências e do Polo Acadêmico da UFPA, Terezinha Valim Gonçalves, “fazer ciência” é produzir conhecimento em benefício de toda a sociedade, além de investimento na qualidade da educação das futuras gerações. TEXTO bruno rocha FOTO roberta brandão


de investigação científica. Já na década de 1980, o próprio CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) abriu a possibilidade de se começar essa iniciação científica mais cedo, no ensino fundamental e médio. Mas no fundo o que se pretende com esse modelo de ensinar ciência é que as pessoas se tornem cidadãos mais críticos, que percebam a realidade e engendrem modos de mudança dessa realidade, que nem sempre atende as necessidades da própria população. A intenção não é a formação de cientistas. Como funciona, nesse caso, para estudantes do ensino médio e fundamental? Qual a importância do ensino da ciência para os jovens? Os projetos de investigação são a melhor maneira para ensinar ciência. O professor tem um conteúdo a passar, mas o aluno tem um questionamento próprio, então o professor pode muito bem sistematizar essas questões de maneira que os grupos de alunos possam investigar determinadas questões, se valendo de conteúdos já elaborados pela literatura específica para encontrar as respostas desejadas. Esse esquema não difere muito do que é usado no ensino da graduação e é o primeiro passo, e o primordial, para o fazer científico. Estimular o conhecimento científico é importante, por exemplo, para que os jovens possam fazer estudos comparativos entre o conhecimento popular e o que a ciência diz. Ou seja, promover a educação científica significa também ter compromisso social, não só no ensino, mas na saúde, meio ambiente. E claro, não como objetivo principal, mas ajuda no desenvolvimento tecnológico das futuras gerações. Como incentivar o gosto pela ciên-

“Estimular o conhecimento científico é importante para que os jovens possam fazer estudos comparativos entre o conhecimento popular e o que a ciência diz” cia em crianças e adolescentes? Eu lembro de um projeto que desenvolvi junto com uma professora do ensino básico, que tinha uma turma que queria saber como se reproduziam os camundongos. Então desenvolvemos um plano de aula onde os próprios estudantes faziam as observações de comportamento dos ratos em diferentes ambientes, com tipos de alimentação variada e como isso podia influenciar na reprodução deles. O projeto surgiu da curiosidade, que é condição natural do ser humano, da própria turma e foi bem aproveitada pela professora, de uma maneira não burocrática. É preciso mostrar a ciência de maneira instigante, como um processo que sempre rende novidades. A descoberta de coisas novas sempre vai chamar a atenção de crianças e adolescentes. Como a senhora avalia a preparação dos professores do ensino básico? Há várias iniciativas nessa perspectiva. O próprio Clube de Ciências é uma delas. Hoje nos temos um mestrado acadêmico

na área de educação e ciência na UFPA e um mestrado profissional, onde a pesquisa e dissertação final são voltadas para a sala de aula. São oportunidades de formação para esses professores e de incentivo para seguir em uma carreira na área. O que é o Clube de Ciência e como ele surgiu? Costumo dizer que não vou ter a possibilidade de mostrar ao outro como fazer algo se eu mesma nunca fiz. Então, foi com essa premissa que surgiu o Clube há 35 anos. Eu desenvolvia meu projeto de mestrado e queria investigar valores e planejamento conjunto no ensino da ciência. Foi então que descobri, nas aulas que já ministrava na graduação, que os alunos não haviam aprendido a serem professores. Isso me impactou e eu busquei soluções até chegar ao Clube de Ciências, com a perspectiva da formação de professores, mas com a metodologia da iniciação científica, visando à formação crítica. Foi o primeiro clube de ciência apoiado pelo CNPQ e institucionalizado em uma Universidade. A estrutura conta com estagiários dos cursos de licenciatura que ficam com mais ou menos dez alunos, vindos de escolas municipais e estaduais. Aí eles desenvolvem projetos com essas crianças iniciando-as na pesquisa científica. O clube cumpre uma função fundamental para as crianças que não têm possibilidades de fazer atividades extracurriculares e já recebeu uma série de avaliações espontâneas positivas dos próprios pais dessas crianças. O que é fazer ciência? É construir conhecimento. Um conhecimento que vai em várias direções, buscando a melhoria da qualidade de vida. Pode ser na vida humana, ou na vida animal, no controle das condições ambientais. Em poucas palavras, fazer ciência é produzir conhecimento e disseminá-lo para benefício de todos. FEVEREIRO DE 2015

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ASSUNTO DO MÊS

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WALDEMAR HENRIQUE MAESTRO POP DE TODOS OS TEMPOS

nascido Há 110 anos, no dia 15 de FeVereiro, o comPositor e Pianista traduziu a cultura amazônica em Forma de mÚsica e HoJe é uma das maiores reFerências Para a noVa Geração de JoVens artistas Paraenses

C

TEXTO jOãO CUNhA FOTOS CARlOS bORGES iluSTraçÃO jOCElyN AlENCAR

apturar o sentido de “clássico” é tarefa árdua. Ilusória, provavelmente. A palavra há muito se descolou de sua origem, na Grécia Antiga, viajou pela Filosofia, Semântica e Literatura até virar o coringa dos nossos tempos, bem servindo ao período azul de Picasso, à trilogia dos fi lmes “De Volta Para o Futuro” ou a um sabor de sorvete. Quais critérios usar para defi nir o que faz de algo ou alguém um clássico, afi nal? Sobrevivência à prova do tempo? Ter uma dimensão universal, sem deixar o que lhe é particular? Influenciar gerações além do seu tempo? Apesar da geleia geral que se tornou o conceito, sob todos os ângulos antes levantados neste início de reportagem, podemos garantir: clássico é Waldemar Henrique. O compositor, pianista e maestro por aclamação, nascido em Belém há 110 anos, no dia 15 de fevereiro, é um marco na mú-

sica paraense e mundial. O volume de sua produção artística que, entre gravações famosas e inéditas, nem chega a 200, não oferece uma noção justa da sua importância. Atrás de um estilo compacto e cristalino e debaixo de uma superfície de simplicidade, encontra-se uma obra coesa e potente que, num indo e vindo de melodias, desenha um mapa sonoro dos universos trilhados por Waldemar Henrique, sobretudo, das muitas “Amazônias” que ele viveu e conheceu. Como o escritor paraense Inglês de Sousa, ele foi um apaixonado pelas culturas tradicionais da região. Nos livros do autor, dentre eles “Contos Amazônicos” e “O Missionário”, e nas composições do maestro estão representadas cenas do cotidiano das zonas rurais e dos nascentes pontos urbanos, o encanto da e pela natureza, as manifestações do imaginário, reais, palpáveis, interferindo e, por vezes, determinando

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ASSUNTO DO MÊS

o curso dos homens. A respeito dessa última característica, o filósofo e professor João Jesus de Paes Loureiro escreveu ao compositor “quem escuta essas músicas amazônicas, não mais pode pensar neles (seres mitológicos da região), sem que o pensamento venha musicado por elas”. Waldemar Henrique não foi o primeiro compositor regional a decantar esses temas. Porém, segundo Sebastião Godinho, estudioso da obra e amigo nos anos finais de vida do maestro, ele se destacou de todos que vieram antes e depois pela maneira muito personalista 40 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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como o fez. “O maestro se diferenciou porque fez uma obra musical simples, como as obras-primas costumam ser, mas extremamente original. As harmonias, os acordes, como ele trabalha os motivos folclóricos, aquilo ali é dele e ninguém até hoje soube fazer igual”, afirma. As composições do maestro criaram uma sonoridade densa e cheia de ritmos que expressa e se identifica com a biodiversidade e as culturas dos povos da região e se propaga até hoje em teatros, auditórios e salas do Brasil e do mundo todo. Hoje, 20 anos após a morte de

Waldemar Henrique, sua obra vive no trabalho de inúmeros músicos, compositores e intérpretes regionais, que cantam, tocam e tem o maestro como influência. Uma lista quase tão diversa quanto são os artistas da terra, e que a cada dia ganha adeptos da nova geração musical, como as cantoras Camila Honda e Sammliz e o grupo “O Charme do Choro”. A obra está viva, principalmente, na memória afetiva dos paraenses, que reconhecem, logo nos primeiros acordes de “Tamba-Tajá”, “Boi-Bumbá” ou “Uirapuru” um som que também é próprio da região.

maestro por aclamação Waldemar Henrique da Costa Pereira se tornou uma das principais personalidades de Belém, devido à sua influência na identidade cultural da sociedade paraense


