Revista Amazônia Viva ed. 45 / maio de 2015

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REVISTA ENCARTADA NO JORNAL O LIBERAL. NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE.

MAIO 2O15 | EDIÇÃO NO 45 ANO 4 | ISSN 2237-2962

CARMO PATRIMÔNIO RENOVADO

A RESTAURAÇÃO DE UMA DAS IGREJAS MAIS ANTIGAS DE BELÉM REVELA DETALHES ARTÍSTICOS E ARQUITETÔNICOS QUE MOSTRAM A HARMONIA ENTRE RELIGIOSIDADE E CULTURA NO MESMO ESPAÇO

REALIZAÇÃO

PATROCÍNIO



'PUP )FSNFT +VOJPS "SRVJWP 7BMF


CARLOS BORgES

da editoria

puBlicação menSal DELTA PUBLICIDADE - Rm GRAPH EDIToRA maio 2015 / edição nº 45 ano 4 iSSn 2237-2962 presidente LUCIDÉA BATISTA mAIoRAnA presidente executivo RomULo mAIoRAnA JR. diretor Jurídico RonALDo mAIoRAnA diretora administrativa RoSÂnGELA mAIoRAnA KzAn diretora comercial RoSEmARY mAIoRAnA diretor industrial JoÃo PoJUCAm DE moRAES FILHo diretor corporativo de Jornalismo WALmIR BoTELHo D’oLIVEIRA

COIsA lINDA

A Igreja do Carmo, após dois anos de obras de restauração, é reaberta para a visitação pública, enaltecendo o espírito e o conhecimento de quem a adentra

TEMPLO DE PAZ, CULTURA E HISTÓRIA

FELIPE JORGE DE MELO Editor-chefe 4 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

diretor de novos negócios RIBAmAR GomES diretor de marketing GUARAnY JÚnIoR diretores JoSÉ EDSon SALAmE JoSÉ LUIz SÁ PEREIRA conselho editorial RonALDo mAIoRAnA JoÃo PoJUCAm DE moRAES FILHo WALmIR BoTELHo D’oLIVEIRA GUARAnY JÚnIoR LÁzARo moRAES REDAÇÃo Jornalista responsável e editor-chefe FELIPE JoRGE DE mELo (Srte-pa 1769) coordenação geral LUCIAnA SARmAnHo editor de arte FILIPE ALVES SAnCHES (Srte-pa 2196) pesquisador e consultor técnico InoCÊnCIo GoRAYEB

Lembro-me de ter entrado pela

E, após o impecável trabalho de

primeira vez na Igreja do Carmo,

restauração por qual o templo pas-

ainda como repórter iniciante, no

sou nesses últimos dois anos, toda

ano 2000, para cobrir um evento

aquela singularidade artística que

católico da Semana Santa. Para

ficou impressa em mim ganhou ain-

não perder o início da celebração,

da mais valor. E, acredito que não

cheguei com quase uma hora de

é só uma satisfação pessoal, mas

antecedência e me sentei em um

para toda a sociedade que se orgu-

Colaboraram para esta edição o liberal, Vale, agência pará de notícias, agência Brasil, museu paraense emílio goeldi, universidade Federal do pará, universidade do estado do pará, universidade Federal rural da amazônia, Fundação cultural do pará - oficinas do curro Velho (acervo); camila machado, Fabrício Queiroz, Victor Furtado, anderson araújo, moisés Sarraf, abílio dantas, Brenda pantoja, Bruno rocha, Sávio oliveira, Vito gemaque, rosana medeiros, arnon miranda (reportagem); moisés Sarraf, Fabrício Queiroz, Bruno rocha (produção); hely pamplona, carlos Borges, tarso Sarraf, roberta Brandão (fotos); inocêncio gorayeb (artigo) andré abreu, leonardo nunes, Jocelyn alencar, Sávio oliveira, márcio euclides (ilustrações); alexsandro Santos (tratamento de imagem).

dos bancos esperando a liturgia co-

lha de ver um patrimônio histórico

FoTo DA CAPA igreja do carmo, por carlos Borges

meçar. Para matar o tempo, fiquei

recuperado, livre das ações danosas

admirando os detalhes artísticos e

do tempo. Em um local onde reli-

arquitetônicos do templo, até então

giosidade e cultura se encontram,

AmAzônIA VIVA é editada por delta publicidade/ rm graph ltda. cnpJ (mF) 03.547.690/0001-91. nire: 15.2.007.1152-3 inscrição estadual: 158.028-9. avenida romulo maiorana, 2473, marco - Belém - pará.

a “coisa mais linda que eu já tinha

oferecendo para quem o visita mo-

amazoniaviva@orm.com.br

visto em toda a minha vida”.

mentos de paz e verdadeiras aulas

De lá para cá, obviamente, ou-

da história sobre os primeiros anos

tras “coisas lindas” surgiram e de-

da fundação de Belém, nos senti-

sapareceram em minha caminhada

mos presenteados com uma igreja

nesta terra, mas o Carmo continua

renovada, cheia de vitalidade e que

despertando esse sentimento puro

nos desperta a admiração que só as

sempre que me aparece em uma re-

coisas lindas sacramentam no mais

portagem ou roda de conversa.

íntimo de nossas lembranças.

MAIO DE 2015

produção

realiZação

patrocÍnio

reViSta impreSSa com o papel certiFicado pelo FSc - ForeSt SteWardShip council


MAIO 2O15

neSta edição

EDIÇÃo nº 45 / ANO 4

CARLOS BORgES

PATRIMÔNIO RESTAURADO

38

Uma das edificações mais antigas de Belém, a Igreja do Carmo, na Cidade Velha, ficou ainda mais bonita após intenso trabalho de reforma ASSuNTO DO MÊS

16 36 AMAZÔNIDA

MASCARADOS

A ativista cultural Tainá

Por meio de apresen-

CONSTRUçÃO

Marajoara já participou de

NÔMADE

tações teatrais, a Trupe

O engenheiro civil Bernar-

eventos no exterior, como

O cantor e compositor

Perifeéricos leva a plateia

do Moraes Neto desenvol-

da Cúpula Mundial de

paraense Rafael Lima

a um mundo encantado

ve técnicas para diminuir

Cultura e Arte da Organi-

completa 30 anos de

povoado por seres fan-

o impacto na fabricação

zação das Nações Unidas

carreira e lança novo

tásticos. As encenações

de lajes lisas e tornar as

2014, com o objetivo de

disco para celebrar suas

ganham os palcos de

obras que levam concreto

defender a identidade

andanças musicais pelo

Belém, mas também as

mais sustentáveis.

amazônica.

mundo.

ruas da cidade .

QuEM É?

OuTrAS CABEçAS

DEDO DE PrOSA

ArTE PESQuiSADA

DIVULgAÇãO

CARLOS BORgES

ROBERTA BRANDãO

ROBERTA BRANDÃO

58 54

4 6 7 11 13 15 17 17 18 19 19 20 20 21 21 22 24 46 49 49 50 60 62 63 65 66

E MAIS DA EDiTOriA

AS MAiS CurTiDAS PriMEirO FOCO TrÊS QuESTõES AMAZÔNiA CONNECTiON PErGuNTA-SE Eu DiSSE APPliCATiVOS COMO FuNCiONA FATO rEGiSTrADO DEu N’O liBErAl CuriOSiDADES DA BiODiVErSiDADE ElES SE ACHAM DESENHOS NATurAliSTAS CONCEiTOS AMAZÔNiCOS EM NÚMErOS OlHArES NATiVOS COMPOrTAMENTO SuSTENTÁVEl BONS EXEMPlOS MuDANçA DE ATiTuDE ViDA EM COMuNiDADE MEMÓriAS BiOGrÁFiCAS AGENDA FAçA VOCÊ MESMO BOA HiSTÓriA NOVOS CAMiNHOS

MAIO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 5


ASMAISCURTIDAS DESTAQUES DAs EDIÇões ANTERIORes

Inocêncio Gorayeb

POROROCA Bela sequência de fotos na seção Olhares Nativos sobre o surfe na pororoca em São Domingos do Capim. Lembro de minha infância no município há mais de 50 anos e meu pai, que hoje já não está mais entre nós, me levava para ver esse fenômeno da natureza. Ainda não havia surfistas, apenas o temor do rio enfurecido pela Mãe d’água.

a voz que ecoa dos quilombos

A foto feita em 1979 de um quilombola da vila de Curiaú, em Macapá, foi a mais visualizada em nosso Instagram, em abril. Nela, um remanescente de quilombo posa para o pesquisador Inocêncio Gorayeb, sendo um registro vivo da história africana na Amazônia. CARLOS BORGES hely pamplona

Gina Calzavara Belém-Pará

Para se corresponder com a redação da Amazônia Viva envie comentários,

fb.com/amazoniavivarevista

dúvidas, críticas e sugestões para o email amazoniaviva@orm.com.br ou escreva

instagram.com/amazoniavivarevista

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MAIO DE 2015

Roberto Avelar Belém-Pará

BONS EXEMPLOS

A reportagem sobre a Casa Escola da Pesca, que oferece o curso técnico em Recursos Pesqueiros para os jovens da comunidade do rio Maguari, no Outeiro, teve o maior número de curtidas e comentários em nossa página do Facebook na edição passada.

twitter.com/amazviva

Excelente galeria de fotos sobre a pororoca, mais um patrimônio amazônico no Pará e que começa a ser conhecido cada vez mais pelos turistas.

Agradeço pela matéria publicada na edição passada sobre o Espaço ITEC Cidadão (“Espaço para se sentir bem”, Bons Exemplos, abril de 2015, edição nº 44). Também é uma proposta que homenageia os profissionais que nomeiam os bosques Benito Calzavara (que tive a honra de tê-lo como pai) e Camilo Viana, que como médico e ambientalista, é uma pessoa singular. Belos exemplos de pessoas e profissionais. Portanto me sinto orgulhosa que nosso trabalho tenha sido registrado por vocês como bons exemplos. Focar apenas nas dificuldades é perda de tempo, devemos marcar nossa presença junto a sociedade com boas práticas, principalmente se estamos numa Universidade, bem como sair do discurso sustentável para práticas sustentáveis. Obrigada pela atenção.

JOVENS PESCADORES DO DISTRITO DE OUTEIRO

Siga a Amazônia Viva nas redes sociais e compartihe a edição digital, DISPONÍVEL gratuitamente no issuu.com/amazoniaviva

Paulo Coriolano Ananindeua-Pará

para o endereço: Avenida Romulo USE um leitor de QR Code para acessar A EDIÇão digital de abril

Maiorana, 2473, Marco, Belém - Pará, CEP 66 093-000 ou FAX: 3216-1143.


O QUE é NOTÍCIA PARA A AmAzÔNIA ASCOM / UEPA

PRImEIRofOCO

TECNOLOGIA A FAVOR DA VIDA LABORATÓRIO DE PESqUISA EM APOIO DIAGNÓSTICO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ REALIZA TESTE DO SUOR EM RECéM-NASCIDOS PARA DETECTAR A FIBROSE CÍSTICA

PÁGInA 8

ACERVo Herbário Profª Drª Marlene Freitas da Silva

PRoTEÇÃo Instituto Piagaçu monitora a

InoVAÇÃo Estudante de Abaetetuba criou

coloca à disposição das comunidades estudantil e científica vasta coleção da flora amazônica. PÁG.11

frequência com que exemplares do mutumpiuri são ameaçados na Amazônia. PÁG.14

projeto sustentável que transforma a bucha do miriti em ração para animais. PÁG.15

MAIO DE 2015

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primeiro Foco

EXAME AJUDA NO TRATAMENTO

O

diagnóstico precoce da fibrose cística, logo nos primeiros dias de vida do bebê, é muito importante para o tratamento, uma vez que a doença é incurável. Atualmente, ela atinge cerca de 1.250 pessoas no Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde. O Teste do Suor, realizado em recém-nascidos, é um exame específico para identificar esses casos e foi implantado recentemente no Laboratório de Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Lapad) da Universidade do Estado do Pará (Uepa). Na rede pública paraense, o Lapad é o único a realizar o exame. A disfunção promove o bloqueio dos canais dos brônquios, dificulta a respiração, causa tosse crônica e pneumonia, entre outras complicações. A técnica do Teste do Suor consiste em aplicar um gel e eletrodos no bebê, enquanto um equipamento o estimula a suar. O exame é rápido e indolor. O objetivo é do-

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MAIO DE 2015

sar a quantidade de cloro no suor. ‘’Esse é um salto imenso no diagnóstico da doença de forma precoce. É um instrumento valioso para tentar amenizar o problema na criança’’, destaca o professor José Marcelo Magalhães, coordenador do Lapad. O procedimento só é feito quando os bebês apresentam alterações no Teste do Pezinho, mas por causa da baixa demanda de pacientes com suspeita da doença, os exames são realizados todas as últimas quintas-feiras de todo mês, no Lapad, localizado no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), na travessa Perebebuí, em Belém. O resultado sai em cinco dias e, caso seja positivo, a família é logo informada. O Ambulatório do Serviço de Referência em Triagem Neonatal (SRTN), no Centro Saúde Escola da Uepa, dispõe de médicos especializados para o tratamento da doença totalmente gratuito. O Teste do Suor faz parte da fase 3 do Teste do Pezi-

nho e o Laboratório se prepara para implantar a realização da fase 4. Nesta etapa, será incluído o tratamento e o acompanhamento da Hiperplasia Adrenal Congênita, doença genética, caracterizada pela baixa produção dos hormônios cortisol e aldosterona, e aumento da produção de hormônios masculinos, os androgênicos. Mais de 600 postos de saúde em todo o Estado coletam amostras de sangue e encaminham ao Lapad, que faz mais de 10 mil testes todo mês. Antes, devido à distância, as coletas chegavam à capital em até 29 dias. Desde o ano passado, as amostras passaram a chegar pelo serviço de entrega rápida Sedex, dos Correios, e a velocidade otimizou a triagem. A previsão do coordenador do Laboratório é que, ainda neste mês, a Universidade coloque no ar um site para que as unidades de saúde possam conferir, diretamente dos municípios, os resultados dos testes totalmente on-line.

ASCOM / UEPA

DIAGNÓsTICO

Na rede pública de saúde do Estado, o Lapad é o único a realizar o Teste do Suor

10

mil

TEsTEs mENsAIs

são realizados pelo Lapad para detectar variados tipos de doenças no Estado


eliseu dias / agência Pará

PLANEJAMENTO

RESÍDUOS SÓLIDOS

Para auxiliar os municípios do interior na elaboração dos “planos municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos”, a Secretaria de Desenvolvimento urbano e obras públicas (Sedop) reuniu técnicos e secretários de 15 prefeituras do nordeste paraense e do marajó em uma oficina de treinamento. A meta é que, até o final do semestre, 30 cidades já tenham elaborado seus planos. “Estamos sendo pressionados a fechar os lixões a céu aberto, mas para que isso aconteça as prefeituras precisam estar preparadas. o nosso plano começou a ser

VALE FESTEJA OS 102 ANOS DE MARABÁ A cidade de Marabá, no sudeste paraense, completou 102 anos de fundação em 5 de abril e a Vale apoiou a programação oficial das comemorações, realizada pela prefeitura do município. Foram realizados shows de vários estilos musicais. No local das apresentações, foi montado o espaço Vale Conhecer, aberto ao público, onde os visitantes conheceram obras de artistas locais e um pouco da história da empresa, que completa, em 2015, 30 anos de atuação no Pará. A Vale está presente na cidade por meio da Estrada de Ferro Carajás (EFC) e do Salobo, unidade de cobre da empre-

sa no Brasil. A capacidade anual da ferrovia supera a marca dos 110 milhões de toneladas e passa por 27 municípios e localidades entre o Pará e o Maranhão. Além de minérios e cargas, o trem transporte diariamente 1.300 pessoas. Além disso, mais de R$ 52 milhões estão sendo investidos por meio de convênios com a prefeitura de Marabá, em obras nas áreas de saúde, educação, cultura e infraestrutura. Grande parte das ações deve ser inaugurada ainda este ano. A empresa também mantém na região a Estação Conhecimento, que já conta com 1.300 atendidos.

potencial

Marabá é um dos municípios paraenses de maior destaque na economia do Estado

feito em 2013”, afirmou Carlos Vaz, viceprefeito de São Miguel do Guamá. O plano detalha ações e metas que incluem a coleta convencional e seletiva, centro de triagem e educação ambiental, além de colaborar na captação de recursos federais para aplicar em ações de saneamento nos municípios.

PESQUISA

GRAFENO

O grafeno é um dos compostos que pode revolucionar a ciência e a tecnologia nos próximos anos e pesquisadores paraenses integraram o time que fez uma importante descoberta sobre ele.

5

de abril

foi a data do 102º ani-

versário de uma das cidades mais importantes do Estado do Pará

A pesquisa descreveu completamente o papel da interação eletromagnética existente entre os elétrons-p do grafeno (que são as partículas carregadas) e o fóton, a partícula intermediadora na interação eletromagnética entre os elétrons. “Esse é um trabalho pioneiro porque ninguém conseguiu obter e usar um

andré abreu

DESCOBERTOS LAGARTOS-ANÕES

modelo para o grafeno já que toda interação eletromagnética era descartada. Fatalmen-

Três novas espécies de lagartos-anões e com a forma de dragão, que per-

te, com estas conclusões criamos uma nova

tencem ao gênero Enyalioides, foram descobertos. Os animais vivem em

linha na física ‘valleytrônica’”, destaca o

selvas tropicais, como Chocó, na Colômbia, ou a parte ocidental da bacia

professor Van Sérgio Alves, do programa de

amazônica, e nas florestas nubladas dos Andes equatorianos e peruanos.

pós-Graduação em Física da Universidade

Segundo os cientistas, eles estão “entre os de maior tamanho e mais colo-

Federal do Pará e um dos autores do estudo.

ridos” nas selvas da América do Sul.

