MODA NA REVISTA SENHOR PARA ELES ANÁLISE DOS EDITORIAIS DE MODA MASCULINA DA REVISTA SENHOR (1959-1963)
Programa de pesquisa submetido ao Programa de Bolsas de Iniciação Científica PIBIC-CNPq/UNICAMP Cota referente ao período de Fevereiro 2009 – Julho 2009
ANDRÉ RIBEIRO DE BARROS 023149 CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO FACULDADE DE ENGENHARIA CIVIL, ARQUITETURA E URBANISMO | UNICAMP
ORIENTADORA: PROFª DRª SILVANA BARBOSA RUBINO DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA. INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS | UNICAMP.
JULHO, 2009.
RESUMO
Esta pesquisa teve como foco a análise dos editoriais de moda masculina da Revista Senhor, publicada entre março de 1959 a janeiro de 1964. Esta revista1 tinha como público alvo o homem ‘moderno’ ávido por conhecimento e cultura sobre todos os aspectos, indo da política a moda, da literatura a economia. Num total de cinqüenta e nove volumes lançados nacionalmente – dos quais cinqüenta e cinco fazem parte da coleção Revistas Brasil da Biblioteca do Museu de Arte de São Paulo, o MASP – são exemplares de uma iniciativa singular do editorial brasileiro com abordagem diferenciada nacional e internacionalmente. Uma revista totalmente dedicada ao público masculino, pretendendo entender e dialogar com o homem desta época. Esses editoriais de moda traduziam aos seus leitores, as tendências em vestuário e comportamento do Brasil e do mundo, assim como faziam, e ainda fazem os editoriais de moda feminina, muito mais comumente encontrados nas revistas de variedade, por estas existirem no mercado editorial em maior número. Esta investigação tem com objetivo maior, o entendimento de que maneira a roupa era apresentada ao leitor, como se davam as construções desses editoriais, quais os suportes usados pelos editores de arte e moda para formação da idéia de moda e sua transmissão aos leitores nas páginas da revista. A Revista Senhor, em relação à moda e ao vestuário masculino tinha um olhar de grande importância para a construção da identidade, do corpo, da personalidade masculina. Escreviam e editavam moda segundo uma perspectiva masculina, diferentemente das revistas da época, e das de hoje, que apresentam uma moda masculina sob o olhar feminino.
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Segundo Rabaça, a revista é uma publicação periódica, que poder tratar tanto de assuntos de interesse geral quanto de temas relacionados a uma determinada atividade ou ramo do conhecimento. Geralmente, é produzida em forma de brochura, apresenta formato menor do que o jornal e é impressa em papel mais encorpado. Ela se constitui num veículo tanto de comunicação como de propaganda, é quase sempre ilustrada e procura atingir um público determinado, de acordo com sua linha editorial. No caso das revistas de notícias, elas seguem uma linha próxima à dos jornais, mas o tratamento das notícias é mais livre e interpretativo.
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INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
A REVISTA SENHOR
imagem 1: Capa comemorativa de segundo aniversário da revista. Fonte: Acervo Biblioteca Masp.
A Revista SR3 publicação da editora Delta, de propriedade de Simão Waissman, foi criada quando esse editor percebeu no mercado editorial a brecha para uma revista de variedades com alta qualidade, dedicada a um público masculino sofisticado. Waissman entra em contato com Nahum Sirotsky, ex-diretor da Revista Visão e um dos grandes responsáveis pelo sucesso da revista Manchete para dirigir a revista. Convidam Carlos Scliar para desenvolver o projeto gráfico da revista. Scliar monta então, um modelo a partir de recortes de revistas internacionais. O design gráfico da Revista Senhor tem suas raízes nas artes plásticas, Scliar e Glauco Rodrigues, este ultimo contratado por Scliar para ser seu assistente, são artistas de grande porte, com obras ancoradas na pintura, no desenho, na gravura, e lugares reservados na história da arte brasileira. (MELO, 2006).
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Trecho do primeiro editorial – março de 1959 - dirigido aos homens e as eventuais mulheres que pudessem vir a comprar e ler a revista. O editor deixa claro em seu texto, a quem a revista se dirigirá a partir daquela página – os homens. 3 As grafias Revista SR e Revista Senhor eram ambas usadas para a mesma revista. A publicação possuía liberdade para inserir na capa a que mais se encaixasse com a diagramação e, sobretudo, a ilustração.