POPULAR E ETERNO

Conexão sentimental que se percebe mesmo entre o público que talvez desconheça quem é a fonte das melodias e harmonias tão familiares a audição, aprendidas e cantaroladas desde a infância. A violonista 7 Cordas Camila Alves menciona uma experiência de palco que viveu no grupo “O Charme do Choro”, ao combinarem um trecho de Waldemar Henrique no arranjo de outra música. “No nosso primeiro arranjo coletivo, resolvemos tocar o ‘Uirapuru’ no meio do ‘Gaúcho (Corta-Jaca)’, de Chiquinha Gonzaga. A harmonia e o ritmo se adaptavam perfeitamente. E essa citação surpreendeu no público, que rapidamente se identificava e se envolvia, no momento que ouvia as primeiras notas da composição de Waldemar”, afirma. “Esse se tornou, arrisco dizer, o arranjo mais importante d´O Charme do Choro e, com toda certeza, o número mais tocado nesses oito anos de grupo”, completa Camila Alves. Nos anos seguintes, o sexteto de choro participou de espetáculos em comemoração a Waldemar Henrique e ao Theatro da Paz, que fazem aniversário no mesmo dia. Um deles foi no próprio teatro em 2012, com o acompanhamento das intérpretes líricas Carmen Monarcha e Patrícia Oliveira e da pianista Ana Maria Adade. Momento que, segundo Camila, as jovens musicistas adentraram ainda mais na obra, colhendo uma

composição rara do maestro, intitulada “Chorinho”, pouco tocada até mesmo por grupos de choro de Belém. A violonista acredita que um dos fatores que explicam a permanência da obra de Waldemar Henrique é a sua essência popular, apesar da forma erudita. “As composições dele são cantigas e modinhas, populares à sua época. E também as temáticas, nossas lendas e costumes amazônicos. Uma combinação que faz com que sua música atravesse gerações e chegue com facilidade aos ouvidos dos mais diferentes tipos de público”, avalia. Opinião compartilhada por Juliana Sinimbú. A cantora, cujo repertório em quase dez anos de carreira profissional tem nas canções de “Waldeco”, como ela o chama, uma presença constante, completa que a produção do artista transita por diversos segmentos e gerações musicais por ser “universal e elegante”. “Além dos que regravaram Waldemar e deixaram explícita sua paixão pelo maestro, todo o artista paraense que bebe de sua própria cultura inevitavelmente tem Waldeco como referência”, diz. Com o maestro como espelho e parâmetro na música, Juliana mira sua trajetória artística. “Sua maneira de compor, seu lirismo e conteúdo e, principalmente, as melodias, são elementos que podem ser contextualizados até os dias de hoje. Assim quero as minhas canções, que sejam atemporais”.

herdeiras culturais

Atualmente, a cantora Camila Honda (acima) faz sucesso nas rádios do Estado com uma versão moderna de “Tamba-Tajá”. Para Juliana Sinimbú, “Waldeco” é uma presença constante em sua carreira musical.

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aSSunto do mÊS

O mAESTRO E O TEATRO comPositor tem a Vida misticamente liGada a um dos PrinciPais temPlos da cultura em belém O Theatro Nossa Senhora da Paz foi inaugurado em 15 de fevereiro de 1878. Logo se tornou signo de um projeto político de modernidade para a província e da riqueza da borracha em Belém. Exatamente no mesmo dia, em 1905, quando o local estava fechado para reformas que deram suas feições neoclássicas definitivas, nasceu Waldemar Henrique da Costa Pereira. Coincidência histórica, há quem diga. Talvez o próprio maestro, católico praticante, mas um entusiasta do misticismo e do que era metafísico, enxergasse mais do que acaso na sincronia de datas, separadas por 27 anos ou, emprestando um termo que ele mesmo costumava usar quando se referia à passagem do tempo, mais de dois “ciclos jupiterianos completos”. Um possível pre-

núncio dos caminhos em comum que os dois tomariam daí então. Se a edificação do teatro atendeu ao apelo da ilustre sociedade do látex por programações artísticas, bailes e espetáculos à la europeus, havia também a missão de inspirar as pessoas ao cultivo e apreço da arte. Nesse sentido, Waldemar Henrique foi um dos seus exemplos mais bem acabados. Desde pequeno, foi um frequentador das plateias do teatro e, em 1918, o préadolescente (em um tempo que a definição nem existia) viveu uma catarse no “Da Paz” ao assistir a apresentação única da famosa bailarina russa Anna Pavlova. Ainda naquele ano, iniciou seus estudos em música. Anos depois, em 1966, enquanto Waldemar Henrique vivia tempos de glória, o teatro atravessava um período de vacas magras. Consagrado mundialmente, o agora maestro fez a volta à terra natal, num ataque de saudades depois de 33

anos vivendo no Rio de Janeiro. Aqui, foi nomeado diretor do monumento histórico no Estado. Tarefa hercúlea, pois na época o Da Paz não recebia mais nenhum espetáculo, resultado da péssima infraestrutura do lugar. “O imenso casarão exigia serviços que eu e os poucos funcionários tínhamos que dobrar horários para dar conta”, disse certa vez ao amigo Sebastião Godinho. Durante 14 anos, as coxias, galerias e cabines do Theatro da Paz foram a residência de Waldemar Henrique. Literalmente, em um primeiro momento, quando morou no lugar. Logo se mudou para um apartamento alugado na avenida Presidente Vargas, o que não lhe exigia mais do que uma dezena de passos para estar em seu local de trabalho. A devoção do maestro excedia tanto as formalidades de seu cargo que o seu “companheiro” de título, maestro Nivaldo Santiago, comentou em entrevista ao jornal Província do Pará em 1972:

JOãO RAMID / ACERVO SEBASTIãO gODInHO / REPRODUÇãO CARlOS BORgES

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UM bOM fUNCIONÁRIO

Pianista por formação, waldemar Henrique chegou a dirigir o Theatro da Paz, o qual nutria uma verdadeira devoção filial


Um GRANdE E HUmIldE mESTRE

mÚsicos consaGrados Guardam boas lembranças

“Esse negócio do Maestro (referindo-se a Waldemar), (...) ficar abrindo e fechando porta de teatro, eu acho um negócio absolutamente esquisito, sabe? Isso só acontece no Brasil...” À frente do Da Paz, Waldemar Henrique foi responsável por melhorias e a reabertura da casa e pela primeira galeria de artes oficial do Estado, a “Angelus”, que funcionava onde hoje é a bilheteria do teatro. Também foi um grande incentivador das culturas locais, o que ele acreditava acontecer especialmente por meio do incentivo à presença da juventude em meio ao público e aos novos artistas que iam ao então diretor em busca de uma avaliação de seus primeiros trabalhos. Mesmo depois que se exonerou do cargo, em 1980, o maestro era presença fiel no Theatro da Paz em peças, concertos, récitas e em tantas quantas mais ocasiões, reservando um sorriso sereno aos artistas mais jovens e um olhar de aprovação a quem estava em cima do palco, levando adiante o ofício e a predestinação de fazer e divulgar a arte.

Simplicidade, generosidade e boa disposição para quem chegava em busca de aconselhamentos e orientação musical. Esse traço da personalidade de waldemar Henrique, que ultrapassa as análises acadêmicas, é também um caminho importante para entender a continuidade de sua obra. Yuri guedelha, multi-instrumentista e professor da Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA), recorda da vivência com o maestro, iniciada na década de 1980, quando ainda era um músico iniciante. “Das suas características, as que eu mais admirava eram sua simplicidade e humildade. Embora ele fosse um dos maiores compositores do Brasil, sempre tratava as pessoas com gentileza. nunca percebi no maestro atitudes arrogantes ou de estrelismo”, conta guedelha, que organizou um songbook com doze composições do maestro para o livro de Sebastião godinho “waldemar Henrique da Costa Pereira” (1994), destaca qualidades em comum entre o temperamento do artista e a forma como ele construía as canções. “Ele utiliza com maestria os recursos harmônicos, além do trato de suas melodias e harmonias que são ao mesmo tempo simples e refinadas”, diz Yuri guedelha. Característica que, simbolizada no trabalho do JOãO RAMID / ACERVO SEBASTIãO gODInHO / REPRODUÇãO CARlOS BORgES

maestro, instigou uma linhagem de músicos paraenses a olhar e reafirmar suas identidades culturais. “A partir do exemplo dele, a grande maioria dos compositores do Pará vem seguindo suas pegadas no sentido de um olhar mais aguçado para as nossas raízes e a ligação da nossa arte com a natureza”, afirma o instrumentista e professor da EMUFPA, luiz Pardal. A obra singela e grandiosa de waldemar Henrique chegou ao século XXI sendo gravada com a constância e a procura do que nunca foi esquecido, pela referência e atualidade, para músicos cameristas até os intérpretes populares, e com a facilidade que o maestro sempre prezou no diálogo entre sua música e o povo. “Me ligam, mandam e-mails e eu libero os direitos, porque o maestro jamais impediu qualquer pessoa de gravar uma música dele e nunca cobrou um centavo por isso. Esse era o espírito dele e eu estou seguindo o que ele faria se estivesse aqui”, assegura Sebastião godinho, amigo e guardião da memória e dos direitos autorais de waldemar Henrique.

