Revista Amazônia Viva ed. 56 / abril de 2016

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REVISTA ENCARTADA NO JORNAL O LIBERAL. NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE.

ABRIL 2O16 | EDIÇÃO NO 56 ANO 5 | ISSN 2237-2962

RECICLAGEM QUANDO O LIXO VIRA FONTE DE RENDA

Associações e cooperativas geram trabalho para catadores que fazem a coleta seletiva de produtos reaproveitados em centros de tratamento em Belém

MEIO AMBIENTE

Projeto Territórios Sustentáveis ajuda municípios do interior paraense

ZONA RURAL

Embrapa Amazônia Rural orienta agricultores a serem mais produtivos

NUTRIÇÃO

Universitários pesquisam formas de como evitar o desperdício de alimentos


Jovens de Belém em concerto Os meninos e meninas da Orquestra Jovem Vale Música voltam a se apresentar em homenagem aos 400 anos da capital paraense. Os concertos integram o projeto Sons da Amazônia patrocinado pela Vale e Ministério da Cultura. Venha conferir o talento de jovens da rede pública de ensino de Belém, beneficiados pelo Vale Música. A iniciativa promove o ensino da música, permitindo a profissionalização dos participantes e gerando uma alternativa de renda por meio da música.

Participe dos próximos concertos da Orquestra Jovem Vale Música Data: 1° de maio, domingo. Hora: 18h. Local: Arte Doce Hall – Sala Augusto Meira Filho.

Data: 4/06, sábado. Hora: 20h.

Av. Gov. Magalhães Barata, 1012.

Local: Theatro da Paz.

Entrada Franca

Entrada Franca


EKO

Foto: Fernando Sette

Patrocínio

Realização


EDITORIAL

PUBLICAÇÃO MENSAL DELTA PUBLICIDADE - RM GRAPH EDITORA ABRIL 2016 / EDIÇÃO Nº 56 ANO 5 ISSN 2237-2962 Presidente LUCIDÉA BATISTA MAIORANA Presidente Executivo ROMULO MAIORANA JR. Diretor Jurídico RONALDO MAIORANA Diretora Administrativa ROSÂNGELA MAIORANA KZAM Diretora Comercial ROSEMARY MAIORANA Diretor Industrial JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO Diretor de Marketing GUARANY JÚNIOR Diretor JOSÉ LUIZ SÁ PEREIRA Conselho editorial RONALDO MAIORANA JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO GUARANY JÚNIOR LÁZARO MORAES CARLOS BORGES

O lixo tem gerado emprego e renda de famílias em Belém

Ainda sobre o lixo

FELIPE MELO Editor-chefe

A reciclagem é um tema recorrente na revista Amazônia Viva. É um assunto que não se esgota e está em constante renovação por ainda ser um desafio social deste século. Na reportagem de capa, que começa na página 40, mostramos as novidades sobre o tratamento adequado do lixo em Belém e como famílias inteiras têm garantido sua renda mensal com o dinheiro proveniente da venda de produtos descartados no dia a dia. Junto com a oportunidade de trabalho cresce também a conscientização ambiental, chamando a atenção para importância da conservação de uma cidade limpa, o que gera mais saúde e bem-estar aos seus habitantes. Uma iniciativa da prefeitura municipal em parceria com cooperativas tem mudado a for-

4 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

ABRIL DE 2016

RENOVAR

ma de fazer coleta seletiva em Belém. No esquema do “porta a porta”, uma promissora experiência de recolhimento de lixo caseiro no bairro de Nazaré desponta como alternativa eficaz para sanar o problema do lixo descartado de forma incorreta na cidade. A tendência é que a ação se estenda para os demais bairros da capital. E falando em evitar o desperdício, nesta edição também vamos mostrar as pesquisas dos alunos do curso de Tecnologia de Alimentos, da Universidade do Estado do Pará, que estudam novas formas de reaproveitamento de sobras de comidas, reinventando receitas e complementos alimentares para o bem geral dos consumidores e até mesmo de pacientes com doenças, como o diabetes. Boa leitura.

REDAÇÃO Jornalista responsável e editor-chefe FELIPE JORGE DE MELO (SRTE-PA 1769) Coordenação geral LUCIANA SARMANHO Editor de arte FILIPE ALVES SANCHES (SRTE-PA 2196) Pesquisador e consultor técnico INOCÊNCIO GORAYEB Colaboraram para esta edição O Liberal, Agência Pará de Notícias, Agência Brasil, Museu Paraense Emílio Goeldi, Universidade Federal do Pará, Universidade do Estado do Pará, Embrapa Amazônia Oriental, Fundação Cultural do Pará - Oficinas do Curro Velho (acervo); Alan Bordallo, Ana Paula Mesquita, Camila Santos, Victor Furtado (reportagem); Fabrício Queiroz (produção); Carlos Borges, Fernando Sette, Roberta Brandão, Tarso Sarraf (fotos); Anderson Araújo, Thiago Barros e Walace Gomes Leal (artigos) André Abreu, J.Bosco, Jocelyn Alencar, Leonardo Nunes e Waldez Duarte (ilustrações); Alexsandro Santos (tratamento de imagem). FOTO DA CAPA Reciclagem do lixo, por Carlos Borges AMAZÔNIA VIVA é editada por Delta Publicidade/ RM Graph Ltda. CNPJ (MF) 03.547.690/0001-91. Nire: 15.2.007.1152-3 Inscrição estadual: 158.028-9. Avenida Romulo Maiorana, 2473, Marco - Belém - Pará.

amazoniaviva@orm.com.br

PRODUÇÃO

REALIZAÇÃO


NESTA EDIÇÃO

EDIÇÃO Nº 56 / ANO 5

36

A rentabilidade do lixo doméstico Catadores de materiais recicláveis, cadastrados em associações de Belém, estão mudando as próprias vidas através do trabalho, além de ajudarem a manter a cidade limpa CAPA

GASTRONOMIA Estudantes do curso de

FERNANDO SETTE

44

RONALDO ROSA/ EMBRAPA

NAILANA PEREIRA / ASCOM UEPA

TEREZA E ARYANNE FOTOGRAFIA

32

E MAIS

52 48 FEMININO

A artista plástica Elieni

GESTÃO

Tecnologia de Alimentos,

PRODUÇÃO

Tenório expressa em seu

Jakeline Pereira, do

da Universidade do esta-

A Embrapa Amazônia

trabalho o corpo, a alma

Programa Territórios

do do Pará, descobrem

Oriental desenvolve

e o universo feminino.

Sustentáveis, diz que a

novos usos dos frutos

linhas de defesa do siste-

Sua obra retrata a liber-

iniciativa incentiva empre-

amazônicos para evitar o

ma Integração Lavoura-

tação de valores, desejos

endimentos sociais nas

desperdício de alimentos

-Pecuária-Floresta com

e pensamentos acerca da

comunidades em áreas de

e melhorar a saúde dos

o objetivo de ajudar

mulher. Elieni é conheci-

mineração, no Pará.

consumidores.

produtores.

da no Brasil e exterior.

ENTREVISTA

EDUCAÇÃO

SUSTENTABILIDADE

PAPO DE ARTISTA

4 6 7 11 13 14 15 16 17 18 19 19 20 22 60 62 63 65 66

EDITORIAl AS MAIS CURTIDAS PRIMEIRO FOCO TRÊS QUESTÕES ELES SE ACHAM FATO REGISTRADO PERGUNTA-SE EU DISSE APPLICATIVOS CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE DESENHOS NATURALISTAS CONCEITOS AMAZÔNICOS ARTIGO OLHARES NATIVOS MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS AGENDA FAÇA VOCÊ MESMO BOA HISTÓRIA NOVOS CAMINHOS

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CARLOS BORGES

ABRIL2016


ASMAISCURTIDAS DESTAQUES DAS EDIÇÕES ANTERIORES

ANDRÉ DIB / INSTITUTO MAMIRAUÁ

PIRARUCU Parabéns pela matéria sobre o pirarucu na edição passada (“Gigante vermelho”, Capa, março de 2016, edição nº 55). Lindíssima. Eu, como paraense, morri de orgulho da nossa imprensa valorizando os tesouros das nossas águas. Hellen Cristina Almeida Gestão da Implementação e Programação da Transferência de Tecnologia -Embrapa Pesca e Aquicultura. Palmas - Tocantins

POR FAVOR, SALVEM OS PIRARUCUS DA AMAZÔNIA!

A reportagem sobre a proteção e a conservação do “peixe gigante” na região foi a mais comentada, curtida e compartilhada da edição passada em nosso Facebook.

Em todo esse tempo em que acompanho as edições da Amazônia Viva, que são sempre excelentes, a capa do mês de março, com o caboclo

TARSO SARRAF

carregando o enorme pirarucu nas costas, foi a mais bonita de todas, o que confirma a qualidade editorial da publicação. Margareth Menezes Belém-Pará O trabalho sério de proteção do pirarucu garante a sobrevivência da fauna aquática de nossa região. Parabéns. Sérgio Farias Belém-Pará Os programas de proteção do pirarucu e de outras espécies são

O MAIOR DOS MERCADOS AO NORTE DO PAÍS

A foto com o maior número de curtidas em nosso Instagram foi esta do Ver-o-Peso, que no mês passado completou 389 anos de fundação. Um ícone de Belém e do Brasil.

importantes para tirar os animais da Amazônia da lista de extinção. O governo precisa investir mais nessa iniciativa, principalmente para proteger um dos maiores símbolos de nossa região.

fb.com/amazoniavivarevista

RICARDO OLIVEIRA / INSTITUTO MAMIRAUÁ

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Manoel Sobral Ananindeua-Pará Para se corresponder com a redação da Amazônia Viva envie comentários, dúvidas, críticas e sugestões para o email amazoniaviva@orm.com.br ou escreva

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para o endereço: Avenida Romulo USE UM LEITOR DE QR CODE PARA ACESSAR A EDIÇÃO DIGITAL DE MARÇO

Maiorana, 2473, Marco, Belém - Pará, CEP 66 093-000 ou FAX: 3216-1143.


CARLOS SODRÉ / AGÊNCIA PARÁ

PRIMEIROFOCO

O QUE É NOTÍCIA NA AMAZÔNIA

Terra dos cinemas alternativos BELÉM POSSUI IMPORTANTES - E HISTÓRICAS - SALAS DE PROJEÇÃO PARA QUEM QUER FUGIR DO CIRCUITO COMERCIAL PÁGINA 8 E 9

ALIMENTO

PROTEÇÃO

Pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas descobre que sementes de seringueira não possuem glúten. PÁG.11

Aves ameaçadas de extinção ganharão a proteção de famílias de baixa renda com o incentivo da Bolsa Verde, do governo federal. PÁG.15

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PRIMEIRO FOCO

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DIVULGAÇÃO

CASAS DA SÉTIMA ARTE

Salas de projeção, como o Cine Estação, que funciona no Teatro Maria Sylvia Nunes, agregam um público que busca filmes alternativos. Obras cinematográficas, como “A Garota Dinamarquesa” (acima) e “Blue Jasmine”, foram exibidas no circuito “cult” de Belém.

DIVULGAÇÃO

Enquanto cinemas comerciais de Belém ofereciam vários horários com “Star Wars Episódio VII - O Despertar da Força”, o Cine Teatro Líbero Luxardo exibia “Carol”, um romance com cinco indicações ao Globo de Ouro e seis ao Oscar. Não que Carol fosse mais relevante, mas ação e ficção científica não agradam a todos. Depois, o Líbero Luxardo comprou uma briga pelas redes sociais com a Sony Pictures para exibir outro indicado ao Oscar: “A Garota Dinamarquesa”, que por meses não chegou ao circuito comercial local. Com a mobilização, o Líbero Luxardo exibiu o filme e logo o circuito comercial, com poucos horários, fez a exibição. A jornalista Dedé Mesquita, membro da Associação de Críticos de Cinema do Pará (ACCPA), destaca que os cinemas alternativos de Belém oferecem programação de qualidade e com preços acessíveis, quando não gratuitas. “O Líbero está com um projeto digital novinho, o que garante uma projeção muito boa e um ótimo som. É um espaço com 86 lugares e boa refrigeração. A programação é muito boa, com o melhor do cinema alternativo”, diz. “O Cine Estação é outra sala que está com um projeto digital novo. Refrigeração muito boa e ótima programação. É um espaço com cerca de 400 lugares e bem confortável”, completa. O Cine Teatro Líbero Luxardo foi inaugurado em 1986 e ganhou o nome do cineasta, político, escritor e um dos pioneiros da fotografia e cinematografia do Brasil, iniciando a projeção de longas-metragens no Pará e na região central do Brasil. Já o Cine Olympia é o cinema mais antigo em operação no Brasil, inaugurado em 24 de abril de 1912. Sempre foi

GERALDO RAMOS / ASCOM OS PARA 2000

Programação diferenciada


AKIRA ONUMA / ARQUIVO O LIBERAL

CINE TEATRO

No Líbero Luxardo, do Centur, agora possui um projetor digital, o que melhorou a exibição dos filmes

um espaço cultural com atividades diversas, protegido pelo esforço da população. A programação do Olympia se destina a clássicos do cinema, filmes históricos, produção independente e festivais. Há atividades com escolas municipais e estaduais. “Apesar da importância histórica – 104 anos ininterruptos, a sala carece de reparos na projeção, que está exibindo apenas filmes em DVD ou Blu-Ray, e na refrigeração. A programação é de alta qualidade e de graça, já que é subsidiada pela Prefeitura de Belém”, diz Dedé. O Cine Sesc e o Cine CCBEU exibem filmes alternativos e comerciais de graça. Recentemente, o Sesc exibiu a animação brasileira “O Menino e o Mun-

do”, indicado ao Oscar de melhor animação. “O melhor do CCBEU é o tamanho e o conforto. A programação é boa, mas privilegia filmes pouco conhecidos e novas cinematografias “, comenta Dedé Mesquita. Na Estação das Docas, o Cine Estação funciona no teatro Maria Sylvia Nunes. O espaço foi criado em 2002, com o nome da dramaturga e professora fundadora da Escola de Teatro e Dança da Universidade Federal do Pará (UFPA). “A ACCPA faz programações em salas como o Cineclube Alexandrino Moreira (que funciona no auditório do antigo IAP), no Líbero Luxardo, na UEPA e na Casa da Linguagem. A programação é de altíssima

qualidade e de graça”, destaca a jornalista. Sobre a polêmica de “A Garota Dinamarquesa”, Dedé diz que o problema foi distribuição. “A questão não foi o Líbero Luxardo não exibi-lo. Existem as grande distribuidoras, como Warner, Universal, Fox e outras. Elas precisam ter salas para a exibição, o que não acontece quando estão em cartaz filmes de maior bilheteria. Por isso ‘A Garota Dinamarquesa’ chegou aqui depois do lançamento nacional. Não foi preconceito, homofobia ou outra coisa. Mas é importante que as pessoas se mobilizem por bons filmes como foi com ‘Blue Jasmine’, ‘Ninfomaníaca I e II’, ‘Pina’ e ‘Hoje Eu Quero Voltar Sozinho’”, afirma. ABRIL DE 2016

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PRIMEIRO FOCO DENATFRUT / WIKIMEDIA

EM 2024

Brasil vai triplicar a produção de energia A capacidade de geração de energia eólica (foto acima) no Brasil deverá passar dos atuais 8,7 mil megawatts (MW) para 24 mil MW nos próximos oito anos. A estimativa do governo, que consta no Plano Decenal de Expansão de Energia, é que em 2024 o parque eólico brasileiro deverá responder por 11,5% de toda a energia gerada pelo país. Até o fim de 2016, a capacidade instalada deve chegar a 11 mil MW, segundo projeções da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeolica). A energia produzida com a força dos ventos é a que apresenta o maior crescimento no país. No ano passado, foram inauguradas mais de 100 usinas eólicas no país, com investimentos de

R$ 19,2 bilhões. Atualmente, existem 349 usinas eólicas instaladas no Brasil, a maioria na região Nordeste. Segundo a presidente da Abeeolica, Elbia Gannoum, a energia eólica no Brasil é algo novo e a indústria foi sendo construída com bases sólidas. Hoje, o recurso eólico no país é um dos melhores do mundo. “Ao entender e saber explorar esse recurso nós colocamos a eólica em uma situação de vantagem comparativa e competitiva muito grande”, disse. Um dos obstáculos para o crescimento do setor, há alguns anos, era o custo de geração da usina eólica. Hoje esse cenário mudou e ela é a segunda fonte de energia mais barata, atrás apenas da energia hidrelétrica.

