Revista Amazônia Viva ed. 66 / fevereiro de 2017

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REVISTA ENCARTADA NO JORNAL O LIBERAL. NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE.

FEVEREIRO 2O17 | EDIÇÃO NO 66 ANO 6 | ISSN 2237-2962

O PEDIDO DE SOCORRO DOS

BOTOS Ameaçados pela pesca predatória e pelo medo que despertam por causa do estigma de animais encantados, estes mamíferos aquáticos precisam de proteção ambiental para que suas populações não sejam extintas na Amazônia

CONSERVAÇÃO

Como a agropecuária pode reverter os índices de desmatamento na região

BELÉM 401 ANOS

Parte final da reportagem sobre a importância das religiões na formação da capital paraense

“BELÉNS”

O cantor e filósofo Henry Burnett lança novo disco com reflexões sobre a cidade




EDITORIAL

PUBLICAÇÃO MENSAL DELTA PUBLICIDADE - RM GRAPH EDITORA FEVEREIRO 2017 / EDIÇÃO Nº 66 ANO 6 ISSN 2237-2962 Presidente LUCIDÉA BATISTA MAIORANA Presidente Executivo ROMULO MAIORANA JR. Diretor Jurídico RONALDO MAIORANA Diretora Administrativa ROSÂNGELA MAIORANA KZAM Diretora Comercial ROSEMARY MAIORANA Diretor Industrial JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO Diretor JOSÉ LUIZ SÁ PEREIRA GABRIEL MELO SANTOS-BIOMA / DIVULGAÇÃO

PROTEÇÃO

Animais aquáticos da Amazônia, como os botos, precisam ser preservados para a perpetuação da espécie na região

S.O.S. na vida marinha amazônica

FELIPE JORGE DE MELO Editor-chefe

Pesquisadores de centros de pesquisa como o Grupo de Pesquisa BioMa - Biologia e Conservação de Mamíferos Aquáticos da Amazônia, sediado em Belém (PA), e do Instituto Mamirauá (AM) fazem da profissão uma missão digna de heróis. Ao se debruçarem sobre às pesquisas da fauna e flora amazônicas, eles acabam salvando vidas silvestres, muitas vezes ameaçadas pelo avanço do progresso na região e pelo desconhecimento das populações, como ribeirnhos e pescadores. Na reportagem de capa deste mês mostramos como é o trabalho de equipes de resgate e pesquisa de animais marinhos na Amazônia, principalmente de botos, peixes-bois e

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tartarugas, que encalham na zona costeira amazônica ou são perseguidos e maltratados pela ação do homem. “A comunidade pode colaborar durante o resgate isolando a área, evitando que as pessoas fiquem molestando, fazendo selfie, subindo ou até amarrando o animal. Se a gente não der esse atendimento imediato, não vamos conseguir salvá-lo”, alerta a bióloga Angélica Rodrigues, que atua no BioMa. Ela apela para que as pessoas possam ajudar os pesquisadores no trabalho de resgate dos animais encalhados e também façam denúncias de maus-tratos. O apelo parte de um pedido de socorro desses seres, cada vez mais ameaçados na natureza.

Conselho editorial RONALDO MAIORANA JOÃO POJUCAM DE MORAES FILHO LÁZARO MORAES REDAÇÃO Jornalista responsável e editor-chefe FELIPE JORGE DE MELO (SRTE-PA 1769) Coordenação geral LUCIANA SARMANHO Editor de arte FILIPE ALVES SANCHES (SRTE-PA 2196) Pesquisador e consultor técnico INOCÊNCIO GORAYEB Colaboraram para esta edição O Liberal, Agência Pará de Notícias, Agência Brasil, Museu Paraense Emílio Goeldi, Universidade Federal do Pará, Universidade do Estado do Pará, Fundação Cultural do Pará Oficinas do Curro Velho (acervo); Alinne Morais, Camila Santos, Sávio Senna, Victor Furtado, Anderson Araújo (reportagem); Fabrício Queiroz (produção); Carlos Borges, Fernando Sette (fotos); Anderson Araújo e Alberto Teixeira da Silva (artigos) André Abreu, J.Bosco, Jocelyn Alencar e Leonardo Nunes (ilustrações); Alexsandro Santos (tratamento de imagem). FOTO DA CAPA O menino e o boto na região do Salgado paraense, por Gabriel Melo Santos (BioMa) AMAZÔNIA VIVA é editada por Delta Publicidade/ RM Graph Ltda. CNPJ (MF) 03.547.690/0001-91. Nire: 15.2.007.1152-3 Inscrição estadual: 158.028-9. Avenida Romulo Maiorana, 2473, Marco - Belém - Pará.

amazoniaviva@orm.com.br

PRODUÇÃO

REALIZAÇÃO


NESTA EDIÇÃO

EDIÇÃO Nº 66 / ANO 6

32

Vida a ser salva

Animais aquáticos da Amazônia, como o peixe-boi, são resgatados por equipes de pesquisadores, que evitam a extinção das espécies na região CAPA

48

DIVULGAÇÃO

CARLOS BORGES

EVERALDO NASCIMENTO

EDUARDO SOUZA

28

E MAIS

20

AGROPECUÁRIA A doutora em Ecologia

42

MÚSICA O cantor e filósofo Henry

GENTE

Joice Nunes Ferreira, pes-

BELÉM 401 ANOS

Burnett acaba de lançar

Time de fotógrafos com

quisadora da Embrapa

Religiões não católicas,

seu mais novo disco, o

um olhar apurado para

Amazônia Oriental e uma

como o judaísmo e o isla-

Belém Incidental. Nesse

a beleza amazônica

das coordenadoras da

mismo, também ajudaram

recente trabalho, ele faz

presenteiam os leitores

Rede Amazônia Susten-

a formar a sociedade de

reflexões sobre o cotidia-

com lindas imagens

tável, defende a regu-

Belém do Pará em quatro

no com a força de seus

do cotidiano na capital

larização ambiental na

séculos de fundação da

sentimentos pessoais e

paraense.

produção rural.

cidade amazônica.

paixão pelo lugar.

OLHARES NATIVOS

ENTREVISTA

HISTÓRIA

PAPO DE ARTISTA

4 6 7 11 13 14 15 16 17 18 19 19 54 55 57 58

EDITORIAl AS MAIS CURTIDAS PRIMEIRO FOCO TRÊS QUESTÕES ELES SE ACHAM FATO REGISTRADO PERGUNTA-SE EU DISSE APPLICATIVOS CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE DESENHOS NATURALISTAS CONCEITOS AMAZÔNICOS AGENDA FAÇA VOCÊ MESMO BOA HISTÓRIA NOVOS CAMINHOS

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AMANDA LELIS-INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO

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ASMAISCURTIDAS DESTAQUES DAS EDIÇÕES ANTERIORES

IDEFLORBIO

BELÉM Parabéns pela reportagem sobre a influência do cristianismo na construção de Belém (“Missão na cidade”, Capa, janeiro de 2017, edição nº 65). Como professor de História, vou usar a matéria em sala de aula para levar mais conhecimentos aos meus alunos sobre a origem da nossa cidade. Felipe Fernandes Belém - Pará

DE VOLTA AO LAR, TARTARUGUINHAS

A notícia sobre a soltura de mais de 40 mil filhotes de tartaruga-da-amazônia no rio Xingu foi a mais curtida e compartilhada na edição passada em nosso Facebook.

PINDUCA Excelente entrevista com o nosso querido Pinduca (“Pinduca Rei”, Papo de Artista, janeiro de 2017, edição nº 65). Conhecemos um

FERNANDO SETTE

pouco mais da história e da carreira desse ícone da nossa cultura. Wellen Salgado Belém-Pará Que o Pinduca é rei eu não tinha dúvida, mas que ele é gente como a gente e que tem um nome simples, porém bonito, “Aurino Quirino Gonçalves”, eu não podia imaginar. Todas as palmas para esse grande artista do nosso Estado. Lucília Cruz Belém-Pará

SORRIR PARA A VIDA NO BATENTE DA PORTA

A foto de Fernando Sette da jovem feliz da casa 3239 foi a mais curtida e comentada em nosso Instagram na edição de janeiro. A alegria da garota conquistou vários seguidores.

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Luiz Bionor Júnior

da Amazônia Viva envie comentários, dúvidas, críticas e sugestões para o email amazoniaviva@orm.com.br ou escreva

instagram.com/amazoniavivarevista

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do Carimbó”.

Para se corresponder com a redação

fb.com/amazoniavivarevista

twitter.com/amazviva

com certeza merece o título de “Rei

Belém-Pará

FERNANDO SETTE

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O Pinduca é um mestre no que faz e

para o endereço: Avenida Romulo USE UM LEITOR DE QR CODE PARA ACESSAR A EDIÇÃO DIGITAL DE JANEIRO

Maiorana, 2473, Marco, Belém - Pará, CEP 66 093-000 ou FAX: 3216-1143.


TEXTOS VICTOR FURTADO E ALINNE MORAIS FERNANDO SETTE

PRIMEIROFOCO

O QUE É NOTÍCIA NA AMAZÔNIA

Pelos muros de Belém POR MEIO DO GRAFITE, A ARTE URBANA QUE COLORE AS CIDADES EM TODO O MUNDO, O COLETIVO FREEDAS CREW EXPRESSA OS SENTIMENTOS DE MULHERES MARGINALIZADAS NA AMAZÔNIA PÁGINA 8 E 9

MANEJO FLORESTAL

NATUREZA

Comunidade de Bailique, no Amapá, ganhou selo ambiental da FSC Brasil graças à gestão sustentável dos açaizais na região. PÁG.10

Estudo na região sudeste do Pará mostra a importância da proteção e preservação das araras-azuis na Amazônia. PÁG.15

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PRIMEIRO FOCO

Um grito com tinta e arte TEXTO FABRÍCIO QUEIROZ FOTOS FERNANDO SETTE

Entre os azulejos portugueses, as influências neoclássicas e as construções modernas, os muros da cidade de 401 anos ganham as formas, os traços e as cores estilizadas de uma arte que se impõe à ordem e ao padrão. Expressão plástica do movimento hip-hop surgido nos Estados Unidos, o grafite ganhou as ruas do mundo e de Belém expondo as denúncias, os pensamentos e os desejos de artistas muitas vezes marginalizados.

São artistas como o coletivo Freedas Crew, formado por quatro mulheres e um homem trans, o trabalho do grupo busca provocar uma reflexão sobre o lugar da mulher na sociedade e no próprio movimento do “graffiti”, como preferem nomear. “A nossa proposta principal é trazer o feminino para os muros da cidade abordando diversas temáticas, desde a mulher negra, a violência contra as mulheres, a ênfase na mulher

nortista e sua cultura e elementos que retratam a sua liberdade. Além de trazer esses elementos femininos acreditamos que mais mulheres se sintam encorajadas em enfrentar os desafios que é estar na rua e assim ocupá-la. Mas não só isso, só em existirmos como um coletivo de mulheres e um homem trans em um movimento que o protagonismo masculino é muito forte, já é uma atitude de força, união e resistência feminina”, dizem as integrantes, que também preferem falar em coletivo. Além da óbvia referência à pintora surrealista Frida Kahlo, as Freedas querem mostrar a identificação com os temas

EXPRESSÃO AMAZÔNICA

Para os grafiteiros, as cores e os desenhos não devem perder de vista o tom político e, às vezes, até conflituoso de relação com o espaço urbano 8 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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regionais. “Por mais que o ‘graffiti’ seja uma arte difundida mundialmente, na região amazônica ele ganha novas reconfigurações e releituras, trazendo a nossa realidade para os muros da cidade. Nos nossos ‘graffitis’ trazemos elementos amazônicos que refletem a nossa história e o nosso povo”. Os símbolos locais também estão presentes no trabalho do grafiteiro Fábio Modesto Cardoso. No bairro da Cidade Velha, próximo ao “Beco do Carmo”, é possível observar uma de suas intervenções que dão destaque ao Mestre Verequete, famoso por difundir o carimbó no Estado. Fábio atua sozinho em Belém, mas já integrou coletivos da cidade e hoje colabora com um grupo de São Luís (MA) e a União Nacional Crew. Com a experiência de quem milita há muito tempo pelo movimento, ele define: “O ‘graffiti’ é arte urbana, é uma expressão artística democrática e livre”. Para ele, mais do que o belo aparen-

te, as latas de spray, as cores e os desenhos não devem perder de vista o seu tom político e, às vezes, até conf lituoso de relação com o espaço urbano. “Ele surge na liberdade de apropriação dos espaços sem vida, muitas vezes sujos, mas também quebra a regra social e se expressa sem autorização do dono do espaço e passa a ser agressivo por ser liberto ao ponto de passar por cima das regras da sociedade que vivemos”, defende. Para as Freedas, nota-se atualmente um fortalecimento da arte urbana em Belém, resultado de um esforço dos integrantes do próprio movimento, que, contudo, percebem que ainda há um processo em curso para que a cidade perceba que a estética não é o único valor que importa para eles. “O ‘graffiti’ não é uma arte que veio só para trazer o belo para cidade, ele traz a voz da periferia e de pessoas esquecidas pela sociedade, traz a revolta, e o protes-

to político, denuncia violências, mas também fala de amor. Muitos ‘graffitis’ ainda chocam as pessoas, ele também foi feito para chocar. A cidade precisa compreender essas nuances e não usar o ‘graffiti’ como arma contra o picho. Se você for mais fundo na história do ‘graffiti’ vai perceber que isso não tem cabimento”, afirmam.

PRESTANDO ATENÇÃO EM CORES

Tendo como inspiração a pintora surrealista Frida Kahlo, as Freedas Crew querem mostrar a identificação feminina na arte com os temas regionais

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PRIMEIRO FOCO SIDNEY OLIVEIRA / AGÊNCIA PARÁ

AÇAÍ DO BOM

O cultivo de açaizais na Amazônia por ser sustentável, gerando retorno e segurança aos às comunidades

CERTIFICAÇÃO

ENERGIA

Produtores de açaí ganham selo de manejo florestal Uma associação de produtores de açaí do Bailique, um arquipélago a 160 quilômetros de Macapá, no Amapá, obteve a certificação do Conselho de Manejo Florestal (FSC). Atualmente, esse é o único açaí certificado no mundo. “A inclusão de comunidades tradicionais e indígenas no sistema FSC nos indica que estamos no caminho certo, usando de forma responsável os recursos naturais”, diz Aline Tristão, diretora-executiva do FSC Brasil. As áreas de produção de açaí que foram certificadas são da Associação das Comunidades Tradicionais do Bailique (ACTB). O grupo é composto por apro10 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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ximadamente 100 produtores de açaí. “Para o açaizal progredir é preciso de luz do sol, água e outras espécies de árvores próximas”, diz Geová Alves, presidente da ACTB. “Por isso é tão importante manter a f loresta em pé”, explica ele. A certificação FSC tem o papel de aproximar a produção e o consumo responsável de produtos f lorestais madeireiros e não-madeireiros. Agora, a ideia da comunidade é entrar em um mercado diferenciado e criar um fundo financeiro que vai ajudar na criação da futura Escola Família Agroextrativista do Bailique, melhorando a produção do açaí.

