Ana Rocha
XXXI - Alô? É do corpo de bombeiros? Minha casa tá pegando fogo!!! - Qual a origem do fogo, senhor? - Começou na pré-história ou algo do tipo! Por favor, socorro!!! Martins de Castro, Editor André Lasak Revisão Laura Lannes capa @monotipia http://www.facebook.com/monotipia http://monotipia.tumblr.com monotipia@gmail.com
AndrĂŠ Lasak
https://www.facebook.com/quimeraufana
Ébrio Elíptico
Um ébrio elíptico Cruza a sala Observa e cala Sua condenação Seu pulso exala Álcool etílico Seus olhos, cor De vermelho-ressaca Seu fígado morto-vivo Arrasta-se no Último suspiro Da bile escura Seu tempo É pouco neste mundo Seu corpo É muito para uma vala.
Maníacos Passos Lentos Passos Bêbados Passos. . . Vozes Lentas Vozes Bêbadas Vozes. . . Escuto passos lentos De maníacos pelas ruas Escuto tiros bêbados De maníacos pelas ruas Abro a janela e de tiros sóbrios Maníacos tiram minha vida das ruas De maníacos vivem Cheias as ruas À noite De noite vivem Cheias as mortes Dos maníacos O coração Pouco bate Bate fraco E para.
Quereres impossíveis
Das coisas que me consomem Em minha sanidade Das penas que remoem Minhas penas Das cenas que nunca sairão De minhas manhãs Das renas que não mais Natais Trarão Das dezenas de por quês em suas Centenas de não-seis Das trocentas dúvidas, escancaradas Com simples doses Dos muitos quereres de sempre ser Tudo igual... Quando chega a madrugada descobrimos Que nada é estável Tudo muda sem querermos... Tudo assusta Tudo urge Como o tempo no fundo do despertador Do fim do mundo.
Revisão: André Lasak
Ana Rocha
Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto quadrinista. Ana Rocha: A princípio, estudei animação porque adoro essa linguagem para contar histórias. Depois, na faculdade de cinema, aprendi sobre estrutura de roteiro, direção de arte, entre outras coisas que me auxiliariam no desenvolvimento de projetos autorais. Tenho trabalhado também como storyboarder, um departamento que se difere muito pouco da linguagem dos quadrinhos. MT: Quais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas, você identifica no seu trabalho? AR: Meu movimento preferido é o da art nouveau, sobretudo pelo trabalho de Alphonse Mucha, que contém uma delicadeza que sempre tento trazer para o meu trabalho. Mas não subestimo as influências da infância, nas quais existe uma carga emocional muito forte. Sou uma grande fã das produções da Jim Henson Company, dos anos 80. MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? AR: Apesar de toda a tecnologia digital, ainda prefiro trabalhar com lápis, aquarela e nanquim sempre que possível. Acho mais prazeroso. Além disso, sinto que minha forma de me expressar se torna mais verdadeira. O aspecto rústico para mim é um bônus. MT: Conte sobre a dinâmica de produção das suas ilustrações e HQs. AR: Quando estou trabalhando para alguma produtora de animação, preciso desenvolver HQs e ilustrações no tempo que tiver livre, o que é bastante puxado.
Quando o desenvolvimento de uma HQ é o foco do momento, preciso planejar a rotina de trabalho em casa. Acordo cedo para fazer render o período da manhã. Normalmente começo às 8h30, faço uma hora e meia de intervalo para almoço e volto a trabalhar até às 18h00, com curtos intervalos a cada uma hora e meia, aproximadamente. MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? AR: Minha primeira preocupação é que os conflitos despertem curiosidade e que a história esteja estruturalmente eficiente em termos de pontos de virada e ritmo. Em seguida, preciso ter certeza de que narrativa esteja clara, partindo do princípio de que as pessoas não podem ver a história na minha cabeça. Faço um rascunho das páginas e mostro para algumas pessoas para testá-las. Quando percebo que algo não está funcionando, refaço o rascunho mesmo que se trate de uma mudança radical. Aprendi a não me apegar. MT: Por que quadrinhos? AR: Embora eu tenha concentrado meus estudos na área do cinema por muitos anos, a produção de HQs é mais barata e viável para artistas autorais. MT: O que você tem produzido para além dos quadrinhos? AR: Estou fazendo animatics para o desenho do Sítio do Picapau Amarelo. MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? AR: Estou lendo O Incal. O próximo será Black Sad.
Bianca Pinheiro
Revisão: André Lasak
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Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto quadrinista. Bianca Pinheiro: Como todo quadrinista (acho), eu leio quadrinhos desde sempre, aprendi a ler com quadrinhos. E desde pequena, queria fazer disso a minha vida. Eu queria ser como o Maurício de Sousa, que era meu grande ídolo na infância. Quando percebi, no entanto, que não havia faculdade de quadrinhos, acabei fazendo Design Gráfico. No TCC eu decidi que faria uma história em quadrinhos, naturalmente, e fui trazendo o trabalho com a orientação do Liber Paz. Só que na época eu só queria saber de mangá (a fase Turma da Mônica havia passado e nada além dos quadrinhos japoneses me interessavam), então as referências que o Liber me passava não passavam de coisas entediantes para mim. É heresia, eu sei, mas eu achava terrível ter que ler os livros do Will Eisner para embasar meu trabalho (o sentimento era algo como: “aff, esse cara nem sabe desenhar mangá!” - hoje me arrependo e muito de não ter aproveitado para conhecê-lo naquela época). Pois bem, uma vez formada, passei um ano, mais ou menos, sem desenhar direito, lendo poucos quadrinhos e me perguntando onde é que eu tinha errado (hahaha). Comecei a me interessar pelas Graphic Novels quando li Retalhos, do Craig Thompson. Aquele tijolo de quadrinhos que contava uma história só me deixou maravilhada. E não era mangá! (Eu já andava cansada de mangá naquela época.) Acabei conseguindo um emprego como ilustradora e pude trabalhar no meu traço, buscando outros estilos e me aprimorando. Foi quando reencontrei o Liber por acaso, num evento de quadrinhos (lançamento de uma HQ do José Aguiar, para ser mais exata). O Liber me recomendou a pós-graduação em Quadrinhos que tinha acabado de abrir e onde ele próprio lecionava. Devo dizer que a pós foi o empurrão que eu precisava. Sou muito preguiçosa e me distraio fácil. Eu
