Revista Amazônia Viva ed. 54 / fevereiro de 2016

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REVISTA ENCARTADA NO JORNAL O LIBERAL. NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE.

FEVEREIRO 2O16 | EDIÇÃO NO 54 ANO 5 | ISSN 2237-2962

GUERRA CONTRA O

AEDES

O Instituto Evandro Chagas intensifica as pesquisas sobre o mosquito vetor da dengue, febre chikungunya e zika. Mas os cientistas alertam que cada cidadão precisa fazer a sua parte nesse combate.

CORES

Grafiteiros dão um novo visual à ilha do Combu

SUSTENTABILIDADE

Resultado do Programa Municípios Verdes avança no Pará

MARAJÓ

Turistas conhecem um roteiro alternativo no arquipélago




EDITORIAL

PUBLICAÇÃO MENSAL DELTA PUBLICIDADE - RM GRAPH EDITORA FEVEREIRO 2016 / EDIÇÃO Nº 54 ANO 5 ISSN 2237-2962 Presidente LUCIDÉA BATISTA MAIORANA Presidente Executivo ROMULO MAIORANA JR. Diretor Jurídico RONALDO MAIORANA Diretora Administrativa ROSÂNGELA MAIORANA KZAM Diretora Comercial ROSEMARY MAIORANA Diretor Industrial JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO Diretor de Marketing GUARANY JÚNIOR Diretor JOSÉ LUIZ SÁ PEREIRA

Caminhão trafega a Cuiabá-Santarém sob uma grossa cortida de fumaça provocada pelas queimadas na região

A Amazônia está queimando forma, mas é uma realidade. Infe-

lar sobre outra luta dos dias atuais

lizmente. É duro se deparar com

na Amazônia. O combate ao mos-

um cenário de queimadas que

quito Aedes aegypti, vetor da den-

aumentam na região não somen-

gue, é agora mais urgente devido

te por questões climáticas, mas

ao surgimento de outras doenças

também graças às ações danosas

transmitidas pelo inseto: a febre

de invasores que buscam o lucro

chikungunya e a zika.

4 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

do

Instituto

Em pleno século 21, ainda há

Evandro Chagas se debruçam so-

centenas de casos de incêndios nas

bre os casos dessas doenças bus-

matas da região registrados todos

cando conhecer melhor “o inimi-

os dias pelo Instituto Nacional de

go”. Mesmo com os avanços nos

Pesquisas Espaciais (INPE). Mes-

estudos nos laboratórios do IEC, os

mo com os esforços de governos,

cientistas reafirmam que a popula-

ONGs e pesquisadores os esforços

ção também deve contribuir com a

ainda são poucos para erradicar o

redução das ocorrências, tomando

problema na Amazônia. É preciso

os cuidados básicos, já amplamen-

criar mecanismos e políticas públi-

te divulgados na imprensa, como

cas para se intensificar as ações de

evitar acúmulo de água, entulho e

combate às queimadas nas áreas

ambientes favoráveis à procriação

florestais e urbanas da região.

do mosquito.

FEVEREIRO DE 2016

Jornalista responsável e editor-chefe FELIPE JORGE DE MELO (SRTE-PA 1769) Coordenação geral LUCIANA SARMANHO

Pesquisador e consultor técnico INOCÊNCIO GORAYEB

Nesta edição também vamos fa-

Pesquisadores

REDAÇÃO

Editor de arte FILIPE ALVES SANCHES (SRTE-PA 2196)

É triste começar um texto dessa

pensando na Amazônia só para si.

FELIPE JORGE DE MELO Editor-chefe

ADAM RONAN / ECOFOR / DIVULGAÇÃO

FUMAÇA, FOGO E CINZAS

Conselho editorial RONALDO MAIORANA JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO GUARANY JÚNIOR LÁZARO MORAES

Colaboraram para esta edição O Liberal, Agência Pará de Notícias, Agência Brasil, Museu Paraense Emílio Goeldi, Universidade Federal do Pará, Universidade do Estado do Pará, Universidade Federal Rural da Amazônia, Fundação Cultural do Pará - Oficinas do Curro Velho (acervo); Camila Machado, Fabrício Queiroz, Victor Furtado, Anderson Araújo, Moisés Sarraf, Sávio Oliveira, Dominik Giusti, Ana Paula Mesquita, João Cunha, Brenda Pantoja, Alan Bordallo (reportagem); Moisés Sarraf e Fabrício Queiroz (produção); Fernando Sette, Roberta Brandão, Carlos Borges, Tarso Sarraf, Oswaldo Forte, Akira Onuma (fotos); Thiago Barros (artigo) André Abreu, Leonardo Nunes, Jocelyn Alencar, Sávio Oliveira, Márcio Euclides (ilustrações); Alexsandro Santos (tratamento de imagem). FOTO DA CAPA Laboratório de Arbovirologia do Instituto Evandro Chagas, por Akira Onuma AMAZÔNIA VIVA é editada por Delta Publicidade/ RM Graph Editora Ltda. CNPJ (MF) 03.547.690/0001-91. Nire: 15.2.007.1152-3 Inscrição estadual: 158.028-9. Avenida Romulo Maiorana, 2473, Marco - Belém - Pará.

amazoniaviva@orm.com.br

PRODUÇÃO

REALIZAÇÃO


NESTA EDIÇÃO

EDIÇÃO Nº 54 / ANO 5

40

Na luta contra as queimadas O fogo se alastra sobre a floresta graças à ação do El Niño, à falta de chuvas na região e à ambição de invasores. É preciso unir forças nesse combate. ASSUNTO DO MÊS

AKIRA ONUMA

CLAUDIO PINHEIRO

ROBERTA BRANDÃO

FERNANDO SETTE

E MAIS

36 56 16 48 TECNOLOGIA

MÚSICA

O diretor da Universitec,

A cantora e compositora

COZINHA

da Universidade Fede-

TURISMO

Nanna Reis também se

O cozinheiro Rubão é uma

ral do Pará, Gonzalo

Moradores da vila do Céu,

divide entre o trabalho

das personalidades mais

Enriquéz, comenta sobre

no Marajó, criaram um ro-

como atriz e roteirista,

conhecidas de Belém. Em

o novo Marco Regulatório

teiro alternativo para os

além da produção artís-

seu restaurante na Cidade

de Ciência e Tecnologia,

turistas que chegam ao

tica. Ela já passou por

Velha ele recebe os visi-

considerado um avanço

arquipélago. Os visitantes

vários estilos musicais

tantes com um cardápio

para os pesquisadores de

conhecem de perto o

e se define como uma

paraense bem especial.

todo o Brasil.

modo de vida do lugar.

pessoa “presepeira”.

QUEM É?

ENTREVISTA

COMUNIDADE

PAPO DE ARTISTA

4 6 7 11 13 14 15 17 17 18 19 19 20 21 25 52 60 62 63 65 66

EDITORIAL AS MAIS CURTIDAS PRIMEIRO FOCO TRÊS QUESTÕES ELES SE ACHAM FATO REGISTRADO PERGUNTA-SE EU DISSE APLICATIVOS CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE DESENHOS NATURALISTAS CONCEITOS AMAZÔNICOS COMO FUNCIONA CIÊNCIA OLHARES NATIVOS SUSTENTABILIDADE MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS AGENDA FAÇA VOCÊ MESMO BOA HISTÓRIA NOVOS CAMINHOS

FEVEREIRO DE 2016

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 5

OSWALDO FORTE

FEVEREIRO2016


ASMAISCURTIDAS DESTAQUES DAS EDIÇÕES ANTERIORES

FERNANDO SETTE

CHOCOLATE Tenho orgulho de ser paraense e saber que somos reconhecidos pela nossa gastronomia. Destaque para a matéria sobre o chocolate produzido na ilha do Combu. Viva a Dona Nena! (“Chocolate 100% cacau. 100% Belém.”, Primeiro Foco, Janeiro de 2016, edição nº 53). Marianne Barreto Belém-Pará

O APANHADOR DE AÇAÍ

A imagem do ribeirinho subindo o açaizeiro com o auxílio de uma peconha foi a foto mais curtida em nosso Instagram

BELÉM Belém sempre linda, retratada sob vários ângulos e sem cair em reportagens piegas. Parabéns, Amazônia Viva. (“Belém curtida

FERNANDO SETTE

e compartilhada”, Capa, Janeiro de 2016, edição nº 53). Clístenes Assunção Belém-Pará

COMUNIDADE Gostei da reportagem sobre alguns bairros de Belém, mas senti falta de outros como Guamá, Marco, Umarizal e Terra Firme (“Um país que se chama Belém”, Comunidade, Janeiro de 2016, edição nº 53). Eles também fazem parte da história da capital paraense. Anderson Monteiro Belém-Pará A beleza da história dos bairros mais famo-

PELAS BELAS RUAS DE BELÉM

sos de Belém e suas origens escondem a

A reportagem sobre os principais bairros de Belém foi a mais curtida e compartilhada em nosso Facebook na edição passada.

dura realidade de abandono e descaso com seus habitantes. Vale a pena comemorar 400 anos?

TARSO SARRAF

Emília França Belém-Pará

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FEVEREIRO DE 2016

para o endereço: Avenida Romulo USE UM LEITOR DE QR CODE PARA ACESSAR A EDIÇÃO DIGITAL DE JANEIRO

Maiorana, 2473, Marco, Belém - Pará, CEP 66 093-000 ou FAX: 3216-1143.


O QUE É NOTÍCIA PARA A AMAZÔNIA DIVULGAÇÃO

PRIMEIROFOCO

Exposição a rio aberto

O PROJETO STREETRIVER LEVOU GRAFITEIROS PARA O OUTRO LADO DE BELÉM, QUE MUDARAM A CARA DA COMUNIDADE DO IGARAPÉ COMBU, DANDO MAIS COLORIDO À VIDA DOS RIBEIRINHOS PÁGINAS 8 E 9

EXPORTAÇÃO

CONSCIENTIZAÇÃO

O açaí se consolida como um dos principais produtos regionais vendidos para fora do Brasil e ajuda a alavancar a economia paraense. PÁG.10

Em sua terceira edição, a Copa Verde vai colocar o meio ambiente e a sustentabilidade como base da competição de 2016. PÁG.13

FEVEREIRO DE 2016

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PRIMEIRO FOCO

Enquanto em um lado da beira do rio se cortava o bolo dos 400 anos de Belém no Ver o Peso, do outro, na Ilha do Combu, o aniversário da capital paraense passava quase que em branco no dia 12 de janeiro. Como lá o tempo demora mais a passar, a festa dos ribeirinhos demoraria a começar: foi de sábado a domingo, quando a segunda edição da Streetriver chegaria à localidade do Igarapé Combu trazendo cores compatíveis com a floresta. O presente foi de Sebá Tapajós, idealizador da primeira galeria fluvial da Amazônia, que levou um time de artistas convidados para passar dois dias pintando sete casas no local, levando a 12 obras o acervo da galeria. Mais do que embelezar um ponto turístico de Belém, a intenção de Sebá com o Streetriver é fazer com que os olhos de Belém se voltem para o povo caboclo e indígena que carrega o DNA da Amazônia. A Streetriver foi o presente que Sebá quis deixar para Belém dos 400 anos – mas nem ele sabia disso ainda. Depois de pintar muros em Santarém, Rio de Janeiro, Salvador, Buenos Aires e em cidades espalhadas pela Europa, o artista visual e grafiteiro voltou a capital paraense. E foi na cidade, com a qual vive uma relação de amor, que ele se reconectou às suas origens amazônicas. Com um traço amplamente inspirado nas paisagens do Pará, Sebá decidiu se voltar para outras ruas da capital paraense, as ruas de água que levam para a Belém das ilhas, parte tão importante da cidade quanto esquecida. “Aqui estão as nossas raízes. O povo ribeirinho, o povo indígena, são eles que guardam nossa cultura,

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FOTOS: DIVULGAÇÃO

Novo visual na ilha


PEGADA URBANA

Idealizado pelo artista visual Sebá Tapajós (à esquerda, de boné), o Streetriver tornou-se uma galeria fluvial na Amazônia, reproduzindo nos grafites a realidade das comunidades ribeirinhas. O casal Robézio e Tereza, do Acidum Project (CE), se encantaram com Angélica Quaresma, de 90 anos, moradora do Combu.

nossos hábitos e os valores que fazem o nosso povo. É preciso olhar por eles e para eles”, comenta. Em 2015, na primeira fase do projeto, ele levou sua arte para cinco casas do Igarapé Combu, dando a elas um traço que lembra o movimento dos rios. Nesta edição, ele convidou talentos do grafite nacional para se unir à luta pela valorização dos povos amazônicos. Fael Primeiro (BA), Kajaman (RJ), Mundano (SP), Acidum Project (CE), Toys e Omik (DF) e o prata da casa Gaspar (PA) formaram o time para a expedição amazônica. Foi a primeira imersão na região da maioria dos artistas, acostumados a traduzir o cotidiano das grandes cidades em seus respectivos muros, em formas abstratas ou diretas, poéticas ou reivindicatórias. No meio da floresta, porém, para criar era preciso, primeiramente, entender o ambiente. Por isso, além de conhecer as

instalações que pintariam, os artistas aproveitaram a visita técnica para já trocar as primeiras ideias com seus moradores. E, diferente do que se vê nas grandes cidades, no meio da floresta a receptividade para a ainda renegada arte do grafite foi total. “Aqui a gente teve toda a liberdade para criar. A Dona Angélica não pediu para ver nada antes, nenhum esboço. E ainda recebeu a gente com um café quentinho”, lembra Robézio, que com a esposa Tereza forma o duo cearense Acidum Project. “Eu queria uma pintura nova para minha casa no ano novo”, conta Angélica Quaresma, de 90 anos, moradora do Combu. “E aí eles apareceram e deu tudo certo”. Se integrar ao ambiente também aconteceu do lado ribeirinho: vendo os artistas em seus processos criativos, os moradores mostraram curiosidade por aprender mais sobre a arte urbana. Até em-

piricamente. “Dei a falta por dois tons de vermelho enquanto estava pintando, mas achei que havia acabado. De repente começou a chover e o Seu Branco me chamou para entrar. Lá dentro eu vi que a Jamile tinha pegado as tintas e riscado as paredes da casa”, contou o carioca Kajaman. “O sonho agora é que em edições futuras do Streetriver a gente veja artistas ribeirinhos participando”, completou Fael Primeiro. Esse é um dos legados que Sebá Tapajós espera criar com o Streetriver, conciliando com os que já estão sedimentados na ilha. “Outra preocupação nossa é a de garantir que isso aqui continue nas mãos dos ribeirinhos, que essa cultura não se perca, não se descaracterize. O Combu é dos povos indígenas, dos povos ribeirinhos, dos povos amazônicos, dos povos da mata em geral”, completa o artista. FEVEREIRO DE 2016

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PRIMEIRO FOCO EVERALDO NASCIMENTO / ARQUIVO O LIBERAL

T E R R AS

PLANO DE MORADIA O Pará será modelo do plano desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), que pretende implementar uma metodologia para antever problemas em territórios impactados por grandes empreendimentos, tais como hidrelétricas, ferrovias, rodovias, por tos e mineradoras. A Região de Integração do Tapajós será a primeira a ser avaliada. Para implantação deste projeto, a ONU planeja fazer mais de 20 estudos e planos no território para poder subsidiar e monitorar as mudanças de gestão e governança local. Isso inclui o CPI, que é o Índice de Progresso de Cidades, padrão adotado pela ONU. Contudo, pela primeira vez no mundo será realizado para um território, incluindo até a proposta de leis para mudar o marco regulatório sobre licenciamento ambiental e formação de fundos gestores para os impactos sinérgicos possíveis no território.