PA U - R O S A

REFLORESTAMENTO Integrar espécies de plantas de pastagens junto às mudas de pau-rosa para contribuir com a redução do desmatamento na Amazônia. Esse é o objetivo da pesquisa de Emanuel Orestes da Silveira. O estudo, que recebe o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), deve ser concluído em 2018 e beneficiará, ainda, os produtores rurais com o incremento da exploração silvícola e a produção animal. A ideia é encontrar alternativas que resultem um sistema mais sustentável e que melhore a renda produtores locais. “Queremos integrar espécies de plantas de pastagens melhoradas juntamente ao sistema arbóreo em uma mesma área”, adianta Silveira.

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TRÊSQUESTÕES

NUTRIÇÃO

RESPOSTAS QUE VÃO DIRETO AO PONTO

Semente da seringueira são isentas de glúten

O jornalista Antônio Carlos Pimentel Jr. é professor adjunto do curso de Jornalismo

foi desenvolvido com apoio do governo do Amazonas por meio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) e do Programa Sinapse de Inovação. A semente da seringueira, segundo o pesquisador, é muito desperdiçada na região amazônica. Dar destino a essas sementes, utilizando-as na produção de suplementos, seria uma saída para a geração de novos empregos para a população amazonense. Santos explica que, através de uma parceria com a Embrapa, será possível gerar mão de obra para a coleta de sementes. Além disso, será preciso contratar pessoas para o processo de industrialização, gerando emprego e renda no Amazonas.

da Universidade da Amazônia (Unama) e lançou o livro “Os quês e o porquê”, no qual propõe uma reflexão para estudantes, profissionais e consumidores de notícias em geral. São histórias que moldaram o profissional que passou por praticamente todas as funções - de repórter a editor executivo - e o mestre, refletindo as várias transformações do mercado da comunicação nos últimos anos. O livro destina-se a qualquer pessoa que consuma notícias? O livro tem esse tom de conversa. Não é um trabalho de formato acadêmico, embora apresente muitas referências teóricas. ERICO XAVIER / AGÊNCIA FAPEAM

Trata de práticas e narrativas jornalísticas da atualidade, da apresentação de notícias pela mídia tradicional (jornais impressos, revistas, TV) e do universo das redes (internet), e propõe uma reflexão crítica sobre o jornalismo. Pode ser lido por qualquer pessoa que acompanhe noticiário e que se interesse por comunicação. Escrever um livro foi mais difícil do que as matérias do seu tempo de repórter? São trabalhos diferentes. A produção de reportagens e notícias tem pressa. Exige o domínio de habilidades e técnicas específicas do jornalismo. O livro caminha serenamente, e permite uma elaboração textual mais cuidadosa. Nos dois casos, estão princípios dos quais não podemos nos afastar: ética, responsabilidade, honestidade e o bom uso da língua. Que reflexão o senhor propõe aos leitores

SAUDÁVEL

A semente de seringueira é uma excelente fonte de vitaminas, proteínas e livre de gorduras ou conservantes

a respeito do jornalismo brasileiro? Ele vive uma crise de credibilidade. Isso é ruim para os jornalistas e para o negócio

HERBÁRIO

DIVERSIDADE VEGETAL

jornalístico. Temos que reinventar essa profissão, com as adaptações necessárias

A Amazônia possui uma riqueza gigantesca de espécies. O Herbário Dra. Marlene Freitas da

às novas tecnologias, recompondo gêneros

Silva, da Universidade do Estado do Pará (Uepa), promove desde sua criação, em 2011, a

(informação é informação, opinião é opinião),

documentação de amostras de plantas desidratadas. Toda essa diversidade vegetal pode

valorizando-a, sempre, como um instrumento

ser conferida através do herbário virtual da universidade, que disponibiliza a comunidade

de confirmação da democracia.

o acesso ao rico banco de dados, que já é composto por mais de 5.000 amostras. ABRIL DE 2016

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EUNICE PINTO / ARQUIVO PESSOAL

A semente de seringueira, espécie abundante na Amazônia, ganha nova importância ao ser utilizada na produção de suplemento alimentar no Amazonas. A descoberta foi feita através de uma pesquisa, que verificou que o produto é uma excelente fonte de vitaminas, proteínas, além de não conter glúten, gorduras ou conservantes. “Qualquer pessoa que tenha diabetes e pressão alta pode tomar o suplemento por não conter sódio nem açúcar, portanto, o maior benefício que ele traz para a saúde é a reposição de vitaminas e nutrientes, tudo que o organismo perde no dia a dia”, explicou Antônio Lúcio dos Santos, um dos pesquisadores do projeto. O trabalho

Histórias e lições de um jornalista professor


PRIMEIRO FOCO

SCIENCE

FLORESTA AMAZÔNICA A revista Science publicou recentemente um estudo em que a protagonista é a Amazônia. Descobriu-se que a Floresta Amazônica relaciona-se com o clima de forma diferente das florestas de regiões frias – o ritmo de crescimento aumenta justamente no auge da seca. Isso acontece porque é nesse período que a maioria das ár vores passa por um processo de troca de folhas, mas, diferente das ár vores de clima frio, as da floresta amazônica não ficam peladas para depois produzirem folhas novas – as novas brotam enquanto as velhas são derrubadas. Esse processo de troca faz com que a floresta cresça em ritmo acelerado.

AC E RVO

PEIXES

Instituto Nacional de Pesquisas da

CULTURA

Projeto da Uepa incentiva a formação socioambiental

O projeto “Trilhas Culturais e Sustentabilidade na Formação de Agentes Ambientais nas Escolas de Belém” chegou à capital no mês de março, depois de fazer sucesso em Barcarena. Mais de 100 crianças e adolescentes entre 12 e 16 anos são atendidas pelo projeto, que oferece aulas de violão, teatro, flauta, dança e artes através do trabalho de voluntários, alunos e servidores da Universidade do Estado do Pará (Uepa). A coordenação é da professora Ana Telma Monteiro. Segundo ela, um dos objetivos do projeto é o de ocupar o tempo ocioso dos alunos com atividades produtivas, que possam até vir a ser desenvolvidas de forma profissio-

nal. Outra preocupação do projeto é incluir nas oficinas aulas sobre a história da cidade e do bairro em que essas crianças e adolescentes habitam. Além disso, o programa conta com visitas guiadas a pontos turísticos da cidade. “Estamos formando agentes, para que atuem como multiplicadores de conhecimento e desenvolvam uma identificação com o seu entorno”, explicou Ana Telma. Todo o trabalho só poderia ser feito através da ajuda de voluntários, alunos e servidores da Uepa. Para eles, as principais motivações são a empolgação e os bons resultados no desempenho escolar dos alunos.

Amazônia (Inpa) comemora o avanço na informatização da Coleção de Peixes, que reúne um acer vo de 364 mil exemplares coletados em 30 anos. Trata-se da maior coleção de peixes amazônicos. Dos mais de 50 mil lotes, 85% já estão digitalizados. O objetivo é atualizar as buscas automaticamente, por meio do banco de dados do ser vidor da Sociedade Brasileira de Ictiologia (SBI).

ANÁLISE

MUDANÇAS CLIMÁTICAS Que as mudanças climáticas são um problema global, todos já sabem. Porém, recentemente foi descober to, através de um estudo publicado na revista Nature, que a Floresta Amazônica e a Caatinga estão entre os ecossistemas mais vulneráveis a essas mudanças. O estudo, que descreve um novo método de avaliar a sensibilidade de diferentes áreas do mundo às alterações do clima, pode de proteger as áreas mais ameaçadas. Para as análises, os pesquisadores responsáveis utilizaram imagens obtidas pelo satélite MODIS, da NASA . 12 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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APRENDIZADO

Jovens participam do “Trilhas Culturais e Sustentabilidade na Formação de Agentes Ambientais nas Escolas de Belém”

NAILANA THIELY / ASCOM UEPA

representar uma ferramenta na tentativa


ELESSEACHAM POR QUE MIMETISMO É UMA COISA NATURAL

VIDEOGAME

Índios Kaxinawá criam jogo sobre a própria cultura Já imaginou um videogame em que o cenário é a Floresta Amazônica? Pois o projeto, que está prestes a ser lançado, existe e foi elaborado em conjunto por antropólogos, programadores visuais e integrantes do povo Kaxinawá – ou Huni kuin, como se autodenominam. O game “Huni Kuin: os Caminhos da Jiboia” terá cinco fases e em cada uma o jogador aprenderá um pouco sobre um mito tradicional da etnia. Cerca de 45 Kaxinawás participaram do projeto. “Decidimos com eles o roteiro e as histórias. Eles desenharam os protótipos, gravaram as músicas e os efeitos sonoros. Os pajés narraram as histórias”,

disse Guilherme Meneses, antropólogo da Universidade de São Paulo (USP) e idealizador do projeto. A pesquisa durou seis meses e, depois disso, quase três anos até que o jogo fosse concluído. A experiência na aldeia São Joaquim/Centro de Memórias durou quatro meses. Foi o período em que foram feitas oficinas de audiovisual e produção de conteúdo. “A questão da tecnologia é uma transformação na aldeia. É uma demanda deles entrar em contato com nossas cidades, de conseguir trabalho, projetos e visibilidade dentro do cenário nacional”, disse Meneses. A previsão é que o game esteja disponível a partir deste mês.

Sobrevivência de ponta-cabeça

Esta é a borboleta de nome Colobura HUNI KUIN / DIVULGAÇÃO

dirse (Linnaeus, 1758) da família Nymphalidae, presente em toda a América do Sul e México. Ela absorve a umidade viscosa (exsudata) de musgos, troncos de árvores, frutos fermentados e até de excrementos. Suas larvas crescem se alimentando de folhas de algumas espécies de embaúbas (Cecropia spp.). Apresentam uma camuflagem em forma de fissuras (disruptiva). Tem o corpo com listras em vários sentidos e um dos feixes aponta na direção de um falso olho na parte posterior das asas, confundindo os predadores, geralmente pássaros. Esse artifício muitas vezes salva a vida das borboletas – elas

CONHECIMENTO

O videojogo “Huni Kuin: os Caminhos da Jiboia” foi elaborado com a participação dos próprios indígenas

pousam sempre de cabeça para baixo e os predadores atacam onde estão os falsos olhos e cortam um pedaço das

ESTUDO

asas, não atingindo o corpo. Assim,

Um estudo da rede internacional de pesquisa 2ndFOR concluiu que as florestas

seguir a vida e se reproduzir, mesmo

FLORESTAS SECUNDÁRIAS secundárias – formadas da regeneração de áreas desmatadas – podem ser eficientes na Emílio Goeldi, foi uma das responsáveis pelo trabalho, realizado em 45 pontos da América Latina. Segundo ela, a vegetação secundária não irá recuperar a biodiversidade, por isso,

que incompleta. Em Belém, nesta época do ano, podem ser avistadas próximas das mangueiras que estão produzindo frutos.

mais importante que preservar essas florestas é não desmatar as primárias. ABRIL DE 2016

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DIRSE / COLOBORA

redução das taxas de CO 2 na atmosfera. A pesquisadora Ima Vieira, do Museu Paraense

a borboleta tem mais uma chance de


FATO REGISTRADO

ACERVO MUSEU GOELDI

Equipes e excursão de campo O Museu Paraense Emílio Goeldi é um dos pontos mais conhecidos de Belém, além de referência em pesquisas e parte da memória afetiva do paraense. Ao longo de sua existência, muitas histórias certamente já foram compartilhadas ali, seja por quem visita o espaço ou pelas pessoas que fizeram ou fazem parte do grupo de pesquisadores e funcionários do museu. Equipes do Museu Paraense Emílio Goeldi, há 150 anos, excursionam pela região amazônica estudando a fauna, flora, as comunidades humanas antigas, atuais, as águas, solos, clima, a natureza pura e antropizada. 14 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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A foto em questão é apresentada como uma homenagem a esses 150 anos do Museu Goeldi. Trata-se de uma equipe de pesquisa jantando, na década de 60 do século passado, em alguma área silvestre da região. Nela estão, da esquerda para direita, o taxidermista Lério Gomes, o Henry Lorens, funcionário de apoio e motorista, o doutor Roger Arlé, pesquisador entomólogo especialista na ordem de insetos Collembola, e o técnico de entomologia Apolinário Azevedo de Souza, que adicionou muitos registros da fauna na coleção e cuidava com esmero da coleção entomológica.

A cena é interessante e é possível observar diversos objetos compondo a fotografia – sobre a mesa estão o petromax, iluminador a querosene, uma lupa de mão, tigelas esmaltadas, bule, bilha e as garrafas, dentre elas as de Guarasuco, refrigerante a base de guaraná que marcou uma época. O registro é também uma verdadeira homenagem aos pesquisadores e funcionários do Museu Goeldi, que sustentaram e sustentam a excelência da produção científica, a qualidade na manutenção e estudo dos acervos, e de conhecimentos difundidos para a sociedade. Que venham os próximos 150 anos – e muito mais.


PERGUNTA-SE POIS É PRECISO ESCLARECER MITOS E VERDADES OSWALDO FORTE

BOLSA VERDE

Famílias protegem aves ameaçadas de extinção A nona reunião do Comitê Gestor do Programa Bolsa Verde, do Ministério do Meio Ambiente, aprovou a criação de um grupo de trabalho para incluir no programa famílias em condições de extrema pobreza e que moram em áreas habitadas por animais ameaçados de extinção. “Entre as áreas que o Ministério pretende ter famílias beneficiadas está de Curaçá, na Bahia, onde será feita a soltura de ararinhas-azuis”, disse a diretora do Departamento de Extrativismo da pasta, Juliana Simões. O objetivo é tornar as famílias parceiras na proteção dos animais ameaçados em

extinção e prepará-las para a soltura de aves, já que o programa preza pela responsabilidade com o meio ambiente. A reintrodução dos animais no meio ambiente é uma iniciativa do Projeto Ararinha na Natureza, desenvolvido pelo ICMBio, órgão vinculado ao Ministério em parceria com a ONG alemã Associação para Conservação de Papagaios em Extinção (ACTP) e o Al Wabra Wildlife Preservation (AWWP), um criadouro particular localizado no deserto do Catar, entre outros parceiros.Até 2021, um grupo de 150 ararinhas-azuis passará a viver ali em liberdade.