preciso de prazos para trabalhar direito (hahaha). Então como eu tinha que entregar quadrinhos para me formar, acabei me forçando a trabalhar. E foi maravilhoso! Fora que na pós conheci o grande Lielson Zeni (que hoje trabalha com o Sidney Gusman na MSP) e que me ensinou a pensar melhor na hora de fazer roteiros. Foi ele também quem me orientou no meu trabalho final e que me orienta até hoje (santa paciência, Lielson!). Desde que me formei, então, fui buscando meios de me manter produzindo para não parar nunca. Assim comecei com meu amigo Alan Amorim o projeto The Flying Cow Fever (ou A Vaca Voadora). A ideia era que produzíssemos semanalmente (e prazos funcionam pra mim). Atualmente eu toco o projeto com a Fefê Torquato, outra grande quadrinista que conheci pela internet. E, recentemente, iniciei minha webcomic seriada, BEAR, que conta uma aventura de uma menina e um urso e que tenho que atualizar toda semana. MT: Quais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas,você identifica no seu trabalho? BP: Ixi! São várias! Acho que, pra começar, eu não posso negar que ainda me utilizo do jeito de narrar dos quadrinhos japoneses. Aquela lentidão característica dos mangás costuma marcar bem os meus trabalhos. Mas se eu for pegar artistas específicos, tenho que começar com o Cyril Pedrosa, que me encantou com Três Sombras e que me serve de referência com Portugal. Às vezes, quando me falta inspiração, eu abro imagens das páginas dele só pra me inspirar (porque o traço dele é
impressionante). Tem também o Chris Ware, que me surpreendeu e muito com o Jimmy Corrigan - O Menino Mais Esperto do Mundo. Eu nunca havia lido uma HQ tão densa quanto essa e é a minha grande referência quando se trata de ritmo de HQs mais sérias. Gosto muito também daquele Umbigo Sem Fundo, trabalho do Dash Shaw, que serviu também de grande inspiração quando eu estava começando a me encontrar nos quadrinhos. Aí se eu for falar de brasileiros, eu adoro o trabalho do Rafael Coutinho, do Rafael Sica e do Rafael Albuquerque (quanto Rafael!), o traço dos irmãos Cafaggi e, é claro, a simplicidade e clareza dos trabalhos do Laerte. E tenho me inspirado bastante nas webcomics seriadas que tem pelo mundo a fora (hahaha) e que me ajudam a montar o BEAR, que é minha primeira HQ de história de aventura e mais leve. Eu não conheço HQs desse tipo no Brasil, de modo que as minhas referências sempre são as de fora nesse caso. Mas a verdade, no final das contas, é que tudo o que eu leio e gosto acaba servindo de influência de algum modo. Seja no modo como utilizaram as cores, no jeito de traçar, nos materiais utilizados, na forma de fazer sombra... O mundo dos quadrinhos é uma influência constante pra mim. E pego também muitas referências em filmes e livros, especialmente trabalhos do Quentin Tarantino, da Clarice Lispector e da Virginia Woolf. MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? BP: Que pergunta difícil! Estou aqui me perguntando e não sei responder direito! A maioria dos meus quadrinhos tem sido feita digitalmente, mas não por ser uma preferência específica e mais porque o que tenho produzido atualmente, em sua maioria, é para o meio digital, mesmo. Mas eu gosto muito de trabalhar direto no papel,
também. Tem coisas que parece que só o lápis é capaz de resolver, nem que seja pra esboçar. Eu tenho ultimamente me arriscado com a aquarela, que é uma técnica que acho linda, mas que ainda não domino direito (não domino nada, vai). Só que esses trabalhos em aquarela ainda não estão prontos, então ninguém viu (hahaha). Quem me incentivou a arriscar mesmo foi a Ana Luiza Koehler, que faz aquele trabalho maravilhoso com aquarela e que é uma grande referência pra mim (fora que ela vive recomendando outras artistas que também trabalham com aquarela, de modo que a lista de inspirações e referências é enorme). Então eu tenho tentado bastante. A verdade é que me viciei no Ctrl+Z quando comecei a trabalhar com ilustrações, então sou meio cagona na hora de jogar a tinta no papel (“e se estragar? Ah, meu Deus, não quero que estrague!”, sabe?). Mas eu não diria que o digital é uma preferência: é mais um comodismo nesse sentido. Eu geralmente acabo gostando mais dos trabalhos que faço no papel do que dos que faço no computador. Acho que é porque a relação e a proximidade que a gente cria com o papel são muito maiores e mais fortes do que as com o trabalho na tela do computador. E ainda quero conhecer outras tintas e tentar o lápis de cor. Mas primeiro quero “enjoar” da aquarela. MT: Conte sobre a dinâmica de produção das suas ilustrações e HQs. BP: Bom, quando estou fazendo ilustrações, geralmente é porque é um freela, então eu só vejo o que me pedem, busco referências (fotos, na maioria das vezes) e tento fazer o mais rápido possível porque os prazos costumam ser bem pequenos. Não tem muito mistério. Demoro mais quando tenho que desenhar cenários mais complexos e detalhados.
Agora, quando vou fazer uma HQ, tudo depende de uma ideia. Pra Vaca Voadora eu costumo ficar atenta ao que acontece ao meu redor e aguardar por aquele momento em que alguma coisa - qualquer coisa - se materializará na minha mente em forma de ideia para HQ. Essa “coisa” costuma acontecer um ou dois dias antes de publicar, de modo que eu geralmente desenho pra Vaca Voadora em profundo desespero com o prazo. Mas o processo é o seguinte: vem a ideia de uma maneira bem crua e eu, tendo gostado da ideia, começo a bolar possibilidades para trabalhá-la numa HQ. Depois é partir pra produção. E na maioria das vezes, na hora de fazer a página em si eu acabo mudando o planejado. Quando acontece de eu ter várias ideias ao mesmo tempo, pego meu caderno e anoto todas com palavras-chave (tipo “coelho de chocolate com buraco”) e de algum modo essas palavras fazem sentido pra mim depois. Agora, em casos de histórias maiores, de duas páginas ou mais, eu faço um trabalho ainda mais cuidadoso. Rumino a ideia primeiro como no processo da Vaca, depois escrevo um pequeno texto (como um conto) dizendo o que acontecerá na história e fazendo ressalvas do que deve ficar subentendido e de expressões que a personagem deve ter. Então parto para o storyboard, com desenhos bem rabiscados e toscos, só pra eu ter uma ideia (e só eu, mesmo, porque ninguém mais entende aqueles rabiscos). No storyboard eu já decido onde ficarão os balões, mas isso depois se perde porque sou péssima em prever o tamanho do texto. Feito isso, parto para o desenho em si. Tal qual acontece na Vaca, a página final costuma ficar diferente do storyboard (nada gritante, só pequenos detalhes e posições).
