REVISTA ENCARTADA NO JORNAL O LIBERAL. NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE.
DEZEMBRO 2O15 | EDIÇÃO NO 52 ANO 5 | ISSN 2237-2962
O MOGNO CONTRA O
CÂNCER
Nesta árvore, espécie comum no Pará, pode estar o caminho para a cura da doença que mata 7,6 milhões de pessoas por ano no mundo
LAGARTOS
O que eles têm a contar sobre a origem da região?
SLACKLINE
O esporte em que é preciso ter equilíbrio de corpo e mente
NATUREZA
Parceria entre Brasil e Noruega ajuda a salvar o meio ambiente
EDITORIAL
PUBLICAÇÃO MENSAL DELTA PUBLICIDADE - RM GRAPH EDITORA DEZEMBRO 2015 / EDIÇÃO Nº 52 ANO 5 ISSN 2237-2962 Presidente LUCIDÉA BATISTA MAIORANA Presidente Executivo ROMULO MAIORANA JR. Diretor Jurídico RONALDO MAIORANA Diretora Administrativa ROSÂNGELA MAIORANA KZAM Diretora Comercial ROSEMARY MAIORANA Diretor Industrial JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO CARLOS BORGES
ESTUDO
Pesquisadores do Laboratório de Cromatografia Líquida da UFPA se dedicam à descoberta de novos tratamentos do câncer
FELIPE JORGE DE MELO Editor-chefe 4 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
Amazônia, celeiro para pesquisas científicas Os avanços nas pesquisas cien-
muito desgastante para o corpo
tíficas no combate ao câncer na
humano e o objetivo dos pesqui-
região são animadores. Nos últi-
sadores é também encontrar meios
mos anos, pesquisadores da Uni-
de amenizar o sofrimento dos pa-
versidade Federal do Pará e de seu
cientes, além de baratear os custos
hospital universitário, o Barros
do tratamento. “No futuro, espera-
Barreto, vêm se debruçando sobre
mos desenvolver um fitoterápico
o estudo de novas formas para tra-
que possa agir de forma auxiliar
tar a doença.
ao tratamento convencional, dimi-
Experimentos com extratos de
nuindo efeitos tóxicos dos quimio-
mogno, uma árvore comum na
terápicos citotóxicos sem perder a
floresta e de outras plantas regio-
eficácia do tratamento”, diz a pro-
nais têm acendido a chama da
fessora e doutora em Farmacolo-
esperança para a cura da doença,
gia, Raquel Montenegro, do Labo-
a segunda que mais mata no pla-
ratório de Cromatografia Líquida
neta (em 2014, quase 14%, ou 7,6
da Universidade Federal do Pará.
milhões, das mortes foram causa-
Levando-se em consideração
das por ela, segundo a Organização
que a Amazônia, muitas vezes até
Mundial da Saúde).
chamada de “celeiro do mundo”,
No ano passado, de acordo com
pode guardar uma infinidade de
dados do Instituto Nacional do
curas para diversos males ainda a
Câncer José de Alencar Gomes da
serem descobertas, é preciso reco-
Silva (INCA), foram mais de 576 mil
nhecer que avançamos um pouco
casos novos no país. O tratamento
mais no combate a uma das piores
com radio e quimioterapia é algo
doenças do século.
DEZEMBRO DE 2015
Diretor de Marketing GUARANY JÚNIOR Diretor JOSÉ LUIZ SÁ PEREIRA Conselho editorial RONALDO MAIORANA JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO GUARANY JÚNIOR LÁZARO MORAES REDAÇÃO Jornalista responsável e editor-chefe FELIPE JORGE DE MELO (SRTE-PA 1769) Coordenação geral LUCIANA SARMANHO Editor de arte FILIPE ALVES SANCHES (SRTE-PA 2196) Pesquisador e consultor técnico INOCÊNCIO GORAYEB Colaboraram para esta edição O Liberal, Agência Pará de Notícias, Agência Brasil, Museu Paraense Emílio Goeldi, Universidade Federal do Pará, Universidade do Estado do Pará, Universidade Federal Rural da Amazônia, Fundação Cultural do Pará - Oficinas do Curro Velho (acervo); Camila Machado, Fabrício Queiroz, Victor Furtado, Anderson Araújo, Moisés Sarraf, Sávio Oliveira, Arnon Miranda, Fernanda Martins, Brenda Pantoja, Raphael Marinho, Nilson Cortinhas, João Cunha (reportagem); Moisés Sarraf e Fabrício Queiroz (produção); Fernando Sette, Roberta Brandão, Carlos Borges, Akira Onuma (fotos); Thiago Barros (artigo) André Abreu, Leonardo Nunes, Jocelyn Alencar, Sávio Oliveira (ilustrações); Alexsandro Santos (tratamento de imagem). FOTO DA CAPA Mogno, por Carlos Borges AMAZÔNIA VIVA é editada por Delta Publicidade/ RM Graph Ltda. CNPJ (MF) 03.547.690/0001-91. Nire: 15.2.007.1152-3 Inscrição estadual: 158.028-9. Avenida Romulo Maiorana, 2473, Marco - Belém - Pará.
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REALIZAÇÃO
REVISTA IMPRESSA COM O PAPEL CERTIFICADO PELO FSC - FOREST STEWARDSHIP COUNCIL
NESTA EDIÇÃO
EDIÇÃO Nº 52 / ANO 5
38
Novas pesquisas sobre o câncer Os princípios bioquímicos de plantas amazônicas dão a base para avanços no combate à doença CAPA
INGRID BICO
AKIRA ONUMA
AKIRA ONUMA
ROBERTA BRANDÃO
34 58 16 52 DESMATAMENTO
ARTE
João Olegário de Carva-
O artista visual Marcone
ECONOMIA
lho é doutor em Ciências
PARCERIA
Moreira é uma espécie de
O doutor em economia
Florestais e afirma que a
O príncipe da Noruega,
nômade, que faz circular
Francisco de Assis Costa,
região amazônica carece
Haakon Magnus, visitou
sua produção artística
o professor Chiquito,
de um amplo trabalho
Belém para reforçar o
em vários cantos do país.
desenvolve projetos em
de conscientização,
convênio entre o Brasil e
Ele faz de suas obras
favor das comunidades
educação ambiental
seu país na elaboração
uma busca da arte
tradicionais da Amazônia,
e até mesmo mudanças
de ações sustentáveis no
pelas pessoas e pelo
como os ribeirinhos.
na política ambiental.
Estado do Pará .
movimento da vida.
QUEM É?
ENTREVISTA
SUSTENTABILIDADE
PAPO DE ARTISTA
E MAIS 4 6 7 9 11 13 14 15 17 17 18 19 19 20 21 22 24 48 60 62 63 65 66
EDITORIAl AS MAIS CURTIDAS PRIMEIRO FOCO TRÊS QUESTÕES AMAZÔNIA CONNECTION ELES SE ACHAM FATO REGISTRADO PERGUNTA-SE EU DISSE APLICATIVOS CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE DESENHOS NATURALISTAS CONCEITOS AMAZÔNICOS AVES DA AMAZÔNIA COMO FUNCIONA CIÊNCIA OLHARES NATIVOS COMUNIDADE MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS AGENDA FAÇA VOCÊ MESMO BOA HISTÓRIA NOVOS CAMINHOS
DEZEMBRO DE 2015
• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 5
CARLOS BORGES
DEZEMBRO2015
ASMAISCURTIDAS DESTAQUES DAS EDIÇÕES ANTERIORES
TARSO SARRAF
BARCARENA A tragédia ambiental em Barcarena, tema desta revista na edição de novembro (“Desolação em Barcarena”, Capa, edição nº 51, novembro de 2015) nos leva à necessidade de cobrar mais políticas e medidas de segurança ambiental no Estado. Vânia Braga Belém-Pará De acordo com a reportagem sobre o naufrágio do navio Haidar em Barcarena, vimos que
MARCAS DE UMA TRAGÉDIA AMBIENTAL
O naufrágio com cinco mil bois em Barcarena foi tema de nossa reportagem de capa em novembro e teve o maior número de curtidas no Facebook.
existem muitas medidas que poderiam ser tomadas para evitar o acidente. Mas parece que o que falta mesmo é vontade política com as coisas do meio ambiente. Guiomar de Nazaré
FERNANDO SETTE
Belém-Pará
AGRICULTURA Parafraseando o escrivão Pero Vaz de Caminha, “em se plantando, tudo dá em Belém”. Com esforço e dedicação é possível encontrar alternativas para geração de trabalho e renda, como bem mostrou a reportagem “Agricultores da zona urbana”, da edição de novembro (Comunidade, edição nº 51). Anna Beatriz Ramos Belém-Pará
FOTOS A seção Olhares Nativos é uma das melhores da revista Amazônia Viva, pois mostra diver-
NA CABEÇA, UM SURUBIM
A foto de Fernando Sette mostra um peixeiro carregando o exótico peixe numa feira de Santarém. Recebeu muitas curtidas no Instagram da revista.
sos “olhares” sobre a nossa região. Por que vocês não promovem um concurso de fotografias para estimular ainda mais a produção fotográfica no Estado? Fica a dica. Campbell Moraes
TARSO SARRAF
Belém-Pará
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DEZEMBRO DE 2015
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O QUE É NOTÍCIA PARA A AMAZÔNIA DIVULGAÇÃO
PRIMEIROFOCO
Amazônia além da realidade O FILME “ÓRFÃOS DO ELDORADO”, BASEADO NO ROMANCE DO ESCRITOR MILTON HATOUM, MISTURA VÁRIAS LINGUAGENS DA NATUREZA AMAZÔNICA PÁGINAS 8 E 9
CONFLITOS
Os atores Dira Paes e Daniel de Oliveira são os protagonistas do filme que mostra uma Amazônia calorenta em vários aspectos
CONSUMISMO
CULINÁRIA
A psicopedagoga Gina Moraes alerta os pais para os males da publicidade direcionada aos filhos no período do Natal. PÁG.11
Espécie de cogumelo selvagem começa a ser experimentado em pratos sofisticados nas cozinhas do Amazonas. PÁG.15
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DIVULGAÇÃO
PRIMEIRO FOCO
MISTÉRIOS
O paraense Dira Paes interpreta a empregada doméstica Florita, uma personagem sufocada pelas próprias realidades e pelo calor de Belém do Pará
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DEZEMBRO DE 2015
desses personagens sufocados pelas próprias realidades e pelo calor da terra, sempre bem característico no suor dos atores. Tanto que demorou quase quatro anos para ser adaptado. Mas quem conseguir encontrar tempo entre desvendar as motivações de cada personagem, conseguirá fazer uma viagem entre o Pará e o Amazonas, conhecendo cenários selvagens e urbanos, além de deparar-se com as lendas do rico folclore regional. Tudo num cenário cronológico entre a Cabanagem e o fim do Ciclo da Borracha. “Queria fazer um filme que fosse além do real, além do Brasil e além do tempo”, conta Guilherme Coelho. Arminto, desde jovem, era apaixonado por uma índia misteriosa, chamada Dinaura, que ele contemplava nas águas e talvez nunca tenha tido certeza se era real ou não. Mas a FANTASIA
A cantora de bar interpretada por Mariana Rios personifica a paixão obsessiva de Arminto Cordovil, vivido por Daniel de Oliveira
DIVULGAÇÃO
O filme Órfãos do Eldorado (2015), de Guilherme Coelho, inspirado no romance de mesmo nome do amazonense Milton Hatoum, chegou às telas dos cinemas mostrando fantasia, romance, natureza e conflitos pessoais tendo como cenário uma Amazônia cheia de árvores, mangues, rios e solidão. Solidão de pessoas afastadas de grandes causas e questões sociais, mas vítimas e fruto delas: pobreza, abuso, disputas de poder, machismo e exploração do trabalho. O que cabe aos espectadores é compreender a mente humana e os conflitos que comumente assolam qualquer pessoa, em qualquer canto do planeta, ainda mais quando esses enfrentamentos envolvem a busca pela felicidade de forma obsessiva, ainda mais quando o desejo fala mais alto que a razão e o desespero reforça as fantasias. O livro de onde saíram Florita (Dira Paes) e Arminto Cordovil (Daniel de Oliveira) é uma complexa viagem às histórias e dificuldades
Delírios da solidão
EDUARDO NICOLAU / ESTADÃO CONTEÚDO / ARQUIVO O LIBERAL
DIVULGAÇÃO
REPRODUÇÃO
certeza é de que o romance que começou tão repentinamente quanto acabou, transformou aquele jovem numa pessoa ainda mais infeliz. Ela era a única forma de escapismo que tinha do pai, Armando Cordovil, um empresário frio, rude, bruto, inconsequente, inescrupuloso e imoral. Arminto vivia em conforto, mas isso não amenizava o fato de ser culpado pelo pai de ter matado a mãe no parto. Não diminuía a inveja que tinha pelo fato de Florita, a empregada da casa e com quem o protagonista vive as primeiras experiências sexuais, era usada e abusada pelo pai. Arminto cresce em meio a essas angústias e vai para outra cidade. Memórias de cada transa que teve ou deixou de ter com Dinaura e com Florita constroem a mentalidade de um personagem apaixonado, angustiado, solitário e cansado. Adulto, Arminto retorna a Belém, onde o pai dele deixou todos os negócios de transporte de cargas - o nome Eldorado é o nome do cargueiro da empresa - e borracha para ele. O retorno é visto por ele mesmo com a chance de vencer os próprios conflitos: precisa assumir o lugar do pai; reviver as experiências com Florita; e encontrar Dinaura, personificada, na mente de Arminto, por uma cantora de bar, interpretada por Mariana Rios. Se ela é Dinaura ou não, um ser místico ou não, que volta para atiçar a mente de Arminto e tensionar o romance com Florita, cabe ao espectador dizer. A cena mais emblemática e praticamente única da atriz é cantando tecnobrega, o gênero musical que tem tornado o cenário cultural paraense destacado no âmbito nacional com Gaby Amarantos e a Gang do Eletro. “Filmar no Pará foi maravilhoso e Guilherme proporcionou uma união da equipe que parece que todo mundo era paraense. Um filme feito de maneira agregadora, foi lindo”, disse Dira Paes. Quem assistir ao filme e enxergar além da beleza solitária e selvagem dos cenários amazônicos certamente poderá encontrar mais no livro que inspirou a obra e preencher lacunas no enredo do filme, que segue em cartaz no circuito comercial. “Ele [Guilherme] foi hábil em misturar uma Amazônia cotidiana, da música, das atividades das pessoas, com o lado mítico, sonhador e do delírio do personagem. Foi uma surpresa. Eu não procurei o meu livro no filme. Tem uma interpretação muito pessoal”, comenta Hatoum.
OBRA-PRIMA
Acima, o escritor amazonense Milton Hatoum, autor de “Órfãos do Eldorado” (no detalhe), que introduz o leitor em universo amazônico pouco conhecido. À esquerda, o diretor do filme baseado na obra, Guilherme Coelho.
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PRIMEIRO FOCO ASSOCIAÇÃO MATA CILIAR / DIVULGAÇÃO
PRÊMIOS
JORNALISMO Pelo terceiro ano consecutivo, a Revista Amazônia Viva conquistou o Prêmio Especial Raimundo Pinto de Jornalismo, da Fiepa, na categoria Mídia Impressa. Com a reportagem “Açaí e Tecnologia”, de Victor Furtado e Carlos Borges, a revista confirma seu papel em divulgar os aspectos positivos da Amazônia. Já a reportagem “Em favor da Bacia do Itacaiúnas”, de Fabrício Queiroz, ficou em terceiro lugar no Prêmio Hamilton Pinheiro de Jornalismo, do Sindicato dos Jornalistas do Pará e Simineral.
CARIMBÓ
PATRIMÔNIO NACIONAL O carimbó recebeu oficialmente, em Belém, o título de Patrimônio Cultural Brasileiro, concedido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Segundo a entidade, o processo de inventário para registro do carimbó durou cerca de dez anos e em 2014 foi aprovado por unanimidade, em Brasília, pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, formado por representantes da União e da sociedade civil. Agora, o Instituto pretende capacitar agentes comunitários de cultura, fazendo registros, gravações, elaborando materiais didáticos para serem utilizados em redes públicas de ensino, entre outras ações.