AO MEsTRE, COM CARINHO

luiz Pardal e Yuri guedelha reconhecem em waldemar Henrique o exemplo de um amor desprendido à música

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ASSUNTO DO MÊS acervo / sebastião godinho

sincero agradecimento Waldemar Henrique fez uma dedicatória aos músicos da extinta banda Mosaico de Ravena após assistir a uma versão “hardcore” de Matintaperêra, composição do maestro

REPAGINADA

Desconstruir a música, cruzar referências, acrescentar novos tons e elementos e fundir sonoridades são outras vias para dar seguimento, sob uma visão contemporânea, ao trabalho de Waldemar Henrique. Nesse sentido, uma das recriações mais atuais e inovadoras do cancioneiro de Waldemar Henrique surgiu do repertório de Camila Honda. “Tamba-Tajá”, canção emblemática do maestro, ganhou arranjo eletrônico e quebras de andamento na versão da cantora paraense.

admiração e companheirismo

“O maestro se diferenciou porque fez uma obra musical simples, como as obras-primas costumam ser”, diz o pesquisador e detentor do acervo musical de WH, Sebastião Godinho

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A banda de apoio aproveita a partitura original, que indica um jogo de tempos fortes e fracos no acompanhamento musical, e Camila, com modulações de voz, esquadrinha as palavras com um misto de doçura e furor, realçando a atmosfera romântica da música, uma prece melancólica de amor à planta-título, símbolo do amor puro e eterno nas lendas amazônicas. “É uma canção que circula no repertório lírico e que a Fafá de Belém fez uma versão inesquecível no disco de mesmo título (Tamba-Tajá, de 1976). Eu achei que no sé-

culo XXI seria interessante cantá-la diferente, contando essa história de amor de outra maneira. E fui experimentando”, explica. A interpretação, registrada primeiramente em gravação demo e em um “vídeo de estúdio” de 2012, disponível no Youtube, foi um dos destaques do álbum de estreia da cantora, lançado no ano passado, recebendo boas avaliações da crítica especializada. “Sou muito grata a essa música pelos lugares onde tem me levado e pelo novo público ao qual tem chegado”, conta. O “empréstimo” de Tamba-Tajá, como Camila Honda se refere à sua versão, foi um caminho natural ao afirmar ter Waldemar Henrique como uma referência duradoura. “A minha educação musical começou no balé (quando criança), então eu tenho essa base de música erudita. Eu acho que ele é o (maestro Heitor) Villa-Lobos da Amazônia. A relação que ele faz entre a música clássica e a popular é de um conceito maravilhoso, tecnicamente incrível e de um pensamento à frente do seu tempo”, resume.


SAIBA MAIS Algumas canções de Waldemar interpretadas por jovens artistas paraenses Camila Honda canta Tamba-Tajá

O Charme do Choro e Arthur Espíndola interpretam Abaluaiê

jaloo / divulgação

neto soares / sammiliz / divulgação

divulgação

da com orgulho por Edmar. “Para nós, Waldemar Henrique foi uma espécie de autorização especial: sim, poderíamos tocar em qualquer ambiente musical. Estávamos livres e havia uma floresta de oportunidades para a imaginação descobrir”, define o músico. A depender dos artistas paraenses das novas gerações, o espírito pop, ousado e jovial do maestro nunca vai deixar de ditar a cultura amazônica na região.

bó no seu hino maior, a canção de protesto “Belém-Pará-Brasil”, de 1992. A edição “suja” e ruidosa de “Matintapêrera” chegou aos ouvidos do autor da música original. Era o início dos anos 1990, e o Mosaico de Ravena fora convidado pelo Museu da Imagem e do Som do Pará (MIS-PA) para tocar sua versão no encerramento de uma exposição em homenagem ao grande artista. Na plateia, logo nas primeiras fileiras, estava Waldemar Henrique. “A gente estava com muito medo que ele não gostasse. Ao final, fui cumprimentá-lo e recebi um beijo como sua aprovação para o que havíamos acabado de fazer e nos tornamos amigos”, relembra Edmar da Rocha, ex-vocalista do Mosaico. A boa impressão que o som dos “meninos” causou ao maestro está registrada na dedicatória do livro que ele presenteou os integrantes da banda. “Mosaico de Ravena, cujas interpretações amazônicas me conquistaram (...) envio com votos de continuado sucesso por onde se apresentarem”, diz a inscrição, exibi-

O lastro da obra “waldemarhenriquiana” não se limitou a gêneros consagrados pela crítica musical, tampouco unicamente retroalimentou ritmos regionais ou aqueles de inspiração erudita. Outras vertentes musicais também se valeram e reverenciaram suas canções, temas e melodias. Em um exemplo recente, na edição 2013 do festival de música Terruá Pará, a cantora de heavy metal Sammliz e o músico e criador de remixes Jaloo apresentaram uma releitura nervosa e envolta em batidas de “Abaluaiê”, composição baseada em um ponto cantado no afrorreligioso. Os roqueiros do Mosaico de Ravena também possuem um caso dessa influência fora do habitual, o que demonstra o alcance da música do maestro. A banda transformou o lamento arrastado e climático de “Matintaperêra” em um heavy metal com toques de bolero, muito peso e distorção de guitarras. Uma apropriação com a identidade do grupo, que contrariou os puristas ao misturar rock com o batuque do carim-

inspiração regional

A violonista 7 cordas Camila Alves, a roqueira Sammiliz e o músico e criador de remixes Jaloo já fizeram versões ousadas e surpreendentes - da obra de Waldemar Henrique

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COMPORTAMENTO SUSTENTÁVEL

Açaí sempre à mesa

ronaldo rosa / divulgação

Pesquisa de melhoramento genético desenvolve uma nova variedade do fruto na região para tentar evitar a escassez na entressafra TEXTO Vito Gemaque

S

e depender da ciência o açaí nunca faltará na mesa do paraense. Uma pesquisa de melhoramento genético da espécie Euterpe oleracea promete expandir a produção do fruto no Pará e acabar com a entressafra, período em que a colheita diminui na região.

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A pesquisa em fase de conclusão desenvolvida pela Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa) Amazônia Oriental selecionou as melhores variedades do açaí mais adaptadas ao plantio com irrigação. Com a seleção, uma nova variedade de açaí foi criada para, em condições

ideais, duplicar a produção do fruto. Para o responsável pelo estudo, João Tomé Neto, pesquisador de genética e melhoramento de plantas da Embrapa, que há doze anos se debruça sobre o assunto, o resultado da criação da nova variedade começará a render frutos daqui a pouco tem-


ROnAlDO ROSA

CUlTIvO

O plantio do açaí em terra firme com irrigação das plantas, além de técnicas em adubação, ajudam a aumentar a produção no Estado

SAbOR AçAí

A produção do fruto no Pará Área produzida no Estado do Pará

105 mil hectares Produção anual

825 mil toneladas por ano po. A produtividade das áreas plantadas pela Embrapa no campus de pesquisa chegou nos últimos anos a alcançar 15 toneladas de açaí por hectare ao ano, quando, em geral, se obtém aproximadamente seis toneladas sem aplicação de manejo. “Isso demonstra que a planta respondeu bem ao procedimento. Hoje, não há cultura que dê retorno melhor do que o do açaí. É uma excelente alternativa para os produtores do nosso Estado”, garante Neto. O Pará sofre com a escassez do produto durante a entressafra. Segundo estimativas da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap), a produção estadual do açaí em 2013 foi de 825 mil toneladas, sendo que 575 mil toneladas foram no período de safra, ou seja, mais de 70% da colheita se concentrou nos meses de julho a dezembro, e somente 30% correspondentes a 250 mil toneladas foram na entressafra, período que se estende de janeiro a julho. A disparidade gera aumento do preço da saca no primeiro semestre do ano. “O açaí é o retrato do extrativismo. Nenhuma cultura no mundo é tão forte como a do açaí, mas ela tem problemas socioeconômicos na entressafra. Há cerca de quatro mil batedores na Região Metropolitana de Belém, a maioria fecha na entressafra por causa da falta do fruto e do preço”, diz José Neto. Os preços ainda geram uma exclusão crescente da população carente em consumir o fruto devido à alta do produto. O último levantamento de 2014 do Departamento

de Intersindical de Estudo e Estatísticas Socioeconômicos (Dieese-PA) sobre o preço do açaí mostra que no final de novembro o litro do tipo médio vendido em feiras e supermercados de Belém teve aumento de 8,33% em 12 meses. De novembro de 2013 ao mesmo mês do ano seguinte o produto passou da média do litro de R$ 12,60 para R$ 13,65. Para mudar essa situação José Neto sugere que a solução é a produção em terra firme com irrigação das plantas e complementos de técnicas em adubação. De acordo com ele, o Pará precisaria de 50 mil hectares de açaí irrigado para produzir 450 mil toneladas a mais por ano e suprir a demanda interna e externa. Com a nova variedade a produção seria estabilizada durante o ano inteiro. O Estado possui atualmente em torno de três mil hectares de açaí irrigado concentrados principalmente nos municípios de Santarém e Óbidos. A Sedap estima que a área total de plantio no Estado seja de 105 mil hectares. Uma das dificuldades a serem superadas é o custo para implementar a irrigação nas plantações que podem chegar a R$ 8 mil por hectare. “Mas o retorno da cultura da irrigação é compensado financeiramente. Você tem açaí o ano todo”, antecipa o pesquisador.

na safra (entre julho e dezembro)

575 toneladas por ano na entressafra (entre janeiro e junho)