Plantas nocivas Pesquisadores da Universidade do Estado do Pará (Uepa) estão utilizando plantas aquáticas que crescem de forma nociva nos mananciais de Belém como fonte de energia. As chamadas macrófitas são encontradas no Parque Estadual do Utinga e ameaçam a biodiversidade dos lagos Bolonha e Água Preta. Segundo o estudo, todo lixo orgânico pode produzir gás natural durante a sua decomposição. A pesquisa afirma que é possível aproveitar este gás em estruturas chamadas digestores para produzir um combustível natural que gera eletricidade e calor quando queimado. Agora, o que os pesquisadores da Uepa fazem é verificar como obter o máximo de energia possível das plantas aquáticas, para que sua exploração como fonte de energia alternativa seja viável.


TRÊSQUESTÕES

TECNOLOGIA

RESPOSTAS QUE VÃO DIRETO AO PONTO

Energia solar leva internet a populações isoladas

Fevereiro, além de temático para orientação,

fotovoltaico, inversor e um banco de bateria que armazena energia durante o dia para ser usada à noite. O equipamento promete uma grande mudança em São João do Ipecaçu. Para ensinar mais sobre informática e energia solar aos moradores da região o projeto também realizou o curso “Energia Solar para Inclusão Digital” em Tefé, na sede do Instituto Mamirauá. Os 16 participantes vindos de colônias de pescadores da região passaram um mês no Centro de Vocacional Tecnológico (CV T) do Instituto, tendo aulas de cidadania, informática e manutenção de computadores. Além disso, eles também aprenderam os princípios e funcionamento da energia solar. Tudo para ajudar no uso da nova tecnologia implantada na comunidade.

prevenção, diagnóstico e tratamento de vários tipos de câncer, também tem como tema o Mal de Alzheimer. A doença não tem cura. Os tratamentos são mais eficazes no início, capazes de impedir o avanço, mas o diagnóstico precisa ser feito o quanto antes. O professor mestre em Psicologia Alex Miranda observa que há fatores de adoecimento que podem ser prevenidos. E este mês pode ser um bom momento para ficar alerta. Que avanços a ciência já conseguiu no diagnóstico e tratamento do Alzheimer? No diagnóstico, há avanços nas técnicas de exame de sangue e aprimoramento de técnicas de ressonância magnética. Até então, o tratamento da doença é feito de forma a estagná-la, porém há promessas de curas em seu estágio inicial, como o tratamento por ultrassom e novas medicações. No campo comportamental, novas técnicas de JOÃO CUNHA

tratamento baseada em dinâmicas grupais e com uso de animais domésticos. O que pode levar uma pessoa a ter doença que pode ser prevenida? Há fatores que não podem ser controlados, como a principal, que é o avanço da idade e o histórico familiar; no entanto, o estimulo do cérebro, como realizar tarefas intelectualmente estimulantes, leitura frequente, tocar instrumentos musicais e interação social frequente, além de hábitos saudáveis e atividades físicas podem ser utilizados como forma de prevenção da doença. Na Amazônia temos boas referências em pesquisa e tratamento da doença? Nossa floresta é riquíssima e dela talvez possa ser encontrado um tratamento mais eficaz e, quem sabe, a cura da doença. Uma gama de estudos do sobre o camapu, uma frutinha do mato, bastante desprezada pela população, está sendo realizado no Pará com promissoras promessa para o tratamento

MODERNIDADE Os moradores de São João tiveram acesso à internet pela primeira vez. Agora, usam umnotebook comunitário.

do Alzheimer.

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ARQUIVO PESSOAL

O projeto “Energia Solar para Inclusão Digital” do Instituto Mamirauá, patrocinado pela Huawei por meio do Instituto Cooperforte, leva internet para populações isoladas na Amazônia. Por meio do projeto, em novembro do ano passado, os moradores de São João tiveram acesso à internet pela primeira vez. Antes disso, tarefas simples, como emitir uma nota fiscal, eram verdadeiros desafios. É na sede do Teçume da Amazônia, grupo que há 15 anos produz peças de cestaria e outros produtos artesanais, que está instalado o computador com ponto de acesso à internet para uso coletivo. No local também está o primeiro sistema de energia solar da comunidade. O sistema, formado por placas solares posicionadas no telhado do Teçume, conta com um gerador

Mês de enfrentamento do Mal de Alzheimer


PRIMEIRO FOCO AGÊNCIA VALE

MUNDURUKU

VOZES ANCESTRAIS O livro “Vozes Ancestrais”, do paraense Daniel Munduruku, que pertence à etnia indígena Munduruku, reúne dez contos de diversos povos indígenas do Brasil. A obra, voltada para o público infantil, mostra também as principais características de cada povo. Entre as temáticas do livro estão explicações para a origem do mundo, a relação entre ser humano e natureza e os rituais sagrados de cada etnia.

PUPUNHEIRAS

DOMESTICAÇÃO Segundo pesquisas realizadas por Margaret Cymerys e Charles Clement, do Instituto de Pesquisas da Amazônia (Inpa), as pupunheiras estão entre as primeiras plantas domesticadas pelos indígenas, há milhares de anos. Mas, segundo o estudo, o uso do fruto da planta como alimento se deu muitos anos depois.

AMEAÇA

MACACO-DE-CHEIRO O macaco-de-cheiro-da-cabeça-preta (Saimiri vanzolinii), encontrado apenas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, está preocupando pesquisadores. O motivo é que os indivíduos dessa espécie vivem restritos a uma pequena área na unidade de conservação. Os pesquisadores acreditam que o local de ocorrência da espécie vem reduzindo ao longo dos anos, o que pode levar, consequentemente, à diminuição da sua população.

POAIA

PRESERVAÇÃO Com o intuito de preservar espécies de poaia, planta muito comum em alguns locais do Brasil, alguns estudos estão em andamento na Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat). A planta está classificada como vulnerável a extinção e o intuito do estudo é entender os efeitos das mudanças climáticas sobre essas espécies, além de descobrir como essas alterações contribuem para o desaparecimento da planta. 12 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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BOTÂNICA

ITV cria aplicativo para agilizar identificação de espécies

Uma tecnologia que está em desenvolvimento pelo Instituto Tecnológico Vale (ITV) de Belém vai acelerar a identificação de diversas espécies de plantas. É o “Digital Plants”, um sistema capaz de levantar, a partir de uma simples fotografia de uma folha, diversas informações sobre a espécie como nome, família, local, periodicidade, ameaça de extinção e muitos outros dados. O sistema reúne uma base de dados que pode ser usada mesmo em um ambiente sem sinal de internet. “O botânico da Vale poderá levantar informações sobre a planta no exato momento em que encontrá-la no campo. Isso representa um ganho enorme no tempo de identificação das espécies”, explica Schubert Carvalho, coordenador do projeto (foto acima). Em desenvolvimento desde outubro de 2013, o Digital Plants

poderá ser utilizado como ferramenta auxiliar em trabalhos de licenciamento ambiental. A Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Universidade Estadual Paulista (UNESP) são parceiras no projeto. Segundo Schubert Carvalho, a atual base de dados do Digital Plants consegue identificar onze espécies de plantas da vegetação rasteira típica de regiões onde surgem depósitos de minério de ferro. A ideia é incluir outras espécies da flora ao longo do tempo.


ELESSEACHAM POR QUE MIMETISMO É UMA COISA NATURAL

COBRA PRETA

Espécie de serpente rara é registrada pela 1ª vez no Acre completamente inofensiva, não morde, não tem peçonha e se alimenta de pequenos animais que vivem no folhedo da floresta”, detalhou o pesquisador e especialista em répteis e anfíbios. A descoberta do animal é resultado da pesquisa intitulada “Inventário da Herpetofauna – Anfíbios e Répteis – da Estação Ecológica Rio Acre”, que envolveu seis investigadores, entre analistas ambientais do ICMBio e pesquisadores de universidades parcerias. A descoberta também foi transformada em artigo científico, publicado no fi nal de 2016. Esta foi a primeira vez que a espécie foi encontrada no Acre e a sétima vez que foi localizada no Brasil. Outros 19 exemplares de Ninia hudsoni já foram encontrados em territórios da Amazônia Internacional no Peru, Equador e Colômbia.

FERNANDO CARVALHO FILHO/ MPEG

Uma rara serpente de cor preta, cabeça branca e com cerca de 40 a 50 centímetros foi descoberta na Estação Ecológica Rio Acre, a 70 quilômetros de Assis Brasil, interior do Estado. O animal, que tem o nome científico de Ninia hudsoni (foto abaixo), foi achado por pesquisadores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). De acordo com o analista ambiental Marco Antônio Freitas, um dos pesquisadores da equipe, a cobra é um animal noturno e terrestre que vive entre as folhas secas que caem no chão da floresta. “É uma serpente rara por natureza, pouco conhecida pela ciência e não é ameaçada de extinção”, explicou. “Ela é inteiramente negra no dorso, com a cabeça e barriga branca. As escamas são acarenadas, que dá o aspecto áspero ao toque. É

Quase uma folha viva Muitos animais utilizam o recurso da camuflagem com folhas verdes e secas como mecanismo para não serem vistos e terem sucesso, tanto para não serem predados como para surpreenderem suas presas. Isso lhes permite concluírem o seu desenvolvimento. As formas adultas têm ICMBIO / DIVULGAÇÃO

um papel decisivo de acasalar e concluir o processo de reprodução. Os insetos apresentam formas surpreendentes e fantásticas de camuflagem com folhas. Eles simulam folhas verdes, que foram roídas por outros insetos, atacadas por fungos e que estão secando em parte. E também imitam folhas secas, retorcidas, aos pedaços e muitas outras formas. Outro aspecto surpreendente é que os insetos apresentam nervação como as folhas, simulando as nervuras das espécies de plantas mais comuns do ambiente onde vivem. Algumas espécies também apresentam comportamento associado à camuflagem. Ficam estáticos, confiando no disfarce. Alguns, quando percebem que foram avista-

PAISAGEM

Redução no planeta

dos ou quando molestados, deixam-se cair de lado e se fingem mortos, o comporta-

A área intacta da paisagem florestal mundial, sem nenhum sinal de atividade humana, caiu

mento é chamado de tanatose.

7,2% no período de 2000 a 2013. Os dados foram publicados na revista científica Science

Os insetos conhecidos vulgarmente como es-

Advances. A descoberta foi feita pelo professor de geografia Peter Potapov, da Universidade

peranças, da família Tettigonidae, apresentam

de Maryland, nos Estados Unidos. Para coletar os dados o pesquisador e sua equipe

vários gêneros com espécies que se camuflam

utilizaram imagens de satélites do Google Earth e dados do governo para monitorar as

com folhas. POR INOCÊNCIO GORAYEB

mudanças nestes anos. FEVEREIRO DE 2017

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FATO REGISTRADO

Uma aula com um o dr. Junk

INOCÊNCIO GORAYEB

TEXTO INOCÊNCIO GORAYEB

Esta é uma foto feita em 1977, dentro de um barco que viajava pela várzea do rio Solimões, nas proximidades de Manaus. Na ocasião, o dr. Wolfgand J. Junk ministrava aula para alunos dos cursos de mestrado do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Esses alunos eram das primeiras turmas dos cursos de Botânica, Ecologia, Entomologia e Ictiologia, ramo da zoologia que estuda os peixes. Dr. Junk foi orientado em seu doutorado pelo famoso dr. Harald Sioli e possui uma extensa lista de méritos e destaques. Entre os títulos de Junk estão professor emérito 14 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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do Instituto Max Planck de Limnologia na Alemanha; pesquisador, por muitas décadas, do Instituto Nacional da Amazônia, em Manaus; e recebeu a Ordem de Mérito de Primeira Classe da Presidência da Alemanha, em 2008, pelo agradecimento ao esforço incansável e persistência na investigação da Amazônia Sul-americana e planícies tropicais. Junk também está entre os principais ecologistas tropicais do mundo em pesquisas da Amazônia. Ele acrescentou fundamentos indispensáveis para a gestão ecológica da água, foi um dos peritos de

inquérito alemão para a proteção da atmosfera da terra e contribuiu fortemente com a cooperação Alemanha-Brasil. Dr. Junk também foi coordenador da Ictiologia do Inpa, e criou o departamento e a pós-graduação em Hidrologia e Pesca de Água Doce no Instituto. O estudioso também liderou o grupo de Ecologia Tropical do Instituto Max Planck e formou pelo menos duas gerações de cientistas estudiosos da Amazônia. Além disso, foi editor, por anos, da revista Amazoniana, membro da Academia de Ciências de São Paulo, além de muitos outros destaques.


PERGUNTA-SE É PRECISO ESCLARECER MITOS E VERDADES

Quem come queijo tem perda de memória?

NATUREZA

Preservação da arara-azul é tema de amplo estudo cal pode ajudar por meio da preservação de árvores como o axixá, que é muito usada pela ave para a construção de seus ninhos. Segundo os pesquisadores, a preservação é fundamental pois, algum desequilíbrio muito grande do ambiente e mudanças climáticas muito graves, podem afetar a sobrevivência da espécie. “Se a gente cuida da arara, a gente cuida do nosso ambiente”, afirma Neiva Guedes, presidente do Instituto Arara-Azul. Ave símbolo do Brasil, a arara-azul quase foi extinta na década de 1980. Hoje existem aproximadamente 6.500 aves da espécie na Amazônia, no cerrado e no pantanal. O recente estudo realizado será transformado em livro. A obra deve conter imagens das espécies e seu habitat além dos dados coletados pelos pesquisadores durante os anos de estudo.