AÇ A Í
AÇÕES NEUROLÓGICAS O estudo “Propriedades Anticonvulsivantes da Euterpe oleracea (açaí) em Camundongos”
EM CASA
Onça-pintada Felipe volta para a floresta
mostra que as propriedades do fruto são significativas no seu efeito protetor contra as convulsões. O modelo utilizado na pesquisa foi de crises convulsivas induzidas pelo agente químico pentilenotetrazol, quando foi estudada a aplicação clínica do açaí tendo o seu uso como auxiliador. Ao contrário dos fármacos anticonvulsivos que possuem efeitos secundários, os estudos sugerem que o açaí não apresenta efeitos adversos evidentes. A pesquisa sugeriu que o alto poder antioxidante do fruto pode ser um dos principais responsáveis pelos efeitos protetores contra as convulsões. A pesquisa é uma parceria entre a Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 10 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
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A onça-pintada Felipe, que vivia presa a uma coleira e era tratada como animal doméstico em um garimpo, fez uma longa viagem de volta à natureza. Depois de mais de quatro meses de tratamento na Associação Mata Ciliar, em Jundiaí (58 km a noroeste de São Paulo), o felino embarcou em um avião que a levou para casa, a mais de 3 mil quilômetros, no Pará. A onça, um macho de um ano e meio, pesando cerca de 60 quilos, foi solta em uma região próxima àquela em que viveu quando foi capturada, até ser aprisionada por garimpeiros.
De acordo com a veterinária Cristina Harumi Adania, coordenadora da fauna da associação, ‘Felipe’ foi mantido isolado em um recinto amplo para recuperar a condição de animal selvagem. “Nós o incentivamos a caçar, condição essencial para que possa viver livre”, disse. Os contatos com tratadores e veterinários foram reduzidos ao estritamente necessário para que o felino voltasse a ver o homem como inimigo natural. “Ele está preparado fi sicamente e em termos de comportamento”, disse a veterinária.
FOTOS: INSTITUTO MAMIRAUA / DIVULGAÇÃO
TRÊSQUESTÕES RESPOSTAS QUE VÃO DIRETO AO PONTO
Saber dizer não às crianças no Natal Com o Natal chegando, as vitrines estarão repletas de tentações às crianças, um público bombardeado de publicidade com brinquedos, videogames, roupas e diversos outros produtos especializados. Num período de crise financeira, esses gastos todos com um orçamentos das famílias brasileiras. Então, esse pode ser um bom momento para começar
COMPORTAMENTO
Macaco usa ferramenta para predar ninhos Pesquisadores do Instituto Mamirauá apresentaram durante o 16º Cong resso Brasi lei ro de Pr i matolog ia o reg ist ro i néd ito de dois macacos-prego preda ndo n i n hos de jaca rés com a ut i l i zação de ferra mentas. O reg ist ro foi feito por a r mad i l has fotográficas instaladas em pontos da Reser va de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, para monitoramento dos ninhos dos rép-
teis e identificação dos predadores. Segundo os pesquisadores, muitos estudos descreveram o uso de ferramentas por macacos-prego, embora a maioria dos registros seja de espécies que ocorrem em ambientes abertos, tal como o Cerrado e a Caatinga. Foram monitorados 63 ninhos de jacaré-açu na Reserva Mamirauá durante os meses de outubro e dezembro de 2014.
a educação financeira das crianças e impor limites, como orienta a psicopedagoga e mestra em educação Gina Moraes, professora da Universidade da Amazônia.
O consumo é maior devido ao bombardeio de publicidade infantil? Não só pelo bombardeio, mas pela falta de orientação por parte dos pais que encontram dificuldades em dizer “não”, explicando o porquê do não. Se os pais tivessem autoridade de estabelecer limites sobre os filhos, a propaganda não afetaria tanto.
Como recusar o pedido da criança e explicar a situação financeira? É preciso jogar aberto com as crianças. Elas são capazes de compreender a situação. O diálogo é a melhor saída. Os pais podem sair com os filhos, passear nas lojas e mostrar o que pode e o que não pode comprar. Dentro do que pode, eles escolhem.
De que forma os pais podem desconstruir o consumismo infantil? Começando a fazer os filhos valorizarem o ato de poupar; instituindo a “semanada” ou “mesada”, na qual devem priorizar, dentro de suas aspirações de compra, o que elas julgam ser mais necessário. Poupando, haverá maior facilidade para aquisição do bem desejado. Porém, os pais precisam, antes de tudo, serem os maiores exemplos para seus filhos. NA NATUREZA
Câmeras registraram macacos-prego usando pedaços de madeira para predar ninhos de jacarés
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HELDER LEITE/ DIVULGAÇÃO UNAMA
presente de Natal podem estourar
PRIMEIRO FOCO INOCÊNCIA GORAYEB
AUME N T O
INDÚSTRIA EXTRATIVA
A atividade industrial do Pará atingiu um crescimento de 6,2% em setembro de 2015, segundo análise da Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas do Pará (Fapespa). Este é o segundo melhor desempenho nos últimos cinco anos, tendo como principal causa o aumento da produção da Indústria Extrativa em 8,6%, deixando o Pará com o segundo melhor desempenho no mês, ficando atrás somente do Espírito Santo (11,3%) e à frente do Mato Grosso (3,2%). O bom desempenho dos setores industriais do Pará provocam reflexos positivos tanto no que diz respeito à arrecadação de impostos quanto na geração de empregos.
PO LU I Ç ÃO
GASES-ESTUFA As emissões de gases causadores do efeito estufa estão diminuindo em onze das 20
PRÊMIO ABEU 2015
maiores economias do mundo, em uma
Livro científico aborda ervas do Ver-o-Peso A Associação Brasileira de Editoras Universitárias (Abeu) entregou, pela primeira vez, o Prêmio Abeu 2015, que reconhece as melhores edições universitárias em três categorias. Ao todo, 134 títulos foram inscritos. Roberto Acízelo de Souza, autor da obra “Do mito das musas à razão das letras: textos seminais para os estudos literários (século VIII a. C. - século XVIII) (Argos/ Unochapecó)” levou o prêmio na categoria de melhor livro na área de Humanidades. Na categoria de melhor livro na área de Tecnociências, o vencedor foi “Cidades Saudáveis? Alguns olhares sobre o tema” (Editora Fiocruz), de Carmen Beatriz Silveira, Tania Maria Fernandes e Bárbara Pellegrini.
“Plantas Aromáticas do Ver-o-Peso” foi uma das três finalistas do Prêmio. O livro representou a região Norte do Brasil, concorrendo na categoria “Tecnociências”. A obra traz importantes contribuições nas áreas de botânica, anatomia vegetal, palinologia e química sobre mais de 70 espécies da f lora aromática regional comercializada no complexo do Ver-o-Peso. O livro é resultado de uma coedição da Universidade Federal Rural do Pará (Ufra) e do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), com organização dos pesquisadores Maria das Graças Bichara Zoghbi (MPEG), Milton Guilherme da Costa Mota (Ufra), Carmen Célia da Costa Conceição (Ufra).
guinada no enfrentamento às mudanças climáticas. O Brasil, no entanto, está no grupo de países do G20 com aumento de emissões, segundo relatório elaborado por uma nova organização de cientistas e outros especialistas chamada Climate Transparency. O documento diz que os membros do G20 “precisam urgentemente descarbonizar suas economias” para cumprir a meta da Organização das Nações Unidas (ONU) de limitar a 2°C o aumento médio das temperaturas acima dos níveis préindustriais para conter as ondas de calor, as enchentes e o aumento do nível dos mares.
MULHERES
CHAMADO DA FLORESTA Educação, saúde, planos de manejo e representação social foram alguns dos temas debatidos durante os dois dias do “Chamado da Floresta”. Grupos de mulheres participaram de um encontro em Santarém, onde apresentaram soluções para demandas das populações extrativistas de todo País. Dentre as reivindicações estavam o fim da violência contra os povos da floresta, formulação de uma educação que considere o contexto ambiental, geográfico e político e garantia de participação nos conselhos deliberativos para gestão das reservas extrativistas.
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ELESSEACHAM POR QUE MIMETISMO É UMA COISA NATURAL CESAR AUGUSTO FAVACHO
Nova espécie de peixe é descoberta no Tapajós Professores da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) descobriram uma nova espécie de peixe, denominada Bryconops munduruku, em um igarapé situado na Floresta Nacional do Tapajós. De pequeno porte, a nova espécie foi encontrada no igarapé Açu, pertencente à bacia do rio Tapajós, próximo ao município de Aveiro (PA). A descoberta é resultante da pesquisa do biólogo Cárlison Silva de Oliveira, egresso do Programa de Pós-Graduação em Recursos Aquáticos Continentais Amazônicos (PPG-RACAM) da Ufopa, para sua dissertação de mestrado, intitulada “O estudo da ictiofauna em igarapés
nos sistemas de drenagem na Floresta Nacional do Tapajós”. Segundo Oliveira, o nome da espécie faz alusão aos indígenas da etnia Munduruku, que se estabeleceram na margem direita do rio Tapajós e deram origem ao município de Aveiro. “É uma espécie de pequeno porte, encontrada até agora em apenas um igarapé que drena para o rio Tapajós”, explica. “O maior indivíduo encontrado mediu 9,5 cm”. A descoberta foi publicada, por meio de artigo científico, na edição de maio do jornal internacional Zootaxa, publicação referência em taxonomia animal.
SILVA-OLIVEIRA, CANTO E RIBEIRO / DIVULGAÇÃO
ICTIOFAUNA
Borboleta imita abelha para fugir do perigo Os insetos constituem um banquete para espécies de vertebrados terrestres, aquáticos e, inclusive, outros insetos. Mas eles não se deixaram esmorecer. Foram à luta junto do processo evolutivo. É que algumas espécies predadoras se alimentam exclusivamente de insetos. Assim não dava para ficar. E, então, para escapar de ser filado por alguma boca faminta, insetos utilizaram as formas e as cores de seus corpos para fugir ao final trágico, confundindo-se com o ambiente, virando folha, tronco ou parte do solo. O processo foi além: espécies que usam o corpo para parecer outro animal, amedrontando seus predadores. A foto em destaque revela a borboleta da família Sessidae, feita pelo entomólogo Cesar Augusto Favacho,
M E ST R A D O
na Estação Científica Ferreira Penna,
PROFESSORA SURDA
na Floresta Nacional de Caxiuanã,
Após três anos de pesquisa, a primeira pro-
passo na busca pela excelência na educação
município de Melgaço, no Marajó.
fessora surda concursada da Universidade
inclusiva no Pará. O desafio da docente, da-
A borboleta ganha forma de abelhas
Federal do Pará (UFPA), Ellen Formigosa, do
qui para frente, é contribuir para o desen-
com temidos ferrões. Como “não tá
curso de Letras-Libras, retornou a Belém com
volvimento do ensino da Libras, com novas
morto quem peleja”, as borboletas
o título de mestre obtido na Universidade Pa-
metodologias,compartilhando com os colegas
prosseguiram sua sina de embelezar
ris 8, na França. Ela é a primeira surda para-
professores e contribuindo com a reorganiza-
as paragens amazônicas com seu
ense a concluir o mestrado naquele país. Sua
ção do projeto pedagógico do curso da UFPA
garbo e elegância ― e sua valentia! Foi
dissertação, que faz uma reflexão didática do
de Letras – Libras, e Português como segunda
através desse tipo de mecanismo que
ensino de Libras no Brasil, é um importante
língua para surdos.
hoje tem borboleta pra contar história. DEZEMBRO DE 2015
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FATO REGISTRADO
ACERVO MUSEU GOELDI
Oca em construção no coração de Roraima O esqueleto da oca estava à mostra no estágio inicial da construção da habitação indígena em meados da década de 1950. Naquela década e na posterior, pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) realizaram expedições científicas em busca de amostras e peças que enriqueceram o acervo da instituição sobre a Amazônia. E com as expedições, 14 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
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vieram os registros fotográficos, que hoje compõem o arquivo do MPEG. Na foto, as estruturas de madeira, que dão sustentação à oca, sendo recobertas pelas folhas secas de palmeiras a formar a cobertura. A foto foi registrada no estado de Roraima, feita provavelmente por Walter Egler ou Roger Arlé, que compunham a expedição. As andanças
científicas daquele período trouxeram muitas informações relevantes sobre a região, desde a biodiversidade, a vida e os costumes dos povos tradicionais, além de contribuir para a formação de acervo no MPEG. Mostraram as entranhas, literalmente, da sociedade indígena naquela região. Que a ciência prossiga revelando o esqueleto do universo amazônico!
DIVULGAÇÃO
INPA / DIVULGAÇÃO
PERGUNTA-SE POIS É PRECISO ESCLARECER MITOS E VERDADES
GASTRONOMIA
Descoberto novo valor culinário de cogumelo
Numa fa zenda em Itacoatia ra, a 214 quilômetros de Ma naus, A mazonas, toras de casta nheiras, a ntes destinadas a v ira r lenha, hoje servem de incubadora pa ra uma experiência pioneira. Lá acontece o cultivo experimenta l da Lentinula raphanica , primeira espécie a mazônica de cog umelo a ser domesticada pa ra o consumo. A produção controlada da espécie, também inédita no mundo é resultado de uma parceria entre o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), a Fazenda Aruanã e o restaurante Banzeiro, de Felipe Schaedler. O chef se tornou uma espécie de “embaixador” do raphanica ao in-
cluí-lo em seu próprio cardápio, ajudando a div ulgar o novo ingrediente regional fora de Manaus. Quem coordena o projeto é a pesqu isadora Noem ia K a z ue Ish ik aw a . Seg u ndo ela, os relatos cient í f icos apont a m pa ra a ex istência de 34 espécies de cog u melos comest íveis na reg ião - dessas, dez fora m coletadas e est udadas pelo Inpa. O objet ivo da s pesqu isa s, pat roci nadas pelo Cent ro de Est udos Integ rados da Biod iversidade A mazôn ica (INCT-Cenba m), é ava l ia r os prós e cont ras do cu lt ivo desses cog u melos em esca la. Porém a produção do rapha n ica se most rou a ma is v iável até agora.
Carvão serve para escovar os dentes? A resposta é não, apesar de o carvão vegetal realmente ter a capacidade de remover a placa bacteriana. Quem tem até 30 anos ou gosta de buscar tratamentos alternativos pela internet, possivelmente se deparou com essa técnica, que promete clarear os dentes. Entretanto, o professor doutor Oscar Faciola Pessoa, coordenador do curso de Odontologia do Centro Universitário do Pará (Cesupa), esclarece que além de mito, o carvão vegetal pode causar prejuízos à saúde dentária. “O carvão vegetal não deve ser utilizado para clareamento de dentes. Mesmo tendo propriedades medicinais reconhecidas, como nos casos de intoxicação, não age como agente clareador. É fato que causa uma sensação de limpeza, visto que tem a capacidade de remover a placa bacteriana. Todavia, a propriedade abrasiva causa
RESINA
danos à superfície do esmalte, deixando-o
JUTAICICA DE SANTARÉM
mais frágil e suscetível à cárie e sensibilidade
Uma ideia na cabeça e uma panela de barro na
cia e caracterização físico-química da resina
dental”, informa o professor, que ressalta:
feira. O que podem ter em comum? A princípio,
de jutaicica de Santarém”.
o clareamento dos dentes sempre deve ser
nada. A relação foi estabelecida pela observa-
A pesquisa mapeou a resina da jutaicica e do jato-
acompanhado por um dentista profissional.
ção do pesquisador da Universidade Federal
bá, que já foram usadas como base de produtos
do Oeste do Pará (Ufopa), João José Lopes
na indústria para a fabricação de verniz (copal). De
Corrêa, que durante dois anos frequentou o
acordo com a pesquisa, cerca de 10% das árvores
Programa de Pós-Graduação em Recursos Na-
da espécie Hymenaea L. produzem resina. Mos-
turais da Amazônia (PPGRNA), e que resultou a
tras das espécies pesquisadas já estão armazena-
pesquisa intitulada “Copal do Brasil: ocorrên-
das na coleção científica do Herbarium da Ufopa.
MANDE A SUA PERGUNTA Envie perguntas instigantes sobre hábitos, costumes e fenômenos da região amazônica para o e-mail: amazoniaviva@orm.com.br
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QUEM É?
