ANO V, Nº 24 // EDIÇÃO ESPECIAL CONFERÊNCIA APDH 2019
FEMINIZAÇÃO NO SNS Entrevistas a quem está no terreno.
Opiniões e Análises por quem conhece o setor.
Conferência APDH com debate alargado sobre o tema.
Índice 04 EDITORIAL
3 REVISTA DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA PARA O DESENVOLVIMENTO HOSPITALAR DIRETORA ANA ESCOVAL
SNS quatro décadas.
COORDENADORA MARINA CALDAS
06 ANÁLISE
REDAÇÃO MARINA CALDAS, ANTÓNIO SANTOS, ANA TITO LÍVIO
Diálogo Aberto – O Hospital. Os encontros entre pares para debater o hospital público estão a acontecer. Nesta edição a análise sobre o Financiamento Hospitalar na Pós –Troika, por Rui Santana,
EDITORA DE ARTE E PAGINAÇÃO JOANA CÂMARA PESTANA (MYLOGO)
e O Paradigma da Gestão nos Hospitais Públicos, por António Nunes.
FOTOGRAFIA DANIEL PEGO
14 ATUALIDADE
REVISÃO ANA ESCOVAL, ANA TITO LÍVIO, ANTÓNIO SANTOS, MARISA CRISTINO, SARA ROZMAN
"O diagnóstico de ferropenia quando ainda não há anemia é um desafio”.
18 ENTREVISTA A Saúde no feminino. Teresa Luciano e Maria Filomena Gaspar apresentam sentires e vivências na primeira pessoa, sobre uma realidade marcadamente feminina mas ainda dominada por homens.
26 OPINIÃO Ana Isabel Gouveia Lopes analisa a questão da Feminização na Saúde e a persistência das desigualdades. Um documento real e contextualizado, onde se analisam também os desafios
IMPRESSÃO UE TIRAGEM 4.000 EXEMPLARES DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PERIODICIDADE TRIMESTRAL PROJETO Rua Gomes Freire no9 A r/c 1150-175 Lisboa Tel: 213 530 719 geral@fdc.com.pt
e as oportunidades.
32 INOVAÇÃO Feminização na saúde: O Papel da Indústria Farmacêutica no Incentivo à Diversidade. O farmacêutico hospitalar tem acrescentado valor aos cuidados assistenciais às pessoas com VIH. Healthcare Excellence: As Boas Práticas em Saúde Existem.
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Arte de saber comunicar em Saúde.
PROPRIEDADE ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA PARA O DESENVOLVIMENTO HOSPITALAR (APDH) Gabinete HOPE&IHF Portugal Alameda das linhas de torres, 117 1769-001 lisboa Tel. 217548278/79 Telm. 963668745 Email: geral@apdh.pt HOPE: hopemail@hope.min-saude.pt IHF: ihf@ihf.min-saude.pt website: www.apdh.pt
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EDITORIAL
quatro décadas Utopia O lugar impossível que só o sonho alcança e a vontade quando é sonho e esperança. Ancoradouro da vida: Sísifo de chegada e sempre de partida. Utopia é ser e sentir o pensamento em devir
António Arnaut (2016). Era um rio e chorava - 80 poemas para 80 anos. Coimbra Editora.
Houve em Portugal acontecimentos notáveis, em quatro décadas, como o aumento de dez anos da esperança média de vida, de 71 para 81 anos, a diminuição da mortalidade infantil de vinte e três por cento, de 26% para 3%, e o aumento de cinco vezes do número de profissionais de saúde, de 30 mil para 150 mil. Isto foi possível graças à decisão pública de, por vontade, num tempo concreto, ter reunido o sonho e a esperança, ao enunciar primeiro que o “direito à proteção da saúde é realizado pela criação de um serviço nacional de saúde universal...” (número 2 do artigo 64º da CRP), ao determinar a “abertura do acesso aos Serviços Médico-Sociais a todos os cidadãos, independentemente da sua situação contributiva...” (despacho ministerial de 20 de julho de 1978) e ao criar o serviço nacional de saúde (Lei 56/79, de 15 de setembro) para assegurar o acesso universal, compreensivo e gratuito a cuidados de saúde. A mudança de regime operada naquela mesma década de 1970 tornou possível importantes transformações sociais que marcaram para sempre a sociedade portuguesa, principalmente, pela democratização sensível da cultura, da educação e da saúde. E foi neste período que se desenvolveram os naturais movimentos de evolução do género como papel social, ampliando primeiro a distribuição feminina nas profissões de saúde, como em toda a área social, e progredindo depois no acesso às posições de destaque nas direções de serviços, na alta direção de instituições e de organismos e mesmo na condução da política de saúde. Sobretudo nas sociedades europeias tem-se procurado compreender a dinâmica desta natural e recente preponderância do género feminino nas instituições da saúde, tanto na prestação de serviços como na academia, e o que se pode encontrar de comum é que em todas as profissões de saúde, como na educação e outras, até em funções mais relevantes, é a mudança profissional para a feição do cuidado, dos cuidados de saúde. No âmbito da profissão de enfermagem, conhecem-se a partir da década de 1980 os estudos empreendidos por Marie-Françoise Collière, a propósito da ação permanente da enfermeira na promoção da vida, desde a prática ancestral das mulheres de virtude até aos cuidados de enfermagem dos dias de hoje. A presente revista O Hospital reflete de algum modo os serviços de saúde no feminino, nas facetas dos cuidados, da formação, da gestão, da investigação e da formulação política, para valorizar também esta importante transformação social no espaço concreto do SNS.
A DIREÇÃO
A INOVAÇÃO GUIA A NOSSA CIÊNCIA. A HUMANIDADE GUIA A NOSSA EXISTÊNCIA. Para enfrentar os desafios dos cuidados de saúde em todo o mundo, unimos o espírito da biotecnologia à força de uma empresa farmacêutica de sucesso. O resultado é uma empresa biofarmacêutica que combina ciência, paixão e experiência para melhorar de forma inovadora a saúde e os cuidados de saúde. Assegurar um impacto notável na vida das pessoas é mais que a nossa promessa. É a nossa existência.
abbvie.pt
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ANÁLISE
DIÁLOGO ABERTO
O HOSPITAL
A Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar (APDH) tem vindo a desenvolver, ao longo do ano de 2019, vários encontros entre pares (metodologia assente em grupos focais) com o objetivo de repensar o futuro do Hospital, em Portugal e refletir sobre matérias que, à posteriori, serão publicadas e apresentadas em livro, tendo como intenção desenvolver pensamento que permita contribuir para diferentes temáticas que estão na ordem do dia quando se analisa a realidade hospitalar atual. Estes encontros, que juntam em média 30 a 40 participantes, antecipadamente selecionados tendo por base o tema em discussão, para um debate rigoroso, frontal e profundo, têm como ponto de partida um documento elaborado por uma personalidade conceituada do setor - são parceiros da APDH para este projeto a Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), a FDC Consulting e a Takeda. Durante o ano em curso, dois temas mereceram já destaque e análise: o Financiamento Hospitalar, cujo “documento mártir” foi apresentado por Rui Santana, professor da ENSP e, a Gestão e Organização dos Hospitais, cujo trabalho de base esteve a cargo do economista e administrador hospitalar, António Nunes. Nesta edição da revista O Hospital, pedimos a ambos um ponto da situação sobre o trabalho já realizado e para abrirem o apetite aos leitores com a síntese da reflexão aduzida. Os resultados ficam para já em artigo.
7 Financiamento Hospitalar no período Pós-Troika RUI SANTANA Departamento de Políticas e Gestão dos Sistemas de Saúde, Escola Nacional de Saúde Pública, Universidade NOVA de Lisboa
Sendo o setor da saúde um dos mais marcantes da nossa sociedade e o financiamento um elemento fundamental na prossecução dos grandes objetivos dos sistemas de saúde, torna-se importante, à luz do contexto e do período que o nosso país atravessa, realizar uma reflexão sobre as principais lições que aprendemos em resultado da intervenção externa por parte da Troika.
gestão financeira hospitalar numa entidade única e externa ao setor da saúde, o Ministério das Finanças (MdF). A prática diária da função financeira passou a ser exógena às unidades hospitalares, dominada mormente pela necessidade de autorizações superiores administrativamente demoradas e da aplicação de restrições que colocaram sob pressão a tesouraria dessas mesmas unidades.
A primeira constatação prende-se com a divergência no ritmo de recuperação entre a economia do país e recuperação do setor da saúde: a vivência de alguma pacificação e estabilidade em resultado de um processo de retoma de crescimento (ténue) da nossa economia, parece não ser todavia acompanhada pelo setor da saúde, em particular do Serviço Nacional de Saúde (SNS), que permanece a manifestar sintomas de uma continuidade latente nos efeitos e consequências do período anterior. Esta constatação encontra-se mesmo implícita num dos últimos editoriais do Lancet, que alerta o novo Governo Português para a necessidade de colocar o setor da saúde nas suas prioridades programáticas, investindo mais neste mesmo setor.
A este facto aduz-se a indução de uma neutralidade provocada pelos mecanismos de negociação e contratação dos orçamentos-programa (vulgo planos de desempenho) entre os Departamentos de Contratualização das Administrações Regionais de Saúde e as Administrações Hospitalares. Se ao longo do tempo o desgaste deste modelo provocou alguma desconsideração do mesmo (sobretudo motivado pela ausência de consequências reconhecidas do mesmo), no período pós-Troika os contratos-programa enquanto mecanismos tendentes a uma separação das funções pagador, proprietário e prestador foram reduzidos a um papel secundário, de cariz meramente formal e administrativo.
De uma forma simplista não será exagero afirmar que os problemas existentes na altura da intervenção não foram resolvidos e que a intervenção imposta acarretou mesmo novos e mais substanciais problemas ao SNS Português.
Contudo e tendo em consideração os efeitos nefastos, o resultado mais marcante da prática de centralização da responsabilidade por parte do MdF foi a completa ineficácia em romper com os ciclos de endividamento sistemático dos hospitais ao longo do tempo, tornando-se a libertação extraordinária de verbas uma prática regular, tradicionalmente no final de cada exercício.
Um dos efeitos mais marcantes que resultou da intervenção externa foi a decisão de centralização da
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ANÁLISE
Depois de a Organização Mundial da Saúde ter identificado Portugal como sendo um dos quatro países (de 33 analisados) que reduziram a despesa pública em saúde entre 2000 e 2017, no passado mês de outubro e após a divulgação do Relatório e Contas do SNS, ficámos também informados do valor de deficit significativo que o exercício de 2018 apresentou no que respeita ao resultado líquido do mesmo - 848 milhões de euros negativos. Este resultado induz que futuramente serão disponibilizadas novas verbas que necessariamente devem cobrir este resultado líquido negativo, sendo que neste contexto, a incidência das decisões operacionais dos hospitais recai sobretudo na garantia de financiamento do deficit gerado em detrimento de ações tendentes a gerar eficiência. Se os resultados de exploração não se encontram de acordo com as expectativas, a ausência de investimento na renovação do capital fixo através da substituição dos equipamentos desgastados pela sua natural utilização, mostra que a sua manutenção ao longo do tempo não é sustentável. A centralização da função financeira não foi eficaz, neutralizou o instrumento “financiamento” enquanto elemento capaz de gerar incentivos e não promoveu a eficiência. Esta prática criou ainda um sentimento generalizado de falta de meios financeiros para as necessidades básicas de exploração e investimento, fator que desmotivou os profissionais do SNS e por outro lado potenciou a desresponsabilização da ação das estruturas de gestão, utilizando-se o subfinanciamento
da atividade como argumento joker para todas as manifestações e ocorrências negativas do SNS. Outras externalidades também não poderão ser ignoradas, entre as quais o crescimento do sector privado de prestação de cuidados de saúde, que surge como uma alternativa alimentada pela edificação de novas infra-estruturas, profissionais diferenciados provindos de um setor que não lhes proporcionou as condições esperadas e consumidores que não encontram as respostas adequadas nos serviços públicos. O peso do esforço de cobertura direta dos consumidores na prestação de cuidados de saúde cresceu também durante os últimos anos. Num momento em que se encontra faseada a devolução da autonomia financeira aos hospitais, restaurando a confiança entre financiadores e prestadores de cuidados de saúde surgem nesta discussão novas buzzwords e tendências cujo entendimento parece descolado da realidade em que vivemos. Nesta permanecem lacunas significativas e que estruturalmente afetam em particular o sistema de financiamento de organizações de saúde públicas no nosso país, entre as quais se destacam: a inexistência de metodologias de custeio analíticas e baseadas no utente (sem bons custos não há bons preços), a fiabilidade e exaustividade dos processos de codificação clínica em todos os níveis de cuidados de saúde, a abordagem separada na definição de incentivos entre níveis de prestação de cuidados de saúde, a não utilização de sistemas de ajustamento pelo risco de base populacional, a utilização de unidades de pagamento distintas com incentivos cruzados, a quantidade e complexidade dos incentivos colocados, a separação pouco evidente dos papéis de financiador, proprietário e prestador, a ausência da presença do consumidor na definição das modalidades de financiamento ou a falta de integração dos incentivos verticais e horizontais nas próprias organizações de saúde. Apesar dos avanços conseguidos aos longo dos anos, os pilares estruturantes de um sistema de financiamento no nosso país permanecem por consolidar. A agenda deverá incidir em tudo o que ainda não foi feito, pois o sucesso da aplicação de novas práticas ao nível do financiamento de organizações de saúde não alcançará os resultados esperados sem que estes problemas se encontrem resolvidos…uma saca sem arroz, dificilmente se manterá de pé.
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ANÁLISE
ANTÓNIO NUNES Economista e gestor hospitalar, Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (CHULC)
O paradigma da gestão dos Hospitais Públicos UMA REFORMA NÃO CONCRETIZADA A Lei 27/2002 e o D.L. 93/2005 permitiram a criação dos hospitais EPE (entidade pública empresarial), reforma a que também se convencionou chamar de “empresarialização dos hospitais”, que pretendia dar uma resposta às dificuldades de gestão operacional sentidas por todos os hospitais do SNS. Envolveu um número significativo de unidades que eram responsáveis por mais de 50% da atividade clínica do sector público. Esta reforma introduziu algumas alterações positivas, das quais as que mais se destacam foi a separação da entidade financiadora da prestadora, através da criação de contratos-programa, que definiam preços e atividade a contratar, fixavam metas de convergência financeira, e determinavam políticas de incentivos e de penalizações.