ALEXANDER YATES / WIKIMEDIA

A preservação da arara-azul (foto acima) foi tema de um estudo realizado durante três anos em Canaã dos Carajás, no sudeste do Pará. O município faz limite com o Mosaico de Carajás, um conjunto de quatro unidades de conservação e uma reserva indígena. O estudo foi coordenado pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), com apoio do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a mineradora Vale. Os estudos realizados na região revelaram os locais de ninhos dessas aves, o número de fi lhotes existentes e informações sobre a alimentação e modo de vida do animal. Os dados, além de possibilitarem a identificação de áreas com a presença da espécie, também são fundamentais para a conservação da arara-azul na área. A pesquisa ainda revelou que para proteger a espécie, a comunidade lo-

MANDE A SUA PERGUNTA Envie perguntas instigantes sobre hábitos, costumes e fenômenos da região amazônica para o e-mail: amazoniaviva@orm.com.br

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S0NY S0NY / FREEIMAGES

A lenda é antiga e não passa de mito ou brincadeira. Não se sabe como começou, mas queijo e outros produtos à base de leite não prejudicam a memória. Ao contrário, como esclarece Isabelle Silva de Oliveria, mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos e professora da Faculdade Maurício de Nassau. No máximo podem prejudicar quem tem intolerância a lactose e apenas no trato. digestivo. “Não há nenhum indício científico que comprove essa informação. Sabe-se, através de estudos sobre memória e nutrição, que o leite e o queijo são fornecedores privilegiados de cálcio e de fósforo, elementos importantes para o trabalho cerebral. O funcionamento do cérebro depende das escolhas alimentares corretas. Sempre tendo à mesa frutas, hortaliças, peixes e produtos in natura em geral, evitando açúcar, álcool e gordura, é possível manter a saúde mental por muitos anos”, diz a professora.


EU DISSE

“Se queremos evitar os piores cenários devemos atuar de modo audaz e imediato”

Robert Redford, ator e diretor de cinema dos EUA, ao anunciar que o Sundance 2017 terá, pela primeira vez, uma seção dedicada ao tema “Mudanças Climáticas”, com 14 filmes programados. DIVULGAÇÃO

“Neste país, já sobrevivemos a crises em que dizíamos ‘amanhã não terá amanhã’. Sobrevivemos. E estamos sobrevivendo. Acho até que, por estarmos num momento tão terrível, o que nos aguarda é uma boa saída.” Fernanda Montenegro, atriz, em entrevista ao jornal O Globo, sobre as crises que o Brasil enfrenta.

“Crianças ligadas a grupos armados precisam ser tratadas como vítimas”

Leila Zerrougui, representante especial da ONU para Crianças e Conflito Armado, em documento apresentado ao Conselho de Direitos Humanos, no qual a especialista pede aos países e aos envolvidos em conflitos que tomem medidas imediatas para acabar com as graves violações contra crianças.

“Diferentemente do sentimento de conformação que paira nos dias atuais, nossos antepassados lutaram por liberdade e fundamentalmente por dignidade” Phelipe Marques, ator paraense, durante a divulgação da peça “Cabanos”, encenada em comemoração aos 401 anos de Belém.

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APPLICATIVOS BOAS IDEIAS NUM TOQUE DE DEDOS

“O errado virou a regra e todo mundo passou a operar nessa regra.”

Google Translate Quem está em outro país e ainda não sabe bem o idioma, pode contar com essa ferramenta gratuita para iOS e

Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), durante o seminário Grandes Casos Criminais promovido pelo Conselho Nacional do Ministério Público, ao falar sobre a corrupção no Brasil.

Android. Basta apontar a câmera para a placa, aviso, letreiro ou qualquer outra coisa que precise de tradução e pronto: tradução instantânea! Contudo, é preciso baixar antes os pacotes de idiomas

“Nossa nação está mais dividida do que pensávamos”

que se pretende traduzir.

Hillary Clinton, candidata democrata à Presidência dos Estados Unidos, em pronunciamento após sua derrota para o republicano Donald Trump.

SAS Survival Guide Este app é um guia de sobrevivência, que DIVULGAÇÃO

pode ajudar numa emergência inesperada ou apenas para quem deseja fazer uma aventura mais radical e selvagem. Os tutoriais com imagens e vídeos foram desenvolvidos por um ex-soldado do Serviço Aéreo Especial e incluem dicas de como obter água, abrigo, fazer fogo, comunicação e primeiros socorros. Mas tudo bem didático para quem nunca teve treinamento militar. Disponível para iOS e Android.

“Os negros lidam com o fato de serem chamados de macaco há muito tempo e essa desumanização sempre foi um método de racismo e de subjugação das pessoas negras. Isso é parte da história da América e é parte do presente.” John Legend, cantor e compositor norte-americano em recente entrevista a revista Variety. Na ocasião, ele comentou o episódio em que foi chamado de “macaco” por um paparazzi.

Flush - Toilet finder Encontrar um banheiro público pode ser mais difícil do que se pensa, ainda mais no aperto. Mas com esse app gratuito para iOS e Android, eis que surge um mapa com mais de 200 mil banheiros públicos pelo mundo, fornecidos pelo serviço de mapas do Google e colaborações dos usuários. A lista está sendo sempre atualizada e pode ser usado mesmo sem conexão com internet. FONTES: PLAY STORE E ITUNES

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CURIOSIDADES DA BIODIVERSIDADE

Mutualismo entre embaúbas e formigas TEXTO E FOTOS INOCÊNCIO GORAYEB

As espécies interagem entre si de diversas maneiras e quando duas delas se mantêm associadas, de modo que ambas são beneficiadas de alguma forma, o tipo de interação é denominado mutualismo. Um exemplo de mutualismo defensivo é a interação entre formigas e plantas, comum em ambientes tropicais, onde ocorrem muitas espécies, de, no mínimo, 141 gêneros, em 47 famílias de plantas associadas às formigas. Plantas conhecidas como mirmecófitas possuem estruturas específicas para abrigar ninhos de formigas que conferem à planta defesa contra herbívoros. A lgumas espécies do gênero Cecropia (Urticaceae) apresentam caules ocos que proporcionam abrigo para o estabelecimento de formigas, especialmente as do gênero A zteca . A lém disso, a base dos pecíolos, haste que liga a folha ao caule da planta, apresenta uma região modificada conhecida como triquília, que produz corpúsculos müllerianos, que 18 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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são ricos em glicogênio e são considerados uma das principais fontes de a limento pa ra as formigas que habita m a pla nta. Em contrapa rtida, as formigas associadas à á r vore de Cecropia tendem a protegê-la cont ra o ataque de herbívoros e cont ra o estabeleci mento de pla ntas pa rasitas, como por exemplo, a lg umas espécies de trepadeiras. Fritz Muller pesquisou a simbiose de embaúba e formigas. Qualquer tipo de lesão nas folhas

de plantas mirmecófitas desencadeia o recrutamento de operárias ao local lesado. De fato, as formigas A zteca sp . residentes em Cecropia pachystachya respondem aos compostos voláteis liberados pelas folhas atacadas por herbívoros e como resposta a essa sinalização ocorre o recrutamento de grande número de operárias para as folhas danificadas. No Brasil, as ár vores pertencentes ao gênero neotropica l Cecropia (Urticaceae) são conhecidas popula rmente como embaúbas. Esta denominação provém do termo “a mba íba”, que no tupi signif ica á r vore oca, uma referência aos caules ocos destas espécies onde formigas, principa lmente as do gênero A zteca , da subfa mília Dolichoderinae, podem se abriga r e proteger a pla nta contra predadores. O gênero Cecropia consiste em cerca de 60 espécies distribuídas entre o sul do Méx ico e o norte da Argentina. No Brasil ocorrem 26 espécies de embaúbas.


DESENHOS NATURALISTAS

CONCEITOSAMAZÔNICOS O VOCABULÁRIO REGIONAL É UM PATRIMÔNIO

Aruá É uma palavra que vem do tupi “aru’á” ou “uru’á”. Aruá é o nome popular de um molusco gastrópode da família Ampularidae, encontrado em rios e lagoas da América do Sul. Eles são também conhecidos como arauá, fuá, ampulária e caramujo-do-banhado. Outros caramujos também são chamados de aruá, como o caramujo-neretina ou caramujo-do-mangue, das espécies

Neretina zebra e Neterina virginea. Mas a palavra também dá nome à etnia Aruá, de Rondônia, que habitava e ainda

GRAVURA DE M. MEE / REPRODUÇÃO / ACERVO DO MUSEU GOELDI

Relato dos primórdios do Sairé “Todo ano há um grande festival em homenagem ao Santo Patrão. Por duas ou três semanas antes, uma pequena capela é iluminada todas as noites e as pessoas se reúnem para uma espécie de reunião de canto. As mulheres se ajoelham devotamente no chão enquanto três homens, diante do pequeno santuário, seguem em seus cantos simples. Todas as pessoas sabem estes hinos de cor. Eles cantam muito doce e claramente por meio de vozes não treinadas. Os homens se ajoelham com as mulheres para repetir a oração do Senhor então, todos beijam o cinturão do santo e deixam suas contribuições: algum dinheiro para comprar açúcar e rum para a festa. Depois disso, eles saem para casa de um vizinho e ficam uma ou duas horas dançando. O grande festival começa no sábado a noite. Durante o dia, festas estão acontecendo em todas as direções. Cada casa está cheia de convidados e muitos balançam as mãos com ramos de árvores. Todos participam do final e saúdam devotamente o santo, então a dança começa em várias casas ao mesmo tempo e continua, com pou-

cas interrupções, até terça ou quarta-feira. No domingo a noite, as mulheres mais velhas tomam a sua vez no Sairé, cerimônia inventada ou adaptada pelos primeiros missionários jesuítas. As mulheres passam de casa em casa, duas delas em frente carregando uma armação arqueada, envolvida por uma cruz, que é lindamente ornamentada. Uma fita é amarrada a cruz por uma terceira mulher, que sempre caminha mais atrás”. Estas são palavras traduzidas do texto escrito por Herbert H. Smith, naturalista americano que trabalhou a fauna e flora do Brasil em 1879, em seu livro “Brasil, the Amazon and the Coast”. A figura é um desenho apresentado no livro e é considerada a primeira figura sobre o Sairé. O Festival do Sairé é uma festividade de caráter religioso introduzido nas missões religiosas da Amazônia pelos jesuítas, no século XVII. Em 1943, a festividade foi suprimida por ordem dos religiosos franciscanos e voltou a acontecer na década de 70, já desprovida de seu caráter religioso original. POR INOCÊNCIO GORAYEB

habita a região do rio Guaporé. Na Amazônia, o termo é usado popularmente para referir um indivíduo ingênuo, lento, lerdo, “abestado” e facilmente enganado. Exemplos de aplicações da expressão: “Só mesmo um aruá como o Zezinho para emprestar dinheiro para o velho Zico”; “Tu és um aruá, a caça aí dando sopa e tu olhando a borboleta azul passar”; “Vacilaste com teu celular na rua. Por causa de aruás como tu é que os ladrões enchem o papo”.

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OLHARES NATIVOS

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Partidas e chegadas Vêm pelos barcos, pelas canoas e rabetas, os frutos da terra e o alimento dos rios. Chegam ao porto, pelos trapiches e pelas beiradas, as histórias dos homens que enfrentaram os mares. Bem-vindo, Ver-o-Peso. FOTO: OSWALDO FORTE FEVEREIRO DE 2017

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OLHARES NATIVOS

À margem da baía

Gente do interior, da pesca, da cidade, dos subúrbios e do centro. Pessoas vendendo, comprando e transitando. É essa a dinâmica intensa das beiras do Guajará. FOTO: EDUARDO SOUZA

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Peso na cabeça A rasa é a unidade de medida que regula o preço por quantidade de açaí em caroço. Milhares delas viajam do interior ribeirinho para a capital, e o preço varia conforme os meses de pico da safra. A rasa, que serviu para uma antiga decoração nos ônibus de Belém. FOTO: EDUARDO SOUZA

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OLHARES NATIVOS

Divino dendê

Os periquitos fazem a festa se alimentando dos frutos no cacho da palmeira-de-dendê (Elaeis guineenses). Essa palmeira é originária da costa ocidental da África, mas é muito plantada na Amazônia brasileira, para produção de óleo-de-palma, fabricação de margarina, biodiesel, sabão, velas, graxas, lubrificantes e outros produtos. FOTO: EVERALDO NASCIMENTO

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Paraíso no nordeste paraense

Esta é uma cena característica da zona costeira amazônica, mas as carroças enfeitadas são especiais da vila de Algodoal, na ilha de Maiandeua, no município de Maracanã. Muita praia, manguezais, trilhas, passeios de carroça, de canoa e pesca. Muito reggae, carimbó, tecnobrega e beleza natural. FOTO: JOÃO GONZAGA

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OLHARES NATIVOS

Andança e defeso

Os caranguejos, neste período de inverno amazônico, saem de suas tocas para a festa da andança. Parecem embriagados pela lua neste ritual de reprodução. Esta época é também o período de defeso, importante, porque o Amapá, Maranhão e Pará abastecem o Brasil inteiro. Na imagem, estes já estão confinados à venda no mercado. FOTO: FERNANDO SETTE

Envie as suas fotos para a seção Olhares Nativos

Para participar da seção “Olhares Nativos” da revista Amazônia Viva basta enviar fotos com temática amazônica para o e-mail amazoniaviva@orm.com.br acompanhadas pelo nome completo do autor, número de identidade e uma breve informação sobre o contexto do registro fotográfico. As imagens devem ser autorais e com resolução de no mínimo 300 dpi. A publicação das fotos tem fins meramente de divulgação de trabalhos profissionais ou amadores, não implicando em qualquer tipo de remuneração aos autores. Participe!