250 mil toneladas por ano Área necessária para suprir a demanda

50 mil hectares

de plantações irrigadas Aumento da produção

450 mil toneladas a mais por ano

Proporção na produção durante o ano Variedade atual

30%

na entressafra

70% na safra Com nova variedade

48%

na entressafra

bENEFíCIO

O açaí está na família de Márcio Coelho da Veiga, de 36 anos, há muitos anos. Em 2001, seguindo a tradição começou a tra-

52% na safra FOnTE: SECRETARIA DE ESTADO DE DESEnVOlVIMEnTO AgROPECUÁRIO E DA PESCA E EMBRAPA

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COMPORTAMENTO SUSTENTÁVEL ronaldo rosa / divulgação

“Nenhuma cultura no mundo é tão forte como a cultura do açaí” José tomé neto

Pesquisador de genética e melhoramento de plantas da Embrapa

balhar batendo açaí e logo percebeu a carência do fruto na entressafra. Em Tome-Açu, nordeste paraense, Márcio percebeu que o problema poderia se transformar em uma oportunidade. Ele decidiu se lançar em uma nova empreitada e não só comprar o açaí de revendedores, mas produzir o fruto em suas terras. “Tem duas vantagens, a primeira é que o açaí vai sair a um custo mais baixo e o excesso eu vou revender. Vão ser duas fontes de renda”, comemora. Os anos de experiência vendendo a polpa do açaí renderam um reconhecimento para saber quando o fruto vale a pena. “O açaí seca no cacho, com esse tipo da Embrapa não acontece. Ele ainda é mais difícil de pegar doença e dá cachos maiores. O caroço também é sempre miudinho”, elogia. O batedor artesanal começou plantando sementes das 500 plantas da Embrapa, que mesmo não sendo as selecionadas, são consideradas melhores que todas as outras da região. “Enquanto os outros tipos fazem 2,5 litros do tipo médio, e em duas batidas atinge 7,5 litros, o novo tipo consegue 7 litros na primeira batida e mais ou menos de 14 a 15 litros na segunda”, confirma. O plano 48 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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dele é plantar três mil mudas irrigadas. O produtor percebe na Embrapa um grande parceiro. Ele buscará mais informações sobre a maneira correta de plantar e conseguir os melhores resultados.

QUALIDADE

A natureza deu toda a matériaprima necessária para o desenvolvimento da nova variedade da Embrapa, que deverá se chamar Ver-o-Peso. “A disponibilidade na natureza é tão grande que ainda não a exploramos. Nós fazemos um melhoramento genético natural”, explica José Neto. A pesquisa iniciou-se em 2002 com a coleta de frutos nos municípios de Afuá, Chaves e Anajás no período da entressafra em palmeiras que tinham qualidades como uma alta quantidade de filamentos, muitos cachos, sementes pequenas e resistência às pragas. Após um ano foi feito o plantio de 500 sementes selecionadas no campus de pesquisa da Embrapa no município de TomeAçu. Os nove anos seguintes foram dedicados à análise da produção durante cinco colheitas comparando-se a safra e a entressafra. A produção foi crescendo partindo de 6,2 toneladas por hectare ao ano, pas-

sando para 10,8 toneladas e chegando até 15,3 toneladas com a ajustes na adubação. A pesquisa alcançou os objetivos de equilibrar na produção durante todo o ano. No primeiro semestre na entressafra, a produtividade foi corresponde a 48% dos frutos, e no segundo semestre, a produtividade foi de 52%. Depois do período de análise foram escolhidas as 45 plantas que tiveram os melhores resultados e o maior teor de antocianina, substância antioxidante responsável pela coloração roxa do fruto e que ajuda na prevenção do envelhecimento e na pressão arterial. A nova variedade será disponibilizada daqui a dois anos e meio para os produtores do Estado. Esse período é necessário que a variedade seja plantada e gere mais sementes. A Embrapa ainda espera desenvolver no futuro pesquisas de melhoramento genético para o açaí produzido nas várzeas do Estado. “Não tenho dúvidas que com o avanço e com o melhoramento genético conseguiremos chegar de 20 a 25 toneladas por hectare. Precisamos de alguns ajustes culturais. Isso poderá ser feito no período de 10 anos”, adianta o pesquisador José Neto.


BONS EXEMPLOS

MUDANÇADEATITUDE tchor1974 / sxc.hu

roberta brandão

TROQUE TEMPEROS INDUSTRIALIZADOS PELOS NATURAIS Para dar um gostinho extra nos alimentos, e ainda atrelar doses de saúde às refeições, a dica é substituir os temperos industriais pelos condimentos naturais. A utilização de temperos industrializados em excesso apresenta riscos à saúde. Os temperos prontos, como o caldo de galinha e carne, além

Placas para preservar as árvores da avenida Ao passar pela avenida Governador José Malcher, uma das principais vias de Belém, na altura das travessas Três de Maio e Nove de Janeiro, é difícil não notar o cuidado com as árvores do local. Placas com avisos e pedidos de “não quebre as plantas”, chamam a atenção para o respeito ao ambiente. Desde 1997, logo após a aposentadoria, João Moreira de Souza, hoje com 65 anos, passou a fazer canteiros para as árvores que formam um verdadeiro túnel verde na avenida. O primeiro foi feito na porta de sua casa e, agora, já são mais de 20 canteiros construídos com madeira e materiais reciclados. “Eu

não consigo ficar parado. Eu tentei uma outra atividade depois da aposentadoria, mas larguei de mão e fiquei nos canteiros. É uma luta intensa, porque, às vezes, os canteiros são usados como lixeiras ou sanitários para cachorros”, diz. “Mas com o tempo, você vai conquistando o respeito e a admiração das pessoas. É isso que esperamos, um pouco de respeito, um pouco de consideração. Aí, aquele que trazia o cachorro para o canteiro já não traz mais”, completa. A atitude de João tem várias motivações. Uma delas é a compreensão de que a natureza é fundamental ao homem e ao planeta. “Nesse trabalho eu vou falando

com a Mãe Natureza. Eu me apego a ela”, diz. A paixão por Belém também instiga o aposentado a cuidar e se dedicar a cada árvore do perímetro em que mora na Governador José Malcher. “Eu nasci aqui e tenho uma paixão por essa cidade prestes a completar 400 anos. Tenho paixão também pela natureza. Eu sou um apaixonado”. Toda essa dedicação já caiu nas redes sociais e a esperança de João Souza é que o cuidado com a natureza se reproduza ainda mais. “Se a pessoa vem, tira uma foto e coloca na internet, aquela mensagem da placa vai cair no mundo e se multiplicar. Isso será bem-vindo”.

das pitadas extras de sal para o cozimento costumam carregar os alimentos de sódio, um passo em direção à pressão alta, ensina a nutricionista Naíza de Sá, doutoranda do programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB) e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA). Entretanto, a maior parte dos condimentos e especiarias naturais possuem qualidades culinárias e medicinais e são ingredientes essenciais numa alimentação saudável e equilibrada, pois além de realçarem o sabor dos alimentos, ajudam na digestão, melhoram a estética do alimento e possuem qualidades terapêuticas. Considerando a realidade amazônica, os temperos mais acessíveis à população e que podem ser consumidos de maneira saudável são o urucum, cheiro-verde, cebolinha, pimenta de cheiro, cariru, salsão, chicória e outras opções. Vale sempre ressaltar que esses temperos naturais são ricos em substâncias antioxidantes que combatem os radicais livres, impedindo a oxidação das células e com isso previnem contra o envelhecimento precoce, agilizam o trabalho do fígado, têm propriedades diuréticas, entre outros benefícios, por isso devem ser utilizados com frequência na alimentação.

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VIDA EM COMUNIDADE

Lá de onde vêm as mangas

Produtores de Abaetetuba abastecem Belém no período da entressafra do açaí TEXTO fabrício queiroz fotos hely pamplona

O

conhecido “inverno amazônico” traz uma série de mudanças no clima da região, mas também provoca alterações nos hábitos da população. A tradicional alimentação acompanhada de açaí nesse período fica prejudicada devido à entressafra do fruto que não desaparece, mas já não tem o mesmo sabor e cor da época de sua abundância. Nesses meses, outros alimentos adoçam a vida dos paraenses como as mangas, frutas típicas da Índia, mas que se adaptaram tão bem à região que servem até como adjetivo da capital do Estado, a Cidade das Mangueiras. Curiosamente, porém, a maior parte das mangas consumidas em Belém não vem das árvores que embelezam o centro da cidade. Os mercados e feiras, na verdade, são abastecidos pelas frutas vindas, principalmente de Abaetetuba, a terra do miriti. Toda semana, barcos como o “Vitória de Deus”, comandado por Antônio José Almeida, de 36 anos, acompanhado do irmão e de um amigo, chegam carregados de mangas ao Ver-o-Peso.