Apesar de terem sido eliminadas algumas das ambiguidades do SNS, os aspectos que seriam relevantes como o reforço da autonomia e da responsabilização, ficaram praticamente intocáveis com os hospitais a continuarem muito dependentes de políticas conduzidas diretamente pelo poder central. Parece contudo que o falhanço desta política não se esgota simplesmente na falta de autonomia e de responsabilização dos hospitais. Existem outras razões externas estruturais que têm implicações na gestão diária dos hospitais, tais como: Os atuais fluxos de procura das urgências hospitalares não têm uma complexidade clínica que exija aqueles níveis de serviço; O encerramento de camas (-13% de 2001 a 2017) tem dificultado muito a gestão diária dos hospitais em picos de procura, com a agravante da percentagem
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dos dias de internamento inapropriados chegar aos 6%! Políticas orçamentais muito restritivas, assentes em estratégias que têm privilegiado a contenção da despesa com implicações na diminuição do défice público, têm-se efetuado com cativações e fortes reduções na despesa global em que a parcela destinada ao investimento tem sido das mais sacrificadas. Esta situação tem-se arrastado ao longo dos anos, o que tem levado a uma degradação das infra-estruturas hospitalares, dos seus equipamentos médico-cirúrgicos, e dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica, com reflexos numa baixa produtividade, procurando-se responder a essa procura não satisfeita nos hospitais do SNS, comprando-a ao setor social e privado a preços superiores aos dos seus contratos-programas. Relativamente aos recursos humanos, estes assumem uma importância fulcral no processo gestionário dos hospitais e é precisamente nesta área onde existe uma menor capacidade de decisão. As políticas de recrutamento, definição de salários, distribuição das cargas horárias, gestão das carreiras, promoções, etc., estão praticamente fora do âmbito da capacidade de decisão dos Conselhos de Administração dos Hospitais. Estamos perante um modelo muito burocrático e administrativista, cujas decisões estão fortemente concentradas e na dependência direta das estruturas do Ministério da Saúde, e por vezes até do Ministério das
Finanças. Quando esta é a principal rúbrica da despesa dos hospitais, absorvendo perto de 50%, do total da sua exploração! Reconhece-se ao Estado e ao Ministério da Saúde um importante papel na definição das políticas de gestão dos seus recursos humanos, particularmente nos acordos a estabelecer com os sindicatos representativos dessas mesmas carreiras, mas é imperioso que se conclua o processo negocial, ou no mínimo que se estabeleçam as suas principais linhas de orientação. Mas também existem razões comprometido aquela reforma:
internas
que
têm
Mais do que a tão discutida insuficiência do financiamento, são as ineficiências ligadas ao processo produtivo e organizativo as principais responsáveis pelas listas de espera crescentes que só são atenuadas com o recurso à compra de serviços ao exterior. Em 2017, o número de doentes cirúrgicos em espera era de 231.250 e as cirurgias realizadas no sector convencionado (privado e sector social) atingiram as 24.608, ou seja, 4% de toda a atividade cirúrgica global dos hospitais; Uma parcela significativa da atividade hospitalar tem origem nos seus serviços de urgência. Estes serviços, que deviam ser estruturantes nas suas dinâmicas assistenciais, com equipas médicas integradas no seu corpo clínico, são, na maioria das vezes, assegurados por médicos externos com salários exorbitantes e sem nenhuma ligação ao hospital.
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ANÁLISE
Contributos para melhorar a organização e gestão hospitalar
específicos para o controlo da eficiência, passem a ser determinantes:
Os hospitais continuam a estar demasiado no centro do sistema e a consumirem mais de 50% dos recursos. No corrente ano (2019), os atuais Contratos-Programa com os chamados programas verticais incluídos, absorvem 56% do total das verbas do orçamento do SNS.
Produção e Produtividade dos Recursos Humanos – Existe uma inadequação e uma rigidez na afetação dos recursos humanos a determinadas áreas assistenciais como blocos operatórios, salas de exames e consultas.
Estima-se que a ineficiência gerada nos hospitais seja superior a mil milhões de euros. Em março do corrente ano, a dívida total dos hospitais cifrava-se em 1.354 milhões de euros!
Programas de qualidade clínica – As taxas de reinternamento continuam elevadas, as complicações com infeções hospitalares reduziramse mas são ainda preocupantes. A população internada nos hospitais pelo facto de ser muito idosa, está muito sujeita a quedas e contrai facilmente úlceras de pressão. Os hospitais continuam com elevadas taxas de cesarianas, a inexistência de um plano para os doentes com fraturas leva a que estes aguardem demasiado tempo pela cirurgia, com custos clínicos e financeiros elevados.
Quando comparamos recursos e resultados, eles traduzem uma falência desta cultura organizacional. Entre 2001 e 2017, os recursos humanos nos hospitais do SNS, aumentaram respetivamente, 33% no pessoal médico, 24% no pessoal de enfermagem e 26%, no pessoal de diagnóstico e terapêutica. A produção neste período não seguiu a mesma tendência, diminuíram os doentes saídos do internamento (-15%), aumentaram 2%, o número de urgências, 35.5% as cirurgias (muitas no ambulatório) e 71% as consultas. Ainda assim estes aumentos de atividade foram inferiores aos acréscimos registados nos recursos humanos.
É urgente repensar uma nova estratégia As leis de execução orçamental têm sido claras ao apelarem à necessidade de se reformar a prestação dos cuidados de saúde hospitalares, dotando os hospitais de maior autonomia, introduzindo novos instrumentos de avaliação nos seus contratos-programa. Há por isso um consenso generalizado relativamente à possibilidade dos hospitais terem contratos-programa plurianuais, a três anos, que coincidam com os mandatos dos conselhos de administração. Desta forma, os hospitais podiam planear antecipadamente, com vantagens acrescidas para a gestão do Orçamento de Estado, a definição da oferta de cuidados e a atividade a desenvolver a médio prazo. Na linha das recomendações do Tribunal de Contas, o modelo de governação dos hospitais devia assentar numa equipa de gestão, constituída por uma comissão executiva, onde o diretor clínico e o enfermeiro diretor deviam ser órgãos de apoio técnico. Torna-se por isso imprescindível a criação duma nova filosofia organizacional, onde os programas
Aferição da capacidade instalada e dos equipamentos disponíveis – Tem-se constatado que os equipamentos e infra-estruturas disponíveis têm taxas de utilização muito baixas. Controlo de custos e melhoria do volume de receita própria. - É importante encontrar fontes alternativas de financiamento, sem alterar o atual sistema fiscal. O orçamento dos hospitais deviam voltar a incluir uma verba para o investimento de substituição.
Benchmarking hospitalar O orçamento dos hospitais devia voltar a incluir uma verba para o investimento de substituição. Se não criarmos indicadores claros e objetivos sobre o desempenho da gestão e se tivermos défices na qualidade dos conselhos de administração, podemos pôr em risco a sustentabilidade do SNS, pois o futuro vai trazer-nos fortes desafios com crescimentos permanentes das despesas, por força dos avanços tecnológicos, pelas novas terapêuticas medicamentosas pela introdução de dispositivos médicos mais sofisticados e por uma população mais idosa e mais necessitada de cuidados. Por maior que seja a carga tributária relativamente ao PIB, esta será sempre insuficiente para fazer face às necessidades do sector. Se não corrigirmos os erros do passado vamos continuar com os mesmos problemas no futuro - Serviços condicionados com custos sociais e financeiros insustentáveis.
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ATUALIDADE
O diagnóstico de ferropenia quando ainda não há anemia é um desafio” JOÃO PÊGO Patologista clínico Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra João Pego é patologista clinico no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, sendo igualmente membro da direçao da Sociedade Portuguesa de Patologia Clínica. A revista O Hospital quis saber de que forma a patologia clínica pode ajudar para um melhor diagnóstico dos doentes com ferropénia, e mesmo para o consequente tratamento. João Pego não tem dúvidas que o diagnóstico precoce, a este nível, numa altura em que os doentes ainda não têm manifestações clínicas é fundamental para tudo o que vem a seguir. Até porque, afirma ainda, “estamos perante uma entidade subdiagnosticada”, sendo recomendável que “em situaçao de suspeita de ferropénia esta deva ser investigada sob o ponto de vista clinico e laboratorial” sem esquecer de se tratar a causa do problema.
Como se define anemia? A anemia é definida como uma diminuição da concentração de hemoglobina no sangue abaixo dos valores de referência. Pelos critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS) podemos definir anemia no adulto com um nível de hemoglobina inferior a 13 g/dL nos homens e inferior a 12 g/dL nas mulheres. Esta definição não é linear e há que ter em conta outras variáveis que podem mascarar a existência de anemia, como por exemplo a desidratação. O Estudo EMPIRE (estudo epidemiológico nacional publicado em 2016) realizado pelo Anemia Working Group Portugal (AWGP), veio demonstrar uma prevalência de anemia em Portugal de 20%.
A anemia pode ter diversas causas. Pode ser classificada como congénita/hereditária ou adquirida. Pode assim ser devida a alterações genéticas, hemólise, perdas hemáticas agudas ou crónicas, infecções/inflamações, neoplasias ou surgir de défices nutricionais, nomeadamente de ferro, de vitamina B12 ou de ácido fólico. A deficiência de ferro é a causa mais comum de anemia em todo o mundo, sendo responsável por cerca de 50% dos casos de anemia.
E deficiência de ferro (ferropénia)? A ferropénia é definida como uma diminuição do ferro corporal.
15 A ferropénia pode ter várias causas, entre elas: 1) o aumento das necessidades de ferro (ex. durante o período de crescimento, gravidez); 2) o défice de aporte de ferro (sobretudo nos países em desenvolvimento; dieta inapropriada); 3) aumento das perdas hemáticas (ex.: perdas ginecológicas, hemorragia gastrointestinal (ex. cancro do cólon), pós-cirurgia muito hemorrágica, hematúria); e 4) diminuição da absorção do ferro (ex. gastrite atrófica, doença celíaca, medicação para diminuição da acidez gástrica, pós-gastrectomia).
Quais são os parâmetros laboratoriais que permitem o diagnóstico da ferropénia? Recomenda-se que em situação de suspeita de ferropénia, esta deva ser investigada sob ponto de vista clínico e laboratorial, assim como tratada a sua causa, pelo que se reforça a seguinte abordagem laboratorial: pedido de hemograma, reticulócitos e parâmetros do metabolismo do ferro, como a ferritina e a saturação da transferrina. Na ferropénia o parâmetro mais útil é a avaliação da ferritina. A ferritina sérica permite avaliar os depósitos de ferro no organismo e tem um valor normal entre os 30-340 ng/ml (embora os valores de referência possam variar consoante o laboratório). Níveis de Ferritina < 30 ng/ml são indicadores de défice de ferro. Contudo, devem ter-se em atenção valores “falsamente” normais como em situações de inflamação/infecção, doença renal crónica e outras doenças crónicas, e neste caso devem ser avaliados outros parâmetros como a proteína C reactiva (PCR). A Saturação da Transferrina (ST) é um parâmetro útil na avaliação de défice ou sobrecarga de ferro embora deva ser avaliada com precaução dada a variabilidade biológica no doseamento do ferro sérico que é usado para o seu cálculo. Se a ST for <20% considera-se sinal de ferropénia. O Recetor Solúvel da Transferrina (RST), é uma molécula da membrana dos precursores eritroides da medula óssea e um pequeno fragmento desta molécula liberta-se para a circulação e pode ser doseado no soro. Na ferropénia há mecanismos que permitem uma maior expressão destes recetores na membrana dos precursores eritroides com o consequente aumento da concentração do seu fragmento solúvel. Uma concentração elevada traduz uma situação de défice de ferro (embora possa estar aumentado em outros tipos de anemia). Tem a vantagem de ser pouco influenciado por processos inflamatórios pelo que é particularmente útil no diagnóstico diferencial com anemia da inflamação.
A anemia por défice de ferro surge-nos mais frequentemente como uma anemia microcítica (VGM < 80fL) e hipocrómica (HGM< 27 pg). Deve ter-se em atenção que se existirem outros défices nutricionais concomitantes, a ferropénia pode não apresentar-se desta maneira. Da mesma forma, esta apresentação não é exclusiva da ferropénia, e também algumas hemoglobinopatias e determinados tipos de anemia cursam com microcitose e hipocromia. Há que ter em conta a coexistência de doenças crónicas ou hemoglobinopatias. O aumento do RDW ocorre muito precocemente no processo de instalação do défice de ferro e pode ser útil no diagnóstico diferencial de outras anemias microcíticas e hipocrómicas. A coloração do ferro na medula óssea pode ser usada para a avaliação dos depósitos de ferro, no entanto este correlaciona-se com o doseamento de ferritina sérica e sendo um método invasivo é utilizado apenas em situações de excepção. Há situações em que devem ser considerados diferentes valores para a valorização de ferropénia. Por exemplo, no caso das grávidas, em que a reposição de ferro se deve ponderar para valores de ferritina < 70 ng/ml; na insuficiência cardíaca em que se deve considerar deficiência de ferro se ferritina < 100 ng/ml ou ferritina entre os 100-300 ng/mL com saturação de transferrina < 20%.
Porque é que é importante diagnosticar a ferropénia mesmo quando não existe anemia? Segundo as recomendações da DGS, a ferropénia, com ou sem anemia, deve ser tratada e investigada a sua etiologia, ou seja, deve-se corrigir a ferropénia mas também investigar e tratar a causa da mesma. O ferro desempenha várias funções no organismo. É importante no transporte de O2 na hemoglobina e mioglobina, é um cofactor essencial na função de várias enzimas e como componente dos citocromos é responsável pelo transporte de eletrões na cadeia respiratória. A deficiência de ferro vai desde o estado de ferropénia sem anemia à anemia ferropénica. A ferropénia, ainda sem anemia, pode por si só ser responsável por vários transtornos como alterações do metabolismo da tiroide, irritabilidade, fraqueza muscular, síndroma das pernas irrequietas, diminuição
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ATUALIDADE
da capacidade de trabalho e défice de desenvolvimento físico e cognitivo-comportamental nas crianças. Nas grávidas está associada a prematuridade, aumento na frequência de abortos, atraso do crescimento fetal, recém-nascidos de baixo peso, infeções maternas e menor tolerância a perdas durante o parto, entre outros. A ferropénia não corrigida levará inevitavelmente ao aparecimento de anemia e dessa forma a mais sintomas como astenia, palpitações, dispneia e cefaleias, bem como, agravar problemas de saúde já existentes como por exemplo a insuficiência cardíaca que terá mais episódios de descompensação com necessidade de idas ao serviço de urgência e eventual internamento. Na insuficiência cardíaca a ferropénia leva a fadiga, intolerância ao exercício e diminuição da qualidade de vida, sendo que a terapêutica com ferro, com ou sem anemia, permite a melhoria da sintomatologia. Na gravidez o diagnóstico precoce da ferropénia no período pré-natal, seguido de terapêutica, permite diminuir as necessidades transfusionais.