OPINIÃO, IDENTIDADE, INICIATIVAS E SOLUÇÕES SÔNIA VILL/ INSTITUTO MAMIRAUÁ

IDEIASVERDES

Ele quer proteção ESTE PEIXE-BOI É UM DOS MUITOS MAMÍFEROS AQUÁTICOS RESGATADOS NA AMAZÔNIA E QUE PRECISA SER PRESERVADO

PÁGINA 32

CÓDIGO FLORESTAL

BELÉM 401 ANOS

A pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental Joice Nunes Ferreira aposta na regularização ambiental para o campo ser sustentável. PÁG.28

Acompanhe a parte final da reportagem sobre o papel dos missionários religiosos na formação da capital paraense desde a sua fundação. PÁG.40


ENTREVISTA

U

ma das preocupações atuais com relação à Amazônia refere-se ao processo de regularização ambiental. Com tantas regulamentações surgindo, as dúvidas são constantes. O atual Código Florestal, que entrou em vigor em 2012, prevê algumas regras sobre quais áreas devem ser preservadas, e como o território brasileiro pode ser explorado – sem prejudicar os biomas. Com o objetivo de colaborar com a preservação da biodiversidade local, a Rede Amazônia Sustentável (RAS) elaborou um estudo acerca das reservas legais no Estado. Na entrevista a seguir, a bióloga Joice Nunes Ferreira, doutora em Ecologia, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental e uma das coordenadoras da RAS, levantada questões sobre os mecanismos de proteção à Amazônia previstos no Código, além das recomendações da Rede para uma regularização ambiental eficaz na região. O atual Código Florestal, de 2012, prevê alguns mecanismos de proteção a reservas legais, com diferenças para a Amazônia e outros biomas. Quais os principais pontos do Código para a proteção dessas áreas? A Reserva Legal - área de cada imóvel rural que deve, obrigatoriamente, ser conservada com vegetação nativa – é um dos mecanismos principais de proteção no Código Florestal brasileiro. O tamanho da Reserva Legal varia muito em função de diferentes fatores. Na Amazônia Legal, as propriedades situadas em sua porção florestal devem conservar 80% de sua área, mas ela cai para 35% ou 20% nas regiões não florestais, que são encontradas principalmente nas zonas de transição do bioma. Já as propriedades localizadas nos demais biomas brasileiros devem conservar apenas 20% como Reserva Legal. É importante observar que, mesmo onde a 28 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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“A agropecuária tem um papel chave na conservação” A DOUTORA EM ECOLOGIA JOICE NUNES FERREIRA, PESQUISADORA DA EMBRAPA AMAZÔNIA ORIENTAL E UMA DAS COORDENADORAS DA REDE AMAZÔNIA SUSTENTÁVEL, DEFENDE A REGULARIZAÇÃO AMBIENTAL NO CAMPO COMO UM CAMINHO EFICIENTE PARA A SUSTENTABILIDADE NO PARÁ TEXTO CAMILA SANTOS FOTO EVERALDO NASCIMENTO


ONONNONONONONO

A sustentabilidade deve, também, se agregar aos efeitos socioculturais, sendo sensível à cultura e à dinâmica das comunidades. O turismo comunitário no Marajó é um exemplo disso.

lei exige a conservação de 80%, essa área pode eventualmente ainda ser reduzida para até 50%, a depender do grau de modificação da região e da existência de Unidades de Conservação e Terras Indígenas no território, etc. Embora a vegetação da Reserva Legal

não possa ser desmatada, ela pode ser explorada economicamente, desde que sob condições especiais. A exploração dessa parcela da propriedade rural requer procedimentos, tanto no pedido de licença dos órgãos ambientais quanto na adoção de técnicas adequadas que garantam

que a vegetação não seja descaracterizada e que sua biodiversidade seja preservada. Em suma, esses mecanismos foram determinados para que a Reserva Legal cumpra seu papel de conservar a flora e a fauna nativa e seus serviços ecológicos que resultam, por exemplo, em maior qualidade do ar, manutenção da quantidade da água, produção de alimentos, etc. O Código Florestal consegue ser totalmente eficiente na tarefa de evitar riscos ambientais? Para a Amazônia, como fica esse cenário? Quais os benefícios? O Código Florestal é muito importante na medida em que ele consiste na principal diretriz para a proteção da vegetação nativa do país. Entretanto, para que qualquer legislação funcione perfeitamente, há muitos fatores condicionantes. É necessário, antes de tudo, que os envolvidos conheçam bem as regras impostas pela lei, que tenham boa aceitação dessas regras e, especialmente, que tenham plenas condições para cumpri-las. Acontece que a implementação do Código Florestal foi marcada por problemas em vários destes aspectos ao longo dos anos, o que explica o nível muito baixo do cumprimento da lei que podemos observar ainda hoje. Obviamente, o monitoramento e controle para averiguar o cumprimento e tomar as medidas cabíveis caso a lei não seja cumprida é um aspecto chave para garantir a sua eficácia. É fundamental o monitoramento e controle quanto ao cumprimento do Código realizados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). Outro aspecto importantíssimo é a capacidade limitada de muitos proprietários rurais em adotar práticas agropecuárias mais sustentáveis, por falta de recursos ou falta de conhecimento técnico, dentre outros aspectos. Essas práticas sustentáveis são fundamentais para levar a eficiência produtiva e assim salvaguardar áreas para conservação ambiental. Essa realidade não pode ser ignorada no contexto do cumprimento da lei, especialmente de grupos mais vulneráveis, como a agricultura familiar. FEVEREIRO DE 2017

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ENTREVISTA

Como vem sendo realizada a regularização ambiental na Amazônia? Quais são as principais dificuldades detectadas pela RAS para que essa regularização aconteça de maneira positiva? Quais os caminhos para que essas dificuldades possam ser superadas? A regularização ambiental na Amazônia, assim como no restante do país, ainda está dando seus primeiros passos. A inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR) é a primeira etapa do processo de regularização. A partir do CAR é que são contabilizados os passivos e ativos ambientais de cada imóvel rural. Caso existam passivos ambientais em relação às Áreas de Preservação Permanente, Reserva Legal ou outras áreas de Uso Restrito, segue-se, então, para a adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) que cada Estado deve regulamentar. O Pará saiu na frente lançando, em 2015, o decreto com as diretrizes para a regularização ambiental do Estado. Entretanto, embora o CAR esteja bastante avançado em muitos municípios, o seu andamento varia entre os diferentes locais e ainda tem muitas pendências a serem resolvidas. A conclusão do CAR é uma condição básica para que a regularização ambiental deslanche e cumpra o seu papel de recuperar as áreas que foram modificadas em não conformidade com a lei. A recuperação ambiental pode ser realizada pela recomposição ambiental (na qual se faz plantios), pela regeneração natural (consiste em assegurar o crescimento das capoeiras que estão crescendo espontaneamente) ou pela compensação (negociando áreas de florestas “excedentes” em outras propriedades por meio das Cotas de Reserva Ambiental). Percebemos que, muitas vezes por desconhecimento ou outro tipo de barreira, a recomposição de áreas por plantios é a única opção acatada pelos técnicos e proprietários de terra. Embora os plantios florestais sejam vantajosos em permitir a escolha específica de espécies de plantas de maior interesse, ainda há limitações importantes, como altos custos financei30 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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PRESERVAR PARA CULTIVAR

A bióloga Joice Nunes Ferreira, da Rede Amazônia Sustentável, diz que embora a vegetação da Reserva Legal não possa ser desmatada, ela pode ser explorada economicamente, desde que sob condições especiais

ros e a limitação de infraestrutura como a existência de viveiros que disponibilizem mudas. Evitar que as florestas se degradem constitui mecanismo com grandes benefícios ambientais em relação a um menor custo financeiro e, portanto, deveria ser melhor explorado na busca pela sustentabilidade. Enfim, a recomposição florestal através de plantios de espécies nativas deve ser considerada de forma complementar à proteção de florestas primárias, especialmente nas regiões mais desmatadas. Como funciona a compensação dos déficits ambientais no Estado? Quais medidas poderiam ser utilizadas para assegurar a compensação em ambientes com maiores riscos de desmatamento, e que impactos a implementação dessas medidas traria para a região? A legislação permite a compensação dos déficits ambientais usando outras áreas em qualquer local do bioma. Ou seja, propriedades que tenham proporção de vegetação nativa além do que é exigido na lei podem instituir a Cota de Reserva Ambiental (CRA), a partir do seu registro no CAR, e estas cotas podem ser negociadas. Entretanto, os estudos desenvolvidos por pesquisadores da RAS mostraram que essa flexibilidade na lei, ainda que constitua uma facilidade em muitos aspectos, pode, eventualmente, terminar em resultados bastante limitados ou até nulos para a conservação ambiental. Isso ocorre porque para fins de regularização ambiental, o proprietário de terra com saldo negativo de Reserva Legal tem a obrigação de recompor somente até 50% de sua área. Quando

o dono da terra possuir mais de 50% de sua área como reserva legal (até atingir 80%), esse saldo pode ser disponibilizado para compensação. Em se tratando de propriedades pequenas, a lei permite comercializar toda a sua área de reserva legal. Outro aspecto evidenciado nas pesquisas

“Fazemos duas recomendações essenciais em relação à compensação de Reserva Legal – priorizar o mecanismo em áreas sob risco de desmatamento e realizar a compensação entre áreas o mais próximo possível” é que, no Estado do Pará, o excedente total de Reserva Legal (12,6 milhões de hectares) é mais de cinco vezes maior que o déficit (2,3 milhões de hectares). Essa avaliação indica que o excedente de Reserva Legal existente no próprio Estado é suficiente para

compensar todo o seu déficit e ainda restariam 10,3 milhões de hectares, que, pelas regras do Código Florestal, poderiam compensar o déficit de outros estados da Amazônia. Esta avaliação da disponibilidade de florestas revelou que todos os déficits de Reserva Legal no Estado do Pará podem ser compensados dentro do próprio município ou em municípios vizinhos. Portanto, não seria necessário utilizar áreas distantes para efetuar a regularização ambiental, o que constitui uma boa notícia para a conservação, já que áreas próximas têm mais semelhança ecológica e facilitam a conectividade entre florestas. Em resumo, fazemos duas recomendações essenciais em relação à compensação de Reserva Legal – priorizar o mecanismo em áreas sob risco de desmatamento e realizar a compensação entre áreas o mais próximo possível. Qual a importância do envolvimento dos produtores rurais nas políticas públicas para a conservação dessas áreas? Eu diria que o envolvimento dos produtores rurais é fundamental. A agropecuária tem um papel chave na conservação, seja pela extensa área que ocupa, pela relevância do setor agrícola para a economia em nosso país e também pelo seu potencial de melhorar a partir da mudança e da adoção de boas práticas. Para que qualquer política pública funcione, é essencial que os atores envolvidos tenham ampla participação, conhecimento e aceitação. Somente com o envolvimento dos interessados é que as regras poderão ser moduladas para trazerem um bom custo-benefício nas iniciativas de regularização. FEVEREIRO DE 2017

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CAPA

Resgate

amazônicas NAS ÁGUAS

ESPÉCIES AQUÁTICAS, COMO BOTOS, TARTARUGAS-MARINHAS E PEIXES-BOIS, SÃO RECUPERADAS E TRATADAS POR EQUIPES DE CIENTISTAS, QUE SE EMPENHAM EM REVERTER A AÇÃO IRRACIONAL DO HOMEM CONTRA A NATUREZA NA REGIÃO TEXTO SÁVIO SENNA

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E GABRIEL MELO SANTOS-BIOMA / DIVULGAÇÃO

ra noite de maré cheia enquanto ela nadava pelo Oceano Atlântico. A agitação das águas levou a correnteza para as proximidades da praia de Ajuruteua, município de Bragança, nordeste paraense. A tartaruga-marinha nem percebeu quando ficou presa à rede de pesca, que feriu seu pescoço, quase que de uma nadadeira à outra. Acordou já na areia bastante cansada, com um grupo de pescadores lhe ajudando. Em seguida, veio o Corpo de Bombeiros e a resgatou, levando-a até o Ambulatório de Animais Selvagens, na Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), em Belém. Dez dias depois, a tartaruga, batizada de Donatella, teve que passar por uma cirurgia de amputação da nadadeira esquerda, pois teve osteomielite, uma inflamação no osso. Com o apoio do Grupo de Pesquisa BioMa - Biologia e Conservação de Mamíferos Aquáticos da Amazônia, Donatella agora segue em atendimento no Hospital Veterinário da Ufra, até que esteja pronta para voltar ao ambiente natural ou ser transferida para algum centro de reabilitação no Brasil. Além das tartarugas-marinhas, também ocorrem eventualmente situações de encalhe de baleias, botos e peixes-bois na região costeira amazônica. Em consequência da estiagem, da colisão com bancos de areia ou das armadilhas de pesca, como redes e currais, as vítimas ficam presas e debilitadas quando chegam à praia. Por isso é essencial rapidez quando há uma emergência e ao mesmo tempo tranquilidade, evitando aglomerações de curiosos ou uma ocasião estressante. “A chance do animal encalhar já morto existe e caso chegue vivo, morre rapidamente porque vai comprimir todos os órgãos, como o pulmão, contra o chão. Imagina o peso desse animal fora d’água! Então, a comunidade pode colaborar durante o resgate isolando a área, evitando que as pessoas fiquem molestando, fazendo selfie, subindo ou até amarrando o animal. Se a gente não der esse atendimento imediato, não vamos conseguir salvá-lo”, alerta a bióloga Angélica Rodrigues, que também faz palestras em escolas e colônias de pescadores com recomendações e oficinas à comunidade sobre o tema. As atividades de educação ambiental são realizadas durante o período de expedição do BioMa, grupo de pesquisa ligado à Universidade Federal do Pará e Ufra, do qual a bióloga faz parte. FEVEREIRO DE 2017

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Dependendo do registro de incidência de encalhes, o BioMa realiza um cronograma de oficinas nas comunidades próximas, estabelecendo contato com secretarias e prefeituras. De 2012 a 2016, o BioMa realizou ações de monitoramento de praias ao longo da região costeira paraense, indo do município de Augusto Corrêa até Curuçá, com duas bases de pesquisa fixas. Lá, tinham a presença de profissionais de veterinária e biologia, além de um barco, um carro e um telefone para atender e localizar a aparição de espécies nas praias. “O BioMa surgiu da necessidade de um grupo de estudantes de mestrado e doutorado das Ciências Biológicas de fazer pesquisa na área de conservação de mamíferos aquáticos. Cada integrante trouxe experiência de outros projetos, de outros grupos de pesquisa e formalizamos o grupo no CNPq (Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico) inicialmente com quatro biólogos e depois fomos incorporando colegas de outras áreas e pesquisadores de outras instituições, dando uma dimensão multidisciplinar para o grupo”, conta a bióloga, que pretende transformar o BioMa em um instituto de pesquisa. Angélica trabalha com etnobiologia, uma interface da biologia que estuda a relação das pessoas com o meio ambiente. Ela pesquisa os conhecimentos sobre mamíferos aquáticos entre estudantes de escolas públicas de Abaetetuba, Marajó, Mocajuba, Santarém e da Região Metropolitana de Belém, a partir de redações, entrevistas, questionários e pranchas topográficas. Sua tese de doutorado revelou que o imaginário lendário sobre o boto é o mais difundido em nossa região, ligado, principalmente ao boto-vermelho, também conhecidos como boto-cor-de-rosa. Em seguida vem o boto-cinza. Além do conhecimento dos animais, Angélica também destaca os 34 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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ANDRÉ DIB - INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO

CAPA

ATENDIMENTO ESPECIALIZADO Mamíferos aquáticos, como o peixe-boi-da-amazônia, são resgatados e tratados por uma equipe de biólogos devidamente preparados

SOCORRO IMEDIATO Em caso de encalhe de tartarugamarinha, baleia, golfinho, botos ou peixe-boi é preciso agir da seguinte forma:

1 2

Ligar imediatamente para o projeto BioMA:

3

Até a chegada da equipe de resgate é preciso manter o animal

(91) 99250-3113 ou

protegido do Sol, molhado, com

(91) 99257-0613 [WhatsApp];

pano úmido por cima do corpo. Manter o orifício respiratório livre

É preciso aguardar a chegada da equipe de biólogos e veterinários responsáveis pelo resgate dos animais. Os profissionais podem

de obstáculos;

4

Evitar barulho e aglomerações.

ser facilmente identificados pelo uso de cami-

Evitar também tocar na boca e na

setas com o nome e o logo do grupo BioMA.

cauda ou tentar mover o animal.