PROFESSOR CHIQUITO
Economista ajuda a desenvolver ações sustentáveis TEXTO ARNON MIRANDA FOTO ROBERTA BRANDÃO
C
olaborar com o desenvolvimento econômico de uma região é a força-motriz da carreira do doutor Francisco de Assis Costa, conhecido como professor Chiquito. Foi com esse desejo que ele se formou em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em 1971, e logo trabalhou para contribuir com a modernização da base industrial potiguar. O trabalho fundamental era dar assistência técnica necessária ao desenvolvimento local das empresas da região. Depois de fazer especialização em matemática, Chiquito atuou, de 1972 a 1975, como economista industrial na Marinha do Brasil, e em seguida aportou em Belém para trabalhar no estaleiro da Base Naval de Val-de-Cans. Depois foi coordenador técnico
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e um dos fundadores da Comissão Estadual de Planejamento Agrícola do Pará (1978–1982), a qual fazia parte do extinto Sistema Nacional de Planejamento Agrícola. Em 1982, na Alemanha, iniciou o doutorado em Economia pela Freie Universität Berlin (FUB), defendendo tese, em 1988, sobre desenvolvimento agrário e regional da Amazônia. Na volta a Belém, o economista retomou sua pesquisa da dinâmica agrária da Amazônia, destacando o peso da economia de base familiar, tanto a agrícola, como a extrativa. “Fiz muitos estudos mostrando que a economia ribeirinha acumulou, desde o século XVIII, um conhecimento fundamental para o desenvolvimento sustentável”, destacou o economista. “O desenvolvimento sustentável é, para o ribeirinho, a maneira cotidiana como ele faz
economia, relacionando-se com o meio ambiente, com o ecossistema, de uma maneira respeitosa”, diz. Os resultados dessas pesquisas estão dispostos na coleção “Economia Política da Amazônia”, organizada pelo professor Chiquito na coordenação do Grupo de Pesquisa Dinâmica Agrária e Desenvolvimento Sustentável na Amazônia (Dadesa) do Núcleo de Altos Estudos da Amazônia da Universidade Federal do Pará (Naea). São, até o momento, dez livros, cinco de autoria exclusiva do professor. As obras tratam das relações econômicas, sociais, culturais e institucionais dos sujeitos amazônicos e como essas relações influenciam a zona rural e a urbana. Um dos objetivos do economista é mostrar que o desenvolvimento sustentável da Amazônia é possível.
NOME
Francisco de Assis Costa
IDADE 67 anos
FORMAÇÃO
Doutor em Economia
TEMPO DE PROFISSÃO 44 anos
EU DISSE
APPLICATIVOS
DIVULGAÇÃO
BOAS IDEIAS NUM TOQUE DE DEDOS
“Minha mensagem para os povos indígenas brasileiros é que a sua dor e a sua luta são compartilhadas no mundo todo”.
Sangue Amigo
então quem será?), que reforça o chamado à conservação das
clínicas. Por enquanto, a rede de doadores
florestas e à solidariedade aos povos indígenas.
é apenas para cães. É preciso fazer uma ca-
Torne seu cãozinho um doador de sangue. Sim, um doador. Vários outros cães adoecem, se acidentam e também precisam de
Paul Redman, diretor do documentário “If not us then who?” (Se não formos nós,
sangue, algo que muitas vezes faz falta em
dastro antes e ter certeza de que o seu bicho está em boas condições de saúde e apto a ser
“A biodiversidade da Amazônia ainda é pouco conhecida, então temos como missão promover sua preservação”
doador. Plataformas: iOS ou Android Preço: Gratuito
Alberto Akama, coordenador do Programa de Pesquisa em Biodiversidade da Amazônia Oriental, do Ministério de Ciência e Tecnologia, durante VII Seminário PPbio.
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gastar muito dinheiro, pois reúne mais de 33 mil estabelecimentos de hospedagem em formato de hotéis, albergues, casas para temporadas e diversas outras acomodações do Brasil e do exterior. Há algumas dicas de viagens, reservas, guias e a interface é de fácil uso. O aplicativo é gratuito, mas as hospedagens são pagas. Plataformas: iOS ou Android Preço: Gratuito
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“Isso mostra a nossa capacidade de chegar a qualquer patamar. Precisamos apenas de políticas públicas, de oportunidades”
Almires Martins Machado, da etnia Guarani, primeiro indígena a receber o título de doutor na Universidade Federal do Pará (UFPA), com o trabalho intitulado ‘’De Sonhos ao Oguatá Guassú
de em dia. Com este app, você terá acesso a mais de 30 pequenos jogos que estimulam o cérebro para melhorar seu raciocínio lógico, memória, concentração, acuidade e agilidade de pensamento. Os treinos são programados e exclusivos. O app é todo em inglês. Plataformas: Android, iOS e Windows Phone Preço: Gratuito
em busca da(s) Terra(s) Isenta(s) de Mal’’. FONTES: PLAY STORE E ITUNES
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CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE
FERNANDO CARVALHO
Fumaça e o registro de um novo gênero de moscas no Brasil O fogo queimava as campinas em que estavam armadilhas para capturar insetos a serem utilizados em pesquisas. Era novembro de 2015. O entomólogo Fernando Carvalho nada podia fazer. No calor do momento, o pesquisador lembrou do Manual of America Central Diptera, no qual se afirma que os machos de moscas da família Platypesidae, as do gênero Microsania, fazem revoadas em grupo para atrair as fêmeas para o acasalamento. E o principal: que as moscas eram atraídas pela fumaça. Mas o manual falava sobre a América Central. Nada a fazer então, certo? As pesquisas em campinas (cam-
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pos de natureza) de Cametá, na região no Baixo Tocantins, como as de que Fernando Carvalho faz parte, têm produzido descobertas para a ciência. O Museu Paraense Emílio Goeldi, hoje, tem a maior coleção de insetos de campinas, reunindo várias espécies, pertencentes a diversos grupos. São novos registros para a Amazônia, espécies novas e muitos dados de diversidade e abundância. E mais: são dados pioneiros, já que nada fora publicado em periódicos e revistas científicas sobre estes ambientes no Pará. Fernando se manteve! Ainda entre as fumaças, ele teve uma ideia na-
quele momento: sobre sua cabeça, rodeavam moscas. Seriam atraídas pela fumaça? As armadilhas poderiam até se perder, mas os insetos de sua cabeça foram capturados. Estudando-as, posteriormente, no microscópio, Fernando identificou as moscas como pertencentes justamente à família Platypesidae, gênero Microsania. Acontece que aquelas moscas nunca tinham sido capturadas no Brasil, o que adianta que há, no mínimo, uma nova ocorrência do gênero para o Brasil, além da possibilidade de ser uma nova espécie. É impossível não dizer que essa foi na mosca!
ACERVO DE OBRAS RARAS DO MUSEU GOELDI
DESENHOS NATURALISTAS
CONCEITOSAMAZÔNICOS O VOCABULÁRIO REGIONAL É UM PATRIMÔNIO
Bilha, reservatório de água boa Ah, a água da moringa. É aquela amazonicamente conhecida como a “água do pote”. É a solução perfeita porque é um eficiente filtro e, ainda, consegue manter a água numa temperatura agradável para o consumo mesmo no clima equatorial, quente e úmido da região. Uma beleza! Mas, tem também quem conheça este artefato que facilita nossas vidas apenas como bilha! Não bilhar. Leia bem: bilha. Uma das grandes soluções de barro cozido para nossa vida. Os potes da bilha são geralmente de cerâmica, o tal do barro cozido, no geral armazenam água, mas também podem comportar mel, óleos e outros produtos. Os vasos são bojudos, sabe, como um botijão de gás de cozinha, com gargalo estreitinho, com ou sem alça, que nem mão na cintura. O sistema foi
Petróglifos indígenas arqueóloga Edithe Pereira, a partir do exemplar doado pelo próprio Koch ao Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) ainda em 1907, no que é considerada a mais importante documentação sobre as gravuras rupestres do Alto Rio Negro feitas até hoje. A estampa apresentada acima é a de número três. São os petróglifos da Pedra do Iauaretê, grandes pedras da margem esquerda do rio. As covinhas vistas, ordenadas em acutângulos (cujos ângulos internos são todos agudos), foram interpretadas como as manchas da onça (iauaretê). Os grafismos ao lado foram considerados o horror na face dos seres humanos. A estampa está republicada na obra organizada por Edith Pereira, parceria entre o MPEG e o Instituto Socioambiental (ISA), Fundação Amazônia Paraense de Amparo à Pesquisa (Fapespa) e Instituto Arapyaú. E agora, viu?
dois componentes, e ainda hoje são recomendados pela eficiência, até mesmo para evitar contaminação por bactérias. Mas o termo bilha também tem outros usos. Pode se referir a uma pequena esfera de pedra, de mármore ou de marfim. No jogo da peteca, aquela com bolinhas de gude, bilha são as esferas maiores e as de aço, também chamadas de balão. E, ainda, em Portugal, na língua portuguesa popular, se refere às nádegas.
ILUSTRAÇÃO: SÁVIO OLIVEIRA
Caras de pavor frente à ferocidade da onça. Viu? É preciso olhar de novo - e de novo - para seguir os traços da interpretação dadas aos petróglifos amazônicos registrados pelo alemão Theodor Koch-Grünberg. Petróglifos são gravações feitas nas paredes internas e externas de cavernas, geralmente representações mitológicas e de cosmovisões de povos antigos. Os registros, reproduzidos na imagem, foram feitos por Koch entre os anos de 1903 e 1913, quando o pesquisador viajou pela Amazônia. Das incursões de Koch à Amazônia resultaram quatro monografias, dentre elas Sul-Americanos (1907) e Dois anos entre os indígenas (1909). Mas, por quase um século, seu trabalho ficou restrito à língua alemã. Foi apenas em 2005 que suas obras começaram a ser traduzidas e republicadas em português. Em 2010, foi lançada a tradução de Petróglifos Sul-Americanos, organizado pela
melhorado: agora os filtros de cerâmica têm
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COMO FUNCIONA
A extração da andiroba TEXTO E ILUSTRAÇÃO SÁVIO OLIVEIRA
Anti-inflamatória, cicatrizante, sabonete medicinal, vela repelente e serve até como combustível para iluminação pública, sendo usada em várias cidades amazônicas no século XIX, como Belém e Manaus. Duvida? Pois então acredite no poder do bálsamo amazônico da “Rainha da Floresta”, a andiroba.
1
Uma vez ao ano, durante três meses, a andirobeira floresce e deixa cair os frutos, que quebram ao chegar ao chão, soltando até 16 sementes. Então elas são selecionadas e recolhidas pelas catadoras em sacos plásticos, para não ressecar.
2
Cada árvore produz em média 200 kg de sementes por ano. As escolhidas são lavadas na torneira e levadas ao fogo, em uma lata ou panela de alumínio ou aço, cozinhando até amolecer.
3
Então são colocadas para descansar na água ou na areia, cobertas por folhas verdes, para fermentar e evitar a perda de umidade.
EXTRAÇÃO ARTESANAL
Veja como o óleo da andiroba é obtido, em um processo que dura mais de dois meses.
4
Após mais ou menos 30 dias, retiram-se as cascas e a massa das amêndoas com uma faca ou pedaço de madeira. Depois formam bolos de massa, o “pão-de-andiroba”, que é deixado em posição inclinada, em uma superfície de aço ou PVC, à sombra e deve ser amassado diariamente.
FONTES: ANDREZA, P., AND ISOLDE DOROTHEA KOSSMANN FERRAZ. “ÓLEO DE ANDIROBA: PROCESSO TRADICIONAL DA EXTRAÇÃO, USO E ASPECTOS SOCIAIS NO ESTADO DO AMAZONAS, BRASIL.” (2007). MENEZES, ANTÔNIO JOSÉ ELIAS AMORIM DE. “O HISTÓRICO DO SISTEMA EXTRATIVO E A EXTRAÇÃO DE ÓLEO DE ANDIROBA CULTIVADO NO MUNICÍPIO DE TOMÉ-AÇU, ESTADO DO PARÁ.” ANAIS DO XLIII CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL (SOBER).“INSTITUIÇÕES, EFICIÊNCIA, GESTÃO E CONTRATOS NO SISTEMA AGROINDUSTRIAL. 2005.
5
Aí o óleo escorre pela biqueira e goteja no recipiente. O ideal é armazenar o azeite da andiroba em um vidro escuro fervido. Para cada litro de óleo produzido, é necessário em média 3kg de sementes.
HOMMA, ALFREDO KINGO OYAMA. “O HISTÓRICO DO SISTEMA EXTRATIVO E A EXTRAÇÃO DE ÓLEO DE ANDIROBA CULTIVADO NO MUNICÍPIO DE TOMÉ-AÇU, ESTADO DO PARÁ.” (2003).
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DEZEMBRO DE 2015
CIÊNCIA
OBSERVAÇÃO
Laboratório de herpetologia do Museu Goeldi guarda alguns espécimes de lagartos em solução química para pesquisa
Os lagartos guardam histórias Estudo de répteis da região ajuda pesquisadores a conhecer mais um pouco o passado da Amazônia TEXTO FERNANDA MARTINS FOTOS FERNANDO SETTE
S
ua aparência pode assustar os mais sensíveis, mas os lagartos – subordem do grupo dos répteis – podem ajudar a elucidar acontecimentos históricos da Amazônia, graças à sua enorme diversidade e à distribuição geográfica de cada espécie, campo que os pesquisadores denominam biogeografia. Descobrir, catalogar e estudar as diferenças e peculiaridades das espécies amazônicas desses animais é o trabalho da seção de Herpetologia do Museu Paraense Emílio Goeldi. Osgas, iguanas e calangos contam a história da evolução geográfica e social da nossa região. A cara de mau, associada ao corpo frio e à aparência primitiva dos lagartos despertam certa fobia em muita gente, medo este que, de acordo com a bióloga, doutora em Ciências Naturais e pesquisadora do Goeldi, Tereza Cristina Ávila Pires, é infundado. “Os lagartos, de modo geral, são inofensivos. Não são
vetores de doenças ou agressivos. Há muitos mitos acerca do comportamento deles, mas eu peço, por favor, não temam os bichinhos!”, brinca ela, que já dedicou três décadas de sua vida ao estudo das espécies desses répteis na Amazônia. Tereza Ávila coordena atualmente dois projetos no Goeldi intitulados “Diversidade e biogeografia de lagartos (Reptilia: Squamata) amazônicos, e relação com outros biomas sul-americanos” e “Entendendo a biogeografia sul-americana: estudos de caso de lagartos amplamente distribuídos (Reptilia: Squamata)”, que buscam entender como os organismos se organizam no espaço e ao longo do tempo, estudar a taxonomia, filogenia e biogeografia de répteis neotropicais, com ênfase em lagartos, tendo como base caracteres morfológicos e moleculares. Através da observação de seus processos evolutivos, os pesquisadores são capazes de desvendar a história da região.
Boa parte dos lagartos da Amazônia existem apenas aqui. Mais que isso, cada uma das centenas de espécies habita apenas regiões bem delimitadas. “Alguns só ocorrem na parte mais ocidental da Amazônia. Por exemplo, temos um tipo que só ocorre até o rio Tocantins e não ocorre para o oeste. Pode ser que o rio forme certa barreira, mas há também fatores históricos. Estudamos um mesmo organismo que passou por muitas mudanças externas ao longo do tempo. Alguns foram influenciados mais por uma coisa, outros mais por outra e a ideia é tentar entender a história através disso”, observa a herpetologista. Iniciados em 2014, os achados dos projetos trouxeram, até agora, mais perguntas do que respostas. As dúvidas vão desde o motivo de tanta variedade até o porquê de estarem distribuídas como estão. “Quais os padrões biogeográficos encontrados nos lagartos presentes na Amazônia brasileira? O que eles nos DEZEMBRO DE 2015
• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 21
CIÊNCIA
NO MATO, NO JARDIM, NAS PAREDES... Os lagartos mais comuns vistos em Belém
M.S. HOOGMOED
TEREZA ÁVILA
TEREZA ÁVILA
Tropidurus oreadicus
Iguana iguana
Ameiva ameiva
Um dos lagartos mais comuns em Belém,
Bastante comum nos jardins de casas e parques
Conhecido como “calango verde”, por seu colo-
encontrado em muros, troncos de árvores e
arborizados. É um dos maiores lagartos que
rido na parte posterior do corpo e na cauda, com
outras superfícies verticais, ocasionalmen-
habitam a capital e também um dos únicos her-
manchas azul claro nas laterais, apesar de os
te no chão. Chamado de “calango”, tem o
bívoros. Em algumas áreas ribeirinhas, podem
jovens serem predominantemente marrons. Po-
hábito de balançar a cabeça para cima e para
ser encontrados nas árvores à beira d´água, para
dem ser vistos no chão, em parques e também
baixo quando alguém (ou outro lagarto) se
onde pulam ao se sentirem em perigo. A iguana é
em grandes áreas abertas. É capaz de correr
aproxima. Como a maioria dos lagartos, se
chamada popularmente de “camaleão”, mas não
rapidamente quando percebe um perigo se
alimenta de insetos, inclusive formigas, e
faz parte do grupo dos camaleões verdadeiros,
aproximando. Alimenta-se tanto de invertebra-
outros invertebrados.
que só ocorrem na África e Índia.
dos, como de ovos e outros lagartos menores.