E por fim, BEAR. Com BEAR o processo é um pouco diferente porque, embora eu atualize toda semana, a história é a mesma, é uma continuidade. Desde que comecei a fazer a webcomic eu já tinha definido todo o prólogo (que conta como as personagens principais se conhecem) e o fim. Sei exatamente onde terminará a história. Mas o meio, por se tratar de uma aventura em uma jornada, eu posso ir criando aos poucos. Então o meu processo é mais ou menos o seguinte: toda vez que preciso bolar o próximo trecho como um todo (como o prólogo ou um capítulo inteiro), eu entro no que chamo de “estado boba alegre” e fico imaginando o que acontecerá naquele trecho, interpretando as falas das personagens e rindo sozinha com as coisinhas bobas que acontecem. Feito isso, tendo as cenas mais ou menos delineadas na minha cabeça, eu passo pro storyboard. No meu caderno tem os storyboards de todas as páginas que já estão prontas de BEAR. Eles servem só pra eu ter noção de como será cada quadro e da expressão que cada personagem fará. Depois disso, com o storyboard em mãos, eu parto para o computador, onde redesenho o esboço com mais detalhes, finalizo, coloco cores, falas e balões. Aí é só publicar! MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? BP: Tudo depende do que eu quero passar com a cena ou com a história como um todo em questão. A narrativa tem que ser capaz de transmitir o que eu quero que transmita na cena. Para isso, eu me utilizo dos recursos que vou conhecendo ou imaginando, desde acelerar ou diminuir o ritmo e a velocidade dos movimentos até forçar o leitor a girar a página para poder ler. Posso definir uma página mais comprida, para dar a sensação de
sufocamento dentro dela, com os quadrinhos esmagados, posso talvez deixar grandes espaços em branco, simulando uma passagem de tempo ou mesmo um grande vazio existencial. Tudo depende do ambiente que quero criar. As histórias em quadrinhos têm vários recursos que podem ser utilizados para contribuir nesses aspectos. Tem gente que faz isso tão bem que sempre fico surpresa. E o próprio David Mazzucchelli, em Asterios Polyp parece ter se empenhado em mostrar o que os quadrinhos podem fazer. Outro que gosto de recomendar também e que li recentemente é o Desistência do Azul, do L. M. Melite. Aquele também é um grande exemplo de como se utilizar dos recursos visuais das HQs. Além, é claro, do Chris Ware. Leiam Building Stories e verão como o mundo dos quadrinhos parece ilimitado (ainda mais com as facilidades das tecnologias atuais). MT: O que você tem produzido para além dos quadrinhos? BP: Hum... nada? Eu comecei a escrever um livro infantil, mas parei com o projeto porque alguns quadrinhos tomaram conta do meu tempo. E estou pra organizar artigos (sobre quadrinhos) pra poder me inscrever no Congresso de Tecnologia e Sociedade. Mas ainda estou matutando a esse respeito, hehehe. MT: Por que quadrinhos? BP: Por que quadrinhos? Não sei se sei responder a essa pergunta... Quadrinhos são a minha forma de arte favorita desde que me entendo por gente. É o que mais gosto de ler/ver/apreciar como um todo. Desde que descobri gente fazendo quadrinhos mais sérios, com propósitos muito além de vendas e entretenimento, percebi que era nessa arte que eu me
sentia bem, em casa. É essa arte que eu mais gosto de observar, encontrar detalhes, estudar e, acima de tudo, produzir. Os quadrinhos me permitem mostrar o que a literatura tem que escrever e escrever o que os filmes têm que mostrar. É como uma junção perfeita dos dois! E embora eu goste de escrever e tenha interesse em, num futuro, brincar com animação e cinema, quadrinhos é o que mais me chama, é o que mais amo. MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? BP: Eu terminei o Desistência do Azul recentemente e estou com o Building Stories inteiro pra ler ainda, mas a maioria dos quadrinhos que tenho lido ultimamente são webcomics, dessas que atualizam uma página por semana e contam alguma aventura. Recomendo: Hemlock, Nimona, The Fox Sisters, Helvetica, Ava’s Demon, Doctor Cat, Spindrift, Balderdash!, entre outros e muitos outros. Adoro webcomics! E talvez o fato de estar fazendo uma webcomic sirva para aumentar essa paixão por elas. Fora dos quadrinhos eu ainda leio alguns livros, mas beeeem lentamente. Quase não tenho tempo de parar para ler um livro. Mas geralmente os que eu leio são essas aventuras estilo Harry Potter, sabe? Literatura de entretenimento? São minhas favoritas. Estou lendo também o 1984 (acho que só eu não li ainda) e O Segundo Sexo, da Simone de Beauvoir.
Fernando Duarte
Revisão: André Lasak
https://www.facebook.com/JuventudePerigosa
Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto quadrinista. Fernando Duarte: Academicamente falando, nenhuma, rs. Comecei como a maioria dos cartunistas que conheço começaram: rabiscando nas páginas dos cadernos para enganar o tédio na sala de aula da escola e para sacanear com o coleguinha. Mas podemos falar de um começo profissional em 1995, quando consegui uma vaga de cartunista no jornal Correio de Uberlândia. Estava aqui para cursar a faculdade de Psicologia (o que fiz e me formei, na verdade) e levava o desenho como uma paixão mal resolvida. À partir daí continuei desenhando paralelamente aos estágios em Psicologia até que em 2001 fui recrutado pelo cartunista local Maurício Ricardo para desenhar num site que ele estava lançando na época, o Charges.com.br. Desde então, vivo exclusivamente de desenho.
Spacca, com um desenho muito bom.
Mas como quadrinista mesmo, minha maior escola foram as tiras diárias que fiz para o jornal, de 1995 a 1999.
Hoje faço uma mistura destes dois: desenho tudo no papel, digitalizo, e então passo os bitmaps para curvas e faço todo o resto no Flash.
