Algumas consideracoes sobre o sistema tributário

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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA TRIBUTÁRIO E OS MUNICÍPIOS∗ Alfredo Meneghetti Neto∗∗

Resumo – Esse artigo levanta algumas questões do sistema tributário brasileiro procurando entendê-lo sob a ótica do município. Foram trazidas várias evidências de que os recursos da esfera municipal estão sendo reduzidos e é justamente essa esfera que tem toda a obrigatoriedade do atendimento direto ao cidadão. Nesse sentido deve-se prestar muita atenção para os efeitos nos municípios do FEF, das emancipações, da Lei Camata, das isenções fiscais, e da lei Kandir. Palavras-chave – Município, finanças públicas municipais, tributação, sistema tributário brasileiro.

1 – A questão da carga tributária Costuma-se caracterizar as rendas auferidas pelo setor público como uma “carga” associando-a a um sacrifício imposto pela coletividade pela tributação. Esse conceito tem sido motivo de muitas discussões na sociedade brasileira. Como pode ser visto pelo Gráfico 1 a carga tributária no Brasil quase triplicou nos últimos cinqüenta anos, passando de 13,84% do PIB em 1947 para 29,95% do PIB em 1996.

Trabalho apresentado no Seminário sobre o Municipalismo no dia 12 de dezembro de 1997 em Gramado, RS. O autor agradece o apoio recebido tanto da Direção da PUCRS, como da Confederação Nacional dos Municípios em viabilizar a sua participação neste evento. Os erros que eventualmente tenham permanecido são de responsabilidade do autor. ∗∗ Economista, professor da PUCRS e técnico da FEE.


Gráfico 1 Evolução da carga tributária no Brasil – 1947-96

Provavelmente, ela deva chegar aos 35% do PIB nos próximos cinco anos. Dividindo-se a carga tributária pela renda “per capita” (em torno dos US$ 4.700) tem-se o que se chama de verdadeira pressão fiscal, e, comparando-a com outros países, o Brasil supera quase todos eles, como já foi visto em outros estudos, como por exemplo Meneghetti Neto (1993). Além disso, a carga está mal distribuída. Existe uma regressividade tributária perversa no Brasil, expressa nos impostos indiretos. Um estudo recente do orçamento doméstico na FEE mostrou que 30,8% da renda mensal bruta de uma família de quatro pessoas – casal e dois filhos – são comprometidos com impostos.1 E quanto maior for a renda de uma família menor é a incidência de impostos. Em outras palavras, no Brasil a preferência dos tributos recai sobre o consumo, através dos impostos indiretos (ICMS, IPI, ISS, IVVC, COFINS, PIS-PASEP, IOF, etc.). Essas evidências recomendam que deve haver uma revisão das alíquotas dos impostos principalmente aqueles que incidem sobre a cesta básica (como arroz, feijão, açúcar, sal, farinha de trigo e óleo). Isso teria um bom impacto na economia, a medida que a concorrência no mercado afastaria a possibilidade de os agricultores e comerciantes incorporarem o fim da tributação a sua margem de lucro, em vez de reduzirem seus preços. 1 Nesse estudo foram simulados os gastos do mês de uma família de classe média de Porto Alegre, com dois filhos, que tenha um apartamento próprio e um carro do ano de 1992. Também foi estabelecido que o rendimento do marido é de R$ 2,5 mil, que é a única fonte de renda do casal e que não há nenhuma espécie de poupança. Foi constatado que 30,8% (R$ 772, 00) da renda mensal bruta de uma família de quatro pessoas – casal e dois filhos – são comprometidos com impostos. Do total de tributos pagos, R$ 406,00 (16.2%) vão para os impostos diretos, pois incidem sobre o salário (IR na fonte e contribuição previdenciária), sobre os bens (IPTU e IPVA) e sobre a movimentação financeira (CPMF). Outros R$ 366,00 (14,6%) vão para os impostos embutidos nos gastos correntes do mês, que incluem compras de supermercado, despesas com saúde, vestuário, educação e transportes, além dos gastos com moradia (telefone, luz, água, gás, condomínio). Para maiores detalhes ver Aliski (22 set. 1997, p.22) e Flach (16 nov. 1997, p.6).


Dentro desta linha de raciocínio, um exemplo que pode ser dado é o acordo da cesta básica implementado em 1992 pelo governo gaúcho. Neste acordo, o consumidor não saiu beneficiado, pois o preço da cesta básica não baixou para aqueles produtos que haviam tido suas alíquotas reduzidas de ICMS. Faltou negociar com a classe empresarial e estabelecer um compromisso para que os preços ficassem abaixo da taxa de inflação. Por isso houve uma perda de arrecadação de ICMS para o estado.2 Sob a ótica dos municípios, principalmente os de menor porte populacional, um acordo deste tipo, poderia trazer benefícios uma vez que atua diretamente sobre a renda do consumidor mais pobre. É óbvio que não poderia ocorrer, em hipótese alguma, uma diminuição da arrecadação. Desta forma, ocorrendo uma redução do custo da cadeia produtiva e se os preços baixarem proporcionalmente, poderá ocorrer um aumento de consumo. As Câmaras Setoriais poderiam inclusive servir como mecanismos de pactuação social onde o governo, trabalhadores e empresários ajustariam, impostos, salários e preços. Desta forma, havendo uma redução do preço, o consumidor de baixa renda melhorará seu consumo e a oferta do mercado terá que ser incrementada. Isso provocará um bom impacto nos municípios de menor porte, que tem nos repasses do ICMS uma de suas principais receitas. Assim aqueles municípios que dependem basicamente da produção agropecuária, poderiam sair beneficiados com isso. 2 – Os impostos diretos No que diz respeito aos impostos diretos (Imposto de Renda, ITR, IPTU, IPVA e CPMF), pode-se dizer que eles são mais perceptíveis pelo contribuinte, pois são discriminados em contracheques, guias de recolhimentos ou extratos bancários. Já o mesmo não acontece com aqueles impostos que incidem sobre o consumo, pois estão embutidos nos preços das mercadorias. Ao contrário do que ocorre nos países mais desenvolvidos, onde o Imposto sobre Valor Agregado (Value Added Tax) que incide sobre o consumo é destacado na nota fiscal, no Brasil os vários tributos indiretos são invisíveis para o consumidor. Isso faz com que o contribuinte não tenha noção de quanto e para quem paga impostos (Governo Federal, Estadual e Municipal). Com isso, não se está cumprindo o que o determina o artigo 150 da Constituição Federal, que estabelece que o consumidor deve ser esclarecido dos impostos que estão embutidos nos preços das mercadorias. Assim, a medida que haja uma conscientização do Governo (nas suas três esferas) – de que os impostos diretos deveriam ser mais explorados – , os municípios poderão encontrar mais respaldo político para melhorar a performance de seus impostos locais, como por exemplo o IPTU. Este imposto é pago através de uma guia de recolhimento, portanto torna-se visível para o contribuinte, pois ele pode saber o quanto paga e quanto recebe de volta, através de melhorias em seu bairro, como por exemplo, calçamento, saneamento básico, iluminação pública e coleta de lixo. Entretanto, ainda este imposto é muito pouco explorado tanto no Brasil, como nos municípios. Uma análise que foi desenvolvida pelo Departamento de Economia da Faculdade de Ciências Políticas Econômicas da PUCRS, com os dados dos municípios gaúchos, mostrou que