Como referido previamente há diagnósticos graves e potencialmente fatais subjacentes à ferropénia, como por exemplo neoplasias do trato gastrointestinal que se detetados precocemente podem ter o prognóstico melhorado. O diagnóstico e correção atempada da ferropénia poderá evitar o aparecimento de anemia, melhorar a sintomatologia já existente e a qualidade de vida dos doentes.
Considera que há uma desvalorização da ferropénia por esta não ser ainda um estado de anemia? Penso não haver uma desvalorização da ferropénia quando esta ainda não está associada a um estado de anemia. Os colegas sabem da sua importância. Considero é que é um verdadeiro desafio o diagnóstico de ferropénia quando ainda não há anemia. O pedido de ferritina só é efetuado em determinadas situações. A anemia é uma delas, determinadas alterações
17 laboratoriais suspeitas também o são, assim como determinados grupos de risco como já podemos verificar. Os sintomas de ferropénia que referi previamente são muitas vezes inespecíficos e podem ser facilmente confundidos com outras situações clínicas.
Um intervalo de referência da ferritina devidamente atualizado pode ter um papel fundamental na consciencialização e respetivo diagnóstico da ferropénia por parte de outros profissionais de saúde?
De que forma a Patologia Clínica pode contribuir para um melhor diagnóstico e consequente tratamento dos doentes com ferropénia?
Intervalos de referência atualizados e adaptados à situação clínica do doente são fundamentais. A Ferritina é o parâmetro mais útil disponível para avaliar os depósitos de ferro do organismo, sendo que baixas concentrações são indicadoras de depleção. Por outro lado, é preciso haver a consciencialização de que a ferritina é uma proteína de fase aguda, que está aumentada em estados inflamatórios e pode desta maneira mascarar o diagnóstico de ferropénia. Apesar dos valores de referência poderem ser variáveis entre diferentes laboratórios o intervalo de referência comummente aceite para a ferritina sérica é: 30-340ng/ mL. Os valores de referência de ferropénia no adulto são para Ferropénia absoluta <30ng/mL, Gravidez <70ng/ mL, Insuficiência cardíaca <100ng/mL ou 100-300ng/ mL com Saturação de Transferrina <20%, Doença renal crónica <500ng/mL com Saturação de Transferrina <30% e Doença inflamatória intestinal ativa <100ng/mL com Saturação de Transferrina <20%
Desde logo porque a Patologia Clínica é o primeiro local a poder detetar a ferropénia, podendo contribuir para um diagnóstico precoce numa altura em que os doentes podem ainda não ter manifestações clínicas. Estamos perante uma entidade subdiagnosticada. O Patologista Clínico perante uma suspeita laboratorial pode proativamente acrescentar análises, prosseguindo o estudo usando algoritmos diagnósticos que levem ao diagnóstico de ferropénia. Recomenda-se que em situação de suspeita de ferropénia, esta deva ser investigada sob ponto de vista clínico e laboratorial, assim como tratada a sua causa. A abordagem laboratorial incluí Hemograma, Reticulócitos, Parâmetros do metabolismo do ferro: Saturação da transferrina (ST) e Ferritina, entre outros. A determinação da Proteína C Reactiva pode estar indicada uma vez que valores falsamente normais de ferritina podem ocorrer em situações inflamação/ infeção. É de referir que é tão importante o diagnóstico atempado e a sua correção, como a investigação da etiologia da mesma. Além disso existem sub-grupos relevantes, como por exemplo, crianças em desenvolvimento e grávidas que têm necessidades aumentadas, bem como pessoas com doença inflamatória intestinal com défice de absorção. A frequência da ferropénia em grupos de risco conhecidos, como sejam as grávidas, os doentes renais crónicos, os doentes com doenças inflamatórias intestinais ou com insuficiência cardíaca, está associada a pior prognóstico, com aumento das necessidades de internamento e redução da qualidade e esperança de vida. A Patologia Clínica pode adequar os intervalos de referência às diferentes situações clínicas dos doentes. A Patologia Clínica pode assim ao adicionar análises perante uma suspeita laboratorial inicial contribuir para a exclusão de outras patologias, permitindo estudar as diferentes possibilidades de diagnósticos diferenciais para chegar precocemente ao diagnóstico definitivo e assim fornecer de forma rápida informação aos clínicos, com intervalos de referência ajustados, para estes poderem adequar o tratamento.
Que outras formas de comunicação e de alerta têm o patologista clínico à sua disposição para melhor interagir e colaborar no processo de diagnóstico com outros profissionais de saúde? O Patologista Clínico pode desde logo perante uma suspeita laboratorial iniciar o estudo de forma precoce e alertar os colegas para a situação. Pode não só auxiliar no diagnóstico de ferropénia mas também na sua etiologia. Pode igualmente chamar à atenção que perante um resultado de ferritina normal ou alta num doente com estado inflamatório que tem por exemplo uma proteína c reactiva alta o diagnóstico de ferropénia não está excluído uma vez que a ferritina é um marcador de fase aguda. As formas de comunicação e alerta vão desde a disponibilização de resultados de análises que tenham sido adicionadas pelo patologista clínico, ao envio de mensagens a acompanhar os resultados a auxiliar na interpretação diagnóstica, ao contacto telefónico para em diálogo com os colegas saber mais informação clínica dos doentes e da partilha de informação entre colegas chegar de forma mais precisa ao correto diagnóstico, até à participação em reuniões de decisão terapêutica.
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GRANDE ENTREVISTA
A SAÚDE NO FEMININO
VISÃO E A ANÁLISE DE MULHERES QUE SE DEMARCARAM NO SETO A APDH escolheu como tema da sua conferência deste ano “O SNS no Feminino”. Numa altura em que se comemoram os 40 anos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e quando se fala, cada vez mais, na feminilização da Saúde, em Portugal e no mundo, O Hospital escolheu como tema principal desta edição especial a realidade da mulher que trabalha na área da saúde. Foram escolhidas pessoas com provas dadas no setor e que podem, de facto, abrir o livro sobre a realidade que enfrentaram e enfrentam num mundo onde, apesar de estarem em maioria numérica, os cargos diretivos, na grande maioria, ainda pertencem a homens. Será que faz sentido manter-se esta realidade ou sentem que algo está a mudar? Será que a família e a maternidade e os filhos ainda pesam no momento de decidir uma carreira? Será que há outros constrangimentos que são importantes percebermos? Foi isso que fomos tentar perceber e o resultado foi muito interessante. Colocámos a todas as mesmas questões (ver caixa). Agora leiam os resultados.
O que queríamos saber
hierárquica, os homens ainda dominavam.
Nas entrevistas realizadas colocámos as mesmas questões às convidadas e o que pretendíamos saber era se consideravam que as profissões da saúde estavam mais vocacionadas para mulheres do que para homens e se, atualmente quando se olha para o SNS, se consegue ver a questão da feminilizaçao nos diferentes setores (medicina, enfermagem, farmácia, indústria farmacêutica , etc.).
Saber quais as principais dificuldades que encontram as mulheres que lideram este setor foi também uma das perguntas colocadas, assim como a questão da progressão na carreira e as diferenças neste domínio entre homens e mulheres.
Fomos também à análise histórica, tentando perceber se sentiram que, ao longo dos anos, as mulheres tinham conseguido ganhar terreno na área da saúde e se, havendo mais mulheres do que homens no setor em questão, se considerava que as lideranças estavam também a seguir esse percurso (de as mulheres assumirem esses cargos) ou se, ao nível da cadeia
Também a questão da humanização e as características femininas estiveram em análise, assim como a evolução tecnológica, a conversa com os utentes e a questão do toque. E por fim, quisemos ainda que nos dissessem como ficava a família com a subida da mulher nos cargos de direção, da Saúde.
19 Teresa Machado Luciano, atual Secretária Regional
da Saúde, do Governo Regional dos Açores, tem vindo a dedicar o seu desenvolvimento profissional à gestão de organizações públicas na área da saúde. Na Região Autónoma dos Açores, presidiu à Saudaçor, sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos que tem como objeto o planeamento e a gestão do sistema regional de saúde e dos respetivos sistemas de informação, infraestruturas e instalações. Liderou ainda a Unidade de Saúde da Ilha de São Miguel, organização que presta cuidados primários e continuados à população da maior ilha do arquipélago. No âmbito do Serviço Nacional de Saúde, integrou o conselho de administração do Centro Hospitalar do Algarve e dirigiu os Agrupamentos de Centros de Saúde do Oeste Norte e da Amadora. Integrou ainda a equipa do Infarmed para implementação institucional dos genéricos em Portugal no seu início 2001. Teresa Luciano é Licenciada em Ciências Farmacêuticas, pela Universidade de Coimbra, tem formação especializada nas áreas de saúde e desenvolvimento, marketing e negócios internacionais e gestão com várias pos-graduações e frequência de doutoramento em saúde internacional.
As profissões da Saúde são mais vocacionadas para mulheres do que para homens? As profissões da saúde são mais vocacionadas para pessoas que gostam de pessoas. Apenas isso. E não é pouco. Não acredito numa predeterminação de mulheres ou homens para determinadas profissões. Acredito, isso sim, que existe condicionamento social. A predominância das mulheres na enfermagem deu-se em contexto de guerra ou pós-guerra. Florence Nightingale surge como mãe da enfermagem moderna durante a Guerra da Crimeia. Durante as duas grandes guerras que assolaram o mundo no século XX, as enfermeiras impuseram-se, porque os homens estavam a combater. E esse predomínio manteve-se, em grande parte, porque se tratava de mão-de-obra mais barata. Acresce que as profissões da saúde são muitas e diversificadas. É difícil admitir que possa existir uma vocação predominantemente feminina quando falamos de um espectro tão grande de profissões. Nos cuidados
TERESA LUCIANO, SECRETÁRIA REGIONAL DA SAÚDE DOS AÇORES
A sociedade evoluiu, mas continua a obrigar-nos a escolher entre a carreira e a família.
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GRANDE ENTREVISTA
de saúde não há só médicos e enfermeiros. Também há pessoas que transportam macas. Acho que é necessário gostar muito de pessoas, em geral, para trabalhar na área da saúde, convivendo com doença e sofrimento, morte, horários difíceis, elevados níveis de pressão, risco e responsabilidade. Estamos física e emocionalmente próximos das pessoas que necessitam de cuidados e, ao mesmo tempo, fortemente dependentes dos nossos colegas de equipa.
Quando olha para o SNS, como vê a questão da feminização nos diferentes setores (medicina, enfermagem, farmácia, indústria farmacêutica, etc.)? Fico muito satisfeita, claro. As mulheres estiveram fechadas em casa durante demasiado tempo. Até que descobriram que, estudando, poderiam ganhar o seu lugar na sociedade, a sua independência. Compram a sua roupa, pagam a sua casa e, se houver um divórcio, assumem a educação dos filhos. Mas, para conquistarem esta autonomia, as mulheres têm de estudar. Se não o fizerem, vão cair em empregos mal pagos e, mais uma vez, ficam dependentes de terceiros, sejam pais ou maridos. Porque, quando olhamos para o trabalho indiferenciado, os indicadores demonstram que a diferença de remuneração entre homens e mulheres é ainda maior. Portanto, agarramo-nos aos livros…
Atualmente nas profissões que temos de estudar estamos a chegar ao maioritariamente mulheres e na área da saúde não é exceção, será que irá mesmo inverter? Carolina Beatriz Ângelo é um exemplo, foi a primeira mulher a votar no nosso país. Era cirurgiã, viúva, tinha uma filha pequena. Reconheceram-na como chefe de família e, por isso, concederam-lhe o direito de votar. Mas irritou muita gente. E as mulheres tiveram de esperar mais 20 anos para votarem.
Sente que ao longo dos anos as mulheres têm ganho terreno neste domínio? Sim, muito terreno, pelos motivos que já lhe apontei.
Mas sabe o que me aborrece muito? Nas organizações dos sectores que apontou, as mulheres são uma maioria em termos de quadros técnicos. Mas uma minoria nas lideranças.
Havendo mais mulheres do que homens nestas áreas, pensa que as lideranças estão também a seguir esse percurso (de as mulheres assumirem esses cargos) ou ao nível da cadeia hierárquica, os homens ainda dominam? Porquê? A sociedade evoluiu muito. Mas continua a obrigar-nos a escolher entre a carreira e a família. E temos de fazer essa escolha porque não temos rede de suporte. A ministra da Justiça francesa, durante a presidência de Sarkozy, voltou ao trabalho apenas cinco dias depois do parto. Jacinda Ardern, primeira-ministra neozelandesa, tirou seis semanas de licença após ser mãe. Estas mulheres ficaram debaixo de fogo. Os homens vão trabalhar no dia a seguir ao parto, distribuem charutos, bebem uísque e ninguém lhes aponta o dedo. Como viver a parentalidade é uma decisão que cabe a mulheres e homens. O que interessa é que as pessoas tenham horários, espaço e condições para serem mães e pais.
Que dificuldades encontram mulheres que lideram?
as
Dificuldade de tempo para nós, muito mais do que dificuldade de mentalidades de com quem trabalhamos de não nos aceitarem…por vezes a dificuldade em conciliar carreira e família. E não falo apenas em filhos. Estou a falar, também, dos nossos pais. Precisamos de mais estruturas de suporte, de mais organização no trabalho, horários mais racionais. E, não resisto, de homens mais cooperantes. Tudo o resto é pequeno e risível.
A progressão na carreira é diferente para homens e mulheres? Sim. Acho que as mulheres têm de trabalhar mais, de facto, para conseguirem progredir na carreira. Nós, mulheres, sabemos o nome dos filhos e as doenças dos pais de toda a nossa equipa. E conseguimos
21 perguntar por eles enquanto despachamos uma reunião, com vinte pontos na agenda, em trinta minutos; somos mais sensíveis às pessoas, sabemos os aniversários de quem trabalha connosco, preocupamonos com políticas de recursos humanos concretas e implementação das mesmas. Os homens gerem pela disciplina, pela ambição e, às vezes, pelo humor. O facto de termos tanto a nosso cargo obriga-nos a estarmos muito atentas e a sermos muito, muito rápidas.