MT: Quais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas,você identifica no seu trabalho? FD: Muitas. Eu peguei a época do Chiclete com Banana, Geraldão, Níquel Náusea, Circo... Os anos 80/90 foram bastante ricos nesta área no Brasil, muitas publicações excelentes foram lançadas nesta época, com um tipo de humor ao mesmo tempo ácido, irônico e sofisticado, em certo sentido. Li muito o Planeta Diário, por exemplo. Um monte de baboseiras, rs... mas coisa de primeira. Humor que não existe hoje em dia. No traço, me influenciei muito com o Laerte, Angeli e Fernando Gonsales – meus favoritos. Mas tem também o
Sempre gostei daquele meio termo entre o desenho “anatômico”, mais realista, e a flexibilidade do cartum. Ninguém soube e sabe (na minha opinião) mesclar isso tão bem quanto o Laerte. MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? FD: Nunca fui muito rígido com relação a material... Usava o que estava disponível, rs, mas sempre fui um fã incondicional do papel sulfite comum e a Fine Pen, da Papermate! Ela sumiu do mercado um tempo, mas agora foi relançada pela Faber Castell. De qualquer forma, depois de trabalhar por tanto tempo com animação, me acostumei totalmente com o formato digital.
MT: Conte sobre a dinâmica de produção das suas ilustrações e HQs. FD: Bom, a maior parte do meu tempo de trabalho estou envolvido com animação e outros projetos. (Voltar a) desenhar as tiras veio da necessidade de criar uma válvula de escape criativa em meio a essa rotina. Não que não goste de animação – realmente adoro o que faço – mas desenhar tiras é um processo bem diferente, bem mais livre e, principalmente, era uma coisa que eu poderia conduzir da maneira que eu quisesse, sem a obrigação de agradar cliente! (rs) Hoje minha produção é feita no caminho até o trabalho – ouvindo música e caminhando. Tenho a ideia
geral de como vai ser a tira e, em casa, começo a desenhar e escrever no canto das ilustrações as falas. Não sigo um roteiro fechado, apenas uma ideia geral, e deixo a coisa fluir. Já aconteceu, inclusive, de eu ter uma ideia e, no final, a tira ter seguido por outro caminho totalmente diferente. Acho essa uma maneira legal de criar. Outra coisa que nunca faço é esboço: gosto de desenhar direto. Dá mais flexibilidade ao desenho, fica menos engessado. MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? FD: Como falei anteriormente, a criação das HQs são bem livres e intuitivas. Mas realmente tenho uma preocupação especial com a diagramação final. É como uma pós-produção: depois de finalizada a tira eu a leio e vou (re) organizando a disposição de forma que conduza de uma maneira eficaz a história - inclusive nas ênfases emotivas. Para quem não está acostumado a desenhar HQs pode parecer um exagero, mas o quadrinho um pouco mais para a direita ou esquerda, ou mais ou menos próximo do quadrinho seguinte faz uma diferença muito grande no “clima” da história. MT: O que você tem produzido para além dos quadrinhos? FD: Animação, na maior parte. Tenho meu trabalho diário no Charges.com. br, que é fazer e coordenar a produção das charges animadas diárias junto com o resto da equipe, e ainda tenho meu estúdio onde produzo animações e ilustrações para empresas e agências de publicidade.
MT: Por que quadrinhos? FD: Sempre gostei de ler e fazer. Quando fazia as tiras diárias nem sabia sequer quantas pessoas as liam, mas eu lia e gostava de vê-las publicadas. Tanto que, como falei, depois de anos tive que voltar a desenhar tiras simplesmente por que sentia a maior falta de fazêlas, mesmo que não ganhasse bulhufas financeiramente com isso. E acho que o que sempre gostei nos quadrinhos foi a liberdade de trabalhar um pouco de cinema e literatura numa mesma coisa: a liberdade temporal da literatura e a sugestão de imagens e condução de narrativa do cinema. E ainda há quem diga que “quadrinhos não é arte”. Bom, pode falar à vontade. Quem se importa? MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? FD: Monster, um mangá excepcional de Naoki Urasawa. Nunca fui muito de ler mangás, e a única série que possuía na minha estante era o Buda ( também excelente), do Osamu Tesuka. Mas acabei descobrindo este através da indicação de um amigo e fiquei fã imediatamente. Por coincidência, estou também lendo um livro de um autor japonês: Kafka à Beira Mar, do Haruki Murakami. Pensando bem, acho que estou num momento nipônico da minha vida, rararara, porque o que estou gostando muito deste livro é justamente a narrativa não linear e cheia de surrealismo, muito parecida com as animações do Studio Ghibli, do Hayao Miyazaki.
Revisão: André Lasak
Laura Lannes
Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto ilustradora e quadrinista. Laura Lannes: Quadrinhos eu sempre fiz, não sei dizer quando comecei. Meus pais, como muitos outros, me ensinaram a ler com a Turma da Mônica. Desde então nunca parei de ler e fazer quadrinhos. Minha mãe tem umas histórias que eu fiz quando tinha nove anos. Ilustração foi um interesse que surgiu muito mais tarde. Primeiro eu fiz dois anos de Pintura na UFRJ, direto do colégio, porque achei que era a coisa certa a fazer. Não sei explicar. Pintura me parecia o caminho mais nobre, por assim dizer. Eu queria alcançar a excelência técnica, e me dediquei por anos a estudar modelo vivo com o Prof. Bandeira de Mello, mas aos poucos fui percebendo que meu lance é “arte baixa”, “lowbrow”, ou qualquer outra nomenclatura besta que você preferir. Durante meu segundo ano na UFRJ eu fiz também Design na PUC, ao mesmo tempo, pra ver de qual eu gostava mais. Acabou que não curti Design. Comecei a pensar em estudar fora, mandei meu portfólio pra School of Visual Arts, em Nova York, e fui aceita. Larguei as duas faculdades e fui pra SVA estudar Ilustração. Estou muito feliz nesse campo. MT: Quais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas, você identifica no seu trabalho? LL: Antes de tudo, Laerte - primeiro na Folhinha, depois na Ilustrada sempre foi minha parte favorita do jornal. Minha primeira influência. Depois veio o Crumb. Por anos tive uma obsessão nada saudável com ele. Mas quem faz quadrinhos e não passou por isso? A parte triste é que o estilo autobiográfico dele foi algo notável e único nos anos 60, e agora eu fico
tentando replicar no século XXI. Lamentável. Outro cara que copiei compulsivamente por muito tempo foi o Quino. Também sempre curti o Henfil. Essas foram as primeiras pessoas cujos desenhos eu copiei, e, mais de dez anos depois, eu ainda curto imensamente o trabalho deles. Fora esses - olha, eu tinha escrito aqui um parágrafo gigante, cheio de nomes, mas aí eu pensei: “isto está ficando ridículo”. Então apaguei tudo e vou fazer uma coisa pequena, só com os artistas cujo trabalho tem me influenciado nos últimos dois meses: Jillian Tamaki, Anthony Cudahy, Félix Vallotton, Emmanuel Guibert, Brad Holland, Gabriel Góes, Laerte, Moebius, Magenta King, Eleanor Davis, Van Gogh, Rafael Coutinho, Killoffer, Nick Gazin, Sammy Harkham, David Mazzucchelli. Cheguei nessa lista através do meu histórico de pesquisas no Google, então sei que é fiel. Fora isso, gostaria de mencionar também as três coisas que, de longe, mais ocuparam minha mente nos últimos meses: Grand Theft Auto IV, Quentin Tarantino e James Deen. MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? LL: Não sou muito tecnológica. Acho que é uma falha. Tenho planos para comprar um tablet, mais perto do fim do ano. Como disse um professor meu, “as revistas de hoje em dia estão tendo um caso de amor infinito com o Photoshop”. É verdade, está difícil encontrar ilustrações que não foram feitas em um computador. O Michael DeForge, um quadrinista fantástico, não passa nanquim, só faz a arte final na Cintiq! O mundo está mudando etc.