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Tudo começou em agosto de 1992, quando o Legislativo aprovou uma redução do ICMS de 31 produtos da cesta básica, com a finalidade de melhorar a competitividade dos produtos gaúchos. Cinco meses depois, argumentava-se (Meneghetti Neto, 1992) que os preços dos produtos da cesta básica haviam aumentado ainda mais e que era fundamental um acordo setorial e um acompanhamento de preços, para que os consumidores pudessem receber os benefícios dessa medida. Concluiu-se que havia forte predominância do nível do atacado como ponto de origem das oscilações de preços agrícolas e também que as perdas do Tesouro haviam sido enormes. A lição que fica é que, junto com a redução de tributos, é fundamental negociar um realinhamento dos preços da cesta básica. Isto porque o benefício (da redução do ICMS) deve ser estendido até o consumidor.


ainda é enorme a dependência dos municípios das receitas transferidas.3 A Tabela 1 apresenta as receitas tributárias dos municípios gaúchos pelo porte da população. Só para se ter uma idéia no caso, dos Municípios de pequeno porte (com população inferior a 10 mil habitantes), em quase 97% deles a receita tributária representou somente até 10% de sua receita total, no ano de 1996. Em somente seis municípios a receita tributária ficou entre 10% e 20% das receitas totais e em três deles a mesma receita significativa entre 40% e 70% de toda a receita disponível. Como esses três municípios são do litoral gaúchos, eles possuem terrenos e prédios altamente valorizados, o que possibilita boas condições para explorar devidamente o IPTU. Também nesses três municípios a arrecadação do ISSQN dispõe de uma boa performance, principalmente em épocas de veraneiro. Tabela 1 Distribuição dos Municípios gaúchos segundo a participação da receita tributária na receita total, por grupos de habitantes – 1996 Grupos de Habitantes Faixa de participação da Total de Até 10.000 10.000 receita tributária na receita municípios a 50.000 total (%)

50.000 e mais

Até |-----5 5|-----10 10|-----20 20|-----30 30|-----40 40|-----50 50|-----60 60|-----70 70|-----80 80|-----90 90 e mais

235 101 67 6 4 2 2 1

211 44 6 --1 1 1

24 52 34 1 2 1 1

-5 27 5 2

TOTAL

418

264

115

36

Fonte: Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul. Já a situação difícil – de dependência das receitas transferidas – diminui um pouco, no caso dos municípios de médio porte (com população entre 10 mil e menos de 50 mil habitantes). Do universo desses municípios, cerca de 66% deles, a receita tributária representava até 10% das receitas totais, (ao invés de 97%, como ficou demonstrado nos municípios de pequeno porte). E somente 13% do universo dos municípios de grande porte (com população superior a 50 mil) a receita tributária representava até 10% das receitas totais. Isto permite concluir que quanto menor o porte populacional de um município, maior será a dependência das receitas transferidas. Pelo Gráfico 2, que mostra a participação da receita tributária na receita total nos municípios até 50 mil habitantes, pode-se notar que a grande maioria dos municípios está situada no canto inferior esquerdo. Isso demonstra com clareza a baixa participação das receitas nos orçamentos municipais.

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A idéia desta pesquisa foi a de sistematizar os dados dos municípios gaúchos no período de 1982 a 1996, procurando apresentar uma análise da situação financeira dos municípios gaúchos. Para isso foi firmado um convênio entre a PUCRS e o IPEA de Brasília.


Gráfico 2 Distribuição dos municípios gaúchos segundo a participação da receita tributária na receita total – 1996

Nota-se que a receita tributária é pouco significativa para a maioria dos municípios gaúchos, o que equivale a 336 municípios (88%) dos 418contabilizados pelo Tribunal de Contas. Sem dúvida a mesma situação acontece nos demais municípios brasileiros. Então é importante se dar conta que muito ainda pode ser feito pelos municípios, sendo necessário e oportuno fazer um esforço no sentido de: tanto rever as plantas de valores imobiliários (que servem de suporte para o IPTU), como também capacitar os seus recursos humanos para tornar mais eficiente a máquina arrecadatória. 3 - A questão da descentralização das receitas Especificamente nos anos 70 os recursos disponíveis das três esferas de governo estavam concentrados nas mãos da União, que detinha praticamente o dobro das receitas dos estados e municípios juntos. Isso, na realidade, foi um dos objetivos da reforma tributária de 1967, que propunha propiciar condições financeiras para que o Estado pudesse desempenhar suas novas funções. O sistema tributário era entendido como um instrumento capaz de impulsionar, promover e orientar o processo de acumulação e para cumprir esses objetivos tornava-se necessário transferir para a União a competência da maior parte dos tributos, como está documentado em meneghetti Neto e Rückert (1994, p. 63). Procurando-se observar o comportamento das receitas disponíveis das três esferas tem-se o Gráfico 3. Pode-se notar que existe um período que pode ser chamado de centralizador de receitas, pois concentra recursos gradativamente na União e se estendeu de 1970 a 1983.


Gráfico 3 Participação dos três níveis de Governo na Receita Disponível – 1970-96

Nesta época a União passou de 60,7% para 69,7% enquanto que estados e municípios diminuíram sua participação. Especificamente os estados passaram de 29,2% para 21,3% e os municípios de 10% para 8,9% no período de 1970 a 1983. Entretanto no início dos anos 80, já existia um certo consenso de que a reforma tributária estava exaurida devido principalmente, a excessiva centralização das iniciativas tributárias na esfera federal e ocorreu uma reversão do processo dos anos 70, dando início a descentralização tributária, onde a União começou a perder receita em favor dos estados e municípios.4 Então pode-se caracterizar um segundo movimento no sistema tributário em que ocorre justamente o reverso desta tendência centralizadora. Este período vai de 1983 a 1996. Enquanto que a União perdeu participação na receita disponível em 13,2 pontos percentuais, os estados e municípios aumentaram respectivamente 5,2 e 8 pontos percentuais. Especificamente, a União passou de 69,7% em 1983 para 56,4% em 1996. Já os estados aumentaram sua participação na receita disponível de 21,3% para 26,5% e os municípios passaram de 8,9% para 17% no mesmo período. Assim, esse período que pode ser chamado de descentralizador, foi marcado por uma expressiva elevação das transferências federais e estaduais. Com a reforma tributária da Constituição de 1988, ficou ainda mais consolidada a redefinição das receitas entre as três esferas de governo.

