Revista Arte Brasileira - edição 2

Page 1


Indicações:

Música:

Bat macumba (Os mutantes)

. As rosas não falam (Cartola)

Viajando (Ventania)

Nocturno (Chopin)

Como eu quero (Kid Abelha)

Refrão de um bolero (Engenheiros do Hawaii)

A hora do trem passar (Raul seixas

Livros:

Cem anos de solidão (Gabriel García Márquez)

Assim falou Zaratustra (Friedrich Nietzsche)


A sábia hippie

Como diz a hippie, a minha pira é a minha criança que de vez em quando me visita. Buh!!! – ela diz também, com um olhar vermelho e com artesanatos espalhados pelo corpo. Depois, a hippie de Curitiba me olha pelas lentes dos computadores e me alerta com um sotaque de médico – você deve fazer o que quer! – e eu sorrio por fora para parecer simpático, e me derramo em pranto por dentro, para satisfazer a ausência do que eu quero. A hippie leva uma vida muito louca! E também leva a vida como se levam as cargas de remédios de um canto para o outro. Ela, a hippie, me distrai, contando histórias absurdas e dramáticas, pois ela é, além de uma espiã da felicidade, uma atriz da vida real. De forma insensata, eu fico sem saber o que ela deseja ou despreza. Não sei! – eu penso. E penso novamente, e chego a conclusão de que Sócrates era o cara mais certo do mundo quando dizia “só sei que nada sei”. Por isso, eu devo minha maresia a minha própria tristeza. O que seria da minha fé na alegria se não fossem minhas lágrimas, que a sempre molham meu rosto; o que me intriga é o sabor de minha tristeza, que pouco cheira, mas muito tem gosto de hortelã. Novamente, eu digo – não sei – e ouço uma música do álbum NAVE MANHÃ, TRUPÉ CHÁ DE BOLDO, que tem uma canção que diz assim: “Então desarma o seu coração, arranca esses óculos escuros, pra que teus olhos vermelhos e úmidos mirem os meus”, e então me lembro da hippie. Aquela mesma que me disse coisas sobre ser quem eu sou, e não fugir de minha sombra, como tenho feito nos últimos anos. Contudo, eu não posso fingir pra mim mesmo que sou algo inteligente ou muito racional, pois eu só penso em situações instintivas, ao contrário do que todos pensam. Eu não sou nada, mas o nada pode ser de vez em quando o tudo. O maestro da hippie a ensinou coisas que nem o mais sábio dos sábios saberia ensinar. O maestro da hippie é ninguém menos do que a vida, e o tempo. Pois é! O maestro da hippie é tão grande, que acaba até mesmo sendo dois ao mesmo tempo. Fato que me impressiona e me leva novamente a lembrar dela: a hippie e suas palavras inteligentes e liberatórias. A hippie! Ah... a velha hippie, que tanto já fumou, tanto já trilhou e tanto quis me ensinar. Mas a maior lição de todas, será sempre aquela que ela não cansa de me dizer – O mundo pode cair, mas você estará de pé, se quiser. E a sua sombra será sua guia, a sua professora preferida. E seus olhos, ainda que não queira, muitas vezes se limitará a uma vista por de trás de uma janela.

Matheus Luzi


Poema da amante

Eu te amo Antes e depois de todos os acontecimentos, Na profunda imensidade do vazio E a cada lágrima dos meus pensamentos. Eu te amo Em todos os ventos que cantam, Em todas as sombras que choram, Na extensão infinita dos tempos Até a região onde os silêncios moram. Eu te amo Em todas as transformações da vida, Em todos os caminhos do medo, Na angústia da vontade perdida E na dor que se veste em segredo. Eu te amo Em tudo que estás presente, No olhar dos astros que te alcançam E em tudo que ainda estás ausente. Eu te amo Desde a criação das águas, desde a idéia do fogo E antes do primeiro riso e da primeira mágoa. Eu te amo perdidamente Desde a grande nebulosa Até depois que o universo cair sobre mim Suavemente.

Adalgisa Nery


O tempo está passando cada vez mais rápido Quanto mais velho se fica, mais a impressão de que o tempo está passando mais rápido se torna presente. Muitos dizem que depois dos vinte anos, o tempo passa bem mais rápido; talvez isso poça ser explicado citando que a partir dos vinte anos, a maioria dos jovens estão trabalhando e estudando, o que faz com que a pessoa se distraia mais e não veja a hora passar. Além disso, nós não lembramos muito de nossa infância, ou seja, as lembranças começam a aparecer a partir de uns dezessete anos. Com isso, o tempo parece ter passado mais rápido, justamente por causa das lembranças. Outros elementos podem fazer com que surja a impressão de que o tempo está passando mais rápido, como o amor, os entretenimentos, a alegria, a ocupação. O amor faz com que a pessoa apaixonada se sinta bem caso esteja ao lado de seu amante, e a faz esquecer as horas. Os entretenimentos são os principais meios de se esquecer a hora, pois nos dias de hoje, existem computadores e televisões, além dos celulares, que permitem um acesso livre e demorado por parte do usuário. É muito difícil encontrar alguém que fique menos de uma hora em frente as tecnologias. Nos meios de comunicação citados acima, encontra-se pornografia, comédia, e muita leitura; cada um desses elementos ajudam de forma significativa a aumentar a distração e o esquecimento das horas. E por fim, a alegria. Quando se esta alegre, não repara-se as horas, por isso que os finais de semana geralmente passam mais rápido. A alegria é uma droga natural, e toda droga causa esse efeito. Com isso, o entretenimento e as ocupações são as principais causadoras da frase “O tempo está passando cada vez mais rápido”.

Matheus Luzi


O haver

Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura essa intimidade perfeita com o silêncio. Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo. Perdoai: eles não têm culpa de ter nascido. Resta esse antigo respeito pela noite esse falar baixo essa mão que tateia antes de ter esse medo de ferir tocando essa forte mão de homem cheia de mansidão para com tudo que existe. Resta essa imobilidade essa economia de gestos essa inércia cada vez maior ante diante do infinito essa gagueira infantil de quem quer balbuciar o inexprimível essa irredutível recusa à poesia não vivida. Resta essa comunhão com os sons esse sentimento da matéria em repouso essa angústia da simultaneidade do tempo essa lenta decomposição poética em busca de uma só vida de uma só morte um só Vinícius. Resta esse coração queimando como um círio numa catedral em ruínas essa tristeza diante do cotidiano ou essa súbita alegria ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória. Resta essa vontade de chorar diante da beleza essa cólera cega em face da injustiça e do mal-entendido essa imensa piedade de si mesmo essa imensa piedade de sua inútil poesia de sua força inútil. Resta esse sentimento da infância subitamente desentranhado de pequenos absurdos essa tola capacidade de rir à toa esse ridículo desejo de ser útil


e essa coragem de comprometer-se sem necessidade. Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza de quem sabe que tudo já foi, como será e virá a ser. E ao mesmo tempo esse desejo de servir essa contemporaneidade com o amanhã dos que não têm ontem nem hoje. Resta essa faculdade incoercível de sonhar, de transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade de aceitá-la tal como é e essa visão ampla dos acontecimentos e essa impressionando e desnecessária presciência e essa memória anterior de mundos inexistentes e esse heroísmo estático e essa pequenina luz indecifrável a que as vezes os poetas tomam por esperança. Resta essa obstinação em não fugir do labirinto na busca desesperada de alguma porta quem sabe inexistente e essa coragem indizível diante do grande medo e ao mesmo tempo esse terrível medo de renascer dentro da treva. Resta esse desejo de sentir-se igual a todos de refletir-se em olhares sem curiosidade, sem história. Resta essa pobreza intrínseca, esse orgulho, essa vaidade de não querer ser príncipe senão de seu reino. Resta essa fidelidade à mulher e ao seu tormento esse abandono sem remissão à sua voragem insaciável. Resta esse eterno morrer na cruz de seus braços e esse eterno ressuscitar para ser recrucificado. Resta esse diálogo cotidiano com a morte esse fascínio pelo momento a vir, quando, emocionada ela virá me abrir a porta como uma velha amante sem saber que é a minha mais nova namorada.

Vinicius de Moraes


A pátria das chuteiras

Em meio a tantas camisas verde-amarelas que pululam a cidade é difícil ignorar que estamos vivenciando uma Copa do mundo em nosso território. Com a onda canarinho vem uma sapucaí de festas para brasileiros e gringos desfilarem lado a lado. Os protestos ocorrem, mas eles passam despercebidos para a maioria dos torcedores diante da euforia da Copa. Um estrangeiro pergunta o que aquele grupo cercado por policiais estava fazendo na praia de Copacabana? Eu explico. Eles entendem e se solidarizam, mas a conversa não dura mais que cinco minutos. O que eles querem mesmo saber é da comida, das festas, do placar. Em conversas animadas, desfilam elogios às mulheres brasileiras e até aos homens: sarados, bronzeados, descolados. O inverno aqui é quente, eles dizem. A terra arde e a pele dos cariocas arde em erotismo. “Eu poderia viver aqui. Aqui é o paraíso”. Pergunto-me onde perdi meus óculos. Por que não tenho esse mesmo olhar sobre o Brasil? O que me incomoda? Eles vivem o sonho de suas vidas. Uma Copa do mundo no Brasil. Um jogo no Maracanã. Olham admirados as levas de torcedores no metrô ornados de verde e amarelo da cabeça aos pés. As mulheres colocam maquiagem com as cores da bandeira e pintam as unhas combinando com a camisa. “Nossa! Vocês respiram futebol! Me disseram que é como religião para os brasileiros.” Falam como forma de elogio, admiração, deslumbramento, mas alguma coisa continua me incomodando. Ao mesmo tempo, fazem elogios em relação ao metrô do Rio: limpo, organizado, moderno. Meus Deus, será que sou muito exigente? Em meio a tanto entusiasmo, sinto-me perdida. Ao voltar pra casa, converso com amigos professores, e o abatimento me envolve. O que importa a vitória do Brasil, a Fan Fest em Copacabana, a vista do Cristo Redentor se tudo que vejo é o beco para a situação atual da educação pública no Rio de Janeiro: turmas lotadas, alunos analfabetos ingressando no 6º ano (antiga 5ª série); todos os tipos de disfunções que se podem imaginar compartilhando a mesma classe. Sem falar dos baixos salários, das inúmeras interferências de empresas privadas na gestão do dinheiro público e também em nosso trabalho; da indiferença da população e do diálogo na base da palmatória com que o atual governo “negocia” com os professores. De muitas maneiras, apanhamos dentro e fora da escola. O metrô vai bem, mas a educação… Somente um gari vai ao meu lado reclamando dos gastos públicos com a Copa, mas os estrangeiros que lotam o trem não entendem. Como poderiam? Somos isolados em nosso próprio continente. Ninguém fala a nossa língua.


Além disso, somos pacíficos, pacatos ou acomodados, tanto faz. Aparentemente está tudo funcionando, assim, eles não entendem nossa queixas. Então meus amigos precisam fazer uma coisa muito simples: comprar um SIM card pra usar o celular aqui, mas eles têm de se cadastrar. Passamos por lojas e quiosques da VIVO e nos deparamos com sistema fora do ar, informações desencontradas, funcionários despreparados e com caras de poucos amigos. Sem falar do tempo de espera e da burocracia usual. Começa assim: a pessoa que deveria te dar a informação não sabe nem do que você está falando. Em supermercados e Lojas Americanas enfrentamos mais tempo de espera, que não era justificado pelo tamanho das filas, e mais caras de poucos amigos. Olham pra mim perplexos com a paciência do brasileiro. Irritados com a perda de tempo e a obscuridade com que organizamos as coisas. Tudo muito confuso, burocrático mesmo. “No meu país a gente já tinha arrumado um tumulto. Vocês são muito pacíficos. Se eu tivesse que passar por isso todos os dias já tinha enlouquecido ou feito uma besteira”. Nesse momento, respiro aliviada, pois de algum modo eles conseguem ver o outro lado da pátria de chuteiras, que vai além das festas e pontos turísticos. A alegria dos torcedores contrasta com um misto de indignação e impotência de muitos de nós. E não foi preciso nenhum papo cabeça pra eles fazerem uma leitura de outros aspectos da sociedade como a falta de cortesia e qualificação de muitos funcionários. Os tapumes de obra espalhados por toda a cidade também dão mostras da confusão, do atraso, da “paciência” ou da inércia do povo. O entusiasmo dos torcedores, ainda os menos confiantes, Como eu, não deixa dúvida: somos a “pátria de chuteiras”, mas a realidade além da Copa não pode ser ignorada. Agora a única coisa que quica em minha cabeça é a pergunta “Qual será o legado dessa Copa para o Rio e a sociedade brasileira?”

Raquel Castro


Anônima

Hoje eu acordei em paz E não sei o motivo Mas é melhor ser esquisito

Felicidade boa É anônima Felicidade que eu desconfio Tem motivo e sobrenome

Matheus Luzi


Curiosidades:

Um amor platônico não é um amor impossível ou que não se pode dizer. O amor platônico é um amor idealizado, ou seja, a pessoa que tem esse tipo de amor idealiza outra pessoa, imaginando que ela é algo que na verdade não é. O amor platônico pode ser de filho para pai, de amigo para amigo, de namorado para namorado, etc. Esse termo foi inspirado em Platão. --Tem muita gente por aí se auto intitulando classe média, por ter um ou dois carros bons, por ter uma casa bonita e por andar bem vestido, mas não é bem assim que as coisas funcionam. Segundo os sociólogos, para ser considerado classe média é preciso ter um lucro anual de 400.00 mil reais. Isso é o que pensam os sociólogos, mas para mim, pobre é todo aquele sujeito que recebe salário de um patrão, pois se perder o emprego, perde toda sua renda. Ou seja, depende do patrão e do emprego. --Com finalidades financeiras para os chefões da igreja católica, os padres foram proibidos de casar, pois se assim fizessem teriam filhos e dessa forma, passariam bens materiais da igreja para seus filhos. Apesar de tudo, esse não foi o único motivo que fez com que padres não se casassem, pois na bíblia há versos como esse: “É bom para o homem abster-se da mulher”. Além disso, no início, os padres decidiram por conta própria não terem relações amorosas ou sexuais com mulheres. Fato que influenciou até hoje na vida dos padres. --Ave de Ave Maria significa livre. Ou seja, ave Maria é livre Maria. --Para quem gosta de uma cervejinha, ou alguma outra bebida que contenha álcool, fique sabendo que não se pode misturar com energético, e se assim fizer, pode causar até mesmo a morte.


Autopsicografia O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. E os que leem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só a que eles não têm. E assim nas calhas de roda Gira, a entreter a razão, Esse comboio de corda Que se chama coração.

Fernando Pessoa


Eu tenho uma moeda de 50 cruzeiros

Muitos me param na rua e me perguntam – O que você faz com 50 cruzeiros em 2014 – e eu digo que faço sucesso! Apesar dessa moeda não valer mais, ela me traz paz, e me mostra que o dinheiro não passa disso: uma simples moeda, que hoje não tem mais valor. Mas, ainda assim, essa moeda tem valor, pois um dia desses um homem me ofereceu 1.000 reais nela, mas eu achei pouco e não a vendi. Sabe por que achei pouco? Simplesmente porque essa moeda um dia já pode comprar algo, e merece muito mais do que 1.000 reais, por ser uma relíquia. Outro dia desses, fui a venda e fiz um teste, pedi cinco balas de menta em troca da minha moeda. A vendedora não aceitou, e eu a disse – Mas isso é uma moeda! – e ela olhou para mim e disse que era uma moeda antiga. O esculacho dessa moeda é o meu escrúpulo e a minha capacidade de venerar coisas antigas, não é a toa que meus músicos e poetas preferidos já se foram. Essa, a mesma moeda que há poucos anos atrás comprou algo, e que chegou até minhas mãos anos depois. Pra ser sincero, eu nem sei como ela chegou em mim, pois não me recordo, só me lembro de tê-la há muito tempo. A moeda de 50 cruzeiros, me parece que passou por uma bruxaria, pois como pode algo um dia valer dinheiro e no outro ser apenas relíquia? Isso deve ser mágica; não tem outra explicação. O interessante é que as pessoas se matavam de trabalhar para conseguir algumas dessas moedas, do mesmo jeito que trabalham para conseguir o real e os centavos, que daqui alguns anos também não valerão mais. Minha moeda de 50 cruzeiros, está com o brilho tão apagado quanto o seu valor. Mas acima de tudo, o brilho dela reflete a pobreza de se ter uma moeda. Já parou para pensar o quanto as moedas estragam as vidas? Pois tudo gira em torno delas. O brilho é o fiasco para que o dia se torna cansativo e enjoativo, pois em tempos de moda, o lucro é sempre a ambição e o capital, Eu tenho uma moeda de 50 cruzeiros, e não a dou para ninguém, há não ser para o meu próprio destino encabulado e para minhas crônicas perdidas no espaço das linhas

Matheus Luzi


Por que não Haverá de Mim um Deus?

Se a cada coisa que há um deus compete, Por que não haverá de mim um deus? Por que o não serei eu? É em mim que o deus anima Porque eu sinto. O mundo externo claramente vejo — Coisas, homens, sem alma.

Ricardo Reis (Heterónimo de Fernando Pessoa)


Isso não é café, apenas!

Meus lábios rosados almejam a água empretecida, que em glória conquistou o mundo e a medalha de prata; que fez amor comigo as cinco horas da matina, numa segunda qualquer, de um dia cinza, cheio de sorrisos e de mal humor. Com alegria beijei essa água empretecida, e seu calor invadiu minha alma, dando a ela um gosto forte e uma atenção especial. Estupidamente acreditei! E fui um grande idiota ao tentar esquecer essa água empretecida. Apesar disso, eu vejo a fumaça subir, depois de alguns goles. Essa fumaça é preta como essa água. O rosto dessa água empretecida é preto, claro! Mas seus pais são verdes como as plantas que derrapam minha fria solidão. O veneno é o calabouço e a angustia de ter acabado o pó, também preto! Só fui conhecer a angustia e a solidão na ausência dessa água Os espinhos também existem e estão me observando nesse exato momento; e o pior, com canivetes nas mãos, mas espinhos não tem mãos, porém a água empretecida tem, e são duas. As estrelas são muito metafóricas, mas quando eu me envolvo com a água empretecida eu as veja pretas (foscas), e não brilhantes; isso é só um detalhe singelo, pois além das estrelas, eu vejo a lua em formato de gota, e as nuvens em formato de xícara, mas isso tudo é muito metafórico, o importante é a realidade, como as próprias xícaras que vejo, com gotas pretas dentro. Essa água empretecida não é o café, mas acima de tudo é cafeína.

Matheus Luzi


Desejo a vocês Fruto do mato Cheiro de jardim Namoro no portão Domingo sem chuva Segunda sem mau-humor Sábado com seu amor Filme de Carlitos Chope com amigos Crônica de Rubem Braga Viver sem inimigos Filme antigo na TV Música de Tom com letra de Chico Frango caipira em pensão do interior Ouvir uma palavra amável Ter uma surpresa agradável Ver a banda passar Noite de lua cheia Rever uma velha amizade Ter fé em Deus Não ter que ouvir a palavra não Nem nunca, nem jamais e adeus. Rir como criança Ouvir canto de passarinho Sarar de resfriado Escrever um poema de amor Que nunca será rasgado Formar um par ideal Tomar banho de cachoeira Pegar um bronzeado legal Aprender uma nova canção Esperar alguém na estação Queijo com goiabada Pôr-do-sol na roça Uma festa Um violão Uma seresta Recordar um amor antigo Ter um ombro sempre amigo Bater palmas de alegria Uma tarde amena Calçar um velho chinelo Sentar numa velha poltrona Tocar violão para alguém Ouvir a chuva no telhado Bolero de Ravel E muito carinho meu."

Carlos Drummond de Andrade


Biscoitos da Sorte

Todo mundo já ouviu falar dos lendários biscoitos da sorte. Mensagens escritas em forma de provérbios por sábios do oriente que levantam a autoestima, mudam a vida das pessoas, conforta corações e condenam pessoas a um destino. Jonas saiu com sua namorada Julia no aniversário de namoro, estavam juntos há dois anos. Resolveram comemorar em um restaurante chinês que abriu no quarteirão de cima. Chegaram cedo. O restaurante ainda estava vazio, havia apenas algumas poucas pessoas sentadas, casal, família com uma criança pequena que estava brincando com a comida, garçons encostados em um canto. O Maître rapidamente arranjou uma mesa para os dois do lado de fora perto de um jardim. Sentaram, o garçom apareceu e deu o cardápio, escolheram um yakisoba de carne, e file na chapa mais guarnição. Se fartaram e conversaram muito sobre trabalho, faculdade, sexo e família. O garçom aparece com um prato com biscoitos da sorte. - Ei. Eu não pedi isso – Protestou Jonas. - É por conta da casa – Disse o garçom com um sotaque oriental. - Pegue um Jonas, sempre me contam que esses biscoitos trazem sorte. – Julia passa a mão nos braços de Jonas. - Ah melhor não. Eu não ando tendo muita sorte com essas coisas. Quem procura acha. - Vamos, o que de mal pode acontecer? - Acontece que se eu abrir esse biscoito e ser algo ruim, de acordo com o costume, irá se cumprir. - Se sair algo bom, vai acontecer algo bom. - Prefiro não me arriscar. Ainda mais depois de saber o que aconteceu com meu amigo Paulo.


- O que aconteceu com ele? - Oras, ele abriu um biscoito da sorte: Sua cabeça vai abrir para novos horizontes. - Idai? Mensagem bonita. - Sim sim. Largou a família foi ser andarilho, deve estar na Europa uma hora dessas sendo mendigo ou morando em uma pensão. - Que bobagem Jonas. - O Márcio amigo nosso abriu: Você será outra pessoa? - Fugiu com quem dessa vez? - Nada disso, mudou de sexo, era Marcio e virou Márcia, loira espetacular devia ver. - São casos isolados, deram azar só isso, não quer dizer que com a gente seja igual. - Sei não amor... - Vamos abra o seu. Por mim. Ele abre o biscoito e está escrito: Quem não arrisca não petisca. - Estranho sempre escutei isso. - É mesmo? - Sim, eu por exemplo nunca tinha beijado uma garota, me arrisquei e dei o meu primeiro beijo no colegial. - Ah, como foi? – Julia pensou que estava falando deles. - Foi ótimo - Não seu bobo, como foi a situação? – Ela dá um tapinha de leve no peito de Jonas. - Ah eu gostava de uma menina, ela sempre me fazia sorrir, era engraçada, tomei coragem, chamei ela para ficar no recreio. - Estranho achei que a primeira vez que a gente tinha ficado foi no cinema. - Não era você, era a Lurdinha. - Quem é Lurdinha? - Já disse uma colega minha. Era a garota top do colégio, veja que sorte a minha.


- Sei... – Julia ficou com ciúmes. - Ah faz tempo que não vejo ela. Será que ela ainda está bonita? Ela já era um espetáculo na época de colégio, conhecendo a genética do pai e da mãe deve ser miss ou algo parecido. - Rum rum – Julia ficou incomodada. - Taí. Faz tempo que não falo com ela, depois que ficamos, viramos amigos, estudávamos juntos, claro, sempre rolava algo a mais. - Jonas... - Acho que eu tenho o telefone dela em algum lugar – Jonas procura no celular – Ih devo ter anotado na agenda. - Agenda? Você tem o telefone dela em uma agenda? - Tenho oras, uma boa amiga a gente guarda para a vida toda, ainda mais ela. Um achado da natureza - Já chega não aguento mais, vou embora, está tudo acabado entre nós. – Julia levanta nervosa. - Calma Julia, não é para tanto... Você ainda não abriu o seu biscoito e.... - Calma nada, fica aí com a sua Lurdinha e o seu biscoito da sorte idiota, meu pai sempre me disse que você não prestava, na verdade todo homem não presta. Julia sai do restaurante nervosa e Jonas fica sentado sem entender nada, ele olha para os biscoitos da sorte em cima da mesa e conclui que deveria ter levado ela a uma pizzaria.

Caio Geraldini


Concerto para corpo e alma

Compreendi, então, que a vida não é uma sonata que, para realizar a sua beleza, tem de ser tocada até o fim. Dei-me conta, ao contrário, de que a vida é um álbum de minisonatas. Cada momento de beleza vivido e amado, por efêmero que seja, é uma experiência completa que está destinada à eternidade. Um único momento de beleza e amor justifica a vida inteira.

Rubem Alves


AMPUTAÇÕES

Quando o filme 127 horas estreou no cinema, resisti à tentação de assisti-lo. Achei que a cena da amputação do braço, filmada com extremo realismo, não faria bem para meu estômago. Mas agora que saiu em DVD, corri para a locadora. Em casa eu estaria livre de dar vexame. Quando a famosa cena iniciasse, bastaria dar um passeio até à cozinha, tomar um copo d’água, conferir as mensagens no celular, e então voltar para a frente da tevê quando a desgraceira estivesse consumada. Foi o que fiz. O corte, o tão famigerado corte, no entanto, faz parte da solução, não do problema. São cinco minutos de racionalidade, bravura e dor extrema, mas é também um ato de libertação, a verdadeira parte feliz do filme, ainda que tenhamos dificuldade de aceitar que a felicidade pode ser dolorosa. É muito improvável que o que aconteceu com o Aron Ralston da vida real (interpretado no filme por James Franco) aconteça conosco também, e daquele jeito. Mas, metaforicamente, alguns homens e mulheres conhecem a experiência de ficar com um pedaço de si aprisionado, imóvel, apodrecendo, impedindo a continuidade da vida. Muitos tiveram a


sua grande rocha para mover, e não conseguindo movê-la, foram obrigados a uma amputação dramática, porém necessária. Sim, estamos falando de amores paralisantes, mas também de profissões que não deram retorno, de laços familiares que tivemos de romper, de raízes que resolvemos abandonar, cidades que deixamos. De tudo que é nosso, mas que teve que deixar de ser, na marra, em troca da nossa sobrevivência emocional. E física, também, já que insatisfação é algo que debilita. Depois que vi o filme, passei a olhar para pessoas desconhecidas me perguntando: qual será a parte que lhes falta? Não o “pedaço de mim” da música de Chico Buarque, aquela do filho que já partiu, mutilação mais arrasadora que há, mas as mutilações escolhidas, o toco de braço que tiveram que deixar para trás a fim de começarem uma nova vida. Se eu juntasse alguns transeuntes, aleatoriamente, duvido que encontrasse um que afirmasse: cheguei até aqui sem nenhuma amputação autoprovocada. Será? Talvez seja um sortudo. Mas é mais provável que tenha faltado coragem. Às vezes o músculo está estendido, espichado, no limite: há um único nervo que nos mantém presos a algo que não nos serve mais, porém ainda nos pertence. Fazer o talho machuca. Dói de dar vertigem, de fazer desmaiar. E dói mais ainda porque se sabe que é irreversível. A partir dali, a vida recomeçará com uma ausência. Mas é isso ou morrer aprisionado por uma pedra que não vai se mover sozinha. O tempo não vai mudar a situação. Ninguém vai aparecer para salvá-lo. 127 horas, 2.300 horas, 6.450 horas, 22.500 horas que se transformam em anos. Cada um tem um cânion pelo qual se sente atraído. Não raro, é o mesmo cânion do qual é preciso escapar. Martha Medeiros


Limites do amor

Condenado estou a te amar nos meus limites até que exausta e mais querendo um amor total, livre das cercas, te despeça de mim, sofrida, na direção de outro amor que pensas ser total e total será nos seus limites da vida. O amor não se mede pela liberdade de se expor nas praças e bares, em empecilho. É claro que isto é bom e, às vezes, sublime. Mas se ama também de outra forma, incerta, e este o mistério: - ilimitado o amor às vezes se limita, proibido é que o amor às vezes se liberta.

Affonso Romano de Sant'Anna


Meu filho ouvirá música boa

Todas as pessoas escutam músicas, mas seus gostos são diferenciados. Como se explica isso? Será algo genético, cultural ou de identidade própria? Pois é, acontece que as referencias são pobres e sem muitos valores, ou são fortes e interessantes. Você já reparou que quem ouve rock, por exemplo, também tem um pai ou mãe que ouve o mesmo estilo musical? Isso acontece porque a família interfere no gosto pessoal da criança, que costuma se desenvolver na adolescência. A família tem um papel importantíssimo na construção do gosto musical de seus filhos. A criança tem como primeiro ídolo ou referência os seus pais, acostumando-se a ouvir as músicas desde cedo, causando um impacto sobre seu futuro gosto musical; mas isso não acontece somente com a música, mas sim com todo conjunto artístico e cultural. Além disso, existem os que desenvolvem seus gostos musicais a partir de si próprios, através de amigos ou coincidências, como um vizinho que escuta tal tipo de música. Isso se chama “acidente cultural”, que é quando um jovem em formação tem contato com a cultural de outro lugar, que não seja sua própria casa. É muito comum ver jovens ouvindo rock, por exemplo, vindo de uma família que ouve sertanejo, porém é muito difícil presenciar o contrário. Fato que deixa claro a influencia da família no gosto pessoal de um jovem. Ainda assim, é possível ver que além dos gostos, a família pode também trazer para um jovem o gosto pelos instrumentos e pela cantoria. Sendo isso, uma transferência genética, ou seja, que passou de pai/mãe para filho através do gene. Ou também pode ser que seja simplesmente que os pais já músicos sejam um ponto de referência para a criança. Enfim, educar uma criança não é somente leva-la a escola e dar a ela bons conselhos, o que muito importa de fato, é mostrar a elas na prática; no caso da música, tentar incentiva-la ouvindo músicas e a deixando se levar por isso.

Matheus Luzi


CONTATO:

Celular: 996210534

E-mail: luzismo@hotmail.com

http://revistaartebrasileira.blogspot.com.br/

Facebook: pesquisar por REVISTA ARTE BRASILEIRA



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.