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Dentro do conceito de revista de variedades - dirigida a um grande público masculino, ainda que educado e sofisticado, porém não iniciado - o conteúdo interno da revista traz todo teor necessário ao conhecimento do homem moderno. Literatura, política, economia, humor, moda, até a publicidade recebe tratamento especial nas páginas da revista. O corpo editorial era composto por artistas plásticos como, Carlos Scliar, Glauco Rodrigues, Jaguar, Bea Feitler4, Fortuna e Ziraldo. Glauco, Jaguar e Bea Feitler eram os assistentes de Scliar na editoração de revista. Recebiam ainda, colaborações especiais da literatura reconhecida de Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Ferreira Gullar e outros escritores contemporâneos aos leitores. Tinham a frente da revista como editor redator chefe, o jornalista Nahum Sirotsky, auxiliado por Paulo Francis. Luiz Lobo era redator e Newton Rodrigues, colunista. Carlos Scliar, artista plástico, ficou a frente da revista, como diretor do departamento de arte no período entre março de 1959, lançamento da revista, até julho de 1960, quando Glauco Rodrigues, que já parte integrante da equipe editorial assumiu o comando deste departamento por somente seis meses. Michael Burton ficou a frente da diretoria de arte por quatorze edições.
imagens 2, 3 e 4. Fonte: Acervo Biblioteca do Masp.
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Bea Feitler trabalhou na Revista Senhor das edições de número onze a dezessete. E mais tarde, tornou-se diretora da revista americana Harper’s Bazaar.
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Cinqüenta e nove edições da Revista Senhor chegaram às bancas de todo o Brasil, sendo que até março de 1962, sob cuidados da mesma editora e mesmo corpo editorial, quando é vendida a outra editora, e para alguns autores5, o fim da época de ouro da revista. A cada edição era dedicada uma capa ilustrada (imagens 2, 3 e 4) por um dos artistas-designers que compunham a equipe de publicação. A revista em si era tratada como uma obra de arte. Cada componente se integrava em um conjunto harmônico. Ilustração, texto, tipografia e composição formatavam a revista da primeira a ultima página. Tal integração possibilitava a fácil leitura e fruição do conteúdo impresso.
Imagens 5, 6, 7 e 8. Imagens de Capas da Revista Senhor. Fonte: Acervo Biblioteca do Masp.
Imagens 9, 10, 11 e 12. Matéria sobre os toureiros espanhóis intitulada Escola de Toureiros. Fonte: Acervo Biblioteca do Masp.
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MELO, Chico Homem de. Op cit.
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A MODA NA SENHOR
A roupa é de suma importância na construção da identidade. Diane Crane
Como parte da vida cotidiana, a moda estava presente nas páginas da Revista SR, mostrando as últimas tendências em moda na referida década. Moda, vestuário e comportamento somados a fantasias, desejos e aspirações estampam as páginas dedicadas à moda no interior da revista, configurando o cenário de propagação das regras do viver em sociedade, do uso de signos de reconhecimento cultural. A moda como conhecemos é uma manifestação ocidental, silenciosa e de parâmetros mutáveis a cada estação, como aspecto visual construído como linguagem por cada um de nós. (Lipovetsky, 1991. Sant’Anna, 2002). A roupa serve ao seres humanos como proteção as intempéries e como proteção social, servindo muitas vezes de escudo a sociedade a qual se está inserido. A escolha do vestuário está ligada diretamente à mensagem (ideais, ambições, crenças) que se deseja transmitir, o que se sente ao exibir certo visual, ao portar certa aparência. Nos anos de 1960, os ícones da moda, Yves Saint-Laurent, Mary Quant, André Courrèges e outros estão traduzindo pela primeira vez a moda da rua para as grandes casas de alta costura6. Este período está se curvando a uma nova realidade, já não existindo uma moda única e sim, uma multiplicidade de propostas7. A juventude vivida como uma entidade que possui poder de compra de um mercado próprio. Neste contexto, paletó cintado, gravatas largas e botinas, dominam o prêt-àporter masculino, com uma escolha de materiais novos, introduzindo uma leveza na construção das peças e na simplificação dos detalhes, levando a uma outra postura. Segundo Baudot, a linha aproxima-se da forma do corpo, as calças de ‘cintura baixa’, ombros em forma de pagode, cabelos varrendo a gola comprida e pontuda das camisas com pences, fazem com que o homem admita mais facilmente no futuro uma elegância que não afete sua masculinidade. Contudo, os estilos de vestuário para os ho6
“A idéia da minissaia não é minha, nem de (André) Courrèges, confessará Mary Quant. “Foi a rua que a inventou”. (BAUDOT, 2002:224) 7 A transição para a sociedade pós-industrial, no final da década de 1960 fez com que as pessoas fossem menos coibidas por sua identidade pessoal do que no passado. (CRANE, 2006: 337).
