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Economia Circular
A ECONOMIA CIRCULAR NO SECTOR DA CONSTRUÇÃO
por José de Matos, Secretário Geral da APCMC (Associação Portuguesa dos Comerciantes de Materiais de Construção)
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O tema da Economia Circular tem vindo a assumir uma importância crescente no desenho das políticas comunitárias e nacionais, começando, paulatinamente, a moldar os programas na área ambiental e as medidas dirigidas, quer aos estados, quer às empresas. Se é verdade que nenhum sector está excluído, há alguns, que, pela natureza e volume dos recursos naturais que utilizam, estão na linha da frente das preocupações e constituem uma prioridade de intervenção. À cabeça, encontramos a construção e os edifícios, quer pelo impacto na paisagem, quer pelo volume de materiais envolvidos e pela energia consumida nos processos industriais a montante e também na sua manutenção e na própria utilização ao longo da sua vida útil, para não falar do problema da demolição e dos resíduos gerados nas diversas fases. Isto significa que, para além da adaptação que todas as atividades e empresas já estão a ter que fazer em obediência ao novo paradigma da transição de uma economia linear para uma economia circular, aqueles que estão nas várias fileiras ligadas à construção vão ter que fazer um esforço ainda maior nas vertentes da eficiência de recursos, eficiência energética, durabilidade, reutilização de produtos e materiais, ou na sua reciclagem. Este é um caminho que só pode ser perseguido de forma solidária entre todos os agentes económicos do sector, quer sejam industriais, projetistas, distribuidores ou construtores.
E não nos enganemos. Não há como passar despercebido. Quem não colaborar ou pensar que não lhe toca, sentirá rapidamente as consequências, seja em termos regulamentares (proibições), ou fiscais (fiscalidade verde), ou mesmo, mas não menos importante, de reputação, a qual constitui já hoje um valor reconhecido pelo mercado, seja pelo lado das preferências dos consumidores, seja, como consequência, pelo lado do rating financeiro ou de investimento pelos acionistas, que se afastam das empresas que consideram ter uma estratégia perdedora, não alinhada com os valores da sociedade. Todos os dias surgem mais instituições financeiras a incluir os critérios ambientais no conceito de crédito… As formas como os princípios da circularidade irão ser aplicados podem ser e serão, naturalmente, muito diversas, variando de produtos para produto e, mesmo aí, haverá certamente diferentes soluções e estratégias. Todavia, todas elas irão implicar uma análise exaustiva e rigorosa de ciclo de vida, promovendo em cada fase uma maior eficiência energética e de uso de recursos materiais, a maior durabilidade e a reutilização, ou no limite, a reciclagem e a redução ao limite dos resíduos gerados. Estes princípios aplicar-se-ão a cada produto per si, mas também às obras e, em particular, aos edifícios e suas componentes, o que irá implicar o recurso a soluções e siste-
Secretário Geral da APCMC José de Matos -
mas construtivos de base industrial, com mais pré-fabricação e montagem de partes de edifícios em ambiente do tipo fabril, com recurso a maquinaria, em ambiente controlado. Estas alterações requerem substanciais inovações ao nível do design de produtos e a criação de soluções que facilitem não só o processo industrial e o transporte das partes de edifícios para a obra e montagem no local, mas também a sua manutenção, renovação e substituição durante a respetiva vida útil e a posterior desconstrução e reutilização. Por exemplo, no caso da cerâmica plana, poderíamos, hipoteticamente, criar soluções de colagem que pudessem ser revertidas sem danificar as peças, ou montagem das peças em painéis, sem cola, através de sistemas de encaixe ou em caixilho que permitissem a sua desmontagem, ou mesmo soluções mistas. Ou, para facilitar o transporte de partes de edifício, da fábrica para a obra, usar soluções mais ligeiras, assentes em produtos de menor espessura e leves. Há certamente muitas outras formas de abordar o problema e, agora na perspetiva dos distribuidores, elas irão determinar alterações importantes, seja no domínio do mix de produtos e de serviços, quer da logística e da venda, mas também da relação com o cliente (novos tipos de clientes, diferentes exigências de serviço) e até a criação de novas áreas de negócio como, por exemplo, a compra de produtos resultantes da