FILME BRÜNO: ESCRACHANDO A REALIDADE Brüno é um longa-metragem norte-americano extremamente polêmico. Lançado em 2009 e comandado pelo diretor Larry Charles, o filme tem como personagem principal o ator comediante Sacha Baron Cohen, muito conhecido por expor de forma polêmica e genial os problemas da humanidade e, ainda, atacar os pensamentos conservadores. O longa-metragem aborda e critica diversos temas, como hipervalorização e obsolescência programada do mundo da moda, padrões estéticos, exacerbação da sexualidade, Ultimate Fighting Combate (UFC), Guerra no Oriente Médio, consumismo, preconceitos do conservadorismo e principalmente o que uma pessoa é capaz de fazer para alcançar a fama. O personagem Brüno é um jornalista austríaco de 19 anos. Idiota, inteligente, grosseiro e engraçado, ele é o retrato de um gay afeminado, construído de acordo com os paradigmas fixados pela sociedade. Com uma sexualidade acentuada, é uma identidade rejeitada pela sociedade, como muitas que vemos na mídia. É o tipo de homossexual que pai nenhum quer que o filho vire. Com essa personalidade, Brüno foi demitido de um programa sobre moda em um canal da televisão austríaca, após aparecer ao vivo com seu pênis a mostra. Aliás, esta é uma cena imperdível, que atinge os conservadores. Como por exemplo: alguns colegas – a maioria meninas – da disciplina de Sociologia Para Comunicação da Universidade Feevale, numa aula do 1º semestre de 2014, retiraram-se da sala de aula ao ver a cena da nudez de Brüno. Não compreendo tal atitude, pois mulheres nuas, como a Globeleza, por exemplo, são expostas na mídia diariamente e a reação das pessoas é de indiferença. Isto aponta que ainda há preconceito em publicar imagens do órgão sexual masculino, enquanto obras com mulheres nuas são jogadas a público todos os dias. Com isso, Brüno arruinou o programa e diminuiu a audiência do canal. Proativo e criativo, o jornalista viaja até os Estados Unidos em busca da fama – o sonho dos americanos. Ele quer se tornar o austríaco mais conhecido na história após o ditador Hitler. Já em seu início, o longa-metragem choca os espectadores, pois Bruno protagoniza com seu namorado Diesel, diversas cenas de sexo. Mostra como a sexualidade torna-se o campo da loucura humana. Para isso ele usa, inclusive, uma
bicicleta ergométrica devidamente adaptada para o prazer. Há também uma cena em que o jovem está falando ao celular com seu chefe, enquanto realiza uma depilação anal. É, sem dúvida, uma das cenas mais bizarras e engraçadas do filme. Todavia, apesar de cenas como essa, Brüno não é somente uma comédia. Pois mesmo com muito humor e diversão, torna-se visível o objetivo principal do filme: escandalizar a relidade. E para isso ele utiliza uma grande porção de cinismo e ironia, do início ao fim. Já em Los Angeles, nos Estados Unidos, após ser demitido de seu emprego e abandonado por seu namorado, o jovem busca encontrar uma forma de ficar famoso e prestigiado. Tenta de tudo para ser uma verdadeira celebridade, a qualquer custo. Protagonizando mais uma cena fantástica, Brüno bagunça o desfile de moda da famosa estilista Agatha Ruiz de La Prada. Nesta cena, ele usa um vestido feito de velcro, quando diversas roupas grudam no material. Em meio à confusão no camarim das modelos, ele acaba entrando na passarela do desfile, e ironicamente, sua roupa se parece muito com os vestidos habituais usados neste tipo de evento. Sem dúvida, é uma crítica ao mundo fashion. E concordo plenamente com a crítica, pois os especialistas da moda criam padrões, inovam, renovam e quem não se adequar a isso é taxado de ridículo ou antiquado. E pior, estamos sendo dirigidos por isso. Se eles decidirem que a cor do momento é bege, todos devem correr para as lojas e comprar roupas desta cor? Não! Isto sim é absurdo, ridículo e supérfluo. Programar a postura das pessoas é terrorismo, minha gente. Partindo para Holywood, Bruno faz outros planos para se tornar famoso. Após contratar um talentoso agente, ele propõe o projeto de um programa de televisão de entrevistas com outras celebridades. Porém, o seu jeito doidão acaba assustando os entrevistados e o público. Depois de tantas tentativas, Brüno acredita que, como muitas celebridades norte-americanas, ele precisa defender uma causa humanitária pra atingir a fama.