FOTOS: SEDOP / AGÊncia PARá / everaldo nascimento / arquivo o liberal MAIO DE 2015

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aGÊNcia

ILUSTRAÇÕES: MÁRCIO EUCLIDES

primeiro Foco

ALTER DO CHÃO

NOVA SEDE

Bananeiras são usadas na construção de fossas

A Agência de Desenvolvimento Econômico e Social de Canaã dos Carajás, no sudeste paraense, inaugurou uma nova sede. O local funciona como uma fomentadora de negócios e é formada por quatro segmentos:

O conselho comunitário e as orga-

sas em Alter do Chão. “A fossa do ba-

poder público, iniciativa privada, sociedade

nizações civis de Alter do Chão, no

nheiro público está lotada e precisa de

civil organizada e terceiro setor. A Fundação

município de Santarém, oeste do Pará,

reformas, então criamos esse projeto e

Vale investiu na construção do prédio, que

se uniram para apresentar ao poder

entregamos nas mãos dos secretários

agora conta com auditório para 60 pessoas e

público um projeto diferente de fos-

de Infraestrutura e Meio Ambiente,

será a base de uma incubadora de negócios

sas ecológicas a ser utilizado em ba-

além do Ministério Público. Temos pes-

sociais. A ideia é incentivar o surgimento

nheiros públicos. Chamado de “fossa

soas qualificadas para fazer esses sis-

de empreendimentos sociais, facilitando o

de bananeiras”, o equipamento seria

temas e queremos que o poder público

acesso dos negócios às inovações tecnológicas

uma solução para conter a presença

seja nosso parceiro nessa iniciativa que

gerenciais. Uma das iniciativas que será

de coliformes fecais nas águas da vila

surgiu da comunidade”, espera.

desenvolvida na Agência é o programa AgIR,

balneária, combatendo os casos de

da Fundação Vale, cujo foco é a prospecção

hepatite A no local.

e fomento de negócios sociais, por meio de

O sistema de fossas utilizando tanques de vapotranspiração surgiu

Segundo Índio Brasil, um dos orga-

nos Estados Unidos e já é utilizado

capacitações, assessorias, investimento e

nizadores do projeto, as fossas já são

em vários locais do Brasil e em ou-

acompanhamento dos empreendedores.

uma realidade em pelo menos sete ca-

tros países.

DIVULgAÇãO / VALE

SOLUçÃO ECOLÓGICA

Entenda como funciona a fossa de bananeiras

1

Em frente aos banheiros públicos de Alter do Chão, tanques de vapotranspiração (TEvap) são instalados em um canteiro e lacrado pelos quatro lados (paredes e fundos).

5

As bananeiras sugam o líquido que, em seguida, evapora pelas folhas.

Suspiro (2 m acima do solo)

2

Um tubo em forma de pirâmide feito de tijolos furados é inserido no tanque.

3 iDeNTiFicaÇÃO

TARTARUGAS

Antes da soltura de filhotes de tartaruga, pesquisadores do projeto Pé de Pincha, no Pará, usam um método de coleta hormonal para identificar o sexo dos animais, sem a necessidade do abate. A nova tecnologia foi criada no México e está sendo usado ainda em fase preliminar na Amazônia. Quando bem novos, os quelônios possuem dismorfismo sexual, ou seja, todos têm a mesma aparência. Os testes já chegam a 95% de confirmação.

Bananeiras são plantadas em cima dessas estruturas, sobre camadas de materiais porosos e até cascas de coco, que servirão como base para raízes de outras plantas. Uma camada de 20 cm de terra preta também é aplicada.

4

Dessa forma, a descarga dos banheiros despeja a água suja dentro do tubo vedado, entrando por um suspiro colocado a 2m do solo.

Bananeira

Manilha

Camada âncora

Camada de terra

Camada porosa Parede de tijolos (1 m)

Contra piso (1,5 m)

Pirâmide de tijolos furados

FONTE: G1 SANTARÉM

10 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

MAIO DE 2015


MACIO FERREIRA / uepa

TRÊSQUESTÕES

LITERATURA INFANTIL COM jeito AMAZÔNICO Nazaré de Mello é gestora educacional, professora e escritora infantil. Com 11 obras lançadas, ela se inspira em lendas amazônicas para construir suas histórias que seguem a linha do terror e suspense. Nazaré ocupa a cadeira 16 da Academia Paraense de conhecer melhor a cultura e costumes amazônicos.

HERBÁRIO DISPÕE DE ACERVO VIRTUAL Mais de cinco mil espécies de frutos, sementes e flores, entre outras amostras, da região amazônica podem ser encontradas no Herbário Profª Drª Marlene Freitas da Silva (MFS) da Universidade do Estado do Pará (Uepa). Agora, as pesquisas estão disponíveis em um portal que pode ser acessado por estudantes, professores e profissionais no endereço paginas.uepa. br/herbariomfs. O sistema utilizado permite a catalogação de dados provenientes de cadernetas de campo, registros de imagens, coordenadas geográficas e realização de empréstimos e doações de

amostras botânicas. “O portal surgiu da necessidade de popularizar os bancos de dados e as atividades de ensino, pesquisa e extensão do Herbário MFS. O herbário buscou sair do seu espaço físico e navegar virtualmente para que academia e sociedade pudessem ter acesso às informações diversificadas”, explica a coordenadora e curadora do espaço, professora Flávia Araújo. O site também disponibiliza publicações das obras feitas pelo Herbário e por outras instituições parceiras, orientações para coleta de plantas no campo, além de apresentação de coleções temáticas.

CONSULTA

Informações sobre espécies vegetais estão disponíveis em um portal que pode ser acessado por estudantes, professores e profissionais

O que é preciso em um bom livro infantil? Para despertar o interesse do leitor mirim, é necessário uma história criativa que seja lúdica e prazerosa, promovendo uma interação com o mundo mágico da imaginação. É preciso apresentar uma linguagem adequada a cada faixa etária, e ter a preocupação na transmissão do conhecimento sem dissociar da realidade conceitual, para que a criança fique encantada pelas letras .

É mais fácil escrever para adulto ou criança? As duas opções são complexas se observarmos os critérios da riqueza dos aspectos formativos, na compreensão do contexto da obra. Na literatura infantil a narrativa é movimentada e o discurso direto, podendo ser pedagógico ou fantástico.

5 mil espécies estão disponíveis para pesquisa no portal do Herbário Marlene Freitas da Silva

Muitas vezes necessita de uma boa ilustração, para evidenciar as emoções das personagens ou situar a imaginação. Portanto, não é nada fácil escrever para o público infantil.

Qual o papel da literatura na vida das crianças? O hábito de ler deve começar na infância, sendo de suma importância oferecer bons livros às

andré abreu

MAR ÁCIDO

crianças, mas também os pais devem dar o exemplo, praticando a leitura em casa, sendo uma

Atividade vulcânica intensa deixou oceanos mais ácidos e foi um dos

atividade rotineira e enriquecedora. A literatura

principais fatores da extinção em massa na Terra, há cerca de 250 milhões

desde a mais tenra idade, favorece diversos fato-

de anos. De acordo com a revista Science, cientistas afirmam que os mares

res no âmbito da aprendizagem e na capacidade

absorveram enormes quantidades de dióxido de carbono, o que acabou

de expressão.

com mais de 90% da vida marinha e dois terços dos animais terrestres. MAIO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 11

arquivo pessoal

Letras e defende que é necessário


primeiro Foco

Br-163

Livro investiga a vegetação da Cuiabá-Santarém

DOCUMENTÁRIO

Um documentário sobre o Círio de Nazaré mostra a procissão através do olhar de três pessoas. A história de um guarda da Santa; de um soldado do exército e de um voluntário da Cruz Vermelha é contada em “No Movimento da Fé”, curta-metragem paraense que

O Museu Paraense Emílio Goeldi

totalizando 19 milhões de hecta-

ganhou lançamento especial em DVD neste mês.

lançou o livro “Palmeiras do Distri-

res. Elaborado pelas pesquisadoras

O premiado documentário, dirigido por Fernando

to Florestal Sustentável da BR-163”.

Gleissiane Alves, Ana Luísa Alber-

Segtowick e Thiago Pelaes, teve uma tiragem de

A publicação é um guia com espé-

naz e Maria Aparecida Lopes, o guia

três mil DVDs com legendas em inglês e francês,

cies de plantas identificadas e ma-

é parte dos resultados do Projeto

além do áudio em opção 2.0 e 5.1, patrocinado pela

peadas ao longo da rodovia Cuiabá-

Integrado Ministério da Ciência e da

Vale. Também inclui uma entrevista exclusiva com

Santarém no trecho do distrito que

Tecnologia e Embrapa, cujo objeti-

os diretores explicando a estratégia de captação do

dá título ao projeto, criado pelo Pro-

vo é avaliar a sustentabilidade de se

filme, realizado em apenas um dia. O documentário

grama Nacional de Florestas e que

implementar uma economia de base

é uma produção de Fernando Segtowick, Clarté e

possui 14 unidades de conservação,

florestal na região.

Alt-Produções. FERNANDO SETTE / ARQUIVO

“ON THE ROAD”

Conheça algumas das propriedades do estudo na BR-163 ÁREA ESTUDADA

A rodovia BR-316 (Cuiabá-Santarém) possui 1.756 km de extensão, ligando o Centro-Oeste do Brasil à cidade de Santarém, no Pará, e foi aberta em 1973.

DISTRITO FLORESTAL SUSTENTÁVEL

iNOVe

FORNECEDORES

No mês de abril, representantes de micro e pequenas empresas do sudeste do Pará participaram de eventos, realizados pela Vale e pelo Sebrae, para apresentar um programa de capacitação que tem como objetivo promover a competitividade e o desenvolvimento sustentável de fornecedores da cadeia de valor da empresa. As atividades foram realizadas nos municípios de Marabá, Parauapebas, Ourilândia, Tucumã e Canaã

Foi criado por decreto federal em 2006 para viabilizar a conclusão das obras da rodovia. Pouco mais de 50% da área é formada por unidades de conservação, a maioria enquadrada como uso sustentável.

CARACTERÍSTICAS

A definição da localização para implantação dos distritos florestais foi baseada em três características: potencial florestal (existência de recurso florestal a ser manejado, conservado ou recuperado, em especial florestas públicas), vocação florestal (população voltada para o uso sustentável dos recursos florestais e existência de cadeias produtivas associadas) e condições logísticas.

O programa de capacitação de fornecedores é resultado de um convênio firmado nacionalmente

RESULTADOS

benefícios e as ações do projeto. Somadas ao evento promovido no final de março em Belém, mais de 70 empresas do Pará foram envolvidas.

entre a Vale e o Sebrae, no final de 2014. “A iniciativa faz parte do Programa Inove que tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento sustentável de fornecedores da Vale nas regiões

PA

PROCEDIMENTO

Os trabalhos dos pesquisadores no Distrito Florestal da BR-163 foram concentrados em transecções; seções transversais feitas a partir de um eixo de longitude, que serviram de base para a realização de diversos estudos integrados envolvendo aspectos ecológicos relevantes para a sustentabilidade florestal.

dos Carajás. Na ocasião, foram apresentados os

Santarém

Já foram identificadas e mapeadas 57 espécies de palmeiras na região.

BR 163

MT Cuiabá

onde atuamos”, explicou érika Rosa, gerente de Conteúdo Local de Suprimentos da Vale. 12 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

MAIO DE 2015

FONTE: PORTAL DO MUSEU EMÍLIO GOELDI E ARTIGO “ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PALMEIRAS NO DISTRITO FLORESTAL SUSTENTÁVEL DA RODOVIA BR-163, PARÁ, BRASIL”, DE RODOLFO SALM, MÁRIO AUGUSTO GONÇALVES JARDIM E ANA LUISA KERTI MANGABEIRA ALBERNAZ.

INFOGRAFIA: MÁRCIO EUCLIDES

cÍriO


FARMÁCIA VIVA ESTIMULA USO DE ERVAS MEDICINAIS

Por meio do programa Farmácia Viva, serão produzidos e distribuídos medicamentos fitoterápicos para a rede de atenção básica de saúde pública no município de Santarém. O projeto é conduzido pela Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), em parceria com o governo do Estado e será financiado pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Na primeira fase, as plantas medici-

nais que passarão pelo beneficiamento serão o guaco e a unha-de-gato, usadas para tratar problemas respiratórios e anti-inflamatórios, respectivamente. A fabricação de medicamentos fitoterápicos para suprir as demandas do SUS está orçada em R$ 1,8 milhão, valor que deverá ser investido na implantação do projeto. O professor Waldiney Pires, do Instituto de Saúde Coletiva (Isco), da

AmAzônIACONNECTION

Ufopa, destaca que o programa vai contribuir para o desenvolvimento científico, tecnológico, social e econômico da região. O Instituto de Biodiversidade e Florestas (IBEF) também participa do Farmácia Viva, que é um projeto-piloto. A partir dos resultados obtidos em Santarém, há a possibilidade de criação de outros dois polos do programa, um em Marabá e outro em Belém.

DA AMAZÔNIA PARA O MUNDO Estudar um semestre numa universidade estrangeira se tornou um impor tante adendo nos currículos universitários e no arcabouço de instituições de ensino e pesquisa no Brasil – mas, para concretizar a mobilidade internacional, é preciso se programar. E quem quiser estudar seis meses fora do país pode esperar boas opor tunidades para o segundo semestre

UFOPA/ DIVULgAÇãO

DA TERRA

Os medicamentos fitoterápicos fazem parte do programa Farmácia Legal, que chega ao oeste paraense

deste ano e em 2016. Somente na Universidade Federal do Pará há os programas Ciência sem Fronteiras, Erasmus Mundus e Santander Universidades. “Não é só para quem tira notas nove ou dez, mas para quem tem par ticipação acadêmica”, lembra a assessora da Pró-Reitoria de Relações Internacionais (Prointer), Leila Assef. Na UFPA, instituição que reúne mais de 50 mil alunos na capital e no interior, há duas formas de mobilidade internacional: viajar

1,8

milHÃo

DE REAIs DEVERãO sER INVEsTIDOs NO PROgrama Farmácia Viva para suprir as demandas do SUS

ANDRé ABREU

LARVAS CORADINHAS

para uma universidade parceira da UFPA com as despesas totalmente pagas pelo aluno ou conseguir bolsas concedidas pelos progra mas de intercâmbio. “Por conta do aluno, ele vai ter que arcar com pas sagens, hospedagem, es tadia”, lis ta a as ses sora. Por outro lado, ele também pode em barcar no intercâmbio que sane

Com propriedades fotodinâmicas naturais, o corante extraído da cúrcuma

pelo menos par te dessas despesas.

(Curcuma longa L.), também conhecida como açafrão-da-índia, pode ajudar a

“Mesmo num programa de inter-

eliminar as larvas do mosquito Aedes aegypti nos criadouros. Cientistas brasi-

câmbio, ele ainda vai gastar algum

leiros concluíram que a substância, quando ativada pela luz, induz à produção

dinheiro”.

de moléculas que destroem os tecidos do aparelho digestivo das larvas. MAIO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 13


The National Aviary / Wikimedia

PRIMEIRO FOCO

parceria

desenvolvimento

Somar esforços entre os diversos atores das comunidades é uma forma de contribuir para o desenvolvimento de cidades e municípios numa estratégia de cooperação mútua. No ano passado, mais de 4.500 profissionais de saúde, educação e empreendedores sociais participaram de formações técnicas, graças à cooperação entre empresas, prefeituras, secretarias,

lideranças

comunitárias,

associações locais, parceiros especializados e as comunidades. O dado é do Relatório de Atividades da Fundação Vale 2014. Na área de educação, foram contemplados 3.348 profissionais, entre gestores e professores da rede pública de ensino de municípios do Maranhão, Pará, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Sergipe. Também participaram de formações 611 trabalhadores de Atenção

educação ambiental O mutum-piuri habita a região do baixo purus, no Estado do Amazonas

Básica à Saúde, beneficiando ao todo quase

instituto monitora ave ameaÇada no amazonas

30 mil crianças e jovens. Somente uma das iniciativas, o Ciclo Saúde, capacitou diretamente 365 profissionais em 10 municípios do Pará, Maranhão e Minas Gerais. Na frente de Geração de Trabalho e Renda, o público-alvo são associações, cooperativas, microempresas, grupos produtivos informais e empreendedores das comunidades onde a Vale atua. Pelo Programa de Apoio à Geração e Incremento de Renda (AGIR), foram capacitados 273 empreendedores, o que resultou no desenvolvimento de 117 planos de negócios; além disso, foram realizadas capacitações

O mutum-piuri (Crax globulosa) é uma das aves mais ameaçadas da Amazônia e recebe apoio do Instituto Piagaçu (IPi), que monitora a frequência com que a ave é caçada. O trabalho na região do Baixo Purus, no Amazonas, também busca entender quais áreas são importantes para a alimentação e reprodução

dos mutuns. Eles podem ter quase um metro de comprimento e pesam mais de cinco quilos, vivendo unicamente em florestas de várzea. Além de ações de educação ambiental com a comunidade, pesquisadores iniciarão o monitoramento com telemetria para obter dados que ajudem a salvar a espécie da extinção.

produtivas para diversas atividades rurais, de equipamentos agrícolas, totalizando 375 pessoas beneficiadas.