MADE IN PARÁ

P R OTÓT I PO

TELHA SUSTENTÁVEL Pesquisadores da Univer sidade Federal do Amazonas (Ufam) es tão desenvolvendo o protótipo de uma telha sus tentável. Ela é feita, principalmente, com f ibras naturais da Amazônia, como a malva e a juta, e com uma argamas sa que inclui areia, resíduos de cerâmica e pouco cimento. Segundo o subcoordenador da pesquisa, o doutor em engenharia João de Almeida Melo Filho, a telha sus tentável terá boa aceita ç ã o p e l o s c o n s u m i d o r e s p o r q u e , além de ser mais barata, será parecida com as disponíveis no mercado. João de Almeida acredita que a utilização das f ibras naturais para a produção das ecotelhas também vai estimular o trabalho de produtores ribeirinhos. O pesquisador informou que o protótipo da ecotelha deve ficar pronto em 12 meses. 10 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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Exportação de açaí alavanca a economia O açaí, um dos alimentos mais tradicionais dos paraenses, se consolida como produto de exportação. Só no ano passado, as vendas externas do fruto injetaram mais de R$ 225 milhões na economia estadual. Pensando nisso, a Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap) está implantando o Programa de Desenvolvimento da Cadeia Produtiva do Açaí no Estado do Pará (Pró-Açaí). A meta do programa é expandir em 50 mil hectares a área cultivada com açaí no período de 2016 a 2020, fazendo com que a produção aumente em 360 mil toneladas anuais de frutos até 2024. A meta do Pró-Açaí é

implantar 10 mil hectares de açaizeiros nas regiões de terra firme do Estado, na forma de cultivo solteiro ou em Sistemas Agro-Florestais (SAFs). A ideia, na terra firme, é aproveitar apenas as áreas já abertas pela ação humana – como pastagens abandonadas – e envolver mil pequenos, médios e grandes produtores rurais utilizando, entre outras tecnologias, a irrigação. A expansão da cadeia produtiva também trará ganhos sociais, com a criação de mais três mil empregos diretos e 12 mil indiretos na terra firme e de cinco mil ocupações produtivas diretas e de outras 20 mil ao longo da cadeia, nas áreas de várzea.


TRÊSQUESTÕES

REGENERAÇÃO

Atividade mineral ajuda a renovar a vegetação

Os avanços da constituição brasileira No dia 24 de fevereiro é celebrada a promulga-

nico, que é capaz de regenerar áreas mantendo a vegetação original de onde houve a extração. “Do ponto de vista ambiental, essa técnica é o aproveitamento de um material muito nobre, que faz parte de processos biológicos em geral e que ia ser descartado”. disse o biólogo Maxmiller Cardoso, um dos responsáveis pelo estudo. Na pesquisa dele, que ainda está em andamento e deve ser concluída no ano que vem, já foram percebidas inovações, principalmente na capacidade de regeneração da vegetação em meio a pedaços de raízes que vieram do solo extraído anteriormente.

ção da Primeira Constituição Republicana, o ponto de partida para a Constituição Federal de 1988, em vigor até hoje e com atualização constantes através de emendas. A professora doutora em Direito Juliana Freitas, da Graduação e Mestrado do Centro Universitário do Pará, fala sobre a evolução da legislação brasileira. Nossa Constituição, após inúmeras emendas, já está ultrapassada? Vivemos numa democracia ainda muito

CLAUDIO SANTOS / AGÊNCIA PARÁ

jovem, que completará 28 anos em outubro deste ano. Mas se o Direito, como ciência social que é, deve acompanhar a sociedade no que toca às suas modificações, é fundamental que a norma que sustenta todo esse sistema jurídico também se adeque às exigências que se impõem com o transcorrer do tempo. Como a Constituição Republicana de 1891 influenciou a nossa atual Constituição Federal de 1988? A Constituição de 1891 é o marco inicial para a que está em vigor no Brasil por vários moti-

EXTRAÇÃO

Segundo a Embrapa, solo de áreas de mineração pode ser reaproveitado para regeneração de terras degradadas

vos. Os principais são a política institucional adotada como sistema republicano federativo e a universalização do direito do voto, ainda

MUNICÍPIOS

CONHECIMENTO

A Semana Nacional de Ciência e Tecnologia

O ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação,

É válida a inclusão do estudo da CF nos

(SNCT) alcançou a marca histórica de

Celso Pansera, afirmou que o ministério está

ensinos fundamental e médio?

mil municípios participantes em todo o

elaborando um programa para popularizar

É imprescindível para a formação da consci-

Brasil em 2015. O número comprova o

a ciência no país. Segundo ele, a intenção

ência política e cidadã nas crianças e jovens

sucesso das ações de popularização da

é criar espaços onde os estudantes possam

do país. É um absurdo admitir que muitos

ciência desenvolvidas pelo Ministério da

ter contato com o universo e os fenômenos

escolhem os nossos representantes políticos

Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que

científicos. “É um bom momento para lançar

sem nem sequer entender e compreender o

estão chegando a centenas de municípios

um programa de popularização da ciência,

funcionamento do Estado e suas respecti-

do interior do País. Na avaliação do

aproximando biologia, química, matemática

vas funções. A ignorância política é um dos

coordenador Douglas Falcão, o maior

e física da juventude, criando prazer nos

principais empecilhos para a efetivação da

legado da SNCT é favorecer a “formação de

jovens e nas crianças com o conhecimento”,

democracia no Brasil.

uma rede” de popularização.

afirmou Pansera.

CIÊNCIA E TECNOLOGIA

INOVAÇÃO NO PAÍS

que alcançando, no início, apenas os homens.

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ARQUIVO PESSOAL

Um estudo realizado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) revelou que uma parte do solo retirado em construções e áreas de mineração pode ter um excelente reaproveitamento para regeneração de áreas degradadas. A técnica consiste em retirar a camada superficial do solo de uma área a ser explorada e aplicar esse material em locais destinados à compensação ambiental. Normalmente descartado em aterros e em áreas próximas a rodovias, esse composto de terra, troncos, brotos e demais elementos forma um rico material orgâ-

RESPOSTAS QUE VÃO DIRETO AO PONTO


PRIMEIRO FOCO ASCOM SETUR

A L E R TA

PLÁSTICO AO MAR O uso maciço de plásticos é tamanho que os oceanos abrigarão mais detritos do que peixes em 2050, segundo dados divulgados no Fórum Econômico Mundial de Davos. Segundo o documento, a proporção de toneladas de plástico por toneladas de peixes era de uma para cinco em 2014, será de uma para três em 2025 e vai ultrapassar uma para uma em 2050. O fórum estima necessária “uma refundação total das embalagens e dos plásticos em geral” e a busca por alternativas ao petróleo como material de base para sua produção pois, caso nada mude, o plástico representará 20% da produção petroleira em 2050.

CO N S UM O

BATERIA INTELIGENTE Pesquisadores da Universidade britânica de Stanford desenvolveram a primeira pilha de lítio e íon que desliga antes de esquentar e liga quando a temperatura esfria. Segundo um estudo publicado na revista “Nature Energy”, esta nova tecnologia pode prevenir os incêndios causados pela retirada e pela proibição de

TURISMO

muitos dispositivos que funcionam com pilhas,

Cavalgada do Marajó atrai aventureiros

desde poltronas reclináveis e computadores

Trabalhar com nichos de mercado, recebendo o visitante com atendimento de qualidade na oferta de produtos turísticos diferenciados. Estes são alguns dos objetivos da Secretaria de Estado de Turismo (Setur) neste ano. Um destes novos produtos é a cavalgada no Marajó, que chega ao mercado internacional por meio da Cavalgadas Brasil, uma empresa especializada no turismo equestre, com expertise e parcerias estrangeiras. De acordo com a diretora de Produtos Turísticos da Setur, Conceição Silva, a cavalgada se en-

quadra no segmento do turismo de aventura. “O local escolhido para esta experiência é encantador. O Marajó com seus campos e alagados e ainda a presença de garças, guarás, peixes, sua vegetação, dentre outros, proporciona um belo espetáculo”, afirmou. Ela salientou também a exuberância dos campos bragantinos, nas proximidades de Tracuateua, inseridos também no contexto da Rota Turística Belém-Bragança. “Lá é possível fazer a cavalgada num trecho de leito natural da antiga estrada”, explica.

até sistemas de navegação e “hoverboards”. O engenheiro da Universidade de Stanford e coautor do estudo, Yi Cui, diz que este projeto, em comparação com anteriores testes, “oferece uma estratégia confiável, rápida e reversível que pode melhorar a segurança”.

I N C E N T I VO

MAIS PESQUISAS A presidente Dilma Rousseff sancionou o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação em cerimônia no Palácio do Planalto. O Projeto de Lei da Câmara (PLC) 77/2015 promove uma série de ações para o incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento científico e tecnológico. A ideia é aproximar as universidades das empresas, tornando mais dinâmicos a pesquisa, o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação no país, além de diminuir a burocracia nos investimentos para a área. O texto prevê a isenção e a redução de impostos para as importações de insumos feitas por empresas na execução de projetos.

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ELESSEACHAM POR QUE MIMETISMO É UMA COISA NATURAL

COPA VERDE

Futebol paraense se alia ao meio ambiente Em sua terceira edição, a Copa Verde irá fazer jus ao nome, colocando o meio ambiente e a sustentabilidade como base da competição de 2016, primeira com o título carbono zero do Brasil. Ao longo do campeonato, que começou no dia 6 de fevereiro, serão desenvolvidas diversas campanhas. O objetivo é unir torcidas e clubes em prol da conscientização dos graves problemas ambientais que assolam regiões como a Amazônia e o Pantanal, patrimônios ambientais localizados na região Norte e Centro-Oeste do país. Outra novidade é o “Cartão Verde”,

Sapo de prontidão para estampar a natureza Não é difícil conhecer a origem do grito de susto que advém do banheiro: tem sapo no box. São os populares sapos da

já utilizado em competições em países como a Itália, autorizado pela Federação Internacional de Futebol (FIFA). A iniciativa é uma espécie de bonificação para o jogador que tenha praticado um ato de “fair play”, de jogada limpa, de reconhecimento e postura adequada em relação ao adversário e de não violência em campo. O vencedor da Copa Verde também receberá dois troféus: a taça convencional e um prêmio vivo, uma árvore da flora brasileira que será plantada na sede ou no Centro de Treinamento do clube vencedor. A espécie será definida pelo próprio clube.

ordem Anura, sobretudo os da família Bufonidae, que estão adaptados aos ambientes humanos. Os sapinhos nas paredes frias e úmidas no geral podem causar espanto, mas não os anfíbios do gênero Rhinella. Apesar de serem inofensivos, até poderiam causar algum asco ou o susto quando vistos. Mas esse é o problema: quase nunca são vistos. Eles são especialistas na arte da camuflagem, sobretudo os do gênero

Rhinella. As glândulas paratoides e o tegumento tuberculoso grosso, que sevem de proteção física, transporte de íons e água, respiração e controle térmico, têm outra função. Por serem ANTONIO SILVA / AGÊNCIA PARÁ

rugosos e terem coloração marrom amarelada no dorso, facilmente se camuflam ao ambiente. A perna do sapo vira um pedaço do solo e, seu dorso, confunde-se com folhas caídas, gravetos, galhos e até com pedregulhos. A foto abaixo mostra uma espécie do gênero Rhinella num momento chave: quando o sapo deixa de ser sapo e passa a ser ambiente. É claro que o mecanismo tem duplo benefício: escapar de predadores e espreitar suas presas. E é assim que, dificilmente, você vai escutar um grito de alguém assustado por ver um sapo. Não pelos sapos do gênero Rhinella. FERNANDO CARVALHO

INCENTIVO

O governador do Pará, Simão Jatene, e o prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, apoiam a iniciativa da Copa Verde

PAT E N T E

PROTEÇÃO INTELECTUAL O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, lançou o projeto “Prioritário BR”. O objetivo principal é garantir que um pedido de patente inovadora depositado originalmente no instituto, mas com depósito equivalente em outro país, receba tratamento prioritário em sua análise. De acordo com o diretor de Patentes do órgão, Júlio César Moreira, “o INPI pretende analisar a patente em prazo mais ágil. Segundo ele, a meta é de nove meses a um ano. O diretor afirmou que a proposta é agilizar o processo, de modo que a empresa coloque seu produto no mercado ou comece a exportar produtos de alto valor agregado protegida pela patente”. FEVEREIRO DE 2016

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FATO REGISTRADO

Gado na várzea do rio Amazonas A descida milenar e infinda do rio Amazonas rumo ao oceano e as vazantes e enchentes anuais da bacia recria a vida: deposita considerável quantidade de solos de partículas em suspensão em suas águas barrentas. E nas várzeas, fiéis depositárias desses detritos ricos em nutrientes, a vegetação cresce exuberante. É nessas áreas que os criadores de gado, ouvindo o ritmo das águas, trabalham para manter os rebanhos a salvo nos períodos da cheia. A foto retrata o trabalho anual do 14 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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vaqueiro para conduzir o gado às terras altas às vésperas da cheia e, depois, retornar com o gado para seus campos baixos. O rio Amazonas começa a subir desde o mês de novembro e, então, alcança sua cota máxima anual no mês de julho, início do verão amazônico: hora de preparar o retorno. Nesse período, cobre as várzeas e põe fazendas no fundo, confinando o gado nas alturas e nas marombas, tablados construídos sobre grandes toras de madeira, que seguem flutuando com os bovinos.

INOCÊNCIO GORAYEB

A foto é de 1976. Registra o gado confinado nas altas do rio Solimões, área próxima a Manaus (AM), quando as pastagens estavam totalmente cobertas pelas águas e os tratadores tinham de trazer, carregando em canoas a canarana para alimentar os bichos. A canarana são gramíneas hidrófilas que crescem em bancos e saem flutuando pelos rios. Na cena, o ribeirinho joga a canarana da conoa para o gado. Para um gado que flutua sobre a água, só um pasto de peixe-boi.


Crianças aprendem sobre os povos indígenas O Instituto Socioambiental lançou um livro especial para crianças sobre os povos indígenas, intitulado “Povos Indígenas no Brasil Mirim”. O ISA já trabalha com o tema há mais de 20 anos. Segundo a editora do Instituto, Tatiane Klein, o livro é dividido em quatro capítulos e tenta traduzir coisas tão complexas quanto demarcação de terras e sistema de parentesco dos indígenas ou como as crianças aprendem a caçar e ajudar os pais na roça, de um jeito especializado e até com texto escrito pelas próprias crianças.

A publicação traz informações detalhadas sobre alguns dos 246 povos indígenas que vivem atualmente no Brasil: uma população de quase 900 mil pessoas, que fala mais de 150 línguas diferentes. Além de textos em linguagem acessível, o livro conta com ilustrações e fotografias de diferentes povos indígenas – construindo um painel da sociodiversidade indígena brasileira e rompendo com a ideia de que “todos os índios são iguais” O livro pode ser adquirido no site do ISA www.socioambiental.org.

PEXELS / DIVULGAÇÃO

OSWALDO FORTE / ARQUIVO O LIBERAL

RESPEITO

PERGUNTA-SE POIS É PRECISO ESCLARECER MITOS E VERDADES

Mel ajuda a curar dor de garganta? Com as mudanças climáticas do início do ano, viroses e resfriados são comuns e aqueles mais tradicionais recomendam mel com diversas receitas com limão, alho, copaíba, andiroba ou tudo junto para curar as dores de garganta e afastar as doenças. O otorrinolaringologista Francisco Xavier Palheta Neto, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), observa que mel, comumente, é usado no tratamento dessas doenças e sintomas, como tosse, e alerta: “Na verdade, o mel não ajuda na tosse, pois acaba formando pequenos cristais de açúcar na garganta que provocam irritação. Esses mesmos cristaizinhos servem de alimento para bactérias, então pode acabar piorando”. Sprays vendidos em farmácias, que contêm mel na fórmula e são associados a uma série de outros ingredientes, também não representam muita coisa no

SORO

ZIKA VÍRUS

C A AT I N G A

INSETICIDA NATURAL

tratamento de gripe ou viroses. “Esses produtos apenas tratam os sintomas e

Parceria firmada entre o Instituto Vital

Duas plantas comuns na Caatinga – a cutia e

não as doenças. Muitas vezes é efeito pla-

Brazil, laboratório do governo do Rio, e

a umburana – estão sendo estudadas por um

cebo, pois o que se tem não é a cura e sim

a Universidade Federal do Rio de Janeiro

grupo de pesquisadores do Instituto Nacional

um alívio, graça a menta e eucalipto. Mas

(UFRJ) prevê desenvolver um soro contra

do Semiárido por terem compostos que

é o mesmo alívio que um copo de água

o vírus zika. A previsão é que o soro fique

funcionam como biopesticidas no combate

poderia proporcionar”, ressalta Xavier.

pronto em até três anos para o tratamento

ao Aedes aegypti, mosquito transmissor da

de pessoas infectadas pelo vírus. O diretor

dengue, do vírus zika e da chikungunya. O

científico do Vital Brazil, Cláudio Maurício

coordenador da pesquisa, Alexandre Gomes,

de Souza, disse que a expectativa é que

explicou que a grande vantagem de usar

o soro funcione da mesma forma que o

pesticidas vegetais, orgânicos, é que essas

soro antirrábico. Antes de chegar para uso

substâncias são mais seletivas e agem em

humano, o soro será testado em animais.

pragas específicas.