Seguindo para mais uma cena engraçadíssima e um tanto
quanto cínica, o jornalista consegue chocar um israelense e um palestino ao dizer que o conflito entre Israel e Palestina, na verdade é uma briga entre os hindus e os judeus. Porém, não obtém sucesso ao propor a paz no Oriente Médio. Após mais uma tentativa frustrada, ele resolve adotar uma criança africana. No entanto, durante uma entrevista em um programa de televisão, o garoto é tirado
de Brüno pelo Conselho Tutelar local, após expor sua personalidade e sua conduta homossexual. Esta cena chama a atenção para duas realidades. Uma é o preconceito existente para que um homossexual adote uma criança. A outra, a adoção de crianças africanas como causa humanitária com um fim pífio: aparecer na mídia. Muitas celebridades compram, isto mesmo, compram crianças no continente africano e usam-nas para manter ou elevar sua fama. Mas este fato não abate Brüno, que mesmo assim continua a buscar a fama, agora de um jeito mais ousado: deixando de ser gay. O pastor que atende o jovem numa sessão de terapia heterossexual é tão gay quanto Brüno. Esta cena é uma forma de mostrar como grupos, principalmente religiosos, se propõem a "recuperar gays". Recuperação esta, infundada e ineficiente, pois homossexualismo não é uma doença. Outra cena muito marcante é quando Brüno coloca a Paula Abdul sentada nas costas de um mexicano, que serve de cadeira em troca de grana. Exatamente isso que os norte-americanos fazem com boa parte dos imigrantes nos Estados Unidos: tratam-nos como lixo. Logo os norte-americanos que compram inúmeras toneladas de drogas do México. E cocaína é a preferida delas. Logo uma celebridade envolvida em causas humanitárias senta nas costas de um mexicano, como se ele fosse um objeto. Contraditório, não? Em mais uma tentativa de virar heterossexual, Brüno transforma-se em um lutador do UFC. Seu desempenho dentro do octógono é muito engraçado. Seu exnamorado, Diesel, invade o ringue e luta com Brüno. A cena começa com puxões e tapas, e termina em ambos transando em frente à plateia. Imperdível! Logo no templo de machões, a reação revoltosa das pessoas não poderia ser diferente em nossa realidade. É mais uma ácida crítica do filme. Em suma, Brüno cutuca profundamente a hipocrisia daqueles que alimentam a bilionária indústria do entretenimento. É uma denúncia irônica contra as armações que encobrem a verdade, a essa busca incessante e totalmente desnecessária da maioria da população pela fama. Já disse o filósofo francês Gilles Lipovetsky que moda é usada para atrair a estima e a inveja dos outros, ou seja, com propósito desprezível. Outro pensador importante, o polonês Zygmunt Bauman, em sua obra “Modernidade Líquida”, apontou os problemas da ansiedade e a angústia que é viver
em nossa atual condição sociocultural, marcada por infinitas possibilidades de escolhas e pela falta de solidez e durabilidade. Para os espectadores que percebem a ironia escondida atrás das palhaçadas, resta refletir e gargalhar. Com certeza, Brüno é o típico filme que divide opiniões. No entanto, ficar chocado com situações como nudez ou com o modo apelativo com que Cohen se mostra no filme e não enxergar o preconceito que é denunciado no filme é agir de uma maneira estúpida. E esta censura sofrida pelo filme é a maior indicação de como o susto que ele dá no espectador ainda é necessário. Pra encerrar, penso que o filme veio para confundir, para intimidar os telespectadores, mexer com seus preconceitos e afrontar pensamentos guiados pelo politicamente correto. Sacha questiona o que a mídia internacional apresenta, através da palhaçada-denúncia. Torna-se um filme com propósito brilhante e audacioso: escrachar a realidade! É, sem dúvida, um filme que muitas pessoas não gostariam de ver com suas mães. Mas será que este filme é pior do que as novelas corrosivas e manipuladores que passam no Brasil? E será que somos vítimas ou protagonistas desse grande show de horrores que é a humanidade, atualmente? Pensemos!
REFERÊNCIAS: IGOR ZANONI CONSTANT CARNEIRO LEÃO. 2011. Reflexões sobre O Império do Efêmero, de Gilles Lipovetsky. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/ret/article/viewFile/26826/17791> Acesso em: 08 abr. 2014. RENATO NUNES BITENCOURT. 2010. A liquidez do homem pós-moderno. Disponível em: <http://filosofiacienciaevida.uol.com.br/ESFI/Edicoes/21/artigo772801.asp> Acesso em: 08 abr. 2014. TUDO EM FOCO. Sinopse e elenco do filme Bruno. Disponível em:<http://www.tudoemfoco.com.br/filme-bruno-sinopse-e-elenco-do-filmebruno.html>. Acesso em: 08 abr. 2014.