desconstrução, substituição ou desmontagem. Estamos perante importantes desafios tecnológicos e de processos, mas também ao nível das competências dos profissionais envolvidos, incluindo os projetistas, mas sobretudo daqueles que deverão substituir as tarefas tradicionalmente realizadas em obra. Há uma nova economia que espreita a oportunidade e novos tipos de empresas que deverão emergir para preencher os requisitos de uma atividade assente em funções substancialmente diferentes das atuais. Pergunta-se frequentemente se esta transição não acarretará mais custos, eventualmente insuportáveis, para o setor industrial e para o próprio produto da construção. A resposta é obviamente afirmativa. Não há mudanças desta natureza sem custos associados, especialmente os que resultam de obrigar a “deitar fora” uma boa parte dos ativos em capital fixo que ainda poderiam continuar a sustentar a criação de valor por alguns anos, mas também porque vai ser preciso fazer investimentos avultados e desenvolver novas metodologias e processos, bem como uma nova logística, que levarão tempo a atingir os níveis de eficiência pretendidos. Mas também há benefícios óbvios que podem rapidamente suplantar os custos referidos, que vão muito para além dos de caráter ambiental. Desde logo, podemos esperar uma efetiva redução de custos com energia e com recursos materiais, para além dos custos com mão de obra, cada vez mais escassa, que continuam a subir mais do que quaisquer outros. Será naturalmente mais fácil recrutar pessoas com mais qualificações (e diferentes), para trabalhar num meio mais protegido e confortável, em processos que asseguram uma produtividade muito superior do trabalho e que por isso mesmo poderão ser melhor remuneradas. Ao mesmo tempo os custos e os desperdícios de recursos materiais serão drasticamente reduzidos (menos 30%), ao mesmo tempo que as obras alcançarão melhores níveis de desempenho energético, durabilidade e conforto. Tudo contabilizado, é bem possível que, uma vez amortizados os investimentos iniciais, ou no caso de haver escala suficiente, o produto final da construção, possa ficar mesmo mais barato, mesmo sem contar com o potencial de valorização dos produtos por reutilização após a sua desconstrução. O tema da escala é, em nossa opinião, decisivo para justificar que todos os agentes da fileira possam enveredar rapidamente por soluções do tipo referido. A “bazuca” poderia ser uma boa oportunidade para lançar obras com estes requisitos e para apoiar os investimentos a realizar pelas empresas dos setores industriais e da construção. Uma nota final para salientar a importância da cooperação entre os diversos agentes da fileira, em especial entre fabricantes, distribuidores e construtores/aplicadores, para a realização dos objetivos da economia circular na construção e para o papel essencial da informação técnica e da formação dos profissionais. Na verdade, estamos perante o tipo de mudança em que a evolução tecnológica assumirá a breve prazo um caráter tipicamente industrial, com um crescendo de exigência em toda a cadeia de fornecimento, incluindo a aceleração da digitalização dos vários processos e da informação relativa aos produtos envolvidos. Construir este novo ecossistema será tanto mais fácil e benéfico quanto maior for o nível de confiança entre os diferentes parceiros e a sua capacidade para estabelecer plataformas comuns, ou, no mínimo, compatíveis e convergentes, respeitando o papel de cada um e favorecendo a criação de valor.
CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL, O PAPEL DO CLUSTER AEC – ARQUITETURA, ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO
por Rita Moura, Presidente PTPC / Cluster AEC / Built CoL
Como preâmbulo e, apesar da Construção Sustentável se aplicar à indústria da construção civil em geral, dado o âmbito da publicação, irei contextualizar o artigo no que se refere à indústria da construção leve, associada à construção de edifícios e empreendimentos imobiliários. Não abordarei o tema da indústria da construção pesada, associada à construção de infraestruturas. O Setor da Construção tem uma importância fundamental na mitigação das alterações climáticas e aqui sublinharia os seguintes aspetos:
• A Construção é o principal consumidor de recursos naturais e energéticos; • Cerca de 40 % dos resíduos provêm da construção; • É responsável, direta ou indiretamente, por cerca de 40% de emissão de gases com efeitos de estufa; • Os cidadãos passam, em média, 90% do seu tempo dentro de edifícios.