UMA CHANCE DE SOBREVIVÊNCIA

FERNANDO SETTE

A tartaruga batizada de Donatella chegou muito debilitada ao Ambulatório de Animais Selvagens, da Ufra, onde recebeu atendimento veterinário.

FERNANDO SETTE

sentimentos de indiferença e medo, que surgem a partir do temor das lendas difundidas na Amazônia, com a ideia do boto como um animal encantado. “Essa relação pode ser usada nos programas de conservação, percebendo o boto como um ser mitológico. Quando a gente fala em boto as pessoas associam à lenda. Não estão pensando no animal, mamífero, que tem uma história de vida, um comportamento, que se reproduz e sofre ameaças. Então é difícil fazer um trabalho de conservação sem conhecer essas relações e o simbolismo que está em torno da espécie”, argumenta a doutora em pesquisa do comportamento pela UFPA. “Poder pensar o boto enquanto animal é um trabalho educativo que é construído com a comunidade, mostrando como que o conhecimento pode comprometer ou garantir a conservação animal, a partir do momento que percebemos que o boto tem uma importância ecológica”, complementa Angélica. Um local em que a integrante do BioMa viu uma relação mais harmoniosa entre humanos e cetáceos foi durante a visita ao Mercado Municipal de Mocajuba, nordeste paraense, onde crianças, feirantes e turistas estavam brincando e alimentando os botos. Porém, ela lembra, que por mais que haja boas intenções, a relação direta de alimentar artificialmente pode oferecer riscos à transmissão de zoonoses e condiciona o animal a receber alimento, deixando-o mais vulnerável. “É um animal silvestre, ou seja, é um animal que pode provocar algum acidente como a gente já registrou. Na hora de pegar o alimento o boto mordeu o dedo de uma criança. São dentes grandes, afiados e no momento da interação pode acontecer um acidente. Então a gente se preocupa em mostrar para comunidade que é preciso ter cuidado”, lembra a pesquisadora, que também trabalhou em parceria com estudantes de Engenharia da Computação da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará  (Unifesspa) de Marabá desenvolvendo um jogo educativo sobre os botos. FEVEREIRO DE 2017

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CAPA

NO RASTRO DOS BOTOS DA REGIÃO Enquanto Angélica Rodrigues coordena o Programa de Monitoramento de Praia, Gabriel Melo Santos, também biólogo e integrante do BioMa, coordena desde 2013 as ações do Programa de Monitoramento Acústico Passivo da população de botos de Mocajuba, que pertencem a uma espécie descrita recentemente e mesmo assim, já está em estado considerado crítico: o boto-do-araguaia. Por isso torna-se urgente a coleta de informações para o desenvolvimento de estratégias de conservação. Para realizar o monitoramento, a equipe utiliza um pequeno aparelho chamado DTAG, que possui um GPS para localização geográfica, um acelerômetro para medição de velocidade, um hidrofone para captação sonora, um sensor para definir a rotação do eixo do animal, um sensor de profundidade e quatro ventosas, para fi xação na superfície da pele. Como a DTAG transmite em tempo real é possível entender o que os animais estão fazendo naquele momento, naquela área, com quem eles estão interagindo e quantos animais estão presentes. Como os botos retornam regularmente ao Mercado de Mocajuba, é possível afi xar os dispositivos que irão rastreá-los e gravar as informações no aparelho. Além da DTAG, a expedição também é equipada com soundtraps, que são hidrofones fixos ao fundo do rio em âncoras, que ficam gravando os animais por dias. Após esse tempo, os aparelhos são retirados da água e os dados são transferidos para análise em computador, verificando de que forma os botos utilizam cada ambiente. Além da coleta de dados submer36 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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PRESENÇA NAS ÁGUAS Conheça as principais espécies de botos amazônicos BOTO-VERMELHO (Inia geoffrensis, Inia boliviensis, Inia araguaiensis)

É descendente de uma espécie oceânica que invadiu os rios da Amazônia há muitos anos. É o maior boto de água doce, com média de 2,5 m e 170 kg. Possui o melão (estrutura correspondente à testa do animal) mais proeminente e a nadadeira dorsal similar a uma quilha de barco, pequena, mas larga, e as nadadeiras peitorais grandes, o que lhe dá bastante agilidade. Possui o corpo robusto, bastante hidrodinâmico e flexível. Por ter as sete vértebras cervicais não-fusionados tem a capacidade de mover a cabeça em todas as direções. Apesar dos olhos pequenos, tem boa visão tanto fora quanto dentro d’água. Tem hábitos solitários, andando em grupos de no máximo três indivíduos. As espécies ocorrem no Rio Amazonas e Solimões, Boliviana e Araguaia.

Boto-tucuxi (Sotalia fluviatilis) Boto de água doce, também descendente de uma espécie de água salgada, porém mais recente. O tucuxi parece um golfinho pequeno, com cerca de 1,60 m e 40 kg, nadadeiras e bico pequenos e nadadeira dorsal triangular. O melão é redondo e bem definido e a face é curta e larga na base. Os olhos têm um contorno escuro, parecendo ser maiores. O tucuxi tem a vértebras fundidas e anquilosadas, reduzindo a flexibilidade e mobilidade da cabeça. Têm o hábito de viver em grupos e são muito sociáveis.

Boto-cinza (Sotalia guianensis) Tem características semelhantes a do boto-tucuxi, mas é um cetáceo de água salgada, com o comprimento que chega até 2,20 m, peso de 121 kg e longevidade de 30 a 35 anos. FONTE: ANGÉLICA RODRIGUES, DOUTORA EM TEORIA E PESQUISA DO COMPORTAMENTO (UFPA) E PESQUISADORA BIOMA E BIOSE (UFPA) / ILUSTRAÇÕES: WÜRTZ-ARTESCIENZ

sa, a equipe também desenvolveu uma estrutura de PVC para gravar os sons emitidos pelo melão dos botos, uma lente acústica na região da testa que os cetáceos utilizam para ecolocalização. A equipe também retirou amostras de pele e tecido para análises genéticas. O grupo também pensou em um dispositivo utilizando um aro de filtro de café para captar a respiração. Quando os animais vinham à tona, o aparelho era posicionado acima do espiráculo, o orifício dorsal usado na respiração, para coletar uma amostra de sopro, a fim de verificar bactérias, vírus, fungos e outros microorganismos presentes. O material já foi enviado ao Instituto Evandro Chagas para análise. Nesta última expedição, o BioMa também utilizou um drone para obter informações mais vastas do comportamento dos cetáceos, obtendo um ponto de vista mais amplo e panorâmico. Antes, o grupo fazia o monitoramento apenas usando barcos, com uma visão mais horizontal e limitada. Com as imagens do drone, o grupo pode estimar a população dessa espécie nos rios amazônicos. Após 15 dias de expedição, a próxima etapa da pesquisa para o biólogo Gabriel Melo Santos é ir à Escócia, onde fará um curso com o engenheiro Mark Johnson, o inventor da DTAG, que doou os aparelhos para o projeto. O encontro será na University of St. Andrews. Lá, junto de outros pesquisadores, Gabriel vai analisar as informações reunidas durante a ida à campo, além de um banco de dados extra que recebe de outros cientistas, que vai desde a Costa Rica, na América Central, até Santa Catarina, no Sul do Brasil, com a distribuição de botos ao longo da Amazônia inteira, passando em países como Equador, Peru e Venezuela. Com as informações, Gabriel Melo Santos poderá dizer como os animais conseguem navegar nesses


TARSO SARRAF / ARQUIVO O LIBERAL FOTOS: GABRIEL MELO SANTOS-BIOMA / DIVULGAÇÃO

APROXIMAÇÃO DENTRO D’ÁGUA

Pesquisadores do BioMa registram o comportamento dos botos no entorno do Mercado Municipal de Mocajuba. Lá, eles fixam dispositivos que irão rastrear os animais e gravar informações para as pesquisas.

ambientes aquáticos, pois nem sempre há iluminação na água, onde é bem profundo e escuro. No rio, a visão ainda pode ser mais turva e os organismos vão se desenvolver de uma forma diferente para navegar nesses ambientes. “Os botos e os golfinhos usam o som para navegar, emitindo um clique, que é igual um eco. Daí o som sai da cabeça e depois forma uma imagem como se fosse uma ultrassom do objeto, para saber se é de madeira, se é grande ou pequeno. Só que o sonar é muito mais sofisticado do que qualquer coisa que o homem possa fazer. Como os golfinhos marinhos não têm tantos obstáculos eles vão emitir um clique mais espaçado porque não precisam receber eco o tempo inteiro. Mas os botos emitem cliques muito mais rápidos, não têm nem um segundo entre um clique e outro. São tão rápidos que às vezes nem o nosso ouvido consegue perceber e se tu estiveres na água, sobe pelo pescoço até a orelha, tu sentes que o animal está localizando em cima de ti”, conta o pesquisador. Gabriel afirma que os botos são predadores do topo de cadeia alimentar e exigem do ambiente uma qualidade mínima, sendo bons indicadores de qualidade ambiental. “Os botos são sentinelas ambientais porque se eles estão ali significa que aquele ambiente ainda tem algo a oferecer em termos de diversidade e riqueza. Como é um mamífero grande, ele precisa comer o dia inteiro, exigindo muitos nutrientes. Eles controlam as populações de peixes e mantêm o equilíbrio (da cadeia alimentar) de cima para baixo. O fato de serem predadores faz com que qualquer tipo de contaminante lançado na água vá para o ecossistema e se acumule nos tecidos dos animais”, diz. “Por exemplo, mercúrio que vem das hidrelétricas, que é onde tem grande concentração na água parada. Com esse despejo os peixes consomem as algas ou qualquer zooplâncton que tenha mercúrio e passa para o peixe, depois outro peixe e aí vai acumulando, acumulando até os botos, fora o pesticidas como DTT. Com a acumulação, nós temos uma noção da quantidade acumulada no ecossistema de contaminantes, que vão atrapalhar a taxa de reprodução, tanto dos botos como dos peixes”, alerta Gabriel Melo Santos. FEVEREIRO DE 2017

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VÍTIMAS DO PROGRESSO

Espécies, como os peixes-bois, podem ter as populações extintas devido à instalação de grandes projetos, a exemplo da construção de hidrelétricas na Amazônia

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ANDRÉ DIB

SÔNIA VILL- INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO

AMANDA LELLIS - INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO

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Por mais que o mercúrio seja um metal naturalmente encontrado no ambiente, a formação de grandes lagos de represa para a construção de barragens, o alagamento de florestas, junto com a extração do ouro e o desmatamento na Amazônia são processos que concentram ainda mais o minério metálico no ambiente aquático. Conforme elucida a pesquisadora Miriam Marmontel, do Instituto Mamirauá, o ambiente amazônico vem sendo alterado pela implementação de grandes empreendimentos, aumento populacional, atividades pesqueiras, tráfego de embarcações de pequeno e médio porte, contaminação das águas por agrotóxicos e até atividades de turismo mal planejadas, alterando o comportamento das espécies que necessitam de alimento e tranquilidade para a reprodução e criação dos descendentes. “A planejada expansão da malha hidroenergética, seja de pequeno ou grande porte, ao longo das próximas décadas, especialmente nas bacias do Amazonas, Tocantins e Tapajós, acarretará significativa alteração e perda de habitat, assim como alteração no recurso alimentar, seja acima ou abaixo do barramento. Uma barragem modifica a vazão do rio, causando o permanente alagamento de alguns ambientes, enquanto outros podem não ser formados pela falta de água”, diz a pesquisadora. “As barragens, em geral, podem impactar a população de mamíferos aquáticos tanto por fatores físicos, ligados diretamente à construção de um barramento quanto pelas alterações químicas e biológicas que a instalação de uma estrutura como essa pode acarretar. Uma das consequências mais imediatas e visíveis é a separação de populações, uma vez que os animais ficam impossibilitados de ultrapassar a barreira física, 40 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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SÔNIA VILL- INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO

MONITORAMENTO DAS ESPÉCIES AQUÁTICAS

e ocasionando isolamento reprodutivo e genético de indivíduos. Isto pode reduzir a variabilidade genética das espécies, tornando-as mais suscetíveis a doenças e menos resilientes a quaisquer alterações ambientais”, pontua Miriam Marmontel. Daí a oceanógrafa lembrar a necessidade constante de avaliação da situação

atual das espécies, que precisam ser monitorados ao longo do tempo, desenvolvendo pesquisas acerca da biologia e dinâmica populacional de cada uma. Além de buscar conhecer não apenas distribuição, mas também abundância e aspectos reprodutivos, assim como apontar as ameaças específicas em cada região.