MANDE A SUA PERGUNTA Envie perguntas instigantes sobre hábitos, costumes e fenômenos da região amazônica para o e-mail: amazoniaviva@orm.com.br

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QUEM É?

RUBÃO

O cozinheiro mais famoso da cidade TEXTO DOMINIK GIUSTI FOTO FERNANDO SETTE

C

onhecido por cozinhar seus pratos simples e petiscos em um pequeno estabelecimento no bairro da Cidade Velha, em Belém, Rubem Estevam Lobato - o Rubão, que empresta o nome ao restaurante - começou ainda criança, vendo a preparação para as festas de aniversário da família e da vizinhança. Era o momento em que todos se juntavam para ajudar a fazer bolos, tortas e comidas como arroz com galinha. Nascido em uma família humilde, não existia requinte na feitura do alimento. E a experiência era a observação e a prática. Ainda na infância foi trabalhar em uma mercearia, ao mesmo tempo em que estudava. A rotina iniciava-se às 5 da manhã e só terminava quando saía da aula, no período noturno. “Chegava domingo eu queria comer um pudim, uma coisa gostosa. Mas a gente não tinha condições. Eu lembro até hoje do primeiro bolo que bati, que era a receita ‘1,2,3,4’, que vi numa caixa de amido de milho,

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FEVEREIRO DE 2016

e era referente a quantidade dos ingredientes. Nessa época o forno era de lata de querosene”, diz Rubão, rindo bastante das lembranças de outrora. Já na juventude, o cozinheiro, como gosta de se identificar, passou uma temporada com uma tia, em Brasília, que era doceira. Lá, começou a ajudá-la, juntamente com as filhas dela. E todos faziam tudo, não existia função definida: todos cozinhavam, modelavam e criavam os doces - que eram feitos aos milhares. De volta a Belém, no início da década de 1990, abriu um depósito de bebidas, onde hoje funciona o restaurante. A ideia era apenas vender bebidas, mas os amigos que por lá passavam acabavam requisitando petiscos. “Eles sabiam que eu cozinhava bem e ficavam pedindo. Até que um dia trouxeram um fogão para eu cozinhar. E esses amigos acabaram trazendo outros amigos, que foram falando para outras pessoas e virou o restaurante. Agora vem gente do Brasil todo aqui, até do exterior. Isso

foi muito incentivo dos meus amigos, sabe. Aí preservei a nossa comida do jeito que ela é, natural, leve”, explica Rubão. Apesar de se vestir de maneira extravagante na hora do trabalho é sua simplicidade seu principal cartão de visita. Sem se render aos excessos da sofisticação e da gourmetização dos ingredientes típicos do Pará, tem seus frequentadores certos para a casquinha de caranguejo, picadinho ou a maniçoba. Apesar de ficar em uma rua estreita do primeiro bairro da capital paraense, a travessa Gurupá, as mesas dentro e fora do estabelecimento promovem a sensação de acolhimento, bem como o alimento se propõe também, como comida caseira. Outra experiência fundamental foi ter passado umas férias de julho em Salinópolis, no nordeste do Pará, cozinhando para todos os hóspedes da casa de seu pai. “Ali foi o primeiro Rubão porque eu comecei a vender comida, tinha muita gente, então aproveitamos para fornecer refeição.

NOME

Rubem Estevam Lobato

IDADE 65 anos


DIVULGAÇÃO / CBF

EU DISSE

APPLICATIVOS BOAS IDEIAS NUM TOQUE DE DEDOS

“Que possamos dar o grande exemplo de preservação da natureza e da valorização de bem comum”.

Appetite Universitário App desenvolvido por paraenses para

Coronel Antônio Carlos Nunes, presidente da CBF sobre a Copa Verde, pri-

auxiliar estudantes a saber o que têm nos

meira competição com o título carbono zero do Brasil.

cardápios dos restaurantes universitários a cada dia. O Appetite reúne os menus da UFPA, Ufra e Uepa. Ainda está na fase de

“Queremos deixar de exportar matéria-prima para nos tornar um país que exporta inovação, com produtos de alto valor agregado. Tenho certeza de que isso vai se refletir na balança comercial nos próximos anos.”

testes e em breve, outros cardápios estarão disponíveis. O contato dos desenvolvedores está na página principal já para sugestões e informes de bugs. Plataforma: Android Preço: Gratuito

VOLP Sigla para Vocabulário Ortográfico da

Celso Pansera, ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, sobre a expectativa de que

Língua Portuguesa, o VOLP é o app oficial da

a nova legislação traga mudanças significativas à área de pesquisa.

Academia Brasileira de Letras para auxiliar nas dúvidas sobre como ficaram as palavras ANTONIO CRUZ / AGÊNCIA BRASIL

após o novo acordo ortográfico do idioma. É uma ferramenta útil agora que o acordo é obrigatório e muitas pessoas ainda sentem dificuldades em se adaptar às novas grafias. Plataformas: Android e iOS Preço: Gratuito

iRecycle Ideal para encontrar formas de reciclar todo tipo de resíduo que está em casa. Há mais de 1,5 milhão de tutoriais para acima de 350

“As pessoas acham que inovar é complicado porque falta tecnologia ou estruturas físicas, mas o principal gargalo para a inovação é ter capital humano qualificado para inovar.” Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que sinaliza o

tipos de materiais que podem se transformar em algo novo, de ferramentas a objetos de decoração. Todos os processos descobertos ou comentários podem ser compartilhados no Facebook, Twitter e outras redes sociais. Com o CEP do usuário, dá para encontrar postos de reciclagem ativos. Plataformas: Android e iOS Preço: Gratuito

recomeço da pesquisa científica no país, com novo Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação. FONTES: PLAY STORE E ITUNES

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CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE

INOCÊNCIO GORAYEB

Ritual Tembé na Festa da Moça Pessoal do interior diz que o macaco guariba canta no fim da tarde, enquanto as fêmeas acariciam suas barbas, num ritual tão paralelo ao humano que se diz que a guariba é “que nem uma gente”. Já viram uma guariba nadando? É bem semelhante ao homem. E, no alto rio Guamá e rio Gurupi, os índios Tembé reforçam essa proximidade entre costumes do homem e da guariba: é a Festa da Moça ou Festa do Moqueado.

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Acontece da seguinte forma: em um dos dias da festa, um macaco guariba é caçado e assado. Normal? Se fosse para a refeição, mas não é isso. O animal é devidamente paramentado e vestido como as moças que estão em ritual de passagem para a vida adulta. Daí o motivo da festa. Um índio adulto fica com animal vestido como moça na mão. Durante todo o dia, manipula a guariba como um fantoche, que dança e faz “graça” para

as moças. É um desafio. Enquanto a guariba dança comandada que nem boneco, as meninas-mulheres, por sua vez, não podem rir, tendo de se manter sérias para não serem mau interpretadas em termos de experiência. O macaco guariba é realmente intrigante. Por demonstrar um voz potente cantando pela mata, credita-se às suas cordas vocais, inclusive, o poder de curar doenças relacionadas à garganta e à voz. “É que nem uma gente.”


DESENHOS NATURALISTAS

CONCEITOSAMAZÔNICOS O VOCABULÁRIO REGIONAL É UM PATRIMÔNIO

O seu caminho foi trilhado e seguido por muitos no decorrer dos séculos, mas ele foi o primeiro brasileiro a cruzar a Amazônia se utilizando da ciência para melhor conhecer a região: Alexandre Rodrigues Ferreira. Nascido na Bahia em 1756, ele era fi lho de uma próspera família que fez fortuna com o comércio na colônia de Portugal. Foi na metrópole que o naturalista estudou e se formou na primeira turma de bacharéis em “Philosophia Natural” na Universidade de Coimbra, ainda em 1778. Foi em sua jornada científica pela Amazônia, na famosa “Viagem Philosophica pelas capitanias do Grão-Pará, Rio Negro, Mato Grosso e Cuiabá”, que os riscadores (desenhistas) Joaquim Codina e José Joaquim Freire, ilustraram as máscaras de dança dos índios Tucuna. Na expedição, entre os anos de 1783 e 1792, o grupo estudou, documentou e de-

ILUSTRAÇÃO: SÁVIO OLIVEIRA

As máscaras dos índios Tucuna senhou os povos, a fauna, a flora e os recursos naturais da região. A expedição partiu de Lisboa no dia 14 de julho de 1783 rumo à então Cidade do Pará, hoje Belém, capital do governo-geral do Grão-Pará e Maranhão. Nas embarcações, trazia cozinha de campo, laboratório portátil e estojo médico, além de instrumentos de caça e pesca, biblioteca e três assistentes: os dois riscadores e o jardineiro botânico Agostinho Joaquim do Cabo. Foi através dessa expedição que o naturalista e sua equipe encaminharam ao Real Museu de História Natural, ao longo de nove anos, 19 remessas com os mais variados produtos advindos da Amazônia. Em seus relatórios, estava a antevisão de um futuro real: a possibilidade da extinção de algumas espécies de animais e vegetais endêmicas da região, isto é, que só ocorrem na Amazônia.

Sob a luz da poronga Pelas trilhas infindáveis dos seringais na Amazônia, foi o guia de trabalhadores a sangrar as seringueiras. Em busca do látex, poucos companheiros foram tão inseparáveis tanto quanto ela. Na escuridão da madrugada, fazia as vezes do amanhecer. Lembrou? Apetrecho fundamental na vida do seringueiro, a poronga era como que o símbolo da ponta oposta do capitalismo internacional. Uma ferramenta-chave nos ciclos econômicos da região. A poronga é uma espécie de lampião, afixado na cabeça do extrativista, para iluminar as trilhas de mata fechada, sobretudo na madrugada, já que o trabalho do seringueiro tinha que começar bem cedo para dar conta das espaçadas árvores de seringa. Seu combustível era o óleo diesel, farol do trabalhador que exauriu suas forças em busca de um lucro inexistente: sabe-se que o sistema de aviamento era projetado para dar lucro ao dono do seringal, o seringalista, e não ao seringueiro. ACERVO DE OBRAS RARAS DO MUSEU GOELDI

Mecanismo que alumia que nem as lanternas fixadas na testa dos trabalhadores de minas subterrâneas, a poronga é confeccionada em metais de latas, recortados de modo a proteger a chama. Ela foi um instrumento de um tempo que vai e volta nas variadas Amazônias.

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COMO FUNCIONA

O puçá usado na pesca TEXTO E ILUSTRAÇÃO SÁVIO OLIVEIRA

O puçá é um apetrecho de pesca, com formato de saco afunilado, geralmente feito de pano ou tecido em linha resis-

tente, com malhas trançadas. Ele é bastante utilizado para pesca de pequenos peixes, siris e até pessoas! Sim, um puçá gi-

PESCANDO COM REDE

gante também é utilizado pelo Corpo do Bombeiros para resgatar banhistas que estejam se afogando em rios ou alto mar,

servindo como uma rede salva-vidas. A origem da palavra vem do tupi “pyssá”, que significa “rede”.

3

Instrumento de pesca envolve arte e engenharia

1

Para fazer um puçá é preciso saber como se tece uma rede de pesca, trançando a linha de nylon com agulha e a colher, que padroniza as medidas de espaçamento da costura.

2 1

4

4 Também é preciso utilizar um peso, que pode ser uma pedra, para fazer com que os dois aros fiquem no chão, aguardando o bote.

2

Também são necessários dois aros, de arame ou cipó, de diferentes tamanhos, para fixar a rede trançada e dar forma afunilada.

5

3

5

Daí amarra uma corda no arame superior, que precisa ser maior, e será usada para segurar a armadilha enquanto ela submerge. No arame menor é amarrada a isca, que pode ser restos de peixes. Quanto mais pitiú, melhor para atrair peixes e crustáceos. 20 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

Quando o alvo tenta pegar a isca, acaba se enroscando na malha fina e a corda pode ser “puçada” para fora, ou melhor, puxada!

FONTE: GLOSSÁRIO PARAENSE [COLEÇÃO DE VOCÁBULOS PECULIARES À AMAZÔNIA E ESPECIALMENTE À ILHA DO MARAJÓ] (1906). VICENTE CHERMONT DE MIRANDA. GRANDE ENCICLOPÉDIA DA AMAZÔNIA (1968). CARLOS ROCQUE.

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CIÊNCIA

Pesquisadores na linha de combate Instituto Evandro Chagas é referência mundial na pesquisa e enfrentamento das doenças transmitidas pelo Aedes aegypti TEXTO VICTOR FURTADO FOTO AKIRA ONUMA

E

nquanto o Exército vai às ruas para ajudar no combate e prevenção do mosquito Aedes aegypti, o vetor dos vírus da dengue, febre chikungunya e zika, mais pelo menos 70 pessoas do setor de Arbovirologia do Instituto Evandro Chagas (IEC) estão numa outra linha de enfrentamento do problema: a científica. Os três vírus e o mosquito estão sendo estudados, reforçando a posição do instituto como uma referência de pesquisas no Brasil. O trabalho desenvolvido é base para a formação das vacinas em desenvolvimento, políticas públicas, campanhas e protocolos de atendimento aos pacientes.

O médico virologista e pesquisador do IEC Pedro Vasconcelos explica que uma das armas no combate ao mosquito e às doenças que ele causa é conhecê-lo - “conhecer o inimigo” e a si mesmo é uma das mais fundamentais estratégias de guerra relatadas na obra “A Arte da Guerra”, de Sun Tzu - e observa que o inseto tem a capacidade de transmitir uma dúzia de vírus, porém, no Brasil apenas a dengue e, agora a chikungunya e a zika. O Aedes aegypti, um mosquito africano registrado no Egito, já foi vetor da febre amarela. A partir das vacinas e controle viral a doença foi contida. Desde os primeiros registros da dengue,

na década de 1980, já foram identificados quatro formas do vírus. A chikungunya começou a ser registrada em 2014, após a Copa do Mundo da Fifa. Acredita-se que algum turista trouxe o vírus consigo, foi picado por mosquitos e então a infecção começou a se espalhar. Basta um carapanã infectado com o vírus para disseminar a contaminação durante o acasalamento e nos ovos resultantes do acasalamento entre dois insetos infectados. Há suspeitas de que a zika tenha vindo na mesma época, ou durante a Jornada Mundial da Juventude, em 2013, mas os primeiros casos só foram registrados em fevereiro de 2015. FEVEREIRO DE 2016

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CIÊNCIA

Vasconcelos, com base em dados da Organização Mundial da Saúde (OMS, da qual o IEC é colaborador permanente), ressalta que a dengue é um problema grave de saúde pública nos mais de 120 países onde há registros da doença, superando a malária. São 390 milhões de infecções por ano, sendo 100 milhões com sintomas evidentes e 50 mil mortes. O risco atinge mais de 3 bilhões de pessoas. “Em todos esses países, o controle é falho. Não é só no Brasil”, observa. Dada a dimensão da doença, existe farta literatura, com mais de 10 mil artigos publicados no mundo, para embasar as pesquisas e a vacina está em estágios avançados de desenvolvimento. Em grande parte desses artigos,

O IEC atuou direta ou indiretamente, como autor ou como referência. Por outro lado, mais de 70 anos depois do isolamento do vírus zika na floresta de mesmo nome que fica na cidade de Entebbe, antiga capital da Uganda, atual Kampala, no continente africano, e dois grandes surtos, a literatura sobre a doença não chega a 500 artigos em todo o mundo. Somente após o trabalho dos pesquisadores do Evandro Chagas diante da suspeita que o vírus causava microcefalia em fetos durante a gestação - a pesquisa começou a partir de casos detectados no Ceará, Bahia, Rio Grande do Norte e Pernambuco, nos quais as grávidas apresentavam sintomas

da dengue, mas que não estavam infectadas pelo vírus -, é que o zika foi isolado no Brasil, graças ao trabalho do IEC, que recebeu farto material genético em ótimas condições para as pesquisas. “A preocupação maior é que mesmo no primeiro surto de zika, na ilha Yap, na África, que atingiu 200 pessoas de uma população de 4 mil em 2007, e no Taiti, na Polinésia Francesa, com mais de 10 mil infectados numa população de 200 mil, ninguém morreu. As primeiras mortes só ocorreram no Brasil e ainda está ocorrendo a má-formação de crianças, abortos e um custo social altíssimo que impacta no Sistema Único de Saúde. Agora que estamos, de fato, conhecendo a doença, pois o Brasil é onde os casos mais graves estão acontecendo. Porém, o nosso vírus é semelhante ou o mesmo da Polinésia”, explicou Pedro Vasconcelos. O Ministério da Saúde já está trabalhando no desenvolvimento de vacinas e o pesquisador é um dos consultores na pesquisa e desenvolvimento. O primeiro caso fatal foi de um homem de 35 anos, morador de São Luís (MA), com histórico de lúpus, tratamento contínuo com DIANTE DO INIMIGO

O médico virologista e pesquisador do IEC Pedro Vasconcelos diz que uma das armas no combate ao mosquito e às doenças que ele causa é conhecê-lo de todas as formas e só então partir para o combate 22 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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corticosteroides, artrite reumatoide e alcoolismo. Ele morreu em junho de 2015. A segunda morte aconteceu no final de outubro e foi de uma garota de 16 anos, do município de Benevides (PA), na Região Metropolitana de Belém. O caso também foi confirmado no dia 27 de novembro. Com suspeita inicial de dengue, ela apresentou dor de cabeça, náuseas e pontos vermelhos na pele e mucosas. A coleta de sangue foi realizada sete dias após o início dos sintomas, em 29 de setembro. Essa paciente, após a infecção pelo vírus zika, desenvolveu quadro de púrpura trombocitopênica (redução do número de plaquetas sanguíneas) grave e hemorragias. Quanto à chikungunya, há várias vacinas sendo desenvolvidas fora do Brasil, ainda não licenciadas, mas o IEC segue como referência científica nas pesquisas. Na elaboração de protocolos de tratamento o IEC é uma fonte para o SUS e para serviços de saúde privados. Uma das preocupações com esse vírus é que também causa um enorme custo social a partir de afastamentos do trabalho e sobrecarga na saúde pública que já está lotada de casos de Dengue. “É uma doença que provoca dores intensas nas articulações e pode chegar a inflamações e deformações nas fases mais graves. Pode durar semanas na fase subaguda e chegar a meses ou ano de tratamento na fase crônica. O sexo feminino tem se mostrado um público de risco de maneira geral no desenvolvimento das lesões mais graves, mas homens estão sujeitos do mesmo jeito”, explicou o pesquisador.