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O trio parte do Baixo Tocantins sempre na madrugada de segunda-feira para chegar ainda de manhã bem cedo no mercado. Colocar as frutas nos paneiros para oferecer aos feirantes é a última parte de uma jornada que começa no rio Maratuíra, em Abaetetuba. Na comunidade, Antônio busca as famílias que têm mangueiras em seus terrenos. Antes da safra, por volta dos meses de agosto e setembro, ele compra as mangas para vendê-las nesse período. “Eu compro de umas 20 famílias. Mas se não tiver madura, dos vendedores que conheço, vou procurar (em outras áreas). Onde tiver manga, a gente sai comprando”, conta ele, que, em apenas uma viagem realizada em janeiro, transportou 20 mil mangas de Abaetetuba para Belém. “Trazer para Belém é a melhor opção porque aqui tem muita saída. Daqui (Ver-o-Peso), as pessoas levam também para Ceasa (Centrais de Abastecimento do Pará) e de lá para outros clientes”, conta Antônio, que chega a lucrar até o triplo do que investiu comprando as frutas ainda verdes.


De acordo com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agropecuário e Pesca (Sedap), não há dados oficiais sobre a produção de manga no Pará, porém, sabese que são comercializadas, por ano, na Ceasa, em Belém, mais de 125 toneladas de mangas vindas de Abaetetuba. Desse montante, 80% são da variedade conhecida como a “manga bacuri”.

COLETA

20

MIL É O NÚMERO APROXIMADO DE MANGAS

transportadas por Antônio José Almeida (abaixo), de Abaetetuba a Belém. Nesse período do ano, ele chega a comprar as frutas de pelo menos 20 famílias produtoras do Baixo Tocantins

Além do Maratuíra, os abaetetubenses que vivem nos rios Maracapucu, Marapucu-Miri e Quianduba também têm na coleta e venda de mangas uma importante fonte de renda. Na paisagem dessas comunidades ribeirinhas, de fato, chama a atenção a grande presença de mangueiras tão comuns quanto o açaí e o miriti, outros destaques da agricultura local. “A gente faz de tudo um pouco. Vendemos açaí, cupuaçu, mas nessa época mesmo é a manga porque a gente tem que sempre buscar uma alternativa para ir vivendo”, conta José Maria Silva Ribeiro, de 61 anos, que mora às margens do Quianduba. Lá também mora o produtor Manuel Ferreira Almeida, de 50 anos, mais conhecido como Seu Naza, que regularmente faz o transporte de rabeta da comunidade

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VIDA EM COMUNIDADE

abastecimento

De acordo com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agropecuário e Pesca, pelo menos 125 toneladas de mangas vindas de Abaetetuba são comercializadas por ano no mercado do Ver-o-Peso e na Ceasa, em Belém.

“Quando chega na safra é muito bom porque ajuda a gente quem vende e ajuda também outros pais de família que trabalham conosco” Manuel Ferreira Almeida

Produtor de mangas na comunidade do quianduba

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no Baixo Tocantins até a cidade. O transporte de pessoas é mais uma alternativa de sobrevivência para a família que também cultiva uma pequena roça e vende os produtos do extrativismo local, como a manga. “Quando chega na safra é muito bom porque ajuda a gente quem vende e ajuda também outros pais de família que trabalham conosco. Uma pena que dura só de quatro a cinco meses, mas ela dá um rendimento muito bom”, diz. Segundo os moradores, há árvores tidas ali como “nativas”, contudo muitas foram plantadas para aumentar a produção. Apesar disso, as mangueiras são bem adaptadas ao ambiente, tanto que não há registro de pragas ou da necessidade de muitos cuidados com a plantação. “Não dá

trabalho nenhum. É só esperar e colher”, afirma José Maria. Para colher as mangas, no entanto, os agricultores esperam em torno de oito anos, à exceção da variedade conhecida como “manga espada”, que depois de dois anos já começa a gerar os primeiros frutos. Entre outubro e março, período em que se estende a safra, os produtores garantem que cada árvore pode gerar até três vezes, por isso os ganhos com a venda da fruta se tornaram tão importantes. Assim, no rio Guamá, no Baixo Tocantins ou ainda na Índia, a fruta cheia de fibras e de um doce tão particular sacia a fome, colore as verdes folhas e também ajuda a manter a renda de uma população que só quer viver sua amazonidade nos rios da região.


ARTE, CUlTURA E REFlEXãO ROBERTA BRAnDãO

PEnSElIMpO

NA CENA URbANA

A CANTORA PARAENSE NATÁlIA mATOS TROUxE dE SãO PAUlO UmA VISãO dE mUNdO qUE SE ENCAIxA NA múSICA FEITA NA AmAzôNIA

PÁGInA 54

PInTURA projeto letras que Flutuam

oBRA autora de “menina que vem de itaiara”,

SAÚDE a produção e o consumo de alimentos

resgata a tradicional arte de “abrir” letreiros nas embarcações dos rios da região. PÁG. 58

lindanor celina é hoje um dos principais nomes femininos da literatura do pará. PÁG.60

orgânicos crescem no país embalados pela busca da qualidade de uma vida sustentável. PÁG.66

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dedo de proSa

Dois mundos

a cantora natália matos trouXe Para a mÚsica que Faz em belém sua eXPeriência adquirida na urbanidade da maior metrÓPole do brasil, são Paulo

O

TEXTO jOãO CUNhA FOTOS RObERTA bRANDãO

ano é 2012. Os álbuns de Felipe Cordeiro e Gaby Amarantos, recém-lançados, bem recebidos pela crítica e validados nas pistas de dança dos amantes de música pop, até dos indies, demarcam algo que vinha tomando forma há algum tempo: após um hiato de pouca visibilidade, uma cena musical paraense crescia e se propagava pelo Brasil. Em São Paulo, Natália, belenense radicada na capital paulista há oito anos, arquiteta e cantora amadora, absorve esse movimento com ânsia e a inquietação de assumir a música como rumo principal da vida. Tempos atuais. A jovem cantora, ex-arquiteta praticante, está de volta a Belém, e se apresenta profissionalmente em casas de shows e teatros com o repertório de seu álbum de estreia, “Natália Matos”, lançado em 2014 pelo selo Natura Musical. A artista de 24 anos diz se sentir acolhida pela geração de músicos que viu, num passado não tão distante, alcançar o sucesso na-

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cional. Geração que nomes como o dela e de Camila Honda sucederam com os votos de manter a boa-fama do som e do gingado paraense. Na entrevista a seguir, Natália Matos fala da influência musical que teve da família desde a infância, porque fez o caminho de volta e escolheu a música e o Pará como suas novas prioridades e de que maneira misturou no seu primeiro trabalho de estúdio o calor e o suingue regional com a sonoridade suja e densa que apreendeu na sua vivência em São Paulo. Você cresceu em um ambiente musical, onde foi estimulada para ouvir e praticar música. Essa influência a encaminhou para a carreira de cantora? Minha família não é de músicos, mas ela sempre foi grande incentivadora da arte e acabou que comigo o incentivo dela deu pé. Me colocaram para fazer teatro na Escola de Teatro e Dança da UFPA, fiz dança, música no Conservatório Carlos Gomes, piano na Escola

de Música da UFPA. Foram experiências muito boas, uma forma de eu me envolver com o pessoal da música de Belém. Mais tarde, quando eu me mudei para São Paulo com meus pais eu senti falta da música, aí eu fi z prova pra ULM (Universidade Livre de Música) e lá cursei canto popular por dois anos, junto com a faculdade de Arquitetura. A música caminhou comigo, paralelamente à vida de escola, de faculdade, então ela esteve sempre presente. E chegou uma hora, aos 22 anos, em que eu percebi que ela precisava estar de fato, ser o grande caminho da minha vida. Dois anos depois dessa decisão, você lançou “Natália Matos”, seu álbum de estreia. Ele é, praticamente, com composições suas, de artistas paraenses, como Ronaldo Silva, Dona Onete e Iva Rothe, e paulistas, como Rômulo Fróes e Kiko Dinucci. Como foi a escolha do repertório e o contato com essa turma?


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DEDO DE PROSA

“Isso é o mais legal, ver a nossa música ser apropriada por outra gente. Isso é expandir a nossa cultura, porque se torna uma relação de amor pelo que é paraense” de volta às raízes

Natália Matos decidiu voltar a Belém para se reencontrar com uma música cheia de calor cultural

Eu tentei trazer para o disco um pouco da minha realidade, a expressão de um momento que era de volta às minhas raízes. Assim como eu escolhi tornar a música como profissão, eu escolhi voltar para Belém. Acho que também por mudar de vida, ir atrás da família, dessa terra quente e da própria cena daqui, vim mergulhar mesmo em compositores que nunca deixaram de ser minha referência. Nas minhas rodas de choro eu cantava Ronaldo Silva, os meninos que tocavam comigo já ouviam as minhas coisas e tocavam carimbó. Então o disco traz isso, a minha essência, as nossas peculiaridades musicais. Da turma de São Paulo, alguns eu já conhecia, outros meti a cara e me apresentei. Gravei uma música que eu gostava muito do Douglas Germano chamada “Cio”, que abre e fecha o meu disco. Ela é uma música de muitas guitarras

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e uma percussão que flerta com a cumbia, uma música que simboliza o disco. De que forma o disco expressa sua relação com as duas cidades, Belém e São Paulo? Por mais que eu tenha morado oito anos em São Paulo, e que a cidade me traga uma visão de mundo diferente, a gente não perde nosso lado caloroso, porque isso está nas nossas músicas, porque isso está na composição de todo mundo daqui de certa forma. Eu vim para cá experimentar e a partir do momento que eu tive que produzir o disco, eu quis que ele tivesse a história de Belém, mas que não fosse de forma óbvia. A ideia do disco era fazer um som caloroso, feito por compositores daqui e que também tivesse uma pitada mais urbana, que desse uma cara mais suja mesmo, mais densa, que eu acho que uma cidade como São Paulo traz.