Enrolar frutas em jornal acelera o amadurecimento? AGÊNCIA BRASIL

PROTEEÇÃO

Espécies ameaçadas de extinção, como a ararinha-azul, vão ganhar o zelo voluntário de famílias de baixa renda

D E S C O B E R TA

PECKIA VEROPESO Um grupo de pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) descobriu uma nova espécie de mosca, até então desconhecida. O nome escolhido para a nova espécie foi Peckia

É uma técnica antiga e que tem embasamento científico para funcionar. Frutas possuem hormônios, assim como outros seres vivos, que as faz amadurecer ou parar, como explica a mestre em Botânica Mônica Furtado, professora da Universidade da Amazônia (Unama). As frutas possuem tecidos que são ricos em gás etileno que é liberado naturalmente para atmosfera. Caso a fruta fique “abafada” em jornal - papel funciona melhor, mas outros materiais também servem - , o gás acelera a ação dos hormônios de desenvolvimento e a fruta realmente vai amadurecer mais rápido. “Dependendo do fruto, se tiver muita água, mais rápido ainda será o amadurecimento. O jornal ou plástico servem como isolante do gás etileno, que ficará acumulado. É uma técnica que funciona sim se a pessoa quiser ou precisar consumir determinado fruto bem rápido”, observa, Mônica, destacando que assim como a fruta amadurece mais rápido, também estragará mais rápido se esse isolamento não for desfeito logo. Outras formas de isolamento também poderão funcionar, como armários ou dentro do forno desligado.

veropeso , já que a coleta foi realizada na feira do Ver-o-Peso. A novidade foi publicada na revista Zootaxa, em janeiro. Agora, o grupo de pesquisa responsável pela descoberta pensa em seguir com os estudos, dando atenção à biologia do inseto. “A Sarcophagidae é uma família de importância médica veterinária, porque age como um vetor de endemias e outros tipos doenças. Então essa pesquisa serviria de auxílio para estudos forenses”, diz Caroline Souza,

MANDE A SUA PERGUNTA Envie perguntas instigantes sobre hábitos, costumes e fenômenos da região amazônica para o e-mail: amazoniaviva@orm.com.br

bolsista do Museu Goeldi. ABRIL DE 2016

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EU DISSE

“A capacidade de detectá-las tem o potencial de revolucionar a astronomia” Stephen Hawking, físico britânico ao

“O principal resultado deste teste é que temos um efeito da vacina em células infectadas pelo HIV. Nós ganhamos 70 anos de terapia tripla para os pacientes” Erwann Loret, pesquisador do Centro Nacional Para Pesquisa Científica da França (CNRS), sobre resultados preliminares de uma vacina experimental contra o HIV.

comentar as novas pesquisas sobre ondas gravitacionais, a

ainda precisava ser comprovada.

“Qual é o desafio? Descobrir qual será a tecnologia que vai pegar e que certamente terá uma pegada social maior. O setor privado precisa se estimular a desenvolver um mercado e o governo pode criar um ambiente para que esse produtor tenha a condição de suprir sua demanda” Guilherme Nastari, consultor da Datagro, uma das maiores consultorias agrícolas do mundo, durante a Campus Party, onde falou sobre o uso da tecnologia no agronegócio.

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“Sabemos que anos atrás era difícil escutar nossa música, mas aqui estamos tocando para vocês em sua linda terra. Penso que os tempos estão mudando. É verdade, não?” Mick Jagger, líder da banda Rolling Stones, durante show histórico em Havana, Cuba.

REPRODUÇÃO

de Albert Einstein que

ABC / ADAM TAYLOR / DIVULGAÇÃO

última previsão das teorias


DIVULGAÇÃO

APPLICATIVOS BOAS IDEIAS NUM TOQUE DE DEDOS

“Nós somos capazes de escolhas racionais. Arquemos com as consequências dessa capacidade, especialmente em relação àqueles seres que não têm voz e que jamais vão ser capazes de assumir a própria libertação”

Governo Digital App do Governo do Estado do Pará com vários serviços. Basta fazer um cadastro e

Rafael Bán Jacobsen, escritor, físico e ativista gaúcho em palestra intitulada “Quantos animais matei hoje?”, sobre direitos animais, no TEDxPassoFundo.

ajudar na solução de problemas diversos nas áreas de atuação da Cosanpa, Corpo de Bombeiros, Prodepa e Secretaria de

“Acho que até os climatologistas mais radicais estão olhando isso e dizendo: ‘Mas como é possível?”

Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas). Plataformas: iOS e Android Preço: Gratuito

David Carlson, diretor do Programa Mundial de Pesquisas Sobre o Clima da Organização Meteorológica Mundial, agência da Organização das Nações Unidas (ONU), a respeito do aumento de temperaturas em 2016.

Mãos no volante WIKIMEDIA

Um app de segurança no trânsito, desenvolvido pelo Ministério das Cidades, no qual o usuário programa um tempo médio de deslocamento e, nesse período, qualquer chamada recebida será cancelada automaticamente e respondida com uma mensagem personalizada ou padrão “Estou dirigindo no momento. Ligo mais tarde”. Plataforma: Android Preço: Gratuito

“O progresso tecnológico dos últimos anos nos permite ter uma série de alternativas à nossa disposição, todas excluindo práticas cruéis e desnecessárias contra animais. Minha empresa está dando um passo enorme, que reflete nossa crescente atenção aos problemas críticos do meio ambiente e dos animais” Giorgio Armani, estilista italiano, ao declarar o fim do uso de pele de animais em todas suas marcas e produtos.

Cobertura O nome é bem sugestivo para a função: avaliar a cobertura das operadoras de celular no Brasil. Num mapa são exibidas todas as antenas disponíveis de cada operadora e intensidade do sinal. Assim, é possível saber quais estão operacionais e qual a qualidade da cobertura. Plataformas: Android, Windows Phone e iOS Preço: Gratuito FONTES: PLAY STORE E ITUNES

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CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE

Sapo cunauaru e as crendices amazônicas

Cunauaru é o nome indígena dado à resina cheirosa expelida por um sapo, também chamado da mesma forma. O anfíbio é conhecido por construir uma pequena “panela de barro” no tronco da árvore do breu-branco ( Protium heptaphyllum (Aubl.) Marchand). Os pesquisadores herpetologistas do Museu Paraense Emílio Goeldi, Tereza Ávila Pires e Marinus Steven Hoogmoed, informam que este comportamento se assemelha ao sapo da espécie Phrynohyas resinifictrix (Goeldi, 1907). O animal possui coloração do verde ao verde-musgo, com manchas acinzentadas ou claras no dorso e nas patas. Possui muitas glândulas pequenas e bem visíveis no dorso e laterais do

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corpo, por onde secretam uma substância de aspecto lático, grudenta e pegajosa. Por conta disso é que o sapo cunauaru recebeu o apelido de sapo-grudento, como também é muito conhecido. A espécie é distribuída no Suriname, Guiana, Brasil, Equador, Colômbia, Bolívia, Peru, Guiana Francesa, e Venezuela. O sapo cunauaru apresenta algumas características próprias e preferências – eles são crepusculares, noturnos, arborícolas, preferem áreas sombreadas, bordas de matas em vegetação média e alta, perto de riachos e poças. Depositam seus ovos envolvidos em massa gelatinosa. Mas o que o pequeno sapo cunauaru e o caipora têm em comum? Calma, explica-se. Segundo

MARINUS HOOGMOED

a crendice popular da região amazônica, acredita-se que a seiva encontrada no ninho desta perereca, quando queimada, produz uma fumaça com propriedades de desfazer feitiços e “descaiaporar” qualquer um que cheire o perfume. Caipora é uma entidade da mitologia tupi-guarani que tem a missão de defender os animais. Representado por uma figura pequena, ágil e de cabelos vermelhos, o caipora vive montado em porco-do-mato e carrega uma vara. Guardião da vida animal nas f lorestas, arma ciladas para caçadores, desorientando-os e dando falsas pistas dos animais caçados. Ou seja, se algum dia alguém for enfeitiçado por aí, o pequeno cunauaru poderá ajudar.


DESENHOS NATURALISTAS

CONCEITOSAMAZÔNICOS O VOCABULÁRIO REGIONAL É UM PATRIMÔNIO

Sai de mim, caruara! O caboclo dizia a seu parceiro de pesca: “Parente, nem lhe conto. Nem posso trabalhar, fazer força, que logo bate aquela caruara”. O termo refere-se ao estado geral de indisposição, dores no corpo, mal estar, moleza, que as pessoas, frequentemente,

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Iconografias dos Munduruku de 1827

dos acometidos por malária, febres fracas de viroses, as fraquezas de hipoglicemia e falta de energia no organismo também são chamadas dessa forma, “caruara”. Na zona costeira comenta-se de entidades e pequenos seres que submetem as pessoas que frequentam suas praias ao estado de “caruara” e as fazem adormecer. A lenda do Curuara é mais uma entre muitas da mitologia indígena. Ele é um duende invisível que inspira muito medo às populações de lugares, geralmente em mata, capoeiras e caminhos de áreas rurais. O Curuara geralmente aparece nos quintais, nos caminhos para a roça e para buscar água. E atenção: é especialmente perigoso para mulheres menstruadas, que atraem, pelo seu cheiro, o caruara e sua mãe, que procuram “flechar” sua vítima. Aí já viu – os efeitos dessa flechada são dores no corpo e nas articulações, inchaços nas juntas e moleza generalizada. Pelas crendices, os homens não seriam atacados pelo duende.

WALDEZ

por se tratar de tribos sobre as quais não existiam representações gráficas. As figuras ilustram a tatuagem, pintura corporal, corte de cabelo, adorno auricular e os impecáveis adornos plumários. As figuras apresentadas são: 1) Índio Munduruku, aquarela e desenho do perfil feito em nanquim (pena); 2) Mostra o corte de cabelo – o crânio é raspado, exceto por um tufo circular no centro, junto à testa; este estilo é comum a homens e mulheres; 3) Mulher e criança Munduruku, baixo rio Tapajós; aquarela; 4) Tucháua, chefe Munduruku, em traje de festa, no esplendor de seus ornamentos plumários. Exibe uma coifa, um capuz revestido de plumagens vermelhas peitorais de araracanga (Ara macao) e um apêndice plumário de penas caudais do mutum (Crax sp.). Na junção da coifa com a cobre-nuca sobressaem penas amarelas de arara-canindé (Arararauna). Na mão, o cacique traz um cedro emplumado com várias camadas. Nos braços, pulsos, joelhos, tornozelos e cintura, utiliza vários pingentes. A tiracolo exibe uma série de bandoleiras feitas de rosetas de plumas vermelhas, amarelas e negras.

branto. Porém os sintomas de tremedeiras

ACERVO DE OBRAS RARAS DO MUSEU GOELDI / HERCULES FLORENSE

No período de 1821 e 1829 ocorreu a expedição de Gregory Ivanovitch Langsdorff ao Brasil. Ele foi um médico, botânico, zoólogo, antropólogo, filósofo e navegador alemão, que, com apoio da Rússia, viajou por Minas Gerais, São Paulo, Centro-Oeste e Amazônia. Para a expedição, foi contratada uma equipe formada por botânico, zoólogo, astrônomo, navegador e três artistas – desenhistas e pintores –, dentre eles Hercules Florense, francês que viveu no Brasil e que cobriu o trecho amazônico da expedição. Na ocasião, a equipe coletou rico material da fauna, flora e etnografia, que hoje está exposto nos museus da Academia de Ciência da União Soviética, em Leningrado. Porém, durante muito tempo, o material iconográfico da expedição permaneceu desaparecido. Foi somente um século depois, em 1930, que tal material foi descoberto nos porões do Museu Jardim Botânico de Leningrado. Ao todo são 368 aquarelas e desenhos que compõem um belo retrato do Brasil no século XIX, nos campos da arte e da ciência. As iconografias dei4 xadas por Florense dos Munduruku é de excepcional valor,

atribuem a feitiço, mau olhado ou que-

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ARTIGO

a relação entre zika e microcefalia Diversas doenças humanas são transmitidas por mosquitos. Pode-se mencionar

WALACE GOMES LEAL

Doutor em Neuropatologia Experimental e Professor Associado do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará

a malária, transmitida pelo mosquito Anopheles; a leishmaniose, pelo mosquito flebótomo ou palha e a dengue, o zika e a chikungunya, pelo mosquito Aedes aegypti, apesar do vírus Zika também ser transmitido para humanos pelas espécies A. albopictus e A. africanus. Nesses casos, o mosquito fêmea alberga o vírus e o inocula durante o ato de se alimentar de sangue, o qual é usado para a maturação dos seus ovos. No caso do vírus zika, a transmissão pode ocorrer também por ato sexual e, considerando a presença no vírus no sangue de pacientes infectados, possivelmente por transfusão sanguínea. Um estudo recente liderado pelo pesquisador Pedro Vasconcelos, do Instituto Evandro Chagas, no Pará, publicado na revista Science, sugere que o zika chegou ao Brasil em 2013 durante a Copa das Confederações, possivelmente em pessoas infectadas da Polinésia Francesa. No entanto, não se descarta que tal vírus tenha chegado ao Brasil durante a Copa do Mundo, no ano seguinte. Apesar da infecção pelo vírus zika ser assintomática ou apresentar sintomas leves em indivíduos adultos, mais preocupantes foram os relatos de um possível elo entre a infecção por este vírus e casos de diminuição do tamanho do encéfalo (microcefalia) em fetos e crianças recém-nascidas (neonatos). Cientistas no Brasil e nos Estados Unidos passaram a investigar, em laboratório, o possível elo entre a infecção pelo vírus zika e morte de neurônios do sistema nervoso em desenvolvimento.

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Os pesquisadores Hengli Tang (Universidade Estadual da Florida), Peng Jin (Departamento de Genética Médica da Escola de Medicina da Universidade Emory em Atlanta) e seus colegas utilizaram as chamadas “células tronco pluripotentes induzidas (CTPIs)” para gerar progenitores neurais humanos, ou seja, células precursoras que geram os neurônios adultos. As CTPIs são um tipo especial de célula-tronco, com propriedades similares às células-tronco embrionárias, aquelas presentes no embrião humano e de outras espécies, que podem ser geradas a partir de uma célula comum do corpo, ou, na linguagem técnica, somática. As células da pele, do rim, da bexiga e os fibroblastos são exemplos de células somáticas. Os pesquisadores americanos usaram uma técnica especial desenvolvida pelos ganhadores do prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em 2012, o japonês Shinya Yamanaka e o britânico John B Gurdon, que permite a transformação de células somáticas em CTPIs pela manipulação de, geralmente, quatro genes. Neste estudo, fibroblastos humanos foram transformados em CTPIs, as quais foram direcionadas no laboratório a se transformarem em progenitores neurais. Os progenitores neurais humanos foram postos em contato com uma linhagem específica do vírus zika (MR766) por três dias. Após este período, os pesquisadores visualizaram que o zika podia realmente infectar as células neurais humanas e, ainda mais importante, matá-las por apoptose, um tipo de morte celular programada, onde enzimas conhecidas como caspases degradam o conteúdo da

“O combate ao mosquito Aedes aegypti deve ser incessante. É fundamental que estudos futuros desenvolvam uma vacina contra o vírus zika”


FIBROBLASTOS

Células que constituem a base do tecido conjuntivo

CTPIs

Células-tronco pluripotentes induzidas

VÍRUS ZIKA

CTNs

Células-tronco neurais

MORTE CELULAR

Interrupção no ciclo celular Disregulação gênica

célula. Neste caso, a morte dos progenitores humanos foi visualizada por uma técnica de coloração chamada imunofluorescência dupla, em que o vírus e as células infectadas aparecem em cores diferentes, por exemplo, verde e vermelho. Os pesquisadores também mostraram que o vírus zika desregula a taxa de proliferação dos progenitores neurais humanos, ou seja, as células não se multiplicam direito e que as células infectadas podem liberar partículas virais, o que sugere que o vírus pode “escravizar” os progenitores neurais usando seu material genético para se reproduzir. Esses resultados foram publicados em fevereiro deste ano na importante revista Cell Stem Cell. Os neurocientistas Patricia Garcez e Stevens Rehen do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e também do Instituto D’Or de Pesquisa e Educação lideraram um grupo de pesquisadores que investigaram os efeitos da infecção pelo vírus zika em células tronco neurais (CTNs) derivadas de CTPIs, uma abordagem similar à utilizada pelos pesquisadores americanos. Este grupo de pesquisadores cultivou CTNs no laboratório e as infectaram experimentalmente com uma linhagem do ví-

rus zika. Vinte e quatro horas após a infecção experimental, o vírus foi detectado nas CTNS, fato este observado por microscopia eletrônica, um tipo de microscopia que permite aumentar a estrutura observada em mais de 50.000 vezes. Os pesquisadores brasileiros, diferente dos pesquisadores americanos, também investigaram os efeitos do zika em neuroesferas e organoides cerebrais, os chamados “pequenos cérebros”. Os brasileiros mostraram que o vírus altera o poder de multiplicação das células que formam as neuroesferas e induz morte das mesmas por apoptose. Os estudos descritos acima claramente sugerem que o vírus zika é capaz de infectar e matar células do sistema nervoso em desenvolvimento fortalecendo a sugestão que pode fazer o mesmo em fetos e neonatos humanos infectados. O combate ao mosquito Aedes aegypti deve ser incessante. É fundamental que estudos futuros desenvolvam uma vacina contra o vírus zika e que pesquisadores descubram os mecanismos pelos quais ele pode atravessar a barreira placentária que protege o feto e, definitivamente, estabelecer o elo causal entre a infecção e a morte das células neurais em desenvolvimento.