TEREZA ÁVILA
TEREZA ÁVILA
TEREZA ÁVILA
Cnemidophorus cryptus
Hemidactylus mabouia
Gonatodes humeralis
Ocorrem em terrenos arenosos e campos
É a osga comum, encontrada nas paredes das
É do grupo das osgas, porém ao contrário
com gramíneas. O hábito peculiar de aba-
casas, ativas durante a noite. É de origem africa-
das que ocorrem nas casas, têm hábitos
nar frequentemente uma das patas quan-
na, provavelmente introduzido na América do
diurnos e vivem na parte baixo de troncos,
do caminham lhes rendeu o apelido de
Sul por navios negreiros. Estão entre os poucos
muitas vezes escondendo-se em sua base,
“lagarto-violeiro” em algumas áreas. Além
lagartos que emitem som. Ao contrário da cren-
junto ao chão. O macho é bem colorido
disso, essa espécie é composta somente
ça de que chupam o sangue de crianças enquan-
(como na foto), as fêmeas são todas em
por fêmeas, que se reproduzem sem ne-
to elas dormem, são animais inofensivos para o
tons de marrom. Ao contrário da maioria,
cessidade de um macho, podendo assim
ser humano, podendo mesmo ser benéficos, por
foge da exposição direta ao sol, preferindo
colonizar facilmente novas áreas, pois um
se alimentarem de insetos e outros invertebra-
locais sombreados. Alimenta-se de insetos e
único indivíduo é suficiente para tal.
dos também presentes nas residências.
outros invertebrados.
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DEZEMBRO DE 2015
dizem em termos de processos de evolução dessa fauna? Qual o papel dos rios, flutuações climáticas durante o Quaternário, e eventos tectônicos (afora sua influência na formação/ curso dos rios) na especiação e estruturação geográfica de espécies de lagartos na Amazônia? Como a Amazônia se relaciona a outras regiões sul-americanas, em especial a Mata Atlântica e o Cerrado, em termos evolutivos? Essas são algumas das questões que tentamos solucionar”, enumera a pesquisadora. Apesar do início recente nas pesquisas, o trabalho da seção de Herpetologia do Museu Goeldi nesses projetos já é capaz de apontar alguns indícios interessantes. “Sabemos que a Amazônia não é uma só. Estudando as espécies de lagartos percebemos cada vez mais as diferenças entre as regiões amazônicas, cada uma delas com seus organismos distintos”, conta Tereza Ávila. “Do rio Madeira e do Negro, temos espécies que não ocorrem aqui. Na área das Guianas temos outros tipos. Ao leste do rio Negro há outras. Cada vez percebemos subdivisões nessas regiões que já eram percebidas”, detalha. Algumas dessas divisões acabam revelando aspectos nunca antes percebidos, como a curiosa semelhança genética entre indivíduos de uma espécie de lagarto amazônico, a Kentropyx calcarata. Sabendo que igarapés, rios e mares funcionam como barreiras naturais para demarcação do habitats, o lagartinho intrigou os pesquisadores. “A espécie ocorre em toda a Amazônia, a leste dos rios Negro e Madeira. O intrigante é que a população do Trombetas é mais próxima geneticamente daquela da Flona Caxiuanã, no rio Anapu (a oeste do Marajó). Os indivíduos são molecularmente mais próximos entre si do que outras que habitam a sua vizinhança. Isso foi uma surpresa para nós, e ainda não tem explicação. Eu acredito que essa quebra do padrão deve representar algum evento histórico que os dividiu”, explica. Essa característica dos lagartos, aliás, pode ajudar a elucidar as novas teorias acerca da idade do rio Amazonas – ponto de desacordo entre cientistas. É sabido que na história da formação da Amazônia como conhecemos, antes da formação dos Andes, o seu mais famoso rio corria para o oceano Pacifico e aqui restava apenas um pedacinho, a parte mais ao leste, que seguia para o Atlântico. Então, quando os Andes começaram a subir e o rio inverteu seu
PESQUISA
A herpetologista Tereza Ávila afirma que com o estudo de várias de espécies de lagartos se percebe cada vez mais as diferenças nas regiões amazônicas
curso, passando a correr todo para cá. “Há um novo estudo que determina uma idade bem mais recente do que se calculava anteriormente. Caso isso se revele correto, os lagartos que temos na Amazônia são separados há um tempo muito menor do que pensávamos, o que pode justificar como evoluíram algumas espécies”. Os lagartos que circulam pelas áreas urbanas pertencem a famílias mais endêmicas, porém, também retratam capítulos da história da humanidade. “O tipo de osga doméstica mais comum tem origem africana. Supõe-se que alguns espécimes chegaram ao Brasil a bordo dos navios negreiros”, diz a pesquisadora. Outra espécie de osga recém identificada circulando pela cidade ressalta as novas rotas comerciais de Belém. “É uma lagartixa de origem asiática que deve ter chegado aqui da mesma forma, de carona nos navios que
trazem os containers de produtos fabricados naquelas bandas para venda aqui”, conta. Embora muito seja falado sobre as lagartixas, Tereza Ávila garante que além de não fazerem mal algum aos habitantes da casa, elas podem ser benéficas para o equilíbrio do ambiente. “As osgas ajudam a controlar a população de insetos e até mantê-los afastados”, aconselha. Não há atualmente espécies de lagartos amazônicos na lista de extinção, o que não significa que alguns deles não estejam em perigo. “As pessoas pensam, erroneamente, que os lagartos habitam apenas a mata densa e fechada. Mas há espécies próprias de áreas de cerrado e campinas. É comum que estas áreas sejam utilizadas para culturas, como arrozais, por exemplo, pela crença de que ali não há nada a ser preservado”, ressalta a pesquisadora. DEZEMBRO DE 2015
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OLHARES NATIVOS
24 窶「 REVISTA AMAZテ年IA VIVA 窶「
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Inebriante
Alter-do-Chテ」o vista do alto. FOTO: FERNANDO SETTE
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窶「 REVISTA AMAZテ年IA VIVA 窶「 25
OLHARES NATIVOS
Abandonada Canoa à beira de um braço de rio no Marajó FOTO: CARLOS BORGES
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Primeiras horas No Ver-o-Peso o trabalho inicia ainda na madrugada com a chegada do peixe. O movimento de descarregamento dos barcos é intenso e chama tanta atenção quanto as fortes cores contrastadas do mercado. FOTO: APOENA AUGUSTO
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OLHARES NATIVOS
Construção O pescador ergue pacientemente o curral antes da subida da maré FOTO: CARLOS BORGES
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À espera Os pássaros buscam seu alimento à margem do rio no Marajó FOTO: CARLOS BORGES
Nas Docas
OLHARES NATIVOS
Encantamento No Ver-o-Rio, o sol cai como o fruto de uma árvore. FOTO: CAMILO FERREIRA
Flora aquática
Vitoria-régia encontrada no Mangal das Garças, em Belém. Exuberância e majestade nas águas amazônicas. FOTO: LUIZ SILVA 30 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
DEZEMBRO DE 2015
A qualquer hora
O Ver-o-Peso é realmente um lugar surpreendente. Onde mais em Belém é possível cortar o cabelo em plena madrugada, às cinco da manhã? FOTO: APOENA AUGUSTO
DEZEMBRO DE 2015
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OLHARES NATIVOS
Azuis Tom sobre tom entre céu e rio, em Santarém FOTO: FERNANDO SETTE
Envie as suas fotos para a seção Olhares Nativos 32 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
DEZEMBRO DE 2015
Para participar da seção “Olhares Nativos” da revista Amazônia Viva basta enviar fotos com temática amazônica para o e-mail amazoniaviva@orm.com.br acompanhadas pelo nome completo do autor, número de identidade e uma breve informação sobre o contexto do registro fotográfico. As imagens devem ser autorais e com resolução de no mínimo 300 dpi. A publicação das fotos tem fins meramente de divulgação de trabalhos profissionais ou amadores, não implicando em qualquer tipo de remuneração aos autores. Participe!
OPINIÃO, IDENTIDADE, INICIATIVAS E SOLUÇÕES AKIRA ONUMA
IDEIASVERDES
Na corda
O SLACKLINE É UM ESPORTE DE EQUILÍBRIO E INTERAÇÃO COM O MEIO AMBIENTE, QUE VEM GANHANDO ADEPTOS EM BELÉM
PÁGINA 48
DESMATAMENTO
PESQUISAS
O doutor em Ciências Florestais João Olegário de Carvalho alerta que desmatar a floresta é uma forma de reduzir os recursos da sociedade. PÁG.34
Novas descobertas na região sobre as propriedades bioquímicas das plantas amazônicas têm ajudado a combater o câncer. PÁG.38
ENTREVISTA
D
esenvolvimento social e econômico com proteção ambiental. Essas são as metas para o que se considera como manejo florestal sustentável de madeira no Brasil. Hoje, o território nacional é ocupado em 49% pelo bioma da bacia amazônica, o que representa uma área de mais de 4,2 milhões de quilômetros quadrados. Essa área de riqueza incalculável é habitat de mais de 40 mil espécies de plantas, aproximadamente 400 mamíferos e pelos rios amazônicos são contabilizadas cerca de 3 mil espécies de peixes. Esse ambiente de diversidade é também fonte econômica que precisa ser preservado e utilizado com eficiência. Para isso as universidades, centros de pesquisa e várias outras instituições se dedicam em estudar formas de utilizar tais riquezas reduzindo ao máximo os impactos ao meio ambiente. Desde 1994 como professor visitante sênior na Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), o engenheiro florestal e doutor em Ciências Florestais João Olegário de Carvalho é um dos pesquisadores que se dedicam a esses estudos. Ele atua há mais de 30 anos como pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), desenvolvendo seus estudos nas áreas de preservação ambiental, manejo sustentável e silvicultura.
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“Desmatar é reduzir os próprios recursos” PARA CONSERVAR E PROTEGER A FLORESTA AMAZÔNICA, É PRECISO INVESTIR EM DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E AÇÕES SUSTENTÁVEIS. MAS PARA O ENGENHEIRO FLORESTAL E DOUTOR EM CIÊNCIAS FLORESTAIS JOÃO OLEGÁRIO DE CARVALHO, A REGIÃO CARECE DE UM AMPLO TRABALHO DE CONSCIENTIZAÇÃO, EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ATÉ MESMO MUDANÇAS NA POLÍTICA. TEXTO RAPHAEL MARINHO FOTO AKIRA ONUMA
AGÊNCIA PARÁ
“Não adianta colocar o Exército para reprimir quem desmata. Há que se investir também em educação.” Quais são os objetivos do manejo florestal sustentável e da silvicultura? Manejo florestal sustentável é a administração da floresta para obter benefícios econômicos, sociais e ambientais. Esses três benefícios formam o famoso tripé da sustentabilidade que devem existir simultaneamente e em harmonia. Neles estão incluídos o uso da madeira e de produtos não-madeireiros, assim como outros bens e serviços oferecidos naturalmente pela floresta. Manejo florestal sustentável não é apenas trabalhar a floresta, mas é administrá-la de acordo com as atividades que envolvem todo o processo de produção e utilização dos produtos, bens e serviços desse ecossistema. Já a silvicultura, que é o cultivo da floresta, tem como objetivo estudá-la aumentando o conhecimento sobre ela e contribuir para uma produção florestal de melhor qualidade. A finalidade é aumentar o rendimento da floresta, mantendo o equilíbrio ecológico desse ecossistema. A sua principal finalidade é a produção sustentável de madeira, porém pode favorecer a produção de não-madeireiros, serviços e bens. Qual o papel da silvicultura no meio ambiente, para a economia e para as questões sociais da Amazônia? Ao aumentar o rendimento da floresta, a silvicultura está contribuindo para
PROBLEMA HISTÓRICO
A Amazônia vive são séculos de exploração madeireira ilegal e o problema se repete há anos após anos devido à falta de políticas mais eficazes de combate e controle da extração
a economia. E no Estado do Pará, onde o segundo produto (de maior exportação) é a madeira, os estudos sobre a silvicultura, ou seja, as técnicas e práticas adotadas para melhorar a produção e qualidade da floresta, são de extrema importância. Por exemplo, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia Estatística), em 2014, o Brasil registrou R$ 20,8 bilhões, fruto da produção de extrativismo vegetal oriundo de regeneração vegetal.
Quais são os principais desafios que encontramos hoje para a redução do desmatamento? Essa é uma questão cultural. São séculos de exploração e a história se repete. Enquanto, nós, brasileiros, não entendermos que desmatar é reduzir os próprios recursos, seja madeireiro ou não-madeireiro, seja edáficos (relativo ao solo) ou climáticos e qualquer outro bem florestal, nós e nossos filhos e netos vão viver com essa mesma aflição, ouvindo ou lendo no noticiário: “a percentagem de desmatamento aumentou neste ano em relação ao ano passado...”. Por isso, acredito que é uma questão de conscientização e DEZEMBRO DE 2015
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ENTREVISTA
educação ambiental e até mesmo política. Não adianta colocar o Exército armado para reprimir os criminosos que desmatam, porque o crime vai continuar se essa conscientização, educação ambiental, não acontecerem. Por isso há que se investir também em educação. Como o manejo florestal sustentável e a silvicultura contribuem para a redução do desmatamento? Sabe-se que o manejo florestal sustentável, que aplica as técnicas e práticas silviculturais adequadas às nossas florestas, vai perpetuar as áreas de florestas manejadas, proporcionando produção continua. Essas áreas jamais serão desmatadas, se houver a conscientização que falei antes. Por essa lógica percebemos que a ciência está mostrando vários caminhos, no entanto, os desafios são políticos-governamentais.