Pensa que, de alguma forma, as mulheres têm características específicas na forma de lidar com as pessoas com doença, acabando por criar uma ligação mais “calorosa” com os utentes? Sim, a maior parte das mulheres apresenta características de cuidadoras. Mas não há, aqui, determinismo biológico. É uma construção social. Que oferecemos às nossas meninas desde tenra idade? Bonecas que necessitam de cuidados. Que vemos as nossas mães fazerem? Cuidar dos outros. Mas os homens também ostentam essas características. De uma forma diferente. Talvez mais brincalhona e descontraída, talvez para disfarçar a emoção que lhes pesa nos olhos. Em Portugal, a profissão de enfermagem só adquiriu um cariz feminino em 1950. E, mesmo assim, foi apenas porque copiámos modelos estrangeiros. Se não tivéssemos realizado essa viragem, poderíamos estar hoje a abordar a masculinização do cuidar em Portugal. Curioso, não é?
Há quem diga que a humanização na saúde tem vindo a ser substituída pelas máquinas e pela tecnologia e que o toque, o olhar, a conversa entre utente e médico (por exemplo) vai-se perdendo. Sente isso? Não sei se concordo com essa perspetiva. A tecnologia não é um fator de desumanização. Nem de humanização. Aliás, a tecnologia é um meio, um instrumento. É neutra. O que fazemos com a tecnologia é que a marca.
Percebo esse tipo de preocupação. E ainda bem que ela existe. Obriga-nos a sermos melhores e mais exigentes. Por isso, temos de apostar na humanização, mas sem preconceitos. E aproveitar as possibilidades abertas pela tecnologia para nos ajudar a cuidar melhor. E cuidar numa perspetiva holística. Olhando para o doente como um todo. A humanização na saúde passa por muito mais. Espaços acolhedores, acolhimento eficiente e gentil. Comunicação aberta e eficaz entre quem cuida e é cuidado. E há boas soluções tecnológicas de suporte a tudo isto. De suporte, sublinho. A tecnologia não é um fim. A humanização na saúde deve ser incluída na carteira e na contratualização de serviços. Gostaria de desenvolver trabalho nesta área.
Será que o(a) enfermeiro está a ganhar esse terreno que era do clínico? Os enfermeiros sempre estiveram mais próximos do doente. São a primeira linha de contacto e suporte. E os nossos profissionais enfermeiros estão excelentemente preparados. As escolas têm vindo a crescer, não só em número e tamanho, mas também em qualidade e rigor científico. Por isso é que existe tanta procura, no mundo inteiro, pelos enfermeiros formados em Portugal. Por isso, respondendo à sua pergunta, os enfermeiros estão a ganhar terreno. Mas um terreno que é só deles. Estão a consolidar posição. E isso porque, de facto, têm excelente formação superior e pós-graduada.
Na sua área como olha para a evolução da carreira e que peso sente que têm as mulheres? Acho que, hoje em dia, existe uma formação muito sólida, nos diferentes níveis de ensino e formação, em gestão de serviços de saúde. E isso é muito bom. Temos, em todos os níveis da prestação de cuidados e nos diferentes sectores (público, privado e social), pessoas mais capazes e com mais conhecimentos.
“A humanização na saúde deve ser incluída na carteira e na contratualização de serviços”
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GRANDE ENTREVISTA
Muitos desses quadros técnicos altamente qualificados são mulheres. Mas, como já atrás falámos, a maior parte dos líderes continua a ser do género masculino. Desde o 25 de abril, tivemos cinco ministras e oito ministros da saúde. E hoje temos uma ministra, já no segundo mandato, com menos de 50 anos. Portanto, na perspetiva de equidade e paridade, é com otimismo que olho para o futuro e para o lugar que as mulheres nele vão ocupar.
Como fica a família com a subida da mulher nos cargos de direção, da Saúde? A família fica orgulhosa, claro. A família precisa de nós. Mas precisa de nós inteiras, realizadas, corajosas, otimistas. Não podemos encher a família com as nossas preocupações, pressões e frustrações. Por isso, desde que tenhamos uma boa rede formal e informal de suporte e uma organização eficiente do trabalho, conseguimos perseguir os nossos objetivos com persistência e coragem. Vou repetir-me. Precisamos de uma boa rede formal e informal de suporte e de uma organização eficiente do trabalho. É para isto que temos, todos nós, de trabalhar. Mas como todos precisamos muito de dias de descanso e de desligar dos cargos que ocupamos nem que seja um fim de semana prolongado. Não há número e género em talento, competência, trabalho e conhecimento. Somos pessoas, apenas. Confiantes, otimistas e solidárias. E são essas emoções que temos de partilhar com as nossas diferentes equipas, em casa, no trabalho e até no bairro e na ginástica.
MARIA FILOMENA GASPAR PROFESSORA COORDENADORA ESEL
“Podemos dizer que persistem assimetrias numa área eminentemente feminina”
23 Maria Filomena Mendes Gaspar, nasceu em 1959, em Lisboa, é casada e tem dois filhos. Atualmente é professora coordenadora do ensino superior politécnico na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa ESEL – com provas públicas na área de Administração em Enfermagem. Desempenhou o cargo de Presidente da ESEL entre 2007 e 2019 e protagonizou a fusão das 4 escolas públicas de enfermagem de Lisboa em 2007. No âmbito da sua atividade de investigação, destacam-se temas como qualidade de cuidados; liderança e liderança em Enfermagem e cidadania organizacional, entre muitos outros, sendo igualmente autora de vários artigos de circulação nacional e internacional e tendo apresentado diversas comunicações e conferências em eventos nacionais e internacionais. É, desde 2016, presidente da Mesa da Assembleia Geral da Associação para o Desenvolvimento do Centro Académico de Medicina de Lisboa (AD-CAML). E desde 2008 Membro da equipa de projetos Europeus financiados: RELATE; Nurse–Lead que integram consórcios de várias universidades europeias.
As profissões da Saúde são mais vocacionadas para mulheres do que para homens? As profissões da saúde são atrativas tanto para mulheres como para homens, são aliás dos cursos superiores que tradicionalmente têm um volume de candidatos bastante superior ao número de vagas disponíveis. Embora, tenha havido sempre ao longo dos anos mais mulheres que homens nas áreas da saúde, não creio que atualmente possamos atribuir esta situação a questões de vocação, mas antes a escolhas de oportunidade num contexto de acesso aos cursos altamente competitivos. A história das profissões da saúde, nomeadamente na enfermagem, e a forma como evoluíram pode cruzarse com a tradição religiosa, tanto masculina como feminina, e aí talvez fizesse sentido falar de vocação no sentido da religiosidade associada. Hoje, como referi, penso que se tratam de questões de oportunidade, de mercado, alguma tradição familiar e o sucesso da conclusão do ensino secundário, que determinam as escolhas dos jovens.
Quando olha para o SNS, como vê a questão da feminização nos diferentes setores (medicina, enfermagem, farmácia, indústria farmacêutica, etc.)?
Na sequência do que referi não se pode obviamente escamotear que há de facto muito mais mulheres que homens na área da saúde, embora as percentagens relativas tenham vindo a sofrer algumas alterações. Por exemplo na enfermagem nas últimas 2 décadas há uma tendência de estabilização da percentagem de enfermeiros género masculino, em torno dos 20%, longe portanto de uma distribuição equilibrada. Nos dados mais recentes relativos a 2018 (Ordem dos Enfermeiros) estão registados 17,82% de enfermeiros homens para um universo de 73650 de profissionais de enfermagem. Já no caso da medicina, os homens foram maioritários até 2009, sendo que em 2010 se inverte a relação no número de homens e mulheres, passando a haver mais mulheres a exercer medicina em Portugal. De acordo com a Pordata (2018) os dados dão conta de 55,32 % médicas para 44,68 % de médicos do género masculino, num universo total de 53657 profissionais. Nas outras profissões a tendência de feminização é idêntica cerca de 20% homens para 80% de mulheres. Quando olhamos para o SNS é inquestionável a qualidade da formação de mulheres e homens na área da saúde, no que se refere a aspetos salariais, julgo que não se poder dizer que no SNS há diferenças formais e legais de carreira e salário, embora no que se refere ao acesso a posições de poder as mulheres tendam a aceder menos que os homens, naturalmente considerando o universo que representam. Quanto ao impacto desta situação ela é de algum modo um “clássico” o importante é garantir a redução das assimetrias entre mulheres e homens, melhorar este equilíbrio sobretudo em órgãos de decisão.
Sente que ao longo dos anos as mulheres têm ganho terreno neste domínio? Havendo mais mulheres do que homens nestas áreas, pensa que as lideranças estão também a seguir esse percurso (de as mulheres assumirem esses cargos) ou ao nível da cadeia hierárquica, os homens ainda dominam? Porquê? Apesar do que já referi sobre o acesso aos lugares de poder, penso que nos últimos anos há um maior equilíbrio nestas relações, no entanto ainda longe do que as diferentes proporções de mulheres e homens ditariam. Nesse sentido podemos dizer que sim, persistem assimetrias numa área eminentemente feminina. Julgo que a resposta não está propriamente na área da saúde em si mesmo como caso especial. Trata-se de uma problemática transversal à sociedade e à forma
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como os papéis de mulher e homem são percebidos pelos dirigentes, mas também pelos próprios.
Que dificuldades encontram as mulheres que lideram? Creio que as dificuldades são aquelas inerentes ao cargo e eventualmente alguma sobreposição com a multiplicidade de tarefas que as mulheres tendem a acumular. Tem havido publicação de investigação sobre liderança feminina ou melhor dizendo liderança no feminino! São estabelecidas algumas diferenças de estilo sobretudo na adequação da comunicação a ambientes diversos. Penso que mesmo que a hierarquia motivacional de mulheres e homens possa diferir, isso não significa que as mulheres não estejam também orientadas para os resultados, podem eventualmente optar por procedimentos diferentes. No entanto impõe dizer-se que a flexibilidade do comportamento dos líderes é uma das dimensões do comportamento de liderança transversalmente reconhecida em ambos os géneros e fundamental a uma liderança eficaz.
A progressão na carreira é diferente para homens e mulheres? Não é, no nosso país e nesta área em particular quando nos referimos a aspetos formais, mas sim em resultado da organização da sociedade e da divisão de papéis entre mulheres e homens como já referi.
Pensa que, de alguma forma, as mulheres têm características específicas na forma de lidar com as pessoas com doença, acabando por criar uma ligação mais “calorosa” com os utentes? Tenho sempre alguma dificuldade em categorizar e dicotomizar as diferentes abordagens com origem no género. Estamos a falar de profissões onde a comunicação e a relação são também aspetos da profissão e não do senso comum. Havendo pessoas diferentes haverá sempre abordagens diferentes no estilo de comunicação, mas não parece poder dizer-se que o estilo de comunicação das mulheres seja melhor ou pior que o dos homens. Poderá haver estilos mais eficazes numa ou noutra situação ou contexto que também resulta da interação e das preferências do “cliente”. A investigação dá conta de que as justificações
por preferência de mulheres ou homens em contexto de cuidados são basicamente as mesmas, o que difere são os contextos onde esta interação ocorre e o género dos atores envolvidos. Pelo que a forma, como coloca pode ser resultado de uma perceção que reduz o cuidado a uma essência feminina, o que na minha opinião é redutor face à complexidade da relação que se deve estabelecer entre os profissionais de saúde, mulheres ou homens e os clientes, em contextos de cuidados de saúde.
Há quem diga que a humanização na saúde tem vindo a ser substituída pelas máquinas e pela tecnologia e que o toque, o olhar, a conversa entre utente e médico (por exemplo) vai-se perdendo. Sente isso? A humanização dos cuidados de saúde é uma preocupação e uma constante nas organizações de saúde e não é de agora nem se deve exclusivamente às preocupações com a emergência tecnológica. A tecnologia cria novos interfaces, mas também resulta muitas vezes na melhoria dos cuidados e na possibilidade de salvar vidas que de outra forma não teriam essa oportunidade. Não se pode assumir sempre a relação causal de que com mais tecnologia há menos humanização! O papel da pessoa do profissional, do cuidador não é substituído; pode ser transformado, mas não substituído. Há e continuará a haver lugar para a palavra, o olhar e o toque desde que as pessoas que cuidem tenham esses valores, esses princípios e esse conhecimento. Pois também se trata de conhecimento. A relação entre as pessoas a forma como comunicam, como fazem os processos de luto, como lidam com a vida, a morte e o sofrimento pode ser ensinada e aprendida. Esse é um dos mais importantes papéis que ainstituições de ensino têm. Formar para a complexidade da pessoa e do ambiente de cuidados. Após a formação caberá às instituições e às lideranças acompanhar os profissionais ao longo do seu desenvolvimento profissional para que variáveis organizacionais como o stress e o burnout, a satisfação profissional e por exemplo a perceção de justiça organizacional não venham a determinar o afastamento defensivo de quem cuida. Porque na verdade os profissionais são pessoas que estão sujeitos a enorme pressão no seu dia a dia e precisam desenvolver e consolidar estratégias de coping
25 para lidar com esta realidade e não utilizarem a máquina ou a tecnologia como refúgio.
do ensino superior não integradas temos 4 mulheres a ocupar os lugares máximos da hierarquia.
Será que o(a) enfermeiro está a ganhar esse terreno que era do clínico?
Ou seja, de algum modo mantém-se a feminização das áreas, mas um baixo acesso a posições de poder.
Os domínios das profissões da saúde são diferentes embora com áreas de interface comuns pois todos cuidam de pessoas que deles necessitam. Não me parece que tenha que haver competição desde que cada grupo profissional haja de acordo com normas éticas o seu código profissional e deontológico.
Como fica a família com a subida da mulher nos cargos de direção, da Saúde?
Acredito e julgo que é bem mais interessante desenvolver competências de trabalho de equipa uni e multidisciplinar com formação conjunta do que competir por áreas de trabalho que são de outros. Importa, no entanto, ter a consciência que as áreas de conhecimento e de intervenção das profissões não são estáticas, evoluem e podem desenvolver-se em movimentos de maior diferenciação, e outros de aproximação e transversalidade, onde sem dúvida a “produção de cuidados” se faz com base na continuidade da abordagem de cuidados de toda a equipa que intervém junto da pessoa e não apenas de um grupo em particular. Por isso penso que há lugar para todos, sem concorrência, mas com regulação e seguramente e com novas áreas de oportunidade.