ROMANCE

CAMETÁ O município de Cametá, no Baixo Tocantins, é o

INFRAESTRUTURA

cenário do novo romance do escritor Salomão

OUROVERDE

Larêdo. “Olho de Boto” se passa na década de

A Vila Ouro Verde, na zona rural de Canaã dos

1960, em plena ditadura militar, e conta a aven-

Carajás, recebeu creche, escola e posto de saúde.

tura de dois homens que se apaixonam e fazem

As obras foram entregues pela prefeitura e pela

tudo para realizar o sonho do casamento. O

Vale e incluem, ainda, uma Agência de Defesa

escritor conta que o fato chegou a ser divulgado

Agropecuária do Estado do Pará (Adepará). As

nos jornais da época, com grande repercussão e

unidades de ensino poderão atender, juntas,

carga de intolerância. “Trabalho o assunto com

até 560 crianças. A escola conta com 12 salas de

muita responsabilidade e respeito”, destaca. A

aula, sala de informática e quadra poliesportiva

obra foi lançada pela editora paulista Empíreo.

coberta. 14 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

MAIO DE 2015

rafael tomazi/ divulgação

entre elas, cacau, pecuária leiteira, operação


estudante Paraense cria soLuÇÃo Para sobras de miriti

A matéria-prima que envolve o caroço do miriti, encontrado em grande quantidade na floresta amazônica, costuma ser desprezada, mas o estudante paraense Maurício Pantoja, de 18 anos, encontrou uma forma de transformá-la em ração para animais. Após passar por uma estufa, a bucha, como é chamado o material, é triturada e vira um farelo rico em nutrientes, que já foi adotado na alimentação de peixes e porcos. Já com o caroço, o jovem pesquisador conseguiu desenvolver um filtro vegetal, transformando-o em carvão ativado, uma vez que o

PERGUNTA-SE

Estresse engrossa o leite materno?

miriti é rico em carbono. A ideia era encontrar uma solução simples e barata para melhorar a qualidade da água consumida pelos ribeirinhos. Os resíduos possuem substâncias que, quando manipuladas quimicamente, ajudam a purificar a água. O sistema desenvolvido funciona com três caixas d’água, mas é de fácil execução. Ele conseguiu a parceria do Instituto Federal do Pará (IFPA), em Abaetetuba. Neste mês, ele participa de uma das feiras de ciência e tecnologia mais importantes do mundo, nos Estados Unidos, para apresentar os projetos.

O estresse é responsável por uma série de alterações bruscas no organismo feminino, como no ciclo menstrual, mas uma crença conhecida e muito difundida na região é a que o estresse pode engrossar ou endurecer o lei materno. Só que apesar dos variados efeitos, o principal alimento dos bebês lactentes não sofre alterações tão facilmente, explica a nutricionista e coordenadora do Banco de Leite da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará, Cynara Souza. “É mito. O estresse pode até causar alguns transtornos à mãe, mas nenhum deles envolve alterações na espessura do leite. Não há casos e nem estudos que comprovem. Entretanto, o estresse excessivo pode afetar o fluxo do leite e a mãe não ver o leite descer. Isso acontece.

jovem inventor

Mas basta se acalmar, relaxar e fazer uma pealessandro medeiros / sebrae

Maurício Pantoja, de 18 anos, e o professor Gilberto Silva vão aos Estados Unidos apresentar o projeto sustentável

quena massagem que o fluxo volta ao normal. O maior obstáculo da mãe é ficar nervosa”, diz a nutricionista. Cynara observa que há fenômenos muito raros em que o leite toma uma forma de gel, mas que após algumas massagens nos seios, também retorna ao normal. E se o leite ficar muito tempo concentrado sem sucção, acaba formando alguns cristaizinhos que podem dificultar o fluxo, mas as condições também são muito específicas e alguns estímulos físicos solucionam o problema. carin / sxchu

18

anos

é idade do jovem pesquisador paraense que criou formas sustentáveis de reaproveitar o miriti

QUEBRA-CABEÇAS PRÉ-HISTÓRICO Desde 2011, o fóssil de um jabuti gigante vinha sendo reconstituído por pesquisadores da Universidade Federal do Acre. O animal, que viveu há andré abreu

8 milhões de anos na Amazônia, ainda não possui espécie definida e pode ter parentesco com as tartarugas gigantes de Galápagos. O fóssil tem mais

MANDE A SUA PERGUNTA

Envie perguntas instigantes sobre hábitos, costumes e fenômenos da região amazônica para o e-mail: amazoniaviva@orm.com.br

de 1,5 metro de comprimento, maior que os exemplares do arquipélago. MAIO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 15


Quem É?

BERNARDO MORAES NETO

CONSTRUINDO NOVAS POSSIBILIDADES

M

TEXTO rOSANA MEDEIrOS FOTO rObErTA brANDãO

istura de cimento, água, pedra e areia. Esses são os materiais básicos necessários para preparar o concreto, composição correspondente a 90% de uma construção. Esse dado demonstra a importância e a pertinência dos estudos sobre a tecnologia desses materiais. Em 2014, o paraense Bernardo Moraes Neto, professor da Faculdade de Engenharia Civil da Universidade Federal do Pará (UFPA), ganhou o prêmio nacional de melhor tese de doutorado em estruturas com o trabalho “Comportamento à Punção de Lajes Lisas em Concreto Reforçado com Fibra de Aço sob Carregamento Simétrico”. O prêmio foi concedido pelo Instituto Brasileiro do Concreto (Ibracon), considerado um dos maiores fóruns de difusão e debates sobre a tecnologia do concreto e seus sistemas construtivos. 16 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

MAIO DE 2015

Bernardo é formado em engenharia civil pela UFPA. Em 2006, iniciou o mestrado em Estruturas pela Universidade, onde estudou o fenômeno da punção no sistema estrutural em laje lisa. As lajes são estruturas planas, quase sempre feitas de concreto armado, que se apoiam nas vigas da construção, mas que também podem se apoiar diretamente sobre os pilares. Quando isso acontece, chamamos esse sistema de laje lisa. Nas lajes lisas, toda a carga sobre a laje se concentra na ligação com o pilar, que são elementos verticais da edificação. Nesses casos, é necessário evitar o fenômeno chamado de “punção”, isto é, o risco de o pilar “furar” a laje como uma agulha pode furar uma folha de papel. Assim, a área de contato entre laje e pilar deve ser cautelosamente analisada. Foi essa questão que Bernardo analisou no mestrado, discutin-

do, ao final, a utilização de estribos inclinados na provável região em que ocorreria a punção, fortalecendo assim a ligação laje-pilar. Os estribos são armações metálicas utilizadas ao redor do pilar com o objetivo de proporcionar maior resistência e melhor desempenho da ligação laje-pilar. A pesquisa realizada pelo professor foi desenvolvida em lajes lisas, mas também pode ser aplicada em outras estruturas, como pisos industriais, tubos de águas pluviais e esgotos, pré-fabricados, reforços de elementos estruturais, entre outras. Uma das vantagens da utilização do concreto reforçado com fibras de aço é a possibilidade de reduzir ou suprimir a utilização do ferro convencional, o conhecido vergalhão. Essa mudança causa um impacto no custo fi nal da obra que deve resultar no barateamento dos empreendimentos ligados à construção civil.

NOmE

Bernardo Nunes Moraes Neto

IDADE 39 anos

fORmAÇãO

graduação em Engenharia Civil (UFPA-1994), mestrado em Engenharia Civil (UFPA-2008) e doutorado em Estruturas e Construção Civil (UFPA-2013)

TEmPO DE PROfIssãO 16 anos


inpa / divulgação

EU DISSE

APPLICATIVOS

“É preciso que as áreas de manejo sejam divididas em 30 pequenas porções e que a exploração seja feita em uma por uma a cada ano”

Boas ideias num toque de dedos

Urubu Mobile

Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia

Sistema desenvolvido para informar a locali-

(Inpa), sobre medidas necessárias para que ocorra a diminuição do desmatamento da Amazônia.

zação de animais silvestres atropelados nas

(Revista Época)

estradas estaduais e federais do País. O apli-

“É o caráter político do fazer ciência que empresta à sociedade sua capacidade de definir o futuro e de ter autonomia”

cativo foi desenvolvido pelo Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas (CBEE), da Universidade Federal de Lavras (MG). É possível comunicar onde ocorreu um acidente com animal silvestre, permitindo informar diversos órgãos de segurança. Plataformas: iOS, Android e Windows Phone Preço: Gratuito

Jimena Felipe Beltrão, jornalista e analista em Ciência e Tecnologia do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) sobre a importância do jornalismo científico. (Jornal Beira do Rio)

Infraero Voos Online Descrito como “Feito para quem quer fazer

“Precisamos induzir os docentes a nuclearem novos cursos. Atualmente, consolidamos a vocação científica para as ciências da saúde, da educação, exatas e tecnologia”

uma viagem de avião sem surpresas e sem problemas”. O usuário pode conferir todos os horários de voos de partidas e chegadas de 50 aeroportos brasileiros. Também dá para saber a distância de onde se está até o aeroporto para onde precisa ir. O aplicativo

Douglas Rodrigues, pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação da Universidade Estadual do Pará

conta com previsão do tempo e uma versão

(Portal Uepa)

embutida do Guia do Passageiro. Plataformas: iOS, Android e Windows Phone divulgação

Preço: Gratuito

Peak jogos cerebrais Um série de 16 jogos que na verdade são treinamentos cerebrais, melhorando o aprendizado, atenção, concentração e racio-

“Essa é uma noite histórica, marcante para a educação musical no Pará”

cínio. Fundamental para manter a saúde e a atenção sempre estimuladas. Os resultados são monitorados, comparados e registrados para um melhor acompanhamento.

Silas Borges da Silva, regente da Banda Sinfônica da Escola Estadual Lauro Sodré, sobre a apresenta-

Plataformas: iOS e Android

ção realizada no Theatro Da Paz em referência aos 143 anos da Banda.

Preço: Gratuito (versão básica)

(Agência Pará de Notícias) FONTES: PLAY STORE E iTUNES MAIO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 17


como Funciona

O curimbó TEXTO E iluSTrAçÃO SÁVIO OlIVEIrA

O tambor é a alma do carimbó, eco-

Algodoal e Icoaraci, o instrumen-

gre, “gambá”, e em Vigia, “curem-

Belém e Vigia, hoje, o batuque, a

ando o rufar da floresta e dando vida

to percussivo é conhecido como

bó”. Antes, objeto proibido de ser

dança e os vozerios, são reconhe-

a homens e mulheres, que cantam e

“curimbó”; em Marapanim e San-

tocado no século XIX, pelo Código

cidos como Patrimônio Cultural

dançam por uma noite inteira. Em

tarém é “carimbó”; em Monte Ale-

de Posturas dos municípios de

Imaterial do Brasil.

3

é NO BATUqUE... Conheça os detalhes do

Em uma das aberturas do tron-

instrumento que dá ritmo

cos, é colocado couro de boi,

ao carimbó

fincado com madeira e reforçado

1

com nylon, para manter a pele

O instrumento é feito

cal ou espátula, deixando a pele

com tronco de árvore

lisinha para receber as batidas do

caída, geralmente por

tocador.

conta da erosão dos dendo da localidade,

4

pode ser feito de siriúba

Um aro de ferro também é colocado

ou de cumarú, que pos-

para garantir estabilidade. Com uso

suem madeiras densas

de tarraxas, a afinação pode ser

e bastante consisten-

regulada. Em um roda são utilizados

tes, para reverberar o

dois tambores, um grave, maior,

ritmo em cada espaço

para a base ou marcação e outro

da roda de carimbó.

médio, menor, para fazer o repique

2

ou repenique, que são variações ou

esticada durante a festa inteira. A raspagem do pelo é feita com

manguezais. Depen-

breques no ritmo.

5

A escavação do inte-

rior é feita com uma

A origem do nome do tambor é

goiva, instrumento de lâmina curva que raspa

indígena, que significa “curi”: madeira,

o excesso de madeira

e “mbó:” oca, estava pronto para

e deixa o tronco oco. O

celebrar e “carimbolar”. Ao lado de

tambor mede apro-

banjo, maraca, pandeiro, reque-reque,

ximadamente 1m de

xeque-xeque, clarinete, flauta e muita

comprimento e tem de

gente, o curimbó segue rodeado de

30 a 40cm de diâmetro.

poesia, ritmo e alegria.

A parte externa do tronco é lixada e pode ser pintada, com a co-

FONTES: NEGO rAY, ArTESÃO E MúSIcO./ vANILdO PALhETA MONTEIrO, MESTrE EM ETNOMUSIcOLOGIA./ cArIMbÓ: TrAbALhO E LAzEr dO cAbOcLO. / MArINA ISdEbSKI; vIcENTE SALLES./ dIcIONárIO dO FOLcLOrE brASILEIrO. LUíS dA cÂMArA cAScUdO.

res do conjunto ou do santo da festividade. 18 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

MAIO DE 2015


DEU N’O LIBERAL

FATO REGISTRADO

reprodução / o liberal/ hely pamplona

inocêncio gorayeb

O adeus a Waldemar Henrique

além do horizonte

A estrada de ferro cortava uma área do Pará, que passou a constituir o Território Federal do Amapá, hoje Estado

Um tempo que se foi na Serra do Navio Apenas olhando-se a foto, não há como deduzir a localidade. Não adianta tentar. Ninguém vai dizer que a estrada de ferro, entrecortada pela capoeira em crescimento junto a um monte e a um sinalizador ferroviário ao fundo, compõe um retrato da Amazônia. Corriam os anos de 1950 quando instituiu-se uma “cidade modelo”, a famosa Serra do Navio. Uma área do Estado do Pará passou a constituir o Território Federal do Amapá, onde foi iniciada a primeira experiência de mineração industrial na Amazônia. O empreendimento ob-

jetivava a produção de minério de ferro. E, para isso, firmou-se a parceria entre a empresa Icomi (Indústria e Comércio de Minérios S.A.) e a estrangeira Bethlehem Steel Company. Uma iniciativa que viria a ser conhecida como um “grande projeto na Amazônia”, colocando, pela primeira vez no mesmo espaço, empreendimentos de grande porte e a sociedade civil amazônica. Seria um tempo de grandes transformações econômicas, culturais e sociais. Sem um planejamento de produção adequado e sustentável, no decorrer da década de 1970 as jazidas

deram sinais de exaustão. O pico de desenvolvimento deixou de ser o mesmo, restando apenas casas e vilas no caminho, além de plantas exóticas, hidrantes importados e uma linha férrea no meio da Amazônia. A foto é um ícone da Serra do Navio. Na imagem, tomada pelo pesquisador Inocêncio Gorayeb com uma câmera Pentax K1000, retrata-se a nova realidade: os montes de manganês pelotizado ao fundo, a mata antropizada e um sinalizador ferroviário no horizonte. Em preto e branco, é um registro de uma Amazônia dentro da Amazônia.

No dia 28 de março de 1995, a edição de O LIBERAL prestou uma justa homenagem a um dos maiores nomes da música paraense, o maestro Waldemar Henrique. O pianista morreu aos 90 anos no dia 27, aproximadamente às 15h30. A primeira página do caderno de cultura, à época chamado Dia-aDia – foi totalmente dedicada ao músico herdeiro do modernismo brasileiro. Alguns amigos lembraram de histórias da vida do maestro, como o jornalista João Carlos Pereira, que destacou o “clube” do qual Waldemar fazia parte junto com outros amigos em que conversavam sobre teatro, música e poesia nos restaurantes do centro da cidade. Adorado e referenciado por suas composições que misturam a música clássica com o regionalismo amazônico de lendas, mitos e as músicas populares, o maestro recebeu as últimas homenagens em um velório no Theatro da Paz, local onde foi diretor durante vários anos. Em parceria com o poeta Antônio Tavernard nas músicas “Foi Boto, Sinhá” e “Matinta Pereira” fez história. Já no Rio de Janeiro, onde residiu durante um período, compôs “Cobra Grande”, “TambaTajá”, e “Uirapuru”.

MAIO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 19


CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE inocêncio Gorayeb

Pedras construtoras da Amazônia As pedras grés-do-pará, pedra-jacaré, pedra-dopará ou piçarra são comumente usadas na fundação de construções diversas e constituem o visual e resistência de muitos imóveis históricos. O nome do material, no entanto, só é usado na região amazônica, onde é encontrado abundantemente na natureza. Várias pessoas usam até hoje o material nas construções e nem sequer sabem o quanto a pedra, de aparente valor baixo e usada até em aterros, representa para a história geológica da Amazônia. Essas pedras são lateritos ferruginosos e bauxíticos, descritos pelo geólogo

Marcondes Costa em 1991, mas descobertos pela primeira vez pelo geólogo austríaco Friedrich Katzer em 1903, que batizou as rochas. Ele trabalhou no Museu Paraense Emílio Goeldi em Belém por quatro anos e foi o responsável por vários projetos exploratórios e a primeira coleção mineralógica do Estado. Curiosamente, o nome dado pelo austríaco, que mais valorizou o local da descoberta, dificilmente é usado por outras pessoas no Brasil. Marcondes explica que os lateritos imaturos se formaram durante a era geológica do Quaternário (Pleistoceno). O estudo

de rocha

A grés-do-pará também é chamada de pedra-jacaré e serve para fazer alicerces nas construções da região

dessas rochas tem contribuído para o mapeamento geo-histórico da Amazônia, além de facilitar a prospecção de jazidas minerais.

As grandes reservas da região, geralmente associadas às rochas lateríticas, foram descobertas ainda sob conhecimentos geológicos generalistas, o que leva pesquisadores a suporem que a Amazônia ainda tem grande potencial a ser desvendado.

ELES SE ACHAM

A planta carnívora Drosera cayen-

as vítimas para uma morte entorpe-

nensis Sagot ex Diels é um tipo raro

cida. Os insetos, por exemplo, aca-

de vegetal que surge nas margens do

bam presos na planta carnívora. O

rio Tocantins, em Cametá, justamen-

gel tão atraente segura as presas até

te no período de seca intensa, que vai

que se decomponham totalmente e

de setembro a novembro, e também

alimentem o vegetal, que tem pouco

de alagamentos, de fevereiro a abril.

mais de 2,5 centímetros de diâme-

A Drosera é preparada para suportar

tro. A espécie foi descrita em 1906

a variedade de temperaturas com

e ocorre no Panamá, na Costa Rica,

acúleos (espinhos) que fazem ela

Brasil, Colômbia, Guiana Francesa,

parecer um cacto colorido e cheio de

Suriname e Venezuela.