Por esta razão, o Pacto Ecológico Europeu (Green Deal) é muito focado na necessidade de renovar edifícios, promovendo a eficiência energética, e na redução do consumo de recursos naturais, que são empregues de forma tão intensiva pela indústria da construção e na utilização de materiais e tecnologias sustentáveis. Conforme definido no Pacto Setorial do Setor AEC (assinado com o Ministério da Economia), o Cluster AEC tem como missão “melhorar as condições para o investimento nacional, de modo a garantir a captação de projetos estruturantes para Portugal”. No Plano de Resiliência e Recuperação apresentado para Portugal, cerca de 40% dos investimentos são em construção. As soluções que estão a ser desenvolvidas pela indústria da construção no domínio da sustentabilidade podem agrupar-se nas seguintes áreas:
• Circularidade e Reciclagem – Pensando a médio-longo prazo, o mais importante é a prevenção na geração de Resíduos da Construção e
Presidente PTPC / Cluster AEC / Built CoL Rita Moura -
Demolição. Na fase de projeto, as construções deverão ser concebidas de forma modular, com os elementos de construção devidamente classificados em modelos BIM (Building Information Modeling), de modo a poderem ser rastreados, durante o ciclo de vida da obra, e reaproveitados depois da desconstrução. Aquilo que hoje é modular, amanhã será circular. A curto-médio prazo, reciclar materiais de construções existentes (em fim de vida) e reutilizar em novas construções. • Soluções Baseadas na Natureza – Coberturas verdes com múltiplas-funções de isolamento, estéticas, produção de alimentos, melhoria da qualidade do ar, aproveitamento de águas pluviais, preservação da biodiversidade. Utilização de materiais naturais pouco processados na construção. • Manufatura Aditiva – Otimização na utilização de recursos materiais, sem desperdícios e permitindo a incorporação de materiais reciclados. Para além da grande vantagem, em termos da flexibilidade criativa do projeto e na escolha das formas arquitetónicas e estruturais, que permitem a otimização na utilização dos recursos materiais, uma vez que possibilita a colocação do material nas zonas estritamente necessárias. • Indústria Digital – A construção tem um gap de produtividade em relação às outras indústrias, sendo 1,7 vezes menos eficiente, fruto de algum conservadorismo e de o produto da construção ser um objeto único executado “in situ” e não em fábrica. O BIM é um ponto de viragem, reconhecido como o maior driver de mudança que ocorreu no Setor AEC. A adoção da metodologia BIM (Building Information
Modeling) promove o aumento de produtividade, sendo de esperar uma redução do custo da construção de cerca de 30%. O BIM é a base, na qual se processa a transformação industrial do Setor, com adoção da tecnologia da Indústria 4.0. O BIM é também a base para a implementação da Circularidade na Construção, com a identificação e a rastreabilidade de todos os componentes da construção. O futuro do BIM é a sua massificação, o seu uso generalizado, não só pelo Setor AEC, mas também por outros intervenientes, uma vez que o ambiente construído tem um enorme potencial de captação de dados que interessam a todas as áreas económicas e sociais.