Eu costumo desenhar com pena e nanquim. Ultimamente estou usando pincel, e achando fantástico. Não sei por que demorei tanto na minha vida para chegar no pincel. Também gosto muito de fazer aguadas. Tenho feito muitos trabalhos em guache, que é um material tão bonito! MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? LL: Eu não tenho preocupações nem ritmo. Não dá pra ver que eu não sei o que estou fazendo? Acho que minha única regra, através dos anos, é que tem que ser engraçado. Cara, quando eu tinha 14 anos eu fazia tirinhas, tem noção? Uma coisa de três quadros, prepara a piada, pausa, depois o “punchline”, se bobear ainda rola um “plop!” de alguém caindo pra trás depois da piadinha. Meu senso de humor mudou muito, sem dúvida porque a cada dia me torno mais amarga. Agora prefiro um humor menos claro. MT: Você, sozinha ou em grupo, já organizou algumas publicações de quadrinhos. Fale-nos sobre como foi isso. LL: A primeira vez que eu publiquei alguma coisa foi em 2011. Eu e o Diego Sanchez, que na época era meu namorado, criamos uma revista chamada Peixe Fora d’Água. Chamamos várias pessoas para enviar material. Quase tudo era quadrinho, mas teve algumas ilustrações, e até uma poesia. Mas a verdade é que metade da revista (ou mais) era de material nosso. Pagamos pela impressão, chamamos os amigos pro lançamento, no fim a revista fez mais sucesso do que a gente esperava. Aliás, posso fazer um comercial aqui? Semana passada eu encontrei 7 exemplares
da Peixe escondidos em uma caixa na minha casa, então coloquei pra vender no meu site, se alguém quiser uma: http://www.lauralannes.com/pt-br/revistapeixe-fora-dagua/
Depois disso eu só voltei a imprimir alguma coisa este ano, lá em NY, duas revistinhas. Agora estou cuidando pra imprimir esses quadrinhos aqui, e também uma história longa que ainda estou fazendo. Eu não sei quando esta entrevista vai sair, mas acho que já vou estar vendendo essas coisas no meu site. MT: Quais os planos para este ano? LL: Eu quero imprimir em português uns quadrinhos meus que só tenho em inglês. Também estou fazendo uma história longa que, se der tempo, vou imprimir por aqui também. Daí vou deixar à venda em algumas lojas e no meu site. Tem também um projeto que eu estou fazendo, de entrevistas com quadrinistas: (http://entrevistasdalaura. tumblr.com/). É uma coisa que há muito tempo eu queria fazer, e estou aproveitando agora que estou de férias. Tenho falado com vários artistas fantásticos, fico muito feliz que eles topem perder esse tempo conversando comigo. Já que tenho tempo, estou fazendo também um retrato de cada pessoa que entrevisto pra acompanhar o áudio. MT: Por que quadrinhos? LL: Quadrinhos suprem uma necessidade minha de criar narrativas para imagens. Aquela história de acrescentar balão de texto às imagens nos livros do colégio. Já tive um professor que disse pra eu parar de tentar enfiar uma narrativa em cada pintura. Realmente, minhas pinturas eram uma bosta, mas porque eu estava tentando fazer um quadrinho sem balão.
Acho que quadrinhos são um meio perfeito, que me oferece tudo que eu queria: história e arte. Em um bom quadrinho, essas duas coisas estão presas uma a outra, de um jeito que você não consegue ver aquela história com outro traço. Como em Estigmas, do Mattotti, um livro fantástico. Sem contar que quadrinhos são como cinema, mas você pode controlar todos os aspectos. Você tem um “elenco”, de certa forma, que são seus personagens, mas você mesmo pode criar a aparência deles, ao invés de escolher dentre rostos que já existem. Você pode alterar o clima de uma cena sem precisar de fato criar um ambiente com aquelas luzes, aquela mobília. Quanto mais penso nisso, mais me agrada essa perspectiva. É como fazer cinema, só que mais barato. Não consigo imaginar ter de alugar equipamento a cada vez que eu quisesse contar uma história. MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? LL: Eu tenho lido tudo que o Sam Alden faz. É incrível como ele produz rápido. Os últimos dois quadrinhos dele, Hawaii 1997 e Backyard, são histórias fantásticas com desenhos absurdos. Nem tenho palavras. Julia Gfrörer é uma quadrinista muito inteligente e com um traço belíssimo. Ela tem um quadrinho serializado chamado Black Is the Color que é lindo, e além disso todas as entrevistas com ela que já li me fizeram pensar sobre o que eu quero colocar nos meus quadrinhos, e por que não há mais sexo, como uma ocorrência natural, em quadrinhos. A coisa mais impressionante que eu tenho lido em quadrinhos é o FABIO zines, do André Valente e do Gabriel Góes. Primeiro de tudo, queria ter tido essa idéia!! Segundo, a execução deles é brilhante, os envelopes, o conteúdo
de cada edição, o traço, argh, que coisa fantástica. É pra falar de livros que não são quadrinhos? Eu estou relendo Las Vegas, do Mario Puzo. Eu li alguns anos atrás e pensei que podia dar um quadrinho, mas não achei que meu desenho dava conta, na época. Agora, talvez. Antes disso estava lendo Rei Lear, para a faculdade. Que livro incrível. Estou ao mesmo tempo roubando vários truques do Shakespeare, e pensando se uma adaptação pra quadrinhos não ficaria uma merda. Provavelmente. Mas eu nunca tinha lido nada assim. De certa forma, me fez pensar em Cães de Aluguel. Mas se eu explicar vou contar o final do filme e do livro.