Na sua área como olha para a evolução da carreira e que peso sente que têm as mulheres? Muito peso também no ensino superior e concretamente na área da saúde há mais mulheres que homens no exercício profissional. A educação é igualmente uma área clássica de domínio feminino em termos de volume de profissionais. Mas relativamente aos cargos de reitor ou presidente são maioritariamente homens que lideram as instituições. Ao longo do tempo em que fui presidente da Escola Superior de Enfermagem de Lisboa (ESEL) havia no conjunto de instituições de ensino superior politécnico (19 instituições incluindo as instituições não integradas) eramos apenas 3 mulheres a ocupar o lugar de presidente. Hoje por exemplo em 34 instituições do ensino superior público (15 politécnicos; 15 universidades e 4 instituições
Fica bem! Se for bem gerido também o ambiente familiar não só pela mulher, mas por todos os elementos da família. Aliás é um bom exercício de colaboração e de democracia interna na família. Onde os mais jovens podem aprender com modelos transversais à sociedade e onde os lugares de direção não são atribuídos porque se é mulher ou homem, mas porque se reúnem as condições, se é competente, e se é eleito. Importa salientar que no ensino superior o acesso ao cargo de reitor ou de presidente é por eleição, sendo esse ato realizado por um colégio eleitoral (Conselho Geral) após a defesa de um programa de ação. Penso que quando os mais jovens se desenvolvem num ambiente mais igualitário “dentro de portas” é mais provável que venham a replicar modelos menos assimétricos entre homens e mulheres no futuro. Na minha experiência penso que nada, ou muito pouco, ficou por fazer na minha família por eu assumir uma posição de liderança durante alguns anos. Bem pelo contrário assumimos responsabilidades partilhadas e todos atingimos os objetivos profissionais que nos propusemos (estudos, cursos e profissões). Ainda bem que coloca essa questão pois é também o retrato das dificuldades de muitas mulheres quando têm que tomar decisões sobre se avançam ou não para posições de liderança, nomeadamente quando se trata de concurso ou de apresentar candidatura, onde claramente também estamos a falar de decisões individuais. Mas não deixa de ser curioso, que talvez não colocassem a questão exatamente assim se entrevistassem um homem, pois os “óculos” da sociedade ainda vêm mulheres e homens com atribuições diferentes perante a sociedade e a família sobretudo quando se trata de assumir os cargos mais elevados na hierarquia, e isso sim determina as assimetrias e até as perpetua.
“As áreas de conhecimento e de intervenção das profissões não são estáticas, evoluem e podem desenvolver-se em movimentos de maior diferenciação, e outros de aproximação e transversalidade”
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OPINIÃO
ANA ISABEL GOUVEIA COSTA DE FONSECA LOPES Professora Catedrática de Pediatria, Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa Diretora do Departamento de Pediatria, Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (CHULN)
A FEMINIZAÇÃO NAS PROFISSÕES EM SAÚDE. TRENDS ATUAIS
Crescente Feminização mas persistência de desigualdades? A feminização em profissões associadas à saúde (médicas, enfermeiras, farmacêuticas, nutricionistas, biólogas, delegadas de informação médica) constitui uma tendência emergente nas últimas décadas em sociedades mais afluentes, que reflete primeiramente o acesso generalizado à formação e diferenciação profissional (ensino pré e pós-graduado). De facto, a proporção de estudantes de Medicina do sexo feminino a frequentar cursos de Medicina cresceu significativamente na maioria dos países ocidentais e em Portugal (mais de 300% em três décadas). Evoluise de 1898 alunas matriculadas, em 1991 nas Faculdades de Medicina nacionais, para 8348 alunas em 2018, representando mais do que o dobro dos alunos (4056).
Presentemente, o género feminino é também dominante nos cursos e em todas as profissões associados à saúde (médicas, enfermeiras, dentistas, farmacêuticas, técnicas de diagnóstico e terapêutica e de reabilitação), mantendo-se claramente híper-representado na profissão de enfermagem (acréscimo de 2365 mulheres em 2001 para 12894 mulheres em 2018) (cerca de 5 x superior ao número de homens). A profissão médica é, ainda, uma profissão globalmente equilibrada em termos de género. As últimas décadas evidenciam, porém, uma alteração no padrão demográfico dos médicos em Portugal, com um acentuado rejuvenescimento dos profissionais e um significativo aumento da sua feminização (Estudo de Evolução Prospetiva de Médicos no Sistema Nacional de Saúde, elaborado pela Universidade de Coimbra para a Ordem dos Médicos). Por outro lado, o perfil da profissão
27 médica está em mudança, não só com o aumento da proporção de médicos do sexo feminino, mas também com mudanças nas condições de emprego, atitudes em relação à profissão e ao estilo de vida dos jovens médicos. Este cenário, generalizado e extensivo a muitos outros cursos universitários, tem suscitado intensa investigação de natureza sociológica e epidemiológica. Ao longo das décadas do século passado, as médicas tendencialmente tinham menos filhos do que os seus homólogos do sexo masculino, especializavam-se menos, optavam frequentemente por uma pausa na carreira. Hoje em dia, a maioria das médicas completa uma qualificação especial, vive um relacionamento com um parceiro e tem filhos tão frequentemente como seus colegas do sexo masculino; não interrompem a atividade após o parto embora trabalhem crescentemente a tempo parcial. Relativamente à carreira de enfermagem, a profissão mantém-se reconhecidamente “feminina” em todos os níveis, a despeito do aumento contingencial de profissionais do género masculino. Relembrando o contexto socio-histórico, a enfermagem nasceu como área profissional no seio das ordens religiosas, sendo um exercício institucional maioritariamente feminino e de índole caritativo. A evolução histórica desta como de outras áreas profissionais, trouxe a profissionalização e sub-especialização, mas o perfil de profissão predominantemente feminina tem-se mantido. Na translação do ensino para o exercício profissional, a proporção é idêntica. Embora relativamente à carreira médica os dados sejam eventualmente menos discrepantes (PORDATA 2016: 23.017 homens, versus 27.222 mulheres) a taxa de feminização global na Saúde é elevada, similarmente ao observado na administração pública, o segundo maior empregador da administração pública (cerca de 60%), de acordo com recente relatório social sobre os recursos humanos do Ministério da Saúde (2017) e dados da OCDE. Este resultado deriva sobretudo do predomínio do sexo feminino no grupo profissional dos enfermeiros (83,4% são mulheres), mas igualmente cada vez mais dos profissionais médicos - 59,1% do total no SNS. De facto, o referido relatório do Ministério da Saúde, reporta ainda que 56% das mulheres que trabalham no Serviço Nacional de Saúde têm licenciatura ou grau académico superior, sendo no universo masculino 62%. Embora esta evidência seja transversal a todas as profissões na área da saúde em todo o Mundo, curiosamente em Portugal, parece ser das mais elevadas, segundo investigação sociológica de Tiago Correia. Idêntico cenário evolutivo se tem vindo a constatar
relativamente à carreira Docente e de Investigação. De facto, segundo o Relatório da PORDATA 2018, reportando-se a dados de 2015, o número de Docentes do ensino superior em Portugal era de 18.097 Homens vs 14.483 Mulheres (2015), sendo 54% a percentagem relativa de mulheres doutoradas e 43% na carreira de Investigação. Longe irão os difíceis tempos de ascensão “a pulso” e com muitos obstáculos (da Decana da Pediatria Portuguesa e referência maior da Pediatria internacional), Professora Maria de Lurdes Levy, 2ª Mulher com Doutoramento em Medicina em Portugal e 1ª Professora Catedrática de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Apesar do acesso incontornável e generalizado ao ensino e à formação e destes dados reveladores sugerindo trends emergentes, persistem no entanto algumas desigualdades na progressão nas carreiras e no acesso às hierarquias e à liderança em diversas profissões na área da saúde (embora com grande heterogeneidade inter-institucional e inter-setorial). As mulheres ocupam ainda uma minoria de posições de liderança em saúde em todo o mundo, estimando-se que cerca de 75-80% dos estagiários, profissionais de saúde e docentes na área da saúde global sejam mulheres. A equidade de género e o empowerment das mulheres foram definidos pela Organização das Mulheres da Organização das Nações Unidas como objetivos únicos na agenda global de 2030 para o desenvolvimento sustentável. Apesar dos progressos no sentido de se alcançar este objetivo e do aumento do afluxo de mulheres à escala mundial, continuam sub-representadas, ocupando menos de um terço dos cargos de liderança e gestão, inclusivé nas profissões associadas à saúde; adicionalmente, menos de 30% dos investigadores do mundo são mulheres, publicando menos artigos científicos em média do que os investigadores do sexo masculino. No entanto, o histórico mais recente ao nível da União Europeia em muitas áreas (inclusive na constituição das equipas governamentais) e designadamente do Ministério da Saúde de Portugal, será ilustrativo de franca mudança de paradigma sóciopolítico, incluindo por exemplo, cinco ilustres Ministras da Saúde: Leonor Beleza, Maria de Belém, Manuela Arcanjo, Ana Jorge e Marta Temido.
Que determinantes? Neste contexto, importará compreender por que razão “homens e mulheres com a mesma escolaridade e diferenciação não atingem no mesmo timing idêntica posição na carreira e designadamente posições de chefia institucional. Esta continua a ser uma interessante
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OPINIÃO
área de investigação sociológica, que deverá integrar uma abordagem holística, tendo naturalmente em consideração múltiplas variáveis, incluindo as especificidades nas diferentes profissões. O efeito coorte (efeito cumulativo em gerações subsequentes resultante do acesso à educação e literacia) deveria traduzir-se em percentagens maiores de liderança em especialidades em que há maior número de mulheres. Foi até sugerido que um número mínimo de especialistas do sexo feminino (efeito “quota”) facilitaria a progressão na carreira. No entanto tal nem sempre acontece, mesmo em especialidades tradicionalmente consideradas de tendência feminina, como por exemplo a Pediatria. O sucesso feminino académico não constitui necessariamente um fator preditivo positivo de probabilidade de exercer determinada especialidade ou de atingir o cargo de chefia na carreira hospitalar ou académica. Sendo a “A maternidade e o papel da mulher como cuidadora” a explicação mais óbvia, importará identificar outros determinantes atuais susceptíveis de modulação, requerendo eventualmente uma monitorização ativa e a educação para a igualdade de género em todas as fases do ciclo de vida. A «feminização» crescente das faculdades e do meio laboral, não significa naturalmente que se tenha modificado a natureza intrínseca de ambos os géneros, mas sobretudo que, ao longo dos anos, se assistiu a um processo histórico de progressiva e irreversível queda de múltiplas barreiras. A História da Medicina e da Enfermagem no contexto ocidental ilustra magistralmente a notável persistência, espírito de missão e extraordinária determinação, que permitiu enormes conquistas das mulheres nestas áreas ao longo dos tempos; para citar apenas um exemplo, a primeira licenciada em Medicina, a inglesa Elizabeth Blackwell, tendo adquirido com elevado mérito diplomas franceses e americanos, foi imediatamente surpreendida pela British Medical Association, com a diretiva pública de que os diplomas estrangeiros não permitiriam a atividade profissional em Inglaterra [Londres, 1859]. Os princípios de desenvolvimento da carreira e os critérios de seleção académica deverão inquestionavelmente promover o mérito, mas eventualmente considerar também o potencial impacto seletivo de atitudes ditas “masculinas” (perfil de competitividade, risk-taking,…) e a relativa desvantagem das mulheres associada a maior investimento familiar, na competição para posições académicas. Recentemente, estudos em diversos países têm focado a atenção no
denominado “Glass ceiling”, relativamente à escassa representatividade ainda de mulheres em cargos de liderança, representação e reconhecimento (prémios, bolsas, publicações) no meio académico e profissional, não só na área da saúde, como nos campos da ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM), procurando identificar eventuais barreiras à respetiva progressão na carreira académica. Num centro hospitalar universitário, hierarquicamente muito estruturado, os desafios na carreira médica, a título de exemplo, são múltiplos e de elevada exigência: conciliação de atividade assistencial, formativa (ensino pré e pós-graduado), científica, investigação e de gestão, com um peso relativo muito variável e dinâmico ao longo da carreira, que é longa. Embora o número de mulheres em profissões na área da saúde e médica em particular seja crescente, o interesse das gerações mais novas em trabalhar em instituições públicas com este elevado grau de exigência, tem vindo a sofrer modificações, sobretudo face à emergência de novos cenários e modelos de trabalho (ex. hospitais privados com maior atratividade no plano profissional, financeiro e laboral, diferente exigência de diferenciação, flexibilidade de horário, menor carga horária, designadamente em serviço de urgência). Assim, instituições como os hospitais públicos com ensino universitário, embora sem discriminação explícita, pela natureza da sua estrutura hierárquica e condicionalismos laborais relativamente fixos e estereotipados, tenderão involuntariamente a condicionar em certa medida, o recrutamento, retenção e progressão da carreira das mulheres. A medicina clínica e académica são caraterizadas por intensa exigência e pressão em múltiplas frentes, designadamente para a produtividade clínica e de investigação, com a expetativa de um incondicional compromisso laboral, particularmente durante a primeira década na carreira hospitalar, docente e de investigação (“fase ascendente”). Em comparação com o papel masculino, as mulheres parecem assumir maiores responsabilidades familiares e perceber o ambiente de trabalho como menos favorável para a gestão das respetivas exigências e sua conciliação com responsabilidades familiares. Assim, resultados diferenciais de carreira para as mulheres e os homens poderão resultar em parte de maiores desafios femininos auto-assumidos na integração de funções de trabalho e vida pessoal (work-life balance). Os determinantes subjacentes à persistência da desigualdade de género na área da saúde serão
29 seguramente multifatoriais, sistémicos e complexos (diversas teorias sociológicas), envolvendo não apenas escolas médicas, hospitais e clínicas, modelos e políticas laborais e de organização de cuidados de saúde, mas todos os aspetos da sociedade e respetivos stakeholders. A metáfora “glass ceiling” tem sido usada na literatura para descrever a escassez de mulheres em posições de liderança e de tomada de decisão, apesar do respetivo aumento de “massa crítica”. Têm sido sugeridos fatores exógenos (inerentes ao ecossistema laboral/académico institucional, a par de fatores intrínsecos, verdadeiros obstáculos à progressão/liderança, e forças internas inerentes às próprias especificidades do universo feminino/masculino. Quanto aos primeiros, os mais significativos nos estudos efetuados serão diferentes oportunidades de orientação e desenvolvimento de carreira, networking e role-models, maior número de horas de atividade assistencial e menor disponibilidade para atividade científica e de investigação, com menor produção científica enfim, caraterísticas da cultura e prática organizacional.