De todas estas áreas, a Economia Circular aplicada à indústria da construção (Construção Circular) é o tema mais difícil que se coloca ao Setor da Arquitetura, Engenharia e Construção (AEC). Em relação à eficiência energética e conforto térmico e às tecnologias que existem, o custo da energia é muito elevado, justificando este tipo de intervenções. Há apenas que encontrar modelos de negócio que respondam às necessidades do mercado e implementar essas soluções. O mesmo se pode dizer em relação às soluções baseadas na Natureza, acrescendo aqui os aspetos de conforto visual, estético e a apetência do mercado por este tipo de soluções. Na transformação digital e industrial, há um caminho das pedras a percorrer, mas a indústria consegue vislumbrar ganhos diretos em produtividade, dos quais as entidades públicas e privadas também irão beneficiar, por isso vai acontecer. A Economia Circular aplicada à indústria da construção (Construção Circular) é um tema difícil, pela sua dimensão, e as metas estabelecidas neste domínio são muito exigentes e, nas circunstâncias atuais, a equação de viabilidade económica está por resolver. Este é também um grande desafio, que se coloca à sociedade em geral e, em particular, às entidades públicas e aos investidores responsáveis, e, estou certa, terão que colocar o custo do impacto ambiental nas suas escolhas.
Existem iniciativas conjuntas que, a meu ver, haveria o maior interesse em explorar, conjuntamente com as Indústrias de Cerâmica e Cristalaria e o Setor AEC, não só nas áreas que mencionei, mas também na vertente do Prestígio e da Marca Portugal. Os produtos cerâmicos Portugueses têm uma qualidade e reconhecimento de excelência internacional e muito contribuído para acrescentar valor ao Setor da Arquitetura, Engenharia e Construção Portuguesas. A PTPC / Cluster AEC tem neste momento a decorrer um processo de candidaturas do Projeto PRESTIGE AEC (ver site https://www.ptpc.pt), ao qual também poderão concorrer e seria muito interessante contarmos com o prestígio dos produtos cerâmicos Portugueses nesta iniciativa.
A PTPC / Cluster AEC tem um portfólio significativo de iniciativas e projetos na área da construção sustentável, dos quais destaco alguns que se encontram atualmente em curso. O Laboratório Colaborativo Built CoLAB, que dispõe neste momento de uma equipa de excelência de cerca de 20 quadros altamente qualificados, 100% dedicados ao estudo e desenvolvimento do Ambiente Construído do Futuro, em que uma das áreas de atuação é a análise de ciclo de vida dos empreendimentos (LCA) e construção circular. O projeto Future of Construction, que irá desenvolver a Estratégia de Qualificação Setorial 2030, sendo uma dos vetores estratégicos é o de Promover a neutralidade carbónica e a economia circular, nomeadamente o lançamento da Agenda Setorial para a Neutralidade Carbónica e o desenvolvimento do guia metodológico (AEC Carbon Handprint). O Projeto PAQ Green que visa melhorar a competitividade das PME´s através da qualificação do setor para o desenvolvimento de eco-inovações que permitam novos modelos, produtos e serviços que antecipem e respondam às exigências futuras, privadas e públicas, relacionadas com uma gestão holística e sustentável das atividades económicas, nomeadamente a visão do Pacto Ecológico Europeu (Green Deal). O Projeto Europeu Towards Green Transition Facility, que irá habilitar o Cluster AEC, para apoiar os seus associados na transição verde e a adaptação dos seus processos e atividades no âmbito dos requisitos do Plano Nacional de Energia e Clima 2021 – 2030 e do European Green Deal, aumentando a sua eficiência e competitividade, a nível nacional e internacional. A PTPC faz também parte do consórcio internacional que está a desenvolver o Projeto METABUILDING, um Projeto Europeu de apoio e financiamento às PMEs do Setor AEC, ao abrigo do Programa Horizonte 2020. O projeto METABUILDING visa impulsionar precisamente a Inovação das PMEs, incentivando a colaboração Intersectorial e também Transfronteiriça.