Laerte, nas manchas de Laura
Raphael Fernandes
Revisão: André Lasak
https://www.facebook.com/contraversao
Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto quadrinista. Raphael Fernandes: Fora a leitura de quadrinhos durante a infância e a adolescência, comecei a estudar os quadrinhos de forma acadêmica quando fiz os cursos Oficina de Leitura Crítica de Histórias em Quadrinhos e Editoração de Histórias em Quadrinhos, lecionadas pelo Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro, na Escola de Comunicação e Arte da USP. Passei a utilizar os quadrinhos como documento histórico para meu trabalhos no Bacharelado de História que fiz na FFLCH. Depois disso, o maior aprendizado foi na Mythos Editora/ Panini Comics, onde fui editor-assistente da Marvel e DC, editei álbuns europeus e latinos e onde até hoje sou editor da revista de humor MAD. Depois disso, fiz vários cursos de roteiro na Quanta, com André Diniz e Octávio Cariello, além de um na Casper Líbero com o Spacca. Desde então, eu tenho me dedicado a escrever roteiros e editar histórias em quadrinhos. MT: Quais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas, você identifica no seu trabalho? RF: Isso é muito complicado, pois a autoanálise nunca será precisa. O que posso responder é sobre o que consumi e mexeu com a minha forma de pensar. A lista é muito grande e acabei respondendo um pouco disso em uma entrevista para o blog da Editora Draco. Vale mais a pena dar o link! (http://blog.
editoradraco.com/2013/04/top-5-raphaelfernandes/)
MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? RF: Não sei se entendi a pergunta, mas gosto de histórias curtas de 10 a 20 páginas. No entanto, tenho buscado me desafiar em histórias grandes. O formato da HQ vai depender de custos, conceitos e tal. Trabalhei com web quadrinhos com Ditadura No Ar, mas por incrível que pareça a versão impressa fez mais sucesso que a digital. Por isso, segui firme apenas em publicações impressas. MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? RF: Acredito que o roteiro deve trabalhar em conjunto com o desenho. Quando digo isso, estou pensando em equilibrar total controle de cenas que consegui desenvolver bem a composição de quadros só com o texto... com páginas em que apenas indico o que acontece e deixo para o desenhista propor estruturas narrativas para a página. Dessa forma, consigo unir os dois trabalhos e estimular o desenhista a ter papel ativo na construção da história. Por exemplo, na primeira Imaginários em Quadrinhos escrevi páginas e toneladas de detalhes para A Revolução Não Será Compartilhada, mas em outros momentos deixei apenas uma descrição geral para o Dalton criar a composição das cenas. O resultado me agradou bastante.
MT: Gostaria de falar sobre seus projetos atuais? RL: Revista Mad A MAD começou nos Estados Unidos em 1952 quando era uma revista em quadrinhos com humor totalmente frenético e comandada por Will Gaines e Harvey Kurtzman. A edição brasileira existe desde 1974 e rapidamente se tornou uma febre entre crianças e adolescentes nos anos 80 e 90. Sou editor da publicação há 5 anos, quando ela passou a ser editada pela Panini. Crio o conceito da publicação e o plano de pautas, sempre dando espaço roteiristas e desenhistas que tenham um estilo ácido e subversivo. Relação com a Draco, projeto Imaginários Graças aos roteiros que enviei para as três primeiras edições da Imaginários, fui convidado para ser o editor do projeto, convite que aceitei na mesma hora. A Imaginários em Quadrinhos é uma coletânea que vai ser lançada três vezes ao ano com histórias de terror, fantasia e ficção científica produzidas por diversos autores. No entanto, serei responsável por toda a produção de quadrinhos da Draco. Estamos atrás de bons álbuns para publicar! Catarse e o Apagão O projeto está financiado e tem dado um baita trabalho pra divulgar. Camaleão e eu estamos fazendo a HQ e pretendemos lançar até novembro. Para saber mais, basta visitar http://catarse.me/pt/apagao Ida e volta
Ida e Volta é uma revista em quadrinhos com duas HQs sobre o metrô, sendo uma real e a outra ficção. Ambas escritas por mim e com desenhos de Pedro Pedrada, Doug Lira e Rafael Louzada. O formato da HQ é o mesmo do passe de metrô. Foi um experimento interessante e posso dizer que tenho orgulho de ter feito, mas não sei se faria algo tão conceitual. MT: O que você tem produzido para além dos quadrinhos? RF: Mantenho o blog de contracultura pop Contraversão, que fala de cinema, música, games, seriados, literatura e quadrinhos. MT: Por que quadrinhos? RF: Porque estão comigo desde criança. MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? RF: Leio muita coisa, principalmente quadrinhos nacionais, Vertigo, europeus de sci-fi, mangás diferentes (Bakuman), Image Comics e a maior parte do que é publicado no Brasil. Leio muita literatura clássica, revistas científicas, Philip K. Dick e um monte de livros malucos de magia do caos, teorias da conspiração e Tarot.