água, enganando pequenos animais, principalmente insetos. Os espinhos contêm géis e néctares que atraem 20 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

MAIO DE 2015

NÃO SE ILUDA

A Drosera parece um cacto inofensivo, mas não é

inocêncio gorayeb

Refeição fácil e perigosa


Ernest Lohse

DESENHOS NATURALISTAS

CONCEITOSAMAZÔNICOS

Ribujo, o caminhos dos peixes

Pode procurar no Aurélio, com o perdão do dicionarista, mas lá não se encontra. Tu podes dizer: digita no Google. Veja bem, lá também o termo não existe. Para entender a utilização dessa palavra, sua história e as relações com a cultura, é preciso estar na Amazônia, viver entre os povos tradicionais da região. Localização: litoral amazônico, do extremo norte do Amapá até o Meio Norte maranhense, passando pelo Pará. É preciso saber de onde vem a comida que alimenta o amazônida. É preciso seguir o caminho do peixe. É que o ribujo pode não ser popular nos grandes centros, mas lá pelas bandas do Caeté, no deságue do Guajará-Mirim e no Mojuim, pescador que é pescador leva a vida tentando sentir o “cheiro” do ribujo. Os grandes cardumes, como bem distante

os de gurijuba, deixa um rastro, um indício

O macaco do gênero Lagothrix sp. foi ilustrado em seu habitat natural pelo desenhista Eládio Lima, em 1945

de sua presença. É uma alteração na maré, a mudança na tonalidade: um ribujo. E é aí que o caboclo faz a festa, que a casa se enche de graça e a feira se enfeita. Conhecer o traquejo

O macaco-barrigudo pelo Museu Paraense Emílio Goeldi ainda em 1945. Mesmo estigmatizado por sua barriga protuberante, o barrigudo é um atleta: grande, musculoso, com uma calda preênsil e braços tão longos quanto as pernas. Na mata, os grupos, num único dia, podem se deslocar entre quatro e dez quilômetros, com pausa para a sesta do meio-dia. A calda é imensa, com uma espécie de almofadinha na ponta para garantir a aderência nas árvores. Excluindo o rabo, esse animal mede de 45 a 50 centímetros, e pesa de 7 a 10 kg, sendo

considerado o maior macaco do Novo Mundo. Um peso que varia com as estações do ano, conforme a disponibilidade de alimento. A dieta do buchudinho é quase totalmente frugívora: frutas, sementes, flores, fungos, artrópodes e pequenos vertebrados. A pelagem é tão macia que ele também é conhecido como macaco-de-lã. Ele chega a viver por 30 anos. A presença do bicho ocorre em toda a Pan-Amazônia e, no Brasil, é encontrado às margens dos rios Negro, Tapajós e a oeste da bacia do alto Amazonas.

séculos, atravessando de mãe para filho, de avô para neta. Só em séculos observando o comportamento de cardumes inteiros junto da necessidade material de todos os dias para se alcançar a vida na costa da Amazônia. O termo não figura o Aurélio, mas é um dos muitos explicado no livro “Amazônia, Zona Costeira: Termos Técnicos e Populares”, lançado em abril pelo Programa de Estudos Costeiros do Museu Paraense Emílio Goeldi. sávio oliveira

Apesar da pança semelhante à de um típico bebedor de cerveja, o macaco-barrigudo, por passar longe de manter boas relações com o ser humano, não seria uma boa companhia numa mesa de bar. Na prancha XVI, do livro “Primatas da Amazônia”, de Eládio Lima, a ilustração explica um pouco dessa aversão: na imagem, o barrigudo está em seu ambiente preferido, florestas primárias não alteradas, longe da presença do homem. O símio faz parte do gênero Lagothrix sp., desenhado no livro publicado

da coisa, o traçado que o peixe risca, vem de

MAIO DE 2015

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 21


em nÚmeroS

A FORçA DA MINERAçÃO

ATIVIDADE ECONÔMICA GERA EMPREGOS E ATRAI INVESTIMENTOS PARA O ESTADO TEXTO VICTOr fUrTADO iNFOGrAFiA MÁrCIO EUClIDES

Em 2014, o Pará exportou 128,6 mi-

postos deverão ser criados até 2020,

foi produzido, com maior parte da

do Pará 2015, publicado pelo Sindicato

lhões de toneladas de minérios, o que

já vislumbrando os investimentos de

produção vinda da mina de Carajás,

das Indústrias Minerais do Estado do

movimentou US$ 14,259 bilhões na

US$ 31,171 bilhões previstos no Estado

administrada pela Vale no sudeste

Pará (Simineral), em parceria com as

economia local e nacional. Com isso,

até lá.

paraense. Somente em 2014, o Estado

15 empresas filiadas, entre elas a Vale,

o setor mineral criou direta e indireta-

O minério de ferro foi o carro-chefe

arrecadou R$ 504 milhões com a

e mais os fornecedores. Quem quiser

mente 281.862 postos de trabalho, 5%

das exportações no ano passado,

atividade. Todos esses dados estão

conhecer o anuário completo pode

a mais em relação a 2013. E mais 83 mil

representando 61,5% de tudo o que

presentes no quarto Anuário Mineral

acessar o site www.simineral.org.br

PRODUçÃO MINERAL

Rentabilidade por tipos de minérios exportados no Pará em 2014

Minério de ferro

Cobre

61,5%

11,2%

milhões de toneladas exportadas para 22 países

mil toneladas exportadas para 13 países

Alumina calcinada

11,1%

Alumínio

Níquel

5,2%

2,7%

mil toneladas exportadas para 3 países

milhões de toneladas exportadas para 11 países

110 623 4,8 309 64 0,8%

1,4%

1,5%

1,7%

1,8%

OUTROS PRODUTOS

bilhão movimentados

Bauxita Caulim Ferro gusa Manganês Silício

22 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

MAIO DE 2015

US$ 1,3

bilhão movimentados

Ouro

0,7%

US$ 1,3

foram movimentados

0,3%

US$ 7,4

milhões de toneladas exportadas para 11 países

Outros

US$ 636 milhões movimentados

US$ 328 milhões movimentados


NEGÓCIO EM EXPANSÃO

DO LADO DE LÁ

Quais os principais países que compram nossos minérios hoje

Investimentos da indústria mineral no Pará até 2020 Total

NORUEGA

CANADÁ

US$ 31 BILHÕES

US$ 371 milhões 1,4 milhão de

US$ 817 milhões 5,4 milhões de

em média

Indústria extrativa mineral

toneladas

toneladas

US$ 20,4 BILHÕES

(66%) ALEMANHA

JAPÃO

US$ 899 milhões 8,1 milhões de

EUA

US$ 524 milhões 10,4 milhões

US$ 1,1 bilhão 10 milhões de

toneladas

toneladas

CHINA

US$ 661 milhões 8,2 milhões de

toneladas

OUTROS

US$ 9,9 BILHÕES

(32%)

Indústria da transformação mineral

US$ 1,7 MILHÃO

(1%)

COREIA DO SUL

US$ 4,5 bilhões 66 milhões de

de toneladas

Infraestrutura e transporte

Outros negócios

US$ 5,3 MILHÕES

(2%)

toneladas

US$ 3,1 bilhões 17 milhões de toneladas

MUNICÍPIOS PRODUTORES

Veja a distribuição da Compensação Financeira por Exportação de Minérios (CFEM), em 2014, no Pará

Parauapebas

32s R$milhõe% 6,3

R$ 369 milhões 73,2%

Ca na ãd os Ca ra jás m ilh õe s

R$ 6,4 32,5 %

a Sant Terra

Rm$ilh1õ0 es % 2

mil hõe s

R$ 1 3,2 5 %

Par ago min as

á rab Ma

2014

2013

POSTOS DE TRABALHO SENDO...

POSTOS DE TRABALHO, SENDO...

281.862

191.264

na transformação e fornecedores

269.304 182.742

R$ 10,8 m õe s 2,2ilh%

do una Ipix

á Par

,4 R$mil7hões % 1,58

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67.326

em terceiros permanentes ou projetos

20.133

empregos próprios na indústria da mineração

empregos próprios na indústria da mineração

Jurut i

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na transformação e fornecedores

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Empregos gerados com a mineração paraense nos últimos dois anos

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TRABALHO E RENDA

19.236

FONTE: 4º ANUárIO MINErAL dO PArá 2015 SINdIcATO dAS INdúSTrIAS MINErAIS dO ESTAdO dO PArá

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OLHARES NATIVOS

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Janela aberta para o infinito As janelas para os rios se abrem de par em par no sufoco da cidade feita de asfalto, gente, cimento, gente, aço, gente, vidro, gente, percalço, gente, gente, gente e gente. São elas furos vitais no colossal retalho urbano que a metrópole se torna de bocado em bocado, de boca em boca, com suas vias engurgitadas, seus céus de dióxido, seus arranha-céus multitudinários, suas ilhas de calor e clamor, suas banquetas na porta da casa emulando a calma da cidade dentro da cidade que não existe mais. E olhamos as janelas para achála, a cidade, do outro lado da moldura, no universo paralelo que é cada um. São portais de sonhos abertos para olhos arregalados que insistem em encontrá-los, os sonhos, para quem os busca tateando o concreto, na velocidade dos autos, na lentidão de viver e morrer no organismo vivo e doido do novo século que avança engolindo lembranças onde não há blindagem de rios, onde as janelas, benditas janelas, permanecem escancaradas de par em par. Na foto do Portal da Amazônia ao lado, e assim como nas páginas seguintes, registros especiais de uma Belém única sob o olhar do fotógrafo hely pamplona. MAIO DE 2015

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OLHARES NATIVOS

Ver como a garça da manhã Ver do alto o Ver-oPeso, ver debaixo o voo da ave branca em contraste com irmãos urubus inquilinos de longa data, zeladores das beiras, recolhedores dos restos da feiras. Ver a cidade do ar e guardar-se nela, como um pássaro.

Cheiro doce de nostalgia no quintal O cheiros dos uxis, teletransporte biológico à preço de custo para a terra do quintal, para as mãos enrugadas da bisavó com presentes do sítio do interior do interior. O sabor do uxi por baixo da grossa casca, o mel terroso da polpa das nossas infâncias. 26 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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Igarapés resistentes ao tempo Salta e solta o corpo no ar e os pés vão tocar o gelo dos igarapés, que eram para ser somente as veias minúsculas que correm para a mãe d’água dos rios titânicos da nossa terra. Qual o quê! Tem vida e tamanho, doçura e felicidade no fundo, exaltadas nos banhos de frio.

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OLHARES NATIVOS

Da bicicleta ao grande rio Este rio é minha rua, minha sina, minha estrada e, por que não, minha ciclovia? A relação tão íntima com o cenário úmido que confunde os veículos e seus condutores. Na brincadeira, não custa banhar a magrela perto das gaiolas e popopôs.

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Nos braços da Mãe-Natureza Dorme ao sol e a mata de fundo, a umidade bafejando o baloiço da baladeira atada no mundo. Em sono profundo, reconcilia com o mato e o hábito dos que habitam desde sempre a natureza, nu e livre. Uma leira, uma leseira, na esteira, que nada: é a rede minha morada.

Lições nas águas da região Aprende-se muito cedo a lidar com o rio. Seus significados, suas revoltas, seus períodos e espaços de mansidão, seus avisos, suas contradanças para mostrar o peixe e os perigos até a outra margem. Ensinamentos, quase sempre, de pai para filho. MAIO DE 2015

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OLHARES NATIVOS

O peso da cidade Lá vai a cidade engradecida, mocinha já, senhora já, adulta já. Cheia dos não me toques e dos não me queres. Lá vai a cidade, nariz pra cima, ah, exibida. Mal sabe ela que o cotidiano insiste em lembrá-la que ainda engatinha, a cidade, entre autos e carroças, entre roncos e relinchos.

Envie as suas fotos para a seção Olhares Nativos 30 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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Para participar da seção “Olhares Nativos” da revista Amazônia Viva basta enviar fotos com temática amazônica para o e-mail amazoniaviva@orm.com.br acompanhadas pelo nome completo do autor, número de identidade e uma breve informação sobre o contexto do registro fotográfico. As imagens devem ser autorais e com resolução de no mínimo 300 dpi. A publicação das fotos tem fins meramente de divulgação, não implicando em qualquer tipo de remuneração aos autores. Participe!


Para um mundo com novos valores.

Estação Conhecimento gera oportunidades

Led Produções

Idealizadas pela Fundação Vale, as Estações Conhecimento atendem diretamente nove mil pessoas em quatro estados brasileiros. Três unidades estão instaladas no Pará e oferecem ações socioassistenciais, educativas, esportivas, culturais, artísticas, qualificação profissional e geração de trabalho e renda.

A comunidade tem acesso a atividades que contribuem com a melhoria da qualidade de vida


Informe Publicitário

Unidade de Marabá atende mais de 1.300 pessoas da comunidade Led Produções

Cidadania, educação social, educação infantil, desenvolvimento criativo e complementação escolar estão presentes nas atividades diárias oferecidas às crianças, adolescentes, gestantes, nutrizes e idosos beneficiados diretamente pelas atividades realizadas na Estação Conhecimento de Marabá, localizada no Bairro do São Félix, um dos mais populosos do município.

A1 Produções

A Estação Conhecimento de Marabá, idealizada pela Fundação Vale, tem como parceiro executor o Lar Fabiano de Cristo. Implantada em 2014, a unidade atendeu só no seu primeiro ano de funcionamento 200 famílias da região, totalizando mais de 1.300 pessoas beneficiadas, 1.000 crianças, adolescentes e jovens em atividades educativas, culturais e na área de saúde, 85 pessoas em aulas de teatro, música e dança, 250 crianças na complementação escolar e desenvolvimento lúdico infantil e ainda 14.000 refeições servidas por mês.

Minha família mudou para melhor

Michele Costa, 25 anos, é marabaense e uma das pessoas beneficiadas pelo atendimento oferecido na Estação Conhecimento. “A Estação mudou a vida não só da minha mãe que é idosa, mas de toda a minha família”, afirma. Além da mãe que tem 64 anos, os quatro filhos e duas sobrinhas da dona de casa também participam das atividades proporcionadas na unidade de Marabá. “Agora posso sair pra trabalhar e sei que minhas meninas estarão seguras, vão comer e estão aprendendo coisas boas”, conta Michele.


Fotos: Anderson Souza

Informe Publicitário

O trabalho no laticínio gera emprego e renda para comunidade Desde dezembro de 2014, está em funcionamento no local, um laticínio, abastecido com o leite fornecido pelos produtores da comunidade da APA, beneficiados pelo Projeto de Bovinocultura Leiteira da Estação. Para a operação do laticínio, foram contratados 19 jovens da própria comunidade. O laticínio da Estação realiza diariamente o processamento do alimento, além da produção de derivados como leite pasteurizado, manteiga e queijos. No futuro, o empreendimento será entregue à comunidade, que vai administrá-lo por meio de uma cooperativa a ser formada e incubada no projeto. Além disso, a Estação Conhecimento da APA abriga a Escola Municipal Jorge Amado, a única instituição de ensino regular da região que atende 300 alunos do Ensino Fundamental.

Arquivo Vale

Inaugurada em 2010, a Estação Conhecimento de Parauapebas está localizada na Área de Proteção Ambiental (APA) do Igarapé Gelado, zona rural do município, onde vivem 120 famílias de agricultores. Pela vocação, o espaço atua em iniciativas ligadas à produção rural.


Estúdio Mirante Tucumã

Informe Publicitário

A Estação Conhecimento de Tucumã é a pioneira no Brasil O município de Tucumã foi o escolhido em 2008 para implantação da primeira unidade das Estações Conhecimento no Brasil. Em uma área aproximada de 30 mil m², a unidade abriga campo de futebol com pista de atletismo, campo society, parque aquático, quadra poliesportiva coberta, prédio administrativo, educacional e profissionalizante. Em Tucumã, mais de 1.200 pessoas são beneficiadas diretamente pelas atividades da Estação, entre crianças, jovens e adultos. Idealizada pela Fundação Vale, tem o Lar Fabiano de Cristo como parceiro executor. A Estação oferece atividades esportivas nas modalidades atletismo, natação e futebol, educativas e cursos profissionalizantes. Por meio de iniciativas socioassistenciais, a EC atendeu a 150 famílias da região. Em 2014, a EC teve suas instalações reformadas, ganhando uma cozinha industrial e um cineteatro, com capacidade para 180 pessoas.