AKIRA ONUMA

NEURÔNIOS

Fibroblastos humanos foram transformados em cTPIs. Estas células geraram CTNs, as quais foram infectadas pelo vírus Zika. A infecção causou morte dos progenitores neurais, perda de proliferação e alterações gênicas (Adaptado de Hengli et al., 2016)

AKIRA ONUMA

ENTENDA

INVESTIGAÇÃO

Um estudo do Instituto Evandro Chagas, no Pará, sugere que o zika chegou ao Brasil em 2013 durante a Copa das Confederações, possivelmente em pessoas infectadas da Polinésia Francesa

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OLHARES NATIVOS

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A colheita no mar paraense Pescadores em mais um dia de trabalho na praia de Ajuruteua, Bragança, no nordeste do Pará. FOTO: TARSO SARRAF ABRIL DE 2016

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OLHARES NATIVOS

Vastidão verde Plantação de dendê, em Tomé-Açu, cortada pela longíqua estrada de chão FOTO: TARSO SARRAF

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O futebol A pelada no fim de tarde com os amigos em um terreno da Grande BelĂŠm. FOTO: OSWALDO FORTE


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Fim de expediente Depois de um dia de trabalho, a pequena cutia volta para casa no finalzinho de tarde FOTO: YAGO MENDONÇA DE ALMEIDA

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Vermelhou A beleza das araras-vermelhas e suas cores vivas e deslumbrantes FOTO: YAGO MENDONÇA DE ALMEIDA

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OLHARES NATIVOS

Alegria de viver O encanto da menina amazテエnica pelas pequenas descobertas do dia a dia. FOTO: LUIZ ARANHA

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Transporte A canoa espera solitária à beira de um rio amazônico qualquer FOTO: LUIZ ARANHA

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OLHARES NATIVOS

Para o alto A torre, o sino e a estátua: conjunto imponente da Basílica Santuário de Nazaré FOTO: SILVIA ATAIDE

Envie as suas fotos para a seção Olhares Nativos 30 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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Para participar da seção “Olhares Nativos” da revista Amazônia Viva basta enviar fotos com temática amazônica para o e-mail amazoniaviva@orm.com.br acompanhadas pelo nome completo do autor, número de identidade e uma breve informação sobre o contexto do registro fotográfico. As imagens devem ser autorais e com resolução de no mínimo 300 dpi. A publicação das fotos tem fins meramente de divulgação de trabalhos profissionais ou amadores, não implicando em qualquer tipo de remuneração aos autores. Participe!


OPINIÃO, IDENTIDADE, INICIATIVAS E SOLUÇÕES

Trabalho e limpeza

CATADORES DE LIXO DE BELÉM MUDAM A CARA DA CIDADE E GARANTEM A RENDA FAMILIAR ATRAVÉS DA COLETA SELETIVA

PÁGINA 36

SUSTENTABILIDADE

SEM DESPERDÍCIO

A gestora de equipe do programa Territórios Sustentáveis, Jakeline Pereira, fala sobre a iniciativa nas comunidades do interior do Estado. PÁG.32

Estudantes do curso de Tecnologia de Alimentos da Uepa pesquisam novas formas de reaproveitamento de frutas. PÁG.44

CARLOS BORGES

IDEIASVERDES


ENTREVISTA

C

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“Agentes sociais são a chave para o desenvolvimento” A GESTORA DE EQUIPE DO PROGRAMA TERRITÓRIOS SUSTENTÁVEIS, JAKELINE PEREIRA, AFIRMA QUE A INICIATIVA, QUE REÚNE ENTIDADES COMO O IMAZON, CONTRIBUI PARA UMA ESTRATÉGIA DE EMPREENDIMENTOS SOCIAIS NAS COMUNIDADES EM ÁREAS DE MINERAÇÃO

TEREZA E ARYANNE FOTOGRAFIA

omo elaborar e implementar estratégias de desenvolvimento sustentável na Amazônia, considerando toda sua complexa estrutura social, ambiental, econômica e política? Como garantir resultados de desenvolvimento positivos advindos de grandes empreendimentos no território, mesmo após a sua saída? Instigados com a questão, três organizações da sociedade civil de interesse público decidiram se unir, pensar e estruturar ações. Desde o ano passado a Agenda Pública, que atua nas áreas de governança e políticas públicas; a Equipe de Conservação da Amazônia (Ecam), com projetos voltados para as comunidades tradicionais; e o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) implementam o Programa Territórios Sustentáveis, com atuação em Oriximiná, Faro e Terra Santa, no oeste do Pará. A parceria e o apoio financeiro são da Mineração Rio do Norte (MRN). Os três municípios possuem algo em comum: um grande empreendimento mineral em seu território. Em Oriximiná, a extração de bauxita é realizada na Floresta Nacional de Saracá-Taquera há mais de 35 anos; em Terra Santa, a atividade ocorre há dois anos; e, em Faro, iniciará em 2017. De fato, grandes empreendimentos contribuem com a economia e a geração de empregos, no entanto, também podem acarretar problemas sociais e principalmente dependência econômica dos municípios. O Programa Territórios Sustentáveis trata-se de uma inciativa inovadora que une


DIVULGAÇÃO

as especialidades de instituições não-governamentais no objetivo de criar um diálogo entre comunidades, mineradores e gestores públicos, com uma visão integradora. As organizações coordenam uma equipe de engenheiros, sociólogos, biólogos e outros profissionais responsáveis pelos diagnósticos, elaboração e implementação dos planos de trabalhos, a partir de quatro eixos: gestão pública, capital social, desenvolvimento econômico e gestão ambiental. O objetivo principal programa é contribuir para uma estratégia de desenvolvimento territorial sustentável, através da melhoria das cadeias produtivas, gerando opções de renda para a população; pelo fortalecimento da atuação da sociedade, com autonomia nas deliberações do município; e na melhoria da eficiência dos serviços públicos municipais e de sua gestão ambiental. Confira entrevista com a gestora de equipe Jakeline Pereira e entenda mais sobre o programa:

ACOMPANHAMENTO

O programa Territórios Sustentáveis faz com que as comunidades se sintam parte integrante de todo o processo de formação, pois são elas que conhecem e permanecerão nos municípios após a iniciativa

O programa está estruturado para durar 15 anos e promover estratégias de desenvolvimento sustentável em municípios do oeste do Pará. Como desenvolver ações viáveis e que possam surtir efeito a longo prazo? A chave para o desenvolvimento a longo prazo é o envolvimento dos agentes sociais e do poder público em todo o processo de construção e planejamento do Programa. Nós temos o cuidado de envolver principalmente os servidores públicos concursados, pois são eles quem permanecerão, mesmo que mude o governo local. As pessoas devem se sentir parte integrante de todo o processo, pois são elas que conhecem e permanecerão nos municípios. As ações devem ser estruturantes e que desenvolvam o potencial de cada município, considerando também a

“As ações devem ser estruturantes e que desenvolvam o potencial de cada município, considerando também a vocação da população local”

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ENTREVISTA

vocação da população local. Além disso, devem incluir todas as frentes que interagem para o desenvolvimento sustentável, ou seja, a economia, o social e o ambiental, todos amparados por uma gestão mais efetiva do poder público local.

TEREZA E ARYANNE FOTOGRAFIA

“ Queremos impactar áreas como a saúde, educação, meio ambiente e economia nos municípios”

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Num primeiro momento, o programa realizou diagnósticos nos três municípios. Que tipos de dados foram coletados e com quais entidades? Em 2015, realizamos o diagnóstico nos quatro eixos do Programa: Gestão Pública, Capital Social, Desenvolvimento Econômico e Gestão Ambiental. O objetivo dos diagnósticos foi revelar o retrato atual do território, nos quatro eixos, para subsidiar a elaboração de um plano de trabalho até 2020. Coletamos dados de gestão junto às secretarias de Administração/Gestão, Finanças Públicas, Planejamento, Educação, Assistência Social, Saúde, Políticas Urbanas, Transporte e Saneamento; avaliamos o status de organização de 64 associações e 18 conselhos locais; identificamos a situação ambiental e da gestão das secretarias de meio ambiente; e analisamos o status atual e potencial das cadeias produtivas rurais, como a madeira, castanha, copaíba, agricultura, turismo, pesca e pecuária. Nesses levantamentos houve a participação dos servidores municipais, prefeitos, secretários, associações, sindicatos de classes, empresários, agricultores, moveleiros, pescadores, pecuaristas, colonos, povos indígenas, povos quilombolas e comunidades tradicionais. Qual a análise prévia dessas informações? Qual a situação dos municípios, do ponto de vista de cada área de atuação do programa? Pelo menos metade das associações e conselhos não possuem condições mínimas de funcionamento. Não possuem planejamentos, captação de recursos e a maioria está com alguma inadimplência. Os municípios também possuem problemas de planejamentos, gestão de pessoal e baixa captação de recursos,

mas possuem alto potencial para o setor madeiro, moveleiro, coleta de não madeireiros (como castanha, copaíba e tucumã), pesca e turismo. Existem agentes atuando em todos esses setores, mas com alguns problemas, como a falta de matéria prima legal para a produção de móveis, falta de infraestrutura para atender melhor os turistas, conflitos de área para pesca, entre outros. No entanto, para todas essas cadeias vislumbramos um grande potencial de expansão da comercialização e melhoria de preços, principalmente utilizando como marketing o ativo florestal (muitas áreas protegidas) e social (várias comunidades indígenas e quilombolas) da região. Há um grande potencial de melhorar


DIVULGAÇÃO

FORMAÇÃO

O programa Territórios Sustentáveis mostra que através de técnicas da agricultura familiar é possível reduzir o desmatamento e aumentar a eficiência da produção local

nos municípios, junto aos órgãos públicos municipais, e percebemos o retorno na disponibilidade de informações, na colaboração com a equipe técnica do Programa. Isto é o mais importante, poder contar com o suporte de dados e com o tempo das pessoas. O que vem pela frente é uma construção coletiva, que envolverá atores públicos e toda a sociedade. O comprometimento é uma das alavancas para alcançar os bons resultados.

as técnicas da agricultura familiar e da pecuária, o qual podem reduzir o desmatamento e aumentar a eficiência (maior produção em menos área) através de práticas sustentáveis e novas tecnologias. Finalmente, esses municípios possuem muitas áreas protegidas e baixo desmatamento. No entanto, as secretarias de meio ambiente não estão plenamente aptas para uma gestão eficiente do território. Elas carecem principalmente de recursos humanos e infraestrutura. Por conta disso, realizam poucas atividades de licenciamentos e fiscalizações. Estimamos que ocorre uma renúncia de no mínimo R$ 2,5 milhões por ano, pela falta de emissão de licenças municipais pelas secretarias de

meio ambiente. Assim como as secretarias de meio ambiente, outras áreas da administração pública carecem de investimento na formação de servidores e em infraestrutura. Mas primeiro é necessário mapear melhor as demandas, consolidar um planejamento estratégico e planos setoriais para, a partir daí, desenvolver ações. Também nestes pontos as prefeituras terão apoio do Programa. O programa realizou parcerias com as prefeituras. De que forma se espera que o poder público municipal seja um aliado do programa? O pacto é o primeiro passo, pois demonstra o desejo de mudança, de envolvimento. Nós começamos as atividades

Já foram realizadas discussões preliminares acerca dos indicadores do programa, que são importantes para medir e mostrar os impactos e resultados ao longo de sua implementação. E já foram definidos indicadores até 2020. O que se espera até lá e como o programa se estruturará para obter os resultados? Definimos os indicadores para medir e mostrar o impacto e resultados do programa ao longo da sua implementação. Assim, todas as atividades são planejadas visando ao alcance dos resultados. Iremos monitorar periodicamente para ver se estamos no caminho certo do desenvolvimento e também para orientar se estamos realizando as ações corretas, podendo ser corrigidas, caso haja necessidade. Queremos impactar áreas como a saúde, educação, meio ambiente e economia nos municípios. ABRIL DE 2016

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CAPA

Separando o lixo ASSOCIAÇÕES DE CATADORES DE BELÉM AJUDAM FAMÍLIAS A GARANTIREM TRABALHO E RENDA MANTENDO A CIDADE LIMPA TEXTO CAMILA SANTOS FOTOS CARLOS BORGES

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O

lixo, em geral, é visto por grande parte das pessoas como um problema sem solução. Afinal, o que fazer com todo o material que não será mais utilizado? Essa pergunta e outras similares, além da preocupação com o futuro do planeta, levam a uma mesma direção, a coleta seletiva. Ela pode ser o começo de uma solução eficaz especialmente nos quesitos ambiental e econômico. Mas Belém, assim como outros grandes centros do país, já começou a atentar para essa necessidade e está dando seus primeiros passos nesse sentido. Em setembro de 2015, a cidade começou a realizar a coleta seletiva de materiais recicláveis, a princípio apenas no bairro de Nazaré. Além disso, para o restante da população, há 16 ecopontos espalhados em locais estratégicos, como o Portal da Amazônia, a Praça do Operário, Ver-o-Rio, Praça Brasil, entre outros, além de três galpões, que também são opções para quem quer dar o destino correto ao lixo reciclável. Como toda grande cidade, Belém acumula uma quantidade enorme de lixo, entre o domiciliar e o reciclável. Segundo dados do Departamento de Resíduos Sólidos (Dres) da Secretaria Municipal de Saneamento (Sesan), somente em fevereiro deste ano, foram arrecadadas, em média, 28 mil toneladas de lixo domiciliar na cidade. Enquanto isso, nos três primeiros meses de ação no bairro de Nazaré, cerca de 90 toneladas de lixo reciclável foram arrecadadas, como garrafas pet, cai-

Lixo rentável A reciclagem de material descartado em Belém tem gerado trabalho e renda para centenas de famílias de catadores ABRIL DE 2016

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CAPA

xas de papelão, alumínios, entre outros, segundo dados da Secretaria Municipal de Urbanismo (Seurb). Hoje existem dois tipos de modelo de coleta seletiva em prática na cidade, segundo a diretora do Dres/Sesan, Soraia Knez – a entrega voluntária e a coleta porta a porta. A primeira ocorre através dos ecopontos espalhados pela capital. Há um projeto que pretende ampliar a distribuição desses pontos de entrega voluntária, para que cada vez mais pessoas participem. Atualmente, segundo Soraia Knez, a distância entre população e esses pontos acaba servindo como um fator que desmotiva a participação das pessoas. Além disso, outros empecilhos poderiam justificar a participação baixa da 38 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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população. “O interessante seria achar locais com maior concentração de pessoas e fáceis de estacionar. É importante ter o mapeamento dessas áreas. Estamos fazendo esse trabalho para identificar os pontos mais estratégicos e também uma campanha de educação ambiental”, afirmou a diretora do Dres/Sesan. A realidade da coleta de lixo ainda é cheia de desafios. Um deles é que ainda existem hábitos a serem mudados, como, por exemplo, colocar o lixo para fora muito antes do caminhão da coleta passar, ou não atentar aos dias em que essa coleta ocorre em cada rua ou bairro. Além disso, há a falta de informação sobre a coleta seletiva. A conscientização ambiental é importante, já que

o trabalho de separação deveria partir da própria população, que muitas vezes não tem acesso a informações importantes sobre a coleta de material reciclável, e acaba deixando de participar. “Falta ainda muito a conscientização da população. A coleta seletiva é viável quando as pessoas fazem a entrega, porque o custo é menor. O trabalho de educação ambiental é um trabalho de formiguinha. Estamos empenhados, porque ele é capaz de dar a possibilidade de gerar essa consciência”, afirma Soraia, ao explicar ainda que esse serviço já vem sendo feito em alguns locais da cidade, como feiras, mercados e no bairro de Nazaré, onde já está em prática o segundo modelo de coleta seletiva – o de porta a porta.