Rafael Louzada http://www.rafalouzada.blogspot.com.br
Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto ilustrador e quadrinhista. Rafael Louzada: Sou formado em Design de Moda, tenho uma pós graduação em História da Arte e atualmente curso Licenciatura em Artes Visuais. Trabalhei algum tempo como estilista, porém me frustrei com o mercado e resolvi me dedicar melhor ao término da minha pós e cair de cabeça naquilo que mais gostava de fazer, ilustrar. Não abandonei totalmente a área de Moda, ainda faço trabalhos de ilustração pra moda e estamparia, mas não trabalho mais como estilista. Fiz alguns cursos voltados para a prática de desenho na Escola Panamericana de Artes e na ABRA e recentemente concluí um curso de técnicas de pintura na Quanta, com o Davi Calil. Ainda me considero um iniciante no mercado de ilustração e quadrinhos, estou no mercado pra valer à pouco mais de um ano e nesse tempo desenvolvi trabalhos em diversas áreas, como campanhas de publicidade, estamparia para moda, editorial, algumas coisas para design, como criação de logotipo, personagem entre outros. Tenho um livro infantil paradidático publicado pela Editora Ilelis, chamado: “Essa tal ortografia” de autoria de Rose Lee San’tana. Os quadrinhos sempre estiveram presentes em minha vida. Nunca fiz um curso específico em quadrinhos e não me orgulho nada disso (risos), acho importantíssimo aprender com profissionais da área, eles tem muito a nos ensinar e devemos estar sempre dispostos a aprender com os mais experientes. Porém o motivo por eu não ter feito um curso específico foi porque a vontade de ser quadrinista ficou um tempo adormecida em minha vida por conta de algumas decisões que acabaram me distanciando dessa área, mas que recentemente, mais precisamente no segundo semestre de 2012, foi despertada novamente por um convite inusitado do
meu amigo Doug Lira, para participar de uma HQ, juntamente com Pedro Pedrada, com o roteiro do Raphael Fernandes, Editor da Revista Mad e da Editora Draco, chamada “Ida e Volta”. Fizemos dois lançamentos oficiais da HQ, que tiveram uma repercussão muito legal na mídia especializada, um deles inclusive foi na 1ª Gibicon em Curitiba e o outro em São Paulo, na Gibiteria Monkix, que me deixaram muito animado a produzir quadrinhos profissionalmente. MT: Quais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas,você identifica no seu trabalho? RL: Sempre li muito mangá e manhwa (quadrinhos coreanos) e gosto muito da narrativa dos quadrinhos orientais. Katsuhiro Otomo (Akira), Hayao Miyazaki (Nausicaä), Akira Toriyama (Dragon Ball), Takehiko Inoue (Vagabond), Eiichiro Oda (One Piece) são alguns bons nomes de desenhistas japoneses a serem citados. Já dos coreanos, os que gostaria de destacar são Kim Young-oh (Banya e Gui), Park Joong-ki (Dangu) e Kim Byung Jin (Chonchu). Falando de artistas ocidentais, gosto daqueles com um estilo de traço mais estilizado, como o Roger Cruz, Joe Madureira e Matheus Santolouco, por exemplo. Não sei se deixo transparecer, tão claramente, nos meus trabalhos às minhas influências e tampouco lembra o estilo dos nomes citados, mas acredito que inconscientemente me deixo influenciar por eles sim, mesmo que seja como um ideal a ser alcançado. MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? RL: Gosto de explorar as possibilidades de um formato não convencional, é
interessante trabalhar com um formato diferente, mas eu não tenho predileção por isso. A frase pode soar um pouco clichê, mas eu acredito que Independente do estilo, o importante é, acima de tudo, fazer sempre um bom trabalho. Acredito que o material conta muito para que uma produção seja bem sucedida, porém é claro que a qualidade do papel e da impressão não vendem sozinhos uma HQ. Um bom roteiro aliado à uma boa arte (desenho, narrativa e cores) ajudam a vender uma HQ com baixa qualidade gráfica. Porém, esse tipo de venda, a meu ver, é difícil de acontecer se os valores forem invertidos. Talvez ela tenha um sucesso inicial por ser um produto visualmente bonito, mas na medida que forem saindo críticas e resenhas sobre essa HQ, as suas vendas começarão a cair, pois essa qualidade não se sustenta sozinha. Em contrapartida, é importante lembrar que um produto bonito se destaca na prateleira e se tratando de uma publicação independente, que acaba atingindo um público menor por conta das dificuldades de distribuição e divulgação, isso fará muita diferença na decisão da compra por parte do consumidor final. Essa é uma pergunta difícil porque existem muitas variáveis, mas resumindo, é preciso analisar friamente todos os pontos para se ter um produto final bom. Se não existem condições financeiras para fazer isso logo de cara, a internet é uma ótima mídia para testar a aceitação da sua história. Muitos autores começam assim hoje em dia e muitos outros nunca a abandonam, mantendo suas publicações on-line periódicas com conteúdos exclusivos. Compliquei? =D
MT: Conte sobre a dinâmica de produção das suas ilustrações e HQs. RL: Ilustração, no momento é o meu trabalho principal, por isso eu dedico mais tempo a esse ofício e meus projetos de quadrinhos acabam sendo desenvolvidos no meu tempo livre (que é bem pouco, visto que vida de freelancer não é fácil), entre um trabalho e outro, as vezes nos finais de semana. Porém, desde a minha primeira publicação (Ida e Volta), que foi no final do ano passado, tenho me aproximado mais dessa mídia, lendo mais, indo à lançamentos, apoiando novos projetos, descobrindo novos autores e isso consequentemente ocupou um pouco mais de espaço na minha vida. E, é claro, administrar o seu tempo fazendo o que gosta é muito melhor! MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? RL: A narrativa está totalmente atrelada ao roteiro e se ela não for bem desenvolvida pode comprometer um bom texto, então dessa forma, eu primeiramente penso no que o roteirista quer passar com ele, que tipo sensações ele quer transmitir, qual a mensagem que ele deseja passar, à que público ele deseja atingir, pois esses fatores definirão qual será o ritmo mais adequado, quais serão os melhores enquadramentos, ângulos, cores, influencia toda a dinâmica da narrativa. Depois disso, pensar qual será a melhor forma de transmitir essas idéias, é claro, passando para o papel. Se eu estiver trabalhando em um roteiro meu, eu terei que responder essas perguntas da mesma forma, a única diferença é que esse diálogo será interno, eu terei que responder às minhas próprias perguntas e isso não é tecnicamente mais fácil.