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Na realidade uma das mudanças mais significativas foi a chamada Emenda Passos Porto (1983), que aprovou a destinação para estados e municípios de mais da metade do Imposto Único sobre Lubrificantes e Combustíveis (IULC) de forma escalonada e, também, o aumento dos Fundos de Participação de Estados e Municípios.


Assim, a evidência apresentada pelo Gráfico 3 mostra que houve uma ampliação do grau autonomia financeira de estados e municípios, a partir de 1983 e foi mais consolidada depois da Constituição Federal de 1988, que elevou o montante das transferências intergovernamentais.5 Entretanto, mesmo com descentralização de receitas ocorrida nos anos 80, no Brasil, os governos estaduais das Regiões Sul e Sudeste não conseguiram equilibrar seus orçamentos. Especificamente no caso do Rio Grande do Sul, houve, inclusive, um desajuste maior das suas contas públicas nesse período, o que foi notado pelas mudanças no padrão de financiamento dos gastos públicos. Existiu insuficiência das receitas próprias e um crescimento expressivo dos empréstimos, tendo como conseqüência o aumento do serviço da dívida. O mesmo ocorreu com os municípios. Como explicar esse paradoxo? Parece razoável supor que ocorreram nos anos 90 várias modificações nas atribuições dos estados e municípios, como também pequenas reformas tributárias como o FEF, a Lei Kandir e várias outras desonerações fiscais. Isso tudo penalizou os estados e municípios fazendo com que suas receitas fossem gradativamente sendo diminuídas. 4 – Os encargos sociais da União, estados e municípios Antes de se definir a carga tributária, cabe discutir qual é o tamanho do Estado e, principalmente, quais são as atribuições de cada uma das esferas governamentais. O Governo não deve fazer o que pode ser realizado pela iniciativa privada, e as três esferas governamentais devem ter bem claro quais as funções que deveriam ser implementadas por cada uma delas. Só para se ter uma idéia, analisando-se os dados financeiros dos municípios gaúchos, foi visto que no ano de 1996, em 172 deles foi executada a Função Defesa Nacional e Segurança Pública. Isto cria uma distorção, pois ela é uma função que caberia ao estado executar. Existem também outros problemas com as responsabilidades das três esferas, governamentais. Em primeiro lugar, nota-se que a União está diminuindo seus gastos com as funções educação e cultura e saúde e saneamento, enquanto que os municípios gaúchos estão aumentando suas responsabilidades nestas funções. Também o estado do Rio Grande do Sul vem comprometendo uma parcela cada vez menor de recursos nas mesmas funções. Pela Tabela 2 pode-se observar que a despesa da União nas funções Educação e Cultura e Saúde e Saneamento foram diminuídas no ano de 1996 em relação ao ano anterior, respectivamente em -9,4% e -50,1%. A Função Educação e Cultura passou de R$ 11,4 bilhões para R$ 10,3 bilhões e a Função Saúde e Saneamento foi reduzida pela metade passando de R$ 32,2 bilhões para somente R$ 16 bilhões. Tabela 2 Despesas da União nas funções educação e cultura e saúde – 1995-96 (R$ milhões) Funções Educação e Cultura Saúde e Saneamento

1995 11.458 32.293

1996 10.373 16.092

Variação (%) -9,4 -50,1

Fonte: Relatório e Parecer Prévio das Contas da União, 1997. Nota: os valores estão em R$ milhões de set./97. Para a conversão em real, inflacionou-se pelo IGP-DI da FGV.

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Interessante salientar que embora em algumas unidades da federação (tanto por parte dos estados como dos municípios) possa ter ocorrido um aumento da capacidade de arrecadar, não se pode afirmar que isso tenha ocorrido de uma forma mais generalizada no Brasil. Pois sem dúvida as transferências intergovernamentais superaram o aumento das receitas próprias dos estados e municípios. Também Varsano (1997, p. 21) argumenta nesse sentido.


Além disso, segundo o Tribunal de Contas, a União não vem priorizando o ensino fundamental e isto fere o que determina a Constituição.6 Apesar da União respeitar em parte o que está estabelecido no artigo 212 da Constituição, não cumpre o que está no artigo 60 das Disposições Transitórias que determina que, no período de 1989 a 1998 deverá gastar a metade no mínimo, do total gasto no sistema de manutenção e desenvolvimento do ensino. A tabela 3 apresenta a despesa realizada da União no Sistema de Manutenção do Ensino no período de 1990 a 1996.

Anos 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996

Tabela 3 Despesa realizada pela União no sistema De manutenção do ensino – 1990-1996 Ensino Ensino Outros Fundamental Superior Programas 1,1 61,1 37,8 5,9 59,9 34,2 1,7 53,2 45,1 0,8 56,0 43,2 1,6 58,1 40,3 0,7 53,0 46,3 1,0 54,3 44,7

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: Relatório e Parecer Prévio das Contas da União-1996.

De uma forma geral, pode-se notar que a União nunca priorizou o ensino fundamental, pois oito anos já se passaram desde a promulgação da Constituição e neste período ele nunca passou de 6% do gasto no sistema de manutenção e ensino. No ano de 1996, por exemplo, a União destinou somente 1% ao ensino fundamental. Segundo o Relatório e Parecer Prévio de 1996 do Tribunal de Contas da União, atualmente está em vigor uma emenda que suprime a possibilidade de empresas deduzirem da contribuição do salário-educação as despesas realizadas com o ensino fundamental de seus empregados e dependentes. Isto, sem dúvida, amplia os recursos da União para o financiamento da educação. Já pelo Gráfico 4 pode-se notar que o estado do Rio Grande do Sul vem diminuindo o comprometimento no orçamento nas funções de Educação e Cultura e Saúde e Saneamento nestes últimos 14 anos. Essas duas funções que representavam cerca de 25% de todo gasto estadual em 1982, diminuíram para 18,4% no ano de 1996.

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Especificamente, pelo artigo 212 da Constituição Federal fica estabelecido que a União aplicará, anualmente, nunca menos de 18% da receita resultante de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino e o artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias determina que, nos dez primeiros anos da promulgação da Constituição a União deverá aplicar, pelo menos, 50% daqueles recursos para eliminar o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental. Analisando-se os gastos da União nesta rubrica nota-se que apesar de ter sido atendido o artigo 212 – pois a União gastou no ano de 1996 cerca de 22,1% da receita líquida de impostos – não foi cumprido o artigo 60.