Você circula muito por São Paulo, apesar de não morar mais lá. Como a atual música paraense é encarada pelos músicos paulistas? É passada aquela fase do fenômeno; hoje ela é vista como uma sonoridade estabelecida entre outras do país? Estar estabelecida em São Paulo é sempre um desafio, mas é muito bonito ver que as novas bandas da cena independente paulista sabem o que é guitarrada, quem é o Aldo Sena, o Mestre Vieira, o Felipe Cordeiro, e tocam e citam nossos sons. Tem o Lucas Santana, que faz referência a um brega no show dele; a guitarra do Kiko Dinucci, que soa como se tivesse tocando uma música latina; o Tiago França, que gravou no último disco algo que tem muita a ver com a nossa latinidade. Eu acho que isso é o mais legal, ver a nossa música ser apropriada por outra gente. Isso é expandir a nos-


sa cultura, é chegar aos lugares, porque se torna deles também, uma relação de amor pelo que é paraense. Em agosto do ano passado, você apresentou o seu primeiro CD em Belém com um show no Teatro Margarida Schivasappa. Como foi estrear em casa? Ah, foi bom pra caramba. O teatro lotado e as músicas já tocando na rádio. E a cada show é melhor ainda, porque parece que a gente vai incorporando aquelas músicas, se apropriando do repertório e criando afinidade com a banda. Eu tenho uma banda em Belém e uma banda em São Paulo. Eu pretendo continuar assim esse ano, não parar de fazer show, porque o contato com o público é o mais legal. A gente tem que circular, ganhando dinheiro ou não, disco tem que ser cantado.

Em outras entrevistas você falou da admiração de infância pelo Zeca Baleiro. Como foi essa aproximação de gravar uma música em parceria com ele e fazer uma participação em um show dele (O Baile do Baleiro, em 2013) em Belém? O Zeca tava lá em casa há muito tempo. Desde 2000, a minha mãe comprava todos os discos, acho que ela é mais fã do que eu. Ele é uma grande referência para nossa música, um precursor dessa história de misturar o brega e as próprias músicas tradicionais, ele já olhava para isso há muito tempo. Quando eu estava em São Paulo, preparando meu disco, ele estava gravando um disco infantil, que foi lançado ano passado, no mesmo estúdio e com o mesmo produtor (Guilherme Kastrup). Fui visitar o estúdio e lá estava o Zeca; e eu “aahhh” toda fã (risos). O Zeca já

tinha conhecido as minhas músicas através do Guilherme e ele gostou muito. Ele me chamou para entrar no disco infantil dele e eu fiz lá uma miniparticipação em duas músicas. E em dezembro de 2013, recebi o convite para fazer uma participação no show dele em Belém, o Baile do Baleiro, junto com o Felipe e o Manoel Cordeiro, foi uma noite muito divertida. “Natália Matos” foi bem recebido pela crítica e muito associado, até pela proximidade dos lançamentos e por serem do mesmo selo (Natura Musical), com os trabalhos da Juliana Sinimbú e da Camila Honda. Quais semelhanças e diferenças você enxerga entre o seu trabalho e o delas? Eu acho que a Camila é mais parecida comigo. Ela agrega muitos elementos de outros lu-

gares, faz uma coisa mais moderna, mais pop na música dela, mas em comum acho que a gente tem esse suingue paraense, o calor da nossa terra que está expresso nas músicas que a gente escolhe, na forma que a gente canta. A Juliana já é uma veterana, tem anos de carreira, mas é o primeiro disco dela. Assim como eu e a Camila, nesse sentido a gente está num caminho parecido, e isso é muito bacana, ver que, apesar das diferenças, a gente está na mesma cena, com idades similares, parceiros próximos, nós conseguimos fazer coisas diferentes e dialogar. O fato de eu estar aparecendo na Natura, ao lado de mais dois trabalhos de cantoras daqui, é muito legal, porque mostra que não é uma só, mostra que existe muita coisa rolando, trabalhos diferentes acontecendo. Não são trabalhos que se repetem, eles têm peculiaridades.

respirando urbanidade

Natália acredita que os oito anos que passou em São Paulo lhe deram uma visão de mundo essencial para a carreira. Hoje, está de volta à cena urbano-amazônica de Belém.

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ARTE PESQUISADA projeto letras que flutuam / DIVULGAÇÂO

PINTURA SOBRE AS ÁGUAS

Ofício dos abridores de letras faz parte da cultura das comunidades que moram no entorno dos rios

Letras que flutuam nos rios TEXTO Natália Mello

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Projeto joga luz sobre o ofício dos abridores de letras em embarcações, uma profissão bem tradicional na região amazônica

O

universo do imaginário ribeirinho se abre a cada letra desenhada nos barcos que navegam pelas águas dos rios amazônicos. Cores e referências ganham formas rústicas e tradicionais, e remontam a um tempo ainda não inteiramente identificado, mas que revela a identidade cultural marcante de um povo e transpõe a riqueza histórica da região através das tábuas das embarcações. Embora esses traços sejam levados pela correnteza dos rios de porto a porto, essa atividade parece estar adormecendo ao longo dos anos. Foi pensando em um novo despertar para esse ofício que a designer paulista Fernanda Martins iniciou o projeto “Letras que Flutuam”, resultado de alguns anos de trabalho e estudo, transformados em um artigo científico sobre a letra decorativa nas embarcações amazônicas. Ao chegar no Pará, depois de um curso na Suíça, ela se encantou com a arte dos chamados “abridores de letra”. Segundo Fernanda, essa prática está bastante atrelada ao rio Amazonas, entretanto, a influência artesanal vai perdendo força ao sair da região. Sâmia Batista também é designer e trabalha em parceria com Fernanda Martins. Juntas, elas decidiram se


CRIATIVIDADE

O aprendizado dos abridores de letras costumava ser bastante informal. O interesse pela arte, em geral, surge ainda na infância, ao observar os barcos nos estaleiros. O projeto almeja alçar voos mais altos: montar uma árvore genealógica, mostrando o profissional que passou a atividade para o filho ou para o sobrinho ou para o filho do amigo. “A maioria aprendeu com o pai, o

tio. O que é interessante é que o rio é uma rede em que eles se conectam”, define Sâmia Batista. Existem alguns tipos de letra e algumas técnicas para fazer os desenhos. A letra vitoriana é decorativa, e seria característica do início da publicidade da explosão comercial do século XX. “Sofremos influência na época da borracha, dos cartazes que vinham da Europa. A teoria é que essa referência tenha vindo de outras embarcações, dos Estados Unidos, por exemplo, naqueles barcos que têm uma charanga atrás, vieram para cá e começaram a influenciar os abridores”, diz a designer. Com o desenvolver da pesquisa, as imagens registradas e todo o material visual coletado se transformou em um documentário, que foi apresentado na Mostra “Cidade Gráfica” do Itaú Cultural, em São Paulo. O projeto “Letras que Flutuam” tem ainda outro objetivo futuro, criar um registro do ofício dos abridores. A intenção é divulgar a atividade em outros países, especialmente os que valorizam as artes visuais, e também desenvolver uma rede de contatos que garanta a renda desses trabalhadores. “Pelo sucesso, as pessoas estão fazendo pedidos com as letras. O artesão ainda não quer estar na comercialização, e é aí que a gente entra. A nossa empresa media essa relação. É um problema de identidade, de saber enxergar o que te representa e dizer para o turista que ele está levando um pedaço daqui com esse trabalho”, diz Sâmia. “Artistas anônimos começaram a aparecer e o ofício começar a ser contratado. Temos um exemplo de um rapaz de Igarapé-Miri, mas que mora em Belém há 20 anos. Aprendeu com um amigo aos 14 anos e hoje é ele quem ministra as oficinas. Ele já até recebeu encomenda para tatuar com esse tipo de letra o nome da filha de uma cliente. Isso valoriza a arte deles”, conclui.

fotos: projeto letras que flutuam / DIVULGAÇÂO

debruçar sobre essa história e mapear o trabalho realizado por esses pintores de barcos na região nordeste do Estado. “Começou com uma pesquisa e, quando abriu o edital Amazônia Cultural, do Ministério da Cultura, pensamos, por que não inscrever? A pesquisa começou com fotografias e mapeamento dessa atividade. Aí surgiu a ideia de mapear os próprios abridores de letra, onde e como eles atuam”. Os artistas têm as mais variadas origens. Alguns receberam o dom do ofício ao nascer, impresso no tipo sanguíneo. Foi a forma com a vida encontrou de repassar a tradição de pai para filho, de avô para neto. Muitas famílias se sustentam do trabalho dos abridores, que além de pintar as letras nos barcos, pintam casas, desenham fachadas, tanto no interior quanto nas sedes dos municípios. Mas também há quem exerça a atividade já na área urbana. “Em Igarapé-Miri, um dos locais que mapeamos, a atividade é muito forte. Alguns deles viajam e atendem toda a região ribeirinha. Têm jovens que estão começando. Montamos locais de pesquisas para fazer oficinas para que essa tradição fosse repassada para os jovens de cada comunidade que mapeamos. Temos o Rubens, por exemplo, de Igarapé-Miri, que desenha fachada e tem uma empresa de comunicação visual, e vive disso. Mapeamos também a atividade em Belém, Abaetetuba e Barcarena, mas a intenção é que o projeto avance para o Marajó, Santarém e região do Salgado”, explica Sâmia.

