Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Ano 6 | nº 921 | Outubro | 2012 Fortaleza- Ceará
As tecnologias que ajudam na convivência com o semiárido “Água que vem do seio da terra, trazendo consigo divinos segredos. Água que vem banhando as sementes trazendo consigo da vida o enredo. Água que vem caminhos traçados no fado do povo desesperançado. Água que vem, mensagem celeste mistério guardado em caminho agreste”. Zé Vicente – Poeta e cantor popular
O cenário da caatinga, a luta pela terra e água que envolve as 25 famílias no entorno da comunidade Pé da Serra do Cedro, distante 14 km da cidade de Sobral seria desolador se não tivesse por trás uma forte articulação comunitária que faz da comunidade um espaço de luta, resistência e solidariedade. A conquista pela terra ocupada a mais de 50 anos significa muito para a vida dessas famílias. Uma luta árdua e diária que preocupa a permanência delas no local, porém esse desafio é superado Na sede com membros da Associação São Francisco de Assis quando se unem para cuidar do espaço enquanto a questão da terra não se resolve na justiça. À medida que o decreto de apropriação não chega, os moradores aproveitam a terra de todas as formas e todos os jeitos buscando apoio de projetos e parceiras com diversas entidades para levar a frente às demandas da comunidade. Na terra elas/es cultivam hortaliças, criam galinhas e cabras do projeto cabra nossa. Além disso, acompanham o projeto com alfabetização de adultos, onde quase todos os adultos da comunidade estudam. Reúnem-se num pequeno espaço construído por eles mesmos onde agregam atividades como as aulas, reuniões, oficinas e encontros com jovens. Francisco das Chagas de Sousa, conhecido como “Chiquinho”, casado há 20 anos com Maria do Espírito Santo de Sousa Silva é presidente na Associação São Francisco de Assis, fundada desde 1999. Juntos eles articulam e animam as atividades da comunidade.
Ao lado da cisterna calçadão a comunidade exibe o canteiro cheio de hortaliças
Eles contam que em passado não muito distante a prática dos agricultores ainda se resumia às queimadas como forma de preparar o terreno para receber o roçado, hoje a comunidade tem outra consciência. Já foram feitos o replantio de vários pés de sabiá, árvore típica dessas regiões.
Ceará
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
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“No início enfrentamos vários problemas, não tínhamos a consciência do mal que estávamos fazendo pra nós mesmos. Antes a gente queimava a terra para o plantio, não ínhamos organização, hoje temos atitude e cuidamos mais da natureza”, conta Chiquinho. Conscientes dessa atitude, a comunidade enfrenta hoje outros problemas como a falta de água desafio que foi solucionado com a construção no ano de 2007 das cisternas de placa para as famílias matar a sede. Mais recente em 2011 a comunidade conseguiu construir nove cisternas calçadão, distribuídas em pontos estratégicos da comunidade e um tanque de pedra, onde garante um volume maior de água para consumo humano e cuidar das outras vidas Tanque de Pedra - água garantida para os animais na aos arredores, como plantas e animais. É época da estiagem destacado pelos moradores como uma das maiores conquistas. A comunidade ainda recebeu da prefeitura a construção da passagem molhada, caminho feito de cimento por onde escorre a água da chuva. Todas essas tecnologias foram construídas em mutirão e contou com ajuda até das crianças. Eles cultivam ao lado das cisternas canteiros de hortaliças e plantas frutíferas. “Nossa luta é longa, ainda temos muito que conquistar. Lutamos muito pra ter o que temos hoje e não vamos parar”, afirma Chiquinho. Antes das tecnologias, se abastecia com bastante dificuldade com água que vinha de uma cacimba distante da comunidade, hoje ela não existe mais, foi aterrada devido a uma barreira que caiu por cima. Os agricultores relatam que nunca viram uma experiência como essa e são gratos às instituições que acompanharam e ajudaram a compreender a vida de uma outra forma e com outras possibilidades. “Vivemos um processo de renovação, só fica no modelo antigo quem quer. Trazemos conhecimento e informação para crescer e se não fosse às cisternas, não saberíamos como seria nossa vida”, conta Maria esposa do Chiquinho. Os moradores contam que tudo que conseguiram até hoje foi por mérito e esforço da própria comunidade. “O poder público tem má vontade e demora pra atender nossas demandas. Desafiamos qualquer político que diga que trouxe algum benefício para nossa comunidade. A política pública precisa ser renovada”, desabafa Chiquinho. A conquista de todas essas tecnologias só foi possível devido a grande organização comunitária que envolve a comunidade e a consciência de que as lutas fortalecem a estrutura comunitária, além de empoderar politicamente a própria comunidade para a busca incansável do direito que não se troca por favores nenhum.
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Programa Cisternas