ANDRÉ DIB-INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO AMANDA LELIS-INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO

DE VOLTA PARA CASA

Após serem resgatados, os animais são reintroduzidos à natureza para voltarem a se adaptar em seu habitat

AMANDA LELIS-INSTITUTO MAMIRAUÁ/ DIVULGAÇÃO

“Apenas de posse do conhecimento podem-se traçar ações de manejo ou conservação que sejam benéficas às espécies e às populações humanas locais. Os principais centros de pesquisa atualmente concentram-se em torno de grandes cidades amazônicas, o que remete à necessidade de se expandir as pesquisas para outros estados da região e para interiorizar os esforços de pesquisa para locais ainda não amostrados ou estudados”, diz a pesquisadora. No Amazonas, afirma Miriam, destacam-se o Instituto Mamirauá de Desenvolvimento Sustentável, que trabalha com os três grupos de mamíferos aquáticos há mais de duas décadas e já gerou informações relevantes quanto a aspectos populacionais de botos e ariranhas, e realiza resgate e reabilitação de peixes-bois em ambiente seminatural. Ela também destaca a atuação do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), que tem projeto de longo prazo com botos na Reserva Mamirauá e acompanha a população de ariranhas do lago de Balbina. O Instituto Mamirauá também mantém um núcleo de estudos no Amapá, realizando os primeiros levantamentos e pesquisas de mamíferos aquáticos naquele Estado. O Pará conta com dois grupos de pesquisa, apoiados pelo Museu Paraense Emílio Goeldi e pela Universidade Federal do Pará, que concentram seus esforços na região de Belém e entorno. “Percebe-se como a área de atuação ainda é bastante limitada e restrita, e a necessidade de se ampliar os esforços e área de atuação”, diz a oceanógrafa. A costa amazônica é um oceano de conhecimento e biodiversidade, que não deve ser barrado de correr em direção à sensibilização da população para a importância da conservação ambiental. Apenas com o estruturação de cada vez mais grupos de pesquisa é que nossas espécies estarão mais longe de padecer à beira da praia. FEVEREIRO DE 2017

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HISTÓRIA

E a missão continua...

Parte final da reportagem sobre o legado das primeiras denominações religiosas em Belém apresenta a herança deixada pelas religiões não católicas na Amazônia TEXTO SÁVIO SENNA FOTO CARLOS BORGES

A

carta régia de Abertura dos Portos às Nações Amigas de 1808 e o Decreto de 1814, que abria os portos em caráter definitivo a todas as nações sem exceção, assinados pelo príncipe regente D. João VI, colocaram o Brasil na rota do comércio internacional. Países como Inglaterra, França, Gibraltar e Marrocos, além de importar e exportar mercadorias, estabeleceram novos fluxos migratórios para estas terras ultramarinas, 42 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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consequentemente abrindo novos horizontes religiosos para a região amazônica. Historicamente, após as missões do catolicismo romano, a segunda religião a chegar no Pará foi o judaísmo. A comunidade hebraica está presente desde os tempos coloniais, vindos como cristãos-novos. Convertidos ao cristianismo e com sobrenomes lusitanos fugiam das perseguições do Tribunal do Santo Ofício. Em um ambiente desfavo-

rável para a articulação grupal ou comunitária, apenas com a promulgação da Lei de 25 de maio de 1773, o Marquês de Pombal decretou o fi m da distinção entre cristãos velhos e novos. Oficialmente, a migração judaica para a Amazônia ocorreu em 1823, quando chegou por aqui José Benjó, o primeiro judeu, que se tem registro, a pisar em Belém. Benjó solicitou naturalização e licença para abrir uma casa comercial na Rua do Pelourinho,

A BELÉM DOS JUDEUS

Em 1889, foi fundada a segunda sinagoga no Pará, a Shaar Hashamain, que significa “Porta do Céu”. O templo fica na rua Arcipreste Manoel Teodoro, bairro de Batista Campos.


onde hoje fica a travessa Sete de Setembro, no bairro do Comércio. As primeiras casas de orações judaicas foram criadas em 1823 e 1826, já que não poderiam haver sinagogas, pois a Constituição Imperial reconhecia apenas a Igreja Católica como religião oficial do Estado. No ano seguinte, após a Adesão do Pará à Independência do Brasil, o marroquino Abraham Cris fundou a primeira sinagoga: Essel Abraham, nome que significa “Arvoredo de Abraham Abinu”, primeiro patriarca do povo judeu. Em 1889, foi fundada a segunda sinagoga, chamada Shaar Hashamain, que significa “Porta do Céu”. Décadas depois, várias famílias judias já residiam em Belém, majoritariamente originárias do Marrocos. Em 1842, surgiu o primeiro cemitério hebraico brasileiro, a Necrópole Israelita. A primeira sepultura foi aberta para o rabino Mordecai Hacohen, falecido em 1848, provavelmente um dos primeiros rabinos vindos com a imigração. O segundo cemitério foi o Judeu Antigo do Guamá, onde foi enterrado o primeiro judeu morador de Belém, José Benjó. Segundo o pesquisador Eldorfe Moreira (1912-1989), também há uma hipótese da presença hebraica na região amazônica a partir de supostas ligações entre os povos pré-colombianos e os antigos hebreus. A teoria surge a partir de uma suposição bíblica e comparações entre as línguas indígenas e semíticas. Um dos defensores desta tese, Henrique Onffroy de Thoron, diz que “o rio das Amazonas, desde a embocadura do Ucayali até a foz do Rio Negro, traz ainda o nome de Solimões: não é nem mais nem menos que o nome viciado de Salomão, dado ao rio das Amazonas pela frota do grande rei que dêle tomou posse: em hebráico Solima e em árabe Soliman. Ora, os cronistas da conquista do rio Amazonas contam que, ao Oeste da Província do Pará existia uma grande tribo como o nome de Soliman, nome que tinha o rio: pois na América as correntes d’água tiram os nomes das tribos que a habitam. Daí também os portugueses terem feito Solimão porque costumam mudar o ‘n’ final em ‘o’,” defende o etnólogo francês.

MISSIONÁRIOS NA AMAZÔNIA

Fundada no começo do século XX, a primeira Igreja da Assembleia de Deus em Belém marca o início da missão pentecostal no Pará

A CHEGADA DOS PROTESTANTES

Quando o americano Daniel Parish Kidder pisou na Amazônia, relatou que quase todas as igrejas do Pará estavam em ruínas, em 1839. Segundo o missionário metodista nova-iorquino, entre as 90 paróquias da cidade, só 37 tinham vigários. Além disso, Kidder também demonstrava preocupação com o fato de que a população de cerca de 150 mil índios da Província não era motivo do esforço oficial na catequização e civilização. Em seu livro Reminiscências de Viagens e Permanências nas Províncias no Norte do Brasil, o metodista relata que ministrou diversos cultos, aos domingos, tanto a bordo de um navio como na casa de um amigo. Robert Nesbit, o segundo missionário a atuar na região amazônica entre os anos de 1857 e 1859, também trazia consigo várias bíblias protestantes no navio. Ele distribuía bíblias a ribeirinhos, o que preocupava o bispos católicos da época. O cenário tumultuado em que o missionário chegou era consequência da chamada “Reforma da Igreja Católica na Amazônia”, período que, a partir da publicação da Ques-

tão Católica e da Questão Nazarena, surgiram desavenças entre os bispos, a Irmandade de Nossa Senhora de Nazaré, associação de leigos responsável pela organização do Círio, e o poder público local. Com o cenário eclesiástico instável, a ação missionária protestante vislumbrou a região amazônica como um ponto estratégico na geopolítica mundial. Ou seja, se as missões católicas foram importantes vetores políticos para a colonização portuguesa, as missões protestantes eram investidas por alemães, ingleses e norte-americanos. “O Norte é a principal sede do movimento republicano, e mais, insinua-se que, no caso de o imperador morrer, haverá o desmembramento do império e a formação de uma República Setentrional. Quão importante é que a nossa influência religiosa pudesse ter um ano ou dois para fazer-se sentida e conhecida, antes que o tempo das novas cristianizações cheguem. As épocas revolucionárias nos países papistas são sempre uma boa oportunidade para a introdução do Evangelho, pois no meio do rugir da tempestade o humilde trabalho missionário pode existir despercebido, de modo que, apesar de pedir a Deus que o dia ainda esteja longe, acho que devíamos tomar em FEVEREIRO DE 2017

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consideração algo que é mais do que uma contingência”, escreveu em seu diário o missionário Richard Holden, que chegou a Belém no final de 1860, fundando uma igreja episcopal no porto da cidade, chamada serviço Bethel. Em 1878, ocorreram as primeiras incursões presbiterianas com a chegada do reverendo Blackford, que fez pregações e também distribuiu bíblias. Em 1880, com a criação de uma escola de enfermagem e uma escola de língua inglesa, pelo metodista Justus Nelson, o protestantismo passou a ser um serviço organizado. Em fevereiro de 1897, foi fundada a Igreja Batista, por Eurico Alfredo Nelson. Mesmo com a presença protestante das Igrejas Metodista, Episcopal, Presbiteriana e Batista, na primeira metade do século XIX, a consolidação e expansão ocorreu a partir da segunda década do século XX, com a chegada dos pentecostais e a fundação da Assembleia de Deus, em 1911, pelos suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg, que segundo os relatos históricos, receberam um sinal que teriam que partir em missão para um local chamado Pará. Quando chegaram aqui, iniciaram as missões pentecostais, sendo convidados pelas outras igrejas a congregar e fazer louvores nas Igrejas Batistas da cidade. Porém, com as interpretações de Vingren e Berg começam a surgir divergências doutrinárias, até serem expulsos em 1911 da Igreja Batista, junto com mais 18 seguidores do novo culto. A novas pregações passaram a ocorrer principalmente na casa de Celina Albuquerque, que relata ter sido curada de uma grave doença nos lábios e foi a primeira batizada no Espírito Santo em terras brasileiras.

CHAMADOS À MISSÃO

A Assembleia de Deus foi fundada em 1911 pelos missionários suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg, que diziam terem sido inspirados pelo Espírito Santo para iniciarem a evangeização no Pará 44 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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UNIDADE DOS ESPÍRITAS EM BELÉM No dia 12 de junho de 1879, o espiritismo iniciou-se no Pará por meio do Grupo Espírita Luz e Caridade, que se reunia na rua Nova de Santana, atual rua Senador Manoel Barata. Com o crescimento de adeptos da doutrina, surgiu o Centro Espírita do Estado do Pará no dia 15 de junho de 1890. No mesmo ano, é fundada a Sociedade Espírita Paraense, no dia 24 de agosto. Daí foram crescendo os grupos espíritas, se expandindo em diversos bairros da cidade. “A doutrina espírita é muito jovem. Surge na França, na segunda metade do século XIX, chega ao Brasil através de dois médicos homeopatas em Salvador e depois aqui em Belém. A comunicação com os espíritos atraía muitas pessoas e os espíritas vão sofrer muitos impropérios. Alguns vão ser chamados de loucos. As primeiras pessoas participantes dos grupos espíritas sofreram muito preconceito”, conta a historiadora Stela Pojuci de Morais, professora do curso de Licenciatura em História da Universidade do Estado do Pará (Uepa). Até que, em uma manhã de maio de 1906, diversos panfletos foram distribuídos pelas ruas de Belém, com um convite que dizia: “‘A união faz a força’, diz o velho e sábio provérbio popular. A verdade deste aforismo trouxe a diversos grupos e adeptos do Espiritismo a ideia da congregação de todos os elementos daquela doutrina, esparsos por esta grande capital, carentes de coesão e da uniformidade. Precisa-se fundar a ‘União Espírita Paraense’, que será o resultado da confraternização e congraçamento de todos os Centros da Nova Revelação do Espiritismo, debaixo de uma só bandeira - a da ‘Federação Espírita Brasileira’. Espíritas despertai e uni-vos. Já é tempo de sairdes do obscurantismo roxo a que vos tende aferrado lamentavelmente e de vos

CENTRO DE LUZ E VIDA

No dia 20 de maio de 1906 foi fundada a União Espírita Paraense, que passou a congregar e orientar as entidades espíritas do Estado do Pará

preparardes para a grande luta contra o erro, as trevas, a ignorância, que reinam, infelizmente, nas almas timoratas e supersticiosas; já é tempo de aparecerdes na sociedade paraense bem alto o branco estandarte do Espiritismo, guiados pelos sentimentos do afeto e do amor e iluminados pelo sol aurifulgentíssimo da ciência, que derroca a su-

perstição e cerceia o fanatismo. Espíritas, uni-vos e preparai-vos para a grande reunião que se efetuará em breve, nesta capital, cujo dia será marcado oportunamente pela sua imprensa diária”. No dia 20 de maio de 1906 ocorre a fundação da União Espírita Paraense, que passa a congregar e orientar as entidades espíritas do Pará. FEVEREIRO DE 2017

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EDUCAÇÃO

SUSTENTAÇÃO RELIGIOSA NO PARÁ Com o fortalecimento do movimento espírita, a tríplice doutrina, que se apoia em princípios filosóficos, científicos e religiosos, conquista adeptos de diversos setores da sociedade paraense, pela capacidade de aliar ciência e religião, faculdades aparentemente conflituosas. “Durante muito tempo houve um apartamento entre ciência e religião, ou seja, as pessoas inteligentes e sábias não eram religiosas, eram vinculadas apenas à ciência. No entanto, a partir da metade do século XX nós vamos começar a ver uma aproximação da ciência com a religião e hoje, no início do século XXI, já identificamos vários cientistas, filósofos, estudiosos, se posicionando a respeito da importância de ser crer em algo. A pessoa pode até não ter uma religião, mas é muito importante ter em si a vinculação com o divino. Reconhecer-se enquanto um ser criado por uma divindade, seja o nome que se dê e essa relação, mas com justiça, amor e ética. Porque é importante na vida do ser humano, aparentemente de tanto caos, a pessoa ter algo que creia, se vincule, pelos laços de uma crença, seja ela qual for, pois não temos condições de estabelecer no que a pessoa deve crer, mas enquanto compreensão da vida, do mundo, de quem ela é, de porque ela está aqui, para onde ela vai. e essa religião preencha esses elementos e principalmente, nas horas das dores, das dificuldades, ela seja uma sustentação na vida dessa pessoa”, esclarece a historiadora Stela Pojuci. Foi a sustentação religiosa que o professor de origem árabe, Said Monsif, procurou quando chegou a Belém 46 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

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em 1996 para lecionar engenharia na Universidade Federal do Pará. Ia atrás de irmãos muçulmanos, mas só em 2004 os encontrou e começaram a orar juntos. A partir da consolidação da comunidade, em fevereiro de 2014, dez anos depois após a primeira sala de oração, fundaram o Centro Cultural Islâmico e a Mesquita no Pará, localizados na rua Ferreira Cantão, centro comercial de Belém. “Nosso centro tem sido muito solicitado para cursos de cultura árabe porque a comunidade árabe de Belém tem muita história e intelectuais. Então agora estamos em preparação para resgatar a presença muçulmana no Pará e na Amazônia”, revela Said, que hoje faz parte de uma comunidade com centenas de muçulmanos. Segundo o professor e cientista

social Cauby Monteiro, revertido ao islamismo, mesmo com a chegada de novas religiões no Brasil e na Amazônia, nosso país ainda é o que possui o maior número de católicos no mundo. “O Brasil continua sendo um país essencialmente religioso e o Islã tem um espaço garantido dentro do processo de muito diálogo divulgando a mensagem de adorar a Deus e ter a paz entre nossos irmãos. Uma mensagem simples, mas que toca o coração de pessoas simples”, afirma Cauby. Said Monsif também lembra que Alá, God ou Dios são apenas línguas diferentes para expressar o que em português chamamos de Deus. Então, apesar do traço católico marcante do Círio de Nossa Senhora de Nazaré, a Belém do século XXI também ora em outras vozes de paz e fraternidade.