Quanto a forças internas, a motivação intrínseca, a determinação individual, a atitude quanto ao sucesso na carreira e ao reconhecimento profissional, parecem ser muito importantes. Os valores relacionados com o sucesso académico e reconhecimento são semelhantes para os dois sexos se considerarmos a competência e qualidade de cuidados ou o relacionamento com os doentes e com os colegas. Embora os homens pareçam atribuir grande relevância à visibilidade, autonomia, oportunidades financeiras (como as que se encontram no mundo empresarial) e de liderança, reconhecimento nacional ou internacional, seria altamente redutor depreender daí que as mulheres não tenham igualmente ambição e motivação para lugares de destaque, adicionalmente ao reconhecimento pelos doentes, tutores ou pares, a nível nacional e internacional. Alguns admitem que as mulheres possam eventualmente conter melhor a frustração face às expetativas e hierarquizar prioridades com maior êxito, face às exigências competitivas entre família e profissão.
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OPINIÃO
Particular atenção tem sido dada às denominadas bias implícitas, processos mentais pré-existentes em homens e mulheres (crenças, preconceitos e comportamentos) com imprinting individual e coletivo, nem sempre na esfera do consciente e do auto-controlo.
Que desafios e oportunidades? Num cenário atual socio-cultural de rápidas e drásticas transformações e de elevada mobilidade, torna-se difícil ter uma interpretação objetiva e única dos determinantes principais desta tendência de feminização nas carreiras profissionais em saúde, de etiologia multifactorial, suas características e respetivo impacto institucional e social. Será importante caraterizar as especificidades em cada país, respetivas instituições, modelos educacionais (ensino pré e pós-graduado), modelos e cenários profissionais (pex. desaparecimento das carreiras médicas) e tendências socio-culturais emergentes em cada momento. Por exemplo, em que medida a opção e decisão de serem mães condicionará atualmente as opções de carreira das estudantes de Medicina e internas da Especialidade, à semelhança de outros jovens de outros cursos em início de carreira? A resposta poderá até ser surpreendente e refletir tendencialmente opções emergentes de estilo de vida na geração dos Millennials (geração Y), independentemente de se tratar (ou não) de uma carreira na área da saúde. Nas gerações mais jovens de médicos, a prioridade dada ao trabalho e à carreira poderá não ser tão relevante como em gerações anteriores, contemporâneas da criação e consolidação do Serviço Nacional de Saúde em Portugal. Não só as mulheres, mas também os homens, estão cada vez mais selecionando a especialidade e preferências de carreira médica com base em estilo de vida controlável com equilíbrio entre trabalho e vida pessoal (incluindo paternidade/maternidade). Como referido, uma série de possíveis obstáculos aos objetivos de carreira que se presume agirem sinergicamente incluem responsabilidades domésticas, ausência de flexibilidade nas estruturas de carreira e escassez de role-models. Apesar de tudo, mercê de vertiginosa evolução sociocultural nas últimas décadas, políticas promotoras de suporte familiar e de equidade de género e inerentes mecanismos regulatórios, “ter filhos” há muito deixou de ser o clássico “career stopper” para mulheres dedicadas a profissões na área da saúde. Apesar do passado desafiante e difícil, o presente é já em muitas circunstâncias francamente favorável e o futuro certamente muito promissor. Quanto aos fatores que
determinam a escolha, encontram-se na literatura inúmeros estudos, utilizando inquéritos a alunos de Medicina ou a internos no início da especialidade, sendo valorizado pelas alunas/futuras médicas as condições do internato, a possibilidade de trabalho em part-time, a flexibilidade de horários e a licença parental, enquanto para os alunos/médicos é sobretudo o desafio técnico, o prestígio e o potencial status económico. Em que medida outros fatores, como o desafio intelectual, o contacto com os doentes, as oportunidades académicas ou de investigação, serão igualmente determinantes? Em paralelo, assiste-se ao aparecimento de novas especialidades/sub-especialidades (como por exemplo intensivismo, cuidados paliativos, geriatria) que motivam novas dinâmicas de distribuição de homens e mulheres. Curiosamente, em Portugal nos últimos anos, quanto à escolha da especialidade médica, parece existir ainda uma distribuição relativamente idêntica pelos dois sexos quanto a medicina interna, medicina familiar e anestesiologia, uma tendência ainda francamente feminina para a pediatria e masculina para as especialidade cirúrgicas e medicina de emergência. Embora seja consensual que as oportunidades deverão ser iguais em todos os níveis e etapas da carreira, prevalecendo a meritocracia, atendendo a que a produção científica é um dos principais fatores de progressão (número de publicações, prémios e bolsas para investigação), o padrão comum de multi-tasking das mulheres poderá ser limitante. Por exemplo, tem sido reportada uma sub-representação de mulheres no topo da carreira académica (professor catedrático) no caso de determinadas especialidades com regime laboral mais intensivo (intensivistas, anestesiologistas), em detrimento de outras. Nas novas gerações serão patentes decerto menos assimetrias, maior a visibilidade pública do papel da mulher no trabalho, maior equilíbrio família/carreira. Ilustrativa desta evolução no que diz respeito à igualdade de género, será por exemplo a atribuição dos Prémios L’Oréal Portugal Mulheres na Ciência, em parceria com a FCT e Unesco, destacando que as doutoradas em Portugal já totalizam 56% versus 47% na União Europeia. Os fatores externos estão inevitavelmente a desaparecer e a alterar-se estereótipos, reconhecendo-se que a prática da medicina, o êxito e a aptidão para certas especialidades ou cargos é idêntica, resultante de qualidades profissionais e humanas, do desempenho e determinação, independentemente do género e respectivos estereótipos (inclusive de sinal contrário, igualmente redutores).
Temos de ser a mudança que queremos ver no mundo (M Gandhi) Vivemos tempos desafiantes de profundas transformações associadas à globalização. O impacto de movimentos sociais contemporâneos (#MeToo e #NiUnaMenos, entre outros), tem contribuído também decisivamente para acelerar o processo de reconfiguração do papel dos géneros na sociedade e no meio laboral em particular. Tem sido enfatizado globalmente o impacto negativo resultante da ausência de equilíbrio de género em todas as áreas profissionais. Em 2018, Christine Lagarde, como Chairman do Fundo Monetário Internacional, salientava que a dominação masculina na indústria bancária tornou mais provável a crise financeira global, e que “….if it had been Lehman Sisters rather than Lehman Brothers, the world might well look a lot different today….”. O Portal de Dados de Género do Banco Mundial contém mais de 500 indicadores sobre agenciamento, contexto socioeconómico, oportunidades económicas, educação, saúde, vida pública e tomada de decisão. Ilustrativamente, o Conjunto Mínimo de Indicadores de Género da Divisão de Estatística da ONU compreende 52 indicadores quantitativos e 11 qualitativos nos domínios das estruturas económicas e acesso a recursos, educação, saúde, vida pública, tomada de decisões e direitos humanos. Por outro lado, nos últimos anos e em particular em 2019, tem-se assistido a uma explosão de literatura científica sobre a igualdade de género na área médica (ciência, medicina e saúde global), incluindo designadamente edições dedicadas ao tema da prestigiadíssima revista Lancet. Também na área da Gastrenterologia e Hepatologia, o American College of Gastroenterology lançou uma campanha global para promoção de políticas de igualdade, diversidade e inclusão, designadamente em países em desenvolvimento. A publicação Lancet Gastroenterology & Hepatology destaca que integra atualmente no seu International Advisory Board e corpo de peer review experts, um equilíbrio de género 50–50. A nível empresarial, um relatório de 2017 da Morgan Stanley, analisou o efeito da diversidade de género nas empresas, concluindo que “maior diversidade de género, particularmente em ambientes corporativos, poderá traduzir-se em maior produtividade, maior
inovação, melhor tomada de decisões”. O campo da medicina não é diferente. Recentemente têm surgido argumentos de natureza ética, apoiando a igualdade de género na medicina, com alguma evidência de que o equilíbrio de género na atividade clínica poderá ter impacto no outcome clínico, admitindo-se o género como “putativo marcador” de outros comportamentos que poderão eventualmente estar associados a melhores resultados, naturalmente em função das áreas clínicas (normas de orientação clínica, disponibilidade de tempo para os doentes, humanização, prestação de cuidados paliativos…). No meio académico, há cerca de 10 anos, as mulheres constituíam já cerca de 30% do corpo docente de medicina académica, considerado o cut-off da massa crítica. Teoricamente, com massa crítica, cultura e apoio político à equidade de género, a evolução da docência no feminino deveria ser constatada. A evidência demonstra que algumas barreiras institucionais e o ambiente sociocultural continuam a ser obstáculos, atrasando os efeitos transformacionais. Assim, admitese atualmente que o modelo da “massa crítica” como ponto de viragem para as mulheres deverá ser abandonado, em favor dos líderes “ator crítico”, tanto mulheres como homens, que terão individual e coletivamente o compromisso e capacidade de criar culturas institucionais equitativas em termos de género, catalisando a transformação organizacional. Em síntese, as mudanças societais têm ocorrido através de sucessivas etapas individuais e institucionais, com efeito cumulativo, nas quais todos os stakeholders são e serão protagonistas, incluindo a sociedade civil e sobretudo os atores críticos extra-institucionais (líderes de fundações, organizações científicas e profissionais) e intra-institucionais (Reitores, Presidentes de Conselhos de Administração, Diretores de Faculdade, Diretores de Departamento,…). Será decerto uma questão de tempo, para que as mulheres estejam cada vez mais presentes em todos os sectores profissionais. Em todas as áreas, grandes influencers, como Zaha Hadid, a mulher de maior destaque na história da Arquitetura, primeira arquiteta a receber o Prêmio Pritzker 2004 (“… Who dares, wines…”, The Observer, 2013), continuarão a abrir caminho na aldeia global para gerações futuras.
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INOVAÇÃO
Feminização na saúde: CARLA BENEDITO Diretora Geral da Takeda Portugal
O PAPEL DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA NO INCENTIVO À DIVERSIDADE
O tema da igualdade de género nas organizações e no universo empresarial está cada vez mais na agenda de debate público, contribuindo para aumentar a sensibilidade para as disparidades que ainda existem. Apesar de, durante séculos, ter sido negado às mulheres o reconhecimento do seu talento e contributo na área da saúde, o progresso parece ter encontrado o seu espaço, contando, a meu ver, com uma forte impulsão por parte da Indústria Farmacêutica (IF). Se olharmos para a nossa realidade vemos que em Portugal, a feminização da saúde é uma tendência comprovada. O número de mulheres a trabalhar no Serviço Nacional de Saúde tem aumentado exponencialmente ao longo dos anos. Segundo o Relatório Social do Ministério da Saúde e do Serviço Nacional de Saúde (SNS)1 , a taxa de mulheres no SNS em 2018 fixou-se nos 76,5%. As enfermeiras representam claramente a grande maioria das profissionais ao serviço do Ministério da Saúde, tendo este grupo profissional uma taxa de feminização de mais de 80%. Por outro lado, há também cada vez mais médicas (60,6% são mulheres), embora a Medicina seja a área da saúde com menos mulheres. No grupo
profissional dos técnicos superiores de saúde e farmacêuticos, as mulheres continuam em maioria, alcançando este grupo uma taxa de feminização de 86,2%. Ao nível da formação, são também muitas mais as mulheres a frequentar a licenciatura, o mestrado ou o doutoramento em Medicina, Enfermagem, Ciências Farmacêuticas ou outras áreas da saúde (PORDATA2). Só em Medicina, o número de mulheres a frequentar este curso superior cresceu 340% em três décadas (PORDATA3). Para além da nossa experiência quotidiana, em que facilmente nos apercebemos do enorme contributo das profissionais de saúde e cuidadoras para a sociedade, estes números ajudam a anular qualquer dúvida que exista sobre a importância das mulheres naquela que constitui a dimensão mais fundamental para o bem-estar e qualidade de vida de uma população: a saúde. Contudo, apesar deste progresso muito significativo, continuamos a observar a baixa representação de mulheres em cargos de liderança e tomada de decisão nas empresas. Por isso é importante que não descuremos este progresso e que continuemos a acreditar e ambicionar que todas as mulheres possam
33 ser líderes na saúde e em particular na IF. Esta é a minha experiência e a minha expectativa para o futuro. E o que é que este sonho e ambição podem representar no dia-a-dia de uma mulher? Num estudo recente da Fundação Francisco Manuel dos Santos, resumido numa publicação intitulada As mulheres em Portugal, hoje4, foi avaliada a perceção das mulheres sobre a sua própria felicidade, com o objetivo de averiguar até que ponto as mulheres em Portugal se sentem “globalmente felizes e, concretamente, quão felizes estão com cada uma das facetas das suas vidas”. Os resultados indicam que “as mulheres proprietárias de um negócio ou empresa, assim como as chefes de departamento ou diretoras de um conselho de administração são, precisamente, as que se sentem mais felizes com o trabalho, mesmo admitindo as dificuldades em conciliar o trabalho pago com a vida pessoal ou familiar”. A igualdade de género tem que ser uma ambição da nossa sociedade como um todo, não só porque afecta profundamente a felicidade das mulheres, como vemos neste estudo, mas também porque beneficia o próprio tecido empresarial a vários níveis, incluindo a competitividade. Na Takeda, a energia e o potencial das nossas colaboradoras pulsa. Como poderíamos abdicar de todo este talento? Sem a presença de mulheres em cargos de tomada de decisão, a nossa capacidade de manter a competitividade e sustentabilidade ficaria por cumprir. Na Takeda, é nosso objetivo garantir que a nossa força de trabalho é tão diversa quanto os doentes e a comunidade médica que servimos. Na trilha para este objetivo consta de forma inequívoca o reconhecimento e valorização do trabalho realizado por todas as nossas colaboradoras. Neste âmbito, o Relatório de 2018 sobre Valor Sustentável da Takeda5– que apresenta todas as iniciativas desenvolvidas no âmbito do Desenvolvimento Sustentável, com base no Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU) – indica que, a nível global, a distribuição da nossa força de trabalho em termos de género é quase
igual, compondo-se por 53% de homens e 47% de mulheres. Da mesma maneira, a proporção de cargos de gestão global desempenhados por mulheres tem aumentado, atingindo em 2018 os 37% na companhia. A presença de mulheres em cargos de poder não serve apenas de exemplo, no tecido empresarial constitui por si só um agente de mudança. No estudo Retrato da Gestão e dos Gestores em Portugal6, da Informa, conclui-se que a diversidade de género aumenta em empresas lideradas por mulheres. Nestas empresas, 78% das equipas de gestão são mistas, contra 47% em empresas lideradas por homens. Na Takeda we walk the talk, o nosso management team em Portugal é composta por 55% de mulheres. Para nós isto significa que além do profissionalismo e expertise de cada um, se somam todas as características individuais, como idade, género, crenças, experiência e conhecimento, entre outras tantas, que beneficiam a companhia na tomada de decisões sobre o rumo da companhia e uma cada vez maior proximidade às necessidades que as nossas pessoas, a sociedade, os nossos parceiros e os nossos doentes sentem. Esta diversidade e riqueza que assumimos na companhia reflete-se nas nossas políticas internas e também na nossa ação externa, onde temos desenvolvido um ecossistema de inovação em saúde. Temos impacto na sociedade e respeitamos essa responsabilidade, procurando soluções inclusivas e imprimindo integridade, justiça, honestidade e perseverança em tudo o que fazemos. Melhor saúde e um futuro mais promissor continua a ser a missão que inspira todos os colaboradores e colaboradoras da Takeda Portugal. Acreditamos que todos os contributos que damos à sociedade têm de estar suportados na nossa herança e história de mais de 238 anos, a qual está assente em quatro pilares PTRB (Patient, Trust, Reputation, Business), por esta ordem específica, que resumem o valor diferencial que a Takeda tem e norteiam as nossas decisões.