AS EMPRESAS CERÂMICAS E A TRANSIÇÃO PARA UMA ECONOMIA+CIRCULAR
por Sílvia Machado , Assessora Senior Ambiente&Clima, CIP-Confederação Empresarial de Portugal
A Cerâmica é naturalmente um dos setores em foco no projeto ECONOMIA + CIRCULAR, um projeto da CIP – Confederação Empresarial de Portugal dedicado à promoção da circularidade através da adoção de métricas para melhor identificação das oportunidades de melhoria. Sendo a Cerâmica um setor consumidor intensivo de energia, a sua maior contribuição para a descarbonização da economia, na fase de produção, será, sobretudo, através da implementação de medidas de eficiência material, além de eficiência energética, da adoção de estratégias de conceção sustentável de produtos e conversão de processos ou modelos de negócio, onde for possível. As simbioses e as partilhas estão na base das medidas potencialmente mais eficazes. São exemplo disso a utilização de subprodutos ou resíduos de outros setores, em substituição de matérias-primas virgens, assim como a recondução dos desperdícios do processo cerâmico para incorporação em outros processos/setores como a produção de outros produtos de construção. Relativamente a partilhas, a contribuição para uma ECONOMIA + CIRCULAR pode decorrer da simples partilha de espaço, equipamentos ou serviços (ex. manutenção), mas pode também funcionar no aprovisionamento ou na logística e distribuição. A proximidade é obviamente um plus em termos de partilhas e também simbioses, e, como tal, a agilização e melhoria do funcionamento das áreas industriais ou empresariais poderia ser um fator potenciador. Fundamental também é o apoio da administração nos procedimentos e enquadramento legal favoráveis a soluções que, embora não tradicionais, comprovem ser mais sustentáveis. Foi precisamente na procura de conhecimento sobre o que já se faz, e a discussão e resolução do que são os entraves encontrados pelas empresas no avanço em termos de circularidade, que nasceu o projeto ECONOMIA + CIRCULAR (E+C), promovido pela CIP com toda a sua rede associativa e com o apoio da consultora EY-Parthenon. Uma iniciativa que pretende apoiar as empresas na integração de indicadores de circularidade nos seus sistemas de gestão e, consequentemente, promover uma maior sensibilização e implementação de boas práticas, assim como estimular o desenvolvimento de novas medidas e ações. O E+C, lançado em fevereiro de 2021, por ocasião da Conferência “Por uma Europa Verde: o contributo das Empresas Portuguesas”, permitirá a caracterização do nível de circularidade atual nas empresas nacionais em termos qualitativos e quantitativos. Em termos qualitativos, o projeto prevê o levantamento das medidas já implementadas e
das ações adotadas com vista à circularidade, assim como a identificação dos entraves sentidos pelas empresas de forma a identificar os caminhos a seguir, nomeadamente em termos regulatórios, e a elaboração das respetivas recomendações. Já em termos quantitativos, a CIP pretende demonstrar, por via de uma amostra nacional representativa, as vantagens na utilização de uma ferramenta para medir de forma robusta o progresso de uma organização ou empresa em direção a uma forma mais circular de fazer negócios, tendo sempre em vista os progressos em termos de resultados nacionais no cumprimento das metas do Pacto Ecológico da UE. A eficiência, material e energética, ocupa os primeiros lugares nos objetivos de qualquer empresa industrial que queira reforçar a sua posição no mercado, ser mais sustentável e competitiva. A adoção de métricas pelas organizações com vista à identificação do seu nível atual de circularidade e dos processos que podem ser melhorados, conduzirá ao desenvolvimento de melhores práticas e, consequentemente, a maiores níveis de circularidade. Ao promovermos essa integração ao nível de uma amostra de empresas de uma forma escalável para os diferentes setores ou clusters de atividade, estaremos a promover a economia circular a um nível mais alargado. O facto de a rede associativa da CIP incluir diversos setores de atividade é promissor em termos de uma abordagem integrada que permita a identificação de novas simbioses ou que conduza à operacionalização de outras que, embora já identificadas, enfrentem algum obstáculo. Para levantamento do estado da arte, o projeto incluiu um inquérito nacional online divulgado por toda a rede associativa da CIP e ainda por todos os membros do Steering Committee E+C, composto por representantes de autoridades do ambiente e economia, de entidades do sistema científico e técnico com maior experiência na temática, representantes