Gráfico 4 Participação percentual dos gastos em educação e cultura E saúde e saneamento do Estado – 1982-96

Também isto ficou mais evidente em um trabalho recente sobre a despesa com pessoal, onde se constatou que justamente nas atividades fundamentais do estado estava havendo uma diminuição de servidores, o que pode comprometer a qualidade do serviço público (Meneghetti Neto et al., 1997). Por outro lado os municípios vêm gradativamente aumentando seus gastos nestas duas áreas, como bem assinala o Gráfico 5.

Gráfico 5 Participação percentual do gasto em educação e cultura e saúde e saneamento dos municípios gaúchos – 1982-1996

Vale ressaltar um outro estudo desenvolvido recentemente (Meneghetti Neto e Winckler (1997)) onde se chegou a uma conclusão semelhante. No período de 1986 a 1994 o Estado gastou mais na área social, mas as transferências dos gastos sociais aos municípios gaúchos diminuíram, fazendo com que os municípios fossem forçados a aumentarem seus gastos nesta área. A Tabela 4 apresenta essas variáveis.


Tabela 4 Gastos do Estado, transferências aos Municípios e gastos municipais na área social do RS-1986-94

Anos Média-86-88 Média 89-94

Estado R$ Milhões 2.068 2.145

Transferências aos municípios Municípios % do PIB R$ Milhões % do PIB 3,89 37 0,07 4,40 32 0,06

R$ Milhões 553 1.040

% do PIB 1,04 2,16

Fonte: Meneghetti Neto e Winckler (1997). Balanço e perspectivas da descentralização das políticas sociais do Estado do Rio Grande do Sul: 1986-1994 Nota: os valores estão em R$ milhões de dez./95. Para a conversão em real, inflacionou-se pelo IGP-DI da FGV.

Pelos dados apresentados fica evidente que depois da Constituição de 1988 os gastos sociais do Estado aumentaram em média, passando de R$ 2,0 bilhões para R$ 2,1 bilhões, o que representou um aumento de 3,89% para 4,40% do PIB. Mas as transferências de recursos da área social para os municípios diminuíram em média de R$ 37 milhões para R$ 32 milhões, o que equivaleu uma queda de 0,07% para 0,06% do PIB. Por outro lado, os gastos municipais dobraram passando de R$ 553 milhões (antes da Constituição de 88) para R$ 1 bilhão (no período depois da Constituição de 88) para R$ 1 bilhão (no período depois da Constituição de 88), representando um aumento de 1,04% para 2,16% do PIB. Essa evidência (de aumento dos gastos do estado, 7 queda nas transferências e crescimento dos gastos municipais) fica ainda mais clara através do Gráfico 6. Repetindo, nota-se um aumento dos gastos sociais do Estado gaúcho, mas as transferências de recursos da área social para os municípios diminuíram. Por outro lado, foi a esfera municipal que efetivamente implementou um esforço maior depois da Constituição de 1988. Gráfico 6 Evolução dos gastos sociais do Estado, das transferências aos municípios E dos gastos municipais antes e depois da Constituição de 1988

Fonte: Meneghetti Neto e Winckler (1997). Balanço e perspectivas da descentralização das políticas sociais no Estado do Rio Grande do Sul: 1986-1994

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É importante salientar que embora o Estado tenha gasto mais nestas funções neste período, ele está comprometendo cada vez menos do seu orçamento, como ficou demonstrado no Gráfico 2. Assim, não existe contradição nestas duas evidências.


A conclusão que se pode tirar é que com a Reforma Constitucional de 1988, ficou evidente uma melhoria nas receitas tanto do Estado como dos municípios. Mas também ficou nítida uma preocupação maior dos municípios em aumentarem suas receitas. Em termos de gastos sociais foi a esfera municipal a que mais implementou esforço na execução dos gastos sociais, pois as transferências aos municípios não aumentaram. Enfim, apesar de ter havido uma razoável descentralização de recursos aos municípios após a Constituição de 88, houve uma implementação bem maior na execução dos gastos sociais por parte dos municípios. Daí pode-se argumentar que a descentralização fiscal no Rio Grande do Sul que vem ocorrendo depois da Constituição de 88, tem em seu núcleo duas características bem marcantes: os municípios gaúchos estão sendo forçados a se tornarem mais independentes financeiramente e eles próprios estão se capacitando cada vez mais como executores das políticas sociais, ainda que esse processo esteja incipiente.8 Em outras palavras, mesmo que os municípios tenham conseguido gastar na área social cerca de 2,16% do PIB em média no período de 1989 a 1994, o que já equivale à quase a metade dos gastos estaduais no mesmo período; o que deve ser salientado é que em termos institucionais e de cobertura, o processo ainda é muito recente. Concluindo, os municípios gaúchos estão se capacitando cada vez mais como executores das políticas sociais, ainda que as formas desta intervenção sejam bem variáveis entre eles e entre as diversas políticas, como está documentado em Meneghetti Neto e Winckler (1997). Finalmente é importante chamar atenção para uma emenda constitucional que entrará em vigor no ano de 1998, que deverá ter um impacto enorme nas finanças municipais. Essa emenda - que praticamente modificou a questão da educação no país - e a nova Lei de Diretrizes e Base da Educação - modificarão profundamente a ação no âmbito municipal nos próximos anos. Fica estabelecido que cerca de 25% dos recursos tributários municipais terão que ser repassados mensalmente para uma conta separada para educação, cuja administração terá que ficar a cargo do setor educacional. Isto significa que os municípios terão que ter uma reserva mensal em um fundo próprio da educação. Em outras palavras, tarefa extremamente difícil para a maioria dos municípios gaúchos. Só para se ter uma idéia, no ano de 1996 cerca de 141 municípios gastaram menos do que 25% dos recursos com educação. 5 – O Fundo de Estabilização Fiscal O Fundo de Estabilização Fiscal -FEF9 criado para sanear a fazenda pública federal e ajudar a estabilização financeira, tem como meta destinar seus recursos prioritariamente a saúde e educação, e previdência.10 Entretanto existe uma distorção na sua execução como mostra a Tabela 5.

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Para efeito de ilustração procurou-se apresentar em Anexo um quadro síntese das políticas sociais no Rio Grande do Sul no período de 1986-94. Para maiores detalhes ver também o estudo Meneghetti Neto e Winckler (1997). 9 Na realidade o FEF foi criado em março de 1996 para vigorar no ano de 1996 a 30 de junho de 1997. Ele se originou do Fundo Social de Emergência – FSE que havia sido implementado em 1994, para vigorar nos exercícios financeiros de 1994/95. 10 Os objetivos do FEF estão definidos nos art. 71, do Ato das disposições Constitucionais Transitórias. São eles: “o saneamento financeiro da fazenda pública federal e de estabilização econômica, cujos recursos serão aplicados prioritariamente no custeio das ações dos sistemas de saúde e educação, benefícios previdenciários e auxílios assistenciais de prestação continuada, inclusive liquidação de passivo previdenciário, e despesas orçamentárias associadas a programas de relevante interesse econômico e social”.