PROTEJA-SE

Conheça os repelentes contra o Aedes aegypti aprovados no Brasil Há 122 produtos registrados na Anvisa como repelentes para a pele. Eles têm quatro substâncias ativas: DEET (também

IR3535 (também

Icaridina (tam-

Plantas do gênero

conhecido como

conhecido como

bém conhecido

Cymbopogon

N,N-dimetil-

etil butilacetilami-

como hidroxietil

(citronela)

-meta-toluamida ou

nopropionato ou

isobutil-piperidina

N,N-dimetil-3-metil-

EBAAP): Seguro para

carboxilato ou pica-

benzamida): Seguro

gestantes e crianças

ridina): Seguro para

para gestantes e

de 6 meses a 2 anos,

gestantes e crianças

crianças a partir de 2

sob orientação

a partir de 2 anos,

anos, sob orienta-

médica. 2 horas de

sob orientação

ção médica. 6 horas

proteção. Exemplo:

médica. 10 horas de

de proteção (adulto)

loção antimosquito

proteção. Exemplo:

e 2 horas (infantil).

Johnson’s

Exposis

Exemplos: OFF, Autan, Repelex

Como usar

Aplique na pele e por cima das

Não aplicar o produto próximo

Aplique o repelente 15 minutos

roupas, nunca por baixo

aos olhos, nariz, boca ou

após o uso de filtros solares,

genitais

maquiagem e hidratante

TRATAMENTO

A médica virologista e pesquisadora do Instituto Evandro Chagas Socorro Azevedo ressalta que as três doenças não possuem um remédio específico para tratamento. Vacinas oficiais e com eficácia comprovada ainda não existem. Então só que se pode fazer é orientar sobre o uso de medicamentos (analgésicos e antitérmicos) e formas de tratamento nas redes pública e privada de atendimento. E cada paciente deve ser acompanhado por responder de uma forma aos remédios. O IEC também colabora com

Usar o produto no máximo

Evite aplicar nas mãos de

Procure o serviço médico e

três vezes ao dia, principal-

crianças e lave sempre

leve a embalagem do repelen-

mente as grávidas

as mãos depois de usar o

te em caso de suspeita de rea-

produto

ção adversa ou intoxicação

FONTES: ANVISA, IEC, MINISTÉRIO DA SAÚDE, SOCIEDADE BRASILEIRA DE DERMATOLOGIA / ILUSTRAÇÕES: ANDRÉ ABREU

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CIÊNCIA

PESQUISAS

O IEC colabora com a vigilância dos casos, dos vetores, dos vírus e acompanha cada nova pesquisa lançada. Por essa razão, faz parte da Organização Pan-Americana de Saúde.

a vigilância dos casos, dos vetores, dos vírus e acompanha cada nova pesquisa lançada. Por essa razão, faz parte da Organização Pan-Americana de Saúde. Para a médica, a única forma, por enquanto, de enfrentar as três doenças é combater o mosquito. E esse combate exige a participação de toda a população em não jogar lixo nas ruas e cuidar de seus imóveis e propriedades para evitar que o mosquito se reproduza. Porém, ela lamenta que a população parece ainda não ter entendido a gravidade das doenças e como o mosquito se reproduz fácil. Por outro lado, não descarta totalmente a responsabilidade do poder público. “O Aedes aegypti é um mosquito que se adapta fácil. Antes precisava de água para-

da limpa para pôr os ovos. Agora coloca na água suja mesmo. E mais de dois terços dos criadouros do mosquito são em ambientes particulares. Até uma tampa de garrafa jogada na rua, se acumular água, pode ser lar de dezenas de ovos, depois larvas, pupas até o mosquito ficar adulto e continuar a se reproduzir. Precisamos de uma mudança de hábito urgente. E há anos temos campanhas de conscientização. Não basta apenas cobrar do poder público. Temos nossa responsabilidade também”, critica a pesquisadora. Quanto aos medicamentos, Socorro reforça a orientação de que a automedicação é prejudicial, principalmente pela facilidade de comprar muitos remé-

dios que costumam tratar os sintomas do zika, do dengue e do chikungunya, que são analgésicos e antitérmicos. Ela destaca que medicamentos cuja base contenha ácido acetilsalicílico (AAS ou base da aspirina) são contraindicados em caso de suspeita de dengue porque podem piorar os casos de sangramento e levar a doença a casos mais graves, como sérias hemorragias. “Na dúvida, a melhor coisa a fazer é buscar um farmacêutico nas farmácias, uma das melhores coisas que poderia ter acontecido nesse ramo, para explicar se determinado medicamento possui AAS na composição. E o mais importante é buscar o médico antes de sair tomando qualquer remédio. Em qualquer sintoma, é preciso buscar urgentemente um posto de atendimento para o tratamento correto”, diz. “Em áreas de risco, usar repelentes e reaplicar quando necessário, telas nas janelas, mosquiteiros”, completa Socorro Azevedo, ressaltando que o posto ambulatorial do IEC não faz parte da rede comum de atendimento. Os atendimentos lá são apenas referenciados. O paciente sempre deve procurar um posto de saúde regular ou hospital privado do qual é cliente. PROTEÇÃO

Socorro Azevedo, médica virologista do Evandro Chagas, afirma que nesse momento uma das formas de evitar as doenças é usar repelentes contra os mosquitos 24 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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OLHARES NATIVOS

Leveza A jacinta de corpo esguio se prepara para sair bailando em seu voo pelas matas amazテエnicas. FOTO: CARLOS BORGES

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窶「 REVISTA AMAZテ年IA VIVA 窶「 25


OLHARES NATIVOS

Cultivo As pequenas lavouras na Região Metropolitana de Belém vistas de outro ângulo. FOTO: OSWALDO FORTE

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Convivência

Das ruas

Na praia do Maraú, em Mosqueiro, o encontro harmônico entre a árvore, as pedras e o mar FOTO: CÉLIO MAURÍCIO COSTA

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OLHARES NATIVOS

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Nas Docas Resistência A árvore se mantém firme e isolada no meio de uma área de pasto. FOTO: OSWALDO FORTE


OLHARES NATIVOS

Lotação

No dia-a-dia da cidade os ônibus lotados por pessoas cheias de vida e esperança. FOTO: FERNANDO SETTE

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Na linha do gol

O futebol na água com os amigos em um fim de tarde qualquer nos rios da Amazônia FOTO: OSWALDO FORTE

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OLHARES NATIVOS

Cumplicidade O casal de araras se perde tranquilamente na vastidão verde do Marajó FOTO: CARLOS BORGES

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Voo encarnado Os guarás-vermelhos se destacam no céu azul do arquipélago do Marajó FOTO: CARLOS BORGES

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OLHARES NATIVOS

Sorrir O sorriso desprendido do homem amazônico diante da vida. Seu Nilto, na Lagoa Azul, em Altamira. In memorian. FOTO: CARLOS BORGES

Envie as suas fotos para a seção Olhares Nativos 34 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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Para participar da seção “Olhares Nativos” da revista Amazônia Viva basta enviar fotos com temática amazônica para o e-mail amazoniaviva@orm.com.br acompanhadas pelo nome completo do autor, número de identidade e uma breve informação sobre o contexto do registro fotográfico. As imagens devem ser autorais e com resolução de no mínimo 300 dpi. A publicação das fotos tem fins meramente de divulgação de trabalhos profissionais ou amadores, não implicando em qualquer tipo de remuneração aos autores. Participe!


OPINIÃO, IDENTIDADE, INICIATIVAS E SOLUÇÕES OSWALDO FORTE

IDEIASVERDES

Clareira na floresta AS QUEIMADAS AINDA CASTIGAM A REGIÃO EMBALADAS PELA FORÇA DO EL NIÑO E PELA ESCASSEZ DE CHUVAS PÁGINA 40

AVANÇOS

MARAJÓ

O diretor da Agência de Inovação Tecnológica da UFPA, Gonzalo Enriquez, fala do Marco Regulatório de Ciência e Tecnologia. PÁG.36

Moradores da Vila do Céu, no Marajó, criaram um roteiro diferente para os turistas que chegam ao local, propiciando mais integração. PÁG.48


ENTREVISTA

A

pluralidade da biodiversidade amazônica é o ponto de partida para uma gama de projetos de pesquisa ligados à ciência e à tecnologia realizados na região e no mundo. O seu patrimônio genético, quase desconhecido, desperta a curiosidade e encanta por sua riqueza e funcionalidade. Seus insumos estiveram durante décadas sob o universo criativo e intelectual de estudiosos e empreendedores que, após cinco anos de debates e ajustes, agora passam a contar com um poderoso aliado legal: o Projeto de Lei Complementar (PLC) 77/2015, considerado o novo Marco Regulatório de Ciência e Tecnologia, sancionado pela presidente Dilma Rousseff em 11 de janeiro de 2016. A nova regulamentação vem para redefinir caminhos e metodologias no que tange o incentivo à pesquisa, inovação e ao desenvolvimento científico e tecnológico, flexibilizando processos e substituindo leis que regiam a relação conhecimento x inovação tecnológica x mercado no Brasil, como é o caso a Lei de 2004, e a Lei de 2011, discutida e atualizada. O Marco é visto com bons olhos pela comunidade acadêmica, e, segundo o diretor da Agência de Inovação Tecnológica da Universidade Federal do Pará (Universitec/UFPA), Gonzalo Enriquez, “é um facilitador para que ocorram mais investimentos nas pesquisas, consideradas de risco e longo prazo, e também valoriza o capital intelectual dos pesquisadores”. Na entrevista a seguir, ele esclarece outros pontos que demonstram as conquistas possíveis com a nova lei. Do que se trata o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil? Quais seus principais pontos? O texto regulamenta parcerias de

36 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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“Vamos transformar ciência básica em inovação” CONSIDERADO O NOVO MARCO REGULATÓRIO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA, O PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR 77/2015, SANCIONADO PELA PRESIDENTE DILMA, GARANTE MAIS LIBERDADE DE PRODUÇÃO E CRIAÇÃO DOS PESQUISADORES DA REGIÃO, GARANTE O DIRETOR DA UNIVERSITEC/UFPA, GONZALO ENRIQUEZ. TEXTO NATÁLIA MELLO FOTO ROBERTA BRANDÃO


CRISTINO MARTINS / ARQUIVO O LIBERAL

longo prazo entre os setores público e privado e dá tratamento aduaneiro prioritário e simplificado para aquisição de equipamentos, produtos e insumos a serem usados em pesquisa. A proposta também define a hipótese de dispensa de licitação para contratar bens e serviços para pesquisa e desenvolvimento e abre a possibilidade de uso do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) para “ações em órgãos e entidades dedicados à ciência, à tecnologia e à inovação”. O projeto prevê ainda a possibilidade de instituições científicas autorizarem que seus bens, instalações e capital intelectual sejam usados por outras instituições, empresas privadas e até mesmo pessoas físicas. Como este ato pode provocar mudanças que incentivem o desenvolvimento científico do país? Mesmo com as limitações e alguns vetos, o ato incentiva as atividades

ENERGIA SOLAR

As placas fotovoltaicas já são uma realidade em Belém, mas vão ganhar um impulso ainda maior com as pesquisas

de pesquisa científica porque prevê a isenção e redução de impostos para importação de importação nas compras destinadas a projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação – não só equipamentos, mas insumos muitas vezes estratégicos no processo da pesquisa; facilita processos licitatórios nas universidades; reduz também a burocracia nos investimentos na área e articula, com segurança jurídica, as diversas ações de ciência, tecnologia e inovação que estão em curso. É uma flexibilização dos processos, pois existia um conjunto de normas e legislações que praticamente transformavam o pesquisador, ao realizar atividades fora da universidade, em algum momento, em uma pessoa que está fazendo uma atividade ilegal. Logo, em um ambiente regulatório e institucional mais favorá-

“Com a nova legislação, o poder público cria todas as condições para apoiar os ambientes inovadores, dentre eles as incubadoras de empresas, parques e polos tecnológicos, uma questão que o Brasil despertou tarde” FEVEREIRO DE 2016

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ENTREVISTA

vel à cooperação entre universidades, laboratórios de pesquisa, governos e empresas, transformaremos, certamente, mais ciência básica em inovação e transformaremos inovação em competitividade, gerando um novo ciclo de desenvolvimento econômico no nosso país. No Pará e na Amazônia isso só tem a contribuir para aquilo que o futuro nos reserva. Como biodiversidade e patrimônio genético, a Amazônia é estrategicamente fundamental para o conjunto do planeta.

“Com a desburocratização fica mais fácil colocar as soluções viáveis no mercado” 38 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2016

Neste segmento de pesquisa, qual o atual cenário brasileiro e paraense? Com a nova legislação, o poder público cria todas as condições para apoiar os ambientes inovadores, dentre eles as incubadoras de empresas, parques e polos tecnológicos, uma questão que o Brasil despertou tarde. No início da criação das incubadoras, em 1992, fui diretor nacional da Associação de Incubadoras e Parques Tecnológicos, e lembro que quando estávamos começando tinham países como Japão, Estados Unidos, Inglaterra, a Europa de maneira geral, que tinham 20 anos de incubadoras de empresas. Tínhamos cinco ou seis incubadoras no Brasil, mas hoje temos mais ou menos 500. O novo marco regulatório afeta o Brasil como um todo, os entes federativos, estaduais e as entidades municipais, perpassa toda a relação institucional e a governança da pesquisa da inovação no país, e com certeza o Pará tem a obrigação de se atentar para essa nova realidade. Assim, União, estados e municípios poderão participar do capital social das empresas cujos projetos são voltados para o desenvolvimento de produtos e processos inovadores. Por que incentivar a inovação para a formação de novos profissionais? É fundamental porque amplia o tempo máximo que os professores universitários poderão se dedicar a

projetos de pesquisa e extensão, assim como em atividades de natureza científica e tecnológica; permite que laboratórios universitários sejam usados pela indústria para o desenvolvimento de novas tecnologias — em ambos os casos, com remuneração, que era algo que era proibido que a universidade se abrisse para o mercado. Apesar de ter um veto que diz respeito ao artigo que isenta o recolhimento de imposto previdenciário em cima da bolsa de pesquisa e compra de produtos e insumos, e outro veto para licitações para contratação de empresas que têm faturamento de até R$ 90 milhões anuais, precisamos pensar que é uma


CARLOS BORGES

curso. Nós recebemos recursos da iniciativa privada, porque as que estão aqui são privadas e pagam para a Universidade. Recebemos R$ 100 mil, por exemplo, aí vai para o caixa da Universidade e entra no bolo de todo o orçamento. Quando corta o orçamento, corta do recurso também. Quais os desafios de aplicar o conhecimento científico em soluções viáveis para o mercado? Na medida em que isso se flexibiliza, a possibilidade que esses recursos de conhecimentos e inovações tecnológicas sejam aplicados no mercado é muito mais forte. Com a desburocratização fica mais fácil colocar as soluções viáveis no mercado. Eu vou poder levar para o setor privado e receber recursos por isso, por mostrar para o mercado como essa inovação tecnológica é válida. E o laboratório pode prestar esse serviço para o setor privado. O mecanismo é esse.