“A ciência está mostrando vários caminhos (contra o desmatamento), no entanto, os desafios são políticosgovernamentais” 36 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
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Qual a relação e as contribuições da ciência, em destaque para o trabalho desenvolvido pela Ufra e pela Embrapa, para os avanços legais na proteção do meio ambiente e para o desenvolvimento econômico a partir da utilização dos recursos naturais? A Embrapa vem desenvolvendo o “Ciência Florestal” há mais de três décadas na região amazônica. Esses estudos resultaram no maior e mais organizado banco de dados científicos sobre florestas naturais do mundo tropical. Com ele, temos a possibilidade de estudos avançados sobre a ecologia, silvicultura e manejo das florestas amazônicas. Nessa perspectiva, a Ufra anda sempre de mãos dadas com a Embrapa, seja desenvolvendo projetos de pesquisa conjuntamente, seja pela parceria no Programa de Pós-Graduação em Ciências Florestais, ou seja com os outros cursos de mestrado e doutorado da universidade. Além da Embrapa e da Ufra, outras instituições de pesquisa e de ensino e pesquisa da nossa região vêm contribuindo conjuntamente e substancialmente com as pesquisas e gerando resultados científicos que hoje norteiam a nossa Legislação
CAMINHO Ainda é preciso mais investimentos em práticas de manejo sustentável para reduzir o número de desmatamentos na Amazônia
AGÊNCIA PARÁ
“Se cada cidadão dentro da sua respectiva atividade profissional contribuir para a conservação de alguma forma estará ajudando nosso ecossistema” Florestal, não só para a região amazônica como para todo o Brasil. O que podemos esperar para os próximos anos a partir dos estudos que estão sendo desenvolvidos? Na área de manejo de florestas naturais está havendo uma avalanche de estudos relacionados à produção de recursos florestais em áreas exploradas e monitoradas há mais de 30 anos na região. Os resultados obtidos nesses estudos, desenvolvidos principalmente por grupos de pesquisa, por meio de dissertações de mestrado e teses de doutorado em universidades brasileiras e do exterior, vão possibilitar um enxugamento nas normas de utilização de recursos florestais nativos e prognosticar ações silviculturais para as próximas décadas, com vistas sempre à sustentabilidade dos recursos e da produção. De que forma a sociedade pode contribuir? Cada um fazendo a sua parte. Se cada cidadão dentro da sua respectiva atividade profissional contribuir para a conservação e até mesmo para a preservação do meio ambiente, para a economia e para as questões sociais de alguma forma estará ajudando nosso ecossistema. Basta sermos cidadãos responsáveis. DEZEMBRO DE 2015
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Uma nova
esperança TRADICIONAL E POPULAR, O USO DE PLANTAS PARA FINS TERAPÊUTICOS ENCONTRA EM LABORATÓRIOS DA AMAZÔNIA UMA OUTRA FRONTEIRA: FORMAS DE AJUDAR NO TRATAMENTO E COMBATE AO CÂNCER
E
Na raiz do problema O mogno começa a ser estudado no combate às celulas cancerosas
TEXTO JOÃO CUNHA FOTOS CARLOS BORGES
stá na raiz. Moisés, o profeta do Antigo Testamento, e os hebreus usavam. O grego Hipócrates, pai da Medicina ocidental, também. O imperador da China, Shen Nung, era tão adepto delas que criou o Pen Ts’ ao Ching, o primeiro escrito conhecido sobre o uso de plantas como remédios, centenas de anos antes da Era Cristã. E as pessoas que, em tempos imemoriais e não alcançados pela História oficial, viviam no território hoje batizado de “Amazônia”, certamente eram usuárias. Muito antes das farmácias 24 Horas, drogarias on-line, entrega de medicamentos delivery, das vacinas e pílulas, o “home care” era feito com os elementos que estavam mais à mão, no quintal, na mata ou na horta da comunidade. Em muitos lugares não deixou de ser assim. Segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 80% da população mundial se vale das plantas medicinais como recurso terapêutico, por necessidade, cultura ou uma mistura das duas. Gerações adoeceram e, à base de tentativas e erros (por vezes, fatais), des-
cobriram as combinações e doses precisas para transformar uma folha ou semente em tratamento. “Dor de barriga? Pega esse punhado de coentro pra fazer uma infusão”. “Aquele baqueado inchou e virou roxo? Compressa de calêndula resolve”. “Três dias de gripe? Desculpa, mas vai ter que tomar chá de alho com limão. Tô colocando mel pra melhorar o gosto.” Superada a discórdia com a Medicina moderna, época em que remédio bom tinha que nascer no laboratório e passar pela indústria, os produtos naturais estão de volta aos receituários médicos. Há algumas décadas, governos promovem políticas nacionais e entidades, como a própria OMS, estimulam os países a identificar e explorar os aspectos da Medicina tradicional que forneçam remédios ou práticas eficientes e seguras, especialmente para o tratamento básico de saúde. E é no lugar com a maior variedade e concentração de flora no planeta, a Amazônia, que cientistas estão em busca de soluções para um grupo de doenças muito mais complexas do que a rouquidão ou dor de cabeça: o câncer.
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CAPA
Um nome, muitas identidades
Além de morrer por arma ou no trânsito, um dos maiores medos do brasileiro é o câncer. Que não é um só, mas uma porção de doenças cujo denominador comum é o crescimento desordenado de células anormais com potencial invasivo em órgãos e tecidos do corpo humano. Em 2014, foram mais de 576 mil casos novos no país, de acordo com cálculos do Instituto Nacional do Câncer José de Alencar Gomes da Silva (Inca). Segundo o Ministério da Saúde, a doença é a segunda principal causa de morte natural no Brasil, perdendo apenas para as cardiovasculares, como infarto e derrame. A previsão é de que em 2030, com o maior
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controle da hipertensão e diabetes, o estímulo a um estilo de vida mais saudável e o envelhecimento da população, ele chegue à liderança dessa lista. Uma pesquisa recente da Universidade Federal do Pará (UFPA) demonstrou o grande potencial de uma substância química no tratamento de um dos tipos mais frequentes e preocupantes de câncer, o que ataca a região do cólon, no intestino grosso. A substância em questão é um tipo de limonoide, chamado de “L3” pelos pesquisadores, retirado das folhas do mogno-brasileiro (Swietenia macrophylla), árvore muito comum na região sul do Estado. Todo o estudo e a descoberta da relação entre o L3 e as células de câncer de
cólon poderiam nem ter acontecido não fosse uma lagartinha de poucos centímetros de comprimento. O mogno é a árvore que briga pelo sol. Em meio aos superlativos da f loresta equatorial, ele se destaca pela altura, que pode chegar a 4 metros em dois anos de idade e mais de 15 em uma década. Do chão, não dá pra enxergar os grandes inimigos desse crescimento vistoso (sem contar os madeireiros ilegais, é claro). A lagarta Hypsipyla grandella , também conhecida como “broca-do-mogno”, é a principal praga da árvore, se alimentando da folhagem e depois do interior da planta, impedindo a evolução normal e, em casos severos, sua morte.
PESQUISA
Os extratos de limonoides do mogno são conservados no Laboratório de Cromatografia Líquida da UFPA. Na página ao lado, o dr. Milton da Silva sob um exemplar da árvore estudada.
Em 2006, ao estudar uma maneira de inibir a ação da broca, o químico e na época doutorando, Milton da Silva, tirou extratos de limonoides do mogno e os conservou no Laboratório de Cromatografia Líquida da UFPA. Anos depois, a amostra foi entregue às mãos da professora e doutora em Farmacologia, Raquel Montenegro, com um desafio. “A professora Raquel já desenvolvia testes de substâncias para atividade antitumoral e queria trabalhar com plantas da Amazônia. Eu não tinha alguns extratos que ela pediu; no lugar dei um que apresenta muitas similaridades, os limonoides, e disse que poderia ser interessante testar”, conta o químico, que hoje coordena o laboratório. “Para nossa surpresa, essa amostra apresentou resultados excelentes contra células de câncer de cólon”, completa. O espanto de Milton se explica pela ausência de registros na literatura médica e, até onde se sabia, na experiência popular de uso do mogno e seus substratos para combater a doença. Nada de “chá da casca do mogno para o intestino”, “emplastro da folha de mogno para aplicar no abdômen” ou algo parecido que indicasse que na árvore poderia haver elementos antitumorais. Para chegar ao resultado, as amostras foram testadas em células in vitro cultivadas em laboratórios de vários de tipos de câncer. Nessa fase o L3, em forma de extrato hidroetanólico, demonstrou eficácia muito alta em eliminar as células cancerosas do cólon. A segurança do uso desse limonoide em organismos animais também foi comprovada, conforme um protocolo aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Comparado a um fármaco usado no tratamento da doença e que mata indiscriminadamente células cancerosas e normais, o limonoide se destacou pela seletividade. “O L3 é aproximadamente 20 vezes mais seletivo que um medicamento comum testado como base. Para cada 20 células,
ele elimina apenas uma normal”, afirma Milton da Silva. Os passos seguintes, quando o limonoide do mogno foi testado em porções mais concentradas até ser isolado como substância pura, foram igualmente positivos. “No momento, estamos desenvolvendo testes do limonoide em células humanas inseridas em camundongos imunodeprimidos para novos testes de eficácia”, diz Raquel Montenegro. Segundo ela, a substância ainda vai percorrer um bom caminho até poder ser
considerada um medicamento oficial, o que é provável que ocorra em alguns anos. Até lá, a professora e o grupo de pesquisa continuam as pesquisas para produzir o que ela sonha ser “o primeiro remédio fitoterápico desenvolvido a partir de uma planta amazônica, com baixo custo”. “No futuro, esperamos desenvolver um fitoterápico que possa agir de forma auxiliar ao tratamento convencional, diminuindo efeitos tóxicos dos quimioterápicos citotóxicos sem perder a eficácia do tratamento”, deseja. DEZEMBRO DE 2015
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CAPA
OCORRÊNCIAS NO BRASIL
Dados de 2014 das taxas brutas de incidência por 100 habitantes e do número de novos casos de câncer, segundo sexo e localização primária* 15
Localização Primária da Neoplasia Maligna
Estado
1 Próstata 2 Mama Feminina 3 Colo do Útero 4 Traqueia, Brônquio e Pulmão 5 Cólon e Reto 6 Estômago 7 Cavidade Oral 8 Laringe 9 Bexiga 10 Esôfago 11 Ovário 12 Linfoma de Hodgkin 13 Linfoma não Hodgkin 14 Glândula Tireoide 15 Sistema Nervoso Central 16 Leucemias 17 Corpo do Útero 18 Pele Melanoma 19 Outras Localizações 20 Subtotal 21 Pele não Melanoma Todas as Neoplasias
21
7 8 4 10 6 18 9 1
Capitais
Casos Taxa Bruta 68.800 70,42 16.400 16,79 15.070 15,44 4. 12.870 13,19 11.280 11,54 6.870 7,03 6.750 6,89 8.010 8,18 1.300 1,28 4.940 5,04 1.150 1,15 4.960 5,07 5.050 5,20 2.960 3,03 37.520 38,40 203.930 208,77 98.420 100,75 302.350 309,53
Estimativa dos Casos Novos 15
Casos Taxa Bruta 17.540 82,93 4.000 18,93 860 22,91 2.770 13,07 2.220 10,40 1.460 6,99 1.910 8,91 1.460 6,76 410 5,72 1.490 6,87 470 1,76 1.240 5,81 1.250 5,78 950 4,33 9.070 42,86 51.100 241,30 19.650 92,72 70.750 334,08
7 8 14 10
2
3
11 17 9
21
18
5
Estado Casos 57.120 15.590 10.930 17.530 7.520 4.010 770 2.190 2.770 5.680 880 4.850 8.050 4.130 4.320 5.900 2.930 35.350 190.520 83.710 274.230
Taxa Bruta 56,09 15,33 10,75 17,24 7,41 3,92 0,75 2,15 2,70 5,58 0,83 4,77 7,91 4,05 4,24 5,79 2,85 34,73 187,13 82,24 269,35
Capitais Casos 19.170 4.530 3.080 5.650 2.010 1.050 370 730 540 2.270 420 1.680 2.160 1.370 1.250 2.690 1.150 8.590 58.710 22.540 81.250
Taxa Bruta 80,67 19,20 13,06 23,82 8,44 4,32 1,26 2,97 0,00 9,62 8,64 7,06 9,08 5,81 5,15 11,24 4,57 36,49 248,46 95,26 343,85
*Números arredondados para 10 ou múltiplos de 10.
Distribuição proporcional dos dez tipos de câncer mais incidentes estimados para 2014 por sexo, exceto pele não melanoma* Localização primária Próstata Traqueia, Brônquio e Pulmão Cólon e Reto Estômago Cavidade Oral Esôfago Laringe Bexiga Leucemias Sistema Nervoso Central
Casos
(%)
68.800 16.400 15.070 12.870 11.280 8.010 6.870 6.750 5.050 4.960
22,8% 5,4% 5,0% 4,3% 3,7% 2,6% 2,3% 2,2% 1,7% 1,6%
Homens
Mulheres
Localização primária Mama Feminina Cólon e Reto Colo do Útero Traqueia, Brônquio e Pulmão Glândula Tireoide Estômago Corpo do Útero Ovário Linfoma não Hodgkin Leucemias
Casos
(%)
57.120 17.530 15.590 10.930 8.050 7.520 5.900 5.680 4.850 4.320
20,8% 6,4% 5,7% 4,0% 2,9% 2,7% 2,2% 2,1% 1,8% 1,6%
*Números arredondados para 10 ou múltiplos de 10.
22,8%
5,4%
20,8%
Genética
Tabagismo
Álcool
6,4% Alimentação gordurosa
FONTE: ONCOGUIA.ORG.BR E INCA / INFOGRÁFICO: MÁRCIO EUCLIDES
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ALÉM DO TEMPERO
A função terapêutica da pimenta do gênero Piperaceae tem despertado a atenção dos pesquisadores contra o câncer
Óleos de pimentas regionais
Piperaceae. Assim, vestida com o nome científico, é difícil de reconhecer, mas provavelmente você é familiarizado com mais de uma planta dessa grande família que ultrapassa as 4 mil espécies pelo mundo. A pimenta-do-reino ( Piper nigrum L.) no tempero da refeição, a peperômia-zebra ( Pepero mia sandersii ) para enfeitar o jardim e aquele calmante com nome engraçado que tem na farmácia, a cava-cava ( Pi-
per methysticum). É por essa última função, a terapêutica, que muitas das Piperaceaes são famosas, especialmente na forma de óleos essenciais, os líquidos saídos das plantas por processos como destilação ou extração química. A professora de Biotecnologia da Universidade Federal do Pará (UFPA) e química Joyce do Rosário Silva entende bastante desses vegetais. No estudo das Piperaceaes há mais de uma
década, escreveu uma tese sobre o estudo químico e biológico de óleos essenciais e extratos de espécies de Piper da Amazônia Oriental. “Os óleos essenciais apresentam grande diversidade química de compostos, com diversas aplicações biológicas, como por exemplo a antioxidante, que está associada ao combate do estresse oxidativo, causador de várias doenças degenerativas e câncer”, afirma. Há pouco tempo, no âmbito do
APLICAÇÕES
Os óleos essenciais têm ampla diversidade química de compostos, como ações oxidantes, que ajudam a controlar a doença
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CAPA
EXPERIMENTO
A eficácia e a alta seletividade do óleo de Piperaceae aponta um caminho otimista a ser comprovado pelo seguimento dos exames pré-clínicos da região
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grupo de pesquisa “Plantas aromáticas e Oleaginosas da Amazônia”, ela encontrou em um dos óleos uma atividade antitumoral para células de melanoma. Apesar de ter ocorrência baixa no Brasil (foram estimados apenas 2.960 casos novos em homens e 2.930 em mulheres em 2014) e menor ainda na região Norte, esse tipo de câncer de pele é um dos mais letais que se tem conhecimento. Quando o tumor é localizado, o prognóstico de cura é bom, aumentando o risco quando acontece a invasão de outros órgãos e partes do corpo, a chamada metástase. Em um primeiro momento, as amostras passaram por uma triagem frente a diferentes linhagens como câncer de estômago, colorretal e melanoma. Foram essas últimas células os alvos do óleo essencial de Piper aleyreanum durante os testes preliminares. Essa espécie de Piperaceae é conhecida pelo nome indígena “paninixpu”, e seu óleo essencial é usado como analgésico e antidepressivo pela medicina popular, mas nunca como um antitumoral. Durante os testes, o Piper aleyreanum inibiu em 50% o crescimento das células cancerosas de melanoma. A análise foi feita em comparação com a doxorrubicina, um medicamento muito usado no tratamento contra o câncer. A eficácia e a alta seletividade do óleo aponta um caminho otimista a ser comprovado pelo seguimento dos exames pré-clínicos e, posteriormente, em seres humanos. “Para comprovação de sua eficácia, é necessário conhecer o composto bioativo isolado ou em sinergia com outros. Nesta etapa, o papel do químico é fundamental nas técnicas de separação e identificação, e no entendimento dos mecanismos de ação no sistema “molécula-alvo”.