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mens de classe média – público alvo da revista – são definidos como uma tradição restrita, estável e orientada para o passado. OS EDITORIAIS DE MODA
Os editoriais de moda são mediadores entre os produtores de moda e os consumidores sobre esta linguagem das aparências. Apresentam imagens carregadas de mensagens - informações codificadas - aos leitores por meio de signos. Esses signos são expressos através da fotografia, meio que melhor exprime tais mensagens. De acordo com Sontag, fazemos da fotografia um instrumento através do qual, precisamente, podemos dizer qualquer coisa e servir a qualquer propósito. Àquilo que na realidade é discrição, as imagens se associam. (SONTAG, 1981). A Revista SENHOR trazia mensalmente as bancas um volume repleto de ilustrações, compostas por gravuras, desenhos, caricaturas, diagramação, tipografia e fotografias. A fotografia é utilizada na composição da revista como matéria-prima, não havendo registro fotográfico bruto, a publicação não conta com foto-jornalismo, não é foco principal da editoria. Desta maneira, as composições apresentam porções de fotografias, compondo um todo harmônico, necessário à transmissão de idéias. Assim, através dos editoriais de moda, os vários editores da Revista SENHOR falavam aos seus leitores de homem para homem. A construção da identidade, do corpo do homem, estava sendo abordada sob uma visão masculina e apurada dos intelectuais que trabalhavam na revista. Os editoriais abordavam aspectos de real interesse aos homens da década de 1960. Escapavam de certa maneira do ciclo incessante da moda. Os editores estavam ‘antenados’ aos acontecimentos mais recentes da moda nacional e internacional, e apresentavam suas características em formato diferenciado das revistas de moda voltadas ao público masculino. A figura feminina era utilizada como acessório e suporte em alguns editoriais como pode ser observado ao decorrer deste relatório. Não havia a exploração do corpo feminino e sua sexualidade, como nas revistas voltadas ao público masculino em geral. Os editores tinham a preocupação de pensar o gênero masculino, contrariando a idéia do estudo de gênero voltado ao universo feminino. A revista abordava assuntos 7
de grande relevância ao universo masculino, que poderia ser acompanhado pelo público feminino sem que esse se sentisse excluído ou ofendido, sem a necessidade da abordagem clichê presente em outras publicações voltadas ao mesmo público. Os editoriais de moda e a publicidade8 geravam uma demanda visual não contemplada pela ilustração, necessitavam retratar com fidelidade sejam roupas e acessórios, ou então, produtos a serem comercializados.
E como já dito acima, a fotografia como matéria-prima dá corpo aos editoriais, permitindo a criação de histórias e fábulas onde a roupa, os acessórios, o penteado - a moda - é o ator principal. Os ensaios fotográficos decodificam os signos da moda para o homem contemporâneo comum, público alvo da revista.
imagens 13, 14, 15 e 16. Exemplo de Propaganda publicitária concebida e editada pela própria Revista Senhor. Fonte: Acervo Biblioteca do Masp.
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Por não ser o alvo de investigação desta pesquisa, detive-me em expor mais claramente sobre a fotografia de moda e a fotografia utilizada para a composição dos editoriais de moda. Contudo, a publicidade da Revista SR era produzida dentro do corpo editorial da publicação, permitindo a utilização da mesma linguagem gráfica e artística.