DESAFIO URBANO

A coleta seletiva do lixo em Belém ainda enfrenta a falta de uma educação ambiental na sociedade. É comum os catadores terem de separar o material reciclável do lixo orgânico e até do entulho de obras em alguns pontos da cidade.


COOPERATIVA

A coleta porta a porta no bairro de Nazaré começou a ser realizada oficialmente em setembro do ano passado. Para isso, foi firmado um contrato entre a prefeitura de Belém e uma cooperativa que atendesse a alguns critérios. Um deles era o de absorver no mínimo 30% dos profissionais que trabalhavam no lixão do Aurá, explica Soraia Knez. Para colocar em prática essa modalidade de coleta foi escolhida, por meio de edital, a Cooperativa dos Catadores de Materiais Recicláveis (Concaves). Ela existe desde 2005 e atualmente reúne 49 catadores. Deste número, 33 fazem o trabalho porta a porta (foto abaixo). Débora Baía, coordenadora da Concaves, conta que, a princípio, o raio de ação da cooperativa era na bacia do Tucunduba. Mas desde o início do contrato com a prefeitura, o trabalho foi ampliado passando a ser realizado também em Nazaré. Houve ainda a preocupação em capacitar os trabalhadores antes do início do projeto de coleta porta a porta. Para isso, os ca-

tadores fizeram um curso de formação para melhorar o serviço. A Concaves atua no bairro seguindo dois roteiros. O primeiro, que envolve pontos como as avenidas Nazaré, Governador Magalhães Barata, José Malcher, travessa 14 de Março, entre outras ruas, ocorre as terças, quintas e sábados, das 8h às 14h, e das 16h às 22h. Já o segundo roteiro, que inclui as avenidas Gentil Bittencourt, Brás de Aguiar, travessa Quintino Bocaiúva, entre outras, ocorre as segundas, quartas e sextas, das 8h às 14h, e das 16h às 22h.

ONDE DEIXAR O LIXO Veja a relação dos galpões e ecopontos espalhados pela cidade e ajude na coleta seletiva:

RELAÇÃO COM MORADORES

Algumas pessoas costumam sofrer mais com mudanças que outras. Algumas pessoas podem não entender a nova situação logo de cara. Quando a coleta porta a porta começou, no bairro de Nazaré, os trabalhadores da Concaves perceberam certa resistência por parte de alguns moradores, mas a coordenadora Debora Baía afirma que tudo não passou de uma fase. Hoje em dia, a maioria dos moradores da área

• Galpões - Travessa Padre Eutíquio, 2647, entre travessa Quintino Bocaiúva e Canal São Miguel, Cremação - Avenida Bernardo Sayão, s/n, entre travessa Quintino Bocaiúva e avenida Fernando Guilhon, Jurunas

• Ecopontos -Praça da Sé - Praça Brasil - Praça do Operário - Praça do Marex - Ver-o-Rio - Portal da Amazônia - Orla de Icoaraci - Praça Batista Campos - Praça da República - Praça Pedro Álvares Cabral - Praça Felipe Patroni - Praça da Bandeira; - Praça Santuário de Nazaré (CAN) - Avenida Visconde de Souza Franco (Doca) - Sesan – Avenida Almirante Barroso - Sesan – Avenida Alcindo Cacela

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CAPA

TUDO SERVE

Os catadores coletam todo tipo de material que possa ser reciclado, desde papéis, plástico, papelão, vidro, passando por metais, além de eletrodomésticos, roupas e sapatos

colabora com o trabalho. “No início foi tranquilo, mas como era um trabalho novo, achamos certa resistência dos moradores, que achavam difícil fazer a coleta. Atualmente 70% do bairro participa”, diz. “Hoje temos uma relação muito boa com os moradores, porque a coleta porta a porta acaba criando um vínculo e o próprio catador torna-se conhecido pela sociedade”, afirmou. A Concaves tem arrecadado nesse trabalho porta a porta vários materiais reciclável, como papéis, plástico, papelão, vidro, todos os tipos de metais, além de eletrodomésticos, roupas e sapatos. Segundo Debora Baía, a cooperativa coleta, atualmente, cerca de 40 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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70 toneladas mensais de material reciclável. O número vem crescendo e, em março, foram coletadas 78 toneladas. Em sete meses de contrato com a Prefeitura de Belém, foram, ao todo, 520 toneladas. A maior dificuldade para a cooperativa ainda são os condomínios. Para mudar esse cenário, a Concaves está planejando para abril um mutirão de educação ambiental nos condomínios da área. “Vamos dar palestras de conscientização ambiental para esses moradores. Hoje contamos com três catadores formados em Gestão Ambiental e um que se forma em agosto”, disse Debora Baía. No geral, a coordenadora

acredita que o saldo tem sido positivo, apesar das dificuldades do início. O trabalho vem sendo bem desenvolvido e hoje já é reconhecido e ganha atenção dos moradores. Marcelino Almeida da Silva, 56, é um dos catadores da Concaves que participa da coleta porta a porta no bairro de Nazaré. Já trabalhou em outros ramos, inclusive como pedreiro, por muito tempo. Como catador, trabalha há mais de 20 anos, e, hoje em dia, é apenas com esse serviço que sustenta a família. Ele fala orgulhoso sobre as conquistas que já alcançou com seu trabalho. “Adoro o meu trabalho de coletor. Hoje trabalho só com isso. Atra-


vés do contrato eu me mudei e estou construindo a minha casa”, conta. As dificuldades da rotina ex istem, mas Marcelino é bastante positivo e diz que as coisas estão indo bem. “Dificuldades encontro poucas, só que como é um trabalho que está engatinhando, a sociedade está aprendendo a fazer a separação dos materiais. “A maioria das pessoas nos recebe bem e tem muita gente bastante solidária”, afirma. Para Marcelino, a população, no geral, está se mostrando mais interessada em ajudar com o serviço de coleta seletiva. Ele ref lete ainda que os benefícios dessa atitude ajudam não apenas os próprios catadores e a cooperativa, mas especialmente o planeta e o meio ambiente. “Para mudar, as pessoas têm que ter coragem, determinação e atitude. Esse trabalho que fazemos serve para ajudar e muito o planeta, que pede socorro.” Ivanilza Alves, 60, é moradora de uma das ruas que fazem parte do roteiro de coleta porta a porta no bairro de Nazaré. Ela participa da ação separando material reciclável e já conhece a rotina de trabalho desenvolvida pelos catadores da Concaves. Dos benefícios que a coleta seletiva oferece, ela destaca o de ser positivo para a cida-

de na questão ambiental. “O trabalho é muito bom, porque mantém as ruas limpas, ameniza a sujeira. Tudo que é benefício para a população e para o futuro é louvável”, avalia. Ela garante que o serviço é positivo também porque gera mais consciência social sobre o lixo jogado na rua.

UM BOM INVESTIMENTO

Além de dar um destino ao lixo que seria descartado de forma inapropriada e ajudar centenas de famílias que vivem desse trabalho, investir em coleta seletiva pode trazer outros benefícios para o meio ambiente, como a redução do desperdício de água, além de diminuir a quantidade de produtos que o homem precisaria retirar da natureza. Um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 2010 confirma que deixar de investir em coleta seletiva também significa perda de capital. A pesquisa constatou que o Brasil perde R$ 8 bilhões por ano ao deixar de reciclar os resíduos recicláveis, que acabam indo para os lixões e aterros das cidades. Em Belém, atualmente, ainda não há um número exato que indique a quantidade de material reciclável arrecadado por dia. Isso se deve ao fato da cole-

Movimentação da economia

POR QUE FAZER A COLETA SELETIVA? A coleta seletiva, quando feita de forma correta, pode gerar muitos benefícios dos pontos de vista ambiental,

Reutilização de materiais que seriam descartados em lixões e aterros;

MAIS CONSCIENTES

A diretora do Dres/Sesan, Soraia Knez, afirma que o trabalho de coleta seletiva ajuda a gerar a conscientização ambiental dos moradores da capital paraense

O descarte correto dos

Mobilização da sociedade,

materiais evita a poluição do

além da geração de maior

solo e lençóis freáticos; ruas

consciência ambiental por

ficam menos sujas, assim

parte da população;

como os esgotos, o que pode Indústrias e colaboradores

evitar possíveis problemas

são beneficiados a partir da

para a população, como mau

social e econômico. Alguns

geração de lucro, além da

cheiro e enchentes, além de

A coleta seletiva também

deles são:

criação de novos postos de

doenças como a leptospiro-

significa uma importante fonte

trabalho;

se, dengue, entre outras;

de sustento para centenas de catadores.

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CAPA

ta seletiva ainda estar começando a ganhar importância na cidade. A ONG Noolhar, que existe há dez anos, realiza um trabalho voltado para a educação ambiental, desenvolvimento sustentável e conservação do meio ambiente. Entre os projetos que a ONG apoia está o Cultura Ambiental, que auxilia professores do ensino fundamental quanto a questão dos resíduos recicláveis. Para Marcos Wilson, coordenador da ONG, a grande missão da Noolhar é achar soluções e trabalhar nesse sentido, falando sobre os problemas atuais, como é o caso do desperdício de materiais recicláveis. Para Patrícia Gonçalves, da Noolhar, o maior avanço do trabalho que é feito atualmente no bairro

de Nazaré é quanto a contratação de cooperativas para fazer essa coleta, mas reconhece que o modelo porta a porta deve ser mensurado e avaliado para que seja possível comprovar se é realmente o mais adequado a cidade. “A ONG defende que a cidade deve ter um desenho para verificar qual o melhor modelo de coleta. Não podemos considerar que a educação ambiental deva ser fechada, e sim prática, onde você orienta a população para que ela mude de pensamento e assim ir corrigindo o que precisa”, avalia. Segundo ela, as pessoas ainda têm muitas dúvidas sobre como armazenar o lixo e fazer a separação, o que, na verdade, deveria ser algo comum. “Acho que as pessoas estão mais atentas a questão da separação

do lixo, e digo com a certeza de quem trabalha com isso há dez anos. A dificuldade é saber como fazer e ter uma alternativa prática”, diz.

ASSOCIAÇÃO

Belém também conta com o trabalho da Associação dos Catadores da Coleta Seletiva de Belém (ACCSB), que existe há sete anos. A associação é formada por 45 catadores, que trabalham coletando todo tipo de material reciclável, seja porta a porta, ou com grandes geradores. Segundo o diretor da ACCSB, Roselino Ribeiro, esses grandes geradores são bancos, hospitais, órgãos do Estado, além de shoppings, por exemplo. O trabalho da ACCSB, a primeira associação de catadores da cidade, começa no barracão localizado no Canal São Joaquim, no bairro de Val-de-Cans. Depois os catadores seguem pela cidade recolhendo os resíduos recicláveis. A quantidade de material recolhido varia, mas segundo Roselino Ribeiro, gira em torno de 120 mil toneladas por mês. Além disso, ele explica que a quantidade recolhida é maior no período chuvoso, de dezembro a abril. “O que nós pedimos é que a população contribua com as cooperativas, porque se a população fizer sua parte, a associação e as cooperativas farão a parte delas”, diz, lembrando ainda que o simples fato de separar corretamente o material reciclável ajuda muitas famílias.

SUSTENTO DA FAMÍLIA

EXPERIÊNCIA

Benedita Sanches já foi catadora da Associação dos Catadores da Coleta Seletiva de Belém e hoje trabalha como secretária na entidade 42 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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O barracão funciona com a ajuda de dezenas de catadores, que tiram dali o sustento de suas famílias. É o caso de Rose Mary, 36, que trabalha na ACCSB há dois anos, e Sandra Eduarda, 35, há três meses na associação. O trabalho pode ser cansativo, mas não chega a ser desgastante para Rose Mary. Para ela, o segredo é trabalhar com alegria. “Recolher esse material da rua é bom para o meio ambiente, diminui o lixo das ruas. Pode não dar muito dinheiro, mas va-


mos levando. Dá para sustentar a família”, afirmou Rose, que faz isso junto com o marido, também catador. Benedita Sanches, 51, tem uma história de vida única ligada ao trabalho de catadora. Hoje secretária da ACCSB, trabalha há três anos na associação, mas tem mais tempo de experiência no serviço. O que a motivou a começar como catadora foi a necessidade de criar o filho pequeno, na época com 6 anos. Como não tinha com quem deixá-lo, a solução era levá-lo junto. “Saía por conta própria com um carrinho e levava meu filho comigo. Hoje, graças a Deus, ele já é formado. Consegui isso com o meu trabalho de catadora”, conta orgulhosa, e garante que os amigos que fez na associação já são uma família

também. “É praticamente uma segunda família, porque às vezes passamos mais tempo aqui que nas nossas casas.” Mas não é apenas pela necessidade financeira que Benedita gosta desse trabalho. Assim como Rose Mary, Sandra Eduarda e Marcelino Silva, da Concaves, ela é bastante consciente do papel dessa profissão para os cuidados com o futuro do planeta e o destino correto que deve ser dado ao lixo. “Se não existisse o catador, como seria? É uma profissão de muita importância. Todos deveriam nos levar a sério. Percebo que hoje somos bem recebidos. Até nos convidam para entrar nas casas, oferecem café. Já reconhecem mais nosso trabalho, veem que é uma coisa séria”.