MARCOS SANTOS / DIVULGAÇÃO USP
A fosfoetanolamina foi distribuída para pacientes com cancêr antes de ser testada em humanos
MÁRCIO EUCLIDES
Etapas do desenvolvimento
Fases de pesquisa necessária para substância ser considerada medicamento Teste pré-clínicos
EXPERIMENTOS CONTRA O CÂNCER
Qual o caminho que o óleo de Piper aleyreanum, o L3 e outras substâncias devem passar para serem considerados remédios contra a doença? Fosfoetanolamina. Esse composto químico, facilmente encontrado nas células de muitos mamíferos, é o centro de uma polêmica nacional que colocou na balança a urgência dos que esperam curas para os cânceres e o cuidado indispensável na segurança dos tratamentos. O Instituto de Química de São Paulo (IQSC-USP) sintetiza a fosfoetanolamina desde os anos 1980 e há pelo menos uma década distribuía de forma experimental para o combate ao câncer, de maneira ampla. Isso até a metade desse ano, quando a prática foi bloqueada pela USP porque a eficácia do medicamento não é garantida, nem a ausência de riscos para quem o toma. Uma briga judicial então teve início opondo universidade, familiares e pacientes com câncer A fosfoetanolamina não completou um percurso que todas as substâncias no Brasil devem passar para serem consideradas uma medicação, incluindo o L3 e o óleo essencial de Piper aleyreanum, apresentados nessa reportagem. Os testes começam em um modelo mais simples, a célula cancerosa. Depois, a candidata é aplicada em animais, como ratos, para verificar
se a droga é capaz de controlar o tumor em um organismo vivo. Nesse momento, também é avaliada se a atividade da substância é muito tóxica ou segura para o uso. Esse período de testes é conhecido como fase pré-clínica. Tudo certo até aqui? Então, as provas na substância evoluem para a chamada fase clínica, em seres humanos. Entramos aí na etapa de análises de segurança e toxicidade do produto em humanos, um grupo de 20 a 100 voluntários saudáveis em geral. A segunda etapa testa a possível droga em 100 a 200 pacientes com o tipo de câncer pesquisado e enfim, envolve um número muito maior de pacientes, no mínimo 800, na terceira e última etapa, quando são determinados indicações e contraindicações, efeitos colaterais e dosagem. Agora sim, a substância é encaminhada à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que vai avaliar o pedido de registro. Cada um desses passos tem de ser aprovada pelos órgãos competentes, como o Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), a Comissão de Ética em Pesquisa (CONEP) e à agência reguladora Anvisa.
EM CÉLULAS
Avalia se substância tem potencial terapêutico em células cultivadas em laboratório Fosfoetanolamina só passou por testes em células em camundongos
EM ANIMAIS
Verifica se substância écapaz de controlar a doença em organismos vivos, como ratos
Testes clínicos (em humanos) FASE 1 Testa segurança em voluntários saudáveis
20 a 100 pessoas
FASE 2 Testa se é eficaz em pacientes
100 a 200 pessoas
FASE 3 Testa eficiência em um grande número de pacientes (no mínimo 800), além de determinar as indicações, contraindicações, efeitos colaterais e dose correta
mínimo
800 Ao concluir esta etapa, a Anvisa avalia os resultados para conceder um registro ao medicamento FONTE: INCA E PORTAL G1 DEZEMBRO DE 2015
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CAPA
Tratamento e pesquisas
Williams Fernandes está notando uma mudança no perfi l de pacientes do Hospital Universitário João de Barros Barreto (HUJBB). Médico especialista em câncer e coordenador do Centro de Oncologia do hospital, ele analisa as estatísticas oficiais da casa. Antes bem modestos, os atendimentos em câncer cresceram muito nos últimos tempos e hoje representam 30% do total de ingressos no hospital universitário. De 2013 para 2014, o número quase dobrou, fechando em 1.527 consultas médicas. Este ano promete ultrapassar essa marca: só no primeiro semestre, foram 964 consultas na área. Em torno de 55% desse público vem da capital e os demais de outros cantos do Estado. Para o médico, sinais da progressão da doença no país “A epidemiologia para-
ense acompanha a brasileira”, diz. “Nós lidamos com alta incidência de tumores na próstata, em homens, e na mama e no colo do útero, em mulheres”. Uma característica regional que preocupa e atinge os dois sexos é o câncer no estômago, pelo qual o Pará é campeão na quantidade de casos no Brasil, em números relativos, de acordo com o INCA. Segundo o geneticista Sidney Batista, as responsabilidades por esse título são divididas entre a alimentação local, carregada em ingredientes e pratos salgados e defumados (sim, a maniçoba, estamos falando dela), e por fatores genéticos. Sidney faz parte da equipe do Núcleo Pesquisas em Oncologia (NPO) da UFPA, que sediada dentro do Barros Barreto, e é exatamente a Genética um dos fortes ramos de atuação desse grupo de cientistas e estudantes. Juntos,
eles trabalham para futuramente oferecer meios adicionais de tratamento a quimio e radioterapia e, principalmente, maneiras de prevenção. “Nós usamos tecnologia laboratorial para analisar os marcadores genéticos que podem dizer muito sobre um paciente, antes mesmo do câncer se manifestar”, afirma o geneticista. “Trata-se da mudança que estamos passando no mundo do tratamento curativo para o tratamento preventivo. A descoberta antes da doença em si”. Depois que o câncer é identificado, os marcadores genéticos podem também ser muito úteis, na avaliação de como da pessoa vai se adaptar a medicação, com base em sua carga genética. “Com essas informações, o médico vai ter mais condições de decidir com segurança que remédio aplicar e qual forma de tratamento mais adequada”, garante.
PESQUISA NO HOSPITAL
Números do Barros Barreto sobre a doença
2013 1.454 tratamentos em quimioterapia, 182 tratamentos em radioterapia, 74 casos de cirurgias, 880 consultas médicas de atendimento ambulatorial;
2014 1.828 tratamentos em quimioterapias, 67 tratamentos em radioterapias, 105 casos de cirurgias, 1.527 consultas médicas de atendimento ambulatorial
2015 Até julho, foram realizadas, 833 tratamentos em quimioterapia, sem tratamentos em radioterapias devido a suspensão da licença de funcionamento no Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), 55 casos de cirurgias e 964 consultas médicas ambulatoriais.
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As descobertas das ativ idades a ntitumora is do Piper a ley rea num e do limonoide batizado de L3 são duas concretizações no meio de um mosa ico de possibilidades que as pla ntas da A mazônia guardam. No Laboratório de Cromatografia Líquida da UFPA estão várias amostras de outros tipos de limonoide do mogno atualmente em teste para reatividades contra diferentes formas de câncer. “À medida que formos analisando essas substâncias, esperamos ter mais combinações positivas como ocorreu com o L3 e o câncer de cólon”, afirma o químico Milton da Silva. Estamos discutindo as cha nces em uma espécie de á r vore das quase 2.500 ex istentes na f loresta a ma zônica brasileira, a lém das cerca de 30.000 espécies registradas de pla ntas. “As últimas revisões sobre o assunto relatam um aumento no número de drogas oriundas ou derivadas de produtos naturais em detrimento das drogas de origem sintética. Acredito que é muito difícil termos a capacidade de elaborar tantas estruturas ou compostos diferentes quando comparado à natureza”, opina a química Raquel Montenegro. Para ela, o que separa o “potencia l” da rea lização é a fa lta de ma is investimentos em pesquisas sobre a vegetação nativa, especia lmente no que diz respeito ao câ ncer. “Temos na A ma zônia uma biodiversidade enorme e relativa mente pouco explorada qua nto à ativ idade a nticâ ncer”, a f irma. “Temos que agrega r va lor aos produtos da terra e pa rticipa r ma is ativa mente do cená rio naciona l de pesquisa e desenvolv imento de fá rmacos”.
ATENDIMENTOS
O coordenador do Centro de Oncologia do Barros Barreto, Williams Fernandes, afirma que os casos de câncer representam hoje 30% do total de ingressos no hospital universitário
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COMUNIDADE
Equilíbrio entre corpo e natureza Praticantes do slackline em Belém aliam o esporte à responsabilidade socioambiental nas praças da cidade TEXTO NILSON CORTINHAS FOTOS AKIRA ONUMA
E
ra um domingo de 2014. Thiago Rodrigues voltava de uma celebração religiosa e, do ônibus, olhou a praça Brasil, no bairro do Umarizal, mas de um jeito diferente da paisagem habitual. O estudante viu fitas esticadas e algumas pessoas tentando se equilibrar em cima delas. Outras, mais experientes, faziam manobras mais arriscadas. Foi o máximo que conseguiu observar do local onde estava. 48 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
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“Deixei a Bíblia em casa e voltei, com pressa, para saber o que era aquilo”, diz Thiago. Foi o primeiro contato com o slackline, esporte baseado na arte de equilíbrio sobre uma fita elástica esticada entre dois pontos fixos. O praticante pode andar ou fazer manobras. No caso de Belém, os pontos fixos são, geralmente, as árvores. E os locais mais utilizados para a prática esportiva são, em geral, os espaços públicos
das praças. Mas também é praticado sobre rios e igarapés, modalidade chamada de waterline, em localidades como Mosqueiro, Benevides e Santa Bárbara. A característica própria de uma capital arborizada, como Belém, tornou a prática do esporte planamente viável. E conquistou até o mineiro Rafael Bordoni. “Sou apaixonado pela longline (em que a distância da fita para o chão, normalmente,
NA CORDA ESTICADA
Conhecidos como “slackers”, os praticantes do esporte adotam um estilo de vida com base no equilíbrio do corpo e da mente, respeitando o meio ambiente
ultrapassa os 40 metros). Aqui é ótimo praticá-lo. Belém é uma cidade maravilhosa, linda. Geralmente, as praças têm um bom espaço, o que é necessário para o nosso esporte. Tem que praticar o slackline cuidando do ambiente, inclusive, para outras pessoas que querem fazer outro tipo de atividade”, comenta Rafael. O universitário João Vitor garante que o
esporte embeleza a praça e tem uma marca eminentemente social. “Trouxe vida para cá. Já colocamos até moradores de rua na fita, lá na praça da República”. Thiago Rodrigues, aliás, considera-se um fã incondicional do esporte desde a primeira vez que viu o slackline. “Foi paixão a primeira vista. Resolvi praticar imediatamente. Lembro que fiquei cinco segundos
em cima da fita, consegui dar três passos e alguns chegaram a me questionar, dizendo que já era um praticante e não um iniciante”. Hoje, um ano depois, Thiago é um dos “slackers” mais conceituados de Belém. Consegue fazer manobras, como “drop knee”, em que se abaixa sobre um dos pés e o outro fica sobre a fita sem esticá-la. Para praticar o slackline, é necessário
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COMUNIDADE
ter dois equipamentos básicos: as fitas e os protetores das árvores, cuja função é evitar o dano a ancoragem principal. O kit custa, em média, R$ 180. Alguns preferem andar descalços “para sentir a fita”; outros usam tênis ou sapatênis. Os slackers também têm preocupações ambientais. A primeira delas está relacionada ao inevitável impacto às gramas das praças, causando seu desgaste. “Quanto mais você anda em cima dela, mais você desgasta. Por isso, a necessidade de alternar os locais de treinamento”, explicou Jorge Celso, um dos praticantes mais antigos da modalidade em Belém. “Mas o maior impacto é na árvore se não usar o protetor”, garante. Daí, a necessidade de um grupo mais experiente para armar o cenário próprio do esporte. No início, assim que o slackline passou ser praticado em Belém, há cerca de cinco anos, o grupo chegou a ter problemas com a Guarda Municipal e com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente. “Existia a questão do desconhecimento do esporte. Acreditava-se que gerava uma depredação grande do patrimônio. Felizmente, já não existe esse embate. Toda vez que realizamos eventos maiores, como o Slackday, temos parceria e autorização da Sema”, explica Jorge, professor do Ensino Médio, e que visualizou uma forma de aliar o esporte à responsabilidade social em espaços públicos. “Estamos realizando projetos socioambientais, por meio do desenvolvimento de ideia para trabalhar o reflorestamento e educação ambiental. Também já fazemos algo muito legal, que é estimular a prática por crianças em áreas de risco e pessoas com problemas de vício”. João Vitor, que pratica o esporte com a namorada, Melina Rodrigues, lembra de um momento claro de inclusão social. “São vários os episódios em que observamos usuários de cola e falamos assim: ‘venham praticar o slackline, esqueçam isso’. E eles veem”, afirma. Toda essa movimentação trouxe à 50 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
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PRA CIMA
Os esportistas querem tornar o slackline ainda mais conhecido em Belém. Para isso, se reúnem em praças diferentes aos fins de semana, o que também ajuda a preservar as árvores e o gramado dos logradouros, evitando seu desgaste.
ONDE ACHAR OS SLACKERS DE BELÉM? O slackline na capital tem página em duas redes sociais: o Facebook e Instagram. É uma forma de verificar onde acontecem os treinos. Em geral, a reunião ocorre terça e sexta-feira, à noite, na praça Brasil. Aos finais de semana, a praça da Bandeira é a mais escolhida até em função das várias ancoragens possíveis para se colocar o slackline.
tona a necessidade, e até uma obrigação, de criar uma associação, que reúna todas as ideias viáveis. O slacker Jefferson Braz encabeça o movimento. “Temos uma visão para melhorar o esporte, dar uma identidade a ele. Entrar nas secretarias de esporte do município e do estado, além de promover competições internas. A associação vem com esse gancho de fazer esses torneios. Para nós, o slackline trouxe uma nova maneira de ver a vida. É um outro estado de espírito, é algo prazeroso. É o bem-estar e precisamos ter isso de forma mais oficial”, afirma. Jefferson, inclusive, conheceu o esporte meio que de forma inesperada. “Viajei para Brasília para o Campeonato Brasileiro de Remo, esporte que eu praticava, e encontrei a fita armada. A minha primeira sensação foi subir naquela fita. E eu quis dominá-la. Quando voltei para Belém, consegui um equipamento. Me envolvi, de cabeça, no slackline. Conseguimos reunir um grupo e hoje temos vários praticantes”. No Brasil, a prática vem se firmando. Além de várias associações locais, o maior exemplo foi a realização da Copa Mundial, disputada em agosto, em Foz de Iguaçu, no Paraná. Foi a primeira vez que uma competição com esse status foi promovida fora do eixo Estados Unidos-Europa. Rafael Bordoni também é um dos que engrossa o coro da necessidade de fazer a associação. “Temos um projeto montado para crescermos o esporte. Queremos buscar o máximo de apoio de patrocínio, tanto para desenvolver o esporte, quanto alguns projetos sociais, como trabalhar com crianças carentes. Pratico o esporte há quatro
anos. Hoje, vejo que o slackline cresceu muito”, garante. Mas, o que esse esporte de fitas tem de tão especial assim? Cada praticante tem o seu ponto de vista. “Desde o primeiro dia, é como se a fita tivesse me envenenado positivamente. Você entra em um ciclo vicioso do bem. O slackline te da uma preparação física e cognitiva. Desenvolve a coordenação motora e você fica sagaz. Ele não trabalha apenas os aspectos musculares. Também ajuda na concentração, no equilíbrio, na paz de espírito. Cada vez que você sobe na fita você precisa se desligar do mundo”, enumera Jorge, quando fala dos vários benefícios do esporte. “Muita gente que não gosta de nenhum esporte e passou para o slackline. Antes, eu não praticava nenhum esporte por falta de afinidade. A minha afinidade foi com a fita. Eu a conheci praticando”, afirma João Vitor. Já Amanda Coutinho, fisioterapeuta especialista em Pilates, agrega as duas filosofias. “Trago as instruções do slackline quanto às respirações durante a manobra, a concentração e contração do abdômen e levei para dentro da sala dos pilates”. Já o professor de educação física, Diego Carepa, citou os grupos musculares que são trabalhados. “O slackline é um esporte de equilíbrio, possui benefícios físicos, estimulando o grupamento muscular, principalmente, a região do core, que é composta por abdômen, quadril e a lombar. E tem o benefício mental, diminuindo o estresse, trabalhando a concentração, consciência corporal, coordenação. Qualquer um pode praticar o esporte”, recomenda. DEZEMBRO DE 2015
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SUSTENTABILIDADE
Um norte para a biodiversidade União internacional entre Brasil e Noruega ajuda a preservar a Amazônia paraense TEXTO JOÃO CUNHA
D
a Noruega, um dos locais mais ao Norte do planeta, até o Pará, no Norte brasileiro, são mais de oito mil quilômetros, um Oceano Atlântico e a diferença brutal de temperaturas, capaz de fazer os nórdicos suarem em bicas e os nortistas enregelarem-se. Sem mencionar os contrastes políticos e culturais. Mas tudo isso vai para segundo plano quando o tema é o meio ambiente. Reunidos em Belém no mês passado, cientistas paraenses e noruegueses demonstraram (com uma ajudinha do Inglês, o idioma universal) sintonia no mesmo propósito de conhecer e conservar a biodiversidade da Amazônia. O encontro foi no seminário “Pesquisas em Mudanças Climáticas e Biodiversidade na Amazônia - Novas Perspectivas”. Marcado para um dia de muito sol no Parque Zoobotânico do Museu Paraense Emílio Goeldi
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(MPEG), o evento concluiu a primeira fase de uma parceria entre instituições científicas regionais e do país europeu. Desde novembro de 2013, quando foi concebido, o Consórcio de Pesquisa sobre Biodiversidade Brasil-Noruega (BRC) evoluiu “de um acordo formal a uma associação de pesquisa totalmente operacional”. É a avaliação que faz Torkjell Leira, representante do consórcio pela Universidade de Oslo (UiO). Em dois anos, o BRC pôs em atividade três projetos de pesquisa no Pará, especificamente em Paragominas, sudeste do Estado. A localização não é arbitrária: o município sedia uma das maiores minas de bauxita do mundo, atualmente administrada pela mineradora de capital norueguês, a Norsk Hydro. Junto com o controle da mina, em 2011, a empresa assumiu a meta de “equilibrar a abertura da área para mineração com áreas reflorestadas até 2017” e, a longo prazo, “ne-
nhuma perda líquida de biodiversidade”, de acordo com o seu site institucional. Seguindo a tradição do país nas questões ambientais, o plano da mineradora é fazer com que os espaços já bastante desmatados de Paragominas recuperem a cobertura florestal nativa e também preservar a floresta tropical intocada, que fica localizada principalmente em pequenos vales e ao longo de riachos na região. Foi o primeiro passo para o surgimento do consórcio, um programa de pesquisa sobre biodiversidade e mudança climática. Além da Hydro e da UiO, estão no consórcio a Universidade Federal do Pará (UFPA), o Museu Goeldi e a Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), organizações com grande bagagem em estudos sobre a fauna, a flora e as populações humanas na Amazônia. Elas representam o lado brasileiro da parceria e atualmente
coordenam, cada uma, uma pesquisa específica do BRC em Paragominas, cujos focos são: fungos em áreas naturais e degradadas (UFPA), a propagação de espécies de plantas e recuperação de áreas degradadas de mineração de bauxita (UFRA) e a entomologia e bioindicadores para o monitoramento da biodiversidade (MPEG). Nessas linhas de investigação, quase tão importante quanto gerar informações e resultados sobre o status de conservação e o elo entre os fluxos de gases de efeito estufa e emissões de carbono com operações de mineração de bauxita é a cooperação internacional estabelecida. O trabalho conjunto de pesquisadores do Brasil e da Noruega, e ter um impacto acadêmico elevado, em termos de publicações científicas e do aumento da qualificação de estudantes e pesquisadores são critérios do BRC.