Relatório Social do Ministério da Saúde e do SNS 2018. Acedido em: 30/10/2019. Disponível em: https://www.sns.gov.pt/noticias/2019/09/24/relatorio-social-do-ministerio-da-saude-e-do-sns/ 2 Base de Dados Portugal Contemporâneo (PORDATA). Acedido a 30-10-2019.. Disponível em: https://www.pordata.pt/DB/Portugal/Ambiente+ de+Consulta/Tabela 3 Base de Dados Portugal Contemporâneo (PORDATA). Acedido a 30-10-2019. Disponível em: https://www.pordata.pt/DB/Portugal/Ambiente+ de+ Consulta/Tabela 4 Laura Sagnier, Alex Morell (2019). As mulheres em Portugal, hoje. Fundação Francisco Manuel dos Santos. 5 TAKEDA PHARMACEUTICAL COMPANY LIMITED (2018). Sustainable value report 2018 - Creating value for patients around the world. Tóquio, Japão. Acedido a 30-10-2019. 6 INFORMA (2017). A Gestão em Portugal - Retrato da Gestão e dos Gestores no Tecido Empresarial Português. Acedido a 31-10-2019. 1
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INOVAÇÃO
CARLA MENDES CAMPOS Associação Portuguesa de Farmacêuticos Hospitalares (APFH)
O farmacêutico hospitalar tem acrescentado valor aos cuidados assistenciais às pessoas com VIH A Associação Portuguesa de Farmacêuticos Hospitalares (APFH) levou a cabo durante o mês de novembro (entre 20 e 23 ) o seu 12º Congresso Nacional, sob o lema Alianças Estratégicas para o Farmacêutico do Futuro. Motivo mais do que suficiente para que O Hospital ouvisse as opiniões da sua presidente, a farmacêutica Carla Mendes Campos, sobre o papel das farmácias hospitalares na luta contra a infeção por VIH. Qual o papel das farmácias hospitalares na luta contra a infeção por VIH?
garantem condições adequadas de armazenamento e distribuição; fazem intervenções farmacêuticas de necessidade, efetividade e segurança; asseguram a monitorização, reconciliação e vigilância da utilização dos medicamentos, participando na identificação e na promoção da notificação de reações adversas; desenvolvem consultas farmacêuticas; promovem a adesão; geram informação e informam o doente sobre os aspetos relacionados com a sua terapêutica e reforçando a importância das medidas de prevenção da transmissão; participam em ensaios clínicos e projetos de investigação; fazem formação pré e pós-graduada e apoiam comissões e grupos de trabalho.
Os farmacêuticos hospitalares emitem pareceres sobre a seleção e utilização de medicamentos (pareceres técnicos e validação de prescrições); identificam necessidades e solicitam a aquisição de medicamentos;
Com a chegada do teste rápido às farmácias portuguesas, acha que o papel da farmácia hospitalar pode ser esvaziado quando falamos da luta contra a infecção por VIH?
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O papel do farmacêutico hospitalar na luta conta a infeção por VIH não é de todo afetado. Pode até ser potenciado, em particular na referenciação de casos positivos e no seguimento em contexto hospitalar.
É necessária formação específica nesta área para os farmacêuticos hospitalares? A APFH tem como objetivo a promoção, desenvolvimento e a atualização das competências técnicas e científicas, acompanhando a inovação, para formar farmacêuticos hospitalares de excelência na prática clínica, investigação e ensino. Neste contexto, a formação na área do VIH, tal como outras áreas com impacto na farmácia hospitalar, tem estado presente continuamente nos planos de formação e reuniões científicas. No caso das pessoas que vivem com o VIH, a complexidade do cuidado exige ação e comunicação multidisciplinar e o conhecimento de aspetos clínicos e imunológicos, mas também de padrões de resistência vírica, reações adversas e interações medicamentosas, especificidades metabólicas e estratégias de promoção e garantia de adesão à medicação a longo termo, para além dos problemas sociais que afetam uma faixa importante dos doentes. Os farmacêuticos portugueses seguem um sistema de desenvolvimento profissional contínuo instituído pela Ordem dos Farmacêuticos, que assegura a sua preparação para o exercício da profissão nas respetivas áreas profissionais.
Como vê a situação no norte, centro e sul
do país? Ou seja, acha que os hospitais portugueses estão “equipados” ao mesmo nível para combater a infecção por VIH? Os hospitais portugueses estão munidos de farmacêuticos hospitalares capacitados para dar resposta no seu nível de intervenção nesta e noutras áreas.
Qual a importância do Movimento #Pensa PositivoTM e porque é que a APFH se junta a esta causa? O movimento Pensa Positivo aposta na prevenção desta doença, sendo que aqui anda há muito trabalho a desenvolver, através da divulgação, partilha e reforço de informação em multidisciplinaridade, permitindo que o doente se sinta integrado numa sociedade que o aceita cada vez mais.
Como avaliaria o papel das farmácias hospitalares na luta contra a infeção por VIH? A avaliação que fazemos é bastante positiva, pois, independentemente das diferenças que possam existir nas condições das unidades de saúde (infraestruturas, recursos), o farmacêutico hospitalar tem vindo a acrescentar valor aos cuidados assistenciais às pessoas com VIH: na seleção de medicamentos nas Comissões de Farmácia e Terapêutica, no acompanhamento farmacoterapêutico, quer do doente internado quer do doente em regime de ambulatório, e cuidados relacionados; na farmacovigilância, esclarecendo
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INOVAÇÃO
devidamente e informando, quer o doente quer os outros profissionais de saúde; na promoção da adesão à terapêutica, entre outros. Este ano Portugal atingiu todos os objetivos estabelecidos no programa das Nações Unidas para o combate ao VIH/SIDA, conhecido como 90/90/90: 90% dos infectados diagnosticados, 90% em tratamento, 90% com carga vírica indetectável. As farmácias hospitalares tiveram e têm tido um papel fulcral, pois para atingir estes valores é necessário que o doente cumpra a sua terapêutica, e esta é uma das nossas importantes áreas de intervenção.
As farmácias hospitalares são um porto seguro dos doentes? Os serviços farmacêuticos de todos os hospitais do país estão dotados de recursos humanos totalmente habilitados a lidar com estes doentes, detetando de forma precoce efeitos adversos dos medicamentos e avaliando de forma criteriosa o perfil farmacoterapêutico dos doentes com o auxílio de métodos complementares de diagnóstico. Quando o médico do doente precisa de decidir a melhor terapêutica a propor ao doente, os farmacêuticos hospitalares são um elemento essencial, pois são os únicos profissionais que conseguem aferir a adesão à terapêutica e desta forma contribuir para a supressão viral sustentada, minimização da taxa de resistências e propondo terapêuticas anti-retrovirais combinadas (TARVc) custo-efetivas. Esta parceria médico-farmacêutico tem-se revelado muito profícua, pois muitas vezes torna-se crucial discutir determinados assuntos em que o tempo urge e só devido a esta proximidade se consegue resolver estas questões em tempo útil. As farmácias hospitalares são o espaço, onde ao longo de várias décadas os doentes encontram profissionais que esclarecem todas as dúvidas sobre a doença e tratamentos, num ambiente com a privacidade necessária, mas que ao mesmo tempo os responsabilizam para uma correta adesão ao tratamento e contribuindo para o sucesso terapêutico, como se comprova pelo alcançar da meta 90-90-90 pela ONUSIDA em julho do corrente ano.
Quais as principais preocupações dos doentes infectados por VIH? Alguns doentes infetados por HIV têm dificuldade de acesso à terapêutica. Por outro lado, outros doentes preferem correr vários quilómetros em busca da sua medicação, por questões de privacidade e confidencialidade. Todos os doentes necessitam que a informação lhes seja transmitida de forma clara, precisam de esquemas terapêuticos simples e que os mesmos sejam bem tolerados. A questão da regularidade de fornecimento previsto, com diversas causas reconhecidas, pode afetar a vida do doente e não deixa também de ser uma preocupação não só do doente mas também dos profissionais de saúde que gere a medicação e trabalham diariamente para garantir que todos os doentes tenham acesso quando dela precisam. Qual a importância do papel do farmacêutico na adesão à terapêutica? O farmacêutico é o profissional de saúde que assiste o doente o maior número de vezes. Como tal é um profissional privilegiado para aferir como está o grau de satisfação do doente e a sua qualidade de vida, a deteção precoce de reações adversas e a monitorização da adesão ao tratamento indispensável ao sucesso terapêutico. As farmácias hospitalares, cientes das dificuldades de alguns doentes em se deslocarem aos hospitais por motivos diversos, criaram pró-ativamente mecanismos de entregas de proximidade, facilitando deste modo o acesso e aumentando o grau de satisfação dos doentes. As plataformas informáticas, a telemedicina, a inteligência artificial, a robótica e os bancos de dados são um aliado ou inimigo na geração de conhecimento? Naturalmente que depende do uso que lhes é dado, mas seguramente são aliados. Por exemplo, a partilha regulada e consentida de informação entre os profissionais de saúde, nos vários níveis de cuidados, é um requisito fundamental para a qualidade e segurança dos cuidados de saúde prestados aos cidadãos.
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INOVAÇÃO
Healthcare Excellence: AS BOAS PRÁTICAS EM SAÚDE EXISTEM FERNANDO BASTOS External Affairs and Market Access Director da AbbVie Portugal
Vivemos tempos empolgantes e altamente desafiantes no setor da saúde. Nas últimas décadas, graças à crescente aposta na prevenção, à melhoria dos cuidados de saúde e ao aparecimento de soluções terapêuticas inovadoras, vimos a esperança média de vida crescer exponencialmente e doenças que outrora eram fatais tornarem-se doenças controláveis. Conquistas extraordinárias em termos da saúde, mas que não estão isentas de desafios acrescidos para as sociedades e os sistemas de saúde. Os episódios de doença aguda mantêm-se elevados, enquanto os casos de doença crónica, esses, tendem a ser cada vez mais frequentes, fruto dos enormes progressos no tratamento de várias doenças. Hoje, são milhares os doentes crónicos que necessitam de cuidados ao longo de toda a vida, criando desafios acrescidos aos sistemas de saúde e à própria sustentabilidade desses sistemas. E a expectativa é que o número de doentes crónicos continue a crescer no futuro. O aumento da esperança média de vida foi acompanhado, como sabemos, por uma diminuição da taxa de natalidade em Portugal, o que resultou no envelhecimento da população. A este desafio
da evolução demográfica juntaram-se ainda constrangimentos financeiros nos últimos anos, fruto da crise económica que o país atravessou, que vieram dificultar o trabalho de quem gere e trabalha das unidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Como resultado, temos em mãos um dilema extraordinariamente complexo. Estamos hoje perante duas grande prioridades, à primeira vista antagónicas: por um lado, a necessidade de mais e melhores cuidados de saúde; por outro, a sustentabilidade do sistema de saúde. Como responder a tal desafio? Acreditamos, e temos até a prova, que é possível encontrar um ponto de equilíbrio e que as soluções existem. No Prémio Healthcare Excellence, iniciativa que a AbbVie promove em conjunto com a Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), temos descoberto e dado a conhecer muitas soluções alternativas implementadas nas unidades de saúde em Portugal. Soluções reais, com resultados comprovados no terreno e que permitem, simultaneamente, prestar serviços de qualidade aos utentes e preservar a sustentabilidade do nosso sistema de saúde.