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OPINIãO, IDENTIDADE, INICIATIVAS E sOlUÇõEs

OSWALDO FORTE

IDEIASVErDES

DE PORTAS ABERTAS

A IGREJA DO CARMO REABRE APÓS DOIS ANOS DE INTENSA REFORMA. O PRéDIO FOI CONSTRUÍDO NOS PRIMEIROS ANOS DA FUNDAçÃO DE BELéM. PÁGInA 38

IDEnTIDADE a ativista tainá marajoara defende

REPRoDUÇÃo uFpa e ufra desenvolvem os elementos que são próprios da região amazônica pesquisa em melhoramento genético de búfalos e diz que eles precisam ser resguardados. PÁG. 36 para alavancar a produção no estado. PÁG.46

REGISTRo O documentário “Mestres Praianos do Carimbó de Maiandeua” apresenta os compositores da ilha de Algodoal. PÁG.50

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OUTRAS CABEÇAS

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plantio, a colheita e o preparo do açaí seguem um ritual nos interiores amazônicos, assim como sua parceira, a farinha, desde o cultivo da mandioca. São alimentos, e ao redor deles há aspectos sociais, econômicos, ambientais, nutricionais e, principalmente, culturais. É que os variados povos e grupos sociais manifestam suas identidades também através de seus alimentos: isso é cultura alimentar. E, em um cenário de homogeneização de gostos, outros alimentos, sabores, preparos, técnicas – cultura tradicional amazônica – podem estar se perdendo com o tempo. É sobre isso que a ativista Tainá Marajoara, que já participou de eventos no exterior, como da Cúpula Mundial de Cultura e Arte da Organização das Nações Unidas 2014, quer falar. Ela quer mostrar que comida é cultura – e que precisa ser resguardada. De tanto ser reconhecida como a representante do Marajó, Tainá Godinho fortaleceu no nome a identidade marajoara: ao redor do alimento, há política, emponderamento, história e religiosidade. Lutando contra a perda da diversidade cultural, a Tainá, que tem suas raízes em Cachoeira do Arari e formação em comunicação e teatro em Belém, respondeu algumas perguntas na entrevista a seguir.

Tudo começou com a materialização de uma série de inquietações. O que foi realizado nesse período? Em 2008, foi feito um trabalho, um projeto cultural apenas, sobre essa relação que a encantaria possui com os alimentos. Sempre me chamou muita atenção a história do “homem que vira cavalo”, do “fulano que vira macaco”. E você vai pesquisar noutras fontes uma história tão arraigada em alguns territórios. Busquei pesquisas na Arqueologia, na História, no próprio Pós-colonialismo, na Biologia, na Nutrição. E, claro, na própria experiência das comunidades tradicionais. 36 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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“Temos as nossas línguas próprias” A ativista Tainá Marajoara, do Instituto Iacitatá Amazônia Viva, é uma defensora da cultura e identidade amazônicas, tendo no alimento um dos principais símbolos que expressam nossa rica diversidade. Para ela, é preciso fortalecer os valores que nos fazem amazônidas. TEXTO Moisés Sarraf FOTO Roberta Brandão


Coletamos fotos, narrativas. Era o projeto “Da Receita de Porco à Mulher que vira Porca: Sabores, Saberes e Encantarias da Cultura Alimentar da Amazônia”, sendo depois incorporado ao Grupo de Estudos em História Oral da Universidade de São Paulo. Mas isso era apenas um projeto cultural sobre essa relação metafísica, a cosmovisão e o alimento. A partir daí nós tentamos fazer uma publicação com o material recolhido. Quando a gente tentou fazer a publicação na secretaria de cultura, a gente esbarrou no discurso de que o que estávamos fazendo não era um produto cultural, era produto turístico. Quando fomos à secretaria de turismo para custear uma parte da pesquisa nos disseram que estávamos tratando com um produto cultural que não era prioritariamente deles. E qual foi a saída? A partir daí a gente foi estabelecendo um argumento sobre como isso poderia alcançar também políticas públicas. Foram se somando outras narrativas, outras viagens, outros processos, culminando no projeto que é o CATA - Cultura Alimentar Tradicional Amazônica. Desde o começo, foi feita a pesquisa em cima do nosso conhecimento tradicional de base oral, só que também teve o acompanhamento de uma bibliografia. Então, é estabelecida a diferença entre gastronomia, culinária, cultura alimentar, o que são técnicas. Nesse mesmo projeto, esbarramos, por exemplo, na ideia de que a cozinha brasileira não possui técnicas. Então, esse projeto deixou de ser um projeto cultural, já que seria uma publicação dessas narrativas e dessas relações, passando a ter ensaios acadêmicos, publicação de artigos, se tornando base de argumento para política pública no espaço público. E hoje a gente busca diálogos com a academia e com instituições de ensino de gastronomia para dizer que existem, sim, técnicas brasileiras autóctones, que a gente não precisa só utilizar cortes franceses. A gente tem que quebrar essa hegemonia que toma conta da nossa cozinha

nham trabalho também com ativismo.

“Quando a gente coloca o alimento para dentro ele não vai sozinho. Ele vai com história, com ciência, com uma vida para dentro da gente” amazônica. Nós temos as nossas palavras, as nossas técnicas. O guererê, o cauauá, o tique-tique, o teiú, o moquém, o gapuiar. Temos as nossas línguas próprias. Isso precisa ser respeitado também. Você mencionou o termo “políticas públicas”. Como, hoje, o governo brasileiro vê a cultura alimentar? No dia 18 de dezembro de 2013, o Ministério da Cultura publicou o relatório da Comissão de Finanças do Fundo Nacional de Cultura, em que já previu para o exercício de 2014 o segmento cultura alimentar contemplado dentro do orçamento. No dia 22 de março daquele ano, foi publicada a Portaria 22, em que a cultura alimentar passou de fato a fazer parte de todo o plano nacional de política cultural. E nesse processo, o que é a iniciativa Iacitatá Amazônia Viva? É o nosso instituto, uma organização não-governamental sem fins lucrativos, que se dedica mais fortemente à conservação da cultura alimentar, a projetos de cultura alimentar, sejam eles de cultura tradicional, assim como suas relações com a cozinha contemporânea. Além disso, a gente apoia pesquisas, recebe pesquisadores, cozinheiros, fotógrafos. Vários atores das cadeias produtivas relacionadas não só à cultura, mas com a conservação, que te-

Há também uma parceria com o movimento Slow Food, que é uma organização internacional nascida como uma reação ao Fast Food. Como funciona? Eu sou facilitadora da região Norte desse movimento. Hoje, a liderança do convívio Amazônia no Pará é o chefe Fábio Sicília. O Slow Food luta pelo alimento bom, limpo e justo. Por isso a nossa relação com a organização, que tem um trabalho importantíssimo, a Arca do Gosto, que promove os alimentos que estão em risco de extinção. E houve alguma atuação da Arca do Gosto no Pará? Houve, sim. Tem uma iniciativa muito bacana com Seu Vavá, de Ourém. Ele é a última pessoa que faz mingau de mucajá no município do nordeste paraense. E o mingau estava sendo deixado um pouco de lado. Infelizmente existe um rechaço com a cultura popular. A comida recebe um caráter subalterno, principalmente quando ela é uma cozinha específica do interior. Então, o Seu Vavá era o último guardião do mingau de mucajá em Ourém. Então, nós inscrevemos o mingau de mucajá do Seu Vavá na Arca do Gosto e foi aprovado. Você fala de nutrição, saúde, emponderamento político... Fala de tudo a partir do alimento? De tudo, porque quando a gente coloca o alimento para dentro ele não vai sozinho. Ele vai com história, com ciência, com uma vida para dentro da gente. Vamos falar, por exemplo, de uma fruta. A gente sabe que o melhor cupuaçu é o caído no chão. Para o cupu chegar ao solo ele já teve que florescer. A semente teve que virar árvore, só que para que ela chegasse ali tinha que ter um pássaro espalhando a semente ou o próprio homem, que aprendeu isso com outro homem, com o avô, com o bisavô. E a gente reconhece as propriedades nutricionais no cupuaçu. Nele, a gente se reconhece como paraense. Assim como a gente se reconhece no nosso isopor no aeroporto. O isopor é a nossa extensão territorial do afeto. E o cupuaçu também vai dentro dele. MAIO DE 2015

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aSSunto do mÊS

HISTÓRIA RECUPERADA COM A RESTAURAÇÃO COMPLETA DA IGREJA DO CARMO, NO BAIRRO DA CIDADE VELHA, A SOCIEDADE TEM DE VOLTA UM PATRIMÔNIO QUE REPRESENTA A UNIÃO ENTRE RELIGIOSIDADE E CULTURA SOB OS CÉUS DA AMAZÔNIA TEXTO SÁVIO OlIVEIrA FOTOS CArlOS bOrgES

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sujeira cobre a superfície da moldura de fachada em pedra lioz, um tipo raro de mármore português trazido de Lisboa pelos carmelitas ainda no século XVII. O mato cresce no telhado e na cobertura, expõe as goteiras do forro e desce pelas colunas de argamassa e balaústres. A invasão das plantas facilita a penetração da água da chuva, que se infiltra em rachaduras e no interior da madeira, abrindo galerias e fragilizando as peças das capelas. Sob a penumbra úmida, cupins adentram e corroem a estrutura de estátuas do século XVIII, enquanto umas das mãos da imagem de Jesus Cristo se encontra no chão do templo da Cidade Velha. A cena descrita acima foi testemunhada há dois anos por Jodair Velozo, mestre artífice em restauro, ao adentrar a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, localizada no centro histórico de Belém, para avaliar a situação de degradação do prédio religioso. Porém havia pouca luz no interior do espaço, dificultando a análise de vista. Ao subir um andaime para tatear o capitel, peça que fica na extremidade das pilastras de sustentação, o objeto veio abaixo, junto com a memória de quase 400 anos de colonização portuguesa e missões católicas na “cidade do Pará”. Nas mãos do restaurador e sua equipe, a responsabilidade histórica de recuperação do patrimônio amazônico. TEMPLO HISTÓRICO

A Igreja do Carmo foi reaberta depois de dois anos de um intenso trabalho de restauração. Hoje, a sociedade em geral volta a usufruir do imponente prédio no bairro da Cidade Velha. MAIO DE 2015

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ASSUNTO DO MÊS

“A igreja estava muito escura. Quando eu cheguei e olhei, percebi que ela já estava muito deteriorada e que a reforma não iria ser concluída em apenas um ano. O restauro requer tempo por conta da minúcia e da mecânica dos objetos, como a espátula pequena, utilizada cuidadosamente para a remoção de cada camada de tinta ou textura”, conta o restaurador baiano, que veio a Belém pela primeira vez para trabalhar nos reparos da Ordem Terceira do Carmo e na Igreja de Santo Alexandre, em 1993, e retornou à cidade há dois anos para restaurar a prospecção do altar da capela principal da Igreja do Carmo. O templo histórico, local de instalação do convento e colégio da Ordem dos Carmelitas Calçados, na década de 1620, fechada e reaberta no século XVIII após desentendimentos internos entre a cúpula católica, objeto de intervenção arquitetônica do italiano Antonio Landi 40 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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em 1766 e alvo de restauro pontual no anos 1990 e 2000, dessa vez passou por um período de reparos equivalente à sua dimensão religiosa e simbólica. Com o patrocínio exclusivo da Vale, via Lei Rouanet e recursos próprios, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - Iphan, em parceria com o setor de Obras Sociais da Arquidiocese de Belém e Salesianos do Carmo, puderam executar a restauração e conservação da igreja, além da Capela da Ordem Terceira e da Capela de Adoração. Os trabalhos levaram dois anos para serem concluídos, de 2013 a 2015, um tempo considerado curto dado à grandeza da obra, segundo a presidente do descoberta a cada camada

O mestre artífice em restauro Jodair Velozo veio da Bahia para trabalhar na intervenção do Carmo. Para ele, a experiência foi única.


Iphan, Jurema Machado, que esteve na capital paraense na reabertura da igreja, em 23 de março deste ano. Segundo a superintendente do Iphan no Pará, Maria Dorotea de Lima, a Igreja do Carmo, tombada em 1941, “é um marco colonial do território brasileiro e traz as características barrocas dos templos religiosos, que demarcaram território aqui e em todo o Brasil. É nossa atribuição legal esse acompanhamento de restauração e conservação a fim de assegurar a preservação desses bens”, explica a arquiteta. Durante a reforma, a Vale também investiu no projeto educativo “Visitação às Obras do Carmo”, com a finalidade de aproximar a comunidade do trabalho de restauração do templo, ampliando o conhecimento sobre a igreja. Universitários dos cursos de Arquitetura e Engenharia Civil e jovens moradores da Cidade Velha foram capacitados para serem monitores do projeto. “Esta foi uma obra realizada de portas abertas. Durante quatro meses, cerca de mil pessoas, moradores de Belém e turistas, tiveram a oportunidade de

conhecer a história desse importante patrimônio e de vivenciar o processo de restauração de uma construção histórica”, discursou o diretor de Energia e Institucional Pará, da Vale, João Coral, durante a solenidade de entrega da Igreja do Carmo. “Para os universitários, foi uma oportunidade de incrementar o currículo e ganhar novos conhecimentos dentro de suas áreas. Para os jovens da comunidade foi uma oportunidade de se tornarem agentes de preservação da Igreja e de disseminação da cultura, além de uma alternativa viável de geração de renda”, completou.

ESFORÇOS

Com o financiamento do projeto de restauração e conservação da Igreja do Carmo aprovado, o primeiro passo foi a fase de prospecção, que detecta quais são as principais medidas a serem tomadas durante a intervenção. “Você vai tirando camada por camada até chegar a base da superfície estudada. Então fizemos a prospecção do altar e vimos que tinha um douramento por baixo da camada de tinta

para todos

A reabertura do templo contou com a participação dos fiéis, apresentação musical das crianças e jovens do programa Vale Música, e presença de representantes da Arquidiocese de Belém e do Iphan regional e nacional. Acima, o diretor de Energia e Institucional Pará, da Vale, João Coral, destacou a disseminação da cultura no Estado por meio da restauração da Igreja do Carmo.

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ASSUNTO DO MÊS

branca. Retiramos toda a pintura branca e olha aí o que tinha por debaixo! Olha a beleza desse retábulo, todo em ouro!”, sorri Jodair Velozo, apontando para o altar, tão feliz e surpreso como se ele próprio tivesse presenciado a subida de Jesus Cristo aos céus. Além da revelação do douramento do altar-mor, foram encontradas duas imagens de madeira de Santa Tereza D’Ávila, que estão em processo de restauração por conta do avançado estado de deterioração. “Elas sofreram muito com os ataques de cupins. Agora nosso trabalho é recuperar

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e fortalecer a estrutura, por isso usamos pó de serragem ou madeira, misturados à cola nas partes internas. Quando são áreas mais profundas nós utilizamos madeira, de preferência o cedro, porque é mais leve e também pode ser utilizado para restaurar a base da imagem”, explica a restauradora Tânia Veloso, que trabalha em um ateliê montado na igreja. Segundo Tânia, a imagem de Santa Tereza D’Ávila, que foi uma freira carmelita, ilustra várias técnicas utilizadas no Barroco, estilo bastante difundido por italianos entre os séculos XVI e XVIII. A peça é


detalhes cheios de cultura

A restauração minuciosa da Igreja do Carmo traz à tona uma parte da história de Belém ligada aos primeiros anos de fundação, além da religiosidade herdada dos primeiros portugueses que ajudaram a construir a “cidade do Pará” na Amazônia

completamente banhada em ouro, algo comum para o movimento artístico. Possui olhos de vidro, dentes aparentes e aplicações diversas de policromia, como os esgrafiados, pontilhados raspados para revelar o ouro embaixo, e a punção, um volume feito para imitar um bordado. “É uma peça valiosa, que vale a pena ser recuperada pelas características artísticas”, conclui a restauradora. Após a prospecção da equipe técnica, os esforços se concentraram na cobertura do telhado, que apresentava muitas infiltrações, comprometendo toda a estrutura de sustentação da edificação. Então, o telhamento de cerâmica foi substituído completamente, além da implantação de um sistema de canalização para água da chuva não invadir a área interna. Também foi feita uma limpeza nas torres e cúpulas, tomadas pela vegetação. O projeto executivo objetivou conservar as características arquitetônicas e artísticas mais relevantes do conjunto edificado, com destaque para a cobertura, limpeza da fachada, restauração de pinturas, revisão do sistema elétrico, instalação de sistema de segurança e de combate à incêndio.

INTERVENÇÃO

O arquiteto do Iphan Giovani Blanco Sarquis atenta para o fato de que a restauração não é necessariamente um re-

juvenescimento. “Nessa obra percebeuse que a superfície da fachada também deveria ser objeto de uma limpeza, mas não com objetivo de torná-la uma fachada nova. Logicamente que quando as estruturas são antigas você precisa fazer uma intervenção para mitigar o dano, mas ainda sim deixar uma aparência de antiguidade. Então a fachada passou um trabalho especializado para retirar manchas causadas pela poluição, com objetivo de reverter esse tipo de dano e não reverter a idade, que sofre um desgaste natural pela ação do tempo”, explica. Adma Lopes, coordenadora técnica da obra, pontua que o Iphan também atuou em parceria para trabalhos mais especializados, por exemplo. “Na fachada, piso e tijoleiras, nós pedimos o apoio da Universidade Federal do Pará por meio do Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação (Lacore), da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, que realizou os testes laboratoriais para saber que material deveríamos utilizar”, diz. Outro aspecto importante dentro da teoria do restauro é que ela é moldada de acordo com a época em que é feita e em sintonia com as intenções da organização. Na Igreja do Carmo, a intervenção resultou dos estudos históricos sobre a evolução do edifício e suas transformações ao longo do tempo. “O douramento, os detalhes você consegue perceber muito mais quando os tons aplicados nas superfícies da parede e do teto são neutros. MAIO DE 2015

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ASSUNTO DO MÊS

em tempo de recuperação

A imagem de Santa Tereza D’Ávila está sendo restaurada emum ateliê montando dentro da Igreja do Carmo. A peça reúne várias técnicas utilizadas no período Barroco, estilo bastante difundido por artistas italianos entre os séculos XVI e XVIII. Abaixo, o arquiteto do Iphan Giovani Blanco Sarquis e a coordenadora técnica da obra, Adma Lopes, que participaram do projeto de restauração do templo católico.