AVANÇOS
De Paragominas para outras áreas da Amazônia brasileira. O objetivo é estabelecer um projeto de pesquisa mais amplo visando à restauração dos ecossistemas da região. “Esse é um grande anseio do Museu Goeldi e das universidades locais. Há muito tempo, nós temos essa avaliação de que áreas, como a Amazônia maranhense, não podem ser mais desmatadas, e o consórcio está incorporando isso, buscando alternativas nesse sentido”, afirma a bióloga do Goeldi e representante da instituição no BRC, Marlúcia Martins. “Zerar o desmatamento não é uma questão de polícia, trata-se de alternativas econômicas, desenvolvimento sustentável, senão as queimadas vão continuar”. O tema da preservação e da redução do desmatamento na região ressoou na voz de pesquisadores e lideranças do governo dos dois países durante todo o seminário “Pesquisas em Mudanças Climáticas e Biodiversidade na Amazônia”. “Não há dúvida que os esforços do Brasil em reduzir o desmatamento são muito importantes para o clima mundial”, disse o príncipe Haakon Magnus, herdeiro da coroa norueguesa, ao se pronunciar na conclusão do evento. “Significantes também são as pesquisas sobre biodiversidade, serviços
DEBATE
O seminário “Pesquisas em Mudanças Climáticas e Biodiversidade na Amazônia - Novas Perspectivas” reuniu pesquisadores do Museu Goeldi e da Universidade de Oslo. Acima, o meteorologista norueguês Frode Stordal. Ao lado, o biólogo Leandro Ferreira, coordenador da Estação Científica Ferreira Pena, do MPEG.
COMUNIDADE
ecossistêmicos e vocês terem desenvolvido experiência e conhecimento que outros países agora estão olhando como modelo e inspiração. A Noruega está muito feliz em ser parceira do Brasil nesse projeto”. Mais tarde naquele dia, no Palácio do Governo, Haakon assinou um tratado de cooperação científica entre o país europeu e o Estado do Pará. Foi a primeira vez que a Noruega firmou uma parceria diretamente com um estado da federação no mundo, fato que Marlúcia Martins, vê com alegria. “Geralmente, quando países estrangeiros fazem acordos de cooperação, tudo acontece por Brasília. Isso fragmenta as linhas de investimento e as instituições UM PRÍNCIPE ENCANTADO
Herdeiro do trono da Noruega, Haakon Magnus se surpreendeu com as ações desenvolvidas pelo convênio entre seu país e o Pará. Ele visitou o Parque Zoobotânico do Museu Goeldi e disse que a Amazônia é importanete para as pesquisas climáticas.
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de pesquisa na Amazônia ficam com uma parcela muito pequena”. A pesquisadora é enfática em afirmar que a ciência construída na Amazônia, com os olhos e sensibilidade voltados para o Estado, tem experiência acumulada suficiente para apontar caminhos para os desafios locais e trabalhar em pé de igualdade com centros de pesquisa de todo o mundo, o que para ela ficou comprovado com o seminário no Museu Goeldi. “Aqui está a biodiversidade, aqui estão os problemas, aqui está a Amazônia e aqui está a solução. A pesquisa feita aqui não precisa de tutores e sim de parceiros. E esse consórcio é isso, uma relação de parceria. Com o seminário, ficou claro para os noruegueses e brasileiros que nós temos um caminho andado no sentido da conservação, nós sabemos o que fazer”, avalia.
ARTE, CULTURA E REFLEXÃO INGRID BICO
PENSELIMPO
Pura arte A ARTISTA VISUAL MARCONE MOREIRA E UMA DE SUAS MUITAS CRIAÇÕES ORIGINADAS DE SEU ESPÍRITO AMAZÔNICO PÁGINA 56
LITERATURA
EMPREENDIMENTOS
O escritor e jornalista José Veríssimo nasceu em Óbidos, no Pará, e entrou para a história da letras nacionais. PÁG.60
Com a licença concedida pelo Ibama para enchimento do reservatório de Belo Monte, o funcionamento da usina volta a ser alvo de polêmica. PÁG.66
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PAPO DE ARTISTA
Arte para os outros O ARTISTA VISUAL MARCONE MOREIRA É UM OBSERVADOR DA REALIDADE QUE O CERCA TEXTO DOMINIK GIUSTI FOTO INGRID BICO
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A
busca da arte pelas pessoas e pelo movimento da vida: as obras do artista visual Marcone Moreira têm em sua abordagem conceitual as histórias que compõem os elementos recolhidos em portos, nas esquinas, em estaleiros, nos trapiches, em casas incendiadas - por onde passa e pelo que observa. A relação com o outro e o pensamento político sobre alteridade são frutos de sua própria trajetória de vida. Nascido no Maranhão, mudou-se ainda criança para Marabá, no sudeste paraense. A viagem era feita de trem, e a paisagem deixou lembranças - tanto que depois tornou-se tema para sua experiência com vídeo. Os deslocamentos também o forneceram contribuições para o seu processo criativo, e ele passou a ser um nômade coletor de objetos, ou um “extrativista urbano”, como diz, e para suas obras reúne pedaços de madeira, embarcações usadas, caixas de isopor e o que mais lhe for conveniente ao olhar. Atualmente, o artista mora no Rio de Janeiro, e tem circulado por importantes museus e galerias de arte contemporânea no país. As mais recentes foram no Museu da República, na capital carioca, e na galeria Blau Project, em São Paulo. Na entrevista a seguir, feita no atelier do artista, ele fala sobre seus projetos atuais, além da manutenção de seu espaço criativo no sudeste sem perder a conexão com o Pará. O que você tem feito atualmente, como tem sido seu percurso no Rio de Janeiro? Tenho permitido me deslocar para alguns lugares, sem projeto, e a execução fica em aberto. Isso tem sido enriquecedor. Então, transito entre trabalhos que têm o mesmo tema, já que derivam do meu olhar, da minha pessoa, dos meus pensamentos. Também estou organizando o meu site, eu só tinha um blog e estava tudo em um HD. Tenho muitas imagens de experiências, de residências que eu estou organizando e está sendo muito legal rever isso. Para mim, as imagens são mais DEZEMBRO DE 2015
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PAPO DE ARTISTA
do que retratar, são crônicas visuais da experiência. É um material residual dessas experiências, e o que ficou foi o registro e o processo. Eu mesmo faço as fotos. E a sua vinda para o Rio? O que o motivou? Eu tinha outras conexões, saí de Marabá, do Maranhão. Sempre que você sai também leva o seu lugar, e contamina e é também contaminado. É uma troca muito rica. Me associam à Marabá, mas eu nem nasci lá. E agora, nem pensava em vir direto pra cá, queria ir para São Paulo. Mas voltei para Marabá, fui para Belém. E voltei pra cá e o que de fato me fez ficar foi a questão afetiva mesmo. Não sei até quando, posso mudar para outro lugar em breve. E diante dessas mudanças, como você organiza suas demandas de criação? A ideia é uma ideia, o projeto é um texto, uma maquete, uma imagem. Um referencial da estrutura da ideia. Faço desenho, que é uma ferramenta da organização do meu pensamento, e me auxilia muito com projetos. Quando tem uma oportunidade, um convite, um incentivo, tenho tentado realizar dessa maneira. Esses momentos são assim. Tipo a porteira exposta no Atelier 397, em São Paulo. Já tinha um local, me pediram para fazer uma intervenção no corredor, e quando definiram o conceito curatorial vi que era levado para esse lado dos conflitos. E pensei que o território é gerador desses conflitos, no Pará, principalmente. Essa porteira ainda é pra mim um elemento muito simbólico. Mas existem possibilidades de desdobramento disso. As obras são coisas que se desdobram. Outro exemplo é a série “Banzeiro”, que fiz inspirado nos mestres que constroem barcos em Abaetetuba. É um conhecimento importante para a região das ilhas e muito necessário. Mas tem se perdido muito. Conhecimento se tem, mas não tem mais demanda.
SENSIBILIDADE ARTÍSTICA
Para Marcone, “a ideia é uma ideia, o projeto é um texto, uma maquete, uma imagem”
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Como está seu processo de pensar a escultura? Lembro que você costumava recolher muito material em portos, nas ruas...
“Eu sou um extrativista urbano de qualquer situação que encontre, busco essas referências. O meu olhar é tentar olhar para fora, sair.” Sim, ainda. Eu sou um extrativista urbano de qualquer situação que encontre, busco essas referências. O meu olhar é tentar olhar para fora, sair. Pelo fato de você estar nas ruas, observando a cultura popular e a visualidade urbana, a cor é elemento central em algumas obras, como pinturas da série “Acúmulos” e “Visualidade Ambulante”. O que significa essa questão para você, esse elemento pictórico? A pintura sem dúvida é um esteio importante para o meu trabalho, não sempre, mas para a maioria sim. É muito presente o pictórico, na ordenação, na configuração da coisa, na própria ideia de eleger os elementos. Por que escolhi? Pela beleza visual. O projeto do “Visualidade Ambulante”, por exemplo, teve a questão da troca. Levava um isopor novo por um velho na orla de Marabá. E foi tranquilo. Nesse mundo de todo mundo querer explorar o outro, soou estranho. Por que ele quer me dar um novo? Mas as pessoas foram receptivas. A maioria era mulheres, em situação difícil, vendiam
cerveja e refrigerante para complementar a renda. Você chega na intimidade, é um monte de neto, é conhecer os filhos, ver o cachorro. Não é só mais a relação com o objeto, mas com as pessoas e com o contexto social. É uma maneira de pensar o trabalho. Aconteceu o mesmo quando fiz o “Banzeiro”, com as embarcações, mais do que chegar como anônimo. Para mim, é delicado pensar como isso vai chegar às pessoas, o meu trabalho, é uma ampliação. Só sei que isso me motiva a continuar a investigar isso. Já rodei com esse trabalho, e a ideia é ambular mesmo. A madeira continua sendo um elemento constante na sua obra.
Sim, mas agora estou começando a trabalhar com ferro. Fui à ilha de Cotijuba, tem um canto na praia que tem umas pedras, observei a relação do homem com a natureza. Penso sempre a questão com a escala, minha relação com a natureza da Amazônia, é tudo grande. Como foi a experiência com a produção do vídeo “Horizonte de Ferro”, feita ano passado? Eu nasci no Maranhão e fazia essa viagem de trem até Marabá. A proposta era fazer a viagem e filmar. E fomos e voltamos diversas vezes, filmando as pessoas nas estruturas, a paisagem. Não queríamos depoimentos, a ideia não era fazer documentário nem
jornalismo, mas um experimento estético. Começa numa estação e a viagem, tem a variação de paisagens, uma dinamizada.