REGIONAL

questão de estratégia, se você tem o fundamental, vamos deixar o secundário para um processo posterior. Esse marco regulatório valoriza o capital intelectual. Porque você dá aula, faz pesquisa, chega em casa, trabalha, faz a gestão do seu trabalho através da internet. Você estende o seu horário e recebe por isso. O marco apoia os recursos para pesquisadores, é possível fazer assessorias e consultorias para empresas privadas. Ou seja, o profissional pode crescer a partir do conhecimento adquirido na universidade. Não tira o professor da universidade, mas a sua relação com a empresa assume um caráter f lex ível.

O açaí já é comercializado e exportado com tecnologia de ponta na região

E o que muda na questão da administração dos recursos, na economia? O interessante é que foi definido que você pode criar fundações para administração do recurso. Nós somos um Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT), criado a partir da lei de 2004. Nós podemos nos transformar numa fundação para ministrar nossos recursos. Todo recurso que chega à Universidade vai para um caixa único. Lá dentro se divide, mas é um recurso e eu não posso pegar esse re-

Que projetos estão em execução no Pará para incentivar a disseminação da inovação tecnológica na economia local? Temos convênios e parcerias hoje com o governo do Estado, por exemplo, em que a universidade tem uma contribuição nessa dinâmica de adensamento das cadeias produtivas de alguns produtos de origem vegetal. Por exemplo, com o cacau, que o Pará tem a segunda maior produção do Brasil, temos incubada a empresa Naiah. Com o açaí, temos a empresa Amazon Dreams, que trabalha mais com exportação. Também temos uma empresa que produz placas de energia solar e o prédio da Universitec vai ser o primeiro iluminado por energia solar da UFPA. São aproximadamente 50 empresas incubadas e 150 laboratórios que trabalham dentro da UFPA com inovação tecnológica. Então, os processos que já estavam sendo executados e poderão acontecer de forma mais dinâmica e intensa. FEVEREIRO DE 2016

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ASSUNTO DO MÊS

Amazônia em cinzas

GRANDES PARTES DA FLORESTA AMAZÔNICA QUEIMAM NO BRASIL TODOS OS DIAS. O EL NIÑO MAIS INTENSO EM DÉCADAS, A ESCALADA DO CLIMA GLOBAL E A SANHA DE INVASORES POR LUCRO FAZEM O COQUETEL EXPLOSIVO QUE PROVOCOU INCÊNDIOS NA REGIÃO EM 2015 E PODE SE ESPALHAR AINDA MAIS EM 2016 SE NÃO HOUVER ESFORÇOS CONJUNTOS TEXTO JOÃO CUNHA

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OSWALDO FORTE

E

stalos secos de madeira queimando, o avançar lento e irrefreável das chamas, a vista turva pela fumaça e a dificuldade de respirar (é a inalação de monóxido de carbono que deixa tudo mais complicado). Sons e sensações que entraram na ordem do dia de muita gente que vive dentro e ao redor de áreas de floresta da Amazônia brasileira. E como eles foram comuns no ano que passou. Em 2015, os satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) detectaram mais de 100 mil focos ativos de queimadas na região Norte do país. Isso sem contar os trechos do bioma amazônico no Maranhão, Mato Grosso e Goiás. Nesse rol, o Pará foi o Estado que mais contribuiu em número de incêndios: foram 45.202 focos, o maior índice registrado em uma década. Neste ano, somente na primeira quinzena de janeiro, 776 queimadas foram provocadas. O crescimento das queimadas pode ser debitado em grande parte na conta de um velho conhecido que voltou à tona nos noticiários dos últimos meses. A versão 2015 do “El Niño”, fenômeno sazonal com influência em todo o planeta, veio forte, em uma escala maior do que a de 1997-1998, o antigo parâmetro de intensidade. Na Amazônia, os maiores efeitos estão sendo a queda na frequência de chuvas, o clima seco e, a reboque, o risco do fogo. Junte isso à escalada progressiva do aquecimento global rumo ao topo, mais os incêndios frequentes causados pela classe madeireira e agropecuária e está posto o encontro de fatores que põem a biodiversidade e os modos de vida de várias comunidades locais à prova do fogo.

Mata ardente Somente na primeira quinzena de janeiro deste ano, 776 focos de queimadas foram identificados no Pará FEVEREIRO DE 2016

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ASSUNTO DO MÊS

Mais alarmante que o cenário em si, são os indícios de que há um rombo na conservação e segurança das florestas nativas e seus habitantes que órgãos brasileiros responsáveis pela fiscalização, controle e combate a incêndios e outras práticas ilícitas ainda estão distantes de ser aptos a cobrir. Em outra frente, pesquisadores que estudam as dinâmicas naturais da região se unem a movimentos sociais para barrar a destruição desse ecossistema.

O “Super” El Niño

No início de dezembro de 2015, Belém conhecia a maior temperatura de sua história em 100 anos. Os termômetros da capital registraram a temperatura máxima de 38,5°C, seis graus acima da média

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FEVEREIRO DE 2016

para o mês. Na mesma época, a cidade amanheceu com dias encobertos por uma neblina que em nada combinava com o calor. Situação semelhante vivida pelos moradores de Manaus, no Estado do Amazonas, em outubro do mesmo ano. Lá foram 20 dias de uma densa cortina de fumaça, acompanhada de um cheiro de queimado e problemas respiratórios. Dois casos e a mesma fonte: a ocorrência de queimadas nas imediações das cidades. Ainda em outubro, os incêndios no Estado atingiram a marca recorde de 11.104 focos, de acordo com o INPE. O governo local decretou estado de emergência em Manaus e outras onze cidades. O que até alguns meses era suspeita, confirmou-se então em resultados incontestáveis. O El Niño

da temporada é o mais extremo em décadas. Quando as águas do Oceano Pacífico, à altura dos mares do Peru e do Chile começam a aquecer de maneira acima do normal, o que acontece de 3 a 5 anos em média, é sinal de que muita coisa vai mudar no clima do planeta. “O Menino” (significado de El Niño em espanhol) despertou, dessa vez em uma edição “super”. O que significa tempestades e muitas chuvas na região Sul do país, para a Amazônia é sinônimo de seca e fogo. “O último verão foi extremamente rigoroso, e isso é natural que aconteça, porque as massas de ar quente vêm em direção à Amazônia e, por consequência, as massas de chuva diminuem”, afirma o geólogo e pesquisador do Museu Pa-

CORTINA DE FUMAÇA

Em novembro do ano passado, uma espessa nuvem branca pairou sobre uma área florestal em Santarém, no oeste do Estado. O véu de fumaça era tão intenso que quase não se podia enxergar o Sol, contam pesquisadores da Universidade de Lancaster, Reino Unido, que fazem pesquisas na região.


ADAM RONAN / ECOFOR / DIVULGAÇÃO

400

380

350 300 250 200

191

100

25

AMÉRICA QUENTE

6

1

12 Venezuela

4

Estados Unidos

3

Suriname

Guatemala

17

Peru

El Salvador

31

Paraguai

5

Panamá

1

México

3

Guiana

2

Equador

Colômbia

4

Costa Rica

41 2

Chile

26

Brasil

0

Belize

50

Honduras

150

Argentina

raense Emílio Goeldi (MPEG), Amílcar Mendes. “Já é fevereiro e não estamos naquele inverno de costume, em que estaria chovendo de manhã. A redução de chuvas é em razão dessas massas que estacionam na região. É uma cadeia: com menos chuva, você tem menor produção agrícola, por exemplo, mais calor, o aquecimento do Oceano Atlântico, que banham nossas águas, uma projeção de maré maior. É uma série de impactos secundários que tem como causa o El Niño”, explica. O geólogo, que é especialista em sensoriamento remoto pelo INPE, continua: “E os incêndios se associam a esse processo. Por uma questão cultural, as queimadas são feitas nessa época do ano para preparar o terreno para a agricultura e pecuária, principalmente. Como a terra está muito seca, essas queimadas fogem ao controle e aí se vê essa proliferação de incêndios na

Dados levantados pelo INPE mostram o número de focos acumulados em alguns países latinos entre os dias 18 e 19 de janeiro deste ano. O Brasil lidera o ranking, com 380 focos de queimadas.

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ASSUNTO DO MÊS TARSO SARRAF

CAÇADORES DE INCÊNDIOS

Os pesquisadores Jos Barlow e Erika Berenguer estudam os efeitos das queimadas na Amazônia ADAM RONAN / ECOFOR / DIVULGAÇÃO

região. O Centro-Oeste também passa por uma dinâmica semelhante”. Pesquisando e rodando pela Amazônia brasileira desde os anos 1990, os doutores em Ecologia da Universidade de Lancaster, do Reino Unido, Erika Berenguer e Josiah “Jos” Barlow têm muito a dizer sobre as queimadas. “Há incêndios florestais na Amazônia todo ano, mas 2015 é excepcional”, afirmam em um artigo publicado no final do ano passado no site acadêmico “The Conservation”. “Temos investigado essa questão nos arredores de Santarém, cidade na margem sul do rio Amazonas, a 800 km do mar. Durante as últimas cinco semanas, acordamos sob um espesso véu de fumaça” relatam. “Por dias nós mal 44 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2016

conseguimos ver o Sol. Em muitos dias da semana passada, a visibilidade foi menor do que 50 metros e o sol, antes amarelo, nascia vermelho, se muito”. Os pesquisadores afirmam que o tempo que uma floresta tropical leva para se recuperar de incêndios, em termos de biomassa e biodiversidade, é desconhecido. É possível até que ela nunca recupere a sua antiga vitalidade e glória. O que se sabe é que as árvores mortas abrem uma série de lacunas no dossel da floresta, o que permite que mais luz e vento atinjam diretamente o solo. A floresta torna-se então mais quente e seca e mais propensa a queimar mais uma vez.

Os geólogos, que registram os danos dos incêndios em vídeos (em inglês), afirmam que, em 2014, 583.100 hectares foram desmatados na Amazônia brasileira. Em um comparativo, quando apenas um hectare de floresta, uma área equivalente à de um campo de futebol, é cortada e queimada, cerca de 300 toneladas de carbono são perdidas. Essa quantidade é lançada à atmosfera em forma de gases de efeito estufa. Erika Berenguer e Jos Barlow calculam que, em termos de emissões de dióxido de carbono, isto é o mesmo que um carro zero dando a volta ao redor do mundo 61 vezes.


Amazônia maranhense ameaçada

Um caso emblemático da perda de área florestal em terras amazônicas está em uma área de quase 300 mil hectares entre os municípios de Bom Jardim, Centro Novo do Maranhão e São João do Carú. É a Reserva Biológica (Rebio) do Gurupi, unidade de conservação (UC) do governo federal, que abriga uma rica diversidade de vegetação, incluindo árvores de madeira de lei, e espécies animais ameaçadas de extinção como a onça-pintada (Panthera onca) e o mutum-de-penacho (Crax fasciolata pinima). Junto com as Terras Indígenas (TI) vizinhas Awá, Alto-Turiaçu, Alto Rio Guamá, Araribóia e Caru, a reserva representa o último fragmento de floresta na Amazônia maranhense. Esse patrimônio público tem diminuído gradativamente ao decorrer dos anos, principalmente devido à ação predatória de grupos invasores em busca de madeira, carne de caça e outros bens comercializáveis. O fogo é um dos seus instrumentos preferidos de destruição e uso ilegal das terras do Gurupi, mas há também a intimidação e o assassinato, como o que vitimou o conselheiro da Rebio, Raimundo Rodrigues, no último dia 25 de agosto. “Estamos com grandes dificuldades de trabalhar na região. Bloqueios de quilômetros de estradas, pregos pelo chão e tocaias são exemplos do nível de enfrentamento desses madeireiros às equipes de fiscalização”, lamenta o gestor da Reserva Biológica do Gurupi, Evane Lisboa. “Quem está aqui na linha de frente não consegue mais ficar em paz sabendo que a Rebio, única em biodiversidade, continua perdendo suas áreas de florestas para o fogo, os invasores e os madeireiros”. De acordo com Evane, há uma pressão muito grande, em especial da classe madeireira, para que a Rebio seja diminuída em tamanho ou mesmo extinta. “Como os equipamentos deles estavam sendo apreendidos pela fi scalização, começaram a articular toda classe madeireira em conjunto com fazendeiros e começaram a retaliar.

A BATALHA DO FOGO

Oceano Atlântico

Comunidades indígenas e animais ameaçados de extinção resistem à ação das queimadas na Rebio do Gurupi, último fragmento de floresta amazônica no Maranhão

Reserva Biológica do Gurupi

Pará

Maranhão Piauí Tocantins

Monitoramento de queimadas Focos acumulados por estado do Brasil no período de 18 de janeiro de 2016 a 19 de janeiro de 2016

RR

ADAM RONAN / ECOFOR DIVULGAÇÃO | INFOGRAFIA: MÁRCIO EUCLIDES

AP

AM

PA MT

180 160

155

MS

140

129

120

PR

100 90 60

RS

40 20 0

31 2 AM

AP

SC

6 MS

MT

22

18

11 PA

PR

RR

RS

5 SC FONTE: INPE

FEVEREIRO DE 2016

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ASSUNTO DO MÊS

Em 2015, incendiaram a UC e todas as Terras Indígenas, eles não querem a continuidade da Rebio do Gurupi”. O gestor afirma que esse grupo econômico tem conexões políticas em todos os níveis de administração, que defendem seus interesses. Evane Lisboa diz que a atuação mais eficaz da Rebio esbarra na falta de recursos, repassados

pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), e estrutura para lidar com ameaças, como os incêndios criminosos que se proliferam na unidade de conservação e terras próximas. “Para um incêndio de grande porte como aconteceu ultimamente, a unidade não tem aparatos. Precisaríamos de pelos menos 60 brigadistas, e os sete que

tínhamos foram cortados em 2015 por questões de orçamento”, afirma. “Só vamos reverter a situação se tivermos uma ação de longa duração, em que o Exército é essencial para sitiar a região leste, fora de controle há mais de um ano e onde se instalou uma rede criminosa com assassinatos, invasões, roubo de madeira e narcotráfico”.

PROVA DE FOGO

Um dos principais entraves no combate aos incêndios criminosos é a falta de infraestrutura e recursos para as ações na Amazônia. Sem as devidas condições, os focos de queimadas se proliferam na região Norte do país.

ADAM RONAN / ECOFOR / DIVULGAÇÃO

Unidos contra o desmatamento Na contramão do fogo nas florestas, 17 entida-

no meio ambiente e na economia nacional, espe-

Nacional no fim de 2015. Em passeatas nas ruas

des nacionais e estrangeiras, dentre elas o Instituto

cialmente na produção agrícola. Já em 2020, o se-

e nas redes sociais pela internet, artistas como

do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon)

tor poderá sofrer um prejuízo anual na ordem de

Letícia Sabatella, Maria Paula e Wagner Moura de-

e The Nature Conservancy (TNC), estão engajadas

R$ 7,4 bilhões, como consequência da redução de

monstraram apoio à causa. Uma das diretrizes do

em um movimento para barrar o desmatamen-

chuvas em diferentes regiões. O grupo afirma que

projeto de lei é impedir os incêndios criminosos em

to na Amazônia e em todos os biomas brasileiros.

o Brasil já dispõe de tecnologia e áreas abertas em

áreas de floresta.