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Aqui o processo de restauração procurou dialogar com o que já havia sido feito em outros bens e percebeu-se que retomar esses tons seria o mais pertinente, haja vista que eram tons que dialogavam mais com o projeto inicial”, comenta Giovani. As limitações da ação do tempo também se impõem ao projeto de restauro. Por exemplo, na Igreja havia uma representação da vida de Dom Bosco, mas quando os técnicos fizeram os estudos perceberam que existia uma representação mais antiga por debaixo dessa passagem que era mais fácil de ser restaurada. E não existia nenhum registro dessa pintura que pudesse mostrar como ela era. Então entenderam que era melhor retornar à pintura mais antiga. Ou seja, a equipe se utiliza de camadas não tão antigas, mas que estejam mais nítidas para o recuperação. Também há o cuidado com o chamado “falso histórico”, que é uma suposição sobre o original. “Quando há lacunas você opta por mantê-las. A ausência de referência é um limitador para que você dê um passo à frente

no sentido de recompor algo que não existe mais. Na falta desse registro, que pode ser documental, fotográfico ou uma fonte primária então obviamente você não segue adiante. Você interrompe o processo. Um exemplo é uma pintura inacabada, se você não tem uma clareza de como seria o prosseguimento daquela pintura então você não segue adiante”, esclarece Giovani Blanco Sarquis. Mesmo com a intervenção recente, a manutenção permanente do espaço da Igreja do Carmo é necessária para conservação do patrimônio histórico. “Não adianta você restaurar o patrimônio sem uma solução de gestão e de uso porque vai se deteriorar muito rapidamente. Por isso, o espaço também pode ser ampliado para determinadas atividades que não conflitem com o uso religioso, como apresentações musicais, visitação e uma série de usos para ampliar a apropriação social”, sugere Maria Dorotea, do Iphan. Ela destaca que a gestão deve ser um processo permanente, como parte das políticas de governo, para que o


monumento seja um indutor de revitalização. “Na Estação das Docas, por exemplo, percebe-se uma apropriação com o tempo de uso. Isso acaba iniciando um processo de revalorização nas áreas. A ideia não é simplesmente se tornar um espaço turístico, mas um local em que a população se aproprie dessa parte da cidade de grande potencial simbólico e econômico”, afirma.

visitas

Até o dia 30 deste mês, visitas guiadas à Igreja do Carmo, com apoio da Vale, em parceria com a Arquidiocese de Belém, os Padres Salesianos e o Iphan, ajudam a conhecer o valor cultural desse patrimônio. Dois mediadores, moradores da comunidade no entorno do prédio religioso, qualificados no projeto “Visitação às Obras do Carmo”, criado em 2013, estão disponíveis para atender ao público que chega ao templo. Às vésperas de completar 400 anos, Belém abre mais um caminho para a sociedade conhecer e contemplar um acervo edificado pela História, construído ao longo do tempo com barroco português, recriado com arquitetura italiana e assentado na religiosidade paraense. A Igreja do Carmo é documento vivo, patrimônio que merece afeto e cuidado para que a conservação e a promoção do espaço rico de sentido espiritual possa se perpetuar em plenitude cultural.

Serviço As visitas guiadas à Igreja do Carmo são realizadas de terça a sexta, das 9 às 11h e das 15 às 17h. Aos sábados, das 9 às 11h. Informações e agendamentos pelo (91) 3085-6438. A entrada é gratuita.

IGREJAs DENTRO DA IGREJA

As capelas da Ordem Terceira e da Adoração também passaram por um processo de restauro patrocinado pela Vale MAIO DE 2015

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comportamento SuStentÁVel

BúFALOS MELHORES E SAUDÁVEIS UNIvErSIdAdES INvESTEM EM PESQUISAS GENéTIcAS PArA AUMENTAr A PrOdUçÃO dE bUbALINOS NA rEGIÃO. cOM ISSO, cIÊNcIA, SUSTENTAbILIdAdE E EcONOMIA SE FOrTALEcEM NO PAíS. TEXTO ArNON MIrANDA

A

daptável. Essa qualidade define o búfalo em territórios paraenses como nenhuma outra. O animal encontrou, especialmente no arquipélago do Marajó, o ambiente ideal para sua vivência e ampla reprodução. Foi logo aceito e tornado símbolo da cultura local. Do animal é aproveitado tudo. Na vida adulta garante tração, transporte, leite para a produção de queijo, além de fornecer a carne e o couro.

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Pensando em melhorar a produção de búfalos e seus derivados no Pará, um grupo de doutores em reprodução animal da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) e da Universidade Federal do Pará (UFPA) vem trabalhando com uma pesquisa em melhoramento genético de bubalinos através de biotécnicas de ponta, como a inseminação artificial e a inseminação em tempo fi xo. Agora os doutores trabalham para serem os primeiros a fa-

zer nascer um bezerro bubalino a partir da técnica de fertilização in vitro de forma comercial. O interesse no melhoramento genético de búfalos tem explicação. Com vantagens como a carne mais saudável em relação à bovina e um leite com menos colesterol, o búfalo é bem visto por pecuaristas de todo País. O Pará leva vantagem por abrigar o maior rebanho brasileiro. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia


fotos ascom ufra

e Estatística (IBGE), em 2011, dos mais de 1,2 milhão de búfalos no Brasil, 38% estavam concentrados no Estado. A necessidade de aplicação de biotécnicas de melhoramento genético em reprodução de bubalinos já se mostrou necessária logo no ano seguinte. Em 2012, o efetivo de búfalos caiu 1,3% no país, sendo que na região Norte essa queda foi de 1,4%. Está previsto para outubro deste ano que o IBGE divulgue o resultado da Produção da Pecuária Municipal de 2014, que mostrará dados mais recentes sobre o rebanho bubalino. Essa queda pode ser reflexo do que apontou um dos representantes do grupo de trabalho responsável pela pesquisa em reprodução de búfalos, o médico veterinário Sebastião Tavares Rolim Filho, doutor em Reprodução Animal e professor da Ufra. “Apesar de o nosso rebanho ser o maior do Brasil, nós não temos ainda um rebanho com qualidade tão boa. O grande problema da cultura da nossa região é o manejo. Como o do nosso rebanho é extensivo, temos dificuldade de achar animais de qualidade genética elevada”, diz. “Na Ilha do Marajó, por exemplo, há búfalos criados em fazendas enormes, sem cuidado nutricional e sanitário. Isso diminui mais a possibilidade de se conseguir animais que realmente tenham genética superior para se desenvolver. Em outras regiões, como São Paulo e Minas Gerais, os animais são criados com manejo adequado. Com isso, eles conseguem ter animais de qualidade superior à nossa”, completa. Para Tavares, há vários fatores que influenciam a técnica de reprodução de búfalos. Um deles é conseguir animais com genética superior, como touros reprodutores com descendentes e ascendentes de alta produção de carne e leite. Outro fator que dificulta a garantia de qualidade na reprodução é que as próprias búfalas produzem uma quantidade menor de oócitos (gametas reprodutores femininos) que as vacas. Consequentemente, elas produzem menos embriões. “Além disso, os meios que

reprodução em alta

O médico veterinário Sebastião Rolim (de boné) afirma que é preciso melhorar a qualidade do rebanho bubalino. Mas o Estado está no caminho certo.

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COMPORTAMENTO SUSTENTÁVEL

se usavam para cultivar esses oócitos em laboratório eram os mesmos que os usados para bovinos, então estamos tentando adaptar esses meios aos bubalinos”, diz o professor da Ufra.

Para Sebastião Tavares, as biotécnicas aumentam em praticamente 100% a lucratividade do produtor. “Quando é utilizada a biotecnologia, seja ela inseminação artificial, inseminação em tempo fixo ou fertilização in vitro, consegue-se alavancar essa produção, porque usa animais que têm produtividade mais elevada”, afirma. Assim, os animais doadores servirão como um meio para aumentar a produção. Todo processo dura aproximadamente três anos, entre a gestação da búfala, que leva dez meses, e o crescimento do animal. As biotécnicas de reprodução surgem como uma ferramenta para viabilizar uma produção maior em áreas menores. Tanto a biotecnologia de ponta, quanto a básica, como o manejo, rotação e adubação de pastagem, uso de sal mineral e a alimentação adequada do rebanho geram custos que, segundo o professor Sebastião Tavares, são minimizados com o aumento da produção local. O problema apontado pelo pesquisador é a falta de entendimento, pois o produtor muitas vezes não tem acesso a essas tecnologias ou não tem conhecimento adequado para usá-las. “Eu acredito que a única forma de produzir de forma sustentável é aumentando a produção, desde que se use biotecnologia. Se um fazendeiro tem uma área de mil hectares com mil cabeças de gado, ele consegue produzir essa mesma quantidade de gado em 200 hectares. A partir do momento que a nossa pecuária, seja bovina ou bubalina, utilizar essas tecnologias de 48 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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fotos ascom ufra

RENDIMENTO

forma mais adequada, a gente vai poder aumentar nossa produção sem ter que derrubar uma árvore”, aposta.

“Acredito que a única forma de produzir de forma sustentável é aumentando a produção, desde que se use biotecnologia” Sebastião rolim

Pesquisador da Ufra


MUDANÇADEATITUDE reprodução

roberta brandão

BONS EXEMPLOS

Visite um brechó perto de você Aprender a utilizar o objeto de consumo a nosso favor, com produtos e serviços de

Por uma voz mais ativa

Em 2008, Patrícia Ferreira tocava em uma banda de uns amigos, que, além das apresentações e shows, já ensaiava o que viria a se tornar o projeto Voz Ativa. O grupo funcionava como um ponto de apoio e ferramenta para o desejo que ela tinha de juntar suas duas grandes motivações, a música e a vontade de ajudar o outro. “Até o nome Voz Ativa, trecho de uma música de Chico Buarque, tem a ver com esse universo musical, muito importante para mim”, conta Patrícia, ressaltando que a intenção no começo do projeto era fazer ações sociais que envolvessem shows beneficentes e oficinas de música para crianças da periferia. Hoje, ainda com certo espanto, ela admite que as coisas mudaram de rumo e ganharam uma proporção maior do que a esperada. “Ainda nesse começo nós cobrávamos, como ingresso, alimentos não perecíveis

e doávamos para creches, por exemplo. Mas um dia a banda acabou e aí foi que surgiu de fato o que hoje é o projeto social Voz Ativa”. Mesmo sem tocar mais os integrantes da banda não conseguiram deixar de lado o que já tinham começado e o projeto ganhou corpo e novos integrantes. Agora, além de arrecadar alimentos, o Voz Ativa passou a visitar comunidades desenvolvendo atividades durante todo o ano, em datas como Páscoa, Natal e Dia das Crianças, levando roupas, material escolar e brinquedos. “Para esse ano, nós já conseguimos desenvolver um calendário que inaugura uma nova fase do Voz Ativa, que é de ministrar oficinas nas comunidades onde atuamos. Música, caratê, informática, redação”, diz Patrícia. Uma dessa comunidades é a Nossa Senhora do Carmo, em Benevides. O trabalho só foi possível graças ao número de pessoas que foram se somando

ao projeto. “A princípio era eu, Ivan Gadelha, e as minhas irmãs Sandy e Evelyn”, lembra Patrícia. Os amigos foram conhecendo a ideia e se juntando e chamando outros amigos e hoje o núcleo fixo do Voz Ativa tem 16 pessoas, e durante as ações esse número chega a dobrar. Para ela, o que torna as ações possíveis é justamente essa colaboração, mesmo de quem não é do cotidiano do grupo. “A nossa realidade da infância era a mesma realidade dessas crianças que encontramos com o Voz Ativa. Então, a gente cresceu e pensou: ‘agora podemos ajudar elas, do mesmo jeito que nos ajudaram quando éramos criança”, confessa Patrícia. E assim, por quase oito anos o Voz Ativa tem ecoado por aí, se fazendo ouvir pelas meninas e meninos das comunidades atendidas e mostrando que se reconhecer no outro é passo fundamental para promover a transformação social.

maneira diferente e criativa, se torna cada dia mais necessário. Sendo assim, a moda comprada em brechós, que incentiva o reaproveitamento e a reciclagem ganha cada vez mais adeptos pelo mundo. Mas afinal, como consumir de forma sustentável? A alternativa que a Internacionalista Tienay Costa, de 24 anos, encontrou para evitar cada vez mais o consumo foi montar o próprio bazar. Ela conta que o “Bazar da Tica” já está funcionando de forma on-line há sete meses e que a procura é crescente. “As pessoas estão perdendo cada vez mais o preconceito de comprar roupas usadas. É sustentável, pois você se desfaz de coisas que são boas, mas que estão guardadas e sem uso. Sem contar que é uma fonte de renda alternativa para quem vende. Todos ganham”. Doar as roupas usadas para brechós e bazares significa compartilhar com a comunidade e promover a reutilização. Outra opção interessante é encaminhar as peças que não estão mais sendo usadas para instituições de caridade, onde essas roupas serão de grande utilidade. Um exemplo disso é a Oxfam, uma organização não governamental britânica. Foi ela que ajudou a popularizar as lojas de caridade que vendem de tudo sem comprar nada para o estoque, ou seja, trabalham com base na solidariedade da população para arrecadar bens como roupas, livros, discos e móveis. Revendem a baixo custo e, dessa forma, revertem os lucros em ações sociais e sustentáveis.

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Vida em comunidade

CARIMBÓ NA PRAIA dOcUMENTárIO MOSTrA A vIdA SIMPLES E A ObrA dOS MESTrES dO rITMO NA ILhA dE ALGOdOAL

O

GENUINAmENTE DO PARÁ

O documentário “Mestres Praianos do Carimbó de Maiandeua” apresenta os artistas carimboleiros anônimos do nordeste paraense

TEXTO VICTOr fUrTADO

carimbó se tornou patrimônio cultural imaterial do Brasil em setembro do ano passado, após nove anos de campanha. Sete meses depois, várias iniciativas buscam esse reconhecimento e fomentar a arte imortalizada pela “trindade carimboleira” dos mestres Cupijó, Verequete e Lucindo. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) estima entre 100 e 150 grupos de carimbó em todo o Pará. Uma das áreas que reúne uma tradicional linha do carimbó, a praiana, é a ilha de Maiandeua, a conhecida Algodoal, no município de Maracanã, nordeste pa-

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raense. A vida das comunidades que respiram o ritmo paraense é tema do documentário “Mestres Praianos do Carimbó de Maiandeua”. Mais do que as músicas, o trabalho gravado nas comunidades Fortalezinha, Camboinha e 40 do Mocooca busca promover o acesso à rica cultura e modo de vida simples dos mestres do ritmo típico do Pará. Na ilha de Maiandeua, ele é tocado com instrumentos de pau e corda, tambor, maraca, reco-reco, banjo e violão, sendo considerado um “carimbó puro”. As melodias dançantes são acompanhadas de

letras sobre o cotidiano social, econômico e cultural das comunidades. Qualquer coisa pode virar música: uma pescaria, uma fruta, um habitante da ilha, o imaginário popular e um dos temas universais da música, o amor. A música é bem rústica e artesanal. As vozes roucas e emboladas, mas cheias de empolgação dos mestres carimboleiros acabam sendo imitadas pelos mais jovens, mesmo que com timbres de voz mais audíveis e melhor dicção. Mestre Chico Braga, de 65 anos, é a principal referência para as comunidades de Algodoal. As pesquisas do projeto o indicam como uma influência de seguidas


gerações. Os depoimentos dele são fortes e apaixonados pela arte. “Onde tem metal, não é mais carimbó. Carimbó é pau e corda”, declara ele, autor de mais de 260 músicas. Mais do que falar, prefere cantar: “A praia de Algodoal é linda e tem riqueza. No farol do Maiandeua, onde mora a princesa, já ouvi a princesa falar, já ouvi a princesa cantar. No morro de Maiandeua, na praia de Algodoal”. A famosa ilha paraense é também citada por muitos dos mestres praianos como “Algodoar” para manter a rima e também o regionalismo linguístico. O fonema “al” vira “ar” novamente na voz do mestre Montana, quando canta: “Mamãe eu vou lá para ‘Algodoar’ passear na praia e tomar banho de mar”. “Mestre Chico Braga, que com sua sabedoria e modo de vida simples e selvagem, dá exemplo e referências culturais além de seu limite geográfico a várias gerações. A poesia do carimbó e de culturas populares é ferramenta oral de transmissão de saberes para manutenção destas populações e seus modos de vida tradicionais”, explica uma das produtoras do documentário, Cris Salgado. Apesar do título nobre, ser mestre não envaidece nenhum dos praianos retratados no documentário. A maioria vive de maneira muito simples e não pensa em mudar de vida. Aquela realidade é o que os faz ser o que são e produzir o que produzem. O cientista social Pierre Azevedo, produtor e pesquisador do documentário, observa que as comunidades vivem na simplicidade, pois é uma região de praias, com economia baseada em pesca, agricultura, pequenos comércios e turismo. Para se ter uma ideia, casas de muitos dos mais respeitados mestres é em barro ou madeira. “Chico Braga, por exemplo, afirma que vive como quer. E se mudar algo ou ele

deixar de fazer o que faz, vai morrer. Todos vivem o carimbó, mas a maioria não vive do carimbó”, ressalta o pesquisador. A “Princesa” é uma dos símbolos mais cantados e conhecidos de Algodoal. Diz a lenda que dois pescadores estavam numa praia quando surge uma bela mulher. Eles comparam a beleza da moça à de uma princesa. Da mesma forma misteriosa que veio, desapareceu. Hoje esse local é conhecido como “Praia da Princesa”. O encontro virou carimbó, assim como quase qualquer evento é um bom motivo para reunir a comunidade, tocar e cantar músicas tradicionais. Nessas reuniões é que surgem novas obras. “O carimbó faz parte do cotidiano da ilha. São tradições e costumes que começaram com os pais e avós dos mestres, mostrando uma música ancestral, de miscigenação cultural e étnica, misturando música africana e indígena. É passada oralmente e tem sido esquecida pela falta de registros. Muitas letras não estão registradas em lugar nenhum”, explica Pierre Azevedo. Quando pega num banjo e começa a cantar, Francisco dos Santos Dias, de 41 anos, se torna o Mestre Zezinho, um dos discípulos do Mestre Chico Braga, seu pai.