ISLÃ NA AMAZÔNIA

O Centro Islâmico Cultural do Pará congrega a comunidade muçulmana na capital paraense


ARTE, CULTURA E REFLEXÃO

Belém reflexiva O CANTOR E FILÓSOFO HENRY BURNETT LANÇA DISCO TENDO A CIDADE COMO INSPIRAÇÃO

PÁGINA 46

CIÊNCIAS

CLIMA GLOBAL

O legado do agrônomo paulista Felisberto Camargo na região deu origem à Embrapa Amazônia Oriental, referência em pesquisas. PÁG.52

O cientista social Alberto Teixeira da Silva analisa a política de Donald Trump para o meio ambiente e para a Amazônia. PÁG.58

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DIVULGAÇÃO

PENSELIMPO


PAPO DE ARTISTA

As Beléns de Henry Burnett

ENTRE A NOSTALGIA E A CRÍTICA, CANTOR, COMPOSITOR E FILÓSOFO VOLTA À CAPITAL PARA LANÇAR SEU NOVO DISCO, O BELÉM INCIDENTAL

TEXTO ANDERSON ARAÚJO

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Por que o título do novo disco Belém Incidental e como surgiu a concepção desse novo trabalho? A ideia foi gestada há 4 anos e tinha a intenção de revelar um conjunto de canções atravessadas pela vivência da cidade e, portanto, fruto dela de modo indelével. De alguma forma eu queria mostrar que a intenção de forjar uma identidade cultural, ou criar um recorte, sempre resulta no ocultamento daquilo que não serve ao discurso oficial, à representação política e ao

“Eu ainda acho que um dos movimentos mais viscerais que a música paraense produziu foi o rock, no qual eu nunca estive integrado, mas que admirei à distância”

FOTOS: DIVULGAÇÃO

O

cantor e compositor Henry Burnett nasceu em Belém, mas saiu da cidade em 1998 para estudar e descobrir o mundo. Morou em Campinas, Rio de Janeiro, São Paulo e passou quatro temporadas em Berlim, na Alemanha. Na mais recente, permaneceu pouco mais de um ano, aprofundando seus estudos de Filosofia. Hoje é reconhecido também pelo trabalho como compositor. Sempre que volta à terra natal traz na bagagem novas canções e reaviva a relação com os velhos e novos amigos músicos, como os amigos do peito Renato Torres e Maurício Panzera. Mas, não só. Sagaz e pensante, o artista faz da sua arte o platô para fluir a nostalgia, paixões, críticas e a imensa vontade de transformar. No novo álbum, Belém Incidental, Burnett faz o que faz melhor: repensa a sua realidade a partir da música, desta vez assumindo sem desvios a faceta rock do seu trabalho. Tanto que convidou a musa Sammliz para cantar junto em uma das faixas. Na conversa com a Amazônia Viva, ele fala dos 30 anos de carreira, do novo disco e dá um chega pra lá na burrice que permeia a produção musical de hoje, além de surpreender com o anúncio de um novo livro e um álbum só com músicas infantis. Confira a seguir.

discurso sobre originalidade, ao que é, portanto, “incidental”, um termo que serve tanto a uma música imprevisível quanto ao que ficou proscrito. É preciso dizer claramente que tal posição não significa uma crítica cultural aos artistas que foram cooptados conscientes ou não pelas estruturas oficiais e mercadológicas como um todo, portanto, uma crítica política; as pessoas muitas vezes não compreendem essa diferença fundamental e podem achar que repudio a música regional, numa redução que só serve para evitar a discussão crítica contra a manipulação política e aos padrões que a indústria cultural estabelece de modo aparentemente espontâneo; esses são meus alvos verdadeiros. Ronaldo Silva sempre vai ser um dos maiores compositores que já conheci. Qual a marca mais evidente neste novo trabalho? O rock, que sempre esteve presente na minha formação, mas que ficou apenas insinuado nos meus discos anteriores. E a reiteração dos meus parceiros mais frequentes, FEVEREIRO DE 2017

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PAPO DE ARTISTA

“A música antecede a filosofia na minha vida em muitos anos, por isso não sou um professor e pesquisador que pode ser considerado um padrão dentro da universidade, talvez porque a música lança mais questões ao meu trabalho filosófico que o contrário”

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que reúno neste novo álbum pela primeira vez: Edson Coelho, Renato Torres e Paulo Vieira. Todos exerceram papeis fundamentais ao longo da minha formação como compositor. Como nasceu essa parceria com a cantora Sammliz? Quando a sonoridade do disco começou a se definir, graças ao Fábio Cavalcante (produtor musical), ao Renato Torres e aos músicos convidados, Tiago Belém, Maurício Panzera e Marcel Rocha, eu percebi que havia feito um recorte com meus temas mais pesados. Eu ainda acho que um dos movimentos mais viscerais que a música paraense produziu foi o rock, no qual eu nunca estive integrado, mas que admirei à distância. A Sammliz fez essa ponte entre o real e o imaginado, entre o “cantautor” que me tornei e a cena roqueira; ela tem toda propriedade para isso e foi muito generosa ao aceitar o convite. Há belas canções como “E nós” de um lirismo muito forte. Mas há também críticas sutis como em “Oswald Canibal” e “Feliz Natal Anormal”. Esse equilíbrio é proposital ou intuitivo no disco? “E nós” foi escrita para os 70 da minha mãe, em 2016, uma das poucas vezes em que escrevi a letra primeiro, como um texto independente. É uma canção fruto da matéria da memória de infância, não tinha como escapar ao lirismo e à força do passado que carregamos, com todas as dificuldades; ela é uma exceção no disco, a última que entrou, com arranjo de Arthur Alves, que já tinha participado de modo essencial como arranjador no “Não para magoar”. As duas outras são fruto da safra recente, e se ligam por certa inquietude com a decadência (no caso de “Oswald Canibal”, escrita pelo Paulo Vieira a partir de referências licenciosas a Oswald de Andrade e Benedito Nunes) e com a burrice que nos cerca (no caso de “Feliz Natal Anormal”). Por fim, não penso muito quando componho, junto elementos sem muito rigor, por isso, se há equilíbrio, foi involuntário.

Falar de “burrice”, atualmente, é uma forma de transgressão? Os discursos hoje em dia meio que repudiam a figura do intelectual no show business e da reflexão pela música. O que você pensa sobre isso? Tom Zé já falou sobre isso de modo direto e fatal na canção “Burrice”: “Veja que beleza/ a burrice está na mesa”, do esplêndido álbum “Com defeito de fabricação”. Claro que a reflexão precisa ser eliminada do mercado, isso diz tudo sobre a cena atual, onde tudo ocupa seu lugar sem necessidade de crítica musical, que hoje poderia ser chamada de crítica social – se uma música representa um segmento, ela se justifica sem necessidade de crítica, de reflexão estética. É um caminho sem volta, mas compreensivo. A crítica musical precisa aderir ao que faz sucesso, só assim ela pode fingir que ainda existe. Você sempre lança os discos em Belém. Por que essa preferência pela cidade? Ano que vem completam-se duas décadas desde que saí de Belém, aos 27 anos. Talvez em outros lugares eu também seja conhecido como compositor, mas nada que se compare com minha cidade, de onde emana minha música desde sempre. Não é por acaso que o disco abre com “Belém de passagem”. Canto a frase do Paulo Vieira (parceiro de várias composições no disco) com propriedade: “Onde quer que eu vá/ a taba também vai”. Aqui me sinto apenas um compositor que reencontra sua fonte. Qual a diferença deste novo trabalho para os outros? Gravei músicas muito antigas, como “Vozes do Norte”, mas ainda assim a seleção procura unir o disco através do rock, que sempre será a arma mais forte contra o conservadorismo. Há quanto tempo você está na estrada e o que mudou do início da carreira para cá na forma de compor? Em 2018, completo 30 anos de carreira. Meu “Linhas Urbanas” é de 1997, mas uma data é mais fundamental para mim, o dia 1º de maio de 1988, quando toquei pela primeira vez em uma apresentação musical. O “Não para magoar”, que completou 10 anos comemorados


com um concerto na Casa do Fauno, em Belém, definiu minha identidade musical, que só aprofundo com o passar dos anos. Nesse sentido, “E nós” dialoga com “Sonho em segredo”, apesar da distância de 10 anos as separam. Os arranjos de cello do Arthur Alves permitem compreender essa ligação.

FOTOS: DIVULGAÇÃO

O que mudou de lá para cá na cena artística de Belém? A cena ganhou em profissionalismo, em visibilidade e multiplicidade. O movimento é positivo como um todo.

UM PENSADOR

Henry Burnett faz da sua arte e das lembranças da vida a força para fluir a nostalgia, paixões, críticas e a imensa vontade de transformar

Como a Filosofia influencia o teu trabalho musical? Ou é o contrário: a música e pensar sobre música te levaram para Filosofia? A música antecede a filosofia na minha vida em muitos anos, por isso não sou um professor e pesquisador que pode ser considerado um padrão dentro da universidade, talvez porque a música lança mais questões ao meu trabalho filosófico que o contrário. O fato de ter chegado na UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo) no primeiro grupo de professores do então recém-inaugurado campus de Humanas, resultou numa liberdade extrema, que eu não teria em outras universidades. Hoje, as duas frentes se complementam mutuamente, sem dúvida, e meus projetos acadêmicos refletem o lugar que ocupo como compositor e professor. Quais os próximos projetos musicais? Um livro/DVD voltado para o público infantil, projeto em parceria com o Paulo Vieira; um disco inédito como letrista, chamado “Sangue”, parceria com Guilherme Valverde e um CD/concerto reunindo meus temas mais melancólicos junto com o celista Arthur Alves. Já existem composições infantis? Como seriam as músicas para crianças de Henry Burnett? O Paulo escreveu o “Livro de imaginacéu”, mirando o público infantil, e eu musiquei alguns poemas a pedido dele, como já havia feito com o “Retruque”. A eles juntei canções que escrevi para os meus dois filhos. Os temas vão do circo ao medo, da aventura ao sonho. A ideia é lançar o livro com um DVD encartado reunindo esse material todo, com animações criadas a partir das canções. Um projeto caro, que exige um aparato que ainda não conseguimos reunir. FEVEREIRO DE 2017

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MEMÓRIAS BIOGRÁFICAS

Felisberto Camargo 1896-1977

para desenvolver a Amazônia TEXTO ALINNE MORAIS ILUSTRAÇÕES JOCELYN ALENCAR

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JANEIRO DE 2017


F

elisberto Camargo nasceu no dia 10 de setembro de 1896, sete anos após a proclamação da República, em Piracicaba, São Paulo. Engenheiro agrônomo, Camargo trabalhou nas áreas de botânica, citricultura, entomologia e zootecnia, Com seu trabalho e pesquisa, ele ajudou a desvendar e desenvolver a Amazônia. Felisberto se graduou na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ), em Piracicaba, e depois foi para Universidade da Flórida, nos Estados Unidos. Lá, ele se especializou em fruticultura tropical, mais especificamente no preparo de frutas cítricas para exportação. Apesar de começar a exercer sua profissão com pouca idade, Felisberto logo se destacou no ramo e passou a ser considerado um dos pesquisadores mais completos de sua época. Na década de 40, período em que a Amazônia Brasileira vivia uma grande estagnação econômica após o período da borracha, Felisberto chegou a região. Com seu trabalho de pesquisa ele ajudou positivamente o desenvolvimento do local . “Foi muito importante a vinda dele para a nossa região porque ele trouxe para cá a ideia da importância da pesquisa e do trabalho científico. Ele defendia que a melhoria das pesquisas na região poderia fazer a Amazônia se desenvolver mais rápido”, comenta Marly Quadros, jornalista e autora da obra “O homem que tentou domar o Amazonas - Biografia do cientista Felisberto Camargo, polêmico, ousado e futurista”, escrita em parceria com Paulo Roberto Ferreira, também jornalista. Felisberto foi o primeiro diretor do Instituto Agronômico do Norte (IAN), que mais tarde originou a Embrapa Amazônia Oriental. Na instituição ele contribuiu para o desenvolvimento de novos pilares técnico-científicos para a região. “É como se ele fosse o criador da Embrapa Oriental. Tanto que até hoje ele é reconhecido pelos pesquisadores da Embrapa como uma pessoa visionária, que implementou pesquisas que nem se pensavam naquele momento e hoje são realidades”, explica Marly. Felisberto também implementou a antiga Escola de Agronomia da Amazônia, depois chamada de Faculdade de Ciências Agrárias do Pará (FCAP) e atual Universidade Federal