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Por ser uma revista dirigida ao público masculino, os editoriais da revista utilizavam-se da figura feminina como acessório, prendendo à atenção do leitor, já que a idéia de construção de uma identidade pelo homem através do uso de vestuário era vista com reservas, conceito que sofreu grandes alterações desde então, principalmente a partir de 19909. Tais editoriais tornavam público às idéias, o ‘como ser’ um homem na década de 1960, vendendo fantasias, desejos e aspirações do homem moderno heterossexual, assumindo a suma importância da roupa na construção da identidade10. Resumidamente, a construção de um editorial deste tipo se inicia com a definição da intenção que se deseja transmitir através de uma pauta, muitas das vezes, discutida em conjunto com os editores e produtores de moda e arte. Esta decisão tomada, estes profissionais escolhem as roupas que serão usadas, os modelos, a locação da filmagem, o fotógrafo e outros detalhes. Contudo, o editorial necessita de alguma maneira transmitir claramente aos seus leitores a intenção dos editores e produtores através da revista. A intenção primeira é a decodificação do que é visto nos desfiles de moda, por profissionais iniciados no assunto, neste caso os editores de moda, aos não-iniciados, os leitores. Essa transmissão é feita com o uso da fotografia de moda a partir de uma história a ser contada.
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CONEKIN, Becky. Colocando o Playboy na Moda: mensagens de estilo e masculinidade nas páginas da Revista Playboy, 1953-1963. Artigo publicado na Revista Fashion Theory. volume 1, número 4. Editora Anhembi Morumbi, Dezembro 2002. 10 CRANE, Diana. Op cit.
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ANÁLISE DOS EDITORIAIS DE MODA Elegeu-se alguns editorias de moda que ilustram e são amostra da versatilidade do corpo editorial da Revista Senhor para uma análise um pouco mais minuciosa, na tentativa de decodificação de alguns de seus signos e significados. Permitindo assim, o entendimento da construção de editorial de moda, e o que eles significavam para os editores da revista.
1. Cem mil cruzeiros pelo caroço de maça de Adão – No azul pintado de azul.
Imagem 17. Páginas 54 e 55. Fonte: Acervo Biblioteca do Masp.
Neste primeiro editorial (primeira edição da revista março, 1959), os editores se utilizaram de desenhos para exibir e evidenciar os artigos destinados aos homens, através da utilização de quatro páginas (duas páginas duplas). (ver imagens 17 e 18). Os artigos mostrados: (1) um chapéu azul, (2) uma camisa branca em conjunto com (3) uma gravata, (4) paletó, (5) calça social, (6) sapato social e (7) camisa de gola e manga comprida de malha. A construção do editorial tem como suporte o corpo masculino, e elementos que remetem ao universo masculino. Esse ‘corpo masculino’ não é representado na íntegra,
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e em alguns casos, percebe-se a existência de uma alusão ao corpo, mesmo que não representado graficamente. Nas duas primeiras páginas (imagem 17) pode-se observar o desenho de um cavaleiro e seu cavalo, e a imagem de um chapéu azul que teve o seu tamanho aumentado, evidenciando sua maior importância em relação ao restante do grafismo. O par cavaleirochapéu forma uma nova imagem ao leitor. Esta nova imagem sugere que o cavaleiro está caminhando em direção a porção localizada à direita da revista. Do instrumento em suas mãos, uma trombeta, que pode ser lida como uma trombeta de anunciação sai às frases que dão origem ao título do editorial: Cem mil cruzeiros pelo caroço de maça de Adão – No azul pintado de azul, diagramados de maneira que o leitor perceba serem essas frases os sons anunciados por tal cavaleiro. E também, como anúncio das próximas páginas que perfazem o editorial. Tais interpretações estão sustentadas pela leitura das imagens e do texto como um conjunto. Os editores iniciam o texto com citações da passagem de Genesis 11, explicitando o que para eles seria o momento no qual o Homem passa a usar artifícios, neste caso folhas, para cobrir o corpo, baseado em passagens da bíblia, nos trechos onde conta-se a origem do vestuário através de Adão e Eva. Este primeiro parágrafo faz referência ao primeiro trecho do título do editorial. Seguido da introdução de uma problemática, o custo de peças básicas necessárias ao vestir. “Daí em diante o pai Adão foi obrigado a catar folhas de figueira para vestir. E Eva lançou a moda da folha de parreira (que ficou muito mais popular). E o problema de vestir começou”.