Em setembro passado, elas lançaram o manifesto

quantidade suficientes para garantir a continuida-

As proibições de desmatamento propostas não

“Desmatamento Zero e o Futuro do Brasil”, que

de e o desenvolvimento da produção de alimentos

incluem os imóveis rurais da agricultura familiar

mostra a importância do país assumir a meta de ze-

sem a necessidade de novos desmatamentos.

por um período de cinco anos contados a partir

rar o desmatamento nos próximos anos. Objetivo

Assim também pensam os adeptos da campa-

da aprovação da lei. Nesse tempo, o poder público

considerado pelo grupo como algo “necessário e

nha “Desmatamento Zero Já”. Mais de 1,4 milhão

deve garantir que esses grupos recebam progra-

factível”.

de pessoas já assinaram a petição on-line organi-

mas de assistência técnica, extensão rural, fomen-

Os efeitos não se reservam apenas ao meio am-

zada pela ONG Greenpeace Brasil. A ideia é que o

to à recuperação de florestas nativas, transferência

biente. A combinação “florestas desmatadas” e

documento reforce e ampare o Projeto de Lei pelo

de tecnologia e de geração de renda compatíveis

“mudanças climáticas” deve ter impactos severos

Desmatamento Zero, encaminhado ao Congresso

com o uso sustentável da floresta.

46 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2016


Fogo em terras indígenas

Também alvos das investidas de madeireiros e invasores de outras naturezas em seus territórios, membros das etnias Ka´apor, Awá-Guajá e Guajajara se encontram em uma situação de desolamento ainda mais crítica. Na segunda metade de 2015, o ataque às Terras Indígenas cresceu em intensidade e violência. Imagens aéreas da Organização Não-Governamental (ONG) Greenpeace, feitas sobre a TI Araribóia, dão um panorama do estrago. Estimava-se que à época, outubro de 2015, pelo menos 45% da terra dos Guajajara tivesse sido consumida pelo fogo. Quatro meses depois, sem o apoio de nenhuma instância governamental, essa área perdida deve ser bem maior. Tamanha é a relação da etnia com o seu lugar que retirar a terra desse povo equivale a um lento genocídio. Os Ka´apor, que passam por situação semelhante, formaram brigadas para monitorar a terra e expulsar os invasores. Em dezembro, no flagrante de um grupo extraindo madeira ilegalmente

na TI do Alto Turiaçú, houve embate e os indígenas afirmam que dois membros da etnia foram baleados. “Esses grupos estão isolados, sem nenhum tipo de ajuda do Estado e das instituições responsáveis”, afirma a bióloga do Museu Goeldi, Marlúcia Martins. Ela é uma das pesquisadoras que há anos trabalha na Reserva Biológica do Gurupi e proximidades e acompanha de perto os crimes cometidos por grupos invasores, a começar pelas queimadas. “O incêndio nestas áreas foi criminoso. Pessoas atearam fogo. O fato das florestas estarem já alteradas pela retirada de madeira com a abertura de muitas clareiras fez o terreno mais suscetível e facilmente inflamável”, garante. “As autoridades reagiram com uma morosidade impressionante. A imprensa local, mesmo tendo sido acionada, não reagiu reportando os fatos. Quando fez isso, tardiamente, alterou a verdade dos fatos tentando mostrar os incêndios como resultado de causa natural (o El Niño)”. À frente de projetos de pesquisa na

Amazônia Maranhense e na coordenação do Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBio) - Núcleo Amazônia Oriental, a bióloga diz que o Museu Goeldi e outras instituições regionais de ciência têm contribuído na divulgação da riqueza natural da região do Gurupi se unindo às lideranças indígenas para barrar a destruição da floresta. “O que temos feito é ampliar o conhecimento sobre a área e apoiar ações de educação ambiental. Temos divulgado os resultados de pesquisa em diversos fóruns de forma a levar à sociedade e tomadores de decisão a informação sobre a importância biológica da Rebio dentro do contexto da Amazônia maranhense e da Amazônia como um todo” diz. “Precisamos que todos saibam que estas terras de floresta são essenciais para a qualidade de vida de toda a humanidade, mas que é preciso se importar com os povos que vivem e dependem diretamente da floresta. Eles prestam este serviço para todos nós, conservando a floresta. Precisamos apoiá-los e respeitá-los em seu modo de vida”. TARSO SARRAF

A CHAMA DA ESPERANÇA

Para a bióloga Marlúcia Martins, do Museu Goeldi, é preciso um trabalho conjunto, ampliando o conhecimento sobre a floresta e seus povos e apoiando ações de educação ambiental

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COMUNIDADE

Turismo à moda marajoara Moradores de vila no Marajó mantêm um projeto turístico de base comunitária que agrega a vida simples do lugar à acolhida dos visitantes TEXTO BRENDA PANTOJA FOTOS CLÁUDIO PINHEIRO

A

s canoas saem da praia do Pesqueiro, em Soure, em direção a um pontão de areia e, poucos minutos depois, chegam à Vila do Céu. Logo na entrada, uma placa indica o restaurante “Brisa do Céu”, construído em um esforço conjunto pela comunidade de pescadores. Os moradores perceberam que os viajantes que saíam da rota oficial do turismo na ilha e chegavam até o local, não encontravam opções de alimentação e hospedagem, tendo que voltar para o Pesqueiro. Depois que o estabelecimento, erguido com uma estrutura de taboca e palha, foi inaugurado, a renda arrecadada tem sido usada para promover melhorias no lugarejo e o plano é abrir uma pequena pousada ao lado.

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Os visitantes que costumam explorar a vila, com suas coloridas casas de madeira e uma rotina muito diferente das grandes cidades, são aqueles interessados em turismo de base comunitária. A preservação ambiental é um dos fatores que chama a atenção desse público, mas o que realmente encanta é o contato com o acolhedor povo amazônico. “Esse modelo de turismo traz a parte humana da viagem, para que as pessoas conheçam a dinâmica e a diversidade da região através de seus habitantes. É importante que o brasileiro explore a Amazônia para aprender a valorizá-la”, comenta Maria Teresa Junqueira, gerente da operadora de viagens Turismo Consciente.

Natural de São Paulo, Maria Teresa começou a desbravar a Amazônia há 15 anos com o projeto Vaga-Lume, que implanta bibliotecas comunitárias em localidades rurais e ribeirinhas. A partir da interação com as comunidades do arquipélago, ela participou da montagem do roteiro VEM – Viagem Encontrando Marajó, em 2007, em parceria com a Associação de Mulheres da Vila do Pesqueiro. A experiência inclui atividades como coleta de turu, pesca artesanal, passeio no mangue e pernoite nas comunidades. O projeto recebeu financiamento do governo federal, possibilitando a capacitação de muitos moradores. Eles se dividiram entre os que participaram de oficinas


gastronômicas, para resgatar a culinária tradicional, de guias turísticos e anfitriões, que formou os responsáveis por coordenarem os grupos e organizarem os passeios, e de hospedagem, para aqueles que escolheram abrir as casas para os turistas. Embora o projeto esteja oficialmente parado há pelo menos cinco anos, por dificuldades de articulação junto à Associação, os agentes do turismo comunitário continuam trabalhando na área, através de parcerias com hotéis e agências de viagem. É o caso da Lucileide Borges, 41, que tem várias funções na comunidade do Pesqueiro, entre elas a de professora e a de guia do passeio de extração do turu. A tarefa é desempenhada ao lado do marido, e sob os olhares curiosos e desconfiados dos visitantes, eles pegam os moluscos no mangue, fazem a limpeza e a degustação. “A procura por esses roteiros tem crescido e o diferencial é que é

um modelo que promove a preservação ambiental, porque os turistas conhecem melhor a natureza local, e são criados laços entre quem vem de fora e a gente. Não é um trabalho impessoal”, diz. Ainda segundo ela, a renda gerada por essa atividade complementa o orçamento de muitas famílias. “Esse turismo envolve os parceiros das comunidades de pescadores, beneficiando gente que, muitas vezes, só tem o Bolsa Família de renda fixa. A consciência com o meio ambiente também aumenta entre os moradores, que passaram a se preocupar mais com destino adequado do lixo e até com a poluição sonora”, completa. Maria Teresa ressalta que o turismo de base comunitária não pode transformar a atividade econômica de uma localidade, funcionando melhor como uma renda extra. “Há uma linha tênue: até onde dá para a gente ir para que as pessoas não deixem de desen-

VIDA CABOCLA

A extração do turu faz parte do roteiro turístico dos visitantes, assim como andar de búfalo e conhecer as praias do lugar

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COMUNIDADE

volverem as ocupações tradicionais? Se abandonam isso e o fluxo de turistas cessa ou diminui, a comunidade sofre um declínio”, pontua. Percorrendo as praias, vilas, fazendas e rios de Soure, Ana Cristina Penante, 38, fala com muita segurança sobre as características da gente, dos animais e das plantas marajoaras. Ela é uma atuante promotora do turismo regional no Marajó, com 15 anos de experiência. Para ela, o impacto na vida da comunidade é visível, mesmo com poucos investimentos no setor turístico. “Quando começamos a hospedar turistas na vila, só podia recebê-los quem tinha banheiro dentro de

casa, com fossa séptica. A partir daí, mesmo quem não precisava seguir essa exigência, fez questão de adaptar o banheiro e hoje praticamente todas as casas da vila estão adequadas”, conta. Ana Cristina comenta que o turismo, especialmente o que busca o envolvimento com as populações tradicionais da Ilha, esbarra em dificuldades de comunicação, transporte e incentivo. “Nas vilas do Pesqueiro, Céu e Cajuúna, por exemplo, só pega o celular rural e se tiver antena boa. Para chegar a alguns desses locais, tem que ter autorização para passar por dentro de fazendas e o transporte aqui na ilha tem um custo muito alto. O poder público pou-

co divulga e informa os turistas sobre iniciativas de base comunitária. O Marajó tem um enorme potencial turístico, que pode beneficiar muito os habitantes, mas falta nossas autoridades perceberem isso para a gente conseguir crescer mais”, acrescenta. Outro grande efeito de trabalhar com os moradores locais, de acordo com Ana Cristina, é ver o fortalecimento da articulação e do empoderamento. Maria Teresa destaca que o “Brisa do Céu” é um ótimo exemplo de “inteligência social”. De trás do balcão, sempre sorridente e sentindo prazer em receber bem os clientes, a gerente Joelma Sousa, 29, fez questão de registrar no celular imagens do estabelecimento lota-

TROCA DE EXPERIÊNCIAS

Os turistas que chegam à vila no Marajó entram em contato com a cultura local, gerando respeito pela diversidade e multiplicando o conhecimento acerca do lugar

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do de visitantes que tinham chegado de São Paulo. Os turistas almoçaram peixe frito com açaí, ao som de bregas marcantes e de frente para a praia, com um vento suave e incessante, fazendo jus ao nome do restaurante. “A nossa ideia é ampliar e abrir uma pousada, construindo alguns quartinhos. A comunidade fica afastada e é basicamente familiar, mas nos reunimos e decidimos oferecer opções para os visitantes comerem e se hospedarem”, reforça. O restaurante foi construído há menos de um ano, erguido e equipado a partir da coleta e da mão de obra da comunidade. “O lucro é usado em melhorias para a comunidade, como a revitalização de áreas de uso comum, na sede da associação de moradores, na igreja, no colégio. Esse sistema tem funcionado muito bem e só tem benefícios a trazer”, avalia.

ARTE MILENAR

Além da interação com a natureza, o roteiro montado por Maria Teresa costuma incluir a visita ao ateliê do escultor ceramista Ronaldo Guedes, 40, que mostra um pouco da arte marajoara. No bairro do Pacoval, onde fica o espaço, ele também promove ações ambientais e culturais paras as crianças. “É um trabalho voltado para a cultura, mas também de consciência política, para que as pessoas daqui se apropriem do seu território e entendam o quanto esse aspecto histórico da arte representa para o nosso desenvolvimento”, defende. Para o grupo de cerca de 20 turistas de São Paulo, que viajaram com os filhos pela Turismo Consciente, a oficina de cerâmica foi um dos momentos mais especiais, pois eles puderam produzir as próprias peças, que depois foram ao forno para ficarem prontas. “O turismo de base comunitária é um elemento importante para a gente porque há uma troca de experiências e contribui para a nossa renda. Ensinar e aprender com a cultura dos outros sempre é enriquecedor, ainda mais pela cerâmica marajoara ter relação direta com a pré-história da Amazônia”, diz Ronaldo Guedes.

PELAS ILHARGAS Os visitantes também fazem caminhadas nas trilhas marajoaras e conhecem a produção das famosas cerâmicas do arquipélago

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NATÁLIA MELO

SUSTENTABILIDADE

Caminhos sustentáveis Programa Municípios Verdes chega e se instala no interior do Pará regido por uma máxima: manter a floresta em pé TEXTO NATÁLIA MELLO

A

ntônio Bezerra mora no assentamento Floresta Gurupi, no município de Ulianópolis, no sudeste do Pará. Aos 46 anos, o agricultor lembra como começou a vida no campo. “Ah, eu roço a terra com meu pai desde menino”, conta, procurando nas memórias, embora sem sucesso, a idade exata. Hoje, com a mulher e cinco fi lhos, ele conta que a comunidade onde eles e outras 70 famílias vivem, na Vila Bom Jesus, já anseia por novos caminhos para se desenvolver e produzir de forma sustentável, especialmente agora, em que há a consciência sobre a importância de preservar o meio ambiente. “A preocupação é essa, porque precisamos viver do meio ambiente, mas queremos orienta-

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ção, evitar queimadas. E o conhecimento é importante”, diz. Foi pensando em ampliar o acesso de Antônio e de outros pequenos produtores a novas práticas ambientalmente corretas, visando ao reordenamento das áreas rurais do Pará, que o Programa Municípios Verdes (PMV), lançado em 2011, desenvolveu o maior projeto já aprovado pelo Fundo Amazônia/BNDES, no valor de R$ 82,4 milhões. E, para atingir seus principais objetivos – o fortalecimento da gestão ambiental municipal, o aumento dos imóveis rurais registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e a formalização dos pactos para reduzir os índices de desmatamento em todo o Estado; do dia 25 ao dia 28 de janeiro, quatro equipes técnicas do PMV

formaram uma caravana para lançar oito Bases Locais do programa, que irão atender 44 municípios das regiões nordeste, oeste, sudeste e sudoeste do Pará. Cada equipe ficou responsável por implementar duas bases, divididas de acordo com a região de integração: Tailândia e Dom Eliseu; Santarém e Almeirim; Marabá e Redenção; Altamira e Itaituba. Cada polo, considerado um escritório avançado do programa, será responsável por dialogar com os municípios ligados à base. “O trabalho in loco facilita a articulação para ações de mobilização com as secretarias de meio ambiente e entidades envolvidas com a questão ambiental nos municípios, pois teremos a presença constante de um representante da empresa contrata-


FORÇA-TAREFA

Em Itaituba, na região sudoeste do Pará, a reunião do PMV conseguiu trazer representantes de quase todos os municípios que a base irá atender, exceto de Novo Progresso e do distrito de Castelo dos Sonhos. O coordenador regional do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) no município, Edvan Carvalho, ressaltou a importância de o trabalho ser realizado em conjunto, devido às dificuldades enfrentadas na região. “Entendemos que a questão ambiental é difícil de ser trabalhada aqui, mas o Ipam avalia de forma muito positiva a reunião e está satisfeito com o resultado. Estamos dispostos a colaborar com a base local”, pontuou. Para Edvan, a reunião é valida para dar transparência ao processo de implementação da Base Local, devido à presença constante do PMV. “Esperamos que os resultados dos diagnósticos

NATÁLIA MELO

da para executar o plano de trabalho, a Floram. Eles serão responsáveis pelo monitoramento das metas e firmamento dos pactos, mas tudo será supervisionado por nós”, diz o diretor do Núcleo Executor do Programa Municípios Verdes, Felipe Zagalo. E era por essa aproximação que o produtor Antônio Bezerra esperava. Ele conta que sua comunidade carece de recursos e enfrenta certa dificuldade para sobreviver da roça. Para ele, com as bases in loco, a possibilidade das famílias de agricultores serem beneficiadas com ações é maior. “Eles vão estar mais perto, nos ouvindo mais. Queremos preservar a comunidade e ter condições de fazer a nossa roça sem desmatar ilegalmente. A minha preocupação lá é que a maioria das pessoas não quer mais roça, porque não tem mais muito rendimento. A gente precisa fazer por onde, encontrar um meio de realizar outra atividade. Essas reuniões são uma luz para nós, porque juntos fica mais fácil da gente conseguir nossos objetivos”, acredita o produtor.