Rural da Amazônia (Ufra). Com a Instituição, ele também contribuiu para o desenvolvimento científico na região. Ainda na década de 40, Camargo também se dedicou para solucionar a questão da produção de carne e leite nas regiões quentes e úmidas da Amazônia. A estratégia encontrada pelo pesquisador foi estimular a criação de búfalos na Ilha do Marajó e a produção de grandes rebanhos de gado indiano. Em 1948, Felisberto deu início às tentativas, junto às autoridades, para conseguir trazer para a região espécies de gado Red Sindhi. Para inserir o animal na Amazônia, o pesquisador enfrentou a pressão de técnicos, pecuaristas e burocratas que eram contra sua ideia. Porém, ele não desistiu. Assim, tempos depois, os novos gados chegaram à região. O grupo de animais adquirido no Paquistão era formado por 31 cabeças, entre machos e fêmeas. Essa importação foi extremamente significativa pois marcou a entrada do gado Red Shind na Amazônia. Felisberto Camargo também apostou no desenvolvimento de híbridos de dendê, resultantes do cruzamento das espécies de dendezeiro africano (Elaeis guineensis) e o nativo da região amazônica (Elaeis oleifera). No Instituto Agronômico do Norte foram realizados os primeiros cruzamentos interespecíficos dessas espécies visando a criação de palmeiras de menor porte. Além de gados e plantas, Felisberto Camargo também se interessou pelos solos amazônicos. O pesquisador acreditava que os solos da região, por serem pobres, estavam naturalmente vocacionados para o cultivo de plantas perenes, que têm um ciclo de vida longo. Já o cultivo de plantas de curto ciclo deveria ser conduzido, segundo ele, nas várzeas ricas em nutrientes, às margens dos rios amazônicos. Ainda nessa linha de pesquisa o paulista desenvolveu estudos sobre os solos de terra firme e o cultivo racional da seringueira. Assim, Camargo ajudou a melhorar muitos aspectos da região amazônica. “Ele era apaixonado pela Amazônia e mesmo não tendo passado muito tempo aqui a contribuição que ele deixou foi muito importante”, afirma Marly Quadros. JANEIRO DE 2017

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AGENDA ASCOM FCP

FOLIA NO PARQUE Dia 19 de fevereiro será realizada mais uma edição do “Folia no Parque”. O evento vai contar com brincadeiras recreativas, escola de samba, banda de marchinhas e muito mais. A programação vai ser realizada no ginásio do Sesc Doca, localizado na rua Senador Manoel Barata, 1873 - Reduto. A entrada custa R$ 7,00. Mais informações: (91) 4005-9500

FOTOGRAFIA Estão abertas as inscrições para a oficina “De Olhos Vendados”, com Miguel Chicaoka. As aulas serão realizadas a partir de 9 de março, na Fotoativa, localizada na praça das Mercês, 19 - Campina. O objetivo da oficina é estimular o pensamento crítico e o diálogo entre a fotografia e as outras áreas do conhecimento. Informações e inscrições no site fotoativa.org.br

ENGENHARIA AMBIENTAL

RESTAURAÇÃO

Livros da Biblioteca Arthur Vianna

Congresso Brasil Norte de Engenharia

A Biblioteca Arthur Vianna está com as ins-

De acordo com a coordenadora de Processos

Sanitária e Ambiental’. O evento será

crições abertas para a oficina de restauro de

Técnicos da FCP, Suzana Tota, as oficinas são

realizado no inicio do segundo semes-

livros. São apenas 15 vagas para os interes-

importantes para a recuperação e higienização

tre, no Hotel Princesa Louça, na avenida

sados em aprender a técnica. A oficina será

do acervo. “Não é só mostrar ao aluno sobre

Presidente Vargas, 882 - Campina. O

realizada até 24 de fevereiro, no horário de

a técnica, tem que explicar o porquê do livro

congresso terá com tema “Sustentabi-

8h às 12h, no terceiro andar da Biblioteca. As

danificado, após isso verificar se o livro precisa

lidade, Inovação e Desenvolvimento na

inscrições são gratuitas e podem ser feitas

ser costurado, encapado. Tudo isso é mostrado

Amazônia”. Informações e inscrições no

pelo site da Fundação Cultural do Pará (fcp.

para o aluno se conscientizar que os livros não

site cbnabes.com.br.

pa.gov.br). Para participar é necessário ter

vão para o lixo e que eles passam por todo esse

mais de 16 anos.

processo de recuperação”, explica ela.

REDAÇÃO

Quem vai ministrar as aulas é o instrutor

Além de conscientizar o público, a ação

Estão aber tas até o dia 17 de março as

Valdiney Souza. Ele será o responsável em

também comemora a volta das atividades na

inscrições para o 46° Concurso Inter-

repassar aos alunos todas as orientações

biblioteca, que estava desativada por causa

nacional de Redação de Car tas. O tema

sobre o restauro do acervo da Biblioteca e de

de reformas estruturais. Mais informações

desta edição é “Imagine que você é

livros no geral.

pelo telefone: 3202-4377.

um(a) assessor(a) do novo secretário-

Estão abertas as inscrições para o “I

-geral da ONU – Qual é o problema mundial que você o ajudaria a resolver

IMAGENS DE BELÉM

em primeiro lugar e de que forma você o aconselharia para isso?”. As redações

Em comemoração aos 401 anos da capital paraense, o Museu de Belém (Mabe) promove a

devem ser em formato de car ta, escri-

exposição “Imagens de Belém, acer vo modernista do Mabe”, que retrata por meio de obras

tas a mão, usando caneta esferográfica

os vários aspectos da cidade como a paisagem urbana, as ilhas, a cultura, a população e as

preta ou azul, contendo no máximo

características climáticas. A mostra segue aber ta para visitação até 19 de fevereiro, de 10h

900 palavras. O estudante interessado

às 18h, de terça a sexta, e de 9h às 13h, aos fins de semana. A entrada é franca. Mais infor-

em par ticipar deve procurar sua escola

mações: (91) 3114-1028.

para uma seleção prévia. Mais informações no site correios.com.br.

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FEVEREIRO DE 2017


FAÇA VOCÊ MESMO

Instrumento musical reciclado para o carnaval Dá para aproveitar o Carnaval com adereços reciclados? Dá, sim. E os técnicos das oficinas Curro Velho, da Fundação Cultural do Pará, ensinam como fazer um pequeno instrumento musical de visual condizente com a festa para divertir as crianças,

que podem até formar um bloquinho. E os adultos também, por que não? A base é uma garrafa PET e papel nacarado. Cada tipo e tamanho de embalagem produz um som diferente. As opções de customização do instrumento são variadas.

• 1 garrafa pet • 1 estilete com travas

Do que vamos precisar?

• 1 tesoura com pontas arredondadas • 1 par de luvas • Retalhos de papel nacarado • Barbantes de algodão coloridos • Use Tinta spray na cor desejada (não deve ser usada por crianças se elas participarem da confecção do instrumento). Recomendado uso de máscara para quem usar esse material.

DILMA TEIXEIRA, COORDENADOR DE ARTES VISUAIS/ OFICINAS CURRO VELHO | LUIZA NEVES, TÉCNICA EM GESTÃO CULTURAL DAVID MATOS, INSTRUTOR DA FCP | GUILHERME CHAVES, MODELO | LEANDRO RIBEIRO, FOTOGRAFIAS / ASCOM/FCP FEVEREIRO DE 2017

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FAÇA VOCÊ MESMO

4 7

Com o estilete, faça um pequeno corte no centro da garrafa PET

Faça recortes, formando uma franja (repita o processo com a outra parte da garrafa)

Faça um recorte central. Encaixe o papel nacarado na garrafa.

2 5 8

Com a tesoura, corte a garrafa ao meio, a partir da abertura feita com o estilete

Borrife pequenos jatos com o spray somente por dentro da garrafa (evite borrifar por fora a fim de manter o brilho externo da garrafa)

Amarre o barbante no gargalo da garrafa e enrole algumas vezes, finalizando com um nó. Corte o excesso do fio.

3 6

Acerte as bordas das duas partes da garrafa.

Corte dois retângulos no papel nacarado (aproximadamente 15 x 30 cm), dobre ao meio e faça recortes com a tesoura, formando franjas.

9

Está pronto o instrumento para animar o bloco de carnaval ou bailinho.

Para saber mais Quem quiser conhecer mais sobre técnicas artísticas pode se inscrever nas oficinas Curro Velho, da Fundação Cultural do Pará. Crianças a partir de 12 anos podem participar. O Curro Velho fica localizado na rua Professor Nelson Ribeiro, nº 287, esquina com a travessa Djalma Dutra, bairro do Telégrafo. Telefones: (91) 3184-9100 e 3184-9109. 56 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

FEVEREIRO DE 2017

RECORTE AQUI

1

ATENÇÃO: Essa atividade pode ser feita por crianças, desde que acompanhadas por um adulto responsável


BOA HISTÓRIA

Orelhas

ninos cortavam o cabelo lá sempre, porque até 11 anos tinha desconto. Pagavam meia. De 12 pra cima, já era marmanjo, ele dizia sorrindo. Tinha pouco jeito com crianças, mas era muito simpático. Enquanto não aparecia freguês, Sirico ficava sentado na cadeira posta com muita estratégia na calçada lendo um jornal velho por cima dos óculos de lentes amareladas de tão velhas. Na verdade, fingia. Estava na conferência habitual do movimento e fiscalizando a vida alheia. Sabia de tudo. Nada escapava ao fígaro. Era também parte do trabalho. Precisava de assunto para passar o tempo enquanto tesourava. A mãe de Marquinho reencontrou a barbearia de Sirico depois de anos em que havia perdido o contato. Havia mudado fazia uns dez anos e agora retornara ao bairro da Sacramenta. Era ele o barbeiro de Marquinho na primeira infância. Bons tempos. Só não para o menino. O pequeno tinha péssimas lembranças. O cabelo crescia mais rápido do que a infla-

ção da época, governo Sarney. E a mãe levava o garoto mensalmente para aparar as madeixas indomáveis do filho. Marquinho, por sua vez, detestava. Via a tesoura e o dono dela como ameaças. Submetia-se ao ritual aos prantos. E saía da cadeira quase sempre com a orelha lascada pela navalha. Era um menino inquieto, o que não combinava muito com lâminas. O destino, esse brincante, colocou o agora pré-adolescente, de novo, frente a frente com o antigo carrasco. O barbeiro estava mais gordo com cabelos acinzentados. O ambiente, em novo endereço, não era apropriado para infantes. Fala-se muito de assuntos de adulto, sem muito pudor, e, nas paredes, havia grandes pôsteres de mulheres com pouca roupa. Marquinho ficou de olho arregalado. Sentou-se na cadeira, agora a de gente grande. Sirico falava e fazia movimentos bruscos com a tesoura, como quem corta erva daninha no jardim. Marquinho começou a suar. Pelo calor de sempre e pelas más recordações.

Sirico seguia empenhado na falação: - Eu não podia fazer nada. Ora, veja. Era um garotão. Marquinho estava com a respiração suspensa e olhava para os lados, como que perseguido. Só pensava nas orelhas. E o barbeiro no automático: - Sabia que era proibido, claro. Mas a gente gostava. O pequeno engolia saliva e temia o pior. Mais tesouradas: - Quando descobriram foi um deus nos acuda, mas já era tarde. Pegou a navalha para acertar as suíças e o toutiço. Ai, meu Deus, é agora!, gelou Marquinho. Mas, Sirico foi cirúrgico. Acabou sem um filete de sangue sequer. Passou talco no pescoço do moleque. Estava pronto! - Tá com quantos anos, jito? - Doze. - Paga só meia pra voltar de novo. Marquinho deu os cinco tostões. Orelhas ao vento, nunca mais apareceu, embora quisesse saber o fim da história proibida do barbeiro com a meia irmã. FEVEREIRO DE 2017

LEONARDO NUNES

Sirico tinha uma barbearia modesta onde atendia toda gente. Os me-

Anderson Araújo

é jornalista e escritor • REVISTA AMAZÔNIA VIVA • 57


NOVOS CAMINHOS

Trump, clima global e Amazônia

A surpreendente vitória do magnata conservador Donald Trump nas eleições

ALBERTO TEIXEIRA DA SILVA é doutor em Ciências Sociais pela UNICAMP, com pós-doutorado na Universidad Carlos III de Madrid e professor associado da Universidade Federal do Pará 58 • REVISTA AMAZÔNIA VIVA •

presidenciais dos EUA, com um discurso ultranacionalista, avesso à globalização e ao livre comércio, provocou um tsunami sistêmico no cenário mundial, com consequências imprevisíveis na área comercial, dos direitos humanos e na governança do clima global. O discurso tendo como “leitmotiv” America first (América primeiro), já anuncia como emblema da política externa americana: protecionismo e isolamento no ambiente de arranjos multilaterais. A saída dos EUA do tratado comercial do Pacífico (TPP), a renegociação do NAFTA, a retomada dos polêmicos oleodutos Keystone XL e o Dakota Access e a retirada dos sites oficiais de temas como mudanças climáticas (excluindo o Climate Action Plan, de Barack Obama), geraram instabilidades e protestos. Neste contexto, é improvável que o congresso americano ratifique o Acordo de Paris, em vigor desde 4 de novembro de 2016 na COP-22, de Marrakech, visto que Trump defende o uso dos combustíveis fósseis e a retomada da indústria carvoeira nos EUA, posição que embaralha e compromete a geopolítica dos esforços de redução drástica e urgente dos gases de efeito estufa (GEE), estabelecidos na COP-21 (Paris, 2015), para um patamar seguro de estabilização em torno de 2 graus celsius até 2100. FEVEREIRO DE 2017

Importante considerar que os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, perdendo apenas para a China. Contudo, ainda é cedo para fazer afirmações, mas especula-se que as restrições dos mercados americanos às exportações brasileiras podem intensificar a abertura de novas fronteiras para produção de commodities (soja, madeira, minérios) e pressionar o desmatamento da Amazônia. O descompromisso de Trump com a questão da sustentabilidade planetária, visto que nega o aquecimento global e zomba dos movimentos ambientalistas, tem impactos importantes no fomento de políticas de proteção florestal e serviços ambientais, inibindo fluxos de investimentos e parcerias estratégicas de cooperação internacional, sobretudo em regiões de megabiodiversidade como é o caso da Amazônia. Associado ao cenário doméstico de recessão econômica, baixa capacidade de governança brasileira nas políticas ambientais e climáticas e significativos retrocessos já nos primeiros atos do governo Trump relativos à transição para um modelo de desenvolvimento global resiliente e responsável, a Amazônia continuará objeto de ações predatórias e pouco articuladas com os avanços tecnológicos e inovação de ponta, embora considerada porção territorial emblemática da governança energética, climática e ambiental neste século XXI.

“Especula-se que as restrições dos mercados americanos às exportações brasileiras podem intensificar a abertura de novas fronteiras para produção de commodities e pressionar o desmatamento da Amazônia”


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