Tabela 5 Execução orçamentária do FEF por função – 1996 Funções % Assistência e Previdência 55,30 Defesa Nacional e Segurança Pública 13,59 Saúde e Saneamento 8,91 Educação e Cultura 7,35 Administração e Planejamento 5,44 Agricultura 3,12 Transporte 2,48 Trabalho 1,11 Desenvolvimento Regional 0,79 Energia e Recursos Minerais 0,50 Legislativo 0,41 Judiciário 0,40 Habitação e Urbanismo 0,32 Comunicações 0,13 Indústria, Comércio e Serviços 0,09 Relações Exteriores 0,06 100,00 TOTAL Fonte: Relatório e parecer prévio das contas da União de 1996. Tem sido destinado uma parcela considerável para a função defesa nacional e segurança pública. Nota-se que a função defesa nacional e segurança pública absorveu no ano de 1996 mais de 13% do total do FEF, o que significa quase os gastos em saúde e educação somados. Isso representou R$ 3,3 milhões. Além disso, as perdas dos municípios nos repasses do FPM têm sido bem expressivas, principalmente naqueles municípios que tem grande parte de seus orçamentos dependendo das receitas transferidas. 6 – As emancipações É inegável o crescimento do número de municípios no Brasil, que, nestes últimos 50 anos, aumentou de 1,5 mil para quase 5 mil. No Rio Grande do Sul, o avanço é ainda maior. Nos últimos 13 anos, o número de municípios gaúchos dobrou com a promoção de quatro processos de emancipações. Existem vários argumentos (e inclusive estudos) favoráveis às emancipações: o poder público fica mais próximo da população; o desmembramento pode proporcionar o desenvolvimento; a administração numa área menor é sempre mais eficiente e também recebe uma maior colaboração da comunidade. Além disso, em boa parte das nações existe uma quantidade bem maior de municípios, e, a emancipação mexe com sentimentos individuais e com o orgulho das pessoas de pertencerem ao lugar onde nasceram ou trabalham. Muito provavelmente, todas essas constatações são verdadeiras e merecem atenção, pois, em termos individuais, pode ser que faça sentido para os habitantes de cada um dos municípios ser a favor da emancipação. Seria oportuno, entretanto, analisar as emancipações do ponto de vista nacional, sob a ótica das contas do conjunto das esferas de governo como um todo. É aí que aparece seu lado perverso. A maioria dos municípios tem-se emancipado sem a mínima infraestrutura administrativa, fazendo-se necessária toda uma outra estrutura: novas prefeituras, câmaras de vereadores, secretarias municipais, mais servidores públicos, instalações, veículos, etc. Assim, gerou-se duplicidade administrativa, significando que a soma do gasto do município emancipado e de origem foi maior do que a despesa anterior ao desmembramento. Isso provocou um acréscimo na máquina pública, cujos gastos não recaíram somente sobre a esfera municipal,


mas também sobre o Estado e sobre a Nação, pois os municípios dependem muito de verbas estaduais e federais. Muitos municípios pequenos que se emanciparam provavelmente continuam tão pobres como antes, com a diferença de que agora seus habitantes trabalham para sustentar estruturas burocráticas. A propósito, uma recente pesquisa acadêmica (Amaral, 1995) sobre as 12 emancipações ocorridas em 1982 revelou que nos primeiros seis anos – em média – a renda “per capita” desses municípios diminuiu de R$ 5 mil para R$ 3,7 mil; a despesa pública aumentou 50% (particularmente os gastos com pessoal); e a dependência das transferências de receitas federais e estaduais ficou ainda maior. Apesar de terem ocorrido três exceções nesse grupo de municípios, ainda assim isso representou uma perda de eficiência e um encarecimento da máquina pública, tal qual o exemplo citado. Assim, parece razoável supor que a proliferação de municípios, dentro do contexto de uma crise fiscal já bastante aguda, representa um ingrediente importante da crise das finanças públicas, onde o contribuinte é um dos prejudicados mais visíveis. Isto está bem documentado em Meneghetti Neto (ZH, 10.12.95). 7 – A Lei Camata A Lei Complementar Federal n.82 de 27/3/95 (Lei Camata), limitou as despesas com pessoal da União, estados e municípios a 60% da receita corrente líquida. Vários estados estão com um comprometimento maior do que 60%, como por exemplo, o Rio Grande do Sul que chegou em 1996 à 86,27% da receita corrente líquida. Um estudo recente (Meneghetti Neto et al., 1997) chegou a conclusão que tanto a despesa com o funcionalismo, como a do serviço da dívida, tem dificultado a execução orçamentária do Estado, constituindo-se problemas de mesma grandeza. Especificamente, existem problemas no gasto com pessoal, tanto pelo seu crescimento como pelas distorções em sua estrutura. O aumento da despesa com pessoal tornou-se expressivo, principalmente após 1994, devido a dois motivos: Plano Real e mudança de governo. Com o Plano Real, o governo já não pode mais contar com atrasos de seus pagamentos para reduzir suas despesas, e com isso o gasto com pessoal foi tornando-se cada vez mais expressivo. Além disso, a política salarial do governo anterior foi de ajustamento, no sentido de conter o crescimento da folha. Quando mudou o Governo, houve uma pressão enorme do funcionalismo e ele foi obrigado a conceder reajustes para várias categorias, o que acabou pesando ainda mais no orçamento. Pelas informações disponíveis dos municípios gaúchos, tem-se que no ano de 1996 eles comprometeram cerca de 48,16% da receita corrente com gastos de pessoal. Na realidade esse nível de gasto fica bem abaixo do limite estabelecido pela Lei Camata. Entretanto, existem 48 municípios que comprometeram mais 60% no ano de 1996, e que devem urgentemente se adequar a Lei. Provavelmente o caminho seguido pelo Estado do Rio Grande do Sul em 1996 não deve ser o mais adequado, pois foi implementado o Programa de Demissão Voluntária-PDV, e a maioria das adesões ao Programa foi de atividades-fins (segurança, educação e saúde), o que acabou prejudicando a qualidade do serviço público gaúcho.11 É importante que os municípios não recorram a demissões ou programas semelhantes, até porque não existe um número excessivo de funcionários públicos no Brasil como bem demonstra 11