REUNIÃO

Em cidades como Dom Eliseu e Tailândia, lideranças políticas e comunitárias discutiram o Programa Municípios Verdes. O projeto sustentável foi bem aceito pela população.


SUSTENTABILIDADE

e dos planos de monitoramento consigam contribuir com uma política de gestão ambiental no território da BR-163. Sabemos que não é fácil. As pessoas que estiveram aqui presentes têm a consciência disso, mas o encontro cria a expectativa de que podemos avançar com o programa e com o próprio desenvolvimento local”, conclui. Nascida e criada dentro no campo, a agricultora Domingas Rufina da Silva conta que gosta muito das atividades rurais. A produtora, que participou da

reunião também em Itaituba, vê a implementação da Base como uma grande chance de novas conquistas para a região. “Acho que o que foi apresentado aqui foi realista e estou dando todo o apoio, representando a Associação das Mulheres Agricultoras de Trairão. Moro no assentamento Areia 2 há 18 anos e ainda tem desmatamento, mas vamos lutando, né? O colono sabe que não pode desmatar”, reflete, consciente do desafio que tem pela frente.

PARÁ MAIS VERDE

Onde estão as bases locais e municípios atendidos no Estado

1 Base Local Tapajós: Santarém, Prainha, Mojuí 5Base Local Itaituba: Itaituba, Jacareacanga, dos Campos, Belterra, Óbidos, Monte Alegre, Aveiro

Placas, Novo progresso, Distrito de Castelo dos

e Alenquer.

Sonhos (Altamira), Rurópolis, Trairão.

2 Base Local Almeirim: Almeirim, Porto de Moz, 6 Base Local Marabá: Itupiranga, Bom Jesus do Gurupá.

Tocantins, Marabá, Novo Repartimento.

3 Base Local Altamira: Altamira, Anapú, Brasil 7 Base Local Redenção: Santa Maria das Novo, Medicilândia, Pacajá, Senador José Porfirio,

Barreiras, Santana do Araguaia, Redenção, São

Uruará, Vitória do Xingu.

Félix do Xingu, Cumarú do Norte.

4 Base Local Dom Eliseu: Dom Eliseu,

8 Base Local Tailândia Tailândia:: Goianésia do Pará,

Ipixuna do Pará, Paragominas, Rondon do Pará,

Igarapé-Miri, Jacundá, Moju, Tailândia.

Ulianópolis.

2 1

8 4

5 3

6 7 FONTES: P DEFM

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ESTRUTURAÇÃO

O Programa Municípios Verdes já entregou uma caminhonete às prefeituras de 18 municípios considerados prioritários no combate ao desmatamento no Pará. Além do veículo, as secretarias municipais de meio ambiente de Paragominas, Dom Eliseu, Belém, Trairão, Xinguara, Canaã dos Carajás, Itupiranga, Óbidos, Santa Maria das Barreiras, Santarém, Uruará, Placas, Senador José Porfírio, Ulianópolis, Santana do Araguaia, Tailândia, Itaituba e Altamira receberam um kit para verificação em campo das atividades ilegais, formado por notebook e dois GPSs. Os equipamentos foram adquiridos com recursos do Fundo Amazônia/BNDES. Outros seis municípios já receberam a caminhonete e o PMV aguarda a manifestação das demais prefeituras sobre o interesse em receber os demais itens do kit. Também serão entregues em breve câmeras fotográficas digitais para contribuir com a estruturação da gestão ambiental nestes municípios. No total, 34 cidades serão beneficiadas com a doação do veículo e dos equipamentos. Participam do evento secretários municipais de Meio Ambiente e de Agricultura, Sindicatos de Produtores Rurais, Empresa de Assistencia Técnica e Extensão Rural do Estado do Pará (Emater), prestadores de Serviço de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater/ Ates) públicos e privados; Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Universidades (cursos de graduação, pós-graduação e extensão envolvidos), Federação da Agricultura e Pecuária do Pará (Faepa), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), organizações não governamentais e representantes das governanças locais. O encontro ocorreu para que os governos municipais, sociedade civil organizada e produtores rurais conhecessem a Base Local e suas atribuições, e ainda para fortalecer o vínculo entre estes atores e conscientizá-los sobre a importância de um trabalho conjunto para a redução do desmatamento ilegal.


ARTE, CULTURA E REFLEXÃO AKIRA ONUMA

PENSELIMPO

Cantora presepeira A PARAENSE NANNA REIS TEM UM ESPÍRITO INQUIETO E LEVADO DIANTE DA VIDA E DA ARTE PÁGINA 56

MEMÓRIA

PROGRESSO

A escritora Maria Lúcia Medeiros é um dos expoentes da literatura paraense, traduzindo em seus livros o estilo amazônico de viver. PÁG.60

As hidrelétricas instaladas e as que estão prestes a entrar em funcionamento na região ainda são temas de discussão. PÁG.66

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PAPO DE ARTISTA

N

ão tem o que freie a veia artística de Nanna Reis – às vezes ela se chama de presepeira. Mesmo trêmula e diante de uma praça Batista Campos lotada, ela pegou o microfone e aos oito anos realizou o sonho de cantar – depois desceu do palco e foi para a praça brincar. Para atuar, Nanna, filha do cantor e compositor Alfredo Reis, aceitou um convite às pressas e deu vida e graça à personagem da música “Varejeira” na websérie Sampleados, tornando-se depois roteirista do projeto. Aprendeu a ler partituras, cantar com impostação, respirar com o diafragma e se refinou tecnicamente. Depois aprendeu a escrever projetos, captar recursos e traçar estratégias para alcançar grandes públicos com poucos recursos. Se sua carreira fosse jogadora de futebol, Nanna talvez fosse chamada de “gato”, só que ao contrário: ela tem algumas experiências em que teve que mentir a idade, para mais, para poder subir no palco. Nessa entrevista, a cantora, atriz, roteirista, que faz shows - e participa de reality shows – conta, à base de “nanices”, quem é Nanna Reis, como ela chegou aos palcos do Pará e do Brasil e o que espera de 2016. Te lembras a primeira vez que pensaste em ser cantora? Acho que quando aprendi a falar já disse para a mamãe “quero cantar”, ou algo do tipo. Ou mesmo na barriga (risos). Já nasci presepeira, desde pequena quis ser artista. Tem uma foto minha pequena, devia ter uns dois anos, sentada em cima de um tamborzinho com um microfone, de calcinha (risos). Aquilo é bem representativo daquele momento, de como a música apareceu e como resolvi fazer isso. É engraçado, sempre foi algo muito natural. Fazia parte do meu dia a dia desde a infância. Inclusive, a primeira vez que cantei em público foi aqui na praça Batista Campos, ali naquela esquina, ao lado do colégio Santa Rosa (ela se vira e aponta para o cruzamento da Tamoios com a Presidente

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Nanices de Nanna

CANTORA, COMPOSITORA, PRODUTORA, PRESEPEIRA, ATRIZ, ROTEIRISTA DE WEBSÉRIE, ESPEVITADA. UFA, NANNA REIS É TUDO ISSO E MAIS UM BOCADO! TEXTO ALAN BORDALLO FOTOS AKIRA ONUMA


Pernambuco). Agora lembrei disso. Meu pai (o cantor e compositor Alfredo Reis) ia fazer um show e as amigas dele fizeram essa surpresa como um presente. Todo mundo já sabia que eu queria cantar, então chegaram comigo: “É molequinha? Quer mesmo?”. Subi no palco e vi aquela praça lotada, me tremi toda. Cantei uma da Lucinnha Bastos, era fã dela. Ela e a Lenne Bandeira eram Deus para mim (risos). Tinha até pôster. Lucinnha gravou a música “A La Brasileira”, que é do meu pai e fala da mulher brasileira. Mas enfim, naquele dia me tremia toda, ainda lembro da sensação, “ai, vou morrer”. Mas cantei e fui brincar na praça. Então, para mim, a música sempre foi ligada ao lúdico, ao natural. Na tua casa tem outros músicos? Não profissionais, mas lá todo mundo batuca, canta, dança. Minha família é bagaceira, alegre. Isso é muito do paraense, um povo que tem uma onda com música. No Norte acho que o Pará é o Estado que se notabiliza por mais manifestações culturais, aqui a galera gosta de se divertir, ser feliz. Acho que o clima reverbera no calor humano, na receptividade. Somos assim, de braços abertos, cheguem aí, vamos nos amar (risos). E foi por influência da família que depois desse show na praça entraste para o Conservatório Carlos Gomes? Quando a gente é criança os pais nos botam em tudo, então eu e minha irmã fazíamos dança, teatro, inglês, desenho, alemão, e, no meio de tudo, música. Eu tinha oito anos quando entrei no conservatório e o professor (Luís Santana) Balieiro me perguntou o que eu queria. Eu disse “quero cantar”, e ele respondeu que eu era muito nova. “Mas eu quero cantar”, e ele dizia que eu ainda era criança. E eu continuava respondendo que queria cantar e ele disse que só a partir de 16 anos. “Então depois eu vou cantar?” (risos). E depois disso e sosseguei, fiz musicalização, três anos de flauta doce com o BaFEVEREIRO DE 2016

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PAPO DE ARTISTA

lieiro, que hoje é um grande amigo. Depois estudei com outros professores, fiz flauta transversal. Aí eu fiquei braba porque ia demorar muito para estudar canto lírico. E foi aí que cruzaste a linha para o canto popular? Entrei para a Escola de Música da UFPA, onde a Dayse Addario, minha mestra, abriu uma turma de canto popular. Mas lá também só era aberto para pessoas com no mínimo 15 anos; eu tinha 13 na época mas menti a idade (risos). Já era grandona, disse que tinha 15. E já tinha uma voz, dizem até que sou meu pai de saia, mas é que minha referência era meu pai, eu reproduzia o que via em casa. Lá estudei técnica vocal e canto popular. Fiquei até os 16 anos, aí resolvi voltar (para o conservatório) para entrar no canto lírico. Achava importante ter formação técnica e em Belém não existia a especificidade para o popular. No lírico podia aprender teatro, com a ópera, respiração, impostação. A voz tem que ultrapassar a massa sonora da orquestra. Era botar para cima e ser feliz (risos). Fiquei um tempo e depois saí, vi que não era a minha. Nas notas que eu cantava com voz de peito, não de cabeça, já impostava a voz, e lá fui eu com a Dayse, que é do canto lírico também, e ela me disse que isso iria acontecer, que era uma questão de costume. O corpo é o instrumento, o processo é de autoconhecimento.

MULHER PARAENSE

Quando decidiu seguir a carreira artística, Nanna Reis batalhou pelo seu ideal e experimentou vários estilos musicais. Ela soube ir à luta.

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E foi também nesse período que começaste a participar de festivais? Foi, eu estava aprendendo a cantar e fui para os festivais. Não interessava se era no ônibus, no chuveiro, eu queria cantar. E deixei a música me levar aonde fosse. E tudo que me interessava eu ia atrás. Se via uma possibilidade, uma janela de aprendizado, um desafio, que poderia me amadurecer como ser humana, eu ia. Isso se reflete na minha visão de artista: comecei a cantar cedo, vou experimentar tudo. Aí fiz o (Projeto) Charmoso. Conhecia os meninos dos metais do conservatório. O Proefx (DJ do Projeto Charmoso) conheci depois. Unimos várias coisas diferentes, a música

“Música é música, é sentimento. Antes de cantar, compor, tocar, tem que sentir. Se não sente e não transmite aquela coisa boa, é um robô.” latina, afro, eletrônica. Esses projetos eram como uma desculpa para eu experimentar e não entrar direto para o clássico, ou para o “açaí com tapioca”. E quando foi que surgiu a carreira solo? A carreira solo já existia da seguinte forma: eu como intérprete, cantando músicas dos outros em festivais. Mas desde criança eu já compunha. Mas era um pouco “noiada”, porque meu pai era compositor. Ficava pensando o que iam achar das minhas músicas, o que eu queria dizer nelas. Sempre pensei muito em (forma de) verso, ia andando e escrevia quando vinha a ideia. A música é meio uma onda natural, eu falo meio cantando... Teu trabalho busca sempre a diversidade então? Na minha família tem evangélico, espírita, umbandista, católico e todo mundo almoça e reza junto no Círio. A avó por parte de pai, de Manaus, é descendente de índios, a por parte de mãe é do Marajó, e de uma comunidade quilombola. Um avô é filho de português e outro filho de espanhol. Essa diversidade já se refletiu em um show também, o Entre Cores, que teve uma pegada mais


mística, refletindo as minhas vivências, meus estudos e até Belém como uma capital mística. E todas essas referências fui buscando, procurando coisas, esse show foi bem isso. Entre Cores da minha gente, das minhas heranças. E entre isso ainda cantei com Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz e com a Amazônia Jazz Band, em concertos, isso foi muito legal. São essas experiências que te deixam à vontade no Theatro da Paz ou em cima de um trio elétrico então? É, porque não tem limites mesmo. Música é música, é sentimento. Antes de cantar, compor, tocar, tem que sentir. Se não sente e não transmite aquela coisa boa, é um robô. É como a diferença entre o professor e o educador. O professor muitas vezes passa aquilo pra ti, e tu decoras. E o educador te faz

pensar e refletir, introduz na tua realidade aquela história. A academia me ajuda muito nessa parte de ressignificar o que faço, mas vários outros pontos eu aprendi no dia a dia, fazendo. O sentimento move tudo. Não adianta, pode ser o da Paz ou o Aurora com Piña Colada (grupo de cantoras formado por Nanna Reis, Juliana Sinimbú, Camila Honda e Natália Mattos) – música para mim é um sentimento antes de tudo. Não interessa o lugar, o público, se tem uma pessoa ou um milhão. No ano passado lançaste um EP e um videoclipe. O que a gente pode esperar para esse ano? Ainda não tenho disco gravado mas estou correndo atrás de editais. Demorei um pouco a entender como isso funciona. Eu que faço tudo, não tem produção, tem amigos queridos que ajudam,

o pessoal da Platô (Produções) e outros. E fui aprendendo. Hoje já faço meus projetos e corro atrás. Mas independente disso tem clipe novo e outro EP a caminho. Essa é a formula do século XXI: singles isolados e EP para distribuir nas plataformas de streaming. Um dia fui numa palestra com Priscila Brasil (cineasta) e ela falou que não tinha que se preocupar com DVD, Blu-ray, mas com colocar o conteúdo acessível no smartphone, no pendrive. Claro que é legal ter o físico, mas a internet é a onda. A TV antigamente tinha um aspecto social importante de formação da identidade do artista, e a internet acabou com isso, e enfraqueceu as gravadoras. Para ganhar dinheiro agora tem que fazer show mesmo. E é doido, porque nesses espaços a gente vê as pessoas sabendo a nossa música. Quando vejo gente sabendo tudo, fico impressionada. FEVEREIRO DE 2016

NA ONDA DA VIDA

Nanna aposta no sentimento verdadeiro pelo que faz e segue os caminhos que surgem pela frente, com alegria e determinação

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MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS

A prosa poética de lucinha TEXTO ANA PAULA MESQUITA ILUSTRAÇÕES JOCELYN ALENCAR

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Maria Lúcia Medeiros 1942-2005


C

om uma escrita envolvente e marcante, Maria Lúcia Medeiros, ou simplesmente Lucinha, tornou-se uma das principais contistas do Pará. Seus livros têm como ponto forte os sentimentos, entre eles a angústia e a solidão, com um toque emocional, intenso e quase autobiográfico. Assim a define Fátima Amador, professora e pesquisadora, na dissertação de mestrado intitulada “Maria Lúcia Medeiros: Entre Atos, o Fato e a Ficção”, uma biografia e crítica literária. Foram cinco livros publicados: “Zeus ou A Menina e os Óculos”, “Velas Por Quem?”, “Quarto de Hora”, “Horizonte Silencioso” e “Céu Caótico”. Todos tinham como temática a vida da autora quando criança, relações com as pessoas e a Amazônia e o momento em que vivia. Eram textos para serem interpretados nas entrelinhas. “Ela gostava de brincar com as palavras para torná-las mais poéticas e belas”, diz Fátima. Maria Lúcia nasceu em Bragança, nordeste do Pará. Saiu de casa aos 12 anos e estudou no colégio Gentil Bittencourt, onde começou a ter contato com a literatura. Num dos contos do livro “Céu Caótico”, sua última obra, publicado em 2005, ano em que morreu, dizia: “Quando descobri os livros, descobri um outro jeito de viver. Personagens, situações, lugares ajudavam meu aprendizado do mundo. Ler para mim sempre foi uma salvação. Agora, escrever, acho que sempre escrevi. Lembro que muito menina eu me recolhia e escrevia, escrevia para mim”. Em 1960, Maria Lúcia formou-se em Letras pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Foi professora na escola John Kennedy, de 1972 a 1974, onde dava aulas de Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa. Trabalhou na UFPA de 1978 a 1991, quando se aposentou. No Centro de Letras ensinou Literatura Brasileira, Teoria Literária e Literatura Infantojuvenil. Na aposentadoria, foi consultora da Fundação Curro Velho e da Casa da Linguagem, junto com o poeta Max Martins. “A principal preocupação da autora era despertar nos alunos o gosto pela escrita, pela literatura.