O CANTO DA EXPERIÊNCIA

Os mestres Montana (acima) e Chico Braga são detentores de um conhecimento secular sobre o carimbó de Algodoal

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VIDA EM COMUNIDADE

“Foi muito bom participar desse documentário e esperamos que ele mostre o carimbó para o resto do País, que mal o conhece” Mestre Zezinho, Compositor da ilha de Maiandeua

Começou aos oito anos, quando fez a primeira apresentação. Mas o trabalho e as responsabilidades de chefe de família o afastaram da arte que lhe rendeu 16 músicas autorais. Em 2005, junto com o início da campanha pelo reconhecimento como patrimônio cultural nacional no Estado, resolveu reunir um grupo novamente. Começou com mais três amigos e hoje, com oito pessoas, o grupo Nativos do Canal já tem dois discos gravados e um hit, a música “Zezinho, Traz a Canoa”. A iniciativa rendeu a formação de mais dois grupos, o Regional e o Nativo Jovem, que nasceu da Casa Cultural de Carimbó, projeto que já vai completar um ano em julho e tem reforçado a difusão do ca-

expectativa

Mestre Zezinho (à direita) e tantos outros da ilha de Maiandeua esperam o fortalecimento e o respeito do carimbó Brasil afora

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rimbó na ilha. “Foi muito bom participar desse documentário e esperamos que mostre o carimbó para o resto do País, que mal o conhece, e para todo o mundo, pois muita gente não faz ideia que exista essa cultura aqui no Pará. É o que espero com o reconhecimento do carimbó como patrimônio cultural do Brasil para os próximos cinco anos”, conclui Mestre Zezinho.

totalmente disponível na internet. Por enquanto, só foi exibido, em abril, nas comunidades de Algodoal. O teaser pode ser visto no YouTube, com pouco mais de dois minutos dos 15 minutos totais. A direção é de Artur Arias Dutra.

SAIBA MAIS Veja um trecho do documentário “Mestres Praianos do Carimbó de Maiandeua”

REGISTRO

Os autores de “Mestres Praianos do Carimbó de Maiandeua” ainda estão difundindo e inscrevendo o documentário em festivais e mostras. Logo deve chegar no circuito alternativo de Belém. Até o final do ano, deverá estar

USE um leitor de QR Code no seu celular ou tablet com o código ao lado para ver o vídeo


ARTE, CUlTURA E REFLEXãO DIVULgAÇãO

PEnSElIMPO

CANçÃO DO PARÁ O CANTOR E COMPOSITOR RAFAEL LIMA COMPLETA 30 ANOS DE CARREIRA E LANçA SEU NOVO DISCO, “NÔMADE” PÁGInA 54

TEATRo Seja nos palcos ou nas ruas de Belém,

PInTURA o artista plástico andrelino cotta

CIÊnCIA A difusão científica precisa de novos

a trupe perifeérica mistura realidade e fantasia em suas apresentações cênicas. PÁG. 58

nasceu em cametá e revolucionou a forma de pintar as paisagens amazônicas. PÁG.60

espaços na sociedade e na mídia para que as pesquisas sejam mais conhecidas. PÁG.66

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DEDO DE PROSA

cabano universal O cantor Rafael Lima lança seu novo disco, “Nômade”, para celebrar 30 anos de carreira expressando em letra e música seu apelo por uma sociedade amazônica melhor TEXTO Abílio Dantas FOTOS carlos borges

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A

A chuva caía sem trégua no Bosque Rodrigues Alves, numa manhã de Belém. O som da água entre as folhas lembrava o barulho de um igarapé passando levemente sob as matas amazônicas. Sentado na escadaria de um coreto de pedras, após a sessão de fotos, um homem magro de violão a tiracolo e cabelos longos lembrava sua vida com calma e concentração. Quem passava pelo local talvez não soubesse, mas estava diante de um dos artistas paraenses mais originais e incisivos da nossa cultura. Rafael Lima é cantor, compositor, arte-educador e coordenador do Jaco Fest, importante festival de jazz de Belém. No entanto, gosta de se definir simplesmente como músico. Conhecido internacionalmente desde 1994, quando se apresentou com destaque no Festival de Montreux, na Suíça, durante a inauguração da sala Miles Davis, Rafael lança este ano seu sexto disco, “Nômade”, o primeiro gravado inteiramente no Brasil, que traz 12 músicas inéditas. Na entrevista a seguir, ele fala sobre o novo trabalho, os primeiros anos de sua trajetória e a importância de conhecer e respeitar a história da nossa região. Você tem 30 anos de carreira, seis discos gravados e muita história para contar. Quando começou a vontade ou a vocação de seguir a música como um caminho? Eu vivia cantando em casa. Quando entrei no colégio primário das minhas tias, eu era colocado para cantar nas festas de fim de ano sempre, mas não gostava (risos). Gostava de cantar em casa, mas não de me apresentar. E a minha mãe também cantava em casa, não profissionalmente. Perdi meu pai muito cedo, quando tinha três anos. Minha mãe criou os três filhos. Das poucas reMAIO DE 2015

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DEDO DE PROSA

cordações que tenho do meu pai é tocando violão, cantando e de fotos em que ele está rodeado de amigos no Bar São Jorge. Depois, a primeira apresentação que fiz foi no programa da Terezinha Vieira. Era um programa de auditório ao vivo na TV Marajoara, canal 2. Eu devia ter uns sete ou oito anos de idade. O microfone era daqueles grandes, que o cara segurava e quando ele andava você tinha que ir atrás. Quando ele fez isso, eu fiquei parado, eu não fui atrás (risos). Diziam que eu tinha uma voz poderosa, então eu fiquei cantando e mandando ver, até que o cara voltou. Eu não gostava de ensaiar, pois tinha muita segurança para me apresentar, não era tímido. Abria a boca e saía cantando como fiz na televisão ao vivo. Você decidiu continuar cantando na adolescência e seguir em frente. Meu irmão Macário (Macário Lima), quando eu estava com 15 para 16 anos, escreveu uma peça de teatro chamada “Da pedra à tanga” e me colocou no palco pela primeira vez. Eu era o protagonista, ele ficava tocando e eu cantava. Eu procurava as coisas por causa da música. Procurei o Grupo de Teatro Experiência porque eles faziam musicais e eu queria cantar. O Geraldo (Geraldo Sales, diretor de teatro) dizia: “Mas você é bom ator”. Eu acabei fazendo duas peças com ele: “O Andrógino” e “O Pássaro da Terra”. Mas o meu negócio era música. Fiz vestibular para a Escola de Teatro por causa da dicção. Eu queria estudar dicção e articulação. Com 20 anos, eu me sentia a pessoa mais feliz do mundo. Vamos saltar para o presen56 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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te. O “Nômade”, disco que você está lançando este ano, é o seu sexto trabalho, o primeiro gravado todo no Brasil. Como se deu a realização dele e a escolha do nome? O “Nômade” é um pouco eu, essa coisa de viver em vários lugares e todas as minhas estradas. Comecei a gravar esse disco há seis anos na Suíça. Depois não deu certo, o produtor deu uma pirada em um sentido não muito legal. Então todo o material que eu gravei ficou lá com ele. Em uma das minhas passagens por aqui, o Ná Figueiredo (produtor cultural) me convidou para fazer um disco. Aí começamos. Eu tinha muito material, dava para fazer dois CDs. Fizemos uma seleção, peguei as canções que estavam na Suíça e comecei a gravar tudo desde o começo. Demorou muito tempo. O processo foi de final de 2009 até 2014. Foi tudo muito legal, muito curtido, muito bem feito. Podemos dizer que o “Nômade” é o resultado de composições de várias épocas? Sim, com certeza. Mas todas são inéditas. Não gosto de repetir música. O mais bacana é poder reunir uma moçada de músicos que está em Belém. Gosto de estar com esses músicos. Eu canto mas gosto de me considerar músico. Embora eu não seja virtuose, eu estudo para tocar as minhas músicas, que não são muito fáceis de tocar. Como ocorreu a ida para o Canadá e para a Europa, até a gravação do primeiro disco? Saí de Belém em 1984 para São Paulo. Eu era concursado do Banco Central. Mas já entrei no banco com um pé na música. Fiz o Projeto Pixinguinha e abria os shows do cantor Belchior. Depois de três

“ A Cabanagem ainda não foi recontada de uma maneira correta. Tento, de uma certa forma, sempre colocar a nossa realidade dentro da música porque a Cabanagem é a minha realidade.” VEJA Assista um trecho da apresentação de Rafael Lima no Festival de Montreux, em 1994

Aqui, o compositor cantando “Cantilena”, do seu novo disco, “Nômade”

anos em São Paulo resolvi ir embora para o Canadá. Saí de férias e não voltei mais. Lá, comecei a me profissionalizar mesmo. Mas ralei bastante. Fui até para construção civil, lavei prato. Até que me chamaram para tocar em uma casa noturna imensa, conceituadíssima, Bamboo Club, onde já tinham tocado Egberto Gismonti, Hermeto Pascoal, Paquito D’Rivera e tantos outros da pesada. Foi meu primeiro show no Canadá. Você tem uma preocupação nas suas letras com a vida e a história da nossa região. É o caso da música “Cantilena”, que está no “Nômade”, e trata da Cabanagem. A Cabanagem ainda não foi recontada de uma maneira correta. Tento, de uma certa forma, sempre colocar a nossa realidade dentro da música porque a Cabanagem é a minha realidade. Sinto uma boa obrigação de fazer isso. “Cantilena” é uma espécie de relato, como se um avô estivesse contando a história para a neta. Nada melhor que lembrar


divulgação

de nomes como o Dalcídio Jurandir, que sempre foi um defensor da Amazônia e da Cabanagem. A Cabanagem, no nosso contexto amazônida, serve para você se conhecer um pouco, porque ninguém conhece a nossa história na Amazônia. Por isso que digo assim (cantarolando Cantilena): “Já se vão quase uns 200 anos/ coisa que já nem se ouve mais falar”. Não acho que a música paraense tem que passar só pela gastronomia. Uma coisa que acho válida é você resgatar a nossa linguagem da Amazônia, não forçar a barra. Como funciona o seu projeto de educação musical “Violão Cidadão por uma Cultura e um Canto de Paz”? Inscrevi um projeto no Ministério da Justiça, junto com a Andréa Andrade, e foi aprovado. Era uma verba pequena, dava para trabalhar só uns seis meses. Fomos para o Guamá. Com o dinheiro, comprei

uns 15 violões para ficar lá na comunidade e, depois, quando não conseguimos renovar o apoio, continuamos a trabalhar de forma independente. Aí o pessoal do Espaço Nossa Biblioteca (da comunidade do bairro) me chamou para conversar. Então eu e a Andréa reescrevemos o projeto e eles aprovaram no Criança Esperança. Mas no início do ano, eles não conseguiram renovar. Foi uma pena porque já estava há dois anos com um grupo crescendo, que é essa meninada que eu já comecei a levar para tocar nos lugares, na TV Cultura, no teatro Waldemar Henrique. É uma turma de 20 pessoas, se quatro ou cinco forem fazer música vai ser muito bacana. Estamos conversando para tentar continuar no espaço do Coletivo Casa Preta. Você é também organizador do festival de jazz contemporâneo Jaco Fest, que trouxe a Belém no ano

passado nomes importantes como Egberto Gismonti e a banda Isca de Polícia. Como surgiu a ideia? O Jaco Fest existe na minha cabeça há mais de 15 anos. Na prática, só há dois. Quando o meu filho nasceu, que se chama Jaco, em homenagem ao Jaco Pastorius (baixista de jazz norte-americano), eu decidi que iria fazer o festival. Decidi parar mais em Belém, faz três anos que não viajo, para ficar mais perto do meu filho e vi que poderia fazer. Escolhi o nome Jaco: Jazz da Amazônia Contemporânea Festival. Aprovei duas ou três leis na primeira vez mas não conseguimos captar e fomos fazendo na marra. O primeiro ano foi 2012, não consegui fazer em 2013, fiquei pagando as dívidas (risos). Trouxe primeiro o Omar Sosa (músico cubano), o Bocato (trombonista) e a moçada daqui que é muito boa e competente. Aqui é terra de baixistas, por isso que o festival se chama Jaco!

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solto no mundo

Rafael Lima morou anos fora do Brasil, onde pode mostrar seu talento amazônico para novos públicos e críticos

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ARTE PESQUISADA

No mundo da fantasia A TRUPE PERIFEÉRICOS USA O TEATRO COMO FERRAMENTA DA LIBERDADE DE PENSAMENTO AO CONVIDAR A PLATEIA A ADENTRAR NUM UNIVERSO IMAGINÁRIO NA AMAZÔNIA TEXTO ArNON MIrANDA FOTO rOBErTA BrANDÃO

I

magine você andando pela praça Batista Campos e vê um grupo de “ciganos mascarados”. Em seguida, aquele estranhamento o abraça imediatamente e eles farão de tudo para você entrar em um mundo mágico e conhecer suas histórias fabulosas. É assim que os atores mambembes de teatro Trupe Perifeéricos atuam. A rua é o palco para aflorar os pensamentos mais íntimos e os devaneios mais criativos desses artistas. Agora imagine você, no meio da maior metrópole da Amazônia, conhecer através desses atores a ira, as paixões e as traquinagens de duendes, ninfas, faunos, zombeteiros e demais seres, que, mesmo interpretados ali, na sua frente, ganham forma e características fi nais só suas. É esse o cartão de visitas ao mundo feérico que a trupe apresenta nos pontos turísticos de Belém. Eles buscam dar vida a seres inanimados, como a luz, as sombras e o vento. 58 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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O público só percebe o sentido delas através de um desprendimento pessoal, de não se levar tão a sério e pegar carona para outro mundo. “Por ser um teatro que acontece na rua, na maioria das vezes, ele exige um contato maior com o público e exige também saber como dominar a cena nesse espaço, que é muito barulhento e que sofre várias intervenções. Por isso é fundamental ter o domínio do público, porque você se expõe mais, tem risco de ser assaltado, tem o perigo de um cara bêbado te atacar, como já aconteceu. A rua exige malícia do ator, afi nal ela também é o espaço do ladrão, rola um pouco de atrito, de negociação”, explicou o ator Rafael Couto. “A gente sabe que tem um risco, e não fazemos isso pensando no pior. A gente joga com o que acontece. Uma vez um homem tentou brigar com o Rafael, porque queria saber o meu nome. Ele virou inimigo do Rafael. E quem contracenava comigo ele brigava também e depois ter-

minou apertando a mão”, disse a atriz Thainá Cardoso. “Porque você joga o jogo deles, e o jogo deles é de enfrentamento. Eles estão acostumados que tu sintas medo, mas a partir do momento que eles veem que você não tem medo, e que você está jogando o jogo deles, e você está forte, você fica pronto para lidar com isso em uma apresentação em qualquer lugar do mundo”, destaca o ator Mateus Moura. Com coragem de sobra, a Trupe Perifeéricos teve o trabalho selecionado pelo Instituto de Artes do Pará (IAP) para Bolsa de Pesquisa e Criação Artística em audiovisual, um viés que já estava sendo iniciado pelo grupo desde o ano passado. E a apresentação das histórias de fantasias e mundos imaginários tem a simbologia das máscaras como foco central das apresentações realizadas na tela de cinema do Instituto, com inspiração na Commedia


dIVuLgAção dIVuLgAção

MAsCARAdos

Segundo os atores da trupe, as máscaras têm o poder de levar o público para um mundo místico, de fazer a fantasia ser aceita no ambiente real

AtuAÇÃo

A performance teatral dos perifeéricos levou o grupo a conquistar uma Bolsa de Pesquisa e Criação Artística em audiovisual no Instituto de Artes do Pará (IAP)

Dell’Arte, estilo teatral nascido na Itália, entre os séculos XV e XVI, que tem enfoque no improviso. O resultado dessa aventura “perifeérica” agora é inserido como parte dos espetáculos do IAP. Com a experimentação, o grupo realizou no mês passado suas primeiras apresentações em palcos fechados, que considera uma caixa-preta. A Trupe Perifeéricos foi criada há cinco anos, fazendo pesquisas independentes sobre a arte da linguagem feérica com integrantes sempre em rotatividade: quase de ano em ano novos atores integram ou deixam a Trupe. “As pessoas novas vão alimentando esse universo que vai sendo criado, mas às vezes algumas delas não conseguem entender a essência do que grupo vive na sua totalidade, sentem estranhamento ou deixam de ir por outros motivos. Alguns tiveram que viajar ou se casaram, ou tiveram filhos, por exemplo”, diz Mateus Moura. “A arte das máscaras. Como traduzir isso para o cinema? E nós fomos lá atrás, na origem do cinema, o cinema de atrações, que tinha esse quê mais forte do feérico, quando o cinema ainda não era o grande espetáculo. Era o show de variedades. No meio da feira mística tinha a mulher barbada, o atirador de facas, e aí tinha uma tenda, e lá dentro acontecia o cinema. E fomos para esse cinema silencioso, o cinema que não tinha uma ordem narrativa, onde uma imagem puxa a outra, buscando mais essa sensação do onírico, do feérico. E aí a gente quis trazer de volta também essa coisa dele ser tocado ao vivo”, explicou Mateus. Nas apresentações são tocados a escaleta (instrumen-

to de sopro que possui teclados e serve para conduzir a história, assumindo o personagem ‘tempo’), o violino, o violão e o teclado. Nessa narrativa envolvente entre som e visual, o “veículo” que justifica o nome “Perifeéricos” é a máscara. Ela tem o poder de levar o público do mundo real para o místico, de fazer a fantasia ser aceita no ambiente real. Ao mesmo tempo, transporta os artistas para o mundo mágico, oferecendo segurança psicológica para encarar os personagens ameaçadores da vida real, tanto nas ruas quanto nos palcos. Com o arrancar das máscaras durante a história, a plateia sente a dor, a vergonha e a fragilidade do personagem que a perdeu. Tanto que não conseguem fitar os olhos dos personagens por muito tempo. E se quem assiste está envolvido o bastante para assumir para a si a personalidade de algum dos seres, acaba descobrindo que a simbologia das máscaras reflete as contradições que são vividas em uma metrópole como Belém. A vida dual – com personalidades diferentes das reais nos perfis de redes sociais ou conversas escusas das famílias – é intencionalmente abordada nas apresentações. “Essa reflexão sobre as máscaras é fundamental para transmitirmos para o público. Porque ela serve tanto para esconder o que você quer encobrir, e ao mesmo tempo encoraja a ser quem você realmente é. Exemplo disso é o Carnaval, quando as pessoas fazem coisas que nem imaginariam fazer, mas fi zeram só porque estavam usando máscaras”, comenta o ator Rafael Couto. ABrIl DE 2015