Antes mesmo disso, a qualidade do serviço público (principalmente da área social) já vinha diminuindo, segundo o Tribunal de Contas de Estado do RS. O Relatório e Parecer Prévio sobre as Contas do Governo Estadual: exercício de 1995 aponta que os serviços de segurança pública, educação e saúde vem sofrendo uma diminuição da qualidade. Em relação a Segurança, os recursos humanos (Brigada e Polícia Civil) são insuficientes, existe distorção na distribuição do efetivo da Brigada Militar, 70% da frota de veículos tem mais de cinco anos de uso e não existe eficácia em assegurar os direitos e garantias individuais e a tranqüilidade pública, uma vez que é elevado o número de ocorrências atendidas por policiais civis: 40 ocorrências por ano. Na educação, o percentual de professores sem regência é elevado (22,4%) e cerca de 37% das salas de aula não foram utilizadas. Na saúde, o número de hospitais públicos vem diminuindo e existe 3,5 leitos hospitalares para cada mil habitantes, quando a Organização Mundial de Saúde aponta que este coeficiente deve ser de no mínimo 5.


um estudo da Enap.12 Demissões podem significar uma diminuição da qualidade do serviço público. Os recursos humanos devem ser treinados para se tornar cada vez mais capacitados. Para se adequarem à Lei Camata, os municípios devem procurar urgentemente aumentar suas receitas próprias. 8 – As isenções ficais O orçamento gaúcho apresenta anualmente uma estimativa das desonerações do ICMS, que compreendem as isenções, imunidades, reduções de base de cálculo e os créditos fiscais presumidos. Através da Tabela 6 – que apresenta as desonerações concedidas no período de 1992 a 1996, - pode-se chegar a conclusão que é bem expressivo o montante das mesmas. Tabela 6 Desonerações do ICMS concedidas ao mercado interno e externo No RS-1991-1996 % 1992 1993 1994

ANOS Desonerações Mercado interno Mercado externo Totais

12 10 22

26 11 37

26 11 37

1996 19,5 16,5 36

Fonte: Orçamentos estaduais (1992, 1993, 1994, 1996).

Pode-se notar que no ano de 1992 as desonerações do ICMS concedidas ao mercado interno chegaram a 12% e as do mercado externo a 10%, atingindo cerca de 22% da receita potencial. No ano de 1996 houve uma ampliação das desonerações concedidas, tanto ao mercado interno, como ao externo, chegando respectivamente a 19,5% e 16,5%, totalizando 36% da receita total. É óbvio que um volume menor da arrecadação do ICMS também corresponde a repasses menores aos municípios. Neste sentido, seria oportuno e necessário atender o que determina o artigo nº 41 da Constituição Federal, que estabelece que “os Poderes Executivos da União, dos Estados e dos Municípios, reavaliarão todos os incentivos fiscais de natureza setorial ora em vigor, propondo aos Poderes Legislativos respectivos as medidas cabíveis”. Nota-se que pouco tem sido feito para atender esta determinação. 9 – Lei Kandir A Lei Kandir, que isentou de ICMS as exportações de semi-elaborados e primários, máquinas e implementos e bens para consumo próprio começou em setembro de 1996. Ela faz com que a perda do Estado do Rio Grande do Sul seja de R$ 534 milhões ao ano, o que equivale a mais do que uma arrecadação mensal de ICMS. Isto equivale a mais ou menos cerca de 15% da receita de ICMS, segundo os cálculos da Secretaria da Fazenda (Performance Fiscal, 1997). A União criou, entretanto, um mecanismo de seguro-receita que ressarcirá os Estados, se ocorrer uma perda no comparativo entre o período base (setembro de 1995 a fevereiro de 1996) e o de referência, respeitando um teto de compensação. A Tabela 7 apresenta a relação dos estados que estão recebendo esse seguro.

12

Neste estudo de 1992 ficou constatado que o Brasil possuía 15,8% de empregados do governo em relação a população empregada total, enquanto em outros países esta relação era bem maior. França, Reino Unido, Finlândia, Noruega e Suécia apresentaram respectivamente 19%, 22%, 27%, 33% e 36% de funcionários públicos em relação a população empregada total.


Apura ção

Tabela 7 Distribuição do seguro-receita entre os estados relativo a Lei Kandir Valor Mês de Distribuído Estados Contemplados Competência (R$ Milhões) Acre, Amapá, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba e Paraná.

Setembro

33,5

Outubro

20

Espírito Santo, Pará, Paraná e Rio de Janeiro.

Novembro

9,8

Amapá, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará e Paraná.

Dezembro

9,3

Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas gerais, Pará e Paraná.

Janeiro

16,5

Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Paraná.

Fevereiro

31,3

Espírito Santo, Mato Grosso, Minas gerais, Pará, Paraíba, Rio de Janeiro e Paraná.

Março

36,2

Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Rio de Janeiro e Paraná.

Pode-se notar que os estados do Paraná e do Espírito Santo é que foram contemplados em cinco apurações do “seguro-receita” e o Rio Grande do Sul até março de 1997 não havia sido ainda contemplado. A arrecadação do ICMS gaúcho no ano de 1997 vem ficando aquém da verificada no ano passado. O Gráfico 7 mostra a evolução do ICMS mensalmente. Gráfico 7 Evolução do ICMS – 1996-97

Pode-se notar que desde abril de 1997 a arrecadação tem ficado abaixo a do ano de 1996, sendo que os piores desempenhos foram os meses de agosto e setembro de 1997. Com isso os municípios gaúchos também têm uma diminuição do ICMS repassado. Para aqueles municípios de menor porte populacional – que dependem mais das receitas transferidas – as perdas são maiores do que os de maior porte. Procurando-se calcular as perdas de todos os municípios gaúchos devido a Lei Kandir, tem-se que os repasses do ICMS para os municípios no ano de 1996 chegaram a R$ 1 bilhão (em valores correntes). Esse valor significou no ano de 1996 cerca de 37% (em média) nos orçamentos dos municípios (incluindo Porto Alegre). Assim, a