Na sequência apresenta uma listagem de peças e quantidades dessas que podiam ser compradas com cem mil cruzeiros. As imagens que acompanham essa segunda página apresentam (1) um paletó vestido em um desenho de um manequim que se assemelha a base e fuste de uma coluna, nota-se que o paletó parece estar vestido em um corpo humano, há movimento nas mangas e no corpo do casaco, e (2) camisa e gravata pendurada em uma espécie de cabideiro, que assim como o manequim foi desenhado. 11
Transcrição do primeiro parágrafo do texto do editorial: No princípio (segundo o Genesis) Deus criou os céus e a terra (1.1). E então criou o homem à sua imagem (1.27). Da costela que Deus tomou do homem, formou uma mulher, dando-a a Adão (2.22). Ambos estavam nus, o homem e sua mulher, e não se envergonhavam (2.25). Mas vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e desejável para dar entendimento, tomou o seu fruto e comeu; e deu também ao seu marido; e ele comeu como ela (3.6). Então foram abertos os olhos de ambos e conheceram que estavam nus; e coseram folhas de figueira; e fizeram para si aventais (3.7).
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Imagem 18. Páginas 56 e 57. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
A página dupla a seguir (figura 18) mostra à esquerda, um sapato repousado sobre uma taça representada através de desenho e a direita três imagens: (1) calça e sapatos em articulação com o desenho do que se assemelha com um painel, que impede o leitor de ver a figura masculina que veste essas peças por completo, porém, não impede a compreensão da existência de tal figura, da existência de um corpo; (2) novamente, os editores se utilizam do desenho e da montagem para mostrar a última peça do vestuário masculino desse ensaio. A face do modelo que foi fotografado é substituída pela imagem da cabeça de uma estátua masculina, que pode ser lida como uma estátua representativa de Adão. E o último desenho apresentado (3): o desenho de um corpo feminino visto por trás, onde há a presença de um desenho de uma maça, ‘mas vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e desejável para dar entendimento, tomou o seu fruto e comeu’, remetendo diretamente ao texto introdutório do editorial.
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2. A gravata e a moça Neste editorial intitulado A gravata e a moça, os editores se utilizam da figura feminina para falar de gravatas. O texto que acompanha as fotos apresenta as tendências, na visão dos editores, sobre o formato, a cor, o tecido, e outras características das gravatas. A primeira página de três apresenta o texto rápido e informativo de maneira descontraída. E ainda, apresenta, como se pode observar ao lado, uma mão feminina servindo de suporte para gravatas que seguem as características descritas no texto. Imagem 19. Edição março de 1960. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
Essa imagem sugere a aparição da figura por completo de uma mulher. E o texto parece ratificar essa sugestão na passagem a seguir: As moças estão combinando com as gravatas, quanto à forma. Como nessa Yolanda. Da mesma maneira com a qual os editores apresentam aos leitores, o formato do colarinho, a cor da gravata, o tipo de nó, apresentam a figura da mulher que é utilizada como artifício para falar e expor o tema do editorial. O sentido da imagem, da esquerda para a direita, com a mão apontando para o lado direito da imagem, sugere a continuidade das imagens que compõem o editorial, recurso usado em ampla escala por grande parte das revistas. Nas páginas seguintes (imagem 20) as imagens trazem a figura da mulher como suporte as gravatas. Na página da esquerda, há uma seleção de gravatas escolhida pelos editores para ilustrar tanto o editorial como artigo fotográfico quanto como referência ao texto, Na terceira e ultima página do editorial, a figura feminina é apresentada de forma mimetizada, escondida, apoiando uma coluna que serve de suporte para três colarinhos com suas respectivas gravatas. A figura feminina, neste caso, possui função semelhan-
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do ao suporte das gravatas, e ao mesmo tempo afirmam a passagem do texto citando anteriormente, onde os editores comparam as moças à forma das gravatas. Podemos aqui extrapolar esse entendimento para a forma vertical e esguia das gravatas à forma das modelos e manequins a partir do final dos anos 1950, início dos anos 1960.