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MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS

O “Lápis endiabrado” de Cametá TEXTO roMANA MEDEIROS ilustrações jocelyn alencar

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Andrelino Cotta 1896-1972


Q

uando saiu de Cametá para Belém, em 1921, Andrelino Cotta talvez não imaginasse que se tornaria um dos artistas mais prestigiado da capital paraense da primeira metade do século XX. Assim que chegou à cidade, Cotta passou a trabalhar na revista A Semana como caricaturista. Como se deu sua inserção tão rápida na revista é uma das questões de sua vida que intriga os historiadores. Para Raimundo Nonato de Castro, professor de História no Instituto Federal do Pará e doutorando em História Social na Universidade Federal do Pará, onde desenvolve pesquisa sobre a vida e a obra do artista, a explicação mais provável é que ele tenha sido indicado por algum amigo. “Havia toda uma construção de amizade, havia um circulo intelectual que fazia com que as pessoas se aproximassem de A, B ou C e se inserisse numa revista ou jornal”, afirma Castro. Como caricaturista, Cotta foi responsável pela ilustração das páginas de vários órgãos da imprensa do Estado, traçando tipos carnavalescos, políticos da época e situações cotidianas da cidade. Ao chegar a Belém, o caricaturista se deparou com uma cidade marcada profundamente pelo modelo político republicano, o que vai influenciar sua atuação como artista. Os trabalhos de Cotta na revista A Semana, nos jornais locais e também suas pinturas marcam uma nova maneira de se expressar. Ele passa a dar evidência para a periferia, o cabloco e a natureza da Amazônia. Isso leva alguns intelectuais a considerem suas obras como pintura de segunda ordem, quando na verdade apenas mostram uma parte da cidade que não tinha espaço na arte e nos veículos de comunicação locais. As obras de Cotta pintam as fragilidades de uma época nobre da história de Belém, a Belle Époque, que foi um período de grande crescimento econômico da região, resultado da extração e comercialização do látex. Com seu trabalho, o artista confrontou e desconstruiu a ideia de uma Belém modernizada. “Ele fazia caricaturas de Belém num contexto em que a cidade ia pras páginas dos jornais ou pras páginas das revistas como uma cidade moderna. O detalhe era que ele vinha em páginas seguintes na mesma revista, no caso A Semana, e colocava uma Belém com falta de saneamento, com matagal crescido, com animais invadindo as ruas”, coloca Castro.

Cotta foi um autodidata que se destacou e ganhou espaço no circuito intelectual paraense. Num período em que o mais comum era a formação artística fora do País, ele fez exatamente o contrário. E na falta dessa formação externa os pontos-chaves de seu trabalho foram paisagens e costumes que lhe eram comuns como a periferia de Belém e a região da ilha de Mosqueiro, que ele bem conhecia. O “Lápis Endiabrado”, como era conhecido Andrelino Cotta, foi o responsável por traçar uma Belém que não era tão conhecida. Para Castro sua importância está em “criticar uma Belém e por tabela criticar os administradores e porque coloca na ordem do dia uma realidade amazônica que os acadêmicos não colocavam”. Cotta foi pioneiro em propor uma ideia de nação que valorizava a questão do regionalismo, da heterogeneidade do Estado. De acordo com o historiador, “embora a cidade fosse marcada por uma sociedade diversa, os tipos comuns não ganhavam espaço nas páginas dos periódicos paraenses, e quando apareciam era nas seções destinadas a questões policiais”. Após se consagrar como caricaturista, Andrelino Cotta se destacou, a partir dos anos 1930, também pelas exposições dos seus quadros nos salões de arte que ocorriam na capital. Foi um pintor de grandes méritos, realizando inúmeras mostras de telas em promoções anuais. Essas exposições se constituíam em uma grande festa artística em Belém. Além de caricaturista e pintor ele era um amante da música. Também foi professor de arte decorativa no Colégio Lauro Sodré e de desenho na Escola Normal do Pará. Faleceu em 1972. Um de seus últimos trabalhos foi a criação da atual bandeira do município de Cametá, em 1971. Andrelino Cotta pode ser classificado como uma pessoa que viveu para a arte. O artista também demonstrava preocupação com o ensino público, que para ele deveria valorizar o aprendizagem das artes. De acordo com Castro, ele foi sempre tão ligado ao mundo artístico que escreveu, na edição de A Semana de 18 de maio de 1935: “O esplendor das artes não somente indica o mais alto grau de civilização de uma sociedade, como é o sinal mais claro de prosperidade que indica a preponderância de seu comércio e de suas indústrias. Iguala os menores países às maiores nações”. MAIO DE 2015

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AGENDA

ORTOPEDIA Até o dia 16 de maio será realizado o XXI CBTO - Congresso Brasileiro de Trauma Ortopédico, no Hangar. O objetivo é discutir os problemas do dia a dia para quem sofreu um trauma. A programação completa pode ser acessada no site do evento www.traumaortopedico.med.br.

DRAMATURGIA Até o dia 20 de maio, dramaturgos, alunos, pesquisadores, professores e demais interessados em artes cênicas poderão se inscrever para a 6ª edição do Seminário de Dramaturgia Amazônida da ETDUFPA, entre os dias 27 e 30 deste mês no Teatro Universitário Cláudio Barradas. As inscrições podem ser feitas na secretaria do teatro, de 9h às 20h, ou ainda pelo e-mail dramaturgiaamazonidavi@gmail. com. O seminário é uma das ações do projeto de pesquisa “Memória da Dramaturgia Amazônida: Construção de Acervo Dramatúrgico”.A programação completa pode ser encontrada no site dramaturgiaamazonida.ufpa.br.

ORQUESTRA

PARASITAS

VALE MÚSICA

A Universidade do Estado do Pará (Uepa) re-

A Orquestra Jovem Vale Música (OJVM) vai se apresentar em mais um concerto pelo projeto Sons da

aliza até o dia 9 de junho as inscrições para o

Amazônia IV, promovido pela Musikart Produções e patrocinado pela Vale por meio da Lei Rouanet. A

Processo Seletivo 2015 do Programa de Pós-

apresentação será no dia 24 de maio, às 18h, na sala Augusto Meira Filho, no Art Doce Hall. A regência é do

Graduação em Biologia Parasitária na Ama-

maestro Miguel Campos Neto, que também se apresentou com a orquestra no mês passado, no mesmo

zônia - Doutorado. O Programa é vinculado

local. Neste ano, a OJVM completa cinco anos de fundação e é composta por 67 jovens que integram o pro-

ao Centro de Ciências Biológicas e da Saúde

grama Vale Música. Mais de 200 crianças e jovens participam da iniciativa, que aposta no ensino da música

(CCBS) da Uepa e desenvolvido em associa-

como forma de inclusão social, criando a oportunidade de acesso à cultura musical e à profissionalização

ção com o Instituto Evandro Chagas (IEC). São

desses estudantes. No ano passado, a OJVM foi agraciada pela Fundação Nacional de Artes, com o Prêmio

ofertadas oito vagas, sendo uma para pessoa

Funarte de Apoio a Orquestras, ligado ao Ministério da Cultura.

com deficiência. O edital completo pode ser encontrado no site www.uepa.br. Lúcio bernardo júnior / agência câmara

PARLAMENTO As inscrições para o Programa Parlamento Jovem Brasileiro, da Câmara dos Deputados, seguem até o dia 12 de junho. Estão aptos a participar a seleção estudantes matriculados do 2º ou 3º anos do ensino médio ou o 2º, 3º e 4º ano do ensino técnico em escolas públicas ou particulares. O estudante, ao realizar a sua inscrição, deve mandar um projeto de lei pensando na realidade do Brasil de modo que sirva como solução de problemas e possíveis alternativas sobre qualquer tema. Depois disso, basta preencher os documentos necessários. Mais informações no site www2.camara.leg.br.

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FAÇA VOCÊ MESMO

BRACELETE DE TUBO de PVC De um lado, o policloreto de vinila. Aquele cano, peça cilíndrica de vários diâmetros, utilizado para canalização de água, esgoto e até mesmo como conduíte para fiação elétrica. O famoso tubo de PVC. Do outro, o bracelete. Você deve conhecer: adorno para o braço, que pode ser feito de ouro, bronze,

cobre e até com materiais biodegradáveis. Chegou a hora de modificá-los: basta retirar o ouro do bracelete e dar outra utilidade ao tubo de PVC. Nesta edição, a Fundação Cultural do Pará, por meio das Oficinas Curro Velho, e a revista Amazônia Viva apresentam o bracelete PVC. Braços à obra!

Bianca Addario

DO QUE VAMOS PRECISAR?

• • • • • • • • • •

Liquidificador Cola branca Vasilha com água Pincéis Papel higiênico Tinta acrílica Régua Lixas Tubo PVC de 70 mm de diâmetro Serra de arco INstRutoRA: CÉLIA HELENA SEGTOWICH ColABoRAÇÃo: DEUSARINA VASCONCELOS Fotos: JORGE RAMOS

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FAÇA VOCÊ MESMO

4 7 10

Leve, então, ao liquidificador para trituração.

Terminada essa etapa, deixa a massa descansar por 24 horas numa vasilha tampada.

Agora é só cobrir o tubo cortado utilizando a massa de papel e cola.

2 5 8 11

deixe o papel de molho na água por 24 horas.

Após triturar, coloque-o numa vasilha plástica com tampa e acrescente um copo americano de cola branca.

No tubo PVC de 70 mm de diâmetro, marque quatro centímetros de largura e corte com a serra de arco.

deixe as peças secarem por quatro dias. Após esse tempo de secagem, passe a lixa novamente para retirar imperfeições.

3 6 9 12

Após esse tempo, retire o papel e esprema-o bem para sair a água.

Mexa bem a mistura para formar a massa.

Lixe as imperfeições da beirada do tubo cortado para melhorar o acabamento.

Feito isso, dê uma demão de tinta acrílica branca na pulseira, deixando-a secar. Em seguida, decore da forma que preferir. Há braços!

PARA SABER MAIS Quem quiser conhecer mais sobre técnicas artísticas pode se inscrever nas oficinas da Fundação Curro Velho, do governo do Estado do Pará. Crianças a partir de 12 anos podem participar. A Fundação Curro Velho fica localizada na rua Professor Nelson Ribeiro, nº 287, esquina com a travessa djalma dutra, bairro do Telégrafo. Telefones: (91) 3184-9100 e 3184-9109. 64 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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RECORTE AQUI

1

Encha de água uma vasilha, o suficiente para cobrir o papel higiênico rasgado: ele vai se tornar massa.


leonardo nunes

BOA HISTÓRIA

aleluia

Os moleques arrumaram umas roupas velhas,

sacos de estopa, serragem, jornais usados e barbante para construir o Judas da vez. Fizeram tudo na surdina, como manda o figurino, tapando o riso que queria escapar da boca e furar o silêncio da madrugada. Era tão tarde que até as fofoqueiras já estavam dormindo. Arranjaram uma escada e escolheram o poste em frente à casa de minha avó. A operação foi feita com o máximo de cuidado porque o boneco estava muito mal feito e troncho e poderia se despedaçar a qualquer momento. Não parecia com ninguém, muito menos uma mulher. De manhã, na hora em que muitos saiam para comprar o pão ou seguir para o trabalho ou só para espantar o sono na calçada, viram o Judas pendurado e foi juntando falação. Um cartaz feito com resto de caixa de papelão não deixava dúvida a quem a troça estava direcionada. A vizinhança, cruel como sempre, desfilava diante do boneco e ria, ria muito. Até chegar dona Fátima. Ela parou defronte ao totem e se admirou da coragem dos

moleques, porque para afrontar minha avó daquele jeito tinham que estar preparados para o revide. A valentia da velha era conhecida na rua e a fama de não aliviar para os moleques justificava a “homenagem” com um Judas bem na porta de casa. Pelo menos, foi o que pensou a observadora. Fátima era um símbolo da rua. Folclórica, despachada, expansiva, batalhadora, meio nervosa, encrenqueira às vezes. Quando berrava com os filhos, todo mundo ouvia. Saia de casa esbravejando os problemas como se estivesse contando as lamúrias da vida para alguém muito íntimo. E estava: para todo mundo. Labutava cedinho, antes de nascer o Sol, para arrumar o de comer, fosse vendendo os saquinhos de alho e cominho ordenados em uma bandeja equilibrada na cabeça, fosse garantindo a xepa na Ceasa para vender aos vizinhos verduras e legumes mais baratos na porta de casa. Fátima era uma brasileira forte, embora magrinha e sofrida. Ingênua, ela observou o boneco, riu e fez um comentário.

Fez-se um silêncio entre os que testemunharam a cena. Até que alguém lhe revelou, ao pé do ouvido, que o Judas era para ela. Fátima, obviamente, ficou furiosa. Só então os vizinhos notaram que ela não sabia ler. Comerciante desde sempre, nunca imaginariam que ela ganhava a vida na intuição e força de vontade sem conhecer o alfabeto. Diante o povaréu, a mulher arrumou uma escada – talvez a mesma da madrugada anterior-, subiu distribuindo impropérios com sua voz esganiçada de sempre, tirou a representação de sua figura do alto do poste e lançou no chão. Amaldiçoou os autores. E a pergunta inevitável se instalou: quem fez? Ninguém disse nada. Os que sabiam calados permaneceram para evitar mais confusão. Fátima deu a primeira bicuda na cabeça do Judas cheia de cabelos falsos. Saiu andando rápido com seu andar miudinho, resmungando, sem saber que iniciou involuntariamente a malhação de si mesma naquele Sábado de Aleluia infeliz. MAIO DE 2015

Anderson Araújo

é jornalista, escritor e blogueiro

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NOVOS CAMINHOS

Ciência: Difusão e popularização A difusão científica é uma

Inocêncio Gorayeb é mestre e doutor em Entomologia, pós-doutor em sistemática zoológica e pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi

prática que contribui com a sociedade e com as próprias instituições e profissionais que fazem a ciência. De certa forma é uma obrigação repassar para a sociedade brasileira o conhecimento científico desenvolvido, pois ela é quem direta e indiretamente, provê os recursos que sustentam o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia. A sociedade informada pode acompanhar, sugerir e indicar demandas urgentes e prioritárias de pesquisas científicas, e estas participações são relativas a diversos universos, local, municipal, estadual, nacional e global. No Brasil, a difusão científica ainda é pequena, mas atualmente o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) vem fazendo um esforço para popularizar a ciência. Muitas são as formas e ações de difusão, dentre elas: artigos em jornais, revistas, artigos e vídeos em sites na internet, matérias na televisão, eventos, feiras de ciência, palestras, livros, cartilhas, campanhas, atividades lúdicas, exposições e várias outras. Os pesquisadores produzem o conhecimento e têm a obrigação de divulgar os resultados em artigos publicados em revistas científicas. Entretanto, estes artigos estão em linguagem especializada e geralmente em inglês. Além disso, cada especialidade tem uma linguagem própria com um grande número de termos técnicos, isso porque são direcionados à comunidade científica daquela especialidade. Então, porque os pesquisadores não produzem textos e outras atividades de difusão em português mais apropriado para que a sociedade possa compreender? De fato isso não é função deles. Al-

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guns poucos fazem isso, mas esta função é de profissionais especializados que trabalham justamente para produzir textos e materiais compreensíveis para a sociedade, com a essência dos resultados científicos. Dependendo do público-alvo os conteúdos, as linguagens e a forma de difusão são apropriados e direcionados a estes. Os profissionais de difusão além de estudar os textos científicos precisam interagir com os pesquisadores para poderem produzir a essência dos resultados científicos. A sociedade ainda tem a sensação de que a ciência é algo distante dela, tanto no sentido de compreensão como quanto os assuntos que são alvos de pesquisa. Entretanto, a ciência por si própria é fortemente relacionada com a sociedade. Os pesquisadores que se dedicam a produzir material de difusão não têm qualquer vantagem por fazer isso, pois as pontuações que ganham em seus cálculos de produtividade são desprezíveis. Portanto, não há incentivo para que se dediquem a isso, pelo contrário, acabam perdendo tempo que poderia ser usado nas produções científicas que redundam em maior pontuação.Certamente, o esforço do MCTI para popularizar a ciência deve redundar em ajustes nestes cálculos de produtividade, promovendo as análises sobre este assunto em outras instâncias, dentre elas a CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (que é a agência de fomento a pesquisa do Brasil), Ministério da Educação, FAPs – Fundações de Amparo a Pesquisa, Editais para financiamento de pesquisa e até nos programas de Pós-graduação stricto sensu.

A sociedade ainda tem a sensação de que a ciência é algo distante dela, tanto no sentido de compreensão como quanto os assuntos que são alvos de pesquisa


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