MT: O que você tem produzido para além dos quadrinhos? RL: Paralelamente aos quadrinhos, atuo como ilustrador e efetuo trabalhos em diversas áreas ligadas à ilustração, como campanhas de publicidade, estamparia para moda, ilustração editorial, algumas coisas para design, como criação de logotipo, personagem, entre outros. Estou cursando Licenciatura em Artes Visuais e em breve também terei de deixar um tempo disponível em minha agenda (rs) para dar aulas de Artes no ensino fundamental, médio e também em universidades. MT: Por que quadrinhos? RL: Gosto de todas as formas de expressões artísticas e aprecio a beleza particular de cada uma delas e com os quadrinhos não poderia ser diferente. Para mim, a sua beleza está na capacidade de poder sintetizar duas linguagens diferentes (texto e imagem) em uma totalmente nova, de materializar um texto, dando vida à ele, quadro à quadro, mesmo que a história seja muda, assim como no cinema, dando à essa mídia o poder de transmitir emoções, gerar questionamentos, inquietações, despertar a curiosidade e a criatividade, disseminar informações e é justamente isso o que me faz gostar tanto da “Arte Sequencial”. MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? RL: Ultimamente tenho me dedicado mais à leitura de quadrinhos independentes nacionais. Acho que devido muito ao fato deu estar envolvido com publicações desse tipo nos últimos tempos. Tenho dado
preferência para Graphic Novels de volumes únicos como as publicações do coletivo Dead Hamster, mais precisamente as HQ’s “Surubotron” do Davi Calil, “Sequence Shot” do Greg Tochinni, “A acensão e queda de Big Mini” de Arthur Fujita e “Another Planet” de Amilcar Pinna. Até agora gostei de tudo que foi lançado por eles e espero em breve ler as histórias de Roger Cruz, Julia Bax, Amanda Grazinni e Bruna Brito. Só tem gente boa nesse grupo. Tenho lido também coletâneas como: “Imaginários em quadrinhos” de Raphael Fernandes e “Coletânea Petisco”. Li recentemente “Monstros” do Gustavo Duarte e “O Astronauta Magnetar” da Graphic MSP, ilustrada pelo Danilo Beyruth. O qudrinho nacional está num bom momento com publicações muito boas. Pra não dizer que não acompanho nada gringo, estou lendo a série The Walking Dead de Robert Kirkman e de tempos em tempos leio alguma série em mangá e a que estou lendo no momento é uma minissérie curta, em 4 edições, chamada Blue Dragon - Ral & Grad. Fora os quadrinhos, sempre leio livros de ficção, a série mais recente foi o “Guia do Mochileiro das Galáxias” de Douglas Adams. E Ultimamente tenho lido livros de arte como A História da Arte de E. H. Grombrich e biografias de artistas famosos como a de Delacroix.
Bi Anca https://www.facebook.com/pages/ Anna-Bolenna-A-perturbada-da-corte/125387274292876
Monotipia: Fale sobre sua formação, enquanto ilustradora e quadrinista. Bi Anca: Eu fiz uma prova pra fazer um curso técnico gratuito, eu não sabia direito o que eu ia fazer, quando eu vi Design Gráfico (desenho industrial) eu pensei, há deve ser isso mesmo, tem a ver com desenho haha, ai eu cursei o técnico, não fiz curso de quadrinhos, porém, os programas que aprendi no curso, me ajudaram nos quadrinhos, atualmente eu estou cursando Artes Visuais. MT: Quais influências, no que se refere a movimentos e/ou artistas, você identifica no seu trabalho? BA: Quando eu ganhei um livro da Aline do Adão Iturrusgarai foi amor à primeira vista, uma personagem maluca, safada e tudo que existe de bom hahaha, antes disso eu lia muito Mafalda, mas eu encontrei na Aline o que eu queria dizer para as pessoas, a referência é clara na personagem Anna Bolenna. MT: Há alguma predileção no que se refere a formatos e materiais? BA: Eu faço a mão, digitalizo e jogo as cores no Photoshop. Eu andei arriscando aquarela (acho que deu certo), mas o material é meio caro né, haha, eu prefiro o mais em conta.
Revisão: André Lasak
MT: Conte sobre a dinâmica de produção das suas ilustrações e HQs. BA: As pessoas me perguntam de onde vem as ideias, eu não faço a mínima ideia, às vezes vêm no ônibus depois da aula, às vezes antes de dormir, ou eu forço a ter uma ideia, pegando papel e lápis e rascunhando, sem pressão, acho que a palavra-chave é: sem pressão tudo dá certo (depende né, haha). As tirinhas
de mais sucesso são as que eu faço assim, do nada, sem nenhuma pretensão, ou são as que refletem alguma coisa do meu dia a dia, por exemplo: Uma pessoa me faz uma crítica, eu fico chateada mas faço uma tirinha sobre isso, ela faz sucesso e no fim tudo acaba bem, haha. MT: Quais costumam ser suas preocupações narrativas, no que concerne à construção de um ritmo visual, em suas HQs? BA: Eu gosto de ser clara e objetiva, eu não consigo desenhar tudo que eu quero, mas prefiro desenhar do jeito de que dá que não desenhar nada. MT: O que você tem produzido para além dos quadrinhos? BA: Eu faço tapete de barbante (crochê), faço poesia, e bagunça, muuuuuita bagunça. MT: Por que quadrinhos? BA: Uma maneira linda de passar uma ideia, um conforto pra quem está triste, um alivio pra quem quer dizer alguma coisa e não sabe como, é prazeroso e me traz paz. MT: Que quadrinhos você tem lido ultimamente? E o que além deles? BA: Eu li Habibi, do Craing Thompson, faz umas semanas, ai me empolguei com a série Fábulas e comecei a ler também. Fora isso, eu sempre estou lendo o livro Omnibus do Ricardo Tokumoto, eu curto muito, principalmente que ele vai mostrando a evolução no livro. Os livros do Adão e Toda Mafalda, do Quino, são minhas bíblias, estou sempre lendo pra me inspirar.
I wish you could see how beautiful I was today Ana Recalde http://anarecalde.blogspot.com.br
Ela nunca tinha se achado bonita, era gordinha e desajeitada. Passava muito longe daquele padrão cinematográfico que tanto admirava. Às vezes ela sentia que continuava vendo filmes apenas para se martirizar ainda mais. Mas então algo mudou naquele mês que passou, alguém olhou para ela. Era o rapaz que fazia os sucos na lanchonete que ela sempre ia. Será que estava delirando? Será que ele nunca olhou de verdade para ela e tudo era apenas uma grande bobagem? Sabe, coisa de receber bem na lanchonete, profissionalismo e cortesia. Ela teve muito medo durante muito tempo de estar enganada e se iludindo, por isso nada falava. Mas ia todos os dias no mesmo lugar. Mas aquele dia seria diferente. Ela faria tudo diferente.
Então, ao acordar, se encheu de força e confiança. Escolheu uma roupa que favorecia seu corpo, usou aquela maquiagem que sempre pensou em fazer quando decidisse ser sexy. Era isso, era aquele dia. Ela diria mais que “oi”, o convidaria para sair, trocaria telefone. Saiu sorrindo e caminhou firme até a lanchonete. Quando lá chegou não o viu. Sentou, esperou. Ele não estava lá. Uma garçonete parou em sua mesa: - Como posso te ajudar? - O João, não veio hoje? - Ah não não, ele ficou doente. Mas amanhã acho que ele tá aqui. Uma gripe de nada, sabe como é?
Tudo foi por água abaixo. Ela pediu seu suco de sempre e foi pra casa. Então se perguntou se ela teria coragem um outro dia e quase se disse que não, para logo se dizer sim, depois não novamente e acabar decidindo que amanhã era outro dia. Apenas teve ânimo para twittar uma coisa naquele dia: “I wish you could see how beautiful I was today”.