Tinha por eles imenso carinho e tinha anseio por uma escola criativa e expressiva”, observa Fátima. A escritora participou de colóquios na Feira de Livro de Frankfurt, da Universidade de Heidelberg, na Alemanha, com leitura de contos junto com Ligia Fagundes Telles, Caio Fernando de Abreu, Márcio Sousa e Ivan Angelo, em 1994. No mesmo ano, a obra de Lucinha inspirou o documentário “A escritura veloz sobre a escritora”, dirigido por Mariano Klautau, seu filho, em parceria com os jornalistas Dênio Maués e Valzeli Sampaio. E ainda a adaptação do conto “Chuvas e Trovoadas”, no curta-metragem homônimo de Flávia Alfinito. Nesta produção áudiovisual, quatro meninas têm aulas de costura em tardes entediantes do período da Belle Époque. O filme é narrado pelo ator José Mayer e tem participação das atrizes Patrícia França, Suzana Faini, Andrea Rezende, Andréa Paiva, Francy Moura, Luana Nunes, Mônica Soares e Daniela Lima e do ator Alexandre Siqueira. Recebeu prêmio de melhor fotografia no Festival de Gramado. Pode ser encontrado no YouTube. Lucinha foi homenageada na XVII Feira Pan-Amazônica do Livro, em 2003, com um sarau “O elemento fabuloso da narrativa de Maria Lúcia Medeiros” e depois no Fórum de Letras da Universidade da Amazônia (Unama). Em 2002, o livro “A ficção de Maria Lúcia Medeiros: leituras” foi publicado pela Secretaria de Estado de Cultura (Secult), organizado pela professora Amarílis Tupiassú, com diversos autores comentando contos da escritora. A literatura era paixão de Maria Lúcia Medeiros. “Era uma questão de vida, de se manifestar. Era trazer toda uma experiência de vida para a literatura”, destaca Fátima Amador. A obra da escritora era o envolvimento da relação entre vida e palavra. Todos os sentimentos de Lucinha se revelavam nos personagens. Para ela, a literatura era um código secreto de histórias com temas densos. Ainda que sejam secretos, é possível se reconhecer nas histórias deixadas para refletir e sonhar. FEVEREIRO DE 2016

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AGENDA ELZA LIMA / ASCOM SECULT

QUADRINHOS O Concurso de HQ “Belém 400 Anos”, da Fundação Cultural do Pará (FCP), segue com inscrições abertas até o dia 25 de fevereiro. Segundo Ruth Selma, coordenadora da Biblioteca Pública Arthur Vianna, “A maior importância do evento é divulgar o espaço da Gibiteca, para que seja mais conhecido e visitado por pessoas apaixonadas pelos quadrinhos”. Informações no site www. fcp.pa.gov.br.

GESTÃO AMBIENTAL As inscrições para a seleção ao Programa Internacional de Formação de Especialistas em Desenvolvimento de Áreas Amazônicas do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, da Universidade

MIGUEL CHIKAOKA

Federal do Pará, FIPAM XXVII: Gestão

Obras em exposição

ambiental e Manejo de Paisagem, seguem até o dia 11 de fevereiro. O edital

As obras do fotógrafo Miguel Chikaoka se-

(2015), “Fotografia Contemporânea Paraense

completo pode ser encontrado no site

guem em exposição do Espaço Cultural Casa

Panorama 80/90” (2001) e “Fotonorte” (1998).

www.naea.ufpa.br.

das Onze Janelas. “Travessias” traz um pa-

Para Chikaoka, esta exposição é uma mostra

norama de mais de três décadas do trabalho

de seus 35 anos de carreira. “Tem obras de

VIROLOGIA

do fotógrafo, apresentando o seu olhar sobre

todo esse período da minha profissão de fotó-

Acadêmicos do nono semestre da Facul-

cidades pelas quais passou ou viveu, materia-

grafo, então, de certa forma, trago a parte do

dade de Farmácia, da UFPA, realizarão

lizado em instalações, objetos e fotografias,

processo de fotografia em Belém, é uma expo-

o I Simpósio de Virologia: Atualização

com registros do interior do Pará, de Belém e

sição que permite um panorama da fotografia

e Desafios para os Serviços de Saúde,

de alguns países.

na capital paraense”, observa o fotógrafo.

nos dias 20 e 21 de fevereiro. O evento

Todas as obras foram adquiridas a partir de

A exposição ocupa todas as salas do espaço

será composto por palestras acerca de

prêmios e projetos, como as obras da 7ª edi-

até o dia 1º de abril. Informações: (91) 4009-

diversos enfoques e entre eles os mais

ção do “Prêmio Marcantônio Vilaça/Funarte”

8825/8821.

recentes acontecimentos envolvendo novos vírus e patologias que estão aco-

A Universidade do Estado do Pará (Uepa) se prepara para sediar nos dias 11 e 12 de agosto o I Seminário Internacional Sobre Cidades, Territorialidades e

OSWALDO FORTE

CIDADES

metendo a população, e que tornam-se necessários para a atualização dos profissionais de saúde. Mais informações www.portal.ufpa.br

Sustentabilidades na Pan-Amazônia, I Seminário de

PARASITAS

Pesquisa e Pós-Graduação em parceria com a Funda-

A Universidade do Estado do Pará (Uepa)

ção Amazônia de Amparo e Estudos e Pesquisas (Fa-

oferta oito vagas para o Doutorado em

pespa), e o III Seminário Sobre Cidades na Amazônia.

Biologia Parasitária na Amazônia. As

A programação debaterá o direito, sustentabilidade

inscrições ocorrem até 1º de junho de

e modo de vida nas cidades da Amazônia, além de

2016. Os interessados devem entregar os

levantar questões sobre crescimento econômico, de-

documentos na Secretaria do Programa

mocracia e equidade social na região. As propostas

de Pós-Graduação em Biologia Parasitá-

poderão ser encaminhadas de 15 de fevereiro a 25 de

ria na Amazônia, no Centro de Ciências

maio, via internet, por um link ainda a ser disponibili-

Biológicas e da Saúde (CCBS). Mais infor-

zado. Mais informações pelo site www.uepa.br.

mações pelo site www.uepa.br.

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FEVEREIRO DE 2016


FAÇA VOCÊ MESMO

Porta-treco com colagem Um lugar para guardar trecos diversos sempre é algo necessário, principalmente para quem trabalha num escritório ou faz home-office. E para construir um porta-treco de pegada ecológica, os técnicos das Oficinas Curro Velho ensinam como fazer um numa técnica francesa bem simples, a papietagem ou papier collé (papel colado). A técnica é antiga e muito utilizada para decoração cênica de teatro e máscaras carnavalescas. É possível reproduzir, praticamente, qualquer objeto

Do que vamos precisar?

Papel kraft 90g e 400g

Rolo pequeno

Tesoura com pontas arredondadas

Cola branca

Barbante

Tubo de papelão

Pincel

sólido. Com a prática e experimentação de novas formas de trabalhar, os resultados são objetos em três dimensões deixando de lado a confecção com apenas uma face. A técnica foi desenvolvida pelo pintor cubista Georges Braque e é uma ramificação do papel machê, que não exige muito do artesão já que se trata apenas da colagem de papel sobre papel. Todo o material é facílimo de obter e ainda pode ajudar a reduzir o lixo em casa ou no escritório.

INSTRUTOR: BRUNO NUNES/ COLABORAÇÃO: DILMA TEIXEIRA (TÉCNICA EM GESTÃO CULTURAL – ARTES VISUAIS) / FOTOS E TEXTO: WALACE FERREIRA FEVEREIRO DE 2016

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1 4 7

Amassar o papel kraft 90g e rasgar em tiras

Envolver o papel no tubo de papelão de dentro para fora

Colar o fundo recortado com cola branca no tubo de papelão

2 5 8

Mergulhar as tiras de papel kraft em uma mistura de cola com água em um recipiente (a mesma medida para os líquidos)

Demarcar o fundo do papel kraft 400g com a circunferência do tubo de papelão

Passar a cola branca no corpo do tubo de papelão para impermeabilizá-lo.

3

Depois de mergulhar as tiras, envolvê-los no tubo de papel

6

Recorte o papel kraft 400g na área demarcada

9

Após a secagem, decorar o tubo com o barbante ou materiais alternativos. Seu porta-treco está pronto!

Para saber mais Quem quiser conhecer mais sobre técnicas artísticas pode se inscrever nas oficinas da Fundação Curro Velho, do governo do Estado do

Pará. Crianças a partir de 12 anos podem participar. A Fundação Curro Velho fica localizada na rua Professor Nelson Ribeiro, nº 287, esquina com a travessa Djalma Dutra, bairro do Telégrafo. Telefones: (91) 3184-9100 e 3184-9109. 64 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2016

RECORTE AQUI

ATENÇÃO: Essa atividade pode ser feita por crianças, desde que acompanhadas por um adulto responsável

FAÇA VOCÊ MESMO


LEONARDO NUNES

BOA HISTÓRIA

Coristas

As velhas de véu cantavam de olhos fechados em uma afinação perfeita que

até elas mesmas, no fundo do transe a qual estavam submetidas, surpreenderam-se. Em outros dias, eram Marias, Franciscas, Conceições, Raimundas sem nenhum traço artístico evidente. Da linha e agulha, da enxada e arado, do sabão na pedra do rio, nenhuma usava a voz para ganhar o pão. No entanto, naquele dia, unidas numa dor que não era delas, descobriram sem querer que a ressonância de suas gargantas eram um espetáculo no meio daquele pedaço de nada em que viviam agregadas com mais, no máximo, cinco mil almas, à beira de um córrego límpido, ramificação do imenso Guamá, por trás de uma ilha escondida dos olhos da capital. Entraram pela noite cantando. Nunca foi de bom tom exagerar na cantoria nessas ocasiões. Mas, o caso é que, quando as velhinhas cessavam, a realidade ganhava um peso muito maior. As lágrimas transbordavam em

todos os cantos da pequena sala. Ouvia-se soluços sofríveis e toda gente quedava de cabeça baixa. Alguém, por essas observações nunca baseadas na razão e sim num sexto sentido aguçado, percebeu que o coro era um bálsamo para os corações partidos de saudade no ambiente funesto que se apresentava. No intervalo do cafezinho, contritas, elas ouviram ao pé do ouvido: cantem mais um pouquinho. Isso quando o Sol já estava se escondendo atrás das matas. A noite ia longe quando o repertório acabou. Não eram tantos cânticos assim, afinal. Já sem cerimônia, alguém pediu para repetir as mais conhecidas. Elas se entreolharam, enternecidas e vaidosas com o pedido. E começaram mais um “segura na mão de Deus e vai...”. E o recinto foi tomado pela energia possante e sincronizadas daquelas vozes nasais e agudas que, se isoladas, jamais seriam nem de perto sucesso de pública e crítica, privilégio que agora gozavam. Porém, em coro, eram imbatíveis pela beleza e pelo alívio que tra-

ziam aos maltratados entes que perdiam um dos seus inoportunamente, como ocorre quase sempre, uma vez que a hora derradeira nunca é oportuna para ninguém. Na manhã seguinte, na despedida final, estavam elas no campo santo. Embora com os rostos cansados, agora com vestidos mais dignos ainda e de melhor caimento, afinal, foram assunto vivo nos cafés da manhã do lugarejo. Foram mais faladas até que a passagem do compadre Clodomiro, homem querido que se foi cedo demais. A pedidos, elas entoaram mais um hino assim que a última pá de terra foi posta sobre o esquife. Palmas explodiram abafando os murmúrios da perda e ninguém soube se era pela vida que se findava ou pela grandiloquência vocal das coristas. Voltaram para casa de mãos dadas pelas ruas de terra do lugar onde nasceram e cresceram, alvo de olhares curiosos. Também, sem combinar nada, sorriam por dentro já pensando no repertório de um próximo velório possível. FEVEREIRO DE 2016

Anderson Araújo

é jornalista e escritor

• REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 65


NOVOS CAMINHOS

o dilema das hidrelétricas O potencial hidrelétrico do Pará passou a fazer parte

THIAGO BARROS

é jornalista, mestre em Planejamento do Desenvolvimento Sustentável (NAEA-UFPA) e professor da Universidade da Amazônia @thiagoabarros

ções de vários setores já se organizam para que os problemas registrados na

dos planos governamentais com mais

construção de Belo Monte não se repitam

intensidade nos mandatos de Lula,

na planejada usina de São Luiz do Tapa-

diante da previsão de crescimento eco-

jós, que deverá ser licitada neste ano.

nômico do país de 5% ao ano, no início

São Luiz faz parte de um conjunto de

dos 2000. Produzir energia seria essen-

hidrelétricas que poderão ser levanta-

cial para garantir o arranco e suprir a

das no leito do Tapajós. Para o governo

demanda por abastecimento de unida-

federal, o empreendimento é funda-

des residenciais – a previsão para 2017

mental para a ampliação da oferta de

é de que sejam mais de 63,2 milhões em

energia no Brasil. O projeto de licencia-

todo o Brasil.

mento travou no componente indígena

Diante deste cenário, a hidrelétrica

– 12 mil mundurukus vivem às proximi-

de Belo Monte, no rio Xingu, seria a so-

dades – e estudos recentes apontam que

lução. Quinze anos depois, com duas hi-

a construção da usina é inviável. Segun-

drelétricas construídas no rio Madeira,

do a ONG Greenpeace, o EIA-Rima tem

em Rondônia – Jirau e Santo Antônio –, e

falhas graves e não contempla o espec-

com Belo Monte enchendo os primeiros

tro real dos impactos na região.

reservatórios, o Brasil está mergulhado na

É importante analisar os casos iso-

recessão. Ainda assim, o planejamento es-

lados como o de Belo Monte e de São

tratégico para o setor energético mantém

Luiz do Tapajós, mas ainda não ganhou

a toque de caixa o processo para imple-

espaço devido na agenda de discussões

mentação de usinas na região do Tapajós.

públicas o possível impacto conjunto

Os principais rios paraenses já in-

das hidrelétricas instaladas nos princi-

ventariados têm potencial para gerar

pais afluentes da margem direita do rio

38,2 mil megawatts (MW). Além de Belo

Amazonas. Se o planejamento do gover-

Monte, o componente energia elétrica

no for executado, praticamente todos os

do Programa de Aceleração do Cresci-

grandes rios da Bacia Amazônica vão

mento (PAC) previa, no tempo de di-

abrigar barragens. O argumento da Ele-

nheiro farto, o funcionamento de pelo

trobras é de que nem 10% do potencial

menos mais seis hidrelétricas de porte

hidrelétrico da Amazônia – cerca de 111

médio e grande no Estado até 2018. O

mil MW – são explorados.

cronograma atrasou, mas o planeja-

Para segmentos do governo federal e

mento segue ativado. Mas, segundo

setores industrial e produtivo, é o Eldora-

especialistas, a manutenção do atual

do da energia limpa que poderá salvar o

modelo de desenvolvimento poderá ser

Brasil de novos apagões e garantir o cres-

desastrosa para a região.

cimento do País com uma economia de

De acordo com o Sistema de Infor-

petróleo sem precedentes - assim, com

mações do Potencial Hidrelétrico Bra-

redução drástica da emissão de gases

sileiro (Sipot), o foco da Eletrobras para

do efeito estufa. É o discurso. Na prática,

estudos de viabilidade e inventário está

cada nova usina instalada tem provoca-

nos rios Itacaiúnas, Tapajós, Jamanxim,

do impactos previstos por especialistas

Trombetas e Paru do Oeste. Organiza-

– e que poderiam ter sido resolvidos.

66 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2016

“O projeto de licenciamento travou no componente indígena – 12 mil mundurukus vivem às proximidades – e estudos recentes apontam que a construção da usina é inviável”


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