DICAS PARA SEPARAR CORRETAMENTE O LIXO RECICLÁVEL O primeiro passo para quem quer ajudar com a coleta seletiva é aprender o que é material reciclável. O chamado lixo reciclável seco é separado em quatro categorias – papel (papel seco não contaminado, papelão, revistas, cadernos, embalagens longa vida), plástico (copos descartáveis, sacos e sacolas, garrafas, embalagens, caixas, tubos de PVC, vasilhames, utensílios quebrados, brinquedos), metal (bronze, alumínio, cobre, latas, sucatas de ferro, panelas, fios, correntes) e vidro (copos, potes, jarras, garrafas, frascos de perfume, vasilhames de produtos de higiene e limpeza).

Confira algumas dicas para começar a separar o lixo reciclável e colaborar com a coleta seletiva em Belém:

1

Para Patrícia Gonçalves, da ONG Noolhar, sepa-

rar o lixo deveria ser um hábito diário e simples. “Basta ter um saco para materiais recicláveis e outro para os não recicláveis”, disse. Lembrando que, no caso da coleta de lixo domiciliar, é importante que não se coloque o lixo para fora muito antes do horário em que o caminhão da coleta passa, pois isso pode acarretar em alguns problemas, como mau cheiro ou sacolas rasgadas;

2

O material separado para reciclagem deve estar, de preferência, limpo. É importante lavar as embalagens antes de separá-las. Esse ato simples impede o mau cheiro dentro de casa e ajuda no trabalho do catador;

3

Uma dica importante de Patrícia Gonçalves para quem mora em bairros onde não exista coleta seletiva: entrar em contato com coopeAPTOS AO TRABALHO

Débora Baía, coordenadora da Concaves (acima), diz que os catadores participam de uma capacitação para poder desempenhar a função da melhor maneira possível

rativas que possam ir até a rua ou condomínio recolher o material reciclável. Vale lembrar que, para isso, é necessário juntar certa quantidade de lixo. Basta perguntar para a cooperativa e pedir informações. ABRIL DE 2016

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EDUCAÇÃO

A reinvenção do sabor paraense FOTOS: NAILANA PEREIRA / ASCOM UEPA

Estudantes de Tecnologia de Alimentos descobrem novos usos dos frutos amazônicos para evitar o desperdício e melhorar a saúde dos consumidores

"A

Amazônia está na moda na gastronomia. Cada vez mais nossos sabores são incorporados a produtos nacionais e internacionais. Com a intenção de não perder o protagonismo nesse campo, as instituições de ensino locais investiram na criação de cursos que aliam tecnologia e inovação aos melhores ingredientes da região para desenvolver produtos saborosos e com grande potencial de mercado. Os alunos abraçaram a ideia e o resultado disso é evidente a cada rodada de defesas de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) nos campi das instituições: iogurte grego de leite de búfala com geleia de açaí, doce de leite feito com soro do leite e geleia de cupuaçu e até mesmo 44 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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uma farinha feita da casca do cupuaçu, aplicada na confecção de pães. Quem olha o Laboratório de Tecnologia de Alimentos da Universidade do Estado do Pará (Uepa) em funcionamento nem imagina os produtos deliciosos que saem dali. Vestidos com jalecos e toucas, munidos de beckers, tubos de ensaio e equipamentos tecnológicos – usados para avaliar textura, cor e aroma das combinações – os alunos elaboram formulações que prometem não apenas alavancar os sabores locais ao gosto internacional, mas, de quebra, resolver antigos problemas de reaproveitamento e sustentabilidade na indústria. A vontade de usar um ingrediente abundante no Pará e o incentivo do orientador, o professor José Lourenço, foram os

motivadores do tecnólogo em alimentos Wagner Barreto, de 23 anos. “O Pará produz 37% do leite de búfala brasileiro. O produto oferece um rendimento de cerca de 40% maior que o leite de vaca, o que o torna muito mais viável para produção em larga escala. Com menos perdas, o lucro é maximizado”, explica Barreto. Sua pesquisa foi desenvolvida em 2014, momento em que o iogurte do tipo grego estava em ascensão. “Era tudo tão novo que nem sequer havia parâmetros para produção dos iogurtes gregos”, relembra. Para aumentar o apelo regional do produto, Wagner Barreto decidiu aliar o iogurte grego de leite de búfala a uma geleia de açaí. O produto fez sucesso na fase de testes e o baixo custo de produção levou o tec-


SUSTENTABILIDADE

O soro do leite é considerado hoje um rejeito e seu despejo é responsável pela contaminação de diversos rios e igarapés, graças ao aumento da demanda bioquímica de oxigênio – fenômeno denominado DBO. “O soro alimenta micro-organismos, que se reproduzem

e criam esta demanda maior por oxigênio. O resultado disso é que os rios acabam ficando mais pobres e têm sua biodiversidade comprometida”, explica o tecnólogo de alimentos Adriano Lucena, de 23 anos. Para ajudar a solucionar este quadro, ele acatou sugestão da co-orientadora Suely Gomes e se uniu à pesquisadora Estela Cruz, com quem desenvolveu um doce de leite que inclui em sua formulação 30% de soro de leite. O produto formou dupla perfeita com o cupuaçu, transformando-se em um delicioso creme com grande potencial de mercado. “Na fase de análise sensorial, testamos 11 formulações diferentes do produto com 60 provadores. As boas notas obtidas deles foram uma grande motivação para nós”, conta. O trabalho deve ser publicado ainda este ano na revista Cândido Tostes, especializada

FOTOS: NAILANA PEREIRA / ASCOM UEPA

nólogo a sugerir em sua monografia que o iogurte fizesse parte da alimentação dos alunos da rede pública municipal. “O iogurte grego de búfala apresenta três vezes mais proteínas do que o de vaca. Para fazer uma porção com 250Kcal, que é o que preconiza o PNAE, o custo seria de R$ 1,11”, diz. Apesar da intenção de dar prosseguimento ao projeto, a vida levou Wagner por outros caminhos. Atualmente, ele desenvolve seu projeto de mestrado, onde cria biofilmes feitos à base do colágeno de peixe.

PESQUISA À MESA

Estudantes do curso de Tecnologia de Alimentos desenvolvem novas fórmulas alimentares a partir de produtos amazônicos. Wagner Barreto já produziu iogurte grego de leite de búfala e geleia de açaí no laboratório da Uepa.

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COMUNIDADE

em trabalhos científicos que envolvem lacticínios. Os então estudantes chegaram a pensar em buscar uma patente, mas decidiram que o compartilhamento das informações seguia mais o espírito da pesquisa. “Como temos o objetivo de combater o desperdício e evitar a contaminação, achamos melhor publicar como domínio público mesmo, para que qualquer interessado possa desenvolver o produto e contribuir para o meio ambiente”, conclui. A mesma vontade de combater o desperdício na indústria alimentícia tomou as estudantes de Tecnologia de Alimentos da Uepa em Marabá, Ranielle Nascimento, de 25 anos, e Yasmim Souza, de 21 anos. Elas elevaram o aproveitamento

do fruto do cupuaçu a 100% desenvolvendo uma farinha feita da casca da fruta, aplicada a produtos de panificação. “As sementes já eram usadas para fazer o cupulate, que tem produção industrial. A polpa também tem uma ampla gama de usos. Sobrava somente a casca, que descobrimos ser riquíssima em fibras”, observa Ranielle. Após secagem e moagem, as cascas foram completamente aproveitadas na feitura da farinha. Para o trabalho, esse produto foi usado na confecção de pão de forma. “Quanto testamos o pão, as pessoas elogiaram bastante o sabor. Uma das pessoas, que é diabética, disse que não costumava consumir pão por ter restrições ao consumo de carboidratos, e que estava feliz em poder consumi-lo sem culpa. Fi-

cou com aparência e textura muito semelhantes ao pão integral tradicional”, lembra a graduanda, que acaba de apresentar os resultados da pesquisa na defesa de seu TCC. “Queríamos uma oportunidade de mostrar o potencial dos nossos produtos regionais para produção em larga escala. O cupuaçu segue os mesmos passos do açaí e começa a despontar internacionalmente. Desta forma, esperamos contribuir também para a redução do desperdício em maior escala”, acrescenta.

PATENTES

O debate sobre a propriedade intelectual se acendeu quando o interesse pela produção regional cresceu, na última década. A Amazônia virou vedete e as instituições

FOTOS: NAILANA PEREIRA / ASCOM UEPA

PALADAR REGIONAL

“O Pará produz 37% do leite de búfala brasileiro. O produto oferece um rendimento de cerca de 40% maior que o leite de vaca”, diz o tecnólogo de alimentos Wagner Barreto, que também faz experimentos com o açaí.

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OUTROS SABORES

Os estudantes do curso de Tecnologia do Alimento também desenvolvem receitas de pães e doces de leite tendo o cupuaçu como matéria-prima FOTOS: NAILANA PEREIRA / ASCOM UEPA

de pesquisa e ensino se valeram da lei Federal de nº 10.973 – conhecida como Lei da Inovação – para criarem seus Núcleos de Inovação e Transferência de Tecnologia (Nitt), que fazem a ponte entre pesquisadores e os órgãos de patente. A coordenadora de Propriedade Intelectual do Niit/Uepa, Adriana Maués, avisa: a busca pela proteção do produto ou serviço desenvolvido deve ser feita enquanto o trabalho ainda está em fase de pesquisa. Por ser algo recente – o Nitt da Uepa iniciou atividades em 2013 – muitos alunos e professores ainda desconhecem os pormenores do trabalho ali realizado. “No ano passado, fizemos um roteiro de palestras nos campi para explicar nosso funcionamento. O retorno foi bastante positivo. Desde então, já recebemos 17 demandas para pesquisa”, conta a coordenadora. O processo de obtenção da patente é longo e começa com a verificação dos requisitos de patenteabilidade. “Avaliamos se o objeto da patente é de fato uma novidade, se contém atividade inventiva e se ele pode ser produzido industrialmente. A partir do preenchimento destes requisitos, submetemos o invento ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi), que buscará se há algo semelhante registrado”, resume. As taxas são cobertas pela instituição que, caso a patente seja obtida, terá uma porcentagem nos eventuais ganhos trazidos pelo invento, por ser considerada por lei uma parceira no desenvolvimento do produto. Os alunos e professores devem atentar para o momento correto de buscar o auxílio do Nitt. “O ideal é que o pesquisador nos procure assim que tiver resultados positivos na fase de testes, desta forma poderemos proteger o invento durante os trâmites de registro da patente. Caso o conteúdo seja apresentado em artigos científicos, matérias na mídia ou mesmo em bancas de defesa de TCC, o conhecimento será adicionado ao domínio público imediatamente, perdendo a possibilidade de registro”, ressalta Maués.

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SUSTENTABILIDADE

Estratégia no campo KELEM CABRAL / EMBRAPA

Embrapa Amazônia Oriental incentiva a geração de receita na agricultura local de forma sustentável. Os produtores saem ganhando com a iniciativa.

R

ecuperar pastagens e áreas degradadas intensificando o uso da terra, com vias a melhorar de forma sustentável a produtividade, a qualidade dos produtos e a renda das atividades agropecuárias, com preservação ambiental. Essas são as principais linhas de defesa do sistema integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), tecnologia que é definida como uma estratégia de produção sustentável que tem como singularidade a integração, em uma mesma área, das atividades agrícolas, pecuárias e florestais. Ou seja, reúne a produção de grãos, carne ou leite, além de produtos madeireiros e não madeireiros ao longo de todo ano, com redução na pressão por desmatamento de novas áreas com flo-

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restas nativas e ainda, a diminuição das emissões de gases de efeito estufa (GEE). A tecnologia é utilizada em todo país, mas ainda de maneira tímida, porém crescendo a cada ano, em especial, nos polos produtores de agricultura e pecuária, como o Centro-Oeste brasileiro. Em 2013, ganhou apoio governamental e foi sancionada pela presidência uma Política Nacional de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, destinando mais recursos às pesquisas e às estratégias de estímulo a adoção por parte da cadeia produtiva. Outra forma de incentivo é a inserção do ILPF como integrante do Plano Agricultura de Baixa Emissão de Carbono do Governo Federal (Plano ABC), que incentiva a adoção de tecnologias com capacidade de mi-

tigar emissões de GEE por meio de financiamentos por bancos públicos, com taxas diferenciadas. A instituição da política nacional também foi um impulso à Rede de Fomento ILPF, uma iniciativa coordenada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em parceria com a Cocamar, John Deere e Syngenta. A pesquisadora Gladys Martinez, da Embrapa Amazônia Oriental, é coordenadora do projeto ILPF na Amazônia e defende que a tecnologia pode ser uma resposta ao grande desafio que é encontrar o equilíbrio entre produção, desenvolvimento e sustentabilidade na produção agropecuária brasileira, setor da economia que é estratégico para o país. Em 2015, a produção agropecuária foi


RONALDO ROSA / EMBRAPA

responsável por 23%, em média, de todo Produto Interno Bruto (PIB), movimentando em Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) R$ 463,3 bilhões, figurando como um dos únicos setores a registrar crescimento no cenário de crise econômica nacional, segundo dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O Pará tem conquistado destaque no cenário nacional do setor, alcançando o quinto lugar no ranking brasileiro de produção bovina, com um rebanho estimado de 19,9 milhões de cabeças, segundo dados do IBGE. Números que também aumentam a pressão para responder à equação da sustentabilidade, uma vez que o Estado integra uma região com a maior floresta tropical do mundo. Outro dado importante, e umas das apostas do sistema de integração, e a recuperação de áreas degradadas. O pesquisador Moacyr Bernardino, da Embrapa Amazônia Oriental, afirma que em cerca de 50% das pastagens no Brasil estariam degradadas, algo em torno de 100 milhões de hectares. “A proporção para a Amazônia é semelhante, chegando 30 milhões de hectares de pastagens com algum grau de degradação”, alerta o pesquisador. Ele explica que considera o ILPF um sistema viável, mas ressalta que o uso dessa tecnologia exige mais investimentos e maior qualificação técnica do produtor.

QUALIFICAÇÃO

Seja na plantação de milho ou na criação de búfalos, os produtores paraenses têm no sistema integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) uma forma de produzir sustentavelmente. A pesquisadora Gladys Martinez (à esquerda) coordena o projeto na Amazônia e defende que a tecnologia pode ser uma resposta ao desafio do equilíbrio entre produção, desenvolvimento e sustentabilidade na produção agropecuária do Brasil.

Num passo a passo da tecnologia, a pesquisadora Gladys Martinez descreve que o sistema ILPF integra diversos componentes agrícolas, como a produção de grãos, pecuária, com animais e pastagem, e o florestal, com a plantação de árvores. Ela explica que há diversas composições possíveis e não há obrigatoriedade em se ter todas as atividades juntas. “Temos experiências com grãos, gado e florestas, mas também podem ser utilizados animais, como búfalos, ovinos, ou ainda, a integração de lavoura e pecuária

VINICIUS BRAGA / EMBRAPA

Integração


SUSTENTABILIDADE KELEM CABRAL / EMBRAPA

(ILP), sem a floresta, mas o melhor sistema de integração é aquele que se adequada à realidade de cada propriedade rural no intuito de proporcionar a ela mais viabilidade e sustentabilidade”, enfatiza. A pesquisadora afirma que a intensificação da produção, incide diversos benefícios ao produtor e ao meio ambiente. Entre eles destacam-se a melhoria das condições físicas, químicas e biológicas do solo, pois aumenta a ciclagem e a eficiência na utilização dos nutrientes. Entre as vantagens econômicas, estão a redução ou amortização dos custos de produção das atividades agrícola, da pecuária e florestal ao longo do tempo, além de diminuir a ociosidade do uso das áreas agrícolas e aumentar a diversificação da produção, que pode estabilizar a renda anula nas propriedades rurais. Foi em busca desses resultados que o 50 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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grupo Mogi Guaçu, com tradição nacional em pecuária de leite, iniciou há cerca de oito anos, a migração da pecuária tradicional ao sistema ILPF. Segundo Marcus Ubiratan, gerente das fazendas do grupo no Pará, a escolha pelo sistema se deu devido à alternativa de produção de culturas diferentes na mesma área e tempo, pois além de proporcionar incremento na renda e melhoria da qualidade do solo, trouxe significativas melhorias ambientais e sociais. “Já realizamos a integração de todos os componentes do sistema, hoje estamos integrando árvores, gramíneas e animais para corte e leite”, informou. O gerente diz ainda que a integração permite a geração de caixa em médio e longo prazo, maior renda por hectare e a diversificação das receitas, mitigando assim a volatilidade do mercado.

