Ano 8 • nº2055 Outubro/2014 Almenara Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Artesãs contam sua história com retalhos, agulha e linha Símbolos da vida rural no Vale do Jequitinhonha, as casinhas de paua-pique, a taboa, a luz do lampião, a fumaça do fogão a lenha, o rio, a ponte, os pássaros e os pescadores são elementos recorrentes no trabalho de artesãs da cidade de Almenara, localizada a mais de 700 km de Belo Horizonte. Juntas, elas formam a Associação Comunitária Mulheres Criativas de Almenara. Desde sua fundação, há 11 anos, o grupo mantém o mesmo objetivo: gerar renda para famílias carentes e preservar a cultura regional. Pelo menos uma vez por semana, cerca de 20 mulheres se reúnem para costurarem artigos diversos, como panos de prato, capas de almofada, aventais, colchas, porta-talheres, porta-celulares e portagarrafas, colchonetes, vestidos infantis, jogos de banheiro e de toalhas. Entre as técnicas utilizadas pra ornar os produtos de artesanato estão o bordado, vagonite, ponto cruz, patchwork e quilting. Uma determinação para continuidade do projeto foi a de valorizar a cultura do Vale do Jequitinhonha, seja por meio de palavras ou do artesanato em si. "Toda vez que participamos de alguma feira, as pessoas pedem pra gente contar a história do Vale, falar sobre a nossa realidade. E através de nosso produto, mostramos a riqueza da região e o potencial do povo daqui. Contamos nossas histórias com retalhos, agulha e linha", relata a atual presidente da associação, Marinha Costa de Sousa.
Marinha, à direita, coordena as reuniões semanais das Mulheres Criativas de Almenara
Nos outros dias, além dessas 20 e poucas associadas, mulheres adultas e adolescentes interessadas em participar de uma atividade diferente são acolhidas calorosamente. Essa atitude foi herdada das irmãs franciscanas, as criadoras da associação e da casa em que funciona o projeto, o Centro Pastoral Padre Valdir. "Trabalhamos com o espírito de sempre ajudar as pessoas. Se chega até nós uma mulher que saiu do serviço por motivo de doença, ou se está em casa nervosa e depressiva, nós temos a obrigação de recebê-la de braços abertos, confortá-la, ensiná-la as técnicas, até que fique boa. Se uma criança está dando trabalho na escola, deixamos ela trabalhar com o que sentir vontade, soltando a criatividade. As adolescentes em conflito com a lei também já passaram por aqui. É essa a nossa obrigação! Trabalhar pra nós e pra comunidade!", explica a presidente.
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Articulação Semiárido Brasileiro – Minas Gerais
Um exemplo de sucesso do projeto é a experiência de dona Eurides dos Reis. Essa senhora cheia de energia passou por momentos difíceis em sua juventude: o falecimento precoce de sua mãe e a responsabilidade de cuidar de seus nove irmãos, o abandono da carreira de professora por causa disso, e os problemas de saúde que a deixaram por longos períodos no hospital. Com conhecimentos de costura aperfeiçoados desde os 12 anos de idade, ela logo entrou para a associação já como Dona Eurides exibe a estampa de taboa
monitora. "Recebia convites para participar, mas como estava
sempre doente, não conseguia começar. Hoje, isso aqui é a minha casa, e as colegas, a minha companhia quando meus netinhos estão na escola", declara a artesã, que tem os dias preenchidos pela alegria de Vitória e Murilo, de 12 e 10 anos, que moram com ela. Assim, além de prover renda para o sustento e a criação dos netos, a atividade também serve para encher o guarda-roupa deles com peças feitas pela vovó coruja. Histórico de responsabilidade social O Centro Pastoral Padre Valdir abriga ainda uma horta comunitária e a Associação das Crianças e Adolescentes Aprendizes da Arte de Almenara (Criaarte) e, na época de sua inauguração, contava com uma lavanderia comunitária e uma creche. O centro foi construído pelas irmãs franciscanas após a grande enchente, em 1989, para acolher as pessoas desabrigadas, fornecer alimento e facilitar a vida das lavadeiras, que muitas vezes iam para o rio bem cedo e só retornavam no final da tarde. Nesse contexto surgiu a necessidade de criar a Associação Comunitária Mulheres Criativas de Almenara. O objetivo foi juntar essas mulheres, que tinham conhecimentos variados, e promover a troca de ideias e experiências. "Umas bordavam, outras desenhavam... Cada uma contribuía com o conhecimento que tinha e as freiras com a matéria-prima: as linhas, os tecidos...", relembra Marinha. Artesanato como profissão Muitas mulheres foram beneficiadas pelo projeto. Se antes se ocupavam apenas com a manutenção do lar, hoje são talentosas costureiras. É o caso de Zenailda Lima, a Zena, como é conhecida. "Fomos descobrindo outros potenciais", revela. Essa mudança fortaleceu a presença da mulher em casa, na contribuição com a renda, e na sociedade, fazendo com que sobrasse tempo para maior participação na comunidade; e foi um antídoto para levantar a autoestima dessas mulheres. Zena entre suas professoras, Marinha e Eurides: "No início eu morria de medo de pegar na máquina! Comecei devagarinho, com crochê, pontinhos, depois evolui para o patchwork, o quilting..." Realização
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