39 Mas cada vez mais acreditamos que desafios maiores, como este com o qual estamos confrontados, precisam de respostas diferentes e de novas abordagens. O modelo de prestação de cuidados tal como o conhecemos poderá deixar de ser eficiente muito em breve. Face a esta realidade, temos a convicção que o caminho poderá passar pela integração dos cuidados de saúde e na participação de todas as partes interessadas: autoridades nacionais, unidades de saúde, mas também instituições de solidariedade social, associações de doentes e comunidades locais. Todos devem fazer parte da solução, numa perspetiva mais holística da Saúde. Tendo isso em mente, também o Healthcare Excellence mudou. O Prémio foi criado em 2014 com o objetivo de distinguir projetos de melhoria da qualidade dos serviços prestados aos utentes que tenham produzido uma melhoria do acesso, da eficiência, da segurança, ou dos resultados obtidos nas unidades de saúde. Este ano, pela primeira vez em seis edições, decidimos alargar o âmbito da iniciativa e abrir as portas do concurso a outras organizações, nomeadamente a associações de solidariedade social. E foi precisamente uma dessas associações que venceu a 6ª. edição do Prémio Healthcare Excellence: a Aldeias Humanitar. Uma organização que nasceu no interior do país, no distrito de Viseu, numa realidade fortemente impactada pelo envelhecimento da população e a desertificação humana. O projeto pretende combater o abandono através da integração de cuidados de saúde e apoio social, mobilizando os vários recursos já existentes no terreno. Uma ideia aparentemente simples, mas com ganhos extraordinários para a população alvo e a comunidade no seu todo e que não poderia ter encontrado melhor nome. Pois o que este projeto faz, e muito bem, é humanizar a prestação de cuidados de saúde. O projeto das Aldeias Humanitar convenceu o júri do Prémio Healthcare Excellence precisamente por esta abordagem holística e abrangente da saúde. Mas também pelo seu carácter inovador, pela qualidade da apresentação feita na cerimónia final e, claro, pela sua replicabilidade. A esperança das Aldeias Humanitar, e a nossa, é que este modelo possa ser reproduzido
em outros territórios nacionais, marcados por estes mesmos problemas de isolamento e abandono. Se a APAH e a AbbVie promovem o Healthcare Excellence é por condiderarem fundamental dar a conhecer, premiar e, principalmente, incentivar a propagação das boas práticas em saúde. Se os bons exemplos existem e podem dar respostas a problemas comuns, o nosso desejo é que possam sejam replicados onde fizer sentido. Muitas destes exemplos são até ideias relativamente simples, fáceis de adaptar e que exigem pouco ou nenhum investimento financeiro, mas com enormes ganhos em saúde. É caso das duas menções honrosas entregues este ano. O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (Hospital de Santa Maria) recebeu a primeira menção honrosa pelo seu projeto de microeliminação da hepatite C, que tem levado os cuidados de saúde do hospital para a comunidade. Já o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (Hospital Dona Estefânia) foi distinguido com a segunda menção honrosa pelo seu projeto “Huddle Meeting”, que consiste numa reunião multidisciplinar semanal que tem permitido melhorar o fluxo de trabalho do bloco operatório. Estes três projetos são exemplos claros de resiliência e inovação, mesmo em tempos marcados por grandes constrangimentos. Mas o caminho para a sustentabilidade e para a melhoria dos cuidados não pode fazer-se apenas por via do esforço das instituições e das suas equipas. É também necessário um maior investimento em saúde. Só investindo mais e criando sinergias conseguiremos proteger o nosso sistema de saúde e garantir cuidados de qualidade a todos os portugueses no futuro. Uma vez mais, queremos felicitar todos os projetos finalistas apresentados na cerimónia final da 6ª. edição do Prémio Healthcare Excellence, que decorreu no passado dia 18 de outubro, no antigo edifício do Hospital de S. Marcos, na cidade de Braga. São a prova viva da excelência da saúde em Portugal. O nosso profundo desejo é que os projetos se consolidem no futuro, que possam ganhar nova vida em outras instituições e que muitas outras ideias possam emergir.
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APDH
ARTE DE SABER COMUNICAR EM SAÚDE A Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar (APDH) realizou em julho de 2019 mais uma edição do Media Training dirigida à Alta Direção de Unidades de Saúde, em parceria com a Alter Ego e o apoio da Novartis. Perante os atuais desafios mediáticos, que implicam uma grande exposição das organizações de saúde ao público em geral, mostra-se fundamental promover a valorização e capacitação das competências no relacionamento dos altos dirigentes de unidades de saúde com os diferentes órgãos de comunicação social. Em resposta a esta realidade, a APDH, através da formação Media Training, pretende assim dotar os seus participantes de competências no relacionamento com os media, pela simulação de entrevistas em contexto real e aprendizagem dos principais conteúdos relacionados com estas dinâmicas. Foram realizadas, em 2019, duas sessões, no Porto (5 de julho) e uma em Lisboa (12 de julho), cujo sucesso foi reconhecido por todos seus participantes. No final, procurámos auscultar todos os profissionais que participaram nestas iniciativas, tendo recolhido alguns testemunhos que destacam a importância de Saber Comunicar em Saúde, bem como evidenciam as mais-valias do Media Training e a sua pertinência para a prática profissional.
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ANA INFANTE
Presidente do Conselho de Administração do Hospital Distrital de Santarém
Esta formação foi extremamente importante e necessária às funções que desempenho. Essencialmente prática, só considero que talvez fosse mais vantajosa realizada em 2 dias. Formação altamente recomendada a quem desempenha funções de representação, pois fornece os instrumentos imprescindíveis a quem necessita de dar informação aos media.
ANA PAULA HARFOUCHE Assessora do Conselho Diretivo da ARS Lisboa e Vale do Tejo
A pertinência da Sessão Media Training é crucial num mundo cada vez mais veloz e polarizado, em que a nossa capacidade de perceção carece de factos que contribuam
para a compreensão do mesmo. A abordagem metodológica para uma comunicação eficaz foi a “Joia da Coroa” deste dia de trabalho, totalmente pedagógico e com uma componente didática substancial, o que permitiu ajustamentos na substância e na forma como cada um comunicava ex-ante, dotando os participantes, assim, com instrumentos fundamentais para a sua competência comunicacional. Num tempo em que o tempo conta, passar a mensagem para que o recetor a percecione com o tempo e o modo pretendida pelo emissor é um desafio que deve ser treinado, na substância dos conteúdos, que se pretendem simples, concretos, percetíveis, sem adjetivações e associados a palavras-chaves que sejam compreensíveis, isto é, o seu modo. Sinteticamente saber escolher as palavras que contam e as ideias que contam, carece de treino regular, para o desenvolvimento eficaz da competência comunicacional. Um desafio permanente dos profissionais num tempo que conta.
BEATRIZ DUARTE BORGES Vogal do Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde de Matosinhos
Quando fui convidada para frequentar a formação em Media Training, não imaginava o quão fascinante a mesma seria.
Estava na expetativa de entrar num auditório repleto de formandos com um ou mais formadores que debitariam, num dia inteiro, um conjunto de conceitos teóricos projetados num qualquer PowerPoint®. Quando cheguei, fui logo surpreendida pelo tipo e dimensão da sala, respetiva disposição das cadeiras, simpatia e afabilidade dos formadores da organização da APDH... Esta ação de formação é essencialmente prática, aproxima os formandos ao abordar temas comuns ao dia-a-dia das instituições de saúde onde trabalham e, acima de tudo, abre os horizontes de todos para uma realidade que a maioria desconhece. A importância de saber comunicar, sobretudo em situações de crise, é um dos temas principais desta formação. É explicado como falar e se relacionar com os media, alertando para as características do setor da comunicação, de forma a tornar esta relação, tantas vezes conflituosa e tortuosa, mais empática. Mas, sem dúvida, o ponto alto desta formação é a simulação de entrevistas, cujo tema se desconhece de início, num estúdio televisivo. Naquele momento, todas as ideias transmitidas anteriormente deveriam ser postas em prática. Neste ambiente, temos de lidar com a ansiedade e o nervosismo da exposição, do cenário, das luzes, do calor, do frente a frente com um jornalista, a par de uma interpretação rápida do caso que nos pedem para comentar e explicar e da respetiva resposta. A análise conjunta da entrevista, através da visualização das imagens logo de seguida, ajudanos a perceber de imediato as nossas características (muitas das quais que até então desconhecíamos!) e aspetos que deveremos corrigir. Posso assim dizer que esta formação foi uma agradável surpresa para mim e de uma enorme utilidade para a função de membro de um Conselho de Administração. A gestão da comunicação, externa e
42 também interna, de uma instituição, sobretudo na área da saúde, é crucial neste tipo de cargos. Temos de assegurar que a nossa mensagem chega aos diversos destinatários, sem ruídos e sem margem para mal-entendidos e, acima de tudo, que a imagem da nossa instituição não é afetada. Por isso, todos aqueles que pela sua função ou pelo seu cargo tenham de saber comunicar deveriam obrigatoriamente frequentar este curso. Por um lado, pela sua vertente prática de ajuda na antecipação e resolução de problemas ou de transmissão da mensagem que queremos passar. Por outro lado, na sua vertente de aquisição de competências e de desenvolvimento pessoal. Não posso, por isso, deixar de agradecer à APDH a oportunidade de todos os anos, disponibilizar esta formação aos seus associados e não só.
da comunicação e a aprendizagem de temas relativos a comunicação verbal e corporal. Ou seja, ensinamentos muito relevantes para o meu contexto profissional atual, designadamente em situações de crise mediática, mas de igual forma para a vida em geral, pelo acréscimo de competências em comunicação que o curso fomenta. Por estes motivos, recomendo a formação a todos os que têm responsabilidades de gestão em saúde, sem dúvida o tema mais mediático da atualidade.
como se apresentaram e a forma como conduziram a formação foi totalmente diferente entre eles. Mas uma característica comum a todos, embora uns mais que outros, foi a frieza com que fomos confrontados com a realidade. Não sei se essa frieza é uma técnica de comunicação para atrair a atenção dos ouvintes, mas, seja como for, comigo resultou e, desde o primeiro minuto, estive atento e empenhado no que foi transmitido. Acho que aprendi bastante pelo que seria interessante que houvesse mais formações deste tipo para evoluir e/ou reciclar o que foi aprendido. Claro que recomendo a todos os profissionais de saúde, principalmente aos que ocupam lugares de responsabilidade/chefia, até porque nós temos, normalmente, uma maneira mais “romântica” de ver estas questões e, por isso, podemos sair prejudicados nos “encontros” com a comunicação social.
HÉLDER TRIGO Diretor Clínico do Hospital da Senhora da Oliveira Guimarães
ELSA BAIÃO Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Oeste
Foi um privilégio participar na sessão de Media Training, promovida pela APDH! De salientar a experiência na área da comunicação em saúde e dinâmica dos formadores. Destaco ainda o formato da ação, com uma componente teórico-prática, que permitiu aos formandos um treino comportamental, relevante certamente para potenciar a eficácia
Tive oportunidade de participar, no dia 5 de julho de 2019, numa Sessão de Media Training, patrocinada pela APDH, que decorreu na Universidade Fernando Pessoa, no Porto. Em primeiro lugar quero dizer que as minhas espectativas para esse evento foram largamente excedidas. Apesar de já saber da importância da comunicação social, principalmente na saúde, consegui compreender a mais-valia que é estar um pouco dentro dos meandros desse poder que, cada vez mais, representa a comunicação social. Tivemos 3 formadores, todos eles jornalistas conhecidos e reconhecidos pela sua competência e experiência em várias áreas. Foi muito interessante porque a maneira de ser, a maneira
MANUELA MOTA DUARTE Vogal do Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde do Alto Minho
Participei no curso de Media training com a ideia de que este seria um dia diferente, fora da rotina das unidades prestadoras de cuidados de saúde. Esta ideia resultava da partilha dos relatos de anteriores participantes no evento. Afinal, revelou-se um dia espetacular, em primeiro lugar porque mostrou o funcionamento, por dentro, dos órgãos de comunicação social,
43 pelo testemunho dos profissionais que, em cada dia, fazem noticias e investigação em Portugal. Depois porque me alertou as especificidades do funcionamento deste setor, com relatos e testemunhos vividos pelos jornalistas participantes. Por ultimo, porque mudou a minha perceção sobre os órgãos de comunicação social e do seu relacionamento com o setor da Saúde. Recomendo este curso a todos os que o puderem frequentar, porque é desafiante para o participante, sobretudo no contexto de simulação de uma entrevista em estúdio, uma oportunidade para aprender algumas normas de relacionamento com os profissionais da comunicação social e sobretudo, saber como potenciar as unidades de saúde que dirigimos, neste tempo em que a imagem é omnipresente nas nossas vidas.
• o porquê da pressão jornalística, os timings dos media. Se recomendaria esta formação aos meus pares? Claro que sim. A preparação para o contacto com os jornalistas permite-nos, pelo menos tentar transmitir a nossa mensagem, evitando divagações e especulações sobre situações que não são verdadeiras e podem denegrir a instituição que dirigimos
ROSÁRIO REIS Vogal Executiva do Conselho de Administração do Instituto Português de Oncologia de Coimbra Francisco Gentil
MARGARIDA ORNELAS Presidente do Conselho de Administração do Instituto Português de Oncologia de Coimbra Francisco Gentil
MARIA PAULA BRANCO Enfermeira Diretora do Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil
Da minha participação na Sessão Media Training, destaco como essencial a aprendizagem sobre: • a importância de dar visibilidade à instituição, não esperando só que os media venham questionar o que surge por denuncia; • o que fazer e não fazer perante um jornalista;
suas expectativas e dos bastidores do jornalismo.
Considero que a participação na Sessão Media Training me conferiu uma importante ferramenta de comunicação. Atendendo às atuais responsabilidades que detenho no Conselho de Administração, conhecer as regras base para comunicar com os jornalistas, sabendo como preparar uma entrevista, nomeadamente em situações difíceis ou de crise, traduzse numa enorme mais-valia. Destaco o exercício prático de simulação com filmagem e visualização de entrevista na televisão que permitiu identificar os pontos fortes e fracos da entrevista. Recomendaria esta sessão por duas principais razões: permite um melhor conhecimento pessoal, conferindo competências na área da comunicação e permite, ainda, um melhor conhecimento na interação com os jornalistas, das
O curso de Media Training, realizado a convite da APDH, constituiu uma grande oportunidade de aprendizagem numa área em que não possuía nenhuma formação. É uma experiência enriquecedora que auxilia muitíssimo. Demonstra a realidade nua e crua dos media e a forma de relacionamento com o designado quarto poder. Recomendaria claramente este curso a outros colegas, sem dúvida que sim. O curso de Media Training é uma importantíssima ferramenta de trabalho. O ambiente em que se desenvolve a formação é descontraído e estabelecem-se laços especiais de proximidade com os outros formandos, em consequência da forma despretensiosa com que os conteúdos são abordados. Os formadores têm uma atitude muito pedagógica e incentivadora, fornecendo dicas muito práticas e úteis de como lidar com as situações. Falar a verdade, lamentar quaisquer danos causados e fornecer três mensagens positivas são ideias chave simples de apreender (embora difíceis de concretizar na prática), que não esquecerei.
L I L L Y
A
I N O V A R
P E L A
CIÊNCIA Vivemos numa era fantástica para a medicina. Na Lilly, utilizamos a inovação na ciência para satisfazer as necessidades médicas nas áreas da diabetes, oncologia, imunologia, doenças neurodegenerativas e da dor. Estamos empenhados em utilizar os avanços mais recentes da ciência para melhorar a vida das pessoas em todo o mundo.
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Lilly Portugal - Produtos Farmacêuticos, Lda. Torre Ocidente, Rua Galileu Galilei, n.º 2, Piso 7, Fração A/D, 1500-392 Lisboa. Matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Cascais, sob o número único de matrícula e de pessoa coletiva 500165602. Sociedade por quotas com o capital social de €1.650.000,00.