Poupança verde

O presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Paragominas, Murilo Zancaner, é um dos defensores dos sistemas de integração e diz que pecuária e agricultura são atividades que se complementam e só vê benefícios nessa dobradinha. Como um exemplo prático ele destaca a simbiose que ocorre entre a plantação de grãos e o gado. Ele explica que área agrícola costuma ter apenas uma grande safra anual, mas o sistema auxilia na safrinha, uma colheita intermediária, que é cultivada junto com a pastagem. No período em que se inicia a seca, época de maior necessidade de complementação alimentar do gado, é feita a colheita, mas o capim cresceu forte aproveitando a adubação dos grãos. É para essa área que pertencia a lavoura, que ele migra parte do gado da propriedade, que contará, nos seis meses de seca, com alimentação de qualidade. “Na seca você tem queda de peso dos animais e no número de cabeças na propriedade. Com a integração, sai o grão, entra o gado, que se alimenta e deixa esterco na área que servirá de adubo para a próxima safra”, comenta o produtor. Já para o produtor e pesquisador aposentado Italo Falesi, o componente florestal tem se revelado como a grande promessa do sistema. A árvore, comenta, requer mais paciência, pois seu retorno financeiro é mais demorado, no entanto é repleto de diversificação, por isso apelidou a atividade de poupança verde. Em uma propriedade de 125 hectares ele produz ovinos, mas é da floresta, inserida no sistema ILPF, que ele retira maior parte do lucro. E se engana quem pensa que o dinheiro advém na venda da madeira. “A venda de sementes florestais representa hoje 44% de todo lucro da propriedade, seguida da venda da madeira, com 36%. A carne e derivados dos animais, juntas, respondem pelo restante”, garante Falesi. Ele planta mogno africano, acácia mangium, tachi preto, gliricidia e outras espécies. “As árvores dão lucro com as sementes, com a madeira e ainda proporcionam ciclagem de nutrientes para o solo, alimento e conforto térmico, dando bem estar aos animais, que resulta em ganho de peso e até aumento na taxa de fertilidade”, diz.


ARTE, CULTURA E REFLEXÃO FERNANDO SETTE

PENSELIMPO

Do feminino A ARTISTA PLÁSTICA ELIENI TENÓRIO REVELA O UNIVERSO DAS MULHERES EM SUAS OBRAS EDIFICAÇÕES

MERCADO

Francisco Bolonha é responsável pelos principais prédios históricos de uma Belém saudosista e fonte de inspiração para artistas. PÁG.60

A gastronomia regional se tornou uma grande aliada da economia verde, dando destaque ao Estado do Pará no país e exterior. PÁG.66

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PAPO DE ARTISTA

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À flor da alma feminina

A ARTISTA PLÁSTICA ELIENI TENÓRIO EXPRESSA EM SUA OBRA UM UNIVERSO QUE ELA ENTENDE MUITO BEM TEXTO ALAN BORDALLO FOTOS FERNANDO SETTE

Q

uando Elza Soares compôs “Mulher do Fim do Mundo”, faixa que dá título ao seu mais recente disco, mostrou o real perfil das resistentes mulheres habitantes do Brasil. A descrição cabe para a artista plástica Elieni Tenório. Não por ter nascido na tímida Mazagão, no interior do Amapá, ou por ter se criado em Belém – apesar de que, aos olhos de muitos, o Norte ainda seja um fim de mundo – mas por escolher expressar sua poesia, seus desejos, sua feminilidade e seus pensamentos sendo fiel à sua essência. Dona de um estilo plural, que mescla técnicas como desenho, gravura, pintura, escultura, costura em plataformas das mais variadas, ela nunca escondeu sua predileção pelo mergulho no universo

feminino a partir das experiências pessoais. Fala sobre o erotismo, dando vazão às fantasias que convivem com inúmeros e agitados pensamentos em sua cabeça. Tanta informação lhe rendeu uma carreira atribulada, com inúmeras exposições e prêmios, no Brasil e no exterior. A última foi “Recortes da Alma Feminina”, na Galeria Theodoro Braga, do Centur. Nesta entrevista, Elieni nos recebeu em sua casa-galeria, que é outra obra sua, decorada com dezenas de suas criações. “Faço pesquisa no meu próprio trabalho. Passam muitos pensamentos na minha cabeça”. A agitação foi tanta que ela preferiu nem sentar enquanto atendeu a reportagem: de pé contou um pouco do que lhe motiva a continuar criando – o que espera fazer até o fim.

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PAPO DE ARTISTA

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Quando surgiu teu interesse pela arte? Desde criança. A família ia à praia e em vez de eu estar brincando na água estava fazendo esculturas na areia. Cobria vidrinhos com tecidos. Digo que minha necessidade fez eu ser uma artista criativa. Por eu não ter condições de ganhar bonecas no fim do ano, cobria vidrinhos com tecidos e fazia minhas bonecas. E também por outro lado minha mãe não fazia as minhas roupas. Fazia as das minhas irmãs, mas a minha não. Por isso, hoje eu me visto, costuro minhas roupas. Depois comecei a fazer meus trabalhos em escola. Depois me casei. Não deu certo, me casei de novo e aí meu segundo marido me deu toda essa liberdade para eu desenvolver meus trabalhos. Ele já vinha observando esse meu jeito de trabalhar. E desde cedo foste misturando técnicas e linguagens? Eu tinha uma necessidade de escrever também, sempre gostei. Mas não saía legal. E aí comecei a passar as crônicas do dia a dia para as telas. E fiz uma exposição, que foi “Suburbano Coração”, um marco na minha vida e momento que fiquei conhecida. Depois veio “O Espelho da Alma”, “O Silêncio Que Evoca”... Os nomes são bonitos, né? Muito caliente... E assim comecei a ir limpando aquelas imagens. Porque um cabaré cheio de personagens, comecei a limpar. Era um casal em uma cama redonda em um motel. Comecei a trabalhar também com várias técnicas que uso até hoje, desenho, pintura, gravura, costura, escultura e objetos, instalações, vídeo. Tudo eu já fiz. E não tinha me dado conta, sou assim muito agitada, emotiva, e comecei a trabalhar muito. E quando as exposições começaram a ficar mais frequentes? Em 2003, fui para Alemanha levar uma exposição. E já estava sendo cobrada a apresentar uma evolução, a aprofundar pesquisas. Levei essa exposição. Quando estava indo para o Rio, em conexão para Alemanha, meu trabalho não embarcou ABRIL DE 2016

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porque a minha curadora tinha despachado o dela e eu tinha despachado o de uma amiga. Pedi para uma filha colocar umas gravuras para mim. Tinham dois envelopes, um de gravuras prontas outro de experimentação. Ela jogou na minha maleta o de experimentação. Quando cheguei no hotel que vi disse “Nossa Senhora”. Mas queria sair do figurativo e saí. Fiz uma instalação na parede, fui muito aplaudida. Senti que era o aval, já podia fazer o abstrato. Fui depois em Veneza ver a bienal, a cabeça fervilhando de ideias, despi a minha casa. Meu trabalho é de construir, desconstruir e construir de novo. Prova tanto que essa história é minha. E aí pego, despi a casa, tirei as cortinas, capas dos sofás e produzi a exposição “Vestida de Obsessão”. E daí não parei mais, foi prêmio atrás de prêmio no Arte Pará, fui ficando manjada (risos). Fiz outras exposições, Alemanha, Itália, França. Meu trabalho passou a ficar reconhecido lá fora. Mas o legal dessa história toda de sair do figurativo e ir pro abstracionismo. Todo mundo pensa que fazer abstrato é fácil, mas não é.

DIVULGAÇÃO

DETALHES DO DIA A DIA

Elieni Tenório imprime sua experiência de vida nas obras que produz, tendo a feminilidade sempre presente

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Hoje a tua casa é uma das tuas instalações? Ela é uma galeria, né, já deu para notar. Derrubei essa casa, só deixei os quartos meu e do meu filho. Meu marido quando viu se espantou. “Eu sabia que tu eras louca, mas não tanto”, ele me disse. Mas aí mudei a casa, fiz o desenho de como queria, discuti com a arquiteta e ficou assim. Até no lavabo tem obra de arte. Meus filhos me perguntavam: “Mamãe, quando vamos ter uma casa normal? A gente quer ser normal”. E eu falava: “Mas vocês são!”, porque quem não gosta de arte não é normal. Entre tantas linguagens e componentes diferentes que colocas nas tuas obras, qual a influência foi mais determinante para chegar a esse estilo, esse caldeirão? Sempre foi assim, eu nasci assim. Você viu que eu não sentei, né? Meu pai perguntava: “Tem prego na cadeira?” (risos). Porque eu subia, descia, sempre fui agita-

“ Logo no início para uma mulher é muito difícil, sim. Tudo depende de pauta. Quer expor? Precisa de pauta. Entra em salão, vai disputar com amigos. Recebemos pouco apoio.” da. E olha que agora estou mais calma, porque já estou com uma idadezinha. Mas quem me acompanha sabe que sou apimentada, elétrica, tenho energia. Mas voltada para o que gosto de fazer. Quando não gosto não faço mesmo. Mas sempre fui autêntica, encontrei minha própria identidade: falar de mim. São poucos artistas que falam de si. Falo da minha história, da minha vida. Não digo que é um sofrimento, mas as dificuldades que tive aproveitei para evoluir, mostrar para as pessoas que diziam que eu não tinha condições. Me perguntam das minhas referências e digo que sou minha própria referência. Falaste sobre a dificuldade de ser artista. Foi difícil fazer arte em Belém? Logo no início para uma mulher é muito difícil, sim. Tudo depende de pauta. Quer expor? Precisa de pauta. Entra em salão, vai disputar com amigos. Recebemos pouco apoio. Quantas vezes recebi prêmios fora e não pude representar nosso Pará por não ter como ir? Essas são as dificuldades. Os folderes


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CHEIA DE HISTÓRIAS

Elieni Tenório já foi várias vezes premiada no Brasil e exterior. Para ela, sua arte é libertadora.

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e catálogos que tenho hoje foram tirados do meu dinheiro. Vim ter retorno financeiro em 2013, porque os prêmios, quando ganhava, coitados, era só para entregar. É uma disputa, né. Tudo é. O tema feminino é recorrente no teu trabalho. Como chegaste ao conceito da exposição atual e o que ela traz de novidade? Engraçado que estive conversando com uma poeta. Ela me chama de Menina Luz. Ela viu um trabalho meu e disse que veio uma música à cabeça, do Gonzaguinha, “Fanatismo”, e que era a minha obra. Inclusive ela e outras pessoas fizeram uma performan-

ce com a música dele. Ela começou a falar e eu falei da minha ideia para uma exposição, com os tampos de mesa, com costuras, desenhos, que atrelam minhas relações de prazer à mesa, do vinho, que gosto muito, enfim. E isso remonta a 2000, por exemplo, na época do Café Imaginário. E ela chegou aqui e viu os tampos. Com três dias ela me mandou o texto. “Caramba, essa mulher simplesmente entrou no meu inconsciente e captou o que eu queria”. Ela simplesmente falou coisas que eu não tinha dito ou ia produzir. Ou então eu deixei escapar em uma rodada de vinhos (risos). E aí comecei a trabalhar

e a pauta saiu. Aí veio a bailarina, uma das novidades, três bustos de mulheres com desenhos, e também desenhos de rendas. Cansei de colar e agora estou desenhando rendas. Cobri com o molde de costura, depois desenhei, depois colei e depois coloquei objetos, várias técnicas em uma só obra. E bordei os textos. São pedaços, histórias aqui e ali. O que quero mostrar é que nós somos cheias de histórias. Se pudéssemos falar da gente sairia tanta poesia. E quando vi a exposição montada tive que me conter para as lágrimas não escorrerem. Cada trabalho que faço venho para casa com alma lavada, leve como uma pena. ABRIL DE 2016

A ARTISTA

Para Elieni, cada trabalho que faz lava sua alma e a deixa feliz em poder produzir sua arte de forma livre como mulher

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MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS

Francisco Bolonha 1872-1938

Um engenheiro inspirado pelo amor TEXTO ANA PAULA MESQUITA ILUSTRAÇÕES JOCELYN ALENCAR

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A

Belle Époque foi um período marcante e de mudança artística, cultual e política da Amazônia durante o ciclo da borracha. A região teve grande influência europeia no modo de vida e na arquitetura. Os detalhes dessa herança hoje passam despercebidos, mas estão presentes em obras edificadas pelo engenheiro civil Francisco Bolonha, que imprimia o estilo eclético que o o período exigia. Um dos exemplos mais conhecidos é o Palacete Bolonha, na avenida Governador José Malcher com a rua Dr. Moraes, um presente a esposa, a pianista Alice Tem-Brink. Um Taj-Mahal amazônico cuja história é contada no livro “Palacete Bolonha, Uma Promessa de Amor”. “Alice não queria vir para Belém e ele prometeu construir a mais bela residência. Pegou o gosto europeu da época em que esteve em Paris e trouxe a mentalidade do ecletismo”, conta Euler Arruda, arquiteto e museólogo e um dos autores do livro, junto com Célio Cláudio de Queiroz Lobato e Aurea Helyette Gomes Ramos. A vila Bolonha, às proximidades do palacete, era um reduto de operários, feito para que os engenheiros e outros funcionários de obras viessem da Europa. Bolonha era um amante de festas. Nos salões do palacete eram decididos o futuro político e econômico de Belém e do Estado. “Neles aconteciam saraus, bailes e jantares onde se podia observar a elegante moda parisiense que era importada especialmente pela elite belenense”, conta Euler. Também havia uma sala de música dedicada ao piano de Alice. O engenheiro civil era filho do coronel Francisco de Paula Bolonha Loureiro e Henriqueta Adelaide Rodrigues Bolonha, nascido em 22 de outubro de 1872. Formou-se na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, em 1894, e fixou residência em Paris. Lá fez cursos de aperfeiçoamento na profissão e especializou-se em hidráulica na Holanda e na Inglaterra. Foi testemunha da Exposição Universal de 1900 e tornou-se amigo de Gustavo Eiffel, engenheiro francês que construiu a Torre Eiffel, com quem aprendeu técnicas do uso de metais e cristais na construção civil, presentes no palacete Bolonha. O casamento com Alice Tem-Brink foi no Rio de Janeiro. Não tiveram filhos devido