diminuição do ICMS de 15% terá um impacto de R$ 150 milhões nos orçamentos municipais, o que significa em média 5% a menos nas receitas totais dos municípios. 10 – Uma proposta de reforma tributária O Mercosul e a globalização vêm pressionando para que ocorra uma diminuição do Custo Brasil através da redução de impostos sobre o consumo, pois, em outros países (França, Espanha, Holanda, Alemanha e Portugal), os tributos não passam de 8% do preço final dos alimentos industrializados. Espera-se que uma redução das alíquotas dos impostos tenda a aumentar a demanda por consumo e o nível de empregos. Além disso, também estimula a disposição dos empresários para assumirem riscos. Mas aí surge um impasse, pois o Governo não pode simplesmente reduzir alíquotas dos impostos sem negociar uma forma de compensação com a classe produtiva, uma vez que a receita tende a cair. Também é importante não repetir os erros no passado, como por exemplo em 1992, quando houve a redução de alíquotas do ICMS dos produtos da cesta básica, e os preços não caíram. Atualmente, várias propostas de reforma tributária estão em tramitação no Congresso nacional; algumas delas bem radicais, e outras polêmicas. O estudo de Rezende (1995), concluiu que deve haver cautela e prudência por parte de todos aqueles responsáveis pelo encaminhamento das propostas, para evitar um impasse na sua negociação: Existem muitos fatores que necessitam ser considerados. As mudanças não podem ser realizadas de uma só vez, sob pena de comprometerem o equilíbrio regional, federativo e o financiamento de programas sociais. Provavelmente, projetos menos ousados, porém mais realistas, devem ter maiores chances de desencadear uma modernização necessária do sistema tributário brasileiro, adequada ao cenário do Mercosul e à globalização. Apesar de haver uma crença já tradicional, pela experiência cotidiana das pessoas, de que, aconteça o que acontecer, os preços dos produtos jamais se reduzem, algo ainda pode ser feito. Por exemplo, o acordo de redução de impostos através das Câmaras Setoriais foi uma boa experiência, que pode ser implantada novamente; mostrou que vários interlocutores, de divergentes interesses econômicos, podem abrir mão de uma parcela de renda, para que o preço final do produto possa baixar significantemente. A idéia é de que uma queda no preço ocasione um razoável aumento de consumo, de vendas, de produção e, conseqüentemente, de emprego e de receita para o Governo. Além do mais, essa proposta aliviaria o item do orçamento doméstico: supermercado, que como foi visto anteriormente é justamente o que mais pesa nas famílias de renda baixa e média. E os municípios podem sair beneficiados, uma vez que este tipo de política pode atuar diretamente no orçamento das pessoas de menor renda. Concluindo, este tipo de proposta negociada entre Governo, empresários e trabalhadores parece ser mais oportuna e realista e deve ter razoável impacto para os municípios. 11 – Conclusão Foram trazidas neste documento várias evidências de que os recursos da esfera municipal estão sendo reduzidos e é justamente essa esfera que tem toda a obrigatoriedade do atendimento direito ao cidadão. Os encargos municipais estão aumentando cada vez mais, ainda que o processo seja muito incipiente. Na realidade cada vez existem mais dificuldades na prestação do serviço público. Cabe ao administrador municipal buscar um melhor equilíbrio entre a arrecadação e a oferta dos serviços públicos, buscando cada vez mais melhorar o atendimento ao cidadão. Para que isso aconteça, é fundamental que se tenha bem claro quais são as atribuições de cada uma das esferas governamentais.


Referências bibliográficas ALISKI, A. Impostos consomem 29,1% dos salários. Zero Hora, 22 set. 1997, p.22. AMARAL, R.L.P. Emancipações municipais 1981-92; os resultados de uma década de autonomia. Porto Alegre: PUCRS, 1995. (Monografia de conclusão do curso de Economia). FLACH, M. Conta chega à classe média. Zero Hora, Caderno de Economia, 16 de nov. 1997, p.6. MENEGHETTI NETO, A. Os efeitos da redução do ICMS da cesta básica. Indicadores Econômicos FEE, Porto Alegre, v.20, n.4, p.181-205. 1992. _______, RÜCKERT, I.N. Avaliação das finanças públicas estaduais – 1970. In: FARIA, L. A. E. et al. O Estado do Rio Grande do Sul nos anos 80: subordinação, imprevidência e crise. Porto Alegre: FEE, 1994. _______. A dimensão fiscal da descentralização no RS. Porto Alegre: FEE, 1996. _______, WINCKLER, C. R. Balanço e perspectivas da descentralização das políticas sociais no Estado do Rio Grande do Sul: 1986-94. Relatório síntese. Porto Alegre: FEE, 1997. _______ et al. Análise do gasto estadual com pessoal. Estado do Rio Grande do Sul. Relatório final. Brasília: IPEA, 1997. MINISTÉRIO DO TRABALHO E DA ADMINISTRAÇÃO. Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). Estudos sobre recursos humanos do setor público. Brasília, 1992. PERFORMANCE FISCAL. Porto Alegre: Secretaria da Fazenda, Janeiro, 1997. RELATÓRIO E PARECER PRÉVIO SOBRE AS CONTAS DO GOVERNO ESTADUAL: exercício 1995. Porto Alegre: Tribunal de Contas do Estado, 1996. RELATÓRIO E PARECER PRÉVIO SOBRE AS CONTAS DO GOVERNO FEDERAL: exercício 1996. Brasília: tribunal de Contas da União. Diário Oficial da União, 26 jun. 1997, p.13.279, Seção 1, 1997. REZENDE, F. Propostas de Reforma do Sistema Tributário Nacional. IPEA, Brasília, 1996. (Texto para discussão n. 420). VARSANO, R. A evolução do sistema tributário brasileiro ao longo do século: anotações e reflexões para futuras reformas. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 27, n.1, p. 1-40, abr. 1997.


Anexos Quadro síntese das políticas sociais no Rio Grande do Sul – 1986-94

S A Ú D E

Gastos

Problemas

Os gastos estaduais no programa saúde vêm caindo em termos absolutos, em relação ao total das despesas estaduais, em relação ao PIB e per capita (p.52). Os gastos municipais na função saúde e saneamento vêm crescendo desde 1991 (p. 54).

Atrasos no repasse dos recursos, baixo valor da tabela SUS; dificuldades estruturais dos municípios para assumir a gestão da saúde, carência de recursos humanos.

Política Destinada ao Setor Existe preocupação do estado com relação à municipalização , evidenciada através de seminários para discussão promovido pela SSMA e através do rigor com que são feitas as avaliações dos pedidos de municipalização .

Gestão 89% dos municípios estão na gestão incipiente e apenas 2% na gestão semiplena (mas abrangem 25% da população municipalizada) . (p.8).

Transferências As transferências oriundas de governo federal, repassadas através do FES, representam 23% do total com saúde; as transferências realizadas pela SSMA representam algo em torno de 15% (9% aos municípios e 6% às restrições privadas).

Cobertura O nº de leitos hospitalares caiu 5% (de 1986 a 1995). Não foi possível detectar a transformação de disponibilidades de leitos públicos (privados, desde que houve, nesse período, a inclusão da categoria hospitais.

Tendências 1. Aumentar o número de municipalizados; 2. Consolidar a participação popular; 3. Criação de incentivos à atuação preventiva.


S A N E A M E N T O

E D U C A Ç Ã O

Gastos

Problemas

Os gastos estaduais no programa saneamento vêm diminuindo, sendo que somente no ano de 1994 ocorreu um volume maior devido ao aumento de capital da CORSAN (p.6).

Resultado negativo operacional da CORSAN em 1995. Além da dívida da estatal de R$ 526 milhões (TCE, 1996). Problemas de disparidade entre as economias atendidas e de hidrômetros instalados. Elevado índice de perdas tanto dos sistemas operados pela CORSAN, como nos serviços municipais. (FREITAS, quadros n: 3 e 4). Reduzida cobertura dos serviços em áreas rurais e no setor de esgotos sanitários (FREITAS e PUIG).