NÔMADE
Marcone Moreira nasceu no Maranhão, viveu uma parte de sua vida em Marabá e hoje produz no Rio de Janeiro, onde instalou seu atelier
Como artista, como você se conecta com esses temas sociais? Costuma ter uma visão crítica, isso nutre seu trabalho? Dá para nutrir, sem dúvida. Tenho amigos que fazem documentários e a gente convive intelectualmente, e isso vai te inquietando. Você pega um jornal em Marabá e vê a palavra “execução” todo dia. São camponeses, acerto de contas do tráfico, liderança do MST que mora escondido, vive ameaçado. Isso é muito próximo da nossa realidade. DEZEMBRO DE 2015
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MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS
José Veríssimo 1847-1916
Filho de Óbidos digno das letras TEXTO BRENDA PANTOJA ILUSTRAÇÕES JOCELYN ALENCAR
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A
s carreiras literárias eram a “vocação única” do estudioso José Veríssimo Dias de Matos, nascido em 8 de abril de 1857 no município de Óbidos, situado à margem esquerda do rio Amazonas. A afirmação, deixada por ele em uma carta endereçada à noiva, valida a sua trajetória como jornalista, professor, educador, crítico e historiador literário, além de um dos membros fundadores da Academia Brasileira de Letras. O vasto conjunto de sua produção, que inclui obras sobre etnografia, folclore e vários outros temas, expressam uma perspectiva “ampla, analítica e empírica de conceber os movimentos culturais e literários”, na visão da mestra em Estudos Literários pela Universidade Federal do Pará, Alessandra Pamplona. Na mesma carta, datada de 1884, Veríssimo manifesta o desejo de ser reconhecido como “um nome digno nas letras ou nas ciências do meu país”, um anseio que se concretizaria alguns anos mais tarde. Sua vida escolar começou em Belém e Manaus, Amazonas, até que foi ao Rio de Janeiro estudar no Colégio Pedro II e na Escola Central (posteriormente Escola Politécnica), entre 1869 e 1876. Por problemas de saúde, retornou ao Pará e se dedicou ao magistério e ao jornalismo, iniciando as atividades como colaborador do jornal O Liberal do Pará, publicando crônicas de viagem e pequenas narrativas de costumes amazônicos. Uma viagem à Europa, também por motivos de saúde, em 1880, marcou a primeira intervenção literária que iniciou o processo de reconhecimento nacional e internacional de José Veríssimo. Durante o Congresso Literário Internacional, em Lisboa, Portugal, ele defendeu os escritores brasileiros, que vinham sendo severamente censurados e acusados de pirataria literária. Ainda em solo paraense, o escritor se tornou o fundador e dirigente da Revista Amazônica e do Colégio Americano, que se tornou uma prestigiada unidade de ensino primário e secundário, recebendo os filhos das famílias de posse da sociedade paraense. Como professor, ele deu aulas de Português, Francês e História, em uma carreira acadêmica que se consolidou ao longo da vida. Tal atuação no ensino o fez conhecido como reformador da instrução pública no Pará, ten-
do como exemplo o livro “A Educação Nacional” (1890). Entre 1887 e 1890, Veríssimo tornou-se sócio-correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, participou do X Congresso de Antropologia e Arqueologia Pré-Histórica, na Europa, tratando sobre “O homem de Marajó e a antiga civilização amazônica”, e ainda fundou outro periódico, cujo exemplar, apesar de desconhecido, foi intitulado “Revista de Educação e Ensino”. Após 14 anos vivendo em Belém, ele se estabeleceu no Rio de Janeiro em 1891 e continuou com as atividades de educador e jornalista, trabalhando no Ginásio Nacional (antigo Colégio Pedro II) e na Escola Normal. Gazeta de Notícias (RJ) e Almanach do Paraná (PR) foram apenas alguns dos veículos que tiveram Veríssimo como colaborador, além da Revista Brasileira, da qual se tornou diretor de 1895 até 1899. Ele conseguiu contemplar toda a literatura nacional na revista e a sala da redação, na travessa do Ouvidor, era o ponto de encontro de ilustres amigos como Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Visconde de Taunay, entre outros. Dessas reuniões, saiu a Academia Brasileira de Letras, em 1897. Contudo, ele se afastou da ABL em 1912, quando Lauro Müller, ministro das Relações Exteriores, político e que não era um homem das letras, foi eleito para uma das vagas. Veríssimo ficou desapontado ao ver a casa deixando de receber exclusivamente expoentes da literatura. O ilustre obidoense faleceu na capital fluminense em 2 de fevereiro de 1916, aos 59 anos. Alessandra Pamplona pontua que Veríssimo, integrante de uma geração de letrados brasileiros apoiados em bases científicas, inaugurou uma nova maneira de conceber e estudar a literatura nacional, considerando as especificidades históricas do país. “Seu legado está vinculado tanto à permanência das histórias literárias no ensino brasileiro, de modo geral, quanto à primazia do estabelecimento de instâncias do que viria a ser a disciplina teoria da literatura no século XX: a reflexão do método e do objeto dos estudos literários”, diz. A pesquisadora, que é, doutoranda em Literatura Comparada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e professora do Instituto Federal do Pará, estuda sobre o crítico e historiador literário há 10 anos. DEZEMBRO DE 2015
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AGENDA ARQUIVO O LIBERAL
ILHAS O projeto Arte Sesc Confluências segue com a exposição “Belém Insular”, no Centro Cultural Sesc Boulevard. A mostra, resultado de pesquisa artística experimental de doze artistas paraenses, tem entrada gratuita. As atividades começaram em abril com a construção de um mapa conceitual a partir das demandas apontadas pelos participantes, norteando o trabalho que se desenvolveu ao longo do ano. BOTÂNICA Estão abertas até o dia 11 de janeiro de 2016 as inscrições para o Processo Seletivo do Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas: Botânica Tropical UFRA / MPEG. Serão ofertadas 18 vagas para o curso de mestrado que tem o objetivo de formar pesquisadores e
Festival de carimbó em Santarém Novo
profissionais vindos das seguintes áreas de atuação: Licenciatura ou Bacharelado em Ciências
A manifestação cultural do carimbó de Santarém
Marajó, Tapajós e Belém, mostrando a diversi-
Biológicas, Agronomia, Engenharia Florestal,
Novo, município do nordeste paraense, é centená-
dade de sotaques e estilos carimbozeiros.
Farmácia e áreas afins. As inscrições podem
ria. Uma expressão da cultura popular amazô-
Haverá também o Minifestival de Carimbó, em
ser feitas pelo site www.sigaa.ufra.edu.br.
nica que se renova, anualmente, através do
que apresentam-se grupos mirins de todo o
Informações pelo telefone (91) 3217-6088.
Fest-Rimbó - Festival de Carimbó de Santarém
Estado, o X Encontro de Mestres de Carimbó,
Novo. Este ano, no entanto, para que possa ser
espaço de vivência e articulação política, e a
SAÚDE
realizado, foi lançada uma campanha de finan-
reunião do ritmo do carimbó com grupos e mes-
Incentivar a realização de projetos que possam
ciamento coletivo no site Kickante com o intuito
tres de outras tradições musicais amazônicas e
contribuir para melhorar as condições de vida
básico de custear suas atividades. Não foram
brasileiras na II Mostra Batuques do Brasil.
e saúde no Brasil é um dos principais objetivos
viabilizados incentivos públicos ou privados
Uma novidade dessa edição é a realização de
da 8ª Olimpíada Brasileira de Saúde e Meio
para a realização do evento.
apresentações, oficinas e rodas de conversa com
Ambiente que no ano de 2016 homenageia o
O núcleo do 13º Fest-Rimbó será em Santa-
grupos convidados do evento em Belém. A ideia
Ano Internacional da Luz. A Olimpíada busca
rém Novo entre os dias 18 e 20 de dezembro
é aumentar o alcance do festival e a visibilidade
disseminar conceitos e práticas em Educação
e sua programação é vasta. Nele ocorre, por
desses artistas na capital. Os shows, rodas de
Ambiental nas escolas da Educação Básica, va-
exemplo, a “Mostra Mestre Celé de Carimbó”,
conversa e oficinas deverão acontecer no espaço
lorizar o trabalho do professor que desenvolve
que valoriza os grupos e compositores em ati-
do Sesc Boulevard, nos dias 11 e 12 de dezembro,
atividades criativas e inovadoras na escola,
vidade. Esta é considerada hoje a mais antiga
antecedendo e divulgando o Fest-Rimbó. Toda a
incentivando a capacidade de reflexão e cria-
e representativa mostra de carimbó do Pará,
programação será gratuita. Informações: www.
tividade dos alunos e o interesse pela ciência e
pois recebe grupos das regiões do Salgado,
festrimbo.blogspot.com.br.
tecnologia. As inscrições serão encerradas no dia 29 de julho de 2016 e podem ser realizadas no site www.olimpiada.fiocruz.br.
MÚSICA
CORPO
De 10 a 13 de dezembro a Universidade Federal
A exposição “O corpo como objeto de arte”
MULHERES
do Oeste do Pará (Ufopa) promove o Wirapu’ru -
segue na Casa das Artes, em Belém. A mostra é
A Exposição “Mulheres de Fibra”, do Grupo
Encontro Internacional de Música na Amazônia,
resultado de uma oficina voltada para desenho
Arte em Fibra de Jupati, segue com visitação
reunindo artistas locais, nacionais e internacionais
com modelo vivo, experiência inédita na cidade.
até o dia 20 de dezembro, no Espaço São José
na cidade de Santarém (PA). Realizado em parceria
A iniciativa foi proposta pela artista visual Renata
Liberto/Polo Joalheiro do Pará. A exposição
com o músico santareno Sebastião Tapajós, patro-
Maués, e conta com uma média de 60 desenhos,
tem como propósito exibir o artesanato feito a
no e idealizador do evento, terá atividades específi-
além de 20 fotografias de Jorge Ramos, fotó-
partir da fibra do jupati, matéria prima retirada
cas a estudantes e profissionais da música e shows
grafo exclusivo do projeto. As obras mostram a
de uma palmeira característica da flora do
abertos ao público, que vão do chorinho ao jazz.
evolução do trabalho na foto e no desenho. Mais
município de São Sebastião da Boa Vista. In-
Mais informações pelo telefone: (93) 2101-6529.
informações pelo telefone 4006-2929.
formações pelo site www.artejupati.com.br.
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FAÇA VOCÊ MESMO
Árvore de Natal de retalhos As árvores de Natal de materiais reciclados há anos ganham cada vez mais espaço nas decorações de dezembro pelos produtos diferenciados e visuais inovadores e únicos. Os instrutores da Fundação Curro Velho ensinam a fazer um modelo apenas com papel e retalhos de tecidos. Muitos dos materiais geralmente são jogados no lixo, mas
Do que vamos precisar?
•
resultarão numa peça que vai dispensar luzes e bolas decorativas devido ao colorido. Quando dominar a técnica, aproveite e comece a fazer combinações de materiais e cores diferentes. As suas árvores podem até render algum dinheiro com vendas. Veja os materiais necessários e acompanhe o passo a passo.
Retalhos de tecidos, lisos e estampados de várias cores;
•
Papel kraft;
•
Agulha de mão;
•
Régua;
•
Tesoura de costura;
•
Cola de silicone líquido ou pistola de cola quente;
•
Linha de costura.
INSTRUTORA: BETH SANTANA / COLABORAÇÃO: LUIZA NEVES (TÉCNICA EM GESTÃO CULTURAL) / FOTOS: WALACE FERREIRA/ ASCOM FCP DEZEMBRO DE 2015
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FAÇA VOCÊ MESMO
4 7
Desenhe um círculo no papel kraft para a árvore, com 25 cm de diâmetro e elimine um quarto.
Cole o cone na base.
Pingue um ponto de cola no centro do círculo pelo lado avesso do tecido e aperte, formando o fuxico.
2
Dobre primeiro uma das laterais para o lado de dentro e depois a outra. Coloque fita adesiva ou cola para unir.
3
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Use pedaços de tecido para revestir a árvore.
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Recorte vários círculos no tecido com 8 cm de diâmetro.
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Finalize colocando uma ponteira de sua preferência na árvore: flor de fuxico, estrela, bola de natal, etc.
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Cole os fuxicos lado a lado, começando pela base, até cobrir todo o cone.
Faça um círculo para a base usando o cone como molde.
Para saber mais Quem quiser conhecer mais sobre técnicas artísticas pode se inscrever nas oficinas Curro Velho, da Fundação Cultural do Pará.
Crianças a partir de 12 anos podem participar. A Fundação Curro Velho fica localizada na rua Professor Nelson Ribeiro, nº 287, esquina com a travessa Djalma Dutra, bairro do Telégrafo. Telefones: (91) 3184-9100 e 3184-9109. 64 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
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RECORTE AQUI
1
ATENÇÃO: Essa atividade pode ser feita por crianças, desde que acompanhadas por um adulto responsável
natal
A manhã surgiu branca, fechada, amolecida
por um toró bíblico naquele dezembro. O cheiro verde de mato molhado serpenteava pelas lufadas de vento e invadia a casa, misturado ao aroma saído do bule. Defronte, os pingos espetavam o rio volumoso que, da janelinha do quarto de dormir, parecia dança ou criar desenhos no remanso, mais vivo do que nunca. O barulho no telhado agoniava e era também convite para ficar na rede. E assim foi feito. Curvou-se ainda mais, em caracol, parecendo uma trouxa, absorto. No vago da casa, fria da chuva, a visão até o quintal listava os poucos móveis – uns bancos, a mesa comum -, e a irmãzinha adormecida, coberta no mosquiteiro remendado e marcado pela guerra noturna contra os carapanãs. Ao fundo, já perto do quintal, a mãe na cozinha, emoldurada na contraluz realizando as tarefas no jirau. Era franzina, rija, rápida, mas estava quieta nas primei-
LEONARDO NUNES
BOA HISTÓRIA
ras horas do dia entretida com o radinho ligado: “alô, alô, interior! Recado pra dona...”. Cuidava o peixe de sempre e pensava no marido. Nem notícia. O moleque olhava as brechas que foram preenchidas cada vez mais pela luminosidade que adentrava a choupana sem cessar. Um branco cada vez mais denso e invasivo, mas que ninguém se preocupou porque nele não havia nenhum cheiro diferente de nada dos cheiros domésticos. Pairavam o delicioso cheiro de café quente e da vegetação úmida com a chuva de três dias sem parar. A casa foi tomada pela nuvem luminosa tão devagar que mãe e filhos não perceberam de pronto e ao perceberem não houve espanto, nem medo, nem nada. Era coisa da natureza, cada um concluiu ao seu modo, exceto a neném que nem sequer acordou debaixo do filó, nem tinha como chegar a conclusão nenhuma na sua inocência de anjo. A mulher se deslocou até o
fogareiro tateando para não derrubar nada. Quase leva a bateria de panelas com a saia. O garoto na letargia matinal percebeu que a luz vinha em grãos, uns fininhos, outros maiores, outros do tamanho de petecas de vidro. E achou tudo muito engraçado. Longe distinguia a silhueta da mãe e a chama embaixo da panela de arroz. Os estalos no assoalho também foram encarados como coisa à toa. Toda casa de madeira, de vez em quando, dana a estalar. É a forma que acharam para falar com os donos, pensava a mulher, que continuou nos afazeres ouvindo o grunhir de tábuas, perna-mancas, esteios, ripas. O menino sentou-se na beira da rede, preguiçoso que só. Foi ele que sentiu primeiro: o casebre navegava já em boa velocidade debaixo do dilúvio furando tranquilo a atmosfera densa, macia, clara como leite. DEZEMBRO DE 2015
Anderson Araújo
é jornalista e escritor
• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 65
NOVOS CAMINHOS
Desenvolvimento a partir de Belo Monte A licença de operação para a hidrelétrica de Belo Monte concedida pelo Ibama reacen-
como unidades que precisam ser remanejadas para dar espaço ao progresso.
no rio Xingu, sobretudo pela crítica de
Há três décadas do final das obras em
indígenas e pesquisadores em relação às
Tucuruí, por exemplo, comunidades
condicionantes não cumpridas. A libera-
próximas, na área de influência do rio
ção para o enchimento do primeiro reser-
Tocantins, ainda cobram indenizações
vatório, processo que deverá ser iniciado
e não têm acesso à energia produzida no
em janeiro de 2016, reforçará novamente
“quintal” delas.
tico que não prevalece a região atingida.
O economista e sociólogo Carlos Vainer é incisivo acerca dessa problemáti-
Renomados estudiosos, que se debru-
ca e adapta o termo enclave – utilizado
çam sobre o tema na Amazônia desde as
para a análise do processo de explora-
obras da hidrelétrica de Tucuruí, apon-
ção mineral na Amazônia – para anali-
tam as características desses empreen-
sar a construção de hidrelétricas: elas
dimentos: servem para transferência
não “nascem” do processo de desen-
de energia em grande escala para o eixo
volvimento no território amazônico e
Sul-Sudeste e fornecimento a autopro-
não expressam ações sociais, políticas
dutoras da região. E de 1980 até hoje se
ou econômicas endógenas; são, sim,
mantém o silenciamento de fontes alter-
“implantadas” e contradizem o con-
nativas de aproveitamento e as políticas
ceito de desenvolvimento sustentável.
públicas ainda são definidas à sombra
Assim, reforçam um novo impulso ao
dos fantasmas dos blackouts.
A principal questão agora é avaliar se
é jornalista, mestre em Planejamento do Desenvolvimento Sustentável (NAEA-UFPA) e professor da Universidade da Amazônia @thiagoabarros
quenos agricultores figuram em projetos
deu o debate sobre os impactos da usina
a implementação de um modelo energé-
THIAGO BARROS
neficiado. Indígenas, ribeirinhos, pe-
padrão de desenvolvimento de economia de fronteira.
empreendimentos como Belo Monte, Ji-
A crítica central construída a partir
rau e São Francisco – além das possíveis
das experiências dos grandes projetos e
hidrelétricas na região do rio Tapajós –
outras iniciativas de médio porte é de que
promovem desenvolvimento regional ou
a Amazônia não se integra a um plano de
replicam a lógica de utilização da Ama-
crescimento nacional, mas o alimenta,
zônia como fonte inesgotável de recur-
reforça Vainer, de forma separada, ligada
sos para o arranco do país – afirmações
a ele por linhas de transmissão de ener-
estereotipadas pela mídia e governos,
gia elétrica. Alternativas que poderiam
mas não discutidas de forma adequada,
ser contempladas nas políticas públicas
sequer em audiências públicas nos mu-
para a região – de acordo com o tema tra-
nicípios diretamente atingidos.
tado no artigo de novembro nesta seção
Para um debate qualitativo sobre o
– entram em conflito com os grupos que
desenvolvimento regional é necessário
comandam as construções de barragens
que as atuais políticas públicas sejam
e linhas de transmissão e comercializam
avaliadas de acordo com quem será be-
a energia no Brasil.
66 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •
DEZEMBRO DE 2015
A principal questão agora é avaliar se Belo Monte promove desenvolvimento regional ou replica a lógica de utilização da Amazônia como fonte inesgotável de recursos para o arranco do país
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