BOLETIM ARTE NA ESCOLA • EDIÇÃO #77 • AGOSTO / SETEMBRO 2015
ARTIGO
É só cantar e tocar?
Vivências sonoras e estímulos musicais na infância contribuem para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social
Sandra Rhoden * Refletir, abordar e pensar em outras possibilidades de inserção de práticas pedagógico-musicais no contexto da Educação Infantil atual se faz urgente e necessário. Cantar e tocar instrumentos de percussão são atividades muito importantes, mas o que mais podemos fazer? Que outras possibilidades podem ser pensadas e planejadas neste universo? Desde a concepção até o nascimento, a criança absorve e estabelece relações com a música. As vivências sonoras e estímulos musicais recebidos na infância muito contribuem para o seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social.
Cantar, ouvir música, sonorizar histórias, interagir com instrumentos musicais, criar objetos sonoros e instrumentos de percussão, perceber os sons do ambiente interno e externo do seu contexto, expressar-se corporalmente a partir de gêneros musicais diversos, inclusive cantigas de roda, desenvolver o senso rítmico, conhecer as músicas do mundo, utilizar o corpo como suporte, entre outras atividades, são formas de musicalizar. Para conceituar e ampliar o termo musicalização, trago Penna (2008), que contribui ao dizer que: A musicalização é um processo educacional orientado que, visando promover uma participação mais ampla na cultura socialmente produzida, efetua o desenvolvimento dos instrumentos de percepção, expressão e pensamento necessários à apreensão da linguagem musical, de modo que o indivíduo se torne capaz de apropriar-se criticamente das várias manifestações musicais disponíveis no ambiente – o que vale dizer: inserir-se em seu meio sócio-cultural de modo crítico e participante. (PENNA, 2008, p. 47). De acordo com a autora, é importante que as atividades pedagógico-musicais propostas à criança tenham objetivos que propiciem a vivência, a pesquisa e a interação com a música. Além disso, é fundamental que façam sentido e tenham significado, contribuindo assim para o desenvolvimento integral desta faixa etária.
Expressar-se corporalmente faz parte da musicalização
A criança vem para a escola para aprender música? Levando em conta que a criança estabelece relações com a música antes de entrar na escola, os contatos com outras possibilidades e vivências musicais se ampliam gradualmente, de acordo com as práticas pedagógico-musicais propostas e pensadas pelo educador com o objetivo de expandir esse conhecimento. Ao escolher uma música ou uma atividade para desenvolver o fazer musical, é de suma importância que o educador ouça, conheça e reconheça o repertório musical prévio das crianças e se questione: “Que interesses musicais devo levar em conta? Que novos conhecimentos posso oportunizar? Que práticas e conhecimentos musicais pretendo proporcionar? ” Com relação aos repertórios musicais das crianças, ao buscar formas de ouvi-las e escutá-las, explorando suas múltiplas linguagens, valorizamos aspectos relacionados à sua autonomia e possibilidades de cooperação. A criança é ativa e participativa ao revelar a sua condição de sujeito, ao produzir e reproduzir sentidos e significações a tudo o que pensa e realiza. Para Ilari (2013, p. 114), “ainda hoje tem gente que pensa que criança não ouve direito, não tem opinião e que pouco importa o repertório musical que apresentamos a elas”. É importante permitir a inserção e apreciação dos repertórios musicais das crianças antes de ensinar somente músicas que nós, educadores, acreditamos ser melhores e mais adequadas para elas. A partir do reconhecimento dessa bagagem, devemos seguir com um planejamento que seja próximo do seu contexto, para depois pensar na expansão para outras esferas. Para realizar atividades pedagógico-musicais preciso de silêncio? É desafiador conseguir a atenção das crianças ao propor uma atividade, ainda que dinâmicas e lúdicas. Nesse sentido, procuro incorporar práticas pedagógico-musicais relativas ao som e ao silêncio. O silêncio é o pronunciamento do que ouço, pois ao silenciar me concentro e me foco no que está sendo proposto. Por meio da capacidade de fazer silêncio, consigo apreender profundamente os sons do ambiente, interno e externo, no qual estou inserido. Nesse sentido, é importante propor atividades em que as crianças silenciem por alguns momentos, sendo imprescindível escutar o que elas têm a nos dizer e, após o processo de escuta, conhecer as suas concepções em torno do que ouviram. Para estimular a percepção sonora, podemos incentivar a criança a nomear e classificar o que ouviu: “Quais foram os sons? ”, “De onde eles vieram? ”, “São fortes
ou fracos? ”, “São curtos ou longos? ”, “São graves, médios ou agudos? ”, “Estão longe ou perto? ”, “Podemos reproduzir estes sons? De que forma? ”, entre outras possibilidades. Assim, estaremos colaborando para mantê-la absorvida pelo que escuta no seu cotidiano e exercitando a atenção e concentração. Considerações finais Oferecer e desenvolver práticas pedagógico-musicais na Educação Infantil é um compromisso do educador, no entanto é necessário buscar mais conhecimentos para propor práticas que promovam a musicalização. Cursos de curta duração e leituras sobre o tema possivelmente serão necessárias e o auxiliarão a conhecer, refletir e planejar práticas musicais que possam ser desenvolvidas com crianças além de cantar e tocar. Referências bibliográficas: ILARI, Beatriz. Música na infância e adolescência: um livro para pais, professores e aficionados. Curitiba: InterSaberes, 2013. PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. Porto Alegre: Sulina, 2008. * Sandra Rhoden é Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS; Licenciada em Música pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS e Graduanda em Artes Visuais pela mesma Universidade. É professora na Fundação Municipal de Artes de Montenegro – FUNDARTE desde 1994, atuando nas áreas de música e artes visuais, com ênfase em musicalização infantil, pedagogia do piano, artes visuais, formação de professores e projetos integrados. Coordenadora do Polo FUNDARTE Arte na Escola e professora convidada no Curso de Especialização em Educação Musical pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS.