Revista arqa #113

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Revisitações Modernas

ARQUITETURA E ARTE

Revisitações Modernas OMA Renzo Piano Steven Holl

JKMM Ibelings van Tilburg FABG Teresa Nunes da Ponte Sergison Bates Andrés Jaque Ana Tostões Hilde Heynen Barry Bergdoll Diane Ghirardo Jukka Jokilehto Horacio Torrent Yoshiyuki Yamana João Paulo Martins Mark Carroll Ruptura Silenciosa

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Ano XIV – março|abril 2014 E11,00 (continente) – 2 600 Kwanzas (Angola)

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ISSN: 1647- 077X

mai.|jun. 2014 | E11,00


Propriedade:

R. Alfredo Guisado, 39 – 1500-030 LISBOA Telefone: 217 703 000 (geral) 217 783 504/05 (diretos) Fax: 217 742 030 futurmagazine@gmail.com

ÍNDICE

matérias Foto: Robert Perry Photography

Os artigos assinados são da inteira responsabilidade dos autores

STEVEN HOLL - Seona Reid, Glasgow School of Arts

Cozinhas

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Info – Boletim Informativo da Ordem dos Arquitetos de Angola (0A)

014

Atualidades e agenda

019

Luís Santiago Baptista – Revisitações Modernas

022

Revisitações Modernas: Perspetivas Críticas – Ana Tostões, Hilde Heynen, Barry Bergdoll, Diane Ghirardo, Jukka Jokilehto, Horacio Torrent, Yoshiyuki Yamana, João Paulo Martins, Mark Carroll

Angola News Editorial Entrevistas

Projetos

040 042 052 064 076 084 090 096 106 112

Biografias OMA – Centro Universitário McCormick Tribune, Plano IIT de Mies van der Rohe, Chicago Renzo Piano – Extensão do Museu de Arte Kimbell de Louis Kahn, Fort Worth, Texas Steven Holl – Ampliação Seona Reid da Escola de Arte de C. R. Mackintosh, Glasgow JKMM – Biblioteca Municipal, Centro Administrativo e Cultural de Alvar Aalto, Seinäjoki Ibelings van Tilburg – Ampliação do Edifício Ter Muelen de Van der Broek e Bakema, Roterdão FABG – Reconversão de Estação de Serviço de Mies van der Rohe, Verdun, Québec Teresa Nunes da Ponte – Remodelação e Ampliação da Escola Padre António Vieira de R. Athouguia Sergison Bates – Reabilitação do Solar Pavilion de Alison e Peter Smithson, Upper Lawn, Wiltshire Andrés Jaque – Intervenção PHANTOM, Pavilhão Mies van der Rohe, Barcelona Investigações

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Filipe Borges de Macedo – Le Petit Cabanon: Mitologia Inspiradora

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e

Artes Sandra Vieira Jürgens – Neomodernos: Revisitar os clássicos do século XX

Design Carla Carbone – Martino Gamper: O design é um estado de alma

Itinerâncias Luís Santiago Baptista – Peter Zumthor Buildings and Projects

Fotografia Fernando Guerra – FG+SG: Escola Secundária Rainha D. Leonor

Dossier Ruptura Silenciosa Tanto Mar

Diretor Luís Santiago Baptista lsbaptista@revarqa.com Redação Paula Melâneo (Coordenação) apmelaneo@gmail.com Baptista-Bastos (Opinião), Bárbara Coutinho (Design), Carla Carbone (Design), David Santos (Artes), Margarida Ventosa (Geração Z) Mário Chaves (Livros), Nádia R. Bento (Tradução), Sandra Vieira Jürgens (Artes) Paginação e Imagem Nuno Silva Bruno Marcelino (desenhos) Edição Digital Ricardo Cardoso Comunicação e Marketing Maria Rodrigues (Diretora) – mrodrigues@revarqa.com Carmen Figueiredo – cfigueiredo@revarqa.com Publicidade – PORTUGAL Tel. +351 217 783 504 Fax +351 217 742 030 futurmagazine@gmail.com cfigueiredo@revarqa.com ANGOLA Parceria Futurmagazine – NAMK, Lda. Rua Major Marcelino Dias, nº 7 - 1º andar-D Bairro do Maculusso, Distrito da Ingombota, Província de Luanda namk-limitada@hotmail.com Tel. +244 222 013 232 Publicidade – BRASIL Jorge S. Silva Tel. +55 48 3237 - 9201 Cel. +55 48 9967 - 4699 jssilva@matrix.com.br Impressão Jorge Fernandes, Lda. Rua Quinta Conde de Mascarenhas, 9 2825-259 Charneca Caparica Distribuição Logista Portugal Área Ind. Passil, lt 1-A, Palhavã 2894-002 Alcochete

Livros Mário Chaves

News Maketing

Tiragem 10.000 Exemplares

Materiais fornecidos pelas marcas

Periodicidade Bimestral

Apoio:

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www.revarqa.com – futurmagazine@gmail.com

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Diretor Geral Edmundo Tenreiro etenreiro@revarqa.com

ISSN: 1647- 077X ICS: 124055 Depósito Legal: 151722/00


Indoors

Cozinhas

Novas cozinhas Ikea


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Cosentino Porto Tel. +351 229 270 097 info-porto@cosentinogroup.net Cosentino Lisboa Tel. +351 219 666 221 info-lisboa@cosentinogroup.net

Dekton® é a nova e inovadora categoria de superfícies do Grupo Cosentino. Utilizável tanto em espaços interiores como exteriores graças ao seu excelente desempenho e ao grande formato de placas em que é elaborado, um fator que facilita e agiliza a sua instalação, sendo o aliado perfeito para designers e arquitetos. Oferecendo inúmeras soluções decorativas e arquitetónicas, Dekton® permite que o design flua desde o interior ao exterior e em todos os níveis, tanto horizontal como vertical, sem que existam limites ou interrupções no design final. Dekton® oferece também uma grande variedade de cores e acabamentos com uma altíssima qualidade e versatilidade.

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Cinacryl, um esmalte acrílico aquoso para interiores, é a escolha ideal para cozinhas, por estas exigirem uma maior resistência e facilidade de limpeza. Resistente a fungos e lavável com água e detergente, Cinacryl seca rápido e apresenta um cheiro pouco intenso, quando comparado com os esmaltes tradicionais de base solvente. Este produto é uma solução rápida e fácil para quem pretende renovar a imagem da sua cozinha, sem ter que fazer grandes obras. Pode ser aplicado sobre azulejos, sobre madeira e sobre metal (devidamente protegidos), mantendo todas as superfícies resistentes à sujidade e ao amarelecimento.

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Avenida de Dom Mendo nº 831 Apartado 1008 - 4471-909 Maia Tel. + 351 229 405 000 Fax + 351 229 485 661 customerservice@cin.pt www.cin.pt


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Chousa Nova 3830-133 Ílhavo – Portugal Tel. +351 234329700 Fax. +351 234329702 margres@margres.com www.margres.com

A nova coleção Linea Party interpreta em grés lâmina as suaves cores da coleção Party, já existente em 9,5mm. Com Linea Party é dada uma nova polivalência às 5 cores mais procuradas no mercado. Assim estas 5 cores para além de estarem disponíveis nos formatos 30x60cm e 60x60cm, passam agora a estar também disponíveis em grandes formatos até 1x3m e com apenas 3mm de espessura. A coleção Party visa criar superfícies de cor uniforme com ligeiras nuances, de forma a criar algum movimento visual na superfície. Esta tipologia de superfícies vai ao encontro das modernas tendências da arquitetura minimalista, onde os pavimentos e revestimentos se querem discretos e suaves, adaptáveis aos mais diversos fins do espaço a ser vivido.

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As novas cozinhas IKEA são um mundo de possibilidades infinitas. Quando se diz “novas” cozinhas, quer-se dizer completamente novas. As estruturas, as portas, as dobradiças, as gavetas - mesmo tudo. Desenvolvidas de raiz para proporcionar liberdade na criação de uma cozinha de sonho - com o estilo preferido, as funções necessárias e a capacidade de enfrentar o dia a dia em casa. E tudo com a famosa etiqueta de preço da IKEA. A abordagem simples de blocos de construção, na qual as cozinhas IKEA se baseiam, permite criar literalmente milhares de combinações de estruturas, portas, gavetas e organizadores, podendo tirar-se o máximo partido de todos os centímetros da área da cozinha, sendo ainda mais fácil de montar e instalar. “Olá” às novas cozinhas IKEA, onde se encontram mais momentos de inspiração. Tudo numa das três lojas IKEA: Alfragide, Loures e Matosinhos ou numa visita ao site www.IKEA.pt/cozinhas

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II N NF FO O Boletim da Ordem dos Arquitectos de Angola, Conselho Nacional – Ano I -– Nº 2013 Nº 311– –janeiro|fevereiro maio|junho 2014

Boletim da Ordem dos Arquitectos de Angola, Conselho Nacional – Ano I - Nº 3 – janeiro|fevereiro 2013

Agenda

9Agenda DE FEVEREIRO 2013

OAA – A Terceira 9 DE FEVEREIRO 2013 Assembleia Geral da OAA Terceira OAA –– A Ados Terceira Ordem Arquitectos Assembleia Geral da Assembleia Geralevento da de Angola. Neste

Ordem dos Arquitectos Ordem ser dosfeito Arquitectos deverá um balanço de de Angola. Angola. Neste evento

do mandato que agora

deverá ser feito um balanço termina. do mandato que agora termina.

Arquitecto Galardoado com Prémio EUROPA NOSTRA 2012, confirmado “Na Aula Magna” O Arquiteto espanhol Jorge Suaréz Diaz,

galardoado com o Prémio EUROPA NOSTRA 2012, pelo seu trabalho de reconversão de uma antiga Central Térmica em Museu Nacional deDE Energia, está confirmado 2 DE MARCO 2013 2 MARCO 2013 Terceiras Eleições Terceiras Eleições para uma AULA MAGNA com Gerais da Ordem dos a Ordem dos Arquitectos Arquitectos de Angola. de Angola, aindadeverá este ano. Nestas Nestas eleições eleições deverá ser ser O galardoado é licenciado eleito o Presidente eleito o próximo próximo Presidente do Nacional, em emConselho arquitetura pela do Conselho Nacional, em substituição do arq. Antonio substituição do arq. Antonio Universidade Politécnica Gameiro, bem como do Gameiro, como do de Madrid,bem estre em Ciências Presidente do Conselho Presidente do Conselho provincial Luanda, de Designde Arquitetónico, pela provincial de Luanda, o arq. Helvecio da Cunha. Universidade de Columbia o convocatória arq. Helvecio para da Cunha. A os dois Nova Iorque, e ainda MBA A convocatória para eventos foi feita a 17os dedois em Direção e Administração eventos foi feita a 17 de Janeiro, pelo atual Presidente Janeiro, pelo atual Presidente de Ordem. Empresas. da da NãoOrdem. perca !

CC

Eventos realizados Opinião

Eventos realizados OS DADOS DO CENSO 2014 VERSUS OS DA ARQUITECTURA EM ANGOLA Por: Celestino Chitonho, Arquiteto, Consultor

REALIZOU-SE DE 8 A 12 DE DEZEMBRO, EM ABIDJAN, COSTA DO MARFIM, a 39ª reunião do Conselho da União Africana Arquitectos (AUA) e o encontro de Desenvolvimento Profissional (CPD). Este REALIZOU-SE DEde 8A 12 DE DEZEMBRO, EM ABIDJAN, COSTA DO MARFIM, a 39ªContínuo reunião do Conselho último, foi uma organização conjunta entre a AUA e a UIA (União Internacional de Arquitectos). Na reunião da União Africana de Arquitectos (AUA) e o encontro de Desenvolvimento Profissional Contínuo (CPD). Este do Conselho daorganização AUA foram aprovadas varias resoluções a organização interna da União. último, foi uma conjunta entre a AUA e a UIAconcernentes (União Internacional de Arquitectos). Na reunião do da CPD, AUA foram varias resoluções concernentes a organização interna da União. No Conselho encontro do foramaprovadas feitas apresentações de trabalhos desenvolvidos por grupos de arquitetos No encontro em do CPD, foram feitas apresentações de sobre trabalhos desenvolvidos porde grupos arquitetos • ivoariences, parceria com o governo de Abidjan, requalificação urbana zonasdedegradadas. ivoariences, em parceria com o governo de Abidjan, sobre requalificação urbana de zonas degradadas. •

‘Delirious in in Luanda’ Luanda’ ‘Delirious 90, verificou-se como um período de estagnação FALAR DE LUANDA é também falar dos Opinião

Opinião

FALAR DE LUANDA é também falar dos musseques, assim como os “Slums” em Londres musseques, assim como os “Slums” em Londres ou em Nova Iorque, os “bidonvilles” em Paris, ou em Nova Iorque, os “bidonvilles” em Paris, as “favelas” “favelas” no rio de de Janeiro, Janeiro, os os “bustees” em em as De 16 a 31noderioMaio, do corrente“bustees” ano, Angola leva Calcutá, as “villas de misérias” em Buenos Aires, Calcutá, “villas de misérias” em Buenos Aires, a cabo o as Censo geral da população, que incide ou os os “bairros “bairros de de caniços” caniços” em em Lourenço Lourenço Marques, Marques, ou basicamente na busca de dados ligados à população pois espelham as assimetrias da evolução social. e habitação. Duas variáveis intimamente ligadas Com os seus 437 anos de existência, Luanda à arquitetura e ao urbanismo. deQuantos hoje é o somos, palco das atenções arquitetos, onde e comode vivemos são as sociólogos e sociólogosque e antropólogos, antropólogos, pois apresenta apresenta perguntas mais ecoam pois nesta fase censitária. características únicas onde novas características únicas onde se se verificam verificam novas Dezoito milhões de habitantes é o número genérico dinâmicas sociais, culturais e Se a que estamos, meia volta, acostumados a ouvir. dinâmicas sociais, culturais e económicas. económicas. Se Agora, até a da era lenta, no temos também a oportunidade saber osfoi números até 1940 1940 a expansão expansão da cidade cidadede era lenta, foi no período da 2º guerra mundial onde se verificou o específicos de cada localidade. período da 2º guerra mundial onde se verificou o maior da cidade com uma arquitetura Maiscrescimento do que abordar quantitativamente os dados, maior crescimento da cidade com uma arquitetura fortemente movimento moderno, incumbe-secaracterizada aos fazedorespelo de ciência a criatividade fortemente caracterizada pelo movimento moderno, a arquitetura “Corbusiana”. Esse movimento chegou de abordar os dados qualitativamente e incentivar a arquitetura “Corbusiana”. Esse movimento chegou a pelas mãos debásicas, arquitetos jáLuanda a tomada de medidas no talentosos sentido de mitigar a Luanda pelas mãos de arquitetos talentosos da épocafuturos como Vasco Vieira daé,Costa, Castro e corrigir colapsos. Isto políticas públicas da arquitetura. época como Vasco Vieira Costa, Castro Rodrigues, Fernão Simões deda Carvalho entre outros. de Rodrigues, Fernão Simões deoAngola, Carvalho outros. Foi período onde urbanismo e aGuia própria Aum Ordem dos notável, Arquitectos de noentre seu Foi um período notável, e lançou a própria arquitetura hoje têm algoo aurbanismo dizer à cidade. Nacional deainda Arquitectos eonde Urbanistas - 2013, O período entrehoje finais dos anos 70 atéà fins anos arquitetura ainda têm algo a dizer cidade. dados da localização dos seus associados nodos território

O período entre finais dos anos 70 até fins dos anos

90, verificou-se como um período de estagnação no crescimento da cidade de “betão”, mas também no crescimento da cidade de “betão”, mas também foi nesse mesmo período que se registou o fenómeno foi nesse mesmo período que se registou o fenómeno de migração migração do do interior interior para para aa capital capital (cidade (cidade de de nacional. Este dado e outros tantos do mesmo de Guia, Luanda). O “Boom” das construções desordenadas Luanda). O “Boom” das construções desordenadas não são inocentes. começava aa uma uma velocidade velocidade descontrolada descontrolada e, e, hoje, hoje, começava Ora vejamos. espelha o mosaico e a diversidade da nova estrutura Existe o rácio considerado normal, que reflete Luanda apresenta. ourbana númeroque de arquitetos e a quantidade de população Existem alguns planos urbanização que estão existente num território. Ou de seja, um arquiteto a implementados para a urbana a ser ser implementados para aliviar aliviar a pressão pressão urbanaque para dez mil pessoas (1/10000 = 0,0001). À medida que a vive. bem existem estes quevalor a cidade cidade vive. Ainda Ainda bem que queos existem estes este se aproxima da unidade, arquitetos deixam planos mas, querendo ser perguntode ter trabalho e surge o desemprego. À medida que se planos mas, não não querendo ser pessimista, pessimista, pergunto-me cidade se com aproxima do zero, faltam arquitetos. -me se se uma uma cidade se faz faz com planos planos “a “a retalho” retalho” como tenho verificado porigualmente exemplo com o plano do É este rácio que permite situar como tenho verificado por exemplo com o plano do Sambizanga, entreNão outros, ou se asCazenga, escolas de arquitetura Zango, no território. é um Cazenga, Sambizanga, Zango, entre outros, ou se se deve aleatório. pensar a cidade como todo, criando um processo O número de um arquitetos formados se deve pensar a cidade como um todo, criando um plano estratégico de crescimento sustentável, onde por ano deve ter em conta este rácio, bem como plano estratégico de crescimento sustentável, onde ganhar é a e cidade e os seusDaqui, utilizadores. asquem taxassai deamortalidade de natalidade. deduzir quem sai a ganhar éLuanda a cidade e os seus utilizadores. Na pensar um exercício muito que overdade, ensino não é negócio, éésim uma estratégia Na verdade, pensar Luanda um exercíciopela muito complexo e ao mesmo tempoé apaixonante sua de desenvolvimento. complexo e ao mesmo tempo apaixonante pela sua diversidade cultural e social e nunca terá o consenso Isto não significa que os privados não devam meter-se diversidade cultural e Claro social e nunca terádentro o consenso de todos os pensam nela. •sim, mas no “negócio doque ensino”. que desta Jaime Arquiteto de todosde osdesenvolvimento, que pensam nela. • Mesquita, estratégia traçada pelos governos.

Jaime Mesquita, Arquiteto

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A cidade são as pessoas...

ARTIGO 3.º (Atribuições)

Por Wilfred Figueiredo, arq.

A

habitação coletiva como substrato de urbanização é e será sempre, sem dúvida, um bom pretexto para falar de arquitetura, urbanismo, autores e suas influências, habitantes, enfim dos obreiros da cidade. Fazendo uma comparação direta com a capital do Império, Luanda ainda como colónia, aceitando a amplitude do conceito de modernidade e no seu contexto de desenvolvimento, mostrou-se muito mais aberta à adaptação das novas ideias e métodos a situações reais, talvez numa procura de autonomia e até mesmo de identidade operacional. Neste sentido a estruturação formal e essencialmente social, no que diz respeito à organização da cidade, dominou o seu crescimento urbano onde a habitação coletiva (quer a de iniciativa governamental quer a de investimento privado) teve um papel preponderante no desenvolvimento do habitar, procurando promover uma maior integração e interação da vida comunitária. De uma forma geral Luanda sempre se destacou pela qualidade sensível das

Eventos

Estatuto

abordagens e pela assinalável formalização destas propostas, no quadro de uma assimilação dos princípios do movimento moderno. Não é difícil identificar adaptações da escola ocidental traduzida num urbanismo modelo cidadejardim e suas satélites, mas também a concretização de experiências urbanas, derivadas da carta de Atenas, numa visível separação por zonas, onde conjuntos autónomos e espaços verdes tomam protagonismo no tecido urbano. Um conviver paralelo de correntes de pensamento arquitetónico e urbanístico, propondo novas características, em função da escala dos elementos que compunham a cidade, singularidade esta que se pode observar até mesmo no pormenor do desenho do edificado. Talvez um reflexo da adaptação à própria escala de intervenção, mas também o olhar menos “apertado” do regime em oposição ao português suave da Metrópole. E assim se foi fazendo por cá o Moderno, na minha opinião um pouco mais brando, menos limitador do que o cenário ideal

para o homem ideal de Le Corbusier. A máquina de habitar enquadrada no “Esprit Nouveau” inspirada nos transatlânticos e nas suas células habitacionais, uma produção em série tal como a dos automóveis, aviões... esse “sonho acordado” que é a sua obra tão bem concebida e valorizada por todos nós. Habitaçãotipo de acordo com as necessidades e funções-tipo, procurando resolver o grande problema de então, não muito diferente do que ainda hoje cá vivemos. Passados cinquenta anos é tempo de olharmos para a nossa realidade e encarar o homem real. O homem que vive e se sente bem em viver a sua cidade. O homem que se revê não em partes, zonas, células, ilhas, tipos ou o que se quiser chamar, mas num todo. Um todo que seja planificado e que até permita que se desenvolva espontaneamente, porém um todo bem estruturado. Que respeite o clima, o lugar e principalmente dignifique a cultura do seu recurso mais importante.

Júri do Concurso Urbano de Arquitectura – CONCURBA visita Local do Concurso

O júri da primeira edição do Concurso Urbano de Arquitectura – CONCURBA, após a receção e validação das propostas entregues pelos concorrentes, visitou no mês de Maio, o Parque dos Namorados, no Sumbe, Província do Kuanza Sul. O objetivo da visita de trabalho foi de tomar contacto com o “espírito do lugar”, de modo a estar munido e melhor interpretar as propostas e ideias dos concorrentes.

Constituem atribuição da Ordem: a) Contribuir para a defesa e promoção da arquitectura e do urbanismo, zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de arquitecto e de urbanista promovendo a valorização profissional e científica dos seus membros, a defesa e os respectivos princípios deontológicos; b) Efectuar o registo dos arquitectos e urbanistas, atribuir a cédula profissional dos arquitectos e dos urbanistas para o exercício da profissão; c) Elaborar e aprovar os regulamentos para o exercício da profissão; d) Representar os arquitectos e os urbanistas perante os órgãos de soberania e a administração pública devendo ser ouvida sobre a legislação que abrange o domínio da arquitectura e do urbanismo dos actos próprios da profissão de arquitecto e de urbanista e em geral sempre que estejam em causa matérias que se relacionam com a prossecução dos seus fins; e) Contribuir para a elevação dos padrões de formação do arquitecto e do urbanista e pronunciar-se sobre os planos de estudos e funcionamento dos cursos de arquitectura e de urbanismo; f) Defender os interesses, direitos e prerrogativas dos seus membros; g) Fazer respeitar o código deontológico e exercer jurisdição disciplinar sobre todos os arquitectos e urbanista nacionais e estrangeiros que exerçam a profissão em território nacional; h) Promover o intercâmbio de ideias e experiências entre os seus membros e com organismos congéneres estrangeiros e internacionais, bem como acções de coordenação interdisciplinar, quer ao nível de formação e investigação, quer ao nível da prática profissional; i) Colaborar, patrocinar e promover a edição de publicações conforme os objectivos da Ordem e que contribuam para um esclarecimento público sobre as implicações e a relevância da arquitectura; j) Colaborar com escolas, faculdades e outras instituições em todas as iniciativas que visem a formação do arquiteto e do urbanista; k) Participar na regulamentação dos concursos de arquitectura ou de urbanismo promovidos pela administração pública e nos seus júris; l) Organizar e desenvolver serviços úteis aos seus membros; m) Regulamentar os estágios de profissionalização e participar na sua avaliação; n) Registar a autoria dos trabalhos profissionais nos termos da lei; o) Filiar-se ou estabelecer acordos com organizações nacionais, internacionais e estrangeiras com objectivos afins; p) Exercer as demais competências previstas na lei.

Ordem dos Arquitectos de Angola

Rua Aníbal de Melo, nº 109, 1º andar Vila Alice, Luanda Tel. +244 926 975 502 geral@arquitectos-angola.org

Projecto Nova Vida Rua 50 • edifício 106, 3º andar, apto 3.2 • Luanda - Angola Telf. +244 923 609 573 • +244 921 548 455 pranchetalda@hotmail.com


news

atualidades

Paula Melâneo

Livro Common Pavilions premiado Common Pavilions é um livro fantástico, com origem num projeto com curadoria dos arquitetos suíços Diener & Diener, em conjunto com o fotógrafo italiano Gabriele Basilico, e que foi apresentado na exposição Internacional de Arquitetura da Bienal de Veneza em 2012. O projeto e o livro que o permite extender-se no tempo, espelham o universo multicultural da Bienal, e do tema da sua 13ª edição “Common Ground”, centrado nos 29 Pavilhões Nacionais do Giardini di Venezia (incluindo também a Livraria, obra de James Stirling, Michael Wilford and Associates, com Tom Muirhead, de 1991 – foto em cima –, e o Pavilhão dos Países Nórdicos, obra de Sverre Fehn de 1962 – foto em baixo), juntando o universo visual de Basilico a desenhos técnicos das obras e a ensaios de 33 autores internacionais convidados. O reconhecido arquitetofotógrafo, falecido no início de 2013, deixou-nos o seu olhar inconfundível num conjunto de 67 imagens a preto e branco. Dividido por nações, a leitura torna-se poesia com os textos que acompanham as imagens. Cada país vê o seu Pavilhão retratado na narrativa de um autor – filósofo, artista, arquiteto, historiador de arte ou de arquitetura – numa visita que se pode fazer na língua do próprio país ou, para os menos dotados em línguas, num já tão “esperantizado” inglês. A riqueza das 23 línguas e as suas diferentes grafias é quase sonora e preenche-nos o olhar e a mente. Juhani Pallasmaa presenteia-nos com Aalto’s Magic Lantern, o ensaio em filandês sobre o mítico Pavilhão da Finlândia, obra de Alvar Aalto (1956), Peter Cook debruça-se sobre On the Verandah, sobre o Pavilhão britânico de Edwin Alfred Rickards (1909), e Zissis Kotionis com Elia Zenghelis descrevem, em alfabeto grego, a obra de M. Papandreou e Brenno del Giudice, o Pavilhão grego (1934), no ensaio Geography and Common Imaginary. A introdução é de Roger Diener e os ensaios contam ainda com Vito Acconci, Arnfinn Bø-Rygg, Monica Bonvicini, Alexander Brodsky, Eduard Bru i Bistuer, Dinu Bumbaru, Jean-Louis Cohen, Hermann Czech, Marcelo Danza, Bogdan Ghiu, Amos Gitai & Ben Gitai, Jörg Haspel, Herman Hertzberg, Taro Igarachi, Marcel Meili, Henrieta Moravčíkova, Hyungmin Pai, Andras Palffy, Regina Silveira, Martin Steinmann, Peter Stutchbury, Adam Szymczyk & Monika Sosnowska, Carsten Thau, Milica Topalovic, Bart Verschaffel, Henry Vicente e Tarek Waly. Cerca de 60 desenhos de plantas de pisos e implantações complementam os conteúdos e a percepção das obras dos vários Pavilhões, numa contextualização mais técnica. Este livro singular é editado em 2013 pela Scheidegger & Spiess (ISBN 978-385881-734-1) em 288 páginas de formato 25x39cm, com design de Robert & Durrer e uma impressão de grande qualidade, e foi recentemente premiado com a medalha de ouro do German Photo Book Award 2014. www.commonpavilions.com www.scheidegger-spiess.ch

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atualidades

Foto: Délio Jasse

Foto:José Pedro Cortes

Foto: Letícia Ramos

Aires Mateus vencedor de nova Mesquita em Bordéus

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O atelier Aires Mateus foi o vencedor do concurso por convite para o Centro Muçulmano de Bordéus, em França, numa zona nova junto ao rio Garona. Uma obra promovida pela Fédération Musulmane de la Gironde, de cerca de 12.000m2, com o valor de 24,5 milhões de euros, dedicada ao culto e à cultura muçulmana. Para além de Aires Mateus, participaram também os ateliers Poly Rythmic Architecure (autores de uma mesquita na Arábia Saudita); Lion Associés (autores do plano urbano envolvente à Grande Mesquita de Meca); os locais Marjan Hessamfar-Joe Verons Architectes e o arquiteto Éric Lapierre. Na sua proposta, o atelier português procurou “um espaço absoluto, uma topografia contínua, uma arquitetura onde tudo está ligado: os diferentes usos, os percursos que os relacionam, a luz filtrada que os caracteriza. Um todo sem partes”. O piso térreo é aberto à circulação, com diversas lojas que servem a cidade, e na área superior estão as áreas culturais, com salas de aula. Entre estes espaços está a zona aberta, em vidro, dedicada ao culto (uma sala com 350 lugares, para uso diário, e outra com 4 mil, para uso semanal). A ideia de continuidade, onde a religião se funde com a vida social e quotidiana, foi central nesta proposta, a primeira obra de características religiosas a realizar pelo atelier. www.airesmateus.com

BES Photo 2014

MVRDV vence transformação da Fábrica Serp & Molot

Délio Jasse (AO), José Pedro Cortes (PT) e Letícia Ramos (BR) são os candidatos da 10ª edição do Prémio BES Photo, nomeados pelo júri internacional deste ano, composto por Jacopo Crivelli Visconti (BR), crítico e curador; João Fernandes (PT), subdirector do Museo Reina Sofia, Madrid; e Bisi Silva (NG), Centre for Contemporary Art, Lagos. Um conjunto de obras inéditas dos artistas está em exposição no Museu Coleção Berardo. Mais convencional na sua forma, o projeto “Um Eclipse Distante” de José Pedro Cortes trabalha os sentidos de privado e de público, num conjunto onde se distinguem imagens de corpos femininos e imagens de objetos ou “arquiteturas” do quotidiano da cidade onde vive, Lisboa. É uma análise sobre o seu próprio trabalho, explorando a relação fotógrafo-modelo, na busca da imagem “perfeita”. De caráter arquivista, “Ausência Permanente” é uma série onde Délio Jasse criou imagens pela sobreposição de várias histórias de arquivo: retratos anónimos de épocas passadas, carimbos de passaporte, fotografias da era colonial, etc. As imagens são fusões de retalhos de memórias que originam novas identidades, apresentadas imersas em água, em caixas no chão, onde uma luz foca cada peça. Letícia Ramos apresenta “Nós sempre teremos Marte”, partindo do questionamento e pesquisa do que pode ser a imagem científica, a informação e o registo da história do Homem. O conjunto de peças apresentadas têm origem numa ficção criada pela artista, onde várias imagens feitas a partir de microfilme nos parecem imagens científicas credíveis. A peça central é a sua sedutora curta-metragem Vostok, representando uma exploração de um submarino na Antártica. O premiado será conhecido no dia 2 de julho. A exposição está patente no Museu Coleção Berardo, no CCB em Lisboa, até 7 de setembro. Depois, os trabalhos viajam até São Paulo, onde serão apresentados no Instituto Tomie Ohtake, entre 23 de outubro 2014 e 11 de janeiro 2015. A exposição é acompanhada de um catálogo com um volume para cada artista. Centram-se nos projetos apresentados e são complementados de entrevistas e da contextualização das suas obras, através de trabalhos anteriores. www.pt.museuberardo.pt

A proposta dos holandeses MVRDV foi a vencedora do concurso para a transformação da fábrica Serp & Molot (Hammer & Sickle), localizada a este do centro de Moscovo. O seu conceito urbano respeita a estrutura industrial dos 58 hectares e cria espaço para 1,8 milhões de m2 de uso misto. A Development Corporation Donstroy prevê um investimento de 180 biliões de rublos e a finalização em 2021. A fábrica de aço original, datada de 1884 e um elemento importante durante a Revolução Russa, tinha ultimamente caído em decadência. A proposta de MVRDV preserva as características fabris do local, integrando-as nas novas estrutruras. Grandes espaços fabris são substituídos por novos blocos urbanos e pátios ajardinados, os pisos térreos são reservados para infraestruturas públicas e comércio. Um circuito de transportes existente será transformado num parque, que funciona como diretriz tridimensional da nova área. O novo espaço urbano acolhe espaços de lazer e desporto, mercados ao ar-livre e pavilhões. Escolas e centros de dia abrem sobre este parque. No topo do circuito de transporte há uma passagem aérea, entre as copas das árvores e vista sobre a envolvente. Junto às habitações há escritórios e comércio, escolas e um hospital local. A área será desenvolvida em fases, criando espaço para 19.000 habitantes e 16.000 locais de trabalho. Os finalistas deste concurso incluem também LDA Design (UK), Ateliers Lion Associés (FR), Mega Project (RU) e De Architecten Cie. (NL). www.mvrdv.nl

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Foto: RAAAF

Revisitações Modernas

OMA, Centro Universitário McCormick Tribune, Chicago, 1997-2003 maio|junho 2014

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EDITORIAL

temático

Revisitações Modernas

Os dilemas das intervenções contemporâneas no património moderno

Luís Santiago Baptista|lsbaptista@revarqa.com

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Há poucos dias, mais precisamente na manhã de 23 de Maio, deflagrava um incêndio na Escola de Belas-Artes de Glasgow, obra-mestra do arquiteto Charles Rennie Mackintosh, construída entre 1897 e 1909. Na sua dimensão trágica, este não é um acontecimento irrelevante quando nos propomos trabalhar sobre o tema das intervenções contemporâneas no património moderno. O impacto da notícia é tão maior quanto o facto da Escola se ter mantido em pleno funcionamento ao longo de mais de um século, cujo polémico recente edifício de ampliação de Steven Holl se apresenta como uma tentativa de dar um novo fôlego, aumentando o espaço disponível e reorganizando o seu programa. O edifício de Mackintosh, cuja magnífica biblioteca parece ter escapado a danos de maior, é um exemplo de apropriação continuada, mantendo este património insubstituível permanentemente vivo. Este acidente trágico, que deliberadamente trouxemos à capa, confronta-nos e interroga-nos. O que implica a preservação do legado da arquitetura moderna? Qual o papel dos arquitetos contemporâneos nessa tarefa? A verdade é que os mestres modernos marcam indelevelmente o nosso território físico e mental. A sua presença manifesta-se nas obras que nos legaram, verdadeiros testemunhos materiais dos desafios que a disciplina enfrentou ao longo da modernidade. Mas, perante as transformações nas sociedades contemporâneas, temos a sensação que a preservação deste património se torna hoje tão premente quanto problemática.

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Em 1968, Manfredo Tafuri afirmava: “A dificuldade em historicizar a arquitetura contemporânea depende de uma sua escolha inicial: a de pretender apresentar-se como fenómeno radicalmente anti-histórico.”1 O historiador italiano percebia que a arquitetura moderna manifestava uma nova conceção do espaço e do tempo, que introduzia uma nova forma, inevitavelmente problemática, de lidar com a relação entre a arquitetura e a história. A conceção dinâmica do tempo, assente na ideia de progresso inerente à modernidade, pressupôs a interiorização da mudança constante da industrialização e a vontade de superá-la na nova ordem de um presente eterno. A transformação do processo histórico configurava-se através de modelos que anunciavam o seu fim. Esta condição paradoxal, entre historicidade processual e a-historicidade projetual, funda a arquitetura heroica do Movimento Moderno, tornando-se manifesta, décadas mais tarde, quando se coloca a questão da sua preservação. Daí a estranheza que sentimos perante uma ruína moderna. Wessel de Jonge, arquiteto com ampla obra na reabilitação de obras modernas e um dos fundadores do DOCOMOMO, assinala a especificidade da questão do património moderno: “Os pioneiros do Movimento Moderno consideravam que o direito a um edifício existir não estava determinado pela sua história, mas pelo seu uso. Para eles a ideia de preservação era totalmente irrelevante ou mesmo contrária às conceções do Movimento Moderno. Decidindo a favor da conservação dos seus edifícios, podemos estar, ao mesmo tempo, a agir contra os seus princípios.”2 Não será por acaso que até há pouco tempo o campo do património marcava a diferença entre aquele pré-industrial do outro industrial, deixando implícito que algo se alterava na sua natureza na transposição desse limiar temporal. Só no final dos anos 80 a questão do património moderno começou verdadeiramente a emergir, com a fundação

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do DOCOMOMO, plataforma fundamental de reunião de especialistas e investigadores, de inventariação e documentação de obras modernas e de debate teórico das temáticas específicas da preservação da arquitetura moderna. Porém, apenas em 2011, o ICOMOS que tutela as questões do património arquitetónico a nível mundial, através do ISC20C/International Scientific Committee on Twentieth Century Heritage, redigiu o Documento de Madrid, onde se apresentam finalmente os princípios e orientações específicos para o património moderno, “desenvolvendo diretrizes que apoiem a conservação e gestão da mudança nos lugares patrimoniais do século XX.”3

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A questão da importância do património arquitetónico moderno parece hoje estar assimilada. Mas como apontou Benedetto di Cristina, “agora que a documentação e investigação académica sobre a arquitetura do século XX se tornaram, previsivelmente, muito mais rápidas e eficientes que a atual conservação dos edifícios, os arquitetos praticantes têm que redefinir o seu papel e as suas prioridades.”4 A preservação desse legado moderno implica que a teoria se reflita numa prática, que os fundamentos programáticos e metodológicos se materializem em intervenções concretas. Neste sentido, o verdadeiro teste da pertinência dos princípios e valores enunciados está na atividade projetual. A 10ª Conferência DOCOMOMO em 2008, exatamente dedicada ao tema do “desafio da mudança”, lança a questão: “O legado do Movimento Moderno tem ganho um estatuto lendário, grandemente resultado do crescente reconhecimento e apreciação dos conceitos arquitetónicos visionários das suas obras-primas. No entanto, contra a realidade da vida quotidiana, tem sido difícil manter as criações arquitetónicas do Movimento Moderno de tal forma que reflitam ainda as intenções originais dos seus projetistas. Sabendo que muitos arquitetos modernos procuraram novos patamares de funcionalidade e flexibilidade, o desafio atual está em como lidar com esse património tendo em conta o seu contexto em constante transformação, incluindo tanto as mudanças físicas, económicas e funcionais como as socioculturais, políticas e científicas.”5 Apesar da ideia aceite de que cada caso é um caso, levantam-se muitas dúvidas quanto a uma correspondência entre a teoria e a prática da preservação, acima de tudo quando se confronta uma preexistência com uma nova intervenção, seja através da alteração de usos, seja de ampliação de área, seja ainda de atualização infraestrutural ou reconstituição material. Mas é de uma outra ordem, o foco principal das interrogações sobre a preservação do património moderno. É a prevalência do ato de criação contemporânea sobre as obras modernas, tendo em conta essa exacerbação autoral da arquitetura atual, que tem levantado maiores dúvidas. Na verdade, as indicações do Documento de Madrid são bastante genéricas quanto aos limites da intervenção criativa contemporânea. Se na intervenção sobre as preexistências se advoga “fazer apenas tanto quanto seja necessário e tão pouco quanto possível”, as ampliações “devem desenhar-se respeitando a escala, a implantação, a composição, a proporção, a estrutura, os materiais, a textura e a cor do bem patrimonial”, devendo ser “reconhecíveis como elementos novos”, mantendo “a harmonia com a preexistência” e “complementando sem competir”.6 Apesar das deliberações consensuais sobre a salvaguarda do património moderno, pressente-se que a complexidade da prática da preservação não é


Apesar das deliberações consensuais sobre a salvaguarda do património moderno, pressente-se que a complexidade da prática da preservação não é facilmente enquadrável numa doutrina. Essa problematicidade lembra-nos que as intervenções contemporâneas sobre as obras dos mestres modernos implicam simultaneamente consideração e violência. Consideração pela vida que trazem aos edifícios, violência pelos processos de mudança que inevitavelmente implicam. Num certo sentido, conservação e transformação são duas faces da mesma moeda

FABG, Reconversão Estação de Serviço, Québec, 2011 • Renzo Piano, Extensão Museu de Arte Kimbell, Texas, 2007-13 • Andrés Jaque, Instalação Phantom, Barcelona, 2012-13

facilmente enquadrável numa doutrina. Essa problematicidade lembra-nos que as intervenções contemporâneas sobre as obras dos mestres modernos implicam simultaneamente consideração e violência. Consideração pela vida que trazem aos edifícios, violência pelos processos de mudança que inevitavelmente implicam. Num certo sentido, conservação e transformação são duas faces da mesma moeda.

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As intervenções contemporâneas em obras dos mestres modernos são dificilmente generalizáveis. Englobam um leque muito alargado de objetivos e estratégias que vão levantando novas situações e problemas. Por isso, a polémica tem sido inevitável mas salutar. Em primeiro lugar, temos os restauros de obras iconográficas da arquitetura moderna, normalmente associados a processos de musealização, com consequente perda da função original. São os casos do restauro da Ville Savoye de Le Corbusier e, mais recentemente, da casa Tugendhat de Mies. Por outro lado, as exemplares reabilitações do Sanatório de Zonnestraal de Duiker e da Fábrica Van Nelle de Brinkman & Van der Vlugt, ambas por Wessel de Jonge, assumem uma posição mais afirmativa devido à exigência de mudança de uso. Neste número, a renovação sensível da Casa de Férias dos Smithsons por Sergison Bates e a reconversão surpreendente para Centro Social da Estação de Serviço de Mies por FABG aproximam-se desta abordagem interventiva mais cautelosa. Em segundo lugar, temos as ampliações contemporâneas de obras modernas, que implicam por natureza uma ação criativa mais deliberada e visível. Confrontando dois atos e dois tempos criativos, o problema tende a resolver-se através da separação entre a obra original e a nova intervenção. Isto acontece no controverso mosteiro na Capela de Ronchamp de Le Corbusier por Renzo Piano (ver arqa #108), ou, neste número, na extensão significativa do Museu Kimbell de Louis Kahn por Renzo Piano; no polémico edifício de ampliação da Escola de Belas-Artes de Glasgow de Mackintosh por Steven Holl; na nova biblioteca no Centro Cívico de Seinajoki, projetado por Alvar Aalto, por JKMM; na recuperação de um Centro Comercial de Bakema e Van der Broek com ampliação de uma torre habitacional por Ibelings van Tilburg; e na reabilitação e ampliação da Escola Padre António Vieira de Ruy Jervis d’Athougia por Teresa Nunes da Ponte. Em terceiro lugar, temos

as intervenções que propõem uma apropriação criativa da preexistência moderna, transformando a sua condição objetual ou territorial. Nestes casos, a intervenção assume uma dimensão mais radical, evidenciando a premência do ato criativo contemporâneo. Se a extensão da Casa Breuer por Toshiko Mori evidencia esse posicionamento afirmativo mas sensivelmente respeitador, inversamente, o centro universitário no célebre plano do IIT de Mies pelo OMA, apresentado neste número, assume uma atitude mais conceptual e crítica da intervenção sobre o património moderno. Por último, temos intervenções dificilmente enquadráveis pelas políticas patrimoniais, que lançam novas questões sobre a herança da arquitetura moderna. São os casos da histórica reconstrução do Pavilhão de Barcelona de Mies e da construção tardia da Wall House de John Hejduk. Mas este é também o caso do recente Modelo à escala natural do Clube de Golfe de Mies por Robrecht en Daem (ver arqa #108) ou da reconstrução minimal de Bruno Fiorette Marquez das casas dos mestres da Bauhaus, projetadas por Walter Gropius mas destruídas nos bombardeamentos da Segunda Guerra Mundial. Todas estas intervenções extremas apontam novos territórios que desconstroem as nossas certezas acerca da intervenção nas obras dos mestres modernos, algo que também se pode vislumbrar na instalação efémera de Andrés Jaques no Pavilhão de Barcelona, apresentada neste número. n Manfredo Tafuri. Teorias e História da Arquitectura (1968). Lisboa: Presença, 1988, p. 31. Wessel de Jonge. «Three Modern Preservation Cases», tradução livre. in http://www. wesseldejonge.nl/media/downloads/Three%20Modern%20Preservation%20Cases_ research%20ENG.pdf 3 Sheridan Burke. «Foreword to the Madrid Document», ICOMOS / International Scientific Committee on Twentieth Century Heritage, 2011, http://icomos-isc20c.org/sitebuildercontent/sitebuilderfiles/MDversionportugese.pdf 4 Benedetto di Cristina. «Two or Three Things I Know about Conservation of Modern Buildings», in Vicenzo Riso (edit.), Modern Building Reuse: Documentation, Maintenance, Recovery and Renewal. Guimarães: Escola de Arquitectura da Universidade do Minho, 2014, p.24, tradução livre. 5 Organising Comitee. «Introduction», in Proceedings of the 10th International DOCOMOMO Conference - The Challenge of Change: Dealing with the Legacy of the Modern Movement, Delft: IOS Press, 2008, p. xv, tradução livre. 6 Ver ICOMOS / ISC20C, Documento de Madrid 2011, tradução livre, http://icomosisc20c.org/sitebuildercontent/sitebuilderfiles/MDversionportugese.pdf 1 2

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PROJETOS

biografias

TERESA NUNES DA PONTE (n.1955, Lisboa) diplomou-se na ESBAL em 1978 e coordena o atelier Teresa Nunes da Ponte, Arquitectura, desde 1988. O atelier dedica-se a projetos de restauro e reabilitação, com especial incidência em património e revitalização urbana, realizando ainda obra nova, desenho de exposições, mobiliário e objetos. Colabora com a Fundação da Casa de Mateus desde 1986 e com a Fundação Calouste Gulbenkian a partir de 1999. Realizou projetos para o Convento de São Francisco em Vila Franca do Campo, em São Miguel, o Museu Municipal de Portalegre ou a Escola de Hotelaria e Turismo de Setúbal no Baluarte do Cais. Recentemente foi-lhe atribuído o Prémio Vilalva 2013 ao Museu do Caramulo. www.tnp.pt JKMM Architects foi fundado em 1998 por Asmo Jaaksi, Teemu Kurkela, Samuli Miettinen e Juha Mäki-Jyllilä. Iniciaram os seus estudos em meados de ‘80 e desde o início a inovação arquitetónica tem sido o mote do seu trabalho. O seu objetivo é realizar arquitetura com excepcional qualidade e técnica. Em 15 anos o estúdio tem vindo a crescer, contando hoje com mais de 30 profissionais. Os arquitetoa operam ativamente em diversas áreas e escalas da arquitetura de edifícios, interiores, mobiliário, ambientes urbanos e também em reabilitação. Os seus projetos refletem os valores e a estética escandinava. Atualmente JKMM Architects projeta a sede de Alma Media na área da baía de Töölönlahti, Paul Stradins University Hospital em Riga e unidade de habitação para desalojados em Helsínquia. Os seus trabalhos recentes incluem a igreja de madeira em Viikki, a biblioteca da cidade de Turku e o Verkatehdas Factory Cultural Center em Hämeenlinna; os edifícios anexos da Joensuu University; O pavilhão Finlandês para a Shanghai EXPO 2010 e a casa para crianças Saunalahti. www.jkmm.fi

OMA é uma das mais importantes sociedades internacionais na área da arquitetura, urbanismo e análise. Os seus edifícios e planos gerais realizados em diversas partes do mundo insistem em formas inteligentes ao mesmo tempo que propõem novas possibilidades de conteúdo e usos diários. OMA tem 6 sócios - Rem Koolhaas, Ellen van Loon, Reinier de Graaf, Shohei Shigematsu, Iyad Alsaka e David Gianotten - e consiste numa prática internacional, com escritórios em Roterdão, Nova Iorque, Hong Kong, Pequim e Doha. Em 2014 completaram o projeto G-Star Headquarters em Amsterdão, e o grupo de edifícios ainda em construção inclui o Taipei Performing Arts Centre; 3 edifícios em Doha, Qatar; a Bibliothèque Multimédia à Vocation Régionale, uma biblioteca pública de 4 pisos em Caen; e Bryghusprojektet em Copenhaga, um projeto de uso misto que acolhe a nova sede do Danish Architecture Centre. www.oma.eu

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FABG (Les Architectes Faucher Aubertin Brodeur Gauthier) é um atelier sediado em Montreal. Entre os seus projetos recentes estão: a extensão e renovação do Cinéma Excentris, Montreal; o Théâtre La Licorne, Montreal (2010); o Centre Culturel de Drummonville, Concepteur (2010); a Maison du Festival de Jazz, Montreal (2009) ou o Théâtre de Quat’sous, Montreal (2009). O atelier tem grande volume de trabalho na área cultural, contando com o projeto de diferentes estruturas para o Cirque du Soleil, como escritórios, ateliers de artistas ou oficinas para cenários e fatos. Éric Gauthier, o sócio responsável pelo projeto apresentado, tem formação em arquitetura na Université Laval (1983). www.arch-fabg.com

IBELINGS VAN TILBURG Architecten é dirigido por Marc Ibelings (na foto) e Aat van Tilburg. O escritório data de 1994 e está sedeado em Roterdão, na Holanda. Elaboram projetos de habitação, escritórios, escolas e também edifícios para municípios, para a indústria e para bombeiros. Entre os vários projetos do atelier contam com a sede de escritórios da Mercedes Benz em Utrecht; o edifício de escritórios Facet em Utrecht; Sede da Capgemini em Utrecht; a escola Kohnstamm-ensemble Hogeschool van Amsterdam, Roc Mondriaan Leidschenveen, em Haia; os edifícios de habitação ’t Leliepark em Gouda, de Contabas Schiedam, de Karel Doorman Rotterdam. www.ibelingsvantilburg.nl


Mark Heitoff

SERGISON BATES Architects foi fundado em 1996, sendo hoje um dos principais escritórios no Reino Unido. A sua perpectiva é internacional e também a sua equipa. Abriram um segundop estúdio em Zurique em 2010 e estão atualmente envolvidos numa ampla variedade de projetos internacionais que vão do planeamento urbano à reabilitação, edifícios públicos e habitação. O escritório compromete-se numa abordagem com base na pesquisa, apoiada pela atividade académica dos sócios. Jonathan Sergison é professor de Architectural Design na Accademia di Architettura de Mendrisio, Stephen Bates é professor de Urbanismo na TU München, e juntos são professores convidados na Graduate School of Design em Harvard. Muitos dos seus edifícios foram distinguidos internacionalmente, tal como por 3 RIBA Awards e o escritório foi premiado com as Erich Schelling e Heinrich Tessenow Medals for Architecture em 2006. O seu trabalho fez parte da Bienal de Arquitetura de Veneza em 2008 e 2012. www.sergisonbates.co.uk

RENZO PIANO nasceu em Génova, em 1937, numa família de construtores, desenvolvendo fortes ligações com a cidade e o porto e com a profissão do seu pai. Após a licenciatura no Politécnico de Milão, iniciou experiências com estruturas leves, móveis e temporárias. Entre 1965 e 1970 fez diversas viagens à Grã-Bretanha e EUA. Em 1971, abriu o escritório Piano & Rogers em Londres, com Richard Rogers, vencedor do concurso para o Centro Pompidou. Nesta sequência mudou-se para Paris. Desde início dos anos 70 até aos 90, trabalhou com o engenheiro Peter Rice, partilhando o Atelier Piano & Rice de 1977 a 1981. Em 1981, estabeleceu o Renzo Piano Building Workshop com cerca de 150 colaboradores e escritórios em Paris, Génova e Nova Iorque. Entre as distinções que obteve estão a Royal Gold Medal da RIBA (Londres 1989); o Kyoto Prize em Kyoto, (Japão 1990); o Neutral Prize em Pomona, (Califórnia 1991); a Godwill Ambassador da UNESCO (1994); o Praemium Imperiale em Toquio (Japão 1995), o Erasmus Prize (Amsterdão 1995); o Pritzker Prize (Washington 1998); o Leão de Ouro carreira da Bienal de Veneza 2000; a Gold Medal AIA (Washington 2008) ou o Sonning Prize (Copenhaga 2009). Desde 2004 que também trabalha para a Renzo Piano Foundation, uma organização sem fins lucrativos para a promoção da profissão de arquiteto através de atividades e programas educativos, com sede em Punta Nave (Génova) desde 2008. www.rpbw.com

Luis Diaz Diaz

Edward Tyler

STEVEN HOLL (Bremerton, Washington, 1947) é arquiteto pela Universidade de Washington com estudos em Roma, em 1970. Em 1976 junta-se à Architectural Association de Londres e estabelece o Steven Holl Architects, em Nova Iorque. Considerado um dos arquitectos americanos mais importantes, Steven Holl é reconhecido pela sua habilidade em explorar espaço e luz, com grande sensibilidade contextual, e utilizar as qualidades únicas de cada projeto para criar um conceito de design dirigido. Especializa-se em integrar novos projetos em contextos com particular importância cultural e histórica. Realizou projetos culturais, cívicos, académicos e residenciais nos EUA e internacionalmente. Entre os seus trabalhos estão os projetos Horizontal Skyscraper em Shenzhen, na China; o Knut Hamsun Center em Hamarøy, na Noruega; o Herning Museum of Contemporary Art em Herning, na Dinamarca; o Linked Hybrid em Pequim (2009); o Kiasma Museum of Contemporary Art em Helsínquia (1998) ou o Sarphatistraat Offices em Amsterdão (2000). A sua obra tem sido galardoada com prestigiados prémios, nomeadamente o Arts Award da BBVA Foundation Frontiers of Knowledge Awards, o 2010 P/A Award para o LM Harbor Gateway ou o AIA NY 2008 Sustainable Design Award para o edifício Linked Hybrid. É professor na Escola de Arquitectura e Planeamento da Universidade Columbia de Nova Iorque. www.stevenholl.com

ANDRÉS JAQUE é arquiteto pela ETSAM e Tessenow Stipendiat - Alfred Toepfer Stiftung, Hamburgo 1998-99. É professor na SoA Princeton University, Nova Jersey. Lecionou também na ETSAM - UPM Madrid; GSAPP - Columbia University, Nova Iorque; UA, Alicante; Bezalel Academy, Tel Aviv. Com o Office for Political Innovation, do qual é fundador, explora o potencial de políticas pós-fundacionais e de abordagens simétricas à sociologia da tecnologia para repensar as práticas arquitetónicas. O slogan do escritório é ‘ARCHITECTURE IS TECHNOLOGICALLY RENDERED SOCIETY’ e está atualmente dedicado ao estudo de “connecteddomestcites” e urbanismos politicamente ativos. www.andresjaque.net

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PROJETOS

EUA

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OMA

Centro Universitรกrio McCormick Tribune, Plano IIT de Mies van der Rohe, Chicago

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Philippe Ruault

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PROJETOS

EUA

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Renzo Piano

Extens達o do Museu de Arte Kimbell de Louis Kahn, Fort Worth, Texas

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PROJETOS

Reino Unido

Steven Holl

Ampliação Seona Reid da Escola de Arte de C. R. Mackintosh, Glasgow

Arquitetura: Steven Holl Architects - Steven Holl, Chris McVoy (conceção); Chris McVoy, Noah Yaffe (sócios responsáveis); Dominik Sigg (projeto); Dimitra Tsachrelia (assistência de projeto); Rychiee Espinosa, Scott Fredricks, JongSeo Lee, Jackie Luk, Fiorenza Matteoni, Ebbie Wisecarver (equipa de projeto); Dominik Sigg, Peter Adams, Rychiee Espinosa (concurso) Arquitetos Associados: JM Architects - Henry McKeown (direção); Craig Tait (projeto); Paul Twynam, Vicky Batters (arquitetos), Ian Alexander (direção de projeto, concurso) Cliente: The Glasgow School of Art - David Miller, Eleanor McAllister, Douglas Anderson, Heather Gemmell (gestão de projeto), Megan Green (administração de projeto), Ian Jones (apoio gestão projeto), Stuart Miller (assistência à gestão projeto), Mike Sharp (coordenação académica) Gestão de projeto: Turner & Townsend Empreiteiro geral: Sir Robert McAlpine Engenharia: Ove Arup & Partners Medições: Turner & Townsend Coordenação cdm: Cyril Sweett Arquitetura paisagista: Michael Van Valkenburgh and Associates Planeamento: Turley Associates Área: 11.250m2 Datas: 2009 - 2014 Texto: Steven Holl Architects Fotografia: Iwan Baan

O Edifício Seona Reid contrasta complementarmente, com a Escola de Arte de Glasgow de Charles Rennie Mackintosh, de 1909 - forjando uma relação simbiótica em que cada estrutura aumenta as características integrantes da outra. Uma fina materialidade translúcida, considera-se um contraste face à alvenaria do edifício de Mackintosh - volumes de luz que expressam a atividade da escola no tecido urbano, simbolizando uma vida voltada para o futuro, para as artes. As forças interiores e exteriores únicas deste projeto são catalisadoras da criação de um novo modelo do século XXI para a escola de arte. Trabalhando, em simultâneo, de dentro para fora - combinando as necessidades funcionais e os desejos psicológicos do programa - e de fora para dentro - fazendo ligações com o campus, e relacionando-se com o edifício de Mackintosh, em frente - o projeto personifica as aspirações da escola no tecido da cidade. A incrível manipulação inventiva de Mackintosh nas entradas de luz no edifício, inspirou a nossa abordagem através de um plano de volumes, com diferentes entradas de luz. O estúdio/oficina é o bloco base de construção do edifício. A localização dos espaços foi definida não só para refletir as suas relações de interdependência, mas também as diferentes necessidades de luz natural. Os estúdios estão posicionados na fachada norte, com grandes superfícies envidraçadas inclinadas, viradas a norte, para maximizar o

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acesso à desejada qualidade da luz difusa do norte. Espaços que não têm necessidade da mesma qualidade de luz natural, como o refeitório e escritórios, estão localizados na fachada sul, onde o acesso à luz solar pode ser equilibrado com as necessidades dos ocupantes e o desempenho térmico do espaço é regulado com a aplicação de sombreamento . “Vazios de luz dirigidos” permitem a integração da estrutura, a modulação espacial e a luz. Os poços de “vazio dirigido” de luz levam a luz natural até ao fundo do edifício, permitindo a ligação direta com o mundo exterior, através da intensidade e da mudança de cor do céu. Além disso, estes vazios permitem a circulação vertical através do edifício, eliminando a necessidade de ar condicionado. Ao longo da fachada sul, à mesma altura dos estúdios principais de Mackintosh, uma loggia sobre a envolvente, na forma de Machair, dá à escola um núcleo social exterior, aberto para a cidade. A vegetação natural, com algumas pedras trabalhadas, conduzem a água a uma pequena lagoa de água de reciclagem, que reflete a luz solar em manchas no teto interior. Um “circuito de ligação” através da nova GSA incentiva a “abrasão criativa” através e entre departamentos, que é fundamental para o funcionamento da escola. O circuito aberto de rampas escalonadas liga todos os grandes espaços - átrio de entrada, espaço de exposições, salas de projeto, auditório, salas de seminários, estúdios, oficinas e terraços verdes para encontros informais e exposições. n


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PROJETOS

Finlândia

JKMM

Biblioteca Municipal, Centro Administrativo e Cultural de Alvar Aalto, Seinäjoki

Arquitetura: JKMM Architects, Asmo Jaaksi (responsável) Equipa: Teemu Kurkela, Samuli Miettinen, Juha Mäki-Jyllilä, Aaro Martikainen, Teemu Toivio (arquitetos), Harri Lindberg (estudante arquitetura), Päivi Meuronen (interiores) Morada: Alvar Aallon katu 14, 60100 Seinäjoki Cliente: Cidade de Seinäjoki Estruturas: Magnus Malmberg Oy / Eero Pekkari HPAC design: Ylitalo Oy / Pekka Nykänen

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Eletricidade: Satakunnan Insinöörikeskus Oy / Lauri Levo Construtores: Rakennusliike Timo Nyyssölä Oy (geral); Jalasjärven Sähköasennus Oy (eletricidade); Lakeuden ilmastointi Oy (ar condicionado); Pohjanmaan Putki Oy (águas e esgotos) Datas: 2009-2012 Área: 4.430 m2 (bruto) Texto: Asmo Jaaksi Fotografia: Mika Huisman; Tuomas Uusheimo, Hannu Vallas


Implantação - Centro adimistrativo e cultural Seinäjoki

Mika Huisman

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Holanda

Ibelings van Tilburg

Ampliação do Edifício Ter Muelen de Van der Broek e Bakema, Roterdão

Arquitetura: Aat van Tilburg , Marc Ibelings Colaboração: Marcel Vermeer, Jessica Scholtes Cliente: DW Nieuwbouw, Roterdão Localização: Binnenwegplein, Roterdão Empreiteiro: van Wijnen Dordrecht, Dordrecht Construtor: Royal Haskoning DHV, Den Haag Consultor: Peutz Associes, Zoetermeer Consultor estática: TNO, Delft Instalações: Wichers & Dreef, Badhoevedorp Área: 10.500 m2 (lojas); 4.000 m2 (estacionamento) Datas: junho 2006 (início construção); junho 2010 (reinício); novembro 2012 (conclusão) Texto: Ibelings van Tilburg Fotografia: Ibelings van Tilburg architecten; Ossip van Duivenbode, Roterdão; Iemke Ruige, Amstelveen; J. Versnel en J.F.H. Roovers (fotografias históricas)

Um novo edifício residencial de 70 metros de altura que inclui 114 apartamentos, é acrescentado ao edifício comercial Ter Meulen, em Roterdão. Este é um projeto invulgar, uma vez que o novo edifício repousa, literalmente, sobre os pilares e fundações da estrutura existente. Os únicos acrescentos são dois poços de elevador em betão que, em simultâneo, permitem estabilidade. A técnica construtiva é pouco convencional para um projeto na Holanda, uma vez que a estrutura principal é em aço, em vez de materiais pesados ​​como o betão ou a pedra calcária. O edifício existente é reabilitado de acordo com o original e, novamente, abriga 3 pisos comerciais. O parqueamento está localizado no segundo piso e na cobertura do edifício Ter Meulen existente. Uma abordagem respeitosa O edifício Ter Meulen tem um lugar especial no coração dos habitantes de Roterdão. Foi construído em 1948, como um centro comercial de Ter Meulen, Wassen e Van Vorst e projetado por Van den Broek e Bakema. Com amplas fachadas envidraçadas o edifício foi notável no seu tempo, pela sua aparência transparente. O atelier Ibelings Van Tilburg architecten propôs o restauro do edifício Ter Meulen de acordo com o seu original. Ambos os pisos, adicionados em 1977, foram demolidas para dar lugar ao novo edifício de apartamentos. Uma abordagem respeitosa é o ponto de partida para o trabalho de reabilitação, bem como para o projeto do edifício residencial. Enquanto que o edifício Ter Meulen em si é reabilitado para as condições originais, o projeto para o novo acrescento é abstrato. O novo edifício de apartamentos é composto por uma pele externa envidraçada, impressa. As loggias e galerias estão localizadas por detrás do escudo de vidro. A fachada dos próprios apartamentos é revestida com pinho Oregon. Um dos efeitos sobre o meio ambiente de acrescentar pisos é óbvio: o edifício original é salvo da demolição e, portanto, os desperdícios são evitados. Acrescentar pisos acima da cobertura é também uma forma intensiva de utilização do espaço, a cobertura é agora usada como “segundo” nível de superfície. Além disso, os novos pisos dão valor acrescentado, em termos urbanos.

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Programa As lojas estão localizadas na cave, no piso 0 e no piso 1, numa área total de comércio de 12.450m2 . Utilizando os elevadores de automóveis, os condutores podem estacionar no piso 2 (com a sua mezzanine) ou na cobertura. Podem ser estacionados 156 carros no interior do edifício. Os 114 apartamentos estão distribuídos por sete pisos interligados. Nove pisos na torre ocidental e seis na torre leste. Um jardim protegido na cobertura, para uso comum, está localizado no 10 º piso (a 40m se altura), entre os dois volumes. n

J. Versnel en J.F.H. Roovers (fotografias históricas)

PROJETOS


Ossip van Duivenbode

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PROJETOS

Canadá

FABG

Reconversão de Estação de Serviço de Mies van der Rohe, Verdun, Québec

Arquitetura: Les architectes FABG - Éric Gauthier (responsável) Equipa: Marc Paradis, Dominique Potvin, Jaime Lopez, Steve Montpetit Engenharia de estrutura, mecânica e elétrica: Aecom Construtor: Norgéreq Localização: 201 rue Berlioz, Verdun, Québec, H3E 1C1 Cliente: Arrondissement de Verdun – Jean-Pierre Gauthier (gestão de projeto) Orçamento: 1.4 M$ Data: setembro 2011 Texto: Les architectes FABG Fotografia: Steve Montpetit

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PROJETOS

Portugal

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Teresa Nunes da Ponte

Remodelação e Ampliação da Escola Padre António Vieira de Ruy d’Athouguia


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PROJETOS

Reino Unido

Sergison Bates

Reabilitação do Solar Pavilion de Alison e Peter Smithson, Upper Lawn, Wiltshire

Arquitetura: Sergison Bates architects Equipa: Jonathan Sergison, Stephen Bates, Mark Tuff, Timo Keller Engenharia: Greig Ling Consulting Engineers Cliente: Ian e Jo Cartlidge Datas: 2002-2004 Área: 62 m2 Texto: Sergison Bates architects Fotografia: Ioana Marinescu, Ian Cartlidge

Ioana Marinescu

O Solar Pavillion em Upper Lawn, foi projetado por Alison e por Peter Smithson em 1958 e utilizado como a sua casa de família para fim de semana, entre 1961 e 1982. O edifício reutiliza o muro de pedra de uma antiga casa de trabalhadores do campo e foi construído como uma estrutura em madeira modificada, assente numa parede de alvenaria, e dando-lhe estabilidade lateral através da ligação à empena da velha chaminé, a meio. O edifício balança sobre uma nova viga de betão assente, ao centro, na parede da chaminé e apoiada em pilares de betão nas extremidades. Os acabamentos de madeira são em pinho no interior e em teca no exterior, onde as aberturas do primeiro piso se apiam em faixas revestidas a teca. As superfícies são revestidas de folha de alumínio. Ao nível térreo, a casa abre para o jardim pavimentado, com portas duplas. Uma escada vertical liga ao piso superior, cuja mobília é

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composta apenas por colchões e almofadas. “O pavilhão foi concebido como um equipamento cujos padrões de habitação poderiam mudar ... um conjunto de salas e pequenos espaços de jardim, que poderiam ser adaptados às estações do ano, aos padrões de utilização de uma família, às mudanças das sensibilidades de cada um”, escreveram os Smithsons. Os novos proprietários contrataram-nos para restaurar e atualizar, discretamente, o revestimento e o interior. O jardim foi reabilitado de acordo com o original e o terraço aberto, inicialmente usado para refeições no exterior, foi devolvido à sua utilização. O tijolo e pedra do pavimento foram recolocados em torno de uma nova superfície de betão que é a base para uma mesa de 2x2,5m de betão branco, com cimento de pedra Portland local, branca, realizada in-situ. No interior, o piso radiante foi instalado no primeiro piso da construção, os vidros de todas as janelas foram substituídos por painéis individuais de grande desempenho energético e as portas do piso térreo foram restauradas para a sua configuração original, de batente e de correr. Foi instalado um novo sistema linear de iluminação tubular de tungsténio e introduzidos novos móveis para substituir a cozinha, prateleiras e o banco de estar. Todos os materiais e detalhes existentes foram ajustados, limpos ou restaurados para a sua expressão inicial. n


Ioana Marinescu

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PROJETOS

Espanha

Andrés Jaque

Intervenção PHANTOM, Pavilhão Mies van der Rohe, Barcelona

Projeto: Andrés Jaque/ Office for Political Innovation Design, coordenação e edição: Paola Pardo, Ana Olmedo, Ruggero Agnolutto, Roberto González, Jorge López Conde, William Mondejar, Silvia Rodríguez, Dagmar Stéeova, Paloma Villarmea Desgin gáfico: spread.eu.com Colaboração: equipa da Fundació Mies van der Rohe Datas: 12.2012 - 02.2013 Texto: Andrés Jaque/ Office for Political Innovation Fotografia: Andrés Jaque/ Office for Political Innovation

PHANTOM. Mies as Rendered Society é uma intervenção de Andrés Jaque no Pavilhão de Barcelona, como resultado da investigação levada a cabo ao longo dos últimos dois anos, a convite das Fundações Mies van der Rohe e Banc Sabadell. Uma parte significativa dos itens que estão guardados na cave do Pavilhão, em segurança, foram distribuídos em diferentes locais, por todo o espaço do Pavilhão. Esta cave é apresentada como o fantasma do Pavilhão (Phantom) e nunca tinha antes chamado a atenção dos visitantes do Pavilhão, mas Jaque reconhece-lhe um papel importante no surgimento da sua arquitetura, como um tipo social de construção. A equipa responsável pela reconstrução do Pavilhão de 1929 pensava que a cave facilitaria o controle e manutenção das instalações. Decidiu também que a entrada devia ser dificultada, de modo a evitar o seu uso futuro como espaço de exposição, onde Mies e o Pavilhão seriam explicados. No final, a cave foi usada para armazenar todos os materiais, testemunho que dá conta do tecido social envolvido num projeto partilhado: todos os dias a reinterpretar a manhã de maio em que o Pavilhão de 1929 abriu ao público, pela primeira vez. n

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ENTREVISTA

arquitetura

Revisitações Modernas

Perspetivas críticas sobre a intervenção no património arquitetónico moderno

Luís Santiago Baptista Paula Melâneo

Ana Tostões

Arquiteta, Presidente DOCOMOMO Internacional, Professora IST

© Márcia Lessa – FCG, 2013

arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? AT: Hoje em dia o fascínio pelas obras modernas é crescente. De Los Angeles, Califórnia, da referência aos Eames, Neutra ou Shindler, à Lisboa de Athouguia ou de Nuno Teotónio Pereira, da Neues Frankfurt de Ernst May ao Porto de Távora e Viana de Lima ou Losa, da São Paulo de Lina, às obras de Artigas, Korngold ou Libeskind, para não falar do Rio de Niemeyer e Reidy, a Macau de Chorão Ramalho ou de Manuel Vicente, são cada vez mais os admiradores da arquitetura do Movimento Moderno. Como sabe o DOCOMOMO (the international committee for the documentation and conservation of buildings, sites and neighborhoods of the modern movement) foi criado em 1988, em Eindhoven, justamente para difundir a missão da Arquitetura do Movimento Moderno ao público, às autoridades, aos profissionais e à comunidade educativa, com o objetivo de identificar e promover o registo através de desenhos, fotografias, e outros documentos destas obras muitas das vezes esquecidas. Paralelamente, o DOCOMOMO constitui-se como o fórum que reúne especialistas interessados na teoria, na prática, na discussão dos métodos de conservação e das técnicas adequadas à reabilitação e à reutilização destas obras. Finalmente tem por missão opor-se e resistir à destruição e à desfiguração de obras significativas encontrando alternativas na convicção que na resiliência desta arquitetura, o seu reuso constitui passo para o futuro sustentável que desejamos para todos. 25 anos passados desde a fundação do DOCOMOMO, estamos a publicar o Docomomo Journal 50 e a realizar em Seoul, Coreia do Sul, a 13ª Conferência Internacional. Esta dinâmica também pode ser vista através

Pedro Cid, Alberto Pessoa e Ruy Jervis D’Athouguia, Grande auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1969 (Projeto de reabilitação de Teresa Nunes da Ponte, 2013)

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dos 70 países que hoje, em 2014, passaram a integrar a fantástica rede DOCOMOMO. Nesse quadro tenho tido o privilégio de acompanhar intervenções que podem ser divididas entre aquelas que mantêm o uso e as que o alteram. As que mantêm enfim, a função original embora sempre adaptada ao longo dos anos, correspondem essencialmente a atualizações que surgem da necessidade de renovação técnica. Nesse grupo podemos considerar por exemplo a recente obra de restauro e renovação do Grande Auditório da Fundação Calouste Gulbenkian (Alberto Pessoa, Pedro Cid, Ruy Athouguia, 1959-1969), intervencionado por uma equipa multidisciplinar de alta competência técnica, com projeto de arquitetura do atelier Teresa Nunes da Ponte. Tratou-se de uma intervenção fundamentalmente de restauro, muito conservadora do ponto de vista formal, uma vez que se assumiram apenas as alterações essenciais relativas a aspetos técnicos de segurança e regulamentares, às condições performativas da cena e à ampliação das possibilidades de utilização e de usufruto do público. Assumiu-se o respeito absoluto pelas regras da conceção original e pelos princípios da construção existente. Nos casos em que as alterações de desenho foram imperativas, optouse por soluções contemporâneas inspiradas e pautadas pelas regras do projeto original. Encontramos o mesmo tipo de abordagem na reabilitação da Biblioteca de Viipuri (Alvar Aalto, 1927-1935) e na reabilitação agora em curso da Casa de chá da Boa-Nova, em Leça da Palmeira, conduzida pela segunda vez pelo próprio autor, facto extraordinário pelo respeito que o autor, Álvaro Siza tem pela obra. Existem, no entanto, muitas estruturas arquitetónicas cuja função ao longo dos tempos se torna obsoleta. É o caso da Fábrica Van Nelle (Brinkman & Van Vlugt, 1925-1931). Projetada com base no princípio de que um espaço de trabalho moderno e saudável, em ambiente verde, constituiria um fator de produtividade para os trabalhadores, a fábrica constitui um ícone para o desenvolvimento da arquitetura moderna na Europa. Depois do fecho da fábrica, o edifício entrou em decadência até ter sido reabilitado por Wessel de Jonge em 1999, através de uma reutilização adaptativa que ganhou o Prémio Europa Nostra em 2009. Através de novas soluções que garantissem o bom desempenho climático do espaço e a criação de uma luminosidade e de um ambiente adequados à nova função de trabalho, o arquiteto optou por conservar as estruturas e fachadas no seu aspeto original – trata-se de um edifício desenhado com bons materiais e construído para durar – e adicionar assumidamente os novos elementos, como são os módulos independentes destinados a unidades de trabalho, incluídos no interior da fábrica. Muitos também são os casos que sofreram adulterações ao longo dos tempos, com camadas sucessivas, desconexas, em que a proposta de intervenção sugere uma reaproximação ao projeto original. É o caso da Casa Tugendhat (Mies van der Rohe e Lilly Reich, Brno, Républica Checa, 1929-1930). Classificada pela UNESCO em 2011 como Património Mundial, a opção de reposição e de eliminação das histórias do entretanto é justificada por constituir um projeto com um caráter quase de culto na história da arquitetura moderna, conhecido por ser a primeira residência com um esqueleto de aço a permitir a planta livre. A intervenção permitiu que este projeto seja provavelmente a obra do arquiteto Mies van der


© Ana Tostões, 2013 © FG+SG

© Ana Tostões, 2013

Charles e Ray Eames, Eames House, Case Study House #8, Los Angeles, Califórnia, 1949

Lina Bo Bardi, Casa de Lina, São Paulo, Brasil, 1951

Álvaro Siza Vieira, Casa de Chá, Matosinhos, 1963

Rohe, na Europa, mais próxima da autenticidade do projeto original. Uma vez que falamos de uma casa museu, o objetivo já não é o de preservar a função original com o intuito de a tornar ou manter operativa. Enquanto monumento acessível, a função torna-se a de servir de lição e representar uma marca na história da arquitetura e da engenharia modernas. Algo de semelhante se passou com o apartamento 1/11 da Casa Bloc do GATPAC (1933) em Barcelona. Existem ainda os projetos em que por necessidade de adaptação às exigências atuais de segurança, como é o caso do Museu Nacional de Arte Ocidental (Le Corbusier, Uenokoen, Tóquio, 1959), foi necessário conceber um extraordinário reforço sísmico através do recalçamento das sapatas da estrutura com borracha.

AT: Pode equilibrar-se com bom senso, sempre. Na verdade, digamos que são muito raras as obras em que podemos afirmar que o seu estado é “original”. A passagem do tempo deixa lastro, cicatrizes, envelhecimento, mas também carácter, densidade, personalidade. A passagem do tempo implica manutenção, adaptação e muitas das vezes transformação. Por exemplo, a questão do desempenho energético ou da segurança contra sismos são matéria a que é necessário responder hoje com parâmetros de maior exigência do que há 50 anos. Creio que quando somos levados a intervir, “temos de pensar naquilo que eles (os modernos) ainda não eram capazes de fazer”, como diria Wessel de Jonge. Penso que a criatividade pode estar precisamente no momento do equilíbrio entre o existente e o novo, com audácia e sem medo, permitindo transformar com um bom senso que seja mais do que inovação pela inovação. A criatividade está em conseguir-se ponderação: responder ao presente, sem comprometer a manutenção daquilo que é necessário preservar, saber eliminar o

arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea?

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Penso que a criatividade pode estar precisamente no momento do equilíbrio entre o existente e o novo, com audácia e sem medo, permitindo transformar com um bom senso que seja mais do que inovação pela inovação. A criatividade está em conseguir-se ponderação: responder ao presente, sem comprometer a manutenção daquilo que é necessário preservar, saber eliminar o supérfluo e manter o essencial Ana Tostões

arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados? AT: Maxwell Fry (1899-1987) e Jane Drew (1911-1996), casal de arquitetos britânicos que trabalharam nos trópicos, descreveram a arquitetura moderna da seguinte forma: “Modern architecture is distinguished by nothing so much as its determination not to turn aside from science and the effects of science, but to enter into them and wring from them a solution of value to humanity. Modern architecture and its extension into town planning, has above all this task of interpreting applied science in humanistic terms. Of making industrialism fit for human use; building cities that ennoble life instead of degrading and destroying it; and of creating everywhere, out of the disparate and anti-social manifestations of machine production and centralised power, unities of resolved thought and feeling, in the form of buildings, groups of buildings and larger aggregations, in which life may know its bounds and flourish”. O Movimento Moderno, frequente e erroneamente confundido com um estilo, sempre teve como princípio a criação de um mundo melhor. Posto isto, grande parte da arquitetura moderna conteve na sua origem as devidas relações com os seus entornos sociais, económicos e geográficos. Da mesma forma, acredito que a arquitetura moderna de qualidade contem em si a possibilidade de se adaptar a novas realidades em mutação com as quais se tenha a vir de relacionar. Trata-se de assumir uma atitude honesta perante o presente. Vejamos, por exemplo, os casos de Angola e Moçambique. São territórios densamente pontuados de arquitetura moderna de uma qualidade incrível. Projetada de forma a responder aos índices de conforto dos climas e culturas tropicais, falamos de arquiteturas que foram apropriadas pelas populações locais

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© Ana Tostões, 2010

supérfluo e manter o essencial. Mesmo quando é inevitável a construção de um novo edifício, os edifícios antigos oferecem-nos necessariamente sugestões de soluções para os problemas sociais, técnicos e estéticos. Assumem-me como lições de experiência acumulada e que ultrapassaram – ou não – o teste do tempo. Há que entender essa experiência como um recurso de conhecimento e dizer que sim àquilo que funciona e não àquilo que não resultou. O projeto do Complexo habitacional do Lignon (Georges Addor, Dominique Julliard, Louis Payot, Jacques Bolliger, 1963-1971) é um exemplo de equilíbrio entre o respeito pela obra original e a necessidade de atualização para responder aos parâmetros de conforto e energia contemporâneos, coordenado com uma brilhante criatividade contemporânea. Confrontado com as exigências atuais de redução do consumo de energia, foi realizado um projeto-piloto na área da “conservação e da melhoria térmica” das fachadas do complexo habitacional Suíço, a partir da mínima intervenção visual. Realizado pelo Laboratório de Técnicas e Preservação da Arquitetura Moderna da École Polytechnique Fédérale de Lausanne, o objetivo do projeto foi o de introduzir medidas que permitissem conservar a pele exterior existente dos edifícios, garantindo em simultâneo os padrões de energia necessários.

Arménio Losa e Cassiano Barbosa, Fábrica Monteiro & Giro, Quelimane, Moçambique

de um modo que comprovam a sua vocação para responder às exigências socioculturais e ambientais destes territórios, através de soluções que permanecem ainda hoje válidas. Nesses mesmos territórios assiste-se hoje à substituição desde património moderno e da comunidade que o usa por novas estruturas descontextualizadas, sem identidade, nem quaisquer preocupações de desempenho energético. A minha convicção é que estes edifícios constituem ainda soluções rentáveis e flexíveis, capazes de se adaptarem a usos contemporâneos, da mesma forma como o foram ao longo da sua existência. Acredito no reuso do património arquitetónico moderno como um dos conceitos-chave para uma via de desenvolvimento sustentável. O DOCOMOMO Internacional que presido desde 2010 e agora sediado em Lisboa, no Instituto Superior Técnico, constitui precisamente uma plataforma de investigadores (arquitetos, urbanistas, designers, engenheiros, juristas, historiadores de arte, etc.) que trabalham sobre a atualidade do Movimento Moderno e o seu valor como um património à escala mundial promovendo a Reutilização das estruturas da cidade contemporânea. n


Apoio a ideia de que, para muitos edifícios a melhor estratégia de sobrevivência é transformá-los e adaptá-los. Originalidade e autenticidade são fetiches no discurso da preservação, dificilmente conciliáveis com os próprios valores modernistas, que enfatizam funcionalidade, flexibilidade e efemeridade. Portanto, gostaria, sempre que possível, de dar prioridade à criatividade da intervenção contemporânea, em detrimento do respeito pelo original Hilde Heynen

Hilde Heynen

Historiadora, Autora “Architecture and Modernity” arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? HH: Há dois fatores muito específicos da herança modernista. Antes de mais, a arquitetura modernista foi muitas vezes projetada e construída tendo em mente um período limitado. De acordo com a teoria da arquitetura moderna, como articulada por exemplo por Sigfried Giedion em 1929, no seu livro Befreites Wohnen o que era necessário na modernidade eram casas e edifícios muito funcionais e racionais, mas também de algum modo efémeros e com uma vivência de curta duração. Quando os edifícios deixassem de servir o seu objetivo inicial deviam ser substituídos por outros. Portanto, há algo de paradoxal na circunstância de agora se querer preservar edifícios que nem sempre foram concebidos como testemunho duradouro do seu tempo. Em segundo lugar, em muitos contextos - especialmente no Sul Global - os edifícios modernistas ainda são base do quotidiano e são-no pela intensa utilização, muitas vezes de forma contraditória com as suas funções originais. A razão porque se mantêm, nesses casos, baseia-se no facto de serem “mal-utilizados”. Isto também significa que as modificações e alterações já são parte importante da sua vida e que as intervenções de preservação, como “património moderno”, podem desmentir essa condição.

os edifícios modernistas compõem o tecido do quotidiano e continuam a estruturar, a apoiar e a intensificar a vida urbana. Para mim, sem dúvida, o modernismo produziu um tipo de arquitetura que está “mais em casa” nestes contextos. Em muitos países do Norte, edifícios modernistas são apenas exceções num ambiente construído total que os tolera, mas que realmente não os usufrui. Assim, um dos principais desafios para a preservação de edifícios modernistas é transformar uma relação infeliz com o contexto envolvente. Isso pode ser feito - um exemplo bem sucedido é a reutilização de um edifício modernista como a Escola de Henry Van de Velde em Leuven numa biblioteca municipal, cujo arquiteto responsável pelo restauro foi Georges Baines. n

arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados? HH: Os exemplos mais convincentes de edifícios modernistas, que são geradores de urbanidade podem ser encontrados no Sul Global. Em cidades como Dar Es Salaam, Joanesburgo, São Paulo ou Chandigarh,

© Silvio Tanaka

arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? HH: Para mim não é óbvio que o respeito pela originalidade das obras modernas deva equacionar a necessidade de adaptações e transformações. Sigo Reyner Banham e concordo que nem todos os edifícios que se apresentam na história da arquitetura merecem, só por isso, ser preservados como património. Apoio a ideia de que, para muitos edifícios a melhor estratégia de sobrevivência é transformá-los e adaptálos. Originalidade e autenticidade são fetiches no discurso da preservação, dificilmente conciliáveis com os próprios valores modernistas, que enfatizam funcionalidade, flexibilidade e efemeridade. Portanto, gostaria, sempre que possível, de dar prioridade à criatividade da intervenção contemporânea, em detrimento do respeito pelo original.

Oscar Niemeyer, Edifício Copan, São Paulo, Brasil, 1951-1966

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em ressonância as preocupações contemporâneas. Assim, em 2001, em exposições sobre o trabalho de Mies van der Rohe durante os anos que esteve em Berlim (1905-1937), ou na obra de Le Corbusier (em 2013-14, com Jean Louis Cohen), procurei realçar as dimensões da riqueza panorâmica das obras muitas vezes pensadas como incorporação de uma mentalidade tabula rasa. Isso não apenas evidencia o facto de que podemos retomar continuamente obras-primas da arquitetura moderna para descobrir novos significados, tal como podemos, com obras magistrais de qualquer período, mas também que essas obras têm algo a dizer-nos sempre que procuramos criar uma arquitetura cada vez mais relevante para o nosso posicionamento, isto num mundo com o qual precisamos ter uma relação menos contraditória.

Barry Bergdoll

Arquiteto, Historiador, Curador Arte e Arquitetura MoMA arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? BB: A arquitetura moderna foi demasiado tempo entendida apenas como uma ilustração das suas próprias declarações polémicas, uma arquitetura programática que, por isso, estava condenada à irrelevância com consequências para o desenvolvimento de muitos dos seus principais temas: o avanço tecnológico, a urbanização, a adaptação à velocidade, etc. Nesse sentido as chamadas soluções “perfeitas” das grandes obras do Movimento Moderno foram condenadas ou a tornarem-se ícones de um passado próximo ou a ceder à intervenção radical. Mas, com o tempo, muitas dessas grandes obras têm vindo a ser entendidas como tendo qualidades estratificadas e complexas, o que significa que não podem ser simplesmente reduzidas à qualidade de manifestos do construído. Ou incorporaram as composições magistrais de espaços e materiais cujas inovações ainda movem espectadores, tal como aconteceu com o Pavilhão de Barcelona, recriado 30 anos depois para recapturar uma das grandes experiências espaciais da década de 1920. Ou, então, oferecem um enquadramento para a adaptação que implica, num período de consciência ecológica, iminente escassez de recursos e de necessidade de adaptação, mais do que a demolição e reconstrução em todas as situações, um modo de preservação – senão de mera conservação – predefinido, em vez de substituir o legado dos vários booms de construção do século XX. Deste modo, mesmo os vestígios de regimes depostos podem ter novos significados no século XXI, pensamos, por exemplo, no brilhante museu criado em Nuremberga, arquitetura do regime nacionalsocialista. Como historiador, mais do que como arquiteto, diria que muito do meu trabalho nos últimos 15 anos se tem concentrado em iluminar aspetos ignorados de obras-primas da arquitetura moderna, que não só oferecem uma visão histórica mais rica, mas também evidenciam

Hannes Meyer, Escola ADGB, Bernau, Alemanha, 1930 (Projeto de reabilitação de Winfried Brenne, 2001)

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©Sebastian Wallroth

©Sebastian Wallroth

arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? BB: Obras diferentes exigem diferentes níveis de limitação na intervenção. Certas obras são em grande parte simbólicas e podem manter-se como obras da grande arquitetura, tal como muitas igrejas e casas de campo se vão mantendo em determinados locais, apesar da frequência da igreja ter diminuído ou das casas de campo da aristocracia rural serem um artefacto de eras passadas. São trabalhos que exigem ser mantidos para serem estudadas como obras de arte arquitetónica falamos por exemplo da Vila Savoye ou de outros ícones. Mas, muitas obras são mais respeitadas se adaptadas a uma nova vida. Se o tabaco já não circula nas passagens de vidro da fábrica Van Nelle, em Roterdão, importante é que esta seja agora um centro de atividades, com pessoas a circularem, e que se mantenha um espaço de trabalho e de produção. A preservação é uma prática guiada por uma ciência exata, mas também é muito parecida com a tradição anglo-americana do Direito, uma prática que se ajusta às novas circunstâncias, guiada pelos precedentes, em vez da aplicação estrita do código legal. A intervenção num edifício não é uma imposição de vontades, mas uma concertação com os usos passados, intenções originais e significados subsequentes... Aqui o objetivo é


A preservação é uma prática guiada por uma ciência exata, mas também é muito parecida com a tradição anglo-americana do Direito, uma prática que se ajusta às novas circunstâncias, guiada pelos precedentes, em vez da aplicação estrita do código legal. A intervenção num edifício não é uma imposição de vontades, mas uma concertação com os usos passados, intenções originais e significados subsequentes...

© Gerard Dukker

© Sergé Technau

Barry Bergdoll

Brinkman & Van der Vlugt, Fábrica de tabaco Van Nelle, Roterdão, Holanda, 1925-1931 (Projecto de reabilitação de Wessel de Jonge, 1999-2005)

adaptar uma obra a uma nova relação com o presente, sem acabar com a legibilidade de situações anteriores. É o que se pode dizer, por exemplo, de um edifício com muitas “camadas” de existência, como a Escola ADGB, projetada por Hannes Meyer, em Bernau, no final dos anos 1920. Foi recentemente restaurada, de forma brilhante por Winfried Brenne, de Berlim, dando-lhe novos usos e uma nova vida. Aqui o restauro enriquece a nossa compreensão histórica, ao mesmo tempo que cria uma nova vida para um lugar que tinha caído um pouco no esquecimento. arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados? BB: A Arquitetura Moderna foi, durante demasiado tempo, considerada como o movimento que criou o monumento autónomo, internacional, não específico a um local, em procura de - como declararam primeiro Walter Gropius e depois Hitchcock e Johnoson - “internacionalidade”, se é que uma tal palavra pode ser criada. Atualmente, num período em que a globalização é tanto a ordem como a ansiedade do dia, o modernismo está a ser reconsiderado pelos seus valores particulares, pelas suas conquistas e pela sua relação complexa com o contexto, tanto físico como institucional. Cada vez mais, aqueles que fazem campanha para salvar os projetos de arquitetura moderna auto-consciente, estão tão preocupados com o contexto quanto com o objeto. Colin Rowe seria provavelmente

o primeiro a concordar que a Villa Savoie de Le Corbusier, ficou tão comprometida pela construção de uma plataforma dominadora de uma escola secundária, no seu antigo contexto pastoral dos anos 60, tal como a Malcontenta de Palladio o ficou com a urbanização e industrialização ao longo do canal Brenta, no Veneto. As recentes disputas têm sido sobre a mudança da paisagem e do contexto urbano de monumentos como o Instituto Salk, de Louis Kahn em La Jolla, na Califórnia e, mais recentemente, o seu Museu de Arte de Kimbell em Forth Worth, no Texas. Aqui, tal como anteriormente na capela de Ronchamp, de Le Corbusier, um respeitado neomodernista como Renzo Piano alterou os valores fundamentais da paisagem, parte da mística e receção destes edifícios icónicos, tanto quanto as suas características formais e construtivas. Piano fala, por exemplo, de um diálogo que foi estabelecido entre o seu novo edifício em Kimbell e o museu original. O edifício original estava em diálogo com o amplo prado e com o distante Museu Amon Carter, em frente, ambos agora com a vista bloqueada a partir da entrada do edifício de Kahn… É um pouco como aquelas festas em que nos interrompem subitamente uma conversa (é pena que Kimbell não tenha procurado um lugar muito melhor para a sua extensão), o que já acontecia na forma de um estacionamento, anteriormente subtraído ao conjunto paisagístico de Kahn. Tudo isto para dizer que estamos a aprender que as características paisagísticas e os contextos mais amplos são frequentemente tão importantes para as criações modernistas como o foram para os Templos Gregos. n

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©Diane Ghirardo

Diane Ghirardo

Pier Luigi Nervi, Palazzo del Lavoro, Turim, Itália, 1961

Historiadora, Professora História e Teoria de Arquitetura University Southern California arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados? DG: Great from afar, far from great — No seu Manifesto da Arquitetura Futurista de 1912, o arquiteto Antonio Sant’Elia delineou de forma quase profética a arquitetura futura da transitoriedade, na qual cada geração iria construir as suas cidades de novo. No sonho de Sant’Elia, a quintessência dos materiais essencialmente modernos, tais como o betão armado e o ferro (ou aço), libertados dos detritos da história - “tradição, estilo, estética, proporção” -, produziriam uma arquitetura “leve, prática, efémera e rápida”. Esta arquitetura iria superar catástrofes naturais, como inundações e incêndios, e catástrofes provocadas pelo homem, como guerras, o excesso de desenvolvimento e reabilitações urbanas, forças essas que submeteram as cidades europeias do século XX a terapias de choque que quase as transformaram para além do reconhecimento, em linha com as previsões de Sant’Elia. Nos Estados Unidos, em 50 anos, os arquitetos e urbanistas alteraram completamente bairros inteiros, demolindo mesmo apartamentos, casas e edifícios públicos recentes, para abrir caminho ao novo. De acordo com a profecia de Sant’Elia, os arquitetos adotaram novos materiais e novos métodos de projetar os edifícios do novo século, com materiais não destinados a durar, mas a serem arrasados pela força da mudança geracional. Esses materiais - betão armado, vidro, estuque, ferro - aparentemente disponíveis em quantidade ilimitada, poderiam ser facilmente substituídos de acordo com as alterações do gosto e necessidade. A demissão histórica de Sant’Elia e a onda que varreu a arquitetura do século no seu início, materializouse nas mãos dos arquitetos a partir daí coroados pelo seu próprio culto: Le Corbusier, com o seu plano de arrasar o centro de Paris (mais tarde levado a cabo pelo Centro Pompidou de Piano e Rogers); a expulsão da história dos programas de arquitetura, reproduzida devidamente por Walter Gropius na Harvard School of Design (mesmo chegando a retirar todos os livros de história e arquitetura da biblioteca) e depois praticamente por todas as outras escolas de arquitetura, produzindo assim gerações de arquitetos qualificados mas ignorantes; o plano de Mies van der Rohe para a demolição de vastas do sul de Chicago, para dar lugar aos novos edifícios do novo Ilinois Institute of Technology. Noutros lugares avançaram alegremente no projeto de novas estruturas para

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Fábrica San Felice sul Panaro após terramotos de maio de 2012, Itália

substituir os baldios urbanos, que derivaram de programas de “renovação urbana”, tanto nos Estados Unidos como noutros locais, sempre seguindo o mantra do “novo” para substituição do “antigo”. Nas campanhas da construção febril das décadas do período entre guerras e, especialmente, após a Segunda Guerra Mundial, os arquitetos adotaram princípios de projeto cada vez mais baseados na realização auto-expressiva. Na segunda década deste século, a atenção dada à história e às tradições desapareceu da paleta de qualquer arquiteto que proclamava ser «moderno»; e com o passar do tempo, formas exóticas e complexas de auto-expressão, tais como as observadas por exemplo nos projetos de Frank Gehry, Zaha Hadid, Daniel Libeskind, dominam a arquitetura sob pena de exclusão de praticamente tudo o resto. Relativamente às questões colocadas pela arqa, em relação à preservação da arquitetura do século XX, rotulada de “moderna”, coloco mais questões e duas propostas. Os edifícios projetados pelos arquitetos modernos do século XX são agora eles próprios “históricos”. Os seus criadores foram tenazmente banidos dos edifícios, das publicações, dos currículos arquitetónicos e até mesmo as suas cidades limpas de algum vestígio de tradição ou história, aliada à celebração da destruição de edifícios e bairros históricos; então porque deveriam ser os edifícios históricos agora tratados de forma diferente? Para sermos coerentes com as suas próprias teorias, as suas obras devem perecer, tal como os seus criadores acreditavam que deviriam acontecer com os edifícios históricos; até porque, devido aos processos de construção do século XX, estão condenados a perecer vitimas da própria fragilidade dos seus materiais. Igualmente, estas estruturas não devem ser remodeladas ou refeitas, como pequenas jóias de construção, com materiais construtivos muito superiores aos originais. Tendo em conta que a arquitetura moderna foi


Os edifícios projetados pelos arquitetos modernos do século XX são agora eles próprios “históricos”. Os seus criadores foram tenazmente banidos dos edifícios, das publicações, dos currículos arquitetónicos e até mesmo as suas cidades limpas de algum vestígio de tradição ou história, aliada à celebração da destruição de edifícios e bairros históricos; então porque deveriam ser os edifícios históricos agora tratados de forma diferente? Diane Ghirardo

difícil de habitar ou trabalhar nela, que os seus bairros e planos eram monótonos e opressivos, os moradores ou proprietários devem poder remodelar e transformar esses edifícios, tornando-os mais acolhedores e personalizados, de acordo com seus próprios gostos. Sem dúvida que as próprias teorias dos “mestres modernos” sobre a destruição da história devem refletir-se em qualquer tentativa de “respeitar o original”, no caso de um esforço de conservação equivocado. Considerações adicionais dão peso a este argumento. Esses mesmos frágeis materiais modernos não têm resistido nem a catástrofes naturais nem à intervenção do homem, como o pode testemunhar o caso da fábrica de piso único em San Felice Sul Panaro, com 20 anos de idade, depois dos terramotos de maio de 2012. Por exemplo, a alvenaria não reforçada do Castello Estense também sofreu com o terramoto, mas pergunto qual resistiu melhor à força da natureza? Mais ainda, como responderiam os dois edifícios à inclemência do tempo, isto é, qual deles é que daria uma ruína mais evocativa? Certamente não o Palazzo del Lavoro, em Turim, de Pier Luigi Nervi que, com apenas 53 anos, está a apodrecer no esquecimento. Os enormes custos envolvidos na preservação, ou mesmo manutenção, de alguns destes enormes edifícios exigem cautela. Os problemas associados à manutenção parecem não ter interessado muitos arquitetos​​, seja no projeto, seja nos materiais. Para ser bem sucedido - ou seja, para cumprir as aspirações dos seus criadores - a arquitetura moderna depurada exige superfícies suaves e cristalinas e detalhes, algo muitas vezes incongruente com os próprios materiais e projetos. O destino do Centro Pompidou e de toda a sua infraestrutura, exposta com vulgaridade cromática no exterior, aconselha cuidado com os custos de renovação, que excedem o custo original, num edifício com apenas duas décadas de funcionamento. Os defensores do edifício culpam o próprio sucesso do edifício e os milhares de visitantes que provocaram o seu desgaste. Como curiosidade, acrescente-se que as visitas anuais do Centro Pompidou são apenas um terço das do Louvre, o museu mais visitado do mundo, uns bons séculos

mais velho e ainda longe de necessitar de restauro. O Auditório Disney de Frank Gehry, em Los Angeles, um marco da arquitetura moderna de auto-expressão, cumpre o ditado “grande de longe, longe de ser grande «. De perto, o revestimento original exige limpeza regular e dispendiosa para manter essa pureza elegante. Uma pergunta: é este o melhor uso dos recursos da sociedade? A voz autorizada de Leon Battista garante que ideias do arquiteto (Ingenium ) expressas em palavras e desenhos lhe garantirá a fama tanto quanto um edifício, permitindo que a sua decadência até aumente o seu reconhecimento. As cansadas e cansativas polémicas sobre as necessárias extensões do Instituto Salk, de Louis Kahn e do Museu Guggenheim de Frank Lloyd Wright são o outro lado da mesma moeda. Apesar da clara necessidade de ambos de ampliação, há protestos de todos os lados. É mesmo melhor que o destino de um edifício seja o ser embalsamado num momento indefinido no tempo? Penso que não; para sobreviverem, nem todos podem tornar-se museus e, de qualquer modo, será melhor que essas decisões fiquem nas mãos dos proprietários. Se fosse para admitir a possibilidade de renovação, digamos para o trabalho de arquitetos que se recusaram a abandonar a história e a tradição das suas paletas, então princípios diferentes talvez devessem ser aplicados. O mais interessante é o de Aldo Rossi. Em 1986, um grupo de arquitetos alemães visitaram o cemitério de San Cataldo de Rossi em Modena. Depois visitaram o seu escritório em Milão e expressaram o seu entusiasmo, especialmente sobre os longos blocos de cavidades vazias ou recessos dos sepulcros. Condenaram com veemência o modo como as famílias empilhavam, nas sepulturas dos seus entes queridos, flores artificiais, lâmpadas, vasos, quadros, inscrições, imagens de todo o tipo, sendo cada sepultura diferente da outra. Pediram a Rossi que interviesse para garantir que estas práticas cessassem. Rossi não discutiu a questão, mas quando eles saíram comentou: «Eles não entendem. Só quando as pessoas se apropriam dos espaços, dos lugares, só então eles se tornam arquitetura.” n

Aldo Rossi, Cemitério de San Cataldo, Modena, 1973

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No entanto, quando algo é reconhecido pelo seu valor patrimonial, então as intervenções contemporâneas devem, necessariamente, estar sujeitas a verificação dos requisitos do lugar e do seu contexto. É lamentável que arquitetos-estrela, famosos mundialmente, tomem a liberdade de apresentar os seus projetos independentemente de se adequarem ou não ao lugar. Há um sentimento de artis gratia ars, arte pela arte Jukka Jokilehto

arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados? JJ: A arquitetura moderna é o resultado do processo criativo humano, como qualquer criação arquitetónica ou obra de arte do passado. É reconhecido que a criatividade humana se caracteriza pela diversidade de expressões culturais, como se refere na Convenção da UNESCO de 2005. A arquitetura moderna foi efetivamente reconhecida como parte do nosso património cultural e incluída na Lista do Património Mundial da UNESCO. Embora seja verdade que o nosso período moderno se caracteriza pelos novos materiais e pelas novas formas, a sua preservação dependerá do seu reconhecimento como património. Consequentemente, a preservação do património arquitetónico moderno é uma questão cultural. É evidente que o Movimento Moderno na Arquitetura, que começou no início do século XX, se prolongou também pelo período pós Segunda Guerra Mundial. Nessa altura houve uma combinação com o rápido processo de industrialização,

necessário para lidar com os resultados da vasta destruição. Nesse período, a atenção internacional focou-se principalmente no respeito pelo carácter e escala da edificação urbana existente. Foi somente a partir das décadas de 1970 e 1980 que a arquitetura moderna e o planeamento urbano foram gradualmente considerados como parte do património edificado. Isso também significou que o conceito de património se foi expandido a todo o ambiente construído e natural, resultando na introdução do conceito de paisagem cultural, na década de 1990. Mais tarde foi complementado pela noção de Paisagem Urbana Histórica, adotada pela UNESCO em 2011, o que se pode entender como uma abordagem operacional holística. De facto, atualmente, o projeto e o significado associado ao território construído reflete a evolução do final do século XX. Ao invés de falar da especificidade das intervenções contemporâneas no património moderna, seria necessário definir primeiro a especificidade do moderno como património. Não há uma solução que possa ser recomendada. Cada caso deve ser avaliado pelas suas características. As alterações podem ser umas vezes rejeitadas outras aceites, sujeitas ao reconhecimento do significado do que é reconhecido como património. Foi este o caso de Paimio de Alvar Aalto, que tinha passado de sanatório a hospital. O caso da Casa Schröder de Gerrit Rieveld é diferente, uma vez que o edifício poderia tanto ser restaurado como um símbolo das ideias do movimento De Stijl dos anos 1920, ou como um edifício histórico, a ser conservado com as alterações que foram acontecendo ao longo do tempo. A própria vida está sujeita à continuidade e à mudança. Uma das características da arquitetura tradicional tem sido a sua flexibilidade. Os edifícios poderiam naturalmente ser adaptados a novos usos sem alterações substanciais. O problema da arquitetura racionalista moderna é que, na maior parte dos casos, foi projetada para responder a uma função determinada. Portanto, é mais difícil a adaptação a diferentes utilizações. No período

Michael Lee-Chin, Extensão do Royal Ontario Museum, Toronto, 2007: a nova extensão espetacular ignorou totalmente a qualidade arquitetónica da preexistência

Construção das “Flame Towers” em Baku: sinal da “sindrome do Dubai” que tem alterado a paisagem do centro histórico classificado como Património Mundial

Jukka Jokilehto

Arquiteto, Urbanista, Consultor ICCROM, Membro Honorário ICOMOS Finlândia, Professor University Nova Gorica

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Escritórios da Alfa Romeo, Asmara, 1937: construída por arquitetos italianos nas décadas de 1920 e 1930 nesta capital colonial, mantém hoje a integridade do tecido urbano modernista, mesmo sem manutenção do edificado

pós Segunda Guerra Mundial, a dificuldade estava também relacionada com a dependência dos recursos limitados e a introdução de standards mínimos. Após os progressos técnicos, industriais e financeiros, no final do século XX, as pessoas desejavam frequentemente atualizar os seus edifícios, respondendo às novas expectativas difundidas pelos meios de comunicação de massa. Na reabilitação urbana tem-se tornado prática comum fazer uma série de pesquisas que identificam a tipologia e a morfologia do parque edificado existente, bem como da estrutura espacial do tecido urbano. Ao mesmo tempo, será necessário definir o que deve ser protegido e conservado e quais são os limites de alterações aceitáveis ​​ nos edifícios individuais e no tecido urbano, sem perder os valores patrimoniais. Tais limites devem necessariamente ser o resultado de uma investigação sistemática, normalmente identificada num Plano Diretor de Conservação, que deve ser entendido como complementar ao Plano Diretor Geral, o qual regula o uso do solo e as suas funções. O terceiro instrumento deve ser o Plano de Gestão, necessário à gestão de todos os bens do Património Mundial. Será essencial que haja uma compreensão da propriedade, partilhada por todos os agentes​​, e instrumentos adequados para monitorizar e controlar os seus processos. A criatividade é parte da cultura humana. No entanto, quando algo é reconhecido pelo seu valor patrimonial, então as intervenções contemporâneas devem,

necessariamente, estar sujeitas a verificação dos requisitos do lugar e do seu contexto. É lamentável que arquitetos-estrela, famosos mundialmente, tomem a liberdade de apresentar os seus projetos independentemente de se adequarem ou não ao lugar. Há um sentimento de artis gratia ars, arte pela arte. Alguns arquitetos, ao serviço de ambições políticas e financeiras, esqueceram lições determinantes do próprio Movimento Moderno. De facto, estamos agora no período do Pós-modernismo, que se desenvolve em lugares como o Dubai, mas está a esquecer-se a responsabilidade bmoral e profissional dos arquitetos e urbanistas, não só para realizar a última moda, mas também para ver como esta se adapta às qualidades e características específicas do contexto sócio-cultural e ambiental em causa. O meu professor de arquitetura finlandês, Aulis Blomstedt, costumava dizer que um arquiteto deve considerar as necessidades do cliente, os requisitos do contexto e a sua própria sensibilidade e habilidade. Os arquitetos e urbanistas são uma parte profissional do Património da Comunidade, que foi definido no Conselho da Europa, na Convenção de 2005 em Faro. Agora temos uma consciência do ambiente construído e natural, como um contexto cultural, histórico e ecológico. O nosso futuro dependerá, em parte, do modo como formos capazes de lidar com essa herança. É uma questão de Capacidade de Construção. É um processo de aprendizagem e, sobretudo, é da nossa responsabilidade cultural e moral. n

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mesma intensidade que a intervenção contemporânea em edifícios que consideramos como herança moderna. Organizamos em duas ocasiões diferentes seminários e debates, culminando em intervenções sobre casos exemplares da arquitetura moderna chilena. A primeira consistiu na intervenção num setor do edifício da Embaixada do Chile, em Buenos Aires, Argentina. O edifício original tinha sido o resultado de um concurso e foi construído na década de 1960. Por motivos de obsolescência dos materiais, uma secção da cobertura ajardinada tinha sido removida e a nova proposta considerava a construção de uma solução estranha ao edifício preexistente. O debate sobre opções de projecto levou a mais de 50 propostas, das quais 3 foram selecionadas para serem desenvolvidas. A proposta final, de Sebastian Irarrazaval, foi concluída em 2010, como Centro Cultural do Chile, na Argentina. O segundo destes casos foi a intervenção no edifício pertencente à Comissão Económica das Nações Unidas para a América Latina (CEPAL), uma área que tinha sido destruída pelo terramoto de fevereiro de 2010. O edifício original, uma das obras-primas da arquitetura moderna da América Latina, projeto de Emilio Duhart e construído também durante a década de 1960. Aqui, o concurso foi internacional; um grande número de propostas foi objeto de debate, tendo sido 3 inicialmente selecionadas e, finalmente, seguindo os procedimentos do organismo internacional, o projeto de Pablo Saric e equipa foi o escolhido. Em ambos os casos, as necessidades específicas levaram a um tipo de intervenção com características contemporâneas que se apresentam diferentes do edifício original, mas que o respeitam e, no final, cumpre-se o objetivo de uma melhoria dos seus valores originais.

Horacio Torrent

Arquiteto, DOCOMOMO Chile, Investigador Conicyt, Professor School of Architecture PUC Chile

© Archivo de Originales Sergio Larraín García-Moreno. FEDEU/UC Chile

arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? HT: A intervenção contemporânea torna-se indispensável para apoiar a herança moderna, tanto no sentido físico como no cultural. No que respeita os materiais, a arquitetura moderna estabeleceu uma renovação das formas tradicionais de construção, introduzindo um forte sentido experimental. Esta situação resultou por um lado, na degradação significativa ou obsolescência dos materiais nas edificações modernas, enquanto permite, por outro lado, que o sentido experimental original seja incorporado no restauro, isto é, envolvendo por exemplo o uso ou o teste de novos materiais num processo de restauro crítico. Além disso, em termos culturais, a própria arquitetura moderna considerou a possibilidade de substituição e renovação e, portanto, a sua herança admite ambos os procedimentos para consolidar as suas características - através da restauro crítico - ou novas intervenções que sustentem o seu estatuto de diferença, a partir do edifício pré-existente. Na DOCOMOMO Chile, promovemos o conhecimento da arquitetura moderna e as suas possibilidades de preservação. A maior parte do trabalho tem-se centrado na valorização dos principais testemunhos da arquitetura moderna fora dos grandes centros. Mas a atividade seguinte desenvolveu-se com a

Emilio Duhart, Arq. Goycoolea, De Groote, Sede da Comissão Económica para a América Latina e Caraíbas (ECLAC), Santiago, Chile, 1960-66

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arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? HT: Eu entendo que a aparente contradição entre a preexistência original e a originalidade contemporânea, que é comummente proposta como chave para a intervenção no património antigo, não surge com a mesma força quando se trata de arquitetura moderna. Isto pode surgir noutros campos como um conflito claro e definitivo, e isso permite muitas vezes que a nova proposta opere num sentido positivo, colocando uma questão muito mais complexa quando se trata de edifícios ou espaços modernos. De certa forma, porque a criatividade era praticamente um imperativo ético para a arquitetura moderna, o que agora se revela menos favorável. Não há dúvida de que uma intervenção deve assumir essa condição de diferença, a que a atitude proativa contemporânea se permite, com o devido respeito à abordagem formal e estética desenvolvida durante o século XX. Certamente, ao longo do período em que a arquitetura moderna existiu - e ainda existe nos seus testemunhos edificados uma dimensão coletiva, expressa no desenvolvimento de uma estética partilhada com uma ambição de representatividade que excedeu, e sempre excederá, a criatividade individual, e é nesta mesma dimensão que reside, em grande parte, o seu reconhecimento como património. É por esta mesma razão que toda a intervenção contemporânea realizada na arquitetura moderna encontra como principal entrave a qualidade da


Certamente, ao longo do período em que a arquitetura moderna existiu - e ainda existe nos seus testemunhos edificados - uma dimensão coletiva, expressa no desenvolvimento de uma estética partilhada com uma ambição de representatividade que excedeu, e sempre excederá, a criatividade individual, e é nesta mesma dimensão que reside, em grande parte, o seu reconhecimento como património

© Sebastián Irarrázaval, 2010

Horacio Torrent

Sebastián Irarrazaval, Centro Cultural da Embaixada Chilena na Argentina, 2010

resolução original e que, quem tem a intenção de o superar, deve possuir uma dose de criatividade pelo menos igual à que os arquitetos modernos usaram em cada caso. arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados? HT: Os edifícios modernos emergiram frequentemente de condições de produção ou de significância que transformaram as dimensões urbana e territorial. Mesmo os casos modelo, geralmente pensados como objetos isolados, foram em grande parte concebidos como estudos específicos que tratam da formulação de um determinado problema - e, eventualmente, a sua solução - com sentido urbano ou territorial. Ou seja, essas conexões podiam ser entendidas, e de muitas maneiras diferentes, como constitutivas do ADN da arquitetura moderna. A ideia

de Groszstadt, por exemplo, contempla uma definição da arquitetura como fenómeno urbano que tem muitas vezes sido mal entendida; nomeadamente uma relação tanto dialética como complementar entre a arquitetura - no seu derradeiro detalhe - e a cidade, resultante de uma noção de gesamtkunstwerk, que se perdeu com a banalização imobiliária das fórmulas que eram originalmente oferecidas pelos arquitetos modernos como solução para os problemas da habitação. Talvez um dos maiores espólios da herança moderna, especialmente para a Arquitetura, resida no seu valor demonstrativo, no que refere a capacidade de produzir novas cidades plenas de desenho e qualidade de vida. Existem inúmeros ambientes urbanos moldados por edifícios modernos que merecem ser preservados, por um lado, porque fornecem uma elevada qualidade de vida e, por outro, porque são a prova viva do que a arquitetura foi capaz de proporcionar à sociedade. Urbanizações modernas são parte desses testemunhos que merecem ser mantidos e adaptados às condições de vida atuais. n

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Mas se “a criatividade da intervenção contemporânea” é realizada com sucesso, é necessário termos o seguinte em consideração: a metodologia utilizada para avaliar a importância do património arquitetónico do século XX deve seguir uma abordagem assente num planeamento de conservação culturalmente apropriado. Isto inclui pesquisa histórica compreensiva e análises do sentido no desenvolvimento de políticas de conservação, gestão e interpretação do significado cultural identificado Yoshiyuki Yamana

Yoshiyuki Yamana

Arquiteto, DOCOMOMO Japão, Professor Tokyo University of Science

© KITAMURA Toru

arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? YY: Muitos exemplos de Arquitetura do Movimento Moderno, construídos no início dos anos 20 no Japão, já foram demolidos. Durante a década de 1960, muitos ícones arquitetónicos do Movimento Moderno foram demolidos no Japão, como o Imperial Hotel de Frank Lloyd Wright, construído em 1923 em Tóquio e deitado abaixo em 1968, cujo hall de entrada foi reconstruído em Meiji Mura, perto de Nagoya em 1976. Também na década de 1980, no período da “bolha económica” no Japão, a Arquitetura Moderna enfrentou alguns perigos. A DOCOMOMO Japão iniciou a sua atividade em 1997 e, em 2000, tornou-se numa representação nacional oficial, parte da DOCOMOMO International. Depois de 2000, nesta plataforma tornou-se mais fácil debater o Património Moderno e podemos hoje encontrar no Japão muitos casos de estudo bem sucedidos de intervenções contemporâneas na herança moderna. Para a DOCOMOMO Japão foi uma boa notícia que o Projeto de Ampliação e Conservação (2006-2009), da Escola Primária Hizuchi na cidade de Yahatahama em Ehime do arquiteto Masatsune Matsumura (1956-1958) tenha recebido em 2012 o prémio Knoll Modernism da World Monuments Fund . A DOCOMOMO Japão está a colaborar com a delegação japonesa da ICOMOS ISC20c no projeto para o desenvolvimento de uma teoria

Masatsune Matsumura, Escola Primária Hizuchi, Cidade de Yawatahama, Prefeitura de na Ilha Shikoku Island, Japão

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e metodologia para a “Conservação do Património Arquitetónico do Século XX”, bem como na definição de diretrizes que fundamentem a conservação e gestão das transformações no património do século XX, com base no Japão, através da interpretação do Madrid Document 2011 da ICOMOS ISC20c (http://icomos-isc20c.org/id13.html). O debate no seio da DOCOMOMO Japão está em total concordância com o conceito do documento de Madrid que é: “É necessária uma adequada investigação, documentação e análise da materialidade histórica de um bem para guiar qualquer mudança ou intervenção. A integridade do património arquitetónico do século XX não deve ver-se afetada por intervenções insensíveis.” O projeto de Ampliação e Conservação da Escola Primária Hizuchi será um dos melhores exemplos destes casos: “A escola distinguese pelo seu projeto moderno funcionalista e é um importante exemplo da arquitetura em cluster deste período. Não é comum que, sendo um edifício moderno, seja construído principalmente em madeira. As características notáveis do edifício incluem a fachada dupla, com janelas que permitem que a luz natural entre no edifício, durante o período do pós-guerra, quando a energia falhava. Hizuchi foi reconhecido em 1999 como um dos vinte edifícios representativos do modernismo no Japão, pela DOCOMOMO 20. Apesar deste reconhecimento, o edifício enfrentou uma série de problemas, porque não estava conforme com os regulamentos antissísmicos da altura ou com as normas de segurança infantil. Devido à idade da estrutura, a deterioração também afetou o edifício, nomeadamente infiltrações das chuvas e janelas partidas. Um tufão em 2004 danificou ainda mais esta escola. Os danos na escola e a falta de certos requisitos atuais levaram a um debate na cidade sobre a possibilidade de preservar ou demolir o edifício. Depois de um debate de dois anos, um consórcio de peritos juntou-se, trabalhando em estreita colaboração com a associação de pais local e com o conselho executivo, para criar um plano de restauro que também a adaptasse de modo a acolher os atuais regulamentos de educação e segurança. De 2006 a 2009 a escola foi meticulosamente recuperada. Os elementos originais foram usados sempre que possível, com 459 dos 462 pilares originais e mais de 90 por cento dos elementos arquitetónicos reutilizados. As cores da pintura foram repostas por pesquisa de amostras e as telhas danificadas foram replicadas com moldes originais. Os vidros originais, a maioria destruída pelo tufão, foram substituídos por vidros de segurança. As salas de aula foram restauradas e algumas foram projetadas com a flexibilidade necessária para uso da comunidade, antecipando um futuro declínio da população estudantil. O edifício tornou-se a primeira escola de madeira do pós-guerra resistente a sismos. A nova ala, o edifício oeste, foi construída para atender às necessidades atuais, mas foi concebido em harmonia com a arquitetura original. (http://www.wmf.org/modernismprize/hizuchi-elementary-school) arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? YY: Os edifícios evoluem ao longo do tempo e as alterações a que


© Matukuma Lab of K.I.T

Kunio Mayekawa, Auditório Kyoto Kaikan, Japão

são sujeitos podem ter um significado cultural. Mas se “a criatividade da intervenção contemporânea” é realizada com sucesso, é necessário termos o seguinte em consideração: a metodologia utilizada para avaliar a importância do património arquitetónico do século XX deve seguir uma abordagem assente num planeamento de conservação culturalmente apropriado. Isto inclui pesquisa histórica compreensiva e análises do sentido no desenvolvimento de políticas de conservação, gestão e interpretação do significado cultural identificado. É essencial que essa análise seja concluída antes do início das obras, para garantir que as políticas de conservação específicas orientem o desenvolvimento e a mudança. É necessário também prestar atenção aos seguintes fatores: faça-se apenas o necessário e o menos possível; qualquer intervenção deve ser cautelosa; a extensão e profundidade da transformação deve ser minimizada; utilizem-se métodos comprovados de reparação, evitando intervenções que possam causar danos aos materiais históricos e ao significado cultural; a reabilitação deve ser realizada do modo menos invasivo possível; as mudanças devem ser tão reversíveis quanto possível. O caso da Escola Primária Hizuchi foi um bom exemplo, tendo em conto o resultado. Mas acho que a sorte também alcançou bons resultados. Há casos em que se obtêm bons resultados quando há um esforço conjunto dos intervenientes. Exemplo disso são a Casa Internacional do Japão de Junzo Sakakura, Kunio Mayekawa, Junzo Yoshimura (1955), a moradia isolada Villa Hyuga de Bruno Taut (1936), etc. É necessário fazer um plano de gestão para projetos designados como

importante património cultural como por exemplo o Museu Nacional de Arte Ocidental de Le Corbusier (1959), o Centro para a Paz de Hiroshima de Kenzo Tange (1952), a Câmara Municipal de Ube de Tohgo Murano (1937), entre outros. No entanto, estes são casos raros, muitos outros, listados na DOCOMOMO Japão, não possuem este tipo de plano de gestão. O plano de renovação proposto para o Kyoto Kaikan de Kunio Mayekawa (1960) foi, recentemente, o caso mais difícil para a DOCOMOMO Japão. As propostas dos novos planos de renovação, alteração e ampliação do Kyoto Kaikan preocupam-nos na medida em que podem causar danos irreversíveis neste complexo patrimonial, altamente significativo. O tamanho e a forma do projeto proposto para o novo teatro vai destruir a beleza e harmonia criadas no conceito e detalhes do projeto original de Mayekawa. O ICOMOS e DOCOMOMO solicitaram a sua revisão com Kyoto-shi, mas, infelizmente, a troca de opiniões levou a percursos paralelos, devido à inexistência de um plano de gestão. Depois do Madrid Document 2011 da ICOMOS ISC20c, à ideia de “Autenticidade” convencional, adicionamos uma outra denominada de “Integridade”, abrindo-se um modo de pensar a preservação dos bens culturais do século XX. No entanto, é importante referir que considero cada um dos planos um exemplo concreto de gestão. Será a única maneira de um edifício poder continuar a crescer com um sentido urbano, sendo que é aí que este trabalho pode encontrar o valor original dos bens culturais no século XX, que é social e se pode encontrar com a natureza. n

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Mas o mobiliário é, pela sua própria definição e essência, móvel. Isto é, transportável, modificável. É mais flexível que a construção arquitetónica; é mais propenso do que ela a ajustar-se ao longo do tempo à vontade dos utilizadores, aos requisitos de cada momento (funcionais, tecnológicos, ideológicos, estéticos, expressivos). E, portanto, eminentemente mutável, efémero, volúvel. Ou seja, tem uma dimensão patrimonial especialmente frágil João Paulo Martins

João Paulo Martins

Arquiteto, Professor FAUL, Investigador CIAUD arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? JPM: A investigação que tenho conduzido recentemente estuda os processos de projeto e aquisição de mobiliário e equipamento para os edifícios públicos em Portugal num período que, de um modo geral, poderíamos identificar com o do Movimento Moderno. A partir do CIAUD o centro de investigação da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa , desenvolvemos o projeto de investigação “Móveis Modernos. 1940/1980”, com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia e a cooperação do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) e do Museu do Design e da Moda (MUDE). O universo do mobiliário e dos equipamentos fixos (os dispositivos integrados na arquitetura, muito próximos daqueles) implica um conjunto de questões que lhe são particulares, em termos de uso e de obsolescência, e portanto, também, enquanto objeto de valorização patrimonial. Mobiliário e equipamentos contribuem de um modo muito direto para a caracterização expressiva dos espaços, fazem parte integrante dos conjuntos habitados e conferemlhes sentido; em grande medida, são responsáveis pela especificação funcional de cada espaço, fazem a mediação direta com os utilizadores (atribuem escala humana à arquitetura), são fundamentais na construção da coerência entre as diversas parcelas que constituem um todo. Mas o mobiliário é, pela sua própria definição e essência, móvel. Isto é, transportável, modificável. É mais flexível que a construção arquitetónica; é mais propenso do que ela a ajustar-se ao longo do tempo à vontade dos utilizadores, aos requisitos de cada momento (funcionais, tecnológicos, ideológicos, estéticos, expressivos). E, portanto, eminentemente mutável, efémero, volúvel. Ou seja, tem uma dimensão patrimonial especialmente

Designer Daciano da Costa (projeto de interiores e mobiliário), Reitoria da Universidade de Lisboa, Salão do Reitor, Lisboa, 1960-61 (Espólio Daciano da Costa, IHRU)

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frágil. Acresce que o mobiliário do período moderno está ainda pouco estudado e, como tal, pouco valorizado. Falta investigação extensiva e aprofundada sobre os diversos programas funcionais, as tipologias, as atitudes de projeto recorrentes e as distintas tendências que, no tempo e no espaço, se confrontaram e sucederam; sobre os autores e outros agentes implicados nos processos de conceção e aquisição; as instituições e respetivas redes de poder e de decisão; os produtores e fornecedores; as relações estabelecidas com os padrões e intervenções de referência internacionais de cada momento. Em muitos casos, a nossa proximidade cronológica faz-nos reagir de um modo superficial em relação a essas peças e conjuntos. Frequentemente, associando-lhes uma imagem negativa, de algo que está fora de moda, antiquado, obsoleto (sem merecer o estatuto positivo do mobiliário ao qual se atribui as etiquetas de “antigo” ou “clássico”). Esta atitude acentua-se face ao envelhecimento físico, ao estado de degradação que implicaria manutenção, reparação ou substituição parcial. O mito da “eterna juventude”, característico da ideologia moderna que esteve na origem de muitas dessas obras, não se compadece com materiais que têm, afinal, processos críticos de envelhecimento e de manutenção (sobretudo os materiais sintéticos, como plásticos, borrachas, espumas, peles artificiais; ou mesmo o aço). E não será menos superficial a crescente apetência atual pelo “vintage”, no mercado do mobiliário e acessórios designados como “antiguidades modernas”, que deverá alimentar o processo de sensibilização, valorização e recuperação patrimonial, evitando-se que contribua para a depredação e para a fragmentação abusiva de alguns conjuntos subsistentes. Naturalmente, são especialmente críticas a obsolescência tecnológica (pensemos em campos nos quais têm existido transformações muito radicais por efeito da evolução dos dispositivos técnicos que lhe estão associados, como na área da saúde, ou do trabalho em escritório) e a obsolescência ideológica (atente-se no mobiliário escolar e nas alterações ocorridas nos espaços dedicados ao ensino e à aprendizagem, quanto aos conceitos de ordem, de disciplina, de interação, de hierarquia…). Parece certo que, quanto mais estrita for a adesão de um determinado mobiliário a definições ideológicas ou a determinados níveis de desenvolvimento tecnológico, mais ele será significativo do seu tempo. E essa sua condição acentuará o processo de obsolescência num tempo curto, acentuando o apelo pela “modernização” para suposta adequação ao presente, sem uma verdadeira avaliação crítica do existente ou busca de preocupação com o sentido do conjunto (sobretudo num mercado como o atual, com oferta muito alargada e muito convidativo à mudança). Mas devemos também salientar os sinais positivos que temos vindo a registar. É evidente que existe uma crescente sensibilidade ao ambiente construído entendido em todas as suas escalas (sim, “da cidade à colher de chá”). Veja-se, a título de exemplo, os dois volumes do Docomomo Journal dedicados ao “global design” (nºs 46 e 47, em 2012). Com maior extensão, profundidade e rigor e com menos preconceitos , sente-se a disponibilidade da academia para o estudo sistemático e exaustivo do património moderno e contemporâneo, para além do círculo restrito das obras, dos autores e das geografias mais icónicos.


Fotos: Luísa Ferreira (2013), Projeto “Móveis Modernos - 1940-1980”

Arqº Lucínio Cruz (projeto de arquitetura), arqº José Luís Amorim (projeto de mobiliário) Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Lisboa, 1952-1958

Arqº António Linhares de Oliveira (com o arqº Eduardo Coimbra de Brito), Serviço de Fomento Mineiro, Porto, 1961–1967

arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? JPM: Creio que não é possível adotar-se uma atitude pré-definida e inflexível. Um bom apoio para a reflexão que importa fazer, será o documento designado “Critérios para a Conservação do Património Arquitetónico do Século XX. Documento de Madrid 2011”, adotado pelo ICOMOS (International Council on Monuments and Sites) como contributo para o debate sobre a conservação de bens patrimoniais do século XX (Jun. 2011). Aí é formulada a recomendação de se “desenvolver de forma proactiva inventários do património arquitetónico do século XX” (art. 1.4) e de se “identificar e avaliar a importância de interiores, acessórios, mobiliário e obras de arte associadas” (art. 1.2). Antes de qualquer intervenção, deve-se “utilizar uma metodologia que avalie o significado cultural e providencie políticas para a sua conservação e respeito, antes do início dos trabalhos” (art. 2.2). Nomeadamente, devem ser usadas “análises comparativas para estabelecer o significado cultural” (art.1.5), considerando-se que “a promoção e interpretação são partes essenciais do processo de conservação” (art. 9.1). É importante «reconhecer e gerir as constantes pressões a favor da mudança» (art. 4), sendo certo que «a gestão da mudança é uma parte essencial do processo de conservação para manter o significado cultural, a autenticidade e a integridade do património» (art. 4.1). Importará, sempre, saber «estabelecer limites de alteração aceitável» (art. 2.3). Como princípios, deve ter-se em atenção que «os elementos significativos devem reparar-se ou restaurar-se, mais que substituir-se» (art. 7.1) e que «os conteúdos, elementos fixos e acessórios que contribuem para o significado cultural devem ser sempre mantidos, integrados no bem, na medida do possível» (art. 7.2). Diremos, pois, que os primeiros passos para a transformação (e a eventual preservação patrimonial) serão «estudar para conhecer», isto é inventariar,

recolher e sistematizar informações sobre os objetos e o respetivo contexto. Em seguida, a partir da análise comparativa e contextual, «interpretar para valorizar». E logo, «divulgar: informar para sensibilizar»: a academia, os técnicos, os utilizadores, todos os públicos. Nesse momento haverá condições para uma reflexão aprofundada sobre o existente. Caso a caso deve debater-se qual o grau de adequação das heranças patrimoniais às solicitações do presente; quais os limites de alteração aceitáveis? Em seguida, todas as possibilidades deverão ser admitidas e avaliadas, de forma metódica e sistemática. Deve manter-se em uso ou (e) musealizar? Reabilitar, conservar, manter? Reparar pontualmente ou restaurar integralmente (a imagem; a matéria)? Reconstruir, replicar (a partir do projeto original ou de exemplares subsistentes)? E quando deve admitir-se a substituição do antigo mobiliário por modelos diferentes, com produção atual e desenho compatível, revelando um entendimento crítico do projeto original, mas propondo uma sua reinterpretação de acordo com os novos valores, necessidades, expectativas e hábitos? arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados? JPM: O reconhecimento e o estudo dos autores e produtores originais, bem como das instituições e indivíduos envolvidos no processo de encomenda e conceção é, sem dúvida, um dos veículos para se reconquistar essa dimensão. Uma importância igualmente crescente vem sendo atribuída aos processos de memória individual e coletiva, funcional e afetiva, das comunidades de utilizadores que foram dando sentido aos espaços, aos edifícios, aos objetos. Numa palavra, importa construirmos uma consciência da biografia dos objetos herdados, pela valorização das relações que com eles os homens estabeleceram. n

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No campo da arquitetura a nossa criatividade é sempre pressionada por restrições; isso é o que precisamos para lidar com o dia-a-dia, ou seja, a gravidade é uma restrição muito importante que todos os arquitetos precisam enfrentar. Mas eu não sinto que este seja um fator impeditivo da criatividade; na verdade, vejo isso mais como estímulo Mark Carrol

de Kahn. Outro exemplo de um interface que respeita a herança moderna é o nosso projeto residencial para um pequeno grupo de freiras na capela de Notre-Dame du Haute, em Ronchamp, projeto de Le Corbusier. Aqui, utilizámos o local como vantagem, colocando as residências na encosta, abaixo da obra de Le Corbusier. Esta localização das residências permitiunos manter as linhas existentes do local, de e para a Notre-Dame du Haut, desobstruídas. No entanto, conseguiu-se uma participação e uma relação espiritual próximas com esta pequena construção, através da seleção cuidada de materiais frugais e austeros, tais como o betão realizado no local. Adotámos também o uso de claraboias, para fornecer uma luz natural difusa, controlado de cima.

Mark Carroll

Arquiteto associado Renzo Piano Building Workshop arqa: Tendo em conta a sua investigação, como definiria a especificidade das intervenções contemporâneas no património moderno? MC: Cada projeto que desenhamos é inerentemente diferente de todos os nossos outros trabalhos, passados presentes e futuros. Isto deve-se a muitos fatores variáveis ​​diferentes que cada projeto contem, ou seja, as aspirações do cliente, necessidades funcionais, tecnologias disponíveis, condições do local, o contexto, orçamento, etc. Consequentemente, a nossa arquitetura e o seu interface com a herança moderna, varia de um projeto para o seguinte. Penso, no entanto, que também há um tema comum, o tema do respeito, que é constante em todo o nosso trabalho. Por exemplo, durante o processo de conceção da extensão do Museu de Arte de Kimbell entendemos ser necessário haver um diálogo, um diálogo arquitetónico, entre o Edifício de Kahn e o novo Pavilhão de Piano. Portanto, estávamos todos, (equipa de projeto e equipa do cliente), muito conscientes no sentido de garantir uma distância adequada entre os dois edifícios, de preservar o relvado com a dupla fileira de ulmeiros e de conceber um novo edifício com um único piso, de escala compatível. Além disso, não queríamos destruir a atmosfera maravilhosa do Edifício de Kahn, roubando-lhe visitantes e vivência. Em vez disso, tanto a nossa intenção como a do nosso cliente foi melhorar a vivência do edifício de Kahn, proporcionando novos espaços educativos, um auditório, para conferências e concertos, e galerias de arte, para exposições temporárias dentro do Pavilhão de Piano. Com o objetivo de que essas atividades distintas disponibilizadas no Pavilhão de Piano iriam revigorar a instituição com novos visitantes; por conseguinte, aumentando a vida útil do edifício

Renzo Piano Bulildind Workshop, Reabilitação da Fábrica Fiat Lingotto, Itália, 1983-2002

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© Gianni Berengo Gardin, cortesia RPBW

© Merlofotografia, cortesia RPBW

arqa: Se as obras de arquitetura pressupõem uma adaptação às transformações nas sociedades, como se pode equilibrar o respeito pela obra original moderna e a criatividade da intervenção contemporânea? MC: No campo da arquitetura a nossa criatividade é sempre pressionada por restrições; isso é o que precisamos para lidar com o dia-a-dia, ou seja, a gravidade é uma restrição muito importante que todos os arquitetos precisam enfrentar. Mas eu não sinto que este seja um fator impeditivo da criatividade; na verdade, vejo isso mais como estímulo. Portanto, o respeito pelos trabalhos modernos originais de arquitetura ou por obras históricas de arquitetura é apenas mais uma restrição que deve ser considerada um estímulo positivo à nossa criatividade como arquitetos. No entanto, quando se trata de trabalho “original” moderno uma abordagem prudente, com uma, é sempre recomendável e apreciada por todos. Este «intervenção leve» é expressa no nosso trabalho, no acrescento do High Museum em Atlanta. O edifício do museu original foi projetado por Richard Meier, no início dos anos oitenta. Ao contrário do Museu de Arte Kimbell, o espaço para o High Museum não era muito generoso, em relação aos requisitos do programa. Portanto, projetamos o novo edifício do museu para ser


© cortesia RPBW

Renzo Piano Building Workshop, Acesso e Mosteiro à Capela de Notre-Dame du Haute de Le Corbusier, Ronchamp, França, 2006-2011

instalado ao lado do edifício Meier existente, com uma altura, volume e cor semelhantes. Um pequeno espaço de cerca de 9 metros foi mantida entre os dois edifícios. Pontes de vidro ligam esses 9 metros, facilitando o itinerário dos visitantes entre as galerias do museu. Este conceito de fazer a ligação através das pontes permitiu ao nosso edifício manter uma distância ideal; perto o suficiente para ser estimulado pelo projeto original e longe o suficiente para o respeitar. arqa: Tendo em conta as dimensões territoriais e urbanas da arquitetura moderna, de que forma os edifícios modernos podem estabelecer relações significativas e produtivas com os seus contextos físicos e culturais alargados?

MC: Existem muitas ferramentas que nós, como arquitetos, podemos usar para que os nossos projetos incentivem relações significativas com seu contexto físico e cultural. Os elementos físicos: forma do construído, materiais, natureza, água; bem como os elementos não físicos: escala, transparência, luz, ritmo, tudo contribui para a noção de criar um relacionamento, ou uma ligação. A nossa arquitetura está obcecadamente preocupada com a ligação; é indiferente se é uma ligação com a grande escala urbana ou se é com um pequeno conjunto de contruções. Com a escala do projeto do Museu de Arte Kimbell, o material, a luz e a transparência certamente foram fatores que contribuíram para a criação do diálogo; no entanto, a qualidade e a integridade não devem ser menosprezadas. n

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Artes

ensaio

Neomodernos

Revisitar os clássicos do século XX

Sandra Vieira Jürgens|sandravieirajurgens@gmail.com

Ainda à espera de um novo conceito que defina bem o nosso “espírito do tempo” podemos aceitar a designação neomodernos. Com efeito, os investigadores, artistas, arquitetos tem se debruçado muito mais sobre o projeto moderno do que pela pós-modernidade ou mesmo pela pós-pósmodernidade. Nos últimos anos, entre a apropriação nostálgica e as práticas críticas, são muitas as possibilidades de encontrar retratados temas, aspetos, símbolos visuais relacionados com a modernidade e o modernismo na produção artística contemporânea. A modernidade, o modernismo e o projeto moderno constituem temas de análise em diferentes âmbitos e não apenas no universo académico. Contudo, nem mesmo nesta esfera existe um consenso em relação às raízes, à origem e aos limites temporais da modernidade. Existe uma pluralidade de modernidades, como nos ensinaram os estudos póscoloniais. Sabemos também que existem diferentes definições, conceções e versões de moderno e de modernismo. Um historiador da arte poderá dizer que o modernismo é um conjunto de movimentos, escolas e estilos que instauram uma nova cultura artística que rejeita a tradição e as convenções artísticas, situado na passagem do século XIX para o XX; outro dirá que o ano de 1863 pode ser considerado um dos seus marcos iniciais, por ser o ano da instituição do Salão dos Recusados e da publicação de O Pintor da Vida Moderna, obra do poeta e crítico Charles Baudelaire (1821-1867), primeiro autor a introduzir o termo de modernité; um outro afirmará que o marco essencial do modernismo se situa em 1907, data da apresentação de Les Demoiselles d’ Avignon. As dificuldades de definição atingem ainda a arte moderna. Há quem use a expressão arte moderna como sendo equivalente a modernismo, situando o seu início no século XIX ou na passagem deste para o século XX, alargando o seu limite cronológico até aos anos setenta do século passado, época em que se inicia o que designamos por arte contemporânea. Há igualmente controvérsia sobre os traços distintivos do projeto moderno. Para alguns este deu lugar ao pós-modernismo e constitui hoje uma entidade histórica mas para autores como Jürgen Habermas esse projeto está incompleto. Existindo diferentes versões e narrativas, prevalece a ligação da prática artística moderna à vontade de autonomia artística, ao desejo de existência de uma linguagem universal, à afirmação da abstração geométrica, ao formalismo. E digamos que são esses os traços que maior efeito têm tido nas várias reapropriações e reciclagens dos últimos anos. Se as referências da pintura moderna são Kazimir Malevich, Piet Mondrian, Joseph Albers, não deixa de ser curioso que entre os artistas seja o tema da arquitetura moderna o mais recorrente. Na década de noventa, Hiroshi Sugimoto registou o Seagram Building de Mies van der Rohe (1997), depois a Villa Savoye de Le Corbusier (1998). De resto, os edifícios mais citados pelos artistas são os projetos icónicos destes arquitetos. Em 1999, também Thomas Ruff começou a desenvolver a série L.M.V.D.R. – as iniciais de Ludwig Mies van der Rohe – na sequência de uma encomenda a propósito da renovação de dois projetos

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Ângela Ferreira, Indépendance Cha Cha, 2014. Cortesia: Lumiar Cité Em baixo: Anna Artaker, Die unbekannte Avantgarde, 2007

do arquiteto: a Haus Lange e a Haus Esters em Krefeld, na Alemanha. Dessa série faz parte uma fotografia do Pavilhão de Barcelona do mesmo arquiteto, também trabalhado por Dominique Gonzalez-Foerster, artista que em 1999, fez um projeto sobre o mesmo assunto. A viver temporariamente no Brasil, desde 1998, esta artista francesa, interessouse por uma noção de Modernidade Tropical, realizando trabalhos vários sobre novas conceções de modernidade, novas leituras do mundo, novas paragens e atmosferas que combinam a racionalidade e a arquitetura moderna ocidental com a dimensão emocional e o clima tropical. Brasília (Lucio Costa e Oscar Niemeyer), o Pavilhão de Ibirapuera, a generalidade das obras de Oscar Niemeyer e os principais trabalhos de Roberto Burle Marx tem sido foco de atenção de muitos artistas. Determinante para intensificar esta abordagem das práticas artísticas ao projeto moderno foi, em 2007, a realização da Documenta 12. Com direção artística de Roger M. Buergel, lançava como questão fundamental de discussão, o destino e o legado da modernidade através

de uma questão paradoxal: “Is Modernity our Antiquity?” [“Não será a Modernidade a nossa Antiguidade?”]1. Comum aos recursos e à metodologia das práticas artísticas centradas na modernidade é a apropriação de imagens pré-existentes. Os documentos fotográficos de edifícios modernos constituem elementos do vocabulário formal da arte contemporânea, verificando-se em muitos casos uma abordagem crítica ao potencial utópico da modernidade e ao fracasso desse ideal, que transcende a simples homenagem aos seus autores e às suas obras mais emblemáticas. São muitos os projetos que se ocupam da promessa de transformação social, das dimensões sociais e políticas do projeto moderno, da secularização, do desejo de igualdade, do progresso, do direito à autodeterminação, da democracia, dos princípios dos direitos humanos e do lado mais sombrio da modernidade, o colonialismo. Se tomarmos em conta o catálogo de uma exposição dedicada ao tema, como é Modernologías: Artistas contemporáneos investigan la modernidad y el modernismo – realizada no Museu d’Art Contemporani de Barcelona (2009/2010), com curadoria de Sabrine Breitwieser –, verificamos que na generalidade dos casos, é entre aqueles que indagam e interrogam determinados episódios, aspetos e dimensões contraditórias e ambivalentes da modernidade e do modernismo que encontramos os trabalhos mais interessantes. São eles que indagam os paradoxos e os becos sem saída destas visões de mundo, constituindo reflexos críticos sobre as suas múltiplas facetas. A artista austríaca Anna Artaker, presente na exposição, desenvolveu uma série de trabalhos Die unbekannte Avantgarde [Vanguarda desconhecida], 2007, bastante interessante, em que se apropriou de fotografias documentais de movimentos e grupos de vanguarda artística e examinou o modo como se inscreveram e permaneceram representados na história oficial do modernismo. O trabalho consistiu na seleção de dez fotografias históricas que representam coletivos das vanguardas do século XX (Dada, Surrealistas, Bauhaus, a Internacional Situacionista, etc.)2 e onde aparece uma só mulher em cada grupo. Interessando-se por esta demonstração da posição isolada das mulheres na história da arte, neste trabalho, Anna Artaker rescreve a história, corrigindo essa perceção e assinalando a atividade das mulheres nas vanguardas. Expondo o que ficou à margem da história oficial destes movimentos, o seu projeto evidencia simultaneamente a complexa interação entre a representação e a realidade. Também representado nesta exposição estava Armando Andrade Tudela, artista peruano, interessado em analisar de que forma os cânones ocidentais são assimilados e reativados política e socialmente em contextos locais. Na série Camión apresenta imagens documentais de veículos pesados – registados pelo artista entre outubro e dezembro de 2003 nas autoestradas peruanas Central, Panamericana Sur, Panamericana Norte e Lima Metropolitana – com logótipos empresariais que evidenciam uma apropriação vernacular de elementos da cultura erudita. Muito concretamente, recuperaram formas muito semelhantes à abstração europeia do pós-guerra, por exemplo da pintura geométrica das décadas de cinquenta e a setenta do século XX. No seu trabalho,

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dESIGN

ensaio

Martino Gamper O design é um estado de alma

Carla Carbone|carlacarbone@yahoo.com

Parecemos estar a testemunhar, a par de uma certa “decadência dos costumes”1, (Como nos dizia Charles Baudelaire), a um empobrecimento do ‘projeto moderno’, tal como ele ainda é visto hoje, de algo que não foi ainda terminado. Vemos permanentemente projetos que se estendem e estruturam com o recurso (estilístico, ideológico) ao passado. Aqui e ali evocam-se os grandes mestres da primeira metade do século XX. Voltam-se os olhares para o período mais industrial e mecanicista desta disciplina, e não menos alvo de críticas por parte dos movimentos que conhecemos na década de 90 (droog design). Há como que um saudosismo e um retrocesso ao materialismo da década de 20 e 30., habituada ao experimentalismo cientifico, em prol da mecanização e das exigências autoritárias da industria. Observamos nisto um misto de tendências, que podem ser presenciadas nas feiras de agora, a Bem do fervor saudosista, vemos como que um florescer do gosto que evoca as formas desnudas da arquitetura dos finais do séc. XIX, que tem como símbolo mais permanente a torre Eiffel, as formas que elogiam os metais ou as superfícies transluzentes e brilhantes, provocadas pelo polimento. Voltam-se os designers para estes materiais e formas do passado, e a pergunta que aflora é se não estarão os mesmos de facto numa concreta fase de crise criativa. Vejamos o que, em 1846 nos dizia Baudelaire no seu texto The Salon of 1946: On the Heroism of Modern Life, a propósito de modernidade: “Before trying to distinguish the epic side of Modern Life, and before bringing examples to prove that our age is no less fertile in sublime themes than past ages, we may assert that since all centuries and all peoples have had their own form of beauty, so inevitably we have ours.” Em suma, o que nos diz Baudelaire é que, de certo modo, as novas gerações estavam a ser preguiçosas, e não acreditavam no poder modernizador da sua época, salientando, que a nossa época não é menos fértil em temas sublimes que as épocas passadas, e que todas tem as suas especificações. Podemos apoderar-nos desta apurada analise do autor, na sua época, e transferimo-la para o presente, fazermos uma observação do que acontece hoje, e o crescente interesse pelo antigo. Talvez este interesse pelo passado denuncie uma maior facilidade, apresente-se como que numa mais rápida resposta a modernidade, esquecendo que as respostas estão la, no seu tempo, que é um período único. Segundo Baudelaire: “todas as formas de beleza, assim como todos os fenómenos possíveis, contêm, em si, um elemento eterno e um elemento transitório - o absoluto e o particular. Que o absoluto e o eterno não existem, ou são apenas o resultado de uma abstração geral de diferentes belezas. O elemento particular em cada manifestação vem das emoções, e assim, como temos as nossas emoções particulares, assim possuímos a nossa própria beleza” Emoções: Observamos o designer Martino Gamper empilhar os vários objetos, e depois expô-los, numa tentativa de refletir essa mesma

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capacidade que os objetos têm de poderem ser recetáculos ou cristalizarem sentimentos, memórias, momentos simbólicos. Martino Gamper, no seu texto de apresentação da exposição, na lendária Serpentine Gallery, onde esteve patente até 18 de Maio, deste ano, referiu justamente o seguinte: “There is no perfect design and there is no über-design. Objects talk to us personally. Some might be more functional than others, and the emotional attachment is very individual. This exhibition showcases a very personal way of collecting and gathering objects – these are pieces that tell a tale”. Já William Morris dizia: “se quiserem uma regra de ouro que sirva toda a gente, ela será certamente a de que: nada devem possuir em vossas casas que não saibam para que serve, ou que acreditem que seja belo”. Como se sabe, nem tudo o que possuímos em casa é inequivocamente claro na sua funcionalidade primária (ou útil). Donald A. Norman, no seu livro Emotional Design (o mesmo autor de “The Design of Everyday Thing’s”) faz a mesma pergunta a respeito de objetos que possui em casa, variados bules, e que aparentemente não respondem a necessidades de ordem prática, ou imediata: “Porque é que sou tão ligado aos meus bules? Porque é que os exibo no parapeito da minha janela e os vislumbro de quando em vez?, mesmo quando não estão a ser usados?”, Mesmo quando não são deliberadamente úteis? Como o exemplar que tem em casa do bule coffeepot for masochists, de Jacques Carelman. Donald A. Norman valoriza os seus diferentes bules, não apenas pela suas funções de preparação para chá, mas também porque são trabalhos esculturais artísticos. Norman descreve os vários prazeres que extrai desses objetos: “Gosto de me colocar diante da janela e comparar os contrastes oferecidos pelas diferentes formas dos bules, apreciar o jogo de luzes formados nas variadas superfícies.” O autor do clássico livro ‘The Design of Everyday Thing’s’, procura os objetos não só pelas suas qualidades pragmáticas mas também pelo contexto em que os mesmos surgem, estados de espírito, ocasiões .Em suma, os objetos guardam historias e são um corolário de emoções.

Inevitable Weave, Ongay Perez Ao lado: Instalação de Martino Gamper, Design is a State of Mind


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dossier

O Projecto de Investigação Ruptura Silenciosa, realizado na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto entre 2009 e 2013, estudou a proximidade entre os movimentos de renovação no cinema e na arquitectura nas décadas de 60 e 70 do séc. XX, que corporizaram uma nova visão do espaço e da cidade. A investigação foi feita sobre os objectos arquitectónicos e cinematográficos que estabeleceram uma ruptura silenciosa, dando um sinal das convulsões na sociedade portuguesa. O período em estudo é particularmente rico no que se refere às intersecções entre a arquitectura e o cinema e isso deve-se ao facto dos arquitectos estarem intensamente ligados ao cinema, fundando cineclubes, escrevendo crítica cinematográfica ou participando na rodagem dos filmes, mas também à circunstância de que aos cineastas interessava retratar a cidade contemporânea, privilegiando-a como cenário para os seus filmes.

ruptura silenciosa intersecções entre a arquitectura e o cinema. portugal 1960-1974

Cineastas e arquitectos circulavam nos mesmos meios e discutiam como as duas disciplinas se podiam influenciar, não apenas culturalmente, mas como processos de projecto que lidam com o uso do espaço. Provavelmente como nenhum outro método de visualização, as imagens em movimento conseguem representar os espaços arquitectónicos como espaços vividos e habitados. O cinema é muitas vezes encarado como um meio que, através da relação espaço/tempo, da mise-en-scène, dos personagens e do argumento, pode circunscrever importantes debates sobre a arquitectura e a vida urbana. Os arquitectos e cineastas portugueses estavam também envolvidos politicamente na luta contra o regime político de Salazar e Caetano, que fechou o país num ambiente repressivo e claustrofóbico. Um dos principais objectivos do projecto de investigação foi perceber como a arquitectura e o cinema portugueses, contaminados pelo contexto internacional, introduziram uma vontade de ruptura com o passado, dentro e fora das suas disciplinas, reflectindo simultaneamente a atmosfera cultural, social e política que levou à Revolução de 1974.

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Filmes

A investigação incluiu uma componente prática que se concretizou na produção de curta-metragens

sobre edifícios emblemáticos do período em estudo, onde a informação e o conhecimento adquiridos através da pesquisa foram aplicados. Essas curtas-metragens exploraram uma nova forma de perceber o espaço arquitectónico e urbano procurando um equilíbrio entre um necessário lado documental e uma intencional relação emocional com o espectador, usando as imagens em movimento, não apenas como método de representação da arquitectura, mas também como um veículo para enfatizar a espacialidade vivida e o sentido de lugar criados pelo uso, a atmosfera, a materialidade, a luz ou o som de cada um dos lugares retratados. Esta componente prática, e o reconhecimento em festivais de cinema que alguns dos filmes obtiveram, permitiu, de forma algo surpreendente para a equipa, uma assinalável atenção mediática sobre o trabalho desenvolvido e a uma inusitada presença de público nas exibições das curtas-metragens.

também algumas narrativas associadas à casa, como o facto de ter sido palco de encontros clandestinos no período de repressão política pré-revolução ou lugar de encontros colectivos depois de 1974, marcando sucessivas gerações de arquitectos. – PROJECTO Vill’Alcina, 1970-73. Caminha ARQUITECTO Sergio Fernandez REALIZAÇÃO E ARGUMENTO Luis Urbano ASSIST. REALIZAÇÃO Ana

Resende FOTOGRAFIA Miguel C. Tavares, Rui Manuel Vieira MONTAGEM Miguel C. Tavares PÓS-PRODUÇÃO VÍDEO Joana Deusdado PÓSPRODUÇÃO ÁUDIO Armando Ramos MÚSICA ORIGINAL Guilherme Lapa INTERPRETAÇÃO Joana Batista, Júlio Resende, Nuno Bernardo, Pedro

RUPTURA SILENCIOSA / FILMES

Loureiro, André Urbano

siZÍgia Em Sizígia, curta-metragem filmada na Piscina das Marés em Leça da Palmeira, seguimos o percurso de um personagem solitário ao longo de um dia de trabalho, procurando uma identificação do espectador com o olhar da câmara, mas também com o do próprio actor, permitindo que a narrativa desvende os espaços do edifício através de múltiplas solicitações hápticas. – PROJECTO Piscina das Marés, 1959-73. Leça da Palmeira ARQUITECTO

Álvaro Siza REALIZAÇÃO Luis Urbano ASSIST. REALIZAÇÃO Ana Resende ARGUMENTO Ana Resende, Luis Urbano, Miguel C. Tavares, Pedro

Neto FOTOGRAFIA Miguel C. Tavares, Pedro Neto MONTAGEM Miguel C. Tavares PÓS-PRODUÇÃO VÍDEO Joana Deusdado SONOPLASTIA Ana Resende, Miguel C. Tavares MÚSICA ORIGINAL Guilherme Lapa INTERPRETAÇÃO Rui Pinto

a casa do lado A Casa do Lado é um filme realizado na Vill’ Alcina, casa de férias em Caminha desenhada por Sergio Fernandez no início dos anos 70, e onde se exploram não só a vivência dos espaços, nomeadamente a questão do uso, do conforto e da luz, mas

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a encomenda Entre 1959 e 1961, Raúl Hestnes Ferreira desenhou e construiu uma pequena casa de fim de semana, em Albarraque, nos arredores de Lisboa, para o seu pai, o poeta José Gomes Ferreira. A Casa de Albarraque, como foi ficando conhecida, continua hoje, passados mais de 50 anos, uma encantadora e inesperada peça, montada sobre o suave declive do terreno, sugerindo-nos diversificados e surpreendentes espaços novos, a propósito do modo como se articulam e sucedem aqueles mais normativos. A curta metragem A encomenda introduz-nos no ambiente da casa, tomando como pretexto a chegada de um carteiro muito palavroso, anarquista e abelhudo (Homero Roque) que a vai percorrendo, abrindo e fechando armários, mexendo nos objectos, nos quadros, enquanto perora contra o Governo ou declama poemas de José Gomes Ferrreira, sob o olhar enfadado do proprietário (o próprio Arquitecto Raul Hestnes Ferreira). “Esta casa é um espaço de poesia! É poesia militante feita com o espaço!”, elogia o carteiro, enquanto se perde na observação das várias subtilezas da casa, antes de se despedir. Só depois da sua definitiva partida, Raúl Hestnes Ferreira poderá calmamente ouvir música, concluindo pequenas bricolages, antes de


se sentar no pátio, ao sol, para então descobrir (e nós, com ele), finalmente, o conteúdo d’ A encomenda. PROJECTO Casa de Albarraque, 1959-61. Albarraque ARQUITECTO Raúl

Hestnes Ferreira REALIZAÇÃO E ARGUMENTO Manuel Graça Dias ASSIST. REALIZAÇÃO Luis Urbano FOTOGRAFIA E SOM Miguel C. Tavares, Rui

Manuel Vieira MONTAGEM Miguel C. Tavares PÓS-PRODUÇÃO VÍDEO Joana Deusdado PÓS-PRODUÇÃO ÁUDIO Armando Ramos INTERPRETAÇÃO Homero Roque, Raúl Hestnes Ferreira

terreno que a casa se abre, ao longo de um “L”, relacionandose mais privadamente com o jardim. A sua compartimentação, paradoxalmente formal mas pouco convencional, remete-nos, quase só num único piso (o superior), para uma estratégia de espaços labirínticos requintadamente iluminados. A curta metragem A limpeza introduz-nos neste ambiente, fazendo-nos seguir os movimentos de uma jovem empregada (Joana Manaças) com uma noção muito própria do serviço doméstico e que, na ausência da autoritária patroa (Teresa Gafeira), vai percorrendo os cantos à casa com especial determinação. “E, sobretudo, não deixa nenhuma porta ou janela aberta! Anda por aí muita malandragem e isto parece a casa das mil janelas!”, recomenda-lhe a patroa antes de partir para fim de semana. Joana, contudo abre toda a relação da casa com o jardim e com os pátios, seguida de perto pelo olhar de um jardineiro um pouco voyeur, o qual, já no fim do filme, sofrerá uma enorme decepção. – PROJECTO Casa Weinstein, 1970-74. Cascais ARQUITECTO Manuel Vicente REALIZAÇÃO E ARGUMENTO Manuel Graça Dias ASSIST. REALIZAÇÃO

Luis Urbano CINEMATOGRAFIA E MONTAGEM Rui Manuel Vieira SOM Bruno Nacarato ASSIST. PRODUÇÃO Ana Maria Trabulo, Marta Alves PÓS-PRODUÇÃO VÍDEO Joana Deusdado PÓS-PRODUÇÃO ÁUDIO Armando

Ramos ASSIST. PÓS-PRODUÇÃO ÁUDIO Tiago Cardoso INTERPRETAÇÃO

29-a

Joana Manaças, Teresa Gafeira, Egas José Vieira, Manuel Teles Grilo, Gonçalo Foro, Tiago Pereira, Nuno Ferreira, Iroa Borges

RUPTURA SILENCIOSA / FILMES

29-A é um lugar intrigante. Um corpo desenhado por homens e mulheres que se movimentam num tenso jogo de relações. As ruas aéreas são um espaço em aberto, um desafio à invenção de viver. Sempre foi assim, no passado e no futuro. Neste lugar, a arquitectura não tem tempo e as personagens não têm idade. – PROJECTO Conj. Habitacional Olivais Sul, 1962. Lisboa ARQUITECTO

Vítor Figueiredo e Vasco Lobo REALIZAÇÃO E ARGUMENTO Circo de Ideias (Gonçalo Azevedo, Joana Couceiro, Magda Seifert, Pedro Baía) DIR. PRODUÇÃO Luis Urbano ASSIST. PRODUÇÃO Ana Maria Trabulo,

Marta Alves CINEMATOGRAFIA E MONTAGEM Rui Manuel Vieira SOM Bruno Nacarato PÓS-PRODUÇÃO VÍDEO Joana Deusdado PÓS-PRODUÇÃO ÁUDIO Armando Ramos ASSIST. PÓS-PRODUÇÃO ÁUDIO Tiago Cardoso MÚSICA ORIGINAL Birds Are Indie INTERPRETAÇÃO Sofia Dinger, Carlos

Azevedo, João Crisóstomo, Maria Manuel Barreiros, Guida Marques, Pedro Crisóstomo, Carlos M. Guimarães

panorama No Porto, hoje, Lois está só, fragilizada, a habitar um mundo onde a arquitectura, tragicamente, não consegue evitar o desapego; mas a súbita possibilidade de um reencontro parece querer interromper a inevitabilidade desse processo... Panorama incorpora o tema dos edifícios em altura - da cidade confortavelmente distante mas irremediavelmente interiorizada - a partir da apropriação de personagens e imaginários que embora exteriores à nossa especificidade cultural habitam, com uma certa naturalidade, o desencanto e a melancolia que hoje parecem caracterizar a experiência quotidiana. Entre demolições e super-heróis, Panorama procura representar a perda e a resistência à perda, a esperança e a resistência à esperança, temas que se apresentam comprimidos, quase indistintos. – PROJECTO Edifícios Torre da cidade do Porto – Jornal Notícias (Márcio

de Freitas, 1965-70), Hotel D. Henrique (C de Almeida, José Carlos

a limpeZa Entre 1969 e 1974, Manuel Vicente desenhou e construiu uma casa em Cascais para a família Weinstein. A Casa Weinstein assume-se, face à rua, como uma quase cega parede forrada a pedra de onde emerge uma abstracta bow window que, com o átrio refundado da entrada, introduz uma mancha colorida e misteriosa a meio da composição. É para o interior do (pequeno)

Loureiro, Luís Pádua Ramos, 1966-74), Grupo de Moradias Populares do Aleixo (Manuel Telles, 1969-76) REALIZAÇÃO E ARGUMENTO Francisco Ferreira com a colaboração de João Rosmaninho ASSIST. REALIZAÇÃO Luis Urbano, Bruno Nacarato DIR. PRODUÇÃO Luis Urbano ASSIST. PRODUÇÃO Ana Maria Trabulo, Marta Alves CINEMATOGRAFIA Bruno

Nacarato MONTAGEM Francisco Ferreira, Bruno Nacarato SOM Rui Manuel Vieira PÓS-PRODUÇÃO ÁUDIO Armando Ramos MÚSICA ORIGINAL The Beautiful Schizophonic INTERPRETAÇÃO Sofia Duarte Silva

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dossier

Portugueses fora de Portugal

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Fotografia: FG+SG maio|junho 2014

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News

marketing

Maria Rodrigues | mrodrigues@revarqa.com Carmen Figueiredo | cfigueiredo@revarqa.com

Prémio Internacional Silver Award É com enorme orgulho que a AROUNDtheTREE, marca portuguesa de design de mobiliário, pelo designer Alexandre Caldas, vence o Prémio Internacional SILVER AWARD pela A’DESIGN AWARDS. A reinterpretação da cadeira mais icónica portuguesa, uma das maiores referências do design nacional dos anos 50, foi levada além fronteiras, dando a conhecer ao mundo do design as raízes portuguesas, a um nível de perfeição completa, aliando as madeiras mais nobres a materiais tradicionais, como a cortiça natural, resultando em peças de design exclusivo. Com apenas um ano de existência, para além deste prémio internacional, a AROUNDtheTREE foi convidada para ser parte integrante da exposição permanente do MUDE (MUSEU NACIONAL DE DESIGN), uma referência no mundo do design. www.aroundthetree.eu

Encontro Nacional de Estudantes de Arquitetura O I Encontro Nacional de Estudantes de Arquitetura decorreu na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, de 10 a 13 de Abril deste ano. O evento foi organizado por Rodrigo Gonçalves e Sofia Fidalgo, estudantes de 4.º ano. A iniciativa pioneira contou com visitas guiadas a obras e ateliers do Porto, conferências com arquitetos portuenses e convívios. O ENEA pontuou-se pelo espírito crítico, sendo unânime a necessidade e urgência da união dos estudantes, na discussão do ensino e prática da arquitetura. O encontro contou com a participação de alunos da FAUL, do IST, do ISCTE, da FCTUC e da UBI. A próxima edição será em Lisboa, mantendo-se a expectativa que o evento continue a crescer, podendo futuramente auxiliar na defesa dos direitos do estudante e futuro profissional de arquitetura. https://www.facebook.com/pages/I-ENEA-Encontro-Nacional-de-Estudantes-deArquitetura/225198897678355

resultando assim num conjunto de soluções, que aliam o design dinâmico e a perfeita funcionalidade de uma torneira de banho Ctesi. www.ctesi.pt

Nova gama de Radiadores

Ctesi vence Ouro e Prata no maior concurso mundial de design O design da torneira Smooth foi premiado com o Silver Award, enquanto o modelo Straw foi galardoado com o Golden Award, na categoria de mobiliário de banho e sanitários, do concurso A’Design Awards, que tem como principal objetivo destacar os melhores produtos orientados para o design e conceitos de excelência, no domínio da arte, do design e da arquitetura. O design da Straw, da autoria da designer Catarina Violante e da Smooth, da autoria do designer Jorge Marques, nasceram de um desafio, lançado pela Barros & Moreira, à Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha. Na resposta, desconstruíram-se as habituais formas deste tipo de produto,

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A pensar no máximo conforto e bem-estar, a nova gama de radiadores da Vulcano aliam uma construção inovadora uma estética moderna e discreta, que se enquadra perfeitamente em qualquer espaço. Com seis modelos de entreeixo (de 350 a 800mm) e ligações a 1”, os radiadores da Gama Master foram concebidos de forma modular, de modo a permitir várias configurações. O seu desenho inovador que favorece a relação peso/potência térmica e ao mesmo tempo menor peso, proporciona a obtenção de um excelente rendimento térmico. Este novo produto destaca-se também pela abertura das costas que, por ser de superfície palhetada, permite uma maior troca térmica com o ar ambiente. Estes radiadores têm maior profundidade para maior conteúdo de água na instalação otimizando a inércia térmica e como tal, melhora a sensação de conforto. www.vulcano.pt


News

marketing

certificação de inovação a nível mundial; Troféu Inovação, na 20ª edição dos Troféus Luso Franceses, organizada pela Câmara de Comércio e Indústria Luso-Francesa; Prémio Inovação, na Tektónica. www.revigres.com

Love Tiles e Margres, na MosBuild 2014

Pavimento Premiado REVICOMFORT é um pavimento inovador, desenvolvido pela Revigrés, em grés porcelânico, amovível e reutilizável, rápido e simples de colocar: não é necessário usar cimento cola, nem betume, nem precisa de mão-de-obra especializada. Aplica-se diretamente sobre qualquer suporte e está pronto a usar. Não danifica o pavimento preexistente, pode ser facilmente retirado e reutilizado noutro local. É uma solução sustentável e versátil, ideal para renovações e para aplicações rápidas e está disponível nas várias coleções REVIGRÉS. O pavimento Revicomfort da Revigrés já foi distinguido com vários prémios: A’Design Award Gold 2014; Produto do Ano 2014 Grande Prémio de Marketing e Inovação, uma

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Love Tiles e Margres, marcas da Gres Panaria Portugal S.A.,estiveram presentes na 20º edição da MosBuild, que decorreu na Expocenter, Moscovo, de 15 a 18 de Abril. Pela 5ª vez nesta exposição, considerada a maior na área da construção e interiores, na Rússia e Leste Europeu,a Gres Panaria reforça assim a sua estratégia de internacionalização nesta região do globo. No certame, a Love Tiles apresenta as coleções Charm, Parfum, Loft e Fusion e a Margres destaca a mais recente coleção Subway. A Margres e a Love Tiles consolidam desta forma a sua estratégia no mercado Russo, ao mesmo tempo que alargam a oferta nos países da Europa de Leste, zona particularmente interessante pelo aumento da taxa de importação de cerâmica plana. www.lovetiles.com • www.margres.com

European Business Awards 2014 O Grupo Cosentino, empresa familiar espanhola líder na produção e distribuição de superfícies inovadoras para o mundo da arquitetura e do design, foi premiado nos European Business Awards 2013-2014, na categoria Importação/ Exportação. Esta distinção reconhece a Cosentino como a melhor empresa europeia no que à internacionalização diz respeito, e valoriza “o seu crescimento constante em volumes de exportação, a sua expansão para novos mercados e a introdução de processos criativos e inovadores”. Desta forma, é valorizada por parte da organização “a solidez na gestão e o desenvolvimento do comércio internacional, e a capacidade de manter e melhorar a posição no mercado, perante os seus competidores”. Atualmente, o Grupo Cosentino distribui os seus produtos e marcas em mais de 80 países e gere de forma direta, a partir da sua sede, instalações próprias em mais de 20 deles. 90% da faturação do Grupo é gerada a partir dos mercados internacionais. www.cosentino.pt




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