Francisco Bolonha ter contraído caxumba. Ele voltou a Belém para morar com o pai na rua da Indústria, atual Gaspar Vianna, onde fundou uma fábrica de gelo com o nome “Empresa de Gelo Paraense, de Bolonha, Paiva & Companhia” e a “Empresa Construtora e Locadora de Quiosques”, que por concessão pública, ergueu em Belém diversas construções do tipo, sendo o Bar do Parque a mais famosa. As primeiras geladeiras da cidade também foram ideia de Bolonha. Eram caixas de madeira revestida de metal. O gelo que fabricava era colocado ao lado da caixa. Tudo era coberto com uma tampa. O Mercado Municipal de Belém, que hoje abriga o mercado de carne Francisco Bolonha, foi construído com recursos próprios e, por isso, o engenheiro teve concessão do então intendente Antônio Lemos para explorar por 30 anos o comércio no local. Ele fornecia gelo para os pescadores em troca de peixe. Em 1904, construiu o palacete Bibi Costa, localizado na Governador José Malcher esquina com a travessa Joaquim Nabuco. O sistema de abastecimento de água do Utinga – um dos lagos é chamado de Bolonha -, o prédio que foi do jornal Folha do Norte e de O Liberal e a Escola de Engenharia do Pará também foram obras dele. O estilo neoclássico, art nouveau, barroco e rococó foram estilos utilizados nas construções de Francisco Bolonha e são evidentes no palacete que leva seu nome. “Ele introduziu novas técnicas e materiais de construções em um uso harmônico, como estruturas metálicas, pastilhas, vidros, azulejos, telas de ploé, coberturas em ardósia, tijolos em vidro e concreto armado”, diz Euler Arruda. Por não ter filhos, mas gostar muito de crianças, o engenheiro construiu uma montanha russa na cidade. “Era descendo a Governador José Malcher, esquina com a Tiradentes, e que ele permitia que as crianças e os amigos usassem”, conta o pesquisador. Francisco Bolonha morreu aos 68 anos, em 1938. Era diabético e tentou cortar um calo que tinha no pé, que gangrenou. Foi o maior cortejo fúnebre de Belém na época. Seu corpo foi levado do palacete e para o cemitério Santa Izabel. Os ossos repousam em um ossuário no local. ABRIL DE 2016

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AGENDA

MOSTRA A Estação das Docas recebe até o dia 15 de

MARAJÓ

abril a mostra “Janelas da Rua – Travessa

Embrapa instala Unidade de Demonstração de búfalos

Leão XIII”, resultado do curso “Janelas da rua”, ministrado pelo professor e fotógrafo Valério Silveira. A mostra é composta pelos registros de dezoito participantes e valoriza o patrimônio

A Embrapa Amazônia Oriental, em parce-

de produção bubalina, englobando me-

de Belém, que este ano completou 400 anos.

ria com a Secretaria de Estado de Desen-

lhoramento genético, nutrição, sanida-

Mais informações no site www.sesc-pa.com.br.

volvimento Agropecuário e da Pesca (Se-

de, reprodução, entre outros. O objetivo

dap) e Associação Paraense dos Criadores

é fortalecer a cadeia leiteira e de corte

CONGRESSO

de Búfalos (APCB), vão instalar, em maio,

como alternativa econômica para o Mara-

De 24 a 27 de abril será realizado no Hangar

no Marajó, uma Unidade de Demonstra-

jó, região que abriga municípios que estão

Convenções e Feiras da Amazônia o XVIII

tiva (UD) do projeto “Pecuária Bubali-

entre o IDH mais baixo do Brasil. Nesse

Congresso Médico Amazônico. Este ano,

na Familiar Leiteira da Ilha do Marajó”

período, haverá ainda uma vasta progra-

o tema central do evento é “A contribuição

(Promebull Marajó). A UD funcionará no

mação com palestras e seminários sobre

dos profissionais de saúde nos 400 anos de

campo experimental da Embrapa do mu-

manejo de pastagens, sanidade, genética,

Belém”. A programação conta com oficinas,

nicípio de Salvaterra e servirá como uma

manejo de fêmeas e ordenha. Inscrições e

cursos, seminários, entre outras atividades. O

vitrine para os produtores da região, para

informações no e-mail: cpatu.napt-mara-

congresso é promovido pela Sociedade Médi-

estimular e difundir boas práticas pre-

jo@embrapa.br ou pelos telefones 3204-

co Cirúrgica do Pará (SMCP). Informações no

conizadas pela instituição nos sistemas

1272/ 99360-5879.

www.congressomedicoamazonico.com.br.

PRÊMIO Seguem abertas até o dia 29 de abril as inscrições para o Prêmio Mercosul de Ciência e Tecnologia, que este ano possui como tema “Inovação e Empreendedorismo”. Os interessados podem se inscrever em uma das cinco categorias - Iniciação Científica; Estudante Universitário; Jovem Pesquisador; Pesquisador Sênior; e Integração. Informações no site www.premiomercosul.cnpq.br.

INSCRIÇÕES RONALDO ROSA / EMBRAPA

O Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade chega à 29ª edição e inscreve até o dia 25 de abril. A premiação reconhece ações que preservam o patrimônio histórico brasileiro. No total oito trabalhos serão premiados com o valor de R$ 30 mil. Edital e ficha de inscrições

MÚSICA

no site www.cultura.gov.br.

O Sesc Casa da Música segue com inscrições abertas para novos

OFICINAS

alunos interessados pelo univer-

Em abril, as oficinas Curro Velho oferecem

so musical. Entre os cursos estão

cursos de cultura e arte. Entre as opções estão

bateria, violão, canto, guitarra,

violão, cavaquinho, serigrafia, desenho, pintu-

flauta transversal, harmonia e

ra, teatro, dança, técnicas circenses, fotogra-

improvisação, teclado, percussão,

fia, e mais. As inscrições seguem até o dia 11

ser feitas até o dia 10 de abril, no Sesc Doca. Para mais informações: 3222-0359, 4005-9584 e 4005-9587. 62 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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DANIEL WILSON / FREEIMAGES

entre outros. As inscrições podem

de abril e podem ser realizadas no Curro Velho, na rua Professor Nelson Ribeiro, ou na Casa da Linguagem, na avenida Nazaré. A taxa é R$ 20. Alunos da rede pública não pagam. Informações: (91) 3184-9100 e 98895-1334.


FAÇA VOCÊ MESMO

Gravuras de renda em tecido Trata-se de uma técnica de corte/gravação a partir do ferro de queima ou pirógrafo. Estimula a ressignificação do tecido em malha sintética ao reaproveitar forros, cortinas e outros materiais numa elegante reciclagem. O Núcleo de Oficinas Curro Velho oferta, mensalmente, oficinas de gravura em tecido e os instrutores ensinam uma forma de reaproveitar tecidos que estavam deixados de lado ou até mesmo estavam prestes a serem descartados. Com ela, será possível criar rendas que podem ser usadas em diversas superfícies e costuras.

Do que vamos precisar?

Entre as técnicas com pirógrafo e ferro de solda, quase não há diferenças, mas o pirógrafo é mais indicado e seguro por conter um regulador e apoio para as mãos. Ambas as ferramentas estão disponíveis em lojas de artesanato. A pirografia é uma das manifestações artísticas mais antigas da humanidade, tendo os primeiros registros já com a descoberta do fogo. A técnica deve ser feita sobre uma mesa de material fórmico ou de vidro, considerando que a ponta, tanto do pirógrafo quanto do ferro de solda, usam de ferro quente para queimar ou cortar os materiais.

Papel A4

Retalhos de tecido sintético

Tesoura

Pirógrafo (ao lado) ou ferro de solda

Placa de vidro para a base

INSTRUTORAS: CARLA BELTRÃO E ROSA PEREIRA / COLABORAÇÃO: DILMA TEIXEIRA COORDENADORA DE ARTES PLÁSTICAS FOTOS : ANA CAROLINA SCALERCIO

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ATENÇÃO: Essa atividade pode ser feita por crianças, desde que acompanhadas por um adulto responsável

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Dobre a folha de papel A4 duas vezes no meio e uma terceira vez puxando uma das pontas para a lateral oposta.

Abra o papel e coloque-o sobre o tecido desejado. Usando o pirógrafo, corte o tecido utilizando a renda como referência. Cuidado ao retirar pois pode rasgar o papel e o tecido.

Pode-se decorar livremente, abrindo fendas ou desenhando com o pirógrafo detalhes pontilhados.

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Recorte o papel dobrado livremente. Quanto mais cortes, mais detalhada a renda.

Coloque o tecido cortado sobre um segundo tecido. Ainda com o pirógrafo, faça pequenos pontos bem próximos (pontilhismo) pelas bordas para “colar” um no outro.

Finalize em um último tecido, repetindo o passo quatro sobre ele.

Para saber mais Quem quiser conhecer mais sobre técnicas artísticas pode se inscrever nas oficinas Curro Velho, do governo do Estado do Pará. Crianças a partir de 12 anos podem participar. O Curro Velho fica localizadO na rua Professor Nelson Ribeiro, nº 287, esquina com a travessa Djalma Dutra, bairro do Telégrafo. Telefones: (91) 3184-9100 e 3184-9109. 64 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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RECORTE AQUI

FAÇA VOCÊ MESMO


LEONARDO NUNES

BOA HISTÓRIA

Vermelho

Não faz tanto tempo, mas, naquela época, ainda havia a corte e certa timidez na aproximação entre os adolescentes

que, por algum motivo, se escolhiam. Coisa do século 19 entre aqueles dois encabulados de fim do século 20. Ambos de férias numa Cametá, às margens do Baixo Tocantins, que não existe mais, com uma orla em eterno desmoronamento pelas águas do rio, navios fantasmas afundados em frente ao cais, visagens a vagar pela madrugada e noites profundas de luz que apagava às dez no descanso compulsório da usina a diesel. Os pudicos falavam a mesma língua, cheios de cuidado nas primeiras vezes do reencontro. Tinham se visto muito pequenos num episódio que se resumia na venda de um violão de brinquedo. Contavam da escola, dos casos dos recessos escolares da primeira infância, do vestibular que logo viria. A moça, redonda de tão formosa. O rapaz, um varapau cravado de acne. Ela tendia à musicista. Ele

nem sabia o que queria ser. Todo dia emendavam a prosa defronte de casa até mais tarde, cercados de primos menores, que percebiam os meneios de paixão de ambos e faziam uma algazarra dos diabos. Eram ele e ela também meio parentes, sem saber ao certo em que grau, com a única certeza de uma distância imensa e já desconhecida na árvore genealógica daquelas famílias de caboclos e cafuzos que em algum momento se cruzava e se reuniam todo ano numa diáspora invertida na cidade cujos ancestrais ajudaram a fundar. Como havia de ser, a vontade de se ver e prestar atenção na fala e no gesto do outro cresciam. Foi ele quem propôs, então, do nada, se encontrarem na sexta-feira, no cais, longe de tudo, no claro-escuro das seis e meia. Tomou fôlego e falou. Ela, depois de segurar a respiração, disse sim. Arrumou roupa limpa e emprestou perfume da tia Alzira. Partiu com a bicicleta também emprestada, o coração pulando, o moleque. Chegou ao cais e esperou, sem perceber que as luzes de mercú-

rio dos postes não reagiam. Uma hora depois já no breu, ele desistiu e viu que a cidade estava mergulhada na escuridão, sem energia. Vítima do destino, ele presumiu, cafona. Já na praça principal tomou o susto: ao longe, centenas de lanternas vermelhas, como num engarrafamento de almas, e os metais da banda e as vozes anasaladas crescendo a cada metro que se aproximavam. Piscou os olhos para só então ver homens e mulheres iluminados apenas pelas velas bentas entoando os hinos a São João Baptista. No meio da multidão, o tio Joaquim com o saxofone dourado se destacava como um arcanjo maestro. Durou alguns minutos e eles passaram em direção à igrejinha. Voltou pra casa sem vê-la, sem dizer o que queria e nunca mais reviu a quase prima. Já a procissão no breu, embalada pela cantoria e os instrumentos, com um vermelho vivo das chamas por detrás dos guarda-ventos, ficou para sempre na memória daquele fracasso amoroso de verão. ABRIL DE 2016

Anderson Araújo

é jornalista e escritor

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NOVOS CAMINHOS

Gastronomia na economia verde Jaci, em uma viagem ao centro da Terra ao lado de Iassytatassú, foi mordida por um monstro. As lágrimas der-

THIAGO BARROS

é jornalista, mestre em Planejamento do Desenvolvimento Sustentável (NAEA-UFPA) e professor da Universidade da Amazônia @thiagoabarros

ramadas pela deusa Lua, na mitologia Tupi, banharam uma parte da floresta cheia de pés de mandioca, dando origem ao tucupi. O sumo usado pelos indígenas desde tempos imemoriais, extraído das raízes da planta, tempera grande parte dos alimentos típicos da Amazônia até hoje. De mítico, o líquido amarelo virou item da gastronomia de alto nível no Brasil e no exterior, conquistando grandes chefes de cozinha e turistas. Não à toa que Belém, principal núcleo de desenvolvimento culinário da região, foi eleita neste ano cidade criativa da gastronomia pela Unesco, a Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura. O que encanta quem não é da região é toda a aura fantástica acerca da alimentação cotidiana dos amazônidas, suas heranças multiculturais, a aproximação com a natureza e os saberes tradicionais - como a técnica para extrair o “veneno” do caldo do tucupi, na verdade o ácido cianídrico. O trabalho que proporcionou projeção mundial à gastronomia amazônica, especialmente a desenvolvida no Pará, faz parte de uma convergência de esforços ao longo de décadas, numa cadeia que começa nos produtores tradicionais, segue com organizações da sociedade civil e se materializa, também, em políticas públicas. Existe um ambiente favorável à consolidação desta vocação. E os próprios moradores da região, sempre atentos às novidades de fora, começaram a redescobrir e valori-

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zar as receitas locais. A riqueza da gastronomia amazônica e dos variados ingredientes tem ligação direta com a biodiversidade que a floresta tropical úmida abriga e se respalda em uma lógica de produção inversa à de monoculturas desenvolvidas em fronteiras agrícolas como a da soja, que invade o sul da região. Os produtos de uma gastronomia sustentável têm reduzido impacto ambiental e beneficiam cadeias de produção local, mas ainda são minoria em nosso cotidiano. Esse novo mercado - a exemplo do crescimento da alimentação de base orgânica no país inteiro - abre janelas para ações que priorizem o desenvolvimento regional, tendo como referência a economia verde. Esses produtos são gerados a partir de três eixos que se encaixam muito bem à “marca” gastronomia amazônica e agregam valor diante de um público consumidor internacional cada vez mais engajado e exigente: baixa emissão de gases do efeito estufa, eficiência no uso de recursos naturais e investimento na inclusão social. Só é possível chegar a esse tipo de produto final, na prática, solidificando o equilíbrio de quatro capitais: humano, físico, natural e institucional. O resultado é o bem-estar, que se mantém a partir do empoderamento de comunidades, da adoção de mecanismos que proporcionem uma diferente forma de utilização dos recursos naturais. Em todas essas dimensões, o Pará, por exemplo, tem boas inIciativas, mas elas precisam ser ampliadas, criando raízes. E a gastronomia amazônica tem tudo para se tornar referência a outras iniciativas.

“O trabalho que proporcionou projeção mundial à gastronomia amazônica faz parte de uma cadeia que começa nos produtores tradicionais, segue com organizações da sociedade civil e se materializa em políticas públicas”


ECOCHARGE EKO Foto: Fernando Sette

Realização

Patrocínio

06/04/16 14:33


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