aprendizagem

Projeto Letras que Flutuam oferece oficinas sobre a arte de pintar letreiros nas embarcações

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MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS

a menina que veio da literatura TEXTO abílio dantas ilustrações jocelyn alencar

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Lindanor Celina 1917-2003


O

material do qual os artistas da palavra dispõem para criar uma obra, seja ela em versos ou em parágrafos, podem surgir dos mais diferentes caminhos. Pequenas observações cotidianas ou um simples diálogo, por exemplo, são capazes de desencadear narrativas inteiras. A memória é outra grande fonte de processos criativos e foi a partir dela, e da capacidade inventiva da autora, que os livros da escritora paraense Lindanor Celina foram concebidos ao longo dos anos. Autora de crônicas, peças de teatro, poemas e romances, Lindanor Celina Coelho Casha, nascida em 21 de outubro de 1917 no município de Castanhal e criada na cidade de Bragança, ambas no nordeste paraense, é lembrada principalmente pela criação da personagem Irene e pela sua saga relatada nos livros “Menina que vem de Itaiara”, de 1963, “Estradas do Tempo-foi”, de 1971, e “Eram Seis Assinalados”, de 1994. Para muitos, é indissociável a relação entre criatura e criadora. Irene e Lindanor. O professor, jornalista e escritor João Carlos Pereira, organizador do livro “Lindanor, a Menina que veio de Itaiara”, junto com as professoras Amarílis Tupiassú e Madeleine Bedran, afirma que escritora e personagem compartilham vivências muito semelhantes. “Eu acho que a Lindanor era a própria Irene porque as histórias de vida são bem parecidas”, acredita o professor. Tal como Lindanor, Irene cresceu em uma cidade com poucos habitantes, onde todos se conheciam, cortada por uma linha de trem e a devoção a São Benedito era uma das marcas do lugar. A Bragança de Irene chama-se Itaiara. Além do traço autobiográfico, João Carlos Pereira destaca a linguagem utilizada por Lindanor Celina em seus romances. “Como disse o professor Francisco Paulo do Nas-

cimento Mendes, a Lindanor escrevia com sedutora intimidade. Quase que contando um segredo. Era como se ela estivesse na rede comigo, contando aquilo perto”, relata ao lembrar de suas primeiras leituras. Para o professor, a oralidade utilizada na escrita e o domínio das técnicas do lirismo tornam o texto da escritora ao mesmo tempo agradável e de alto teor literário. João Carlos Pereira reconhece ainda a importância do romancista Dalcídio Jurandir para o desenvolvimento artístico de Lindanor. “Todos os prosadores paraenses do século XX foram beber nos campos do Dalcídio Jurandir”, afirma. Segundo ele, Lindanor e o escritor marajoara possuíam uma grande amizade, a ponto de Dalcídio sugerir cortes no texto da autora. Em 1985, Lindanor homenageou o amigo com a criação do livro memorialístico “Pranto para Dalcídio Jurandir”, em que narra momentos de vida compartilhados com o autor. Lindanor Celina trabalhou em Belém como cronista e como funcionária do Tribunal Regional do Trabalho. Anos mais tarde, mudou-se para França. Lá, tornou-se professora de cultura e literatura brasileira na Universidade de Lille III e funcionária do governo francês. Durante as décadas em que viveu na França, cultivou amizades importantes como a da escritora Simone de Beauvoir. Falecida em 2003, a obra e vida de Lindanor Celina foram lembradas em 2012 pelo espetáculo teatral “Lindanor nas Estradas do Tempo-foi”, dirigido por Luciana Porto e Denis Bezerra. São também de autoria da escritora os livros “Símbolo”, de 1956, “Contracanto”, de 1960, “Breve Sempre”, de 1973, “Para além dos Anjos”, de 1975, “Afonso Contínuo, Santo de Altar”, de 1986, “A viajante e seus Espantos”, de 1988 e “Diário da Ilha”, de 1992.

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AGENDA tarso sarraf / arquivo o liberal

PRÊMIO 1 Seguem abertas até o dia 13 de fevereiro, as inscrições para o Prêmio Nacional da Biodiversidade. Instituída pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), a premiação reconhecerá ações e projetos que se destacaram pela conservação das espécies da fauna e da flora brasileira. As inscrições serão realizadas somente por meio do preenchimento de formulário on-line, pelo endereço pnb.ana.gov. br, com anexação de documentos. Em cada categoria, os três melhores trabalhos serão classificados como finalistas. O vencedor receberá o Troféu Prêmio Nacional de Biodiversidade e os segundos e terceiros colocados levarão o certificado de finalista do concurso. As iniciativas finalistas também concorrerão ao prêmio Júri Popular, que será eleito por meio de votação eletrônica no site do MMA.

PRÊMIO 2 As inscrições para o Prêmio Mercosul de Ciência e Tecnologia segue com inscrições abertas até o dia 23 de fevereiro. Podem se inscrever estudantes e pesquisadores nacionais ou resi-

encontro mundial

dentes nos países membros ou associados ao

CIDADES sustentáveis da amazônia

Mercosul. O tema escolhido é “Popularização da Ciência”. O edital está disponível no site

Nos dias 7 e 8 de abril, o Programa Cidades Sustentáveis realizará a I Conferência Internacional Cidades Sus-

www.premiomercosul.cnpq.br.

tentáveis – Políticas Públicas Inovadoras. Marcado para o Centro de Convenções Ulisses Guimarães, em Brasília, o evento ocorrerá junto com o III Encontro dos Municípios com o Desenvolvimento Sustentável. Belém e

LÍNGUAS

Paragominas são alguns dos municípios paraenses que terão representantes que apresentarão experiências

De 25 a 28 de fevereiro será realizado, em

concretas e de excelência de gestão pública sustentável em diversas áreas como saúde, educação, mobili-

Belém, o IX Congresso Internacional da As-

dade, segurança, resíduos e governança. As experiências bem-sucedidas, que podem servir como referên-

sociação Brasileira de Linguística (ABRALIN).

cias para o planejamento e a gestão das administrações municipais, integram o Banco de Boas Práticas do

A programação do evento incluirá conferên-

Programa Cidades Sustentáveis. O público alvo da conferência serão gestores públicos, lideranças sociais e

cias e mesas-redondas com pesquisadores

empresariais, pesquisadores, acadêmicos e jornalistas. Os interessados em mais informações sobre o evento

ligados a diversas áreas e vertentes teóricas

podem acessar o site www.cidadessustentaveis.org.br

do estudo da linguagem. Para mais informa-

“Sou livre para o silêncio das formas e das cores”. A frase do poeta Manoel de Barros traduz a Belém imaginada pela fotógrafa Walda Marques, que homenageia a capital paraense com a exposição “A Cidade em Silêncio”, com imagens inéditas que registram seu olhar sobre Belém. Com ou sem personagens, as fotografias retratam detalhes como santos, pinturas, azulejos, pontos históricos e a periferia da capital paraense. Esses recortes, aliados a programas de edição, estão impressos em mais de 20 imagens que compõem a mostra. A visitação é aberta das 10h às 22h, no Armazém 2, na Estação das Docas. Entrada franca. Mais informações pelo telefone (91) 3212-5525.

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everaldo nascimento / arquivo o liberal

WALDA

ções sobre a programação só acessar o site abralin.org.

fotoativa A Associação Fotoativa recebe até 8 de março inscrições para o projeto “Fotoativa em Residência - Dois de lá, Dois de cá”, que vai selecionar quatro artistas (dois paraenses e dois de outros estados do país) para realizar uma imersão criativa em Belém. Como resultado, serão promovidas atividades para a participação do público. Informações: www. fotoativa.org.br.


Faça VocÊ meSmo

FICHEIRO MUSICAL DE sucata Da família do chocalho, aparentado com o reco-reco e vizinho do rebolo, o ficheiro é um instrumento musical produzido com sucatas. Entre seus primos, também da família do chocalho, estão as maracas, o ganzá, o caxixi, o xique-xique, o naná e qualquer outro que baste o agitamento ritmado para iniciar a festa. Nas mãos de um bebê é brinquedo, nas de um leigo é barulho. Porém, en-

tre os dedos do especialista, do “bamba das rodas”, ele é o elixir da festança popular brasileira. Esses chocalhos podem ser confeccionados de forma artesanal, com latas, pedras ou continhas, como é o caso do ficheiro, que, nesta edição, é apresentado pela revista Amazônia Viva e Oficinas Curro Velho. O instrumento foi idealizado por instrumentalistas que reutilizam sucata para fazer música.

