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Cavalos de Troia – cargas adulteradas - Pedro Galveia
Cavalos de Troia - cargas adulteradas
O termo Cavalo de Troia remonta ao século VIII a.c., pela hábil estrutura construída pelos gregos, tornando-se um estratagema decisivo para a conquista da dita cidade. O cavalo de madeira foi tomado pelos troianos, como um símbolo da vitória aos gregos, sem saberem que no seu interior carregavam para dentro das suas muralhas, o inimigo. Durante a noite, efetivaram o ataque a partir do interior das muralhas, abrindo as portas das mesmas ao seu exército, levando a cidade à ruína. O termo tem sido utilizado por hackers informáticos, noutras lutas no passado, e também no mundo do transporte global. As cargas que torneiam o globo terrestre viajam ao longo das cadeias de abastecimento, de norte a sul, este a oeste, nos mais variados meios e suportes de transporte. São vários os pontos onde existem transformações modais, transferências de carga totais ou em parte, e as mesmas são alvo de cobiça por parte de redes mundiais de tráfico de pessoas, drogas, armas e muitos outros produtos. Com este aproveitamento, o uso do circuito feito pelas cargas “legalmente” expedidas, depressa se tornou apetecível para outras redes, usando as cargas e os seus meios de transporte como verdadeiros cavalos de troia. Este processo não é novo, é certo, mas tem sido cada vez mais explorado e estudado pelas grandes redes ilegais, que operam à escala global. Recentemente, abril de 2011, cerca de 1600 agentes entravam no porto de Antuérpia. Cerca de 200 moradas foram também revistadas, decorrente da enorme operação de combate ao narcotráfico na Europa, que usava o tráfego contentorizado para espalhar os seus produtos. Foram capturadas cerca de 27 toneladas de droga em contentores e armazéns do porto de Antuérpia, no valor de aproximadamente 1,4 mil milhões de euros. De acordo com a International Chamber of Shipping, em relatório publi-
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Pedro Galveia
Obrigado, Pedro Galveia
Quis o destino que este texto do Pedro Galveia, habitual cronista da Revista APAT, não fosse publicado na edição anterior, por manifesta falta de espaço. E, com isso, quis o destino que este último contributo do Pedro Galveia chegasse ao público leitor a título póstumo, já depois do seu falecimento. A luta contra a doença que acabaria por vitimá-lo prolongou-se por anos. Mas nem ela conseguiu retirar-lhe o ânimo, a vontade de trabalhar e de contribuir, com a partilha dos seus conhecimentos, para o progresso do setor – o dos transportes – a que dedicou praticamente toda a sua vida adulta. Apesar das limitações que a doença lhe impunha, nunca o Pedro Galveia se escusou a escrever, a ajudar na organização de eventos, a participar em seminários e conferências. Foi assim, bastas vezes, com a APAT. E, por isso, aqui lhe prestamos homenagem e expressamos o nosso agradecimento. Pedro Galveia ingressou no setor portuário como trabalhador da ETP Lisboa, em junho de 1999. Menos de um ano volvido integrou os quadros da Sotagus, onde permaneceu até 2018, quando transitou para a Yilport Iberia, participando no processo de implementação do sistema de gestão de operações Navis4. Paralelamente, Pedro Galveia cursou Engenharia Informática na UAL e realizou o Mestrado em Gestão Portuária da ENIDH. Foi ainda professor convidado numa das edições da Pós-Graduação em Shipping e Gestão Portuária do ISEG. cado recentemente, cerca de 90% do tráfico de cocaína é feito por via marítima. Estes valores encontram-se diluídos no tráfego de contentores com a América do Sul, na exportação de produtos perecíveis (fruta, por exemplo) e em todos os outros modos que seja possível dissimular os estupefacientes de modo eficaz, de modo que a sua viagem para a Europa, ou outros pontos de rotação, decorra sem sobressaltos. Portos na Grécia e Croácia tiveram igualmente operações no passado mês de abril, onde se realizaram grandes apreensões de produtos ilegais, dentro de contentores. Os cavalos de troia fazem, assim, parte de redes organizadas a nível mundial, com ramificações ao longo da cadeia de transporte, para garantir o sucesso neste transporte - muitas vezes emprestado - levando a que as cargas legítimas fiquem depois arrestadas, tendo o expedidor/importador que sofrer as implicações derivadas desses processos, levando a que as mesmas sejam muitas vezes apreendidas ou até destruídas, sem que os seus donos tenham conhecimento real do que as unidades efetivamente transportavam no seu todo. Os próprios navios têm sido também usados como meio de transporte deste tipo de cargas, agarrados ao casco, aproveitando assim a boleia do transporte destas cargas. Em maio deste ano, foram descobertas algumas dezenas de quilos de cocaína agarrados ao casco de um navio que provinha do Brasil para a Grécia com um carregamento de soja, não sendo caso único nos últimos anos. O tráfico de armas, e em algumas rotas específicas o tráfico de seres humanos, também tem este efeito de cavalos de troia nas cargas. Ao longo da cadeia de transporte, seja no transporte rodoviário, ferroviário ou marítimo são hoje em dia muitos os pontos onde o perigo espreita. As técnicas usadas para este tipo de práticas são também elas cada vez mais elaboradas e pensadas na origem. Nos aeroportos existe igualmente um grande potencial de adulteração de cargas, usando as pessoas como transporte/carregamento destes bens. A contrafação (até de medicamentos, hoje em dia, com a pandemia a que assistimos) é outro dos problemas que assola a economia mundial, podendo trazer problemas a quem compra, na qualidade dos produtos que adquire. Os controlos alfandegários tornam-se vitais para controlar todo este problema, num mundo em que temos aviões de carga constantemente em viagem a distribuir mercadorias a nível mundial, comboios de carga da China para a Europa, e navios que transportam todo o tipo de cargas, em grande quantidade é certo (aumentando assim a apetência pelo uso dos mesmos como cavalos de troia devido ao enorme volume de carga transportada) mas um pouco mais devagar. As cargas que legitimamente passeiam pela cadeia de transporte global deveriam conseguir garantir a sua integridade ao longo da viagem, protegendo-se deste efeito “Troia”, mas as redes globais de tráfico, nas suas mais variadas formas, costumam estar um passo mais à frente e continuam a reinar a nível global, ultrapassando toda a tecnologia atualmente disponível na maior parte das vezes. Uma vez mais se denota a importância das redes de confiança criadas pelos orquestradores do transporte, o seguro das cargas e a sua integridade ao longo do transporte, de modo que possam chegar ao seu destino no tempo certo, pelo preço acordado e sem mais delongas.
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