Gastos

Problemas

As despesas no setor educação vem caindo (p.18). As despesas na Função Educação e Cultura municipal aumentaram, entretanto sua participação manteve-se no patamar de 23%.

Caso a descentralização não se faça acompanhar da recuperação dos patamares históricos de despesas no âmbito estadual, as ações do Estado com os municípios poderão fracassar. (p.44).

Política Destinada ao Setor Ausência de uma política setorial com abrangência sobre a área rural e urbana e sobre os diversos operadores dos serviços (FREITAS, p.70). Apesar do crescimento dos investimentos e dos gastos em saneamento no RS ainda existe um nível muito baixo que significou pouco para reduzir o atraso existente no setor (p.14).

Política Destinada ao Setor O processo de descentralização no RS apesar de ter atingido relativo grau de organização, certamente ainda não produziu efeitos de monta na produtividade escolar. (p.44).

Gestão Em termos de abastecimento de água, 289 municípios operados pela CORSAN, seis autarquias municipais e 132 diretamente pelas prefeituras, sem uma ordenação institucional adequada. (FREITAS, p.16 e 17). Em termos de esgotamento sanitário 41 municípios são operados pela CORSAN, cinco autarquias e nos restantes 381, não existem sistemas institucionalizad os (FREITAS, quadros 3 e 4). Não existem instrumentos de regulação e controle sobre a prestação dos serviços (FREITAS, p.67).

Gestão Número de municípios que possuem: Plano de Carreira (412); Planos Municipais de Educação (342) e Conselhos Municipais de Educação (256). PNME descentralizada Lei nº 10. 576: Gestão Democrática do Ensino Público.

Transferências As transferências aos municípios são pouco significativas (Tabela 16).

Transferências As transferências aos municípios são pouco significativas. As transferências federais têm aumentado sua participação no total dos recursos aplicados em educação.

Cobertura

Tendências

Elevada cobertura em termos de abastecimento público em áreas urbanas (acima de 90%), reduzida cobertura em áreas rurais e em termos de esgotamento sanitário nas áreas urbanas (FREITAS e PUIG). Situação de cobertura é semelhante nas autarquias e na Companhia de Saneamento (FREITAS, p.29).

Maior interferência e participação da comunidade, bem como do poder concedente, sobre os operadores dos serviços. Redefinição dos papéis da CORSAN, como empresa viabilizada financeiramente , e do Estado como ente regulador e fiscalizador da qualidade dos serviços. Descentralizaçã o da CORSAN (FREITAS, cap. 3,4 e 5).

Cobertura

Tendências

A rede estadual ainda concentra as matrículas do ensino fundamental (56%). A rede municipal possui 34% das matrículas de 1º grau. (p.43).

A partir da consolidação da organização municipal na área educacional, bem como da Lei nº 10. 576 e Emenda nº 14/96 o ensino de 1º grau será municipalizado a médio prazo.


H A B I T A Ç Ã O

Gastos

Problemas

No período de 86 a 94 os gastos estaduais em habitação diminuíram de ano para ano, tornando-se irrisório a partir de 1991 (p.6). Já os gastos dos municípios no conjunto da função aumentaram e foram cinco vezes maior do que os do estado. (p.41).

Existe um desinteresse do Governo estadual, especialmente a partir de 1991, associado ao grave problema de endividamento da COHAB (p.51).

Política Destinada ao Setor A partir de 1993, pode-se detectar os primeiros passos no processo de descentralização , mas este só se configura com a instituição do novo Sistema Estadual de Habitação de Interesse Social em 1995 (p.51).

Gestão Dada a disparidade entre os recursos estaduais e municipais pode-se supor que os últimos tenham atendido uma parcela muito maior de sua demanda habitacional. (p.51).

Transferências São mínimos os recursos transferidos aos municípios gaúchos.

Cobertura No período 1986/94 a COHAB atendeu em média 1% da demanda por habitações populares no RS.

Tendências O grave problema financeiro decorrente da impossibilidade de operar lucrativamente na comercialização de habitação de baixa renda tende a ser encaminhado dois tipos de ação no setor: o uso de recursos a fundo perdido; locação social e não venda de moradias.


A S S I S T Ê N C I A E P R E V I D Ê N C I A

Gastos

Problemas

O gasto em assistência e previdência apresentou um crescimento, tanto do Estado, quanto nas transferências nos municípios (LORIS, p.9). Entretanto considerando-se os programas assistência e previdência nota-se que enquanto o primeiro permanece a mesma participação (baixa) a previdência aumenta sua participação no total da despesa do Estado (SANÁBRIA, p.18).

Tanto a indenização formal, como a invasão da área da assistência pela previdência, como a diferenciação dos usuários, que incluem desde o morador de rua até os deputados e magistrados, levam a que se questione o que é assistência social para o Estado, qual é a identidade e o perfil dessa política pública, no RS. (SANÁBRIA, p.37).

Política Destinada ao Setor A partir de 1995 observa-se os primeiros sinais de descentralização político administrativo da Assistência Social, após convênio entre MPAS/SAS entre o Estado do RS. Em 1996 foram instituídos o Conselho e o Fundo Estadual de Assistência.

Gestão A nível municipal existem 249 Conselhos de Assistência Social representando 58,5% dos Municípios. Quanto aos Fundos Municipais estão registradas 138, não podendo informar o estágio de remuneração e funcionamento. Em termos de Conselhos Municipais dos Direitos das Crianças e Adolescentes existem 197 institucionalizad os e dos mesmos 157 contam com Conselhos Titulares. Existem, também, no estado 6 Conselhos Municipais do Idoso.

Transferências Mais de 16% dos recursos vão para os municípios em casos de calamidade pública – seguidamente ocorrem enchentes no Estado –, para instituições de caridade e programas de ações comunitárias, através do gabinete do Governador. (SANÁBRIA, p.36).

Cobertura

Tendências

Sabe-se que existem mil famílias indigentes (IPEA, 93) no RGS, mas não há informações concretas sobre o atendimento destas. A partir de 1996, começaram algumas pesquisas sobre o de idoso e de criança e adolescentes, em estado de necessidade.

Pode-se dizer que a solução do problema da totalidade dos “desassistidos” pela prática até agora desenvolvida, é muito remota, entretanto a LOAS poderá ser um instrumento de muita valia na conscientização da população e do governo, para, pelo menos, minimizar a situação.

Fonte: MENEGHETTI NETO, A. & WINCKLER, C. R. (1997) Balanço e perspectiva da descentralização das políticas sociais no estado do Rio Grande do Sul: 1986-94. Relatório Síntese. Porto Alegre: FEE.


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