0 a nos Chaves, 1 e m r e h il Gu

dO qUE VAmOS PRECISAR?

• • • • • • • •

Pedaço de madeira de 42 cm x 5 cm Chave de fenda 50 tampinhas de garrafas Fita isolante Martelo Alicate 40 pregos de 1.1/2 x 15 (um e meio por quinze) 1 prego de 2.1/2 x 12 (dois e meio por doze)

INsTRUTOR FláVio Gama COlAbORAÇãO deusarina Vasconcelos fOTOGRAfIAs ionaldo rodriGues

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aTENçÃO: essa atividade deve ser feita por um adulto responsável

1 4 7

Reúna as tampinhas de garrafas e as abra com alicate;

Um desafio: utilize o prego de 2.1/2 x 12 para fazer um furo no meio de cada tampinha;

Vire o ficheiro para o lado oposto e complete com as mesmas casas na direção do intervalo das casas do lado oposto;

2

Agora, pegue o martelo e bata as tampinhas para que fiquem com a estrutura plana;

3

5

Depois disso, pegue quatro tampinhas e coloque no prego de 1.1/2 x 15 para formar uma “casa” (tampinha e o prego) do ficheiro;

6

8

Para o acabamento, coloque fita isolante nas pontas do ficheiro;

9

Com a chave de fenda, retire o plástico de dentro da tampinha;

Pegue o pedaço de madeira e faça um espaço de 5 cm nas pontas. Coloque a primeira casa e, assim, até completar as casas distanciando 2 cm uma da outra;

O instrumento está pronto: xiquexique, reco-reco. É carnaval!

PARA SAbER mAIS Quem quiser conhecer mais sobre técnicas artísticas pode se inscrever nas oficinas Curro Velho, da Fundação Cultural do Pará. Crianças a partir de 12 anos podem participar. O Curro Velho fica localizado na rua Professor nelson Ribeiro, nº 287, esquina com a travessa Djalma Dutra, bairro do Telégrafo. Telefones: (91) 3184-9100 e 3184-9109. 64 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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recorte aQui

Faça VocÊ meSmo


BOA HISTÓRIA

leonardo nunes

O imperador A música soou longe.

O mesmo trompete de sempre. O bumbo, o tarol acelerado igual a todos os anos. Gritinhos ainda fracos, meio sem graça. O mundo estava aquoso e havia pássaros de asa molhada voando de cabeça para baixo, enquanto ele atravessava um cipoal estreito com uma cambada de peixes gordos reluzentes de olhos vivos e sorriso pacífico. O balanço da rede e a brisa faziam parecer um sonho bom quando o batuque o despertou de vez. Correu até o quarto de dormir. Estava um lixo. Roupas espalhadas por todos os lados. As pernasmancas das paredes feitas de prateleira, cheias de copo. Sandálias e sapatos sem par aos montes. Peças de bicicletas. Caixas de papelão com revistas da década de 90, jornais passados, livros manchados. Garrafas vazias e até panelas e cuias. No assoalho faltavam tábuas e muita coisa poderia ter escorregado para sempre pelos buracos. Ainda atarantado pelo sono, rogou a Deus, mas a ajuda veio da mãe. Até ouvir tudo que já ouvira sobre ser organizado e mais ativo e me-

nos preguiçoso e etc, etc e etc. Ela encontrou: estava atrás de um velho armário. Cheia de fungos e mofo e uns quantos tachis. Quando ele vestiu, sentiu a coceira lhe corroer. Tirou e pulou no poço numa pressa de fugitivo de incêndio. Saiu ensopado, mas aliviado. Encontrou a mãe sacudindo o traje e jogando um pó que afirmou ser infalível para expulsar os bichinhos e restabelecer o conforto. Temeroso de novo ataque, ele atentou, cheirou e só então, quase refeito da sova que levou dos minúsculos inimigos, aprontou-se. Ao olhar-se no espelho deu por falta da peça principal. Estava prestes a iniciar outra empreitada descabida no caos do dormitório quando a mulher, de novo, tomou à frente. Foi difícil até para ela, tão senhora da casa: revirou armários, baús, olhou detrás da porta, da estante, embaixo da tevê imensa com tubo de imagem, vasculhou os grandes vasos de barro. Revolveu até o monturo de folhas no fundo do quintal. Ligou para filha mais nova e, então, lembrou que o apetrecho poderia estar perdido

para nunca mais, porque foi visto com os netos mais novos numa das brincadeiras de finais de semana que não sabia precisar. A fanfarra estava claramente mais próxima e ele, desolado. Incompleto, sentia-se nu, quase desistindo. Até que a mãe, sempre ela, rememorou o esconderijo: subiu na escada, equilibrando o corpo frágil como podia, e resgatou o tesouro de décadas dentro do forro da sala. Havia enfiado lá para evitar a sanha dos pequenos. O filho enfiou na cabeça e saiu correndo pelo corredor, que agora parecia quilométrico tanta era a ansiedade. A sincronia foi perfeita. Ele pulou por cima do portão no exato momento em que os músicos chegaram defronte à sua casa. Saudaram o gorila ruivo, de todo carnaval, como imperador que era por direito e antiguidade. Depois que ele surgiu o bloco, como fazia todos os anos, a brincadeira ganhou volume, juntou a multidão, que só parou de batucar e cantar na quinta-feira de manhã depois da desistência do homem-macaco que voltou à rede do quintal para sonhar. FEVEREIRO DE 2015

Anderson Araújo

é jornalista, escritor e blogueiro

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NOVOS CAMINHOS

Alimentação orgânica: entraves e possibilidades

THIAGO BARROS

é jornalista, mestre em Planejamento do Desenvolvimento Sustentável (NAEAUFPA) e professor da Universidade da Amazônia @thiagoabarros

Na última década, o Brasil começou a se destacar na produção de alimentos orgânicos, mas, atualmente, oferta e consumo são discrepantes entre as cinco regiões do País. Além disso, 77% das vendas ocorrem nos balcões de supermercados, com preços até 463% maiores em relação aos praticados em feiras orgânicas, de acordo com levantamento do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Para orientar a demanda por alimentos orgânicos - aqueles produzidos com impacto reduzido ao meio ambiente e, sobretudo, sem uso de agrotóxicos -, o Idec também elaborou um mapa das feiras orgânicas no Brasil. Na primeira etapa, foram descobertas 140 feiras, distribuídas em 22 capitais, sendo que somente seis delas estão na região amazônica - a maior parte está concentrada nas regiões Sul e Sudeste. Feiras quinzenais ou semanais são organizadas em praças ou centros de distribuição das capitais do Pará, Amazonas, Roraima, Amapá, Acre e Rondônia. Os comerciantes - geralmente os próprios produtores - oferecem frutas, legumes e hortaliças orgânicos a baixo custo, mas não dão conta da demanda, que acaba direcionada a redes de varejo. Em Belém, as praças Brasil e Batista Campos acolhem a iniciativa em sábados alternados. Segundo o Idec, um pé de alface americana que custa R$ 0,70 numa feira orgânica pode ser vendido por até R$ 3,94 em supermercados - com o preço turbinado por custos com atravessadores, acondicionamento e até a “marca” do estabelecimento. A realidade é uma contradição, já

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que as características da Amazônia oferecem soluções para a redução do uso de agrotóxicos no Brasil, responsável por 19% do consumo mundial de produtos químicos destinados à proteção de plantações contra pragas. Dos 300 milhões de hectares de toda a atividade agropecuária brasileira, somente 1,5 milhão de hectares são destinados ao cultivo de produtos orgânicos, aponta o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O crescimento da produção de alimentos orgânicos é um desafio para o Brasil, apesar do desenvolvimento do setor no eixo Sul-Sudeste. A grande questão é a certificação e o selo de garantia, exigidos dos produtores desde 2011 - e que demandam altos custos e capacitação técnica. Dados da Comissão da Produção Orgânica do Pará (CPOrg-PA) mostram que a região Norte responde por somente 2,6% da venda de orgânicos no País. Apesar de a região amazônica produzir alimentos de forma extrativista sustentável, a CPOrg-PA reforça que a certificação só pode ser considerada a partir do uso de fontes de nutrientes naturais em todo o processo de cultivo - um detalhe burocrático que acaba por criar sérios entraves. A maior parte dos orgânicos vendidos no Norte – com destaque para feiras - não é certificada, indica o Censo Agropecuário do IBGE (2006). Mas outras iniciativas mostram o potencial da região: guaraná, castanha e cacau orgânicos são produzidos em larga escala no Pará e Amazonas e já conquistaram o mercado internacional.

O crescimento da produção de alimentos orgânicos é um desafio para o Brasil. A grande questão é a certificação e o selo de garantia, exigidos dos produtores desde 2011.

SAIBA MAIS

Mapa de Feiras Orgânicas do Brasil (www.idec. org.br/feirasorganicas) O Mercado Brasileiro de Produtos Orgânicos. Instituto de Promoção do Desenvolvimento (IPD).


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