Imagem 20. Edição março de 1960. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
Os chapéus vêm aí – os homens vão voltar a usar a cabeça
Imagem 21. Edição outubro de 1959. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
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Com título irreverente, os editores apresentam os chapéus como a nova moda, e segundo eles, logo após a trégua entre Dwight (Dwight Eisenhower, então presidente dos EUA) e Nikita (Khrushchev, o então Primeiro ministro da União Soviética) os homens passariam a usar mais a cabeça12, e a moda dos chapéus, uma vez mais retornaria. A diagramação permite que o leitor identifique a figura e o corpo masculino, porém este corpo quando representado através de modelos vivos, fica restrito a partes como os olhos escondidos por uma revista; a nuca, quando a parte de trás do chapéu é mostrada; e o rosto escondido parte pela sombra obtida com a aba do chapéu e parte pelo pára-brisa do automóvel. Na visão dos editores, o importante são as roupas e os acessórios, e não a figura humana. Utiliza-se de esculturas para exibir os artigos de vestuário. Essa estratégia reafirma a importância do vestuário frente ao suporte. Nas duas primeiras páginas (imagem 21) as imagens são enquadradas e/ou recortadas de modo a mostras somente a parte essencial – o chapéu. As três composições apresentam recursos de editoração que garantem a intenção dos editores.
Imagem 22. Edição outubro de 1959. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
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Os editores tinham a intenção de passar aos leitores a noção de que os dois governantes (Eisenhower e Khrushchev) passariam a governar a luz da razão.
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Suas calças, caro Senhor.
Imagem 23. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
O editorial Suas calças, caro senhor conta uma história através de suas imagens. Podese observar acima um pai brincando com seu filho. A presença de uma figura masculina adulta e uma criança não deixa dúvida sobre o mote da história a ser contada. Uma vez mais, os editores focam com maior grau de importância as roupa. Das três imagens que compõem o editorial, apenas a terceira e última revelam as faces do pai e filho. O texto, por sua vez, apresenta as preocupações dos leitores como usuários de calças, e o alívio e satisfação, nas palavras dos editores, com o rumo que a moda masculina estava tomando na época quanto ao corte, ao caimento, as proporções em geral das calças. É com um suspiro de alívio que noticiamos a nova tendência da moda masculina a respeito das calças-esporte. Felizmente acabou aquela estranha inclinação que vinha fazendo as calças masculinas diferençarem-se das femininas apenas pela presença ou não da braguilha. As calças de homem voltam agora a ser bastante masculinas, justas mas não apertadas na cintura, menos enfeitadinhas e com bolsos em lugar das aberturas só decorativas.Como demonstraremos.
As imagens como um conjunto apresentam as calças sendo usadas por um homem, pai, em movimento, exercendo alguma atividade, mesmo que lazer. Tais imagens dão suporte ao texto. As calças mostradas possuem pernas menos justas, bolsos que não são apenas decorativos e outras características destacadas no texto.
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O Verão Este editorial de verão traz assim como o editorial A gravata e a moça, a figura feminina como suporte a moda masculina, que é apresentada sem a presença real de um corpo masculino, este está representado de maneira fantasiosa.
Imagem 24. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
Nas quatro páginas dedicadas ao editorial, a figura masculina e seu respectivo corpo estão representados por desenhos caricatos, e servem como suportes inusitados as peças de vestuário apresentadas.
Imagem 25. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
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Na primeira sequência de imagens observa-se o corpo masculino desenhado em uma toalha de banho. Um short foi posicionado acima deste desenho, exatamente onde este estaria localizado em um corpo real. Outras peças de vestuário, camisa, chapéu e par de sapatos, foram postos ao lado do corpo remetendo diretamente ao desenho. Na sequência final fica evidente o suporte utilizado pelos editores – a presença da mulher e o desenho em suporte variado. Nessa sequência de três imagens, nota-se um padrão semelhante. Há a figura de um homem desenhada ao fundo, aparentemente em uma parede ou muro, e sobre esse desenho foram colocadas peças de vestuário. Ao mesmo tempo, em duas das três imagens, a mulher traja roupas masculinas. Outros editorias de moda As bengalas
Imagem 26. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
Nunca vista números
Imagem 27. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
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O paletó
Introdução ligeira ao estudo histórico do uso de “bermudas”
O Rigor para 60
Imagem 28 e 29. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
Imagem 30. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
Um pouco de moda inglesa
Imagem 31. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
A propósito do verão
Imagem 32. Fonte: Acervo da Biblioteca do Masp.
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BIBLIOGRAFIA
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