dos consumidores e de organizações não governamentais ambientais. Além desta fonte de dados, foram igualmente recolhidas informações sobre boas práticas e exemplos do que melhor se faz em Portugal em diversos setores, com a realização de um ciclo de webinars promovidos por alguns dos membros do Management Committee do projeto, associações e empresas que integram um leque alargado de setores considerados prioritários quer pelo Plano Europeu para a Economia Circular, quer pelo Plano de Ação para a Economia Circular nacional. Os sete eventos que constituíram este ciclo, incluíram, além do show case de boas práticas e exemplos de medidas de economia circular em diversos setores de atividade, sete debates em torno das barreiras ou entraves ao avanço de mais medidas e ações entre quem desenvolve conhecimento, quem o implementa e quem regula. Inês dos Santos Costa, Secretária de Estado do Ambiente, abriu o primeiro evento do ciclo de webinars Empresas+Circulares, e começou por destacar o desafio da regulação e legislação europeia no sentido de equilibrar as condições competitivas e de sustentabilidade das empresas europeias face às empresas de países terceiros. “As empresas europeias enfrentam maiores exigências em termos ambientais e de sustentabilidade, que se refletem na capacidade de competir em preço com esses países”. O diretor geral do CITEVE, no mesmo evento, reafirmou a mesma preocupação e explicou que essa distorção, que acaba por se revelar no preço final dos produtos, dá uma ideia errada de que os produtos sustentáveis são mais caros, quando na verdade, os produtos fabricados com matérias-primas virgens geralmente não incorporam os custos sociais e ambientais que lhes estão associados. No evento deste ciclo promovido pela APICER, as empresas cerâmicas apontaram a legislação e o enquadramento regulamentar como um dos principais entraves à circularidade. Declararam sentir que a administração não confia nas empresas, que se veem assoberbadas com legislação normalmente extensa, difícil de interpretar, com processos extremamente burocráticos e com custos associados à sua análise e à emissão de licenças. De acordo com Ana Cristina Carrola, vogal do Conselho de Administração da APA, e participante ativa em vários dos debates havidos neste ciclo de eventos E+C, “mesmo que a reciclagem pós-consumo e de desperdícios de indústria estivesse a funcionar no seu máximo potencial, teríamos uma diminuição das matérias-primas primárias de aproximadamente 30%”. Para a responsável, “temos de ir mais além: estes 70% têm de ser também conseguidos e isso passa pelo ecodesign, pela diminuição do impacto de fim de vida do produto, potenciando a sua reutilização. O tempo de vida do produto na economia tem de ser a aposta a fazer hoje em dia”, afirmou. Ainda com vista a uma discussão aberta e multistakeholder sobre o que mais se pode fazer para acelerar a Economia Circular em Portugal, a dinamização do referido Steering Committee permitirá validar um conjunto de recomendações com vista ao aumento do nível de circularidade nacional, tendo em vista os objetivos de descarbonização e preservação da biodiversidade.
A FERRAMENTA CIRCULYTICS
A ferramenta selecionada para o diagnóstico de circularidade no E+C foi o Circulytics, uma metodologia desenvolvida pela Fundação Ellen MacArthur. A escolha resultou de uma avaliação de vários instrumentos disponíveis à data, e da conclusão da adequabilidade do Circulytics por estar alicerçado numa metodologia que avalia as várias vertentes da circularidade. O Circulytics apoia a transição de uma empresa para a economia circular, independentemente do setor, complexidade e tamanho. Indo além da avaliação de produtos e fluxos de materiais, esta ferramenta de medição ao nível de uma organização revela até que ponto uma empresa atingiu a circularidade em todas as suas operações. Faz isso usando o mais amplo conjunto de indicadores atualmente disponível entre duas categorias: os fatores que impulsionam a adoção de uma estratégia de Economia Circular e os respetivos resultados. Na primeira categoria, incluem-se os fatores que permitem às empresas promover a circularidade ao longo da sua cadeia produtiva, como, por exemplo, a prioridade estratégica atribuída à Economia Circular e os programas de formação interna relacionados com este tema. Já na categoria dos resultados, inserem-se os esquemas atuais de avaliação dos fluxos de materiais, aferindo o grau de circularidade corrente das organizações. Esta categoria está relacionada essencialmente com a circularidade dos inputs e outputs e o processamento de materiais.